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EXPERIMENTUS Edição 10 - Junho/2015

Sustentabilidade

Ambiental e Inovação


Expediente Universidade Comunitária da Região de Chapecó - Unochapecó

Comunicação Social - Jornalismo

Odilon Luiz Poli

Franscesco Flavio da Silva

Reitor

Professor Responsável

Vice-Reitoria de Ensino, Pesquisa e Extensão

Coordenador do Curso

Maria Aparecida Lucca Caovilla

Vice-Reitor de Planejamento e Desenvolvimento Claudio Alcides Jacoski Vice-Reitor de Administração Antonio Zanin

Diretor da Área de Ciências Sociais Aplicadas Sady Mazzioni

Vagner Dalbosco

Disciplina

Técnicas de Reportagem

Coordenadora Pedagógica Acin Jornalismo Mariângela Torrescasana

Projeto Gráfico e Diagramação

Aline Dilkin e Carlos Eduardo Pereira

Redação Alessandra Lara Zuanazzi Seidel Ana Carolini Fragoso Bárbara Michailoff Camila Silveira Camila Veloso Cristina Gresele Carlos Eduardo Pereira Carlos Benedetti Cristiano Pinto Zamboni Cleberson Cagol Dalvana Treméa Daniel Paulus Emily Midiã Machado Emanuelle Sauer Jung Eleandro Machado Eduardo Bender Janaína Chagas

Janete da Costa Juliana Matielo Letícia Sechini Lidiane Pagliosa Lucas Tedeus Lobor Maicon Franceschini Marina Folle Schielke Marina Oliveira Maristela Eli dos Santos Matheus Graboski Nádia Michaltchuk Rafael Bressan Ricardo Souza Samara Grando Stefani Specht Simone Pereira Viama Bau


EDITORIAL A Revista Experimentus chega a sua edição de número 10 com a missão de tratar de temas relacionados à sustentabilidade e inovação, mas sem perder o caráter experimental, presente na sua essência. Aos estudantes do 6º período de Jornalismo (2015) lhes foi cobrado reportagens que trouxessem novidades, contribuições para ao público leitor, mas principalmente que se aprofundassem no exercício desafiador que é a produção de uma grande reportagem. O resultado desta edição revela a diversidade de pensamentos, estilos e caminhos seguidos por cada um. Mais que um produto midiático, a revista concretiza um momento importante do percurso acadêmico na busca pelo aperfeiçoamento profissional destes futuros jornalistas.

Prof. Franscesco Flavio da Silva


Sumário A bioconstrução como uma forma de sustentabilidade Página 06

Ser sustentável é caro Página 10

Energia fotovoltaica: eletricidade a partir do sol Página 16

Ducha sustentável Página 20

Sustentabilidade à mesa Página 24

Escolas chapecoenses promovem conscientização Página 28

A falta da coleta seletiva ainda gera poluição Página 32

Destinação inteligente do lixo reciclável é fonte de renda em Chapecó Página 38

Coleção de roupas inovadoras e sustentáveis saem do papel Página 44


Poços artesianos são a solução? Página 46

Da cidade para o campo Página 50

Agroecologia o futuro sem agrotóxicos

Quem tem medo do Código Ambiental?

Página 52

Página 66

A real situação do Bioma Mata Atlântica em Santa Catarina

As incertezas do Lajeado Passo dos Fortes correm no Ecoparque

Página 56

Página 72

Preservação das florestas é garantia de água na torneira

Lajeado São José Um problema sem final feliz

Página 60

Página 76


A bioconstrução como uma forma de sustentabilidade Um novo modo de vida

Por Emily Midiã Machado e Janete da Costa O mundo inova a cada dia e evolui a cada experiência. Na área da sustentabilidade não é diferente. Hoje, existem muitas alternativas que podem fazer toda a diferença no modo e no estilo de vida das pessoas, a bioconstrução é uma delas. Pedra, bambu e barro são alguns dos materiais naturais utilizados para este tipo de construção, que possui baixo custo de produção. Essa forma alternativa pode ajudar a realizar o sonho das pessoas de maneira mais barata e sem agredir o meio ambiente. Segundo a doutora em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP), Camila Fujita, as primeiras práticas de bioconstrução no Brasil foram as construções indígenas, realizadas antes da chegada dos europeus, bem como a arquitetura com terra do período colonial. Esta é uma construção que leva em consideração a minimização de impactos ambientais e uma maior integração com o contexto sociocultural. “O importante é compreender o conjunto de princípios que podem ser utilizados em cada situação”, relata a arquiteta. Para a engenheira civil da empresa Cimeplan de Planalto Alegre (SC), Denise Sehn, esta forma de 6

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construção com materiais ecológicos é válida e importante. Além disso, representa uma maneira de pensar no meio ambiente em uma das áreas econômicas que mais crescem no país e no mundo. Entretanto, ela acredita que as obras sustentáveis ainda precisam ser aperfeiçoadas e estudadas. “Deve ser levada em consideração principalmente a parte da estabilidade e segurança das edificações”, afirma Denise. Conforme Camila, a bioconstrução pode ser utilizada em qualquer ambiente, independente se urbano ou rural. Porém, em áreas de caráter rural, a disponibilidade de matéria prima local não industrializada pode facilitar o trabalho. Existem diferentes obras, que incluem técnicas e materiais, cujas características adequam-se ao clima, à cultura e aos recursos naturais existentes em cada local. Para o permacultor e bioconstrutor de Porto Alegre, Carlos Eduardo da Silveira, essa alternativa busca adequar o projeto da casa ao local onde será inserida. Deste modo, precisa de observação do local de construção, cuidando alguns pontos, como orientação solar, lado que vem os temporais, as brisas frescas de verão e possível zona de inundação. “Analisamos também os recursos

naturais que podem ser utilizados na obra, como o solo, pedras, bambus e madeiras. Fazemos alguns testes com o solo do local para ver se é apropriado para a construção e para descobrir qual o traço de areia/argila necessita aquele solo em específico”, relata o bioconstrutor. O morador de Coronel Martins (SC), Itacir Antunes, construiu uma casa sustentável na área urbana. Por esse motivo teve que comprar todos os materiais, como: terra, pó de brita, ferro, bambu, madeira tratada, cimento, areia, brita, palha de trigo e lonas. Também utilizou telhado reciclável de caixa de leite, cal, jimo cupim, pregos, cinza, tijolos ecológicos feitos de terra fina, papelão e lajotas. Na casa dele há uma fossa ecológica planejada para a reutilização da água. A água passa por um processo de filtragem natural e escoa limpa. A partir disso, ela pode ser utilizada para molhar a grama, a horta ou ser despachada para a natureza e a sua eficácia de limpeza é de até 98%. A casa também possui janelas centralizadas ao nascer e ao pôr do sol, com aberturas nas paredes para passagem de luz natural, deixando a casa mais clara e economizando no consumo de energia elétrica.


Foto: Arquico Naturalmente

Gastos Para a arquiteta Camila, os gastos com uma bioconstrução variam de acordo com as características e especificações de cada projeto e contexto de execução. No caso de Itacir, os materiais e a mão de obra, utilizados para a casa ecológica, tiveram um custo de aproximadamente R$45 mil. “Se eu tivesse feito uma casa convencional, teria gasto em média no mínimo R$150 mil, dependendo da qualidade do material utilizado e da mão de obra”, afirma ele. Segundo a engenheira Denise, para ser realizada uma construção convencional simples, com dois quartos, sala, cozinha, banheiro

e uma garagem, é gasto em média R$800 por metro quadrado de obra construída. Já, nas construções mais luxuosas, o preço varia em torno de R$1.700 por metro quadrado. Para a engenheira, nessas construções os materiais utilizados como telhas, vidros, tubulações de PVC e impermeabilizantes agridem o meio ambiente. “Um dos principais problemas que enfrentamos hoje na construção civil é o desperdício desses materiais. Além da destinação dos resíduos da construção civil, que na maioria das vezes é feita de forma incorreta e sem o reaproveitamento”, entende ela. Para a engenheira, os gastos com construção civil aumentaram bastante nos últimos anos, principalmente em materiais como

ferro e cimento. Outro aspecto que sofreu um grande acréscimo foi o valor da mão de obra na construção. Com isso, as novas construções diminuíram e a procura por locação de residências e de crédito para construções novas elevaram. Mesmo assim, há alternativas para realizar o sonho de construir uma moradia própria, mesmo que a pessoa possua baixa renda. “Hoje existem as linhas de financiamento que podem ajudar nesses casos. O mais conhecido para edificações residenciais unifamiliares de padrão baixo/médio é o fornecido pela Caixa Econômica Federal “Minha Casa Minha Vida”, explica Denise. Outra alternativa é a bioconstrução, que além do baixo custo, tem outros benefícios.

“ Te m o s q u e a b a n d o n a r o c o n c e i t o d e c o n s u m o d e m o d e lo li n e a r e v o lt a r a o p a d r ã o n a t u r a l d o s c i c lo s , p e n s a n d o e p l a n e j a n d o c o m a u t i li z a ç ã o d o s r e c u r s o s r e n o v á v e i s e e m n í v e i s d e u t i li z a ç ã o em que o meio ambiente possa recompor o que fo i u t i li z a d o , d e s t e m o d o t e r e m o s u m a r e a l s u s t e n t a b i li d a d e . Te m o s q u e e n t e n d e r q u e n ã o podemos sair esbanjando recursos como se e s t e s fo s s e m i n f i n i t o s ” . Carlos Eduardo.

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Benefícios Para a arquiteta Camila, as bioconstruções proporcionam condições ambientais saudáveis para as pessoas, como conforto térmico, iluminação adequada, minimização de climatização artificial, menor gasto de energia e de utilização de materiais tóxicos e identidade cultural. O morador de Coronel Martins, Itacir, afirma que sua qualidade de vida melhorou após morar numa bioconstrução: “O conforto e o bem estar em morar em algo que você desenvolveu, planejou e executou, o faz querer cada vez mais aprender e aprimorar suas técnicas para passar adiante o conhecimento. Morar em uma casa ecológica é uma experiência única e maravilhosa, com modelo mais rústico e ecológico”, comenta. Ele relatou também que muitas pessoas já vieram visitá-lo e buscar informações sobre o processo da construção e as técnicas utilizadas: “Isso nos faz conhecer e trocar experiências de vida com outras pessoas. Já vieram pessoas de outros estados como: Paraná, Rio Grande do Sul e de outros países, como Paraguai e Argentina”. Apesar disso, na opinião de Itacir, faltam investimentos e financiamento para este tipo de construção e há dificuldades na procura por mão de obra. Apesar das dificuldades, o bioconstrutor Carlos Eduardo e a técnica em agropecuária e permacultora, Patrícia Girardi Bystronski, praticam a permacultura. Eles possuem um blog chamado “Espaço Naturalmente”, que tem a finalidade de sensibilizar as pessoas para o desenvolvimento de bioconstruções e de uma vida sustentável. Segundo Carlos, a permacultura é a união de práticas tradicionais, ancestrais, junto com a ciência 8

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moderna, em uma síntese do que cada uma tem de melhor, englobando assuntos de como produção de alimentos limpos e sem transgênicos, cultivo da terra, bioconstrução, iluminação passiva, ventilação cruzada, segurança hídrica e saneamento ecológico, além de captação de água da chuva, preservação das nascentes e rios, e energias renováveis. São temas que buscam criar uma verdadeira cultura sustentável para que as próximas gerações tenham os mesmos ou mais recursos e sistemas naturais do que agora. “São técnicas do tipo ‘faça você mesmo’, pois em sua grande maioria são simples de construir e planejar, deixando de lado o ‘modismo da sustentabilidade’, que muitas vezes é utilizado apenas para agregar valor a produtos e serviços”, relata Carlos. Desde 2009 o casal desenvolve em sua própria casa, pesquisa e aplicação de técnicas de permacultura e bioconstrução, como a construção com terra crua, saneamento ecológico e cultivo em pequena escala de alimentos orgânicos para consumo próprio. Além disso, eles trabalham com a confecção artesanal de móveis e estruturas de bambu e oferecem cursos sobre bioconstrução e permacultura. Também prestam serviço de assessoria em bioconstrução e realizam palestras sobre estes temas, a mais procurada é sobre bambu e o design em permacultura. “Nossa visão é capacitar a pessoa ou família para que ela mesma faça sua casa”. Já realizamos algumas bioconstruções em Porto Alegre e cada uma tem um jeito e particularidade. De modo geral são casas pequenas, com a utilização de madeira, bambu e terra crua”, afirma Patrícia. A arquiteta Camila, explica que as bioconstruções são


Foto: Arquico Naturalmente

resistentes se realizadas de modo coerente. “Em geral, tem um melhor desempenho, tanto em termos de durabilidade, resistência e performance, do que materiais industrializados, os quais podem não se adequar às condições específicas, caso sejam mal empregados”, afirma. Patrícia relata que é imprescindível testar o solo que se pretende usar para construir. “Se houver muita argila, as paredes vão rachar muito e se houver muita areia não terá resistência”, explica ela. O interessante para a finalização do trabalho são as tinturas. Elas são feitas de pigmentos minerais ou vegetais, com base de argila fermentada e alguns aditivos naturais como soro de leite, cola de farinha, óleo vegetal de linhaça e baba de cactos, explica Carlos. Conforme bioconstrução, Itacir, as casas deste tipo possuem uma temperatura curiosa. “Essa casa torna-se térmica: quanto mais frio está, mais quente fica dentro da casa, e quanto mais quente lá fora, mais fria ela se torna. Este tipo de construção retém mais calor e também se esfria rapidamente”, relata. Assim como Itacir, que relatou que a bioconstrução foi uma transformação para uma melhor qualidade de vida, Carlos e Patrícia também fazem com que as pessoas se sensibilizem para uma mudança de hábitos, com conforto e bem estar, mas sem exageros. Ações como estas mostram que podem mudar o mundo. Elas começam pequenas, mas a partir do momento que cada um dá o primeiro passo, todos partem em busca da cooperação. “Quanto mais pessoas aderirem a esta causa, menor será o impacto no planeta e consequentemente todos saem ganhando”.

Te n d a d e b a m b u construída no “Espaço N a t u r a l m e n t e” , lo c a li z a d a e m P o r t o A le g r e

Forno de tonel, c o m fo g ã o r o c k e t stove acoplado ao la d o.

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Foto: Gabriel Kreutz

Ser sustentável é caro Caminho para a sustentabilidade na construção civil ainda é barrado pelo custo dos produtos Por Liziane Nathália Vicenzi e Gabriel Kreutz

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O setor imobiliário representa cerca de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial e 35% de toda a energia consumida pela sociedade. Os dados do Conselho Brasileiro de Construção Sustentável (CBCS) indicam que a construção civil tem grande impacto na economia, na sociedade e no mundo. Como consequência disso, as empresas podem ou não adotar uma postura consciente nas mais diversas etapas da construção civil. Porém, o custo dos materiais ecologicamente corretos ainda é uma barreira para isso. “O grande problema da sustentabilidade hoje em dia é que ser sustentável é caro. As empresas não veem nisso um bom negócio”, afirma o engenheiro civil Pedro Luciano Sorgato. Conforme o engenheiro, a região oeste ainda não tem as atividades focadas em 12

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reduzir os impactos ambientes nas construções. Mesmo assim, afirma que as alternativas ecológicas são uma meta a ser conquistada. Pedro é pós-graduado em Engenharia de Produção e realiza especialização em Gerenciamento de Obras. Ele trabalha na empresa Civil Engenharia, localizada em Xaxim. Em parceria com o sócio Crenilson Corrêa, que é arquiteto pós-graduado em Construção Civil, o engenheiro afirma que a empresa começou a pensar em obras mais sustentáveis, e já deu o primeiro passo para isso. Está em fase de construção um edifício que contará com diferenciais, como a utilização de laje nervurada e escoras metálicas. O objetivo do projeto é diminuir os gastos com profissionais, e reduzir o uso de materiais prejudiciais ao meio ambiente. As escoras metálicas substituem escoras de madeira, e a

laje nervurada substitui laje comum, que reduz a utilização de madeira. Conforme Pedro, a laje nervurada elimina aproximadamente 80% da madeira da obra, é 12% mais barata que as lajes convencionais e pode baixar os custos da obra em até 30%. O arquiteto explica que em vez de utilizar madeira para todo o escoramento da laje, são utilizados tabletes, chamados de cubetas de polietileno que serão usadas na construção de toda a obra. As lajes nervuradas são um conjunto de vigas que se cruzam e podem ser moldadas no local ou com nervuras pré-moldadas. “É como se fosse uma forma de bolo virada, aonde a armadura vai entre elas. Em comparação com a laje maciça que é inteira de madeira, a cubeta transforma a laje nervurada em várias vigas, então teremos apenas algumas faixas de madeira,


Foto: Gabriel Kreutz

Foto: Gabriel Kreutz

o que não implica na resistência da obra. A laje descarrega nas vigas, as vigas descarregam nos pilares, os pilares descarregam na fundação e o prédio fica em pé”, explana Pedro. A laje nervurada também elimina o concreto desnecessário nas cubetas, que é um grande agravante na quantidade de CO2 liberado na atmosfera. A mão de obra também se torna mais barata e requer menos materiais de construção. Um dos problemas da utilização é que é necessária mão de obra especializada para executar o serviço, o que dificulta na utilização mais periódica do material. Outra opção ecológica da empresa é usar escoras metálicas. A escora é utilizada para suportar cargas de estruturas ainda instáveis ou permanentes quando ocorre a necessidade de apoiar a construção, ou até que adquira resistência para

se sustentar. Conforme o arquiteto Crenilson, na região oeste a utilização é de escoras com madeira de eucalipto, que prejudicam o meio ambiente. “A escora de madeira é o que sustenta a laje. Nosso objetivo é utilizar nessa obra um escoramento metálico, que substitui o eucalipto e preserva o meio ambiente”, afirma. De acordo com o engenheiro Pedro Sorgato, utilizar as escoras metálicas tem um custo mais elevado, de 10 por cento a mais do que as escoras de madeira, mas garantem a preservação do meio ambiente. “Quanto à utilização de madeira, a cada metro quadrado vai uma escora de aproximadamente três metros. Sendo assim, a utilização das escoras metálicas diminui a utilização de três metros de madeira a cada metro quadrado”, explica o engenheiro. Pedro destacou que um edifício de 400 metros quadrados,

economizaria cerca de 1.200 metros de madeira. A escora metálica também pode ser reutilizada por inúmeras vezes e tem fácil aplicação em obras de pequeno, médio e grande porte, e podem ser recicladas no fim da sua vida útil. O engenheiro ainda destaca que a construção civil utiliza opções ecológicas como reutilização da água da chuva, placas fotovoltaicas para produção de energia e alvenaria estrutural. Segundo o engenheiro, na alvenaria estrutural não são utilizados pilares e vigas, o que contribui para a preservação das árvores. “O próprio tijolo sustenta a laje, evitando desperdícios. Na alvenaria comum ocorre muita quebra de tijolo, mais do que o necessário, então é preciso preencher com argamassa. Na alvenaria estrutural, a modulação encaixa todos os tijolos reduzindo as quebras”, detalha Pedro.

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Empresas podem ser reconhecidas pela sustentabilidade Para alcançar o caminho da sustentabilidade, as empresas contam com um estímulo a mais. A certificação das empresas é indispensável para garantir que as construções utilizem materiais e práticas que sejam ambientalmente sustentáveis. Portanto, as empresas que provarem a sustentabilidade em suas obras podem obter o certificado Liderança em Energia e Design Ambiental (Leed), que é emitido pela organização United States Green Builting Council (USGBC). Em 2007 foi criado o Green Building Council Brasil (GBCB), órgão não governamental vinculado ao USGBC que visa auxiliar o desenvolvimento da indústria da construção sustentável no país. O selo é uma confirmação de que os critérios de desempenho em termos de energia, redução de emissão de CO2, qualidade no interior dos ambientes, uso de recursos naturais e impactos ambientas foram atendidos satisfatoriamente. Este é um certificado pioneiro, pois é o primeiro a ser implantado na América Latina e garante uma construção sustentável. A avaliação da obra ocorre

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com base no projeto, por isso a fiscalização do contratante é fundamental para que não sejam adotadas práticas que agridam o meio ambiente. Para conseguir o certificado, é necessário passar primeiro por uma pré-certificação, que avalia itens como a eficiência energética, a racionalização do uso da água, a qualidade ambiental interna, a sustentabilidade do espaço e a sustentabilidade dos materiais. Um exemplo de certificação é a arena do Grêmio, localizada na cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. A arena recebeu no dia 2 de junho do ano passado a certificação Leed de Prata por cumprir os requisitos de sustentabilidade exigidos pelo USGBC, com 51 pontos na avaliação. Foram determinantes para a conquista do certificado itens como: prevenção ativa da poluição na construção; redução no uso de água e reaproveitamento de água da chuva; redução do uso de energia; armazenamento e coleta de materiais recicláveis; uso de materiais de fornecedores regionais e inovação e design.

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A classificação, de acordo com a pontuação de cada requisito, pode ficar assim:

Certified 45-59 pts

S i lv e r 60-74 pts

G o ld 75-89 pts

Platinum 90+ pts F o n t e : h t t p : / / w w w. s u s t a i n a b le c o m f o r t i n c . c o m / le e d - fo r - h o m e s /


Estudantes aprendem técnicas sustentáveis na universidade “A sustentabilidade primeiramente deve estar ligada ao controle executivo das práticas já existentes, que são as mais difundidas e realizadas”, destaca a professora do curso de Engenharia Civil da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó), Andrea Giovana Foltran Menegoto. Segundo ela, não é viável usar tecnologias para fazer algo mais rápido ou mais barato, se nos processos habituais de uma obra ocorrer desperdício por falta de preparo e organização. De acordo com a professora, a sustentabilidade de uma obra começa no consumo consciente dos recursos empregados. As novas tecnologias que buscam minimizar os danos causados pelos entulhos da construção civil, devem ser pensadas nas fases iniciais, desde a concepção até a finalização de projetos. Conforme Andrea, muitas práticas de construção sustentável são desenvolvidas dentro da universidade. Um exemplo são as pesquisas de conclusão de curso que buscam uma utilização para entulhos produzidos nas construções. Alguns dos resíduos descartados tem maior capacidade de reaproveitamento, entre eles se destacam tijolos, argamassas e concretos. Quando estes produtos passam por uma moagem adequada, eles podem ser incorporados a novas argamassas, telhas, tijolos, e pavers. A professora Andrea ressalta ainda que existem pesquisas para transformar resíduos gerados pela comunidade, em

produtos que poderão ser utilizados nas construções. “Produtos como pneus inservíveis, resíduos de pet e areia de fundição são utilizados buscando uma destinação adequada. Em casos de substituição parcial, haverá um ganho ambiental ao passo que se reduz a quantidade de matéria prima natural”, destaca. Conforme o estudante Félix Boschetti, do 5º período de Arquitetura e Urbanismo da Unochapecó, a orientação dos professores é para utilizar o conceito de sustentabilidade nos projetos, e é um caminho que ele pretende seguir. “Sempre procuramos projetar da melhor forma possível utilizando técnicas sustentáveis como telhados verdes, captação da água da chuva e telhados brancos, que refletem melhor a luz solar. Cabe a nós também inovar e apresentar aos professores técnicas sustentáveis”, afirma Félix. De acordo com a acadêmica do 9º período de engenharia civil da Unochapeco, Estefani Bevilaqua, os profissionais estão saindo da universidade com maior consciência ambiental. “Tanto em mim quanto nos meus colegas, e até mesmo em profissionais mais experientes (que não tiverem esse enfoque na formação acadêmica) é uma preocupação muito grande com as soluções existentes hoje para os problemas ambientais e uma busca por novos materiais/técnicas que objetivem o melhor aproveitamento das construções, de modo a contribuir com o meio ambiente, destaca.

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Energia fotovoltaica: eletricidade a partir do sol Área de energia renovável que mais emprega no mundo é a solar fotovoltaica Por Carlos Eduardo Pereira e Camila Veloso

Uma alternativa sustentável de se obter energia, sem degradar o meio ambiente e ainda economizar no fim do mês, são as placas de captação solar. Nos últimos anos o uso de painéis fotovoltaicos se tornou comum em residências e empresas. Em tempos de falta de chuva e excesso de sol, comum no verão, a captação solar é uma boa alternativa para se obter energia elétrica. Desde dezembro de 2012, com a Resolução 482/12 da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), empresas e residências de todo o Brasil podem produzir eletricidade a partir de fontes renováveis, como a luz solar, conectando o sistema de energia solar na rede elétrica. A energia

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Foto: Carlos Eduardo Pereira

que não for consumida irá para a distribuidora e o consumidor ganhará um abatimento na conta de luz. Ao observar as casas dos bairros de Chapecó, verifica-se que a maioria das residências que possuem os painéis solares como alternativa de abastecimento são de famílias de classe média ou alta. Isso porque o incentivo por parte do governo ainda é pouco. “Se tivesse incentivo, todo mundo iri colocar, porque em vez de estar pagando a fatura de energia, estaria pagando pelos painéis”, aponta o engenheiro de bioenergia Cristiano Gnoatto. O painel fotovoltaico é um sistema que funciona como captação de energia solar e a converte em eletricidade. Segundo o engenheiro, um painel solar é composto por um conjunto de células fotovoltaicas que possuem elétrons que, ao serem atingidos pela radiação solar, se movimentam gerando uma corrente elétrica continua. Os inversores transformam a energia gerada pelos módulos solares nos padrões exigidos para a conexão à rede elétrica, monitoram e se desconectam do sistema em caso de anomalias ou manutenção. A energia fotovoltaica é considerada limpa por não gerar resíduos e não causar danos ao meio ambiente. Esta energia produzida pode ser utilizada no abastecimento da rede elétrica em larga escala, como acontece no setor comercial, mas também pode ser gerada em residências. Além do sistema solar para geração de energia elétrica, há também a energia térmica, que utiliza a radiação solar para o aquecimento da água. Na hora da compra do equipamento deve-se garantir que os componentes utilizados tenham a certificação do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), que realizou a implementação da Portaria n.º 357 em 2014, com o objetivo de estabelecer regras para os equipamentos de geração de energia fotovoltaica.

Vantagens e desvantagens na utilização dos painéis solares A manutenção dos painéis é miníma. “É um sistema que não tem peças móveis, a manutenção seria somente da fiação elétrica”, afirma Gnoatto. É nescessária verificação periódica, inspecionando se não há acúmulo de poeira, folhas ou outros interferentes sobre o equipamento. Os painéis solares têm vida útil de 25 a 30 anos e custa R$ 1.100,00 cada. Todo o projeto para intalação custa em média R$ 15 mil. Este custo, segundo o engenheiro, se recupera em seis anos de uso do equipamento. A poluição decorrente da fabricação dos equipamentos necessários para a construção dos painéis solares é totalmente controlável. Eles estão cada vez mais potentes, ao mesmo tempo que o seu custo diminui. A energia solar é excelente em lugares remotos ou de difícil acesso, pois sua instalação em pequena escala não obriga a enormes investimentos em linhas de transmissão. A desvantagem apontada é a variação nas quantidades produzidas de acordo com as condições climatéricas (chuva, neve, nebulosidade, etc), além de que durante a noite não existe produção, o que obriga se ter meios de armazenamento da energia produzida durante o dia em locais onde os painéis solares não estejam ligados à rede de transmissão de energia. Locais em latitudes médias e altas (Ex: Finlândia, Islândia, Nova Zelândia e Sul da Argentina e Chile) sofrem quedas bruscas de produção durante os meses de inverno devido à menor disponibilidade diária de energia solar. Locais com frequente cobertura de nuvens (Curitiba, Londres), tendem a ter variações diárias de produção de acordo com o grau de nebulosidade.

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Cresce o número de empregos na área renovável

Com o objetivo de estimular a geração de energia limpa no estado, o governo de Santa Catarina lançou, no dia 24 de junho deste ano, o Programa Catarinense de Energias Limpas - SC+Energia. A meta é passar de 880 MWh para 1 mil MWh com a implantação de opções alternativas de energia como a eólica e a solar. Serão investidos R$ 5 bilhões em projetos de energia limpa e renovável, como centrais hidrelétricas, eólicas, solar e de biomassa. Para as empresas que participarem do programa, o governo prevê benefícios, como isenção do ICMS até 2021. Para isso, serão lançadas chamadas públicas. De acordo com as Centrais Elétricas de Santa Catarina (Celesc), no primeiro trimestre de 2015, o estado consumiu 6.195 gigawatts (GWh) de energia. O que representa em média 2.065 GWh por mês. As instalações comerciais correspondem a 32,6% deste gasto, a indústria, 22,4%, e o comércio, 21,8%. Atualmente, a energia limpa gerada em Santa Catarina é de 880 megawatt, que corresponde a 19,5% do total.

Foto: Carlos Eduardo Pereira

Conforme estudo da Agência Internacional de Energia Renovável (Irena), realizado em 2015, a área da indústria de energia renovável que mais emprega em todo o mundo é a solar fotovoltaica, com 2,5 milhões de pessoas. Ela é seguida pela indústria de biocombustíveis líquidos, com 1,8 milhão de pessoas empregadas. Em terceiro aparece a eólica, fonte que, pela primeira vez, passou a marca de 1 milhão de empregos. Ainda de acordo com o estudo, o Brasil é o segundo país que mais emprega na indústria de energia renovável. O país possui mais de 934 mil postos de trabalho relacionados à energia eólica, solar e outras fontes consideradas menos poluentes. Com quase 3,9 milhões de postos de trabalhos na área verde, a China lidera a lista. São mais de 40% dos cerca de 7,7 milhões de empregos diretos e indiretos registrados no setor em todo o mundo, em 2014. O número de empregos na área cresceu 18% no ano passado comparado a 2013, quando 6,5 milhões de pessoas estavam empregadas. Na terceira colocação, atrás do Brasil, estão os Estados Unidos, com 724 mil postos.

Programa de incentivo a energia renovável em SC

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Variedades dos painéis solares Foto:http://planetasustentavel.abril.com.br/

Bons Exemplos

Depois do desastre na usina nuclear de Fukushima, após terremoto seguido de um tsunami em 2011, o Japão passou a investir em energias limpas. Em maio deste ano, foi inaugurada na província de Hyogo uma usina de energia fotovoltaica composta por 9 mil painéis solares flutuantes. Com estrutura de 333 por 77 metros, a plataforma vai gerar, em média, 3 mil MWh, com capacidade de abastecer até 800 residências. Projetada para suportar desastres naturais, comuns na região, foi construída com materiais 100% recicláveis, resistentes aos raios ultravioletas e à corrosão. A inciativa visa bater a meta do governo de até 2030 ter 24% das indústrias do país utilizando energia renovável.

Segundo o portal eCycle, existem três tipos básicos de painéis solares fotovoltaicos: Painéis solares policristalinos Menos eficiente que o painel monocristalino, as células são formadas por diversos cristais, e não somente por um. O resultado final é uma célula fotovoltaica com aparência de vidro quebrado. Painéis solares monocristalinos É o mais recomendável, feito de células monocristalinas de silício. Cada célula é formada por um único cristal desse elemento. O processo de fabricação desses painéis é complexo, pois exige a produção de cristais únicos de silício de alta pureza para cada célula fotovoltaica. Painéis de filme fino O material fotovoltaico é depositado diretamente sobre uma superfície de metal ou de vidro, para formar o painel. Apesar de serem mais baratos, possuem uma eficiência energética muito menor, fazendo com que seja necessária uma área maior para compensar.

Painéis solares s ã o m a i s u t i li z a d os em casas de classe m é d i a o u a lt a ED .1 0 Junho/2 0 1 5

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Ducha sustentável Alternativa que traz economia na hora do banho Por Cleberson Cagol e Lucas Tedeus Lobor Durante o verão e principalmente no inverno o chuveiro elétrico abocanha grande parte do consumo de energia elétrica nas residências brasileiras. Com isso, alternativas que não agridam o meio ambiente e que aliviem o bolso do consumidor estão ganhando espaço no dia a dia da população. Natural, gratuita e abundante, a luz solar tem sido o combustível de projetos sustentáveis e alternativas para o chuveiro. No Brasil, o chuveiro elétrico concentra a maior parcela da energia consumida em residências, 25% a 35%, segundo o Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel). Calcula-se que somente consome 6,2% a 8,7% de toda a energia produzida no país. Foi pensando neste consumo que a ONG Sociedade do Sol (SoSol), de São Paulo, desenvolveu o Aquecedor Solar de água com tubo de PVC. O sistema vem ganhando cada vez mais espaço no cenário de energia sustentável e se tornou uma alternativa simples e barata na casa de muitas famílias brasileiras. O técnico em agropecuária e eletrônica, Edison Urbano, se dedica há mais de uma década ao desenvolvimento, pesquisa e criação de projetos sustentáveis e de fácil aplicação. Urbano garante que o 20

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aquecedor de água solar com tubos de PVC é um sistema que traz muitos benefícios não só ecologicamente, mas também financeiramente. “Com a instalação desse sistema na casa a redução dos gastos com energia elétrica na residência chega até a 40%, sendo que no chuveiro economiza até 80%”, comenta ele. Urbano ressalta que é possível aquecer água usando a energia do sol com varias técnicas, mas conseguir fazer isso com eficiência e baixo custo é muito difícil. Porém, com esse sistema foi possível chegar a um resultado satisfatório. Enquanto o aquecedor industrializado custa em média R$ 1800,00, o construído com tubo de PVC e materiais recicláveis tem um custo entre 300 a um mil reais dependendo do tamanho necessário para cada caso, e os benefícios são praticamente o mesmo. Apesar da alta procura, devido o aumento do consumo da energia elétrica, Urbano acredita que a adesão seria ainda maior se o governo pudesse colocar em seus projetos habitacionais esse sistema. “Por não ter certificação o governo não pode usar em seus projetos habitacionais equipamentos com tecnologia artesanal, como é o caso desse sistema”, lamenta Urbano.

Famílias do Oeste aderem ao sistema Há quatro anos, Juliano Collet e sua esposa Gislaine Partorio, moradores do município de Coronel Martins, a 110 km de Chapecó, fizeram um investimento de mil reais para instalar o sistema. Além de usar a água aquecida no chuveiro, eles também utilizam na pia e para lavar roupa. “Reduzimos o consumo de energia no chuveiro e ao mesmo tempo usamos também para lavar as louças e roupas, o que é excelente, pois limpa com maior facilidade” argumenta Juliano. Eles conheceram o Aquecedor Solar com tubos de PVC em uma oficina sobre Bioconstrução. Hoje, depois de quase meia década usando o sistema, Juliano recomenda. “Prático, útil e eficiente” garante ele. A parte onde eles mais sentiram a diferença foi no bolso, a redução na conta de energia, em casa chegou a aproximadamente 20%.


“Pensar em sustentabilidade é essencial” O sistema de Aquecedor Solar de Água com tubo de PVC também já foi desenvolvido pelo Senai de Xanxerê. O diretor do Senai do município, Vanderlei Antonio Duarte, avalia ser importante esse novo sistema e a divulgação dessas alternativas de energia. “Tentamos passar aos alunos a importância do aproveitamento nas energias renováveis. Desenvolvemos esse projeto com eles e ensinamos como fazer para mostrar que é possível economizar energia”, explica ele.

Vanderlei já estuda refazer e apresentar o projeto de aquecedor solar de água com tubo de PVC para a população no “Mundo Senai” que acontece em outubro deste ano na cidade. “A questão de energia renovável está em evidência mais do que nunca, busca-se alternativas de estar economizando e não agredindo o meio ambiente. Pensar em sustentabilidade é essencial para que o fornecimento futuro não seja prejudicado”, conclui ele. Foto: Cleberson Cagol

“O valor que pagávamos era de mais ou menos R$50,00, e os meses subsequentes a instalação passou a ser de R$ 38 a R$ 40”, cometa Juliano. Outra casa, também em Coronel Martins, que conta com o sistema é a de Katia Amaral e Daniel Barea, que moram no interior do município e conheceram o projeto na mesma oficina que Juliano. “Na época, quando foi apresentado esse projeto para nós, achamos que seria uma boa ideia e que poderíamos economizar muito com isso”, comenta Kátia. Agora, a mais de meia década com o sistema implantado em sua residência, Katia avalia como positiva a adesão ao sistema. “Senti no bolso, e o resultado foi bom. Poupei em média 30% na conta de energia e ainda sabendo que estou contribuindo para o meio ambiente”, ressalta ela.

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Como funciona

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Consumo de energia elétrica por um chuveiro elétrico Nas residências nacionais são utilizados chuveiros de 4.000 a 8.000 W. Uma pessoa que toma um banho por dia com duração de 10 minutos gasta duas entre a cinco horas de banho por mês. Isso significa que consome de 20 a 40 kwh por mês, dependendo da potência do chuveiro. Se pegarmos como exemplo um chuveiro de 4.500 W, que gasta em média 4,5 kwh, quatro pessoas usando ele diariamente, com duração do banho de 10 minutos cada, vai consumir 90kwh por mês. Esse valor corresponde em média a 40% do consumo de energia de uma casa de quatro pessoas.

Coletores necessários para cada região Em regiões quentes, como o nordeste por exemplo, é necessário um coletor para cada 100 litros. Em regiões com baixa insolação, como São Paulo, é preciso um coletor para cada 90 litros. Em regiões frias, a exemplo do Oeste Catarinense, é necessário um coletor para cada 60 litros de água.

Foto: Cleberson Cagol

O Aquecedor Solar de Água é construído com coletores solares instalados sobre o telhado e ligados em uma caixa de água revestida com isolante térmico, que armazena a água que foi aquecida nos coletores. Depois a água quente pode ser usada no banheiro e também na cozinha como é o caso da Kátia. No banheiro, o chuveiro usado é do tipo que mistura a água quente e fria, para que possa regular a temperatura, uma vez que a água aquecida vem com a temperatura muito elevada. Também é instalado um chuveiro eletrônico para os dias em que não há sol. Para entender como funciona o movimento da água dentro do sistema e como mantém quente é preciso ter um conhecimento razoável em física, como explica Urbano. “O termo usado é “sifão”, ou seja, a água fria sempre fica no fundo e a quente, por ser mais leve, fica na parte de cima da caixa. O cano que leva aos coletores fica no fundo da caixa, que por sua vez vai receber a água fria, esquentá-la com o sol e jogála de volta para cima da caixa. Será uma circulação natural enquanto tiver sol” explica ele. Quanto ao tamanho do aquecedor que deve ser instalado é necessário fazer um estudo do caso. Depende de quantos integrantes tem a família e em média quanto tempo cada um fica no chuveiro. “Em uma casa onde moram três pessoas, o ideal seria três placas e mais uma caixa de 250 litros para água quente e outra de 500 litros para água fria”, explica Urbano. Se tratando da viabilidade do negócio, Urbano ressalta que “o investimento pode até parecer alto em um primeiro momento, mas após um ano ou pouco mais, o sistema já se paga e depois começa a sentir no bolso a diferença”, conclui.


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Foto: Juliana Matielo

Sustentabilidade à mesa Por Juliana Matielo e Daniel Paulus É através da sustentabilidade que os recursos naturais são utilizados de forma inteligente e são preservados para as gerações futuras. Para dar resultados, deve estar presente em todos os contextos: social, econômico e ambiental. Inclusive na hora de escolher o alimento para colocar à mesa. Anderson Guedes, 35 (anos), mostra com orgulho o projeto do restaurante sustentável que planeja construir em Chapecó. O sonho, que ainda está no papel, é inspirado em uma rede de restaurantes de São Paulo, projetados com conceitos de reutilização, reciclagem e autossustentabilidade. Ele é natural de Cascavel, no Paraná e desde criança aprendeu a cultivar alimentos com a avó, dona Leonilda Godinho, amante de plantas, frutas e verduras. Conhecido como “Pinguim”, trabalha com divulgação de campanhas publicitárias e, no tempo livre, corre atrás de investidores e patrocinadores para o “Restaurante Eco”. “Cresci vendo minha avó colocar as mãos na terra e cultivar todo tipo de alimento. Já tinha esse respeito pelo meio ambiente e uma vontade de fazer algo por ele e também pela minha saúde. Mais tarde, conheci o projeto de São Paulo e acredito que possa dar certo em nossa cidade”, planeja. O projeto se trata de um restaurante autossustentável, que pretende atender a conceitos ambientais em todos os aspectos possíveis. Na construção, Anderson prevê a utilização de materiais reaproveitados e reciclados.

“O projeto arquitetônico foi desenvolvido por um colega, o arquiteto Gustavo L. Dal Cin, que preza sempre pelo uso de materiais renováveis nas construções”, conta. Em relação a energia e consumo de água, as instalações serão pensadas para que possam economizar e até gerar energia, além de reservar água da chuva. O conceito principal é em relação ao cardápio: os alimentos utilizados na preparação dos pratos deverão seguir princípios do movimento Slow Food - em tradução livre “comida lenta”. Baseia-se na alimentação pensada através do meio ambiente, que se contrapõe ao Fast Food (traduzida do inglês “comida rápida”), principalmente quanto a forma com que esse tipo de alimento é produzido e preparado. A ideia é cultivar temperos, verduras, frutas e condimentos no próprio espaço do restaurante. O que não for possível produzir ali, busca-se na agricultura familiar responsável, que não utilize agrotóxicos no cultivo. “As hortas e pomares terão duas funções. Uma de subsidiar os suprimentos do restaurante, e outra que, o ambiente em si será muito leve e descontraído, um refúgio para a agitação da cidade. A ideia é que o alimento seja colhido na hora e que o cliente possa se sentar ao redor das árvores”, conta. A viabilidade do projeto é uma preocupação para Anderson, que se inspirou na rede Tantra Eventos e Eco House - Restaurante Sustentável, de Pinheiros - São Paulo. Pioneiro na América Latina, o local funciona como restaurante e casa de eventos, que pode

ser alugado para realização de festas, casamentos, etc. O projeto conseguiu incorporar o tripé da sustentabilidade, o que garantiu o sucesso do empreendimento. O proprietário e idealizador da Eco House, Eric Thomas, contou em entrevista ao programa Pequenas Empresas, Grandes Negócios, que o investimento total foi de um milhão de reais (em 2012) e que, em função da redução de gastos para manter o local, o retorno deste investimento era esperado em três anos. São 500 m², entre área para eventos adulto e infantil, restaurante e terraço com horta e pomar. As lâmpadas são todas de led, que consomem menos energia. Há uma pista de dança com um mecanismo que gera energia a partir dos movimentos, pulos e passos dados sob ela. Logo abaixo da pista, fica o reservatório de água pluvial, que abastece as descargas dos banheiros e fornece água para limpeza e irrigação da horta. “Essas e outras ideias garantem uma redução significativa nos gastos para manter economicamente o local”, conta o empresário. Eric abriu o negócio para franquias. O investimento para montar a mesma estrutura hoje, é de R$ 1,2 milhão, com um faturamento estimado em R$ 150 mil por mês, segundo Eric. O projeto de Anderson é menos ambicioso e a estrutura seria menor do que a Eco House. “Ainda estudo a viabilidade econômica do projeto, pois dependo de apoiadores e investidores para realizá-lo em Chapecó. Claro que, numa escala bem menor, começando de baixo mesmo”, explica.

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Slow Food em Chapecó? Para colocar o projeto em prática, além de garantir investimentos, Anderson diz que é necessário uma pesquisa de mercado. “Como todo novo negócio, antes de investir em algo, temos que saber se haverá público suficiente. Como ainda não tenho uma perspectiva de tempo para colocar o projeto em prática, não sei quando vou fazer. Tudo depende, se aparecer um investidor”, afirma. Esta reportagem buscou nas redes sociais a opinião de 46 chapecoenses sobre a implantação deste tipo de projeto em Chapecó. O público mostrou pouco conhecimento em relação a ecogastronomia e a restaurantes sustentáveis. A nutricionista Flávia Sell acredita na ideia do projeto, porém, aponta que a falta de tempo pode prejudicar o sucesso do restaurante. “Temos uma coisa que vai contra esse projeto, que se chama tempo. As pessoas correm muito hoje em dia”, afirma. Para ter um hábito de vida saudável não há nada melhor que o planejamento. “A maioria das pessoas não tem o hábito de comer salada, não é que não gostem de salada, mas apenas não tem o hábito de preparar. As pessoas veem como um tempo perdido, mas na verdade, seria um tempo ganho”, destaca a profissional. A falta de tempo é a justificativa mais habitual e preocupa quando se pensa na viabilidade de um restaurante ecogastronômico, pois nesse estabelecimento a intenção é que a pessoa “vivencie” o alimentar-se.

Tripé da Sustentabilidade No ambiental, conquistou eficiência energética (através de iluminação natural, telhado verde e lâmpadas led), eficiência no uso de recursos hídricos (captação de água pluvial), gerenciamento de resíduos sólidos (através da coleta seletiva) e de resíduos orgânicos (com a compostagem). No social, há o Projeto Escola Para Todos, cujo objetivo é auxiliar seus funcionários na conclusão do ensino médio, fundamental e até superior através da contratação de um professor particular que os orienta e estimula em seus estudos. No econômico, otimiza seus recursos financeiros para não onerar a operação e uso do empreendimento. Desta forma, ao consumidor final não há custos adicionais por ser uma casa com todos os padrões de sustentabilidade.

Ahhhh, as frutas… Conforme uma pesquisa do Ministério da Saúde, o hábito de comer frutas ainda é baixo no Brasil. Os dados indicam que apenas 18,9 % da população consome cinco porções diárias - o equivalente aos 400 gramas recomendados pela Organização Mundial da Saúde. A nutricionista Flávia Sell indica que a ingestão dessas cinco frutas seja distribuida da seguinte forma: Café da manhã - obrigatório uma fruta Lanche da manhã - recomendado uma fruta Almoço - sobremesa uma fruta Meio da tarde: obrigatório uma fruta Após o jantar: recomendado uma fruta 26

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Foto: Juliana Matielo

Da horta direto ao prato: os benefícios dos alimentos frescos Especialistas indicam que as hortaliças em geral, devem ser consumidas imediatamente após a colheita, para que não haja perda, principalmente de vitaminas. A nutricionista Flávia Sell diz que, ao colher e consumir imediatamente, todas as qualidades nutricionais do produto (legumes, verduras e frutas) se mantém íntegras. Para ela, a própria apresentação do produto fica melhor e instiga a sua ingestão. “Você pega uma salada fresquinha e uma que está estocada a mais tempo, ela te dá mais vontade de consumir e assim você se alimenta de forma saudável”, explica a nutricionista. Flávia destaca que a proposta de um restaurante ecogastronômico é bastante interessante, pois o consumidor tem segurança da qualidade do produto que está ingerindo. “No supermercado você não sabe exatamente como aquele produto foi cultivado, se é orgânico ou não, e também são produtos livres de agrotóxicos”, comenta. Atualmente, as pessoas estão mais conscientes em relação à saúde. A nutricionista aponta que o perfil dos pacientes está passando por mudança. “Antigamente procuravam a nutricionista porque queriam ficar magras. Hoje em dia 95% das pessoas que entram no meu consultório buscam saúde”, diz Flávia.

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Escolas chapecoenses promovem conscientização Projetos chamam a atenção para questões ligadas ao meio ambiente Por Alessandra Lara Zuanazzi Seidel e Rafael Bressan A preocupação com o planeta que vamos deixar para as nossas crianças é fundamental e de extrema valia. Mas e pelas crianças que vamos deixar para esse planeta, quem se responsabiliza? Partindo dessa máxima e notando a necessidade da precaução, a educação ambiental se tornou “decreto” nos Projeto Político Pedagógico (PPP) na maioria das escolas e instituições de ensino de Santa Catarina. O tema faz parte da Proposta Curricular do Estado, reelaborada em 2014. É nessa perspectiva que as escolas EEB Druziana Sartori e EEB Antônio Morandini, ambas de Chapecó, no oeste do estado, buscam potencializar a educação e consciência ambiental. Na escola Antônio Morandini, localizada no Bairro Saic, desde 2013 existe o projeto “Terra Nova”. Ele surgiu a partir da inquietude de um grupo de estudantes com a 28

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situação vivida na escola e arredores: muito lixo, poucas árvores e uma população sem consciência do problema e noção das consequências. O grupo mobilizou outros estudantes e professores que resolveram criar e executar o projeto. A mobilização foi tanta que hoje todas as turmas, de uma forma ou de de outra, fazem parte do projeto (cerca de 500 alunos). A Diretora da escola Valderez Barpi, afirma que o fato de ter sido iniciativa dos estudantes foi e é fundamental para o sucesso do projeto. “Da forma como surgiu o projeto, partindo deles, é muito mais fácil de chegar a bons resultados, porque foi ideia deles e não algo imposto pela direção e professores”, pontua a gestora. Tailini de Paula tem 12 anos. Ela integrava a turma da quinta série que deu o pontapé inicial do Terra Nova. Na época, quando as famílias dos alunos foram convocadas a


Foto: Divulgação

Foto: Divulgação Foto: Rafael Bressan

auxiliar na execução das atividades do projeto, seus pais ofereceram resistência e trataram o assunto com descaso. Hoje, eles afirmam que o Terra Nova foi agente de mudanças de comportamento, de consciência e dos seus cotidianos. “Ajudando na revitalização do ambiente escolar, percebemos que na nossa casa havia muito a ser feito. Desde a conservação dos espaços à questões simples, como a separação do lixo. Antes era um fardo, hoje é hábito, fazemos no automático”, afirma Marisa, mãe de Tailini. A escola investiu na arborização dos arredores, no recolhimento frequente do lixo e, em seguida, na separação, auxiliando na reciclagem. Ademais, promoveu intensas atividades de conscientização com os moradores das casas próximas à escola. “Agora podem parecer atitudes pequenas, mas lá na frente perceberemos o quanto essas mínimas ações fizeram a diferença”, ressaltou Tailini. Assim, a partir de pequenas atitudes, o projeto alcançou e segue buscando consideráveis transformações. O projeto foi tão positivo que se mantém até hoje. Algumas adaptações ainda estão sendo feitas, mas o resultado já é notório. Prova disso é que as atividades fazem parte do livro “Experiência Significativa: Relatos que fazem a diferença na educação básica” que será lançado no mês de julho pela Unochapecó.

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O P l a n o P o l í t i c o P e d a g ó g i c o , P P P, é u m d o c u m e n t o q u e reúne as metas, aspirações e os meios para se atingir o b j e t i v o s d e t e r m i n a d o s p o r u m a i n s t i t u i ç ã o d e e n s i n o. O P P P e n g lo b a p r o p o s t a s q u e d e v e m s e r c o n c r e t i z a d a s n u m t e m p o q u e t a m b é m s e r á p r e v i a m e n t e e s t a b e le c i d o . D e s s a fo r m a , o d oc u m e n t o a t u a co mo u m g u i a q u e d i re c i o n a ge st o re s, p rofe ss o re s, fu nc i o n á r i os, a lu nos e a t é me s mo a s f a m í l i a s e n v o lv i d a s d i r e t a m e n t e c o m a e s c o l a .

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Investir nas séries iniciais é garantia de resultados foi muito interessante.” O trabalho não para por aí. A ideia de Marise é fazer uma apresentação a todas as turmas do Ensino Fundamental para mostrar o desperdício que ocorre na escola. Como ferramenta, a professora pretende utilizar fotos e textos de orientação. “Além disso, vou apresentar algumas alternativas para esse problema, como receitas que utilizam partes dos alimentos que são considerados sem serventia, como talos e cascas, a fim de utilizar ao máximo cada um deles”, afirma. A reciclagem também faz parte do projeto. Em trabalho conjunto com a professora de Artes Claudia Tironi, os alunos confeccionaram um brinquedo ou porta-objeto cada um. Na criação, utilizaram somente sucatas. Outra produção do gênero, que está em andamento, é a confecção de maquetes que representem o quarteirão onde a escola está situada, novamente utilizando apenas materiais recicláveis. “Com isso, queremos estimulá-los a evitar o desperdício e a produção de lixo, mais uma vez, reaproveitando o que for possível”, esclarece Claudia. A educadora destaca a importância da prática, das atividades lúdicas, mas sem esquecer do estudo conceitual. “Precisamos

dar o primeiro passo para que os alunos se tornem “ecologicamente alfabetizados”, trabalhando com pequenos textos para que desenvolvam também a oralidade e a escrita”, afirma Marise. Ao propor e receber propostas de projetos relacionados à preservação do meio ambiente, a escola assume um papel que vai além do sentido óbvio e limitado da palavra educação. Os professores entendem que não basta explicar os problemas de cunho ambiental, as suas causas e resultados. É necessário perpassar o limite da percepção dos alunos e fazê-los entender a ligação que o ser humano possui com o ambiente e aplicar, mais do que na teoria, práticas que enraízem a conscientização.

Foto: Divulgação

É muito mais fácil “moldar” o comportamento e os pensamentos de crianças em relação aos adultos, que já possuem suas ideias cristalizadas. Investir na Educação Ambiental ainda nas séries iniciais é aposta certeira. Partindo desse pressuposto e de uma iniciativa da direção e da coordenadora das séries iniciais, Nilse Naue, é que se originou, na EEB Druziana Sartori, o projeto “Eu e o meio ambiente”, abrangendo 295 estudantes. A partir desse tema, as professoras das turmas de 1º a 5º ano desenvolveram o projeto para turma com focos diferenciados. Em estágio mais avançado está o 3º ano do vespertino, com a professora Marise Beatriz Occhi. Marise é nova na escola, mas logo nas primeiras semanas percebeu quanto lanche era desperdiçado. Incomodada com a situação e com o desperdício, ela propôs um trabalho em cima da produção, conservação e reaproveitamento dos alimentos. Para que não haja tanto desperdício de comida, a professora, inicialmente, mostrou a realidade de muitas famílias do país em relação a fome. Posterior a isso fotografou os alunos jogando o lanche na lixeira e quanto acumulou no final dos 15 minutos de intervalo. O resultado espantou os alunos. Na segunda vez que a professora fez as fotos muitos alunos demonstraram comportamento diferenciado. “Isso gerou curiosidade por parte de muitos e, também, inibiu a ação de muitos que começaram a cuidar o que estava indo para o lixo. Isso

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Foto: Cristiano Pinto Zamboni

A falta da coleta seletiva ainda gera poluição Segundo Aterro do Conigepu deve durar 12 anos Por Cristiano Pinto Zamboni e Viama Bau

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Os municípios deveriam eliminar os lixões, desde agosto de 2014, e implantar a coleta seletiva, conforme a Lei 12.305, que trata sobre os resíduos sólidos. Mas não é o que acontece na maioria dos municípios. A coleta seletiva ainda não está implantada e tem pontos de acúmulo de lixo nas beiras de estradas e matas, em diversos municípios. Na região norte do Rio Grande do Sul tem pessoas que ganham o sustento catando materiais recicláveis nas lixeiras. A preservação do meio ambiente é uma das formas de zelar pelos recursos naturais, como as nascentes de água e as espécies de pássaros que estão na natureza. Algumas das iniciativas são ações comunitárias que tem objetivo de realizar campanhas de conscientização sobre a correta separação do lixo. 34

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A microrregião norte do Rio Grande do Sul, que compreende 12 municípios, tem um centro de triagem do lixo doméstico. É um consórcio, gerido pelos municípios, que conjuntamente, destinam os rejeitos que antes eram depositados nos lixões, nas respectivas cidades. Segundo o administrador do Consórcio, Elton Santin, a coleta é realizada por empresas contratadas pelas prefeituras dos respectivos municípios, que realizam regularmente a coleta nas lixeiras e o transporte do lixo até a central do Conigepu, Consórcio Intermunicipal de Cooperação em Gestão Pública, no município de Trindade do Sul. O Conigepu, tem uma equipe de 82 colaboradores, moradores de Trindade do Sul, que trabalham de segunda à sexta-feira, das 07h às 12h

e das 13h30 às 17h. O administrador informa que a central de triagem recebe 30 toneladas de lixo por dia. O consórcio foi criado em 2006, tinha a denominação de Conilixo e era uma empresa mista. Em 2011 passou a se chamar Conigepu e passou a ser uma empresa pública. Os caminhões descarregam na plataforma de entrada e os sacos de lixo passam pelas esteiras para a triagem. Os itens que podem ser reciclados são selecionados e armazenados em baias, para na quantidade exata serem prensados em fardos. O lixo orgânico que sobra na esteira é conduzido com um carreto até o aterro orgânico. O Conigepu tem dois aterros de lixo. Um já está no limite de utilização e outro foi escavado recentemente. O novo aterro tem área de 5.050m², com estimativa de vida útil de 12


Foto: Cristiano Pinto Zamboni

Com o mau cheiro que é exalado pelo aterro os corvos e urubus rondam a região e se aglomeram em cima do lixo. Em períodos regulares, dependendo da necessidade, é feita a compactação do aterro com terra. Segundo a bióloga Juciane, o aterro gera o gás metano e o chorume. O gás é drenado para fazer um ciclo de geração, drenagem e armazenamento nas lagoas de contenção. O gás formado no aterro é queimado para evitar a poluição do meio ambiente. O restante do chorume é transformado em adubo. Para o funcionário Adílio Duranti, que trabalha a cinco anos no Conigepu, este é um trabalho como qualquer outro. Ele ainda destaca que realiza um trabalho com uma função social, de cuidar do meio ambiente. O Conigepu é localizado na comunidade de Colônia Nova, área rural de Trindade do Sul, a três quilômetros da cidade. O presidente do Consórcio, prefeito de Trindade do Sul, Luiz da Silva Rosa, analisa que o Conigepu está cumprindo com o papel social. “O Consórcio é exemplo para os demais municípios da região. Temos o município de Erechim

que está vindo conhecer o projeto para no futuro implantar na região deles”, destaca o presidente. Ele ainda acrescenta que o consórcio tem uma responsabilidade muito grande, porque faz a prestação de contas para o Tribunal de Contas do Estado. Ele faz uma observação que tem pessoas que querem criar cooperativas de catadores de material reciclável, mas isso não vem de encontro com o propósito do Conigepu já que resultaria em menos material para reciclagem. O valor que resulta da venda dos materiais recicláveis são usados para pagar os trabalhadores do Conigepu e demais despesas de funcionamento do complexo. Contudo, a receita não é suficiente. O valor que falta para saldar as contas do mês são divididos de forma igual para os 12 municípios. Ou seja, além dos municípios terem que pagar para uma empresa fazer a coleta, precisam ajudar com uma taxa mensal para o consórcio, que pode ser variável. Um exemplo é o município de Nonoai que paga R$38.900,00 para uma empresa recolher o lixo e no mês de julho terá que pagar R$15.277,76 para o Conigepu.

“ N ã o é a p e n a s s e p a r a r, temos que ter a atenção de tirar para reciclagem tudo que é possível para mandar para o aterro a p e n a s o li xo o r g â n i c o”

Foto: Cristiano Pinto Zamboni

anos. O complexo do consórcio tem área de 70mil m². Elton destaca que o material reciclado é armazenado nos barracões em fardos. “Quando o mercado de materiais recicláveis oferece um preço considerado bom é realizada a venda do estoque para indústrias de reciclagem. A receita obtida com a venda ajuda a custear o funcionamento do consórcio”, ressalta o administrador. O Conigepu tem 12 municípios consorciados: Alpestre, Constantina, Entre Rios do Sul, Engenho Velho, Gramado dos Loureiros, Nonoai, Rio dos Índios, Trindade do Sul, Três Palmeiras, Ronda Alta, Rondinha e Sarandi. Segundo a bióloga do Conigepu, Juciane Aresi, um dos principais problemas no recolhimento do lixo é a conscientização da população nos municípios. “As pessoas precisam separar o lixo para depositar na lixeira. Outro fator que precisa ser adequado é os caminhões, com plataformas separadas para cada tipo de lixo para agilizar o serviço e não misturar o material”, destaca. O lixo é descarregado na plataforma de entrada e cai direto nas esteiras. Os trabalhadores ocupam os dois lados da esteira para separar os diversos tipos de materiais. Quando são identificadas embalagens de vidro, essas são recolhidas e armazenadas em um contêiner para a destinação correta. O Conigepu tem licença de operação expedida pela Fepan por tempo indeterminado. “Os municípios são responsáveis em implementar a coleta seletiva de lixo e terminar com os lixões, por normas da Lei 12.305, que trata dos resíduos sólidos, mas mesmo assim o lixo não está vindo separado”, complementa a bióloga.

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Foto: Cristiano Pinto Zamboni

O desafio da população Outro fator que merece destaque é a conscientização da população para a correta destinação de resíduos sólidos. Segundo o chefe do Departamento de Meio Ambiente de Nonoai, José Carlos Pires Moreira, ocorre o descarte de materiais diversos, caracterizados como entulhos nas beiras de estradas ou em matas. Moreira revela que o Departamento apresentou um projeto de uma central de triagem para os resíduos descartados como entulho, galhos, sofás, móveis velhos, e outros itens. “O projeto já foi levado ao conhecimento da administração”, enfatisa Moreira. Conforme o secretário de Assuntos Urbanos de Nonoai, Antonio Mânica, a Administração está analisando propostas de empresários para a instalação de uma central de triagem de material reciclável. “Se for confirmada essa instalação podemos dar mais condições para a entrega do material e beneficiar as pessoas que coletam material para reciclar”, argumenta. Mânica também comenta que são várias pessoas que realizam esse trabalho no município, por isso a preocupação em encontrar alternativas para dar mais infra-estrutura para essa atividade. Sobre o lixo largado nas beiras de estrada, quando é de conhecimento da secretaria é feito a coleta e a correta destinação. Os entulhos e restos de construções são usados para ensaibrar as estradas. O diretor de Políticas Urbanas de Nonoai, Claudir Diniz de Oliveira, comenta que a coleta seletiva é o início de um processo de preservação contínuo do meio ambiente. “Todos ganham com a coleta seletiva. As pessoas fariam a parte cidadã, de separar o lixo antes de depositá-los na lixeira. Os catadores iriam ganhar na hora do recolhimento, porque estaria separado o que pode ser reciclado e o lixo orgânico. O Conigepu e ou outras empresas de triagem ganhariam com a venda dos materiais para as indústrias”, destaca Diniz. O município de Nonoai está realizando campanha de conscientização para a implantação da coleta seletiva. Ele complementa que o meio ambiente ganha com todo esse ciclo de política reversa. “Em Nonoai, a área do antigo lixão está preservada, com a plantação de árvores para reflorestamento”, destaca. 36

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Foto: Cristiano Pinto Zamboni

Claudir avalia que o processo de coleta seletiva e a política reversa geram o desenvolvimento porque agrega aos serviços, principalmente com o processo de reciclagem. É possível destinar corretamente o lixo descartado, os catadores poderão ter renda com a venda desse material para as empresas que fazem o processamento do que seria jogado fora. É um processo que só aumentará, gerando o desenvolvimento sustentável”, conclui Diniz. O comandante da Policia Ambiental de Nonoai, sargento Alencar Fontana, relata que o Comando Ambiental com sede em Nonoai também tem um projeto de educação ambiental nas escolas. O projeto Patrulheiro Ambiental Mirim é realizado semestralmente em uma escola, com turmas de alunos com até 12 anos que participam de palestras e atividades práticas. “O objetivo é promover a conscientização das crianças, para elas crescerem cuidando do meio ambiente. São 15 aulas e a cada semestre temos mais de 40 alunos formados no projeto”, ressalta. Sobre os crimes ambientais, Fontana esclarece que quando há denúncias ou fatos que merecem a fiscalização, ocorre a averiguação do fato e se necessário é realizada a autuação e encaminhamento para o Ministério Público.

A diferença em uma ação simples Enquanto está sendo realizada a separação do lixo doméstico, e encaminhamento para a reciclagem, ainda tem pessoas que tiram o sustento coletando materiais diversos que são jogados no lixo na cidade de Nonoai. É o caso de Domingos Fortes, 62 anos, que realiza a coleta de itens que podem ser reciclados. Ele conta que faz 15 anos que começou a atividade. Na época com um cavalo e uma carroça, percorria as ruas da cidade de Nonoai em busca de papel, plásticos, garrafas e itens que podem ser reciclados. Segundo Domingos Fortes, foi a forma que ele encontrou para viver e de contrapartida ajuda na preservação do meio ambiente. Ele relata emocionado que os papéis, plásticos, pets e outros materiais que recolhe nas lixeiras são aproveitados, mas nem tudo está organizado. “Muitas vezes recolho os materiais que são possíveis de reciclar e arrumo nas sacolinhas o lixo que fica nas lixeiras”, comenta Domingos.

Ele mora no Bairro Operário, onde fica uma propriedade utilizada para guardar o material para a entrega às empresas de reciclagem. O plástico e o papel são entregues para uma empresa da cidade de Alpestre - RS e o ferro é entregue para uma empresa da cidade de Chapecó - SC. Para fazer uma entrega ele precisa recolher de dois a três mil quilos de material reciclável, período que dura de 10 a 15 dias. “Tem muitas coisas jogadas que as pessoas não têm consciência. Pegam de um lugar e jogam em outro. Esses materiais podem parar em um rio ou poluir o meio ambiente”, comenta. Domingos ainda revela que poderia haver uma associação na cidade, mas nunca teve incentivo para a realização de algo parecido, exeto pelo o apoio da Prefeitura que ajudou a fazer o aterro na propriedade para melhor guardar o material recolhido. “Eu trabalho de domingo a domingo, não tem horário. Tem pessoas que me conhecem, que pedem para eu ir buscar materiais para reciclar”, conclui Domingos.

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Destinação inteligente do lixo reciclável é fonte de renda em Chapecó Presidente da Associação de Catadores de Materiais Recicláveis Armaluz alerta sobre a contaminação causada pelos resíduos orgânicos deixados no lixo reciclável Por Marina Oliveira e Nádia Michaltchuk Entre as principais preocupações das cidades desenvolvidas está a quantidade de lixo produzido pela população. Esta questão representa um desafio às empresas especializadas em reciclagem, afinal, muitas pessoas não estão conscientizadas em relação aos problemas causados pela má separação do lixo. O que nem todos admitem é que ter uma cidade limpa depende tanto de políticas públicas e serviços adequados que garantam a limpeza urbana, quanto dos cidadãos que, em pequenos hábitos diários, podem reduzir grande parte da poluição ambiental. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, o brasileiro joga fora cerca de R$ 8,5 bilhões em produtos que poderiam ser reaproveitados. Uma pessoa adulta gera em média um quilo de lixo por dia e mais da metade disso é matéria orgânica. São cerca de 22 milhões de toneladas de alimentos jogados fora no Brasil. O​ s alimentos desperdiçados poderiam sustentar 30 milhões de pessoas por ano.​É o que equivale à população de países como o Iraque. Ainda pior que o desperdício de alimentos,​é​saber que apenas 26% dos brasileiros reciclam o lixo, segundo pesquisa realizada 38

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pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope). O estudo indica também que a maior concentração de brasileiros que praticam a reciclagem em suas casas está entre pessoas de 35 a 75 anos. Enquanto isso, os resíduos não separados causam prejuízos irreparáveis ao meio ambiente e aos catadores de materiais reciclados, que perdem muito tempo descartando o lixo orgânico. A reciclagem, além de trazer benefícios à preservação do meio ambiente, é socialmente importante, pois movimenta a economia, gera empregos e é fonte de renda para milhares de brasileiros. Este é o caso dos trabalhadores da Associação de Catadores de Materiais Recicláveis Armaluz, localizada no bairro Bom Pastor, em Chapecó. A associação emprega sete associados. Entre eles o seu Adão Francisco dos Santos, de 64 anos. Adão é presidente da associação e vivencia a reciclagem todos os dias. Ele conta que cerca de 40% do material recebido através da coleta seletiva realizada pela empresa TOS ­Grupo Tucano v​em misturado com resíduos orgânicos. Além disso, ressalta o quanto a inconsciência da população em relação à importância

da reciclagem faz com que o uso dos materiais seja inviabilizado. Segundo o presidente, em Chapecó, o centro da cidade é a região que mais dá trabalho a eles, pois os restaurantes, lanchonetes e hotéis misturam o lixo na hora do descarte, sem pensar que estão prejudicando a renda de muitas famílias. “Em relação a rentabilidade o que mais se perde é o tempo. Porque você poderia estar reciclando um material que gera renda, então você tem que reciclar o lixo orgânico, separar para não contaminar os demais e deixar ele em um canto até o caminhão vir buscar. Ninguém paga por esse material”, lamenta Adão. Não é só a perda financeira que a má separação do lixo implica a essas pessoas, pois lixo orgânico traz a ploriferação de fungos e bactérias ao ambiente de trabalho. Seu Adão lembra que já houve casos em que a associação recebeu animais mortos e dejetos através do caminhão da coleta seletiva. Situações como essa podem gerar graves problemas. Além de contaminarem o material reciclável, atraem animais como ratos, moscas e baratas para o local de trabalho, pondo em risco a transmissão de doenças para os trabalhadores.


Mobilização incentiva reciclagem Chapecó conta com quatro associações de recicladores; Amarluz, Asmavi, Amaré e São Francisco, que realizam diariamente o mesmo trabalho. Ambas encontram as mesmas dificuldades durante a coleta do lixo. No dia 25 de abril de 2015 as associações se reuniram, em parceria com o Fórum de Resíduos Sólidos de Chapecó, para realizar uma mobilização na praça Coronel Bertaso, no centro da cidade. O principal intuito foi a conscientização dos moradores na separação adequada do lixo orgânico e reciclável. Na ocasião, os associados realizaram uma simulação do processo de perda quando o material vem misturado. “A intenção foi chamar a atenção da população para separar o material corretamente. Assim, poderemos realizar o nosso trabalho com mais rentabilidade, segurança e direitos. Além de garantirmos limpeza e organização para a cidade”, finaliza Adão.

O F ó r u m d e R e s í d u o s S ó li d o s d e C h a p e c ó ( F R S C ) é uma instância que agrega interessados, atuantes e r e s p o n s á v e i s p e l a g e s t ã o d o s r e s í d u o s s ó li d o s n o município de Chapecó (SC). Seu objetivo é promover a d e fe s a d o me i o a m b i e nt e a t r avé s d e e nt i d a d e s p ú b li c a s e p r i v a d a s c o m p r o m e t i d a s c o m a G e s t ã o I n t e g r a l d o s R e s í d u o s S ó li d o s .

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Reciclagem como promoção de mudança social O Verde Vida trabalha há quase 20 anos para transformar vidas dos jovens carentes de Chapecó Por Cristina Gresele e Marina Folle Schielke

Em um dos bairros mais carentes de Chapecó vive um garoto robusto de bochechas rosadas, cabelos cacheados e bastante tímido. Clemer de Moraes vem de uma família humilde e encontrou refúgio em um lugar que transforma materiais recicláveis em educação e preparo para crianças e adolescentes entre 12 e 17 anos. No coração do bairro São Pedro está o Verde Vida, uma organização sem fins lucrativos que realiza coleta de materiais recicláveis em toda a cidade de Chapecó. A renda conseguida com a venda destes materiais sustenta oficinas socioeducativas que atendem os jovens do bairro. Clemer foi um destes. Desde pequeno frequentou o espaço e confirma que ele fez diferença em sua vida. “Durante o tempo que frequentei o Verde Vida muitas vezes tive vontade de não ir, pois eu era muito tímido e tinha vergonha de fazer as atividades na frente de meus colegas. Depois que comecei a ir todos os dias, percebi o 40

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quanto era bom para o meu futuro e quando chegavam os finais de semana eu já tinha saudade das segundasfeiras para ir ao Verde novamente”, relata. Hoje, aos 15 anos, depois de passar por algumas oficinas do programa, Clemer foi encaminhado ao mercado de trabalho. “Tive a oportunidade de ser indicado a uma entrevista no jovem aprendiz do Banco do Brasil e tentar conseguir meu primeiro emprego. No final deu tudo certo, fui aceito no Banco do Brasil. Fiquei muito triste por ter que parar de frequentar o Verde, mas minha família ficou muito feliz e orgulhosa por eu ter conseguido trabalhar em um banco, algo que para eles era muito difícil”, descreve. Assim como Clemer, muitos jovens são atendidos pelo programa, encaminhados ao mercado de trabalho e têm a oportunidade de conquistar uma vida melhor. O lugar onde vivem os expõem à violência, tráfico de drogas, e a um estilo de vida à

margem da sociedade. No programa, encontram além da inclusão social, orientações e apoio para encontrar uma nova forma de viver. O Verde Vida é uma organização sem fins lucrativos, fundada em 1994, reconhecida como de utilidade pública municipal, estadual e federal. Trata-se de uma entidade do Terceiro Setor, importante pela inclusão social que realiza, pelas ações ambientais da coleta e destinação correta de recicláveis, e por sensibilizar a comunidade em relação às responsabilidades ambientais. Também é uma entidade ambientalista reconhecida pelo Ministério do Meio Ambiente. A ONG participa do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, do Conselho Municipal de Assistência Social, do Conselho Nacional de Assistência Social, do Conselho Municipal do Meio Ambiente e do Fórum de Resíduos Sólidos de Chapecó.


Saiba como acionar o Verde Vida:

Foto: Cristina Gresele

Organize com seus colegas de empresa ou vizinhos um Ponto de Entrega Voluntária (PEV) que permita a armazenagem de uma grande quantidade de material; Mantenha o local seco e em uma área interna da empresa, condomínio ou residência; Entregue no Verde Vida ou agende a coleta com antecedência.

A reciclagem Materiais recicláveis são coletados em mais de 200 pontos comerciais e residenciais da cidade de Chapecó. O material recolhido é separado em um espaço próprio da ONG e posteriormente vendido para empresas da região. Para realizar esse trabalho, o Verde Vida dispõe de seis caminhões que diariamente fazem a coleta dos recicláveis. Trabalham no processo 39 funcionários remunerados a partir da venda dos materiais. Conforme a encarregada de produção, Silmari Pereira é importante que todos conheçam o trabalho do Verde Vida e evitem o desperdício de materiais recicláveis que podem ser úteis para o processo de reciclagem. “O trabalho do Verde Vida é diferente

do trabalho de empresas de coleta seletiva, pois nós entramos nas empresas para pegar os materiais, enquanto as outras empresas fazem a coleta na rua”, explica. Ela orienta que as empresas busquem o Verde Vida para destinar seus materiais recicláveis, pois, no latão de lixo, em contato com outros resíduos orgânicos, essa matéria, que poderia ser reciclada, muitas vezes é inutilizada. Conforme o presidente do Verde Vida, Valdemar Stoll, o objetivo é ter cada vez mais pontos de coleta, o que aumentará o investimento nos programas sociais da ONG. Além da coleta de materiais recicláveis, outras ações sustentáveis são desenvolvidas pelo programa. Após mais de um ano de planejamento, em 2015 a usina de óleo de cozinha entrou em funcionamento. Para o presidente da ONG, esse é um grande

avanço na questão ambiental, pois um litro de óleo de cozinha, quando não recebe a destinação correta, pode contaminar milhares de litros de água. A campanha de coleta do óleo é realizada em escolas, supermercados e restaurantes da região. Após ser encaminhado à usina, o produto é peneirado e posteriormente é vendido, destinado para a produção de sabão. Os resíduos não utilizáveis são destinados à construção civil. Outra novidade implantada em 2015 é a compostagem de orgânicos para a produção de adubo. Diariamente, os caminhões do Verde Vida também fazem a coleta de materiais orgânicos, descartados, principalmente por grandes supermercados da região. A compostagem acontece em um espaço próprio, junto à sede do Verde Vida, no bairro São Pedro.

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Foto: Cristina Gresele

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O Verde Vida tem como principal objetivo a transformação e inclusão social. Com esse fim, desenvolve oficinas socioeducativas com crianças e adolescentes do bairro São Pedro. Através destas oficinas, as crianças e os jovens da comunidade têm a oportunidade de desenvolver os seus potenciais e sua criatividade, podem brincar e se divertir de forma saudável. As oficinas também proporcionam aos seus participantes o autoconhecimento e a oportunidade de descobrirem os seus talentos. No total são oferecidas 14 oficinas e cerca de 200 alunos são atendidos. Para a professora da oficina de Salão de Beleza, Pamela Aracen, os professores tornam-se um espelho para os alunos, e por isso ela sempre busca orientá-los além do conteúdo da oficina. “‘Aproveitem a oportunidade’. É o que eu sempre digo para os meus alunos, pois o curso que eles têm aqui, de forma gratuita, e a oportunidade de aprender uma profissão, são poucas crianças que têm”, explica. A professora Maria Rejane Colaço, responsável pela oficina de manicure já dedica uma década de seu trabalho

ao Verde Vida. Para ela, preparar para o mercado de trabalho e desenvolver as habilidades são os principais objetivos da oficina que ministra. Ela conta que apoia e se envolve com os alunos de forma especial. “Eu também passei por algumas situações ruins no meu passado, e tudo mudou. Por isso, eu me apego muito a essas meninas e é muito gratificante poder participar do desenvolvimento delas”, afirma. No programa, os alunos recebem suporte para diferentes situações da vida. A oficina de teatro, por exemplo, trabalha na comunicação e desenvoltura dos alunos. O professor Fábio Gusso explica que “com as técnicas que aprendem, eles se sentem mais seguros para uma entrevista e trabalho, por exemplo”. Os adolescentes, além das oficinas, também recebem atendimento psicológico no Verde Vida. A psicóloga Aline Ricardi realiza sessões em grupo e, conforme as necessidades de cada adolescente, também é feito um trabalho individual. Oportunidades de emprego, estudo e formas de seguir a vida longe da violência e das drogas. É isso que a coleta e venda dos recicláveis representa para os jovens que recebem ajuda e frequentam o Verde Vida. Essa é uma inciativa que muda vidas e influencia a sociedade para buscar um bem maior. Foto: Cristina Gresele

Meio para um fim

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Coleção de roupas inovadoras e sustentáveis saem do papel Estudantes participam de exposição na bienal Brasileira de Design em Florianópolis Por Maristela Eli dos Santos e Samara Grando

Ao percorrer uma pequena viagem diária para chegar à faculdade, Glaucia Simon e Thais Haeberling provam que gostam muito da profissão que escolheram trilhar ao longo de suas vidas. Glaucia vem de Saudades e Thais de Maravilha para cursar design de moda na Unochapecó. Elas acreditam que usarão a profissão para um grande feito. Com visão de futuro, a preocupação das duas com o planeta é notável. As acadêmicas do quinto período participaram no dia 11 deste mês da Bienal Brasileira de Design 2015. O evento aconteceu em paralelo à Bienal, realizada na Universidade da Univali em Florianópolis-SC. A criação é uma coleção com peças de roupas reutilizadas, é conhecida como Design para Todos. “Estou muito feliz com este projeto e com as peças expostas pelas estudantes, foi realizado um belo trabalho”, afirma a coordenadora do curso de Design de Moda, Rachel Quadros. Segundo o site Abril, na editoria Desenvolvimento, sustentabilidade 44

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é um conceito sistêmico, integrando e relacionando em ordem aspectos econômicos, culturais, ambientais e sociais de toda sociedade. A reutilização de peças, acessórios e utensílios sem prejudicar ou agredir o meio ambiente se encaixa nesse conceito e o benefício está desde o desenvolvimento das peças até a compra dos produtos. As roupas que antes seriam jogadas fora, ou deixadas de lado, para as estudantes são matéria-prima para reutilizar, fazer novas criações, inovar. Desse modo, a preocupação com o meio ambiente também aparece no vestir consciente. Desde os primórdios da existência até os dias atuais o homem vive para conquistar. Uma vez a apropriação da terra, depois a conquista pelo ouro, em seguida o sonho da casa própria e tudo mais para seu conforto e sobrevivência. Porém, para ocupar seu lugar ao sol, a degradação do meio ambiente foi a pior consequência. Segundo o site da JusBrasil, o planeta pede socorro, pois o efeito estufa e o aquecimento global, por exemplo, afetam toda o ecossistema.

Ideias de sustentabilidade geram seminários e eventos no mundo todo. Ainda no site JusBrasil, há mais informações sobre a Organização das Nações Unidas, a ONU, que fundou o grupo Caring for Climate, tem como intuito combater essas mudanças climáticas para que a partir de ações conjuntas e contínuas se obtenha a preservação do planeta. Pequenas atitudes podem servir de exemplo, como um pedaço velho de tecido, uma roupa que foi esquecida com o tempo ou porque saiu de moda podem dar vez a lindas e exclusivas peças. E é isso que fizeram as estudantes. Para elas, as peças estarem expostas na Bienal é uma forma de reconhecimento pelo trabalho e isso é muito importante, pois gera mais motivação. Ideias como a das alunas podem ser vistas em outras formas com o uso de materiais recicláveis nos mais diversos produtos. Mas como o jeans é um material que agride muito o planeta na sua fabricação, as meninas decidiram que este seria o carro-chefe de sua coleção.


Foto: Maristela dos Santos

Arquivo pessoal

J a q u e t a f e i t a à p a r t i r d e c a lç a jeans, com tingimento em cozimento

As acadêmicas com sua criação em mãos

As técnicas usadas para elaborar a coleção Desde que decidiram os materiais que utilizariam, foram em busca deles. Thais conta que tinha vergonha de pedir as peças e não sabia como abordar o assunto com as pessoas. Mas se surpreendeu com a doação de várias peças pela dona de uma loja, que depois de tempo teve enfim coragem de perguntar. Glaucia diz que a arrecadação foi melhor do que elas imaginavam, com muita gente se disponibilizando a ajudar. Isso deixou as duas muito contentes e motivadas para dar uma nova cara a todas as peças que estavam inutilizadas. Com auxílio da coordenadora e dos professores do curso de Design de Moda, as acadêmicas elaboraram suas peças. Cada peça teve seu diferencial e foi confeccionada com toda a atenção. Tingimentos, recortes, costuras e adaptações criativas foram o diferencial na coleção. Uma das peças foi feita em modelagem tridimensional (em três dimensões). “O macacão foi

feito com tecido de jeans recortado em tiras, montados primeiramente na mesa e depois todo adaptado ao corpo do manequim”, relata Thais ao falar de uma peça da confecção exclusiva feita por quatro mãos. O trabalho foi feito na Usina da Moda, (um laboratório do curso que fica dentro do campus da Universidade). A participação dos professores foi de extrema importância para o resultado final. Glaucia e Thais afirmaram que os professores motivaram elas durante todo o processo, o que fez com que elas ficassem mais seguras. O peso da participação em um evento representando a Universidade é de muita responsabilidade e se tudo desse certo, o nome delas, do curso e da Unochapecó ficariam em evidência e muito bem representados. Difícil é definir uma peça que seja a favorita, mas uma delas é de extrema importância, a jaqueta vermelha, feita de tecido e pedaços

de jeans. Ela foi tingida a partir do cozimento e modelada no manequim (a peça passou por fervura para que a tinta fosse fixada e foi adaptada ao corpo do manequim). “A jaqueta foi feita através de uma calça jeans e modelagem tridimensional. A saia de tecido jeans possui uma prega macho tanto na frente quanto nas costas com detalhes em triângulos aplicados nas pregas tingidas na cor vermelha.” afirma Glaucia. O projeto possui visão futurista, pois ações no presente que são elaboradas pensando no amanhã contribuem com o meio ambiente, sem agredir o ecossistema. Além disso, pensar no que se veste, é também pensar em como esses produtos chegam, sua origem e processo de fabricação. O mínimo que o homem pode fazer é tentar minimizar os danos causados no meio ambiente, afinal, a devolutiva desses danos veem para ele próprio.

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Poços artesianos são a solução? Uma saída momentânea para abastecimento de água

Por Eduardo Bender e Stefani Specht

O oeste catarinense é reconhecido nacionalmente pela força econômica movida pela agricultura e as agroindústrias da região. Devido a esse crescimento acelerado, a destruição do meio ambiente se torna, muitas vezes, necessária. Matas ciliares e nascentes de água são destruídas, o que provoca um descontrole ambiental. Uma das preocupações das autoridades regionais é a falta de água potável para o consumo humano, pois em épocas de seca, vários municípios sofrem com o racionamento da principal fonte de vida: a água. Grande parte das fontes de água superficial está contaminada ou secaram com o excesso de poluição. Uma das alternativas encontradas para suprir o problema é a exploração das águas subterrâneas através de poços artesianos, submetendo ao consumo crescente desse recurso. Situações como essa podem gerar a intensa 46

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exploração dos aquíferos e desabastecer os poços e vertentes superficiais. As águas subterrâneas da região oeste de Santa Catarina e região sul do país fazem parte da Bacia do Rio Jacutinga e Contíguos. O território possui 2477 poços artesianos, reconhecidos até 2013 e subdivididos em dois tipos: os poços tubulares profundos e os poços comunitários que são de propriedade de grupos familiares rurais. O gráfico publicado em um artigo do XVIII Congresso Brasileiro de Águas Subterrâneas apresenta a distribuição dessas centenas de perfurações nos municípios da Associação dos Municípios do Alto Uruguai Catarinense (Amauc) e do Consórcio Lambari, em que os poços comunitários registram a minoria do total de poços apontados. Do montante, 1531 poços estão funcionando, 648 são considerados poços secos, 129 não estão ativos e 169 não apresentaram informações suficientes que atingissem o propósito da pesquisa. Aproximadamente mil poços não contribuem de forma alguma, um dado que requer mais atenção. Desde o início deste ano, o Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH) decretou a diminuição das burocracias necessárias para a perfuração, substituindo o licenciamento ambiental por apenas a outorga. Isso facilita o aumento do número de poços. Antes da perfuração são realizadas vistorias por


engenheiros, contudo, através dos dados apresentados, requer-se mais pesquisa de campo para identificar as reais possibilidades dos poços. De nada adiantam os números se a eficiência deixa a desejar. A Amauc e o Consórcio Lambari prestam serviços para alcançar a excelência e a sustentabilidade no desenvolvimento da região. Conforme o Presidente do Comitê da Bacia do Rio Jacutinga Vilmar Comassetto, “o Consórcio Lambari vem realizando trabalhos de monitoramento das águas subterrâneas na bacia do Rio Jacutinga e Contíguos, com o intuito de controlar a perfuração demasiada dos poços artesianos”. Além da quantidade de poços, a preocupação é apontada também para a qualidade da água subterrânea que, por sua vez, está exposta à contaminação de propriedades físico-química, biológica e radiológica. De acordo com Comasseto, em entrevista publicada no site jornal Folha Sete, o Comitê realizou uma análise em 2013, a única até o momento, de aproximadamente cem poços artesianos na região de abrangência da

Amauc. O diagnóstico apontou que a qualidade da água está condenada. “Isso não quer dizer que a água da nossa região esteja toda comprometida ou contaminada, mas é bom estarmos atentos às análises e empenhados na preservação e recuperação dos nossos mananciais”, explica Comassetto. Da perspectiva microbiológica, os número de poços com baixa qualidade de água para consumo humano são altos. A análise apresentou diversos parâmetros (pH, flúor, manganês, ferro e alumínio, por exemplo) acima dos limites estipulados pela Portaria Nº 2914 do Ministério da Saúde e pela Resolução CONAMA Nº 396. O que significa, até as investigações mais intensas, que as águas subterrâneas da região analisada não representam mais reservas de boas propriedades. Até então, a medida recomendada é o uso de cloro na água ou a prática das técnicas de desinfecção dos poços. Cabe agora às Secretarias da Agricultura e do Meio Ambiente dos municípios darem continuidade no processo de observação e controle.

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Do sentimento de preocupação às medidas preventivas Uma das alternativas para a falta de água é a implantação de cisternas, pois o aproveitamento da água da chuva serve para amenizar os impactos da estiagem. Além de reduzir os riscos da escassez, a cisterna é uma opção para que não se perfure poços artesianos, reduzindo a dependência de fontes de água superficiais. Em decorrência das estiagens dos últimos anos, o governo estadual de Santa Catarina desenvolveu o Programa Água para o Campo que beneficia as propriedades rurais, com objetivo de construir cisternas de até 500 mil litros. Os produtores, para serem beneficiados com o Programa, devem, obrigatoriamente, apresentar um projeto técnico. Todos receberão assistência de técnicos por meio da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina - Epagri. No estado, a meta é chegar em 1864 cisternas em 66 municípios, totalizando um investimento de R$ 53.871.110,00 para financiamentos.

O custo de implantação de uma cisterna de 500 mil litros através do projeto do governo do estado é de R$ 28.900,00, que poderá ser pago de duas maneiras: um ano após a data do financiamento com 30% de desconto, ou em cinco anos sem juros. A prioridade é beneficiar os produtores de aves, devido o alto consumo de água nas propriedades. No município de Seara estão previstas 54 cisternas, algumas inclusive já estão prontas e outras em andamento, como é o caso da propriedade de Aliandro Nardino, da comunidade de Linha Ipiranga. Segundo o produtor, a propriedade é carente de fontes superficiais e em virtude da falta de água não conseguia aumentar sua produção de suínos. “Agora com a implantação da cisterna, vou ampliar minha produção para 3000 leitões de crechário. Com os 500 mil litros do reservatório terei água para 90 dias sem depender de qualquer outro recurso hídrico”, frizou Nardino. Essas cisternas do município são acompanhadas pelos técnicos da Epagri, Aline Bellicanta e Rafael Presotto que prestam o assessoramento do início até o fim do processo de solicitação da cisterna.

C o n s e lh o E s t a d u a l d e R e c u r s o s H í d r i c o s de Santa Catarina determina a redução de burocracias para os usuários de águas s u bt e r r â ne a s. O li ce nc i a me nt o a m b i e nt a l fo i s u b s t i t u í d o p e l a o u t o r g a c e d i d a p e lo G ove r no d o E st a d o.

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Da cidade para o campo Programa pretende manter jovens no meio rural

Uma vida melhor”. Esta é a frase mais ouvida quando o assunto é êxodo rural de jovens em nosso país. Todos os anos, um grande número de pessoas deixam o campo rumo a cidade em busca de oportunidades de trabalho, estudo e novos objetivos. O senso demográfico do IBGE de 2010 mostrou que o número de habitantes de zonas rurais continua diminuindo em todo o país. Em contraponto ao dado, os números apurados indicam uma diminuição no êxodo rural, sendo o menor número da última década. A pesquisa do IBGE mostra que entre 2000 e 2010aproximadamente 2 milhões de pessoas deixaram a vida rural para migrar para as cidades grandes. No entanto, na década anterior, o número de pessoas que deixou a zona rural em busca de oportunidades nas cidade foi de duas vezes mais, chegando à 4 milhões de pessoas que deixaram o campo.

A SOS Sustentar é uma Empresa de Marketing Socioambiental que tem como i n t u i t o d e s e n v o lv e r s u s t e n t a v e l m e n t e a s o c i e d a d e , a t r a v é s d e s u a s a ç õ e s . E l a a t u a e s s e n c i a l m e n t e n o d e s e n v o lv i m e n t o e c o n ô m i c o, a m b i e n t a l e s o c i a l , c o m n ú c le o d e n t r o d a c a s a d o a g r i c u lt o r. L i d a n d o c o m u m a d i v e r s i d a d e d e li n g u a g e n s , s i s t e m a s a g r á r i o s , c u lt u r a s r e l a ç õ e s s o c i a i s e p a d r õ e s lo c a i s . A e m p r e s a s e m a n t ê m c o m p a t r o c i n a d o r e s , g o v e r n o e a j u d a d e m o r a d o r e s d a r e g i ã o.

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Foto: Arquivo SOS Sustentar

Por Ana Carolini e Camila Silveira


Foto: Arquivo SOS Sustentar

Produção Jovem Segundo dados da Secretaria Estadual da Agricultura, o Estado de Santa Catarina possui aproximadamente 200 mil propriedade rurais produtivas. Destas, cerca de 30 mil não possuem perspectivas de um futuro já que não possuem um sucessor para nutrir a propriedade rural. Isto porque grande parte dos jovens, filhos de produtores rurais, migram para as cidades atraídos pela tecnologia, possibilidade de estudo, emprego fixo e perspectivas de uma vida mais estável e confortável. Muitos desses jovens saem em busca de estudo e acabam voltando para as propriedades rurais economicamente ativas, visando maior conhecimento técnico e tecnológico para manutenção das propriedades. É com esta proposta que o programa Juventude Rural chega até a cidade de Riqueza, no oeste de Santa Catarina. Proporcionado pela empresa SOS Sustentar, o programa Juventude Rural procura orientar e desenvolver o conhecimento técnico dos jovens da pequena cidade para habilitá-los para a vida produtiva no campo. Com acompanhamento técnico mensal os jovens recebem capacitação sobre bovinocultura de leite, qualidade de produção e gestão, além de treinamentos sobre práticas de manejo, práticas agroecológicas, dias de campo, reuniões de avaliação e acompanhamento financeiro. O programa iniciado em 2013 é organizado por acompanhamentos publicados semestralmente, onde os resultados e objetivos seguintes são anunciados para o público como uma forma de transparência e clareza. Com o objetivo de melhorar a renda das famílias, o programa também une cooperativas às atividades realizadas com os jovens. O programa iniciou com 24 famílias da pequena cidade de Riqueza e possui investimento de R$ 979.200,00. O programa Juventude Rural visa possibilitar produção rentável, respeito ao meio ambiente e esforço físico menor, viabilizando maior conforto e bem estar para as famílias. Segundo o coordenador do programa e Engenheiro Agrônomo, Sérgio Bento, os resultados são visíveis e a

melhoria na interação e produção das famílias é crescente. Em seu primeiro semestre, o programa realizado em 60 meses usou de recursos como internet e escolaridade dos jovens a seu favor. Diferente da maioria dos adultos, a facilidade do acesso ao conhecimento dos jovens habitantes do meio rural mostra-se como ponto positivo na implantação do programa, facilitando a transmissão das informações e agendamento de reuniões via mídias sociais. Os acompanhamentos de 2013 mostraram avanço nas práticas de pastagem e elaborações do espaço de produção, onde os jovens foram preparados para eventuais problemas na área de produção. As capacitações voltadas para o meio tecnológico de produção leiteira e agroecologia, além da prática do controle financeiro neste período também foram abordadas, dando aos jovens maior confiança para o trabalho. No ano seguinte os jovens sentiram um pouco mais de dificuldade para a realização das tarefas. Houve média de 9,56% no aumento da produção. Para obter algum avanço sobre a decaída na produção foram trabalhadas assistências técnicas coletivas e reuniões de avaliações. No final de 2014 foi feita uma nova avaliação sobre o desempenho semestral em conjunto com os produtores. Os resultados foram variados e então puderam ser estipuladas novas metas e um novo desafio: atingir metas com prazos menores. No entanto, em consequência aos grandes desafios, algumas famílias acabaram abrindo mão do projeto, que demanda tempo e dedicação. A última análise dos dados mostrou algumas informações importantes para o rumo do projeto que se estende por todo o ano de 2015: 15 família desistiram do projeto, havendo apenas 9 em produção; entretanto, houve aumento de 21,8% na produção, mesmo com um grupo menor. Assim, o projeto segue contabilizando 7926 litros de leite comercializados, aproximadamente 1402 a mais que no mês em que mais famílias participavam. Com novas metas e novos desafios, os próximos relatos mostrarão o quão válido e importante é a Juventude Rural.

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Agroecologia o futuro sem agrotóxicos O Brasil é o país que mais consome agrotóxicos no mundo: 1 milhão de toneladas por ano. Mas há uma alternativa: a produção de alimentos sem o uso de químicos. Uma técnica antiga, mas que ainda é desconhecida pela maior parte dos agricultores da região. Por Ricardo Souza e Carlos Benedetti

Em 1999 o pai de Neri Vaccari estava doente. Problemas respiratórios o colocaram em uma cama no Hospital Regional do Oeste, em Chapecó, por uma semana. Nesse tempo, Neri e o pai conheceram um senhor, do qual não recordam o nome, que tinha câncer no pulmão. O homem de 50 anos era agricultor, assim como Neri e seu pai, e o convívio diário por décadas com agrotóxicos lhe causou problemas sérios de saúde. No fim da vida, o homem confessou a Neri que, se pudesse, faria diferente: não usaria tantos químicos e cuidaria mais da saúde. Isto marcaria para sempre a vida de Neri. Nesta época a família Vaccari estava pensando em mudar a forma de cultivo em sua propriedade, que fica na linha Simoneto, a 13 quilômetros do centro de Chapecó. Conversas com outros agricultores, cursos e visitas lhes fizeram conhecer a Agroecologia, uma forma de cultivo sem agrotóxicos. Preocupado com o meio ambiente e a saúde da família, Neri se informou. A vontade de viver e se alimentar em um ambiente livro de químicos foi decisiva para a mudança de cultura. 52

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Foto: Ricardo Souza

“Naquela época nós estávamos c o m e ç a n d o a m e xe r c o m p r o d u t o s orgânicos, e era bem difícil. M a s a q u e le e xe m p lo , p r a e le e r a economicamente favorável. Mas se v o c ê p e n s a r, p r a q u e e u v o u m e m a t a r pra ter capital se nós temos as coisas p r a v i ve r m a i s e me lho r ? ” , co nt a o a g r i c u lt o r, h o j e c o m 5 3 a n o s .

Riscos Reais O consumo de agrotóxicos é discutido seriamente desde os anos 1990. Problemas congênitos, hormonais e neurológicos e até câncer são apontados por agrônomos e médicos como consequencias do uso indiscriminado de químicos no cultivo de frutas e hortaliças. O glifosato, herbicida mais usado no Brasil, causará autismo em metade das crianças do mundo até 2025, segundo a bióloga Stephanie Seneff em seu discurso na Eco21. Considerado cancerígeno pela OMS, o 2,4-D, outro entre os herbicidas mais usados no país, é um componente do Napalm, utilizado pelos Estados Unidos na Guerra do Vietnã e que causou inúmeros problemas no país asiático. Em abril deste ano, o Instituto Nacional do Câncer (Inca) publicou um documento se posicionando contra o uso de químicos na agricultura. Segundo a publicação, a presença de agrotóxicos em alimentos e no ambiente, mesmo em baixas quantidades, podem causar câncer e diversos tipos de intoxicações. Os danos causados por alguns compostos químicos ao sistema nervoso levou a OMS a definir o consumo de agrotóxicos como possível causa de tendências suicidas em seu relatório anual de 2013. Apesar de todos os riscos, produtos nãoorgânicos dominam as seções de frutas e hortaliças nos supermercados. De acordo com a pesquisa dos Indicadores de Desenvolvimento Sustentável de 2015 do IBGE, o brasileiro consome quase 7 kg de agrotóxicos por ano. Entre 2002 e 2012, seu uso cresceu 115% no Brasil. Mas nem sempre foi assim. O início do uso de compostos químicos na agricultura remete ao período pós-Segunda Guerra Mundial. Em 1939, o químico suíço Paul Müller descobriu propriedades inseticidas no DDT (dicloro-difenil-tricloroetano), o

primeiro pesticida moderno. A partir daí, a indústria química se expandiu cada vez mais, principalmente para a fabricação de armas. A matança causada por substâncias como os gases Mostarda e Sarin impulsionou a fabricação química que, após o final da guerra, achou outro fim: a produção de alimentos. A Europa destruída tinha fome, e a saída encontrada foi o cultivo de sementes com agrotóxicos. Tinha início o que ficou conhecido como Revolução Verde. O uso de químicos na agricultura cresceu exponencialmente nas décadas seguintes. Os agrotóxicos desembarcaram no Brasil nos anos 60 e logo seu uso recebeu apoio do governo e entidades ligadas à agricultura. Financiamento para a compra de sementes era concedido apenas mediante a compra de agrotóxicos e adubo, seu uso recebeu isenção fiscal e cada vez mais agricultores viraram adeptos desse tipo de cultivo. Quarenta anos depois a produção com agrotóxicos não para de crescer. Segundo relatório de 2012 do IBAMA, a venda de agrotóxicos no Brasil aumentou de dois bilhões de reais em 2001 para 8,5 bilhões em 2011, um valor recorde. Desde 2009, o país é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, usando mais de 1 milhão de toneladas por ano na produção agrícola. Apenas Santa Catarina consumiu mais de 10 mil toneladas em 2012, sendo o nono estado com maior uso – o campeão é São Paulo, com pouco menos de 83 mil toneladas. Segundo o relatório dos Indicadores de Desenvolvimento Sustentável do IBGE, os agrotóxicos são perigosos pois são persistentes e se acumulam no solo, na água e no ar. O Inca, em seu pronunciamento, afirmou que o cultivo livre de agrotóxicos tem potencial anticancerígeno e definiu a agroecologia como a alternativa viável à produção com químicos.

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Apesar de tudo, a produção ainda é baixa

Uma das vantagens da produção agroecológica para Neri é a falta de concorrência no mercado, já que a procura por alimentos orgânicos é alta. Pensamento compartilhado pela engenheira agrônoma da Epagri (Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina) Caroline Scholz. De acordo com ela, apesar da possibilidade de cobrar mais caro pelo produto por ele ser orgânico, apenas 5% dos agricultores da região produzem alimentos sem agrotóxicos. Além da falta de conhecimento sobre a possibilidade de produzir alimentos sem usar químicos, Caroline cita

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a falta de assistência técnica para os agricultores, que sofrem com as mudanças. “Não é um cultivo mais difícil, mas é totalmente diferente da agricultura convencional. Os cuidados têm que ser bem maiores. Então eles precisariam de técnicos especializados para ajudar na transição, porque é um modelo muito complexo”, opina. Para o engenheiro agrônomo Vilceo Sehnem, o cultivo sem agrotóxicos é rentável, mas os agricultores precisam se organizar. Vilceo aponta que o acesso ao crédito para a produção agroecológica exige muita burocracia e não há financiamento para o dificultoso processo de transição. Além disso, muitos agricultores colocam no mercado os produtos orgânicos junto aos convencionais, deixando de agregar valor e gerando desmotivação. Para Vilceo, os incentivos que faltam são pesquisa e investimento para repensar todo o modelo de agricultura: “Hoje se deixassem de existir os agrotóxicos, milhões de pessoas passariam fome. Mas se o investimento fosse voltado para a produção orgânica, com certeza não faltaria alimento em lugar algum”. Para melhorar a organização dos agricultores, a Epagri organiza

visitas à comunidades de produtores agroecológicos bem sucedidas em outras localidades. Na semana de produção desta reportagem eles foram para o Paraná e viram como funciona todo o processo de produção orgânica, desde o plantio até a fabricação de compotas e geleias. Segundo Caroline, a visita é importante para despertar o interesse nos produtores: “Nem todo o agricultor tem vocação pra isso. Ele tem que estar preparado para as dificuldades que vai ter no dia a dia e disposto a levar para frente.” Vocação exercida por poucos hoje, mas que tende a crescer. Há alguns anos, a família Vaccari e outros produtores começaram a vender produtos orgânicos para um supermercado da cidade, o que significa muito para o trabalho agroecológico da região. “Quando tem condição de produzir um pouco mais a gente vende pros mercados. As pessoas conhecem o trabalho da agroecologia os produtos, e valorizam isso.” Mais importante do que as vantagens econômicas para Neri é o cuidado com o meio-ambiente: “hoje, nós mesmos produzimos e consumimos agroecológicos. Essa ideia tem que ser multiplicada, porque o que mais vale é a saúde”.


Uma Nova Esperança Junto com a Revolução Verde, nos anos 1950 e 1960, cresceu a preocupação com a qualidade dos alimentos consumidos pela população. Alguns agrônomos alertavam para o risco que o consumo de agrotóxicos poderia causar à saúde, principalmente após a descoberta que o DDT, pesticida amplamente usado na época, era cancerígeno e danoso ao sistema nervoso. Apesar disso, o cultivo com agrotóxicos continuou em alta. Segundo o livro Agricultura Sustentável, de Eduardo Ehlers, entre 1950 e 1984, a produção alimentar dobrou e a disponibilidade de alimentos por habitante aumentou em 40%. A partir de 1985, entretanto, os números começaram a cair e os problemas ecológicos vieram à tona. Logo o movimento agroecológico cresceu. Sem dinheiro para pagar pesticidas à base de petróleo após o fim da União Soviética, em 1991, Cuba teve de mudar todo o sistema de agricultura do país. O país cortou em 75% os insumos agroquímicos e passou a produzir mais e melhor. O exemplo cubano chegou timidamente no Brasil, mas aos poucos alguns grupos de agricultores perceberam que a novidade era benéfica. Ivo Luzzi tem 73 anos e sempre trabalhou com agricultura. A simplicidade traduzida nos gestos tímidos retrata a personalidade do homem que nasceu e morou a vida inteira na propriedade da família, em Rodeio Bonito, no interior de Chapecó. Pai de cinco filhos – três

mulheres e dois homens, todos casados – e avô de dois adolescentes, seu Luzzi sempre teve preocupação com o meio ambiente. Em 1997, Ivo ouviu sobre as novidades e fez um curso de Agroecologia. Contra a previsão dos agrônomos da prefeitura de Chapecó, que na época diziam ser impossível produzir alimentos totalmente orgânicos, a família de Ivo decidiu pelo cultivo sem químicos. Uma decisão tomada pensando na saúde e no meio ambiente, e do qual ele não se arrepende. “No começo foi difícil, nós perdemos algumas safras, mas com o tempo fomos nos acostumando. Hoje nós fazemos mais dinheiro com os produtos agroecológicos do que antes, quando usávamos agrotóxicos”, conta ele. Experiência parecida com a da família Vaccari, que trabalha há 15 anos com produtos agroecológicos. Neri Vaccari conta que, quando estavam começando, perderam várias lavouras. Cursos e visitas a outras propriedades ajudaram a aumentar a experiência, e hoje Neri é especialista no assunto. “Tem que cuidar do solo, ter um controle ambiental, controle biológico, conhecer o clima. Pode-se dizer que eu descobri a fórmula”, brinca. Segundo Ivo, o orgânico mais difícil de produzir é o tomate. A alta sensibilidade da fruta faz com que o cuidado tenha que ser dobrado e o ciclo de 6 meses não é favorável. Para Neri, os mais trabalhosos são, além do tomate, a cenoura e o morango, que necessitam ser cultivados em estufas. Do outro lado, a

alface é a mais vantajosa, já que tem um ciclo de 28 a 30 dias no verão e 45 dias no inverno. Ainda assim, toda a mão-de-obra a mais investida no trabalho é recompensada na venda do produto no mercado: os orgânicos podem chegar a custar até 168% a mais do que os produtos com agrotóxicos. No mercado, os produtos orgânicos fazem sucesso. A feira, que acontece duas vezes por semana, nas manhãs de quarta e sábado, está quase sempre lotada, principalmente no começo do expediente. A família de Joelci Dias só consome produtos sem agrotóxicos há mais de 10 anos, e o consultor de vendas vem todas as semanas na feira. Os cuidados com a saúde se intensificaram principalmente após o nascimento do filho Antônio, hoje com 15 anos. “Nós mudamos pela preocupação com o meio-ambiente e a saúde. Menos produtos químicos influencia bastante na qualidade de vida. Nosso filho também se cuida bastante, só come pão integral, ele é bem consciente”, conta Joelci.

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Foto: Dalvana Treméa

A real situação do Bioma Mata Atlântica em Santa Catarina Santa Catarina é o quinto estado que mais desmata no país Por Dalvana Treméa e Matheus Graboski

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Com vestígios apenas em 17 estados brasileiros a Mata Atlântica registra a cada ano um índice alarmante de desmatamento. Em meio a tanta destruição do bioma Mata Atlântica, o site da Fundação SOS Mata Atlântica estima que existam mais de 20.000 espécies vegetais nativas e que a fauna presente neste sistema soma mais de 849 espécies de aves, 370 espécies de anfíbios, 200 espécies de répteis, 270 de mamíferos e cerca de 350 espécies de peixes, todas já catalogadas. Diversos órgãos não governamentais como: SOS Mata Atlântica e Greenpeace, trabalham diariamente para preservar os resquícios originais que sobraram desta que já foi uma das maiores florestas tropicais do mundo. No Brasil no mês de maio deste ano, a Fundação SOS Mata Atlântica e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) divulgaram os novos dados do Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica, levantados no período de 2013 a 2014. Essa pesquisa mostra em detalhes, através de imagens de satélites as áreas de preservação e desmatamento da Mata Atlântica. No estado de Santa Catarina mais de 23% dos 9.571.782 hectares da área são ocupados por Mata Atlântica, destes, entre 2013 e 2014 mais de 692 hectares foram desmatados, o que significa um aumento de 3% em relação ao mesmo período de 2012/2013, quando o número de hectares desmatados foi de 672. Em Santa Catarina a Mata Atlântica é composta por restingas, mangues, floresta e áreas naturais não florestais. Restingas são f​aixas de areia ou de pedra que se prendem ao litoral e avançam pelo mar. Já os mangues são terrenos costeiros entre terra e mar. Presente em maior número de hectares no estado a categoria floresta está classificada em quatro tipos: densa, úmida, rasteira e costeira. As áreas naturais não florestais são áreas particulares preservadas por entidades competentes, responsáveis pelo espaço geográfico em questão, por exemplo: parques florestais e trilhas ecológicas particulares.

Reflorestar é o caminho As medidas a serem tomadas no momento são para reverter o quadro de desmatamento, diminuir o número de áreas devastadas e reflorestar regiões atingidas. Em meio a alternativas de recuperação das matas ciliares, o reflorestamento de área próxima de rios e córregos é a que mais surte efeitos em médio prazo. Biólogos fazem estudos nas áreas específicas, onde clima, temperatura, tipo de solo e quantidade de água próxima são pontos avaliados. Normalmente as espécies escolhidas são as que fazem sombra e crescem mais rápido, motivo este 58

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que depois que a área estiver “habitada” as plantas que não são adaptadas ao sol conseguem se desenvolver. O biólogo Estevan Casanova explica como acontece a escolha das espécies que fazem parte da primeira etapa de reflorestamento, “Primeiro levamos em consideração a preservação também da fauna na localidade e plantamos árvores frutíferas, que não são as que produzem frutos comestíveis ao homem, depois plantamos as árvores de grande porte, comumente conhecidas por “madeira de lei”, e por último plantamos as árvores de floração, que vão colaborar com a apicultura e a produção de pólen no eco­ sistema”, destacou. Por este motivo, reflorestar áreas deficientes de vegetação é o caminho mais rápido para a recuperação da área. Segundo o técnico em Meio Ambiente Marcos Shieder, o reflorestamento é uma ação ambiental que procura repovoar com vegetação, áreas que foram destruídas por ação da própria natureza, e principalmente pela ação do homem, para a expansão de áreas agrícolas. “O processo de reflorestamento é de grande importância para o meio ambiente. Ele é capaz, quando executado com eficiência, de recuperar áreas verdes com espécies nativas, melhorando ecossistemas degradados”, destaca Shieder. O técnico alerta ainda que usando o processo de reflorestamento, muitas empresas deixam de comprar madeira proveniente do corte ilegal, poupando assim a natureza. “O processo de reflorestamento é aplicado também em áreas de encostas com o objetivo de impedir deslizamentos de terras. Neste contexto, ele também é eficaz no combate à erosão do solo”, conclui Marcos. O reflorestamento é obrigatório por meio da Lei Federal 4.771, onde o Código Florestal Brasileiro declara que todos os consumidores de matéria­ prima florestal, madeira e derivados, são obrigados a reflorestar o equivalente ao consumido para evitar o déficit de árvores e manter o equilíbrio. Essa Lei Federal determina também que para aqueles que descumprirem a lei, será gerada uma multa em 10% do valor da matéria utilizada, ou seja, se o gasto para reflorestar determinada área gira em torno de 5 mil reais, a multa para o dono da terra que não reflorestar vai ficar em torno de 500 reais. A lei sugere também duas possíveis formas para reflorestar: a primeira consiste na plantação de novas mudas por quem utilizou as árvores da floresta, que é admitido ser feito em áreas particulares ou então em áreas públicas autorizadas. Na segunda opção, o reflorestamento é realizado da mesma forma que a primeira, mas recebe o intermédio de associações existentes em todos os estados onde o bioma está presente e é cobrado R$0,45 por árvore. As informações estão disponíveis no site do Ministério do Meio Ambiente.


Foto: Matheus Graboski

O agricultor José Zim, morador na Linha Água Amarela em Chapecó, possui uma área de plantio de aproximadamente 17 hectares, destes cinco estão localizados na encosta de um córrego. Ele comenta que nestes hectares, teve que reflorestar 30 metros a partir da encosta do córrego, ou seja, foram 150 metros da sua terra ocupados para reflorestamento. “Tive que reflorestar este espaço na minha terra. Creio que seja importante reflorestar, até por ser uma preocupação com o nosso futuro, a preservação da água e da floresta nativa. Ao mesmo tempo, se não cumprimos a lei, uma multa é gerada”, afirma Zim. Ele comenta que gastou um montante de aproximadamente três mil reais para reflorestar este espaço de terra, o que considera um valor elevado. “Minha renda mensal é baixa em relação ao gasto que tive com o reflorestamento, e não recebi nenhum tipo de ajuda”. Para a dirigente do Sindicato Regional dos Trabalhadores Rurais de Chapecó, Rosalina Belato, existe muita divergência a respeito da lei, uns acham válida, outros nem tanto. “Não é trabalho do sindicato fazer o manejo do reflorestamento, mas alertamos quanto ao Cadastro Rural e a importância de recuperação das matas, já que nosso estado está entre os cinco estados brasileiros que mais desmatam ”, ressaltou Rosalina. Ela comenta também que a lei é um importante passo para tentar reverter a situação do bioma em todo o Brasil.

Na região Oeste, a Mata Atlântica sofreu com a degradação do homem. A mata nativa deu espaço para a criação de gado e também abertura de lavouras

Produzindo o futuro Um viveiro localizado na Universidade Comunitária da Região de Chapecó Unochapecó produz mudas e utiliza de algumas alternativas para propagar o futuro. Para grupos de escolas e projetos ambientais o Viveiro Florestal doa cerca de 200 mudas de diversas espécies. Já para quem não faz parte deste seleto grupo, pode adquirir as mudas pelos seguintes valores: se você preferir pelas mudas que vem no tubete o valor é de R$ 1,20, se preferir na embalagem plásticao valor fica um pouco mais caro R$2,00. Cristiane Segatto é uma das responsáveis pela produção das mudas neste viveiro. “Produzimos todas as mudas do bioma mata atlântica, e aqui temos elas disponíveis para doação e venda”, afirmou a bióloga. O Viveiro da Unochapecó funciona em horário comercial o telefone para contato é (49)3321­ 8281.

“ O r e f lo r e s t a m e n t o é u m a a ç ã o a m b i e n t a l q u e p r o c u r a r e p o v o a r c o m v e g e t a ç ã o, á r e a s q u e fo r a m d e st r u í d a s po r a ç ã o d a p ró p r i a n a t u re z a e p r i n c i p a lm e n t e pe la a ç ã o d o h o m e m” ­ M a rcos S h i e d e r, Té c n i c o e m M e i o A m b i e n t e .

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Preservação das florestas é garantia de água na torneira Mil litros de água desaparecem das torneiras quando uma árvore é cortada Por Bárbara Michailoff e Janaína Chagas

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Céu encoberto e nuvens carregadas são sinais de que está na hora do aposentado Celso Rodrigues abrir a tampa da caixa d’ água para reservar a chuva. Essa é uma das soluções simples do cotidiano para ajudar na preservação da água e do meio ambiente. Desde 1992, dois problemas assombram constantemente a atenção dos ambientalistas e da população: a crise hídrica e os problemas ambientais. Por isso, cada vez mais é necessário a conscientização das pessoas, e atitudes simples como a de Celso podem fazer a diferença. “Sem floresta não há água” – é o lema da campanha de conscientização do World Wide Fund For Nature (WWF) (Fundo Mundial para a Natureza) – Brasil, e Greenpeace, em parceria com entidades do mundo todo. O objetivo é chamar a atenção para a destruição em massa das árvores da Amazônia e como isso causa impacto na vida das pessoas com a falta de água e prejudicando os animais, por exemplo. Em pesquisa recente do Sistema de Alertas de Desmatamento da Amazônia Legal (SAD), em maio deste ano, foram registrados 389 km² de alertas de desmatamento na Amazônia. O estado do Amazonas e o Mato Grosso lideram na destruição com 110% a mais do que o identificado no ano de 2014. Santa Catarina está no quinto lugar do ranking, com 6,92 Km². De acordo com a organização de preservação ambiental e animal WWF-Brasil, o Brasil precisa de um plano nacional para proteção e recuperação de nascentes, rios, lagos, córregos e outros mananciais. Ainda o segundo WWF, o país deverá seguir uma tendência mundial de aumento no consumo de água nos próximos anos, tanto nas cidades quanto no campo.

Economizar água O casal Vera e Celso Rodrigues, do bairro Efapi, em Chapecó, procuram diariamente formas simples de economizar água em casa, reduzir custos e ainda ajudar o meio ambiente. “O que faço ainda é muito pouco. Temos tantos benefícios economizando que apenas com essa atitude de recolher a água da chuva nos garante a irrigação das nossas plantas, hortaliças e flores do jardim, e também diminui os custos na conta de água no fim do mês.” Para o biólogo e mestre em agronegócios Valdecir Luiz Bertollo, se as pessoas tiverem bons hábitos de reuso de

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matéria-prima e empatia no futuro haverá mais cuidado com o meio ambiente. “Quando o pensamento constante da população é naturalizado de que ‘um dia iremos morrer’, as pessoas perdem o sentido de se preocupar com o próximo e acabam exagerando no banho, na hora de escovar os dentes, ou lavar seus objetos pessoais, porque elas não irão passar por dificuldades”, destaca o biólogo.

Contraste A dona de casa Vilma Santos, moradora do loteamento Colina do Sol no bairro Efapi, em Chapecó, é casada, tem dois filhos e uma nora, que mora junto. Vilma relata que não tem como costume pensar em meios de economizar água, reciclar ou diminuir o consumo de energia em sua residência. “Tenho muitas tarefas de casa para fazer todos os dias, como limpar a casa, lavar roupa dos meus filhos, do meu marido e da minha nora que estuda o dia todo. Não vejo maneiras de como ajudar o meio ambiente, porque eu gosto de ver tudo limpo e organizado e por isso utilizo muito água”, comenta. Vilma também ressalta que todas as manhãs têm o hábito de lavar a calçada em frente a sua casa, seus quatro cachorros e lavar roupas. De acordo com o biólogo Valdecir, essa mania é dada pelo ato de esbanjamento. “Como um meio de contribuição para não escassez de água, ela poderia uma vez por semana ou quinzenalmente lavar sua calçada e seus cachorros. As roupas também se encaixam nesse quadro. São pequenas ações que mudam o ciclo ambiental. Por tanto, tudo que fizermos de mal a Terra, com dor sofreremos as consequências. Mas se tudo de bom fizermos com amor, a Terra nos retribuirá”, frisa Valdecir.

Futuro gera+ação Mãe de um filho e casada, Patrícia Carraro moradora do bairro Efapi, afirma que sabe o quanto é importante os cuidados com a natureza para garantir o futuro das próximas gerações. “Não tenho como costume guardar a água da chuva, por exemplo, mas, economizo o que posso nos gastos com o banho, com o carro, e com a limpeza da casa. Sempre reutilizo a água da máquina de lavar roupa para lavar a calçada e regar meu quintal.”


“ O r e s u lt a d o d i s s o t u d o são chuvas irregulares, em a l g u n s lo c a i s c h o v e d e m a i s e em outros ocorrem grande s e c a s ” f r i s a B e r t o l lo .

Conservar ajuda a preservar recursos hídricos Em entrevista ao Portal Brasil, o biólogo e diretor do Departamento de Áreas Protegidas (DAP), do Ministério do Meio Ambiente, Sérgio Henrique Collaço de Carvalho, avalia que criar e manter unidades de conservação da natureza nas áreas urbanas pode ser uma resposta para a falta de água. A escassez está associada a fatores como a carência de planejamento dos assentamentos urbanos, os equívocos no manejo do uso do mineral, a utilização de equipamentos urbanos de distribuição ineficientes e responsáveis por enormes desperdícios. O desmatamento e a impermeabilização do solo fazem com que a água da chuva chegue mais rápido aos cursos d’água e ao mar e modifique o regime de precipitação. “Esses fatores influenciam no clima, provocando períodos de estiagem, com escassez de água e crise de abastecimento, sendo que, imediatamente depois, vem o período de chuvas, acarretando alagamentos e a ideia de abundância de recurso”, esclarece Sérgio Henrique. Para Bertollo, a esperança está nas novas gerações, pois elas aprendem desde cedo à importância de economizar água. “Tudo está no conhecimento e na educação. Para resolver o problema as pessoas tem que se conscientizar e entender a importância da água para tudo. Teríamos que poluir menos e economizar mais, mas vai muito da cultura. A população de Chapecó, por exemplo, deveria utilizar mais o transporte público ou pegar mais carona, o que é difícil pois não se tem um costume e para isso acontecer leva um certo tempo” comenta o biólogo.

O biólogo destaca a Produção Mais Limpa, com objetivo para a Meta Zero, um programa que busca diminuir a poluição até 2021. O que é resíduo para um é matéria- prima para outro segmento de produção. Reaproveitando assim, muitos nutrientes que são postos fora e ajudando a diminuir os materiais poluentes no solo. Falar em crise hídrica é mostrar que ela não ocorre apenas pelo mal manejo do solo. Um dos graves problemas são os gazes de efeito estufa. A poluição que fica nas nuvens e atrapalham a entrada de sol, impedindo a evaporação dos oceanos. A água é a matéria-prima responsável por todas as atividades econômicas. Por exemplo, para se ter acesso a uma calça jeans, a produção começa ainda no campo com a plantação de algodão, e até chegar ao produto final são necessários cerca de 11 mil litros de água. Tingimento ou serragem, em tudo há natureza, em todos os processos numa visão sistêmica. A natureza é finita, petróleo, fosseis, água potável. Se o agricultor utiliza 75% de água no plantio, o urbano também utiliza esses 75%, indiretamente, porque ele consome o produto final. “Para nós termos o pão no nosso café da manhã, temos que pagar o produtor, o produto, o deslocamento, a lavagem, manufatura, a gasolina do carro para ir até a padaria, o padeiro e para no fim chegar na nossa casa, esse processo polui muito o meio ambiente. E o produtor é o grande responsável hoje para produzir, além de alimentos, a água através de reflorestamento das nascentes de riachos e lagos,” finaliza o biólogo.

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Águas Cantareira chegou! Com a água do governador, não vai faltar sede! Foi assim que os paulistanos descobriram a nova água de São Paulo. O lançamento da marca de água fictícia aconteceu nesta terça-feira (23/06) em dois pontos públicos da cidade: na Praça da Sé e no Parque Trianon, em plena Avenida Paulista. O lançamento também incluiu uma atividade de guerrilha para expor o novo produto nas gôndolas de dois supermercados da capital. As últimas gotas de água do mais importante manancial de São Paulo foram distribuídas para

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lembrar, de forma irônica e bem-humorada, que a crise da água não acabou e que esse bem público não deve ser tratado como mercadoria. Água é um direito da população. Em vez de priorizar o abastecimento da população, investir na recuperação dos mananciais e reduzir a perda de água na rede de distribuição, o governador Geraldo Alckmin e a Sabesp impõem aumentos na conta mensal, descontos para grandes empresas e um racionamento não declarado que prejudica a qualidade de vida de milhões de paulistanos.

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É 100% volume morto!

Salve a Floresta O desmatamento na Amazônia tem ligação com a água que cai ou não da torneira da sua casa. Cada àrvore que cai na Amazônia significa menos de 1000 litros de água de chuva caindo em sua cidade. Precisamos proteger as florestas brasileiras.


Inovações Banho quente, redução nos custos de energia e conforto. Os especialistas em elétrica indicam chuveiros com uma angular maior no corpo do chuveiro. Desse modo, a distribuição de água para o corpo é mais completa do que chuveiros com ângulo menor. As torneiras 1/4 de abertura é uma solução eficiente. Especialmente

fabricadas para maior controle do uso e vasão de água, existem modelos com controle de tempo de 3 segundos para vasão da água. A novidade deste modelo, além do controle de vasão de água ativado pelo 1/4 de abertura, é a possibilidade de água quente ou fria puxando a válvula para esquerda e para direita.

Água doce superficial Apesar de o Brasil possuir 13% da água doce disponível do planeta, a distribuição é desigual, pois 81% estão concentrados na Região Hidrográfica Amazônica, onde está o menor contingente populacional, cerca de 5% da população brasileira, e a menor demanda. Nas regiões hidrográficas banhadas pelo Oceano Atlântico, que concentram 45,5% da população do País, estão disponíveis apenas 2,7% dos recursos hídricos do Brasil.

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Foto: LetĂ­cia Sechini

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Quem tem medo do C贸digo Ambiental?

Por Let铆cia Sechini e Emanuelle Sauer Jung

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O termo “sustentabilidade” vem sendo utilizado à exaustão nos últimos anos, principalmente quando o assunto é ecologia. Sua etimologia tem origem no latim sustentare, que significa dar apoio ou conservar. Tratase de uma palavra que pode definir o comportamento adotado por uma instituição ou uma comunidade. Enquanto adjetivo, “sustentável” define uma atitude ou estratégia que engloba a viabilidade econômica e a preocupação com o meio ambiente, sendo utilizado como uma bandeira, um princípio a ser adotado e defendido. Apesar da expansão do termo na atualidade, a sustentabilidade enquanto preocupação com o meio ambiente é bastante antiga. Nas pequenas propriedades rurais, onde se pratica a agricultura familiar, o assunto é desenvolvido na prática - as pequenas ações desenvolvidas diariamente nesse espaço são definitivas. De acordo com uma pesquisa realizada em 2011 pelo Governo Federal, 70% dos alimentos produzidos no país tem origem na agricultura familiar. Para garantir que todo o processo da agricultura aconteça de maneira segura e sustentável, o Brasil conta com dispositivos legais, descritos em documentos como o Código Ambiental. Em 2012, o Código Florestal Brasileiro de 1965 teve sua validade revogada. O dispositivo observava o meio ambiente brasileiro sem considerar sua biodiversidade. Isto é, o antigo código de leis tratava de ter o mesmo cuidado da caatinga com a mata atlântica. Hoje, com a expansão das ciências ambientais, esse fator é considerado um erro grave. Mas a modificação no Código não se trata de um processo definitivo. Desde 1990, momento em que o assunto se tornou inevitável, diversas comissões, partidos e organizações tentam torná-lo mais adequado a uma realidade que é a cada dia mais mutável. Depois de mais de duas décadas de debates, ainda não existe um consenso a respeito do meio ambiente brasileiro. Apesar disso, houve uma modificação pontual e de vital importância na sequência de embates ambientais: desde 2009, a responsabilidade de cada estado caiu no colo de seus próprios representantes estaduais. Foi quando acabou a paz. A função inicial do código ambiental é de regulamentar a forma como a terra pode ser explorada pelo produtor. Há artigos estabelecendo até onde a vegetação nativa pode ser derrubada em detrimento da lavoura e onde pode haver diferentes tipos de produção. Além disso, o código delimita as Áreas de Preservação Permanente (locais frágeis, como beiras de rio, devem ter sua vegetação preservada para evitar a erosão e com isso, o aterramento do rio), o percentual suficiente para reserva legal (espaço onde a vegetação nativa deve ser mantida, número que varia em cada estado) e até mesmo a anistia 68

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ou não dos descumpridores da normativa. Ainda em 2011, a última versão aprovada em âmbito nacional, pelo Senado brasileiro, alterava as áreas de reserva legal para 50% em estados em que o território total incluiu 65% de terras indígenas ou unidades de conservação patrimonial brasileira - quantidade impraticável em estados como Amazonas e Mato Grosso. A polêmica que existe com a intervenção brasileira permeia exatamente entre esses números, por isso a importância de cada Estado escolher a própria legislação cabível, de acordo com suas particularidades. O sul do Brasil é um grande exemplo dessa questão, pois a extensão dos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul compreende uma variedade ampla de relevos (planícies, planaltos, serras, litorais, enseadas e depressões) e insere cada um em uma condição florestal. Há porções litorâneas com mangue e com restinga, enquanto há campos tropicais e matas de araucária em faixas atlânticas em toda a extensão. Outra questão que emerge polêmicas é a disputa entre a bancada ambientalista e a bancada ruralista. Os proprietários de terras, pequenos e grandes produtores, tem o mesmo argumento: a lei atual não permite mudanças de produção (limitando o plantio direto) e os obriga a extinguir áreas que já são consolidadas como produtivas para replantio de vegetação nativa. Já os ambientalistas (também apoiados e amparados pela Polícia Militar Ambiental catarinense) afirmam que o projeto abre precedente para aumentar o desmatamento em uma proporção desnecessária sem punir os responsáveis pela área. De acordo com eles, a área agricultável no Brasil já é suficiente para produzir internamente e exportar ao mesmo tempo. Diante desses impasses, o Código Florestal sofre alterações periódicas. Discute-se desde o tamanho de um módulo fiscal até a metragem ideal para a mata ciliar. O que revolta aos produtores e seus representantes é exatamente essa indecisão: se no início do ano quatro módulos rurais não precisam recompor sua vegetação nativa, ao final do mesmo 20% dessa extensão deve estar recoberta de pinheiros, pés de erva-mate e até mesmo a quase extinta imbuia, árvore considerada símbolo de Santa Catarina. A alteração mais recente nessa legislação aconteceu em dezembro de 2013. Em sessão tumultuada, a Assembleia Legislativa de Santa Catarina discutiu a separação entre pequenas e grandes propriedades rurais de acordo com seu tamanho (acima de quatro módulos rurais, considera-se a propriedade grande), reconsiderou o tamanho de matas ciliares que equivalem a APP e extinguiu a necessidade de averbação de reservas legais em cartório.


Foto: LetĂ­cia Sechini

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Situação local

Em se tratando de pequenas propriedades, a aprovação e as atualizações recentes do código vieram trazer um pouco de tranquilidade. Quem afirma é o secretário do Sindicato Rural de Xaxim, Enor Cenci. Segundo ele, o código teve importância vital na conduta dos agricultores. Cenci também afirma que os produtores no interior da região Oeste sempre estiveram dispostos a cumprir sua obrigação ambiental, evitando desmates desnecessários. “No passado, havia um programa do Governo Federal chamado Pró-Várzea. Nessa época, o próprio governo investia dinheiro para que os produtores enxugassem os banhados e beiras de rio. Existiam incentivos fiscais para isso. Hoje, se vê que é o contrário”, lembra o secretário. Nesse sentido, uma das modificações mais importantes do código foi a criação do Cadastro Ambiental-Rural (CAR). Trata-se de um mapeamento, que é atestado sem custo pelas prefeituras, que informa de maneira oficial as áreas que são, de fato, agricultáveis e as áreas que necessitam de restauração da mata nativa. Além disso, o CAR informa quanto tempo o agricultor tem para realizar as adequações. Diariamente, o Sindicato Rural recebe produtores que vem em busca de conhecimento sobre a melhor forma de cuidar do meio ambiente e minimizar os impactos da produção. “Hoje a questão ambiental é motivo de paz. No passado, havia pouco ou nenhum conhecimento sobre o assunto. Não haviam muitos estudos ou divulgação de informações. Então, sem querer, o produtor rural ficou acostumado com a imagem de vilão, que precisa gastar muito dinheiro com taxas denecessárias. Hoje temos conhecimento sobre o papel de cada um, e podemos repassar isso. Nesse sentido, o Código Ambiental veio clarear essas questões”, destaca Cenci. Domingos Nei Scanagatta, produtor rural do interior de Xaxim, foi afetado pela inconstância e inconclusividade do Código Florestal Catarinense. Nei é proprietário de 48 hectares de terra, e reside no mesmo espaço desde criança. Há décadas aprendeu o plantio direto como manejo correto de produção e utiliza o sistema 70

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como forma de preservar a terra e preveni-la da erosão. Para se manter de acordo com a legislação, Nei precisou comprar uma nova propriedade de terra. O artigo do código que rege a Área de Preservação Permanente não relata se o espaço agricultável e a área preservada precisam estar no mesmo terreno. Ou seja, Nei possui duas propriedades diferentes, uma de terras dobradas para manter preservada e outra de terra plana, onde cultiva milho, soja, feijão, trigo e aveia em sistema de rotação. O produtor afirma que a notícia foi um susto. Sua primeira reação foi “ficar com um pé atrás”, mas afirma que não relutou em cumprir a lei. Apesar de ter consciência da necessidade da preservação, acha errado ter despendido R$ 80 mil em uma área que até então está inútil. “Nós na colônia sempre cuidamos do meio ambiente. Cuidar da água, das árvores, dos animais é algo que fazemos todos os dias. Temos composteiras, reciclamos o lixo, cuidamos com os agrotóxicos que usamos. Na cidade, o povo polui e degrada muito mais e quem precisa compensar é o coitado do agricultor. Por que nós temos que perder 20% de espaço se na cidade jogam até o esgoto no rio?” indagou o produtor, defendendo que a proteção do meio ambiente deve partir das áreas urbanas também. Nei sabe que apesar das adaptações realizadas, o desencontro não está próximo do fim, e novas alterações na propriedade podem ser necessárias. De acordo com a Assembleia Legislativa de Santa Catarina, serão discutidas neste ano medidas que visam repassar a responsabilidade sobre as APPs da área urbana consolidada para a prefeitura de cada município, além de mais medidas que afetarão os produtores rurais na questão dos efluentes despejados na água. Ou seja, o produtor que se adequar agora, pode ter de investir em novas modificações no decorrer do ano, enquanto o alto escalão das bancadas decide o que é melhor para o produtor que vive a sustentabilidade ambiental como uma prática cotidiana, sem sequer conhecer o significado da palavra.


Foto: Letícia Sechini

“Na cidade, o povo polui e degrada muito mais e quem precisa compensar é o coitado do agricultor. Por que nós temos que perder 20% de espaço se na cidade jogam até o esgoto no rio?”

A medição do módulo rural tem por objetivo determinar o enquadramento sindical rural - diferente do módulo fiscal, que determina a classificação entre minifúndio, pequena, média ou grande propriedade. O número de módulos rurais da propriedade é obtido através da soma do número de módulos calculado para cada tipo de exploração e o número de módulos para a área agricultável. Essa informação é encontrada no Certificado de Cadastro de Imóvel Rural, emitido pelo INCRA.

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Foto: Maicom Franceschini

As incertezas do Lajeado Passo dos Fortes correm no Ecoparque Por Eleandro Machado e Maicon Franceschini

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Foto: Maicom Franceschini

Em outubro de 2011 o principal parque ecológico de Chapecó passou por um processo de revitalização. Novos espaços foram criados com o intuito de sofisticar o ambiente e de satisfazer as necessidades dos frequentadores. Dentre as principais mudanças está a recuperação da pista de caminhada com nova arborização, iluminação, colocação de bancos e novas lixeiras. A construção de banheiros foi a principal conquista para o local afirmou Valdir Crestani, secretário do Desenvolvimento do Meio Ambiente. “Não havia o mínimo para as necessidades básicas das pessoas. Foi o nosso primeiro grande avanço”. Assim como áreas de convivência, pórtico de entrada e a casa de administração também tiveram suas reformas. Além do lago, construção de coreto bosque e o plantio de mais de 300 mudas de árvores fizeram parte do desenvolvimento sustentável proposto pela prefeitura municipal. Mesmo com tantas reformas a situação não é de conforto, pois o lixo e a degradação do lajeado Passo dos Fortes mostram o descaso por parte dos responsáveis. O Ecoparque possui grande concentração de resíduos depositados em seu entorno. Um dos moradores próximo ao lajeado, Gilberto Gurth, afirma que durante os 27 anos residindo no mesmo local, sempre contou com saneamento tratado e adequado para a preservação

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do entorno e que boa parte dos moradores da rua Nereu Ramos também preservam seus recicláveis. “Esses resíduos jogados aí na frente de casa com certeza não são de morador algum por aqui. Como há empresas que precisam depositar seus lixos em algum ponto, muitas vezes acabam entulhando no canteiro ou até mesmo na encosta do lajeado”. Gilberto diz que há bocas de lobo estabelecidas para escoar a água da chuva, mas que nenhuma delas acaba parando dentro do Ecoparque. “Nenhum destes bueiros que morrem aí dentro são de residências próximas daqui. Eles vêm de algum ponto da cidade que ninguém sabe ao certo. Já contatei a vigilância sanitária e até mesmo a ambiental pra comparecer ao local e tentar entender de onde vem, mas não tive retorno de ambos”. Ao lado do Ecoparque, já na rua John Kennedy, onde o lajeado também atravessa até desaguar na Borges de Medeiros, havia um posto de lavagem que durou aproximadamente cinco anos. Hoje, Ademir e Ivo são sócios de um ferro velho onde trabalham com venda e troca de sucatas no local. “Estamos aqui há poucas semanas e muita coisa mudou. Havia muito lixo espalhado, e ao invés de jogar pra dentro do parque, resolvemos queimar. Assim como esse espaço usado pra lavar os carros onde armazenava grande volume

D e j e t o s d e li xo s s ã o lançados diariamente n o lo c a l


Foto: Maicom Franceschini

Antigo posto de lavação virou depósito de sucatas. A água que escorria para o l a j e a d o fo i n e u t r a l i z a d a

de água compramos pedras pra poder escoar e filtrar principalmente quando chove”, afirma Ivo, morador das proximidades há 30 anos. Ademir garante ainda que não há detritos que maltratem o meio ambiente ou que suscite odor e mau cheiro aos que praticam esportes internamente, ou para os moradores próximos. “Apesar da água suja a gente não sente cheiro ruim. Nem mesmo no verão com o calor forte não há sintomas de poluição – pelo menos é o que nós percebemos”, explica o morador. Mas o que eles não sabem realmente é de onde vêm os lixos despejados na encosta do lajeado. Quando chove, o nível sobe a ponto de cobrir os bueiros e elevar os resíduos jogados no entorno. Para o biólogo Rudinei Montemezzo, a operação de tratamento do lajeado deveria propor ainda em seu planejamento, uma revisão subsidiada da água. “É essencial revisar o sistema de monitoramento atual para priorizar áreas com problemas evidentes de degradação dos recursos hídricos, limitando ao essencialmente necessário o número de indicadores e parâmetros a serem monitorados, bem como o número de pontos e a frequência de coleta das análises, de modo a reduzir substancialmente os custos operacionais sem perda de informações relevantes para a tomada de decisão e ampliar o número de monitoramento de situações potencialmente poluidoras da água”, afirma Rudinei.

Todavia, o que moradores e frequentadores do principal parque ecológico do município esperam é a cautela quanto aos projetos futuros, pois a natureza do espaço não permite ampliação com pista de ciclismo, praças esportivas ou amplo playground. “A cidade cresce e as estruturas também devem ser melhoradas, ampliadas, oferecendo condições adequadas à população. Agora, estamos chamando uma audiência pública buscando uma definição”, é o que espera o vereador Márcio Sander, em entrevista ao jornal Diário do Iguaçu sobre uma nova revitalização do esforço. “Essa nova revitalização que estão propondo será mais uma verba pública mal utilizada. Não há como pensar em parque ecológico se as autoridades não tomam uma providencia com os lixos depositados em torno do lajeado, ou até mesmo do esgoto que vem ninguém sabe de onde”, conclui o morador Gilberto Gurth. Contatamos responsáveis pela vigilância sanitária do município durante duas semanas. Por ao menos três vezes encaminhamos e-mail solicitando um respaldo com informações precisas do problema, e das reclamações obtidas dos moradores. Por telefone, conseguimos algumas raras vezes falar com a secretária do então responsável Adalton Alves de Abreu. Em nenhuma das ligações foi possível agendar entrevista ou obter um encaminhamento direto.

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Foto: Lidiane Pagliosa

Lajeado São José Um problema sem final feliz Por Lidiane Pagliosa e Simone Pereira

Assim como no amor é necessário semear boas ações para manter o sentimento vibrante, desta mesma forma deve ser a relação entre humanos e meio ambiente, para que a colheita seja de bons frutos. Apesar de grande parte do que é consumido hoje ser industrializado, muitos produtos tem a matéria-prima extraída da natureza. Além de ser dela a produção de um dos bens mais preciosos para a existência humana, a água. O lajeado São José é um manancial superficial e a principal fonte de abastecimento de água dos chapecoenses. Possui uma área de aproximadamente de 7.278,54 hectares. Em Chapecó, a exemplo de outras localidades, a preservação dos recursos hídricos é preocupante. Pois, na bacia do lajeado São José há poluição, dejetos de animais e descarte de lixo próximo ao local, onde as chuvas levam os resíduos ao contato da água do rio. Além disso, existem famílias que residem próximas das margens sem nenhuma infraestrutura e com saneamento básico precário. É o caso da família da dona Ermeni Terezinha do Prado, conhecida como Dona Nica. Ela, há 23 anos reside às margens do lajeado. Dona Nica era moradora da linha Faxinal do Rosa, interior do município e resolveu se mudar para área urbana

em busca de melhores estudos para seus quatro filhos. Porém, sem condições de comprar um terreno, e apenas com uma carga de madeira, invadiu a terra próxima a margem do lajeado e construiu sua primeira residência. Hoje, Dona Nica acredita que sua vida está melhor, pois, os quatro filhos estão encaminhados. “Uma conseguiu fazer sua casa ao lado da minha e tem um filho. A outra trabalha de agente de saúde, mas ela é enfermeira. Para o mais velho dos rapazes eu dei um pedaço aqui também para ele construir seu próprio negócio. O mais novo faz agronomia na Universidade Federal”, relata com um sorriso no rosto. No entanto ela recorda que em 1992, quando chegou na comunidade do Lajeado São José, logo percebeu a falta de interesse de seus vizinhos de manter a preservação ao redor do lajeado. “Muitas mulheres lavavam roupas no rio e algumas deixavam as roupas velhas na beira e quando chovia a água levava embora”. Por este motivo, Dona Nica resolveu fazer parte da Pastoral da Criança, onde realizou um trabalho de combate à desnutrição e de orientação sobre cuidados com a água. “Nós tratávamos as crianças desnutridas, mas percebemos que o problema não estava somente na falta de alimento e sim na qualidade de água consumida”, afirma.

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Foto: Lidiane Pagliosa

“M u i t a s m u lh e re s lavava m ro u p a s n o rio e algumas deixavam as roupas ve lh a s n a be i r a e q u a n d o c h ov i a a á g u a le v a v a e m b o r a ” . - E r m e n i Te r e z i n h a d o P r a d o , c o n h e c i d a c o m o Dona Nica, moradora há 23 anos da comunidade do Lajeado São José

Qualidade da água

Como é o tratamento da água?

De acordo com uma pesquisa realizada através do projeto Rede Guarani/Serra Geral, em Santa Catarina de 2008 a 2014, a qualidade da água do lajeado São José foi a pior entre os oito rios avaliados da região oeste. O motivo disso é evidente, a história de Dona Nica, se repete com muitos moradores do local, que fizeram a ocupação sem nenhum planejamento e fazem o uso inadequado do solo. Além da habitação, outros agravantes são: as indústrias, os comércios e a prática da agricultura que contribuem para a degradação da água. Segundo a Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan), em Chapecó há uma vazão de 560 litros por segundo de água tratada, distribuída a 159.523 habitantes. Para o abastecimento de água no município, de acordo com o Relatório Anual de Qualidade da Água Distribuída 2014 da Casan, são utilizados três mananciais subterrâneos e dois superficiais. Dois dos mananciais subterrâneos abastecem de forma integrada a cidade e estão localizados nos bairros São Pedro e Vila Real. O outro poço abastece de forma isolada o Distrito Industrial. O processo de captação de água de mananciais subterrâneos ocorre de forma mais vantajosa e segura. De acordo com a entidade, o processo de tratamento para purificação é mais simples e os poços são mais protegidos de agentes poluidores, do que os mananciais superficiais.

Para o tratamento dos poços que abastecem os chapecoenses são realizadas três etapas. A primeira é a de captação da água através de poços tubulares profundos, entre 100 e 180 metros de profundidade. Através de bombas de sucção a água é encaminhada para a Câmara de Desinfecção, onde por meio de processos de adição de cloro e flúor é realizada a desinfecção e fluoretação química. Após esse tratamento a água fica armazenada em um reservatório e está apta para ser distribuída. Porém, o processo para desinfecção da água de mananciais superficiais é mais complexa. Para chegar até a casa do consumidor água dos lajeados São José e Tigre passam por quatro etapas. São elas: captação e recalque da água, clarificação, tratamento final, reservação e distribuição. Durante esse processo a água é captada nas represas dos lajeados, através de bombeamento é conduzida para Estação de Tratamento de Água (ETA). Onde recebe a clarificação que é a adição do produto químico policloreto de alumínio, que tem a função de eliminar partículas, matéria orgânica e outros elementos que estejam presentes na água. Após esse procedimento é realizada a filtração da água, com materiais específicos para purificação. Depois, segue para o tratamento final, onde é adicionado cloro para controle bacteriológico, alcalizante para correção da acidez e flúor para prevenção contra a cárie dentária. Após, esse processo, passa para os reservatórios para a distribuição.

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O que falam os órgãos públicos?

Foto: Lidiane Pagliosa

De acordo com o gerente de Desenvolvimento Ambiental da Fundação do Meio Ambiente (Fatma), de Chapecó, Rafael Gasparini, a situação da água do lajeado São José realmente é crítica. Mas ele garante que após todos os procedimentos com toda certeza a água distribuída pela Casan é a melhor opção para o consumo humano. “Podemos pegar, por exemplo, os poços artesianos de Chapecó. Que dos aproximadamente quatro mil poços existentes, 90% não têm licença para distribuir essa água, então se compararmos questão de riscos, a água da Casan é melhor”, relata. Quanto à problemática do lajeado São José, ou seja, a degradação ambiental e a presença de moradias irregulares, afirma estar ciente. Porém, não há recursos para realizar uma fiscalização constante naquela localidade. Ainda, segundo ele, estes conjuntos de problemas não são de hoje. Ele afirma, que se um crescimento sustentável tivesse sido pensado, haveria uma solução rápida. Pois, hoje é complicado por em prática os planos e projetos que visam solucionar a situação. Pelo fato de ter famílias no local, e isso demanda recursos financeiros para a retirada das mesmas. Ainda segundo Gasparini, a responsabilidade dessas mudanças seriam da prefeitura. Para ele, uma solução seria retirar e coibir a habitação humana nas proximidades do lajeado e fomentar o plantio de novas árvores. “Após isso, a natureza se encarregaria de fazer o resto”, conclui. Segundo a prefeitura de Chapecó, o assunto “Lajeado São José” está em pauta na Câmara de Vereadores do

município. “A administração municipal só repassará informações a respeito após concluído o trâmite no Legislativo Municipal”, afirmou em nota. No entanto o que está em trâmite na Câmara de Vereadores é o Plano Municipal do Saneamento Básico, que prevê a articulação, integração e coordenação dos recursos tecnológicos, humanos, econômicos e financeiros para a prestação dos serviços públicos municipais de abastecimento de água e esgotamento sanitário. No momento o projeto está com seu trâmite suspenso, pois foi pedido vistas para maiores esclarecimentos. Enquanto isso, Iracema da Silva, deve seguir com a mesma opinião. Ela, que reside há 29 anos na comunidade Lajeado São José, acredita que a situação continua igual desde que chegou na localidade. De acordo com ela, que morava no interior de Nonoai, Rio Grande do Sul, a mudança para a comunidade foi em busca de melhores condições. Pois, a vida na agricultura era difícil. Mas garante que a condição de poluição do lajeado já existia . “Eu não usava a água do rio para lavar as roupas, encardiam”, relata ela. Seus filhos, conforme dona Iracema, nunca se interessaram em frequentar o lajeado, seja para brincar ou pescar. “No verão, o pessoal costuma se reunir próximo ao rio para fazer piquenique, churrasco, beber e brincar na água”. Apesar dessa prática, a moradora não sabe dizer se o pessoal costuma deixar o lixo abandonado nas margens do lajeado. Agora é esperar o verão para saber qual será o desfecho. Quem sabe até chegar essa estação, os órgãos públicos (ou alguém) tenham encontrado a solução definitiva para a problemática do lajedo. Qual será o capítulo final dessa história? Isso segue uma incógnita.

“Eu não usava a água do rio para lavar as roupas, e n c a r d i a m ” , I r a c e m a d a S i lv a - moradora há 29 anos da comunidade do Lajeado São José

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