na Camilo
er ontigo... ‌ Poemas de Natal ‘14
Título: Ler contigo poemas de Natal! Capa: logo do projeto “Ler contigo!” Seleção de poemas, ilustração, fotografia e montagem: Adelaide Jordão (PB) Ano Letivo: 2014/2015 Biblioteca da Escola Secundária/3 Camilo Castelo Branco / ESCCBVR Vila Real Dezembro 2014
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“Para viver com autonomia, com plena consciência de si próprio e dos outros, para poder tomar decisões face à complexidade do mundo actual, para exercer uma cidadania activa, é indispensável dominar a leitura. Determinante no desenvolvimento cognitivo, na formação do juízo crítico, no acesso à informação, na expressão, no enriquecimento cultural e em tantos outros domínios, é encarada como uma competência básica que todos os indivíduos devem adquirir para poderem aprender, trabalhar e realizar-se no mundo contemporâneo.” Plano Nacional de Leitura / PNL
Projeto Ler Contigo! Promover a competência leitora e os hábitos de leitura, criando atividades e projetos de treino e melhoria das capacidades associadas à leitura, constitui um dos objetivos nucleares do domínio B - Leitura e literacia - do Plano Anual de Atividades da Biblioteca Escolar. Um dos projetos propostos pela Biblioteca da Escolar Secundária/3 Camilo Castelo Branco, Vila Real, inserido no projeto Ler+ na Camilo para o ano lectivo de 2014/15, dá pelo nome de Ler contigo! e prevê a dinamização de atividades livres de leitura. Trata-se da criação de um grupo de voluntários de leitura, constituído por alunos do Ensino Secundário, que irão ler regularmente para os mais jovens, em contexto de aula e/ou na biblioteca. Este projecto teve a sua peimeira edição em Dezembro: “Ler contigo poemas de Natal!”.
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NOITE DE NATAL Em a noite de Natal Alegram-se os pequenitos; Pois sabem que o bom Jesus Costuma dar-lhes bonitos. Vão se deitar os lindinhos Mas nem dormem de contentes E somente às dez horas Adormecem inocentes. Perguntam logo à criada Quando acorde de manhã Se Jesus lhes não deu nada. – Deu-lhes sim, muitos bonitos. – Queremo-nos já levantar Respondem os pequenitos. Mário de Sá-Carneiro
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HISTÓRIA ANTIGA Era uma vez, lá na Judeia, um rei. Feio bicho, de resto: Uma cara de burro sem cabresto E duas grandes tranças. A gente olhava, reparava e via Que naquela figura não havia Olhos de quem gosta de crianças. E, na verdade, assim acontecia. Porque um dia, O malvado, Só por ter o poder de quem é rei Por não ter coração, Sem mais nem menos, Mandou matar quantos eram pequenos Nas cidades e aldeias da nação. Mas, por acaso ou milagre, aconteceu Que, num burrinho pela areia fora, Fugiu Daquelas mãos de sangue um pequenito Que o vivo sol da vida acarinhou; E bastou Esse palmo de sonho
Para encher este mundo de alegria; Para crescer, ser Deus; E meter no inferno o tal das tranças, Só porque ele não gostava de crianças. Miguel Torga 5
HINO DE AMOR Andava um dia Em pequenino Nos arredores De Nazaré, Em companhia De São José, O bom Jesus, O Deus Menino. Eis senão quando Vê num silvado Andar piando Arrepiado E esvoaçando Um rouxinol, Que uma serpente De olhar de luz Resplandecente Como a do Sol, E penetrante Como diamante, Tinha atraído, Tinha encantado.
Jesus caminha No seu passeio, E a avezinha Continuando No seu gorjeio Enquanto o via; De vez em quando Lá lhe passava À dianteira E mal poisava, Não afroixava Nem repetia, Que redobrava De melodia!
Jesus, doído Do desgraçado Do passarinho, Sai do caminho, Corre apressado, Quebra o encanto, Foge a serpente, E de repente O pobrezinho, Salvo e contente, Rompe num canto Tão requebrado, Ou antes pranto Tão soluçado, Tão repassado De gratidão, De uma alegria, Uma expansão, Uma veemência, Uma expressão, Uma cadência, Que comovia O coração!
Em pequenino (Era já certo) Ela lá estava A pobre ave Cantando o hino Terno e suave Do seu amor Ao Salvador! João de Deus
Assim foi indo E foi seguindo. De tal maneira, Que noite e dia Numa palmeira, Que havia perto Donde morava Nosso Senhor http://pescadordeaves.blogspot.pt/2014/06/rouxinolgrande-dos-canicos.html
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ROSAS DE INVERNO Corolas, que floristes Ao sol do inverno, avaro, Tão glácido e tão claro Por estas manhãs tristes. Gloriosa floração, Surdida, por engano, No agonizar do ano, Tão fora da estação! Sorrindo-vos amigas, Nos ásperos caminhos, Aos olhos dos velhinhos, Às almas das mendigas! Desse Natal de inválidos Transmito-vos a bênção, Com que vos recompensam Os seus sorrisos pálidos. Camilo Pessanha
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CHOVE. É DIA DE NATAL
Chove. É dia de Natal. Lá para o Norte é melhor: Há a neve que faz mal, E o frio que ainda é pior. E toda a gente é contente Porque é dia de o ficar. Chove no Natal presente. Antes isso que nevar. Pois apesar de ser esse O Natal da convenção, Quando o corpo me arrefece Tenho o frio e Natal não. Deixo sentir a quem quadra E o Natal a quem o fez, Pois se escrevo ainda outra quadra Fico gelado dos pés. Fernando Pessoa 8
NÃO DIGO DO NATAL – DIGO DA NATA Não digo do Natal – digo da nata do tempo que se coalha com o frio e nos fica branquíssima e exata nas mãos que não sabem de que cio nasceu esta semente; mas que invade esses tempos relíquidos e pardos e faz assim que o coração se agrade de terrenos de pedras e de cardos por dezembros cobertos. Só então é que descobre dias de brancura esta nova pupila, outra visão, e as cores da terra são feroz loucura moídas numa só, e feitas pão com que a vida resiste, e anda, e dura. Pedro Tamen
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NATAL Acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia. Era gente a correr pela música acima. Uma onda uma festa. Palavras a saltar. Eram carpas ou mãos. Um soluço uma rima. Guitarras guitarras. Ou talvez mar. E acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia. Na tua boca. No teu rosto. No teu corpo acontecia. No teu ritmo nos teus ritos. No teu sono nos teus gestos. (Liturgia liturgia). Nos teus gritos. Nos teus olhos quase aflitos. E nos silêncios infinitos. Na tua noite e no teu dia. No teu sol acontecia. Era um sopro. Era um salmo. (Nostalgia nostalgia). Todo o tempo num só tempo: andamento de poesia. Era um susto. Ou sobressalto. E acontecia. Na cidade lavada pela chuva. Em cada curva acontecia. E em cada acaso. Como um pouco de água turva na cidade agitada pelo vento. Natal Natal (diziam). E acontecia. Como se fosse na palavra a rosa brava acontecia. E era Dezembro que floria. Era um vulcão. E no teu corpo a flor e a lava. E era na lava a rosa e a palavra. Todo o tempo num só tempo: nascimento de poesia. Manuel Alegre 10
NATAL CHIQUE Percorro o dia, que esmorece Nas ruas cheias de rumor; Minha alma vã desaparece Na muita pressa e pouco amor. Hoje é Natal. Comprei um anjo, Dos que anunciam no jornal; Mas houve um etéreo desarranjo E o efeito em casa saiu mal. Valeu-me um príncipe esfarrapado A quem dão coroas no meio disto, Um moço doente, desanimado… Só esse pobre me pareceu Cristo. Vitorino Nemésio
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OS PASTORES Guardavam certos pastores seus rebanhos, ao relento, sobre os céus consoladores pondo a vista e o pensamento. Quando viram que descia, cheio de glória fulgente, um anjo do céu do Oriente, que era mais claro que o dia. Jamais os cegara assim luz do meio-dia ou manhã. Dir-se-ia o audaz Serafim, que um dia venceu Satã.
Num berço, o filho real, não o vereis reclinado. Vê-lo-eis pobre e enfaixado, sobre as palhas de um curral! Segui dos astros a esteira. Levai pombas, ramos, palmas, ao que traz uma joeira das estrelas e das almas!» Foi-se o anjo: e nas neblinas, então celestes legiões soltam místicas canções, sobre violas divinas.
Cheios de assombro e terror, rolaram na erva rasteira. – Mas ele, com voz fagueira, lhes diz, com suave amor:
Erguem-se, enfim, os pastores e vão caminhos dalém, com palmas, rolas, e flores, cordeiros, até Belém.
«Erguei-vos, simples, daí, humildes peitos da aldeia! Nasceu o vosso Rabi, que é Cristo – na Galileia!
E exclamavam indo a andar: – «Vamos ver o vinhateiro! Ver o que sabe lavrar nas nuvens, ver o Ceifeiro!
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Vamos beijar os pés nus do que semeia nos céus. Ver esse pastor que é Deus – e traz cajado de luz!» Chegando ao presépio, enfim, caem, de rojo, os pastores, vendo o herdeiro d’Eloim que veste os lírios e as flores. Dão-lhe pombas gloriosas, meigos, tenros animais. – Mas, vendo coisas radiosas, casos vindouros, fatais… Abria o deus das crianças uns olhos profundos, graves, no meio das pombas mansas – nas palpitações das aves. Gomes Leal
NATAL Se considero o triste abatimento Em que me faz jazer minha desgraça, A desesperação me despedaça, No mesmo instante, o frágil sofrimento. Mas súbito me diz o pensamento, Para aplacar-me a dor que me traspassa, Que Este que trouxe ao mundo a Lei da Graça, Teve num vil presepe o nascimento. Vejo na palha o Redentor chorando, Ao lado a Mãe, prostrados os pastores, A milagrosa estrela os reis guiando. Vejo-O morrer depois, ó pecadores, Por nós, e fecho os olhos, adorando Os castigos do Céu como favores. Manuel Maria Barbosa du Bocage
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NATAL Turvou-se de penumbra o dia cedo; Nem o sol apertou no meu beiral! Que longas horas de Jesus! Natal… E o cepo a arder nas cinzas do brasedo… E o lar da casa, os corações aos dobres, É um painel a fogo em seu costume! Que lindos versos bíblicos, ao lume, P' lo doce Príncipe cristão dos pobres! Fulvas figuras pra esculpir em barro: À luz da lenha, em rubro tom bizarro, Sou em Presépio com meus pais e irmãos E junto às brasas, os meus olhos postos Nesta evangélica expressão de rostos, Ergo em graças a Deus as minhas mãos. Afonso Duarte
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NATAL DIVINO Natal divino ao rés-do-chão humano, Sem um anjo a cantar a cada ouvido. Encolhido À lareira, Ao que pergunto Respondo Com as achas que vou pondo Na fogueira. O mito apenas velado Como um cadáver Familiar… E neve, neve, a caiar De triste melancolia Os caminhos onde um dia Vi os Magos galopar…
Inverno, de Pieter Bruege
Miguel Torga
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PRELÚDIO DE NATAL Tudo principiava pela cúmplice neblina que vinha perfumada de lenha e tangerinas Só depois se rasgava a primeira cortina E dispersa e dourada no palco das vitrinas a festa começava entre odor a resina e gosto a noz-moscada e vozes femininas A cidade ficava sob a luz vespertina pelas montras cercada de paisagens alpinas David Mourão-Ferreira 16
Nos são tão pesados Como há dois mil anos. A nossa ignorância É um fardo que arde. Como se faz tarde Para a nossa ânsia!
PRECE DO NATAL
Nós somos da Terra, Coisa fria e dura. Olhai a amargura Que esse olhar encerra.
Menino Jesus De novo nascido, Baixai o sentido Para a nossa cruz!
Colai o ouvido À alma que sofre; Abri esse cofre Do sonho escondido.
Vede que os humanos Erros e cuidados
Pegai nessa mão Que treme de medo; Sondai o segredo Da minha oração.
Nos são tão pesados Como há dois mil anos.
! Vede que os humanos Erros e cuidados
Esta pobre gente 17
Da minha oração.
Que mal é que fez? Nós somos, talvez, Um povo «inocente»… Menino Jesus Que andais distraído Baixai o sentido Para a nossa cruz! A mais insofrida De tantas misérias – Não termos mais férias Ao longo da vida – Trocai por amenas Manhãs sem cuidados, Silêncios banhados De ideias serenas; Por cantos e flores Risonhas imagens Macias paisagens Felizes amores! Carlos Queirós
NATAL DE 1971 Natal de quê? De quem? Daqueles que o não têm? Dos que não são cristãos? O de quem traz às costas as cinzas de milhões? Natal de paz agora nesta terra de sangue? Natal de liberdade num mundo de oprimidos? Natal de uma justiça roubada sempre a todos? Natal de ser-se igual em ser-se concebido,
em de um ventre nascer-se, em por amor sofrer-se, em de morte morrer-se, e de ser-se esquecido? Natal de caridade, quando a fome ainda mata? Natal de qual esperança num mundo todo de bombas? Natal de honesta fé, com gente que é traição, vil ódio, mesquinhez, e até Natal de amor? 18
Natal de quê? De quem? Daqueles que o não têm, ou dos que olhando ao longe sonham de humana vida um mundo que não há? Ou dos que torturam e torturados são na crença de que os homens devem estender-se a mão? Jorge de Sena
NATAL DAS ILHAS Natal da Ilhas. Aonde O prato de trigo novo, A camélia imaculada, O gosto no pão do povo? Olho, já não vejo nada,. Chamo, ninguém me responde Natal da Ilhas. Serão Ilhas de gente sem telha, Jesus nascido no chão Sobre alguma colcha velha?
Presépio tradicional dos Açores (https://ahistorianacidade.files.wordpress.com/2010/12/presepio-ac3a7oreano2.jpg)
Burra de cigano às palhas, Vaca com língua de pneu, Presépio girando em calhas como e eléctrico, tu e eu. Natal das Ilhas. Já brilha Nas ondas do mar de inverno O menino bem lembrado, Que trouxe da sua ilha O gosto do peixe eterno Em perdão do seu passado. Vitorino Nemésio 19
Presépio do Museu Carlos Machado, Açores (http://azores.gov.pt/NR/rdonlyres/5F2B1733-538E-46E3-A503-3A0BA6999B77/574187/7930.jpg)
FALAVAM-ME DE AMOR Quando um ramo de doze badaladas se espalhava nos móveis e tu vinhas solstício de mel pelas escadas de um sentimento com nozes e com pinhas, menino eras de lenha e crepitavas porque do fogo o nome antigo tinhas e em sua eternidade colocavas o que a infância pedia às andorinhas. Depois nas folhas secas te envolvias de trezentos e muitos lerdos dias e eras um sol na sombra flagelado. https://grijo.files.wordpress.com/2009/12/lareira-natal1.jpg
O fel que por nós bebes te liberta e no manso natal que te conserta só tu ficaste a ti acostumado Natália Correia 20
EU QUERIA SER PAI NATAL
Eu queria ser Pai Natal E ter carro com renas Para pousar nos telhados Mesmo ao pé das antenas. Descia com o meu saco Ao longo da chaminé, Carregado de brinquedos E roupas, pé ante pé. Em cada casa trocava Um sonho por um presente Que profissão mais bonita Fazer a gente contente! Luísa Ducla Soares
http://desenhos.abccriancas.com/Imagens/pai-natal-a-dar-presentes.jpg
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NATAL À BEIRA-RIO É o braço do abeto a bater na vidraça? E o ponteiro pequeno a caminho da meta! Cala-te, vento velho! É o Natal que passa, A trazer-me da água a infância ressurrecta. Da casa onde nasci via-se perto o rio. Tão novos os meus Pais, tão novos no passado! E o Menino nascia a bordo de um navio Que ficava, no cais, à noite iluminado... Ó noite de Natal, que travo a maresia! Depois fui não sei quem que se perdeu na terra. E quanto mais na terra a terra me envolvia E quanto mais na terra fazia o norte de quem erra. Vem tu, Poesia, vem, agora conduzir-me À beira desse cais onde Jesus nascia... Serei dos que afinal, errando em terra firme, Precisam de Jesus, de Mar, ou de Poesia? David Mourão-Ferreira
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NATAL, E NÃO DEZEMBRO Entremos, apressados, friorentos, num gruta, no bojo de um navio, num presépio, num prédio, num presídio, no prédio que amanhã for demolido... Entremos, inseguros, mas entremos. Entremos, e depressa, em qualquer sítio, porque esta noite chama-se Dezembro, porque sofremos, porque temos frio. Entremos, dois a dois: somos duzentos, duzentos mil, doze milhões de nada. Procuremos o rastro de uma casa, a cave, a gruta, o sulco de uma nave... Entremos, despojados, mas entremos. Das mãos dadas talvez o fogo nasça, talvez seja Natal e não Dezembro, talvez universal a consoada. David Mourão-Ferreira
http://recursosdoeducanaweb.blogspot.pt/2011/12/poema-de-natal.html
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A ABSTRAÇÃO NÃO PRECISA DE MÃE NEM PAI A abstração não precisa de mãe nem pai nem tão pouco de tão tolo infante
um de joelhos outro em pé e o rei preto vinha sentado no
mas o natal de minha mãe é ainda o meu natal com restos de Beira Alta
camelo. Era o mais bonito. depois eram filhoses o acordar de prenda no
ano após ano via surgir figura nova nesse presépio de vaca burro banda de música
sapato tudo tão real como o abrir das lojas no dia de feira
ribeiro com patos farrapos de algodão muito musgo percorrido por ovelhas e pastores
e eu ia ao Sanguinhal visitar a minha prima que tinha um cavalo debaixo do quarto
multidão de gente judaizante estremenha pela mão de meu pai descendo de montes contando
subindo de vales descendo de montes acompanhando a banda do Carvalhal com ferrinhos
moedas azenhas movendo água levada pela estrela de Belém
e roucas trompas o meu Natal é ainda o Natal de minha mãe com uns restos de canela e Beira Alta. João Miguel Fernandes
um galo bate as asas um frade está de acordo com a nossa circuncisão galinhas debicam milho de mistura com um porco a que minha avó juntava sempre um gato para dar sorte era preto assim íamos todos naquela figuração animada até ao dia de Reis aí estão
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https://sites.google.com/site/ceramicasdealmoster/presepios-tradicionais-portuguese
POEMA DE NATAL Natal... Na província neva. Nos lares aconchegados, Um sentimento conserva Os sentimentos passados. Coração oposto ao mundo, Como a família é verdade! Meu pensamento é profundo, Estou só e sonho saudade. E como é branca de graça A paisagem que não sei, Vista de trás da vidraça Do lar que nunca terei! Fernando Pessoa
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DIA DE NATAL Hoje é dia de Natal Mas o menino Jesus Nem sequer tem uma cama, Dorme na palha onde o pus. Recebi cinco brinquedos Mais um casaco comprido. Pobre menino Jesus, Faz anos e está despido. Comi bacalhau e bolos, Peru, pinhões e pudim. Só ele não comeu nada Do que me deram a mim. Os reis de longe trazem Tesouros, incenso e mirra. Se me dessem tais presentes, Eu cá fazia uma birra. Às escondidas de todos Vou pegar-lhe pela mão E sentá-lo no meu colo Para ver televisão. Luísa Ducla Soares 26
O NATAL NÃO É ORNAMENTO: É FERMENTO
O Natal não é ornamento: é fermento É um impulso divino que irrompe pelo interior da história Uma expectativa de semente lançada Um alvoroço que nos acorda para a dicção surpreendente que Deus faz da nossa humanidade O Natal não é ornamento: é fermento Dentro de nós recria, amplia, expande
Entre a noite e o dia Entre a tarefa e o dom Entre o nosso conhecimento e o nosso desejo Entre a palavra e o silêncio que buscamos Uma estrela nos guiará O Natal não é ornamento. Tolentino de Mendonça
O Natal não se confunde com o tráfico sonolento dos símbolos nem se deixa aprisionar ao consumismo sonoro de ocasião A simplicidade que nos propõe não é o simplismo ágil das frases-feitas Os gestos que melhor o desenham não são os da coreografia previsível das convenções O Natal não é ornamento: é movimento Teremos sempre de caminhar para o encontrar!
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NATAL No ermo agreste, da noite e do presepe, um hino De esperança pressaga enchia o céu, com o vento... As árvores: “Serás o sol e o orvalho!” E o armento: “Terás a glória!” E o luar: “Vencerás o destino!” E E E E
o a a o
pão: “Darás o pão da terra e o pão divino!” água: “Trarás alívio ao mártir e ao sedento!” palha: “Dobrarás a cerviz do opulento!” teto: “Elevarás do opróbrio o pequenino!”
E os reis: “Rei, no teu reino, entrarás entre Palmas!” E os pastores: “Pastor, chamarás os eleitos!” E a estrela: “Brilharás, como Deus, sobre as almas!”
https://planetalgarve.files.wordpress.com/2013/11/presepio.jpg
Muda e humilde, porém, Maria, como escrava, Tinha os olhos na terra em lágrimas desfeitos: Sendo pobre, temia; e, sendo mãe, chorava. Olavo Bilac
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POEMA DE NATAL Para isso fomos feitos: Para lembrar e ser lembrados Para chorar e fazer chorar Para enterrar os nossos mortos Por isso temos braços longos para os adeuses Mãos para colher o que foi dado Dedos para cavar a terra.
Um verso, talvez, de amor Uma prece por quem se vai – Mas que essa hora não esqueça E por ela os nossos corações Se deixem, graves e simples. Pois para isso fomos feitos: Para a esperança no milagre Para a participação da poesia Para ver a face da morte De repente nunca mais esperaremos... Hoje a noite é jovem; da morte, apenas Nascemos, imensamente.
Assim será a nossa vida: Uma tarde sempre a esquecer Uma estrela a se apagar na treva Um caminho entre dois túmulos Por isso precisamos velar Falar baixo, pisar leve, ver A noite dormir em silêncio.
Vinicius de Moraes
Não há muito que dizer: Uma canção sobre um berço
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