Passe a folha edição 53

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Edição 53 | Ano 17 | Julho de 2015

JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNOCHAPECÓ

Voto eletrônico começou em Xaxim e agora está na ponta dos dedos

A urgência do jeitinho brasileiro se tornar o jeitinho certo Janqueli Ceruti

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Dizer que não gosta de política é renegar a própria relação com outras pessoas Página 02

Maria vai com todos e a necessidade de rever discursos Página 03

Perfis: Joaquim Barbosa, Padre Pedro Baldissera e José Mujica Páginas 4, 11 e última

Delação premiada: “arrependimento” seria ato digno de perdão do Estado e da população?

Baixos índices educacionais: atuais políticas públicas ainda são insuficientes

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Entre a cultura enlatada e a cultura caseira Página 6


EDITORIAL

Desinformação e a legião da “antipolítica” Um jornal-laboratório, como este, tem como função possibilitar a experimentação jornalística aos acadêmicos de Jornalismo. Nesse sentido, os alunos partem da escolha do gênero sobre o qual preferem escrever ao definir o tipo de texto e da respectiva pauta que pretendem abordar, para tratar de um assunto que consideram relevante ou para expressar suas ideias. Para tanto, o Passe a Folha é um instrumento que contribui para a qualidade da formação jornalística. Com publicação desde abril de 1999, o Passe a Folha permite a produção jornalística e o surgimento de novas propostas, como a valorização de textos informativos, interpretativos ou opinativos, bem como adequações em seu aspecto visual. Por isso, não é um jornal padronizado, porque deve servir como laboratório. Nesta edição, são apresentados textos de diversificados gêneros jornalísticos como reportagem, crônica, perfil, artigo e ensaio. Da mesma forma, há uma grande variedade de temas abordados, como a necessária valorização dos atos políticos, o uso das redes sociais, a corrupção e o jeito certo de fazer as coisas, sem o “jeitinho brasileiro”, a difusão da cultura, as políticas de incentivo cultural e os dilemas da educação. Também são temas de pauta: a política como essência, contrapondo-se à politicagem; a greve dos caminhoneiros e a política; a união estável entre pessoas do mesmo sexo; impeachment; delação premiada; lei da ficha limpa; processo eleitoral e o sistema de voto pela urna eletrônica; e mídias sociais e as campanhas políticas. Um gênero de texto que deveria ser mais valorizado pela imprensa está bem presente nesta edição do Passe a Folha. Trata-se do perfil jornalístico. São três produções feitas por acadêmicas: do ex-ministro e ex-presidente do STF, Joaquim Benedito Barbosa Gomes; do deputado estadual Padre Pedro Baldissera; e do ex-presidente do Uruguai, José Mujica. Como se vê, os assuntos abordados têm a política como ponto central. Essa foi a opção dos alunos do sétimo período, na disciplina de Redação Jornalística V, de tratar do tema política, não necessariamente em seu aspecto puramente partidário. A partir disso, os acadêmicos produziram um rico conjunto de textos, que estão a seguir.

Jornal laboratório do curso de Jornalismo da Unochapecó

(opiniões e interpretações em textos assinados não representam a posição do curso ou da universidade)

Reitor Odilon Luiz Poli Vice-Reitoria de Ensino, Pesquisa e Extensão Maria Aparecida Caovilla Vice-Reitor de Planejamento e Desenvolvimento Cláudio Alcides Jacoski Vice-Reitor de Administração Antônio Zanin

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Diretor da Área de Ciências Sociais Aplicadas Sady Mazzioni Coordenador do Curso de Jornalismo Vagner Dalbosco Av. Senador Attilio Fontana 591-E, Bairro Efapi, Cx. Postal 1.141 Chapecó - SC - CEP 89809-000 Fone (49) 3321-8254 www.unochapeco.edu.br jornalismo@unochapeco.edu.br

Disciplina: Redação Jornalística V, Sétimo Período Professor/Editor responsável Hugo Paulo Gandolfi de Oliveira (Jornalista/MTE4296RS) Redação Aline Reinheimer, André Zanfonatto, Camila Mendo, Camilla Constantin, Carine Ester Salvador, Daiana Fátima Brighenti, Daniel Mendes Moreira, Daniela da Silva, Débora Favretto Pinto, Fernanda Filippi, Guilherme Júnior Rachelle,

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Janquieli Ceruti, Laisa Verona Dal Forno, Tatiane Defiltro, Taulan Cesco, Vanderleia Vanessa Tramontina e Vinícios Antônio Ranzan. Diagramação Aline Dilkin


OPINIÃO

André Zanfonatto

André Zanfonatto

Desinformação e a legião da “antipolítica”

Senso Comum” diz que uma pessoa não gosta de política e, ainda por cima, que não gosta porque “é muito roubo de dinheiro público”. Porém, o “Senso Comum” esquece em que pessoa votou, esquece até de qual partido era o candidato. Ele esquece até para quem vendeu o voto. Sem generalizar, por favor, mas esse “Senso Comum” é mesmo um grande chato. A massa que grita alto e diz

que odeia política é a primeira que se manifesta quando algo ligado à corrupção acontece. Talvez seja a primeira a aumentar o volume da televisão e do rádio quando se fala em roubo nos cofres públicos. Pode ser, talvez, a primeira que pula o horóscopo do jornal impresso e corre às paginas policiais para saber qual é o novo processo de desvio de verba pública. Isso é não gostar de política? Ou é apenas gostar

de dizer que odeia? A política faz parte da nossa vida desde muito cedo. Há quem diga que o primeiro choro, na hora do parto, já uma atitude política, pois está se demonstrando um sentimento para os demais, inclusive ao médico que dá um tapa no traseiro para que o bebê chore. Logo, o ser humano é indissociável desse assunto, a política faz parte, é uma relação de troca com outras

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pessoas. Política é buscar um denominador comum para todos, negociar decisões e encontrar soluções. Vai muito além do simples fato de assistir o horário político ou apertar nas teclas da urna eletrônica o número daquele candidato que você nem conhece, ou mal conhece. O teu “bom dia” para o amigo é um ato político, afinal está se demonstrando preocupação com o próximo Página 3


e querendo que a relação continue bem. Política é algo interpessoal, sempre refletirá em alguém, nem que seja em você mesmo. Porém, o que se procura entender dentro do tema é por que muita gente gosta de dizer que odeia ou o que as levou a crer que isso realmente é verdade. Será que confundem o ato político com a politicagem? Será que não saem de casa e não conversam com as demais pessoas? A politika da Grécia Antiga de Platão significava tudo o que se referia à cidade, ou seja, à polis. Pensar a origem da organização social e qual a melhor forma de convívio entre os moradores era pensar o espaço público, o viver em comunidade. Porém, ao que parece, o termo política, para muitos, se resume em apenas “gente roubando”, algo do qual querem distância. Será esse afastamento e renegação da política que faz a situação se tornar exatamente da forma como detestamos? Elegendo alguém que não me representa também me torno partícipe da celuma.

Dizer “odeio política” te redime da culpa de ter colocado alguém mal intencionado no poder? Será que odiar política te deixa de consciência limpa de que você não faz parte do que o país vive atualmente ou, tão somente, demonstra que não se entende realmente o que é o assunto. Não minta para si mesmo. A solicitação de aumento de salário é ato político. Este assunto, porém, o seu chefe pode não gostar, e a política dele pode ser aumento de trabalho, apenas. Ambos os atos são políticos e a proposta de cada um incomoda o outro, e nisso se esquece que é política. Odiar a política é ser um analfabeto político, como já disse o alemão Bertold Brecht, no século passado: “O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos…”. Esse analfabeto pode não ser mais como Brecht escreveu. Hoje ele participa da discussão, jurando que possui razão no que diz. Porém, não busca informações concretas, se baseia em

Ficar “em cima do muro” nem sempre é a melhor opção

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boatos, mentiras e suposições num aprofundamento indiscutivelmente raso. Recebe sem filtros e distribui como recebeu. Esse analfabeto político odeia política, mas a vive como ninguém, por mais que seja em um mundo paralelo,

pensar num termo abrangente, que represente o que realmente é política, como uma relação indispensável para que se construa uma sociedade mais igualitária e justa com os princípios que se buscam desde a “invenção” da política. O analfabeto político

Não participar de política, ou pelo menos renegá-la, não contribui em nada para a construção de uma sociedade mais justa onde apenas a sua razão é válida. Essa pessoa não tem argumentos profundos para, realmente, definir o por quê não gosta de política, apenas o que sabe é que “é muita roubalheira, isso me dá nojo”. Será que esse analfabeto político não poderia se apossar do termo e compreender do que se trata? Falta informação concreta do que acontece e envolve política, falta esclarecimento e quebra de paradigmas sobre o assunto. Caso pensasse muito mais nos prejuízos em que a falta de política faz, talvez os impactos negativos na opinião pública não seriam assombrosos. Deve-se deixar de lado o partido corrupto e

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é uma ameaça ao debate público sobre o assunto, que precisa de respeito e o mínimo de conhecimento para se dialogar. No mais, ele nada mais é do que uma vítima do que ele mais abomina, o político desonesto, virulento. São vítimas de uma política incoerente, partidarista e divisionista, sem escrúpulos e que se aprende a odiar, mas não se aprende a ter criticidade de se livrar. Logo, o senso comum volta a imperar em uma parte da sociedade que é frágil intelectualmente, que tem senso crítico, mas ainda não consegue diferenciar o que é realmente o termo do que é praticado.


CRÔNICA

Maria vai com todos Angélica Bergamin e Débora Pinto

Débora Favretto Pinto

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aria deu um passo à direita defendendo o passarinho de bico grande. Todas as outras Marias deram um passo junto com ela. Vestiram agressivamente o verde e o amarelo em favor do pássaro de bico grande. Maria estava descontente com a estrela vermelha. Todas as outras Marias ficaram descontentes com a estrela vermelha, mesmo sem saber o que estavam fazendo. De Maria a Marias, as redes sociais, geralmente o Facebook e o Twitter, são minadas todos os dias por opiniões e após a reeleição da presidente Dilma Rousseff as coisas pioraram. Os descontentes online passaram a disseminar, não somente a opinião, mas palavras de ódio, raiva e violência contra os que não defendem a mesma opinião. Há de se dizer que as redes sociais não são o mal, porém é preciso dizer que há um mal na forma em que as Marias passaram a ir umas atrás das outras. Os discursos já estão prontos. A opção de compartilhamento nunca foi tanto usada. Se Maria fosse uma vaca, diria que ela aprendeu a usar as redes sociais para levar todas as outras vacas potreiro abaixo. Estamos na democracia, porém abaixo de palavras sábias e de discursos estudados, longe do raciocínio lógico e inteligente. As redes sociais podem servir a liberdade de expressão com um banquete de “eu posto o que eu quero”. No entanto, apenas para aumentar a angustia do momento, é bom lembrarmos de Paul Sartre diz que “somos eternamente condenados a viver em liberdade”. A condenação das últimas postagens é a de acirrarmos a política partidária de uma forma errônea, parcial, muitas vezes raivosa. Pesquisas mostram que nas

eleições de 2014 as redes sociais influenciaram para inflamar as discussões políticas. Nos esquecemos que aquilo que aparece na time line é dirigido por um filtro digital e mostrará apenas o que esse filtro achar que há familiaridade com o perfil pessoal. Desta forma, informações, corretas ou não, milhões de bytes produzidos por dia, podem influencia as opinião de quem o lê. Assim, o que temos produzido? Marias que vão atrás de outras Marias, sem valorizar o raciocínio individual. Formamos o fenômeno de coragem nas redes sociais baseado na Maria que vai com as outras. Espalhar a discórdia não é a melhor forma para se discutir política, não há como esperar pela mudança vivendo uma guerra online, que somente vê ataques ao ar, sem causa ou efeito. A política precisa ser discutida sim. No entanto é preciso eliminar o discurso

de ódio e rancor. Em primeiro lugar, é necessário lembrar que discursos raivosos não são a solução mágica para o problema da má política no Brasil. Outro, é que a corrupção não decorre somente da política partidária, mas sim, é um ato presente no “jeitinho brasileiro” de viver. Eliminando esses fatores de conceitos prontos, é bom trazermos a mente, que como dizia uma antiga professora de História “o Brasil comete erros de menino pequeno”, ou seja, ainda estamos construindo a nossa história e saber o que já aconteceu é bem importante.

Como se não bastasse o online, as Marias espalharam seus discursos nas ruas

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O debate menos agressivo e mais eficaz parte, sabiamente, daqueles que se despirem do egoísmo e do sentimento de derrota partidária. Discursar “fora estrelinha” não muda, compartilhar dados do “revoltados online” não muda e muito menos propagar a raiva, essas coisas não mudam. São passos de vacas cegas. Muda quando o pensamento levar em conta uma postura crítica e equilibrada. Usar as redes sociais pode render uma discussão frutífera e sem limites geográficos, rende um intercâmbio de conhecimentos específicos prontos para ajudar cada um a forma a opinião própria. É necessário pensar antes de escrever cada palavra. Há liberdade, há direito em usar a rede como quiser. No entanto, cuidado para não ser você a Maria que vai com as outras, ou pior, a Maria que vai com todos. Página 5


ARTIGO

Néscios em política Aline Reinheimer

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faculdade com ensinamentos enriquecedores, pois conhece um mundo completamente diferente do que o imaginado. Ao distinguir política de “politicagem”, a socióloga Lorici Orsolin explica que política é um exercício de poder de um homem sobre outro homem, quando se busca utilizar do poder para defender os direitos de cidadania e do bem comum. Então, podemos concluir que quando o político é eleito ele tem o dever de fazer algo em benefício da população, para honrar as pessoas que o escolheram. Já a “politicagem” a socióloga ensina que são atos inescrupulosos, que visam o benefício próprio e não à coletividade. São ações de politiqueiros que querem se dar bem às custas do povo. Assim podemos citar os escândalos envolvendo políticos corruptos, que aproveitam a oportunidade de estarem no poder para cometer tais atos, mas esquecem que estão ocupando essas

cadeiras que foram escolhidos pela população. A política é bem abrangente, pois em todos os lugares existe política, até mesmo dentro de casa, na administração da família e no convívio do lar. Já a sociedade é constituída por várias políticas, que são denominadas, por exemplo, de política social, política de saúde, política de educação, política de economia e política de transportes, entre outras. Resumindo, a política busca somente melhorias e bem-estar para toda a sociedade e não o pode prejudicar. Ao se tratar de política e eleições, todos os eleitores devem escolher bem em quem votar, principalmente analisar com bastante tranquilidade quem vai trabalhar para ajudar o povo e lutar pelos direitos dos cidadãos. O cidadão tem todo o direito de voto, não é obrigado a votar em quem lhe faz promessas falsas ou quem lhe trata bem somente no ano de eleição. Mesmo

aquele que se candidata pela primeira vez deve ter ciência que será analisado por seus atos durante a vida. Pode ser complicado e dar medo, mas vale muito à pena. A política é algo sério, pois ela é a grande protagonista da história e existe para melhorar e beneficiar a população. Portanto, há um grande abismo de diferenças entre política e “politicagem”, pois ambas não dizem respeito aos mesmos atos. Enquanto uma trata de algo que constitui a boa conduta, razão, responsabilidade e respeito, a outra infringe os princípios legais da administração pública fazendo com que as pessoas não acreditem mais na honestidade dos políticos. Enfim, a política é tudo o que se relaciona à busca de ações para o bem-estar, tanto individual como coletivo. E como afirma Aristóteles, “a política não deveria ser a arte de dominar, mas sim a arte de fazer justiça”. Lucas Gonzatti

omo Platão já dizia “O preço a pagar pela tua não participação na política é seres governado por quem é inferior”. O que demonstra, para quem tem pouco conhecimento e acredita no que os outros falam, as denominadas pessoas néscias, que a maioria das pessoas não tem uma noção muito clara de o que é política. Para muitos a concepção de política é político corrupto, lavagem de dinheiro, atos ilícitos, mas isso não é política e sim “politicagem”, falando no popular. Ou seja, é servir-se de artifícios políticos egoístas para beneficiar somente uma pessoa ou um pequeno grupo de pessoas interligadas. Neste contexto, é recomendável que essas pessoas (com pouco conhecimento) participem da política partidária, de eleições e campanhas, se candidatando como um vereador, por exemplo, para conhecer o que é política e o que gira em torno. Para muitos, é uma

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PERFIL

De faxineiro negro ao cargo mais importante do Judiciário Carine Estér Salvador

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Ilustração: Jocimar Bohnenberger

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e família modesta, olhos miúdos, óculos Gepeto e mania de mexer as mãos enquanto fala. Negro, 61 anos, calvo, tem história com início simples e humilde, no município de Paracatu, em Minas Gerais. Desde menino, brindava a vida com a leitura e escrevia no ar. Como primeiro emprego, auxiliava o pai entregando lenha e fazendo tijolos, enquanto a mãe cuidava da casa e dos outros sete irmãos menores. Com menos de uma década e meia de vida já tinha viajado o mundo através das histórias dos exemplares que ganhava. Depois, já juiz, um pouco acima do peso, trajou terno e gravata, além de uma batina preta, e desfilou humildemente e sem papas na língua pelos corredores do Supremo Tribunal Federal (STF), como seu mais alto mandatário. O ex-ministro e ex-presidente do STF Joaquim Benedito Barbosa Gomes, que é conhecido por Bordane Jocana, na cidade natal e ganhou apelido até no Supremo, com o famoso “Ouvidor Geral da Nação”, nasceu em 7 de outubro de 1954. Filho de Joaquim Barbosa e Benedita Gomes da Silva, ele pedreiro e ela dona de casa, cresceu na pequena cidade natal, onde ficou até os 16 anos. Alvoroçado por uma vida mais ascendente, mudou-se para Brasília, onde arrumou emprego na gráfica do Correio Braziliense. Estudou e se formou em Direito pela Universidade de Brasília, JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNOCHAPECÓ


Instigado pelo debate, Joaquim Barbosa é daqueles que diz o que pensa depois como mestre em Direito de Estado, pela mesma instituição, e doutor, na França. Entre as atuações na administração pública federal, foi compositor gráfico do Centro Gráfico do Senado Federal, oficial de chancelaria do Ministério das Relações Exteriores e membro do Ministério Público Federal. Era procurador da República quando se licenciou do cargo para fazer mestrado e, depois, o doutorado em Direito Público na França. Durante sua carreira, causou agitação e ganhou destaque na mídia por ser relator do notório processo do mensalão. Nesse episódio, coordenou o processo e dominou os mínimos detalhes das mais de 50 mil páginas de laudos, perícias e depoimentos do julgamento. Foi também o único ministro do STF favorável à legalização do aborto. Entre as manias, mexer nas mãos dissona de suas palavras, que são redirecionadas para serem pertinentes. Com um documento à frente para ler, precisa tirar sua lente extra ocular, como sinal de astigmatismo. Inteligente, temperamento genioso e incapacidade de dialogar são rótulos de amigos, às vezes de inimigos e da imprensa, findados através de ações e comportamentos. Alternando entre sentar e ficar em pé no plenário, Barbosa mostrou uma doença degenerativa chamada sacroileíte, que se dá pela inflamação nas articulações que conectam a base da coluna com o quadril, o que provoca fortes dores. Essa moléstia chegou a afastar o ministro do trabalho várias vezes para repouso. Além de se limitar quanto o trabalho, Barbosa teve que deixar o piano, o violino e o futebol,

paixões da infância, por boia revertida. Gostando ou não, sua quente, cadeiras especiais e opinião sempre teve peso sobre sapatos com solas macias. a mesa. Hoje, fora das bancadas do Supremo, Joaquim tem as suas preferências e indicações Poliglota e palestras e divulga-as através dos 140 A vida do libriano teve caracteres do Twitter. Ele elogia o jornalista outras dificuldades. De faxineiro a ministro, nada de Fernando Gabeira, ex-deputado flores. Estudando em escola federal pelo Rio de Janeiro. pública e sem padrinhos Em sua página destaca a influentes, conseguiu o frase: “O que o Gabeira faz cargo máximo do Judiciário não é jornalismo, é serviço de Brasileiro por competência, utilidade pública, de educação, e foi também presidente do de conscientização social, de Conselho Nacional de Justiça civismo. Magnífico”. Entre (CNJ). Além de doutor e mestre os livros indicados pelo exem Direito, Joaquim fala ministro em seu Twitter cinco línguas: inglês, alemão, destacam-se “A Casa dos Budas italiano, francês e português. Ditosos”, do autor João Ubaldo Mesmo com o segundo menor Ribeiro; e “Cidadania no salário do plenário (dados Brasil”, de Murilo de Carvalho. divulgados em 2012 pelo site de Ambos são elogiados, com notícias R7) os R$ 15.956,00, as palavras “livro delicioso” que eram depositados na conta e “um livro belo, instrutivo e do ex-ministro, enchiam sua atualíssimo”, respectivamente. mãe de orgulho. E também o Também aponta como um filho Felipe Barbosa, que teve “livraço”, a obra “Getúlio”, com Marileiza Francisco de de Lira Neto. Não é à toa Andrade, com quem foi casado que Barbosa distribui tantas indicações. Em seu gabinete no durante sete anos. Atualmente Joaquim dá STF, nada mais nada menos do andamento a sua empresa de que 4 mil exemplares estavam palestras e cursos, ministrados a disposição. Depois de sua pelo Brasil. Entre os temas saída, as obras foram levadas dominados pelo advogado estão: para sua casa, onde ele montou Ética e Desenvolvimento; Ética uma biblioteca. na Política e nos Negócios; e Tributação e Controle de Partidos, meros Constitucionalidade. Também é instrumentos possível destacar as temáticas: Estado, Sociedade e Direitos Sobre partidos, indica que do Cidadão; Lei Anticorrupção: “são meros instrumentos” e que Compliance Empresarial; e “nossa nação não se construiu Desenvolvimento e Segurança e tampouco se define à luz Jurídica. de momentâneos interesses No plenário ficou famoso partidários”. Joaquim Barbosa por agredir verbalmente vários comenta, ainda, que “o processo colegas, como Eros Grau e judicial cuida de interesses Gilmar Mendes. Isso é até ferrenhamente contrapostos. hoje lembrado e causou sua Tem de ser transparente, recusa de seu registro na OAB, dar igualdade de chances às do Distrito Federal, depois partes”. Nas entrelinhas e com JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNOCHAPECÓ

tamanha informação quanto ao Judiciário e o Parlamento, percebe-se certo rigor nas opiniões do ex-ministro. Ele lamenta que as pessoas falem assuntos distorcidos sobre si, criticando a forma como comentam a respeito: “Incrível como torcem e retorcem o que eu digo. O objetivo é claro: desviar a atenção da essência daquilo que foi objeto do meu comentário”. Mais alguns caracteres e complementa: “Sobre as reações aos meus posts recentes sobre confusão entre Política e Justiça: meus críticos fingem não saber que hoje sou um cidadão livre”. Bem embasado, Joaquim utiliza oTwitter para descrever o seu sonho: “Termos dirigentes que saibam o efeito profundo que a educação disseminada e de qualidade tem sobre o desenvolvimento de um país”. Diante disso, há questionamentos sobre o motivo pelo qual ainda não se candidatou a Presidência da República ou outro cargo. Ele alicerça: “Acho difícil. Não me vejo fazendo isso. O jogo da política é muito pesado, muito sujo. Estou só assistindo a essa movimentação. [...] Deixem falar. Não serei candidato a presidente. Realmente eu não quero. É lançar-se, expor-se a um apedrejamento”. Aposentado desde o dia 31 de julho do último ano, Barbosa, na ocasião da despedida, verbalizou estar “absolutamente tranquilo, com a alma leve e com o cumprimento do dever”. Em seu posto tomou posse Ricardo Lewandowski, o mais antigo ministro do supremo, que juntamente com Joaquim participou dos embates no julgamento do Mensalão, de forma ferrenha. Página 9


ARTIGO

Pelo “jeitinho certo” Laisa Verona Dal Forno

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por mês para pagar a conta de uma televisão a cabo que você rouba o sinal. Sua mãe não merece ser roubada, após todo o amor e carinho que lhe deu. Sim, roubada, porque aquele troco do mercado que você não devolveu poderia pagar o seu pão do café da manhã. Viu só? Ninguém merece as coisas que acontecem, mas mesmo assim, continuamos fazendo, e reclamando a corrupção “dos outros”. A corrupção não acontece somente no ambiente público, ou na relação “públicoprivada”, ela acontece todo o dia. Está entre nós, está nos corrompendo também. “O que você tem a ver com a corrupção?”, é o tema de uma campanha do Ministério Público que surgiu em Chapecó. Tudo! Somos vítimas e também somos praticantes. Esses pequenos desvios de conduta, de ética são “carinhosamente” chamados de “jeitinho brasileiro” e são, lamentavelmente, o que, forma o “caldo” que alimenta toda a corrupção no Brasil. Ela começa por baixo mesmo, começa com você, com seu vizinho e vai até lá em cima, lá no alto escalão, onde é mais fácil de ser vista e

julgada. “Mas eu não posso mudar tudo o que acontece no Brasil”. Pode, pode sim! Esse pensamento de que nada vai mudar mesmo se você mudar, é o que faz o nosso país retroceder. O mesmo menino que cola na escola, poderá ser aquele homem que compra o resultado de uma prova para passar em um concurso público ou que frauda uma licitação. Assim como crescemos, o nosso caráter também deve crescer. E crescer para o lado do bem! A mudança começou. Sempre dizem que é o jovem que vai mudar o mundo e a mudança está começando por ele, através de manifestações, de caras pintadas, de ruas cheias de patriotismo. Já se vê um enorme progresso comparando-se com alguns anos atrás. O jovem está preocupado com o seu futuro, não somente em relação à política, mas também em relação à natureza e ao respeito ao próximo, por exemplo. Os jovens querem mudar a visão de que o Brasil é formado apenas de samba, futebol, praia e político corrupto. E devem mudar. Nós temos muito mais para

oferecer, sempre tivemos. Mas também temos que ter os pés no chão e ter a plena consciência de que todos precisam mudar. Nós, ao votar, mas também nas praticas corriqueiras do dia a dia. Já ouviu aquela linda frase: “Gentileza gera gentileza”? Ela é linda e ela é real. Eu tenho, sim, uma visão otimista sobre a vida e sobre o mundo e acredito que as coisas podem mudar. E mudarão. O “jeitinho brasileiro”, um dia, se transformará no “jeitinho certo”.

De acordo com o jeitinho brasileiro, o melhor modo de conseguir algo é “molhando” a mão, ou os bolsos, de alguém

Laisa Verona Dal Forno

esde pequena minha mãe me ensinou a cuidar muito bem da minha vida e não me meter na dos outros, a me amar antes de pedir que alguém me ame. Sempre me ensinou a cuidar bem de mim para depois poder julgar alguém pelos seus atos, porque mesmo que isso seja uma atitude horrível, convenhamos, não somos perfeitos. E eu tenho feito isso, o máximo possível. Por isso ardem os meus ouvidos quando ouço pessoas falando: “Chega de corrupção, o povo não merece político corrupto no poder!”. Concordo que a corrupção no Brasil alcançou níveis extremos, mas fico me indagando se o povo realmente não merece isso. A mulher grávida e o idoso também não merecem ficar em pé na lotação ou horas esperando nas filas de banco ou mercados. O professor não merece ver alguém colando na prova, após passar horas elaborando as aulas e também a prova que é corrompida. O seu chefe, após confiar a você um cargo e tê-lo contratado, não merece ser enganado com um atestado falso. Seu vizinho não merece trabalhar cinco dias

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CRÔNICA

Tatiane Defiltro

Tatiane Defiltro

Entrego e me redimo

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m meio a tantas denúncias, principalmente no que se refere ao escândalo da Operação Lava Jato, é mais do que pertinente se falar em delação premiada, ainda mais quando o ex-diretor de Refino e Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, por exemplo, em acordo com o Ministério Público Federal, vem denunciando nomes de empresas e envolvidos para “livrar” sua pele de problemas maiores. O ex-diretor decidiu fazer delação, acuado, na iminência de sofrer uma sucessão de condenações como réu da operação, considerando que não teria a menor chance de sair da prisão tão cedo, querendo também preservar seus familiares, que se tornaram alvos da Lava Jato. É indiscutível que a delação premiada é a fonte primordial da Operação Lava Jato, que

investiga um dos maiores escândalos de corrupção da história recente do país, onde, pelo menos 13 pessoas já se beneficiaram desse instrumento. Em troca de informações à Justiça, os acusados por ela optantes podem alcançar o perdão ou significativa redução de pena. Mas esse direito já existente em outros países e que foi inserido há poucos anos no Brasil, não é visto com bons olhos por muitas pessoas. A começar pelo fato de que o delator somente entrega os crimes após sua prisão. Então, apenas o faz para reduzir sua pena, e só confessa mediante acordos. Sendo assim, ele comete um crime e posteriormente ainda é “condecorado” se agir de forma “ética” denunciando o restante do esquema. Sobretudo, o Estado, além de não punir um crime, ainda incentiva condutas de “traição”, indo

contra os preceitos que regem o companheirismo e o respeito, qualidades essas valorizadas inclusive por quem está atrás das grades. Um tanto contraditório não? O Estado valorizando menos do que os próprios criminosos alguns princípios morais. Fora essas questões, é irracional confiar em alguém envolvido em um crime, seja de qual espécie for, pois seja crime político ou não, o envolvido pode ser tendencioso e denunciar apenas o que lhe for conveniente, para, dessa forma, sair ganhando de duas maneiras: judicial e financeiramente em novos acordos firmados para que não entregue nomes do esquema. Como se não bastasse tudo isso, ainda pesa o fato de que, será que é digno um cidadão de atenuação de pena, ou mesmo perdão judicial, após ter cometido um crime contra a

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O dedo duro aponta mais envolvidos para responder consigo pelo crime sociedade? O “arrependimento” seria um ato de nobreza digno de perdão do Estado e da população? Uma vida toda de insulto á população brasileira e ao fim dela é premiado como se fosse um título de ética? A justiça brasileira no seu todo precisa ser repensada, mas a delação premiada, com certeza, é um instrumento mal adaptado de outros países e de certa forma acaba contribuindo com os famosos crimes de colarinho branco no país e com a impunidade, no sentido de abrandamento das punições, pelo menos até o presente momento e da maneira com que está sendo aplicada. Página 11


Taulan Cesco

COTIDIANO

Um gole de cultura, por favor! Taulan Cesco

H

ouve um tempo em que o homem, logo depois de olhar para o céu e reconhecer sua insignificância - antes da significância -, voltou sua vocação não mais a balbuciar e comer alimentos crús, mas sim à sua cultura. Voltouse a expelir suas angústias, temores, euforias, iras, frustrações, prazeres e tantos mais substantivos passíveis do sentimento humano naquilo que entende-se como sua maior criação: a arte. O que distingue os homens de qualquer outro animal da natureza é a cultura. Que não passa de um conjunto de artefatos, esteriótipos e imaginários da qual cada ser é pertencente. E quando o homem Página 12

vislumbrou sua arte, vislumbrou suas potencialidades: a pintura, a música, a representação, as tecnologias... Enfim, vislumbrou o mundo que vemos hoje. Podemos, voltando ao passado, dar alguns milhares de anos ao surgimento e manutenção das culturas humanas. Além disso, podemos dar algumas centenas de anos ao firmamento dessas diferentes culturas e algumas décadas em que esses conjuntos de técnicas e artefatos iniciaram um cruzamento entre si, provocando uma espécie de hibridismo cultural pós-moderno. Historicamente, o Brasil é repleto de diversidade

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cultural - desde a música às representações artísticas (específicas de uma determinada região) - motivada, em muito, pelas diferentes colonizações de países europeus. Foi no fim de 1937 que a cultura passou a ser entendida como ferramenta de promoção, propaganda, o que se exemplifica de modo mais evidente no regime de Getúlio Vargas. Mais tarde, a difusão da cultura brasileira é interrompida pelos golpes atordoantes da ditadura militar, o que por anos se repetiu com as ações de Collor, que extinguiu, se não todos, muitos organismos de promoção à cultura existentes até então. Além disso, os canais


de televisão aberta, réplicas de modelos estadunidenses, tiveram e ainda têm grande parcela de “culpa” quanto ao detrimento da cultura popular brasileira, em ascendência de modelos estereotipados e de puro gozo, encharcando os canais com programações evasivas e pouco construtivas. Um verdadeiro “freak show”. Evidentemente, com muita prudência, há de se destacar que a televisão aberta no Brasil também proporcionou bons momentos à difusão e incentivo às linguagens artísticas, mas ainda está aquém da real potencialidade.

Cultura de prateleira, cultura de feira Mas os tempos mudaram. Ou melhor, algumas coisas ao longo dos últimos anos mudaram, efetivamente. Foi na década de 1990 que a situação se reverteu e a cultura no Brasil passou a cruzar-se com as demais governanças, que não federalistas, para, assim, inciar um grande diálogo sobre a produção cultural e artística. Surgiram nesse período políticas de investimento à cultura. O Brasil se esforçava, então, para retomar a construção interrompida em três décadas atrás. Contudo, duas décadas antes, em 1970, a cultura norteamericana dava os primeiros passos à globalização cultural, à homogeneidade da cultura, à cultura enlatada. Esse quadro foi se intensificando cada vez mais, criando um cenário, aparentemente, irreversível. Consumia-se e apropriava-se da cultura estrangeira de forma muito natural, como se aquilo já

A cultura, como a água, é a essência de vitalidade seja do indivíduo ou de seu grupo “fizesse parte de nós”. A indústria cultural pressionava as expressões mais autênticas e populares, transformando-as em produtos de turismo ou, mesmo, menosprezando-as como cultura de minorias. Este contexto ainda é vivido. Porém, uma espécie de batalha está posta. Já não bastasse a indústria cultural estrangeira, impregnou-se a nacional. Nesse meio campo, as demais manifestações artísticas buscam espaço da forma que conseguem. Programas públicos de incentivo foram complementando-se com verbas decorrentes de iniciativas privadas e o cenário se abriu de uma forma que nunca havia se visto. Existem muitas controvérsias no que diz respeito às políticas de incentivo, mas há de se notar sua grande importância para a entrada de novos movimentos, antes limitados fisicamente, mas especialmente em razão de uma cegueira causada pela cultura enlatada, importada do que poderíamos chamar de “trashlands”, ou seja, “os países-lixo”. Estaríamos vivendo a aurora cultural do Brasil? De imediato, a resposta pode ser sim, mas faltam alguns passos até que, com efeito, brindemos à democracia da cultura, fadada ainda a uma massificação. Atualmente existem diversas leis, programas e editais de incentivo e acesso à cultura. Muitos, resultado de ações governamentais, outros, de inciativas privadas, o que no Brasil significa muito. Um exemplo mais convencional, que tornou-se a “padroeira” dos artistas independentes, é a lei nº 8.313, de 23 de dezembro de

1991, mais conhecida como Lei Rouanet, que possibilita pessoas física e pessoas jurídicas utilizarem parte do Imposto de Renda em promoção de ações culturais. Muitos artistas são devotos e outros ainda acendem velas em pedido à “padroeira” pelo deferimento de seus empreendimentos artísticos. E a “santa”, bondosa como é, na maioria das vezes, ouve os pedidos. Outros mecanismos também auxiliam na projeção desse movimentos culturais alados, menos privilegiados, sufocados pela pulverização da indústria cultural. O Plano Nacional de Livro e Leitura concentra ações, projetos, programas e eventos desenvolvidos em todo o território brasileiro, com o objetivo de estimular as práticas de leitura, em diversos âmbitos. Além disso, a linguagem audiovisual é aportada, hoje, pela lei nº 8.685, de 20 de julho de 1993, que beneficia produções cinematográficas, exibições e produções audiovisuais a fim de garantir a manutenção dessas práticas artísticas. Só se for “de grátis” - Pode-se falar, ainda, em espaços públicos que garantem o acesso livre dos cidadãos como os Centros de Artes e Esportes Unificados (CEU’s), inciativa do governo federal, e os centros do Serviço Social do Comércio (Sesc) distribuídos pelo país, onde são apresentados espetáculos teatrais, musicais, exibição de filmes, acesso à biblioteca, esporte, entre outros. Lembra-se, também, dos espaços públicos a exemplo dos teatros municipais, museus, galerias, bibliotecas públicas, enfim, uma infinidade de ambientes que florescem de

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cultura. Já declara a Constituição Federal de 1988 que a Cultura é uma garantia da cidadania: “Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais”. Parece que acordamos para esta realidade. Ainda sonolento, o Brasil desperta para uma nova fase. O muito que foi feito, ainda é pouco para melhor contemplar. Os indivíduos bebem, sentem, tocam, respiram e ouvem a cultura. Pois quando olharam para o céu estrelado e perguntaram “quem somos?”, escondiam em si a resposta: “O homem é a sua arte”. É preciso alcançar, de agora em diante, patamares onde se viva a plena cultura brasileira, democratizada pela diversidade de linguagens, estilos e discursos, sem estereótipos entre o popular e o elitizado. Ambos não existem mais. É preciso criar público e mantê-lo, mostrar a ele que de nada adianta produções artísticas sem plateia. Abaixo à cultura importada, aos produtos massificados que nos são jogados diariamente de diversas formas. É preciso viver a cultura sem preços, sem etiquetas que definem “você pode” ou “você não pode”. O justo é o gratuito, a não ser, é claro, quando impostos retornam como música, cinema, dança, teatro, documentário, pintura, museus e livros. Sem importância ficam as políticas, quando não há quem consuma. Nada vale o consumo, se o que as políticas ofertam é o enlatado do vizinho. Página 13


ARTIGO

Nós podemos ser pai e mãe, sim! Daniel M. Moreira

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divulguem relatórios anuais que especifiquem a “relação dos escolares com as suas famílias”. Loucura? Não. O deputado disse que não inventou um novo formato de família e que apenas reproduziu o conceito que está na Constituição Federal de 1988. Em entrevista ao programa Roda Viva da TV Cultura, o presidente admitiu considerar errado que casais homossexuais possam adotar uma criança e não respondeu se sua posição seria um retrocesso para a sociedade brasileira. Disse que é contra, e acha que não é a melhor maneira. “Sou a favor de uma educação mais ‘igualitária’, não acho correta a adoção por homossexuais”, afirma. Podemos conceituar a adoção como sendo um ato jurídico solene pelo qual se estabelece um vínculo de paternidade e filiação entre o(s) adotante(s) e adotado, independentemente de qualquer relação natural ou biológica de ambos. Em maio de 2011, por unanimidade, o Supremo

Tribunal Federal reconheceu a união estável entre pessoas do mesmo sexo. Sendo assim, casais homossexuais podem adotar, visto que a adoção já não é mais tida, pelos orgãos reguladores, como um contrato de simplesmente inserir uma criança na família. O vínculo afetivo é o que importa nesse ato. No que tange aos casais homoafetivos, o princípio da igualdade é aplicado, e se existe afetividade, reconhecida pela lei, tendo em vista que a liberdade da sexualidade é elemento integrante e próprio do ser humano. Nestes termos, um ambiente familiar saudável e equilibrado não se relaciona com a orientação sexual do adotante. Também a vinculação da orientação sexual do adotante para o deferimento da adoção por casais homoafetivos é inconstitucional, ferindo o princípio da igualdade, artigo 5º de nossa constituição. Diante do exposto, não há como impedir que os casais homoafetivos adotem conjuntamente uma

criança e adolescente, visto que a jurisprudência brasileira vem demonstrando que os homoafetivos possuem direitos em seu favor, com base nos princípios da dignidade humana. Entre os vários obstáculos que os homossexuais passam, estão o preconceito e a discriminação que ferem a identidade e dignidade desta minoria. Preconceito que Igreja, sociedade e políticos fortalecem. A adoção por homoafetivos também é julgada pela visão preconceituosa da sociedade. Sociedade esta que não nega somente o direito de união dos homossexuais e de adotarem filhos, mas os torna invisíveis e doentes negando-lhes o respeito e os direitos fundamentais de viverem do seu jeito.

Desde 2011 o Brasil reconhece a união estável entre pessoas do mesmo sexo Ilustração Alexsandro Gnovatto

uando criança, ouvia muito a frase “formar uma família”. Logo imaginava um casal, homem mais mulher, um filho ou dois, e pronto. Era esse o meu conceito de família. Hoje mudou. Entendo família como pessoas que moram juntas. Escolhem e ponto. Isso para mim, é claro, mas e pela lei o que é uma família? É o fruto de uma “união estável”, entre um homem e uma mulher. Desde fevereiro deste ano, Eduardo Cunha, deputado federal pelo PMDB do Rio de Janeiro, preside a Câmara dos Deputados. Logo que assumiu, o deputado tratou de criar uma comissão especial para que a tramitação do projeto que reconhece como família apenas núcleos formados por um homem e uma mulher fosse acelerada. A proposta tinha vindo da bancada evangélica, criada pelo deputado federal de Pernambuco Anderson Ferreira, do PR. Esse estatuto veda adoção de crianças por casais gays, prega a valorização da família e prevê, ainda, que as escolas

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ARTIGO

Dilemas educacionais: realidades e abismos Camilla Constantin

Camilla Constantin

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educação é um dos setores mais importantes para o desenvolvimento de um país. É através do conhecimento adquirido em sala de aula que a sociedade encontra maiores possibilidades de aumentar sua renda, de ter maior qualidade de vida e, ainda, de adquirir o senso crítico necessário para questionar as inúmeras questões referentes ao cenário político do país. As melhorias no setor envolvem a responsabilidade e parceria dos governos federal, estadual e municipal. Por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), o governo desenvolve políticas, programas e ações com o intuito de amenizar e combater as desigualdades existentes entre as regiões e Estados brasileiros. Entre as políticas voltadas à educação pública de qualidade e à democratização do acesso aos sistemas educacionais, estão o Programa Nacional do Livro Didático, que visa à distribuição de coleções de livros aos alunos da educação básica e o Programa Brasil Alfabetizado, com a missão de superar o analfabetismo entre jovens com 15 anos ou Página 16

mais, adultos e idosos, além de programas de formação direcionados aos profissionais da educação e outros. Diversas políticas públicas vêm contribuindo com a educação no país. Porém, o Brasil ainda sofre com baixos índices nessa área e diversos fatores contribuem para os resultados negativos, como as falhas no ensino básico e a falta de incentivo à profissão de educador. No ranking da educação, feito pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil está atualmente na penúltima posição (35º). Diferentemente da Coreia do Sul, décadas atrás conhecida apenas pelos conflitos com o país vizinho e que atualmente ocupa o quarto lugar no ranking mundial. Até os anos 1970, os índices educacionais do Brasil e da Coreia do Sul eram semelhantes. Entretanto, com o passar dos anos, criou-se um abismo entre as duas realidades. Com 98% da população alfabetizada, a Coreia do Sul, admirada mundialmente por sua educação de qualidade, foi o primeiro país a equipar todas as escolas com internet banda larga. No Brasil, ainda existem escolas

que não utilizam nenhum aparato dos educadores, incompatível tecnológico. para abarcar todas as melhoras requeridas. Entretanto, não é apenas graças Baixos índices às questões governamentais que apontam descaso tais resultados foram atingidos Coreia do Sul. De acordo com com a educação no na dados da Organização para a Brasil Cooperação e Desenvolvimento Econômico, os pais brasileiros Os resultados obtidos na estão entre os menos interessados Coreia do Sul, foram fruto de na educação de seus filhos, muito esforço e dedicação, enquanto os pais sul-coreanos principalmente em relação a destacam-se pelo alto grau de políticas eficazes. Lá, onde participação e comprometimento. educação é política permanente É importante ressaltar que essa de Estado, ser professor é motivo participação vai muito além de de orgulho e admiração. A carreira comparecer aos eventos escolares. de docente está entre as mais Envolver-se com a educação dos disputadas, devido principalmente filhos significa saber o que a aos bons salários, já que um criança está aprendendo, seguir de professor sul-coreano do ensino perto a lição de casa, incentivar a fundamental chega a ganhar seis leitura e realmente contribuir com vezes mais do que um brasileiro e o aprendizado escolar, com visão está entre os dez mais bem pagos permanente. do mundo. Exigir que o Estado efetive Apesar da contribuição de políticas públicas voltadas para inúmeras políticas públicas a educação de qualidade é tarefa para a educação no Brasil, isso de todos. Entretanto, é importante não é suficiente. Uma reforma levar em consideração o caso educacional torna-se necessária Coreia do Sul: os resultados diante de tantos erros vistos somente virão com a participação no setor, principalmente em de todos os envolvidos no relação às condições de trabalho processo educacional.

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ENSAIO

O papel político na greve dos caminhoneiros A greve dos caminhoneiros, que durou cerca de um mês e afetou todo o país em fevereiro e março deste ano, pode ter causado efeitos que pegaram muitos consumidores de surpresa. Quem não se antecipou, acabou ficando sem combustível e enfrentando dificuldade para obter outros produtos básicos, como determinados tipos de alimentos e gás. Mas assim como parte da população que foi pega desprevenida pelos efeitos da greve, as maiores autoridades do país também não se anteciparam. O governo foi alertado por aliados no Congresso Nacional sobre uma possível paralisação, mas não se importou com o movimento em si e nem com os efeitos que poderiam causar. Os senadores Waldemir Moka (PMDB-MS) e Blairo Maggi (PR-MT) avisaram os líderes do governo no Congresso pelo menos três dias antes de o movimento começar no País inteiro. O Planalto não agiu porque esperava que a greve não tivesse tamanha proporção e que logo o movimento se dissiparia, sem nem precisar jogar panos quentes, simplesmente pretendia não gerar mais discussão e assistir à paralisação perder força gradativamente. O governo só se deu conta do contrário quando mais de cem trechos de rodovias federais em 13 estados foram dominados por caminhoneiros, sem contar as rodovias estaduais que também foram interditadas ou tomadas por motoristas em protesto e a população começou a sofrer com o desabastecimento. A greve expôs uma fragilidade e uma qualidade do Brasil. A primeira é em relação à dependência extrema do transporte rodoviário e a desvalorização dos motoristas, responsáveis por transportar 80% da produção brasileira.

Sem modais alternativos ou de proporção beirando a insignificância, quando o transporte rodoviário entra em colapso, todos estão fadados a sofrer as consequências. Além do desabastecimento em postos de combustíveis e mercados, a paralisação prejudicou serviços públicos e diversas cadeias produtivas. As agroindústrias pararam os abates, os agricultores tiveram que parar as colheitas e os prejuízos chegaram a R$ 150 milhões por dia, somente na região Oeste de Santa Catarina. Os trabalhadores, a maioria autônomos, paralisaram as atividades e bloquearam trechos em rodovias por todo o País para reivindicar a criação de uma tabela de frete e a redução do preço do óleo Diesel, entre outros itens da pauta. O discurso dos caminhoneiros é de que a situação da atividade está insustentável. A maioria possui um ou dois caminhões, normalmente velho porque nem todos tem acesso às linhas de crédito e são contratados por transportadoras que precisam de caminhões. Existe a demanda pelo serviço prestado pelos caminhoneiros, mas estes profissionais não têm estabilidade financeira e vivem em permanente tensão, porque não têm fluxo de caixa estabilizado, precisa buscar a carga, cuidar da manutenção do caminhão, das contas da viagem e ainda da família. Quando fica parado na estrada ou em filas, ele é o único a arcar com o prejuízo. Em países como Estados Unidos e Alemanha, cuja matriz de transporte não é tão dependente do transporte rodoviário, os caminhoneiros conseguem lucros de quatro e seis vezes a mais que os brasileiros, respectivamente. No Brasil, que é extremamente dependente do transporte feito pelos caminhões, em 20 dias de trabalho o salário líquido não

Vinicios Ranzan

Vinicios Antonio Ranzan

chega a R$ 3 mil. Por segundo, podemos avaliar positivamente o engajamento com a paralisação, inclusive com participação de donos de empresas. Eles lutaram por um interesse primariamente particular, mas que tem reflexo posterior em toda a economia. Havia contradições nas agendas dos trabalhadores, que tem interesses divididos em relação aos donos das grandes transportadoras. Mas o fato a ser louvado é a união em torno do apelo por mudanças, em prol de uma sociedade melhor para todos e não apenas para a própria categoria, alimentados pelo anseio popular, exposto por uma sequência de eventos políticos, como as manifestações de junho de 2013. Mas o que ficou claro é a indiferença de autoridades. Figuras que ocupam cargos eletivos no Executivo e Legislativo são representantes do povo, lhes é atribuída a função de discutir os problemas para tentar solucioná-los e não podem fugir da responsabilidade, mas tentam reduzir ao máximo

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possível o conflito gerado, pois dependem da confiança do povo para se reeleger. Alguns deputados tiveram a iniciativa de ouvir os manifestantes e levar as reinvindicações para as esferas em que atuam, ainda que também de forma tardia. Os problemas apontados não eram novidade, mas não recebiam a devida atenção, até que os caminhoneiros sentiram que chegou ao limite e resolveram paralisar. Enquanto a lógica for remediar em vez de evitar que os problemas cheguem a situações insustentáveis, a greve vai continuar sendo a lógica predominante na busca por melhorias. O povo brasileiro se diz não representado pelos políticos e a prova é esta. Milhões de brasileiros foram às ruas há quase dois anos, foram às ruas em março novamente e os caminhoneiros também conseguiram realizar um manifesto que provocou alarde no país inteiro, enquanto políticos fogem do compromisso e tendem a mostrar esforços e dar atenção ao tema apenas quando a repercussão é inevitável. Página 17


ENSAIO

Impeachment, uma ‘‘mudança’’ nada certeira Vanderleia Tramontina

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ão há como negar, o Brasil está passando por um delicado momento político. Chegamos ao ponto de ouvir e ler, em inúmeras publicações de redes sociais e cartazes de manifestações, pedidos absurdos de intervenção militar. Sim, a situação econômica do país não está em sua melhor fase. O aumento dos preços dos combustíveis e da energia elétrica são exemplos disso e causam alvoroço. Para piorar, mais escândalos de corrupção são pautas diárias, de um bolo recheado, nas entrelinhas do debate, por sensacionalismo e interesses pouco legítimos. Em meio a tanta indignação, uma parcela do pede, que euforicamente, pelo impeachment da presidente da República, Dilma Rousseff. Mas será que existe base legal que sustente a possibilidade? E mais do que isso, se Dilma viesse a sair, realmente aconteceria a tão almejada mudança social, econômica e política? Nessa divisão, um grupo considera a ideia inútil, entre eles o teólogo Leonardo Boff, que em entrevista à Rádio Brasil Atual teceu contextualizações sobre essa questão. Quem também assumiu abertamente a mesma posição foi o cronista Luiz Fernando Veríssimo. Enquanto isso, outro grupo defende a proposta. Nesse lado encontramse Michelino Roberto, diretor do jornal católico ‘‘O São Paulo’’ e Jarbas Vasconcelos, deputado federal do PMDB de Pernambuco. A história se repete ou não. Em 1992 quem governava o país Página 18

era Fernando Collor de Melo, o primeiro candidato a eleger-se pelo voto direto após 30 anos de ditadura. Collor assumiu o governo em 1990, e desde então enfrentou problemas em seu governo, eis que vêm à tona um plano de governo. Denominado como ‘‘Plano Collor’’, o projeto tinha, entre outros objetivos, congelar preços e salários e bloquear contas de poupança pelo prazo de 18 meses. Essa era a possível saída para haver o corte de gastos e o controle da inflação.

De acordo com pesquisas, a aprovação do governo Dilma cai de forma constante Entretanto, o resultado foi contrario e a insatisfação da população somente aumentou, daí o caos alastrava-se como erva daninha. Foi nesse estágio que surgiram denúncias contra Collor e seu governo. Após a instauração da CPI para investigar as denuncias e a comprovação de tais acusações, eis que Fernando Collor sofre impeachment, assumindo o então vice-presidente, Itamar Franco. Bem, voltemos a 2015. Vivemos a triste realidade de convier diariamente com notícias e afins que trazem em seu vasto, ou nem tanto assim, conteúdo o desenrolar da ‘‘Operação Lava Jato’’.

Operação que investiga um esquema de lavagem e desvio de dinheiro, envolvendo políticos de diferentes partidos, empreiteiras e a empresa estatal Petrobras. Os momentos históricos aqui citados pouco têm em comum. Lá atrás estavam os caras pintadas. Jovens cheios de vontade e ousadia, agora são os pais da juventude de hoje. Também movidos pelo atrevimento. Para alguns, e aqui se encaixam, perfeitamente, homens e mulheres, jovens e adultos, faltam aulas de história, para quem sabe assim não levantarem a bandeira da volta da ditadura. Esta é a oportunidade de sair de casa e ir para as ruas cobrar, gritas e espernear. Isso é democracia, às vezes cinza e empobrecida, mas mesmo assim é democracia. Sem hipocrisia, sabemos que muito ainda precisa melhorar. Afinal, o sistema politico brasileiro constituiu-se movido por fortes interesses privados e uma noção mínima de identidade publica. É cruel dizer que a solução para problemas de natureza politica seja a volta da ditadura militar. Precisamos entender esses contrapontos e defender aquilo que realmente pode trazer mudanças significativas para o país. A reforma politica pode ser compreendida como a largada inicial, para ter-se uma administração pública mais eficiente e honesta. Essa reforma é constituída por um conjunto de propostas, discutidas no Congresso Nacional. Dentre as mudanças estaria a questão dos sistemas eleitorais, dos

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financiamentos eleitorais e partidários e da reeleição e mandato. Temas esses, que sempre estão em discussão e são vistos como pontos que devem sofrer alterações. Essa seria uma contribuição, no mínimo, significativa para a reorganização da politica brasileira. Infelizmente, tivemos esta juventude criada às vistas da corrupção, já enraizada em nossa confusa política brasileira, de ideologias falidas e perspectivas quase nulas. Será que os sonhos ficaram resguardados aos jovens dos 50, 70 e de lá não saem mais? A presidente Dilma não é hoje nenhum baita exemplo de administração, mas se sair ainda assim permanecerá o sonho de um país melhor. Isso porque, sem muitos rodeios, os possíveis substituídos na presidência, perante a legalidade ,estão longe de trazer mudança. É trocar seis por meia dúzia, e olhe lá. Somente para deixar claro, se a Presidente atual realmente sofresse um impeachment, não seria Aécio Neves quem assumiria. De acordo com a legislação, a sucessão se daria com o vice assumindo, nesse caso Michel Temer, em caso de decorridos dois anos de mandato. Se Temer também não pudesse assumir, viria o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, e depois o presidente do Senado, Renan Calheiros. Não há provas de que o partido da atual presidente, o Partido dos Trabalhadores, seja todo corrupto, nem que


Vanderleia Tramontina

Dilma esteja envolvida no caso da estatal petrolífera brasileira. Existe, no entanto, a insistência. Desde o início de 2011 calcula-se que 10 pedidos de impeachment já foram feitos contra a atual presidente, mas todos foram arquivados. De acordo, com a Lei do Impeachment - Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950, capítulo I, artigo 14, é “permitido a qualquer cidadão denunciar o Presidente da República ou Ministro de Estado, por crime de responsabilidade, perante a Câmara dos Deputados’’. Na sequência, o artigo 16 completa que, ‘‘A denúncia assinada pelo denunciante e com a firma reconhecida, deve ser acompanhada dos documentos que a comprovem, ou da declaração de impossibilidade de apresentá-los, com a indicação do local onde possam ser encontrados, nos crimes de que haja prova testemunhal, a denúncia deverá conter o rol das testemunhas, em número de

cinco no mínimo’’. Por mais que o cenário atual esteja desestabilizado em alguns setores, não há evidências do envolvimento de Dilma com a corrupção da Petrobrás. Isso contribuiu para que nenhuma investigação fosse instaurada contra ela. No fim das contas, o impeachment tem cunho um tanto manipulatório. É claro que tem a insatisfação da população diante de tantos descasos, porém existe também a atuação, nas entrelinhas, de uma mídia que denuncia e de uma política com interesses ambíguos. Enfim, escolhe-se um ‘‘Judas’’ no meio de uma centena de ‘‘mal lavados’’, e Dilma é a escolha da vez. É certo que não é culpa somente dela, quem derá esse lixo todo fosse disseminado por uma só pessoa ou partido, mas não. É coisa histórica, atravessa a fronteira das ideologias políticas. Lado ‘‘A’’ é corrupto, lado ‘‘B’’ não se pega para trás. E você sentando no sofá ou

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gritando na rua tem sua parcela de culpa. Afinal, aceitamos a ideia de que furar fila, aceitar troco errado e falsificar carteira estudantil, por exemplo, são coisas normais. Não que isso justifique os rombos estrondosos existentes, mas serve de base para entendermos que está tudo muito banalizado. Não basta, nem de longe, apenas julgarmos este ou aquele, precisamos mudar alguns dos nossos hábitos cotidianos. Estudar, ler e pesquisar sobre a reforma política é válido, já que dentre as opções é a mais cabível e eficiente para o momento que se vive. O contexto ao qual estamos inseridos clama por mudança. Porém, é preciso ir além do senso comum, e compreender que um impeachment não solucionará em nada as lacunas que se arrastam pela história. Afinal, a cereja do nosso bolo, se substituída, mesmo que mude de cor, continuará o mesmo gosto. Página 19


REPORTAGEM

A nova velha lei da ficha limpa Camila Mendo

E

m 10 de junho de 2010 entrou em vigor a Lei da Ficha Limpa (PLP n° 518/2009 n° 135). Com 1.516.479 assinaturas, aos cidadãos brasileiros votaram para que as eleições sejam mais limpas e transparentes. O projeto vale para cargos de âmbito federal, no Executivo, Judiciário e Legislativo. Antes de a lei ser intitulada Lei da Ficha Limpa, em 1990 a Presidência da República decretou a lei complementar número 64, que apresenta medidas para crimes cometidos por políticos. Medidas essas que foram atualizadas em 2010, como a pena, que era de quatro anos e passou a ser de oito anos, com maior rigor no julgamento, mesmo o político podendo entrar com recursos e se candidatando a um cargo público. No ano de 2014 houve mais de 26 mil registros de candidaturas, e destas 4.115 foram questionadas pelo Ministério Público Eleitoral (MPE). Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 502 impugnações foram decorrentes dessa lei, 254 casos foram rejeitados nas contas de cargos públicos, 59 foram condenadas definitivamente e 37 foram condenados por improbidade administrativa que compreende lesão do patrimônio público e enriquecimento ilícito. Contudo, a condenação não é definitiva, os crimes como a compra de voto, abuso do poder econômico e abuso do poder eleitoral estão previstos na lei e são julgados, podendo o candidato ainda recorrer da decisão. Vindo de encontro a esses recursos e às brechas da lei, está Paulo Maluf, que foi condenado em primeira instância pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo e recorreu. Maluf, Página 20

deputado federal do Estado de São Paulo, pelo PP, foi condenado por improbidade administrativa. Mesmo a população sabendo dessa condenação, na última eleição votou no candidato, que se elegeu com 250.296 votos e conseguiu entrar com um recurso e ter aprovada a candidatura para exercer seu mandato no início deste ano. Em 18 de março, a presidente Dilma Rousseff divulgou o pacote de medidas anticorrupção, ampliando a Lei da Ficha Limpa e a criminalização do “caixa dois”. Não houve mudança no julgamento dos candidatos que renunciam sua candidatura porque caíram na Lei da Ficha Limpa, que são julgados e podem ser condenados como os outros. Nas seis medidas da proposta, se destaca a penalidade para os crimes, que antes era de oito anos e hoje ,com as novas medidas, prevê pena de três a seis anos para quem for condenado pela prática de caixa dois. Além dessa penalidade, há o confisco dos bens e a devolução do dinheiro aos cofres públicos. Os bens irão a leilão e o dinheiro ficará depositado em juízo. Como última medida, prevê uma regulamentação da Lei Anticorrupção.

Na ficção Recentemente, a Rede Globo voltou a reprisar a novela “O Rei do Gado” que trata, entre seus assuntos, da política. O senador Roberto Caxias, interpretado pelo ator Carlos Veneza, põe em discussão a honestidade de um político. Seu personagem vive em Brasília e é um político honesto, que não pensa em roubar um real se quer do que não lhe pertence, mesmo

com grandes ofertas. Benedito Ruy Barbosa, autor da novela, exibida primeiramente em 1996, demonstra as semelhanças com o passar dos anos. As semelhanças estão na corrupção, na compra e sonegação do que o político tem. Segundo dados divulgados pelo movimento de combate à corrupção eleitoral, a partir do ano 2000 e divulgado em 2007, o Estado de Minas Gerais é o que mais possui políticos cassados, 71. Em seguida vem Rio Grande do Norte, com 60, e São Paulo, com 55. Já o partido que mais tem políticos cassados é o Democratas (DEM), com um percentual de 20%, levando em conta que hoje no Brasil são 32 partidos registrados no TSE. Os cargos que mais têm político cassado são os de prefeito e vice (508), em seguida vereador (84), deputado estadual (13), deputado federal (8), senador e suplentes (6) e governadores (4), totalizando 623 políticos. De encontro com esses dados, podemos afirmar que o Brasil é considerado um dos países mais corruptos, já que muitos políticos pensam menos na população e mais em seu bolso. O importante é encher os cofres do partido e pensar em sua própria conta poupança, deixando de lado o cidadão. O eleitor que votou num país menos corrupto e em pessoas que se diziam de bem, ou pensavam em ajudar a todos, hoje percebe que não é bem isso que está acontecendo. Como exemplo de corrupção e caixa dois, há o Mensalão, o Petrolão ou Lava Jato, o caso HSBC (poucas pessoas sabem, pois a mídia não trata do assunto com tanta ênfase) e tantos outros que estão escondidos debaixo do pano. Assim como muitos políticos são corruptos, não pode-

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se generalizar e dizer que não existem políticos honestos que tentam fazer o seu papel, mas são prejudicados pela má fama dos outros. Muitas vezes eles não têm como se defender, pois os fatos estão comprovando que uma parte de quem ocupa esses cargos somente pensa no dinheiro e não na população.

Faça sua parte O cidadão também pode questionar o registro da candidatura, pois para ser um candidato é necessário apresentar a filiação partidária um ano antes do pleito e domicílio eleitoral um ano antes, apresentar as certidões criminais de primeiro e segundo graus, da Justiça Federal e da Justiça Estadual, além da idade mínima exigida (18 anos) e quitação eleitoral perante a Justiça Eleitoral. Para isso, deve formular o pedido por escrito e apresentá-lo a um cartório eleitoral, que encaminhará para o Ministério Público Eleitoral. Caberá ao MPE verificar a pertinência da informação e tomar as medidas cabíveis. As denúncias ainda podem ser realizadas pelo disquedenúncia no 0800-881-0278 para todas as localidades, e para capitais e regiões metropolitanas no 4003-0278. A denúncia pode ser realizada em qualquer momento, não necessariamente em época eleitoral. No entanto, o mais importante é o eleitor saber quem é e como foi o passado do candidato, indo muito além da lei, pois não são somente as leis que devem mostrar quem deve ou não. É o eleitor que deve ter responsabilidade e saber quem colocará em determinado cargo para garantir seus direitos.


Conjunto de medidas 1) A criminalização pela prática do caixa dois (pena de três a seis anos a quem for condenado, além de multa de cinco a 10 vezes sobre o valor doado e não declarado); 2) Aplicação da Lei Ficha Limpa para todos os cargos de confiança no âmbito federal (Executivo, Judiciário e Legislativo); 3) O confisco de bens e a devolução do dinheiro aos cofres público; 4) A alienação antecipada dos bens apreendidos após atos de corrupção. Os bens serão leiloados assim que apreendidos e o dinheiro ficará depositado

em juízo; 5) A responsabilização criminal de agentes públicos que não comprovarem a obtenção dos bens; 6) Regulamentação da Lei Anticorrupção (incentivo a adoção de programas de integridade por empresas privadas, com códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes para detectar desvios e irregularidades contra a administração pública); Fonte: Congresso em Foco Uol.

Cargo

Número de Cassados

Prefeito e vices

508

Vereadores

84

Deputado Estadual

13

Deputado Federal

8

Senador e suplentes

6

Governador

4

Total

623

Fonte: Dossiê MPF, MCCE

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Daiana Brighenti

PERFIL

Aclamado com louvor Daiana Brighenti

J

ovem do Sul do Brasil, catarinense nato. De família humilde, simples e cristã. Filho de agricultores. Apenas 57 anos de idade, digno de uma trajetória de vida de respeito e orgulho. Um rapaz alto que carrega no rosto um sorriso sereno e sincero. De pele clara, cabelos grisalhos e ondulados. Às vezes usa batina, às vezes terno preto, mas sempre é cauteloso e decidido. É aquele que anseia sempre por descobertas, não tem medo de mudanças e não se oprime a nada. Ama o novo. Dono de uma retórica de dar inveja e de um currículo admirável. Fascinado por livros. Por onde passa constrói grandes amizades. Maturidade de quem já viveu uma vida inteira e no coração tem a bondade de uma criança. Defensor da natureza e dos cidadãos. Luta em prol de movimentos sociais. Vira a cara Página 22

para a mentira e para a falsidade. É praticante do bem, das boas ações. Um jovem sonhador. Um homem vencedor. Aquele que ajuda todo mundo. Padre Pedro Baldissera, este é o nome dele. Nasceu em 29 de maio de 1957, na pequena cidade de Caxambu do Sul, ainda distrito de Chapecó. Trabalhava na roça, junto com seus 11 irmãos. Usufruiu de uma infância dura com a realidade da vida no campo. Estudou até à quarta série na Escola José Bevilaqua, da comunidade de Dom José, daquele mesmo município. Da quinta a oitava série, deu continuidade aos seus estudos na Escola Aurora Shell Loureiro, de São Carlos. Seu ensino médio ganhou novos ares. Transferiu-se para a Escola Estadual Professor Anízio Ferraz Godinho, de São Paulo. A partir daí, prosseguiu seus

estudos de nível superior no curso de Filosofia da Faculdade Salesiana de Filosofia, Ciências e Letras, de Lorena, no interior de São Paulo. Formou-se pedagogo pela Faculdade de Filosofia e Letras, na pacata cidade de Moema, e teólogo, pelo Instituto Teológico de São Paulo. Em 1985, Pedro Baldissera foi ordenado padre católico. Inicia-se uma história de fraternidade, amor e carinho com as comunidades nas quais exerceu atividades. Agora sua vida religiosa se constituía em reitor do Seminário Salvatoriano, de Videira, e anos mais tarde, em 1988 a 1992, foi pároco de Tangará. Em 1993, transferiu-se para Guaraciaba, desenvolvendo atividades na paróquia local até 1996. Suas marcas do trabalho nas paróquias registram participação e amor pelo que faz, solidariedade

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e a motivação de sempre estar presente em qualquer ação, mesmo as mais simples. Como pessoa, Padre Pedro é mais próximo de um agricultor do que de um deputado, função que exerce desde 2003. Em seus horários de folga, aproveita para viajar, ficando mais tempo nas comunidades, ouvindo seus anseios, quando não está trabalhando de terno na Assembleia. Prefere entrevistas com especialistas para debater o tema que está em pauta, e não qualquer pessoa. Por este afeto e amor às pessoas, em 1996, foi candidato a prefeito de Guaraciaba, sendo eleito. A gestão, reconhecida até hoje pela população da região, levou Padre Pedro à Assembléia Legislativa, em 2002, elegendo-se deputado estadual. Em 2006, 2010 e 2014, novamente foi eleito como deputado.


Daiana Brighenti

Sua relação com a família é exemplo de respeito e amor por seus pais. Sua mãe, a dona Rosinha, não cansa de falar de seu filho, e sente-se orgulhosa em dizer que seu filho é padre e deputado. Antigamente, quem se ordenava padre era visto com bons olhos e acima de tudo era respeitado. Seus irmãos, muito próximos uns dos outros, ainda são unidos e mantém a forte chama da palavra família. Hoje em dia, sua relação com a Igreja ainda matém-se viva, porém um pouco afastado. Realiza missas de vez em quando, devido sua rotina corrida de deputado, mas o tempo que encontra é dedicado aos fiéis. Todos os dias, padre Pedro faz inúmeras visitas a municípios junto com seus assessores, para debater sobre as questões que envolvem o meio ambiente e os movimentos sociais, conversando e trocando ideias com prefeitos e moradores dos municípios, construindo um elo de amizade por onde passa. Seu trabalho é reconhecido pelo forte compromisso com os movimentos sociais, os projetos dirigidos à agricultura familiar e camponesa, a preservação ambiental, o apoio à agroecologia, ao desenvolvimento sustentável e a moralidade pública. Eis algumas marcas de seu mandato. Do homem simples do interior, para a construção de uma nova realidade para uma nação.

De padre a deputado Outras áreas também merecem destaque. Como saúde e educação, economia solidária e os direitos da pesca e dos avicultores, que se somam aos inúmeros projetos e ações de articulação dentro da Assembleia, desenvolvidos pelo deputado e padre. Atua junto aos movimentos ligados à terra e aos direitos humanos. Preside o Fórum Permanente de Preservação do Aqüífero Guarani

e das Águas Superficiais e o Fórum Parlamentar de Agricultura Agroecológica. Ele não decide sozinho. Coloca tudo no coletivo para decidir. Não encaminha nem uma questão, sem antes falar com alguém da área sobre o tema. Ouve mais do que fala. Não possui “frescuras” como deputado. Parlamentar exemplar, pois se preocupa com a vida, com as pessoas e pelo eixo de atuação no mandato. Mesmo sendo deputado de oposição ao governo estadual, consegue manter uma boa relação com este no que tange às reivindicações da comunidade. Pelo seu forte comprometimento atrai boas concepções com a sociedade, Igreja e movimentos sociais. Por sua forma de agir, é muito respeitado no parlamento. Ele é o único deputado que corre da imprensa, e não atrás da imprensa. É padre católico, com vinculo á pastoral e com origem na Teologia da Libertação. No entanto, a única vinculação que ele percebe entre política e religião está na ideia de que ambas deveriam ter como finalidade o bem das pessoas. Por outro lado, diz ele: “Acho que é fundamental ao Estado manter a separação entre os interesses da sociedade e de uma ou outra religião”. Quando fala em política, Padre Pedro é objetivo. “Não fazemos política somente na política partidária. Fazemos política todos os dias, quando dialogamos para buscar soluções e viabilizar demandas. Acredito que a política deve ser o bem estar coletivo nos mais diversos espaços, seja numa associação de moradores ou num parlamento. Infelizmente política para algumas pessoas significa buscar o bem de grupos ou de pessoas. É isso que atrasa nosso país: nossa visão da política se limita a uma atividade que tem desvios, quando na verdade, se todos nós fizéssemos política

todos os dias, fiscalizássemos e participássemos, teríamos melhores resultados para todos.” Bem embasado em suas prerrogativas, padre Pedro, afirma que o processo de amadurecimento democrático não costuma ser retilíneo. Assim como a política ainda possui suas divergências sobre sua definição real, as pessoas ainda não sabem fazer política. A maturidade democrática exige que as pessoas tomem mais consciência e coloquem, acima de tudo, suas exigências. A descrença das pessoas com a política e com a própria Igreja é efeito de uma sociedade que só pensa em dinheiro, esquecendo-se de seus paradigmas e o valor do outro, de uma sociedade com pessoas sem parâmetros. Por isso, os movimentos sociais encontraram uma forma de falar de suas necessidades, afinal, quem grita quer ser ouvido. “Percebo que algumas pessoas me vêem de forma diferente, quando a questão é padre e deputado, no entanto, como sempre tive uma ligação muito forte com as comunidades, em diversas frentes, e estas pessoas conhecem meu jeito, em geral não encontro tantas resistências. O problema é usar religião politicamente. Outra coisa é ter opiniões. Não se devem fazer convicções de uma pessoa, de achar que ela é isso, claro, desde que as suas opiniões

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não desrespeitam os outros.” O trabalho da Igreja é servir à sociedade, entende ele.

Sobre o papa Sobre o papa Francisco, Padre Pedro o elogia. O argentino dá muitas esperanças de mudanças profundas na Igreja, por mais resistência que ele tenha enfrentado, com relação à política. A questão está: onde a Igreja deve estar, na ponta sustentada pelo vaticano, ou junto ao povo; a Igreja deve estar fora da política, fora da sociedade, e sim, dentro dos dogmas e da liturgia. Este Papa deve transformar a palavra cristã em ação cristã, engajada, agrega padre Pedro. Ele quer, como muitos de nós, uma Igreja que se aproxime dos problemas sociais. Que trabalha, sim, as questões espirituais; que evangeliza que respeita toda a estrutura de questões que envolvem a religiosidade, mas que também olha para a sua realidade de forma crítica. Não se pode avaliar Padre Pedro como deputado sem olhar a história dele. Origem de família camponesa, onde sempre trabalhou na roça, depois saiu de casa para estudar, foi ordenado padre e novamente retornou para o interior, para trabalhar com as famílias que eram exatamente uma reprodução da sua realidade. Um exemplo de amor ao próximo e de solidariedade com todos. Página 23


Com unhas e dentes Fernanda Filippi

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usuários das redes sócias nesta época de tantas manifestações é que o partidarismo continua muito presente na vida das pessoas. Percebe-se que os eleitores não votam na pessoa e sim no partido, que defendem com unhas e dentes. Geram, assim, uma guerra sem limites, com xingamentos e palavras descabidas no Facebook e em outras redes também, como o Twitter. Discussões sobre política nas redes sociais, especialmente a respeito das eleições, têm causado consequências diretas na vida real de algumas pessoas. Amigos de infância estão brigando, excluindo um ao outro do convívio pela internet e, nos casos mais graves, até da relação pessoal. E não é apenas entre amigos que a coisa está ficando complicada: o ambiente familiar também está se estremecendo em algumas situações. Mostrando mais uma vez a força da internet, as manifestações saíram das ruas e foram para as redes sociais. E aí pouco ou quase nada pôde-se aproveitar. Prevaleceu o ranço, o ódio e todo tipo de preconceito. A maior parte das pessoas que se utilizaram das redes sociais para comentar o assunto não deu margens ao controverso. Defendeu a liberdade de manifestação, mas apenas a sua própria, sem dar a mesma concessão a quem pensava diferente. Essa verdadeira onda de insatisfação que se abateu sobre a população teve um poderoso aliado na propagação de informações e opiniões. Para muitos adeptos, o principal ponto favorável das redes sociais nessa questão é o poder que elas têm de quebrar o monopólio da informação e dar voz a todos presentes nelas.

As redes sociais fazem com que as pessoas possam divulgar suas próprias informações e opiniões. Isso significa que você tem uma interação muito rápida online, e as pessoas acabam tirando conclusões e começam a agir. As redes sociais fazem com que as informações virem um rastilho de pólvora sem ter um controlador, causando intrigas e discussões por parte de pessoas cujos partidos são opostos. Portanto, mesmo reconhecendo a força e a importância das redes sociais, acredita-se que no caso das recentes manifestações elas tiveram pouca contribuição, a não ser pelo fato de terem incentivado a mobilização. De resto, nós, brasileiros, mostramos mais uma vez que gostamos muito de pregar o respeito aos direitos, especialmente os nossos, esquecendo-se que numa democracia liberdade e responsabilidade andam juntas.

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Teclar também gera conflitos, principalmente quando ocorre nas redes sociais

Fernanda Filippi

A difícil convivência nas redes “sociais” tem beirado o insuportável para um bom número de usuários do Facebook. Difícil encontrar quem não tenha se intrigado, bloqueado, excluído contatos ou se decepcionado com amigos por causa de divergências na opção partidária. Primeiro é preciso considerar que a democracia no Brasil ainda é algo recente. Talvez a maior manifestação popular desde a democratização do país foram as Diretas Já, em 1979. Desde então, os brasileiros somente voltaram a se manifestar em momentos isolados, como no impeachment de Collor em 1992, nos protestos contra o aumento de tarifas de ônibus e especialmente em março e abril passados, pedindo o impeachment da presidente Dilma Rousseff. A guerrilha política, partidária, e a exasperação dos ânimos diante dos temas que mexem com paixões existem desde que o mundo é mundo. Porém, nas redes sociais, alguns ingredientes contribuem para o esgarçamento das relações. Alguns posts ofendendo a oposição são constantemente vistos nas redes sociais. Posts que chegam a 300 ou mais curtidas e muitos comentários ofensivos por parte daqueles que sentiram-se no direito de defender a sua ideologia ou a do seu partido. Comumente pode-se ver montagens criadas para criticar e ofender o partido oposto. Todos esses elementos contribuem para que as ofensas através do meio online fiquem cada vez mais acirrada. Temos em nossas redes conhecidos de diversas áreas e momentos da vida, e nessa hora todos falam de política, evidenciando as divergências. O que fica muito nítido aos olhos dos


PERFIL

Larica pós Mujica Daniela da Silva

U

m senhor de quase 80 anos, cabelos grisalhos, bigode conservado. Gosta de usar sandálias e andar de Fusca. Vive em uma chácara no interior de Montevidéu, no Uruguai. É casado com Lúcia Polanksy, exguerrilheira e atual senadora do país. O homem, que já escreveu cartas românticas a mulher,­ é o mesmo que também já foi guerrilheiro e presidente da República. Agora, distante da faixa presidencial é somente o José, o Pepe, o Mujica. Como preferir. Formalmente, ele é José Alberto Mujica Cordano. Um menino que nasceu em Montevidéu, no dia 20 de maio de 1935, que cresceu, tornou-se agricultor, político e ateu. Foi deputado, ministro da Pecuária, da Agricultura e da Pesca. Uma herança política, herdada de sua juventude guerrilheira. Entre 1973 e 1985, exerceu importante papel na luta contra à ditadura civil-militar. Foi um jovem militante de armas nas mãos, a postos do lado esquerdo da força, membro do Movimento da Libertação Nacional Tupamaros (MLNT). Mais tarde, um homem, que tornou-se presidente.

Ana e Facundo, os guerrilheiros Treze anos. Foi o período que Lúcia e Mujica ficaram separados quando ainda eram namorados. Nos anos 1970, eram jovens em busca de mudanças políticas e econômicas, desejavam uma revolução rápida e definitiva. Optaram então pela luta armada

e pela militância na guerrilha uruguaia. É nesse período que Lúcia e José dão lugar a “Ana” e “Facundo”, seus nomes de guerra. É nessa época, também, que ocorre a “Tomada de Pando”, especificamente, no dia 8 de outubro de 1969. Data emblemática, em que o MLNT tomou a delegacia de polícia, o quartel do corpo de bombeiros, a central telefônica e alguns bancos da cidade de Pando, no Uruguai. Em decorrência, Facundo se viu separado de Ana, ambos foram presos e apenas tornaram a se encontrar após a anistia, momento em que voltam a se reunir também com os seus companheiros de movimento. Inicia aí, uma caminhada de mãos sem armas, que, para Ana, foi fundamental para que Facundo se tornasse o presidente mais célebre que o Uruguai já viu. Um presidente elementar, que dispensou as acomodações presidenciais para continuar vivendo com Ana em sua chácara. O ar afável e sábio, de quem está acostumado a tantas menções ao seu passado militante, fica nítido no tom calmo e esclarecido com que ele trata seu período na luta armada. Seu passado guerrilheiro é continuamente lembrado. Em entrevista a Revista Fórum ele confessa que na juventude buscava um mundo perfeito e atos complicados foram tomados em prol disso: “Eu costumava pensar que haviam guerras nobres e justas, mas eu não acredito mais nisso”. A guerrilha uruguaia sonhava com um mundo onde as pessoas tivessem mais alimento,

um teto para lhes abrigar, uma educação de qualidade e o direito ao lazer. No entanto, quando um grupo decide lutar contra o Estado, pegando em armas, muitas pessoas acabam pagando o preço desse sonho. Ana e Facundo possuem o senso esclarecido quanto a essas consequências. Não de arrependimento, mas de pesar. Como presidente e como senadora, eles se depararam com um método diferente de transformação social e política, sonhada por uma geração inteira. Um sistema de mudança que, na época, eles julgavam impossível de ocorrer. Sem armas, sem violência. Apenas com política. Eles conquistaram o Estado, sem medo de inclinarse para um ou outro lado. Sem medo de serem taxados como “socialistas”. Afinal, como gostam de acusá-lo de “socialisismo”.

Pepe, esse socialista! Legalizar o cannabis, legitimar o aborto e abrir mão de parte do seu salário. Seriam esses os traços socialistas do governo Pepe? Frente a presidência do Uruguai, ele recebia US$ 12.500,00. Desse valor, 90% iam para ONGs. Os cerca de R$ 2.800,00 que restavam eram suficientes para que ele pudesse sobreviver com a mulher, mantendo sua casa no interior de Montevidéu e seu emblemático Fusquinha azul. Na madrugada, do dia 31 de julho de 2013, a Câmara de Deputados do Uruguai aprovou um projeto de lei, que colocou de vez o país e Pepe nos olhos

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do mundo. O texto, aprovado por 50 dos 96 deputados presentes, após 14 horas de debate, legalizava a produção e o consumo de maconha no Uruguai. “Se quer mudar, não pode seguir fazendo o mesmo”. Foi essa a primeira frase de Pepe, quando questionado acerca da legalização do cannabis, em entrevista aos jornalistas brasileiros do Canal Livre. Diferente do que ocorreu nos Estados Unidos da América (EUA), Pepe insiste em esclarecer que a ideia de legalização não está ligada ao incentivo do vício e da venda indiscriminada da erva. Ele vai completamente de frente ao modelo adotado pelo Tio Sam. No Uruguai, a produção da maconha fica em posse do Estado e sua venda é controlada. O usuário passa a ser tratado da mesma forma que um consumidor de drogas lícitas, como álcool e nicotina. Esse é o ponto chave do projeto: para o usuário, oferecer a possibilidade de desclandestinidade, acesso ao tratamento público se for desejado e reconhecimento do Estado; para o país, avançar em uma luta contra o narcotráfico e a violência. Apesar da efervescência positiva por parte da sociedade em torno desta lei, 65% dos uruguaios enxergam com desconfiança a legalização do cannabis. Mas Pepe encara com naturalidade, não cansa de frisar que esse é um “projeto vanguarda”: “Quando as pessoas não conhecem, a primeira coisa que fazem é criar expectativa, mas as pessoas não medem as consequências de

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iLUSTRAÇÃO - Daniela da Silva

Por trás do olhar singelo e acolhedor de um ex-presidente sem muita presunção, o título de homem ovacionado estarem continuando em uma política que faz 100 anos que a humanidade aplica, e está multiplicando a quantidade de preços, o grau de violência e não detêm o vício”, defendeu Pepe, ainda na entrevista ao Canal Livre, da Rede Bandeirantes.

Mujica, o ex presidente Trinta anos após a experiência de militância e perseguição do governo, no dia 29 de novembro de 2009 Mujica, candidato pelo partido Frente Ampla, é eleito presidente do Uruguai. Quatro anos depois, em 1º de março de 2015, Mujica deixa o cargo, e caminha ao encontro de um desfiladeiro de cidadãos saudosistas. Eles desejam tocar

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sua mão e lhe abraçar. Em meio à multidão, as pessoas carregam cartazes, entre eles alguns se destacam. As escritas clamam para que Mujica se candidate novamente. O mais curioso? Essas bandeiras trazem também outras nacionalidades que não a uruguaia. São chilenos, argentinos e até mesmo brasileiros, e eles querem Mujica para presidente. O político singular, de cotidiano habitual, gostos comuns e aparência acolhedora, mostra uma simplicidade costumeira, mantida e revelada, através de uma rotina humilde, mesmo que ancorada pelo ar presidencial. Pepe, José ou Mujica, como preferir. Ele foi o presidente que colocou o pequeno, em termos

de território, Uruguai, no mapa da América Latina, quiçá do mundo. E, se olharmos pelo lado direito ou pelo lado esquerdo de nossos ombros, descobriremos, para o bem ou para o mal, que Mujica foi um presidente atípico. Reacendeu chamas da resistência latino-americana ao bater de frente com grandes corporações norte americanas, a exemplo da luta contra os abusos da empresa de tabaco Philip Morris, em que Mujica enrijeceu as leis do consumo de cigarro no país; ao apoiar a causa ambiental, incentivando no congresso Rio+20 de 2012, a reciclagem de materiais, como opção contra o consumo desenfreado das populações;

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e na busca pela diminuição da pobreza, apoiando-se em políticas de redistribuição da riqueza nacional. Quebrou paradigmas centenários da política mundial, que eram embasados por visões arcaicas e anacrônicas de partidos políticos. Desalinhou camadas conservadoras da sociedade, através da legalização da maconha, da legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo e da legalização do aborto. Ele é um político unilateral. Seu nome e seu legado no Uruguai se tornaram um símbolo. E, agora, o mundo está com fome de liberdade e de transformação. É uma larica danada, pós Mujica.


Guilherme Rachelle

ARTIGO

Investir para refletir Políticas públicas municipais de fomento à produção independente ampliam chances de mercado para artistas regionais e aumentam opções de conteúdo independente Guilherme Rachelle

Q

uando criança, ouvia muito a frase “formar uma família”. Logo imaginava um casal, homem mais mulher, um filho ou dois, e pronto. Era esse o meu conceito de família. Hoje mudou. Entendo família como pessoas que moram juntas. Escolhem e ponto. Isso para mim, é claro, mas e pela lei o que é uma família? É o fruto de uma “união estável”, entre um homem e uma mulher. Desde fevereiro deste ano, Eduardo Cunha, deputado federal pelo PMDB do Rio de Janeiro, preside a Câmara dos Deputados. Logo que assumiu, o deputado tratou de criar uma comissão especial para que a tramitação do projeto que reconhece como família apenas núcleos formados por um homem e uma mulher fosse acelerada. A proposta tinha vindo da bancada evangélica, criada pelo deputado federal de Pernambuco Anderson Ferreira, do PR. Esse estatuto veda adoção de crianças por casais gays, prega a valorização

da família e prevê, ainda, que as escolas divulguem relatórios anuais que especifiquem a “relação dos escolares com as suas famílias”. Loucura? Não. O deputado disse que não inventou um novo formato de família e que apenas reproduziu o conceito que está na Constituição Federal de 1988. Em entrevista ao programa Roda Viva da TV Cultura, o presidente admitiu considerar errado que casais homossexuais possam adotar uma criança e não respondeu se sua posição seria um retrocesso para a sociedade brasileira. Disse que é contra, e acha que não é a melhor maneira. “Sou a favor de uma educação mais ‘igualitária’, não acho correta a adoção por homossexuais”, afirma. Podemos conceituar a adoção como sendo um ato jurídico solene pelo qual se estabelece um vínculo de paternidade e filiação entre o(s) adotante(s) e adotado,

independentemente de qualquer relação natural ou biológica de ambos. Em maio de 2011, por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a união estável entre pessoas do mesmo sexo. Sendo assim, casais homossexuais podem adotar, visto que a adoção já não é mais tida, pelos orgãos reguladores, como um contrato de simplesmente inserir uma criança na família. O vínculo afetivo é o que importa nesse ato. No que tange aos casais homoafetivos, o princípio da igualdade é aplicado, e se existe afetividade, reconhecida pela lei, tendo em vista que a liberdade da sexualidade é elemento integrante e próprio do ser humano. Nestes termos, um ambiente familiar saudável e equilibrado não se relaciona com a orientação sexual do adotante. Também a vinculação da orientação sexual do adotante para o deferimento da adoção por casais homoafetivos

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é inconstitucional, ferindo o princípio da igualdade, artigo 5º de nossa constituição. Diante do exposto, não há como impedir que os casais homoafetivos adotem conjuntamente uma criança e adolescente, visto que a jurisprudência brasileira vem demonstrando que os homoafetivos possuem direitos em seu favor, com base nos princípios da dignidade humana. Entre os vários obstáculos que os homossexuais passam, estão o preconceito e a discriminação que ferem a identidade e dignidade desta minoria. Preconceito que Igreja, sociedade e políticos fortalecem. A adoção por homoafetivos também é julgada pela visão preconceituosa da sociedade. Sociedade esta que não nega somente o direito de união dos homossexuais e de adotarem filhos, mas os torna invisíveis e doentes negandolhes o respeito e os direitos fundamentais de viverem do seu jeito. Página 27


REPORTAGEM

Confiança não acompanhou a evolução do processo eleitoral brasileiro Janquieli Ceruti

A

em termos de segurança e genuinidade do que é divulgado pela Justiça Eleitoral. Também na última eleição, onde a presidenta Dilma Rousseff foi reeleita e venceu o candidato Aécio Neves em um dos pleitos mais acirrados da história, celebrou-se 18 anos de implantação da urna eletrônica no Brasil. Naquele 5 de outubro de 2014, cerca de 141 milhões de eleitores foram as 530 mil urnas e mantiveram o recorde mundial de maior eleição informatizada do mundo. Ainda para este país, estão voltados os olhares de maior admiração das lideranças políticas mundiais em função Janquieli Ceruti

controvérsia quanto ao resultado das eleições acompanha a história política brasileira. Seja um pleito municipal, estadual ou nacional, em cédula de papel, com teclas ou tendo as impressões digitais como comprovante, a insegurança em relação à veracidade da computação dos votos está presente. Da primeira eleição municipal totalmente informatizada da América Latina, que aconteceu em Xaxim, no ano de 1995, na escolha de prefeito e vereadores, atéa verificação biométrica, que foi utilizada em muitas localidades na votação do ano passado, muito se evoluiu

da credibilidade do resultado. “O processo, que garante maior transparência eleitoral, tem como grande qualidade a eliminação da mediação dos homens”, salienta o chefe de Cartório Eleitoral de Xaxim, Marcos Vieira. Para acompanhar a evolução tecnológica e aumentar a confiança dos eleitores e candidatos, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vem apresentando avanços, tendo como último deles a biometria. O modelo automático e individual, que é utilizado nas eleições governamentais, reconhece o eleitor pelas impressões digitais. “Todo sistema biométrico é preparado para reconhecer, verificar ou identificar uma pessoa que foi previamente cadastrada”, consta no site do órgão. O recadastramento é gradual e, conforme Vieira, deverá chegar a Xaxim até as eleições do ano que vem. “A ResoluçãoTSE, de número 23.335/2011, estabelece a gradativa inserção de todos os eleitores no sistema biométrico. Aos poucos esta será a realidade em todo o País e, pelo ponto avançado em que estamos, acredito que seja a realidade do próximo pleito municipal xaxinense.” Ele lembra que até julho do ano passado, aproximados 23 milhões de eleitores foram cadastrados no novo sistema.

Xaxinense inaugura o voto eletrônico Não foi na época de Vieira, e sim na gestão do juiz Artur Jenichen Filho que os munícipes de Xaxim tiveram acesso ao primeiro método eletrônico de votação e, inclusive, foram pioneiros neste tipo de eleição. O mais célebre e noticiado deles em todo o território nacional foi o farmacêutico José Mélo que foi o primeiro a computar o voto eletrônico. Mélo poderia até não Página 28

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ter dimensão da notoriedade do ato, mas inaugurou em Xaxim o primeiro pleito totalmente informatizado da América Latina. “Foi uma emoção, senti que agora sim, de verdade, meu voto estaria correto ao final da apuração. É inesquecível, foi um grande avanço para todos”, salienta ele. No ano seguinte, 32 milhões de brasileiros votaram naquela máquina que, na época, ainda gerava estranhamento. Esse grupo representou cerca de um terço do eleitorado nacional e utilizou mais de 70 mil urnas desenvolvidas para aquele pleito. Finalmente, a aspiração que já constava no primeiro Código Eleitoral, de 1932, foi materializada. A máquina de votar que assegura o sigilo do voto não emocionou somente a Mélo, mas também ao candidato vencedor da época. Edemar Matiello, do PMDB, foi o primeiro prefeito eleito numa eleição municipal desenvolvida massivamente com o uso da urna eletrônica. “Todos queriam saber como era a máquina que mostrava a foto do candidato e orientações de como seguir com o voto. As pessoas aprenderam rápido com os testes feitos pela Justiça Eleitoral e, no dia da eleição, o resultado saiu após 39 minutos”, lembra o eleito. Como visto, os avanços na operacionalização das eleições brasileiras deram grandes passos na história. Com a evolução da democracia, a prática de fraudes tornou-se cada vez mais distante. Aos pesquisadores, duas falhas estariam entre as brechas do sistema político brasileiro: a possibilidade de desvio eletrônico de votos, já que uma segunda contagem não pode ser feita, e a especulação sobre a vulnerabilidade do voto secreto, tendo em vista que o local onde o número do título é transcrito é associado à urna.


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