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/XDQD $OPHLGD 0DUtOLD 3LQWR 6{QLD *RPHV 0RWD RUJV
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Águas da Resistência
Luana Almeida Marília Pinto Sônia Gomes Mota (orgs)
São Leopoldo/RS
2019
© Centro de Estudos Bíblicos Rua João Batista de Freitas, 558 B. Scharlau – Caixa Postal 1051 93121-970 – São Leopoldo/RS Fone: (51) 3568-2560 vendas@cebi.org.br cebi.org.br
Série: A Palavra na Vida – Nº 381 – 2019 Título: Águas da Resistência Organização: Luana Almeida, Marília Pinto & Sônia Gomes Mota 5HYLVmR RUWRJUi¿FD 1HOVRQ .LOSS Capa: Anderson Augusto de Souza Pereira Editoração: Rafael Tarcísio Forneck ISBN: 978-85-7733-322-6
/ඎൺඇൺ $අආൾංൽൺ, Graduada em Comunicação Social com habilitação em jornalismo pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Mestre em Comunicação Midiática, com foco em comunicação comunitária e alternativa, pela UNESP (2011). Analista em Comunicação na Coordenadoria Ecumênica de Serviço – CESE. 0ൺඋටඅංൺ 3ංඇඍඈ, Graduada em Comunicação Social com habilitação em Relações Públicas pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB). MBA em Marketing pelo Centro Universitário Jorge Amado(2014). Analista em Comunicação na Coordenadoria Ecumênica de Serviço – CESE 6තඇංൺ *ඈආൾඌ 0ඈඍൺ, Graduada em Teologia pelo Instituto de Educação Teológica GD %DKLD *UDGXDGD HP )LORVR¿D SHOD 8QLYHUVLGDGH )HGHUDO GD %DKLD 0HVWUH HP Teologia (2003) pela Faculdades EST. Pastora da Igreja Presbiteriana Unida – IPU. Diretora Executiva da Coordenadoria Ecumênica de Serviço – CESE.
Sumário
Apresentação ...................................................................................................
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Mulheres e água, juntas resistindo pela vida! Leila Cristina Lemes dos Santos Morais e Lucimone Maria de Oliveira ............
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Água: Um bem comum (1Rs 17) Adriano Portela dos Santos ...........................................................................
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Água como fonte de transformação (Êx. 15.22-27) Shirley Batista dos Santos Proença ................................................................
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Água, Bênção e Renovação (Gn 1.6-10; 7.17-24) Renato Küntzer ............................................................................................
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Água fonte de saúde Neusa Maria Gomes da Silva ........................................................................
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Água: Fonte de vida Camila Mantovani e Helivete Ribeiro .............................................................
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Falta de água: Um problema com nome de mulher Claudia Florentin Mayer...............................................................................
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Fama 2018: Mensagem das Religiões e Espiritualidades aos Povos ..............
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Referências de Vídeos sobre a luta pela água no Brasil .................................
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Apresentação “... porque tive sede e me deste de beber!â€? (Mt 25,35b)
VocĂŞ tem em suas mĂŁos mais uma publicação da Campanha Primavera para a Vida, que a CESE realiza desde 2000. Durante todos esses anos, os temas abordados nas Campanhas expressaram o nosso compromisso de HVWLPXODU H FRQWULEXLU FRP DV LJUHMDV HP VXDV UHĂ€H[}HV H SRVLFLRQDPHQWRV QD DÂżUPDomR H GHIHVD GD -XVWLoD 3D] H ,QWHJULGDGH GD &ULDomR 1RV ~OWLPRV anos, em parceria com o CEBI, temos publicado cadernos com estudos bĂblicos para serem utilizados nos grupos de estudo. Este ano, o tema escolhido ĂŠ Ă guas da ResistĂŞncia e nos inspiramos no texto bĂblico “... porque tive sede e me deste de beber!â€? (Mt 25,35). A ĂĄgua ĂŠ um elemento muito frequente na escritura sagrada. Ela se encontra desde o GĂŞnesis, onde o poema da criação nos diz que “o espĂrito de Deus se movia sobre a face das ĂĄguasâ€? (Gn 1,2), atĂŠ o Apocalipse, que nos apresenta a cidade do futuro de onde brota um rio de ĂĄgua viva (Ap 22,1s): uma imagem para a nova relação entre Deus e a humanidade, em que todas a partilha justa e a fraternidade entre as pessoas terĂŁo sua plena realização. Ao longo da BĂblia, encontramos incontĂĄveis referĂŞncias Ă ĂĄgua; elas VHPSUH QRV DSUHVHQWDP VLJQLÂżFDGRV GLIHUHQWHV RUD GHVLJQDP D SUHVHQoD GH 'HXV YLGD ErQomR HQFRQWUR SXULÂżFDomR RUD R FDRV PRUWH GHVWUXLomR H
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ausĂŞncia de Deus. O prĂłprio Jesus Cristo usa a ĂĄgua para falar dele como “fonte de ĂĄgua da vidaâ€?. Na tradição cristĂŁ, como em outras tradiçþes religiosas, â€œĂĄgua ĂŠ vidaâ€?; todas as pessoas devem ter acesso a ela como um direito humano a ser respeitado. No entanto, este recurso estĂĄ cada vez mais ameaçado, nĂŁo sĂł pela falta de cuidado com este bem precioso, mas tambĂŠm por seu uso indevido. Isso faz com que ele se torne escasso e, por conseguinte, negado a muitas populaçþes. HĂĄ uma crise mundial de ĂĄgua. O Brasil ĂŠ um dos paĂses mais ricos em ĂĄgua doce. Suas grandes EDFLDV KLGURJUiÂżFDV FRQVWLWXHP GD iJXD GRFH H[LVWHQWH QR PXQGR e o Ăşnico paĂs de dimensĂľes continentais onde chove em todo o territĂłrio. Entretanto, a situação de nossas ĂĄguas ĂŠ uma lĂĄstima. Aproximadamente 110 mil km de trechos de rios brasileiros estĂŁo contaminados por esgoto industrial, domĂŠstico, metais pesados e agrotĂłxicos. Do ponto de vista do FRQVXPR GD SRSXODomR EUDVLOHLUD QmR WHP DFHVVR D iJXD SRWiYHO GR HVJRWR SURGX]LGR QmR p WUDWDGR PDV MRJDGR in natura nos rios brasileiros. Cerca de 105 milhĂľes de brasileiros vivem em estado de insegurança quanto Ă ĂĄgua que consomem. Uma outra situação desperta nossa indignação: sabemos que o “bem comumâ€? ĂĄgua estĂĄ sendo privatizado em diversos lugares, ou seja, o que era para ser “gratuidadeâ€? para todos virou comĂŠrcio. Algumas pessoas estĂŁo “autorizadasâ€? a usufruir dela como se fosse sua propriedade exclusiva e nĂŁo um bem comum a que todas as pessoas devem ter direito. 1mR p GH DJRUD TXH DV LJUHMDV FULVWmV VmR GHVDÂżDGDV D VH SRVLFLRQDU profeticamente diante deste grave atentado a nossa Casa Comum. Muitas pessoas estĂŁo sedentas de ĂĄgua para beber e de vozes profĂŠticas que denunciem o abuso que se tem cometido contra este bem comum, de vozes que as ajudem a saciar a sua sede de justiça. Se reconhecemos que a ĂĄgua ĂŠ uma dĂĄdiva divina e, portanto, um direito de todos, ela nĂŁo pode ser reduzida a uma mercadoria ou a um bem particular.
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Esperamos que esse material possa ser amplamente usado, pois além da Palavra da Bíblia ele traz também Palavras da Vida. São casos concretos, vidas de pessoas e de grupos impactados por projetos de morte que atentam contra o bem comum água e histórias de grupos e/ou pessoas que enfrentam a tentativa de privatização e do uso exclusivo da água. Como cristãos e cristãs devemos nos posicionar, pois a missão de salvaguardar a Criação e cuidar da nossa Casa Comum não é uma ação a mais de nossas igrejas, mas um compromisso constitutivo de nossa fé e testemunho. Soa aos nossos ouvidos a palavra de Jesus: “Vinde benditos/as de meu pai, porque tive sede e me deste de beber”. Marcus Barbosa Guimarães Presidente da CESE Padre da Igreja Católica Apostólica Romana
Sônia Gomes Mota Diretora Executiva da CESE Pastora da Igreja Presbiteriana Unida
Rafael Rodrigues da Silva Diretor Nacional do CEBI
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Mulheres e água, juntas resistindo pela vida! Leila Cristina Lemes dos Santos Morais1 Lucimone Maria de Oliveira1
a) Preparar um ambiente acolhedor: colocar as cadeiras em círculo, trazer para o centro símbolos: água, terra, sementes e a Bíblia. b) Dar as boas-vindas c) Invocar a luz do Espírito Santo d) Apresentar brevemente a motivação para o encontro e) Canto inicial Mantra Mudarei o sertão em açude, terra seca em olho d’agua. Assim falou o Senhor das andanças, pra dar a seu povo a esperança. (Bis) Entrar com uma vela acesa enquanto se canta o mantra e colocá-la no centro.
1 Agentes da Comissão Pastoral da Terra.
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Introdução A água é fundamental para a vida. As mulheres sempre garantiram o bem viver de suas famílias, sentiram as consequências da restrição de água de forma profunda. Sempre foram elas que zelaram por este bem comum, armazenando e percorrendo longas distancias para buscá-la em tempo de escassez. Agora mais do nunca é tempo de unir forças para proteger a vida. Para resistir aos impactos do agronegócio e dos grandes projetos irresponsáveis de infraestrutura e garantir a proteção da água e biodiversidade, é preciso que elas tenham o direito de fazer suas escolhas, principalmente em suas casas.
Águas e mulheres a partir da Bíblia – Gn 16 e Jo 4,5-15 (fazer memória dos textos ou escolher um para ser lido) Na Bíblia, as mulheres são mencionadas muitas vezes em conexão com lugares públicos. O poço é um desses lugares onde encontramos ações de mulheres. Nas proximidades dos poços são decididas questões de âmbito familiar e de grupos. Eram as mulheres que tinham a tarefa de buscar água para o cuidado da casa. Esse lugar de mulheres se torna espaço público. São espaços onde a mulher exercita liderança. Nesse sentido, esse espaço das águas se torna também um espaço político. Pesquisando os textos bíblicos que apresentam a temática dos poços vamos perceber que há uma diversidade de atividades acontecendo nas proximidades do espaço da água, envolvendo diferentes grupos: pastores e pastoras (Gn 29; Ex 2,16), mulheres (Gn 16; 21), jovens para acertar namoros (Gn 24; Ex 2,16; Ct 4,12-15; Pr 5,15-18). O poço era também lugar para as celebrações e festas (Nm 21,17; Gn 16,13-14; 26,33; Jz 5,11). “Em uma região árida como a terra da Bíblia, cada fonte, cada olho d’água, cada poço, é quase um milagre. Toda fonte é sinal forte da bênção divina, um presente de seu amor.” (Marcelo Barros)
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7RPDUHPRV FRPR H[HPSOR SDUD HVVD UHĂ€H[mR VREUH iJXDV H PXOKHres dois relatos: em Gn 16, temos memĂłrias de Agar e, em Jo 4, memĂłrias de uma mulher Samaritana. 6HJXLUHPRV DV UHĂ€H[}HV GH 0HUFHGHV %UDQFKHU VREUH *Q (OD DÂżUPD TXH D QDUUDWLYD VREUH $JDU IRL SURGX]LGD HP WHPSRV GLIHUHQWHV possivelmente em trĂŞs fases. “Seu inicio fundante estĂĄ na histĂłria de luta de Agar. E esta histĂłria hĂĄ de ter tido seu nascedouro no mundo da oraliGDGH &UHLR TXH DLQGD SRGHPRV LGHQWLÂżFDU R FRQWH[WR H R HVSDoR HP TXH a histĂłria de Agar, a nĂvel oral, foi criada e transmitida. A base de Gn 16 ĂŠ uma memĂłria popular que tem sua origem entre as mulheres escravas. O PLROR GHVWD KLVWyULD DQWLJD HUD R FRQĂ€LWR TXH DV HVFUDYDV YLYLDP QDV IDPtlias. O texto nos aponta para o espaço da fonte e do poço (v.7-8.14) como um possĂvel lugar onde se conservaram as memĂłrias. Os v.13-14 mostram que o poço era um espaço onde as escravas celebravam a sua experiĂŞncia de fĂŠ. Expressavam sua maneira de comunicar-se com sua divindade. Entende-se que este espaço foi fundamental para as escravas guardarem suas memĂłrias de resistĂŞncia e luta pela dignidade e emancipação. Em Gn 16,7-8 mostra-se que, na fonte, Agar começa a falar. Ela tem palavra prĂłpria e consciĂŞncia de sua realidade social. Entendemos que ali as mulheres podiam fazer suas reuniĂľes e partilhar suas experiĂŞncias cotidianas, ao buscar ĂĄgua ou quando davam de beber a rebanhos.â€? Em Jo 4 acolhemos as memĂłrias sobre uma mulher da Samaria que protagonizou um diĂĄlogo teolĂłgico com Jesus. O lugar teolĂłgico GHVVH GLiORJR IRL R SRoR e PXLWR LPSRUWDQWH UHĂ€HWLU VREUH HVVH HQFRQWUR considerando a fala da mulher, suas questĂľes cotidianas, como o fato GH WHU TXH EXVFDU iJXD e IXQGDPHQWDO QHVVD UHĂ€H[mR FRQVLGHUDU WDPbĂŠm o seu empoderamento: ela estava no seu lugar. Assim como Agar, tambĂŠm a Samaritana tinha, junto Ă s ĂĄguas, o poder da fala. Naquele momento se deu o encontro entre saberes diferentes, um verdadeiro diĂĄlogo inter-religioso.
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QuHUHPRV DVVXPLU DTXL D UHĂ€H[mR GH ,YRQL 5LFKWHU 5HLPHU Ela diz que: “O poço e a ĂĄgua sĂŁo tambĂŠm na antiguidade, e nas tradiçþes MXGDLFD H VDPDULWDQD OXJDU GH HVSLULWXDOLGDGH FRWLGLDQD GH GLiORJR GH UHĂ€HxĂŁo sobre a vida. O compartilhar das ĂĄguas, em tempos que ameaçam matar de sede, matar por falta de sentido, faz parte de uma profunda vivĂŞncia de espiritualidade da compaixĂŁo e da solidariedade. Um dos primeiros passos nesta vivĂŞncia ĂŠ deixar que sejamos transformados em â€˜ĂĄgua’ para outras pessoas, para refrescar diante do calor, para lavar feridas, para estabelecer laços de paz, e nĂŁo de guerra, entre pessoas, povos, culturas e ambientes.â€? A busca da ĂĄgua era prĂĄtica das mulheres era sua obrigação de alimentar e saciar a sede da famĂlia e dos animais. No poço a mulher encontra Jesus que lhe pede ĂĄgua, e ela dĂĄ a ele de beber, sacia sua sede e Jesus ofeUHFH iJXD YLYD ÂłTXHP EHEHU QXQFD PDLV WHUi VHGH´ e XPD WURFD GH iJXDV A Samaritana pede desta ĂĄgua, pois o poço ĂŠ longe e difĂcil o acesso. A ĂĄgua que sacia a sede estĂĄ na ação e nĂŁo na espera, pois as sedes sĂŁo muitas e precisam da nossa intervenção. RefrĂŁo “Elas estĂŁo chegando, pelas portas e janelas, avenidas e vielas, elas estĂŁo chegando.â€? (bis)
Olhando a realidade Vamos conversar? • O poço de Jacó era o lugar de acesso a ågua. De onde vem a nossa ågua hoje? Todos têm acesso? • Como as mulheres estão sendo afetadas pela captura das åguas por parte dos grandes projetos (mineração, monocultura, irrigação e outros)? • Quais iniciativas de luta e defesa pela ågua existem em seu bairro, comunidade, grupo?
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Vamos meditar fechar os olhos, acomodar na cadeira, escutar a mĂşsica e senti-la em seu corpo. A Força Que Nunca Seca, de Chico CĂŠsar (escutar a mĂşsica ou fazer a leitura) JĂĄ se pode ver ao longe A senhora com a lata na cabeça Equilibrando a lata vesga Mais do que o corpo dita Que faz o equilĂbrio cego A lata nĂŁo mostra O corpo que entorta 3UD ODWD ÂżFDU UHWD Pra cada braço uma força De força nĂŁo geme uma nota A lata sĂł cerca, nĂŁo leva A ĂĄgua na estrada morta E a força que nunca seca Pra ĂĄgua que ĂŠ tĂŁo pouca 5HĂ€H[mR Âł2 FRUSR TXH HQWRUWD SUD ODWD ÂżFDU UHWD ´ Âą 'H TXHP VmR HVVHV FRUpos? Que latas carregamos hoje? “A lata sĂł cerca, nĂŁo leva, a ĂĄgua na estrada morta.â€? – A lata ĂŠ uma opção? Ou ĂŠ um instrumento que se carrega? Os pesos que carregamos nesta lata ĂŠ sua escolha? “E a força que nunca seca, pra ĂĄgua que ĂŠ tĂŁo poucaâ€? – Façamos ressurgir a nossa resiliĂŞncia, resistĂŞncia e esperança. Para que se espalhem, “pois mulheres sĂŁo como ĂĄguas quando se juntam viram um marâ€?.
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%rQomR ÂżQDO Em cĂrculo, bem prĂłximos, orar juntos:
Fica conosco ó Deus/ Tu nos revelaste o teu amor de mãe/ a nós que experimentamos o peso das faltas e tensþes/ pela força da terra, mãe da vida/ o Deus do Universo/ abençoa a nós/ e a todas as tuas criaturas /com teu amor agora e sempre,/ amÊm!
HISTĂ“RIA DE VIDA
A potĂŞncia e a resistĂŞncia de quem luta pela vida dos rios 3pV ÂżUPHV H GHVFDOoRV YHORFLGDGH H HXIRULD (VVH HUD R SUHSDUR SDUD dar saltos mortais no rio Corrente, na comunidade de Silvânia, municĂpio GH &RUUHQWLQD Âą %D ( VH R EULQFDU SRU VL Vy Mi HUD WmR EHQpÂżFR UHODFLRQDGR GLUHWDPHQWH FRP RV ULRV DQLPDLV Ă€RUHVWDV HQWmR HUD DLQGD PDLV WUDQVIRUPDGRU Âł8P GRV GHVDÂżRV TXH D JHQWH ID]LD HUD DWUDYHVVDU R ULR nadando de esteio a esteio. A ĂĄgua era tĂŁo forte que poucos de nĂłs conseguiam atravessar. Muitos nem chegavam Ă metadeâ€?, relembra Andreia Neiva, 36 anos, ribeirinha da regiĂŁo e militante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). Hoje, por mais corajosas e aventureiras que as crianças sejam, fazer acrobacias nos recursos hĂdricos tornou-se bastante perigoso e nadar em iJXDV VHFDV Mi QmR p WmR GHVDÂżDGRU DVVLP 3DUD $QGUHLD 1HLYD RV DVSHFWRV relativos Ă cultura infantil ribeirinha, a valorização da identidade e do modo de vida das populaçþes tradicionais tĂŞm perdido espaço para o agronegĂłcio que seca rios, desmata e destrĂłi laços: “HĂĄ um desnĂvel muito grande desde a chegada do agronegĂłcio. O rio estĂĄ praticamente pela metade. â€? Com o modelo de desenvolvimento jĂĄ instalado na regiĂŁo, a ĂĄgua se tornou o bem mais cobiçado pelas transnacionais. Moradores/as acompanham de perto o vazamento dos rios e sentem na pele os efeitos dos
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venenos que sĂŁo escoados pela chuva. Mas isso nĂŁo ĂŠ tudo! A partir dos DQRV D UHJLmR SDVVD D VHU FRELoDGD FRPR IRQWH VLJQLÂżFDWLYD GH OXFUR para a geração de energia. HĂĄ inĂşmeros projetos de construção de Pequenas Centrais HidrelĂŠtricas (PCH). No rio Corrente, a PCH chamada Fazenda Diogo, proposta pelo Grupo Neoenergia e Iberdrola, proprietĂĄrios da Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia (Coelba), afetaria direta e indiretamente sete comunidades. Um crime ambiental e social que inundaria totalmente a histĂłria e a cultura ancestral de mais de 500 famĂlias. “Como moramos no nĂvel do rio, nĂŁo hĂĄ altitude. EntĂŁo todo o povoado e todas as casas ÂżFDULDP HPEDL[R GÂśiJXD 3HUGHUtDPRV WXGR FDVDV URoDV HVFROD LJUHMD cemitĂŠrio... Quem continuaria com sua casa e sua terra, teria sua vida alterada. A relação comunitĂĄria seria desarranjada e destruĂdaâ€?, descreve a militante do MAB. Nesse processo de construção de grandes empreendimentos, as mulheres sĂŁo as mais afetadas pelo problema da violação de direitos. SĂŁo elas que acabam perdendo seu espaço de produção camponesa e de autonomia, jĂĄ que historicamente tĂŞm o cuidado com a casa, a criação dos animais domĂŠsticos, a produção de hortaliças e a garantia de renda. AlĂŠm disso, nos processos de indenização sofrem por nĂŁo serem reconhecidas como chefes de famĂlia. E jĂĄ que nĂŁo hĂĄ um marco legal que garanta o direito das populaçþes atingidas, ĂŠ atravĂŠs da capacidade da força e da articulação polĂtica que trabalhadores e trabalhadoras rurais das comunidades tĂŞm resistido e GHQXQFLDGR HVVDV RIHQVLYDV *XDUGLm GR ULR &RUUHQWH $QGUHLD p ÂżUPH DR falar sobre o projeto da usina: “NĂłs nĂŁo queremos barragem. Estamos no processo de mobilização hĂĄ 15 anos e se depender da nossa resistĂŞncia nĂŁo serĂĄ feita. Se nĂŁo nos organizarmos a empresa vem como rolo compressor e passa por cima da gente.â€?
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Lutando por uma melhoria de vida e para defender os bens naturais e o territĂłrio onde nasceu, Andreia Neiva segue com outras mulheres e homens se organizando em grupos de base, fazendo formação polĂtica e empoderando as mulheres na perspectiva de ampliar a atuação e manter DFHVD D FRQVFLrQFLD UHVLVWHQWH D ÂżP GH FRQWLQXDU JDUDQWLQGR D YLGD H D recreação nos rios: onde se possa mergulhar, nadar, pescar, brincar, viver e ser feliz.
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Ă gua: Um bem comum (1Rs 17) Adriano Portela dos Santos2
a) Preparar um ambiente acolhedor – se possĂvel espalhar cartazes ou projetar imagens sobre a situação que serĂĄ abordada b) Dar as boas-vindas c) Invocar a luz do EspĂrito Santo d) Apresentar brevemente a motivação para o encontro e) Canto inicial
8PD H[SOLFDomR GR WH[WR EtEOLFR O cap. 17 de 1Reis marca o inĂcio da atividade do profeta Elias; ele estĂĄ dividido internamente em trĂŞs partes: a profecia de Elias (17,1-7), (OLDV H D YL~YD GH 6DUHSWD H D UHVVXUUHLomR GR ÂżOKR GD YL~YD -i R QRPH GR SURIHWD PDUFD VXD PLVVmR (OLDV VLJQLÂżFD ÂłPHX Deus ĂŠ IavĂŠ (o Deus hebreu)â€?. Ele serĂĄ o profeta que, no contexto do reinado de Acab (873 a.C. – 852 a.C.), sustentarĂĄ a exclusividade do culto 2 Revdo. da IEAB em Feira de Santana/BA e Presidente do ComitĂŞ Inter-religioso e de Liberdades Laicas de Feira (COINTER).
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a IavĂŠ contra a inclusĂŁo do culto a deuses estrangeiros (Baal e AserĂĄ), no reino do Norte (Israel). $FDE KDYLD VH FDVDGR FRP -H]DEHO VDFHUGRWLVD GH %DDO ÂżOKD GR rei de Sidon (FenĂcia), e permitiu que ela introduzisse em Israel todo um aparato de culto a Baal e AserĂĄ, com templo, sacerdotes e profetas. Obviamente, tal concessĂŁo encontrou opositores entre os profetas de Israel. Nesse contexto ĂŠ que surge Elias, que nĂŁo se importa de entrar em rota de colisĂŁo com o poder real de Acab e Jezabel. Enquanto o casal real, com seu casamento, promete abundância, Elias prenuncia escassez, denunciando o engano daquele projeto e as consequĂŞncias nefastas do enlace real. No inĂcio do capĂtulo, o profeta diz a Acab: “Juro pela vida do Senhor, Deus de Israel, a quem sirvo: nestes anos nĂŁo haverĂĄ nem orvalho nem chuva, se nĂŁo quando eu disser!â€? (1Rs 17,1). Foram cerca de trĂŞs anos de seca na regiĂŁo. A profecia de Elias nĂŁo foi por acaso: Baal era considerado o deus da prosperidade e AserĂĄ era considerada a deusa da fertilidade. Por qual caminho desacreditar, entĂŁo, a aliança de Acab com Jezabel, se nĂŁo escasseando na regiĂŁo a ĂĄgua, elemento necessĂĄrio Ă prosperidade? A segunda parte do capĂtulo, referente ao encontro do profeta Elias com a viĂşva de Sarepta, mostra um caminho oposto ao percorrido por Acab em sua aliança com os fenĂcios (casamento com Jezabel). Acab busca uma prosperidade a partir da aliança entre poderosos; Elias busca uma prosperidade a partir da partilha, quando recebe das mĂŁos da viĂşva o suprimento necessĂĄrio para enfrentar a crise. “Pois assim fala o Senhor, Deus de Israel: ‘A vasilha de farinha nĂŁo acabarĂĄ e a jarra de azeite nĂŁo diminuirĂĄ, atĂŠ ao dia em que o Senhor enviar a chuva sobre a face da terra’â€? (1Rs 17,14). O profeta revela que o projeto de Deus passa por uma economia solidĂĄria, onde se repartem os bens em vez de privatizĂĄ-los, como tem acontecido com a ĂĄgua em pequenas comunidades, por causa de atos ilegais de empresas privadas.
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A terceira e Ăşltima parte do capĂtulo diz respeito Ă ressurreição do ÂżOKR GD YL~YD e XPD SURYD GH IRJR SDUD (OLDV (OH DQXQFLD D VHFD HP GHFRUUrQFLD GD DOLDQoD GR FDVDO UHDO PDV D YL~YD TXH R DFROKH Yr VHX ÂżOKR morrer: “O que hĂĄ entre mim e ti, homem de Deus? Porventura vieste a minha casa para me lembrares os meus pecados e fazeres morrer o meu ÂżOKR"´ 5V 2 SURIHWD GHYH UHVVXVFLWDU R PRUWR SDUD TXH WHQKD FUHdibilidade sua profecia: nĂŁo pode ser verdadeiro o profeta que traz a morte! O sinal justo de sua missĂŁo serĂĄ o da vida que ĂŠ gerada pela partilha e pela abundância de ĂĄgua.
Oração (Adaptada do Livro de Oração Comum, p. 518) 6RFRUUH y 6HQKRU WHX SRYR ¿HO TXH SUDQWHLD QHVVH PRPHQWR HP meio a calamidades e catåstrofes. Cerca-o de teus anjos e envia pessoas amigas que possam confortå-lo nos momentos de dor, agindo como mãos e EUDoRV WHXV QR DPSDUR GH WRGD D JHQWH e R TXH WH SHGLPRV SRU -HVXV &ULVWR AmÊm!
Uma provocação a partir da vida (o que estå acontecendo hoje com a ågua) Em 1 Rs 17, vimos o quanto a ågua Ê importante para a prosperidade de uma sociedade. Cabe a pergunta: qual a situação da ågua no Brasil? Segundo a Agência Nacional de à guas (ANA), o Brasil possui cerca de GD iJXD GRFH GLVSRQtYHO QR SODQHWD (QWUHWDQWR D GLVWULEXLomR QDWXUDO desse recurso não Ê equilibrada, uma vez que a região Norte concentra DSUR[LPDGDPHQWH GD TXDQWLGDGH GH iJXD GLVSRQtYHO WHQGR DSHQDV GD SRSXODomR EUDVLOHLUD HQTXDQWR DV UHJL}HV SUy[LPDV DR 2FHDQR $WOkQWLFR FRQFHQWUDP PHQRV GH GRV UHFXUVRV KtGULFRV GR SDtV WHQGR PDLV GH GD SRSXODomR
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AlĂŠm da distribuição irregular dos recursos hĂdricos, que acarreta o histĂłrico problema da seca no Nordeste, nosso paĂs sofre com um precĂĄrio sistema de saneamento bĂĄsico. Um estudo realizado pelo Instituto 7UDWD %UDVLO DSRQWD TXH DSHQDV GD SRSXODomR p DWHQGLGD FRP UHGH GH HVJRWR H TXH VRPHQWH GR HVJRWR FROHWDGR p WUDWDGR ,VVR VLJQLÂżFD TXH XPD TXDQWLGDGH HQRUPH GH HVJRWR p GHVFDUWDGD QRV ULRV JHUDQGR poluição ambiental. Lembremos ainda um outro tipo de poluição das ĂĄguas, aquela derivada de atividades ambientais. No Brasil, temos um longo histĂłrico de descarte inadequado dos resĂduos industriais, que ocasionam a poluição do lençol freĂĄtico, ademais, temos experimentado recentemente tragĂŠdias ambientais mais agressivas. O rompimento de duas barragens da Vale do Rio Doce (Mariana, 2015, e Brumadinho, 2019) provocou a morte de rios. Vem das grandes empresas tambĂŠm outra grande ameaça: hĂĄ rios, lagos e outras fontes de ĂĄgua que sĂŁo explorados exclusivamente visando os interesses econĂ´micos das empresas, privando as comunidades ribeirinhas do uso das ĂĄguas ao qual elas jĂĄ estavam acostumadas e do qual muitas vezes dependem suas vidas. Nesse sentido, uma grande ameaça ĂŠ a privatização da EletrobrĂĄs, prevista para o inĂcio de 2020. Com a privatização da empresa, se nĂŁo se privatiza a propriedade dos rios, privatiza-se, na prĂĄtica, o uso destes. Mais uma vez ĂŠ urgente a profecia em favor do povo.
3HUJXQWDV SDUD UHĂ€H[mR a) Temos feito alianças com pessoas, instituiçþes e grupos? Qual a ÂżQDOLGDGH GDV DOLDQoDV TXH HVWDEHOHFHPRV" b) Quais sĂŁo as calamidades e tragĂŠdias que as pessoas estĂŁo enfrentando ao nosso redor (inclusive em relação Ă ĂĄgua)? c) O quanto de auxĂlio temos oferecido Ă s pessoas que estĂŁo enfrentando calamidades para manterem a dignidade, acessarem direitos e alimentarem a esperança?
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Cântico Final É o rio da fraternidade (Pe. Zezinho) Existe um rio Um rio caudaloso De fonte cristalina E Ê lå no cÊu que ele começa ( HX FRQ¿R Nas åguas deste rio Porque elas são divinas E trazem junto uma promessa Onde ele passa leva a graça do Senhor As åguas deste rio geram paz e liberdade E o nome deste rio e R ULR GD IUDWHUQLGDGH
HISTĂ“RIA DE VIDA
As ĂĄguas do rio SĂŁo Francisco e a luta do povo XakriabĂĄ “Gigante pela prĂłpria naturezaâ€? – esta famosa expressĂŁo do hino QDFLRQDO EUDVLOHLUR IRL UHVVLJQLÂżFDGD HP SHOD HVFROD GH VDPED (VWDção Primeira de Mangueira para homenagear o rio SĂŁo Francisco. Esses versos couberam como uma luva num samba enredo de carnaval para chamar a atenção sobre um dos mais importantes recursos hĂdricos do Brasil e da AmĂŠrica do Sul. Em 2019, permanecer gigante pelo conjunto das forças do universo tem sido praticamente impossĂvel em um modelo de desenvolvimento do sistema capitalista que se nutre da exploração das populaçþes e do meio
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ambiente. Sem falar em um contexto de extrema direita e de retrocessos de direitos, que tem exigido cada vez mais do povo lutas cotidianas para defender as riquezas naturais, seus territĂłrios e suas vidas. $ UHJLmR QRUWH GH 0LQDV *HUDLV SRU H[HPSOR DEULJD FRQĂ€LWRV HP torno do direito legĂtimo de acesso a ĂĄgua e Ă s riquezas produzidas pelo rio SĂŁo Francisco. Santo Caetano Barbosa, cacique XakriabĂĄ da aldeia Morro Vermelho, sente na pele as consequĂŞncias da lĂłgica do capital. Vivendo entre os municĂpios de SĂŁo JoĂŁo das MissĂľes e Itacarambi – entre os biomas do Cerrado e da Caatinga – essa liderança indĂgena luta junto com seu SRYR SHOR GLUHLWR FRQVWLWXFLRQDO GH JDUDQWLU D SRVVH GHÂżQLWLYD GDV iUHDV LGHQWLÂżFDGDV jV PDUJHQV GR ULR 6mR )UDQFLVFR Apesar da comprovação atravĂŠs de estudo antropolĂłgico sobre a LGHQWLÂżFDomR H R OHYDQWDPHQWR IXQGLiULR GDV iUHDV UHLYLQGLFDGDV DSHQDV um terço do territĂłrio foi regularizado, deixando de fora as terras com mananciais de ĂĄgua. Os XakriabĂĄ tĂŞm enfrentado forte resistĂŞncia de posseiros, fazendeiros, polĂticos e empreendimentos ligados ao agronegĂłcio: “Praticamente todas as ĂĄreas da margem do rio estĂŁo invadidas por grandes fazendas e setores do agronegĂłcio. SĂŁo os grandes exploradores das ĂĄguas que causam impactos irreversĂveis a partir do uso de agrotĂłxicos, envenenamento da ĂĄgua, pastagens, criação de gado, plantio de soja, milho e frutas em larga escala. Enquanto isso, a nossa população sofre com a falta de ĂĄgua para o abastecimento das nossas famĂlias, que sĂŁo atingidas diretamente por essas açþes predatĂłriasâ€?, desabafa Santo Caetano. Um povo que historicamente vive da atividade da pesca, da caça, da coleta e do plantio de pequenas roças tem sua relação cultural, espiritual e de convivĂŞncia negada pelo Estado brasileiro. Reconhecedor e sabedor da profunda responsabilidade de assegurar a vida de 12.000 indĂgenas distribuĂdos em 36 aldeias, o cacique XakriabĂĄ ĂŠ enfĂĄtico ao falar sobre a luta pela preservação dos recursos naturais: “Vamos continuar lutando para defender o rio SĂŁo Francisco, nĂŁo hĂĄ como separar o rio do nosso povo e
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o nosso povo do rio. A batalha pelo acesso ao direito a ĂĄgua e a terra ĂŠ um FDPLQKR HP FRQVWUXomR H XP GHVDÂżR TXH SUHFLVDPRV VXSHUDU ´ Nesta caminhada houve muitas perdas e ameaças. Lideranças foram brutalmente assassinadas e vidas sĂŁo constantemente perseguidas e ameaçadas. VĂtima de emboscadas e gestos que anunciam a morte, a liderança XakriabĂĄ descreve que, apesar da dor, a chacina que acarretou a morte dos parentes Rosalino Gomes de Oliveira, Manoel FiĂşza e JosĂŠ Pereira inspira a resistĂŞncia de seu povo: “Todos os anos relembramos esse episĂłdio. Um marco para renovarmos o compromisso com nossos antepassados e mĂĄrtires, fazer memĂłria aos nossos guerreiros e guerreiras que deram suas vidas para que pudĂŠssemos continuar existindo.â€? A força da cultura indĂgena, a resistĂŞncia e a relação histĂłrica e secular com o rio SĂŁo Francisco tĂŞm trazido conquistas polĂticas, empoderado grupos de mulheres e articulado jovens do povo XakriabĂĄ. Enquanto liderança, Santo Caetano Barbosa representa o seu povo e defende as causas a favor da resistĂŞncia e da luta contra os que ameaçam o territĂłrio, o rio e a YLGD 'HVDÂżDGR D FRQWLQXDU DWXDQGR HP WHPSRV FRQVHUYDGRUHV H GH UHWURFHVVR R FDFLTXH DÂżUPD Âł$ OXWD SHOR DFHVVR D iJXD p DFLPD GH WXGR XPD FRQGLomR GH VREUHYLYrQFLD GH QRVVR SRYR e XPD HVFROKD TXH SUHFLVDPRV fazer: Morremos lutando ou morremos de sedeâ€?. 'LDQWH GHVVD FRPSOH[D FRQMXQWXUD p SUHFLVR DÂżUPDU TXH RV UHFXUVRV naturais devem estar sob os cuidados e o controle popular em seus territĂłrios. SĂł assim o “Giganteâ€? terĂĄ forças para despertar.
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à gua como fonte de transformação (Êx. 15.22-27)
Shirley Batista dos Santos Proença3
1. Abertura a) Preparar um ambiente acolhedor b) Dar as boas-vindas c) Invocar a luz do EspĂrito Santo d) Apresentar brevemente a motivação para o encontro e) Canto inicial.
2. Introdução A ĂĄgua ĂŠ fundamental para a vida e sem ela a morte se anuncia. “No %UDVLO GD SRSXODomR EUDVLOHLUD QmR WHP DFHVVR j iJXD SRWiYHO GD iJXD GDV WRUQHLUDV QmR WHP FRQÂżDELOLGDGH GDV FDVDV QmR WrP FROHWD GH HVJRWR H GR HVJRWR FROHWDGR p ODQoDGR GLUHWDPHQWH QRV ULRV VHP qualquer tipo de tratamentoâ€?. (SCHOENLEIN-CRUSIUS; ALMEIDA, 2018, p. 158). Quando apenas uma parcela da população mundial tem acesso 3 Pastora da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil. Professora da Faculdade de teologia de SĂŁo paulo da IPI do Brasil.
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Ă ĂĄgua potĂĄvel, quando a poluição, o desperdĂcio e o interesse comercial dilapidam um componente essencial para a existĂŞncia planetĂĄria, nĂŁo hĂĄ dĂşvida de que estamos diante de ĂĄguas que amargam e usurpam o direito Ă vida de toda criação de Deus. Muito se tem falado a respeito de sustentabilidade, do cuidado com a natureza, de açþes que podem colaborar para que a proteção Ă vida seja um esforço conjunto de toda a humanidade. HĂĄ de se enfatizar que esforços individuais e coletivos, pessoais e institucionais sĂŁo urgentes para que a ĂĄgua potĂĄvel esteja ao alcance de todos os seres humanos.
8PD H[SOLFDomR GDV iJXDV DPDUJDV O povo de Deus foi liberto da escravidĂŁo egĂpcia e apĂłs atravessar o mar Vermelho começou a caminhar pelo deserto rumo Ă terra de CanaĂŁ. $ SULPHLUD GLÂżFXOGDGH HQFRQWUDGD IRL D DXVrQFLD GH iJXD SRWiYHO &RPR continuar a jornada sem ĂĄgua, elemento essencial para a sobrevivĂŞncia? A apreensĂŁo, o medo, a falta de alternativas para solucionar a necessidade imediata foram elementos que levaram o povo Ă murmuração. Encontrar, no deserto, poços com ĂĄguas imprĂłprias para o consumo poderia ser o anĂşncio da morte e a libertação jĂĄ nĂŁo teria sentido. O que o povo precisava no momento de desespero? Ouvir e se comprometer com os ensinamentos do Deus que liberta, que sara e que restaura a esperança diante do anĂşncio da morte. O povo recorreu Ă liderança de MoisĂŠs para que o problema fosse resolvido. Ouvir o clamor das pessoas necessitadas, enxergar situaçþes que provocam desânimo, angĂşstia e ameaçam a vida sĂŁo atitudes QHFHVViULDV SDUD TXH RV REVWiFXORV VHMDP VXSHUDGRV 1D GLÂżFXOGDGH HQFRQWUDGD DV SHVVRDV QmR ÂżFDUDP GHVDPSDUDGDV SRLV HVWDYDP FRP um lĂder que as ouviu, que reconheceu a gravidade da situação e que agiu, com sabedoria, para solucionar o problema. A atitude de MoisĂŠs EHQHÂżFLRX WRGR R SRYR
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Moisés clamou a Deus e agiu. Uma madeira foi lançada para neutralizar os elementos químicos que tornavam a água insalubre e ela se tornou própria para salvar o povo sedento. As águas amargas transformadas em águas doces representavam um marco entre o tempo de escravidão e o tempo da libertação. O Deus que tirou o povo da escravidão, acompanhou-o em toda travessia pelo deserto. Os obstáculos foram vencidos até se alcançar a terra onde todo povo poderia viver e cultuar o Deus libertador.
4. Uma provocação a partir da vida Há grande divulgação mundial a respeito do uso consciente da água potável do planeta. Há também estatísticas que demonstram que a poluição, o desmatamento, a falta de saneamento básico, o desperdício, a falta de políticas públicas, entre outras ações humanas, têm diminuído consideravelmente as reservas naturais de água própria para o consumo. No nosso dia a dia, as águas amargas brotam dos poços da corrupção, do desrespeito aos direitos fundamentais para a existência humana, do poder que escraviza e oprime, dentre outros. Não podemos nos calar ou nos tornarmos indiferentes. Deus nos chama para agirmos para que as águas doces da equidade, da justiça e do amor façam parte da nossa jornada. Desde a Antiguidade a água tem sido motivo de disputa. O uso consciente desse recurso está diretamente relacionado à saúde e à sobrevivência humana. Pelo menos de duas maneiras podemos colaborar para que essa riqueza natural seja preservada e melhor distribuída. Em primeiro lugar, cuidar para que a água seja utilizada sem desperdício e, quando possível, compartilhada com as pessoas que não têm acesso a ela. Em segundo lugar, mobilizar-se como líderes nas comunidades, nas igrejas, nas associações de bairro, nas rodas de conversa, e conscientizar as pessoas da necessidade de se cobrar dos poderes públicos que sejam implementadas políticas que tornem possível a distribuição sustentável da água para toda e qualquer pessoa. A água é bênção de Deus para a vida do planeta.
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5. Uma conversa sobre a realidade iluminada pela Palavra a) Quais ações são necessárias para que o uso consciente da água seja realidade em nossa casa, em nossa comunidade? E 2 TXH SRGHPRV LGHQWL¿FDU FRPR iJXDV DPDUJDV QD VRFLHGDGH H como elas podem afetar a conscientização da população quanto ao uso desse precioso recurso natural? c) Quais ações objetivas podemos ter para que políticas públicas sejam implementadas para a preservação e a distribuição equitativa da água potável?
2UDomR ¿QDO Animador/a: Ó Deus Pai e Mãe de todos e todas, confessamos que não temos cuidado da tua criação de forma adequada e te pedimos que nos perdoes e nos capacites para termos atitudes de cuidado para preservar toda a natureza criada por ti. Que sejamos homens e mulheres que contribuam para que as águas amargas do nosso tempo se transformem em água doce e alcancem todo ser humano em todo e qualquer lugar e a vida da tua criação seja preservada. Amém! Pai Nosso Ecumênico, de mãos dadas. Abraços de paz e compromisso.
Referência SCHOENLEIN-CRUSIUS, Iracema Helena; ALMEIDA, Maria Aparecida de Andrade. Água Potável e Saneamento. In: BARRO, Jorge Henrique et al.(orgs.) Porque Deus amou o mundo: igreja & ODS. Londrina: Descoberta, 2018.
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A VIDA MARGEIA OS RIOS
histĂłrias de resistĂŞncia O corpo jĂĄ nĂŁo tinha o mesmo vigor de outrora, de quando pescava no rio Murucupi e tirava oito latas de açaĂ por dia, mas a mente permanecia incansĂĄvel. Quando jovem, seu AntĂ´nio ajudara a fazer a resistĂŞncia Ă primeira leva de desapropriados de Barcarena, quando a ALBRAS (produtora de alumĂnio primĂĄrio) veio se implantar na regiĂŁo, em 1978, para produzir alumĂnio. “Na ĂŠpoca, foi a Companhia Vale do Rio Doce que trouxe pra Fi´ HOH FRQWD Âł'HSRLV RV MDSRQHVHV UHVROYHUDP ÂżFDU FRP WXGR H R JRYHUQR vendeu a parte deleâ€?. Hoje, ele olha para a igreja de SĂŁo JoĂŁo Batista na vila do Conde e, nos seus olhos, a maresia das memĂłrias desponta, penso que vai chorar, mas conclui dizendo: “Agora ĂŠ continuar lutando. JĂĄ teve gente que morreu aqui, mas a gente nĂŁo pode parar!â€? Dona Mundica descasca camarĂŁo enquanto conta a histĂłria do rio, sentada na cabeceira da ponte e reparando os netos, que sobem na popa do rabudo para dar saltos mortais e depois sumir dentro da ĂĄgua. “TĂĄ vendo sĂł? A gente nĂŁo consegue nem vĂŞ os meninos dentro da ĂĄgua de tĂŁo branca que tĂĄ!â€? Ela conta que, antigamente, era sĂł descer de casa e puxar a malhadeira que vinha o peixe; era sĂł tirar o matapi que ia ter camarĂŁo; mas o rio DendĂŞ estava morto. Tornou-se ĂĄgua sem vida, contaminou o pescado e a plantação de açaĂ. Ă gua que ninguĂŠm toma e sĂł quem entra sĂŁo as crianças. “Esses meninos vivem cheio de coceira, mas fazer o quĂŞ, nĂŠ? A gente atĂŠ tenta, mas jĂĄ viu. Tem um cano da Imerys (multinacional francesa especializada na produção e processamento de minerais industriais) bem ali que joga toda a sujeira no rio... A luta ĂŠ grande; sĂł Deus mesmoâ€?. “TĂĄ aqui Ăł, ĂŠ tudo isso que eu tenho que tomar todo o santo dia!â€? Dona Maria das Graças esvazia no chĂŁo uma sacola cheia de caixas de remĂŠdio. “E tem mais um monte lĂĄ em casa. Tem pro coração, pra diabetes, pressĂŁo, isso aqui ĂŠ tudo pra essas alergias na pele... atĂŠ pros nervos HX WRPR SRUTXH FRPR QmR ÂżFDU GHSUHVVLYD DVVLP"´ &RPR QmR ÂżFDU" %RP
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Futuro foi o nome que os moradores deram para a ocupação no lixĂŁo da cidade Ă s margens do rio SĂŁo Francisco quando, desapropriados para dar lugar Ă s empresas no complexo industrial, migraram em busca de terra, trabalho, moradia, esperança... de um futuro. Mas quando chove muito, a ĂĄgua vira lama vermelha e escorre da bacia da Hydro (principal acionista da ALBRAS TXH ÂżFD GX]HQWRV PHWURV DFLPD GD FRPXQLGDGH 'RQD 0DULD H RV YL]LQKRV DFRPHWLGRV SRU XPD LQÂżQLGDGH GH GRHQoDV WLUDP GH onde nĂŁo tĂŞm para comprar os remĂŠdios, tiram do lixo, das mĂŁos e dos pĂŠs feridos. “A Hydro podia pelo menos pagar o nosso remĂŠdio, porque ĂŠ por causa dela que a gente tĂĄ assim. Temos o nosso direito e isso nĂŁo tĂĄ certo!â€? &DtD XPD FKXYD ÂżQD j EHLUD GR ULR 3DUi QD SUDLD XP ~QLFR YHQGHGRU de picolĂŠ arrastava o carrinho e, atrĂĄs dele, formavam-se os trilhos na areia. Pensei nos trilhos que se aproximavam de Barcarena, da ferrovia que vai trazer mais boi, soja e minĂŠrio. Seu SabĂĄ viu que eu olhava para o porto e apontou: “Foi bem ali que o navio afundou. Cinco mil bois tudo pro fundo. Ainda teve uns que conseguiram chegar na praia e o povo comeu; depois a gente soube que fazia malâ€?. Um navio acabara de chegar e esperava a lavagem; outro saĂa para a China ou a Europa, quem sabe. “Eles levam pra fora as nossas riquezas e deixam sĂł a sujeira aqui. Vai chegar um dia que a gente nĂŁo vai mais aceitar isso; vamo fechar esse porto, aĂ vĂŁo ter que nos respeitar!â€? * As histĂłrias sĂŁo fruto de relatos de atingidos da regiĂŁo de Barcarena-Pa. Os nomes foram alterados para preservar a identidade das pessoas.
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Água, Bênção e Renovação (Gn 1.6-10; 7.17-24)
Renato Küntzer4
a) Preparar um ambiente acolhedor – se possível espalhar cartazes ou projetar imagens sobre a situação que será abordada b) Dar as boas-vindas c) Invocar a luz do Espírito Santo d) Apresentar brevemente a motivação para o encontro e) Canto inicial.
Introdução +i WHPSRV R FULVWLDQLVPR WHP D¿UPDGR TXH D iJXD p SUHVHQWH GD criação de Deus à humanidade. Disso deveria resultar uma relação de cuidado e de amor com a terra e com as águas. Testemunhamos que a vida nasceu a partir das águas e essa experiência é testemunhada pelos textos bíblicos: Deus se serve das águas do Mar Vermelho para libertar seu povo da escravidão do Egito; ele sacia a sede do povo no deserto; Jesus foi EDWL]DGR QDV iJXDV GR ULR -RUGmR HOH WDPEpP D¿UPRX VHU D IRQWH GD iJXD 4 Pastor da IECLB em Boa Vista do Buricá/RS – Integra a Direção Institucional da CESE.
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vida. Como manifestação do Espirito Santo somos lavados pelas ĂĄguas no VDFUDPHQWR GR EDWLVPR $ iJXD WHP XP VLJQLÂżFDGR HVSLULWXDO H XPD OLJDomR indiscutĂvel com a vida.
8PD DQiOLVH GR WH[WR EtEOLFR O texto da criação de Gn 1 ĂŠ fruto do inconformismo e resistĂŞncia a uma realidade de escuridĂŁo, caos e deserto. Deus cria para trazer luz, ordem e vida. O ato criador de Deus supera primeiro as trevas criando a luz. Em seguida, vence o caos do mar profundo, separando as ĂĄguas. Isto SHUPLWLX TXH D WHUUD SXGHVVH HQFKHU VH GH YLGD e D SDUWLU GR FDRV TXH 'HXV faz surgir a criação. A ordem criada por Deus torna possĂvel que a terra produza seus frutos e que o ser humano viva. A desordem e o caos sĂŁo superados pela ação divina. $R FRORFDU HP RUGHP R FDRV 'HXV GHÂżQH TXH QRVVD FDVD FRPXP p REUD GLYLQD H GHWHUPLQD TXH DV QRUPDV GHVVD FDVD QmR SRGHP VHU FRQÂżDGDV aos desejos e prazeres dos projetos de morte. Deus estabelece uma forma de estar no mundo e de organizar a vida no mundo que privilegia a vida. NĂŁo somente a ĂĄgua, mas toda a criação de Deus participa de um projeto de vida que nĂŁo se reduz Ă utilidade econĂ´mica e de geração de riquezas. O ser humano foi criado como um ser com quem Deus se relaciona e dialoga. O ser humano deve ser imagem e semelhança de Deus: mulher e homem sĂŁo chamados Ă vida. O ser humano ĂŠ chamado a trabalhar para que triunfe a luz, para realizar, construir e procriar, dando continuidade Ă obra de Deus.
Uma provocação a partir da vida $V D¿UPDo}HV GH Ip GH QRVVR WH[WR JDQKDP DWXDOLGDGH TXDQGR FRQfrontadas com uma experiência local da região noroeste do Rio Grande do Sul e que envolve o Rio Uruguai, onde hå um projeto de construção
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de duas barragens internacionais, Garabi e Panambi. A construção de barUDJHQV HVWi FHUFDGD GH XP PLWR UHOLJLRVR H GH ÂżGHOLGDGH D XP tGROR R desenvolvimento com base na reprodução do dinheiro. Fato ĂŠ que as barragens ao longo do Rio Uruguai, entre os Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, resultaram no reestabelecimento do caos. As barragens reinstalam o caos social. Em todo processo de construção de hidrelĂŠtricas, de desapropriação e reassentamentos constata-se uma luta desigual que privilegia interesses pĂşblicos e privados, exigindo dos atingidos todo o Ă´nus decorrente desse empreendimento. O modelo energĂŠtico brasileiro exige sacrifĂcios. O discurso predominante do desenvolvimento entende que todo e qualquer direito dos ameaçados ĂŠ algo PHUDPHQWH SDUWLFXODU H SRU LVVR GHYH VHU VDFULÂżFDGR DR LQWHUHVVH S~EOLFR (P HQWUDPRV HP FRQĂ€LWR FRP HVVH PRGHOR GH GHVHQYROYLPHQWR TXH regula a produção energĂŠtica e que visa prioritariamente o crescimento econĂ´mico e a concentração de renda. No confronto com o ConsĂłrcio de empresas e setores pĂşblicos, as famĂlias ameaçadas cresceram na formação e organização popular, com claro protagonismo das mulheres, e articularam uma denĂşncia marcante contra o mercado que exige sacrifĂcios ambientais e humanos. As barragens reinstalam um caos ambiental. As licenças ambientais continuam sendo emitidas por decisĂŁo polĂtica e sem nenhum embasamento tĂŠcnico que respeita os marcos legais da ĂĄrea ambiental. A ordem ĂŠ atender as demandas econĂ´micas imediatas. Os critĂŠrios tĂŠcnicos tornam-se letra morta e o ĂłrgĂŁo ambiental transforma-se em um setor de mera chancela e de obediĂŞncia aos interesses polĂticos e econĂ´micos. Consagra-se a visĂŁo de que os rios e a natureza como um todo sĂŁo apenas mercadoria. $ FKDPDGD Ă€H[LELOL]DomR GR OLFHQFLDPHQWR DPELHQWDO QDGD PDLV p TXH D anulação da lei atual, revelando-se como uma ação oportunista e imoral. As barragens provocam o caos econĂ´mico. Quando começa o processo de construção de uma hidrelĂŠtrica, “dois mundos entram em
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choqueâ€?, pois sĂŁo empreendimentos de capital alheios e estranhos Ă s comunidades atingidas. Comunidades tradicionais sĂŁo destituĂdas de seus meios de vida, que vinham assegurando a manutenção e a reprodução de seus modos de vida: a terra, o patrimĂ´nio, a comunidade, a memĂłria coletiva e o uso compartilhado de recursos. A partir da Ăłtica de mercado, o Estado e os empreendedores pĂşblicos e privados veem o territĂłrio como mercadoria. Fazem parte da implantação do projeto caĂłtico e mortal a manipulação das informaçþes, a distorção da opiniĂŁo pĂşblica e uma promessa vaga de que ninguĂŠm vai sair perdendo, de que nĂŁo vai haver prejuĂzo VLJQLÂżFDWLYR DR PHLR DPELHQWH H TXH WRGD PDQLIHVWDomR FRQWUiULD p GLVcurso de extremistas que sĂŁo contra o desenvolvimento. As pessoas sĂŁo apenas empecilhos a serem removidos, e o estudo de impacto sobre o meio ambiente ĂŠ apenas um detalhe a ser fraudado. O projeto de implantação do caos exige o sacrifĂcio ambiental e humano.
3DUD UHÀHWLU Que outras situaçþes concretas de projetos de restabelecimento do caos se manifestam em nossa sociedade e que exigem nossa reação? Quais são as formas de reação e de resistência que precisamos criar a partir de QRVVD HVSLULWXDOLGDGH H FRQ¿VVmR GH Ip" O compromisso que brota do projeto de vida estabelecido por Deus na criação, onde a ågua Ê sinônimo de bênção e renovação da vida, exige TXH OXWHPRV SDUD TXH R ULR 8UXJXDL H VHXV DÀXHQWHV FRQWLQXHP D FRUUHU OLYUHPHQWH D ¿P GH SRGHUPRV XVXIUXLU GH VXDV ErQomRV 4XHUHPRV TXH os agricultores familiares e as comunidades tradicionais permaneçam em suas propriedades e territórios. Queremos que permaneçam intocåveis os UHFXUVRV QDWXUDLV D ÀRUD H D IDXQD SRLV FRQVWLWXHP XP SHTXHQR SDUDtVR que ainda se mantÊm e pode servir como oportunidade de lazer com acesso livre e democråtico.
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Canto Final Água (Pa. Louraini Christmann – Lola)
Bendita água que temos Bendita água que somos Somos água Somos à imagem de Deus Então Deus é água E somos água E temos água No céu No ar No rio No mar Na caixa No cano Na torneira No tanque Límpida água Limpa (...e água entende de limpeza de lavar GH SXUL¿FDU«
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Água na pia No lavar matinal Água na pia No lavar batismal Bendita água que temos MALDITA GENTE QUE SOMOS Porque água saudável Água “tomável” Água potável Está acabando por aqui Até mesmo no nosso Aquífero Guarani.
MARIANA:
quantas lágrimas disfarçamos sem berro? “Foi uma coisa muito triste no dia do rompimento, nós não estávamos esperando que isso acontecesse. Escutamos pela televisão o que tinha acontecido lá em Mariana (Minas Gerais), que ia descer pela foz do rio Doce, mas ninguém imaginava que esse mar de lama fosse mesmo chegar. Só fui sentir que fomos atingidos quando os meus três botes, minhas redes e materiais de pesca, que eram meu sustento, afundaram com a lama. Percebemos logo o impacto quando a gente começou a ver os peixes boiando, subindo por cima das águas. Ficamos muito chocados porque nós, como moradores, tivemos que tirar do rio os peixes podres, fedendo. E aquilo ali me deu uma tristeza muito grande... Até hoje eu lembro e começo a chorar, de ver aqueles peixes que nos alimentavam, que nos sustentavam, todos mortos.
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Meu rio nĂŁo volta mais. Minha comunidade nĂŁo ĂŠ mais a mesma. NĂŁo podemos mais beber da ĂĄgua, nĂŁo podemos mais comer do peixe, nem vender para o sustento de nossas famĂlias: um estado triste, decadente. Na minha comunidade tem gente doente, acamada, gente que era ativa, que gostava de ir para o rio pescar. Eu tinha a minha vida no rio, era pescadora, nĂŁo sabia fazer outra coisa a nĂŁo ser pescar. A minha vida hoje ĂŠ sem graça, sem sentido. Hoje eu me considero do lar, jĂĄ nĂŁo posso mais ir ao rio pescar porque os peixes estĂŁo contaminados, doentes. Na minha casa moram comigo meu esposo, PLQKD ÂżOKD 6RÂżD GH VHWH DQRV H PHX ÂżOKR PDLV YHOKR 1DWDQDHO GH anos. Hoje estamos sem ganho nenhum. Nem a Renova (entidade responsĂĄvel pela mobilização para a reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem de FundĂŁo, em Mariana – MG), a Samarco, ou a BHP Billiton (responsĂĄveis pelo crimetragĂŠdia) reconheceram as pessoas de fato como pescadores\as. A Renova QmR PH SDJRX QmR WLYH D LQGHQL]DomR GRV PHXV EHQV TXH ÂżFDUDP HPEDL[R GD ODPD +RMH D QRVVD YLGD ÂżFRX VHP VHQWLGR D DOHJULD GD JHQWH DTXL IRL embora. O meu esposo pega o cartĂŁo emergencial, esse cartĂŁo tem que dar para a gente comer e sobreviver. Mas antes disso eu jĂĄ sobrevivia, eu jĂĄ WLQKD YLGD QR ULR (X WLQKD PHX SHVFDGR PLQKD UHQGD RV PHXV ÂżOKRV tinham lazer, hoje nĂŁo tĂŞm mais nada. A Ăşnica coisa que nos fortalece sĂŁo os movimentos que a gente faz com o MAB. O Movimento dos Atingidos por Barragens veio para nos dar força, animar e mostrar que nem tudo estĂĄ perdido. NĂłs estamos nos organizando como comunidade para lutar contra esse dragĂŁo de lama chamado Renova. Diante dela nĂłs somos pequenos, mas estamos aprendendo a lutar. Isso tudo que aconteceu na nossa vida nos despertou. Hoje, alĂŠm de sofredores, nĂłs somos lutadores.â€?
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Sou Patrícia Ambrósio, mulher lutadora de 46 anos, pescadora e ribeirinha de Pedra Corrida, município de Periquito (MG), médio Rio Doce, e sou uma sobrevivente. No dia 5 de novembro de 2015, ocorreu o rompimento da barragem de Fundão, da Samarco (a Vale e a BHP Billington são as mineradoras controladoras da Samarco). Foram retiradas 11 toneladas de peixes mortos do rio Doce um mês após o crime-tragédia, que deixou 19 mortos e é considerado o maior desastre ambiental do Brasil.
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Ă gua fonte de saĂşde Neusa Maria Gomes da Silva5
“Quem der ainda que seja apenas um copo de ĂĄgua fria a um desses pequeninos, por ser meu discĂpulo, eu garanto a vocĂŞs: nĂŁo perderĂĄ a sua recompensa.â€? (Mt 10.42)
a) Preparar um ambiente acolhedor – se possĂvel espalhar cartazes ou projetar imagens sobre a situação que serĂĄ abordada b) Dar as boas-vindas c) Invocar a luz do EspĂrito Santo d) Apresentar brevemente a motivação para o encontro e) Canto inicial
Introdução “A comunidade cristĂŁ, lendo Mateus, ĂŠ convidada a olhar para dentro GH VL PHVPD D ÂżP GH GHVFREULU D SUHVHQoD GH -HVXV TXH HQVLQD D SUiWLFD da justiça. Desse modo, a comunidade aprenderĂĄ a dizer a palavra certa e 5 Reverenda da Igreja Presbiteriana Unida (IPU) – Rio de Janeiro.
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a realizar a ação oportuna, no tempo e lugar em que estĂĄ vivendo.â€? (BĂblia Pastoral) O Reino de Deus ĂŠ feito de gestos de amor, solidariedade e justiça. Jesus sempre esteve atento ao clamor e Ă s necessidades do povo de sua ĂŠpoca e tambĂŠm nos dias de hoje. Precisamos ser sensĂveis ao clamor de nosso povo com relação Ă ĂĄgua, pois ela ĂŠ fundamental para a subsistĂŞncia e vida saudĂĄvel do ser humano.
8PD H[SOLFDomR GR WH[WR EtEOLFR 2V SULPHLURV GLVFtSXORV QmR WLQKDP OXJDU Âż[R LDP GH FDVD HP casa, de aldeia em aldeia para anunciar a vinda do reino de justiça e paz com palavras, açþes, e seguindo os ensinamentos de Jesus para libertar o homem e a mulher de todo tipo de opressĂŁo. Eles eram pessoas malvistas e perseguidas pela sociedade de sua ĂŠpoca. A regiĂŁo de Israel era seca e quente, e era uma atitude hospitaleira quando um judeu dava um copo de ĂĄgua fria em vez de quente. As pessoas consideradas importantes recebiam ĂĄgua fria para saciar sua sede. e SHOD DWLWXGH GH DFROKLPHQWR H VROLGDULHGDGH FRP R RXWUR H D RXWUD que receberemos o galardĂŁo, pois esta ĂŠ a recompensa prometida por Jesus: “E quem der a beber, ainda que seja um copo de ĂĄgua fria, a um destes pequeninos, por ser este meu discĂpulo, em verdade vos digo que de modo DOJXP SHUGHUi R VHX JDODUGmR´ 0W 1DGD PDLV JUDWLÂżFDQWH GR TXH oferecer um copo de ĂĄgua fria a quem estĂĄ cansado e sedento. As nossas açþes precisam ser sempre fruto da nossa fĂŠ em Jesus Cristo, que nos ensinou como servir atravĂŠs de diversos dons. “Acolhimento ĂŠ a palavra-chave para a nova famĂlia e comunidade de Jesus, baseada nos valores da solidariedade, da paz, do cuidado e da justiça. Solidarizar-se com as pessoas que assumem atitudes profĂŠticas, justas e assumem a posição de pequenos ĂŠ o mandato de Jesusâ€? (Claudete Ulrich).
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Uma provocação a partir da vida A ĂĄgua ĂŠ fundamental para o ser humano. Ela constitui a matriz da prĂłpria vida, se faz presente na origem da nossa existĂŞncia. Somos setenta por cento ĂĄgua. A vida humana nĂŁo ĂŠ possĂvel sem ela. Começamos a perceber e a nos conscientizar da importância desse bem precioso quando, nas ~OWLPDV GpFDGDV FRQVWDWRX VH D VXD ÂżQLWXGH 0HVPR DVVLP R GHVSHUGtFLR ainda ĂŠ muito grande e a sua distribuição nĂŁo ĂŠ igualitĂĄria. (P WRGR R PXQGR GD iJXD XVDGD p GHYROYLGD DR PHLR DPELHQWH VHP WUDWDPHQWR &HUFD GH GRV SLRUHV GHVDVWUHV QDWXUDLV KXPDQLWiULRV nos Ăşltimos 25 anos estiveram relacionados com a ĂĄgua, como cheias e secas. Soma-se a isto que, em muitos lugares do mundo, no Brasil inclusive, a ĂĄgua, um bem comum bĂĄsico e natural, ĂŠ privatizada e comercializada. No Brasil, os casos de Mariana e Brumadinho sĂŁo os mais fortes exemplos que demandam luta e compromisso por parte da Igreja de Jesus Cristo. Na maioria das vezes, a Igreja ĂŠ uma expectadora silenciosa. E o JRYHUQR QmR WHP UHVSRQGLGR HVWDV TXHVW}HV GH IRUPD HÂżFLHQWH (OH ÂżFD ao lado das grandes corporaçþes responsĂĄveis por esses crimes em vez de SURPRYHU OHLV SROtWLFDV H Do}HV SDUD TXH WDLV DWRV QmR ÂżFDVVHP LPSXQHV mas fossem considerados crimes contra a humanidade. Precisamos retomar “a proposta do Conselho Mundial de Igrejas, onde estĂĄ alocada a Rede EcumĂŞnica da Ă gua, em documento aprovado pela Assembleia Geral do ĂłrgĂŁo em 2006, (de) que as Igrejas coloquem o tema em pauta, que se posicionem ao lado de quem tem sido excluĂdo do acesso Ă ĂĄgua e que defendam o acesso como direito humano, demandando transparĂŞncia e justiça nos processos que envolvem a privatização da vidaâ€?. “Durante o 8Âş FĂłrum Mundial da Ă gua, realizado no Brasil em 2018, grupos religiosos reuniram-se no FĂłrum Alternativo Mundial da Ă gua, incluindo a Rede EcumĂŞnica da Ă gua, e levantaram suas vozes para
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UHIRUoDU D GLPHQVmR HVSLULWXDO GD iJXD H D D¿UPDomR GD iJXD FRPR XP bem comum, que não pode ser privatizado e deve ser colocado à disposição de todos os seres viventes�. (Revista Carta Capital on line, março de 2019).
3DUD UHĂ€HWLU a) A Organização Mundial de SaĂşde (OMS) GHÂżQH VD~GH FRPR “um estado de completo bem-estar fĂsico, mental e social e nĂŁo somente ausĂŞncia de afecçþes e enfermidadesâ€?! SerĂĄ que temos tido esse entendimento a respeito da vida das pessoas menos favorecidas Ă nossa volta? b) O que podemos fazer contra a comercialização da ĂĄgua, que resulta em contaminação e redução do abastecimento, e pela implementação do direito humano Ă ĂĄgua e ao saneamento para todos, sem exceção? F 9RFr SHUFHEH TXH p XUJHQWH TXH VXD FRPXQLGDGH GH Ip UHDÂżUPH R inestimĂĄvel valor da ĂĄgua e promova atitudes individuais e coletivas de cuidado e preservação desta que ĂŠ a fonte de toda vida? “O que a vida quer da gente ĂŠ coragem!â€? (GuimarĂŁes Rosa) Oração Senhor, Deus da vida, perdoa-nos por todas as vezes em que, em nosso caminhar e no caminhar da nossa comunidade de fĂŠ, deixamos de acolher e ser solidĂĄrias/os com os “pequeninos do teu reinoâ€?. Deixamos de nos envolver na luta contra as grandes corporaçþes que privatizam a ĂĄgua. Senhor! Tu criaste os rios, as fontes e todos os veios de ĂĄgua, para que de forma igualitĂĄULD SXGpVVHPRV XVXIUXLU GHVVH EHP FRPXP $MXGD QRV D DFROKHU WHXV ÂżOKRV H WXDV ÂżOKDV TXH VRIUHP H PRUUHP SHOD IDOWD GHVWH EHP WmR SUHFLRVR (P QRPH de Jesus, que estĂĄ conosco em nossas lutas diĂĄrias! AmĂŠm!
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Ă GUA TĂ“XICA, LUTO E LUTA Era 25 de janeiro de 2019, 12h28min, horĂĄrio do almoço, quando a barragem cĂłrrego do FeijĂŁo, em Brumadinho (MG), se rompeu. TrabalhaGRUHV DV PmHV SDLV ÂżOKRV DV DQLPDLV Ă€RUHVWDV H FDVDV IRUDP VRWHUUDGRV por 12 milhĂľes de metros cĂşbicos de lama tĂłxica, vĂtimas do maior crime socioambiental e humano do paĂs, protagonizado mais uma vez pela Vale, D PDLRU PLQHUDGRUD GR %UDVLO )RUDP PRUWHV FRQÂżUPDGDV SHVVRDV desaparecidas e cerca 600 desabrigados/as. O crime – tragĂŠdia deixou marcas de destruição e rastros de sofrimento nas comunidades vizinhas ao cĂłrrego do FeijĂŁo e ao rio Paraopeba. Sem ĂĄgua potĂĄvel, a população de Cachoeira do Choro, povoado que pertence ao municĂpio de Curvelo, vive diretamente as consequĂŞncias do modelo de mineração predatĂłrio adotado pela VALE. A relação harmoniosa e equilibrada entre meio ambiente e ribeirinhos/as deixa existir. Os danos sĂŁo incalculĂĄveis e colocam em risco a sobrevivĂŞncia e a saĂşde das pessoas que residem nesta comunidade. “Era um local bastante visitado, com muitos peixes e cachoeiraâ€?, relembra Eliana Marques, que antes dos rejeitos de lama chegarem ao rio Paraopeba vendia seu pescado para turistas. Hoje, afetada pela falta de abastecimento de ĂĄgua tratada, restaram para a regiĂŁo ĂĄguas turvas e contaminadas. “Boa parte das famĂlias viviam e dependiam do rio. A contaminação matou os peixes e espantou a visitação turĂstica. Com isso, muitas pessoas foram embora em busca de emprego e melhores condiçþes de vidaâ€?, explica a pescadora que mora na comunidade hĂĄ 13 anos. A ĂĄgua que sai das torneiras ĂŠ malcheirosa e apresenta uma coloração estranha: “Uma borra preta, com odor e totalmente imprĂłpria para FRQVXPR ,VVR TXDQGR QmR ÂżFDPRV GLDV VHP R DEDVWHFLPHQWR´ H[SOLFD Eliana. Segundo ela, atravĂŠs de uma visita tĂŠcnica, a VALE se eximiu da UHVSRQVDELOLGDGH SHOD SpVVLPD FRQGLomR GD iJXD H DÂżUPRX TXH D REULJDomR pela distribuição do recurso hĂdrico a partir do poço artesiano na Cachoeira
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do Choro é exclusivamente da Copasa – Companhia de Saneamento de Minas Gerais. Esta, por vez, nega a presença de materiais pesados. Em nota divulgada no mês de março ao Brasil Fato, a Copasa informou que a água direcionada para a região está dentro dos critérios estabelecidos pelo Ministério da Saúde, e que a captação do rio Paraopeba está suspensa desde o dia do rompimento da barragem do córrego do Feijão. Mas segundo a pescadora, a empresa não disponibiliza suas análises para a população: “A empresa informa que a água está boa, mas água potável é transparente e não tem mau cheiro. A Copasa só dá acesso aos resultados de coliformes fecais, não dos metais tóxicos provenientes da lama.”. Outro impacto causado pela alteração do estado da água foi a eliminação de produções rurais orgânicas das pequenas propriedades. A contaminação do lençol freático e dos poços artesianos impediu a continuidade das plantações nos quintais, bem como a criação de animais para a subsistência das famílias. Eliana Marques relata que, além da pesca, sua família utilizava o terreno para plantar feijão, raízes e frutas: “Infelizmente não tive como manter o quintal. Sem água limpa não dá para plantar, colher e comer. Tive que me desfazer dos animais para não vê-los morrer aqui”. Além do sofrimento mental pela contaminação e falta de água, os/as moradores/as têm apresentado sintomas de doença como diarreia, vômitos, febre, manchas na pele e coceira no corpo. Eliana Marques sente literalmente na pele o que acredita ser a consequência do contato com a água: “Meu braço está manchado e ainda tenho dores locais. O cachorro da minha vizinha morreu, nunca apresentou outra doença, mas após o contato FRP R ULR ¿FRX GRHQWH H QmR UHVLVWLX´ Outro agravante é a inexistência de um posto de saúde em Cachoeira do Choro. Segundo a pescadora, os/as moradores/as recorrem ao atendimento médico em cidades vizinhas. “As pessoas se deslocam com muita GL¿FXOGDGH SDUD PXQLFtSLRV YL]LQKRV H QmR WrP FRPR FRPSURYDU RQGH
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UHVLGHP R TXH DFDED GLÂżFXOWDQGR D LGHQWLÂżFDomR GH TXH D GRHQoD p RULXQGD do rio Paraopeba.â€? Sentindo a dor, a revolta e a insegurança que o crime da VALE causou na sua vida e na da comunidade, Eliana uniu-se a outras pessoas atingidas para formar comissĂľes para lutar por reparação, direitos e justiça. A cachoeirense integra a ComissĂŁo dos Atingidos da Cachoeira do Choro – Curvelo (MG), que atualmente tem pautado fortemente a questĂŁo do acesso a ĂĄgua de qualidade e a questĂŁo da saĂşde dos/as moradores/as. Em Brumadinho, a ganância e a negligĂŞncia estiveram acima da vida, do meio ambiente, da saĂşde e do trabalho seguro. No povoado de Curvelo, a resistĂŞncia estarĂĄ por cima do luto e da angĂşstia de quem perdeu WXGR 0mH GH WUrV ÂżOKRV H XP QHWR (OLDQD FRQWLQXDUi OXWDQGR SHOR GLUHLWR de viver: “Apesar da indignação e da tristeza, nĂŁo sossegarei enquanto nĂŁo tivermos ĂĄgua de qualidade. Me tiraram o rio, mas me deixaram a vida para continuar lutando.â€?
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Água: Fonte de vida Camila Mantovani6 Helivete Ribeiro7
a) Preparar um ambiente acolhedor – se possível espalhar cartazes ou projetar imagens sobre a situação que será abordada b) Dar as boas-vindas c) Invocar a luz do Espírito Santo d) Apresentar brevemente a motivação para o encontro e) Canto inicial
Introdução A água como um bem social, econômico e ambiental é um direito de todo ser humano. Sua escassez e privação são experimentadas de maneira extremante dramática por mulheres e homens que vivem na pobreza e, com muita frequência, nos países mais pobres. O acesso à água potável e ao saneamento é indispensável para a vida e para o desenvolvimento das comunidades espalhadas pelo mundo. 6 Membra da Aliança de Batistas do Brasil e da Igreja Batista do Caminho. 7 Pastora da ABBB – Integra a Direção Institucional da CESE e a Coordenação estadual do CEBI-Pernambuco
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Como elemento essencial para a vida dos seres humanos, embora não seja valorizada como tal, a água é, muitas vezes, desperdiçada. No entanto, sob o ponto de vista moral, o ato de esbanjar água é insustentável.
8PD H[SOLFDomR GR WH[WR EtEOLFR “E Jacó não tinha sede, quando o levava pelos desertos; fez-lhe correr água da rocha; fendendo ele as rochas, as águas manavam delas.” (Isaías 48,2) No livro de Isaías é apresentada a salvação de Deus para o ser humano. Esse ato revela a profecia da salvação em Jesus, a rocha ferida, fendida no Calvário para que, do seu interior, brotassem águas para saciar a sede da nossa alma. Sede de paz, de alegria e de vida. Na Bíblia, a água WHP R VLJQL¿FDGR GD SUHVHQoD GH 'HXV $VVLP FRPR D iJXD WHP D IXQomR GH saciar a sede, lavar o que está sujo, refrigerar o que está quente e trazer vida onde existe morte, também as águas da presença de Deus saciam nossa sede espiritual, refrigeram a nossa alma e trazem vida ao nosso coração morto. A aparência de uma terra seca é deprimente, uma vez que nos transmite uma mensagem de sequidão total, morte, sofrimento, vazio e ausência de vida. O aquecimento global e toda a questão do meio ambiente, os próprios desastres ecológicos vivenciados tragicamente ou divulgados de maneira sensacionalista pela mídia estão levando a população a perceber que é hora de mudar. Porém, uma nova postura ecológica diante da vida ameaçada ainda não é muito perceptível. Fontes, riachos, rios e mares continuam sendo contaminados pelos esgotos, pela sujeira produzida pelo consumismo insaciável e inconsequente. Como agentes do Reino, cabe a nós desenvolver em nós uma postura de percepção e sensibilidade para que possamos captar as tendências e, atentas e atentos aos gritos da terra, agir de maneira criativa e solidária em prol da defesa da vida do planeta.
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SeguLQGR QRVVD UHÀH[mR QD SHUVSHFWLYD SURIpWLFD YDPRV DFRPSDnhar o que nos diz o profeta Jeremias: “Porque dois males que meu povo tem feito: eles me abandonaram, fonte de águas vivas, e cavaram para si mesmos cisternas, cisternas rachadas que não retêm água.” (Jeremias 2,13) A água é um dos elementos mais importantes na fé cristã. Não poderia ser diferente. Já que a água garante a nossa vida de maneira concreta, que outro símbolo poderia ser tão potente para expressar Deus como garantidor da vida? Infelizmente, com o passar dos anos, nos temos distanciado do entendimento de que Deus se manifesta em toda a sua criação. Gastamos tanto tempo buscando Deus nos lugares celestiais que não percebemos sua doce e maravilhosa presença manifesta na concretude do chão que pisamos, dos animais que acariciamos e da água que bebemos. E esse distanciamento que temos provocado entre Deus e sua criação tem gerado DUJXPHQWRV TXH MXVWL¿FDP WRGD D H[SORUDomR H GHVWUXLomR GD QDWXUH]D Quando pensamos que nosso Deus é parte de tudo que há e que seu sopro, que nos garantiu vida, também garante a vida de toda a natureza, não conseguimos nos manter alheios à degradação que o sistema impõe. As guerras provocadas pela falta de água já não são uma previsão distante, mas uma realidade para muitas pessoas no mundo. As crises hídricas provocadas pelo monopólio da água que detêm as grandes indústrias e mineradoras já têm afetado a milhões de brasileiros de diferentes Estados. 2 GHVD¿R GD LJUHMD KRMH QR %UDVLO p QmR FDLU QD DUPDGLOKD GR GLVcurso do progresso e desenvolvimento. São essas duas palavrinhas que mais têm sido utilizadas para manipular a opinião pública e garantir que as cidadãs e os cidadãos brasileiros se mantenham longe de todo o debate sobre justiça socioambiental. Em nome do progresso contaminam-se os rios, em nome do desenvolvimento privatiza-se a água. Esse sistema que rege todo o mundo hoje é uma máquina de moer a vida, e nossas comuniGDGHV WrP R GHVD¿R GH VHU D YR] SURIpWLFD TXH GHQXQFLD R SHFDGR GR OXFUR que se sobrepõe à criação de Deus.
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Todas as vezes que deixamos esse conceito de progresso e desenvolYLPHQWR WRPDU HVSDoR QDV QRVVDV PHQWHV FRPR MXVWLÂżFDWLYD SODXVtYHO SDUD a degradação ambiental, estamos cavando cisternas rachadas incapazes de reter ĂĄgua. Quando vemos as crises hĂdricas geradas pelo capitalismo e agimos como se o problema nĂŁo fosse nosso, estamos cavando cisternas rachadas que nĂŁo sĂŁo capazes de reter ĂĄgua. Quando nos calamos como igreja, estamos cavando cisternas rachadas incapazes de reter ĂĄgua. A ĂĄgua como fonte da vida no coração da BĂblia reforça que Jesus ĂŠ D IRQWH GH iJXD GD YLGD &RPR ÂżOKDV H ÂżOKRV GH 'HXV WHPRV R FRPSURPLVVR de sensibilizar as pessoas da importância do meio ambiente, por sermos parte fundamental da criação divina.
Uma provocação a partir da vida Considerando as atuais condiçþes de vida no planeta terra, com D GHYDVWDomR GDV Ă€RUHVWDV D HVFDVVH] GH iJXD H R DF~PXOR GH OL[R DV FRPXQLGDGHV GH Ip WDPEpP GHYHP ÂżUPDU VHX FRPSURPLVVR GH DSRLDU H incentivar a defesa da preservação do meio ambiente. Como coparticipantes da criação, nossa responsabilidade ĂŠ zelar, cuidar, promover açþes que possam dar uma melhor qualidade de vida ecolĂłgica. Entre as mĂşltiplas açþes na pauta ecolĂłgica, precisamos priorizar a ĂĄgua. Baseados nos valores do Reino de Deus, de que maneira podemos pensar numa proposta de desenvolvimento que nos assegure que a vida nĂŁo serĂĄ mais destruĂda em nome do capital? Como garantimos o progresso atendendo ao chamado ĂŠtico do cristianismo de cuidado e zelo com toda a criação? O que podemos fazer como igreja de Jesus para garantir o acesso Ă ĂĄgua potĂĄvel, Ă qual todas e todos temos direito? Como engajamos nossas comunidades na luta por justiça socioambiental, compreendendo Deus como parte de tudo que hĂĄ? SĂŁo as tantas cisternas rachadas deste mundo que nos tĂŞm distanciado de Deus, fonte de ĂĄgua viva. SĂł deixaremos de ter sede quando nos
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arrependermos e nos voltarmos a Ele. Ele que se manifesta em cada rio, em FDGD iUYRUH QRV DQLPDLV QR PDU QR DU e WHPSR GH GHVWUXLU DV FLVWHUQDV UDFKDdas e de reconectar-nos à verdade manifesta de Deus em toda a natureza. O tema da campanha desse ano abre uma maravilhosa oportunidade para nós vivenciarmos, como igreja, um discipulado corajoso e transformador que possa assumir um compromisso com a dignidade da criação de Deus.
Meditar a partir da mĂşsica “Canção pela vidaâ€? Canção pela vida (ZĂŠ Vicente)
Passarim, meu passarinho, desapareceu no mato e o mato, meu matinho, desapareceu no fogo, mas o fogo morreu cedo, deixou cinzas no meu peito. Meu tatu, meu tatuzinho, se escondeu, buraco fundo homem cavou meio mundo, mas a fome nunca passa, quem tĂĄ vivo vira caça e deixa um gosto de saudade! Meu Ăndio, meu indiozinho, sou caboclo amansado; minha avĂł pegada a dente de cachorro bem treinado, onde foram meus parentes? Meu paraĂso encantado?
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Deixa eu cantar as mĂĄgoas sobre as ĂĄguas poluĂdas; deixa eu chorar as feridas de minha terra, minha gente, deixa eu plantar no presente uma canção dolorida! Um instante de silĂŞncio e esta canção pela vida!
AS Ă GUAS DO AMAZONAS PEDEM SOCORRO O rio Amazonas atravessa os estados do Amazonas e do ParĂĄ atĂŠ cheJDU D VXD IR] FRP NP GH ODUJXUD e R PDLRU ULR GR PXQGR HP YROXPH de ĂĄgua e em extensĂŁo, com 6.992,06 km. Josana Pinto da Costa, 43, pescadora artesanal, vĂŞ com tristeza o descaso com as ĂĄguas do rio Amazonas. Ela e seu companheiro vivem GD SHVFD GHVGH )LOKD GH DJULFXOWRUHV FULRX ÂżOKRV DWUDYpV GHVVD atividade, na comunidade de Amador, no municĂpio de Ă“bidos, Ă s margens do Rio Amazonas, no estado do ParĂĄ. â€œĂ s ĂĄguas do Amazonas pedem VRFRUUR´ DÂżUPD -RVDQD UHOHPEUDQGR R RFRUULGR Qa cidade de Barcarena, no interior do ParĂĄ. Foi o grito da natureza que trouxe Ă tona a grave contaminação dos rios da regiĂŁo, causada pelo vazamento de bauxita das operaçþes da empresa mineradora Hydro Alunorte, em fevereiro de 2018. Bastaram dois dias de fortes chuvas para que a subida do nĂvel das ĂĄguas revelasse a cor avermelhada da contaminação. O MinistĂŠrio PĂşblico (MP) do ParĂĄ recebeu denĂşncias da população atingida, preocupada com a situação, mas RV ÂżVFDLV GD 6HFUHWDULD GR 0HLR $PELHQWH GR (VWDGR 6HVPD LQVSHFLRQDram a mineradora e informaram que nĂŁo havia vazamento. Os laudos nĂŁo convenceram. O vazamento da barragem de rejeitos da empresa Hydro
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Alunorte provocou a contaminação e propagou doenças em vĂĄrias cidades ribeirinhas do ParĂĄ. Segundo Jackson Dias, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), cerca de 15 a 20 mil famĂlias foram atingidas por essa poluição na bacia do rio ParĂĄ. A perĂcia constatou ainda a existĂŞncia de um duto clandestino que conduzia resĂduos poluentes para cursos d’ågua na regiĂŁo. Um ano depois da constatação do crime ambiental, a empresa segue negando que tenha ocorrido um vazamento e, com isso, protelando a atenção aos atingidos. “A atividade mineradora tem soterrado muitos rios e igarapĂŠs, ĂĄreas onde quem vive da pesca artesanal exerce sua atividade. Os rios, antes cristalinos, agora parecem desprovidos de vida. Os peixes morreram, graças aos dejetos jogados em suas ĂĄguas por empresas como a Hydro Alunorte e a Alcoa. Sem falar nos rios que foram soterrados pela escavação na extração do minĂŠrio. Tudo que ĂŠ extraĂdo da terra pelas mineradoras acaba com nossas ĂĄguas, a ĂĄgua que bebemos, que cozinhamos, a ĂĄgua HP TXH SHVFDPRV´ DÂżUPD -RVDQD $ SHVFDGRUD DOHUWD TXH DLQGD Ki PXLWR o que denunciar e resistir para que essa situação nĂŁo piore. Entre Juriti e SantarĂŠm, nos municĂpios de Lago Grande e Ă“bidos, estĂĄ em andamento um mapeamento pela Alcoa para retirada de vĂĄrias famĂlias que estĂŁo sobre XPD iUHD Mi LGHQWLÂżFDGD FRPR XPD JUDQGH PLQD GH EDX[LWD $OpP GD SURximidade de reservas indĂgenas, essas ĂĄreas sĂŁo habitadas por populaçþes tradicionais. SĂŁo cerca de 75 comunidades que representam mais de 10.000 famĂlias ribeirinhas. HĂĄ tambĂŠm a contaminação das ĂĄguas pelo esgoto das cidades, que ĂŠ jogado diretamente no rio, e pelo veneno que vem do ar. “A pulverização por agrotĂłxicos em ĂĄreas de vĂĄrzea que alagam todo ano e aonde se ateia fogo para ampliar as regiĂľes de pastagens leva tambĂŠm para as ĂĄguas doces mais contaminação. A Cargill, poderosa representante do agronegĂłcio em SantarĂŠm, com a instalação de portos para escoamento dos grĂŁos que produz, tambĂŠm tomou uma grande ĂĄrea de praia, local de ancoragem de embarcaçþes e da atividade pesqueira nos perĂodos de cheia.
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O Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP) ĂŠ formado por homens e mulheres que produzem alimentos saudĂĄveis e contribuem para a soberania alimentar do paĂs. Essas pessoas tĂŞm um importante papel de defesa do territĂłrio pesqueiro e de preservação das ĂĄguas no paĂs. Em parceria com o CPP – Conselho Pastoral dos Pescadores Âą R PRYLPHQWR SURPRYH RÂżFLQDV SDUD VHQVLELOL]DU DV FRPXQLGDGHV ULEHLULnhas dos danos causados por grandes empreendimentos e debater o Projeto de Lei de Iniciativa Popular que cria um marco legal para a garantia e PDQXWHQomR GR WHUULWyULR -RVDQD XPD GDV IDFLOLWDGRUDV GDV RÂżFLQDV UHYHOD “No ParĂĄ a luta ĂŠ contra o hidro, o agro e o minĂŠrio-negĂłcio que tem atingido a nossa forma de viver, a nossa cultura e a nossa soberania alimentar. e QHFHVViULR DOLDU VH D RXWUDV YtWLPDV TXH VmR DWLQJLGDV SRU HVVH PRGHOR desigual do lucro e do capital que se sobrepĂľe Ă dignidade e ao bem-viver das comunidades tradicionais do Brasil. JĂĄ somos historicamente explorados pelos atravessadores, que compram nosso pescado por cerca de R$ 0,90 H UHYHQGHP QDV FLGDGHV SRU 5 D 5 e PXLWD H[SORUDomR GH todos os lados As comunidades ribeirinhas do ParĂĄ assistem Ă chegada do WDO ÂľSURJUHVVRÂś LQWHQVLÂżFDGR D SDUWLU GH FRP D DWXDomR GH PLQHUDGRUDV H DÂżUPDP Âľ2 TXH p SURJUHVVR SDUD HOHV p PRUWH H GHVWUXLomR SDUD QyVϫ Mesmo com tantas violaçþes, Josana ĂŠ motivada pelo orgulho e alegria de ser pescadora, e com esperança acredita na uniĂŁo e na articulação GRV PRYLPHQWRV VRFLDLV IUHQWH D WDQWDV YLRODo}HV GH GLUHLWRV Âłe SUHFLVR lutar com dignidade para garantir o bem-viver das comunidades tradicionais no Brasilâ€?.
%LEOLRJUDÂżD FERNANDES, Leonardo. Barcarena: hĂĄ um ano, mais uma tragĂŠdia marcava a mineração no Brasil. SĂŁo Paulo. 17 fev. 2019. DisponĂvel em: <https://www.brasildefato.com.br/2019/02/17/barcarena-ha-um-ano-mais-uma-tragedia-marcava-a-mineracaono-brasil/>. Acesso em:13 ago. 2019.
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Falta de água: Um problema com nome de mulher Claudia Florentin Mayer8
Quadros jurídicos A importância de envolver homens e mulheres na gestão da água e do saneamento foi reconhecida em todos os níveis, começando com a Conferência das Nações Unidas de Mar del Plata em 1977, a Década Internacional de Água Potável ea Saneamento (1981-1990) e a Conferência Internacional sobre Água e Meio Ambiente, em Dublin, em janeiro de 1992, que reconhece explicitamente o trabalho fundamental das mulheres na provisão, gestão e proteção da água. Referência é feita novamente a este item na Agenda 21 (Capítulo 18) e no Implementação de Joanesburgo. Além disso, com a declaração da Década Internacional para a Ação “Água, Fonte de Vida” 2005-2015, pede-se a participação e o envolvimento das mulheres nas iniciativas de desenvolvimento da água. 8 Membro da Igreja do Rio Valdese Del Rio La Plata. Feminista Jornalista Graduado em teologia no ISEDET. Especializada em Direito da Mulher pelo Diploma Universidad Austral-Argentina em mudanças climáticas e meio ambiente. Membro do Red TEPALI-Enlace cone sur. Editora e diretora adjunta da ALC Notícias. Texto gentilmente cedido pela Christian Aid Programa Brasil.
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â&#x20AC;˘ Os Objetivos de Desenvolvimento SustentĂĄvel (ODS) pedem a UHGXomR GH EDUUHLUDV H LVVR WHP XP VLJQLÂżFDGR HVSHFLDO SDUD D questĂŁo de gĂŞnero. â&#x20AC;˘ Embora a Igualdade de GĂŞnero tenha seu prĂłprio objetivo (ODS 5), ela nĂŁo pode ser alcançada sem atingir todas as outras metas e objetivos e vice-versa. Como podemos garantir a educação para todas as meninas (ODS 4) sem primeiro criar um ambiente que lhes permite ir Ă escola, tendo, por exemplo, casas de banho adequadas e ĂĄgua nas escolas (ODS6), levando-as a sair da pobreza (ODS 1), garantindo que elas nĂŁo passem fome ou sejam desnutridas (ODS 2) ou garantam que nĂŁo vivem em paĂses em guerra (ODS 16)? A ĂĄgua tambĂŠm ĂŠ uma parte crucial da adaptação Ă s mudanças climĂĄticas e ĂŠ o elo crucial entre a sociedade e o meio ambiente. A ĂĄgua ĂŠ, alĂŠm disso, uma questĂŁo de direitos. Ă&#x20AC; medida que a população mundial cresce, hĂĄ uma necessidade crescente de conciliar a competição entre as demandas comerciais dos recursos hĂdricos para que DV FRPXQLGDGHV WHQKDP R VXÂżFLHQWH SDUD VXSULU VXDV QHFHVVLGDGHV (P particular, mulheres e meninas devem ter acesso a instalaçþes sanitĂĄrias limpas que respeitem a privacidade para que possam gerenciar a menstruaomR H D PDWHUQLGDGH FRP GLJQLGDGH H VHJXUDQoD DÂżUPD D ONU. O direito de regar â&#x20AC;˘ Um dos marcos recentes mais importantes foi o reconhecimento pela AssemblĂŠia Geral das Naçþes Unidas do direito humano Ă ĂĄgua e ao saneamento em julho de 2010. A AssemblĂŠia reconheceu o direito de todos os seres humanos a ter acesso a uma quantidade GH iJXD VXÂżFLHQWH SDUD XVR GRPpVWLFR H SHVVRDO HQWUH H litros de ĂĄgua por pessoa por dia) e que seja seguro, aceitĂĄvel e DFHVVtYHO R FXVWR GD iJXD QmR GHYH H[FHGHU GD UHQGD IDPLOLDU
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H DFHVVtYHO ÂżVLFDPHQWH D IRQWH GHYH HVWDU D PHQRV GH PHWURV de distância da casa e sua coleta nĂŁo deve exceder 30 minutos). â&#x20AC;˘ 2V GHVDÂżRV GD DJXD KWWSV ZZZ LDJXD HV EORJV SDEOR JRQ]DOH] FHEULDQ FXDOHV VRQ GHVDÂżRV DJXD â&#x20AC;˘ 2,1 bilhĂľes de pessoas nĂŁo tĂŞm acesso a serviços de ĂĄgua potĂĄvel seguros gerenciados de maneira segura (WHO/UNICEF 2017). â&#x20AC;˘ 4,5 bilhĂľes de pessoas carecem de serviços de saneamento seguro gerenciados (WHO/UNICEF 2017). â&#x20AC;˘ 340.000 crianças menores de cinco anos morrem todos os anos de doenças diarreicas (OMS/UNICEF 2017). â&#x20AC;˘ A escassez de ĂĄgua jĂĄ afeta quatro em cada dez pessoas (OMS). â&#x20AC;˘ GRV GHVDVWUHV QDWXUDLV HVWmR UHODFLRQDGRV j iJXD (UNISDR). â&#x20AC;˘ GDV iJXDV UHVLGXDLV UHWRUQDP DR HFRVVLVWHPD VHP VHUHP WUDtadas ou reutilizadas (UNESCO, 2017). â&#x20AC;˘ Cerca de dois terços dos rios transfronteiriços do mundo nĂŁo possuem uma estrutura de gestĂŁo cooperativa (SIWI). â&#x20AC;˘ $ DJULFXOWXUD UHSUHVHQWD GD H[WUDomR GH iJXD GR PXQGR (FAO). â&#x20AC;˘ $SUR[LPDGDPHQWH GH WRGDV DV UHWLUDGDV GH iJXD LQGXVWULDLV sĂŁo usadas para produção de energia (UNESCO, 2014).
Ă gua e justiça de gĂŞnero Conceitos-chave Sobre o que estamos falando quando falamos de gĂŞnero? Refere-se aos papĂŠis sociais e relacionamentos entre mulheres e homens. Eles incluem as diferentes responsabilidades atribuĂdas a homens e mulheres em uma determinada cultura. Ao contrĂĄrio do sexo biologicamente determinado, os papĂŠis de gĂŞnero para mulheres e homens sĂŁo socialmente determinados e podem mudar com o tempo ou variar de acordo
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FRP D ORFDOL]DomR JHRJUiÂżFD H R FRQWH[WR VRFLDO $ LJXDOGDGH GH JrQHUR p entendida no sentido de acesso igual e equitativo a recursos, oportunidades e direitos. Em situaçþes de desigualdade de gĂŞnero, geralmente sĂŁo as meninas e mulheres desfavorecidas, excluĂdas dos processos polĂticos e do acesso a recursos econĂ´micos e sociais. Justiça ClimĂĄtica e XP FKDPDGR SDUD DOLYLDU D GHVLJXDOGDGH GH SHVR FDXVDGR SHODV alteraçþes climĂĄticas e transformar as relaçþes sociais que levam Ă desiJXDOGDGH HVSHFLÂżFDPHQWH D HFROyJLFR HFRQ{PLFR SROtWLFR H JHUDUDP H perpetuaram a exclusĂŁo, a pobreza ea marginalização de grupos especĂÂżFRV FRPR DV SHVVRDV LQGtJHQDV PXOKHUHV H RXWURV JUXSRV YXOQHUiYHLV As dimensĂľes de gĂŞnero tĂŞm estado ausentes nos principais acordos globais sobre mudança climĂĄtica global, por isso ĂŠ necessĂĄrio colocĂĄ-los no centro da discussĂŁo. A justiça climĂĄtica deve ser incluĂda nĂŁo apenas em discursos e polĂticas para a mudança climĂĄtica, mas tambĂŠm nas polĂticas editoriais dos meios de comunicação de massa. Vulnerabilidade Referem-se Ă exposição que as pessoas tĂŞm a riscos externos, choques e tensĂľes e sua capacidade de lidar com elas e se recuperar dos efeitos resultantes. A vulnerabilidade pode diferir dependendo do momento da vida em que as pessoas estĂŁo. Difere entre os vĂĄrios grupos de uma comunidade ou indivĂduos em um lar, dependendo de suas atividades econĂ´micas e classe social. As pessoas recorrem a uma sĂŠrie de estratĂŠgias de resposta para lidar com os momentos de tensĂŁo, embora muito provavelmente as estratĂŠgias disponĂveis para os mais pobres sejam muito limitadas e menos resilientes.
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Por que incluir a dimensĂŁo de gĂŞnero? O Mainstreaming9 de GĂŞnero ĂŠ o processo de avaliar as implicaçþes para homens e mulheres de qualquer plano de ação, incluindo legislação, polĂticas ou programas realizados em qualquer ĂĄrea e em qualquer nĂvel. e XPD HVWUDWpJLD SDUD WRUQDU DV SUHRFXSDo}HV H H[SHULrQFLDV GH PXOKHUHV H homens uma dimensĂŁo integral que ĂŠ aplicada ao desenho, implementação, monitoramento e avaliação de polĂticas e programas de todas as esferas, SDUD TXH KRPHQV H PXOKHUHV VH EHQHÂżFLHP LJXDOPHQWH GH WRGDV HODV Por que incluir as necessidades das mulheres em relação Ă ĂĄgua? â&#x20AC;˘ As mudanças na produção agrĂcola devido Ă s mudanças climĂĄticas globais tĂŞm um efeito crucial sobre a situação das mulheres, dado o papel fundamental que desempenham na produção de alimentos. As mulheres produzem, colhem e preparam a maior parte da FRPLGD QR PXQGR DV PXOKHUHV VmR UHVSRQViYHLV SRU GD SURGXomR QDFLRQDO GH DOLPHQWRV QD Ă&#x2C6;IULFD VXEVDDULDQD QD Ă&#x2C6;VLD H QD $PpULFD /DWLQD $ SURGXomR GH DOLPHQWRV QmR VH PDQWpP sem ĂĄgua. â&#x20AC;˘ Encontrar e transportar ĂĄgua, um recurso vital para toda a comunidade, ĂŠ uma tarefa tradicionalmente feminina. Quando esse recurso ĂŠ escasso, a carga de trabalho para as mulheres aumenta. O atendimento na escola e os cuidados de saĂşde para mulheres e meninas diminuem substancialmente Ă medida que a distância ItVLFD SDUD HQFRQWUDU R Ă&#x20AC;XLGR YLWDO DXPHQWD â&#x20AC;˘ Recomendo assistir a este vĂdeo: https://www.youtube.com/watch?v=xBNDZm6sXQU
9 Mainstream ĂŠ um conceito que expressa uma tendĂŞncia ou moda principal e dominante. A tradução literal de mainstream p ÂłFRUUHQWH SULQFLSDO´ RX ÂłĂ&#x20AC;X[R SULQFLSDO´ (P LQJOrV main VLJQLÂżFD SULQFLSDO HQTXDQWR stream VLJQLÂżFD XP Ă&#x20AC;X[R RX FRUUHQWH
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• A migração como consequência das alterações climáticas e da falta de água ou grandes inundações afecta as mulheres que, em muitos casos, são chefes de família, geralmente pobres. As mulheres são mais seriamente afectadas em comparação com os homens quando são forçadas a emigrar e a encontrar novos recursos, embora continuem a assumir as responsabilidades de cuidados e atenção nos seus ombros. • A segurança das mulheres também se torna mais vulnerável quando elas precisam viajar distâncias ou ir a poços comunitários em momentos diferentes. • A condição nutricional de uma pessoa é um fator determinante para sobreviver aos efeitos de desastres naturais. As mulheres são PDLV SURSHQVDV D VRIUHU GH GH¿FLrQFLDV DOLPHQWDUHV H GH KLGUDWDção. Quando a comida e a água são escassas, as mulheres primeiro DOLPHQWDP VHXV ¿OKRV H ¿OKDV H RV RXWURV PHPEURV GD IDPtOLD antes de si. • A falta de saúde devido às condições de pobreza, somada à falta de água segura e acessível, gera condições favoráveis para a disseminação de doenças, bem como complicações de saúde sexual e reprodutiva. • Veja a experiência de gestoras de água para as suas comunidades na Nicarágua: https://ongawa.org/el-agua-es-cosade-mujeres. Séverin Deneulin e Carole Rakodi têm mostrado recentemente que no desenvolvimento de estudos de um tradicionalmente secular e especialmente relutantes em diálogo com confesional- ator em décadas recentes academia tem havido um interesse crescente no papel das religiões e organizações de inspiração religiosa. A necessidade de rever os orçamentos que VmR EDVHDGRV HVWXGRV GH GHVHQYROYLPHQWR UHÀHWH QmR DSHQDV TXH D SROtWLFD ea religião estão ligados de forma complexa, mas as religiões são players globais com uma forte presença local. De fato, as organizações religiosas
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sĂŁo algumas das organizaçþes sociais mais importantes em muitas sociedaGHV WHQGR PDQWLGR Âą RX PHVPR DXPHQWDQGR Âą VXD LQĂ&#x20AC;XrQFLD Conscientes desse papel gravitacional como comunidades de fĂŠ, devemos trabalhar nossa teologia para ler os sinais desses tempos e dos problemas e sofrimentos de nosso povo. NĂŁo podemos falar de uma teologia dos pobres, oprimidos, nas margens, vulnerĂĄveis Ă s alteraçþes climĂĄticas, sem acesso aos recursos bĂĄsicos, sem necessariamente falando de mulheres como pobres, oprimidos, explorados, sem acesso a recursos: cerca de metade do planeta que sofre e de forma diferenciada por causa de sua condição de gĂŞnero. E nĂŁo podemos pensar em uma teologia que evite a leitura crĂtica das razĂľes polĂticas, econĂ´micas e sociais que geram mudanças climĂĄticas, vulnerabilidades, marginalização, pobreza, desigualdade. Portanto, uma teologia de gĂŞnero profĂŠtica ĂŠ necessĂĄria. A encĂclica Laudato Si, tĂŁo preponderante neste tempo na consciĂŞncia para a ecologia integral, diz: Uma verdadeira abordagem ecolĂłgica sempre se torna uma abordagem social, que deve integrar a justiça nas discussĂľes sobre o meio ambiente, para ouvir tanto o clamor da terra quanto o clamor dos pobres (Laudato Si â&#x20AC;&#x2DC;49) .iv
A Aliança Mundial das Igrejas Reformadas (WARC) em sua 24ÂŞ AssemblĂŠia Geral em Gana (Accra, 2004) publicou um documento que vinha trabalhando desde Debrecen 1997. O texto ĂŠ conhecido hoje como a Âł&RQÂżVVmR GH $FUD´ H p R UHVXOWDGR GH D SUHRFXSDomR TXH XP JUDQGH VHWRU das igrejas da tradição reformada tem levantado sobre sua jornada pelo mundo no alvorecer do sĂŠculo 21: Para ler os sinais dos tempos â&#x20AC;&#x201C; NĂłs ouvimos que a criação continua gemendo, em cativeiro, esperando por sua liberação (Ro 8:22). O grito de pessoas que sofrem e as feridas da prĂłpria criação estĂŁo nos questionando.
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Observamos uma drĂĄstica convergĂŞncia entre o sofrimento das pessoas e o dano causado ao resto da criação. 6. Os sinais dos tempos tornaram-se mais alarmantes e temos que interpretĂĄ-los. As causas subjacentes dos tremendos perigos para a vida sĂŁo, acima de tudo, o produto de um sistema econĂ´mico injusto, defendido e protegido pela força polĂtica e militar. Os sistemas econĂ´micos sĂŁo uma questĂŁo de vida ou morte. e XPD LGHRORJLD TXH DUJXPHQWD TXH QmR Ki DOWHUQDWLYD H UHTXHU XPD FDGHLD LQÂżQLWD GH VDFULItFLRV SDUD RV SREUHV H SDUD D FULDomR 3URPHWH D IDOiFLD GH salvar o mundo criando riqueza e prosperidade, atribui soberania sobre a vida e requer lealdade total que equivale Ă idolatria. Acreditamos que Deus selou uma aliança com toda a criação (Gn 9: 8-12). Deus criou uma comunidade terrena baseada em uma visĂŁo de justiça e paz. O pacto ĂŠ uma dĂĄdiva da graça que nĂŁo ĂŠ vendida no mercado (Is 55: 1). e XPD HFRQRPLD GH JUDoD SDUD WRGD D FULDomR FRPR QRVVR ODU -HVXV QRV mostra que esta ĂŠ uma aliança inclusiva na qual os pobres e marginalizados sĂŁo parceiros preferenciais, e nos chama Ă justiça para â&#x20AC;&#x153;os pequeninosâ&#x20AC;? 0W p D HVSLQKD GRUVDO GD QRVVD FRPXQLGDGH GD YLGD GL] D &RQÂżVVmR Reformada.
Nesta aliança, toda a criação ĂŠ abençoada e incluĂda (OsĂŠias 2:18 H VV 'L] $FUD VHP PHQFLRQDU HVSHFLÂżFDPHQWH D GLPHQVmR GH JrQHUR deixa em aberto o compromisso de denunciar sistemas que sustentam a desigualdade e excluem mulheres. GĂŞnesis 16 e acima nos dĂĄ um personagem que muitas vezes ĂŠ HVTXHFLGR PDV IXQGDPHQWDO e VREUH +DJDU XPD PXOKHU HVWUDQJHLUD XPD escrava, que se torna a destinatĂĄria de uma promessa de Deus. Uma mulher que recebe duas vezes a presença divina ao lado de poços de ĂĄgua â&#x20AC;&#x201C; um elemento central para as aldeias desĂŠrticas. A conexĂŁo da ĂĄgua com a promessa de vida plena e com a inclusĂŁo de uma pessoa que estĂĄ fora do modelo social aceito: mulher, escrava, estrangeira, mĂŁe sozinha.
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%LEOLRJUD¿D FERNANDES, Leonardo. Barcarena: há um ano, mais uma tragédia marcava a mineração no Brasil. São Paulo. 17 fev. 2019. Disponível em: <https://www.brasildefato.com.br/2019/02/17/barcarena-ha-um-ano-mais-uma-tragedia-marcava-a-mineracaono-brasil/>. Acesso em: 15 ago. 2019. FLORENTIN, Claudia. El agua y las mujeres en clave teológica. 2019. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=5QRWUYyrYnI>. Acesso em: 20 ago. 2019. FRANCESCO. Disponível em: <http://w2.vatican.va/content/vatican/it.html>. Acesso em: 23 ago. 2019. HERRAMIENTAS para un Aprendizaje para un periodismo de género ético y políticas en las empresas editoriales ©Creative Commons de WACC y IFJ, 2012, aportes de la autora. ONU, Naciones Unidas. Assuntos que nos importan: Agua. Disponível em: <https://www. un.org/es/sections/issues-depth/water/index.html>. Acesso em: 25 ago. 2019. TATAY, Jaime. Creer en la sostenibilidad las religiones ante el reto medioambiental. Cristianisme i Justícia, Barcelona, 2019, p. 5. WCRC: Confesión de Accra: http://wcrc.ch/wp-content/uploads/2015/06/TheAccraConfessionSpanish.pdf.
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Fama 2018: Mensagem das ReligiĂľes e Espiritualidades aos Povos10
As ĂĄguas convocam NĂłs, membros de diferentes tradiçþes religiosas e espiritualidades, nos reunimos no FĂłrum Alternativo Mundial da Ă gua realizado em BraVtOLD %UDVLO QRV GLDV D GH PDUoR GH SDUD DÂżUPDU DV Ă&#x2C6;JXDV como Dom de Deus, Direito de todas as criaturas e Bem comum. Sentimo-nos convocados e convocadas pelas ĂĄguas para ouvir seus clamores que brotam das graves situaçþes socioambientais causadas pela ganância do ser humano que o leva a usar irresponsavelmente os recursos naturais. Armamos a nossa Tenda Inter-religiosa no FAMA 2018 e, em diĂĄlogo com os povos originĂĄrios, movimentos populares, ONGs e outras organizaçþes da sociedade civil, a partir dos nossos credos e em sintonia com toda a FULDomR DÂżUPDPRV TXH D iJXD p XP GLUHLWR H QmR PHUFDGRULD As nossas tradiçþes religiosas e espirituais tĂŞm uma relação profunda com as ĂĄguas. Elas nos vinculam com a realidade do Transcendente DWUDYpV GH QRVVDV OLWXUJLDV GH QRVVRV ULWRV GH LQLFLDomR GH SXULÂżFDomR GH louvação e de agradecimento. Elas expressam caracterĂsticas do criador, como Vida â&#x20AC;&#x201C; sem ĂĄgua nĂŁo hĂĄ vida; Gratuidade â&#x20AC;&#x201C; a ĂĄgua nĂŁo ĂŠ mercadoria; Liberdade â&#x20AC;&#x201C; a ĂĄgua nĂŁo pode ser privatizada; ComunhĂŁo â&#x20AC;&#x201C; a ĂĄgua ĂŠ 10 FĂłrum Alternativo Mundial da Ă gua. BrasĂlia, 22 de março de 2018.
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um bem comum. Por isso, as ĂĄguas tĂŞm para nĂłs uma dimensĂŁo sagrada em VXD RULJHP H HP VXD ÂżQDOLGDGH D YLGD TXH GR GLYLQR SURFHGH H VH UHDOL]D QD existĂŞncia de todas as criaturas. Como elemento vital as ĂĄguas entrelaçam o natural e o espiritual, o sagrado e o profano, a mĂstica e a polĂtica, a individualidade e a comunidade. Elas conectam os diferentes contextos locais e globais onde o curso da vida percorre na direção da fraternidade entre os povos, que partilham desse elemento essencial a todos: a ĂĄgua.
As ĂĄguas clamam As ĂĄguas tĂŞm um movimento prĂłprio, como um ser vivo que precisa seguir livremente o seu curso para gerar e sustentar outras vidas. Mas elas sofrem hoje os efeitos de um sistema movido por ambiçþes de lucro e as consequĂŞncias das mudanças climĂĄticas, que alteram os seus ciclos e ameaçam a vida no planeta. Por isso as ĂĄguas clamam por justiça socioambiental que supere os projetos de privatização, mercantilização e a depredação da natureza. O FAMA 2018 acontece no Brasil, onde as restriçþes do acesso Ă ĂĄgua expressam as escandalosas desigualdades sociais: o paĂs que guarda GDV UHVHUYDV GH iJXD GR PXQGR WHP PDLV GH GR VHX SRYR VHP acesso Ă ĂĄgua de qualidade. Cerca de 1/3 da população mundial estĂĄ na mesma situação e mais da metade da humanidade nĂŁo usufrui de saneamento bĂĄsico seguro. HĂĄ tentativas de respostas meramente tĂŠcnicas a esses problemas; outros apresentam soluçþes com interesses de obter lucros diante das graves situaçþes em que se encontram os nossos mares, aquĂferos, rios, cĂłrregos e nascentes. Tais propostas afetam diretamente os nossos povos, sobretudo indĂgenas, quilombolas, ribeirinhos e habitantes das periferias das cidades, aumentando ainda mais as desigualdades sociais e os sofrimentos principalmente de mulheres e crianças. Nesse contexto, ouvimos o clamor das ĂĄguas por justiça e por direitos. A ĂĄgua ĂŠ dom de Deus e nĂŁo propriedade privada para ser comprada
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e vendida. Por isso, o acesso Ă ĂĄgua de forma gratuita e livre ĂŠ um direito de todos e todas. Para nossas tradiçþes religiosas e espiritualidades, essa ĂŠ uma forma privilegiada de viver a nossa fĂŠ no criador das ĂĄguas de todo o planeta. Como nos ensinam os povos indĂgenas: se as ĂĄguas nos foram dadas de graça, por que pagar por elas?
As ĂĄguas nos enviam Unimo-nos Ă s vozes que denunciam toda ação que atenta contra o valor sagrado da ĂĄgua, transformando-a em mercadoria desprovida de vida e de direitos. Como religiosos e religiosas alçamos nossa voz profĂŠtica, denunciando os projetos de morte e defendendo propostas ĂŠticas e polĂticas que superem a desordem provocada pelas injustiças sociais e ambientais. Para isso propomos como açþes concretas: Formação espiritual e teolĂłgica, tĂŠcnica e polĂtica, que permita promover comunidades como sujeitos de relaçþes justas para com a natuUH]D HVSHFLÂżFDPHQWH D iJXD H VHXV WHUULWyULRV â&#x20AC;˘ Açþes de articulação, aliança e incidĂŞncia que vinculem agendas locais com os processos regionais e globais de desenvolvimento sustentĂĄvel, justiça climĂĄtica e combate Ă s desigualdades socioculturais; â&#x20AC;˘ EstratĂŠgias comuns de comunicação que favoreçam intercâmbios de experiĂŞncias e de saberes, açþes de denĂşncia pĂşblica e divulgação das alternativas que envolvem os povos nos processos de justiça para com a ĂĄgua e toda a criação. Convocamos todos os credos e as organizaçþes baseadas na fĂŠ para que se integrem Ă s vozes profĂŠticas e Ă s açþes transformadoras na sociedade brasileira, latino-americana e de todos os continentes, vinculando mĂstica e polĂtica no fortalecimento de projetos locais e globais que defendem as nossas ĂĄguas como direito e nĂŁo mercadoria, por serem elas dom de Deus e bem comum.
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ReferĂŞncias de VĂdeos sobre a luta pela ĂĄgua no Brasil ASSEMBLEIA DA CESE 2019. Coordenadoria EcumĂŞnica de Serviço. 19â&#x20AC;&#x2122;58â&#x20AC;&#x2122;â&#x20AC;&#x2122;. DispoQtYHO HP KWWSV ZZZ \RXWXEH FRP ZDWFK"Y &B'= 5W.I(F! $FHVVR HP VHW Crime- tragĂŠdia de Brumadinho (MG). Coordenadoria EcumĂŞnica de Serviço. 08â&#x20AC;&#x2122;24â&#x20AC;?. DisponĂvel em: <https://youtu.be/j2R-pOswkzQ>. Acesso em: 09 set. 2019. Assembleia Anual da CESE 2017. Coordenadoria EcumĂŞnica de Serviço. 11â&#x20AC;&#x2122;15â&#x20AC;?. DisSRQtYHO HP KWWSV ZZZ \RXWXEH FRP ZDWFK"Y 2KT426.L*X ! $FHVVR VHW Brumadinho: Quando o Lucro Vale Mais (DOC). Movimento dos Atingidos por Barragens.34â&#x20AC;&#x2122;51â&#x20AC;?. DisponĂvel em: <https://www.youtube.com/watch?v=ack1QctLvf8>. Acesso: 09 set. 2019. A vale acabou com vidas, e jĂĄ sabia!. Movimento dos Atingidos por Barragens. 01â&#x20AC;&#x2122;39â&#x20AC;?. DisponĂvel em: <https://www.youtube.com/watch?v=T8svUTWzHvk>. Acesso: 09 set. 2019. ProcissĂŁo MarĂtima dos Pescadores. Movimento dos Atingidos por Barragens. 03â&#x20AC;&#x2122;07â&#x20AC;?. DisponĂvel em: <https://www.youtube.com/watch?v=FM1_XbTIrBY>. Acesso: 09 set. 2019. 6 Meses do crime da Vale em Brumadinho. Movimento dos Atingidos por Barragens. Âś ´ 'LVSRQtYHO HP KWWSV ZZZ \RXWXEH FRP ZDWFK"Y J 7 Q$].. N! $FHVVR set. 2019. Direitos das Mulheres Atingidas por Barragens. Movimento dos Atingidos por Barragens H D &KULVWLDQ $LG 'LVSRQtYHO HP KWWSV ZZZ \RXWXEH FRP ZDWFK"Y & X .[0[3 ! Acesso: 09 set. 2019. Ă gua ĂŠ bem comum, territĂłrio, alimento e vida - FAMA 2018. Federação de Ă&#x201C;rgĂŁos para AssistĂŞncia Social e Educacional (FASE). DisponĂvel em: <https://www.youtube.com/ watch?v=W-JtNi-ifJs> Acesso: 09 set. 2019. Ă gua - Direito Ă Cidade e Justiça Ambiental. Federação de Ă&#x201C;rgĂŁos para AssistĂŞncia Social e Educacional (FASE). DisponĂvel em: <https://www.youtube.com/watch?v=EH4mzA0zI9Y>. Acesso: 09 set. 2019.
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