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ADRIANA SCARTARIS
OLamentodoProgresso:UmaReleituradeCândidoPortinari
Na obra "O Lavrador de Café", parte da série Grandes Mestres e uma homenagem ao talento inquestionável de Cândido Portinari, mergulho nas camadas narrativas e nas entrelinhas da obra original para revisitar reflexões sobre o avanço desenfreado do progresso e seus impactos avassaladoressobreavidanocampo.
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Preservando o elemento central, o lavrador de café, busquei criar uma nova textura, uma nova perspectiva, que dialogasse com o contexto atual. Todos os elementos da composição ganham uma camada extra de significado, revelando a complexidade das relações entre o homem, a naturezaeopoderqueocerca.
O cafezal, antes um símbolo de trabalho árduo e produção, transforma-se em um grande tabuleiro de xadrez, onde as peças se movem estrategicamente em um jogo de interesses maiores. Os campos com árvores decepadas são editados com efeitos de arte ótica, criando a ilusão de um buraco negro que tudo consome. Essa representação simbólica alude à voracidade do progresso, quedevoraosrecursosnaturaissemconsiderarasconsequências.
Ao fundo, uma cidade construída com peças de xadrez emerge sem cor, como um prenúncio da vitória das metrópoles e seus valores sobre o campo Edifícios coloridos afundam, tragados pelo incontrolávelavançodaurbanização Éumretratododesequilíbrioentreodesenvolvimentourbano e a preservação das raízes rurais, uma metáfora da marginalização do campo em face da supremaciadavidanascidades.
Mísseis cercam o cafezal, simbolizando o poder destrutivo do progresso sobre a vida do homem e o ambiente que o sustenta. É uma alusão ao deslocamento e à devastação causada por projetos grandiosos que separam o homem da terra que cultiva, transformando-o em mero instrumento de uma máquina impessoal e voraz. A locomotiva segue arrastando vagões vazios e deixa no ar uma fumaçaironicamenteverde.
Nessa releitura, o homem do campo retratado por Portinari ganha uma nova dimensão, pois agora ele enfrenta um sistema ainda mais destrutivo, movido por interesses que ultrapassam sua compreensão. É um apelo à reflexão sobre as consequências do progresso desenfreado, que muitasvezesrelegaosvaloreshumanoseambientaisasegundoplano.
"O Lavrador de Café" se torna, assim, uma expressão do lamento diante da desigualdade, da exploraçãoedaperdadasraízesquenosconectamcomaterra.Éumconviteaquestionarosrumos de uma sociedade que coloca o poder e o lucro acima do respeito pela vida e pelo equilíbrio entre homemenatureza.