Jornal da Adufrj-SSind - Edição 867 - 10/11/2014

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www.adufrj.org.br Jornal da Seção Sindical dos Docentes da UFRJ

Andes-SN Ano XIII no 867 10 de novembro de 2014 Central Sindical e Popular - Conlutas

Reunião do Conselho de Representantes da Adufrj-SSind 10 de novembro 18 horas (segunda-feira) Sala 02 do Instituto de Psicologia campus da Praia Vermelha da UFRJ

Pauta: 1 - Informes; 2 - Análise de Conjuntura; 3 - Caderno de Textos do 34º Congresso do Andes-SN; 4 - Assuntos Gerais. As reuniões do CR são abertas a todos os professores sindicalizados.

Terceirização ataca universidade pública

Fotos: Marco Fernandes - 06/11/2014

Lessa

Cláudio

Levi

Paulo Henrique

No debate sobre terceirização na universidade, o presidente da Adufrj-SSind, Cláudio Ribeiro, fez um breve diagnóstico sobre as consequências da precarização na produção universitária. Em alguns casos, a prática resulta na substituição do trabalho docente. Além do dirigente, o reitor Carlos Levi, o ex-reitor Carlos Lessa e o diretor da Fasubra, Paulo Henrique, participaram do debate sobre o impacto da terceirização na administração pública, dentro da programação da Semana do Servidor. Página 3 Tomaz Silva / Agência Brasil - 06/11/2014

DIREITO À MORADIA

Sem-teto ocupa área em São Gonçalo

Previdência “Rombo” é falácia No seminário que discutiu a previdência social, o professor José Miguel Bendrao Saldanha disse que o alegado “rombo da previdência social” não existe. Página 4

I Internacional faz 150 anos

Organizadas pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), cerca de 350 famílias acamparam num terreno abandonado em São Gonçalo, na periferia do Rio de Janeiro. Página 8

Outdoor da Adufrj: o Museu da Maré pede socorro

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Debate para marcar a data reuniu professores brasileiros e de outros países Página 5


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Kelvin Melo - 02/11/2014

sEGUNDA pÁGINA

Seminário Identidade, Gênero e Raça

Entre os dias 10 e 17 de novembro, será realizado no auditório do CT o seminário Identidade, Gênero e Raça. O evento começa às 9h, com o debate sobre o projeto de lei Gabriela Leite (PL 4211/12), que busca regulamentar a atividade de profissionais do sexo. Serão debatedores o deputado federal Jean Wyllys (PSOL) e Soraya Simões (Ippur-UFRJ), com a mediação do pró-reitor de Pessoal, Roberto Gambine.

Desafios da Saúde Reprodutiva no Brasil

No dia 28 de novembro, de 9h às 13h, a Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Rua Leopoldo Bulhões, 1.480, sala 410, 4º andar, Manguinhos) receberá a mesa-redonda “Questões e Desafios da Saúde Reprodutiva no Brasil: nascimento e parto, mortalidade materna e aborto”. A atividade, que faz parte das atividades acadêmicas da disciplina de pós-graduação Tópicos Especiais em Gênero, Violência e Saúde, está sendo organizada em parceria com o Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da UFRJ.

Cultura não é mercadoria! Novo outdoor da Adufrj-SSind defende Museu da Maré

O

mais novo painel da Seção Sindial entra na campanha em defesa da permanência do Mu-

seu da Maré, localizado em um conglomerado de pequenos bairros e comunidades ao lado da Cidade Universitária — o Complexo da Maré. Inaugurado em 8 de maio de 2006, o museu está instalado em um imóvel cedido por alguns anos em regime de comodato para o Cen-

tro de Estudos e Ações Solidárias da Maré (Ceasm), ONG gestora do projeto. O período de validade do documento expirou no final do ano passado e, em setembro de 2014, o museu recebeu do Grupo Libra – empresa proprietária da construção – uma notificação com o

prazo de noventa dias para a devolução do lugar “livre de pessoas e coisas”. Desde então, foi iniciado um forte movimento de apoio ao Museu, que registra, preserva e divulga a história das comunidades da Maré, em seus diversos aspectos.

UFRJ discute plano cultural para 2015/2016 Objetivo é participar de edital do governo Samantha Su Estagiária e Redação

F

oi realizado, no último dia 5, um primeiro encontro para discutir a proposta da UFRJ que irá concorrer ao edital “Mais Cultura nas Universidades 2014”, do governo federal. A iniciativa conjunta do MEC e do MinC vai distribuir valores entre R$ 500 mil e R$ 1,5 milhão para cada plano, que teria um prazo de execução de até dois anos, nas instituições. As propostas (que precisam ser enviadas até 10 de feve-

reiro de 2015) necessitam da aprovação de um comitê técnico formado por representantes dos próprios ministérios, da associação de reitores federais (Andifes) e pelo Conselho Nacional das Instituições Federais de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif). Na atividade do dia 5, organizada pelo Fórum de Ciência e Cultura (FCC) no salão Pedro Calmon, os professores discutiram, entre outros assuntos, como compatibilizar a Política Cultural, Artística e de Difusão Científico-Cultural da universidade, aprovada em setembro deste ano no Consuni, com os eixos temáticos do edital do governo. Coordenador do Fórum, o

professor Carlos Vainer destacou três pontos para a discussão: infraestrutura, formação e a comunicação. O tripé, segundo ele, é o que embasa os projetos culturais da universidade. De acordo com o documento do governo, entre os critérios de avaliação estão: o envolvimento do plano com populações de vulnerabilidade social, a valorização da diversidade cultural e o envolvimento da comunidade no entorno da instituição. Neste caso, Carlos Vainer lembrou que as atividades mais adequadas ao edital serão aquelas que pretendam envolver o maior número de pessoas e unidades e que consigam articular diversos eixos temáticos. Será montada uma rede de

comunicação para cada tema. O objetivo é unir projetos que possam contemplar um mesmo eixo para tornar mais coesa a apresentação do plano.

Soberania alimentar

Entre os dias 17 e 18 de novembro, será realizado o seminário “Soberania Alimentar — Diálogos entre o campo e a cidade”, no Auditório da Escola de Serviço Social (campus da Praia Vermelha). O evento, que começa às 13h no primeiro dia, vai proporcionar debate sobre a produção e consumo de alimentos, estabelecendo elo fundamental entre soberania alimentar e soberania dos povos. Mais informações podem ser conseguidas pelos e-mails: henriquesousa1991@gmail. com e adriene@ufrj.br.

Próximo encontro será dia 19

O próximo encontro para debater o assunto será em 19 de novembro pela manhã, no prédio da reitoria (auditório ainda não confirmado). “Queremos ser os mais abrangentes possíveis, sem perder o foco e levar em conta quais as questões centrais a partir das nossas dificuldades para não apenas atender o edital, mas nos contemplar. É preciso inovar, mas não queremos empreendedorismo, precisamos trabalhar na esfera do contra-mercado.”

SEÇÃO SINDICAL DOS DOCENTES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO DO SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR

Sede e Redação: Prédio do CT - bloco D - sala 200 Cidade Universitária CEP: 21949-900 Rio de Janeiro-RJ Caixa Postal 68531 CEP: 21941-972

Consciência Negra

Para marcar o mês da Consciência Negra, o jornal A Verdade convida para o lançamento do Grupo de Estudos e Formação sobre Desigualdades Étnico-Raciais. Na ocasião, haverá a primeira plenária do grupo, com o tema: Discriminação Racial, Exploração Capitalista e Relações de Trabalho. O evento ocorrerá em 13 de novembro, às 18h, no Auditório do Sintrasef Rua 13 de Maio, 13, 10º andar.

Tel: 2230-2389, 3884-0701 e 2260-6368

Diretoria da Adufrj-SSind Presidente: Cláudio Ribeiro 1ª Vice-Presidente: Luciana Boiteux 2ª Vice-Presidente: Cleusa Santos 1º Secretário: José Henrique Sanglard 2º Secretário: Romildo Bomfim 1º Tesoureiro: Luciano Coutinho 2ª Tesoureira: Regina Pugliese CONSELHO DE REPRESENTANTES DA ADUFRJ-SSIND Colégio de Aplicação Renata Lúcia Baptista Flores; Maria Cristina Miranda Escola de Serviço Social Mauro Luis Iasi; Luis Eduardo Acosta Acosta; Henrique Andre Ramos Wellen; Lenise Lima Fernandes Faculdade de Educação Claudia Lino Piccinini; Andrea Penteado de Menezes; Alessandra Nicodemos Oliveira Silva; Filipe Ceppas de Carvalho e Faria; Roberto Leher Escola de Comunicação Luiz Carlos Brito Paternostro Faculdade de Administração e Ciências Contábeis Vitor Mario Iorio; Antônio José Barbosa de Oliveira Instituto de Economia Alexis Nicolas Saludjian Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional Cecilia Campello do Amaral Mello Faculdade Nacional de Direito Mariana Trotta Dallalana Quintans; Vanessa Oliveira Batista Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Eunice Bomfim Rocha; Luciana da Silva Andrade; Sylvia Meimaridou Rola; André Orioli Parreiras Escola de Belas Artes Patrícia March de Souza; Carlos de Azambuja Rodrigues; Rogéria Moreira de Ipanema Faculdade de Letras Gumercinda Nascimento Gonda; Vera Lucia Nunes de Oliveira Escola de Educação Física e Desportos Luis Aureliano Imbiriba Silva; Alexandre Palma de Oliveira; Marcelo Paula de Melo; Michele Pereira de Souza da Fonseca Escola de Enfermagem Anna Nery Walcyr de Oliveira Barros; Gerson Luiz Marinho Coppe Vera Maria Martins Salim Escola Politécnica José Miguel Bendrao Saldanha; Eduardo Gonçalves Serra Coordenador de Comunicação Luiz Carlos Maranhão Editor Assistente Kelvin Melo de Carvalho Reportagem Silvana Sá e Elisa Monteiro Projeto Gráfico e Diagramação Douglas Pereira Estagiários Filipe Ferreira Galvão e Samantha Su Tiragem 4.000 E-mails: adufrj@adufrj. org.br e secretaria@adufrj.org.br Redação: comunica@adufrj.org.br Cadernos Adufrj: revista@adufrj.org.br Diretoria: diretoria@adufrj.org.br Conselho de Representantes: conselho@adufrj.org.br Página eletrônica: http://www.adufrj.org.br Os artigos assinados não expressam necessariamente a opinião da Diretoria.


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UFRJ

Faces da terceirização

Em debate, Adufrj-SSind alerta para a privatização das relações de trabalho dentro da universidade Fotos: Marco Fernandes - 06/11/2014

Debate ocorreu durante a Semana do Servidor Elisa Monteiro

elisamonteiro@adufrj.org.br

U

m debate sobre terceirização foi apoiado pela Adufrj-SSind e o Sintufrj, e organizado pela Pró-reitoria de Pessoal (PR4), como uma extensão da semana que celebrou o dia do funcionário público (em 28 de outubro). Mas, segundo Cláudio Ribeiro, não há o que comemorar: “É impossível falar em melhora para o serviço público, se as condições para o trabalhador se precarizam”, afirmou. Ele deixa claro não ser contrário aos trabalhadores terceirizados, mas contra a terceirização: “Não é possível que tenhamos de dar aulas, enquanto nos corredores estão pessoas sem receber salários, por vezes, há meses. O funcionamento da universidade não pode reproduzir esse tipo de injustiças”. Cláudio Ribeiro também deu ênfase ao impacto da terceirização sobre a produção universitária. Ele citou a experiência do ensino à distância (EAD), via consórcio Cederj, do qual a UFRJ participa, como exemplo. Aulas são mediadas por tutores que acabam por “substituir o trabalho docente”. “E o pior: são professores que ensinam que professores não são importantes”, frisou sobre o fato de os tutores serem obrigados, por contrato, a estimular esse tipo de ensino.

As estruturas terceirizadas são muito mais vulneráveis à corrupção Carlos Lessa Ex-reitor da UFRJ

Debate ocorreu no auditório Pangea, do Instituto de Geociências (CCMN), no último dia 6 Cláudio destaca que a modalidade de trabalho segue a lógica de flexibilização, “just in time”, na qual “os trabalhadores são chamados de acordo com o interesse da produção”. São bolsas no valor de R$ 275 por um determinado número de horas/ aulas que pode ser ampliado em até cinco vezes.

A precarização da própria carreira

O dirigente observou, ainda, que a precarização das condições de trabalho e dos salários na universidade pressionam os docentes a realizar atividades fora da Educação. E que, a partir da nova lei de carreiras do magistério federal, “a capacidade de iniciativa” virou quesito na avaliação docente durante o estágio probatório. Por outro lado, a contratação de profes-

sores substitutos cresce. “Os contratos que até pouco tempo eram anuais, agora são semestrais. Qualquer dia, teremos o mesmo dos tutores, contratos para feriados”, ironizou.

Ebserh foi projeto-piloto

De acordo com Cláudio, a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) serviu como projeto-piloto para “alteração de finalidade da universidade”. “Ao mesmo tempo em que elimina a função educativa dos HUs. As mudanças de regime previdenciário também foram lembradas: “Sem Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) nem aposentadoria integral, os docentes – assim como os demais servidores – são praticamente compelidos a participarem de um fundo privado mesmo em carreira pública”.

Um depósito de contêineres é a imagem que Cláudio Ribeiro usa para resumir uma universidade integralmente terceirizada. “Com formato padronizado, eles se propõem a transportar qualquer coisa; servir para tudo. No entanto, nem tudo cabe em contêineres”, encerrou.

A importância dos serviços públicos

Ex-reitor da UFRJ, o professor Carlos Lessa destacou o papel da Educação para concretização do conceito de nação. Ao mesmo tempo, reafirmou a importância dos Estados modernos para neutralizar a Igreja e universalizar a “educação pública e laica”. Lessa obsevou que os serviços públicos correspondem a demandas essenciais “que não poderiam ser garantidas individualmente”. Dentre as “mais básicas” citou a saúde, educação e segurança.

Em relação à terceirização, o exreitor foi categórico: “As estruturas terceirizadas são muito mais vulneráveis à corrupção”.

Reitor admite “dilema ético”

O atual reitor, Carlos Levi, mediou a mesa. Em suas breves considerações, enfatizou o papel da universidade como vanguarda institucional. “Aqui são formadas as lideranças que estarão à frente de todas as demais instituições”. Levi disse que a universidade enfrenta um “dilema ético” ao se ver obrigada a lançar mão de formas “tão deletérias” de relações de trabalho. E afirmou que, entre outros fatores, “o grave problema salarial” e a “alta rotatividade” rompem com o “ethos” da produção universitária. O reitor lamentou o fato de que a terceirização, “que teve início nos anos de 1990, infelizmente continua”.

Fasubra critica falta de transparência do governo

P

ela Federação de Sindicatos dos Trabalhadores em Universidades (Fasubra), Paulo Henrique Rodrigues também chamou atenção para a mudança de finalidade da terceirização na administração pública. “Antes, a terceirização era um recurso para suprir funções temporárias ou de cargos que não fazem parte do quadro permanente”. Para ele, no último período, há o forte retorno de um discurso de ineficiência dos serviços públicos. “Essa ideia está

na matriz dos discursos de defesa da Ebserh que vemos hoje, por exemplo”. Outro exemplo estaria na proposta do presidente da Capes de criar organizações sociais (OS) para as universidades federais. Paulo atribuiu o crescimento da terceirização não a uma economia real para os cofres públicos, mas à pressão do mercado para que o governo o sustente. “Gostaria de ver na listagem de lobistas no Congresso quantos não são destas empresas que pres-

tam serviço terceirizado ao Estado”. Em sua avaliação, “há pouca transparência” nas parcerias público-privadas. E mais: o sindicalista aponta que os próprios dados sobre o quadro de servidores não é esclarecido pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG). “O Ministério pede dimensionamento de pessoal, mas não abre os dados dos contratos com essas empresas para sabermos quanto custa cada trabalhador terceirizado”.

Ainda de acordo com o dirigente da Fasubra, mais de cem mil cargos foram eliminados do quadro permanente da administração pública federal nos últimos anos. Os recentes concursos ficaram em torno de metade disso (54 mil). No entanto, com a expansão “com a qual tivemos acordo no sentido de democratizar a universidade, destacou, “tivemos uma ampliação sem possibilidade humana de cumprir todas as tarefas. A Universidade é refém dessa estrutura”, criticou.

Crescimento da terceirização não representa economia real para os cofres públicos


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SEGURIDADE SOCIAL

Quando o problema é falso

Em seminário, professor da UFRJ mostra que não existe o alegado “rombo da previdência social”. E alerta que a redução de direitos induzirá à previdência privada, o pior caminho a ser seguido Marco Fernandes - 23/10/2014

Evento fez parte dos festejos pelos 35 anos da Adufrj-SSind

S

abe quando o William Bonner anuncia no Jornal Nacional, de vez em quando, os números mais recentes do “rombo da previdência” no Brasil? No lugar de dar uma notícia correta, ele está, na verdade, ajudando a propagar uma das maiores falácias dos últimos tempos. O sistema de seguridade social, no país, do qual a previdência faz parte, possui verbas constitucionalmente garantidas e apresentou saldo positivo de R$ 75,8 bilhões, em 2011; de R$ 82,7 bilhões, em 2012; e de R$ 76,3 bilhões em 2013 (veja quadro). “Não há déficit na seguridade social; há superávit. O Estado arrecada mais do que gasta, mas utiliza esses recursos para pagar os juros da dívida. É para lá que vai o superávit da seguridade”, afirma o professor José Miguel Bendrao Saldanha, da Escola Politécnica da UFRJ. Estudioso do tema, ele foi um dos palestrantes do seminário “Público x Privado: a previdência social em questão”, em 23 de outubro, organizado pela Adufrj-SSind e seu Grupo de Trabalho Seguridade Social (evento parcialmente noticiado na edição anterior deste jornal). José Miguel, além de demonstrar o superávit do orçamento da seguridade social, foi além. Para ele, a discussão deveria se pautar por conceitos baseados na economia real, e não apenas pelos aspectos financeiros decorrentes das leis vigentes (afinal, a Constituição e as demais leis são passíveis de modificações — talvez pelo próximo Congresso eleito, bastante conservador — e a seguridade pode perder o orçamento atual).

O exemplo

A partir do contracheque de um trabalhador hipotético com salário bruto de R$ 2,5 mil, José Miguel mostrou que a contribuição real do trabalhador para o financiamento do Estado é muito maior do que aquela que aparece no contracheque (R$ 275 para a previdência e R$ 45 para o imposto de renda), uma vez que a chamada “contribuição do empregador” (20% sobre o salário bruto, ou seja, R$ 500) também é, na verdade, parte do que o trabalhador produziu. Ou seja, os R$ 820 depositados pelo patrão na conta do INSS (e que o empregador costuma dizer que é um custo seu, os “encargos sociais”) são integralmente pagos pelo trabalhador.

O professor José Miguel Bendrao Saldanha (Escola Politécnica), ao lado da historiadora portuguesa Raquel Varela e Cleusa Santos, diretora da Adufrj-SSind, no seminário de 23 de outubro Além disso, e ao contrário do que pode parecer, esta contribuição não servirá para pagar a futura aposentadoria do trabalhador. O dinheiro cria essa ilusão, mas, na economia real, os trabalhadores ativos não sustentam a si próprios no futuro, isso é evidentemente impossível. Eles sustentam, no presente, as suas próprias famílias, as crianças, e as famílias dos trabalhadores hoje aposentados (estas, por intermédio do INSS). No futuro, quando se aposentarem, serão sustentados pelos trabalhadores ativos do futuro (as crianças de hoje). Este é o chamado pacto implícito entre as gerações, algo que sempre esteve presente na história da humanidade. A previdência social é a forma moderna de administrar este pacto, do qual o regime de repartição simples é uma manifestação praticamente direta. “Quem sustenta tudo é o trabalhador, ainda que tentem encobrir isso.”, defendeu José Miguel.

Os ataques

Os ataques à previdência social, como os anunciados no Jornal Nacional, e aos servidores públicos revelam a necessidade de o modo capitalista de produção encontrar novos montantes de capital para o financiamento de sua acumulação. As sucessivas propostas de contrarreforma da previdência social, no Brasil (como o fator previdenciário e o Funpresp) e em outras partes do planeta, seguiram nas últimas décadas as recomendações do Banco Mun-

Seguridade social 2011, 2012 e 2013 [R$ bilhões] 2011

Receitas

Despesas

2012

2013

Receita previdenciária

245,9

283,4

317,2

Cofins

159,6

181,6

199,4

CSLL

57,6

57,3

62,5

PIS / PASEP

41,6

47,7

51,1

Outras

22,4

25,7

20,8

Total

527,1

595,7

651,0

Previdência

290,5

325,5

366,2

Saúde

72,3

80,1

85,4

Assistência

45,9

56,5

64,1

Outras Total Saldo da seguridade social PIB

42,6

50,9

59,0

451,3

513,0

574,7

75,8

82,7

76,3

4.143

4.392

4.838

Saldo em relação ao PIB 1,8% 1,9% 1,6% Fonte: ANFIP - “Análise da seguridade social em 2013”

dial sintetizadas inicialmente no documento “Prevenir a crise do envelhecimento: políticas para proteger as pessoas idosas e promover o crescimento”, de 1994. A diretriz geral deste documento e de outros que o acompanharam é a redução do papel dos sistemas públicos de previdência social em regime de repartição, articulada à abertura de espaços para a previdência privada complementar, em regime de capitalização. Os principais argumentos para atacar a previdência pública seriam: déficit crescente, devido à transição demográfica (diminuição das taxas de natalidade e de mortalidade); injustiça, porque uns pagam pelos outros; e a não

formação de fundos de capital, que permitiriam investimentos em infraestrutura para o desenvolvimento do país. O regime de capitalização, baseado nos rendimentos financeiros de contribuições depositadas num fundo, em vez de usadas para pagar despesas correntes, seria a solução para estes problemas, pois permitiria uma “eficiente” gestão privada desse montante, via fundos de pensão ou pelos planos oferecidos em bancos ou seguradoras. Nada mais falso, garante José Miguel. O “déficit” do regime de repartição poderia ser resolvido por meio dos chamados ajustes “paramétricos” nas contribuições dos ativos (aumento de alíquotas)

e nas condições necessárias para a aposentadoria (aumento da idade para se aposentar), se isso fosse realmente necessário. Situação que, aliás, nem condiz com a conjuntura brasileira de momento: com a queda nas taxas de natalidade e aumento na expectativa de vida do cidadão, o topo da pirâmide demográfica nacional inchou e a base diminuiu, mas a proporção da população em idade produtiva tem se mantido estável. “Esse deve ser o cenário dos próximos dez, quinze anos”, antecipa o professor. Quanto à pretensa “injustiça” da repartição, ao contrário, da forma como está constituído, o sistema ajuda a distribuir renda e os benefícios dos aumentos de produtividade para a população idosa. E, como os recursos são captados pelo Estado (não por um banco, seguradora ou fundo de pensão), também não é verdade que não haja recursos para investimentos. Ao contrário, caberia aos defensores da capitalização mostrar que o setor privado seria mais “eficiente” do que o estado nos investimentos em infraestrutura, o que não tem cabimento.

Cadê a segurança?

“Na capitalização, vende-se a ideia de que o trabalhador não depende das gerações futuras para sua aposentadoria, mas apenas dele mesmo”, explica o professor da Escola Politécnica. “Mas que sentido tem a sua segurança, na aposentadoria, depender de uma aplicação de risco? É contraditório até nos termos”, acrescenta o palestrante, diante do fato que a gestão privada irá investir o dinheiro do segurado em ações, títulos da dívida pública dos países, entre outras formas de aplicação, cuja rentabilidade a longo prazo está longe de ser garantida. A crise financeira de 2007-2008, até hoje não superada, é um claro sinal de alerta para não seguir por este caminho. Os fundos de pensão, em todo o mundo, tiveram fortes perdas, cuja recuperação não está à vista, comprometendo o pagamento dos benefícios dos seus segurados. Este fenômeno levou até a uma certa “moderação” momentânea por parte dos defensores da privatização da previdência, que agora se concentram na desconstrução pura dos sistemas públicos, como forma de induzir as pessoas a ingressarem, “voluntariamente”, em planos privados. Vídeo sobre o evento está na internet Confira, no site da AdufrjSSind e nos perfis da Seção Sindical nas redes sociais, um vídeo sobre o seminário realizado na Escola de Serviço Social.


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I Internacional

Marco da luta proletária Encontro debateu a importância de fundação da Associação Internacional de Trabalhadores, em 1864 Fotos: Marco Fernandes - 03/11/2014

Influência daquele movimento continua viva nos dias de hoje Silvana Sá

silvana@adufrj.org.br

E

Um século e meio depois de sua criação, a AIT ainda traz importantes lições para os movimentos sindicais atuais

Lições da AIT inspiram movimento docente

Falava-se de como se poderia mudar a vida das pessoas

tor, graças à ativa participação dos proletários. “Os trabalhadores se organizam a partir das necessidades que tinham e com as condições que tinham. São eles que organizam a Internacional e não a Internacional que organiza os trabalhadores”, afirmou.

Bandeiras de ontem e de hoje

George Comninel, também da York University, do Canadá, trouxe um pouco mais da história da AIT. Ele afirmou que a criação da Associação se baseou na solidariedade das classes trabalhadoras, nos movimentos de trabalho cooperativo. Lembrou, ainda, que Karl Marx, embora não tenha sido um fundador da I Internacional, ficou revigorado com sua criação e a ela se dedicou por sete anos. Assim como seu colega Marcello, o professor reforçou que a Associação não se iniciou imediatamente como um

José Paulo Netto ESS/UFRJ

A exigência para a luta de classe é o compromisso de classe

Marcello Musto York University

movimento revolucionário: “As classes trabalhadoras não eram revolucionárias, mas estavam se auto-organizado. Esta era a importância daquele movimento”. Comninel destacou a luta por direitos políticos, organização no trabalho, redução de horas na jornada de trabalho, educação pública e gratuita como bandeiras da I Internacional até hoje reivindicadas nos movimentos de trabalhadores. Os sindicatos, conforme construção da AIT, além de serem mecanismos de luta das questões específicas das categorias, deveriam também assumir um papel mais amplo de organização e luta de classe. “O primeiro requisito era o desenvolvimento dessa classe para defesa de seus interesses”, afirmou.

Construção coletiva

O professor José Paulo Netto, emérito da ESS/UFRJ, falou sobre o significado da I Interna-

George Comninel York University

O primeiro requisito era o desenvolvimento dessa classe para defesa de seus interesses

m 1864, em Londres, foi fundada a Associação Internacional dos Trabalhadores, AIT (também conhecida apenas como Internacional), primeira entidade que buscou reunir diversas correntes do movimento operário no mundo industrializado, durante a segunda metade do século XIX. Para discutir o feito pioneiro, a Adufrj-SSind, a Escola de Serviço Social (ESS) e o Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS), da UFRJ, além da Universidade Federal Fluminense (UFF), promoveram, em 3 de novembro, o encontro “A I Internacional, 150 anos depois”. A atividade, no IFCS, encerrou uma série de eventos similares ocorridos em oito cidades brasileiras desde 24 de outubro. Em todos, foi lançado o livro “Trabalhadores, uni-vos! Antologia política da I Internacional” (Boitempo Editorial), do professor Marcello Musto, da York University (Toronto, Canadá). Na mesa da noite do encontro do Rio de Janeiro, o tema destacado foi “Aprendendo com a I Internacional: As Lutas pela Emancipação”. E o autor da antologia afirmou que a Internacional começou como uma força moderada, no tamanho e na política: “Ela não era uma estrutura gigante e imediatamente revolucionária. Era uma organização pequena e com componentes importantes, mas não se diferenciava muito de outras formas de organização dos trabalhadores. Eram componentes extremamente moderados”, disse Marcello Musto. Com o tempo, segundo Musto, os proletários tomaram consciência de sua capacidade de auto-organização: passaram a experimentar novas formas de lutas. Ele destacou o “enorme potencial democrático” da I Internacional e a clareza de um projeto: “Mudar o mundo, romper com o capitalismo e começar uma sociedade com diferentes propostas sociais”. “Havia a construção de uma forma maravilhosa de política, que temos de retomar. A política era discutida de forma completa. Falava-se da organização de uma sociedade diferente, de sindicatos, das questões da cidade, de como se poderia mudar a vida das pessoas”. Esses entendimentos foram elaborados e possíveis, de acordo com o au-

cional e a intervenção de Marx do ponto de vista histórico. Ele reforçou que Marx não foi o organizador, mas um importante sujeito político em um momento de retomada do movimento operário europeu. “Marx foi um dos protagonistas, não o protagonista. O Manifesto Comunista, por exemplo, é resultado de um debate coletivo de mais de um ano. A mesma coisa ocorreu com a Internacional”. José Paulo Netto destacou os princípios que levaram à criação da I Internacional e que regem o comunismo. Tais princípios se mantêm atuais e regem as lutas dos trabalhadores em todo o mundo: “A exigência para a luta de classe é o compromisso de classe; a mais plena democracia no interior das organizações de classe; apoio solidário e militante internacionalista contra o status quo; e a luta contra a propriedade privada”.

A mesa da noite foi coordenada pela professora Cleusa Santos (ESS), 2ª vice-presidente da Adufrj-SSind. Para ela, as bandeiras da Internacional permanecem atuais e necessárias. Inclusive para o movimento docente, como sublinhou a professora. “O movimento sindical docente tem procurado se pautar, ao longo da sua história, pelos valores e pelas reivindicações da Associação Internacional dos Trabalhadores”. Segundo ela, no atual período político mundial, “em que os trabalhadores encontram-se na defensiva, em que os movimentos sociais são criminalizados e as nossas bandeiras de lutas cooptadas e ressignificadas para atender à lógica do capital”, fazse fundamental retomar o caráter internacional da luta proletária. Mais ainda: “para motivar o fortalecimento de nossas organizações, sindicatos e partidos como formas de associação e assim continuar na luta cotidiana”. Participaram do debate, ainda, Antonino Infranca (filósofo/ Itália) e Serge Volikow (Maison des Sciences de l’Homme MSH/Dijon).

Cleusa Santos, da AdufrjSSind


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ANDES-SN

Preparando o 34º Congresso Seminário realizado em Brasília (DF) discutiu organização do Sindicato frente a novos desafios. Resultados serão avaliados na instância máxima de deliberação da categoria, em fevereiro de 2015 Andes-SN

Evento reuniu mais de 120 professores

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urante três dias (de 31/10 a 2/11), mais de 120 docentes de diversas partes do país se reuniram em Brasília (DF) para o Seminário Nacional sobre a estrutura organizativa do Andes-SN. As plenárias do encontro debateram quatro temas: expansão das universidades multicampi, precarização do trabalho docente, reorganização da entidade e política sindical. Ao encerrar os trabalhos no domingo (2), o presidente do Andes-SN, Paulo Rizzo, avaliou que o Seminário Organizativo marca o início das preparações para o 34º Congresso do Andes-SN, que acontecerá também na capital federal, entre 23 e 28 de fevereiro de 2015: “Ti-

Reunião em Brasília produziu resultados que serão votados no Congresso do ano que vem vemos um bom debate e agora temos o compromisso de levar esse acúmulo à base para que a riqueza dessas discussões se aprofunde e multiplique na categoria e possam refletir no 34º

Congresso”, ressaltou. “A expectativa é que tenhamos, com base nas discussões iniciadas aqui, um bom Congresso, capaz de organizar um plano de lutas que dê conta dos desafios

que se apresentam para o próximo período e também fazer os ajustes organizativos necessários para aperfeiçoar o funcionamento do nosso Sindicato e seu enraizamento na categoria”, concluiu.

UFRJ

Atendimento da SuperEst continua parcialmente paralisado

Silvana Sá - 06/11/2014

Funcionários aguardam transferência para módulos Samantha Su Estagiária e Redação

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odas as divisões da Superintendência Geral de Políticas Estudantis (SuperEst), com exceção da Divisão de Apoio ao Estudante (DAE), serão transferidas, em até 60 dias, para módulos habitacionais ao lado da sede do Sintufrj. Em janeiro de 2015, com a chegada de mais oito contêineres, a DAE também inicia seu deslocamento para lá. Enquanto a primeira parte da realocação não for efetuada, os servidores do órgão vão manter a suspensão, iniciada em 15 de outubro, de parte dos serviços de apoio aos alunos, informou Marilurde Donato (diretora da Divisão de Saúde do Estudante) à reportagem do Jornal da Adufrj. Conforme já noticiado em edições anteriores deste jornal, os trabalhadores da SuperEst reivindicam: espa-

Alguns dos contêineres que irão receber a SuperEst já estão instalados ao lado do Sintufrj ço adequado para trabalho, maior diálogo com as Unidades Acadêmicas (COAA — Comissão de Orientação e Acompanhamento Acadêmico — e secretarias), participação nas deliberações dos órgãos colegiados relativas à assistência estudantil e contratação de mais pro-

fissionais para a Superintendência. O detalhamento da transferência para os módulos foi anunciado pelo reitor Carlos Levi em reunião com os funcionários da SuperEst no último dia 5. Além da questão de espaço, a reitoria resolveu formar uma comissão para

estudar a política de Assistência Estudantil da UFRJ com participação de representantes da superintendência e do Conselho de Ensino de Graduação (CEG). Levi também mencionou a possibilidade de fazer um cartão corporativo para agilizar o pagamento de despesas da SuperEst.

Plenárias

Segundo Amauri Fragoso de Medeiros, tesoureiro do Sindicato Nacional, a coordenação do Grupo de Trabalho em Política de Formação Sindical (GTPFS) vai elaborar, com base nos debates do Seminário Organizativo, os textos que serão apresentados ao 34º Congresso pela diretora do AndesSN: “Vamos avaliar o que pode ser apresentado no Congresso, dentro dos princípios do nosso sindicato, que tem como base maior a organização por local de trabalho”, reforçou. As contribuições das seções sindicais e dos sindicalizados para integrarem o Caderno de Textos do Congresso de fevereiro deverão ser enviadas ao Andes-SN por e-mail (secretaria@andes.org.br) até o dia 18 de novembro deste ano. (Fonte: Andes-SN. Edição: Adufrj-SSind)

CPPD elege novos representantes Resultado será homologado pelo Consuni em 13 de novembro

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Comissão Permanente de Pessoal Docente (CPPD) divulgou o resultado de suas eleições para representantes de cinco classes de professores da UFRJ. Waleska da Silveira (FM) é a nova representante para as classes Auxiliar/Assistente. Marcelo Trovó Leite de Oliveira (IB) e Antonio Eduardo Ramires Santoro (FD) foram eleitos representantes dos Professores Adjuntos. Serão representantes dos Associados Antonio Mauricio Ferreira Leite Miranda de Sá (Coppe) e Ethel Menezes Rocha (IFCS). Os Titulares terão Carlos Alberto Manssour Fraga (ICB) e Márcia Souto Couri (MN). Na classe EBTT, foi eleita Rosangela Conceição de Souza (CAp). Participaram do pleito 632 docentes do quadro do Magistério Superior e 56 do quadro do magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico. Inicialmente, os resultados seriam liberados no dia 29 de outubro, mas, um atraso na devolução das urnas por parte do Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas fez com que o resultado final das eleições só pudesse ser divulgado em 5 de novembro. Agora, o Conselho Universitário deverá homologar a votação em 13 de novembro. O mandato dos novos representantes é de três anos. (com informações da Assessoria de Imprensa da UFRJ).


10 de novembro de 2014

www.adufrj.org.br

Painel Adufrj

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DA REDAÇÃO

Sonho intenso Por Filipe Galvão

Elisa Monteiro

John Lennon estava errado: o sonho continua. Pelo menos enquanto José Mariani percorrer escolas, universidades e cineclubes com o seu novo documentário. O filme dá sequência à proposta do diretor de repensar o desenvolvimento nacional a partir da ótica de Celso Furtado. O projeto, que começou com a cinebiografia do economista em “O longo amanhecer”, é concluído agora com “Um sonho intenso”. “O título não é meu”, lembra Mariani. “Brasil, um sonho intenso, um raio vívido”, são palavras de Joaquim Osório Duque-Estrada, autor do hino nacional de onde o diretor extraiu o trecho. “O filme é o resgate do sonho de uma geração de esquerda, que é a geração do pós-guerra”, explica. O documentário foi exibido no auditório Professor Rodolpho Paulo Rocco – o Quinhentão – do CCS, na abertura do seminário que marcou a semana do trabalhador público na UFRJ (veja matéria na página 3).

Vargas I Um dos protagonistas da narrativa de Mariani, Getúlio Vargas foi assunto recorrente. Apareceu também no debate que se seguiu entre o diretor, professores e a plateia.

Vargas. Área social

“Nós todos temos muita dificuldade de falar de Vargas, porque ele foi ditador”, observa o sociólogo Francisco de Oliveira, em passagem no documentário.

Vargas II

A professora aposentada do Instituto de Economia, Maria Lúcia Werneck, convidada a compor a mesa de debates, diz que é no primeiro Governo Vargas que a legislação brasileira avança na área social. “É o Vargas que cria a legislação trabalhista, os institutos de aposentadoria e pensões, regula direito de férias, o trabalho da mulher e do menor. O aparato de proteção social no Brasil a que o filme se refere é criado nos anos 30”, aponta.

Mariani. A imagem para explicar o Brasil

Há 45 anos Marighella era executado “Logo mais, quando a noite cair, completará 45 anos a tocaia em que o guerrilheiro Carlos Marighella (19111969) foi assassinado em São Paulo. Fuzilado pouco depois das oito horas da noite na alameda Casa Branca, o antigo deputado havia sido declarado pela ditadura, em 1968, “inimigo público número 1”. Em 4 de novembro de 1969, o revolucionário estava sozinho e desarmado, como narro na biografia “Marighella: O guerrilheiro que incendiou o mundo” (Companhia das Letras). Ao menos 29 agentes da polícia política, armados até os dentes, participaram da operação. Poderiam ter prendido o homem que caçavam, até porque contavam com cão treinado para isso, mas o executaram”. Nota do blog do jornalista Mário Magalhães, publicada na terça-feira, 4 de novembro

Vida de Professor

Internet

Internet

E o sonho deles?

A plateia questionou Mariani sobre o lado de lá. “Existe um filme com o sonho intenso da direita?”, perguntou o professor Eduardo Nazareth Paiva que se definiu como brizolista tardio e apaixonado pelo projeto de Brasil de Darcy Ribeiro. “Perturba-me muito a ideia de termos uma elite profundamente conservadora, mas que em geral não se manifesta no campo intelectual e cultural muito claramente”, disse. Quem rebateu foi Maria Malta: “Você só não vê porque tem bom gosto, porque o sonho deles invade as casas na hora do jantar, nos jornais, no cinema, nas revistas”. (da Redação)

Silvana Sá - 04/11/2014

Werneck. Proteção

Elisa Monteiro - 03/12/2013

Malta. Invasão Diego Novaes


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10 de novembro de 2014

MENOS ÓDIO, MAIS MORADIA

MTST chega ao Rio de Janeiro Movimento dos Trabalhadores Sem Teto faz sua primeira ocupação no estado, na periferia de São Gonçalo Tânia Rêgo / Agência Brasil - 05/11/2014

Duzentas famílias acampam no bairro Santa Luzia

Como pensa e atua o MTST

Elisa Monteiro

elisamonteiro@adufrj.org.br

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Moradores da ocupação fizeram manifestação em frente à prefeitura de São Gonçalo, no dia 5 Tânia Rêgo / Agência Brasil - 03/11/2014

a noite de sexta-feira, 31 de outubro, um terreno abandonado com mais de 60 mil m2, na região do bairro Santa Luzia, em São Gonçalo, ganhou novo sentido. Era o início da primeira ocupação organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), no estado do Rio — durante a Copa do Mundo, o movimento teve grande visibilidade pelas suas manifestações massivas, mas em São Paulo. A ação foi cuidadosamente planejada. As primeiras reuniões preparatórias ocorreram seis meses atrás e os últimos grupos formados articularam-se quase dois meses antes da entrada no terreno. E Vitor Guimarães, um dos coordenadores do MTST, justificou à reportagem do Jornal da Adufrj a escolha de São Gonçalo para a “estreia” fluminense. “A infraestrutura (da cidade) é pífia”, argumentou Vitor. “Além da falta de saneamento, há problemas no fornecimento de água e luz. E uma grande carência por unidades de saúde e escolas públicas adequadas”. Para agravar o quadro, o município atravessa “um processo brutal de especulação imobiliária, especialmente na periferia por onde entramos”. Sobre as razões para o atual encarecimento do solo na região, Vitor cita iniciativas de governo que “não chegaram para os trabalhadores”, mas cujas promessas foram suficientes para alimentar uma bolha especulativa. A chegada do metrô foi uma (projeto da Linha 3). Pesou, ainda, a construção do Arco Metropolitano até a vizinha Itaboraí para atender ao Complexo Petroquímico do Rio (Comperj). Esta última teria acrescentado outro componente explosivo ao quadro habitacional de São Gonçalo: “Foram feitas muitas remoções para essa obra”, conta Vitor. À pressão pelo aumento dos preços dos imóveis para aluguel e venda, somou-se a demanda crescente por moradia na cidade. O resultado, para o dirigente do MTST, foi “todo um caldo político” propício à organização do movimento na região. Segundo Vitor, o fato de as “ocupações” não fazerem parte do “imaginário” da população local criou alguma dificuldade inicial. Mesmo assim, novas adesões à ocupação não param

Cozinha é o “coração” do acampamento de acontecer, principalmente de comunidades próximas. Até o fechamento desta matéria, em 5 de novembro, aproximadamente 350 famílias (ou pouco mais de mil pessoas), com muitas mulheres e crianças, tomavam conta do lugar. E já com uma importante vitória: diante da força do movimento, uma comissão foi criada, junto à prefeitura, para discutir a construção de habitações populares naquele mesmo terreno ou em outro a ser indicado pelo governo municipal. Há expectativa de uma reunião com participação do governo federal para esta semana.

Conflito

Mesmo com toda mobilização, não tem sido fácil resistir

no local. Na noite seguinte à ocupação, houve um princípio de incêndio não esclarecido. Vitor lembra que, meia hora depois do incidente, por volta das 2h30 da madrugada, meia dúzia de policiais entrou no acampamento. “Estavam todos armados com fuzis e revólver e apenas um tinha identificação”. Segundo a liderança do MTST, a diligência partiu apenas depois de ter sido afirmado o sentido do movimento por moradia, que só poderia ser despejado com ordem judicial. O grupo voltou, contudo, no início da manhã seguinte com reforço. “Já eram em torno de dez ou doze”, conta. Desta vez, eles estavam acompanhados por um homem que reivindicava ser

Zumbi dos Palmares é inspiração

A ocupação foi batizada “Zumbi dos Palmares” logo em seu segundo dia. “Dentre os nomes que chegamos a pensar, Zumbi foi o aclamado”, conta Vitor Guimarães. “A comunidade de São Gonçalo é muito negra. E Zumbi dos Palmares é uma referência de força e resistência. Ele simboliza a mensagem de vitória para fora e de inspiração para dentro”.

dono do terreno. O candidato a proprietário trazia papéis que supostamente comprovariam o vínculo. Mas, segundo o representante do MTST, ele não permitiu que o documento fosse lido. Por outro lado, o pretenso dono afirmou não querer levar a questão à Justiça. Mas se declarou irredutível sobre a permanência dos acampados. “Como ele não negociou nada, nós também não. Avisamos que só haveria desocupação apenas com decisão da Justiça”, disse Vitor. O movimento avalia que o terreno possa pertencer a uma massa falida da G Bastos Comércio e Indústria de Embalagens Plásticas LTDA. De acordo informações conseguidas pelo MTST, a empresa faliu em 1995.

Tânia Rêgo / Agência Brasil - 05/11/2014

Faixa do MTST leva o lema do movimento

Diferentemente de outros movimentos por moradia nas cidades, o MTST não atua em prédios abandonados. “A ocupação na periferia é uma questão importante para nós”, diz o coordenador Vitor Guimarães. “Quando se ocupa prédios no Centro ou em áreas já com infraestrutura acaba-se retirando as pessoas do seu local de moradia. Nosso objetivo é que a periferia receba a infraestrutura necessária para que as pessoas vivam nela com dignidade. Nosso objetivo é a Reforma Urbana. Para isso, é preciso fazer frente aos latifúndios urbanos”. Outra característica destacada por Vitor é que, no movimento, não há loteamento. “Na verdade, a própria barraca é onde menos se fica. Procuramos valorizar o uso de espaços coletivos. E fugir da cultura de isolamento, muito marcada no caso dos apartamentos. A casa é toda a ocupação”. As barracas bem simples, estruturadas com três pinos de bambu e uma lona plástica, a princípio, não são feitas para durar. “Não vamos fazer uma nova favela”, afirma Vitor. Segundo ele, a mobilização é para o poder público responder à pauta do movimento. E essa agenda inclui a participação popular “desde o projeto até a obra”. O objetivo é uma política social completa, com trabalho além da moradia. “Somos contra mutirão. Para nós, eles representam uma dupla jornada para os trabalhadores. O ideal é que a família receba a casa”. Como exemplo vitorioso, ele citou a construção do Condomínio (antes ocupação) João Candido, em Taboão da Serra, São Paulo. “Até o secretario de Habitação (daquele estado, Silvio Torres) elogiou a obra, afirmando que os moradores estavam adquirindo o melhor módulo construído com (o programa) Minha Casa, Minha Vida. A casa feita pelo próprio morador (assalariado pela empresa para a tarefa) não atrasa”, argumenta Vitor. Ele destaca que a grande maioria das unidades habitacionais populares para famílias com baixa renda, “além de verticalizados”, “não vão além de 50m²”. Já os módulos construídos pelo movimento têm, em média, 63m². “Até o acabamento é feito e mantido pelo movimento”, frisou.


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