Portas Abertas

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Maria Cecília França Lourenço Rodrigo Christofoletti André Müller de Mello



UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO reitora

S uely V ilela vice-reitor

F ranco M aria L ajolo pró-reitor de cultura e extensão universitária

R uy A lberto C orrêa A ltafim PRÓ-REITORIA DE CULTURA E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA assessor técnico de gabinete

Paulo C ésar X avier P ereira

assistente técnico de direção

C ecílio de S ouza

assistente técnico de direção

M arilena P ires

diretor acadêmico

E duardo A lves

diretor administrativo e financeiro

Valdir P revide

MONUMENTO NACIONAL RUÍNAS ENGENHO SÃO JORGE DOS ERASMOS diretora

M aria C ecília F rança L ourenço vice-diretor

W itold Z mitrowicz coordenação executiva

M arilena P ires educadores

A ndré M üller de M ello R odrigo C hristofoletti secretária

H eloisa S tella V eiga M achado projeto gráfico

B ianca O liveira A ndré




Copyright © 2008 Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos

Ficha catalográfica

LOURENÇO, Maria Cecília França, CHRISTOFOLETTI, Rodrigo e MELLO, Andre Müller. Portas Abertas: um programa em debate. Pró–Reitoria de Cultura e Extensão Universitária da Universidade de São Paulo – Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos – USP, 2008.

Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos – Bens Culturais – Educação – Interdisciplinaridade – Educação Ambiental – História do Brasil Quinhentista

Direitos reservados à Universidade de São Paulo


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I. Balanço

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II. Preservar lutas

e visualidades: programas e trocas

e testemunhos

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Fundamentações e conceitos

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Ações e transformações

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III. Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos 50 anos de administração USP

De Portas Abertas para comunidade, o avanço e o saber

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Abrindo as portas para uma Educação em movimento

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A Base Avançada de Cultura e Extensão abre as portas para o futuro das Ruínas

34 37

Usos de um espaço em construção O depoimento como sustentáculo da memória: ruínas que se reagrupam peça por peça

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Depoimento do prof. Julio R. Katinsky

49

Depoimento do arquiteto Bechara Abdalla

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IV. Cartas, Planos e Tomada

de

Consciência

57

Estímulo à Pesquisa, ao Ensino e à Informação

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Depoimento da profª Zildete Prado

Sumário

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67 69

Histórico de um programa bem sucedido 2005 Tateando um projeto possível Edição Verão de 2005 Edição Inverno de 2005 2006 Um laboratório a céu aberto Edição Verão de 2006 Edição Inverno de 2006 2007 Crescendo com as experiências Edição Verão de 2007 Edição Inverno de 2007 2008 A consolidação de um modelo Edição Verão de 2008

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Depoimento do poeta Eguinaldo Hélio de Souza

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Depoimento da profª Maria José Barbierato

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V. Portas Abertas: democratizando espaço, conhecimento e lazer

VI. Cronologia

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VII. Considerações Finais

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Notas de rodapé Fontes de imagens

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Referências Cartas, Recomendações, Convenções Patrimoniais

Sumário

e sobre o meio ambiente




I.

Balanço e visualidades: programas

e trocas

por Maria Cecília França Lourenço, Rodrigo Christofoletti e André Müller de Mello

Esta publicação marca mudanças ímpares, relativas ao Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos: a Universidade de São Paulo/ USP inaugura a primeira etapa da Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária, em Santos. Hoje o bem se constitui em um órgão da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária/ USP, tendo sido doado à universidade, há exatos 50 anos. Nós, educadores, trazemos o resultado de uma ação significativa: o balanço do Programa Portas Abertas, direcionado ao público em geral, visando preservar o bem, ou seja, estudá-lo, suspender silenciamentos aqui ocorridos e trocar inquietações com distintos públicos. A primeira parte desta edificação abrange um auditório e espaço de serviços, sendo uma obra do arquiteto e professor Júlio Roberto Katinsky, inaugurada no exato momento em que se inicia a parte derradeira, representando um passo decisivo para cumprir suas finalidades. Como ex-gestor das ruínas e autor de obra pública, em Santos o professor bem sabe a importância em se oferecer condições harmoniosas para enraizar ainda mais o bem.

O Monumento Nacional, na condição de órgão da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, antes mesmo de adquirir este status iniciou atividades programadas para diferentes públicos no Verão 2005. Como educadores da USP criamos o Programa Portas Abertas, que ora apresentamos, com depoimentos e relatos das experiências de ilustres personagens, em diversas áreas, bem como a documentação do processo de criação, realização e avaliação deste programa, em todas as suas edições. Acreditamos na educação como motor transformador da vida, aprofundador do humanismo e abertura para um diálogo entre diferentes, daí agregarmos este conjunto de textos. A educação em um bem tombado se fundamenta em experiências e em inquietações, que procuramos trazer para debate dos caminhos aqui adotados e que o Programa Portas Abertas se constitui em excelente diferencial. Aguardamos sua visita!

Balanço

e visualidades: programas e trocas

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II. I.

Preservar lutas e testemunhos

por Maria Cecília França Lourenço

“O ser senhor de engenho é título que muitos aspiram, porque traz consigo o ser servido, obedecido e respeitado de muitos.” André João Antonil. Cultura e opulência do Brasil, p.75.

O Monumento Nacional Ruínas Engenho dos Erasmos se constitui, na atualidade, em um patrimônio alargado e complexo, abarcando múltiplos campos. Inicialmente, ao ser passado para a USP imediatamente se identificou a importância arquitetônica, por meio de pesquisas acuradas nas áreas histórica e arqueológica. As três disciplinas seguem com contribuições distintas, porém, desde 2001 se vem buscando alargar o arco, com projetos que reconheçam o monumento como agente para muitos no cenário urbano, fabril, educacional, ambiental, econômico e cultural. O remanescente do antigo engenho se encontra em lugar privilegiado, como bem tombado nas instâncias municipal, estadual e federal. Alude aos processos culturais vividos e marcados pela ação de senhores e escravos, posses e lutas, interesses e disputas, vitórias e açoites, ação e resignação, criação e destruição, risos e prantos, estando desde data recente com múltiplas atividades e programas distintos para dividir tão valiosa herança.

Até o século antepassado pertenceu ao município de São Vicente, no entanto, desde o século XX se acha em território santista. Entre nós, poucos são os bens culturais que detêm o triplo reconhecimento e, ainda mais, abrigam remanescente Quinhentista, a saber – o antigo Engenho, então o denominado do Governador, erigido por Martim Afonso de Sousa, em sociedade com outros companheiros aqui aportados, quando de sua estada entre nós, desde 1532 e por dois anos. O Engenho passou a ser designado São Jorge dos Erasmos quando o banqueiro, comerciante em várias praças e ilustrado senhor da Antuérpia, Erasmus Schetz adquiriu-o em sociedade com outros. Este, católico em tempos de Contra Reforma e com vizinhança protestante, possivelmente selecionou cuidadosamente a referida figura de santo, dentro de sua cultura religiosa para homenagear, recaindo neste degolado em 23 de abril de 303 d. C.. Como se consagrou, o jovem, Jorge se alçou a esta condição, após declarar-se fiel aos princípios cristãos, quando

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e testemunhos

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o Imperador Diocleciano professava outra fé, o que pode remeter à própria biografia de Schetz, quem sabe projetada na escolha do nome. Entre nós, a prática de produzir açúcar com base na cana se deve aos portugueses, que introduziram essa cultura, sendo então altamente rentável e introdutora de uma primeira atividade em escala aproximada do que se denominará posteriormente, capitalismo industrial. Afinal, o capital destes contratava o trabalho à distância, vigiado por feitores e com plena adesão dos Jesuítas, talvez em face do apoio dado pelos Schetz aos negócios e interesse da Igreja Católica, como atestam documentos. Entre tantas missivas de Padre José Anchieta, uma não deixa dúvidas quando toma a iniciativa de rezar uma missa ao falecer um dos Schetz, revelando a proximidade das relações e a estima por serem católicos. A importância da terra, o açúcar como moeda corrente, o chamado ouro branco, a possibilidade de utilização de mão de obra indígena, em trocas pessoais e a escravização de negros renderam ampla produção e, conseqüentemente, atraíram conflitos e lutas, passando a ser mira de ataques e de confrontos. Modificamse também os proprietários, lembrando que Erasmus Schetz falece a 30 de maio de 1550, passando a propriedade exclusivamente para os herdeiros, tendo seu filho Gaspar assumido os negócios e vindo a falecer em 1568, mas mantendo-se o negócio na família, até princípios do Século XVII.

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Como se observa já na origem se caracteriza como uma plataforma de encontros, simbologia adotada em projetos investigativos e ação educacional. Entretanto, a outra face vem sendo lembrada, porém a USP tem procurado não repetir os mesmos erros, uma vez que foi ao mesmo tempo cenário letal, competitivo, excludente e destrutivo, já que há claros indícios de lutas, violências e queimadas, verdadeiros testemunhos dos equívocos para não serem esquecidos tampouco reproduzidos. Alterando-se este quadro internacional, o bem cultural esteve vinculado às várias famílias paulistas por adoção, entre as quais de Braz Esteves, Pedrosa, Góis, Muniz Guimarães, Viana, Marques do Vale, Graça Martins, Toledo e, finalmente em 1943, Octávio Ribeiro de Araújo adquire já em ruínas. Este, no ano de 1958 doa as atuais Ruínas para a Universidade de São Paulo, portanto há exatos 50 anos, inaugurando uma prática seguida por outros particulares, que entendem a importância de se abrigar testemunhos materiais relevantes para uma universidade pública e de qualidade. Tal prática traduziu-se num espaço de atuação educativa, a partir de uma plataforma denominada: Sophia.


Fundamentações e conceitos

“O patrimônio que recebemos na verdade foi tomado emprestado de nossos filhos” Conceito grafado em uma parede atribuída aos Índios Yanomani, de Ushuaia/Argentina, em outubro de 2007.

Ribeiro de Araújo legou em vida o Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos para a USP, pouco após ser elaborado na Organização as Nações Unidas para Educação Ciência e Cultura (Unesco) conjunto de medidas para coibir a destruição de patrimônio, em especial na Segunda Guerra Mundial. A Unesco criada em 1945 já em 1954, reunida em Haia/Holanda, propugna a Convenção sobre a proteção dos bens culturais em caso de conflito armado, um forte clamor para deslocar o patrimônio das questões bélicas e territoriais, apontando para o valor humanístico, de modo a entendê-lo como bem cultural da humanidade, logo, fora de disputas. Reconhece-se nos pressupostos o desastre diante do incremento da técnica militar, o caráter unificador dos humanos e a necessidade de estender uma proteção internacional para assegurar a permanência para distintos patrimônios. Define-se no Artigo 1º. de forma direta tal conceito ao estabelecer o que se considera um bem cultural: “Os bens móveis ou imóveis que sejam importantes para o patrimônio cultural dos povos”.

Ressaltem-se nesse quadro as motivações lúcidas da USP para acolher o patrimônio, com base em pesquisas pioneiras na área. Entre estas cito a dirigida pelo arquiteto e historiador, Luís Saia identificando se tratar do Engenho São Jorge dos Erasmos, na qualidade de diretor da 4ª. Divisão do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, regional paulista. Note-se que desde a atuação do poeta, escritor, crítico, musicista e professor modernista Mário de Andrade em São Paulo, já se elaborava uma série de medidas para a proteção dos bens culturais, organizando-se setores na esfera federal e das capitais, desde 1936. Uma importante reunião internacional realizada em 1931, na cidade de Atenas/ Grécia estimula tais realizações e conta com profissionais de diferentes áreas. O encontro promovido pelo Serviço Internacional de Museus, órgão da então denominada Sociedade das Nações dá origem a uma prática até a atualidade continuada, ou seja, após acalorados debates firmam-se princípios, doutrinas e compromissos visando posturas comuns no cotidiano dos bens herdados do passado, respeitando-se as

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peculiaridades, individualizadoras da variedade e da pluralidade cultural. A chamada Carta de Atenas dividida em sete partes mantém atualidade, em muitos aspectos, dentre tantos, aquele que demanda uma “conservação escrupulosa” no caso de ruínas (VI); a necessidade de preservação do entorno do bem (III); a cooperação intelectual entre várias disciplinas (VII a); a condenação do interesse privado sobrepujando-se sobre o da coletividade (II); e, particularmente, o papel decisivo do uso educacional para garantir o respeito e a proteção aos legados do passado e, assim, viabilizar uma preservação efetiva (VII, b). “(...) A melhor garantia de conservação de monumentos e obras de arte vem do respeito e do interesse dos próprios povos, considerando-se que esses sentimentos podem ser grandemente favorecidos por uma ação apropriada dos poderes públicos.” [Art.VII b.]

Em 1956 a Conferência Geral reafirma tais princípios, ao debater especificamente os temas correlatos à educação, à ciência e à cultura. Aprofunda ao chamar a atenção que o pretendido interesse pelo passado pressupõe “a participação de estudantes em determinadas pesquisas”, acrescentando a necessidade de difusão, organização de circuitos turísticos, exposições e conferências. Assim sinaliza que apenas experiências para um único público e passivas, pouco produziriam de efetivo para despertar um sentimento de pertencimento daquele bem para diferentes públicos.

Maria Regina da Cunha Rodrigues, orientada pelo diretor da unidade, o historiador Eurípedes Simões de Paula. Esta abalizava a identidade do antigo Engenho e de que fora palco de lutas de tantos povos, o que dava para a USP segurança na incorporação desse patrimônio como uma forma de conhecimento acerca do passado, como os livros e as pesquisas, um dos fundamentos do ensino. Outro marco significativo ocorre logo após o ato de tombamento dos Erasmos na esfera federal, em 1963. Decorridos quase dois anos, em 1964, durante o 2º. Congresso Internacional de Arquitetos e de Técnicos de Monumentos Históricos reunidos na cidade de Veneza/ Itália, reafirmam-se os princípios humanistas, já nas considerações inaugurais, bem como o dever dos órgãos públicos se envolverem com a guarda e a preservação de remanescentes significativos para se entender as origens e as posteriores etapas vivenciadas pelo humano, organizado em diferentes quadrantes, condições e sociedades.

Ao lado desses fatores, acrescente-se que já havia investigação da USP no âmbito da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências/ USP da pesquisadora

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Ações e transformações

“Monumentos históricos constituem testemunhos de uma civilização particular, de uma evolução significativa ou de um evento histórico.” Carta de Veneza, artigo 1º. 1964.

A Carta de Veneza/ 1964 confere atenção aos bens do passado e define o que então se entende por monumento histórico, relacionando-o à contribuição deste para interpretação dos processos culturais, das transformações e dos fatos históricos. Observe-se então que no caso das Ruínas estas podem compor a categoria de monumento histórico, englobando os três aspectos, como se verá. Aspecto muito significativo do documento se volta para a necessidade permanente de disponibilizar documentos, relatórios e pesquisas, publicando-se os resultados para sociabilizar metodologias e estimular investigações, uma das metas a que a USP não se furtou em todos estes anos. Entre as várias razões, no caso do Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos destaquem-se: os remanescentes ensejam recursos para o estabelecimento de povos europeus no território; marcam profunda transformação na vida cotidiana do antes estabelecido; tornaram-se palco de lutas e de saques, por piratas; abrigam vestígios arquitetônicos do antigo engenho; mantêm em seu entorno resíduos da Mata Atlântica, tão aviltada em

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nosso meio. Inicialmente o referido Engenho se implantou na Capitania de São Vicente e, como tal, ele guarda em suas entranhas evidências deploráveis de escravização humanas, focos estes decisivos para alteá-lo ao lugar de um sítio monumental, a ser preservado, um marco contra o olvido. A Carta de Veneza aborda, igualmente de maneira inequívoca, outra questão relevante quanto ao aspecto material, em relação aos monumentos como as Ruínas e que se tem procurado levar adiante. Assim inúmeras gestões vêm tomando “medidas necessárias à conservação e à proteção permanente dos elementos arquitetônicos e dos objetos localizados” (Artigo 15) com sistemática visita aos fragmentos localizados e monitoramento do entorno, não sem conflitos e dificuldade de acesso. Acrescentem-se, entre as intervenções, desde a consolidação das encostas até a efetivação da primeira parte da Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária. Note-se que a criação de um organismo específico para proteção dos monumentos e sítios no âmbito internacional ocorreu na seqüência da elaboração


da Carta de Veneza, ou seja, em 1965. Em Veneza se reafirma a importância de organismos internacionais trabalharem conjuntamente gerando o International Council of Monuments and Sites (Icomos). Consolida-se esta tendência como reza o Estatuto inaugural do órgão, chamando a atenção de que visa “promover a conservação, a proteção, a utilização e a valorização dos monumentos, conjuntos e sítios”. No caso das Ruínas Engenho São Jorge dos

Erasmos inúmeras áreas de conhecimento vêm emprestado o melhor dos empenhos para vivificar o bem, sem esquecer os lados sombrios de que o bem foi testemunha. Sublinho que este esforço se volta para acolher todo e qualquer visitante e interpretação do monumento, contudo sem jamais escamotear as múltiplas significações culturais. Ao contrário, se simplesmente se restaurasse o antigo engenho, este seria condenado a se reduzir a parque temático, esvaziando-o das espessas camadas formadas por lutas de tantas vidas, ali sentenciadas.

Desenho de Maria Cecília França Lourenço

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Preferiu-se no quesito utilização abrir para todas as faixas etárias, as diversas camadas sociais e as múltiplas áreas e, para tanto, a USP programou projetos específicos para criação conjunta de inúmeros valores e significados. Estes estão voltados para a construção, a conservação, a proteção e a ampliação de saberes; também se luta para respeitar a comunicação com distintos públicos sobre vários temas como as características físicas, as expressões culturais e os valores imateriais acu-

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mulados por mais de 470 anos de permanência do bem cultural e de parte do ambiente, por esforço de gerações de seres humanos. Os significados simbólicos acumulados nesta longa duração histórica consolidaram-se na atualidade em distintos vetores. Alguns de valor universal, como repúdio à escravização do humano, responsável por um verdadeiro holocausto de índios e de negros. Igualmente a permanência tem ensejado a


ampliação da dimensão social, procurando trocas e respostas. Entre estas uma se impõe, gerando um grupo que se reúne sistematicamente e reivindica a criação de uma Unidade de Preservação Ambiental (UPA) no anfiteatro ao fundo das ruínas, procurando barrar a disseminação de áreas particulares de lazer e questionar: por que somente alguns se beneficiam do entorno e em caráter privado? Outro aspecto das Ruínas versa sobre a utilização e fruição natural, aliadas a algumas tradições culturais, um convite para se meditar sobre os acertos e muitos erros do humano na Terra. Vale musealizar o cemitério encontrado e veiculado nos na década de 1940? A cultura voltada à exposição de cadáveres se associa às práticas desejáveis? Novos valores também estão neste cenário na atualidade e em vários cantos do mundo, como as paisagens naturais e culturais e as perspectivas para se incentivar a ecologia e a biodiversidade, vetores estes fortemente assinalados na chamada Carta de Turismo/Icomos/1976.

Não obstante outro valor significativo se avoluma, também impregnado de interesses e de conflitos: os programas no Monumento não podem mascarar os desvios irradiados, desde as Ruínas. Afinal precisam se manter como um exemplo dos descaminhos do humano, quando se move por interesse de apenas alguns – não para muitos; quando se vale de estratégias para massacrar seres em situação de alteridade, pois não se pode imaginar que seria possível conduta similar com irmãos ou pares, sendo a educação de diversas faixas etárias essencial para construir tal diversidade, em conjunto. A Declaração do México, gerada em 1985, evidencia como a educação e as culturas contribuem na atualidade para rever um universo monóculo e corporativo, liberando o indivíduo para uma sociabilidade mais aprofundada. Assim se expressa: “O mundo tem sofrido profundas transformações nos últimos anos. Os avanços da ciência e da técnica têm modificado o lugar do homem no mundo e a natureza de suas relações sociais. A educação

A par desses valores coexiste o de cunho internacional, se considerar que aqui aportaram, além dos portugueses, comerciantes da Antuérpia flamenga, italianos como feitores do engenho, piratas de várias nacionalidades em busca do chamado ouro branco, o açúcar. Acrescentem-se a importância nacional, porquanto se constitui em último remanescente entre os engenhos mandados erigir pelo dono da Capitania de São Vicente, Martim Afonso de Sousa, quando de sua estada entre nós. De outra parte há valores regionais, para toda a Baixada Santista, acumulando lembranças e todo o imaginário daqueles muros, que agora se alçaram a categoria de programas e portões abertos.

e a cultura, cujo significado e o alcance têm se ampliado consideravelmente são essenciais para um verdadeiro desenvolvimento do indivíduo e da sociedade.” [Declaração do México. 1985.]

Os projetos interpretativos por viés educacional procuram proporcionar análise crítica incluindo diferentes tradições culturais, ao mesmo tempo, em que se têm buscado fontes e revisões relativas ao passado que o bem encerra, mas também, direcionando-se para a realidade atual. Os Programas vêm sendo traçados pela USP tendo como marco postular a presença de uma diversidade cultural plural, na vizinhança alargada, do bairro e da região, com quem tem procurado trocar saberes

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e fazeres, sem esquecer as minorias culturais ou os grupos desprotegidos, presentes na região, outra constante nas cartas desde 1976. Com muito empenho, lutamos para criar diferentes programas, focados para as singularidades dos vários segmentos, desde os pioneiros Vou Volto e o Programa Portas Abertas iniciado no Verão de 2005, que se procura fazer um balanço nesta edição. Cabe reiterar que ao se concluir a construção da Base Avançada, o direcionamento do público em datas e horários não mais será necessário, ficando aberto sem nenhuma interrupção, entretanto permanecendo os vários projetos, sempre avaliados e renovados, como exige a educação. O Programa Portas Abertas permanece como uma plataforma experimental e renovada a cada uma das edições ocorrida nas férias, tanto de meio de ano, quanto no verão. A característica da Baixada Santista como uma região turística tem originado uma série de aprendizagens com público em geral e com segmentos específicos. Isto se deve ao fato de que há sensível aumento de população nesse período, diferenciando o público habitual. Planejamos depoimentos, saraus, festivais e atividades, estando nossa equipe sempre aberta ao diálogo. Acrescentem-se outros programas que se voltam para traços diversificados de fruidores, a citar o Fim de semana temático; mas também ao público especializado, nacional e internacional (UPA e Plataforma Sophia) e particularmente com projetos educacionais para estudantes nos mais diversos níveis. Estes compreendem: Nível Superior (Laboratório de Memórias e Território/

transformação); Nível Pré-Escola/ Fundamental e demais: (Vou Volto e I-Papo) Nível Técnico: (Engrenagem); Educação de Jovens e Adultos: (Eleja). Finalmente temos efetivado uma série de estudos editados sobre todos os esforços em torno do bem, agregando várias áreas e publicações. Marco exponencial tem sido aprender e intercambiar com associações, grupos, autoridades públicas e, especialmente, com o pessoal ligado ao patrimônio e com os educadores da Secretaria da Educação de Santos e de São Vicente, num total de dez, sendo dois concursados pela USP. Estes últimos vêm criando novos programas e atendem ao público de domingo a domingo, de janeiro a janeiro. A finalidade ímpar dos programas reside em dar curso ao esforço hercúleo e coletivo de gerações para interpretar de forma crítica o bem, assim de fato preservando-o e ampliando sentimentos e valores. Deseja-se que no futuro as próximas gerações sigam com o repto de disponibilizar o patrimônio para seus filhos e para os demais. A relação com o passado poderá ajudá-las a viver com muita dignidade e generosidade, longe do universo de senhores e servos. Como propugna a Carta Nara/ Japão, 1994/ Internacional Council of Monuments (ICOMOS) há um grande desafio para os bens culturais para que – “a herança cultural de cada um se perpetue como patrimônio cultural de todos”. Ciça, Verão de 2008.

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III. Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos 50 anos

de administração

USP

por Rodrigo Christofoletti

De Portas Abertas para a comunidade, o avanço e o saber “A celebração é o dínamo que acende as lembranças, Mas também é o lápis corretor das necessidades não cumpridas....” Eurípedes.

O Engenho São Jorge dos Erasmos é, provavelmente, um dos três primeiros engenhos erigidos em solo brasileiro ainda no século XVI, na então Capitania de São Vicente. Sua construção remonta à expedição de Martim Afonso de Souza, de 1532 e à fundação do primeiro núcleo de ocupação portuguesa. De início denominado engenho do Governador, foi provavelmente construído em 1534. Depois, recebeu o nome de engenho dos Erasmos, ao ser adquirido pelo comerciante flamengo Erasmos Schetz, da Antuérpia. Mais de quatro séculos depois, em 1943, os terrenos onde se encontram as Ruínas foram adquiridos por Otávio Ribeiro de Araújo, que loteou a propriedade e doou o Engenho São Jorge dos Erasmos à USP em 1958. Portanto, há cinqüenta anos teve início, por ação da pesquisadora Maria Regina da Cunha Rodrigues (pioneira nos estudos sobre o engenho), a participação da Universidade de São Paulo na história das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, pas-

sando pela autenticação do bem histórico ao arquiteto Luís Saia (diretor do distrito paulista do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) que, em documento público datado de 26 de fevereiro de 1958, manifestou-se por um agenciamento adequado do bem, com o objetivo de – “consolidação e valorização das ruínas”. Nestas cinco décadas muitas ações foram empreendidas, objetivando sua preservação e seu uso como elemento de ensino e pesquisa. Professores e pesquisadores estiveram envolvidos com a questão, no âmbito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – órgão que administrava o bem anteriormente. Em consonância, as questões relativas às Ruínas também tiveram o apoio direto da PróReitoria de Cultura e Extensão Universitária, entidade agora responsável por sua guarda. Gerações de pesquisadores, alunos e docentes da Universidade de São Paulo têm contribu-

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ído para suspender o silenciamento, redigindo pareceres, ofícios, recomendações, trabalhos acadêmicos sobre a região e o próprio Engenho, textos para seminários, escavações arqueológicas, pesquisas em fontes primárias, levantamento bibliográfico e solicitações para garantir a integridade do bem, ao lado da existência de convênios, comissões e ações dispendiosas para sua consolidação. Assim, a USP fornece um paradigma relevante sobre a importância em debruçar-se sobre o passado, valendo-se de princípios, saberes e mérito para preservar a propriedade do bem cultural. A Universidade, então, associa-se à comunidade local de Santos e de São Vicente para trazer o que melhor faz – ensino, pesquisa e extensão à comunidade, convidando todos a uma troca de saberes e construção de significados, para consolidar a humanidade e solidariedade existente há muito no local. Reside neste complexo de ações a vontade política da USP em disseminar este lugar na condição de identitário, relacional e histórico, promovendo-se uma ação voltada para a memória.

De maneira bastante abrangente os resultados alcançados ao longo dos últimos quatro anos (2004-2008 – período de desenvolvimento dos programas educativos nas Ruínas) reproduziram a união de forças em prol de uma meta bastante significativa: tornar as Ruínas um local público de fruição, aprendizado e preservação, respeitando suas capacidades e colaborando para que os esquecimentos do passado não reproduzam mais a negligência, o abandono e a perda de identidade. De outro prisma, valoriza-se o longo caminho percorrido por figuras preocupadas em salvaguardar este bem, tal como seu desejo de verem brotar deste terreno sementes que resultassem em preservação e produção de conhecimentos.

Portanto, o ano de 2008 marca mais uma etapa deste processo dinâmico: o cinqüentenário da administração uspiana junto às Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, etapa em que o Monumento Nacional torna-se, enfim, um Órgão da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, decisão que representa reconhecimento do esforço coletivo empreendido por gerações de interessados em sociabilizar o bem cultural e os significados simbólicos acumulados.

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Abrindo as portas para uma Educação em movimento

“Eu fico aqui pensando... pensando... matutando...sobre esse negócio de aprender... porque não pode ser como pular, nadar, jogar, correr?” Reinações de Narizinho, Monteiro Lobato, 1959

Nos últimos quatro anos o Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos tem se notabilizado por ser um bem cultural diferenciado de seus congêneres, devido ao seu caráter eminentemente educacional. Os programas educacionais implementados pela equipe de educadores vêm solidificando a intenção primordial do Plano Gestor, que busca ampliar, divulgar e produzir conhecimento, de uma perspectiva coletiva. O ano de 2005 marcou definitivamente a vocação das Ruínas como campo aberto para as interpretações interdisciplinares e consolidou a sua presença no conjunto dos mais atuantes e conscientes domínios públicos voltados para a educação formal/não formal do estado de São Paulo. Os esforços da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária somados às incansáveis buscas por melhorias levadas a cabo pelo Conselho Curador nos últimos quatro anos, estimularam a equipe de educadores a executar programas que buscassem, antes de tudo, uma concepção educacional libertária, emancipadora e constante, em que o espaço, o patrimônio e o visitante fizessem parte

de um mesmo organismo: o da educação como troca, como partilha. Educação faz-se em movimento, e no gerúndio, como bem nos lembra o educador Paulo Freire, para quem a forma indicativa no fazer educação está fadada a reproduzir uma educação bancária, hermética e não libertadora, pois já nasce pronta, pré-fabricada. Fazer educação no gerúndio significa aprender com a continuidade, superar os eventuais percalços que possam existir, e mais que isso, crescer com as diferenças, pelo simples fato de justamente o diferente possibilitar no indivíduo a identificação. Os projetos educacionais implementados nas Ruínas seguem fiel e convictamente esta compreensão de que educação só se faz no gerúndio: construindo, partilhando, somando, dividindo responsabilidades, buscando dimensionar as potencialidades, capacidades e habilidades de cada educando. Nenhuma transformação real se efetiva por alquimia, por toque de mágica. Por isso essa mudança só é possível mediante o movimento, a ação efe-

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tiva, pois a educação em que acreditamos é uma construção coletiva, pela ação do coletivo e para o coletivo. Cada qual com suas funções, seus espaços de atuação definidos. As Ruínas cumprem bem este papel de espaço plural das coletividades, de suas construções e transformações. A transformação de uma criança que, ao vislumbrar pela primeira vez o espaço das Ruínas, imagina estar diante apenas de pedras amorfas e sem vida. Ao final da visita, porém, modifica suas interpretações por verificar, se estimulada em sua criatividade, que tais pedras falam, contam histórias, explicam fatos, agitam curiosidades e nos deixam ainda mais dúvidas do que antes de conhecê-las.

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É desta modificação que nos aproximamos, protagonizada pelo visitante enquanto vê, sente, e muda sua maneira de perceber o entorno. A educação em movimento se faz pelo gerúndio, mas deve concordar com a forma que for possível: só não pode ser pretérita (passada, esquecida no toque do tempo), pois senão não é educação, é saudade. Neste sentido, entre os milhares de visitantes nestes quatro anos de trabalho, muitos dos participantes de nossas visitas reflexivas¹ voltaram a visitar as Ruínas ao menos mais uma vez nos fins de semana, e mesmo nos períodos de férias confirmando a premissa de que a pessoa termina por apropriar-se de determinado espaço ao qual se sente pertencente.

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A Base Avançada de Cultura e Extensão abre as portas para o futuro das Ruínas “A vida pode mudar a arquitetura. No dia em que o mundo for mais justo, ela será mais simples.” Oscar Niemeyer

“Eu uso o simples, justamente porque sei que é a forma mais justa de se juntar, utilidade, beleza e função.” Julio R. Katinsky

Nascida de um desejo acalantado há mais de 10 anos, fruto de esforços solidificados ao longo das últimas gestões da Pró–Reitoria de Cultura e Extensão Universitária e do Conselho Universitário do patrimônio, a primeira fase de construção desta Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária encontra-se praticamente terminada. A proposição de um projeto arquitetônico pelo Prof. Júlio Roberto Katinsky, que não competisse com as Ruínas estabelecidas com grandiosidade e exuberância (características da arquitetura militar colonial) foi o ponto de partida para a criação desta Base Avançada, num patamar mais baixo que as próprias Ruínas. Assim, dentro do prédio será sempre possível vislumbrar o conjunto histórico-arquitetônico, como um tributo a este espaço que fora, antes de tudo, terreno vivo de resistência e de construção dos alicerces do Brasil no universo do capital, admissão esta forjada a fogo e sangue pelos povos escravizados. Admirar as Ruínas do patamar da

Base Avançada é como contemplar uma acrópole: solo fértil para interpretações, imaginações e concretizações de desejos. Em contraposição, uma vez no patamar das Ruínas, admirar a construção da Base e sua absoluta integração com o sitio remanescente estimula esperanças de este local permanecer um espaço onde a construção e a preservação são mais que um binômio de propaganda: fazem parte de uma concepção de vida e trabalho que apenas a educação pode oferecer. Da altivez do vidro que não censura nada, do aconchego do auditório e da perspectiva animadora do conjunto restante da obra que ainda está por ser realizado² surgem a certeza de que o Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos é hoje, de maneira definitiva, um espaço de construção e partilha de conhecimentos para a comunidade (função fundamental da extensão), sobretudo a população adjacente, habitantes de uma localidade periférica e por isso pouco assistida.

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Desenho de Julio Roberto Katinsky

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O desejo acalantado por anos apresenta-se agora como realidade. A construção da Base Avançada representa o primeiro passo rumo a eternização das histórias e vidas vinculadas a este espaço. Sonhos, pranchetas e tijolos que darão, a partir de então, concretude a uma aspiração coletiva: a preservação deste espaço é, hoje, mais realidade do que promessa. O ano de 2008 marca esta transformação. A infra-estrutura alcançada com a Base Avançada facilitará o atendimento dos visitantes, a criação de programas educacionais mais bem instrumentalizados e, principalmente, estabelecerá por definitivo a presença da Universidade de São Paulo como parceira efetiva e afetiva da construção de uma educação mais próxima e presente, mais democrática e menos excludente, numa das regiões mais povoadas e menos assistidas econômica e culturalmente da Baixada Santista. Assim, a docência, a pesquisa e a extensão encontram terreno fértil e promissor para sua prática na Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária do Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos.

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Usos de um espaço em construção

“Nesta Base eu busquei enterrar ao máximo o prédio, de maneira que as Ruínas não fossem prejudicadas por um obstáculo qualquer. A segunda coisa que eu me preocupei foi voltar interinamente o edifício para as Ruínas. Isso faz parte da educação das pessoas que freqüentam o prédio, pois eles sempre olharão para as ruínas. E, em terceiro lugar, evidentemente, pensei num mínimo de conforto para as pessoas.” Julio R. Katinsky, Premissas para a construção da Base Avançada.

O sentido de pertencimento a um grupo e simultaneamente a um local faz com que os seres humanos se tornem parte de uma identidade coletiva, que vivem e se transformam diante de um dado espaço. Este sentimento identitário é o que assegura na escala de valores de dada comunidade, os direitos e deveres sociais, a utilização, a fruição e a preservação plenas de certos espaços que se tornam públicos, dada a sua natureza intrínseca. As cidades são palcos de reprodução das relações humanas, que ocorrem ora nos seus espaços construídos (habitações, indústrias, hospitais), ora nos espaços livres (parques, praças, bens culturais os mais diversos, ruínas). Nesse sentido, certos lugares recebem e incentivam o exercício da vivência social e servem de suporte ao exercício da cidadania, enquanto espaços públicos, pois contam com uma expressiva acessibilidade e acolhem simultânea e passivamente os mais variados usuários e as mais diversas formas de uso, seja na sua função educativa (de onde se desdobra a noção de cidadeescola, bem-escola etc), seja na sua possibilidade lúdica de existir.

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Desde os gregos a valorização do locus público sobre o privado, têm demonstrado ser uma perspectiva acertada no sentido de reverter injustiças sociais, com relação à fruição de cultura e cidadania, modo coletivo de qualificação e mobilidade social que postula trocas simétricas entre os cidadãos. A criação da Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária da USP, junto ao Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, sinaliza o desejo acalantado por gerações de estudiosos deste bem cultural no sentido de criar os parâmetros para sua utilização. O usufruto coletivo e democrático objetivando a construção de um novo paradigma que fuja do existente e reiterado modelo de exclusão e privilégio de uns em detrimento de outros. Desta forma, entendemos o espaço público como o principal local de reprodução da vida coletiva e social, que age com seu caráter transformador e igualitário. Objetivou-se, em um primeiro momento, a construção de um auditório de múltiplas utilidades, que pudesse servir de locus para as mais diversificadas

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Ao contrário da práxis daqueles partidários do saber centralizado, mantidos por gerações em algumas instituições de reconhecimento renomado, a equipe do Monumento Nacional Ruína Engenho São Jorge dos Erasmos, assessorada pela Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, vem buscando reverter a consciência de que o conhecimento de qualidade é algo restrito aqueles de melhor condição sócio-econômica. Visando mudar o foco desta realidade tão nociva à construção de um país menos desigual, a Base Avançada se mostra como uma possibilidade viável de democratização, alocada para servir com qualidade, todo visitante destas Ruínas. Para tanto, a construção do auditório climatizado, dotado com mais de sessenta assentos, e as posteriores entregas do bloco educativo, em que estarão disponíveis salas de aula, uma reserva técnica cuidadosamente pensada para guardar a riqueza da cultura material retirada do solo das Ruínas, bem como uma biblioteca pública de funcionamento ininterrupto, laureiam este projeto que tem a assinatura de uma arquitetura socialmente comprometida: atividades, estando à disposição de toda a comunidade, próxima ou distante do bem, sem distinção. Assim, a comunidade envoltória ao Monumento, tanto quanto a comunidade uspiana, ou de outras instituições, ou até mesmo o visitante comum, encontra neste espaço público de construção, produção e divulgação de saberes, uma oportunidade de vivenciar o que é premissa básica em todos os programas educativos aqui em desenvolvimento: o conhecimento se faz no e para o coletivo, respeitando a individualidade como essência primeira desta ação.

“(...) busco proporcionar um espaço em que muitos possam usufruir do mesmo: alimentando de cultura, conhecimento e lazer a vida daquele que jamais disporia de um espaço destes, não fosse uma iniciativa como a da Base Avançada”. [Julio R. Katinsky. Depoimento. Portas Abertas, verão 2006].

Levando-se em consideração que se trata de uma das regiões da Baixada Santista, menos assistidas econômica e socialmente, dada sua característica geograficamente periférica, a Zona Noroeste, região

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em que se situam as Ruínas, terá a possibilidade de usufruir de um centro coletivo de cultura, lazer e aprendizado. A população em geral (vinculadas ou não a uma instituição de ensino) ganha, com a entrega da Base Avançada, um consistente apoio na produção de ações afirmativas de caráter educacional.

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O depoimento como sustentáculo da memória: ruínas que se reagrupam peça por peça “Muitas vezes, de diversas maneiras, a relação entre o depoente e o pesquisador acaba se plasmando, variando entre uma aproximação amigável ou uma desconfiança mútua. Mas é a interpretação do registro e não o próprio registro que auferirá ao depoimento bases sólidas de análise.” Maurice Halbwachs

O manejo das evidências orais vem sendo amplamente utilizado e discutido em diversas publicações. Como seu estatuto ainda está em elaboração, tais trabalhos envolvem, muitas vezes, posições diferentes e até antagônicas sobre a natureza das evidências orais e sobre as diversas formas e possibilidades de seu uso na pesquisa histórica. Dentre os tipos de entrevista empregados pela metodologia3 das evidências orais – termo que suscita problemáticas quanto a sua interpretação–, dois merecem destaque: a entrevista temática e a de história de vida. Nesta oportunidade, objetivou-se a interseção de ambos os tipos, embora atribuindo maior relevo ao trabalho temático por se entender que a oralidade e a memória trabalham tanto na dimensão individual quanto na coletiva4. Por isso, aqui o entendimento baseia-se nos escritos de Maurice Halbwachs, para quem a memória coletiva é “um conjunto de lembranças ativadas pelo filtro do presente, e que por isso passam a constituir um patrimônio que, vivenciado por um grupo de pessoas, revitaliza-se e atualiza-se no momento de cada rememoração”5. Não se trata,

portanto, de rever o passado pura e simplesmente, mas de verificar como este foi apreendido a partir do presente. Na direção deste enunciado, outro debate aparece com importância análoga: o que aproxima as relações entre memória e história, tendo informado os historiadores sobre o aprofundamento e a pluralidade com que estas categorias de analise têm sido construídas. A atualidade do que se denomina “discursos memoriais”, por conseguinte, sinaliza a discussão sobre a densidade desta homilia e o entendimento dos porquês tais discursos memoriais voltaram a ser temas centrais nas discussões das ciências humanas. Neste sentido, a dinâmica do produtor de memórias diante desta profusão de memorialismos recuperados (sobretudo nestes últimos 50 anos) corrobora a idéia de que nunca antes a memória foi tão historicizada e a história se memorializou tanto. No bojo das discussões sobre a perenidade ou a efemeridade da memória a discussão sobre a sua

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relevância e papel nos dia atuais sinaliza a escolha, por parte considerável de historiadores, de eleger como foco de suas preocupações não mais os silenciamentos, mas seus registros; o ato repetido de rememorá-los, entendê-los, à luz de uma dada historicidade “(...) o que redundou num desdobramento das memórias subterrâneas, lembranças dissidentes, lembranças proibidas, memórias enquadradas, memórias silenciadas, mas não esquecidas.” [Seixas, apud Pollack, 115, 1989].

Assim, os chamados lugares da memória nascem e vivem do sentimento que não há memória espontânea, e que por isso torna-se urgente criar arquivos, manter aniversários, organizar celebrações, justamente porque estas operações não são naturais. É, portanto, a defesa de uma memória preservada que buscamos fazer nesta publicação. Pois, como afirma o historiador francês, Pierre Nora, “sem vigilância comemorativa, a história depressa varreria as lembranças”. São eles, os lugares da memória, portanto, bastiões sobre os quais se escora toda a escolha do lembrar. (...) Estes lugares de memória são antes de tudo, o que secreta,

Concomitantemente a esta proposta de se entender o passado para se conceber o presente, o ensaio de Marc Augé (1994) sobre os lugares antropológicos nos parece complementar. Os lugares antropológicos (tal como os lugares de memória) permitiriam, então, uma experiência inusitada: as pessoas se sentiriam solidárias exatamente na medida em que cada uma delas vivencia um acontecimento gerado a partir de uma dada troca seja esta simbólico-emocional, mnemônico-histórica ou simplesmente relacional. Esta reflexão remete conseqüentemente para a definição de como é construído este “lugar” e como é apropriado pelos indivíduos e grupos que o compõem, segundo o significado social que os indivíduos lhe conferem. Os lugares antropológicos são, portanto construídos a partir da junção entre os olhares e vivências plurais e as relações sociais decorrentes destas percepções. Assim, à medida que vão sendo descortinadas tais relações sociais, as redes de comunicações, de associativismos, de conflitos, de experiências entrelaçadas conferem um estatuto mais claro ao lugar antropológico. Posto que, lugares e memórias fazem parte de uma mesma engrenagem:

veste , estabelece (...) pela vontade uma coletividade fundamentalmente envolvida em sua transformação e renovação. Valorizando,

“existem nos atos, nas comemorações, nos artefatos mais variados,

por natureza, mais o novo que o antigo, o jovem que o velho, o

é preciso reconhecê-los também em seu próprio movimento, sem-

futuro que o passado. Assim, museus, arquivos, cemitérios, festas,

pre descontínuo e atual (...)” [Augé, p.52].

aniversários, tratados, celebrações são os marcos testemunhais de uma outra era... são elas, sacralizações passageiras numa sociedade que dessacraliza, e nivela, sinais de reconhecimento e de pertencimento de grupos numa sociedade que só tende a reconhecer indivíduos iguais e idênticos (...). [Nora, p.13].

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Lugares de memória e lugares antropológicos: categorias interessantes no entendimento da dinâmica celebrativa de um dado grupo que divide noções e visões de mundo bastante comuns. A constante evolução desta memória incentivou a ação da ana-

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mnese (ato proposital de rememorar) por parte dos agentes sociais em questão, pessoas que afetiva ou intuitivamente tiveram suas vidas entrelaçadas por eventos relacionados à estas Ruínas. Do ponto de vista do tratamento das informações conseguidas com os depoimentos gravados para o Programa Portas Abertas, em todas as suas edições, cabe ressaltar que estes foram todos transcritos, encontrando-se parte destes editados nesta publicação. Com o intuito de lançar luz às discussões dos que estiveram presentes, descreveremos ao longo desta publicação cinco destes depoimentos. Neste sentido, a eficácia dos mecanismos de representação da imagem das Ruínas pode ser mais bem verificada utilizando a metodologia das evidências orais. Aqui, estas evidências serão utilizadas como registro das percepções dos agentes sociais em questão, pessoas que de alguma maneira participaram ativamente da construção desta nova fase, no que tange às obras e aos projetos educacionais das Ruínas Engenho. Assim, por possibilitar o acesso ao universo das experiências vividas, tal fonte busca ser um recurso valioso para a discussão da recepção e interiorização das idéias sobre este importante bem cultural.

e plurais. A ação docente num espaço como o das Ruínas, a intervenção arquitetônica e política e o olhar literário refletindo as nuances destes últimos cinco séculos de história. Cinco experiências bastante diferentes, mas complementares. Memórias que sinalizam como profissionais de universos tão variados vêem a educação e a preservação nas Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos. O lado do empreendimento, da consciência política, da militância do magistério e do olhar artístico em dimensões que apenas o depoimento é capaz de congregar. Nesta edição, pegadas e pistas em busca de um entendimento: o que são as Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos? Pontos de vista que se complementam e se divergem, numa mistura que faz das Ruínas Engenho um lugar de memória e de ação histórica por natureza.

Portanto, transcrevemos partes editadas de depoimentos que ajudaram a construir etapas significativas do Programa Portas Abertas. Os depoentes: um professor universitário, idealizador do projeto da Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária; um arquiteto representante da Prefeitura Municipal; um poeta/escritor; uma engenheira e professora universitária e uma professora do ensino fundamental de uma escola paulistana. Os temas: convergentes

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Prof. Dr. Julio Roberto Katinsky

“(...) nós nos relacionamos com o passado esperando aprender alguma coisa com o futuro e o presente... e eu acho que isso continua sendo verdadeiro (...) isso porque acredito fielmente que cultura não se faz com 10 merréis... há de garantir a cultura, mas com muito dinheiro... o dinheiro que falo é a manutenção disso(...) é a preservação disso” Julio R. Katinsky

É com grande satisfação que recebemos vocês aqui, hoje, inaugurando o programa Portas Abertas de julho de 2006. Alguns de vocês já conhecem o Engenho, outras pessoas trabalham conosco aqui, outros ainda estão aqui pela primeira vez, e para nós é tremendamente satisfatório, pois esta é a primeira vez que estamos tendo um evento como este. Embora o projeto já exista há três edições, é a primeira vez que relatarei minha experiência profissional e afetiva com o Engenho, de maneira que, é uma honra recebê-los para dividirmos este momento que é sem dúvida, de virada de páginas nos projetos e eventos elaborados por esta equipe. Para nós que militamos pela preservação e a educação é sempre muito prazeroso aprender cada vez mais com as histórias que vivenciamos. Sobretudo, porque nos ensinam cada vez mais a olharmos para este espaço com questões diferentes, olhares diversos. Então, é com entusiasmo que aceitei a esta “convocação”, honrosamente! Eu vejo isso mesmo: quando fui convidado pela gestora para vir falar com vocês eu fiquei pensando o que seria interessante conversar. Uma série de coisas vocês já sabem: isso aqui é monumento nacional. Isto não é um monumento da cidade de Santos. Eu considero até um pouco mais: é um monumento internacional, da humanidade. Por quê? Porque com a instalação do império português nesta área se inicia um capítulo novo da história da humanidade, qual seja: este que todos “metem o pau”, mas que dependem dele para tudo: o surgimento do capitalismo moderno. Isso aqui está ligado com este fenômeno: o surgimento desse capitalismo. Isso porque nenhum português que tivesse um pouco de bom senso sairia de lá para vir para cá. Então para vir para este território a Coroa imaginou que precisaria de portugueses aqui para garantir a posse da terra. E precisava haver um grande incentivo para que eles viessem. E tudo isso, a despeito de Portugal estar numa decadência imensa desde 1530. Então, Portugal quando começa ocupar esse território, já pensa em jogar nas costas da população a conservação do império. Como fazer isso? Dando incentivos para que eles viessem aqui: um deles, a indústria de açúcar, mas por quê? Porque a in-

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dústria de açúcar era uma espécie de monopólio de portugueses e espanhóis, pois em contato com o mundo árabe, eles passaram a aprender a fazer açúcar. O modo ibérico de produzir açúcar já era manufatureiro, com grandes instalações, em oposição ao modo corporativo de produzir bens, mais comuns nas cidades européias da época e com uma produção muito reduzida. O resto da Europa não! Além disso, a cana de açúcar é uma planta que só se dá bem em um tipo de território: como este de São Vicente, por exemplo. Agora, note! Não se trata de terra apenas! A terra não tem tanta importância, senão (veja, um homem ganhou o premio Nobel por causa disso) a cana, por incrível que pareça, usa pouco da terra. Ela não precisa de uma terra fértil, precisa de água, muita água e carbono, porque a sacarose é um produto orgânico: então é uma fórmula de carbono, hidrogênio e oxigênio. Tudo isso está no ar. Carbono está no ar, inclusive nosso problema agora é tirar o carbono no ar, nós temos que capturar toneladas e mais toneladas de carbono que foram soltos pela combustão da gasolina. Naquele tempo, evidentemente, havia menos carbono no ar, mas também era bem carregado de carbono. O nordeste, por exemplo, nunca botou um real em adubo nos terrenos e eles produzem o açúcar há 500 anos. Por causa disto, o que se precisa é água, e em abundância. E isso nós temos. Vejam: nessa região chove quase tanto no inverno quanto no verão, e no verão chove mais do que na Amazônia, essa região toda do litoral que começa aqui em Iguape e vai até Campos no Rio de Janeiro, onde também é uma região que produz açúcar: toda ela recebe muita chuva. Aqui há muito carbono. Então foi muito fácil instalar a indústria do açúcar aqui. Portanto, ele passa a ter importância internacional, tanto que a maioria da documentação sobre este engenho não está no Brasil. Os documentos mais importantes estão na Bélgica, principalmente lá, isso porque é a terra dos últimos grandes donos deste engenho. Porque o Martim Afonso era um “personagem controvertido”. Ele veio aqui e era amigo de infância do rei, mas, quando ele viu que aqui teria que suar a camisa para produzir riqueza, ele se mandou, se foi para as Índias, onde o dinheiro era garantido, numa civilização enorme e um mercado estabelecido. Portanto, deixou tudo nas mãos de administradores no Brasil, os loco tenentes. Porque o império português, já em 1540, começa um processo de decadência, corrupção. Veja: o que percebemos hoje no Brasil, lá já havia. Então, nós temos uma tremenda tradição não é! (risos) Mas, isso aqui, até certo ponto, como tudo no império português, ficou meio abandonado, tanto que ainda no século XVI este engenho (não este prédio), mas o original, que foi trazido pelo Martim Afonso, por uns holandeses, na verdade não são holandeses, flamencos (falam um dialeto quase holandês, ligados à Igreja Católica) compraram este engenho. Uma família que se chamava Schetz e havia um monte de pessoas com o nome de Erasmus, então o engenho ficou conhecido como Engenho São Jorge dos Eramos, Schetz. Por isso que os documentos mais importantes deste engenho estão lá nos arquivos belgas. Nós estamos agora com a atual gestora fazendo um grande esforço para recuperar estes documentos para nós.

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Mas o que eu queria falar para vocês é uma coisa diferente: queria dizer como esta coisa está presente no nosso dia a dia. Vocês estão aqui presentes nas Ruínas, que afinal de contas, são únicas no Brasil. Do século XVI nada mais há, então, isso é interessante: como aconteceu isso? Bom, isso ficou abandonado, depois que os Schetz também perceberam que haviam caído no “conto do vigário”, estes passaram isso para frente, e assim, vem desde o século XVI ou XVII. Este engenho passou por muitas mãos e também, não entendi ainda porque, mas a indústria de açúcar não prosperou nesta região, apesar desta manter os primeiros engenhos de açúcar do Brasil. A maioria só guarda uma meia dúzia de pedrinha, é o que restou deles, mas, eles foram instalados na ilha de Santos, e não prosperaram. Então, o que eu queria dizer para vocês é sobre outra aventura maravilhosa que não tem nada a ver com exploração da indústria do início do capitalismo moderno, porque esse lugar já foi feito para a produção visando o mercado. Ninguém iria produzir açúcar para consumo interno, só para a Europa. Já haviam feito isso nas ilhas atlânticas, tanto os portugueses, quanto os espanhóis e isso é bonito também. Uma história da chegada dos portugueses nos arquipélagos das Canárias – pelos espanhóis – e da Ilha da Madeira – pelos portugueses, isso no comecinho do século do XV. Foram os primeiros navegadores que enfrentaram o oceano. A coisa que eu mais gostei foi ter me envolvido com o Engenho dos Erasmos. Durante muito tempo, não por vontade minha (eu fui empurrado para isso aqui), mas, porque isso é o produto da idéia de se fazer uma universidade aberta para todos, acabei vindo parar neste belo empreendimento. Por que quem descobriu essas ruínas foi uma colega, só que há muitos anos atrás. E ela se apaixonou por essas ruínas e afirmava na época que eram mesmo do Engenho São Jorge dos Erasmos, do século XVI. Ficou “torrando a paciência” dos professores dela lá na USP e dos alunos da FAU, porque engenho é coisa para arquiteto, lá nos idos de 1950 e poucos. Então, ela ia lá, nós éramos estudantes de arquitetura e dizíamos assim: “olha lá vem a Rodrigues, a Maria Rodrigues, de novo com a história do engenho ”e todo mundo desaparecia do grêmio, fugia porque ela ia lá pedir a ajuda da gente para salvar este engenho... tamanha era sua insistência. E ela conseguiu uma coisa maravilhosa: que a família que era proprietária desta região, que por sinal, tinha um professor lá na universidade, doasse um pedacinho de terra para a USP, salvando isso aqui...então, doou-se uma parcela pequena (3mil m2) dentro dessa gleba imensa que era tudo floresta. Então, a USP através de seus mais ilustres professores, pesquisadores e cientistas, como o Sérgio Buarque de Holanda, o historiador que escreveu Raízes do Brasil, ele e o Eurípides Simões de Paula se empenharam em salvar este lugar. Qual é a maneira de salvar um bem nacional? É pedindo o tombamento do lugar, pelo ainda Serviço de Proteção ao Patrimônio Artístico Nacional. E eles, pelo empenho e prestígio, acabaram trazendo o Luis Saia que era o engenheiro/arquiteto responsável

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por restaurar e preservar os bens culturais brasileiros, ao menos os primeiros, quais sejam: os prédios! De uma maneira geral, qual outro bem importante a não ser a arquitetura? Os documentos escritos. Mas isso nunca foi muito a preocupação do Brasil, não é... agora mesmo tem até os bens imateriais, mas isto é tema pra outra conversa... Mas, os prédios sim, há por isso falhas enormes na documentação do Brasil. E então transportem essa história para o Engenho. Quando vem para cá o Luis Saia e vê essas ruínas, ele resolve rearranjar algumas coisas aqui. Então, repensa a disposição dos pilares, nitidamente uns pilares que estão indicando que isso aqui foi uma construção de duas águas. Existem fotografias que mostram isso. Então, este pilarzão que já estava aí na época marca a efetiva intervenção. Mas, aí entra o problema da nossa ignorância e da pobreza de informações que dispomos, pois aquela parte lá tem documentação mas, outras partes não. Bom, então, diante disso o que aconteceu: esse pedacinho de terra foi doado para a Faculdade de Filosofia porque não acreditavam que o governo brasileiro tivesse competência para cuidar disso. E doaram para essa instituição, e logo depois, chamaram o Luis Saia, que verificou os pilares e resolveu uma coisa interessante: vocês olhem para cima e vejam que não há nenhuma tesoura (aliás, vocês sabem o que é tesoura?). É uma estrutura articulada que vence esses vãos, aqui não há isso e quando o Saia chegou aqui, provavelmente não havia esse telhado que olhamos agora.. tanto que a gente chama isso de telhado do Saia, porque o que tinha eram os sinais que havia um telhado, mas até onde ia? Ninguém sabe. Mas, verificou-se que o vão era muito grande e não tínhamos mais vigas tão grandes como na época do engenho, então, criou-se a solução da técnica, de não se usar isso aqui. Não se usava tesoura nas construções de trabalho, só nas edificações de igrejas, até hoje. Então, a tesoura era muito especial... as tesouras são até hoje (eu não sei o que vocês pensam, mas eu reputo) de grande qualidade arquitetônica. Senão vejamos: outra coisa é a gente pensar essas questões com os olhos de hoje, com a percepção de um arquiteto de hoje, e mesmo uma pessoa que trabalhasse com construção no século XVI. O arquiteto de 40 anos atrás não tinha a mesma preocupação de um arquiteto de hoje em dia. O homem daquela época abarcava a construção ao seu objetivo social. Então, a fortaleza não era para ser bonita, mas eficiente. Então a fortaleza servia ao que interessava. Vocês vejam essa construção aqui, quem trabalhava nela eram escravos, portanto, não se precisava de janelas ou outros adereços. Não havia nada. E quando o mesmo construtor chega na igreja: ah! Aqui tudo muda, pois Jesus Cristo ficaria (bom, uma boa parte de vocês é católica e sabe que a hóstia consagrada no seu interior precisa de um lugar para ela ficar, não é). Então, nem a residência do senhor de engenho teve tanta preocupação estética como a igreja, a não ser a partir do século XVIII. Mas, paralelamente a esta discussão andei pensando sobre algo que queria compartilhar com

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vocês: do ponto de vista da atuação profissional de um arquiteto eu vejo com muito bons olhos a intervenção da universidade, em um bem cultural como este. Mas não posso analisar isso de maneira genérica. Só posso analisá-la de acordo com minha experiência pessoal. O que acontece é que a minha geração além de ter se criado junto com a criação da Universidade São Paulo, a Faculdade de Arquitetura é fundada em 1948 e era uma segunda coisa dentro de uma visão universitária, diferenciada daquela antiga que reinava na antiga Escola de Belas Artes do modelo francês. Ela já se cria dentro de uma visão nova. E veja: esse prédio veio parar nas mãos da Universidade, Luis Saia que conseguiu com o Jânio Quadros, governador, o dinheiro para reconstruir este telhado andou intervindo numas coisas aí que a gente não tem certeza, mas também como a gente não sabia como era antes, fica no “talvez”, deixa como está. Mas, aí veio a ditadura, e ela foi uma tragédia. Porque ela destruiu coisa “pra burro” e atacou como toda a violência, ela atacou a inteligência, a universidade sofreu muito, setores inteiros da Medicina desapareceram e a faculdade de Arquitetura, Filosofia e toda a área de Sociologia foi dizimada. E isso evidentemente conduziu ao estancamento das preocupações em torno deste prédio. Veja: o intuito da época era sobreviver, não só fisicamente, mas fazer sobreviver todo um esforço de cultura que é tão difícil de se guardar. Porque se você derruba uma arvore de 500 anos, terá que esperar outros 500 para ter outra, mas no caso da cultura não. No plano da cultura era inda pior. E o que a ditadura fez aqui foi mais ou menos a mesma coisa. Quem começou a preservação no Brasil foram os arquitetos modernos. É paradoxal, mas é assim mesmo! Os arquitetos modernos tinham uma compreensão de que era preciso estudar cientificamente o edifício. Não sabiam fazer, mas tinham a preocupação e começam a fazer estudos mais rigorosos, a pedir para que os historiadores fizessem pesquisas, tais como as de Sérgio Buarque de Holanda que trabalhou sempre por conta dele, por prazer. Ele trabalhou com o patrimônio, e assim, essas ruínas foram avalizadas pelo Sérgio Buarque. Ele era consultado pelo Serviço do Patrimônio Histórico, Artístico Nacional sobre as obras, sobre o que valia a pena proteger. Infelizmente, cometeram erros, como todos nós, mas em geral correu tudo bem. E precisamos lembrar no que acertaram não no que erraram. De maneira que esta análise minha não pode ser genérica sem levar em consideração todos estes episódios. Mas, voltando ao Engenho, há ainda o forte apelo que a educação tem encontrado neste espaço. Retomando então, os projetos desenvolvidos aqui têm focos diferenciados, escolas de ensino fundamental são privilegiadas nos programas dos educadores, programas de visitas diferenciados dão o tom semana a semana. Há, portanto, uma legítima preocupação e uma efetiva presença dos professores que decidem o que abordar. Eu fico até pensando como eu gostaria de ser recebido numa próxima vez que eu viesse aqui. Desculpe agora, mas vou ser crítico! Eu sei o que eu gostaria de

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encontrar aqui sim! O que eu não encontrei! Claro, quando eu cheguei aqui pela primeira vez (risos) Aliás, eu vim para cá a contra gosto, você veja a gente comete um erro na universidade.. que é o falar. Falou, os “caras” te pegam e enviam para os lugares e eu fiz uma proposta de preservação e o resultado foi que me puseram como gestor durante alguns anos. Isso foi muito bom! Então, foram quatro anos. Depois me aposentei e então não podia continuar. Eu gostaria de encontrar aqui a Base Avançada pronta e funcionando. O que é isso: funcionando significa dando apoio para esta construção aqui, isto é, com exposições permanentes e com exposições temporárias, com palestras, monitores e educadores como são vocês! E com publicações de alto nível, porque cultura não se faz com 10 merréis! É preciso muito dinheiro. Por isso eu digo, que beleza que livros bons possam ser postos a disposição das pessoas aqui, isso vai me orgulhar muito. Ler já é um processo de desenvolvimento. Então, é essa coisa que eu espero encontrar aqui. Nesse sentido, eu acho, quando estiver funcionando a base avançada, nós teremos que trazer os cientistas brasileiros para cá para pesquisar. Para terminar, gostaria de falar um pouco sobre o projeto desta construção, a Base Avançada de Cultura e Extensão. O meu ponto de partida foi o seguinte: o que é importante e, isso foi levado em consideração no projeto, é fazer a seguinte questão: até quando a gente intervém? Até tal intervenção não obstruir o objeto que queremos. Então minha preocupação fundamental foi enterrar ao máximo o prédio, de maneira que esta construção que está elevada (as Ruínas) não fosse prejudicada por um obstáculo qualquer. Uma edificação que não concorresse na paisagem, que ele não ficasse na frente das Ruínas. Por isso até a caixa d’água não vai ficar lá, mas sim aqui em cima, escondida no meio do mato, para evitar a perturbação do que se vê. A segunda coisa que eu me preocupei foi voltar o interior do edifico para as Ruínas. Então, em todo o lado voltado para as Ruínas você sempre visualiza o engenho. Isso faz parte da educação das pessoas que freqüentam o prédio, pois eles sempre olharão para as ruínas, sempre presente, e, em terceiro lugar, evidentemente, pensei num mínimo de conforto para as pessoas. Pensei então, em impedir que este prédio tivesse (como é muito comum aqui) uma área ociosa. Então, ela foi pensada para um local que abrigasse os pesquisadores e outro que abrigasse a todos: um auditório que abrigasse a todos. Vejam, para mim não, mas para vocês que estão no sol isso é péssimo. Pensarmos na comunidade carente aí em volta, a escola do lado, etc e você pode me perguntar: você pode garantir isso? É claro que não posso, mas precisa-se pensar nisso. Pois bem: essas eram as premissas deste projeto. E esta premissa foi aceita pela USP. Tanto que não começamos a construir pela parte administrativa, mas pelo auditório que garante a comunidade aqui dentro. O resto é uma questão de qualidade de construção que tem que ser boa! Eu estudei numa escola que era o Caetano de Campos que tinha um auto-falante em cada sala e quando terminava a aula, um bedel batia com uma madeirinha e o som avisava que acabava aula, agora, se for hoje, há uma sirene absurda. Veja: se tratar as pessoas com respeito

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você terá como retribuição, respeito também. É isso que queremos aqui: uma troca disso. Teremos que fazer o mesmo esforço que as pessoas que montaram a universidade e fizeram os engenhos: exigindo coisas boas. Eu agradeço a atenção de vocês, e um dia a gente se encontra de novo.

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Arquiteto Bechara Abdalla Pestana Neves

“(...) bem cultural não preservamos para ser um cenário, nós preservamos para que também tenha um uso, porque só o uso garante a sustentabilidade de qualquer proteção”. Bechara Abdalla

O trabalho que está sendo desenvolvido pela Universidade é muito importante abrindo as portas do Engenho e trazendo a comunidade para conhecer e defender este importante Bem Cultural. Tenho uma relação muito forte com esta área. Represento a Prefeitura Municipal de Santos, através de um Termo de Compromisso Técnico, que há com a Universidade de São Paulo, visando uma série de questões desenvolvidas aqui e que necessitam de aprovações e providências por parte do órgão público. Estou no momento na presidência do Conselho de Proteção ao Patrimônio Cultural de Santos, Condepasa – que é um colegiado municipal protetor de Bens Culturais do município de Santos. O universo de imóveis que trabalhamos no município é fantástico. Na realidade – e aqui eu quero focar as relações com o Engenho – eu, particularmente, me sinto à vontade na coordenação dos trabalhos, por parte da Prefeitura, porque sou um funcionário de carreira há 22 anos e, enquanto apreciava as imagens dos cadernos de apresentação do engenho, me vem à mente o início deste processo. Essa caminhada foi longa. Envolvi-me muito a partir de 1985 quando foi iniciada uma ampla discussão sobre este assunto. Estamos em área urbana desta cidade e tínhamos proprietários das áreas vizinhas quando foi iniciado um processo de negociação e compromissos, no sentido de conseguir atender a uma solicitação da Universidade de São Paulo que sempre pleiteou a ampliação da área envoltória. Temos aqui o limite das Ruínas, aproximadamente 3.250 m², mas sempre colocado pela Universidade o interesse em ampliar esta área face a necessidade de desenvolvermos um trabalho competente e abrangente, principalmente quanto à arqueologia. Daí o processo de negociação com o proprietário vizinho no sentido de adquirir toda a área no entorno das ruínas que vocês podem ver hoje, cercada por alambrados, possibilitando que a Universidade tivesse condições de melhor desenvolver seus projetos, como aliás estão realizando com bastante brilhantismo. Estamos agora num processo que é muito interessante porque havia uma reivindicação antiga por

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parte da Prefeitura para que tivéssemos as portas do Engenho abertas e, durante um longo período, isso não foi possível porque tínhamos uma situação de instabilidade, eram partes das Ruínas que não estavam estabilizadas e vegetação que estava muito alta. E hoje estamos aqui após estas inúmeras conquistas. E é por isso que estou muito contente, porque vejo que estamos chegando onde tanto sonhávamos. Estarmos abrindo as portas para grupos de pessoas interessadas, que embora não seja em grande número é vital, pois somos importantes agentes multiplicadores no sentido de divulgar um pouco desta história, trazendo as pessoas para conhecer este lugar, cuidando dele. O santista de modo geral conhece muito a orla, as praias, a Zona Leste da cidade, e pouco conhece a Zona Noroeste. O Engenho dos Erasmos é a primeira indústria brasileira e representa o primeiro ciclo econômico que o Brasil teve: o do açúcar. Precisamos desenvolver trabalhos que tragam as crianças para cá, para conhecerem este processo, pois a partir deste contato eles poderão se transformar também em agentes multiplicadores visando à preservação deste importante Bem Cultural. Costumamos achar bonito quando temos bens preservados e constatamos que os órgãos públicos estão fazendo a sua parte, sim, mas é de responsabilidade dos órgãos os instrumentos legais que viabilizem a recuperação e preservação, mas principalmente é papel da sociedade, da nossa comunidade, a luta pela preservação de nossos bens culturais. Nós só vamos realmente conseguir preservar se todos estivermos juntos nesta batalha, cada um na sua área, mas trabalhando em conjunto. Caso contrário, sem a população junta nisso, será muito difícil. Agora, como um arquiteto que luta pela preservação há pelo menos duas décadas percebo mesmo um avanço muito grande! Nesse sentido, merece ser registrado um triste exemplo quando tivemos uma ação danosa, há anos atrás, pela utilização de máquinas que acabaram por interferir de forma comprometedora todo o solo onde hoje está sendo construída a Base Avançada. E nós tivemos um problema grave a despeito de conseguirmos reverter a situação. Se hoje temos 43 mil m² de áreas recebidas em doação é devido, não à boa vontade dos empreendedores vizinhos, mas também às tratativas decorrentes da ação dos Órgãos Públicos que determinaram compensações ambientais face ao sinistro ocorrido. Foram criadas áreas para a preservação do patrimônio cultural considerando a necessidade de ampliarmos as áreas envoltórias as ruínas, assim como preservarmos o “cone de visualização” mapeando áreas não edificantes. Patrimônio Cultural é também uma questão econômica e social. Santos, hoje, começa a ganhar divisas com isso. Estamos recuperando nossos bens culturais e temos nossos acervos divulgados em todo o território nacional e no exterior. Com isso se consegue trazer para a Cidade turistas o ano inteiro e não apenas no verão, em que a procura é enorme por nossas maravilhosas praias, mas divulgarmos Santos além das praias e dos jardins, que passa pelo conhecimento do município como um todo. Estamos caminhando muito positivamente: com aperfeiçoamento de equipes técnicas, legislação, enfim, um conjunto de iniciativas que valorizam todo o território santista destacando o nosso Centro Antigo que,

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através do Programa Alegra Centro, que tem como objetivo Revitalizar e Desenvolver Economicamente a Região Central Histórica de Santos vem contabilizando resultados extremamente positivos. Se eu fizesse um paralelo entre as condições desta área a 15 ou 20 anos atrás, destacando as péssimas condições das ruínas e a falta de infra-estrutura, hoje, após o belíssimo trabalho que está sendo desenvolvido e administrado pela universidade, com a estabilização das ruínas, melhoria da acessibilidade e agora com a construção da Base Avançada da USP já é possível abrir as portas à comunidade e permitir que as pessoas, munícipes, turistas, enfim, qualquer cidadão possa conhecer e se encantar por este belíssimo Patrimônio com segurança e conforto. Para finalizar, saber que há pessoas pensando e protegendo este bem e elaborando projetos que guardem este local é um alento. O prefeito João Paulo Tavares Papa está empenhado em contribuir para que este local seja cada vez mais valorizado, e tem a certeza que está sendo realizado um grande trabalho. Se eu estivesse vindo aqui hoje, pela primeira vez, estaria tendo a mesma satisfação que estou tendo agora, pois apesar de já ter vindo aqui diversas vezes, sempre me surpreendo e fico cada vez mais otimista. Sonho em poder chegar aqui e conseguir ver os professores da universidade e das escolas da região trabalhando, fazendo suas pesquisas arqueológicas ou não, mas permitindo que todos possam acompanhar: o importante é ver os trabalhos sendo realizados. Como digo sempre: bem cultural não preservamos para ser um cenário, preservamos para que também tenha um uso, porque só o uso garante a sustentabilidade de qualquer proteção. Muito obrigado.

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IV.

Cartas, Planos e Tomada de Consciência

por André Müller de Mello “Deveriam ser mobilizados a criatividade, os ideais e os valores dos jovens do mundo para forjar uma aliança mundial orientada a obter o desenvolvimento sustentável e assegurar um futuro melhor para todos.” Carta do Rio, Conferência Geral das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento. Junho de 1992.

O Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, Órgão da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária da Universidade de São Paulo, é hoje inestimável ponto de convergência de olhares e de sistemáticas pesquisas e atividades culturais que visam aproximação, intercâmbio e entendimento entre a trama comunitária de interessados, autoridades, grupos e indivíduos envolvidos nas atividades de conservação. Está sediado na Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária, cuja inauguração de sua primeira fase a reunião destes artigos vem registrar e comemorar. Apresentando-se como um dos raros conjuntos histórico-arquitetônicos remanescentes da ocupação européia em solo brasileiro, assume, inevitavelmente, um papel marcante também para os desafios da educação ambiental, além da patrimonial. Tombado pelos órgãos preservacionistas em todos os âmbitos e identificado como lugar de resistência e de memória, testemunho passível de ser encarado sob distintos ângulos, possui ainda configurações paisa-

gísticas, estéticas e afetivas, o que nos leva a considerar constantemente a profunda interdependência que há entre o patrimônio cultural e o natural. Situado estrategicamente, quando da iniciativa de Martim Afonso em construir, em 1532, o engenho de açúcar – um dos primeiros e o mais antigo assim preservado – suas ruínas encontram-se no maciço insular de MonteSerrat-Santa Terezinha, no centro da Ilha de São Vicente, em Santos. Tais ruínas estão inseridas entre os poucos e representativos remanescentes da floresta atlântica, cuja paisagem primitiva tal bioma ocupou, imponente em biodiversidade, mesclado aos manguezais e restingas. Graças ao material utilizado na construção do engenho – blocos semitalhados de rochas muito resistentes, provenientes de pedreiras quinhentistas das cercanias – ainda resta um conjunto lítico no qual é possível observar técnicas construtivas da Idade Média.

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Tudo indica que a dita fábrica de açúcar, ao contrário das engenhocas que surgiram depois, utilizou tecnologia avançada para a época, na forma de uma moenda movida pela força das águas, de acordo com registros documentais, vestígios materiais e uma evocativa queda d’água, hoje um tanto desfigurada, presente na soleira rochosa adjacente à construção.

questionar, ainda enfrentam dificuldades práticas dentro das máquinas administrativas de âmbito federal, estadual e municipal. Ameaças de desflorestamento e degradação atingem tanto florestas de reservas legais, onde a sua diversidade biológica oferece recursos diretos como bancos genéticos ou biomassa, quanto fragmentos de mata secundária cujos maiores valores são os indiretos, como o controle da Justamente também por estas características erosão do solo, da sedimentação dos cursos geomorfológicas e fitogeográficas ímpares, que d’água, a manutenção de microclimas regiodão maior amplitude à leitura e interpretação nais, entre outros. Ambos os casos merecem paisagística do Monumento Nacional, a USP, atenção das autoridades responsáveis por sua em parceria com as Secretarias da Educação proteção e das comunidades beneficiadas por de Santos e São Vicente, através de convê- sua manutenção. O Monumento Nacional em nios firmados, e em parceria também com a questão está unido de forma muito clara às Universidade Católica de Santos via Termo duas situações, dada sua estreita ligação históde Cooperação Técnica, vem desenvolvendo ria e espacial a uma pequena ilha de floresta ações educacionais múltiplas e sistemáticas. da região dos morros, além da proximidade do Os enfoques, diversos, apontam desde o início Parque Estadual da Serra do Mar, contendo a das atividades para aspectos históricos, cultu- maior área contínua de mata atlântica preserrais, produtivos, legais, urbanos e arqueológi- vada no país. cos, além dos ecológicos e ambientais. Estes últimos abordados de forma a transformar o As metas propostas nas gestões curatoriais local em laboratório para o estudo e o exercício das Ruínas durante os últimos anos – incluindo, de diálogos a respeito das relações seculares entre inúmeras outras, obras de consolidação do homem com o seu ambiente. Relações do conjunto e de seu entorno, publicação de construídas e, vale lembrar, ainda em constru- estudos, debates e pareceres sobre as alternação, pois o futuro dos remanescentes de mata tivas para perenizar o bem, contatos sistemáatlântica, de suas águas e do conhecimento ticos com órgãos preservacionistas, projetos empírico das comunidades ligadas a eles ainda educacionais, aproximações com a comuniestá em jogo. dade, investigações científicas, levantamentos de flora e fauna, articulações com as secretaMecanismos legais de proteção do ecossis- rias municipais visando a criação do Parque tema mata atlântica, cuja importância para as Municipal nos arredores, intercâmbios com a atuais e futuras gerações não se ousa mais comunidade científica dentro e fora da USP –

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estão em sintonia com as recomendações maiores das chamadas Cartas Patrimoniais, documentos dos quais o Brasil é signatário e que resultaram de conferências sob iniciativa da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. Na consagrada Recomendação de Paris, de 1962, na qual se discute a administração de paisagens e sítios, o Conselho Internacional dos Museus já considera a negligência do homem em relação à “beleza e a caráter das paisagens e dos sítios que fazem parte do quadro natural de sua vida”, registrando que tais ações “empobreceram o patrimônio cultural, estético e até mesmo vital de regiões inteiras”. O documento diz ainda que “esse fenômeno tem repercussão não apenas no valor estético das paisagens e dos sítios naturais ou criados pelo homem, mas também no interesse cultural e científico oferecido pela vida selvagem” e que “é altamente desejável estudar e adotar as medidas necessárias para salvaguardar a beleza e o caráter das paisagens e dos sítios em toda a parte e sempre que possível”. O desmatamento, a poluição do ar e da água e a captação de nascentes são citados como atividades suscetíveis de causar dano às paisagens e aos sítios, solicitando uma proteção especial que “deveria ser assegurada às proximidades dos monumentos”.

demandados a partir de iniciativa da USP, visam conceder status de Unidade de Conservação à área de mata em torno do sítio, cuja administração seria do próprio município. Desta maneira a fragilidade da floresta, invadida aos poucos, porém incisivamente, ganharia novas alternativas legais de proteção e de uso pela comunidade, carente de espaços destinados ao lazer e à contemplação da natureza. Tal iniciativa apóia-se no conceito de “ambiência” dos conjuntos históricos ou tradicionais, colocado na Recomendação de Nairobi (UNESCO, 1976) como “o quadro natural ou construído que influi na percepção estática ou dinâmica desses conjuntos, ou a eles se vincula de maneira imediata no espaço, ou por laços sociais, econômicos ou culturais”, devendo ambos, o conjunto histórico e sua ambiência serem considerados “em sua globalidade, como um todo coerente cujo equilíbrio e caráter específico dependem da síntese dos elementos que o compõem e que compreendem tanto as atividades humanas como as construções, a estrutura espacial e as zonas circundantes”. O documento segue por concluir que todos os elementos válidos deveriam, portanto, assumir, “em relação ao conjunto, uma significação que é preciso respeitar”, devendo “ser protegidos ativamente contra quaisquer deteriorações, particularmente as que resultam em uma utilização

As sistemáticas reuniões de articulação entre secretarias municipais de Santos e organizações que desempenham papel preponderante nas decisões urbanas, encontros mensais

imprópria, de acréscimos supérfluos e de transformações abusivas ou desprovidas de sensibilidade que atentam contra sua autenticidade, assim como provocadas por qualquer forma de poluição. (...) Do mesmo modo, uma grande atenção deveria ser dispensada

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à harmonia e à emoção estética que resultam da conexão ou do contraste dos diferentes elementos que compõem os conjuntos e que dão a cada um deles seu caráter peculiar.”

Antes mesmo da criação da ONU, na Carta de Atenas de 1931, o Conselho Internacional dos Museus já adverte que a valorização dos monumentos passa também, entre diversas ações, pelo estudo “das plantações e ornamentações vegetais convenientes a determinados conjuntos de monumentos” e recomenda “a colaboração em cada país dos conservadores de monumentos e arquitetos com os representantes das ciências físicas, químicas e naturais para a obtenção de métodos aplicáveis em casos diferentes”. Com seus princípios reexaminados em 1964, na Carta de Veneza, no II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos dos Monumentos Históricos, o 13º artigo deixa claro: “Os acréscimos só poderão ser tolerados na medida em que respeitarem todas as partes interessantes do edifício, seu esquema tradicional, o equilíbrio da sua composição e suas relações com o meio ambiente”.

É o caso dos estudos preliminares para a proposição do projeto da Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária, sede do atual Órgão nas Ruínas Engenho, solução do arquiteto e professor da FAU/USP Júlio Roberto Katinsky para abrigar com dignidade o crescente público e os projetos educacionais em andamento. As obras tiveram início em 2006 e uma primeira parte do edifício já pode ser

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utilizada, com planos para início imediato da segunda etapa. Auditório, área de exposições, dependências com acessibilidade absoluta, escritórios, biblioteca e reserva técnica estarão em breve disponibilizadas sem que se tenha ferido a paisagem6 e a configuração ideal do conjunto, além de terem sido respeitadas todas as prioridades visuais em relação ao monumento histórico, ficando o novo prédio bem abaixo da cumeeira do antigo.


Estímulo à Pesquisa, ao Ensino e à Informação

“Compreendemos nossa identidade como uma forma de pertencer e participar.” Carta de Brasília, Documento Regional do Cone Sul sobre Autenticidade. 1995.

Além de trazer advertências concernentes à técnicas de restauração, administrativas e legais da gestão de monumentos, as Cartas Patrimoniais versam ainda sobre o papel da educação e o respeito a sítios históricos, além de sua estreita relação com o turismo. De maneira geral, persiste o entendimento de que a melhor garantia de conservação de sítios históricos e patrimônios naturais vem do respeito e o interesse dos próprios povos e que atividades educativas deveriam ser estimuladas dentro e fora da escola para despertar o interesse público pelas paisagens e sítios, como estratégia de salvaguarda. Em outras palavras, uma destinação útil à sociedade favorece a conservação do patrimônio, enquanto uma política de revitalização deveria converter os conjuntos históricos em pólos de atividades culturais, atribuindo-lhes um papel fundamental no desenvolvimento cultural das comunidades circundantes. Um encontro histórico da Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente deixou também para a posteridade um importante documento, a Declaração de Estocolmo (1972), no qual tais considerações a respeito da educação são aprofundadas

e contextualizadas para as questões ambientais: “(...) É indispensável um trabalho em questões ambientais, visando tanto às gerações jovens como aos adultos, (...) a fim de criar as bases de uma opinião pública bem informada e de uma conduta responsável dos indivíduos, das empresas e das comunidades, inspiradas no sentido de sua responsabilidade em relação à proteção e melhoria do meio ambiente em toda a sua dimensão humana.”

Nos projetos educacionais implantados no Órgão, sem exceção, ocorrem abordagens ambientais quando do estudo e fruição do bem cultural, sendo as ciências da natureza tratadas com mais maturidade e especificidades nos projetos “Imaginário e Práticas Aproximativas do Patrimônio” (I-PAPo), no “Projeto Educacional VouVolto”, no “Laboratório de Memórias” e no “Portas Abertas”. No primeiro citado, destinado ao ensino fundamental, utilizando a pedagogia de projetos e valendo-se de um conjunto de jogos, dinâmicas e atividades que visitam durante algumas semanas as escolas, um dos três temas geradores (ou “chaves de compreensão”, conforme convencionado na publicação do

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professor) é denominado “Espetáculo da Natureza”, que sugere apreender o Monumento Nacional como “ícone de uma era de transição e transformações, emblema de conquistas, empreendedorismo europeu, conflitos, devastação, miscigenação e mudanças de paradigmas ocorridos no início da era moderna”. Propõe que revisitemos o período em que o engenho foi construído para lembrarmo-nos do encontro de grupos étnicos, da intensificação do comércio ultramarino, das obras dos imortais renascentistas, das grandes invenções que revolucionaram a imagem que o homem medieval tinha do Universo. Evoca ainda as transformações dos hábitos alimentares com o uso das especiarias, a migração dos vegetais e os avanços a respeito do conhecimento sobre os mares e as novas terras. O I-PAPo, desta forma, trouxe um convite aos jovens para o estudo da biologia das florestas aqui presentes, da geografia descritiva desta singular paisagem, da revisão histórica das outras ciências da natureza como a matemática e a física, com suas divisões na contemporaneidade, da história do cosmo e do desenvolvimento da arte. Ao contrário, no segundo programa citado, VouVolto, as questões relativas ao ambiente vêm à tona numa perspectiva que foge da abordagem cronológica, linear, à medida em que, num estímulo à interdisciplinaridade, propõe ao professor e aos alunos abordar a história e o ambiente de maneira indissociáveis, seja qual for o período em discussão. Os ciclos da cana, tanto o do século XVI, utilizando mão de obra escrava e exportando riquezas para a metrópole, quanto o atual, com a gramínea no

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nas cartas de Anchieta, paralelamente à dificuldade atual das últimas gerações em manter de pé menos de 10% da mata atlântica restante. Já no Laboratório de Memórias, programa que tem a participação de alunos universitários, é a prática sócio-histórica e a emersão da memória que estão em foco, qualificando o discurso de apropriação do bem público. Em outras palavras, as memórias e sua função identitária é que fazem parte das estratégias culturais de salvaguarda, num estímulo pelo interesse coletivo de reconhecimento do patrimônio cultural imaterial associado ao bem que se deseja salvaguardar. Ao invés de servirem como meras informações cristalizadoras de um passado a ser simplesmente catalogado, as memórias eleitas e resgatadas no Laboratório, neste caso, servem de elementos problematizadores do presente e se prestam a configurar novos questionamentos a respeito do futuro que se deseja construir.

centro dos debates sobre a questão energética e a busca por combustíveis mais limpos, ambos podem ser citados e discutidos durante as visitas monitoradas. Carros de boi e veículos bicombustíveis são mencionados em momentos diferentes da mesma caminhada reflexiva com os jovens; negros bantos escravizados e bóias-frias cujos direitos são violados fazem parte de uma mesma discussão a respeito das relações de trabalho ligadas à cana; a hostilidade da onipresente floresta tropical enfrentada pelos portugueses e retratada com espanto

Sobre o peso que tal conjunto de memórias sociais tem para seu povo, a Declaração do México (ICOMOS, 1985) ao redigir uma das mais sensíveis e marcantes contribuições que configuram entre as Cartas Patrimoniais, resultante da Conferência Mundial de Políticas Culturais, explicita que a cultura pode ser considerada “como o conjunto de traços distintivos espirituais, materiais, intelectuais e afetivos que caracterizam uma sociedade e um grupo social”, dando ao homem a “capacidade de refletir sobre si mesmo”. Através da cultura o homem se expressa, “toma consciência de si mesmo, se reconhece como um projeto inacabado, põe em questão as suas próprias realizações, procura incansavelmente novas significações e cria obras que o transcen-

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dem. (...) Proporcionar a todos os homens a oportunidade de realizar um melhor destino supõe ajustar permanentemente o ritmo do desenvolvimento.”

Arregimentando identidades plurais e proporcionando ao bem cultural uma dimensão relacional e afetiva, ainda que sutil e delicada, iniciou-se mais um movimento em busca da preservação, capaz de valorizar a troca, de dar voz aos relatos da comunidade e relevância às suas tradições e expressões artísticas ligadas ao ambiente. Inevitavelmente, estão incluídas neste panorama as práticas populares diretamente relacionadas à natureza: os modos de utilização, por moradores vizinhos, de plantas medicinais que crescem nas imediações, os relatos de caças outrora comuns, rituais antigos de cura que se foram com as últimas benzedeiras da região, lendas de criaturas encantadas e visagens de espíritos ligados à floresta e ao passado mítico do engenho primitivo. No terceiro programa educacional citado, o Portas Abertas, prevalece o empenho da equipe de educadores e gestores para assegurar-se o reconhecimento, o respeito e a valorização do patrimônio cultural imaterial através de meios não-formais de transmissão de conhecimento, na troca com as comunidades do entorno, além de famílias de outros municípios, turistas e profissionais ligados às mais diversas áreas. Com duas edições por ano, sempre nas férias, o Portas Abertas lança um calendário de atividades culturais diferentes daquelas propostas durante o ano letivo: sejam novos visitantes, sejam alunos que já estiveram aqui em visitas institucionais, curriculares, é o momento de fruir o bem cultural em um novo contexto, não para as tradicionais

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monitorias, mas sim para participar mais ativamente de oficinas de leitura, rodas de capoeira, interagir com contatores de histórias, tocar um instrumento ou compartilhar um texto de que goste em saraus. Há também jogos, espetáculos musicais, exibição de filmes, sessões comentadas de documentários. De maneira geral, as culturas tradicional e popular vigoram nas atividades propostas, como elementos da identidade nacional. Um balanço do Portas Abertas se faz presente nesta publicação, demonstrando que a cultura tradicional e a popular são privilegiadas nos calendários de atividades propostos, enquanto “criações que emanam de uma comunidade cultural fundadas na tradição, expressadas por um grupo ou por indivíduos e que reconhecidamente respondem às expectativas da comunidade enquanto expressão de sua identidade cultural e social; as normas e os valores que se transmitem oralmente (...) Suas formas compreendem, entre outras, a língua, a literatura, a música, a dança, os jogos, a mitologia, os rituais, os costumes, o artesanato, a arquitetura e outras artes.” [Recomendação Paris, 1989].


As Cartas, os planos e a tomada de consciência que concerne às questões ambientais, em suma, permeiam cada decisão política e pedagógica dos gestores e educadores ligados ao Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, em consonância com o último e contundente parágrafo da Declaração de Nairobi (UNEP – 1982), quando a Assembléia Geral dos Estados

de forma a assegurar que o nosso pequeno planeta seja transmitido às futuras gerações em condições que garantam a vida e a dignidade humana para todos.”.

“(...) Conclama todos os governos e povos do mundo a assumirem, individual e coletivamente, a sua responsabilidade histórica,

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Profª Zildete Prado

“(...) Aprendi e aprendo cada vez mais que conjugar técnica e História sempre se torna prazeroso (...), tento demonstrar que a técnica nem sempre é “fria”, ela deve ter vida, tal como a preservação de espaços como este.” Zildete Prado

Eu gostaria de agradecer o convite para participar do Portas Abertas e vou começar contando qual minha relação com este lugar. Tenho muito carinho e respeito por patrimônios históricos. Meu primeiro grande trabalho foi como engenheira indicada pela UNISANTOS junto ao IPHAN, nas obras da 1ª fase de restauro e recuperação da Fortaleza de Santo Amaro da Barra Grande. Para quem está aqui hoje e nunca foi lá, vale a pena conhecer. Ela é considerada o maior conjunto arquitetônico bélico do estado de São Paulo e foi erguida em 1584, (portanto, provavelmente 50 anos após a edificação deste engenho) quando houve a união das coroas ibéricas. Fica no Guarujá, mas dá para ver a Fortaleza daqui da Ponta da Praia de Santos. Foram três anos acompanhando as obras, principalmente a Capela, que marcaram muito meu conceito de preservação de bens históricos. Ao mesmo tempo em que me dediquei à Engenharia, não deixei de lado meu gosto pelas chamadas Ciências Sociais. Assim, conjugar técnica e História sempre me é prazeroso. Aqui, nos Erasmos, não foi diferente. Entrei em contato com o Engenho, há alguns anos, por intermédio de um aluno e foi a partir daí que tomei conhecimento do trabalho que vinha sendo desenvolvido neste local. Soube também da parceria USP-Unisantos e, assim que se formou o grupo de trabalho, nele fui incluída porque demonstrei imediato interesse. Este grupo foi formado para desenvolver o Laboratório de Memórias, um projeto interessante mas que não vem ao caso comentar em detalhes agora. O importante é que a partir de então tenho trazido diversas turmas de alunos tanto de Engenharia como de Gestão Ambiental, procurando passar para os futuros profissionais esse verdadeiro prazer que é a preservação do bem cultural, parte viva de nossa História, e suas relações com a tecnologia, que é a aplicação do aprendido em sala de aula. Tento demonstrar que a técnica nem sempre é “fria”, ela deve

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ter vida. Este bem cultural, aliás, tem além da importância comprovada pelo seu testemunho histórico, uma singularidade que o diferencia dos demais espalhados pelo país, na minha opinião. Certamente a continuidade da “ocupação”, tornando a ruína em um “ser vivente” que recebe o visitante e a cada visita tem uma aparência diferente. Não compreendo preservação sem utilização posterior. Uma vez visitado um sítio histórico ou arqueológico, o público não mais retorna, pois o que lá existe e foi visto não será mudado e perde-se assim o interesse. Ao contrário, se o local oferece diversidade de atividades, focando público diferenciado – escolas de todos os níveis, turistas e a comunidade em geral, sempre será renovado o conhecimento e o interesse no local. As parcerias, sejam elas com as escolas dos municípios vizinhos ou com outros parceiros, mantêm o fluxo constante de visitantes. Os diversos programas oferecidos – o Portas Abertas e o Vou Volto, além dos outros, são bons exemplos de como se mantem o interesse renovado, atraindo cada vez mais o público para o local. São essas iniciativas que mantêm vivo o sítio histórico e faz o diferencial de outros que tenho conhecimento. Justamente essa diversidade dos programas e a sua continuidade dão esse charme diferente ao monumento, em relação aos trabalhos realizados em outros espaços. Desde que vim aqui pela primeira vez, até a presente data, sempre há algo novo para conhecermos – programas e atividades, isso faz com que o visitante renove sua visita. Também a abrangência do público – das crianças até a terceira idade encontram aqui atividades de seu interesse. Agora, na condição de público, já que vocês me perguntaram o que eu gostaria de encontrar num lugar como este, lá vai: gostaria de ver expostos parte do acervo arqueológico aqui encontrado, fotos das ruínas antes dos trabalhos aqui desenvolvidos, enfim uma mini exposição contando o passado das ruínas. Também um pouco da História da região, as invasões piratas, os visitantes ilustres – Anchieta foi um deles, sempre uma fonte de informação mostrando que as Ruínas tinham ligação com a vida da Vila de São Vicente . Mas as condições atuais para desenvolver o meu trabalho como engenheira e educadora neste local são fantásticas. Vejam, como Engenheira Civil, especialista em Engenharia Ambiental, aqui é o “sonho de consumo”! Imagine poder preservar ao mesmo tempo as Ruínas, inseridas no meio urbano, com o meio ambiente. Todo o conjunto é verdadeiro delírio! Aqui temos exemplos muito atuais: a primeira indústria do Brasil colônia, um grande exemplo de Empreendedorismo – investir em uma nova atividade, em uma terra distante, sem nunca ter aqui estado, a escolha da localização, estratégica quanto à logística do porto existente em São Vicente, a construção defensiva do bem precioso – o açúcar, a produção ecologicamente correta – o uso da força hidráulica, sem falar de outros exemplos. São temas

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atualíssimos que servem de exemplo vivo aos alunos de qualquer nível, mas principalmente aos futuros Engenheiros. Podemos assim demonstrar in loco o que expomos em sala de aula. O Engenho é um “laboratório” ao ar livre. Tenho trazido diversas turmas para visitar as Ruínas e a cada uma delas a visão vai se modificando e ampliando – sempre há um novo olhar, uma nova descoberta. Na verdade acabo aprendendo mais que os alunos. Este é um local para virmos muitas vezes e que deve ser descoberto aos poucos. Mas, sonhos à parte, creio que levar aos futuros profissionais a consciência do que é preservar – com todas as nuances, implicações, dificuldades e também realizações profissional e pessoal, é imprescindível para a consciência da importância de um bem histórico. É preciso que entendam que o bem é de todos, não só dos historiadores, mas também da área técnica, pois afinal o passado que ela representa é comum. E também para a comunidade vizinha, não só para alunos do fundamental, médio, técnico ou superior. O local também pode e deve trazer uma contribuição importante à comunidade vizinha. Ah, a identidade! O “bem” faz parte da vida da comunidade, ele esta inserido na vida da comunidade, na verdade ele é um pouquinho de cada um e assim, preservar e conhecer isso tudo aqui, participar destas novidades todas, fica mais fácil e mais intenso o encontro com a identidade cultural. Um trabalho que une a família – os mais novos trazem os mais velhos, que por sua vez trazem suas lembranças, num círculo que se fecha, mas na verdade se renova constantemente. A preservação da memória, da transmissão verbal para a escrita. A identidade que falo é a de inserir-se na História: saber que estamos fazendo História, ao mesmo tempo em que nosso passado é História e que o sitio em que estamos é História. Nele viveram pessoas como nós, que moravam aqui, trabalhavam aqui, como fazemos hoje. Isso é vida para o patrimônio, ele é antigo, mas novo ao mesmo tempo. Fica mais fácil “preservar” o que é nosso ao invés de termos algo estático, atemporal, com o qual não nos identificamos. Falando poeticamente, podemos considerar as Ruínas um portal do tempo, lugar em que vamos para outras épocas e delas voltamos carregando sempre uma bagagem de conhecimentos renovados. Essa continuidade fará com que a “ocupação” do Engenho, hoje Ruína Engenho, nunca cesse e dessa forma adquira outras faces, sempre novas.

Depoimento

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V.

Portas Abertas: democratizando espaço, conhecimento e lazer

por Rodrigo Christofoletti e André Müller de Mello “(...) Acordar de propósito e escancarar as portas para a sorte, o conhecimento e o livre pensamento: eis o que pretendo...” Paulo Freire, Manuscritos da Pedagogia da Libertação.

Concomitante ao desejo de conhecer e partilhar, sempre esteve a certeza, por parte de nossa equipe, de que a única maneira de se resguardar e preservar este espaço seria considerá-lo como uma plataforma de saberes em constante processo de aprofundamento por meio de ações educacionais que incentivasse o sentimento de pertencimento dos que o visitassem. Neste sentido, o ano de 2004 foi um marco nas conquistas dos programas educacionais realizados junto ao Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, pois passou a acentuar seu caráter educativo. Para além dos programas em andamento: Plataforma Sophia, VouVolto, Laboratório de Memórias, Território e Transformações, I-Papo (Imaginário e Práticas Aproximativas do Patrimônio), Fimde-Semana Temático, Engrenagens e Eleja, a equipe de educadores deste bem cultural sentiu a necessidade de ampliar as possibilidades de visitação ao público geral (não exclusivamente escolar). Ao longo de todo o ano letivo, o bem recebe,

diariamente, sete dias por semana, visitas de escolas públicas, particulares e demais visitantes, que por meio de agendamento prévio conhecem o bem, e utilizam este espaço de construção de conhecimento como complemento da ação educativa. No entanto, no período de férias (meses de janeiro e julho), a visitação escolar (grande foco dos programas desenvolvidos nas Ruínas) muda de patamar com visitas espontâneas, porém eventuais, o que incentivou a equipe educativa do bem a criar um programa que aprofundasse a fórmula já bem sucedida, implementada com as escolas em período letivo. Desta necessidade nasceu um programa que oferece uma agenda diferenciada de atividades culturais durante os meses de férias, voltada para a família, um programa que busca atender aos mais diversificados públicos, focos e interesses. Jogos, dinâmicas e atividades especiais ocorrem paralelamente às visitas monitoradas, juntamente com uma programação de atividades complementares,

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como por exemplo: mostras de cinema de curtas e longas metragens, exposições artísticas, rodas de capoeira e manifestações cênicas, saraus e tardes de produção de poesia, oficinas de textos e fotografias, palestras sobre a diversidade da cultura brasileira, rodadas de depoimentos de profissionais vinculados à história deste bem, dentre outras atividades. Estas ações marcam o diferencial deste novo formato de programa educativo. O Programa Portas Abertas surge assim, procurando trabalhar com uma complexidade de desafios diante das problemáticas da educação, seguindo a linha ascendente dos programas que levam em consideração não apenas a busca de números capazes de solidificar sua existência perante a comunidade, mas, sobretudo, considerando estarmos mais próximos de romper a maior e mais difícil resistência: a errônea idéia de que o Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos é um local interdito. Uma de nossas maiores conquistas é a constatação de ser este, agora e finalmente, um espaço de todos.

interagir com as propostas culturais/educativas orientadas pela equipe de educadores locada no bem. Além disso, tem como prioridade ouvir o que a comunidade tem a propor, visando o aperfeiçoamento do debate educativo. Cabe destacar que o Programa Portas Abertas nasce tendo como busca a adoção e conscientização de distintos segmentos sobre a importância em ações preservacionistas, por meio de visitas com diversos públicos de segmentos locais, visando garantir a salvaguarda do bem, e a efetiva visitação de públicos distintos. Portanto, corrobora a máxima: a educação é a argamassa da preservação. Tal assertiva sustenta o uso qualificado deste bem.

Em consonância com as metas estabelecidas para a utilização deste bem cultural, o Programa Portas Abertas sinaliza a abertura deste espaço, em que pese sua especificidade, de modo a incentivar o conhecimento, interpretação e introdução de temários referentes à cultura nacional, discutidas e analisadas pela população em geral que visita o bem. Neste sentido, tem como primazia estabelecer proximidade com a comunidade envoltória, possibilitando a esta,

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Histórico de um programa bem sucedido

O trabalho educacional desenvolvido junto aos visitantes é por definição uma construção coletiva, visando distintas interpretações e intervenções. Nesse sentido, práticas educacionais foram sistematicamente discutidas e aprimoradas pelos educadores, no sentido de dotar este espaço de características que estimulassem os visitantes a se interessarem por este bem. O Programa Portas Abertas cumpre esta tarefa: a de não censurar o desejo do visitante de encontrar pistas, relações ou contatos entre sua própria história e a história deste lugar. É partindo desta proposição que relatamos de maneira sintética as primeiras sete edições do Portas Abertas.

2005 – Tateando um projeto possível Toda realização se inicia com uma idealização. Às vezes a linha que une a idealização à realização é tão curta, que a idéia parece até ter nascido pronta. No caso deste diferenciado programa educativo, nos sentimos assim: o programa Portas Abertas parece ter nascido pronto, mas demorou um tempo considerável para que, entre discussões, projeções

e estudos, saísse do papel e tomasse sua forma inicial. Como que palmilhando terrenos não conhecidos, a criação do programa Portas Abertas foi um curioso processo de aprendizagem por parte da equipe, no sentido de focar a atenção para a diversidade de públicos que visitariam as Ruínas dentro deste novo formato. Diferentemente dos projetos educacionais já em andamento, cujo público preferencial é o escolar, no programa Portas Abertas a visitação é realizada por uma gama variada de públicos que vai desde o morador das adjacências, até o estrangeiro que visita a cidade, passando pelos alunos que ao longo do ano letivo já visitaram o bem, dentre outros públicos. Por isso, esta primeira edição do Portas Abertas nos foi tão surpreendente. E é para contar partes significativas desta história de sete edições do programa que enfatizamos esta afirmação: entre a idealização e a realização há um universo. É sobre este universo educativo que pretendemos falar. As duas primeiras edições deste evento (verão e inverno de 2005) inauguraram uma programação

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Para tanto, tal programa educacional leva em conta atividades pedagógicas que congreguem preocupações interdisciplinares envolvendo, principalmente, variadas interpretações. O Portas Abertas privilegia esta proposta, em que os jogos, dinâmicas e atividades utilizadas como instrumentos estimulantes ao desenvolvimento do indivíduo fazem parte do roteiro de visita às Ruínas, visto que nenhum visitante é “uma esponja passiva que absorve o que lhe é apresentado. Ao contrário, modelam ativamente seu próprio ambiente e se tornam agentes de seu processo de crescimento e das forças ambientais

de monitoria e atividades diferenciadas, período este que recebeu centenas de visitantes entre os meses de janeiro/fevereiro e julho. Nestas oportunidades o Portas Abertas teve como foco a população envoltória do bem. Todas as terças e quintas-feiras e também no segundo domingo de cada mês, as Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos abriram suas portas para a comunidade da Zona Noroeste de Santos e dos bairros próximos de São Vicente, neste que ficou conhecido como Programa-Piloto.

que elas mesmas ajudam a formar. Em síntese, o ambiente e a educação fluem do mundo externo para a criança e da própria criança para seu mundo.” [ANTUNES, 1998].

Outro tipo de inteligência, coletiva, emocional e complexa tem sido cada vez mais estudado. Tratase da pedagogia que vê no lúdico e na não competitividade a solução para um desenvolvimento psicosocial mais autônomo. Como suporte desta original proposta, a pedagogia na qual este programa está baseado pretende tratar os elementos formadores

Levando em consideração as premissas básicas da educação libertária e construtiva, a qualificação do uso do bem visa incentivar a investigação histórica e a compreensão dos condicionantes ambientais em que o Engenho se insere, propondo discussões e adequações para os mais diversos públicos que viabilizem a compreensão não só da história do Engenho dos Erasmos (hoje em ruínas) e de sua constituição ambiental, mas também de como tal engenho testemunhou profundas transformações no modo de ver e viver da sociedade brasileira, ao longo dos séculos.

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do complexo das Ruínas como algo que possibilite ao visitante dois princípios básicos: a) estimular a construção de sua identidade, incentivando o sentimento de pertencimento deste frente ao patrimônio cultural (uma vez membro da sociedade, deve-se preservar e zelar pela manutenção de sua história e do meio em que vive); b) sinalizar para este visitante a necessidade de se preservar a sensibilidade coletiva, sem desprezar a identidade individual despertando neste o senso crítico e a sensibilidade ética, na relação com o bem. O tatear deste novo objeto e o vislumbrar de novas experiências incentivou a equipe de educadores a acreditar que este programa terá vida longa. Abrese assim, a promessa de vigilância sobre a interação da história, educação e cidadania, pois quem conhece seu passado, sabe melhor sobre si.

dialógica e experimental dentro dos padrões possíveis em bens culturais da natureza das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos. As edições do programa Portas Abertas 2006 ganharam um incremento em relação às anteriores. Se no ano de 2005 o foco era a visita monitorada (embrião do roteiro desenvolvido nas atividades ao longo do ano), nas edições de 2006, o leque das atividades foi mais abrangente. A recondução de algumas atividades deu novos ares à visitação do Portas Abertas 2006, focalizando cada vez mais o potencial de laboratório à céu aberto que as Ruínas possuem. A troca com o público, por outro lado, confere vitalidade aos novos programas, havendo um claro intento em aprender, mais do que simplesmente passar conteúdos contidos em livros. Edição de verão

2006 – Um laboratório a céu aberto A utilização de bens culturais visando sua preservação, por meio da educação, implica que haja a incessante atualização dos pontos de partida, dos questionamentos e das ações educativas do bem. Pressupõe, portanto, aliança constante entre a construção e a propagação dos saberes. Somente conhecimentos interdisciplinares podem embasar programas de utilização de bens culturais, que visem incluir as diversas áreas do saber na sua pauta de discussões. Neste sentido, uma visão específica de educação sobre o patrimônio (nomenclatura controversa por natureza) tem sido constantemente atualizada, no sentido de atribuir a este programa característica

A terceira edição do Programa Portas Abertas iniciou-se nos meses de férias de janeiro e fevereiro de 2006 tendo obtido resultados animadores. Muitos visitantes freqüentaram as visitas monitoradas neste período, com especial destaque para as participações de finais de semana que ajudaram a aumentar o número de visitantes que passaram a ter contato com o Monumento Nacional, totalizando mais de quinhentas visitações. O mau tempo e as chuvas intermitentes, em parte, inibiram a visitação mais efetiva do programa. No entanto, tais fatores apenas instigaram a equipe a criar novas atividades utilizando o espaço do pavilhão restaurado, o que dotou as atividades de um caráter bastante agradável, devido à peculiaridade do espaço.

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Neste sentido, entende-se que os pouco mais de quinhentos visitantes servem de parâmetro para a significativa modificação de postura da população envoltória com relação às Ruínas. O programa Portas Abertas serviu como um elemento de reaproximação dos moradores da zona oeste, vizinhos do Monumento Nacional. Edição de inverno Visando dar continuidade a esta iniciativa, o Portas Abertas recebeu durante os dias 9 a 22 de julho cinco palestrantes dispostos a relatar suas experiências afetivas e profissionais com relação ao bem cultural. Nesta quarta edição o programa consistiu em propor discussões com estas personalidades que, de alguma maneira, tiveram no seu currículo alguma relação com o local, dando continuidade ao propósito de compartilhar, dividir e potencializar as vozes envolvidas. A partir de um roteiro de questões proposto pela equipe de educadores, os palestrantes discutiram temas relacionados à sua formação profissional e sua trajetória dentro do universo deste bem cultural, assim dividindo-as com outros.

São Jorge dos Erasmos hoje na construção identitária da região. A equipe de educadores elaborou um roteiro de questões aos convidados/palestrantes, buscando discutir os seguintes enfoques: a) Qual a relação da atuação profissional do palestrante com as Ruínas Engenho? b) No que as Ruínas se diferenciam dos demais bens culturais que desenvolvem trabalhos análogos no país? c) O que os trabalhos e as atividades desenvolvidas no espaço das Ruínas diferem de trabalhos semelhantes em outros espaços? d) Na condição de público o que você gostaria de encontrar num lugar como este? e) Como a atividade da qual você faz parte pode colaborar direta ou indiretamente na manutenção da

No total esta edição registrou a presença de centenas de visitantes nos cinco encontros realizados. Com uma ampla divulgação e acompanhamento da mídia local (cinco retransmissoras de televisão: Globo, SBT, Rede TV!, Bandeirantes e Santa Cecília TV), dois jornais, um de circulação nacional e outro local (O Estado de S. Paulo e A Tribuna), além da imprensa da universidade, o programa atingiu seu propósito: divulgar e apresentar ao público como funcionam as visitas monitoradas e qual o papel do Monumento Nacional Ruínas Engenho

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preservação deste bem? A inauguração do Portas Abertas Julho de 2006 contou com o depoimento do arquiteto responsável pela elaboração do projeto da Base Avançada de Cultura e Extensão, prof. Dr. Julio Roberto Katinsky. Na oportunidade, o professor relatou sua experiência à frente do Conselho Curador das Ruínas e toda sua proximidade afetiva com este local, de sua primeira incursão na Baixada Santista por motivo das Ruínas até sua gestão à frente do bem.

O segundo a relatar suas experiências foi o também arquiteto Bechara Abdalla, representante da Prefeitura Municipal de Santos no Termo de Compromisso Técnico de Manutenção e Preservação das Ruínas, firmado com a USP. Com vasta experiência na preservação de patrimônio histórico, por sua atuação junto ao Conselho de Patrimônio Cultural santista, sua palestra foi recheada de informações interessantes sobre a trajetória das Ruínas nas últimas décadas. Naquele momento o arquiteto presidia o Conselho de Proteção ao

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Patrimônio Cultural de Santos – Condepasa. A terceira palestra contou com a presença da engenheira e professora universitária Zildete Prado, docente da Universidade Católica de Santos, parceira das Ruínas em alguns projetos pedagógicos levados a cabo desde o início do ano de 2006. Sua fala registrou a relação de parceria que as universidades vêm firmando nos últimos dois anos. Comentou ainda a necessidade da manutenção de convênios que possibilitem aos jovens universitários conhecer e atuar junto à preservação deste bem, orientados a partir de projetos que revertam benefícios à população adjacente. De maneira a explorar as mais amplas áreas de atuação, a equipe de educadores das Ruínas convidou o poeta Eguinaldo Hélio de Souza, conhecido letrista vicentino que apresentou ao público presente um pouco de sua trajetória dentro e fora da poesia. Seu relato enfocou o caráter essencialmente interdisciplinar das Ruínas. Espaço em que poesia, linguagens, cultura, história, preservação e memória se encontram cotidianamente.

anos, Maria José trouxe a reflexão do papel e da postura profissional do educador, uma vez fora do âmbito escolar. Seu depoimento, pleno de histórias emocionantes e engraçadas, encerrou o ciclo de participações fundamentando a proposta central deste programa: ampliar o conhecimento sobre as práticas profissionais e educacionais através das relações que fazem deste espaço um fórum privilegiado de discussões e atuações pedagógicas. Confira ao longo desta publicação a edição de parte destes depoimentos.

2007 – Crescendo com as experiências Edição de verão de 2007 A edição de verão do Portas Abertas 2007 recebeu um público maior se comparado às edições anteriores. Entre os dias 21 de Janeiro e 15 de Fevereiro, as Ruínas foram novamente palco de atividades variadas. Houve o depoimento do historiador Marcos

Em consonância ao depoimento do poeta, a professora Zildete Prado analisou sua participação junto aos seus alunos de Engenharia em diversas oportunidades, em que as Ruínas foram foco de suas aulas. Neste depoimento: docência, extensão e interdisciplinaridade são o tripé de sua análise. O programa foi encerrado com o depoimento da professora Maria José Barbierato, docente de ensino fundamental da escola paulistana Cacilda Becker. Professora de escola pública há pelo menos 20

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Braga, da Casa Martim Afonso, equipamento da Prefeitura de São Vicente que abriga o Centro de Documentação e ruínas da 1ª construção de alvenaria do Brasil, que hospedou Martim Afonso de 1532 a 1533. O historiador abordou temas interessantes e polêmicos envolvendo a fundação da Vila de São Vicente e personagens importantes deste período. Outras novidades desta edição foram as atividades: “Tarde de Jogos para a Família”, “Contando Histórias

e Fazendo Educação” com a antropóloga e escritora Heloísa Pires, e a “Roda de Capoeira: movimentos e sonoridades para jovens e adultos”. Todas estas atividades romperam o caráter informacional tornando-se uma agradável situação de construção coletiva de saberes. Na “Tarde de Jogos para a Família”, familiares de toda a região compareceram municiados de muita curiosidade. O saldo foi uma tarde em que o conhecimento prévio das pessoas acabou por direcionar os caminhos por onde as discussões e as atividades percorriam. Esta expe-

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riência deve, em breve, se desdobrar em mais um programa educacional, pois a experiência ajudou a divulgar as Ruínas, como um lugar em que a família pode, ao lado de seus filhos usufruir e contemplar partes significativas de nossa história. A experiência de mesclar preocupações antropológicas com a dedicação à aprendizagem infantil sempre motivou a escritora Heloisa Pires, que em diversas ocasiões havia participado de eventos educativos nas Ruínas. Nesta oportunidade, a escritora e antropóloga percorreu milhares de anos da tradição africana com historias e historietas interessantíssimas sobre a matriz cultural daquele continente. Sempre acompanhada pelos olhares atentos da platéia mirim que veio prestigiá-la, a escritora ajudou a incentivar a prática da leitura, sorteando livros de sua autoria.Em seu Contando histórias e fazendo educação, Heloisa iniciou um processo de discussões sobre as questões da herança afrobrasileiras que, certamente, terá desdobramentos férteis nos próximas edições do Portas Abertas. Já a Roda de Capoeira, que neste ano teve um tema bastante contundente: movimentos e sonoridades para jovens e adultos, buscou preservar a memória das rodas de capoeira já tradicionais nas anteriores edições do Portas Abertas. Para tanto, diversas academias de capoeira participaram do evento, formalizando um encontro inédito de correntes que até então, jamais haviam se encontrado em uma mesma roda de capoeira. Este tornou-se um fato muito comemorado pelas academias e fez das Ruínas um lugar de congregação. Quase um século e meio após o final da escravização legal, etnia, memória e resistência voltaram a se encontrar em

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terreno propício. As tradições africanas encontram no Monumento Nacional espaço e parceria para a exaltação de seus eventos. Um encontro marcante entre crianças atendidas pela Secretaria de Assistência Social de Santos e moradores da tradicional Casa do Sol (terceira idade) aconteceu durante o “Sarau: açúcar em prosa e verso”, com música, dança, recitação e audição de trabalhos e obras em prosa e verso envolvendo temas relacionados à cana-de-açúcar. Houve

ainda depoimento da educadora Dayana Santana Nascimento sobre “O Bem Cultural e a Inserção Social de Programas Educativos” e “Quem Canta Seus Males Espanta”, roda de músicas populares e parlendas, com a participação de crianças e adolescentes dos Centros Comunitários Arco-Íris e Canto do Macuco. O Portas Abertas de Verão 2007 foi encerrado com a atividade “Pensando a Cidade: trabalhando com mapas afetivos”, quando os educadores do bem cul-

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tural utilizaram mapas antigos e imagens de satélite para criar com os visitantes diversos mapas afetivos. Os mapas afetivos nada mais são do que intervenções que a criança, ou o visitante, realiza junto aos mapas, traçando os caminhos que realiza no seu dia a dia. Então, surgem caminhos que vão da escola para o bairro, da rua de sua casa ao clube, da escola ao seu lugar de lazer etc. Esta atividade visa, além da percepção geográfica, dotar o visitante e ou o aluno de uma percepção espacial que lhe permita interagir com os lugares e as paisagens identificadas

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no mapa, ampliando as vivências. Edição de inverno de 2007 Entre os dias 18 e 22 de Julho, centenas de visitantes participaram do programa Portas Abertas, que nesta edição proporcionou uma “Caminhada Poética: visita especial às Ruínas mesclando história, versos e música,” com a Sociedade dos Poetas Vivos, e mais um sarau, desta vez intitulado “Encontro e Vivências”. Nestas duas atividades

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inauguradoras da edição 2006 houve a presença maciça de moradores dos arredores das Ruínas. A “Caminhada poética” congregou visitantes de várias gerações e se estabeleceu como o grande momento de encontro de gerações que viram de diferentes maneiras as trasnformações urbanas desta região. Houve ainda novo depoimento da antropóloga Heloísa Pires, renomada escritora de livros infantis, trazendo novas “Histórias e Africanidades”. Em seu depoimento, eivado de histórias curiosas e engraçadas (a autora é uma contadora de histórias nata), lançou mão de estratégias que prenderam a atenção da platéia infantil. Informativas e reveladoras, as histórias lembradas por Heloisa Pires tornaram-se o embrião de outros projetos, em breve anunciados nas próximas edições do Portas Abertas. A novidade desta edição foi o “Click Ruínas”, dedicado à fotografia, oportunidade para que distintos olhares registrassem cenas e momentos do Monumento Nacional. O “Click Ruínas” foi uma oficina de fotografia em que o visitante procurava ângulos diversificados das Ruínas, lançando sua sensibilidade a partir dos instantâneos de sua máquina fotográfica. Depois, as fotos digitais foram descarregadas no computador e projetadas em um telão, possibilitando o acompanhamento de todos, como se fosse uma exposição criada naquele instante. A instantaneidade deste processo garante a presença da autoria na foto: este, elemento fundamental no protagonismo de quem está criando e construindo conhecimento. Cabe ressaltar que esta oficina será mais bem estruturada, podendo em outras edições, o visitante levar pra casa a impressão de sua fotografia.

O programa foi encerrado com uma apresentação da Associação de Capoeira Valtinho da Senzala, (uma das associações pioneiras da baixada santista) e uma oficina de pipas para crianças, jovens e adultos. Tanto na oficina de capoeira quanto na de pipas, diferentes gerações se congregaram, mostrando que o espaço das Ruínas não é apenas o da preservação, mas, sobretudo o da renovada utilização. No caso específico da roda de capoeira foram contadas histórias que colocam o negro no centro das questões raciais e econômicas deste país, focando a história da escravização e das heranças culturais que a africanidade legou aos brasileiros. Lugar perfeito para se repensar e refletir sobre como o homem usurpou e utilizou o próprio homem visando sobressair-se economicamente, as Ruínas passam a fazer parte do circuito oficial de apresentação de várias associações culturais de capoeiristas. Misto de resistência e lugar de memórias, as Ruínas se consolidaram, neste Portas Abertas, como um espaço aberto para que as novas gerações repensem as relações humanas ao longo da história. Pois, é preciso que fique patente: as senzalas dos engenhos ainda têm muito a nos contar.

2008 – A consolidação de um modelo Edição de verão de 2008 No ano em que comemoramos os 50 anos do Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos sob a administração da USP, o programa Portas Abertas verão 2008, realizado no período de 15 de janeiro a 7 de fevereiro teve a participação

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efetiva do público, sobretudo dos moradores adjacentes às Ruínas, o que sinaliza uma importante mudança no comportamento da comunidade envoltória com relação ao Monumento. É preciso que fique registrado que nos últimos quatro anos, a equipe de educadores das Ruínas vem organizando programações visando a interação com a comunidade, que ficou afastada do bem por décadas, justamente por acreditar que este era um lugar proibido. De fato, ao longo da década de 1990 as Ruínas ficaram interdi-

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tadas ao público. No entanto, devemos lembrar que este período foi marcado por duas grandes intervenções da universidade que objetivava preparar o bem para a visitação: inicialmente, foi neste período que o projeto arqueológico realizado no local registrou suas maiores descobertas. Também foram nesta etapa realizadas as contenções nas encostas do morro que protege a edificação, bem como nas paredes das próprias ruínas, o

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que visava a proteção e a segurança dos visitantes. Consolidadas estas etapas, a partir de 2004, e com um foco marcantemente educacional, as Ruínas voltaram a ser abertas à visitação. O programa Portas Abertas é, portanto, um marco significativo desta mudança de postura da universidade com relação ao bem e à comunidade, entendendo que é com a preservação e participação ativa e afetiva de todos que este bem permanecerá resguardado das intempéries do meio e dos próprios homens. Nesta edição, uma espécie de resumo de tudo o que havia sido implementado contemplou os visitantes com uma programação diferenciada das anteriores. O Portas Abertas verão 2008 serviu como um balanço geral das ações implementadas até o presente. Atividades já tradicionais ganharam novos contornos. Assim, a já consagrada roda de capoeira teve nesta edição o seguinte tema: “entre atabaques, berimbaus, histórias e gingas”. O mote desta vez foi contar por meio de histórias e músicas africanas como o ritmo e a melodia influenciaram não só a consolidação da capoeira, mas, sobretudo serviu como forma de protesto da manifestação cultural afro descendente no país.

escravização. O tema da liberdade e da resistência foi repetidamente discutido em atividades ao longo da edição de verão. Especialmente nas tardes em que foram desenvolvidas atividades denominadas: “Tarde das Inteligências Múltiplas” e “Tarde com Jogos Diversos”, em que houve a participação maciça dos visitantes. Na tarde das múltiplas inteligências houve a interatividade do público, ao recriar o final do filme nacional “Abril Despedaçado”. Paralelamente a estas atividades, outra experiência valorosa se deu na tarde em que diversos jogos

Com o convite: “Venham descobrir que as palavras constroem mundos inimagináveis!” a tarde poética da edição 2008 recebeu dezenas de visitantes, que na ocasião puderam acompanhar a caminhada poética ao longo do teatro das Ruínas, que serviu de cenário para as declamações apaixonadas e contestadoras. Mais uma vez as Ruínas foram o estímulo para que os poetas declamassem trechos de poemas e fizessem leituras de textos consagrados, todos contextualizando a história e o período da

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foram disponibilizados aos visitantes (RPG, xadrez, dama, gamão, dominós). O mote foi escolher seu próprio jogo e ensinar aos companheiros como jogar. Discutiu-se também a necessidade de programar jogos cooperativos ao invés de jogos concorrenciais na ação pedagógica das atividades desenvolvidas junto às Ruínas. Na atividade “Leituras de mundo! Uma tarde dedicada à leitura” foram disponibilizados centenas de

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títulos de livros e revistas, para várias idades. Nesta ocasião os visitantes passaram a tarde lendo em diversos espaços das Ruínas, contemplando o silêncio e as paisagens do local. Os ecos das histórias deste espaço ecoaram pelas leituras dos visitantes. Finalizando a edição, as atividades: “Oficina de imaginação: uma história puxa a outra!”, que consistia em criar em grupos diversas histórias incentivadas por um caso qualquer, sobretudo com relação ao

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Engenho dos Erasmos, e o tradicional Sarau das Ruínas, abrilhantaram o final da edição do Portas Abertas verão 2008. Como acréscimo das atividades foi inaugurada a sessão diária da Documenteca – acervo de documentários nacionais e internacionais que tinham em comum questões referentes à realidade social-econômica dos dias atuais. Sempre seguida por debates acalorados, as sessões da Documenteca inauguraram a possibilidade de uma interação mais crítica por parte dos visitantes junto às questões relativas ao bem cultural. Longe de serem apenas contempladores do local, os visitantes, a partir destas atividades, passaram a enxergar o bem de forma mais atuante, logo, mais significativa e protagonística.

expressos nos fotogramas de cada visitante configuram o Monumento Nacional como um espaço de portas abertas ao novo e à tradição, à memória e às histórias de todos. O Programa Portas Abertas se efetiva assim como um marco na consolidação cultural e educativa da região. Venha nos conhecer! As Portas estão Abertas!

Neste sentido, ao relacionarmos a primeira experiência do programa Portas Abertas (“Tateando um projeto possível”) à experiência desta recente edição, superando os percalços que só nos ajudaram a engrandecer nossos esforços (“Crescendo com as experiências”) percebemos que a consolidação deste modelo deve-se, antes de tudo, à possibilidade de interagirmos com outras forças afirmativas de construção do conhecimento humano. Ao longo destes quatro anos foi possível estabelecermos parcerias com diversos órgãos e instituições educacionais e socialmente comprometidas, o que só aumentou nossa responsabilidade enquanto mantenedores de tais projetos em andamento. A satisfação de percebermos que estas parcerias encontraram nas Ruínas espaço para suas atividades, assim como para suas discussões e atuações educativas, nos faz cada vez mais cientes do papel transformador desta iniciativa. As leituras de mundo, as sensações individuais e coletivas e os clicks de realidade

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Eguinaldo Hélio de Souza

“Vindo ao Engenho você percebe que as pessoas que aqui trabalham têm aquele amor pelo que fazem, e isso contagia! (...) elas entendem o valor que isso aqui tem! E nos transmitem isso como necessidade de preservação!” Eguinaldo H. de Souza

Eu gostaria de agradecer pelo convite especial e esta oportunidade de expor a minha experiência com o Engenho. No entanto, eu vou começar pelo final. Este aqui (livro em mãos) é o livro que nós lançamos em parceria com a Secretaria de Cultura de São Vicente no ano passado e que se propôs a contar a história de São Vicente de uma maneira diferenciada: a partir de versos. Diferentemente do que você aprende na escola, a história que eu gostava era a que contava a vida das pessoas com suas características peculiares, com suas peculiaridades pequenininhas, pois é isso que nos chamam a atenção e eu havia comprado um livro do Heródoto e deixei lá, por anos até que um belo dia eu o folheei e li um trechinho e vi que ele escrevia sobre os fatos engraçados e curiosos e me apaixonei por essa exata maneira de contar a história. E quando eu comecei a estudar a história de São Vicente e comecei a ver as belezas de suas pessoas e histórias me apaixonei novamente. Então, comecei a fazer poesias sobre isso tudo, contando, inclusive, uma história do Martim Afonso chegando aqui. Na historinha, o personagem principal conversa com um dos seus marinheiros e com um índio: os três juntos e tudo em versos. Portanto pensei em escrever uma história de São Vicente em versos. E, em 2005 eu levei o projeto avante. E esta história tem tudo a ver com minha estada aqui no Engenho. Foi muito curioso porque quando eu vim aqui pela primeira vez eu conversei com o educador do patrimônio e ele me mostrou alguns livros e sem querer eu levei um dos seus livros pra minha casa (um do Hans Staden – que foi um alemão que visitou essas terras e que provavelmente visitou este engenho) Devorei o livro e aprendi ainda mais sobre isso aqui e assim começou minha relação afetiva com o Engenho. A verdade é que você pega o espírito da época, como eles viviam, então eu levei os esboços do livro para o secretário de cultura de São Vicente e ele gostou e me apoiou. Então, com relação ao engenho eu sempre vinha e sempre achava isso uma coisa muito valiosa. Você imagina só que os incas do Peru vinham até São Vicente nesta região e que depois esse caminho torna-se conhecido pelo caminho do

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ouro então, nesse período é o que eu acho mais curioso. No segundo período, que trata do Bacharel de Cananéia, que também é curioso, porque ele era um degredado.. e que se muda para a região, faz comércios de escravos índios, deixa muitos genros que vão começar a história da região, ele na verdade é uma espécie de pré-história da região, e ele já estava aqui. E depois entramos no período do Martim Afonso, que é uma história curiosa. Quando ele vem pra cá ele queria ouro, então a primeira coisa que ele faz é procurar ouro através do rio da Prata, mas é frustrada sua incursão naufraga, quase morre e então decide voltar para São Vicente. Porque essa região? E hoje a gente olha assim o valor desta história. Porque aqui? Porque há todo um contexto, isso porque era a chance de aproveitar todo o núcleo deixado aqui pelos descendentes do Bacharel, toda a infra que já havia e também devido ao Peabiru, caminho para as terras do Rei Branco, então, Martim manda uma expedição à essas terras do tal Rei Branco e fica aqui aguardando a expedição, porque um dos genros do Bacharel, o Francisco Chagas, lhe disse: me dê 400 homens e voltamos cheios de ouro: e foi o que houve, mas não houve ouro. Então, aqui, Martim sobre a serra com o Tibiriçá, junto com o João Ramalho, que é outro personagem que está aqui antes do próprio Martim Afonso, João Ramalho que se casa com Bartira, a índia, que dá origem a toda uma linhagem e então, Martim funda São Vicente e ajuda a fundar o Engenho, de onde tirei inspiração para um poema sobre o Engenho, intitulado: De onde mana leite e mel, e que se parece com esta figura pintada por Carlos Fabra, um pintor uruguaio (mostra a figura que está num dos livros que ele publicou sobre São Vicente) ele era apaixonado pela história de São Vicente. Ele pintou acho que 36 telas sobre São Vicente e sobre o Engenho. A prefeitura comprou seus quadros e tempos atrás houve uma exposição destes quadros junto com os poemas e, até é curioso que no dia da exposição você conseguia captar a atmosfera da época juntando poesia e imagem. E então, um dos poemas que eu quis colocar lá foi sobre o Engenho justamente porque fala da riqueza inicial e nesse sentido são ótimas as publicações da Usp sobre o Engenho, como o Caderno Lap 4, com estudos só sobre o engenho e eu utilizei muito isso para pensar a poesia e dar o contexto da época. Então, voltando à história de Martim Afonso: você pensa que se havia várias capitanias e apenas duas deram certo (uma delas São Vicente) e que prosperaram devido aos Engenhos, perceberás a importância disso aqui tudo, e então verás que a grande indústria era o açúcar. E enquanto Martim Afonso esperava a volta dos seus homens ele recebeu uma notícia pior ainda: que os espanhóis haviam conquistado o império Inca: ou seja, não havia mais ouro para os portugueses naquelas paragens e então, por isso, ele vai embora mas ele deixa uma infra aqui, e durante anos São Vicente serve como celeiro, lugar de abastecimento então se você imaginar, quando você põe uma fábrica no lugar tudo começa a girar em torno dela. Foi assim também com o Engenho em São Vicente então se vocês me permitirem lerei o poema que não mostra apenas sobre o engenho, mas como ele se torna um lugar de suma importância: (ver livro: Epopéia Vicentina: p.155). Veja, a verdade é o seguinte: o que você põe no poema é

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bem menos do que você captou e o segredo é sintetizar seu conhecimento em palavras que caibam em poesia. Isso é um desafio. É preciso dizer que não era esse o único engenho na região: pelo menos há ainda mais dois, ou três mas eram todos parte de uma indústria construída em cima da cana de açúcar para exportação e durante minhas pesquisas encontrei livros bem antigos e destaco este: História da América Portuguesa, do Rocha Pinto e justamente na hora em que eu abri ele contava o seguinte: – ele escreve isso em 1730 – e diz que em São Vicente depois do século XVIII há dificuldades de início eu comprovei esta prosperidade de abastecimento que era São Vicente e isso me chamou muito a atenção. Tanto que anos depois fui rever o livro para saber se era isso mesmo que ele havia falado e a visão que ficou é que quando você resgata a história, você começa a criar uma identidade. Como se fosse aquele conto da pessoa que acordou e não lembra nada o que aconteceu com ela antes daquele dia, nem como veio parar aí, não conhece nada, nem as pessoas. Então ela perde a identidade. É como se ela estivesse perdida. É uma reconstituição histórica em qualquer grau e o valor dela é justamente este. Veja esta questão: Por que foi construído este engenho? Você vai dizer que era um lugar estratégico e tudo mais, e então, você começa a pesquisar e saber cada vez mais, até que parece estar dentro de um livro de história conforme vai-se andando no tempo É curioso não é? Hoje não temos mais a vista do rio São Jorge mas, temos alguns mapas aqui que mostram o rio daqui de perto, rio este por onde se escoava toda a produção. Tudo era uma questão estratégica e você vai conhecendo a identidade deste lugar e começa a lamentar: como é que as pessoas podem deixar de se interessar por um lugar como este? Eu me lembro que eu pegava os folders deste lugar e ficava perguntando para as pessoas se haviam ido, se conheciam e elas nada!!! E você passa a ver o valor que existe numa construção como esta. Não é uma coisa só pra acadêmicos que usarão isso num contexto acadêmico, mas para as pessoas comuns – como eu ou você. E em cima disso, diante dessa experiência resolvi escrever outro livro: neste, que deve demorar um pouco, mas valerá a pena, será analisado o Engenho de outro prisma. Senão vejamos, quando a gente conhece um lugar como este, a primeira coisa que vem a nossa mente é viajar no tempo e então você desenvolve teorias do que havia aqui naquela época etc e tal. Então, pensei como seria bom se tivéssemos uma máquina do tempo, que é um tema muito explorado, mas imaginem isso no contexto do Engenho (tal como no famoso A viagem no tempo do HG Wells). Então, o mote deste novo livro será a possibilidade de viajar no tempo. Pode ser complexo,mas pensei: ao invés de viajar no tempo com uma máquina criarei uma janela, a janela do tempo e, então, vamos imaginar que, através de uma tela possamos olhar e ver aqui (in locus) o que havia há 200, 400 anos atrás. Então, amigos do Engenho, a idéia do livro é justamente esta: uma pessoa que conhece uma dessas janelas do tempo por onde ele pode olhar através dela e descobrir como eram as coisas no tempo

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em que o primitivo Engenho dos Erasmos funcionava Pura ficção, não é, mas a idéia é esta! Vou tentar saber o que havia naquele poço ou fosso lá na frente etc, e meus personagens ajudarão a lançar mais questões ao imenso hall de perguntas existentes hoje. Tudo isso para tentar despertar as pessoas neste aspecto de conhecer, resguardar e cuidar, não é mesmo! Porque é uma curiosidade nossa: o historiador, de alguma forma, precisa imaginar como seria no tempo em que ele estuda, só assim conseguirá dispor de fermentas para interpretar tudo isso. Portanto, baseado nas teorias científicas que atestam podermos viajar no tempo, será realizado este livro. Espero mais a frente, em outro momento trazer o livro pronto para celebrar ainda mais este maravilhoso programa que é o Portas Abertas.

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Profª Maria José Barbierato

“(...) acreditava que realmente uma criança de quinta série podia aprender história apenas com teoria, com conceitos... e com isso eu consegui que as crianças me detestassem (...) então, fui buscar uma nova maneira que fosse agradável e divertida para ensinar história...! Hoje, aqui, eu vejo os dois: teoria e prática juntos. É isso que busco... é isso...” Maria José Barbierato

Foi me pedido para falar a respeito de minha relação com as Ruínas e o trabalho que fazemos com as crianças. Bem, eu sou professora de história e trabalho integrada com meu colega, professor Paulo de Educação Artística, e a professora de Língua Portuguesa. Eu acredito que minha relação com as Ruínas se dê a partir, da idéia de que as Ruínas são documentos materiais que comprovam que o passado existiu realmente. É, em minha opinião, uma maneira de definir e dizer: “olha: os engenhos existiram sim, um deles está aqui e aquelas pedras, o fosso comprovam isso!”É algo palpável para as crianças, por isso é importante. Eu acredito que antes que eles saiam por aí se plugando na Internet eles precisam saber quem eles são. A história do país onde vivem, e para isso precisam além de me ouvir em sala, além dos livros para-didáticos:“O Engenho Colonial”, por exemplo, eles precisam ver, pegar, sentir, precisam aprender pelo olhar! Eu estava dizendo aos educadores, na nossa viagem que eu aprendi isto depois de cometer inúmeros equívocos. Não vou chamar de erros porque fiz com tremenda boa intenção: acreditava que realmente uma criança de quinta série podia aprender história apenas com teoria, com conceitos já prontos, e com isso eu consegui que as crianças me detestassem (risos). Sim, é verdade! Estava, certa vez, escrito na lousa: “Zezé, nós odiamos você!”. Porque a antipatia que eles tinham pela disciplina história com tanta teoria que eu queria enfiar na cabeça deles acabou sendo transferida para mim! E eu fui buscar uma nova maneira que fosse agradável e divertida para ensinar história. Então, fiz inúmeras viagens à coordenadora pedagógica para pedir pra mudar o foco das aulas Ao invés de começarmos a estudar história do Brasil com eles na 5ª série, passamos a trabalhar com algo que fosse mais perto deles. Primeiro: quem está perto deles: eu, claro. Então, começamos com minha história, para mostrar que assim como eu, eles também têm história. Então, tinha que ser algo palpável, concreto.

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Felizmente minha mãe guardou 0,001% do meu enxoval de bebê. Pois, 99,9% ela deu para os mendigos, para a mendiga que esperava um bebê e ela presenteou. E dos meus irmãos ela guardou 90%. Enfim, começo a trabalhar, com o brinco, a pulseira de bebê, com as fraldas de pano que estão desintegrando. Mas, eu preservei partes deles, das fotos, dos vestido. E levo algumas peças de crianças novas como da minha sobrinha, que é completamente diferente das minhas, do meu enxoval. Vejam, eu tenho 50 anos e no meu tempo não havia ultra-som. Minha mãe não poderia saber se era menino ou menina, então, ela bordou em azul e branco e isso é diferente e perguntam: porque em azul e branco? E ela disse que sempre fez colorido porque assim era unissex. E as fotos que eles acham engraçado em preto e branco, coisa diferente da vida deles; ou mesmo eu de uniforme de 50 anos atrás. E eles não conseguem imaginar que aquela roupa era o uniforme, então, depois eles trazem seus apetrechos e as mães deixam trazer chupetas , meias, fotos etc então, comparamos. Foi então que percebi que assim, construindo isso a gente constrói primeiro a história de cada um para depois entrar na disciplina história propriamente dita. Então, após semanas analisando esses apetrechos e tirando conclusões eu comecei a construir com eles a noção de tempo e espaço. Então, outra sessão de fotos para mostrar que pessoas em diferentes espaços vivem o mesmo tempo histórico: tomo então emprestado fotos de bebê de colegas e faço as pontes. Jaú, Adamantina, São Paulo, diferentes espaços em tempos próximos, para avançarmos com a noção de século, e aí então, os convido a fazermos nossa primeira grande viagem, que é no museu do MAE, (Museu de Arqueologia e Etnologia da USP) porque eu acredito que um machado de pedra lascada é uma coisa sendo visto ao vivo, outra coisa é uma palavras sobre ele. Facilita muito mais a construção dos conceitos. E outra coisa que eu aprendi a duras penas com eles, me equivocando, foi que para eles, um conceito pré-estabelecido é difícil de ser entendido. Por isso que construo passo a passo com eles no concreto. Pois bem, falando nisso me vem à cabeça um fato que ocorreu na escola: fui surpreendida com uma frase: “mas quem falou que eu queria saber disso?!”. Foi difícil responder! Eu, como historiadora, me dei muito mau pensando que teoria ensinava algo para alguém, alguém desta idade. Olha até ensina, mas para mim que sou adulta, mas para criança de 5ª série não! E eu sempre assumo que errei, mesmo embora muito bem intencionada e acredito que isso tenha ocorrido com ela também. Boa intenção, erro de interpretação! Por isso que eu trabalho tão bem com a Lucila, professora de geografia que leciona para 4ª série. Fazemos, por assim dizer, um trabalho de base na 4ª série. Mas, depois de um tempo, percebi que meus alunos começaram a se tornar mais abertos, mais sensíveis, dispostos e percebi que o trabalho de base que nós fazemos é o que os deixou assim, neste estado de se abrirem pra tudo. E isso foi o início de uma relação especial dos professores com os alunos do Cacilda Becker.

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Enfim, nós ensinamos já na 4ª série não só geografia e história de maneira concreta, mas buscamos avançar em outras áreas como por exemplo o piano: usamos bastante o piano, até dando chance para aqueles que estudam música. Normalmente membros de denominação evangélica etc, então, você utiliza esse meio. Mesmo outros que tentam tocar a clave de sol ou a de fá, não tem problema, vai se tocando, assim mesmo. E levamos também os alunos às quartas musicais do Teatro Municipal de São Paulo quando eles apresentam uma orquestra de Câmara que é aquela que não é a orquestra toda, mas sim apenas uma parte dela: numa semana são as cordas, na outra metais, na outra percussão e sempre eles executam musica do cancioneiro popular. Nunca uma criança disse: “eu não vou...”, pois nós estimulamos isso: “nunca diga não antes de conhecer” e isso dá resultado. Toca lá “meu limão, meu limoeiro!”, e eles conhecem e cantam juntos, isso para que eles percebam que além do hip hop, pagode, axé, funk existem outros estilos musicais. Veja, outro exemplo: quando eu ensino os hebreus para eles, ensino com uma musiquinha chamada: “os livros do velho testamento” que, por acaso, eu ouvi tocar no domingo na minha igreja: eu pensei, nossa isso vai me servir, copiei a partitura e ensino assim e procuro cada vez que avançamos com uma disciplina, com a matéria que eu tenho que ensinar, fazer isso de maneira concreta, para eles saberem que a aula de história não é mais escutar a aula apenas, com teoria, mas utilizar de tudo. Não utilizo mais apenas teoria. Fazemos maquetes etc. e vamos fazer isso depois de visitarmos o engenho para fazerem a maquete do que eles viram aqui. Manuseando concretamente o que eles viram, pois assim é que eles aprenderão a história. Além disso, eu trabalho com a língua portuguesa, livros para-didáticos na 5ª serie, por exemplo, a Coleção Cotidiano de História, e por isso trabalho com ela. Na 6ª eu ouso mais: no primeiro semestre quando lecionei a história medieval, quando cheguei na transição do feudalismo para capitalismo eles leram Dom Quixote!!! e eles adoraram. Só uma criança que escreveu na prova que esse tal de D. Quixote era apenas um velho louco!!! (risos) É a sua opinião, eu respeito, embora discorde! Talvez ele quisesse dizer: visionário... agora eles voltaram aqui pra rever a idéia de expansão marítima: estarão lendo a Ilha do Tesouro! É uma ponte para entender isso. Ajuda a criar o clima! É justamente neste sentido que vejo uma tremenda relação entre o que se faz aqui no Engenho dos Erasmos e nossa escola: há uma sinergia entre todas estas experiências. Sendo assim acredito que este bem cultural em particular tem se diferenciado em muito dos demais que conhecemos, não só pela sua postura pedagógica interdisciplinar, mas, sobretudo, pela postura aberta às trocas com os demais. Estabelecendo um paralelo entre as Ruínas e o MAE (eu levo sempre meus alunos lá) para discutirem a parte de mediterrâneo e médio oriente, as peças expostas lá tratam da pré história européia, Grécia, Roma e Egito, e aqui tratam do nosso passado, de nossa história, onde tudo começou, é a pré história de nossa historia. Então, há uma correlação, uma corresponsabilidade entre os educadores daqui e da minha escola. É uma fórmula que deu certo e que espero que seja repetida por muitos anos. Por isso, daqui a alguns anos, caso eu voltasse aqui para dar ouro depoimento, eu gostaria de encontrar aqui,

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além da Base Avançada funcionando e pronta, um espaço com cadeiras nesta disposição (circular) para o primeiro contato. Eu ficaria mais confortável e meus alunos já poderiam utilizar o auditório, assim, poderíamos focar mais. Então, para terminar o que eu havia começado a falar, eu estabeleci um caderno de desenho de história para que eles desenhassem tudo o que vissem nos passeios do tipo: sinagoga, museus, ruínas etc. Foi um sucesso, pois, eles sempre desenham os lugares por onde passam, e passam com isto a gostarem de história, de maneira a entenderem que a história não é uma decoreba, mas sim uma aventura e que eles vivam profundamente a aventura que é a história. Bom, pegando o gancho: me lembrei que na última visita da gente aqui foi maravilhosa. Distribuímos uns papéis de envelopes de carta para fazermos uma atividade que tinha o sugestivo nome de: “carta para mim mesmo!”, para eu não esquecer, tipo da coisa que eles escreviam algo que eles não queriam esquecer. Acharam divertido, mas estranho: destinatário: eles, remetente: eles também, mas fizeram. Então, entregaram, e agora no começo das aulas receberão as cartas e relembrarão o que eles escreveram. Rememorando tudo o que viveram naquele dia. Foi bárbaro!!! E numa dessas cartas uma criança dizia: “ah! Eu quero me lembrar... de... de... de... ah! De tudo!!!”. Tem coisa mais gratificante que isso??? Não há! Então foi ótimo por causa disso... Eles direcionam tudo e é sinal de que vocês aqui nas Ruínas estão realmente conseguindo fazer a diferença. E é isso que a gente espera: que eles fiquem tocados pela nossa história e eu sempre comento sobre a idéia da história sobreposta: eu comento sempre sobre a estátua do Borba Gato que é bonita e majestosa, mas está toda cheia de pichação. Há de se preservar a memória do nosso país. Estava eu falando na vinda pra cá: as ruínas de Pompéia que estão até hoje lá, onde as pessoas foram pegas de surpresa pela lava do vulcão e permanecem ali, tal como antes, no momento da catástrofe, então, famílias que estavam à mesa, suas comidas etc, não há arte sobreposta, é verdade do fato! Está tudo preservado, é isso que eu quero: que eles entendam que os monumentos são parte de nossa memória e que devemos preservar isso, pois isto deve permanecer! Não tem que pichar, desenhar coração com flecha transpassada, etc o amor é lindo, mas um coração com flecha no monumento não dá! Eu vim preparada com algumas perguntas e as respostas delas, como sei que iriam me perguntar sobre isso resolvi pensar sobre. Aliás, fiz um pequeno texto: lerei! “Ruínas são documentos materiais que nos permitem introduzir questões relativas ao passado e possibilitam a discussão de vários pontos do currículo de história. Por exemplo: nas Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, sobre o começo da colonização, pode-se se discutir: como viviam as pessoas no inicio da colonização do Brasil? Que regiões ocuparam? Eram apenas para a subsistência? De que forma construíram o engenho? Como as pedras foram assentadas? Como vieram até aqui? Quem eram esses colonos? Do que se alimentavam? Como se relacionavam com o meio ambiente?”. É justamente este tipo de pergunta que vale a pena lançar mão, pois, não tem resposta pronta e faz com que eles pensem nisso não é: se envolvam a descobrir.

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Bem, foi um prazer poder vir aqui para falar sobre esta parceria tão bem sucedida. Obrigado por terem tido paciência de ouvirem a mim, confessar sobre meus erros pedagógicos, embora, com muita intenção. Me dei mal! Mas faço questão de me penitenciar e errar menos a partir de então. Eu errei com a melhor das intenções, mas, é assim. É uma ótima oportunidade para que eu repense o que é ensinar história na 5ª série. Por isso, posso lhes assegurar que as crises existenciais e pedagógicas vêm, mas passam, desde que a gente se foque na nossa melhoria. Assim, tratamos alguns alunos que você percebe que não tem vivência com a leitura, e eu peço livros para-didáticos e eles não sabem. Então, recebo telefonemas de mães que não sabem onde comprar. Bem, para a gente é óbvio: na livraria, mas eles não sabem, é um problema de base sabe e eu procuro instigá-los a ler, saber, por isso, aprendi que não se ensina com teoria apenas. Mas tive dificuldades porque a primeira vez que eu mandei meus alunos desenharem, minha chefe pedagógica me chamou às portas fechadas e me interpelou: porque você ao invés de mandar desenhar não ensina história? Desde então abri as portas. Por isso me sinto tão bem aqui neste Portas Abertas. E eu quero que eles me encostem na parede mesmo, é assim, quando eu não souber respostas, não direi: “faça pesquisa”, trarei as respostas mais cedo ou mais tarde com a ajuda deles. E é assim que eu acredito. Vamos desmanchar e recobrir tudo? Ou vamos ensinar a fazer? Vejo que seja por aí! Muito obrigado.

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VI.

Cronologia

por Rodrigo Christofoletti

50 anos de administração das Ruínas pela USP: Aspirações alcançadas, prioridades consolidadas

1958

31/01/1958 – Doação do terreno onde se situam as Ruínas para a Universidade de São Paulo. Documento Processo: 3591/55. Publicação do artigo de José Ribeiro de Araujo Filho. 4º Centenário da assinatura da escritura do engenho São Jorge dos Erasmus. Revista de História (35) 383-5, jul-set 1958. Intervenção do arquiteto Luis Saia na restauração do pavilhão que hoje leva seu nome.

1960

Publicação do artigo de Maria Regina da Cunha Rodrigues A documentação antuerpiana do Engenho São Jorge dos Erasmos e o professor Herman Kellenbenz. Revista de História (SP) 11 – 43 199-201, jul-set 1960.

1963

Publicação do artigo do arqueólogo Carl Laga. O Engenho dos Erasmos em São Vicente: resultado de pesquisas em arquivos belgas. p.13, nº 1 – junho de 1963. In: Revista de Estudos Históricos. Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Assis, 1963. Tombamento do Engenho dos Erasmos pelo IPHAN - 26/06/1963 - Processo 678 t.

1967

Publicação do artigo de Maria Regina da Cunha Rodrigues. Engenho dos Erasmos. Estado atual dos problemas de preservação das ruínas e considerações sobre a documentação antuerpiana dos arquivos belgas. Revista de História (25) 229-98. jul-set, 1967.

1968

Publicação do artigo de Eddy Stols. Um dos primeiros documentos sobre o engenho dos Schetz em São Vicente. In: Revista de História (37) 407-19, 1968. Sancionada a lei municipal nº 3533/68 que previa a preservação do sitio e a instalação de um museu histórico na área do Engenho dos Erasmos.

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1973

Publicação da série de cinco artigos de Costa e Silva Sobrinho. Martim Afonso de Souza e o Engenho São Jorge dos Erasmos. A Tribuna – Santos 12 e 21 de agosto, 11 de setembro, 16 e 30 de outubro de 1973.

1974

Tombamento do engenho pelo CONDEPHAAT (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo), conforme processo n° 362/73, em 11/12/1974.

1983

Publicação do Relatório SPHAN, assinado por Jaelson B. Trindade. Engenho São Jorge dos Erasmos (ruínas do). SP, 09/03/1983. (inédito)

1987

As terras envoltórias ao engenho começaram a ser vendidas, como foi o caso da parcela adquirida pela empresa VIP Empreendimentos Imobiliários Ltda. que, não respeitando o raio de 300m do bem tombado, iniciou serviço de terraplanagem e desmatamento do terreno contíguo ao engenho. Tal procedimento acelerou a deterioração de parte do solo adjacente às Ruínas (porção noroeste), episódio em que a empresa revirou toda a parte rochosa da planta baixa do terreno, danificando para sempre esta parte do sitio arqueológico. A empresa PRATEX, adquiriu junto da VIP Empreendimentos Imobiliários as terras onde estão as Ruínas, e após projetos rejeitados pela prefeitura de estabelecer no local empreendimentos imobiliários estabelece acordo para a doação das terras à prefeitura, que repassou ao usufruto da Universidade, conforme convênio assinado por ambas.

1990

Publicação de Paul Meurs: Engenho São Jorge dos Erasmos: estudos de preservação. Cadernos LAP. CPC – 1990. Tombamento do Engenho dos Erasmos pelo Condepasa (Conselho de defesa do patrimonio de Santos) em 21/05/1990.

1992

Foi firmado o Termo de Cooperação Técnico Administrativo entre a USP e a Prefeitura de Santos visando a realização de pesquisas e escavações arqueológicas, coordenadas pela Profª do Museu Paulista – USP, Margarida Davina Andreatta, que resultou no projeto interdisciplinar Engenho São Jorge dos Erasmos.

1994

Formação de uma Comissão para a elaboração de um projeto de recuperação e preservação do Engenho São Jorge dos Erasmos formada pelos professores: João Baptista Borges Pereira, José Sebastião Witter, Ana Maria Marangoni, Norberto Guarinello, Cecília Helena Salles de Oliveira e Margarida Davina Andreatta.

1996

Inicio das escavações arqueológicas na área que aconteceram até 1999. Defesa da dissertação de mestrado de Fernanda Maria Felipe dos Anjos. O Caminho do açúcar, cotidiano, trabalho e cultura material. A circulação da produção nas Ruínas do Engenho S. Jorge dos

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(...) 1998

Erasmos. SP – FFLCH, 1996, orientação Margarida Davina Andreatta. Gestão do Prof. Dr. Julio Roberto Katinsky: consolidação das encostas e restauração do Pavilhão Saia. Escavações do Projeto Arqueologia dos Erasmos – coordenada pela arqueóloga Margarida Davina Andreatta (MP-USP). Filmagem das escavações de parte do sitio (cemitério) que redundou em um documentário.

1999

Publicação do livro “Bens imóveis tombados e em processo de tombamento da USP”, edição que traz os bens tombados da universidade, com destaque especial para as Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos. Publicação da Revista Usp. Edição 41. Dossiê Engenho dos Erasmos. mar-abril de 1999. Projeto de recuperação das Ruínas – Maquete escala 1:1000 exposta no Pavilhão Saia. Elaborada pelo Laboratório de Modelos e Ensaios LAME – da FAU-USP – Ana Carolina Louback Lopes, Isabel Xavier da Silva, João Clark de Abreu Sodré, sob a orientação de Julio Roberto Katinsky. Projeto básico de estabilização das encostas – drenagem superficial e profunda, elaborada pelo engenheiro e professor da Escola Politécnica/USP Claudio M. Wolle.

2001

Início da realização das obras provenientes da separação e recolhimento dos remanescentes arqueológicos sob as ruínas. Inicio da criação do videodocumentário sobre o Engenho dos Erasmos, dirigido por Silvio Cordeiro e a empresa Olhar Periférico, juntamente com alunos da escola Gracinda Maria Ferreira, intitulado: Engenho dos Erasmos – imagens da redescoberta. Publicação do Relatório Arqueologia dos Erasmos – Projeto financiado pela FAPESP e assinado pelos arqueólogos Margarida Davina Andreatta (MP-USP), José Luis de Moraes (MAE-USP), Elaine Veloso Hirata (MAE- USP), Eliete Pythágoras Britto Maximino (IPARQ-UNISANTOS) e pelo arquiteto Julio Roberto Katinsky (FAU-USP).

2002

Criação do Plano de Gestão 2002-2004, por Maria Cecília França Lourenço, assessorada por Marilena Pires, da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária. Em janeiro de 2002 foram retiradas das ruínas construções posteriores para abrigo da guarda e zeladoria, ficando estes serviços provisoriamente acomodados em contêineres. Constituição do primeiro Conselho Curador (19/06/2002), formado por especialistas da USP e

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(...)

representantes da comunidade local, de modo a permitir o debate e a troca sobre as atividades realizadas e os rumos a serem adotados. Publicação, em agosto de 2002 do artigo de Eliana Hirata: “Arqueologia e educação: um projeto para o Engenho dos Erasmos”, na sessão Archelogia Brasiliana, do XXVI Convegno Internazionale di Americanistica – Programa de São Paulo – Centro Studi Americanistici. Coordenação e Beatriz Borba Florenzano. Engenho dos Erasmos – Viagem à Bélgica, relatório acadêmico. MAE – USP, relatório elaborado pela professora Drª. Elaine F. Veloso Hirata, e os pesquisadores Silvio Cordeiro e André Costa.

2003

No dia 2 de dezembro foi firmado o interesse da USP em construir em Santos uma Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária/USP. Na mesma solenidade foram assinados os primeiros convênios de parceria com as cidades de Santos e São Vicente.

2004

Publicação do artigo: MORAIS, José Luiz, PIEDADE, Silvia Cristina, PYTHAGORAS, Eliete, BM. Arqueologia da terra Brasilis: o Engenho São Jorge dos Erasmos, na Capitania de São Vicente. In: Revista de Arqueologia Americana, (jan.2004). Defesa do TFG em arquitetura do aluno, Apoena Amaral e Almeida, intitulado: Parque Museu Arqueológico Engenho dos Erasmos – Santos – FAU-USP – TFG, sob a orientação de Alvaro Pauntori. Preparação para o exame de admissão dos dois educadores concursados. Elaboração do Projeto VouVolto da Profª. Dra. Maria Cecília França Lourenço, com as linhas gerais do Programa Educacional. A criação de dois cargos para educador e todo o processo seletivo para suas posteriores contratações. A elaboração, pela equipe de educadores, das especificidades do Programa de Visitas Monitoradas previstas no projeto e de seu “Marco Lógico”. A edição de uma publicação voltada para o profissional do ensino das redes municipais e estadual interessado em obter maiores informações sobre o bem cultural e a respeito das ações educativas desenvolvidas, além do procedimento previsto para agendamento de visitas; atividade auxiliada por Sônia Graffietti, da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária. Processo seletivo para a contratação de dois educadores tendo comparecido 138 concorrentes, em concurso realizado na cidade de Santos, com conteúdo abrangendo as cartas patrimoniais, o que

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(...)

permitiu selecionar um na área de História e outro na de meio Ambiente, atuantes desde agosto de 2004. Juntamente com André Muller de Mello e Rodrigo Christofoletti, educadores concursados pela USP também passaram a integrar os projetos educativos das Ruínas os seguintes educadores: Pela Secretaria de Educação de Santos: Adriana Campos, Andréia Candeia, Cristiane Eugenia Amarante, Maria Del Carmen Blanco Dumarco, Débora de Lima Marreiro, Sandra Regina Pereira. Pela Secretaria de Educação de São Vicente: Mauro Sergio dos Santos Silveira e Ana Paula Gesteira. Renovação do convênio com a Universidade Católica de Santos – UniSantos, visando também integrar as atividades com o conteúdo de disciplinas. Os educadores concursados da USP elaboraram então um conjunto de premissas, denominadas Plataforma Sophia, cujo lançamento ocorreu ao final de 2005. Início do Programa Portas Abertas. Estreitamento de laços com as Secretarias de Planejamento e de Turismo dos municípios de Santos e São Vicente. Atualização do site das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, incluindo a publicação de novas fotos e o registro das visitas. Impressão de mais uma tiragem de folder explicativo dos condicionantes históricos e ambientais das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos (trazendo os relatos dos viajantes). Relatório 2004 para a Assembléia Legislativa encaminhado em dezembro Formalização dos convênios com as Secretarias de Educação de Santos e São Vicente. Visita das seguintes instituições de ensino: EE Gracinda Maria Ferreira, Colégio Santa Cruz – São Paulo, Escola Novos Caminhos,EMEF Dr. Fernando Costa, Liceu Santista, EE Margarida P. Rodrigues, UNIP, UNISANTA, UNISANTOS, UNIMES, EMEF Lions Clube – SV, Mackenzie – São Paulo.

2005

Posse do novo Conselho Curador. Contratação de um estagiário que assume a criação da identidade visual dos projetos. Seria substituído anualmente conforme contrato de estágio até o ano de 2008. Foi lançado o vídeo-documetário do Programa de Visitação do Projeto VouVolto, elaborado pelo Laboratório de Vídeo (videofau) da FAUUSP. Extensão e início das reuniões da UPA (Unidade de Preservação Ambiental).

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(...)

Início dos convênios com as Secretarias de Educação de Santos, São Vicente e UNISANTOS. Início da licitação da empresa responsável pelos serviços de jardinagem (varrição e conservação de áreas externas e verdes), além de finalizar a aprovação, em todas as instâncias cabais, para licitação da Base Avançada de Cultura e Extensão. Participação dos educadores das Ruínas no VI Seminário de Cultura e Extensão, realizado na Cidade Universitária. No evento foi também lançado o número 0 da Revista de Cultura e Extensão USP, com destaque para o artigo “Enredos e Segredos”, da Profª.Drª. Maria Cecília França Lourenço, escrito que revela aspectos históricos das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, bem como a importância da preservação de bens culturais para suspensão de silenciamentos. Em novembro, foi lançada a Pedra Fundamental da Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária, cujas obras têm início em Janeiro de 2006. O mês de dezembro trouxe ainda a presença dos educadores das Ruínas no “I Seminário da História do Açúcar – Canaviais, Engenho e Açúcar: história e cultura material”, promovido pelo Museu Paulista, a Cátedra Jaime Cortesão, o Centro de Estudos de História do Atlântico, a FFLCH-USP e o Instituto Camões Portugal, e realizado no Museu Republicano “Convenção de Itu”, em Itu, São Paulo. Com uma comunicação intitulada “As Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos e a integração entre história e meio ambiente: uma proposta interdisciplinar de ação pedagógica”. Do ponto de vista institucional, vale ainda ressaltar a reunião de trabalho que promoveu encontro entre educadores das Ruínas e da Casa de D. Yayá, sede do Centro de Preservação Cultural da USP, em São Paulo. Deste encontro surgiu o GEMA (Grupo de educativos, acervos e museus da USP) que seria formalizado em início de 2007. Visita das seguintes instituições de ensino: Todas as instituições de 2004 além da: ECA-USP, FAU-USP, FFLCH-USP, FEA-USP, ESALQ-USP, CPC-USP, Andarilhos do Engaguaçu, UNIMONTE, Escola Novo Tempo, CETEPS Aristóteles Ferreira, EMEF Fernando Costa, EMEF Maria Luiza Alonso Silva, Secon Canto do Macuco, Secon Arco Iris, EMEF Prof. Pedro Crescente – SV, Instituto Pão de Açúcar, EMEF Lourdes Ortiz, Escola Privilégio, Fórum Social da Zona Noroeste/ Historiando a Zona Noroeste, UNICID, UNIABC, EE José Carlos Antunes, EMEPF Acácio de P. L. Sampaio, EMEF Barão do Rio Branco, Fórum da Cidadania, Grupo Arte no Dique, Creche Cantinho da Criança, EMEF Prof. Antonio F. Reis, Instituto PROECO, EE Fernando de Azevedo, EMEF Maria de Lourdes, Borges Bernal – SV, Colégio COC – Santos, EE Zulmira C., EMEF Jorge Bierrenbach S. – SV, EMEF Dino Bueno, EMF Waldery de Almeida, Colégio Oswald de Andrade – São Paulo, EMEF Mario Alcântara, EMEF Cidade de Santos – Guarujá, Creche Candinha, EMEF Docas de Santos, EMEF Lobo Vianna, EE Padre Leonardo Nunes, Creche Gota de Leite, SESC – Santos, Colégio Dante Alighiere – São Paulo, Porto da Juventude.

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2006

Pesquisa efetuada pela presidente do Conselho Curador para levantamento bibliográfico, análise de fontes primárias e secundárias, em iconografia e em relato de viajantes para realização de material expositivo e de fascículo destinado em especial ao público estudantil, que visita o local, ampliando-se dados e interpretações sobre a vida do local e as distintas sociedades envolvidas. Contatos com as Prefeituras vicentina e santista para intercâmbio visando qualificar a visita das escolas públicas, elaboração de novas tratativas, tendo sido o convênio de Santos concretizado ao final de 2003 e o termo de colaboração de São Vicente ao final de 2005. Encontro com os seis educadores cedidos, sendo dois de São Vicente e quatro de Santos e apresentação do Projeto VouVolto. Este visa transformar as visitas em uma atividade integrada ao Plano de Ensino dos alunos, incentivando a volta destes, nos fins-de-semana, com seus amigos e familiares. O primeiro “Tema-Gerador” escolhido para caracterizar os conteúdos abordados nos roteiros de visita foi a Cana-de-Açúcar e procurou-se aferir quais as séries escolares constituiriam o público-alvo ideal. Elaboração do Projeto “Território e Transformações” de autoria dos educadores e visando público universitário, analisando intervenções no meio ambiente. Atualização e ampliação do site, efetivado em 2003. Foram realizados no período: a revisão das cercas, trabalhos sistemáticos de poda do mato, colocação de calhas, evitando-se a infiltração e erosão ocasionadas pelas chuvas nos remanescentes. Encontros freqüentes com autoridades federais, estaduais e municipais santistas. Destaque-se, em especial com as Secretarias de Educação, Meio Ambiente e Segurança dos Morros, Gabinete do Prefeito, Conselho de Defesa do Patrimônio Santista (Condepasa), Autoridades policiais estaduais e com o Ministério Público, desde abril de 2002. Procurou-se levar a bom termo um trabalho integrado e atento, para prevenir ações de desmatamento no meio ambiente contíguo ao bem e evitar atividades, que comprometam a segurança dos visitantes em geral e da população estudantil, tanto nas ruínas, quanto na escola estadual, ao lado. Acompanhamento dos preparativos para início do processo licitatório, visando selecionar a firma encarregada da obra referente ao Projeto elaborado pelo arquiteto e professor da FAU/USP, Arquiteto Júlio Roberto Katinsky, no primeiro semestre de 2004. Data de 20 de dezembro de 2005 a reunião final com os vencedores, porquanto se completou o processo necessário para a cessão do terreno, pertencente à prefeitura Municipal de Santos. A Prefeitura Municipal de Santos, após as negociações, resolveu ceder a área para a construção da Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária, digna de acolher, exposições, atividades científicas em várias áreas e para diferentes públicos e testemunhos materiais localizados e selecionados.

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Consulta às Unidades previstas, o Conselho Curador foi renovado em 2005. Consolidação, como órgão, das Ruínas do Engenho São Jorge dos Erasmos, implementando debates internos e externos com órgãos preservacionistas, da USP (CPC), federal, estadual e municipal. Com a mudança de gestão nas Prefeituras, em 2005, foram reativados os contatos e propostas, tendo o Pró-Reitor efetuado uma visita ao prefeito de Santos para decisão final acerca do terreno, determinação dos interlocutores na Prefeitura de Santos para chegar a bom termo todos os ajustes exigidos pela legislação em vigor. Contato com o Prefeito de São Vicente, visando aprofundar as experiências levadas a termos em 2005, solicitando a ampliação do número de envolvidos e disponibilidade de ônibus para que escolas vicentinas distantes possam também visitar as Ruínas. Promoção de encontros entre autoridades da USP e possíveis patrocinadores para se concretizar a segunda parte da edificação, com salas de aula, reserva técnica e sala multiuso, tanto para laboratórios, quanto para oficinas integradas de trabalho educacional com as comunidades. Início das construções da Base Avançada de Cultura e Extensão. Início do registro fotográfico e acompanhamento das obras. Programa Portas Abertas (todas as terças e domingos as Ruínas ficaram abertas ao público em geral, sem a necessidade de agendamento prévio). Inicio das reuniões semanais sobre as obras. Inicio das escavações do terreno, retirada dos matacões e acompanhamento arqueológico pelos profissionais do Museu de Arqueologia e Etnologia da Usp. Estreitamento das relações com as turmas de engenharia da Unisantos – a partir da presença da professora Zildete Prado, parceira dos projetos educacionais das Ruínas. Estabelecimento de agenda para o ano todo de visitas da Secretaria de Turismo de Santos – público alvo: Secons (Secretarias de convivência da prefeitura de Santos). Início das reuniões para discussão da proposta de criação do Parque Municipal (zona do entorno). Visita do especialista em líquens prof. Dr. Marcelo Marceli do Jardim Botânico de São Paulo, que desdobrou em interessante trabalho acadêmico sobre a originalidade dos líquens da região. Visitas das seguintes instituições: Todas as de 2005, além de: MAE–USP, SECON – Penha, SECON

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– Nova Cintra, SECON – São José, Museu Paulista, Escola Carandá – São Paulo, EMEF Cacilda Becker – São Paulo, Faculdade D. Domenico – Guarujá, Colégio Stella Maris, EMEF José Carlos, Escola da Ilha Diana, Escola Martins Fontes, Escola Regina Altman, Escola Isaac Newton- São Paulo, Escola Son da Terra – Mogi das Cruzes – SP, Universidade São Marcos, Jardim Botânico – São Paulo, Jardim Botânico de Santos, Jardim Botânico de São Vicente, Escola Neves P. M., Escola Átrio, EMEF Arantes Terez – Cubatão, EMEF Auxiliadora da Instrução, EMEF Antonio Pacifico, UNAERP – Guarujá, Instituto Albatroz, Escola Nossa Senhora das Graças – São Paulo, EMEF República de Portugal – SV, Escola Avelino da Paz Vieira, EMEF Gilson Kool Monteiro – SV, Fundação Arquivo e Memória de Santos, CEA Praia Grande, EMEF Francisco Martins dos Santos – SV, Instituto Vallverde, EMEF Matteo Bei – SV, EMEF Luiz Benedito Ferreira, Colégio Kennedy– SV, UME Olavo Bilac, Colégio Vitória Neres.

2007

No ano de 2007, a equipe de educadores das Ruínas Engenho participou de três congressos, sendo um internacional. O primeiro evento ocorreu na noite de 27 de setembro de 2007, no Seminário Questões interdisciplinares: o patrimônio e a educação da Fundação Museu Mariano Procópio, de Juiz de Fora, MG. Na oportunidade foi apresentado um vídeo produzido pela equipe, bem como uma sucessão de slides que caracterizaram a transformação do bem ao longo dos últimos três anos. O segundo evento foi o X Seminário Cidade Revelada, evento realizado no período de 17 a 22 de outubro, em Itajaí – SC. Com a comunicação intitulada: Três anos de construção, um balanço geral dos projetos das Ruínas, alguns dos projetos desenvolvidos nas Ruínas foram selecionados para exemplificar a gama variada de visitantes assistida por nosso trabalho. Finalmente, a terceira participação, em novembro, no II Seminário Internacional sobre açúcar, realizado em Itu – SP. Com a comunicação “Educação, presença e temáticas diversas: uma experiência avançada” buscou-se demonstrar como um conjunto de programas educacionais pode ser utilizado para fazer aproximação com os pares e a comunidade. Kelly Naguima Sato. O Olhar investigativo nas Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos. 2007. Trabalho Final de Graduação em Arquitetura e Urbanismo) – Universidade de São Paulo. Orientador: Maria Cecília França Lourenço. No ano de 2007 foi criado o GEMA (Grupo técnico científico dos educativos vinculados aos museus, acervos e arquivos da USP) que manteve ao longo do ano uma sistemática de reuniões mensais, sempre elegendo um dos órgãos da universidade como sede para que os educadores possam conhecer e aprender com os programas desenvolvidos em cada espaço de atuação educacional. O encontro de setembro ocorreu na sede das Ruínas, ocasião em que foi registrada a idéia de formarmos um grupo sistemático de estudos sobre a História da Educação na USP e dos órgãos que dispõe de trabalhos pedagógicos, objetivando a busca de dinâmicas que favoreçam a vinda de públicos espontâneos. O trabalho educacional desenvolvido junto aos visitantes é por definição uma construção coletiva, visando distintas interpretações e intervenções. Nesse sentido, práticas educacionais foram discuti-

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das e aprimoradas pelos educadores, em reuniões pedagógicas mensais que ocorreram sempre nas últimas segundas feiras de cada mês. Nestes encontros foram agendadas discussões sobre Cartas Patrimoniais. Visita das seguintes instituições: Além de todas de 2006 também visitaram as Ruínas: EMEF Ulysses Costa – Cubatão, USP Leste, Casa do Sol, Grupo Escoteiro Pascal Lembo, Grupo Escoteiro 163, Escola Total, Objetivo – Santos, CEES Maria Aparecida P., EMEF Maria Emilia Reis, Colégio Itá – SV, Projeto Mantiqueira – Cubatão, Instituto Brasileiro de Cultura Hispânica, Instituto Butantã, Agência Costeira, EMEF Laura F. – SV.

2008

31/01/2008 – (marco comemorativo do cinqüentenário da doação do terreno das Ruínas à USP). Portas Abertas verão. Junho/2008 – Inauguração da Base Avançada de Cultura e Extensão da USP junto ao Monumento Nacional Ruína Engenho São Jorge dos Erasmos. Publicação do caderno Portas Abertas – comemoração dos 50 anos de administração USP junto às Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos. De 18 a 20 de junho de 2008 – I Seminário – Educação em bens culturais: desafios e trocas, com a participação de centenas de educadores da região e de outros estados. Início das obras da segunda fase da Base Avançada – Bloco Educativo. Contratação de 10 (dez) estagiários (graduandos, mestrandos e doutorandos) das áreas de arquitetura, história, matemática, letras, pedagogia e biologia para auxiliarem os projetos educativos. Implantação do programa Engrenagens (cujo foco são as escolas Técnicas). Implantação do programa ELEJA (cujo foco são os estudantes do Ensino de Jovens e Adultos). Admissão da nova secretaria Heloisa Stella Veiga Machado, locada em Santos. Estudos para a implantação do programa “De carrinho para o Futuro”, pensado no formato de uma passeio de mães e pais que trariam seus bebês em carrinhos, formalizando um passeio, ao molde de uma caminhada de carrinhos de bebês cujo destino será o Monumento. Visa salvaguardar os futuros atores junto ao Monumento Nacional.

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VII. Considerações finais O ano de 2008 marca mais uma etapa do processo dinâmico, de requalificação deste espaço de produção de saberes, quando percebemos o reconhecimento do esforço coletivo empreendido por gerações de interessados em sociabilizar este bem cultural, bem como a cultura material oriunda das descobertas realizadas junto às Ruínas. Este processo de modificação e ampliação constantes de nosso olhar sobre o Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos sedimentou a possibilidade de sua preservação a partir, principalmente, de um conjunto de relações e memórias coletivizadas, nos permitindo enxergarmos este bem cultural como um patrimônio material e simbólico especial.

Há definitivamente um esforço e uma predisposição por parte de cada um dos envolvidos nos resultados ora apresentados para que, cada vez mais, o Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos fixe na comunidade a idéia de ser este um local de usufruto dela própria, em que gerações se encontram e o sentimento de pertencimento funde-se com os emaranhados de lembranças e histórias que cada um quer contar. Pode-se concluir que a meta estabelecida para este programa Portas Abertas foi amplamente alcançada, pois, além da visitação das milhares de pessoas, sólidas parcerias foram estabelecidas, engendrando novos olhares e interlocuções, fundamentais para a preservação deste local.

De maneira bastante abrangente os resultados alcançados ao longo do quadriênio 2004/2008 (período de abertura ininterrupta dos portões das Ruínas aos visitantes) reproduziram a união de forças em prol de uma meta bastante significativa: tornar o Monumento Nacional um local público de fruição, aprendizado e preservação, respeitando suas capacidades e colaborando para que os esquecimentos do passado não reproduzam mais a negligência, o abandono e a perda de identidade.

A estimativa para os próximos anos segue o mesmo caminho: entendemos que apenas a busca por números não é capaz de solidificar a existência deste espaço perante a sociedade em geral e a comunidade acadêmica. Por isso, com convicção de nossos princípios de uma educação libertária e de qualidade, nos distanciamos desta preocupação meramente quantitativa, acreditando estarmos assim, mais próximos da certeza de que este é um espaço de todos, a cada dia construído.

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Considerações Finais


Notas de rodapé:

1 [p. 28] – Os visitantes são instigados de maneira sinestésica a se relacionarem com o espaço refletindo sobre as informações recebidas e interagindo com as mesmas, de maneira a se apropriarem dos saberes construídos coletivamente. 2 [p. 29] – A Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária será construída em duas etapas distintas. A primeira etapa, que congrega o auditório e os sanitários será entregue em junho de 2008. Já a segunda etapa que constitui as salas de aula, biblioteca, reserva técnica e laboratórios multidisciplinares está sendo iniciada ao final de maio. 3 [p. 37] – Este trabalho referencia-se nos estudos de Janaína Amado e Marieta de Moraes Ferreira, que tomam o conceito de história oral como uma metodologia. 4 [p. 37] – A construção de um passado comum baseia nas leituras de Giovanni Levi, Pierre Bourdieu e Ângela de Castro Gomes, sobretudo, em: O uso da memória oral. In: AMADO, Janaína e FERREIRA, Marieta de Morais (Org). Usos e abusos da história oral. RJ, FGV, 1996; A ilusão biográfica, encontrada na mesma coletânea; e o trabalho de GOMES, Ângela de Castro. História e Historiadores, RJ, FGV,1996.

6 [p. 56] – De acordo com a Recomendação Europa, de 1995, segundo a qual a aparência da paisagem “é resultado de ação ou cuidados especiais, de fatores naturais e humanos e de uma combinação de ambos”. Ainda, a paisagem “é considerada em um triplo significado cultural, porquanto, é definida e caracterizada da maneira pela qual determinado território é percebido por um indivíduo ou por uma comunidade; dá testemunho ao passado e ao presente do relacionamento existente entre os indivíduos e seu meio ambiente; ajuda a especificar culturas locais, sensibilidades, práticas, crenças e tradições.”

Fontes de imagens:

Todas as fotos desta publicação pertencem ao acervo do Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, estando a reprodução sujeita à solicitação prévia.

5 [p. 37] – A respeito ver: HALBWACHS, Maurice. A memória Coletiva. SP, Vértice, 1990, p.35. Conferir também: RIOUX, Jean Pierre. A Memória Coletiva. In: RIOUX, J. P. & SIRINELLI, J. F. Por uma história cultural. Trad. Ana Moura. Lisboa: Estampa. 1998, p. 307.

Notas

de rodapé e

Fontes de imagens

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Referências

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CARTAS Patrimoniais. Caderno de Documentos n. 3. Brasília: MEC/ Iphan, 1995. CARTAS do Icomos. Série Cadernos do ICOMOS/ Brasil. V. I, 1997. Carta de Atenas de 1931. Carta de Veneza de 1964. Convenção sobre a proteção dos bens culturais em caso de conflito armado, Haia/Holanda, 1954. Carta do Turismo ICOMOS/1976. Recomendação de Nairobi/UNESCO/1976. Declaração do México de 1985. Recomendação de Paris/1989. Carta do Rio, Conferência geral das Nações Unidas sobre o meio ambiente e desenvolvimento/junho de 1992. Carta de Nara, Japão/ ICOMOS/1994. Carta de Brasília, Documento regional do Cone Sul sobre autenticidade/1995. Declaração de Estocolmo sobre o meio ambiente/1972. Recomendação Europa/1995.

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Cartas, Recomendações, Convenções Patrimoniais

e sobre o meio ambiente


título projeto gráfico fotos

editoração eletrônica revisão de textos e provas

formato tipologia

Portas Abertas, um programa em debate Bianca Oliveira André Rodrigo Christofoletti André Müller de Mello Bianca Oliveira André Bianca Oliveira André Maria Cecília França Lourenço Rodrigo Christofoletti André Müller de Mello 21 cm X 21 cm Helvética e TheMix

papel papelão

1250 g/m² (capa) 115 g/m² (miolo)

couché fosco

número de páginas tiragem filmes impressão e acabamento

112 500 Prol Gráfica Prol Gráfica




Esta publicação sinaliza mudanças ímpares, relativas ao Monumento Nacional Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos. Apresenta o balanço do Programa Portas Abertas, direcionado ao público em geral, que visa preservar o bem e estimular o estudo sobre suas múltiplas dimensões. Marca também a inauguração da primeira etapa da Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária junto às Ruínas. Hoje o bem se constitui em um órgão da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária/USP, tendo sido doado à universidade há exatos 50 anos. A USP, então, associa-se à comunidade da Baixada Santista para trazer o que melhor faz – ensino, pesquisa e extensão à comunidade –, convidando todos a uma troca de saberes e construção de significados, para consolidar a humanidade e solidariedade existentes há muito no local. Reside neste complexo de ações a vontade política da USP em disseminar este lugar na condição de identitário, relacional e histórico, promovendo-se uma ação voltada para a memória. Portanto, o ano de 2008 celebra mais uma etapa deste processo dinâmico, em que o esforço coletivo empreendido por gerações de interessados em sociabilizar o bem cultural, se consolida. O balanço deste programa diferenciado é aqui apresentado com depoimentos e relatos das experiências de ilustres personagens em diversas áreas, bem como a documentação do processo de criação, realização e avaliação deste programa em todas as suas edições.


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