CENTRO UNIVERSITÁRIO BELAS ARTES DE SÃO PAULO BACHARELADO EM ARTES VISUAIS: PINTURA, ESCULTURA E GRAVURA
Adriana Amaral dos Santos
O JARDIM DAS PEQUENAS MONUMENTALIDADES: APROPRIAÇÃO, DESLOCAMENTO E (RE)SIGNIFICAÇÃO
São Paulo 2009
CENTRO UNIVERSITÁRIO BELAS ARTES DE SÃO PAULO BACHARELADO EM ARTES VISUAIS: PINTURA, ESCULTURA E GRAVURA
Adriana Amaral dos Santos
O JARDIM DAS PEQUENAS MONUMENTALIDADES: APROPRIAÇÃO, DESLOCAMENTO E (RE)SIGNIFICAÇÃO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Bacharelado em Artes Visuais: Pintura, Escultura e Gravura do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo como parte dos requisitos para obtenção do grau de Bacharel em Artes Visuais: Pintura, Escultura e Gravura, sob orientação do Prof. Espec. Carlos Augusto do Amaral Sampaio.
São Paulo 2009
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao professor Augusto por compartilhar seu conhecimento em nossas reflexões e por toda sua atenção, disponibilidade e paciência.
RESUMO
Na busca de objetos pela cidade que apresentassem visualmente vestígios de um acúmulo de tempo, a relação dos objetos com o lugar tornou-se fundamental para uma reflexão a partir dos conceitos de apropriação e deslocamento. O espaço urbano apresentou-se como ponto de partida para as minhas indagações envolvendo tempo, memória, espaço/lugar e a (re)significação de elementos corriqueiros a um status que a princípio associo ao caráter de monumentalidade. Deslocar esses objetos para a galeria foi uma estratégia de recriar, ou seja, reconstruir o significado por meio da invenção do lugar. Portanto, ao usufruir dos recursos expositivos a instalação tornou-se o meio para concretização do objeto poético.
Palavras-chave: objeto, espaço, apropriação, deslocamento, (re)significação.
ABSTRACT
Searching the city for objects that could show visual signs of time accumulation, the relation between the objects and the place has become fundamental for a reflection based on the concepts of appropriation and displacement. The urban space was taken as the starting point for my inquiries about time, memory, space/place and (re)signification of common elements to a condition that initially could be associated to the idea of monumental. Displacing those objects to an art gallery has been an strategy of recreation, in other words, reconstruction of sense/significance through space/place invention/fiction. So, the installations have become the way to poetic object realization by making use of expository means. Key words: objects, space, appropriation, displacement, (re)signification.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 7 2. DESENVOLVIMENTO......................................................................................................... 8 2.1 A busca da matéria e a experiência do lugar ........................................................................ 8 2.2 Tempo, matéria e monumentalidade .................................................................................. 12 2.3 “O jardim das pequenas monumentalidades” .................................................................... 15 2.3.1 Memorial descritivo......................................................................................................... 20 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 22 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................... 30 APÊNDICES ............................................................................................................................ 31
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1. INTRODUÇÃO
Este trabalho se apresenta como consequência de uma investigação dentro do campo das artes visuais abordando o espaço urbano como ponto de partida para minhas apropriações, deslocamentos e proposições poéticas que resultaram na construção da instalação: “O jardim das pequenas monumentalidades”. Inicialmente minha intenção era de apropriar-me de objetos que de alguma maneira apresentassem visualmente vestígios de um acúmulo e passagem de tempo que se relacionassem com o espaço urbano. Ou seja, marcas e sinais que vão se aglomerando pelo processo de transformação da própria paisagem urbana criando imagens que se modificam constantemente como se fossem incisões. Essa primeira desconfiança me levou a iniciar a pesquisa pensando nesse caráter transitório da cidade como uma grande matriz em constante transformação e as imagens construídas dessa paisagem como possíveis potencialidades gráficas. Na busca dos objetos dos quais me apropriaria, a relação destes com o espaço apresentou-se com maior intensidade e logo esses espaços começaram a adquirir um caráter de lugar pela relação de tempo e memória que estabeleciam. Seria então necessário me apropriar não apenas dos objetos, mas também das relações com o lugar em que estavam inseridos. A partir desse ponto inicia-se uma reflexão sobre a relação do objeto com o espaço: do espaço enquanto lugar onde se acumulam as memórias e o tempo se tornando ruídos, ou até mesmo silêncio. Na ação de apropriar-me de ambos, objeto e espaço, surge também a necessidade de um deslocamento que se manifesta não apenas em seu aspecto físico, mas também na relação de significado, ou seja, na (re)significação desses elementos para a construção do objeto poético. No processo de desenvolvimento do trabalho pontuo algumas etapas que foram fundamentais, as quais se apresentam nos seguintes capítulos: 2.1 A busca da matéria e a experiência do lugar; 2.2 Tempo, memória e monumentalidade e 2.3 O jardim das pequenas monumentalidades. Apesar de dividir o trabalho nesses três momentos de reflexão eles não são independentes, pelo contrário, eles se entrelaçam. Eles pontuam as indagações, as escolhas, as decisões e as referências de autores e artistas que não se prestam a ilustrar o trabalho, mas a dialogar com minhas reflexões.
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2. DESENVOLVIMENTO “(...) A todos esses sinais de uma idade avançada eles dão o nome se saba, que significa, literalmente, ‘corrosão’. Saba, então, é um desgaste natural da matéria, o fascínio da antiguidade, a marca do tempo, ou pátina. Saba como elemento do belo, corporifica a ligação entre arte e natureza.” Andrei Tarkovski
2.1 A busca da matéria e a experiência do lugar
Sempre me chamou muito a atenção olhar para a cidade e percebê-la como um espaço cheio de potencialidades visuais a partir da ação humana, ou seja, o homem transformando constantemente seu meio. Logo, o espaço urbano como meio torna-se matriz configurando-se suporte dessas ações. Rastros e marcas que vão se acumulando no chão, nas paredes, nas pessoas e nos lugares transformando-se em camadas de sinais gráficos mudando a paisagem. A cidade é posta como símbolo da inovação pelo seu caráter efêmero de absorção das coisas que dá abertura para o novo, como um espaço que se constrói em um tempo que tem como característica a transitoriedade, esse estado de tempo passageiro e de transformação do próprio meio. Nesse contexto os objetos e lugares em estado de desgaste e deterioramento transmitem um aspecto de
inércia e desuso, uma vez que perderam seu referencial de
funcionalidade. A matéria desses objetos e a atmosfera desses lugares remetem a uma idéia de memória, de passagem de tempo que se juntam a uma riqueza de plasticidade e grafismos. Se o meu interesse estava concentrado nesses aspectos precisava então iniciar uma procura por esses elementos, delimitando os lugares que se encontravam no meu percurso e deslocamento pelas imediações e proximidades da cidade de São Paulo. Comecei a visitar os sebos, as lojas de antiguidades e os depósitos de ferro-velho (figs. 1 a 8). A procura desses objetos me possibilitou compreender melhor o aspecto de tempo que eu particularizaria. O tempo enquanto estado de relação com o espaço, se configurando não apenas como uma sucessão de intervalos, mas como qualidade somatória de camadas pelo seu acúmulo, criando no espaço um ambiente particularizado. Uma atmosfera densa, que na sobreposição de infinitas e indefinidas coisas configura um aspecto caótico e ao mesmo tempo inerte. Essas foram as impressões das visitas nesses lugares que colocaram o fator tempo como um estado da matéria em transformação. Uma transformação que ao mesmo tempo compartilhava uma sensação de inércia. Esses lugares parecem estabelecer um tempo, um ritmo diferente em relação à transitoriedade do próprio espaço que ocupam que é a própria
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cidade. Nesse aspecto esses lugares parecem ganhar uma qualidade de eternização do tempo e este parece estar estagnado nesses objetos. A cidade como espaço dos lugares1 que se alojam as memórias vividas e esquecidas, o lugar do instante e do eterno. Cristina Freire (1997) coloca a cidade como campo privilegiado para as investigações estéticas. A cidade como palco e inspiração para uma série de ações em que o artista se apropria tanto dos objetos do cotidiano pelo encontro fortuito, quanto do próprio espaço da cidade como objeto de intervenção tendo como prática suas perambulações. Os artistas dadaístas e surrealistas foram os primeiros a incluir a cidade em seus programas de ação estética, sendo muitos no campo da performance e dos happenings, anos 60/70.
Kurt Schwitters (1887-1948), por exemplo, constrói sua obra
“Merzbau” de 1923-32 por meio de colagens/assemblage a partir da justaposição de objetos e detritos encontrados pela cidade. Essas apropriações da cidade já no início das primeiras décadas do século XX revelavam uma tentativa de resgatar a estranha beleza dos objetos deixados à margem de uma sociedade industrial. Não só esses artistas, mas autores e escritores já no século XIX apontavam para os sintomas da modernidade e seu progresso. O poeta francês Charles Baudelaire (1821-1863), por exemplo, aponta para a aceleração do tempo e a agitação das pessoas nas ruas como condição da modernidade, o efêmero como valorização do novo. O tempo tomava outra dimensão no cotidiano das pessoas, o distanciamento cada vez mais das individualidades sendo diluída na formação das massas. Nesse contexto Baudelaire coloca em muitas de suas obras literárias a necessidade da existência do flâneur2. Com interesses parecidos a esse viajante que deambula pela cidade, lanço um olhar estético na procura de lugares que se colocam ora como ruídos, ora como um silêncio e ora se misturam completamente ao caos da paisagem em que a transformação se dá necessariamente pelo movimento e pela mudança. Buscar nesses lugares objetos que em sua matéria apresentassem marcas de uma passagem de tempo é como se procurasse um tempo que se perde, mas se materializa pelo acúmulo. É como se esses lugares dentro da cidade fossem espaços de retenção do tempo, desse tempo descartado pelo novo.
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Segundo AUGÉ (1994) o lugar se caracteriza pelo seu aspecto identitário, pela troca de relações e seu aspecto histórico. O espaço seria por oposição um não-lugar, porém é no espaço que as relações do lugar acontecem. Por isso no texto ora irei referir-me a espaço, ora a lugar. 2
Flâneur termo que vem do francês que significa aquele que vagueia pela cidade sem nenhum propósito aparente. Charles Baudelaire apropria-se desse termo para definir em suas obras literárias aquele personagem que vagueia pela cidade com um olhar estético que se diferencia do comum. Geralmente é visto como aquele que se põe a margem da sociedade. Esse termo é muito usado nas áreas de humanidades para compreender os fenômenos urbanos modernos.
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A busca pela matéria3 me fez perceber o tempo como condição do espaço/lugar. Esses lugares se colocam como cicatrizes dentro da paisagem, como incisões que revelam marcas de um tempo passado e que se faz presente. Dentre esses espaços/lugares que visitei não posso negar meu interesse pelos depósitos de ferro-velho. Eles transmitem uma atmosfera muito impactante de inércia, de desuso e de descarte. É como se eles fossem um tempo perdido dentro da cidade. Nesse meu maravilhamento por esses lugares me apropriei de três armários de aço (figs. 9 a 11), todos em estado de oxidação, de proliferação de ferrugem, são esses objetos que mais adiante irei confrontar enquanto parte constitutiva do trabalho. Os artistas dos anos 60/70, das vertentes da Land Art, desenvolveram projetos abordando em suas propostas um desencanto pela cultura da tecnologia industrial. Iniciaram uma procura por espaços externos aos museus e galerias para sua produção como resposta a frustração do desenvolvimento dessa cultura. Suas investigações estéticas destinaram-se a busca da paisagem natural como oposição a cidade. A natureza como espaço para seus projetos de intervenção como tentativa de busca da essência. Robert Smithson (1938-1973) foi um dos artistas dessa vertente que em seus projetos colocava em seus sites e non-sites4 fragmentos experimentados da matéria bruta, para o artista “As ferramentas da tecnologia faziam parte de uma geologia da Terra na mediada que submergem de volta ao seu estado original. Máquinas, como dinossauros, têm que retornar ao pó ou à ferrugem.” (SMITHSON, 1968). Ele contrapõe a aceleração das mutações urbanas ao processo lento de sedimentação dos elementos naturais, sendo a terra seu elemento recorrente. Mas o artista também explorou em alguns de seus trabalhos o espaço urbano industrial. Em 1967, publica um mapa de exploração estética a partir de fotografias de lugares banais de Nova York, o trabalho chama-se “Monuments of the Passaic”. Segundo FREIRE (1997) “Os ‘monumentos’ são setores quaisquer da cidade que o artista recorta e eleva a essa categoria ‘nobre’, através de sua operação.”. Isso me fez pensar nesses espaços como pequenos lugares de um tempo condensado, um tempo que se sobrepõe ao outro, que se presentifica, ou seja, que se apresenta, que se manifesta. Esse meu maravilhamento/encanto por esses lugares advêm desse estado da matéria em relação ao meio em que se encontram. O ferro em seu estado de 3
Uso o termo matéria ao referir-me a esses objetos por eles apresentarem em sua aparência material uma qualidade que visualmente remete a própria condição em que se encontram, ou seja, por revelar por meio do próprio material seu estado de desgaste e deterioramento sofridos pela ação do tempo. 4
Robert Smithson em sua produção artística desenvolveu os conceitos de site e non-site estabelecendo uma dialética entre os trabalhos internos e externos às galerias e museus.
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deterioramento como condição para a materialização de um tempo que está se perdendo, “... na mente tecnológica, a ferrugem evoca um medo de desuso, inatividade, entropia e ruína. O porquê de o aço ser valorizado, e a ferrugem não, tem origem em um valor tecnológico e não artístico.” (SMITHSON, 1968). Estar nesses lugares me fez percebê-los como se fossem sítios arqueológicos5, onde nas escavações os monumentos encontrados são os objetos que remetem há um tempo e memória que se perderam na transformação da cidade e que se encontram ali condensados. Eles se apresentam numa mistura de tempo enquanto passagem, enquanto memória de um passado que está presente e que se lança no tempo enquanto condição da própria cidade, de se constituir em sua transitoriedade. Dessa reflexão surge, então, uma vontade não só de registrar esses lugares, mas de apropriar-me desses enquanto pequenas monumentalidades, pois são pequenas existências as quais proponho dar outra dimensão, não em relação à escala, mas em relação ao significado que a eles atribuo. Objetos que estavam a se consumir em seu próprio tempo, pareceu-me relevante atribuir a eles um valor de posteridade.
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Segundo HOUAISS (2001), Sítio arqueológico s.m. (1836 cf. SC) lugar onde se pesquisa e colhe material arqueológico; jazida arqueológica; arqueológico s.m. (1836 cf. SC) 1 relativo à arqueologia e a arqueólogo; (...); arqueologia s.f. (1836 cf. SC) ciência que, utilizando processos como coleta e escavação, estuda os costumes e culturas dos povos antigos através do material (fósseis, artefatos, monumentos, etc.) que restou da vida desses povos; a. industrial (d1951) estudo dos prédios máquinas e equipamentos da revolução industrial e sua descendência tecnológica imediata. (...)
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2.2 Tempo, memória e monumentalidade ... tudo aquilo fazia da igreja para mim, alguma coisa de inteiramente diverso do resto da cidade: um edifício que ocupava, por assim dizer, um espaço de quatro dimensões – a quarta era o Tempo – e impelia através dos séculos sua nave que, de abóbada em abóbada, de capela em capela, parecia vencer e transpor não simplesmente alguns metros, mas épocas sucessivas de onde saía triunfante...” Marcel Proust
Monumentalidade intrinsecamente está associada à idéia de tempo e memória acompanhada de uma eloqüência/grandiosidade. As construções arquitetônicas e as esculturas das antigas civilizações tinham por natureza esse caráter. Queriam passar para posteridade toda sua opulência. O caráter de monumentalidade está relacionado à sua escala em relação ao espaço e seu significado. Essas construções monumentais condensaram um tempo, uma memória do lugar, ou seja, de uma época. Esse caráter é o que transforma uma obra, ou uma construção arquitetônica em monumento. A origem da palavra monumento vem do latim monere, que significa fazer lembrar, etimologicamente leva ao mausoléu6, palavras que compartilham de sentidos muito parecidos. Para FREIRE (1997), “... o sentido de monumento liga-se desde sua origem a uma relação entre morte e maravilhamento, o que também pode ser atribuído aos museus.”. Essa relação de morte e maravilhamento também assume um sentido de contemplação, enquanto qualidade de apreensão do olhar. Contemplação do que se foi e maravilhamento diante do novo. Tanto os monumentos quanto os museus preservam uma memória, eternizam um tempo que se foi. Mas esse eterno não pode vir antes de sua morte, é pela morte de um tempo que se contempla o objeto, esse é o maravilhamento. Na metrópole contemporânea seus monumentos se apresentam de diferentes maneiras. E nem sempre pelo caráter monumental relacionado à escala, pois nem sempre são percebidos, nem sempre ganham notoriedade dentro da paisagem urbana contemporânea. Independente da notoriedade que toda monumentalidade se serve, eles estão imersos na cidade, mas nem sempre se fazem presentes. Percebê-los está mais relacionado ao quanto sua presença significa ao estabelecer uma relação de sentido com o outro. Parece que cada vez
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Segundo HOUAISS (2001), Mausoléu s.m. (a1569 cf. AFerP) monumento funerário, ger. Imponente ou de dimensões avantajadas, que abriga os despojos de um ou vários membros de uma mesma família; ETIM Gr. mausoleion, ou ‘túmulo de Mausolo’, conhecido como mausoléu de Halicarnasso’, pelo lati. mausoleum (...), o túmulo de Mausolo, conhecido como mausoléu de Halicarnasso, foi considerado uma das sete maravilhas do Mundo Antigo; (...).
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mais uma das características do espaço urbano é o esquecimento, o descarte do tempo, da história, da memória do lugar, ou seja, o progresso enquanto descarte para valorização do novo. Porém, a monumentalidade desses lugares que proponho se encontra no lançar de uma percepção particular de dar importância a esses lugares da cidade. Um gesto de evidenciar as escavações desses sítios arqueológicos, como camadas de sedimentos de um tempo que se materializa não apenas pelas relações físicas, químicas, climáticas ou geográficas, mas também pelas relações subjetivas com o espaço na transformação do lugar. Os artistas da Land Art como já mencionados colocaram isso em discussão buscando lugares afastados da cidade. Nessa busca do elementar, a origem na própria natureza, o que realizaram em sua maioria foram projetos de caráter essencialmente monumentais, porém, efêmeros. A fotografia como registro dessas obras, foi o recurso que de certa maneira manteve o caráter de eterno para muitos desses trabalhos sendo apresentados dentro de museus e galerias. Lançar um olhar para essas questões dentro da própria cidade é perceber nesses objetos em situação de descarte um caráter de origem da matéria pelo seu estado de deterioramento, que se torna visível pelo processo de oxidação da matéria. Mas longe de um projeto monumental, a escala que proponho é posta enquanto significado das coisas, enquanto (re)significação7 desses objetos, ou seja, uma maneira de tornar apropriado o caráter de monumentalidade a essas pequenas existências. Outros artistas contemporâneos lançaram mão de questões relacionadas a tempo e memória na construção de outros significados, mas se apropriaram por outras vias. Christian Boltanski (1944) apresenta em seus trabalhos uma relação muito próxima ao sentido de monumento/monumentalidade que venho abordando, pela forma como atribui significado aos objetos e memórias os quais ele se apropria. Apesar das motivações particulares me pareceu muito relevante dialogar e confrontar meu trabalho com a sua poética. Em sua produção destacam-se suas autobiografias imaginárias, o artista se apropria de álbuns de famílias de amigos e estranhos e cria em suas instalações um ambiente
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O termo (re)significação abrange algumas áreas de conhecimento específico como a semiótica e a psicologia. Porém, o sentido que estou abordando está relacionado à história da arte a partir do século XX quando Marcel Duchamp (1887-1968) propõe seus ready-mades (objetos pré-fabricados/ prontos) para dentro da galeria como, por exemplo, a “Fonte”-1917. Quando Duchamp propõe esse deslocamento está questionando o significado do objeto artístico, ou seja, atribuindo a ele um novo significado. Seus trabalhos vão apontar os caminhos da arte conceitual. O que me interesse deste conceito é o deslocamento enquanto atribuição de um novo significado ao objeto.
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em que fatos e ficções se misturam. Além de fotografias o artista também se apropria de objetos com o mesmo intuito, reconstituir histórias a partir de uma organização fictícia (figs. 12 a 14). Ao justapor esses objetos, ele os (re)significa ao organizá-los a partir de um deslocamento do sentido original, inventando muitas vezes uma história pelo recurso da documentação, numa espécie de construção de arquivos. Coloca em contradição o próprio sistema de organização histórico e museológico em que a organização dos elementos deveria levar aos fatos verídicos, mas na verdade constroem uma outra história. Esse gesto do artista de retirar dos objetos e da ação organizadora sua função original dá ao caráter técnico, dessa funcionalidade, um caráter poético. Nesse contexto o que me interessa em sua produção é seu processo de construção relacionada ao modo/gesto apropriar-se de um tempo e de suas memórias. De lançar mão de vestígios que a princípio foram esquecidos pela história, ou nem percebidos, e reconstituir pequenas existências: pessoas/acontecimentos. O artista dá monumentalidade a essas representações, ao evidenciar esses objetos/memórias de um coletivo esquecido, ou seja, descartado. Ele constrói uma narrativa a partir desses materiais, é como se revelasse os inúmeros desconhecidos da história ao reinventá-la. Ele reconstitui as memórias perdidas, ou as que nunca existiram. Esse caráter de apropriação e representação dessas pequenas existências enquanto ficção de seus monumentos me interessa enquanto proposição. Uma estratégia de reorganização de tempo e espaço. O espaço e tempo manipulados, dando abertura para a criação de um espaço fictício. As proposições de Christian Boltanski colaboraram para que eu pensasse nas estratégias que eu poderia me apropriar para lançar mão enquanto proposta poética. Quando lanço a esses lugares um caráter de monumentalidade, estou atribuindo um valor que na verdade é fictício, eu denomino, ou seja, invento esse lugares enquanto monumentalidades para elevar seu status a essa qualidade e consequentemente atribuir um novo significado aos objetos que deles me aproprio.
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2.3 O jardim das pequenas monumentalidades “Li com incompreensão e fervor estas palavras que com minucioso pincel redigira um homem de meu sangue: Deixo aos vários futuros (não a todos) meu jardim de caminhos que se bifurcam.” Jorge Luís Borges
As visitas a esses lugares da cidade, os quais denominei de sítios arqueológicos, e os registros fotográficos tornaram-se parte dos procedimentos para escolha dos objetos que eu me apropriei. Três armários de chapas de aço, material de origem ferrosa, todos em estado de oxidação com suas superfícies contendo inúmeras camadas impregnadas de vestígios de diferentes naturezas. Esses armários apresentam medidas de aproximadamente 195,0 x 65,0 x 75,0 cm cada, os quais serão os elementos constituintes da instalação que proponho dentro de uma galeria, ou dentro de espaços que disponham desse mesmo mecanismo de exposição. Nessa experiência comecei um processo de reflexão sobre como me apropriaria desses objetos8. Não me interessava muito a origem deles enquanto armários, de onde vieram ou para o que eles eram usados. Não era essa memória que me interessava. Interessava-me a memória enquanto elemento de descarte no processo de construção e transformação do espaço urbano. Era mais interessante refletir sobre eles dentro do contexto em que eles se inseriam da atual condição de matéria descartada como algo que pudesse ser reativado, ou seja, (re)significado, a partir da relação com o lugar. Então, antes dos objetos, se iria me apropriar dos três, ou de apenas um armário, seria necessário apropriar-me do lugar em que eles estavam. “O jardim das pequenas monumentalidades” nasce dessa reflexão. Para a sociedade enquanto uso/função esses armários já tinham perdido seu valor diante da cultura contemporânea do novo. Teria, então, que refletir sobre o sentido da ação de apropriar-me desses armários. O termo apropriação designa, genericamente, o ato/ação do qual um sujeito toma posse de algo que lhe não pertencia e o torna próprio/propriedade, ou seja, a ação de tornar algo apropriado pertinente aos valores e normas socialmente estabelecidos. Mas outras definições como as de Marx e Engels (1984 apud Smolka, 2000, p.28) colocam no ato de tornar próprio uma implicação do fazer e usar instrumentos numa transformação recíproca de sujeitos e objetos, constituindo modos particulares de trabalhar/produzir. Pensar sobre o termo apropriação me pareceu relevante dentro da 8
No decorrer do texto o termo objeto tem sido muito mencionado. Tenho relacionado seu uso aos elementos corriqueiros, os quais me aproprio dos lugares e atribuído um novo significado. Dentro da história da arte (século XX) esse termo parte dessas implicações que desde a arte conceitual, a partir de Marcel Duchamp, vem abordando a relação dos objetos enquanto meras coisas reais a qualidade de obra de arte. (FREIRE, 2006).
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proposta poética que pretendia lançar mão. Assim como Boltanski, a apropriação desses armários se daria dentro do universo da ficção, pois o que pretendia era atribuir a eles significados que não estavam dentro de suas funcionalidades reais, seria dessa maneira que elevaria a esses armários um caráter poético. Eu pretendia usar das ferramentas e dispositivos do próprio espaço da galeria na transformação desses objetos, os quais seriam apropriados como obras. Quando eu me aproprio desses objetos, proponho também uma interferência na dinâmica deles e essa apropriação ganha um caráter de pequenas intervenções. Nesse contexto a interferência: A interferência não pretende o reconhecimento como objeto artístico. A idéia de descontinuidade como geradora de um reconhecimento e, portanto, da autonomia, dá lugar a continuidade alterada. A interferência age, como ruído, modificando o fluxo normal das coisas. Num processo de mímese à continuidade, temos um objeto artístico indefinido, revelado apenas através do recorte imposto pelo registro. (PEIXOTO, 2004)
Mas dentro da própria paisagem urbana esses lugares e seus objetos já se caracterizam como interferências uma vez que se colocam como se fossem um tempo estagnado dentro do fluxo dinâmico da cidade. Ao criar uma ficção em relação ao objeto e seu lugar provoco um deslocamento que intervém na dinâmica desses elementos, ou seja, a quebra do fluxo do lugar onde serão inseridos e dos próprios objetos uma vez que esse deslocamento se dá fisicamente e na atribuição de significado. Esse caráter de intervenção do trabalho que coloco se dá por perceber que atuar dentro de seu próprio fluxo, lugar que esses elementos já se encontram instalados, pouco funcionária como dinâmica de interferência. Esses objetos/armários seriam rapidamente assimilados e devolvidos para o próprio local de origem, ou continuariam invisíveis. Por definição, uma intervenção é realizada para ‘enfatizar idéias, emoções etc.’ e é ‘quase sempre (...) feita somente para impressionar’. Isso tem relação com seu impacto imediato. Porque uma intervenção deve chamar a atenção, ou não durará o tempo suficiente para ganhar conteúdo. Porém, há uma barreira no tempo da intervenção, que é seu meio verdadeiro. (O´DOHERTY, 2002, p.126).
A intervenção por natureza se faz no espaço, mas o tempo é seu determinante, sua natureza, como coloca O’Doherty, é a efemeridade e a imprevisibilidade no decorrer das ações. Na relação arte e vida, a arte só se faz pela apropriação seguida de uma transformação e manipulação dos significados. Atribuir um caráter fictício a esses objetos seria a maneira como eu me apropriaria deles, ou seja, dos significados que venho atribuindo a esses lugares
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da cidade. “O jardim das pequenas monumentalidades” nesse processo de apropriação e deslocamento torna-se uma espécie de metáfora de um espaço onde se encontram as ruínas da cidade, as memórias que foram descartadas, em seu constante processo de industrialização, e seus objetos seriam elevados à qualidade de obras de arte. Deslocar os armários para o espaço da galeria tornou-se estratégia e meio para a transformação e manipulação desses significados. Logo, espaço e objeto tornaram-se fundamentais na construção das relações. Um objeto em um determinado espaço não é apenas um objeto isolado. Um objeto em um determinado espaço atua na construção de um campo de forças em que as relações são estabelecidas a partir das estratégias de organização. Se os armários dentro do espaço do ferro-velho obedecem à dinâmica de uma atmosfera aparentemente inerte, dentro do espaço da galeria esses objetos provocariam uma outra dinâmica, uma vez que seriam colocados dentro de um campo de força que atua dentro de outra natureza. Nesse aspecto, ao propor uma relação desses objetos com o espaço, o trabalho começa a configurar dentro dos conceitos que envolvem a instalação enquanto linguagem e que pedem uma reflexão sobre suas estratégias de atuação. Nas instalações de Christian Boltanski, a relação entre os objetos, o espaço e o espectador tornam-se dependentes na organização e construção de suas representações fictícias. Ao organizar as memórias que ele se apropria, ele as propõe como fatos. O próprio espaço da galeria e as documentações fotográficas, ou seja, a forma como ele apresenta colabora para que se crie uma atmosfera de credibilidade. Porém, apesar das inúmeras pesquisas que ele realiza em relação ao material coletado, ao reorganizá-los ele acaba manipulando esses fatos, construindo um espaço fictício. O espectador fica entregue ao discurso do artista e ao arranjo de suas memórias, uma vez que não tem como constatar as procedências. Isso estabelece um jogo com o espectador provocando uma suspensão na relação do objeto com o sujeito. Nessa suspensão a ação e proposição do artista se tornam poéticas, ou seja, são provocações lançadas estabelecendo uma relação com o outro. Uma das características fundamentais da instalação é o jogo estabelecido entre o tempo, o espaço e o espectador configurando um ambiente em que o arranjo desses elementos se torna o encontro das articulações entre o fazer, o pensar e suas inquietações. Para LECCIA (1989 apud HUCHET, 2006, p. 23):
(...) arranjar é chegar num lugar (quelque part) com idéias e tentar pô-las no lugar (les mettre en place). É preciso achar acordes, estabelecer um entendimento entre o
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lugar e minha idéia. É uma flutuação, um vai-e-vem entre meu pensamento e o lugar onde ponho.
Propor “O jardim das pequenas monumentalidades” como instalação é percebê-la como meio e estratégia para que as relações de deslocamento atuem na transformação do espaço, a galeria se torna lugar específico para a (re)significação desses armários. O espaço da galeria, sua especificidade enquanto o lugar, instaura uma situação propícia para as possíveis relações estabelecidas. O conceito de lugar específico surge como desdobramento da idéia de site, das influências das proposições de Robert Smithson com seus site/non-site. Segundo STOLF (2007 apud ARCHER, 1998, p.35):
Site-specificity significa que a aparência e o sentido da obra dependem em grande parte da configuração do espaço onde ela é realizada. Em outras palavras, se os mesmos objetos estiverem dispostos da mesma maneira em outro lugar, eles constituiriam uma obra diferente.
Nesse sentido o lugar também se constitui enquanto elemento integrante e essencial da obra. Escolher o espaço da galeria para deslocar esses objetos funciona como um arranjo discursivo dos conceitos que venho apresentando. Pois, esses lugares da cidade que concentram esse tempo perdido, os sítios arqueológicos como menciono, são elevados a outro status quando atribuo a eles o caráter de monumento e sua matéria que são esses objetos inertes e deteriorados são postos enquanto obras. Ao deslocar esses armários para a galeria ocorre uma transformação no próprio objeto que assume um caráter de interferência (ruído) no espaço austero da galeria. As paredes brancas, o teto de luz, o piso polido, ou de carpete criam uma situação em que:
Nesse ambiente, um cinzeiro de pé torna-se quase um objeto sagrado (...). A arte existe numa espécie de eternidade de exposição (...), não existe o tempo. Essa eternidade dá a galeria uma condição de limbo, é preciso já ter morrido para estar lá. (O’DOHERTY, 2002, p.4).
O que me interessa enquanto reconstrução é justamente esse contraste coexistindo no mesmo espaço. Se enquanto linguagem a instalação propõe um pensamento dentro das questões que envolvem a tridimensionalidade, logo o espaço expositivo irá atuar na
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reconstrução desses objetos que desloco e estes, por sua vez, ativar o espaço dentro das potencialidades e latências de relações que podem ser estabelecidas. Ativar o espaço é provocar uma inquietação em suas relações. Como já mencionado o arranjo é esse ponto de reflexão em que se lançam os elementos na busca de um ponto em que eles possam se encontrar é nesse encontro que as relações são estabelecidas. O espaço, os objetos, o espectador são os elementos que constituem esse arranjo. Na relação desse conjunto apresenta-se um outro elemento que é a qualidade temporal da instalação. Ela é momentânea e se tratando de um site specificity suas relações entre espaço, espectador e objeto tornam-se também efêmeras. Cada lugar que ela se instaura outras relações serão criadas. A situação de obra em que o objeto se configura dentro da galeria é momentânea. Nesse instante de tempo que segundo KABAKOV (apud STOLF, 2007, p.79) “uma instalação total é o local de um ato suspenso, onde um acontecimento teve, tem ou pode vir a ter lugar”. Essa suspensão pode ser entendida como um estado de efemeridade e imprevisibilidade dos acontecimentos. O título do trabalho “O jardim das pequenas monumentalidades” é colocado como um elemento da instalação na provocação desse ato suspenso. Ele torna-se um ponto de ligação em relação aos objetos que estão ocupando o espaço da galeria e os objetos por sua vez se remetem à natureza do lugar dos quais foram deslocados. Porém, considerando o ambiente que esses elementos podem instaurar na relação espaço-tempo e espectador, o título também pode tornar-se um ponto desestabilizador. Pois, diante dos objetos, o título se remete a um lugar que só existe enquanto imaginário, ele é fictício. Isso pode fazer com que o espectador acredite ou não em sua existência, mas na verdade já se encontra diante dele. Ao colocar o título da obra como elemento, ele assume um caráter de provocação. Ele não propõe uma representação e sim uma presença, ou seja, ele se apresenta como a própria coisa em si. Um jogo impreciso de oferecer algumas chaves, enquanto outras ficam em suspenso. Nessa imprevisibilidade dos fatos pode ocorrer o acontecimento da transformação do objeto em obra.
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2.3.1 Memorial descritivo
“O jardim das pequenas monumentalidades” Instalação: dimensões variáveis Armários de aço/enferrujados com aprox. 197,0 x 64,5 x 74,5 cm cada
A instalação foi pensada para ser realizada dentro de uma galeria sendo necessário uma sala, ou uma área mínima de 4m².
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Os três armários serão dispostos de maneira intercalada mantendo-se um distanciamento de aproximadamente 50,0 cm para que o espectador possa circular entre eles.
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A organização dos armários será de acordo com o espaço disponível.
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Um dos armários contém uma porta que ficará lacrada.
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Será necessário que no espaço haja ponto de luz para ligar os refletores. Terá um refletor para iluminar cada armário. Os refletores podem estar no chão, ou a iluminação poderá ser projetada diretamente do teto.
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- Na parede do lado esquerdo, ou do lado direito terá uma legenda com título e especificações sobre da obra.
- Será necessário um dia de antecedência para que o trabalho possa ser devidamente transportado e montado.
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3. CONSIDERAÇÕES FINAIS “Dentre os inúmeros efeitos, ou impressões a que são suscetíveis o coração, a inteligência ou, mais geralmente, a alma, qual irei eu, na ocasião atual escolher?” Edgar Allan Poe
Quero considerar aqui todos os elementos que pontuaram o trabalho, inclusive os que não foram apresentados no desenvolvimento do texto. Considero que os elementos principais foram: os de caráter intuitivo, as hipóteses, os caminhos, as escolhas e procedimentos, as referências, os riscos e expectativas e o próprio trabalho enquanto obra. A intuição é a que eu escolho primeiro para considerar, pois acredito que os demais elementos estejam a ela associados. Assumir o caráter intuitivo do trabalho é assumir, também, parte de sua elaboração poética, porém o meu processo de elaboração sempre se deu de forma muito sistematizada e a intuição era algo que eu menos considerava. Mas este processo de reflexão me possibilitou perceber que o caráter intuitivo é muito importante como ponto de partida. Ela foi o início de onde partiram as minhas primeiras desconfianças e indagações que no decorrer do processo apontaram novos caminhos indicando outras direções. No início ao pensar nas transformações do espaço urbano meu interesse estava mais direcionado para as questões de uma natureza gráfica. Porém, o meio por onde eu iniciei a investigação e os procedimentos escolhidos apontaram para outras questões que resultaram nesta instalação. Em relação às referências de autores e artistas não vou falar das que citei ao longo do texto, quero apontar para as epígrafes que lancei no início de cada capítulo. Elas são de autores que também colaboraram para a parte inventiva do trabalho, mas decidi comentá-los apenas nessas considerações. Andrei Tarkovski foi um dos primeiros autores que contribuiu para o entendimento de tempo que eu buscava em relação à matéria, ou seja, esse caráter do tempo de se manifestar nas “coisas” pelo acúmulo e pela sobreposição transmitindo uma densidade. Marcel Proust que dá ao tempo uma dimensão de presença em relação ao espaço pela forma como organiza sua narrativa. Ele consegue ao relacionar suas lembranças e memórias criar uma atmosfera no espaço enfatizando a qualidade de lugar. Jorge Luís Borges pela inventividade na narrativa que ele constrói, permitindo um deslocamento de tempo e espaço dentro da história criada. Por fim, Edgar Allan Poe por me provocar ao me fazer refletir sobre a construção do meu processo criativo e de onde partiam as minhas indagações.
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Sobre os riscos e expectativas estes se fundem na apresentação do trabalho enquanto obra, pois só irá se concretizar efetivamente em sua montagem e no contato com o outro, o espectador. Sua imprevisibilidade é praticamente uma condição. Apesar de planejar e esquematizar os elementos em relação ao espaço e a montagem dentro de uma situação ideal, não é possível prever os resultados e desdobramentos. Por isso acaba se caracterizando, apesar do teor conceitual, como um trabalho que contém uma predominância muito intuitiva e isso é um ponto que desestabiliza as certezas em relação ao trabalho. Nessa incerteza deixo espaço para as futuras considerações, porém não posso desconsiderar que esta instalação não se resume apenas em sua efetiva apresentação, mas se apresenta enquanto resultado de todo o processo aqui desenvolvido.
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Fig. 1 - Sebo do Messias - Centro - SP, 2009.
Fig. 2 - Sebo do Messias - Centro - SP, 2009.
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Fig. 3 - Bazar Lar São Francisco - Z. N. - SP, 2009.
Fig. 4 - Bazar Lar São Francisco – Z. N. – SP, 2009.
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Fig. 5 - Depósito de ferro-velho – Z. O. - SP, 2009.
Fig. 6 - Depósito de ferro-velho - Z. O. - SP, 2009.
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Fig. 7 - Depósito de ferro-velho – Z. O. - SP, 2009.
Fig. 8 - Depósito de ferro-velho - Z. O. - SP, 2009.
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Fig. 9 - Armários no depósito de ferro-velho – Z. O. - SP, 2009.
Fig. 10 - Armários no depósito de ferro-velho – Z. O. - SP, 2009.
Fig. 11 - Armários no depósito de ferro-velho – Z. O. - SP, 2009.
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Fig. 12 - Lessons of Darkness – 1987 Black and White photographs, metal lamps Dimensions variable Installation, Kunsthalle, Bern
Fig. 13 - Lost Workers: The work People of Halifax 1877-1982 – 1994 Cardboard and metal boxes, artefacts, metal shelving Dimensions variable Installation, Henry Moore Studio, Dean Clough, Halifax
Fig. 14 - Reserve: The Dead Swiss – 1991 2,580 metal boxes, 2,580 black and white photographs Boxes, 21x23x23 cm each; photographs, 4x6 cm each Installation, Galerie Ghislaine Hussenot, Paris
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRADE, Maria Margarida de. Introdução à metodologia do trabalho científico: elaboração de trabalhos na graduação. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2001. AUGE, Marc. Não-lugares: Introdução a uma antropologia da supermodernidade. Tradução Maria Lúcia Pereira. 6. ed. Campinas, SP: Papirus, 1994. (Coleção Travessias do Século). BORGES, Jorge Luís. Ficções. Tradução Carlos Nejar. São Paulo: Círculo do Livro S.A, 1975. FREIRE, Cristina. Além dos Mapas: os monumentos no imaginário urbano contemporâneo. São Paulo: SESC: Annablume, 1997. FREIRE, Cristina. Arte conceitual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006. GARB, Tamar; KUSPIT, Donald; SEMIN, Didier (Org.). Christian Boltanski. Londres: Phaidon, 1997. HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. HUCHET, Stéphane. A instalação em situação. In: Luiz Nazario; Patrícia França (Orgs.). Concepções contemporâneas da arte. Belo Horizonte: UFMG, 2006. O’DOHERTY, Brian. No interior do cubo branco. Tradução Carlos S. Mendes Rosa. São Paulo: Martins Fontes, 2002. PEIXOTO, Nelson Brissac. Paisagens urbanas. 3. ed. São Paulo: SENAC, 2004. PROUST, Marcel. Em busca do tempo perdido. Tradução Mario Quintana. 10. ed. Rio de Janeiro: Globo, 1987. SMITHSON, Robert. Uma sedimentação da mente: projetos de terra. In: Glória Ferreira; Cecília Cotrim (Org.). Escritos de artistas: anos 60/70. Tradução Pedro Süssekind. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006. p. 182-197. SMOLKA, Ana Luiza Bustamante. O impróprio e o impertinente na apropriação das práticas sociais. In: CADERNOS CEDES, ano XX, nº 50, 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ccedes/v20n50/a03v2050.pdf> Acesso em 18 abr. 2009. STOLF, Raquel. A instalação enquanto situação: entre acontecimentos, proposições, inserções e outros desdobramentos. In: Nadja de Carvalho Lamas (Org.). Arte contemporânea em questão. Joinvelle, SC: UNIVILLE/Instituto Schwanke, 2007. TARKOVSKI, Andrei. O tempo impressso In:______. Esculpir o tempo. Jefferson Luiz Camargo. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
Tradução
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APร NDICES
Estudos/ desenhos dos armรกrios - 2009.
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Estudos/ desenhos dos armรกrios - 2009.
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Detalhe da parte interna de um dos armรกrios - 2009.
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Lado de trรกs dos armรกrios - 2009.
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Detalhe da qualidade de ferrugem dos armรกrios - 2009.