A paródia, Alegoria e Antropofagia na Obra de Adriana Varjão

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a paródia, alegoria e ANTROPOFAGIA NA OBRA DE ADRIANA VAREJÃO


universidade federal de sergipe departamento de arquitetura e urbanismo

estética e história da arte ii 2021.2

discentes

isadora alves juliana de paula docente

prof. dr. pedro murilo gonçalves de freitas

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Índice a artista 04 as fases 05 a obra 09 uma "releitura" 10 técnica e composição 11 o banquete servido por adriana varejão 16

referêcias 17

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Adriana Varejão, Figura de convite III, 2005.

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a artista Nascida na cidade do Rio de Janeiro em 1964, Adriana Varejão é uma artista plástica contemporânea que iniciou sua carreira nos anos 80 e desde lá vem conquistando cada vez mais destaque no espaço artístico nacional e internacional. Seu trabalho reproduz diversos elementos históricos e culturais, com temáticas ligadas principalmente à colonização, ao movimento barroco e à azulejaria. Junto as outras temáticas um elemento também recorrente é o corpo humano retratado de forma visceral, muitas vezes repartido, rasgado, tendo a figura da carne quase sempre como elemento estético. Segundo a artista apesar dos elementos históricos serem frequentes em seus trabalhos, as figuras históricas utilizadas por ela são moldadas ao presente, como uma paródia, um conjunto de remendos que estabelecem uma narrativa própria.

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as fases Barrocos (1987-1988)

Altar Amarelo, 1987.

Série composta pelas obras: Natividade, Altar Amarelo, Azulejos, Anjos e Santo. Trata-se de obras que a partir da mescla de elementos barrocos em diálogo com arte contemporânea, questionam as relações sociais construídas no passado colonial. Terra Incógnita (1991-2012) abrange desde o estudo "Filho bastardo" até a obra "Panorama Guanabara".

Filho bastardo, 1991.

Proposta para uma catequese (1993-2005) Série composta pelas obras Figuras de Convite e Proposta para uma Catequese Parte I Díptico: Morte e Esquartejamento. Reacende as indagações sobre o barroco e a colonização brasileira. Figura de Convite II, 1998.

Acadêmicos (1995 - 1999) Série é praticamente formada por paródias. Nela foram concebidas narrativas durante o uso de fragmentos de telas clássicas que representaram o Brasil no período imperial e colonial. Musas, 1997.

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as fases Irezumis (1994-1998) Série que se apropriação da Irezumi (técnica de tatuagem japonesa) como forma de retratar o processo de colonização a partir da ideia do corpo tatuado. Irezumi em ponta de diamante, 1997.

Línguas e Cortes (1997-2003) Série composta de azulejarias com presença de cortes, que deixa entrever uma matéria interna, que tem a aparência de carne. Parede com Incisões à la Fontana, 2000.

Mares e Azulejos (1991-2012) Série de conjuntos de azulejos que fazem referência a azulejaria portuguesa simbolizando toda sua tradição e herança e contam a história do impacto da colonização latino-americana. Azulejões, instalação CCBB - Rio, 2000.

Charques (1999-2021)

Ruína de Charque – Santa Cruz, 2002.

A série simula pedaços de arquitetura com pinturas desses azulejos, entremeadas pela representação da carne de charque. Ao longo de sua pesquisa Adriana colecionou mais de seis mil deles registrados por ela desde 1988, com imagens que a inspiram.

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as fases Saunas e Banhos (2002-2018) A Série afasta-se da apropriação de imagens da azulejaria de monumentos arquitetônicos barrocos civis e religiosos, entre Portugal e Brasil. Foi realizada, a partir de fotografias de espaços públicos pela própria artista em saunas, piscinas, casas de banho, banheiros, hospitais e matadouro.

O iluminado, 2009.

Pratos (2009-2012) Todas as pinturas têm a forma de pratos fundos de um metro e meio de diâmetro, e apresentam de forma singular personagens míticos e frutas frescas, fundo do mare, conchas e castelos de areia.

Sereias bêbadas, 2009.

Polvo (1991-2012) Série que traz reflexão sobre o termo “cor de pele”, desconforto notado por ela ao não encontrar tintas assim descritas por fabricantes que não fossem em tons rosados ou de bege. Altar Amarelo, 1987.

Folhas (2015-2015) Telas em forma de folha seca trazendo imagens que criticam a história do Brasil. Além da recorrente referência à nossa colonização. Também aponta para a tradição chinesa de pintar sobre folhas de pintar sobre folhas. Jardim das delícias, 2015.

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as fases Mimbres (2015-2018) Série que referencia a cerâmica mexicana para colonização e questionar geometria nos discursos que História da Arte.

tradição de falar sobre o papel da dominaram a

White Mimbres, 2015.

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a obra

Figura de convite III, 2005 Óleo sobre tela, 200 x 200 cm Série "Proposta para uma catequese" Coleção pessoal, Rio de Janeiro, Brasil

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Figura de convite, Palácio de Alegrete, Lisboa, Portugal, século XVIII

uma "releitura" As imagens conhecidas por figuras de convite ou figuras de cortesia, eram imagens criadas em azulejos retratando lacaios, damas e guerreiros simpáticos que "davam as boas-vindas" àqueles que chegavam em palácios, pátios e jardins portugueses. Nas figuras de convite de Adriana Varejão, pintadas entre 1996 e 2005 para a a série Proposta para uma catequese, em vez das figuras tradicionais utilizadas pelos portugueses o que vemos nestes trabalhos são mulheres nuas com seus corpos tatuados, cuja posição de guerreira se mostra a partir da arma que ela carrega — nesta obra, uma espada curva — junto com uma cabeça decapitada pendurada em sua mão.

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técnica e composição Os elementos de canibalismo presentes não só em Figura de Convite III, mas em grande parte da série Proposta para uma catequese, mais do que para chocar também comunicam de onde parte a mensagem proposta pela a artista, pautada sobretudo na ideia do "canibalismo" de elementos históricos e culturais para fins narrativos.

Figura de convite I, Adriana Varejão, 1996.

Funda da obra, Figura de convite II, Adriana Varejão, 2005.

Cena de Canibalismo, gravura, Theodor De Bry, 1592.

A representação de Cena de Canibalismo que aparece ao fundo de Figura de convite I em Figura de Convite III se transforma em pedaços de corpos humanos, como representado na gravura de Theodor De Bry, que se mesclam a ornamentação floral dos delicados azulejos portugueses. Sendo assim não apenas uma alegorização da imagem, criada pelo europeu, do nativo selvagem que devora seu semelhante, mas também uma referência ao próprio movimento antropofágico brasileiro de devorar referências culturais.

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técnica e composição

A pintura concebida na forma de azulejos azuis vem, como já dito da tradição barroca portuguesa, tradição essa que foi diretamente influenciada pelas delicadas porcelanas chinesas, a partir da colonização portuguesa na Ásia, e pelos belos azulejos azuis holandeses.

As composições variadas de azulejaria que aparecem em Figura de Convite III, apesar da fragmentação e remodelamento, ainda carregam os traços e heranças desses encontros e desencontros que formam as origens culturais e referencias heterogêneas envolvidas na concepção dos azulejos tradicionais do barroco português.

Reapropriadas, deslocadas e redimensionadas em sentidos diferentes dos originais, através do imaginário alegórico e narrativa da artista, as peças se agrupam irregularmente, abdicando de simetria estética ou compositiva, aproximando-se tanto quanto distanciando-se de suas origens.

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técnica e composição

.A figura feminina da obra de Varejão faz referencia direta as gravuras de Theodor De Bry. Seu corpo tatuado se baseia na gravura de De Bry publicada entre 1590 e 1624, onde é retratada a figura de uma guerreira celta, com o corpo inteiramente coberto de desenhos, exceto por seu rosto, pés e mãos.

Sem título, gravura, Theodor De Bry, 1590-1624.

Figura de Convite III.

Além disso a figura feminina retratada na obra de Varejão, é traçada em linhas simétricas e espirais com linhas pretas bem marcadas.

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técnica e composição

Em suas tatuagens as espirais que cobrem a perna da figura representam o movimento da energia, as fases cíclicas da vida, convergindo para entregar a imagem de mulher detentora de força e persistência, imagem essa que muitas vezes é permitida somente a representação de homens com o ideal de masculinidade viril.

Ainda fazendo referência a gravuras de De Bry, ao redor do pescoço e na altura do abdômen há uma corda e nela uma corrente, a figura da corda possui diversos significados, tanto religiosos quanto místicos e até filosóficos. Numa perspectiva positiva, simboliza união, já numa perspectiva negativa significa prisão ou escravidão.

Sem título, gravura, Theodor De Bry, 1590.

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técnica e composição

Além da corda a referência a gravura de De Bry se estende a posição, a espada e a cabeça decepada que ambos os guerreiros carregam. Na obra de Varejão a cabeça carregada pela guerreira em sua mão direita corresponde a própria artista o que leva a duas narrativas: uma releitura do costume de guerreiros celtas de cortar e guardar apenas a cabeça dos guerreiros mais virtuosos; como também o ato da artista de se oferecer ao espectador como parte do "banquete" antropofágico.

Sem título, gravura, Theodor De Bry, 1590.

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o banquete servido por adriana varejão Figura de Convite III entrega simbolicamente, um corpo canibal. Apropriando-se da azulejaria e das gravuras, não como uma tentativa de copia ou reprodução, mas como sobreposição e remontagem dessas formas conhecidas que além da heterogenia podem estabelecer uma narrativa própria. Utilizando da alegorização e a paródia dos azulejos e gravuras a artista também, mescla discursos, criando um espaço antropomórfico na pintura, um banquete "antropofágico", através de elementos simbólicos. Em palavras de Fátima Nader, Adrinana Varejão "inverte o olhar chocado do civilizado sobre o bárbaro, canibalizando a memória cultural, confiscando imagens e colocando-as a seu serviço".

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as referências Pascholati, Aline. OBRA DE ARTE DA SEMANA: ‘Figura de convite III’, de Adriana Varejão. Artrianon, 2020. Disponível em: https://artrianon.com/2020/06/08/obra-de-arteda-semana-figura-de-convite-iii-de-adrianavarejao/. Acesso em: 1 jun. 2022 TEIXEIRA, Nincia Borges. O corpo feminino na obra de Adriana Varejão: transgressão e ruptura. Revista Desenredo, v. 13, n. 2, 2017. CERQUEIRA, Fátima Nader Simões; LOPES, Almerinda da Silva. ADRIANA VAREJÃO: O CORPO CANIBAL NAS FIGURAS DE CONVITE. Anpap, [S. l.], n. 18, p. 1833 - 1846, 2 jun. 2022.

Adriana Varejão: Suturas, fissuras, ruínas. pinacoteca, 2022. Disponível em: https://pinacoteca.org.br/programacao/adrianavarejao-suturas-fissuras-ruinas/. Acesso em: 1 jun 2022

Biografia Adriana Varejão (Rio de Janeiro, RJ 1964) Escritório de arte, 2022. Disponível em: https://www.escritoriodearte.com/artista/adrianavarejao. Acesso em: 1 jun 2022

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