ISSN 1517-1175
CANDEEIRO Revista de política e cultura da seção sindical dos docentes da UFS
Ano xiv vol.22 2016
CANDEEIRO Ano xiv vol.22 2016 A REVISTA CANDEEIRO É PUBLICADA PELA SEÇÃO SINDICAL DOS DOCENTES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
CANDEEIRO Revista de política e cultura da seção sindical dos docentes da UFS
Ano xiv vol.22 2016 ISSN 1517-1175
Os artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores. Todo material escrito pode ser reproduzido para atividades sem fins lucrativos, mediante citação da fonte. ADUFS-SSIND Associação dos Docentes da Universidade Federal de Sergipe Seção Sindical do Sindicato dos Docentes das Instituições de Ensino Superior ANDES Sede administrativa Cidade Prof. José Aloísio de Campos. Bairro Rosa Elze São Cristóvão - Sergipe CEP: 49100-000 Telefone: (79) 3259-2021 Site: www.adufs.org.br E-mail: adufs@adufs.org.br / candeeiro@adufs.org.br
DIRETORIA DA ADUFS-SSIND 2014/2016 – “ADUFS DE LUTA E PELA BASE” Presidente: Jailton de Jesus Costa Vice-presidente: Acácia Maria dos Santos Melo Secretária: Brancilene Santos de Araújo Diretor Adm. e Financeiro: Júlio Cézar Gandarela Resende Diretor Acad. Cultural: Otávio Luiz Cabral Ferreira Suplentes: Marcos Antônio da Silva Pedroso, Marcos Santana de Souza e Dênio Santos Azevedo. Membros do Conselho Editorial: Antônio Fernando Araujo de Sá Antônio Ponciano Bezerra Brancilene Santos de Araújo Elyson Ádan Nunes Carvalho Jailton de Jesus Costa Marlucy Mary Gama Bispo Maria Aparecida Silva Ribeiro Sérgio Queiroz de Medeiros Revisão gramatical: Antônio Ponciano Bezerra Jornalista: Raquel Brabec (DRT-1517) Projeto gráfico, diagramação e ilustração: Fernando Caldas Capa, elementos gráficos e arte das seções baseadas no trabalho do artista Antônio da Cruz Assistente de produção e divulgação: José Nilson da Silva Tiragem: 1300 exemplares
SUMÁRIO 9
Oferta de Recursos para Inovação Tecnológica no Brasil e Resposta do Sistema Produtivo: Razões do Hiato Atual e Impactos na Universidade Eduardo G. Serra, Rafael Barbastefano
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50 anos do Golpe de 1964 e os lugares de memória da Ditadura Militar em Sergipe Antônio Fernando de Araújo Sá
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História, turismo e educação patrimonial em Sergipe Claudefranklin Monteiro Santos
34
Educação em Cuba: Uma discussão para o mundo! Sérgio Dorenski D Ribeiro, Claudio Lucena de Souza, Augusto Cesar Rios Leiro
46
Violência e linguagem Antônio Ponciano Bezerra
51
Erosividade da chuva (R) para a bacia hidrográfica do Rio Longá-Piauí Cláudia Maria Sabóia Aquino, Amanda Alves Dias
58
Quadros: ‘‘Cores e Subjetividade’’ Maria Eliza da Cruz
67
Ensaio: “O texto de prazer é Babel feliz”. A escrita em rede, entre o coletivo e o monológico Maria Aparecida Silva Ribeiro
69
Poesias Sérgio Queiroz de Medeiros
70
Cordel: O dia que jesus virou professor Elyson Carvalho
73
Resenha do livro “Paisagens da Pesquisa Contemporânea sobre o livro didático de História”. Janaina Cardoso de Mello
77
Biografia do artista Antônio da Cruz
80
Filie-se
06
EDITORIAL
Nesta edição, encontra-se o número 22, da Revista Candeeiro. Na verdade, um pouco fora de sua periodicidade, o que não macula as suas intenções e seus compromissos com os seus leitores. Este periódico se notabilizou como veículo de informação e divulgação de ideias de todos os que fazem, neste imenso país, o movimento sindical da categoria docente. Isto não quer dizer que se restrinja a esse segmento acadêmico. Na história deste veículo de comunicação, constata-se a participação de alunos, de técnicos administrativos e de outros colaboradores. A Candeeiro tornou-se, assim, um espaço plural de publicização de elaborações mentais de natureza científica, cultural, opinativa e artística, para além de um suporte de luta por ideais que, há mais 40 anos, os docentes da Universidade Federal de Sergipe e de outras universidades públicas brasileiras travam contra desmandos e ameaças de soterramento dessas instituições de ensino superior pelos poderes públicos, desta nação. Os textos aqui publicados são signos que perpassam o tempo e continuam a habitar em algum lugar da memória de nossos leitores e militantes. Os artigos multitemáticos que ora publicamos oferecem, por sua natureza, a imagem precisa daquilo que esperamos, seja sempre o tom de diálogo e debates, e não a mancha turva de alguém que ocupa espaço em benefício próprio. A integração de autores e de artigos que este número apresenta, com diversidade de pontos de vista e de competência argumentativa constitui a qualidade de contributos que o compõe. Às vezes, ultrapassam-se os muros formais da academia e, ao lado da pulsação científica, convidamos os nossos leitores ao convívio com a expressão artística e literária. Acima das temáticas que aborda, esta Revista se firmou e continua fiel à linha culturalmente marcada pela vontade de diálogo. Essencialmente, este volume da Candeeiro comporta os seguintes artigos temáticos: 1) Eduardo G. Serra (UFRJ) e Rafael Barbastefano (CEFET/RJ) tratam da inovação tecnológica no Brasil e pontuam que esse discurso “...é de importância fundamental para a competitividade da economia brasileira e, com destaque, para a indústria”; 2) Antônio Fernando de Araújo Sá (UFS) discorre sobre os 50 anos do golpe de 1964, realçando que os historiadores são interpelados “...pelas memórias traumáticas das experiências autoritárias das ditaduras latino-americanas,(...)”; 3) Claudefranklin Monteiro Santos (UFS) explana sobre História, turismo e educação patrimonial em Sergipe, focalizando a ausência de profissionalismo nessas interfaces e asseverando que “O professor e o turismólogo, por definição, são profissionais da informação ao tempo em que são também mediadores culturais”; 4) Sérgio Dorenski D. Ribeiro, Cláudio Lucena de Souza e Augusto César Rios Leiro (UFBa) discutem sobre educação em Cuba, “nos diversos cantos do mundo”, relevando que “Cuba possui uma educação planificada e planejada” cujos “...conteúdos educacionais transmitidos, no campo escolar (básico e superior) são os mesmos para toda a Ilha”; 5) Antônio Ponciano Bezerra (UFS) enfoca o tema violência e linguagem, destacando que o uso de expressões linguísticas que denotam intolerância devasta o próximo e fere a dignidade humana; 6) Maria Aparecida Silva Ribeiro (UNIRIO), numa escrita sugestiva, assevera que “O texto de prazer é uma Babel feliz” e nos conduz a conceber que “...a escrita que se produz nas redes sociais parece ser, majoritariamente, do domínio da afetividade, do prazer e do entretenimento”; 6) Cláudia Maria Sabóia Aquino e Amanda Alves Dias (UFPI) discutem, em seu artigo, sobre a “influência dos processos hídrico-erosivos, na bacia hidrográfica do Rio Longá-Piauí”, e apontam a necessidade de estudos mais aprofundados desse problema de preservação ambiental que melhor organizem o espaço agrícola do Piauí. Na sequência, o poeta Sérgio Queiroz de Medeiros nos brinda com dois de seus textos poéticos que compõem a sua produção artístico-literária. Temos, ainda, um cordel da lavra de Elyson Carvalho, livre de peias, de regras e de modelos. O sugestivo título “O dia que jesus foi professor” é uma deliciosa ironia à profissão docente. Por fim, Janaina Cardoso de Mello apresenta a sua resenha da obra “Paisagens de Pesquisa Contemporânea sobre o livro didático de História”, e conclui que esta obra é “...primordial para a biblioteca de todos os docentes que pensam e avaliam seu cotidiano”. E, assim, fecha-se este número alentado da Candeeiro, ao mesmo tempo em que, no laço social que o envolve, abrem-se novos espaços e condições que nos permitirão extravasar as nossas potencialidades de reflexão e de produção cultural. Boa Leitura. Antônio Ponciano Bezerra/DLEV/UFS.
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ARTIGOS
Oferta de Recursos para Inovação Tecnológica no Brasil e Resposta do Sistema Produtivo: Razões do Hiato Atual e Impactos na Universidade Eduardo G. Serra* Rafael Barbastefano **
*Eduardo G. Serra (serra@poli.ufrj.br) é professor do Programa de Engenharia Ambiental da UFRJ. **Rafael Barbastefano (barbastefano@gmail.com.br) é professor do CEFET RJ. 1Realizado pelo IBGE com apoio da FINEPe do MCT, em 2008
1. Introdução Nos últimos anos, tem predominado, no governo federal, seja na administração direta ou nas agências de fomento, o discurso de que a busca de inovação tecnológica é de fundamental importância para a competitividade da economia brasileira e, com destaque, para a indústria. Coerentemente com este discurso, recursos financeiros têm sido disponibilizados em escala crescente, principalmente pelas agências e programas oficiais, a partir de fontes próprias, de fundos setoriais e por mecanismos fiscais diversos, para o financiamento de atividades de P&D em empresas e em instituições como institutos especializados e universidades, de natureza pública e privada. O cenário parece favorável à atividade inovadora: de acordo com dados do Relatório da Pesquisa de Inovação Tecnológica – Pintec1 –, foram despendidos, em 2008, um total de R$ 54,1 bilhões em Inovação, o que representa 31% a mais do que o gasto total em 2006. O número de empresas inovadoras também cresceu, de acordo com a mesma fonte, tendo passado de 95,3 mil para 106,8 mil, no mesmo período. Muitos autores, como ROCHA, SOARES e CASSONI (2011), consideram a inovação como uma das diretrizes fundamentais para o desenvolvimento do Brasil. No entanto, ainda que os recursos disponíveis para a pesquisa tecnológica venham aumentando, a resposta do sistema produtivo tem sido, entretanto, extremamente baixa, ainda que tenha aumentado, em alguma medida, nos últimos anos, o que suscita discussões e em torno das causas deste fenômeno e acalorados debates quanto ao modelo brasileiro de fomento à inovação,
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envolvendo o papel das universidades e das políticas públicas e suas relações com o setor privado, assim como as estratégias das empresas brasileiras na busca da competitividade. Este trabalho analisa o tema de forma abrangente, levando em conta fatores estruturais característicos do processo de desenvolvimento da indústria e da economia brasileira, nas últimas décadas, e do sistema universitário do país, assim como elementos constitutivos da dinâmica interna da pesquisa científica e tecnológica. 2. Inovação A categoria Inovação tem, como principais definições, de acordo com o dicionário Merian Webster's, a introdução de algo novo, uma nova ideia, método ou dispositivo, ou novidade. Inovação envolve produtos, processos produtivos e também métodos gerenciais e criação de novos mercados. A introdução de inovações, na produção, assim como o desenvolvimento tecnológico, na grande maioria dos casos, está ligada diretamente aos interesses das empresas privadas, em sua busca por vantagens na competição. A difusão de tecnologia pode ser medida e explicada pelas trajetórias e políticas tecnológicas desenvolvidas por cada empresa, seu nível de conhecimento e capacitação, somadas à caracterização e dinâmica tecnológica e concorrencial de cada setor da produção, e à presença e às características e ao grau de desenvolvimento dos chamados sistemas nacionais de inovação, expressão criada por FREEMAN (1987) e outros autores2. Os sistemas de inovação podem ser descritos como a interação entre empresas, universidades, agências públicas e privadas voltadas para o desenvolvimento tecnológico e outros elementos. Nesse sentido, os casos de muitos países desenvolvidos e de industrialização recente merecem atenção
quanto às políticas nacionais utilizadas para a Indústria, a Ciência e a Tecnologia e seus respectivos instrumentos, como os de fomento estatal às atividades de P&D e à política de picking winners3. O exemplo do Japão está entre os mais relevantes quanto à intensidade do esforço e da participação do estado, entre os países desenvolvidos, e o da Coreia do Sul é, certamente, um dos mais relevantes, entre os países de industrialização recente. O montante de gastos em P&D é um importante indicador do volume do esforço inovador dos países. Como mostra a tabela abaixo, o padrão de investimento dos países desenvolvidos está bem acima do Brasil, e os exemplos da Israel, Coreia do Sul, Taywan e Cingapura, países de industrialização recente, e da China, com sua vertiginosa trajetória de crescimento recente, são bastante representativos da diferença de postura quanto à política tecnológica, neste aspecto.
Paises selecionados
Gastos totais em P&D/PIB - 2011
Israel
4,2
Coreia do Sul
3,74
Japão
3,67
Suécia
3,3
Estados Unidos
2,7
Alemanha
2,3
Taywan
2,3
Cingapura
2,2
China
1,97
India
0,9
Brasil
0,9
Fonte: WIPO - World Intellectual Property Organization (2012)
2 Pavitt (1984) apresenta uma taxonomia para a difusão de inovações em diferentes setores. Para o autor, a difusão pode se dar em setores dominados pelo fornecedor, a partir de fontes externas às firmas, como nos setores têxtil e agrícola; em setores intensivos em escala e produção, a partir de fontes internas – presença de estruturas de P&D – e externas – fornecedores de equipamentos, como os setores automotivos e de transportes; a partir de fornecedores especializados – intensivos em produção – com características de alto desempenho e customização, como nos setores de instrumentos de alta tecnologia e equipamentos de produção; e em setores com base científica forte, como as áreas eletrônica e farmacêutica, de fontes internas e externas às empresas, com destaque para as universidades. O autor ressalta que os fatores que levam à inovação são diferentes em cada setor, e que as inovações surgem a partir da presença de estruturas de P&D, e também através da presença de pessoal qualificado, por ações de learning by doing e de interações diversas entre estes e outros fatores presentes em cada país. 3 É a escolha, pelo governo, de empresas que devem receber apoio especial para firmarem-se no mercado.
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3. A política brasileira de fomento à inovação tecnológica. O atual discurso oficial sobre a orientação geral das políticas de Ciência e Tecnologia no Brasil tem origem na década de 90, quando uma série de reformas estruturais seria empreendida pelos governos Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso, sob a égide e a orientação geral do chamado ideário neoliberal. Entre muitas outras ações, destacaram-se a redução da presença do Estado na Economia, com o relaxamento da regulação, em geral, a privatização de empresas estatais e a abertura da economia brasileira para o exterior, visando à sua “integração competitiva”, no mercado mundial. Vista como um dos “fundamentos” da política econômica, a busca da estabilidade começaria pela adoção do Real, a nova moeda do país, lastreada no Dólar, e se desenvolveria com uma redução significativa nos gastos sociais. No plano da C&T, de forma coerente com a orientação geral da política econômica, iniciou-se, então, o lançamento de diversas medidas para fomentar a construção de maior produtividade e competitividade para as empresas brasileiras. A criação do Conselho Nacional para a Ciência e a Tecnologia – CCT – pela lei 9.257, de 1996, com a função de coordenar a política nacional de C&T, foi um passo decisivo para a execução das reformas no setor de pesquisa. Em 2001, realizou-se a I Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, cujo documento-base “Ciência, Tecnologia e Inovação: desafios para a sociedade brasileira”, conhecido como o “Livro Verde”, reflete a essência da política governamental para este setor, que pode ser resumida nas linhas gerais de estabelecimento de parcerias entre instituições públicas e empresas privadas, cabendo ao Estado concentrar os gastos públicos nas áreas de “alta relevância econômica”. Em 2004, já no governo Lula, foi elaborada a Lei da Inovação Tecnológica – lei 10.973 – a partir dos debates da II Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, que teve, como texto-base, o chamado “Livro Branco”. A lei regulamentada em 2005, pelo decreto 5563, centra-se na “Construção de um ambiente propício para a inovação e parcerias estratégicas entre empresas e universidades, incentivo a
atividades de Pesquisa e Desenvolvimento, nas universidades e institutos de pesquisa, e incentivo à inovação, nas empresas. Encontra-se, atualmente, em tramitação, no Congresso Nacional, um novo projeto de Lei (chamado, inicialmente, de Código Nacional de Inovação) que visa aprimorar a regulação dessa atividade que, ao que tudo indica, não mudará os contornos atuais da Lei da Inovação. 4. A discrepância entre os esforços de Ciência e de Tecnologia no Brasil São poucos os feitos tecnológicos já alcançados pelo Brasil, podendo ser citados, com destaque, a prospecção de petróleo em águas profundas, o projeto e a fabricação de aviões, o plantio de soja no serrado, o domínio do ciclo do urânio, a construção de grandes estruturas de concreto. Ao contrário de países de industrialização tardia, como a Índia e a China, não realizamos uma missão espacial completa, a colocação em órbita de um satélite lançado com foguete projetado e construído no país. Estamos bastante atrasados em quase todas as áreas, mesmo em relação a este grupo de países. Em 2010, o investimento privado em P&D foi de 0,57%, do PIB, para 0,54% de investimento público, conforme dados do Ministério da Ciência, Inovação e Tecnologia. São números baixos, no plano internacional, se comparados com os 2,46% gastos pelo setor privado e os 0,86% investidos pelo setor público na Coréia do Sul (números de 2008), e dos 2,68% e 0,54%, respectivamente, do Japão. Pode-se constatar que o padrão dos países desenvolvidos e dos países de industrialização recente é de predomínio dos gastos privados. No que tange às universidades, é bastante conhecida a significativa discrepância entre o elevado e crescente número de artigos científicos publicados pelo conjunto das universidades brasileiras (a principal fonte deste tipo de publicações) e outras instituições e o número de patentes registradas pelo Brasil, em seu conjunto: o número de artigos científicos brasileiros publicados em revistas indexadas vem crescendo significativamente, tendo passado de 2.409 (ou 0,47% da produção mundial), em 1985, para 32.100, em 2010, o que equivale a 2,69% da produção mundial (dados do CNPq). Cabe lembrar, aqui, que, a partir de 2008, o Institute for Scientific Information - ISI, uma das 11
principais referências para a qualificação de revistas científicas e para a quantificação da produção, passou a considerar os trabalhos publicados em revistas brasileiras. Quanto às patentes, de acordo com dados da WIPO, de 2012, foi pedido o registro de 6,6 mil patentes por empresas e pesquisadores brasileiros, o que coloca o Brasil na 28ª posição na comparação internacional. Este número é quase 100 vezes menor, em relação ao número de pedidos da China, e abaixo de países como Espanha, Israel e Coreia do Norte. No mesmo ano, foram pedidas cerca de 30.000 patentes, no INPI (5,1% a mais do que em 2011), mas apenas 2,8 mil registros foram concedidos. O número de registros de desenhos industriais se reduziu, no Brasil, em cerca de 4% entre 2011 e 2012. No que se refere aos registros de marcas, o número de pedidos, no Brasil, equivale a um décimo dos números da China.4 5. Os recursos disponíveis São significativos os exemplos do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa), que dispunha, para o ano 2012, de cerca de R$ 6 bilhões para subvenção e crédito, e do MEC (dados de 2012), que aplicará R$ 2,5 bilhões para que 100.000 estudantes de Engenharia sejam enviados ao exterior nos próximos 10 anos. As principais fontes dos recursos para o financiamento das atividades voltadas para a Inovação são: 1- os incentivos fiscais, regulamentados, entre outros instrumentos, pela Lei 11.196/2005, envolvendo dedução dos gastos em Inovação – incluindo-se os pagamentos de royalties – para o cálculo de impostos sobre os lucros, facilidades para a depreciação de equipamentos usados no esforço inovador, e redução de IPI; 2- a subvenção econômica, com a concessão de recursos não reembolsáveis por agências como a FINEP (que movimenta os recursos dos Fundos Setoriais), para empresas que desenvolvam atividades de P&D e Inovação, regulamentada pela Lei da inovação e outros
instrumentos. A subvenção compreende a remuneração de pesquisadores contratados, despesas de custeio, patentes e outros gastos; e 3- outros mecanismos, como linhas de financiamento oferecidas pela FINEP e pelo BNDES, além de outras agências, como as Fundações de Amparo à Pesquisa, como a FAPERJ, e o CNPq, com várias modalidades. Como exemplo dos montantes ofertados, o BNDES ofereceu, em 2010, cerca de 1,4 bilhão de Reais para atividades inovadores. Além de algumas grandes empresas, onde se destaca a Petrobrás, as principais captadoras são as universidades, com destaque para Unicamp, USP e UFMG. 6. A resposta do sistema produtivo Ao contrário do que esperavam os formuladores da política de fomento à C&T, a resposta do setor produtivo tem sido extremamente baixa, ainda que tenha aumentado, nos últimos anos, como confirma a posição do país no ranking global de inovação, de acordo com dados da OMPI (2012): Brasil era, em 2010, o 47º país em número de patentes registradas, sendo que, de 2007 a 2010, o número de demandas por novas patentes passou de 56 para 134. É relevante a informação de que, no que diz respeito ao número de artigos científicos publicados, o Brasil está em 13º lugar, no ranking mundial, como informa a CAPES (2013). Um estudo da firma Montaury Pimenta, Machado e Vieira mostra que as empresas brasileiras perdem para as chinesas e indianas, no que tange ao registro de patentes: em 2010, o US Patent and Trademark Office (USPTO) concedeu 175 pedidos ao Brasil, 2657 à China e 1098 da Índia (O GLOBO, 18/12/2011). As empresas brasileiras, segundo o mesmo estudo, perdem para as estrangeiras, que têm 68% dos pedidos no INPI, contra 38% das nacionais. Segundo o Relatório Pintec (2008), entre os 10 maiores setores captadores de recursos para Inovação, 7 são industriais e 3 são de serviços. 5 Quanto às fontes de investimento utilizadas pelas empresas, do
4 Há 8,6 milhões de patentes em vigor no mundo. Desse total, os EUA detêm o maior número, com 2,2 milhões, seguido pelo Japão, com 1,7 milhão, e pela China, que possui 900 mil patentes. 5 Produtos eletrônicos e óticos (parte), como 3,6% do total, equipamentos de comunicação, com 3,8%, produtos diversos, com 4,1%, fabricação de automóveis, ônibus, utilitários e caminhões, com 4,2%, impressão e reprodução de gravações, com 4,4%, fabricação de produtos químicos e famacêuticos, com 4,9%, fabricação de outros equipamentos de transporte, com 5,1%, desenvolvimento e licenciamento de programas de computador, com 3,8%, e tratamento de dados, hospedagem na internet e atividades relacionadas, com 6,5%.
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total de empresas inovadoras identificadas, de acordo com o mesmo relatório, 66% têm mais de 500 empregados, sendo consideradas grandes empresas. Os dispêndios com inovação são da ordem de 2,9% do faturamento, tendo se mantido nesse patamar, ao longo do período estudado. Quanto às principais fontes de recursos utilizadas, 80,58% das empresas recorrem a recursos próprios ou a fontes privadas externas (sendo que, desse total, 4,33% são recursos próprios) e apenas 19,42% dos recursos captados vêm de fontes públicas. O Relatório citado aponta que, em 2008, apenas 1% das empresas beneficiaram-se dos incentivos fiscais oferecidos, e 0,75% recorreram às subvenções econômicas. Desse total, a grande maioria (5.559) utilizou os recursos públicos para a compra de máquinas e equipamentos e para outros programas (2.981), tendo sido de 383 o número de empresas que empreenderam, com recursos públicos, projetos de cooperação com universidades e de 581 o número de empresas que desenvolveram projetos de P&D e de Inovação, sem a parceria com as universidades. 7. O debate em curso sobre a discrepância entre recursos oferecidos e a resposta do sistema Diferentes explicações vêm sendo apresentadas em meio ao debate em curso sobre a aparente contradição entre a disponibilidade de recursos e a resposta do sistema produtivo. Uma vertente de explicações centra-se nos problemas derivados das disputas pela remuneração das inovações entre inventores e empresas. Estas, de acordo com Isa Assef, presidente da Associação Brasileira de Instituições de Pesquisa Tecnológica e Inovação (entrevista a O Globo, de 28 de agosto de 2011), levam vantagem na barganha, mesmo em relação às universidades como um todo, na divisão dos royalties. Para Isa, no entanto, é relevante o papel das parcerias públicoprivadas no fomento à inovação, com destaque para a cooperação entre empresas e universidades. Outros argumentos usados com frequência são a falta da “cultura da inovação”
predominante no empresariado brasileiro e as dificuldades encontradas nos trâmites burocráticos para o registro das invenções – o que leva as empresas a não registrarem os inventos. Um claro exemplo deste entrave é caso do Bina (o dispositivo de identificação de chamadas telefônicas), inventado por um brasileiro, que, mesmo tendo sido registrado no IPNI, ainda hoje encontra dificuldades para receber o pagamento dos royalties devidos, como relata o estudo da Montaury Pimenta6. Fala-se, também, da lentidão do processo: um pedido leva cerca de 3 anos para ser analisado nos EUA, enquanto que, no Brasil, o processo leva, no caso geral, cerca de 7 anos, no Brasil. Como uma das justificativas para este fato, é apontada a falta de mão de obra especializada no INPI. Mais ainda, dados da FIESP (2013) mostram que, ao contrário do que se possa pensar, tampouco o setor de serviços “puxa” os esforços de inovação, no Brasil. Um survey recente do IEDI (2012), realizado junto a 40 grandes empresas nacionais e internacionais, operando no Brasil, mostra um quadro conservador quanto à percepção dos empresários sobre a importância da tecnologia para o desenvolvimento da competitividade das empresas, ainda que, para 58% dos dirigentes entrevistados, este fator seja muito importante e que, para 42%, o fator seja considerado relevante. Estes números sobem para 80% e 20%, respectivamente, quando a questão é remetida para uma referência de 10 anos no futuro. No entanto, ainda de acordo com o estudo, prevalecem posturas empresariais tímidas, a do seguidor rápido do líder (fast follower) ou de licenciador7 de tecnologias. O exame das capacitações declaradas revela um quadro precário, com muitos problemas, como a dificuldade de gerenciar redes externas de conhecimento e inovação abertas. O debate, entretanto, está permeado por falsos pressupostos, que devem ser identificados e superados. O primeiro destes falsos pressupostos é o entendimento de que, necessariamente, a inovação tecnológica é o motor do desenvolvimento econômico; o segundo pressuposto tem como pano de fundo a compreensão ou crença –
As empresas que utilizam o invento pagaram, no início, mas, posteriormente, deixaram de pagar. A empresa “seguidora rápida” é aquela que, tendo as condições materiais e organizacionais para inovar, adota uma postura de cautela, adotando a nova tecnologia apenas após a confirmação de seu sucesso pela empresa líder; a empresa licenciadora não inova, apenas usa a respestiva licença, pagando os devidos royalties. 6
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hegemônica, desde o início dos anos 90 até muito recentemente, no Brasil –, de que, de forma “natural”, a estrutura de livre mercado e a presença de grandes empresas industriais no Brasil, além dos novos “nichos” de mercado a serem explorados com produtos e processos inovadores, são, por si, elementos capazes de conduzir ao desenvolvimento tecnológico; o terceiro remete à afirmação corrente de que é, nas universidades, que deve ser alocada a maior parte das atividades de P&D no Brasil e, associada a esta afirmação, a identificação de que há necessidade de serem implementados mais convênios entre universidades e empresas para a cooperação tecnológica, com ênfase na geração “acadêmica” de patentes a serem difundidas para o sistema produtivo privado. Parques e polos tecnológicos, “incubadoras” de empresas e trabalhos de consultorias técnicas estão entre os principais canais de difusão mais comumente elencados. Diversos elementos reforçam a aceitação destes falsos pressupostos como verdadeiros. Um deles é a leitura corrente, construída a partir de artigos acadêmicos e matérias midiáticas diversas, dos “caminhos de sucesso” de países como Japão e Coreia do Sul, atribuídos, na visão desses autores, ao esforço inovador e às iniciativas do setor produtivo privado; a criação, no Brasil, de alguns centros de Pesquisa e Desenvolvimento de empresas multi e transnacionais também contribui para a construção dos pressupostos citados, principalmente nos casos em que sua localização se dá em campi universitários. Casos de sucesso de algumas micro e pequenas empresas inovadoras também se somam à construção desta ideia. As dificuldades e “resistências” quanto à presença de atividades de pesquisa aplicada nas universidades é também um eixo de explicação para a pouca resposta à oferta de recursos. Em meio a um ainda forte debate sobre a justeza da existência de pesquisas de cunho aplicado, em meio à estrutura universitária e sua relação com a pesquisa básica, muitos entendem que a presença de esforços de pesquisa aplicada inibem o desenvolvimento da pesquisa básica. PAVITT (1991) questiona se há mesmo fortes laços entre os dois campos, e aponta para uma tendência geral à “comercialização” da pesquisa aplicada. Há muitas definições para o que chamamos de “pesquisa básica”. As mais 14
comuns são de um esforço “controlado pelo pesquisador”, um trabalho “autônomo” ou uma atividade “sem aplicações previamente antevistas”. Muitas interfaces entre os dois campos, no entanto, podem ser detectadas, pois do trabalho “aplicado” podem surgir – mas não necessariamente – proposições e caminhos de investigação teórica. A recíproca é igualmente verdadeira, mas tampouco ocorre, necessariamente, em todos os casos. O chamado “Modelo Linear” – a ciência descobre ou inventa, a indústria adapta e a sociedade se conforma, como muitos viam esta relação há poucas décadas –, não acontece assim, na realidade, para a maioria dos casos, uma vez que o “drive” para as aplicações não é a ciência em si, mas sim as necessidades de empresas e usuários. Há, igualmente, muitos exemplos de inovações ocorridas antes da formulação teórica, e pode-se afirmar que a maioria das inovações tem caráter incremental, sendo pouco numerosos os desenvolvimentos de inovação que podem ser chamados de “radicais”. Do ponto de vista das empresas privadas industriais, pode-se afirmar que é extremamente arriscado fazer pesquisa básica e mesmo pesquisa aplicada, com caráter sistemático, como analisa ROSEMBERG (1990). As incertezas inerentes ao processo de seu sucesso, em si, da pesquisa e da viabilidade de introdução de seu resultado no processo produtivo ou na forma de produto, o volume extremamente elevado de recursos necessários e o longo prazo de maturação requerido para este tipo de investimento são as principais razões apontadas para esta dificuldade, que faz com que apenas os grandes grupos empresariais consigam arregimentar financiamento para montar aparatos de P&D, com destaque para aqueles que atuam em setores cuja competição se dá de forma predominante por inovações de processo ou produto e para a ação das microempresas especializadas em um desenvolvimento específico. 8. As razões do problema As principais explicações, a nosso ver, para o problema da discrepância entre a oferta de recursos para a promoção de inovações e a baixa resposta do sistema vêm de diferentes planos. No que diz respeito ao conjunto de elementos das políticas gerais que influem na tomada de decisões quanto à possibilidade de promoção de inovações
tecnológicas, tem destaque o papel das taxas de juros praticadas no Brasil, nos últimos anos, que ainda se situam em níveis bastante elevados. Este fato reforça o desincentivo aos investimentos em P&D, uma vez que as taxas elevadas tendem a atrair o capital disponível, alternativamente, para aplicações financeiras, uma vez que o investimento em inovação é inerentemente arriscado e com alta probabilidade de fracasso. Apesar do fomento público à inovação existir, e em valores expressivos, no Brasil, sua aplicação é, no caso geral, difusa e sem cobrança clara de resultados pelos órgãos financiadores. Muitos documentos de agências públicas e órgãos de Governo que demarcam as áreas consideradas estratégicas para a oferta de recursos, em diversos níveis, mais se assemelham a cartas de intenção8 do que propriamente a indicações de projetos integrados ou, no mínimo, a um elenco de prioridades claramente identificáveis. Não é difícil encontrar editais que incluem, como áreas estratégicas de fomento, definições difusas como “Agricultura familiar, orgânica, sustentável e industrial” ou “Desagregação social”. Ao fazerem isso, as instituições de fomento simplesmente sinalizam que não possuem áreas estratégicas definidas para apoiar. Em alguns casos, se verifica um esforço de fomento com alvo específico, com grandes somas de recursos disponibilizados para grupos selecionados. O BNDES, no fomento a determinadas empresas, e o CNPq, através de editais a grupos de excelência, fazem, costumeiramente, esse tipo de ação, mas pouco se pode averiguar quanto ao tipo de resultado que é exigido dessas linhas de fomento especiais e quanto ao acompanhamento realizado. 9. O “pano de fundo” O padrão de desenvolvimento industrial predominante no Brasil, nas últimas seis décadas, é a razão de fundo para a explicação do quadro de elevada discrepância entre a oferta de recursos para a pesquisa tecnológica e o baixo grau de resposta do sistema produtivo. Este padrão começou a se forjar, no contexto dos anos 50, com destaque para os períodos referentes ao Plano de Metas, do governo de Juscelino Kubitshek (1956 – 1960), e ao longo das duas décadas 8 9
seguintes, com os governos do chamado ciclo autoritário, principalmente no intervalo entre 1967 e 1978. Neste período, o Brasil, assim como diversos outros países da América Latina, Ásia e África, que se haviam libertado do jugo colonial ou que tiveram mudanças significativas, nas suas estruturas social e política, começou a trilhar um caminho de desenvolvimento acelerado, tendo como base a industrialização pela via da substituição de importações. A atração de capital estrangeiro foi uma das prioridades adotadas para a aceleração do processo, viabilizado, entre outros fatores, pela expansão, em curso, das grandes empresas industriais com base nos países capitalistas desenvolvidos para a América Latina e outras regiões menos desenvolvidas do mundo, em busca de novos mercados. As possibilidades de desenvolvimento de uma matriz tecnológica autônoma, na região, foi amplamente discutida, à época. Da Teoria da Dependência, com sua visão de que um processo de desenvolvimento só seria possível, para os países latino-americanos, por um caminho de atrelamento às economias desenvolvidas, à proposta da Comissão da ONU, para a América Latina (Cepal), de adoção de estratégias de desenvolvimento capitalistas autônomas, pela via da substituição de importações. Identificada a tendência de deterioração das relações de troca comerciais entre o centro desenvolvido industrializado – os EUA, para o caso da AL –, e a periferia agrário-exportadora, diversos corpos teóricos de análise desta questão, naquele período, apontaram para um quadro de industrialização não autônoma, na região. Ruy Mauro Marini9 aprofundou, em seu trabalho, as razões que levaram as grandes empresas transnacionais à decisão de estabelecerem-se, no Brasil, partindo da análise dos interesses de classes sociais presentes e concentrando-as em dois blocos de explicações: a busca da superexploração do trabalho, dados os baixos salários oferecidos, à época, e a ocupação dos mercados internos, estando prevista, ainda, a expansão das filiais brasileiras para os países vizinhos, num processo chamado por ele de “subimperialismo brasileiro”. Neste modelo, as empresas estrangeiras eram atraídas, principalmente, pela possibilidade de acesso aos mercados
Algumas sujeitas à influência de grupos de pesquisa com alto prestígio Vide referências bibliográficas
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interno ainda inexplorados, pelos baixos salários pagos no Brasil, comparativamente aos salários pagos nos países de origem, e por um conjunto de vantagens e incentivos oficiais, como subsídios, isenções fiscais, oferta de infraestrutura, garantia de encomendas e reservas de marcado, entre outros. Nos anos 60 e 70, como reação ao choque do petróleo e também como parte da estratégia de desenvolvimento adotada pelos governos militares, foram criadas muitas empresas estatais, com forte presença nos setores de infraestrutura, de extração mineral e de indústria de base. Em alguns casos, principalmente na segunda metade dos anos 70, desenvolveram-se, com papel de destaque na integração entre pesquisa e produção, os chamados complexos produtivos estatais e privados de origem estatal, que têm nos conjuntos ITA / Embraer, Embrapa e Marinha de Guerra os principais exemplos, somando ao complexo do Petróleo, já existente desde os anos 50. Completa o quadro do processo de industrialização brasileira, neste período, e principalmente ao longo do governo Geisel, a constituição de grandes empresas privadas nacionais, com forte apoio do Estado, que, na ocasião, buscava, através do II Plano Nacional de Desenvolvimento, num contexto de forte pressão nas contas externas deflagrada pelo I choque do petróleo (de 1973), ordenar a continuidade do processo de substituição de importações, pondo a ênfase, então, nos setores de geração e transmissão de energia, química pesada, siderurgia e outros, além de alguns setores considerados estratégicos, como o de informática. Em muitos desses segmentos, houve uma maior presença de empresas nacionais, como pode ser destacado no segmento de máquinas e equipamentos. Nos anos 80, pouco se alteraria a composição da indústria brasileira, dado o quadro de crise financeira e estagnação que predominou na economia. Este período, que seria chamado de “década perdida”, por diversos autores, por conta das baixas taxas de crescimento do PIB, seria sucedido, a partir do início da década seguinte, por uma nova hegemonia política no plano internacional 1 0 que se traduziria, no campo econômico, pela predominância do ideário neoliberal, na política econômica brasileira, 10
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Deflagrada pela queda da URSS e outros fatores.
que resultou, entre outros elementos, em políticas de abertura às importações, retirada de medidas de proteção, privatização de empresas públicas, desregulamentação de muitos setores da economia, atração de investimentos estrangeiros diretos. Este padrão não se alteraria, em seus aspectos essenciais, a partir de 2002, quando o PT assumiu o governo federal, até presente. Como resultado, além da desindustrialização interna causada pela concorrência generalizada com produtos importados, mais uma vez, a entrada de empreendimentos industriais completos, que não necessitam de tecnologias desenvolvidas localmente, a importação de máquinas e equipamentos, a fabricação de bens sob licença, a partir de patentes estrangeiras, e a formação de grandes grupos privados de capital brasileiro que passaram a internacionalizar-se, como nos casos dos grupos Pão de Açúcar, Vicunha, Vale e outros, confirmando a tendência geral de internacionalização do capitalismo. O padrão de atuação das empresas estrangeiras que prevaleceu, no início do processo, foi o de transferir ao Brasil maquinário em geral já depreciado ou em fase final de uso. Os produtos eram fabricados de acordo com os projetos e com a tecnologia de produção desenvolvidos nas respectivas matrizes, e, assim, com raras exceções, as empresas estrangeiras não criaram centros de Pesquisa e Desenvolvimento, no Brasil, fazendo, apenas, a adaptação de seus produtos para as necessidades e características locais. Ao longo das últimas décadas, algumas empresas estrangeiras passaram a instalar centros de pesquisas, no Brasil, e, nos últimos anos, este processo apresentou alguns sinais de aceleração. No entanto, no caso geral, estas instalações de pesquisa concentram-se nas áreas de petróleo e gás e nas atividades de adaptação de produtos e processos para o mercado interno, e as características geradas, no início do processo, permanecem inalteradas, até hoje, na indústria brasileira. É comum ler-se a respeito do sucesso da política industrial e tecnológica da Coreia do Sul, com destaque para os investimentos privados em P&D, feitos pelos grandes conglomerados típicos daquele país, os
Chaebols. É pouco divulgado, no entanto, que o desenvolvimento da Coreia contou, entre outros fatores, com forte direcionamento dado pelo Estado, que atuou com políticas industrial, tecnológica, econômica, educacional e outras de forma concatenada, combinando a reserva do mercado interno para produtos nacionais com uma estratégia de inserção no mercado mundial que partia da constituição de grandes grupos econômicos nacionais. Os investimentos em P&D são, assim como as demais políticas, responsáveis pela posição de destaque da Coreia do Sul, no Ranking internacional de registros de patentes. Deve-se acrescentar que os consórcios privados formados, no Brasil, nos programas de privatização, da década de 90, são muito parecidos com as organizações desses países – conglomerados de empresas geridos por organizações financeiras, com acesso a fomento e contratos estatais. No entanto, se a formação dos consórcios brasileiros lembra os Chaebols coreanos, em certos aspectos, não se pode dizer o mesmo quanto ao tipo de retorno em inovações que os conglomerados brasileiros geram, mesmo com a presença de políticas de fomento e com o aporte de recursos significativos. Deve-se acrescentar, ainda, que é extremamente elevado o grau de monopolização presente na economia do Brasil, o que ajuda a explicar, também, a falta de iniciativas de geração de inovações tecnológicas no país: os 100 maiores grupos empresarias em operação no Brasil são responsáveis por cerca de 60% do PIB, sendo de 28% a participação do setor industrial, em relação ao total, conforme aponta o Relatório Grandes Grupos, de 2010 11. O Brasil vive, hoje, simultaneamente, um quadro de desindustrialização, com a predominância, na economia, dos segmentos mineradores e do agronegócio, voltados para a exportação, e do setor financeiro. Os números do Balanço de Pagamentos do Brasil, segundo o Ministério da Fazenda / SPE (2013), com dados do Banco Central, confirmam os contornos da situação: além do elevado volume de importações de máquinas e equipamentos, muitos dos quais poderiam ser fabricados, sem maiores problemas, no Brasil, os gastos com o pagamento de Royalties e Licenças ao exterior chegaram a 11
2,4 bilhões de dólares, em 2011, e a remessa de lucros e dividendos para as matrizes das empresas estrangeiras, operando no país, somou 32,9 bilhões de dólares. Chamam a atenção, ainda, os gastos com aluguel de equipamentos pagos a empresas de fora do Brasil, que alcançam a soma de 32,9 bilhões de dólares. NIKOLSKY (2012), levando em conta o saldo comercial dos grupos econômicos de alta e média tecnologia e das contas externas de serviços tecnológicos: computação, royalties e aluguel de equipamentos, entre outros –, construiu um indicador para medir o que chama de “Déficit Tecnológico” da indústria brasileira. Este indicador, em 2010, foi de 84,9 bilhões de dólares, cerca de 20 bilhões a mais do que no ano anterior. Para o autor, o país enfrenta um processo de desindustrialização “à brasileira”, pois, dadas as grandes dimensões (reais e potenciais, grifo nosso) do mercado interno e a fase de crescimento da demanda que vivemos, a atividade industrial vem crescendo em números absolutos, mas, com a quebra das cadeias produtivas por componentes importados, vem ocorrendo “uma grande desarticulação dos fornecedores e a desativação de partes do processo produtivo”. A consequência deste processo, para o mesmo autor, é a perda de conteúdo tecnológico das empresas e o “desaprendizado” teconológico, levando à perda de competência tecnológica. 10. Universidade e desenvolvimento no Brasil O sistema universitário brasileiro, por um longo período, teve pouca relação direta com a geração de conhecimentos voltados para a produção, com a exceção de escolas isoladas voltadas para o ensino de engenharia. A atividade de pesquisa, em geral, era também desenvolvida em outras instituições, e bastante restrita. A primeira universidade brasileira vem do início da década de 20, quando foi criada a Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro. As “ondas” de industrialização pelas quais passou o Brasil tiveram poucos reflexos nas universidades. A partir do Plano de Metas de Juscelino Kubitschek (1955-1959), e na década seguinte, o capital nacional assumiu, na maioria dos setores, a condição de
Vide referências bibliográficas
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parceiro minoritário dos grupos estrangeiros e, na maioria dos casos, as empresas estrangeiras traziam e desenvolviam sua própria tecnologia, desenvolvida, na maioria dos casos, em centros de P&D situados nos países-sede das empresas (fato comum às demais economias latinoamericanas, no período). Assim, houve um claro desestímulo à geração de conhecimento tecnológico, nas universidades brasileiras, distanciando-as, por conseguinte, da esfera da produção. Embora retoricamente mencionado no discurso desenvolvimentista do Estado brasileiro, predominante nas últimas décadas, a educação superior não se constituiu efetivamente em um instrumento estratégico para o crescimento tecnológico, salvo de forma pontual e mais nitidamente relacionada à constituição de programas de pós-graduação, desenvolvidos nos anos 70, com ênfase nas áreas tecnológicas, com destaque para as ações do II Plano Nacional de Desenvolvimento, do governo Geisel12. No entanto, após a estagnação que caracterizou a economia, nos anos 80, nos anos 90 e 2000, com o advindo das políticas neoliberais no Brasil – com a abertura às importações e a desregulamentação da economia, entre outros elementos –, acirrou-se o quadro de afastamento entre universidades e geração de conhecimento tecnológico, uma relação que subsiste, com alguma força, apenas em áreas como petróleo, gás e agronegócio, como efeito “inercial” das décadas anteriores e com algumas exceções isoladas, como no caso das áreas de petróleo e gás e de biocombustíveis. Cabe acrescentar que esta ligação universidade – empresa, uma relação que faz parte das atribuições das universidades em suas relações com o conjunto da sociedade e que responde a demandas concretas , dada a forma como vem operando, gera diversas distorções e problemas, no plano interno, como a diferença na remuneração entre os professores e pesquisadores que participam dos projetos e os que não têm interesse ou acesso a estas atividades, o acúmulo de poder dos grupos financiados na universidade, e a tendência à subsunção da ativi-
dade de pesquisa pura às necessidades diretas das empresas. Este fato se consubstancia pela elevada incidência de projetos realizados pelas Universidades voltados para a simples resolução de problemas operacionais das empresas, sem qualquer desenvolvimento de tecnologia. Mesmo a relativa expansão de vagas oferecidas nas universidades públicas, ocorrida, nos últimos anos, uma ação claramente voltada ao atendimento dos interesses da economia brasileira, em crescimento médio de 3,2%, nos últimos 10 anos, tem como ênfase a formação de quadros técnicos, e não de pesquisadores. No seu conjunto, o sistema universitário brasileiro atende apenas a cerca de 13% dos jovens, sendo que, deste total, mais de 70% estão em instituições particulares que, no caso geral, têm pouca ou nenhuma ligação com atividades de pesquisa13. 11. Uma reflexão necessária Como dito acima, o desenvolvimento industrial brasileiro seguiu algumas das “receitas” produzidas pelo pensamento desenvolvimentista em voga, na América Latina e em outras partes do mundo, nas décadas de 50, 60 e 70. Elementos como a ênfase na industrialização acelerada, presença direta do Estado na produção, de estruturas de planejamento, de políticas de proteção à indústria local, medidas de financiamento e de promoção de empresas nacionais foram utilizados. No entanto, a evidência é de que a aplicação deste ferramental se deu de forma parcial e limitada. O apoio à industrialização, no Brasil, não foi acompanhado de ações sociais como a expansão do sistema educacional para o ensino médio e a universalidade, como ocorrido na Coreia do Sul, Argentina e outros países, a reforma agrária (também realizada na Coreia) e outros elementos estruturais. O esforço realizado não teve como meta o desenvolvimento pleno do país; não se pensou no mercado mundial; a atração de empresas estrangeiras não foi acompanhada de exigências de “internalização” de ações de
Como dito acima, no contexto de promoção da grande empresa nacional e de consolidação da presença do Estado na economia, desenvolveram-se, naquele período, as áreas de infraestrutura como transportes, geração e transmissão de energia e comunicações e de indústrias básicas como química pesada e siderurgia. Áreas consideradas estratégicas como as de informática e aeroespacial, receberam, igualmente, forte incentivo. 13 No que diz respeito ao Ensino Médio, menos da metade dos jovens é atendida pelo sistema escolar, somados os conjuntos público e privado.
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P&D; houve escolha de empresas – sob política de picking winners –, mas sua implementação se deu, igualmente, “pela metade”, pois, além da não cobrança de exigências às empresas estrangeiras, as empresas privadas apoiadas com destaque tampouco tiveram que apresentar contrapartidas significativas. A criação dos grandes conglomerados nacionais, ocorrida nos governos FHC e Lula, como no caso da Vale do Rio Doce, teve como resultado uma empresa monopolista à moda antiga, centrada na exploração do minério de ferro para exportação e não em siderurgia – muito menos no segmento de aços de alta qualidade – ou mesmo na extração de outros minérios. Outra característica da política brasileira, presente ao longo de todo o processo de industrialização e no período atual, é a falta de concatenação e coordenação entre as políticas ligadas à indústria, à Ciência e à tecnologia. Foi ignorada, ou, no mínimo, pouco considerada, a possibilidade de trilhar-se, no Brasil, um caminho de desenvolvimento tecnológico autônomo. 12. Conclusões: as soluções possíveis para o problema Nos últimos anos, diversas ações de fomento à inovação e ao desenvolvimento tecnológico vêm sendo anunciadas. Ainda que tenha havido uma melhoria nos mecanismos de fomento à inovação, conforme apontam ROCHA, SOARES e CASSONI (2011), predominam, no entanto, a falta de coordenação e a inexistência ou rarefação de prioridades, podendo ser facilmente constatado que a política brasileira de fomento tem características de um “balcão”, onde os projetos, representando iniciativas e interesses pulverizados, são analisados e atendidos individualmente. Este procedimento é o que predomina, inclusive, no que diz respeito à aplicação dos recursos disponibilizados pelos fundos setoriais. A discrepância entre a oferta de recursos para o fomento ao desenvolvimento tecnológico e a baixa resposta do sistema produtivo são, essencialmente, um problema estrutural derivado do caminho escolhido pelo Brasil para o seu processo de industrialização. Há diferentes conjuntos de soluções para o problema identificado. No plano da política econômica, a adoção de taxas básicas de juros mais baixas representa a
possibilidade de obtenção do retorno mínimo para que agentes privados invistam em inovação, uma política que pode dispor de vários instrumentos, como o uso da Caixa Econômica e do Banco do Brasil para a indução à baixa das taxas cobradas pelos bancos privados. Sem taxas de juros básicas baixas, vigentes por longos períodos de tempo, o Estado terá que realizar a maior parte dos investimentos em P&D, no lugar das empresas. É fundamental que sejam de grande vulto os investimentos em P&D e em pesquisa científica strictu sensu, o que é claramente justificado pelo enorme déficit tecnológico registrado em nossa balança de pagamentos. Nesse sentido, a definição de projetos integrados de investimentos em P&D, ou, pelo menos, a definição clara de áreas prioritárias para fomento é de extrema importância para a coordenação dos esforços, com rígido acompanhamento e controle dos investimentos. No que diz respeito às práticas gerenciais utilizadas no acompanhamento do fomento, é preciso equiparar o padrão de exigências praticado no Brasil, principalmente em termos dos resultados esperados e resultados obtidos de fato, com aquele característico de países como a Coreia do Sul e o Japão, bem mais abrangentes e bem definidos. A Universidade pode atuar também como centro de inovação. Há interesse, na comunidade acadêmica, pela participação em atividades de pesquisa aplicada, seja pela possibilidade de aplicação de conhecimentos científicos, seja pelo desafio em si ou pelo compromisso com o desenvolvimento, em geral, do país. No entanto, há limitações afins à própria natureza da atividade acadêmica em geral e da pesquisa científica, em particular, que requer tempo e dedicação e cujo horizonte de tempo costuma ser mais longo do que o tempo correspondente às atividades de pesquisa aplicada. Por essa e outras razões, as patentes universitárias tendem a ser mais gerais, mais genéricas, mais próximas de um paper do que uma patente empresarial. Isto se explica, também, pela enorme exigência de publicação de papers para a comunidade acadêmica feita pelas agências de fomento e pelas próprias estruturas internas das universidades, para a permanência nos programas de pós-graduação e para a progressão na carreira docente. O fato de que os incentivos e 19
prêmios para a produção de patentes são inferiores ao que é oferecido aos papers faz das patentes um subproduto do trabalho acadêmico. As exceções são “nichos”, como nas áreas ligadas ao petróleo, onde o tipo de desenvolvimento tecnológico necessário é intensivo em ciência. É fácil constatar-se que os pesquisadores e grupos de pesquisa geradores de patentes são os mesmos que publicam a maior parte dos papers, e, portanto, nas mesmas áreas, o que não coincide, na maioria dos casos, com as demandas sociais, como no caso dos fármacos, e explica porque boa parte das patentes geradas nas universidades não são utilizadas. A almejada ideia da simbiose universidade / empresa, buscada pelos órgãos e iniciativas de fomento e enfatizada no discurso oficial, gera, na realidade, pouco interesse e poucos resultados. É fato, também que a vinculação do esforço científico com os esforços de P&D patrocinados por empresas privadas, se preponderante, torna-se, em geral, um óbice ao desenvolvimento da ciência, pela necessária submissão dos grupos de pesquisadores às linhas de trabalho e às prioridades ditadas pelas firmas, ainda que possam ser identificados muitos casos em que, dos trabalhos aplicados, sujam ideias e motivações para investigações científicas básicas. É preciso lembrar, ainda, que esta vinculação, no volume e na proporção em que se dá, se deve, na maioria dos casos, ao aporte insuficiente de recursos para o financiamento da atividade científica em geral que se observa, no Brasil, há muitas décadas. Assim, a participação das universidades não é a solução única e última para o desenvolvimento tecnológico do país, mas é parte da solução. Um reordenamento geral da atividade de pesquisa tecnológica demandaria também a presença de Institutos e Universidades Tecnológicas criadas e impulsionadas pela demanda real do sistema produtivo, assim como de centros de pesquisa mantidos pelas empresas isoladamente, em parcerias setoriais privadas ou em cooperação com o Estado. Para que esta possível reestruturação do sistema ocorra, há que retomar-se a promoção de um tipo de desenvolvimento que não seja balizado pelo tipo de integração econômica internacional que hoje caracteriza o caso brasileiro, uma integração que vem 20
levando, claramente, à desindustrialização do país. É preciso um projeto ordenado, com forte presença do Estado no planejamento das ações, no provimento de infraestrutura, de financiamento, de plena cobertura das áreas sociais, de proteção do mercado interno. No momento, está em discussão, no Congresso Nacional, uma nova Lei de C i ê n c i a e Te c n o l o g i a , a p r e s e n t a d a , inicialmente, como “Código Brasileiro de Ciência e Tecnologia”. Para que essa nova Lei – e outras que vierem a complementá-la – se torne, efetivamente, um instrumento de transformação para impulsionar o desenvolvimento tecnológico do país, é necessário o engajamento do Estado e da sociedade, na proposição de grandes eixos de desenvolvimento ordenadores de projetos estratégicos de desenvolvimento científico e tecnológico, realmente, integrados e voltados para as necessidades do país, como já apontavam, há décadas atrás, criticando a transposição mecânica dos modelos de desenvolvimento de Ciência e Tecnologia dos países desenvolvidos para a periferia, autores como VARSAVSKY (1971, 1972), e SAGASTI (1977). Estes eixos devem ser criados com a articulação das áreas envolvidas, com a concatenação das políticas Econômica, Industrial, de Educação, de Ciência e Tecnologia e outras correlacionadas. Nesse novo contexto, as universidades certamente saberão reagir e cumprir seu papel fundamental, na busca do desenvolvimento e da justiça social. 13. Bibliografia BNDES http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/b ndes_pt/Institucional/Publicacoes/Consulta_ Expressa/Tipo/BNDES_Setorial/201209_01. html CAPES - http://www.capes.gov.br/ FIESP - http://www.fiesp.com.br/ FINEP - http://www.finep.gov.br/ FDC – Fundação Dom Cabral http://www.fdc.org.br/Paginas/default.aspx GRANDES GRUPOS 2010, Valor, 2010 IEDI – Instituto de Estudos para o
Desenvolvimento Industrial –, Análise 2012 MINISTÉRIO DA FAZENDA, Secretaria de Política Econômica – SPE https://www1.fazenda.gov.br/spe/novo_site/h ome/index.html NICOLSKY, R. Artigo no Portal Protec, em 0 1 / 0 2 / 2 0 1 2 http://www.protec.org.br/noticias/pagina/933 5 PAVITT, K. Sectoral Patterns of Technical Change: Towards a Taxonomy and a Theory, in Research Policy 13 (1894), pp 343 – 373) ________ “What makes basic research economically useful?”, in Research Policy, 20, pp 109 – 119, 1991 RELATÓRIO DA PESQUISA DE INOVAÇÃO TECNOLÓGICA – Pintec 2008 – IBGE. ROCHA, Carolina R., SOARES, Manuela, e CASSONI, Karla - “Um Olhar da Inventta: a eficiência dos mecanismos de fomento à inovação no Brasil”, in Radar Inovação, fevereiro de 2011. ROSEMBERG, N. “Why do firms do Research with their own Money?”, in Research Policy 19, pp 165 – 174, 1991 SAGASTI, F. Tecnología, Planificación y Desarrollo autônomo, Instituto de Estúdios Peruanos, 1977 TRASPADINI, R., e Stedile. João Pedro (Orgs), "Ruy Mauro Marini: Vida e Obra", Editora Expressão Popular, 2005. VARSAVSKY, O. Proyectos Nacionales: Planteo y Estúdios de Viabilidad, Ed. Periferia, Buenos Aires, 1971. ___________ Hacia uma Política Científica Nacional, Ed. Periferia, Buenos Aires, 1972 WIPO – World International Intellectual P r o p e r t y O r g a n i z a t i o n h t t p : / / w w w. w i p o . i n t / p a t e n t s c o p e / e n / http://www.wipo.int/export/sites/www/freepub lications/en/economics/gii/gii_2012.pdf
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50 anos do Golpe de 1964 e os lugares de memória da Ditadura Militar em Sergipe¹ Prof. Dr. Antônio Fernando de Araújo Sá* "a ignorância do passado não se limita a prejudicar o conhecimento do presente; compromete, no presente, a própria ação". Marc Bloch
¹ Comunicação apresentada na mesa redonda História e Memória da Ditadura Militar em Sergipe, realizada na 2a. Semana Acadêmica da Universidade Federal de Sergipe (27de novembro de 2014). *Departamento de História Universidade Federal de Sergipe
A memória coletiva tem se tornado uma verdadeira matéria-prima da vida cívica, nos mais diversos países. Ante a esse desejo de memória nas sociedades contemporâneas, os historiadores reencontraram uma função crítica, no seio da cidade. Interpelados pelas memórias traumáticas das experiências autoritárias das ditaduras latino-americanas, aqueles que se debruçam sobre o nosso passado deixaram de movimentar, no terreno tranquilo da memória partilhada, para um território “infinitamente mais difícil da memória contestada” (AYMARD, 2003: p. 15). Esse deslocamento redirecionou o debate entre história e memória, impondo uma reflexão sobre o “memorável”, na sociedade. Enquanto a história aborda o passado, de acordo com os procedimentos disciplinares, para tentar entender, compreender, interpretar, a memória se vincula com às necessidades de legitimar, condenar. Desse modo, a memória, na cultura contemporânea, adquiriu uma forte dimensão política, por se vincular aos fenômenos de terror, genocídios e massacres, ao longo do século XX. Essa dimensão modificou a relação entre representações do passado e justiça, já que fixou sua atenção nas vítimas (perseguidos, desaparecidos, exilados). Não podemos separá-la do movimento de reparação moral, jurídica e, em alguns casos, financeira das vítimas (LVOVICH & BISQUERT, 2008). Nesse sentido, a memória constitui-se como um direito da cidadania, pois, ao lidar, com a construção do sentido dos indivíduos, em sua inserção nas diversas temporalidades, molda uma rede de afetos, de reflexão e de esperança, fundamentado nas alterações das exigências da vida.
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O golpe de 1964 pode ser pensado como um “passado que não quer passar”, no qual os atores sociais em luta buscam, na conjuntura memorial do presente, reiterar a necessidade de se fortalecer a democracia, não obstante a política de esquecimento é colocada em prática pela conciliação da transição democrática. Aliás, esta política só possível com a manutenção do bloco histórico de sustentação da ditadura militar, no processo de redemocratização no Brasil. As disputas em torno desse passado ganharam, na efeméride dos 50 anos, uma visibilidade não percebida em outros momentos "comemorativos" do golpe. Em 1994, o interesse do público era pequeno, restringindo-se a eventos acadêmicos, com pouca repercussão na mídia. Já em 2014, além de eventos acadêmicos por todo o país e em alguns países como os Estados Unidos e França, os "jornais fizeram sites primorosos, com muitos documentos, incluindo filmes e depoimentos. Até mesmo o Jornal Nacional, da Rede Globo, fez uma reportagem muito correta" (FICO, 2014). Ao lado desse grande interesse público sobre o assunto, especialmente a juventude que reemergiu na cena política, paradoxalmente, assistimos a mobilizações nas ruas que apelam para uma intervenção militar, na vida política e institucional brasileira. Inclusive, existe um colunista, no jornal CINFORM, de Aracaju, que reiteradamente insiste em desqualificar as pesquisas acadêmicas no Brasil, por conta de certo viés esquerdista dominante nas universidades, inclusive criticando de forma leviana a construção de lugares de memória alusivas à repressão da ditadura militar. Esse articulista reacionário esquece que sua própria defesa de um regime autoritário está eivada de componentes ideológicos antidemocráticos, que não levam à "verdade histórica", como ele diz buscar. Portanto, são os confrontos de memória que definem esse "passado que não quer passar" da ditadura militar no Brasil. Nessa guerra de memórias, a esquerda brasileira conseguiu produzir uma leitura que privilegiou a importância da construção de uma consciência democrática e cidadã, tentando evitar a política de esquecimento produzida no processo de transição democrática. Aqui coube, nesse processo, a autocrítica da esquerda quanto à sua negligência sobre a questão democrática, nos anos 1960. 24
Ao contrário, a memória militar viu-se imersa nas contradições ocasionadas pelo envolvimento direto dos militares, no exercício do poder, configurando uma imagem negativa de toda a corporação, ligando-a à prisão, à tortura, ao assassinato de oponentes, ao terrorismo de Estado, enfim, a toda prática de violência e repressão vinculada aos porões da ditadura militar. Construída num espaço de lutas, a memória do golpe de 1964 impõe aquilo que Paul Ricoeur chamou de uma política de “justa memória”, na condição de tema cívico da maior importância, na medida em que possibilita estabelecer a ideia de um “dever de memória” e de uma “dívida”, em relação às vítimas da história (SILVA, 2002: p. 437). Contudo, há a consciência do risco de obstaculizar o trabalho crítico da história, ao se adotar a postura de “dever de memória”, na medida em que certas comunidades históricas podem se encerrar a si mesmas, mantendo-as em sua própria desgraça e desenraizando-as do sentido de justiça e da igualdade, ao invés de um “dever de memória”, talvez fosse melhor propor o “trabalho da memória” (RICOUER, 2000). É a partir desse "trabalho da memória" que podemos empreender a emergência de uma multiplicidade de lugares de fala dos diversos atores como enunciadores de uma memória da violência e do arbítrio, mas, principalmente, o engajamento na luta pela salvação de acervos, depoimentos e lugares de memória (SILVA in ASSIS, 2001). Por que centralizar nosso enfoque, nos lugares de memória da ditadura militar, em Sergipe? Pensamos que a memória constituise num objeto de reflexão intelectual, que se distingue de outras formas de relatar o passado, como a história e os lugares de memória, como monumentos e construções arquitetônicas, podem influir nas ações coletivas de constituição das identidades coletivas (SANTOS, 2003, p. 87-91). Como um modo de compensar as convulsões e rupturas das sociedades contemporâneas, produtoras de angústias e incertezas sobre o futuro, o mundo contemporâneo tem experimentado o desaparecimento da memória, em seu sentido tradicional, isto é, a memória coletiva, mítica, caracterizada pela continuidade entre o passado fundador e o presente. Dessa memória, restaram os lugares de memória, isto é, arquivos, monumentos, comemo-
rações e até mesmo obras historiográficas, nos quais a memória, anteriormente vivenciada, teria deixado seus traços (NORA, 1993). Como datas e aniversários são conjunturas que ativam a memória, motivados pela efeméride dos 50 anos do golpe de 1964, o Conselho Superior da Universidade Federal de Sergipe aprovou, por unanimidade, propositura de construção de um lugar de memória que reivindique a defesa da democracia, aludindo, principalmente, a resistência individual e coletiva daqueles que combateram o autoritarismo da ditadura militar. A aprovação resultou na Resolução no. 25/2014, que instituiu uma Comissão, composta pelo historiador Antônio Fernando de Araújo Sá, o arquiteto Cezar Henrique Matos e Silva e o advogado José Santana Lima, para viabilizar o projeto arquitetônico, urbanístico e artístico do Memorial da Democracia. Como em outras propostas memoriais, o Memorial da Democracia tem uma função eminentemente pedagógica de construção de uma consciência democrática e cidadã, na tentativa de evitar a política de esquecimento produzida pelo bloco histórico dominante durante o processo de transição à democracia. No monumento, está a chave para se pensar a memória, pois ele é a objetivação da memória. A memória é um suporte dos sujeitos históricos que batalham para definir/construir o futuro. Os “usos do futuro são, também, fundamentalmente, usos do passado” (ACHUGAR, 2006: p. 223). Nesse sentido, além do monumento em si, que terá como pilares a Verdade, a Memória e a Justiça, teremos sinalizações alusivas aos acontecimentos nacionais e locais que marcaram essas memórias de violência e arbítrio. O Memorial da Democracia para manter-se vivo, no seio da comunidade universitária, deve criar atividades didático-pedagógicas a respeito dos Direitos Humanos, Memória e Verdade, bem como eventos culturais que proporcionem o pleno exercício democrático, na Universidade Federal de Sergipe. Essa iniciativa memorial pode e deve ser articulada a outras ações dos governos municipal e estadual, no sentido de rever "o passado para libertar o futuro dos fantasmas que ainda pairam no presente" (ALENCASTRO, 2004). Duas iniciativas seriam bem
vindas para romper com o trauma dessa memória: a instituição da Comissão da Verdade e a retirada dos nomes de ditadores e torturadores das ruas, praças, conjuntos habitacionais e estádios de futebol. Sobre o último assunto, tramita, na Assembleia Legislativa de Sergipe, projeto de lei 99/2013, da deputada estadual Ana Lúcia, que propõe a alteração dos nomes de instituições públicas que tenham comandado, participado ou contribuído com a prática da tortura no país. Entretanto, não há previsão de que o projeto seja aprovado, em um plenário de perfil eminentemente conservador. Seguindo as sugestões do historiador francês Marc Bloch, na epígrafe desse artigo, é necessário compreender o presente pelo passado, mas também compreender o passado pelo presente, pois, dentro da conjuntura memorial presente, a história desempenha papel relevante como intervenção política e criação contínua, fortalecendo a luta para que o direito à memória seja patrimônio comum no Brasil. Bibliografia ACHUGAR, Hugo. Planetas sem boca: escritos efêmeros sobre Arte, Cultura e Literatura. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2006. ALENCASTRO, Luís Filipe de. Os fantasmas da memória. Folha de São Paulo. 19 de dezembro de 2004. Endereço eletrônico: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs191 2200405.htm. Consultado em 19/12/2004. ANCHARD, Pierre [et. al.]. Papel da Memória. Campinas/SP : Pontes, 1999. ANDRADE, Manuel Correia de. 1964 e o Nordeste: Golpe, revolução ou contrarevolução? São Paulo: Contexto, 1989 (Coleção Repensando a História). AYMARD, Maurice. História e Memória: Construção, Desconstrução e Reconstrução. In: Tempo Brasileiro. Rio de Janeiro, n. 153, abril-junho de 2003. BLOCH, Marc. Introdução à história. 4a. edição. Lisboa: Europa-América, s/d. DANTAS, Ibarê. A Tutela Militar em Sergipe 25
(1964-1984). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. D´ARAÚJO, Maria Celina, SOARES, Gláucio Ary Dillon & CASTRO, Celso (orgs.). Visões do Golpe: A Memória Militar sobre 1964. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1994. FICO, Carlos. 50 anos do golpe: balanço. 20 d e n o v e m b r o d e 2 0 1 4 . http://www.brasilrecente.com/2014/11/50anos-do-golpe-balanco.html LVOVICH, Daniel & BISQUERT, Jaquelina. La cambiante memoria de la dictadura: discursos públicos, movimentos sociales y legitimidad democrática. Los Polvorines: Universidad Nacional de General Sarmiento, 2008.. NORA, Pierre. Entre Memória e História: A problemática dos lugares. Projeto História. São Paulo, 10: 7-28, dez. 1993. NORA, Pierre. La aventura de 'Les Lieux de mémoire'. In : BUSTILLO, Josefina Cuesta (ed.). Ayer. Madrid: Marcial Pons/Asociación de Historia Contemporánea, n. 32, 1998 (número especial Memoria e Historia). RICOEUR, Paul. La Mémoire, L' Histoire, L' Oubli. Paris: Éditions du Seuil, 2000. SANTOS, Myrian Sepúlveda dos. Memória Coletiva e Teoria Social. São Paulo: Annablume, 2003. SILVA, Francisco Carlos Teixeira da. Apresentação. In: ASSIS, Denise. Propaganda e Cinema a Serviço do Golpe (1962-1964). Rio de Janeiro: MAUAD/FAPERJ, 2001. S I LVA , H e l e n i c e R o d r i g u e s d a . Rememoração/Comemoração: as utilizações sociais da memória. In: Revista Brasileira de História. São Paulo, ANPUH, vol. 22, nº 44, dezembro de 2002.
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História, turismo e educação patrimonial em Sergipe Claudefranklin Monteiro Santos¹
¹Licenciado em História e Mestre em Educação pela Universidade Federal de Sergipe. Doutorando em História pela UFPE. Professor de Patrimônio Cultural do Departamento de História da UFS. Pesquisador do Grupo Culturas, Iden dades e Religiosidades (GPCIR-UFS/Cnpq-UFS).
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Praça São Francisco, São Cristóvão, Patrimônio da Humanidade. Em frente ao antigo Palácio Provincial, hoje Museu Histórico de Sergipe, ao findar uma série de atividades com seus alunos, um professor desapontado é obrigado a dispersá-los porque não havia restaurante que pudesse acomodar a todos adequadamente. Alguns minutos antes, um “guia” investia mais uma vez sua lábia sobre um casal de turistas ávidos por conhecer a velha capital sergipana, exemplar reminiscente das ordenações filipinas, testemunha inconteste do processo de colonização brasileiro. Algumas semanas depois, dois colegas tentavam chegar a Laranjeiras para o lançamento de um livro sobre museus, arqueologia e patrimônio cultural. Confusos com tanta falta de informação, num dado momento de sua quase épica viagem, os professores se deram conta de que, daquele jeito, era mais fácil chegar a Capela ou Itabaiana do que ao centro histórico do berço esplêndido de João Ribeiro e de tantos vultos sergipanos. Fortuitamente, eles conseguiram chegar ao seu destino para se maravilharem com as ruínas e com as dependências do Campus da UFS, daquela cidade. Cenas como essas têm se tornado corriqueiras em Sergipe e não são exclusivas de nosso Estado, evidentemente. Entretanto, apontam para a necessidade urgente de retomada de uma política pública que centre esforços na aplicação de meios capazes de mudar esse quadro e fazer com que seu potencial turístico aflore sobremaneira, agregando outros elementos que não somente seus atrativos paisagísticos e suas possibilidades de prática de esportes ligadas à natureza.
A Revista TAM nas Nuvens2, do mês de maio de 2011, dedicou algumas páginas ao Estado de Sergipe. Por se tratar de uma empresa que lida com pessoas do mundo inteiro, não é de estranhar que a sua linha editorial se desenvolva no sentido de provocar, em seus consumidores, o desejo de conhecer novos lugares. A tônica da matéria girava em torno de um Estado em que o turismo ecológico seria seu forte, com destaque para a praia do Saco e para o Rio São Francisco, em Xingó. A única menção voltada para um viés menos natural do patrimônio cultural foi exatamente a Praça São Francisco, onde pouco ou quase nada se disse a respeito, além da informação que já virou clichê de patrimônio da humanidade. O mesmo não se pode dizer para outra matéria publicada num jornal português3, um mês após a declaração da UNESCO (01 de agosto de 2010) que dava à Praça São Francisco e seu entorno a condição de Patrimônio da Humanidade. A matéria deu amplo destaque às questões que estão em torno da temática que hoje está na moda, como explica François Hartog, para quem o patrimônio cultural ganhou corpo, sobretudo, após a queda do Muro de Berlim, em 1989: “(...) o patrimônio se impôs como categoria dominante, englobante, senão devorante, em todo caso, evidente, da vida cultural e das políticas públicas”4. Quando a UNESCO preconizou que, ao entendimento de patrimônio, carecia o acompanhante cultural, em jogo estava a abrangência do termo, capaz de explicar a ação engenhosa da humanidade, em seus diversos matizes. E está foi a opção da revista portuguesa, ao se referir a São Cristóvão-SE. Nesse sentido, vale pensar aqui, até como reflexão inicial (antes mesmo de adentrarmos pela seara que a discussão sobre educação patrimonial pode demandar) sobre um conceito que me parece norteador e até mesmo capaz de permitir algumas interfaces pertinentes, nessa relação com o turismo, que é o de mediação cultural5, aqui entendida como algo que se (...) limita apenas à transferência de informação, mas cria condições para
que os indivíduos possam discernir, refletir, questionar e transformar todo o universo cultural que os rodeia. Ao invés de pensar o mediador apenas como um intermediário, uma “ponte”, entre informação, a cultura e o indivíduo, parece ser mais promissor pensar o mediador como alguém que oferece condições para que os sujeitos desenvolvam seus próprios fins (SOUZA e CRIPPA, 2009, p. 64). O professor e o turismólogo, por definição, são profissionais da informação ao tempo em que são também mediadores culturais. A noção de mediação cultural aqui exposta, por suas possibilidades diversas, pode atender a vários fins educacionais em cuja essência está a apropriação dela e a produção cultural. Visitar uma cidade é absorve-se dela em suas potencialidades, dentro da perspectiva de ser um bem cultural (a meu ver, tombado ou não). O emissário da informação contida nela apropria-se de seu conteúdo, interpreta-o e ressignifica-o, sendo ele também um produtor de cultura. Esse, para mim, deve ser o cerne do debate em torno dessa interface (longe de ser paradoxal) entre a educação patrimonial e o turismo. A educação patrimonial deve ser encarada como uma metodologia. A necessidade de sua aplicação se dá a partir do momento em que está em jogo a valorização do patrimônio cultural, particularmente o sergipano. Nesse sentido, São Cristóvão, Laranjeiras, Aracaju e qualquer outro município só terão o seu devido valor quando se fizer conhecido. De inspiração inglesa (heritage education), o conceito de educação patrimonial se popularizou em larga escala no Brasil, desde a década de 1980. A proposta, desde então, visa ao uso e à apropriação dos bens culturais, além dos muros escolares, e quer alcançar públicos ainda maiores, como turistas e, sobretudo, a comunidade onde aqueles bens culturais estão inseridos, como parte inclusive de sua identidade. Como se pode inferir, é algo complexo e amplo, abrange uma série de questões, boa parte delas não só confundidas com o lado
Revista TAM nas Nuvens. Sessão Viajantes. Especial Sergipe. Maio de 2011. pp. 135-140. PIPA, André. Jangada Ibérica num país tropical. In: Correio da Manhã. Lisboa, 05.09.2010. pp. 62-63 4 HARTOG, François. Varia História, Belo Horizonte, vol. 22, n° 22, n° 36: p. 261-273, Jul/Dez. 2006. p. 265. 5 SOUZA, Willian Eduardo Righini de; CRIPPA, Giulia. A Cidade como Lugar de Memória: Mediações para a apropriação simbólica e protagonismo cultural. Revista Eletrônica de Pós-Graduação em Museologia e Patrimônio – PPG-PMUS. Unirio. v.2.n.2 – jul/dez de 2009. 2
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formal do processo educacional como sua aplicabilidade eficiente, enquanto metodologia. Um bom começo é a ideia de consumo cultural. Os sujeitos envolvidos, aprendizes formais, turista e comunidade precisam ser sensibilizados para perceberem os bens culturais como algo que deve demandar conhecimento e aprendizagem, mas também possibilidades de mudanças, sejam elas afetivas, sociais, políticas e até mesmo econômicas. A educação patrimonial, por sua natureza abrangente, se transforma num terreno de infinitas discussões, ações e práticas capazes de estreitar a nossa relação com o patrimônio cultural, superando o olhar sobre algo exótico que comum e erroneamente se quer despertar nas pessoas, sobremodo em turistas. Assim como a cultura popular o foi (e de algum modo ainda o é), o patrimônio cultural não dever ser visto como algo distante e único das ações engenhosamente criativas do ser humano, em seus diversos estágios. A definição de educação patrimonial se tornou clássica a partir do trabalho de Maria de Lourdes Parreiras Horta, Evelina Grumberg e Adriane Queiroz Monteiro. O Guia Básico de Educação Patrimonial (2009) apresenta o conceito da seguinte maneira e pode ser um aporte interessante para novas aplicabilidades, como parte de políticas de turismo voltadas para Sergipe, no século XXI: Trata-se de um processo permanente e sistemático de trabalho educacional centrado no Patrimônio Cultural, como fonte primária de conhecimento e enriquecimento individual e coletivo. A partir da experiência e do contato direto com as evidências e manifestações da cultura, em todos os seus múltiplos aspectos, sentidos e significados, o trabalho de Educação Patrimonial busca levar as crianças e adultos a um processo ativo de conhecimento, apropriação e valorização de sua herança cultural, capacitando-os para um melhor usufruto desses bens, e propiciando a geração e a produção de novos
conhecimentos, num processo contínuo de criação cultural (HORTA, GRUMBERG e MONTEIRO, 2009, p. 6). Considerando que a criação da Empresa Sergipana de Turismo (1972) como marco de uma política que visava “vender” as potencialidades turísticas de Sergipe, podese inferir de uma trajetória que se aproxima de quatro décadas uma ausência permanente e sistemática capaz de garantir para o Estado o que os especialistas chamam hoje de preservação sustentável de seus bens culturais, alvos de diversas ações, como as encampadas pelo Programa das Cidades Históricas do Nordeste (PCH), cujo filão era exatamente o turismo: (...) o PCH, como ficou conhecido, tinha como objetivo criar infra-estrutura adequada ao desenvolvimento e suporte de atividades turísticas e ao uso de bens culturais como fonte de renda para regiões carentes do Nordeste, revitalizando monumentos em degradação (FONSECA, 2005, p. 143). A Carta de Turismo Cultural de 1976, um instrumento regulador importante, aponta possibilidades para a compreensão das questões de patrimônio em Sergipe, naquele momento. Foi um desdobramento do Seminário Internacional de Turismo Contemporâneo, realizado na Bélgica. O evento foi promovido pelo ICOMOS (Conselho Internacional de Monumentos e Sítios) e teve a participação de pessoas e órgãos vinculados ao turismo cultural6 e ao patrimônio. Entre tantas coisas, o documento ressaltava a força desenvolvimentista do turismo. Nesse sentido, os monumentos e sítios históricos e artísticos seriam excelentes demandas sócio-econômicas. A visita e o consumo cultural daqueles espaços eram vistos como uma importante fonte e circu-lação de renda. Em Sergipe, isso se fez notar pelas políticas públicas realizadas entre os anos 1969 e 1979. Numa década, houve um aumento considerável do fluxo turístico no Estado. Como se vê, foco era o turismo cultural, como apregoava a Carta da Bélgica, de 1976.
Segundo os estudiosos da área, em especial os antropólogos, essa relação entre turismo e cultura remonta aos anos 60. Nos anos 70, a expressão ganhou força e aplicabilidade, dado que o turismo foi tido como um grande norte para o desenvolvimento mundial. 6
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Hoje, dentro das coordenadas expressas pela metodologia da educação patrimonial, o que se quer propor (e que isto se efetive o quanto antes) é a superação de um turismo cultural do tipo predatório, como comumente se vê Brasil a fora. A proposta de enriquecimento individual e coletivo deve extrapolar o financeiro, mas também está contido nele. Em São Cristóvão, por exemplo, o turista costumeiramente ainda é alvo de enganos, destrato e exploração. Por conta da ausência de um processo permanente e sistemático de educação patrimonial, o turista e o aluno deixam de usufruir dos bens culturais, pois além de faltarem hotéis, restaurantes e guias até mesmo “alfabetizados” c u l t u r a l m e n t e , d e i x a m d e c o n h e c e r, apropriar-se e, portanto, verdadeiramente, valorizar o patrimônio cultural sergipano. O conhecimento crítico e a apropriação consciente pelas comunidades do seu patrimônio são fatores indispensáveis no processo de preservação sustentável desses bens, assim como no fortalecimento dos sentimentos de identidade e cidadania (HORTA, GRUMBERG e MONTEIRO, 2009, p. 6). Também em 1972, o Governo de Sergipe levou a cabo um amplo e minucioso estudo que culminou, entre outras coisas, no Plano de Restauração, Preservação e Valorização do Patrimônio Histórico Cultural de Laranjeiras7. Chama a atenção para algo que parece ainda não superado, pelo menos como se preconizava à época, mantendo-se muito atual ainda. O documento, no que diz respeito à temática, aponta dois conjuntos de sugestões: 1 - Medidas que visam à implantação de uma infra-estrutura turística, abrangendo as comunicações e hospedagem; 2 – Medidas que visam à atração do turista. Necessidades como asfaltamento, terminais rodoviários, ferroviários e fluviais, estradas, pousadas, restaurantes, festivais de folclore, apresentações regulares de grupos folclóricos e vendas de produtos culturais locais. Em termos práticos, a educação patrimonial é uma metodologia que provoca situações de aprendizagem dentro do
conhecido processo cultural. Embora a tônica, muitas vezes, se encerre no aluno e na educação formal, acreditamos que isso possa ser aplicado, com muito sucesso, na seara do turismo. Em tese, quando um turista vem a uma cidade sergipana de interesse histórico (embora isso possa ser relativizado, pois Itabaiana e Lagarto fundadas no século XVII também o seriam), tudo lhe é estranho e ao mesmo tempo simpático, gerando uma identificação, se bem aproveitada, em situações, também, de aprendizagem. Para afirmar o que estamos dizendo, nessa interface entre turismo e educação patrimonial, é importante ressaltar o que está preconizado na Lei Federal nº 8.181, de 28 de março de 1991, no Decreto Nº 448, de 14 de fevereiro de 1992, em seu artigo 2º. A Lei mostra, com muita propriedade, que o fim último sempre será o consumidor e produtor de cultura: o ser humano; e ele que deve ser valorizado nas práticas do turismo brasileiro. É exatamente sobre isso que queremos chamar atenção aqui. Não se pode pensar uma política ainda sob aquela perspectiva e orientação dos anos setenta, em Sergipe (como nos parece ser ainda a em questão). Qualquer relação entre turismo e educação patrimonial precisa centrar-se no indivíduo e em sua comunidade, como também no estudante e no turista. Somente dessa forma, é possível pensar em algo realmente consistente para o Estado, em que a metodologia faça valer aos seus propósitos basilares: conhecimento, apropriação e valorização. Um dos principais objetivos que motivam a educação patrimonial é, por meio de abordagem inclusiva, o fomento à auto-estima das comunidades locais estimulando o conhecimento e valorização de seu patrimônio, memória e identidades culturais. Paralelamente, busca sensibilizar as comunidades para a preservação de suas formas de patrimônio material e imaterial, que constituem suportes de sua memória e identidade cultural (CERQUEIRA et al., 2008, p.13). Entre as grandes lições que eu aprendi, nos primeiros anos de minha formação, na licenciatura, foi ter percebido
7 Plano de Restauração, Preservação e Valorização do Patrimônio Histórico Cultural de Laranjeiras – Sergipe. Governo do Estado de Sergipe. Governador Engº Paulo Barreto de Menezes, 1972.
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que a cidade de Divina Pastora era algo mais do que somente uma “cidade velha”, como eu a percebia, à primeira vista. Isso só foi possível porque a Prof. Terezinha Oliva me fez crer (com bons anos de antecedência) que aquele objeto cultural tornou-se para mim uma fonte primária de conhecimento. Eu me apropriei dele e somente dessa maneira, pude, efetivamente, valorizá-lo como coisa sergipana. Assim, considerando o que vimos discutindo sob forma de uma reflexão sugestiva e reflexiva, a metodologia da educação patrimonial deve se aplicar à comunidade e ao turista, tornando os bens culturais, como as cidades sergipanas, menos exóticos e mais significativos. Bibliografia ARANTES, A. A. Produzindo o Passado. Estratégias de Construção do Patrimônio Cultural. São Paulo: Brasiliense, 1984. CARVALHO, Ana Conceição Sobral de, ROCHA, Rosina Fonseca (Org). Monumentos Sergipanos. Aracaju: Sercore, 2007. CARTA DE VENEZA (1964). Disponível em http://www.revistamuseu.com.br/legislacao/p atrimonio/veneza.htm. Acessado em 03.06.2010. CERQUEIRA, Fábio Vergara et. al. Educação Patrimonial: Perspectivas Multidisciplinares. Instituto de Memória e Patrimônio e Mestrado em Memória Social e Patrimônio Cultural/UFPel. Pelotas: Editora e Gráfica UFPel, 2008. CURY, Isabelle. Cartas patrimoniais. 2 ed. Rio de Janeiro: IPHAN, 2000. DECLARAÇÃO DE AMSTERDÃ (1976). D i s p o n í v e l e m http://5cidade.files.wordpress.com/2008/03/d eclaracaodeamsterdam.pdf. Acesso em 06 de junho de 2010. FONSECA, Maria Cecília Londres. O Patrimônio em Processo: Trajetória Federal de Preservação no Brasil. 2 ed. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ/MINC – IPHAN, 2005. HARTOG, François. Tempo e Patrimônio. In: Varia História, Belo Horizonte, vol. 22, n° 22, n° 36: p. 261-273, Jul/Dez. 2006. 32
HORTA, Maria de Lourdes P., GRUNBERG, Evelina, MONTEIRO, Adriane Queiroz. Guia Básico de Educação Patrimonial. Brasília: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Museu Imperial, 2009 Lei Federal nº 8.181, de 28 de março de 1991, no Decreto Nº 448, de 14 de fevereiro de 1992. Plano de Restauração, Preservação e Valorização do Patrimônio Histórico Cultural de Laranjeiras – Sergipe. Governo do Estado de Sergipe. Governador Engº Paulo Barreto de Menezes, 1972. PIPA, André. Jangada Ibérica num país tropical. In: Correio da Manhã. Lisboa, 05.09.2010. pp. 62-63. Revista TAM nas Nuvens. Sessão Viajantes. Especial Sergipe. Maio de 2011. pp. 135-140. SOUZA, Willian Eduardo Righini de; CRIPPA, Giulia. A Cidade como Lugar de Memória: Mediações para a apropriação simbólica e protagonismo cultural. Revista Eletrônica de Pós-Graduação em Museologia e Patrimônio – PPG-PMUS. Unirio. v.2.n.2 – jul/dez de 2009. Turismo cultural: orientações básicas / Ministério do Turismo, Coordenação - Geral de Segmentação. – Brasília: Ministério do Turismo, 2006.
Educação em Cuba: Uma discussão para o mundo Sérgio Dorenski D Ribeiro Claudio Lucena de Souza Augusto Cesar Rios Leiro
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1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS Este estudo foi instigado pela dinâmica das atividades acadêmicas desenvolvidas na Disciplina Educação no Mundo, do Programa de Pós-graduação em Educação, da Universidade Federal da Bahia1. Neste sentido, o desafio posto foi pesquisar sobre a educação nos diversos cantos do mundo. Assim, os alunos em grupo ficariam responsáveis por escolher um Continente, e neste, escolheria um país para que fosse estudado nas suas peculiaridades, principalmente, no tocante à Educação. Nossa Escolha, então, foi para o Continente Americano (Central) e o país Cuba, cujo objetivo foi analisar o contexto educacional e suas interrelações com a estrutura sociopolítico-econômica. Por que é importante um estudo dessa natureza? Vários fatores poderíam justificar este estudo, mas, precisamente, é instigante e curioso saber como uma ilha pequena, menor que a alguns estados e cidades brasileiras, constitui-se numa potência, no campo educacional, na saúde, no esporte. Além disso, guardadas as devidas particularidades, analisar uma outra nação – universal – faz-nos repensar nosso próprio país – local – e estabelecer um pensamento crítico, no tocante à política pública para nossa economia, sociedade e, principalmente, nossa educação. O legado aqui deixado está aberto para a discussão, no campo acadêmico, no entanto, mais do que isso, estabelece um olhar para a sociedade de modo geral, levando em consideração que a construção histórica, cultural, social e econômica de uma nação não se está desconctada do resto do mundo. Metodologicamente, este é um estudo
caráter optativo, a Disciplina foi ministrada pelos professores Dr. Augusto Cesar Rios Leiro e Dra. Lícia Maria Frei Beltrão, no segundo semestre de 2012.
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de caráter qualitativo e de enfoque descritivo e, neste aspecto, para captura das informações, buscamos, em fontes bibliográficas, bem como em sites que, de alguma maneira, trazem informações sobre Cuba e o que subsidiou a construção deste texto. Produzimos também um vídeo-texto2 em que foram contextualizadas as peculiaridades, a história, seu folclore, culinária de Cuba e sua relação com a educação. Portanto, este texto aponta algumas considerações sobre Cuba, a partir do aspecto histórico, o contexto sócioeconômico da “Ilha” e a educação, esta última fazendo correlação com o sistema políticoeconômico, envolvendo a medicina cubana no tocante à saúde. Por fim, destacaremos alguns desafios de Cuba para/na atual conjuntura. 2. CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS SOBRE CUBA Cuba3, localizada na América Central, na região denominada de Caribe4, é a maior ilha desta região e começou a ser registrada quando Cristóvão Colombo avistou a ilha, durante sua primeira viagem à América, em 27 de outubro de 1492. A ilha, que então era habitada por povos indígenas, tornou-se uma colônia da Espanha, chefiada por um governador espanhol, em Havana. Em 1762, a cidade foi ocupada brevemente pelo reino da Grã-Bretanha, porém retornou à posse espanhola, depois de uma troca pelo território da Flórida. Uma série de rebeliões, durante o século XIX, não logrou pôr fim ao domínio espanhol. No entanto, as tensões entre a Espanha e os Estados Unidos provocaram a guerra hispano-americana, que, afinal, resultou em retirada dos espanhóis e ocupação da ilha pelos americanos do norte, entre 1898 e 1902, quando Cuba conquistou, formalmente, a sua independência. A dominação norte-americana se concretizava não com o uso da força, mas por meio de diversos mecanismos. A eleição presidencial foi realizada de forma para conseguir impor Tomas E. Palma; antigos funcionários partidários da dominação espanhola permaneceram em suas funções;
muitos norte-americanos, [...], se tornaram proprietários de negócios e terras cubanas; o divisionismo entre os independentistas era constantemente acirrado; etc. No entanto, sobreviveram no seio da sociedade cubana aqueles setores que jamais se contentaram com esta situação. Enfim, a revolução que se anunciou ficou adiada por mais alguns anos. (ANCONI, In: COGGIOLA, 1998, p. 18) Os interesses norte-americanos predominaram em Cuba durante as primeiras décadas do século XX, o que gerou exercerem grande influência e poder sobre a ilha. As indústrias de açúcar e muitos hotéis eram dominados por grandes empresários norte-americanos. Os Estados Unidos também influenciavam muito na política da ilha, apoiando sempre os presidentes que se alinhavam aos seus interesses. Do ponto de vista econômico, Cuba seguia o capitalismo, com grande dependência dos Estados Unidos5. [...] aos poucos mas de forma incisiva, os Estados Unidos iam se inserindo na economia. [...] tomemos a questão da industrialização do açúcar e a do tabaco. Estas se desenvolveram em Cuba somente enquanto não se desenvolvia nos Estados Unidos. Quando este país sentiu necessidade, foram tomadas medidas para forçar Cuba a comercializar açúcar não refinado, do qual se cobrava menos impostos, e folhas de tabaco, pois ambos produtos passaram a ser elaborados pela indústria americana. (ANCONI, In: COGGIOLA, 1998, p. 15) Além disso, a Ilha apresentava grandes desigualdades sociais, ou seja, grande parte da população vivia na pobreza. Neste contexto, é que o “clima” de insatisfação, nas camadas mais pobres da sociedade, propiciava um apoio incondicional ao Movimento Revolucionário e não foi diferente. Os revolucionários (guerrilheiros) conseguiram apoio de muitas pessoas, o que ia aumentando à medida que muitos camponeses e operários ficavam desiludidos com a administração de Fulgêncio Batista6 e
2 Aqui, o objetivo principal foi contextualizar em imagens, fotos e uma narrativa, com mensagens subliminares, o sentido que estamos dando ao trabalho elaborado, em especial, para Cuba. 3 Fonte: http://pt.wikipedia.org. Acesso em: 24/10/2012. 4 O Caribe constitui uma região do continente americano formada pelo mar do Caribe. http://pt.wikipedia.org. Acesso em: 24/10/2012). 5 Fonte: http://pt.wikipedia.org. Acesso em: 24/10/2012.
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com as péssimas condições sociais (salário baixo, desemprego, falta de terras, analfabetismo, doenças). Com isso, o povo cubano - cidade e campo – aderiu ao movimento e passou integrar a guerrilha, o que aumentou o número de combatentes e de vitórias. O próprio Batista percebia que o Movimento Revolucionário estava crescendo de forma assustadora. Para Anconi (In: COGGIOLA, 1998), esta Revolução é fruto do processo de independência que nunca cessou e que tinha a história de luta de José Martí7 como inspiração permanente, ou seja, como “uma continuada revolução”. Os cubanos reivindicavam, entre outras prioridades, “a restauração da Constituição de 40 e a imediata realização de eleições gerais” (ALONSO JÚNIOR, In: COGGIOLA,1998 p.51). O Partido Ortodoxo (PO), que era o favorito às eleições, antes do golpe, conclamou a população a realizar boicoites – não ir ao cinema, não comprar sapatos, roupas, entre outros, com isto, o Governo decretou uma forte perseguição aos manifestantes e membros do PO. A Revolução Cubana é um marco histórico, não só para este país, mas para o mundo. Após o golpe de Estado de Fulgêncio Batista (1952), que culminou com um processo de opressão ao povo cubano, instaurou-se, em contrapartida, um movimento de resitência à ditadura que foi liderada por vários sujeitos, mas que teve como principal mentor o então advogado Fidel Castro. (ALONSO JÚNIOR, In: COGGIOLA,1998) As primeiras investidas 8 contra a ditadura de Batista ocorreram em 26 de julho de 1953, quando Fidel Castro e demais companheiros atacaram o quartel de Moncada. O ataque foi frustrado, o que resultou na prisão de todos os envolvidos, mas o ditador anistiou os rebeldes. No entanto, Fidel, impossibilitado de agir devido à rigorosa vigilância policial, procurou exílio no México, onde reorganizou suas forças. No final de 1956, retornou a Cuba, no barco Granma, carregado de armas para iniciar o confronto militar com Batista. O plano de
desembarque, porém, fracassou, e Fidel teve que se refugiar com os companheiros, em Sierra Maestra, de onde começaram as operações guerrilheiras. Essas operações tornaram-se, cada vez mais, organizadas e o movimento guerrilheiro cresceu em força e apoio popular, enfrentando o poder do ditador. Neste aspecto, com o processo revolucionário liderado por Fidel Castro e com o fim da ditadura de Fulgêncio Batista em 1959 (deposto pelos revolucionários), o quadro político-econômico, social e educacional mudou. Foi, então, promulgada a nova constituição, a chamada Lei Fundamental, em 7 de fevereiro de 1959, na qual ainda não estava expressa a opção pelo socialismo. No entanto, com o processo diplomático rompido com os EUA, Cuba consolidou a aliança com a União Soviética, e a transformação numa república socialista. Formalmente, a definição de Cuba como "um Estado socialista de trabalhadores" só apareceu na Constituição de 1976. Além de Fidel Castro, outro símbolo e um dos maiores ícones da Revolução Cubana foi o argentino Ernesto Guevara, o “Che”. “[...] quando se faz uma leitura de Che nos damos conta de que foi muito mais que um extraordinário guerrilheiro, que se inseriu na história de Cuba como um novo tipo de dirigente revolucionário”. (HIDALGO, In: COGGIOLA,1998, p.185) Segundo Castañeda (1997), Che Guevara nasceu na Argentina (Rosário em 14 de junho de 1928), mas foi em Cuba, a partir do sucesso da Revolução, que ganhou notariedade e destaque em nível internacional. Antes disso, teve uma vida comum, cursou medicina e trabalhou com leprosos e rodou vários países das Américas conhecendo a diversidade cultural, bem como a exploração do capital sobre os trabalhadores. Trabalhou em leprosários. Quis conhecer o continente, que percorreu com um amigo, em veículos como motocicleta e
6 Cuba vivia, desde 1952, sob a ditadura de Fulgêncio Batista, que chegara ao poder através de um golpe militar. Batista era um ex-sargento, promovido de uma hora para outra a coronel, depois da chamada “revolução dos sargentos” que depôs o presidente Gerardo Machado, em 1933. Sete anos depois, em 1940, Batista foi eleito presidente. Concluído seu mandato, manteve-se distante do poder durante o governo de seus dois sucessores, para retornar novamente à ativa em 1952, com um golpe. Disponível em: http://www.culturabrasil.pro.br/revolucaocubana.htm. Acesso em: 07/11/2012. 7 José Martí foi o mártir da Independência de Cuba. Criador do Partido Revolucionário Cubano (PRC) Seu pensamento transcendeu as fronteiras de sua Cuba natal para adquirir um caráter universal, é conhecido como «El apóstol». Disponível em: pt.wikipedia.org. Acesso em: 14/11/2012. 8 Ibdem.
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balsa. Foi da Argentina à Venezuela, e acabou em Miami, de onde foi devolvido ao seu país em um avião que levava cavalos de corrida. É provável que, por esta época, tivesse tido a revelação que na sua época teve Martí: da profunda indestrutível unidade de nossos países, além das fronteiras artificiais. É provável que aprendesse a sentir-se latinoamericano. Na Guatemala, no México – e depois, e sobretudo, em Cuba – iria verificar o que aquelas viagens já lhe haviam lançado na cara: a miséria, o desamparo e a identidade última de nossas mestiças9. Foi no México que Che Guevara conhece Fidel Castro e passou a incorporar o sonho de liberdade do povo cubano, nas palavras expressando que valia a pena, morrer numa praia estrageira por um ideal puro (CASTAÑEDA, 1997)10. Não é fácil encontrar uma pessoa que reuna todas as qualidades que reunia. Não é fácil que, numa pessoa, desenvolva-se espontaneamente uma personalidade como a dele. Eu diria que era um desses homens difíceis de igualar e praticamente impossíveis de ultrapassar. Mas, diremos também que homens como ele são capazes, por seu exemplo, de ajudar a que surjam homens semelhantes (FIDEL CASTRO)11. Hoje, Cuba é comandada por Raúl Castro após Fidel Castro, seu irmão, delegar poderes para isto, uma vez que, desde 1959, estava no comando de Cuba, inicialmente como primeiro-ministro e, a partir de 1976, como presidente, cargo que exerceu até 2006. Oficialmente - 19 de abril de 2011 - Fidel retirou-se da vida política de Cuba12.
3. CONTEXTO SÓCIOPOLÍTICO E ECONÔMICO DE CUBA Após a Revolução de 1959, Cuba passou a configurar-se como uma sociedade comunista e, nos anos seguintes, gradativamente, Cuba foi incorporando ao poder os revolucionários de Sierra Maestra. No entanto, como alerta Bandera (In: COGGIOLA, 1998, p. 81) “[...] a Revolução Cubana não foi construída sob a base de uma teoria revolucionária marxista. Ela foi resultado de décadas de ações e teorizações nacionalistas, cujos pontos altos foram as guerras de independência e o Assalto a Moncada”. A mudança com a Revolução e a opção socialista fez Cuba aproximar-se, cada vez mais, do bloco socialista no mundo, o qual tinha como maior representação a União Soviética. Ao mesmo tempo, isto faria com que fosse afastada por outros segmentos, a exemplo de que, em 1962, na Conferência de Punta del Este (Uruguai), Cuba foi excluída da Organização dos Estados Americanos (OEA). Com exceção do México, todos os países romperam relações diplomáticas e comerciais com Cuba, sob o pretexto de que o país estava exportando sua revolução para toda a América Latina. Os anos 60 são fortemente marcados por mudanças significativas rumo ao socialismo, conforme Bandera (In: COGGIOLA, 1998), em que se instituía a reforma agrária, reforma urbana, nacionalização do sistema financeiro e de grandes empresas industriais. Tendo em vista que Cuba passou a ser isolada e o embargo imposto pelos Estados Unidos fez com que aumentasse sua dependência econômica e, neste aspecto, constituiu-se imprescindível a ajuda da União Soviética (USov)13. Este é um fato importante, pois vai influenciar diretamente o modo de viver dos cubanos, considerando que o projeto educacional e as ideias econômicas foram gestadas a partir desta potência mundial (USov). Para Fidel Castro, Cuba já assumia uma forma econômica diferenciada, fazendo uma síntese entre o comunismo e o capitalismo
Roberto Fernández Retamar - Diretor da Casa de Las Américas. Prefácio da Coleção: Revolução Cubana: Passagens da guerra revolucionária escrito por Che Guevara. 10 Che Guevara foi assassinado em La Higuera (Bolívia), em 09 de outubro de 1967, pois tinha o propósito de estender o Processo Revolucionário por toda América Latina. 11 Prefácio por Fidel Castro. Revolução Cubana: Passagens da guerra revolucionária. 12 Disponível em: http://www.culturabrasil.pro.br/revolucaocubana.htm. Acesso em: 07/11/2012. 13 Cerca de 6 bilhões de dólares anuais era remetido à Cuba, pela União Soviética. Este subsídio foi extinto e Cuba buscou outros meios para subsistir, como o turismo.
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que ele chamou de Humanismo: [...] seria uma terceira via, uma opção entre o capitalismo e o comunismo. Ele afirmava que não deveria haver “nem ditaduras dos homens, nem ditaduras das classes, nem ditaduras dos grupos, nem ditaduras de casta, nem oligarquias de classe: governo do povo sem ditadura e sem oligarquia, liberdade de pão sem terror – ou seja, humanismo. Além disso, dizia que o capitalismo pode matar o homem de fome e que o comunismo mata o homem acabando com sua liberdade. (PERICÁS, In: COGGIOLA, 1998, p. 95) Com a queda do muro de Berlim (que separava o comunismo do capitalismo), em 1984, e o fim da União Soviética, em 1991, o que consequentemente, implicou na interrupção da remessa de dinheiro à Cuba, o país começou também a reestruturar sua economia. É sabido que, mesmo antes do fim da Usov, Cuba já se preocupava em estabelecer uma independência também econômica, como relata ALMENDRA (In: COGGIOLA, 1998 p. 135) Em 1986, iniciou-se a política de retificação cubana [...] que consistia em corrigir as distorções vigentes. Entre elas, o rompimento com o paternalismo russo e uma maior independência em relação ao comércio com o Leste Europeu e, portanto, Cuba deveria valer-se de recursos da própria economia local com o desenvolvimento principalmente de gêneros alimentícios; assim, intensificou-se a produção de arroz e a atividade pesqueira. Esta adoção tinha o intuito também de
contrapor a política de Mikhail Gorbatchev (Perestroika)14, pois Cuba não admitia uma total adoção ao modelo econômico capitalista de mercado, principalmente, ao modelo americano. Esta ação não só implicaria internamente como também em função do embargo15 imposto pelos Estados Unidos, significava sofrer represálias, no campo internacional, no tocante às suas importações: “qualquer navio que atraque em portos cubanos ficará proibido de atracar nos Estados Unidos por seis meses”. (ALMENDRA, In: COGGIOLA, 1998, p. 144) Um problema significativo diz respeito à energia. Cuba não possui energia hidroelétrica e toda fonte energética é gerada por petróleo ou carvão mineral, mas, enquanto a União Soviética existia, isto não representava um grande problema, pois, “fornecia petróleo muito além das necessidades cubanas. Dos 12 milhões/ton. que recebia, [...] reexportava entre 2 e 3 milhões/ton.[...]” (ALMEIDA, In: COGGIOLA, 1998, p.143). Entretanto, este é um dos fatores que prejudicou, pois criou-se uma dependência, neste aspecto. Outro campo descoberto, não por acaso, pois já existia antes da Revolução, foi o turismo. Sem o dólar russo, a economia em crise (principalmente o açúcar, já que sustentava toda uma economia a partir deste produto que fora o 5º maior produtor do mundo) e o embargo estadunidense, Cuba não viu outra possibilidade do que abrir as portas para o turismo: “[...] era proibido aos turistas passear em Cuba, pois segundo o governo cubano, este tipo de contato era nocivo” (ALMEIDA, In: COGGIOLA, 1998, p. 145). No entanto, esta foi e está sendo uma medida acertada, pois, na região do Caribe, é imensa a circulação de dólares, neste setor. 4. EDUCAÇÃO EM CUBA: URGE UMA NOVA CONFIGURAÇÃO Para entendermos melhor o atual sistema educacional cubano, sua reconhecida excelência e qualidade, é
14 Em 1985, com a entrada de Mikhail Gorbatchev, a União Soviética passou por bruscas mudanças políticas, econômicas e sociais. Ciente dos problemas que o país passava, Gorbatchev propôs dois planos: a perestroika (reestruturação) e a glasnost (transparência). A perestroika nada mais era do que um conjunto de medidas que propunha modernizar e dinamizar a economia do país. Assim, o plano autorizava a existência de empresas privadas, a entrada gradual de multinacionais e estimulava a concorrência entre as empresas. Já a glasnost previa a diminuição da atuação do Estado, na vida do cidadão, ou seja, nas questões civis. Por meio da glasnost, foi dada liberdade de expressão, os presos políticos foram soltos, entre outras medidas. Disponível em: http://www.historiadetudo.com/fim-urss.html. Acesso em: 14/11/2012. 15 O Embargo, econômico, comercial e financeiro iniciou em 7 de fevereiro de 1962 e vai se consolidando de governo em governo (EUA), proibindo que as filiais estrangeiras de companhias estadunidenses de comercializar com Cuba, a valores superiores a 700 milhões de dólares anuais. Apesar de as nações Unidas condenarem o embargo, a medida está em vigor até os dias atuais, tornando-se um dos mais duradouros embargos econômicos na história moderna.
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preciso refletir sobre os antecedentes históricos tratados no tópico anterior, desse texto, e suas implicações nas transformações da educação cubana, que apresentava um grave quadro educacional, antes da revolução de 1959, como também compreender o esforço coletivo para modificar este quadro e estabelecer princípios identificados com a ética da revolução, notadamente os de solidariedade e coletivismo. É importante também compreender as transformações pelas quais passou a estruturação desse sistema educacional, principalmente em relação às Escolas Secundárias Básicas, que representaram a possibilidade de reavaliação do papel da escola e dos professores, para a retomada dos princípios éticos revolucionários citados acima, que foram comprometidos em função da repercussão do desmoronamento do campo socialista, no final de 80 e início dos anos 90, e dos impasses sociais decorrentes da deterioração desses princípios. Historicamente, a sociedade cubana esteve sob a influência de uma “forte oligarquia, submissa aos signos da aristocracia ibérica (na qual) a escola foi, durante a colonização, notadamente um privilégio da classe média urbana e branca marcada pela seletividade” (LEITE, 2010, p. 259). Passou por intervenções norteamericanas, que, dentre outras coisas, buscou cessar a luta do povo cubano por emancipação, sendo uma das ações mais destacadas a criação da emenda Platt, a qual “oficializou o direito a intervenções [...] consolidando a reorganização do sistema em razão de interesses neocoloniais”. Entretanto, na contrapartida da opressão, historicamente, esta mesma sociedade também foi marcada pela cultura de resistência. Como afirma Leite (2010, p. 259), a “cubanía – consolidação da nacionalidade de raiz afro-espanhola e de vocação latino-americana – promoveu os combates pela independência iniciados em 1868”. Esta cultura de resistência fez surgir nomes importantes também no meio pedagógico, como Félix Varela (1788-1853), que defendia a ideia do estudo como espaço para compreensão e meditação, como também fez surgir o mais influente nome da educação cubana, José Martí, que destacava a relação entre educação e emancipação.
Este defendia um pensamento pedagógico que pressupunha princípios da educação laica; o estudo como um direito de todos; a liberdade de consciência do professor e do aluno; uma educação científica e politécnica; como também uma educação para a vida. Este mesmo pensador estabeleceu as bases da educação em Cuba, principalmente após a revolução, as quais propõem uma estreita relação entre educação, ideologia nacional e formação do professor, a vinculação entre teoria e prática e a relação entre educação e trabalho como princípios norteadores desta formação (LEITE, 2010). Até antes da revolução de 1959, o sistema educacional cubano se configurava bastante precário e com altos índices de analfabetismo. Puiggrós (apud Trojan, 2008, p. 55) apresenta dados sobre a educação cubana que comprovam esse grave quadro educacional, pois, até 1968, o país tinha “um milhão de analfabetos absolutos, mais de um milhão de semi-analfabetos, 600 mil crianças sem escola e 10 mil professores sem trabalho”. Após a revolução, a prioridade à educação para todos se insere em um projeto nacional maior que prevê também saúde, moradia e emprego. No aspecto educacional, destacam-se os movimentos alfabetizadores do início da década de 1960, erradicando o analfabetismo, a fundação dos Institutos Superiores Pedagógicos (ISPs), em meados desta mesma década, ampliando a formação de professores para possibilitar a universalização do acesso à educação básica, e, mais recentemente, a proposta de universalização da educação superior para todos, num quadro educacional que se apresenta na contramão, por assim dizer, daquele apresentado pelo restante do mundo, na atualidade, que em 2008 ainda contava com “cerca de 860 milhões de analfabetos e 120 milhões de crianças sem escola” (TROJAN, 2008, p. 55). Cumprida esta primeira etapa, de erradicação do analfabetismo, os dirigentes cubanos voltaram sua preocupação para o investimento na escolarização para todos e na formação docente, que passou de uma situação inicial de oferecimento de cursos de preparação acelerada de professores emergentes para, depois, à organização dessa formação, no nível de ensino médio e superior. “O sistema educacional cubano se apoia nos princípios do caráter massivo da
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educação; no princípio da vinculação estudo e trabalho; da participação de toda a sociedade nas tarefas da educação do povo; da co-educação e no princípio da gratuidade do ensino e todos os níveis” (FREITAS, 1998, apud TROJAN, 2008, p.56). O sistema educacional cubano está estruturado e organizado com base no modelo europeu, ou seja, educação infantil (zero a quatro anos), pré-escolar (cinco anos), primária (de seis a onze anos), secundária básica (de dez a doze anos), préuniversitária, escola de ofícios, secundária obrero-campesina e instituto politécnico (de quinze a dezessete anos) e, por fim, as universidades, centros universitários e institutos superiores. Além dessa estrutura, também é oferecida uma estrutura de educação de adultos, o equivalente ao Ensino de Jovens e Adultos (EJA) brasileiro, aos que não conseguiram ingressar no ensino superior, na idade própria (TROJAN, 2008). Cuba possui uma educação planificada e planejada, significa dizer que os conteúdos educacionais transmitidos, no campo escolar (básico e superior), são os mesmos para toda Ilha. Com o planejamento e a preocupação, neste campo desde 1959 e efetivação em 1961, foi o primeiro país no mundo a acabar com o analfabetismo. A educação é controlada pelo Estado e a Constituição de Cuba determina que o ensino fundamental, médio e superior devem ser gratuitos a todos os cidadãos cubanos e é obrigatória até o 9º ano16. Na saúde, por exemplo, dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2005, a taxa de mortalidade infantil para crianças abaixo de cinco anos de idade foi de sete para cada mil nascidos, índice superado na América apenas pelo Canadá, onde o índice correspondia a seis crianças a cada mil nascidos. Vale destacar, também, que, desde 2006, Cuba não apresenta nenhum caso de difteria, sarampo, coqueluche, poliomielite, rubéola, tétano neonatal, ou febre amarela (houve apenas três casos de tétano comum em 2006). Estes dados demonstram o compromisso do governo cubano com o bem estar de sua população e com a ampliação do acesso aos direitos básicos para os cidadãos. O mais recente projeto de ampliação desses direitos é o acesso à educação s u p e r i o r, q u e p e r s e g u e a m e t a d e universalização deste nível de ensino em dez anos, a partir de 2003. Em Cuba, a educação 16
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Fonte: Wikipédia.org. Acesso em 16/11/2012.
superior é dividida em oito ministérios, um escritório, um comitê e um instituto nacional, mas o órgão responsável pela rede de ensino da educação básica e pela formação dos professores para a atuação neste nível é o Ministério de La Educación (MINED), que tem como área de estudo as Ciências Pedagógicas. Os princípios gerais da política de formação docente são: a responsabilidade total do Estado pela formação inicial e continuada, por meio da gratuidade, garantia de emprego e formação contínua para todos os professores em exercício; instituições universitárias específicas de tempo integral e duração de cinco anos; e um sistema integrado das instituições universitárias com a escola. Além da formação inicial e continuada, essas instituições são responsáveis pela investigação educativa e elevação do potencial científico do seu território de abrangência (MARIÑO SÁNCHEZ et al, 2004 apud TROJAN, 2008, p. 57). Pode-se dizer que a formação docente se dá como uma formação, em exercício ou em serviço, atendendo ao princípio de articulação entre teoria e prática, e a combinação entre ensino e trabalho, pois dos cinco anos desta formação, o primeiro “de caráter teórico-intensivo, tem como objetivo preparar os estudantes para o trabalho universitário independente e uma adequada formação psicológica, pedagógica e sociológica, que permita iniciar sua atividade docente” (TROJAN, 2008, p.58). Mas, a partir daí, a formação se estrutura em articulação com a prática docente na escola, sendo o aluno orientado por um professor mais experiente, como também estando sob a tutoria de um professor universitário. A qualidade de ensino e as excelentes condições de trabalho docente são representadas não só pela relação da média de um maestro ou PGIs (professores generalistas integrais, que têm uma formação generalista e ensinam nas escolas de educação infantil, primária e secundária) para cada quinze alunos, ou pelo acompanhamento e orientação deste PGI por um professor mais experiente na escola e por um
tutor na universidade, ou ainda a relação de um tutor para cada cinco alunos. Há também a garantia de uma adequada infra-estrutura física e de recursos materiais e tecnológicos oferecidos, como televisão e vídeo, em todas as salas de aula, computador em todas as escolas, período escolar em tempo integral, desde a educação infantil, fortalecimento da interdisciplinaridade e atenção particularizada aos estudantes, através do chamado expediente acumulativo do escolar, que é: [...] um relatório escrito, elaborado pelos diversos professores, acompanha o aluno desde o seu ingresso no sistema formal de educação, onde estão registrados todos os dados significativos do estudante, inclusive as variações do estado de saúde, as características do meio familiar, os avanços e peculiaridades no campo da aprendizagem. (LEITE, 2010, p. 267). Também é representativo, desta preocupação dos dirigentes cubanos com a excelência e qualidade da educação de seu povo, o cuidado com a formação dos professores, atualmente todos egressos de cursos superiores; o desenvolvimento de organizações para tratar das questões educacionais, desde a mais tenra idade, como os Círculos Escolares da década de 1960, que recebiam crianças recém-nascidas até os cinco anos de idade, para possibilitar o trabalho da mãe; ou ainda a crescente estruturação dos órgãos responsáveis por este nível de educação, como a criação do Instituto de La Infancia, as Escuelas Formadoras de Educadoras e a Comisión de Educación de Padres, na década de 1970, a implantação do programa de educação préescolar e sua respectiva licenciatura, integrada ao Ministério de Educação, ou a criação, a partir de 1990, do programa Educa a tu Hijo, que tinha o objetivo de orientar as famílias das crianças que não frequentavam os círculos infantis (TROJAN, 2008). A educação primária acompanha os mesmos níveis de qualidade, já apontados anteriormente, isto é, número reduzido de matrículas por sala (15 alunos), que garante uma atenção pedagógica mais adequada, aporte tecnológico, mecanismos de acompanhamento e diagnóstico da instituição
escolar e do aluno, através de comissões nas quais participam professores, pais de alunos e representantes da comunidade (TROJAN, 2008). Já a educação secundária merece um destaque maior, tendo em vista a sua centralidade, na tentativa de ideologização do ensino, para consolidar a defesa dos princípios do socialismo, comprometidos, como já dissemos, em função da repercussão do desmoronamento do campo socialista, no final da década de 1980 e início dos anos 1990. Os efeitos desta crise revelaram o aparecimento de grupos em desvantagem social, no fim da década de 1980, que comprometiam a formação das crianças devido ao convívio com [...] pais alcoólatras, isolados socialmente ou com problemas psiquiátricos; famílias com condutas relacionadas à delinquência, prostituição, abandono dos menores e problemas frequentes com a polícia; habitação deficitária quanto à limpeza e salubridade; cuidados médicos unicamente em situações de risco, e dinâmica familiar conflituosa (LEITE, 2010, p. 260). Outras questões relacionadas a este momento de crise, as quais a reestruturação da escola secundária cubana pretendia enfrentar, se refere às dificuldades de formação dos jovens nascidos após a revolução, a partir dos princípios de solidariedade e coletivismo, assim como uma formação voltada à prática laboral, tão caros à sociedade de Cuba. Segundo Leite (2010), de forma paradoxal, as conquistas sociais conseguidas, após a revolução (garantia de emprego; serviços médicos e educacionais gratuitos; baixo preço das tarifas de transporte etc.), pareciam responsáveis por uma certa acomodação e indisciplina desses jovens, nos locais de trabalho. A influência de valores relacionados ao consumo de bens e não a sua produção, notadamente da comunidade cubana fixada nos Estados Unidos, e as dificuldades econômicas que levaram parte da população cubana ao mercado informal, comprometeram a percepção dos jovens cubanos sobre a importância da educação escolar e do trabalho como geradores do bem-estar coletivo (LEITE, 2008). Assim, a reforma da escola secundária 41
cubana buscou o fortalecimento da interdisciplinaridade, o redimensionamento do papel da escola e do professor, e a reconstrução de uma identidade profissional atrelada à significação social da profissão, como resultado de estudos do Instituto Central de Ciências Pedagógicas, em 1999. Como afirma Leite (2010, p. 263): “A concepção das escolas secundárias básicas, tratadas como micro-universidades, foi implementada, em todas as províncias de Cuba, dentro da chamada Batalha das Ideas (grifo da autora), movimento desencadeado com a finalidade de minimizar a desigualdade gerada em consequência do Período Especial”. O conceito de micro-universidade pode estar relacionado com a escola, como na citação acima, mas poderia ser um hospital, uma fábrica ou oficina, pois seu pressuposto é que a formação dos universitários deve ser organizada em contato com a realidade onde vão atuar como profissionais. (LEITE, 2010). Outros dois destaques das escolas secundárias cubanas são o caráter de enfoque laboral do ensino, dentro do eixo central, na política educacional do país, e sua relação com o trabalho de produção agrícola no país. Sendo assim, enfatiza-se a importância de se ir além da aquisição dos conteúdos/conhecimentos das disciplinas, mas também envolver os alunos com atividades que desenvolvam valores e normas de conduta. Neste sentido, destacase o envolvimento dos alunos destas escolas em atividades como “atenção às hortas de auto-abastecimento, trabalho de manutenção e reparação do mobiliário escolar, carpintaria, funilaria, confecção e consertos de uniformes escolares, além das tarefas de limpeza das instalações escolares” (LEITE, 2008, p. 12), como também o envolvimento, aos sábados, em campanhas de combate ao mosquito da dengue. Em relação ao trabalho de produção agrícola, Leite (2008) destaca que as escolas secundárias básicas se apresentam em duas modalidades: a escola al campo, para o meio urbano, e a escola en el campo, para o meio rural. Na primeira, os alunos permanecem de quatro a sete semanas no campo, onde realizam trabalho na lavoura, aprofundando aspectos teórico-práticos das técnicas agrícolas, como também devem organizar seus pertences, ajudar a preparar os 42
alimentos e a limpar os cômodos onde ficam alojados. Na segunda modalidade, é destaque a mobilização dos alunos, no turno matutino, para o cultivo de cítricos, café, tabaco, verduras, hortaliças e vegetais, por exemplo, e as instalações das escolas, que contam com “laboratórios de informática, bibliotecas, quadras de esportes, enfermaria e todas as demais instalações necessárias para assegurar a permanência dos alunos, em situação favorável a uma educação de qualidade (CEREZAL MEZQUITA, 2004 apud LEITE, 2008, p. 13). Portanto, diante dos aspectos apontados nos parágrafos anteriores sobre a educação cubana, pode-se destacar a garantia de unidade e igualdade de acesso, permanência e condições materiais e pedagógicas para todos os estudantes, em todos os níveis e modalidades de ensino de todo o país; os princípios de articulação entre estudo, trabalho e pesquisa, sendo esta última um meio de educação permanente; a estrutura de educação superior (graduação e pós-graduação) que vem evoluindo a cada ano, desde 2003, quando se estabeleceu a meta de universalização do ensino superior para todos, em um período de dez anos; a garantia de unidade de formação, por meio da padronização dos cursos ofertados e da metodologia adotada, tendo os ISPs como lócus central da formação; as excelentes condições de trabalho, em razão do modelo pedagógico de ensino da educação básica que prevê baixa relação entre professor e número de alunos (15), tempo integral de trabalho, na mesma instituição, sendo que 50% do tempo é destinado a atividades extraclasse; e o modelo de formação de professores, em tempo integral, que prevê o aporte teórico, no primeiro ano de formação, e mais quatro anos de articulação entre ensino, pesquisa e trabalho, a partir de um sistema de tutoria, assim como a formação específica dos docentes, no ensino superior. A despeito dessa avaliação positiva, é interessante apontar algumas questões problemáticas consideradas pelos estudiosos do sistema educacional cubano, como por exemplo: se as dificuldades de sua economia, iniciadas na década de 1990, podem comprometer as garantias apontadas no parágrafo anterior; se a nova escola cubana poderá superar os conflitos entre a lógica da emancipação e da regulação, as críticas à centralização do processo decisório sobre as
políticas educacionais, ou ainda as limitações para a criatividade e autonomia dos professores, devido a essa centralização; se a concentração prática da formação dos professores, principalmente os PGIs, não acarreta uma preparação pouco aprofundada, em relação aos aportes teóricoconceituais dos conhecimentos tratados; se não há certa imaturidade de parte considerável destes PGIs, visto que muitos deles, também jovens, como seus futuros alunos, podem ter dificuldade em dominar as diversas técnicas metodológicas e a carga de conteúdos compatíveis com a necessidade dos alunos e com o nível de exigência de seus pais, principalmente considerando a necessidade de se trabalhar tais conhecimentos de forma crítica (LEITE, 2010). Além disso, resta saber se mudanças suscitadas pelas dificuldades originadas do agravamento da crise, em razão do desmoronamento do campo socialista, notadamente dos impasses sociais decorrentes da deterioração dos princípios identificados com a ética da revolução, e as recentes transformações de alguns desses princípios, como os de comércio privado, compra e venda de automóveis etc., autorizados pelo novo dirigente cubano, Raul Castro, trará consequências também para a educação cubana, o que refletiremos no tópico a seguir. 5 . C O N S I D E R A Ç Õ E S AT U A I S : O S DESAFIOS DE CUBA Este trabalho proporcionou não só analisar a cultura, a política, economia a educação, mas, precisamente, rememorar o processo revolucionário do povo cubano. Conhecemos particularidades que só uma imersão direta ao campo e ao objeto, numa relação indissociável entre os sujeitos (Nós, Eles), seria possível compreendê-las. Percebemos que Cuba superou várias dificuldades e o embargo tem sido o grande obstáculo de sua superação, e mesmo atendendo às exigências dos Estados Unidos, como não financiar guerrilhas; não mandar tropas para África; não ter laços com países capitalistas, não ameaçar o poderio norte-americano, entre outros, ainda exige-se que Cuba realize eleições diretas e multipartidárias e sob a supervisão dos E s t a d o s U n i d o s . ( H AV R A N E K , I n : COGGIOLA,1998) Este é um aspecto que afeta os demais
setores e a economia, que é a que mais sofre, mas, parece-nos que os Estados Unidos têm interesse em controlar este aspecto também, pois, Cuba configura-se como uma plataforma importante de exportações para a América Latina e o maior mercado consumidor da América Central, pode fornecer álcool e açúcar a preços baixos, como alerta o autor supracitado. As dificuldades de Cuba, antes da revolução e atualmente, têm uma marca de superação e possibilitou/possibilita seu soerguimento: a Educação! Estamos convictos que este bem é imprescindível à vida humana, mas, sobretudo, para a sua condição de cidadania. Não é à toa que Cuba vem se destacando no campo da indústria farmacêutica – biotecnologia – e a medicina microeletrônica, o que já vem despertando os interesses capitalistas externos. No campo esportivo, é destaque internacional, pois, utiliza-se deste fenômeno cultural para prevenir e estimular a saúde (esporte educacional), bem como mostrar ao mundo sua soberania (esporte de alto rendimento). Neste último, despertando o interesse de empresas multinacionais como a “Adidas” que patrocina o esporte cubano e paga 7 (sete) milhões de dólares por ano pela exclusividade. Não fizemos defesa, nem tampouco apologia, a um sistema econômico ou a outro q u a l q u e r. E n c o n t r a m o s p o n t o s q u e enaltecem a cultura de Cuba, principalmente a educação, bem como uma crítica de suas lacunas. Ainda, há, conforme a segunda citação abaixo, aqueles que condenam Cuba a entrar na lógica de uma economia mista (socialismo e mercado), mas, sobretudo, sem querermos fazer comparações, percebemos o quanto estamos atrasados, na melhoria das condições de vida dos brasileiros. Aqui, seguem dois momentos distintos para nossas reflexões: A educação cubana é um sistema aberto que se nutre do melhor de nossa própria tradição pedagógica e daquilo que se fez e se faz, no mundo, para avançar sobre bases seguras, por isso o intercâmbio internacional cresce a cada dia, especialmente com o nosso tronco comum: a América- Latina e o Caribe. Muito é o que estamos tentando aprender de outras experiências e, 43
quem sabe, parte das nossas possa ser útil em algum lugar. [...] Trata-se de uma integração inteligente e enriquecedora em prol de objetivos comuns. Trata-se, enfim, de trabalhar unidos pela educação de nossos filhos, esse alimento tão necessário ao homem, como o pão que consome a cada dia (RODRÍGUEZ, 1996, p.37). Se o socialismo num só país com seus países satélites foi uma falácia, o socialismo numa só ilha é uma ilusão. Cuba tenta canalizar esforços para sustentar sozinha, aquilo que moveu um terço da humanidade e acabou desabando por seus próprios problemas estruturais. Se a União Soviética, com todo seu gigantismo, não conseguiu carregar eternamente o bastião, o que pensar de uma ilha isolada e bloqueada economicamente pela maior potência capitalista? Parafraseando Marx no18 de brumário..., a história se repete, na primeira vez como tragédia, na segunda como farsa. (ALMENDRA, In: COGGIOLA, 1998, p. 152) Portanto, deixamos em aberto estes questionamentos, pois, percebemos, em nossa investigação, que há posicionamentos distintos, no tocante à Cuba. Se, por um lado, observamos as críticas em que a população vive na “miséria”, que o socialismo foi um fracasso, entre outras, muitas vezes, advindas de um lado da mídia que tenta, a todo custo, acabar com o sistema vigente, por outro lado, percebemos que o país está entre os primeiros da América Latina, com o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) elevado. Além disso, estamos vivenciando uma nova fase, no cenário internacional, em que aponta para uma aproximação dos EUA com Cuba, pois, Barack Obama – Presidente dos Estados Unidos - começa a anunciar a retomada das relações diplomáticas com este país. Este é um episódio importante que pode implicar numa nova fase, na história de Cuba. Não resta dúvida de que Cuba tem enormes problemas econômicos, sociais, políticos, entre outros, e consideramos que muita coisa precisa ser mudada, mas, antes de uma análise fria e ideológica, precisamos olhar para o nosso próprio país (Brasil) e as 44
contradições que estão presentes, em nossa pseudo democracia. 6. REFERÊNCIAS ANCONI, Eliane. Antecedentes históricos de uma revolução anunciada. In: COGGIOLA Osvaldo (org.). Revolução Cubana: História e problemas atuais. São Paulo: Xamã, 1998. ALMENDRA, Carlos Cesar. A situação econômica cubana diante da queda do leste europeu. In: COGGIOLA Osvaldo (org.). Revolução Cubana: História e problemas atuais. São Paulo: Xamã, 1998. ALONSO JÚNIOR, Odir. O processo revolucionário: 1953/1959. In: COGGIOLA Osvaldo (org.). Revolução Cubana: História e problemas atuais. São Paulo: Xamã, 1998. BANDERA, Vinicius. O Debate econômico dos anos 60. In: COGGIOLA Osvaldo (org.). Revolução Cubana: História e problemas atuais. São Paulo: Xamã, 1998. CASTAÑEDA, Jorge G. Che Guevara: A vida em vermelho. São Paulo: Companhia das letras, 1997. COGGIOLA Osvaldo (org.). Revolução Cubana: História e problemas atuais. São Paulo: Xamã, 1998. GUEVARA, Ernesto (Che). Revolução cubana: Passagens da guerra revolucionária. São Paulo: Edições Populares, 1987. ______., ______. La Habana: Casa de Las Americas, 1997. HAVRANEK, Alice. Cuba na atualidade: o impasse e o silêncio. In: COGGIOLA Osvaldo (org.). Revolução Cubana: História e problemas atuais. São Paulo: Xamã, 1998. HIDALGO, Rafael. As Lições de Che Guevara. In: COGGIOLA Osvaldo (org.). Revolução Cubana: História e problemas atuais. São Paulo: Xamã, 1998. LEITE, Maria do Carmo Luiz Caldas. A escola secundária básica em Cuba: integração do ensino com o trabalho. Caxambu/MG. Anais da 31ª ANPEd, 2008. D i s p o n í v e l e m : http://31reuniao.anped.org.br/1trabalho/GT09-4323-Int.pdf. Acesso em: 10 de novembro de 2012. ______. A escola como microuniversidade na educação secundária em Cuba. Cadernos de Pesquisa, v.40, n.139, p.257-276, jan/abr. 2010. PERICÁS, Luiz Bernado. Che Guevara e o homem novo. In: COGGIOLA Osvaldo (org.). Revolução Cubana: História e problemas atuais. São Paulo: Xamã, 1998. RODRÍGUEZ, Guillermo Díaz. Educação-Cuba Nem só de pão vive o homem. São Paulo. Revista ADUSP. Jan. 1996. TROJAN, Rose Meri. Educação Básica e Formação Docente em Cuba: prós e contras. Jornal de Políticas Educacionais, n.3. Janeiro-junho de 2008, p.53-64.
Violência e linguagem Antônio Ponciano Bezerra* “Toda interação (interlocução) linguística contém a 'virtualidade' de um ato de poder (...). A violência simbólica pode ser muito mais eficaz que a violência político-policial, sob certas condições e a um certo preço (...) a violência simbólica de um ato de intimidação verbal é um 'habitus': as disposições inculcadas no agente pelos aspectos insignificantes da vida cotidiana” (Pierre Bourdieu)
O conteúdo deste texto ou mesmo a natureza dele, ou ainda as duas coisas, ao mesmo tempo, pode (ou podem) não constituir o que, academicamente, denominase de artigo, e bem menos de 'artigo científico'. A intenção do autor limita-se a uma breve reflexão sobre dois fenômenos sociais que se evocam e acontecem associadamente, nas mais diversas esferas da vida pública ou privada, no âmbito das instituições ou no contexto afetivo e familiar. A relação entre violência e linguagem nos remete ao mito bíblico da punição de Babel. Numa referência livre às reflexões de Pieter Bruegel, pintor flamengo, esse mito nos conduz a imaginar ter havido (se algo, neste sentido, existiu, de fato, ou se enquadra numa lenda mitificada pela espécie humana, por interesses de cunho social, com o objetivo de destruir uma sociedade que se apresentava homogênea e se impunha como 'diferente'. Mas “pode ter sido', também, uma maneira de estigmatizar certos 'habitus' comunitários ou mesmo inibi-los, evitando, assim, o avanço de determinadas peculiaridades que caracterizavam a identidade do grupo. E uma das formas de violência possível seria (se o foi) disseminar confusão entre os indivíduos, abrindo espaço para a violência. “a mesma língua e as mesmas palavras enfermam os homens, em seu estado de padronizadas e os conduzem a projetos dementes e, finalmente, à loucura. É preciso dispersá-los para fazer avançar o encadeamento operado pelo 'fechamento da língua', em contradição com a linguagem (e possibilitar a eclosão da diferença)”.
* Professor DLEV/UFS
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Desse modo, o mito de Babel nos obriga a refletir sobre a associação entre violência e linguagem ou, ainda, entre usos violentos da linguagem. Não existe fala sem sujeito. Não existe fala gratuita ou ingênua. Não existe fala feliz ou infeliz. Se alguém assim o pensa, desconhece, lamentavelmente, que tropeça sobre palavra ou frases. Sentido e interpretação são da parte do receptor e nunca do emissor. Não existe fala sem autoridade. Até mesmo o balbuciar ou o choro de uma criança denota autoridade e chama a atenção da figura materna. Para Lacan (ou para os adeptos da 'lacanagem'), a fala ou discurso do esquizofrênico (e olhe lá!) é a única manifestação verbal desprovida de autoridade. Com efeito, entre nós, 'ufsinos', até, professores doutores acreditam numa fala ingênua, verdadeira, racional, limpa ou desprovida de autoridade ou de violência. Creem numa fala virgem, sarada ou curada de males, bem intencionada, enfim, divinal. Por que 'blá-blá-blá' é a fala ou o discurso do outro e não o 'meu'? O 'meu' é o espelho da verdade ou a encarnação dela? Talvez, Jung, Freud, Lacan ou a 'bola de cristal' expliquem surtos e desvarios, dessa natureza. Zouhour, referindo-se aos prejuízos que o uso chulo da linguagem encerra, nos adverte que a má imagem que esses atos produzem em suas vítimas é tão destrutiva quanto ou mais que a miséria. Para esse mesmo pensador, tal imagem se constrói e ativa, em especificidade, numa “exacerbação de sentimentos e na violência simbólica de certas práticas linguageiras e comunicativas inadequadas, transgredindo as regras geralmente admitidas: uso de um vocabulário de forte conotação sexual ou escatológica, reflexões impertinentes ou injúrias”. A língua ou as línguas (e também a linguagem humana), em si, não são signo de uma revolta, de uma recusa ou de uma zombaria ou escárnio frente à ordem estabelecida pelos homens. Toda prática linguística é reveladora de uma prática social. Adultos e jovens, consciente ou inconscientemente, identificam-se com palavras ou expressões que usam, incluem ou excluem alguém. A verbalização, a fala, vai muito além do que sai de nossa boca ou mesmo de nossa consciência. Isso nos leva a
imaginar, compreender e aceitar que uma reflexão sobre as nossas práticas 'linguageiras' seria essencial à erradicação da violência que nos habita. Palavras ou frases como 'bixa' (com 'x', que não se refere à plantinha caribenha, nem a um mau registro ortográfico, mas a uma dissimulação consciente ou a uma ignorância cultivada), 'ladrão', 'rei-tor' e muitas outras habitam em nós como julgamentos, como formas de exclusão, como sentimentos negativos que nos atravessam. Provenham de adultos ou de jovens, do mendigo ou do papa, são recursos linguísticos que entram em nós e deles nos apropriamos, em conformidade com as nossas crenças, as nossas adesões. A cólera das pessoas e as injúrias por elas proferidas podem marcar alguém pelo resto da vida. Não há idade franqueada para se suportar injúrias, desrespeito, exclusão ou julgamentos vis. Não é por se tratar de um menor de idade, de um jovem, de um adulto ou de um idoso que as expressões verbais injuriosos devem ser amenizadas, desculpadas ou 'perdoadas'. Em várias situações, como observou o jurista mineiro, Alyrio Cavalieri, imprimindo a imortal expressão: ”por trás de um menor (que, necessariamente, não o é só por idade, mas também na escala social), há um maior”, mascarado, dissimulado, aproveitador, que se esconde por trás das palavras e dos mais frágeis. Esse 'maior' representa a violência fascista do covarde ou da covardia. É o mesmo gesto de enrolar-se na bandeira do Brasil, em atos públicos, e fazê-la de escudo. A burguesia, a pequena burguesia, a classe média e o segmento de pseudo-intelectuais desprovidos de leitura, de reflexão ou de pensamento têm essa 'queda ou surto' de cobrirem-se com a bandeira e gritar pelo retorno da ditadura. Possuem, apenas e muito mal, meia dúzia de palavras de ordem, decoradas, portanto, nada mais fascistóide do que essa atitude que, recentemente, ganhou espaço e público, nas ruas e nas instituições públicas de ensino do país. Nesse sentido, importa saber em que consiste a autoridade do falante e quais são as regras que ele transgride quando, claramente, se pode qualificar a sua linguagem de violenta. Numa cultura em que correm livremente injúrias e outros sentimentos negativos, facilmente, o mal torna-se a crença, produtora de violência da linguagem e de linguagem da violência. O 47
filósofo e jurista inglês, Jeremy Bentham sentenciou que “A força e a harmonia dependem, em parte, das qualidades mecânicas da linguagem, e, em parte, do arranjo das palavras”. Conhecer essa realidade violenta que envolve palavras e frases exige de emissores e receptores compreenderem em que consiste tal força ou constrangimento senão no uso abusivo da força, pois é 'violenta a força que ultrapassa os limites do estimado como legítimo. A violência verbal encontra o seu espaço de reflexão e de estudo no âmbito das ciências da linguagem, nomeadamente, na Linguística, em sua vertente que trata da relação entre língua e sociedade, dos atos de fala e dos discursos que acompanham esses atos que, conforme observaram Galatanu, Cozma e Bellachhab, visam a exercer uma força que constrange o indivíduo ou um grupo social, provocando um “mal-estar” como em ameaças, ordens, palavras de ordem, interdição, blasfêmia, acusação, desprezo, ódio, indiferença, injúria, difamação, calúnia, aleivosia, insulto, maldizer (que se inserem no contexto das falas ou dos discursos tiranos), e põem em causa a honestidade, a sinceridade, a boa fé, o bom senso e pertinência de práticas sociais de indivíduos. O objetivo dessas reações verbais violentas não é outro senão manchar a face pública do pretenso adversário. No fundo, a violência verbal brota, mais facilmente, quando a hierarquia, que autoriza a ordem, fragmentase ou passa a não existir, e as violentas interações verbais assumem o comando das interlocuções. O próprio Código Penal enquadra atos como a difamação, a injúria e a calúnia, entre outros, como sujeitos a penalidades, por veicularem conteúdos que ofendem a dignidade ou decoro de outrem. No entanto, 'pecamos' pela complacência, deixando que atos verbais violentos passem despercebidos ou tidos como 'coisas normais', até chegar ao descontrole total. Na instituição escola (em todos os seus níveis) ou no ambiente de trabalho, o uso da linguagem, com o objetivo de ofensa à dignidade ou à honra de indivíduos, não pode e não deve proliferar ou ser tratado com indiferença. A ética não é algo que se ensina como a matemática, a língua portuguesa ou a geografia, mas como atitudes e valores que sustentam a vida das pessoas nas instituições sociais, sejam elas escolas ou ambientes de trabalho. Sem a 48
presença da ética, toda e qualquer instituição, sobretudo, a escolar (que também é local de trabalho) distancia-se da seriedade, do respeito, da competência e do profissionalismo. A violência verbal é um ato devastador e se enquadra no campo denominado por Pierre Bourdieu por 'violência simbólica' que deve ser entendida como uma violência que provoca ou arranca submissões ou obediências que sem, nem sequer, serem percebidas como tais. Apoiando-se em 'expectativas coletivas' e em 'crenças socialmente inculcadas', a violência simbólica produz efeito aniquilador sobre sua vítima. Ferina, a violência simbólica esmaga, corrói e dilacera, bem mais que a violência física que é um tipo de violência declarada. A violência simbólica pode até ser refinada, silenciosa, 'suave', eufêmica, no entanto, não passa de covardia ou de instrumentos em mãos de covardes. A violência simbólica atua nas mentes e nos corpos. Trata-se de uma 'persuasão oculta' que encontra, no uso da linguagem, o seu privilegiado suporte de materialização. As universidades públicas federais constituem um espaço republicano, pluralista e laico. Nela, fazem-se representar segmentos sociais que preenchem toda a hierarquia da pirâmide social que integra uma sociedade de classes como a nossa. Na Universidade Federal de Sergipe, por exemplo, há representação de indivíduos que militam, social e politicamente, em diversos movimentos sociais: sem-terra, sem-teto, de gênero, de direitos humanos, de meio ambiente, de etnia e raça, entre outros. O que parece insólito é que as diversas formas de preconceito são estampas, escancaradas, no interior dessa instituição de ensino, sem a mínima reação de qualquer dessas correntes que lutam por libertar-se de formas vis de tratamento e de exclusão social. Silenciar-se, diante de atos verbais que conotam violência simbólica, por conveniência ou por conivência, é uma das formas mais visíveis e perversas, mais cruéis e mais covardes, de que se tem notícia. O que, aqui, ocorreu e ocorre não vai passar do 'dito' pelo 'não dito' (ou silêncio). Em outra instituição do mesmo porte e gênero, em outros estados do país, esse quadro não ficaria em brancas nuvens. A retórica violenta, invasiva, ao mesmo tempo impregnada de virulência e agressividade, mesmo que seja dirigida ao
que se imagina tratar-se de 'o poder', veicula efeitos maléficos, sobretudo, quando ostenta obscenidades, insultos e injúrias. A linguagem reflete o que se passa na mente humana e é o mais legítimo canal de transmissão de nossos pensamentos e emoções. Ela não só transmite informações ou é um 'instrumento' de comunicação. Representa, também, um modo de fazer tangíveis as nossas ações. As línguas se manifestam em formas orais e/ou escritas, com significado que se faz acompanhar, também, de uma intencionalidade e provocam efeitos em seus receptores. O filósofo inglês John L. Austin, em sua obra “Quando dizer é fazer”, discorre sobre os 'atos de fala', entre eles, encontra-se o 'ato declarativo' que detém força ilocucionária. Então, o que somos capazes de fazer com o uso de palavras ou frases? O que se faz ao pronunciar: a) “eu o condeno à prisão”; b) “eu o condeno ao estigma x”; c) “eu o condeno à morte”; d) “eu o declaro corrupto”. O acusado pode não merecer a declaração, mas há chances de se tornar verdade, a depender de quem proferiu, de quem insinuou. No fundo, realiza-se uma ação, em se falando, declarando, afligindo, amedrontando, acusando, caluniando, injuriando. Esse tipo de linguagem, de alguma forma, converteu-se em 'realidade corpórea', com força própria e intencionalidade agressiva. A violência na linguagem cotidiana é, de fato, uma prática que se distancia da palavra ou da frase em seu sentido eufórico, positivo, por se confinar ao sentido disfórico ou negativo: não 'semeia', 'devasta', não 'crê', 'desconfia', não 'sonha', 'arrebata', não 'concilia', 'desune', não 'integra', 'exclui', não 'sana', 'fere'. A cultura massificante, pela sua própria natureza, desconfia do prazer de que goza todo e qualquer idioma e da capacidade expressiva de seus falantes: crianças, jovens e adultos. Reside, na linguagem humana, a fonte da crítica responsável, mas também é, no próprio uso da linguagem, que se origina a proliferação de insultos, na vida diária, revelando essa face violenta da sociedade que paira sobre a comunicação entre os seres humanos.
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Erosividade da chuva (R) para a bacia hidrográfica do Rio Longá-Piauí Cláudia Maria Sabóia Aquino* Amanda Alves Dias**
*Professora Adjunta do curso de Geografia da Universidade Federal do Piauí – UFPI/ CG/PPGGEO cmsaboia@gmail.com **Graduanda do curso de Geografia da Universidade Federal do Piauí - UFPI amandaalvesdias@hotmail.com
1. Introdução A erosividade da chuva, baseado em Schiavetti & Camargo (2002), pode ser definida pela sua capacidade potencial em causar erosão através do impacto das gotas das águas pluviais em camadas superficiais do solo. A energia cinética empregada em tal processo é resultante, não apenas da intensidade, como também da duração e frequência dos episódios pluviais. A determinação da intensidade de precipitação é importante para o controle de inundação e da erosão do solo. Assim, a precipitação pluvial tem grande importância na caracterização do clima de uma região e, por sua interferência, nas alternâncias de rendimento das culturas. Seu estudo torna-se relevante, no planejamento de atividades agrícolas, permitindo previsões com melhores aproximações e decisões mais confiáveis. Logo, como qualquer outro fenômeno do âmbito de estudo da Geografia, a erosão do solo é estudada do ponto de vista das interrelações espaciais, de seus fatores condicionantes e, principalmente, dos fatores físicos do solo. O presente estudo busca trazer, para o âmbito da Geografia Física, a discussão sobre a influência dos processos hídrico erosivos, na configuração de uma bacia hidrográfica, apresentando uma breve discussão sobre a erosividade da chuva, na bacia hidrográfica do Rio Longá- Piauí. O resultado servirá de base para implantação de um manejo conservacionista, na área de estudo, bem como contribuirá para o conhecimento da erosividade das chuvas, na Bacia hidrográfica do Rio Longá.
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2. Metodologia de Trabalho
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No decorrer da pesquisa, foi realizado levantamento bibliográfico, a partir da análise de livros, visitas em sites especializados, consulta a artigos científicos, dissertações e teses que adotaram metodologia semelhante. A identificação dos dados dos postos pluviométricos, na área de estudo, baseou-se em dados disponíveis, na SUDENE (1990). Os dados de precipitação, excedente hídrico e erosividade da chuva, foram estimados para os 30 postos pluviométricos localizados nessa área do Estado, com base nos dados pluviométricos indicados em SUDENE (1990), listados na Tabela 1. Os dados de erosividade foram estimados pelo uso da seguinte equação, proposta por Bertoni & Lombardi Neto (1999); EI = 67,355 (r2 /P)0,85 em que: EI é a média mensal do índice de erosão, em MJ.mm/ ha.h.ano, r é a precipitação média mensal, em mm, P é a precipitação média anual, em mm. A confecção dos mapas de precipitação, excedente hídrico e de erosividade hídrica fundamentou-se em técnicas de triangulação. Foram elaborados mapas de isolinhas e isoerodentes, utilizando os software SURF, CARTALINX e IDRISI 3.2.2. 3. Resultados e Discussão Com base no método empregado, constata-se que a variação dos volumes pluviométricos, na Bacia Hidrográfica do Rio Longá, é significativa, variando de 1825 mm, no posto Vitória de Baixo, localizado no município de Batalha, a 842 mm, no Posto Madeira Cortada, no município de Pedro II, com uma média pluviométrica total dos 30 postos de 1800 mm. A Fig.1, elaborada a partir dos dados constantes na Tabela 1, apresenta a espacialização das chuvas, na área mapeada. Observa-se uma elevação gradativa do índice pluviométrico da porção oriental, próximo ao Estado do Ceará, em sentido à porção ocidental do Estado do Piauí, sendo a classe pluviométrica de maior predominância a de 1300 - 1350 mm, abrangendo cerca de 10,95% da Bacia hidrográfica.
Figura 1- Mapa da precipitação total média da Bacia do Rio Longá
Na Fig. 2, é notória a relação espacial entre as áreas que apresentaram maiores valores de precipitação (1750-1800mm), com as áreas que apresentaram maiores valores de excedente hídrico (700-750mm). Destacase que cerca de 15, 26% da área de estudo apresenta valores de excedente hídrico, variando de 450-500mm. Figura 2- Mapa de excedente Hídrico na Bacia do Rio Longá
Fonte: As autoras (2014).
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Na Fig.3, é representada a distribuição da erosividade média anual, considerando o período de 1965 a 1985. Segundo Wischmeier e Smith, (1978) para obter um valor confiável para o fator R, estima-se que sejam necessários de 10 a 20 anos de coleta de dados, lapso de tempo constatado no presente estudo. Observa-se que a erosividade na bacia em análise alcançou valores que variaram de 6200 MJ mm ha-1h-1ano-1 a 10600 MJ mm ha-1h-1ano-1. Constata-se um incremento nos valores de precipitação e de erosividade de leste para oeste, da bacia hidrográfica em estudo. Desta forma, constata-se que a variabilidade da erosividade segue a variação da precipitação, conforme pode ser observado pela comparação das Fig. 1 e 3, o que demonstra a significativa correlação entre a precipitação e o índice de erosividade. Pode-se inferir que os maiores valores de erosividade localizam-se nas áreas onde houve um maior índice de excedente hídrico, comprovado pela correlação das Fig. 2 e 3, evidenciando a influência direta da precipitação e do excedente hídrico, nos valores de erosividade da chuva, na área de estudo. Figura 3- Mapa de erosividade da chuva na Bacia do Rio Longá
Os valores de erosividade obtidos foram divididos em quatro intervalos, correspondendo a quatro classes, sendo estas: i) baixa, ii) moderada, iii) moderadamente alta e iv) alta, como se pode observar na Tabela 2. A partir dos valores 54
obtidos, constatou-se um predomínio das classes de erosividade moderadamente alta e alta, ambas representando cerca de 68% da área total da bacia, demonstrando, de maneira geral, que a área de estudo apresenta potencialmente um alto risco de sofrer erosão, em face dos eventos de precipitação. Tabela 2- Classes de Erosividade da bacia hidrográfica do rio Longá – PI
4.Considerações Finais A partir dos valores constatados, conclui-se que a área de estudo apresentou valores de erosividade que permitem caracterizá-la como de moderadamente alta e alta erosividade, sendo fundamental um controle e um planejamento, com o intuito de evitar aumento de perda do solo, principalmente nas áreas que ocorrem um maior índice pluviométrico. Há necessidade de se estabelecer novos estudos acerca da influência das práticas culturais, do manejo dos solos, das formas de uso e dos diferentes tipos de cobertura vegetal atuais, em função das transformações ocorridas na organização do espaço agrícola piauiense, nos últimos anos, para fins de ordenamento e uso racional dos recursos naturais desta bacia hidrográfica. Ressalta-se a necessidade de estudo da variação do fator R, ao longo do diferentes meses do ano, para a área de estudo, como forma de auxiliar na definição da melhor época para o estabelecimento das práticas de manejo e conservação do solos e ainda na definição de épocas críticas quanto à ocorrência da erosão. Destaca-se a necessidade de estimativa deste parâmetro para o restante do Estado do Piauí.
5.Bibliografia AQUINO, C. M. S. de; OLIVEIRA, J. G. B. de; SALES, M. C. L. Estimativa da erosividade das chuvas ( R ) nas terras secas do Estado do Piauí. Rev. Ciênc. Agron., v.37, n3, p.287291, 2006. BERTONI, J. & F. LOMBARDI NETO. Conservação do Solo. São Paulo: Ícone ed., 1999. SCHIAVETTI, A.; CAMARGO, A. F. M. Conceitos de Bacias Hidrográficas : teorias e aplicações. Ilhéus, BA: Editus, 2002. SUDENE. Dados pluviométricos mensais do Nordeste: Estado do Piauí. Recife, 1990. WISCHMEIER, W.H.; SMITH, D.D. Predicting rainfall erosion losses: a guide to conservation planning. Washington, DC: USDA, 1978. 58 p. (Agriculture Handbook, 537).
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QUADROS
Girassóis e flores do campo
Tulipas
“Eu sempre gostei de arte, mas nunca me via pintando”. É assim que a professora Maria Elisa da Cruz, aposentada pelo Departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Sergipe, descreve o início de tudo. Mas, o tempo mostrou que essa visão era equivocada.------------A pintura entrou na sua vida no ano de 2009, em um momento delicado: durante os cuidados de sua mãe, Regina, cuja enfermidade exigiu atenção especial dos familiares. Foi quando Elisa teve contato com o Curso de Pintura utilizando o Método da Neurolinguística, do Atelier G'Avila, ministrado pela Profª. Glória d'Avila Rodrigues.--------------------“Fui convidada por duas amigas a conhecer o Curso de Neurolinguística, que podia ser útil considerando o momento delicado que estava passando, cuidando da saúde da minha querida mãe”, afirmou Elisa. “A Neurolinguística chegou em minha vida na hora certa, veio completar a minha histórica na busca de autoconhecimento, na visão de totalidade do meu ser”.------O curso vai além do aprendizado de técnicas - as obras de Elisa são uma expressão de seu i n t e r i o r. P i n c e l a d a s d e c o r e s vibrantes que se transformam em flores e paisagens, em uma composição de subjetividade que exprime o encontro com a própria essência, conforme explica a professora.----------------------“A minha grande descoberta ao vivenciar as aulas da Neurolinguística é que, trabalhando o hemisfério direito e o esquerdo, despertei para o gosto de pegar no pincel e nas tintas, e com amor pintar os meus quadros. Quando olho para eles, sinto como se fossem uma extensão de mim”.------------------------
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Cores e
Elisa é formada em Serviço Social pela UFS em 1974, com Curso de Especialização pelo Dptº de Serviço Social UFS (“Modelos de Práticas nos Campos de Serviço Social”, em 1981),Mestre pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Foi pesquisadora na área de Movimentos Sociais Urbanos, com trabalhos publicados e apresentados em Congressos. Em 1988, participou do Programa de Intercâmbio ASA, do Ministério de Cooperação Econômica Alemanha Oriental. Atualmente, continua trabalhando e participando de projetos na área social.--------------------------Prof.ª Maria Elisa da Cruz
subjetividade 63 59
Reprodução do monumento de Aracaju
Ramalhete de flores
Rosas coloridas
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A natureza colorida
Caminho
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Girassรณis
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Repouso
Nudez
Casa de JoĂŁo de Barro
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Tucano
Reprodução do quadro ‘‘O Beijo’’, Gustav Klimt
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Arrozal
LITERATURA
“O texto de prazer é Babel feliz”. A escrita em rede, entre o coletivo e o monológico Profª. Maria Aparecida Silva Ribeiro*
‘‘Então o velho mito bíblico se inverte, a confusão das línguas não é mais uma punição, o sujeito chega à fruição pela coabitação das linguagens, que trabalham lado a lado: o texto de prazer é Babel feliz.’’ R. Barthes. Durante algum tempo, a explosão de interações sociocomunicativas que se convencionou chamar rede social pareceu, aos olhos de quem, de dentro e de fora daquele circuito, tem observado a transmutação de práticas contemporâneas de escrita e de leitura, ser “a Babel feliz” desenhada no discurso alegórico de Barthes. A assertiva, presente no pequeno volume O prazer do texto (São Paulo: Perspectiva, 1993), é uma das pérolas sobre o texto que se lê, que se goza, com que se vive, nesta contemporaneidade que já dura dois pares de décadas. Ao contrário da escrita profissional, a que muitos se vêem obrigados, em suas carreiras (e, aqui, fechamos o foco sobre professores e estudantes - duas categorias que têm na leitura e na escrita procedimentos essenciais ao desempenho de suas funções, nos processos relacionados à construção do conhecimento), a escrita que se produz nas redes sociais parece ser, majoritariamente, do domínio da afetividade, do prazer, do entretenimento. Em meio a docentes de várias áreas e segmentos, é fácil perceber esse contraste quando se atua na organização de coletâneas impressas ou digitais - de textos acadêmicocientíficos. Ou quando se solicita pareceres, relatórios, escritas técnicas diversas que exigem determinado número de linhas, laudas, volume pré-estabelecido de texto escrito. O esforço que é, muitas vezes, “arrancar” essa escrita de profissionais em geral tão eloquentes na modalidade oral da língua. A síndrome da tela branca não chega, portanto, a ser um mal desconhecido entre nós, os que escrevemos por necessidade do ofício. É, contudo, surpreendente perceber que, no ambiente das relações virtuais, a escrita de todos tende a ser profusa, regular, generosa. Os textos que não são produzidos para outros fins (por alegada falta de tempo ou
de concentração), naquele espaço de trocas discursivas intermitentes, alcançam um número de linhas por vezes bem maior do que se costuma esperar de uma frase de status. A polêmica a que muitos não se dedicam em textos autorais, científicos, em comentários autorizados, na incerimoniosa sala de estar dos que partilham uma rede flui caudalosa, plena de argumentos, de evidências, de provas e contra-provas, num copiar e colar de citações, imagens e vídeos. Como se a instantaneidade da recepção nos motivasse a uma argumentação prolixa, viciada em likes. Como se nossa faculdade discursiva se potencializasse na medida em que a leitura de nossos escritos possa ser premiada com a possibilidade de adesão (leia-se compartilhamento) de nossos leitores. Em outras palavras, se você gosta de mim, curta o que eu escrevo. Mas se você me ama de verdade, compartilhe-o. É sempre o dado do afeto, do quanto o que escrevemos afeta o outro. Triste, neste contexto, é alguém cuja escrita não reverbera, não toca o outro, nem provoca sua reação mais esperada, na sequência curtir<comentar<compartilhar. Evidência do crescimento dessa produção discursiva, interessada na construção de uma sociabilidade afetiva e retroalimentada, é o tempo gasto em acumular nos verdadeiros arquivos públicos em que se configuram as páginas pessoais da rede social - com seus álbuns de imagens, com a linha de tempo que organiza cronologicamente suas ações e pensamentos declarados, as listas de contato, lugares onde esteve e outras informações que julga pertinente socializar com seus leitores - informações sobre si mesmo e sobre os grupos a que pertence. Nunca tantos em tão pouco tempo escreveram e leram e curtiram e comentaram e compartilharam tanto sobre tudo o que os cerca, sobre aquilo que lhes interessa ou sobre assuntos - próximos ou distantes - que, de
*Escola de Educação (CCH - UNIRIO) Núcleo de Pós-Graduação em Letras (UFS)
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algum modo, mexem consigo. Do cardápio do almoço à sua opinião sobre pena de morte. Tudo tem a ver consigo e todas as escritas reforçam sua visão intimista de rede social como a de páginas de seu querido diário. E é com a argamassa de toda essa intimidade que se erige a Babel. Um edifício de, aparentemente, infinito número de andares é a rede-torre que se distancia do chão pelo sobreposição de imagens, palavras, ícones. Alastra-se também horizontalmente em número de amigos e amigos de amigos, adicionados como contatos, de modo quase que indiscriminado. O acesso ao espaço virtual de interações amplia-se, proporcional ao número de aparelhos facilitadores, em uso no planeta. Os quais ganharam popularidade na medida em que se constituíram objetos de primeira necessidade. Mais acesso aos meios, mais rapidamente se chega aos fins: a comunicação em rede, se não interessada em verdadeiros diálogos, na profundidade de trocas interpessoais, dá-se pelo simples fato de se estar ali, disponível, conectado, online como se costuma dizer. E, em ali estando, clica-se. Enviam-se imagens. Replicam-se dados. Disseminam-se fatos mediatizados ou factualizam-se dados disseminados - a ordem pouco importa. Não há, com efeito, compromisso com a veracidade do que se espalha em rede. Se se espalhou é porque já é um tipo de realidade; se ocorreu de fato não importa, o efeito já é o fato. O dado registrado, arquivado, partilhado, publicizado já ganhou peso de incidente pela simples circulação naquele meio. A Babel, nem tão feliz como se pode antever, tampouco aglutina as vozes na mesma medida em que as reúne em espaços comuns. Não agrega, nem congrega com a mesma eficiência os a quem junta em tópicos de discussão ou imagens que se dão ao ler coletivo. A aparente conversa é mais uma profusão de monólogos entrecortados pelo botão do enter. Enquanto escrevo meu comentário, alguém do outro lado da torre, circular, redundante, digita outras coisas que evidentemente não levam em conta o que estou formulando naquele momento. Mesmo depois, postadas as ideias, em sequência, um autor não irá, necessariamente, dispor de seu tempo para considerar o que o outro expôs. Ademais, a mensagem que envio pode ter relação apenas com o post que encabeça o conjunto de falas, mas nenhuma menção fazer
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e, por vezes, até contradizer, (ainda que sem levar em conta a contradição como base para uma discussão) o que o outro interlocutor, amigo de quem postou o tópico (mas não amigo meu) expressou em seu comentário. Quando não se comenta apenas para contradizer frontal e licenciosamente o que o outro postou em sua página, provocado pela questão-padrão do sistema: no que você está pensando? E, neste caso, a lógica poderia vir em socorro de nossa reflexão: se, em princípio, respondo à pergunta-padrão, como alguém poderia discordar de que eu esteja pensando naquilo em que afirmo estar pensando? Ou estaria seu comentário discordando do teor do meu pensamento, por pensar o contrário do que penso? E, neste caso, por que, ao invés de comentar meu status, não postou simplesmente em sua página afirmação contrária ao que eu afirmei estar pensando? Ou só pensou naquele tópico porque eu confessei nele estar pensando? (Neste caso, estaria eu pautando o seu pensamento, mesmo que às avessas?) Ou, censor do pensamento alheio, o comentarista - pelo simples fato de, um dia, ter sido aceito em uma rede de contatos - se sentiria à vontade para contradizer aquilo sobre o que alguém confessou estar pensando? E, por fim, a questão que busca desconstruir, de certo modo, a ideia de sociabilidade afetiva da rede social: quando escrevo sobre o que estou pensando, quero também saber o que os outros estão pensando ou, apenas, apareço na janela da torre para gritar aos sete ventos o meu pensamento, sem esperar que, de outras janelas, outros gritos se façam ouvir? Assim, vamos nós, escrevendo e lendo, sem muito tempo para refletir, apressados que estamos em pular para outro tópico. E, muitas vezes, nesse meio de caminho, atropelados e atropelando, vamos tentando escalar a torre, pisando uns por sobre a cabeça dos outros. Citando frases que nos parecem argumentos fortes: tijoladas de cultura. Amparando-nos na erudição da qual outras escaladas nos fizeram supor ser possuidores. A Babel melancólica é aquela em que, confundidas as línguas, não nos propomos a aprender com a polifonia. Berramos mais alto nosso dialeto. Forçamos os tópicos a nosso favor. E tentamos sair ganhando numa discussão cuja vitória é tão improvável quanto encontrar o fim do caminho esférico ao redor da torre.
POESIAS Romance
Partir
Há prédios cheios de pessoas sozinhas e pouco espaço para novos solitários.
Nem sempre se quer viajar.
Autoridades públicas, preocupadas com a questão, discursaram sobre a falta de romances. O governo estuda distribuir entradas pro cinema. Todas as drogas do amor devem ser liberadas e não haverá impostos sobre o envio de flores. Será que Alice gosta de orquídeas ou prefere margaridas?
Às vezes se quer apenas partir. Seguir para onde as pessoas dançam outras danças, embora (quase) se amem da mesma maneira. Fugir para um lugar onde não há guerras para guerrear, não se exigem ondas do mar, nem poetas que saibam rimar. Embarco para esse lugar em dias de um cinza claro em que ando cansado de mim e desejo apenas partir.
Sobre o autor Sérgio Queiroz de Medeiros nasceu em 1981, em Mossoró (RN). Escreveu os livros de poesia Um lugar azul (Ibis Libris) e Poemas para ler na chuva (Multifoco). Foi professor do Departamento de Computação da UFS e atualmente trabalha na UFRN.
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Cordel
O dia que jesus virou professor Por Elyson Carvalho*
Mais uma vez peço licença Para outra história contar Como primeira providença Deixe eu me apresentar Eu sou um moço qualquer Que vivo no mundo a prosear Apois é essa história Que aconteceu de verdade E quem tem lá na memória E num vendeu dignidade Vai ligeiro é se lembrar De Jesus na universidade
A revolta foi tamanha Que de tudo eles já tentaram Negociaram, fizeram manha Mas os homi nem escutaram E já que conversar não serve Uma greve eles prepararam
O senhor tá desacreditado Mais logo vai acreditar Por isso lhe trago um recado Pra que o senhor venha se lembrar Que de Brasil e educação Num tem nada o que comemorar
O prejuízo foi de lascar Os alunos foram para casa Sem nem ter data para voltar Sabendo que a vida atrasa Mas mesmo assim entendendo Que é importante essa causa
Peço assim que preste atenção Que essa história começa Com muita indignação De quem só recebe promessa Foi assim com os professores Pedindo mudanças e depressa
O senhor acredite se quiser Mas Dilma num se importou Tratou foi feito ralé A quem à greve apoiou Dos docentes aos estudantes Ela então ignorou
Era muita hora-aula Sem condição para trabalhar E muito aluno na sala E nenhum tempo para estudar Num vou falar do salário Qué pra mode o sinhô num chorar
Diante de tamanho muído Até o céu tumultuou E Jesus que tava comovido À terra na hora retornou Dizendo: me sacrificarei! Em nome de quem tanto orou! Foi perfeita a solução Que com muita sabedoria E sem receber nenhum tostão Melhor professor num haveria E a festa foi tão grande Que a greve parou nesse dia
*Prof. do Departamento de Engenharia Elétrica da UFS.
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Jesus só fez uma condição “Não quero trato diferente” Vou mostrar que com o coração Eu faço trabalho de gente E assim farei desse país Um lugar bem muito contente Quando viu carga horária Me disseram que ele tremeu Mas num fez ação contrária E à pressão logo cedeu “Vá logo é milagre fazendo!” Foi recado que recebeu Todos professores orgulhosos Resolveram foi lhe imitar Se fizeram de teimosos Mas sabiam onde ia dar Foi tão grande a produção Que a CAPES botou pra lascar É que para virar bolsista Nem Jesus dava mais conta Só pesquisador que é artista Que é desses que tanto apronta Conseguia financiamento Com nome de pesquisa de ponta Jesus desistiu da pesquisa E compensou na extensão Fez milagre para quem precisa E passou é por charlatão Pois nem uma sala lhe deram Porque milagre num é inclusão O jeito foi só ensinar Mas sabendo que a progressão Já não ia mais nem rolar Com a grande a obsessão Dos homi lá da reitoria Em empacar a sua acessão
Jesus começou a dar aula Repondo sem nem ter faltado Nem pôde desfazer sua mala E já trabalhava é dobrado Mas feliz ia mesmo sorrindo Vendo os aluno esforçado Mas ele chegou atrasado Primeira vez que ocorreu Socorrera um desmaiado Um professor que adoeceu É que era tanta disciplina Que o professor quase morreu O que Jesus agora sabia É que sozinho já não dava Um professor que adoecia E o aluno é que pagava Deixando assim de aprender Pois ninguém lhe ensinava Foi quando ele percebeu Que ajudou do modo errado Foi o aluno que sofreu Mas o professor que foi lesado E assim começou a pensar Se de fato tinha ajudado Foi tomando um cafezinho Que Jesus teve que desabafar E aquele que tava vizinho Não deixou de escutar Que falaria com o Reitor Porque ele tinha que ajudar O reitor nem lhe recebeu Dizendo: Jesus nem adianta O culpado não fui eu É o ministro que aqui manda E Jesus correu pra Brasília Pra apresentar sua demanda
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Ao ministro chamou na porta Mas ele não foi encontrado E só divulgou uma nota Dizendo para o coitado Que a crise era a culpada E a queixa tinha anotado Foi assim por Dilma gritar Que apareceu lá do além Dizendo: vai logo trabalhar O professor ganha muito bem Porque a minha prioridade É focar no mandato que vem Muito triste ele ficou No jornal foi criticado Ingrato ele logo virou Por defender quem é abastado Mas foi pra universidade Pra continuar seu legado Procurou seu sindicato Disse: assim num tem como ficar Pois não pode ser pecado Pela educação ir lutar E só isso adiantaria: A categoria toda parar Foi assim que tudo parou Renovando essa esperança Em cada greve que deflagrou Aumentando a confiança Jesus veio foi ensinar Como lidar com a governança Assim a história se deu E de novo vem acontecendo Quantos Jesus você conheceu? Pela educação vivendo Pois um amanhã mais justo Na luta é que se vai fazendo
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Resenha do livro “Paisagens da Pesquisa Contemporânea sobre o livro didático de História”. Janaina Cardoso de Mello*
O livro didático de História constitui-se em um objeto deveras multifacetado, controverso e disputado. São vários os territórios de sua circulação, desde sua concepção, editoração, avaliação, escolha dos professores e/ou escolas e uso em sala de aula, sendo um dos elementos fundamentais das políticas públicas educacionais, nas últimas décadas, com a instituição do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). É ainda locus de construção e ressignificação de memórias, representações sociais e visões de mundo. Dessa premissa, partem discussões significativas para o trabalho docente, observadas na coletânea “Paisagens da Pesquisa Contemporânea sobre o livro didático de História”, organizada pelos professores Maria Carolina Bovério Galzerani, João Batista Bueno e Arnaldo Pinto Júnior, docentes de cursos de graduação e pós-graduação em História e Educação, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e Universidade Federal do Espírito Santos (UFES) respectivamente. Dividido em três partes, a primeira dedica-se ao “Lugar da Pesquisa Hoje: o estado da arte, memórias e histórias”, enquanto a segunda segue “Contemplando práticas de leitura e usos dos livros didáticos” e a terceira apresenta “Outros cenários de pesquisa”, debruçando-se sobre as “Linguagens iconográficas”, os “Conteúdos temáticos” e “A questão da avaliação dos livros”. A obra inicia-se com algumas questões-problemas essenciais, elaboradas por Maria Carolina Bovério Galzerani, na introdução, para se entender a proposta do livro: “Que paisagens historiográficas e educacionais estão presentes nas pesquisas contemporâneas relativas aos livros didáticos, hoje, sobretudo, no Brasil? Como compreender tais saberes na relação com os poderes e práticas culturais, existentes no país, sobretudo, a partir dos anos 1980 aos nossos dias? Que práticas de leitura e usos
têm sido implementados no que respeita ao livro didático? Até que ponto os sujeitos leitores são concebidos como portadores de memórias, de saberes da experiência, produtores de saberes escolares?” (p.9). Ao tratar do “Livro Didático e História do Ensino de História: Caminhos de Pesquisa”, a professora Arlette Medeiros Gasparello ressalta o papel do livro didático enquanto um “currículo visível” e um objeto cultural constituído por vários setores e grupos sociais, tendo as pesquisas na área versado pelo estudo da materialidade deste objeto como mercadoria ou como fonte documental (p.19). Para a autora: “A produção mais recente de pesquisadores nacionais e do exterior no campo das ciências humanas tem contribuído para modificar uma visão da escola com esse caráter de imutabilidade e possibilitou a configuração de uma história da educação escolar, em linhas de pesquisa que associam a história do currículo e a história das disciplinas escolares” (p.20). Já Flávia Eloisa Caimi aborda, em seu artigo “O que sabemos (e o que não sabemos) sobre o livro didático de História: estado do conhecimento, tendências e perspectivas”, a partir de um inventário quantitativo e
*Janaina Cardoso de Mello é Pós-Doutoranda em Estudos Culturais (PACC-UFRJ) e professora de História do Brasil, Teorias e Metodologias de História, do Departamento de Museologia da UFS.
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qualitativo da pesquisa acadêmica nacional sobre o livro didático de História, realizada nos programas de mestrado e doutorado, entre 1998 e 2007, configuradas em dissertações e teses disponíveis no Portal de Acesso Livre da Capes, em Banco de Teses (p.36). Os “Livros Didáticos: cenários de pesquisa e práticas de ensino no Brasil” são estudados por Maria Carolina Bovério Galzeroni, ressaltando seu papel como mercadoria vinculada ao setor da indústria cultural, bem como o papel do Estado enquanto consumidor e controlador desta produção (p.53). Ao longo de seu artigo, historiciza sua própria prática inicial como professora de História, de uma escola pública na periferia de Campinas (SP), nos últimos anos da década de 1970, “os anos de chumbo”, perpassando pela mudança do cenário político brasileiro, entre 1980 e 1990 quando já havia abertura para se discutir a Educação, propondo reformulações das visões do aluno, do professor e das práticas de ensino de História (p.54-61). Maria Angela Borges Salvadori, em “Memórias discentes, livros didáticos e culturas escolares”, apresenta um artigo, formulado de maneira colaborativa, com um grupo de alunos de diferentes cursos de licenciatura, da Universidade de São Paulo (USP), convidados a escreverem suas memórias sobre os livros escolares em geral (p.79). Salienta a pesquisadora: “Hoje, apesar de uma (re)descoberta do livro em geral e do livro didático como objetos de pesquisa e produção de conhecimento, ainda são poucos os trabalhos que se dedicam a pensar esta história a partir da perspectiva dos alunos, em geral os sujeitos da educação menos perscrutados, seja por sua condição de aprendizes, seja pelo descarte constante de suas produções, secundarizadas diante daquelas que se originam das práticas docentes e dos órgãos públicos de regulação do ensino” (p.79). O artigo intitulado “A apropriação docente dos livros didáticos de História: entre prescrições curriculares, saberes e práticas docentes”, escrito a duas mãos por Aléxia Pádua Franco e Ernesta Zamboni, busca responder ao alcance e à eficácia dos investimentos realizados no PNLD, instituído nos anos de 1980, pelo Ministério de 74
Educação, junto às escolas públicas de educação básica. Analisa, portanto, a “apropriação, por professores das séries iniciais do ensino fundamental de escolas públicas de Minas Gerais, de livros didáticos de História recomendados pelo PNLD 2004, em aulas ministradas para turmas de 3ª série” (p.99). Em “Os usos do livro didático de História: entre táticas e prescrições”, Araci Rodrigues Coelho questiona qual História tem sido ensinada para as crianças, nas escolas brasileiras, destacando as várias reformulações das propostas para o ensino de História do Brasil, o retorno dessa disciplina ao currículo do primeiro segmento do ensino fundamental e a interferência governamental, nesse campo (p.127). Helenice Campi, no artigo “Uma experiência de pesquisa: uso do livro didático e práticas de leituras no ensino de História na rede pública municipal da cidade de São Paulo”, parte de uma integração reflexiva com o Museu da Pessoa, tendo como foco a pesquisa das práticas dos professores de Pirituba, Butantã, Vila Nova Cachoeirinha, e Casa Verde e Ipiranga (p.155-176). “O Livro Didático de História lido em sala de aula: uma prática de leitura dentre outras possíveis”, de Lana Mara de Castro Siman e Luísa Teixeira Andrade, busca responder o que tem sido a leitura da escrita escolar da história mediada pelo professor em sala de aula. A partir de entrevistas com professores e de um questionário sociocultural aplicado aos alunos, registraram-se dados sobre a prática de leitura do livro didático “História Global: Brasil e Geral”, de Gilberto Cotrim (p.190-192). A análise dos “Livros Didáticos de História para o Ensino Médio e as orientações oficiais: processos de recontextualização e didatização”, por Ana Maria Monteiro, traz a premissa do hibridismo, nessas obras, e parte do estudo de caso do livro “Nova História Crítica”, de Mario Schmidt (p.214-222). Anderson Araújo-Oliveira, no artigo “Relações entre material didático e ensino de Ciências Humanas e Sociais no primário: um olhar sobre as práticas docentes de futuros professores”, apresenta seu olhar sobre o material didático utilizado, a modalidade de utilização do material didático, as razões que justificam a escolha do material, o nível de satisfação perante à utilização do material, as dificuldades na utilização do material (p.233234), apontando ainda a negligência dos saberes a serem constituídos (p.238).
“Imagens em Livros Didáticos de História: elementos para uma análise das relações imagem/texto/historiografia”, de Ana Heloísa Molina, realiza sua pesquisa sobre os livros “História do Brasil”, de Olavo Leonel Ferreira, “História”, de José Roberto Martins Ferreira, e “História em Projeto”, das autoras Maria da Conceição Carneiro de Oliveira, Carla Miucci Ferraresi e Andréa Paula dos Santos (p.249-262). João Batista Gonçalves Bueno e Maria Carolina Bovério Galzerani, em “Propostas de leitura das imagens visuais em livros didáticos de História: uma incursão possível”, estudam as propostas de uso de representações iconográficas como documentos históricos, nos livros anteriores e posteriores aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (p.270-282). Abordando “Os povos originários na literatura escolar: possibilidades de um discurso intercultural”, as professoras Maria Aparecida Bergamaschi e Ernesta Zamboni refletem sobre as imagens indígenas, nos livros didáticos, por onde transitam as “figuras lendárias”, os “costumes curiosos”, o “índio genérico”, o “bom selvagem”, dentre outras representações sociais, com intencionalidade pedagógica, questionando “como constituir espaços para refletir sobre a pluralidade étinico-cultural na escola e nos currículos de História?” (p.289). Elison Antonio Paim, em “Educar para a memória e o patrimônio: possibilidades expressas no livro didático Santa Catarina – interagindo com a história”, ao percorrer a concepção de memória e narrativa de Walter Benjamin (1994), aborda o livro didático “Santa Catarina: interagindo com a História”, das autoras Lilian Sourient, Roseni Rudek e Rosiane de Camargo. Afirma Paim que “[...] memórias e experiências vividas não podem ser jogadas fora, como até então vem acontecendo, em grande parte dos cursos de formação de historiadores, professores, na produção de conhecimentos históricoeducacionais e, mais diretamente, no ensino de História”(p.309). “A construção de uma sociedade de direitos: história, livro didático e cinema”, de Décio Gatti Júnior, parte da identificação de um problema: o grande desconhecimento sobre acontecimentos históricos básicos relacionados aos direitos humanos, bem como à liberdade religiosa e à própria ideia de “sociedade de direitos”, entre professores e acadêmicos, interferindo na compreensão
maior do significado e vivência da cidadania e da própria profissão docente, em consonância com a Constituição Federal, de 1988, e legislação educacional posterior (p.327-328). Por isso, enfatiza, além do livro didático, o papel dos filmes norte-americanos sobre os direitos humanos como objeto cultural (p.345354). Margarida Maria Dias de Oliveira, no artigo “O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e a construção do saber histórico escolar”, trata dos editais do PNLD, além de mapear possibilidades de análises e pesquisas. Ressalta que “Há também, claramente, em todas as áreas, e não só em História, um deslocamento das definições de currículos ou conteúdos para processos de conhecimento. Essa tendência é importante, visto que valoriza as iniciativas diferenciadas de propostas educacionais” (p.370). Por fim, no último artigo, “Livros na batalha de ideias: a sedução da verdade no debate público em torno dos livros didáticos de história”, de Sonia Regina Miranda e Yara Cristina Alvim, aborda a relação da imprensa nacional com o livro didático (p.378-385), bem como o processo de construção do conhecimento, a partir dos livros didáticos, no que tange aos temas da objetividade, subjetividade e relativismo. Ao longo de suas mais de 400 páginas, a obra escrita a muitas mãos cumpre o que propõe, na composição das múltiplas paisagens da pesquisa contemporânea pelas quais passeiam os docentes da disciplina de História, bem como os estudantes das licenciaturas, ao constituírem arcabouços e formular práticas escolares, imbuídas de subjetividades e ideologias, mas também preocupações críticas-reflexivas e dialéticas. É certamente um livro primordial para a biblioteca de todos os docentes que pensam e avaliam seu cotidiano, no processo de ensinoaprendizagem dos conteúdos de História. Referência GALZERANI, Maria Carolina Bovério; BUENO, João Batista; PINTO JÚNIOR, Arnaldo (Orgs.) Paisagens da Pesquisa Contemporânea sobre o Livro Didático de História. Jundiaí: Paco Editorial; Campinas: Centro de Memória/Unicamp, 2013. 408p.
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PERFIL
Perfil do artista:
Antônio da Cruz A capa e os elementos gráficos presentes nesta edição da Revista Candeeiro foram baseados na obra desse grande artista, Antônio da Cruz. Escultor, pintor, ilustrador, cartunista, produtor, cenógrafo, Antônio da Cruz é um artista com múltiplas habilidades. A vocação artística surgiu em sua vida desde cedo: quando era criança, já demonstrava interesse pelas artes e pelos grandes mestres da pintura. Nessa idade, ele já pintava e desenhava. Colecionava gibis e era deles que saia a inspiração para a prática do desenho. “Uma das minhas irmãs viu que eu desenhava muito e acabou comprando pra mim um caderno de desenho e uma cartela de aquarela bem primária. Eu fiquei fascinado quando comecei a pintar”, relatou Antônio. Depois dessas primeiras experiências com desenho, ele passou a trabalhar com tinta guache, e por último, óleo sobre tela. Em 1989, Antônio começou a experimentar outros tipos de materiais, como escultura em pedra e em madeira, mas posteriormente descobriu que o aço poderia oferecer possibilidades infinitas de artes, algo que os outros materiais não proporcionavam, além de ser mais acessível. “Eu costumo dizer que, até hoje, quando vou ao ferro velho, eu me sinto como uma criança em um parque infantil. Eu me divirto, queria poder trazer tudo para o ateliê! Mas, infelizmente, não tem espaço, além do custo, que é alto. Mas o aço foi definitivamente o material com que eu me identifiquei, em função dessas possibilidades que ele oferece, que são muitas”. A oficina de Antônio não contava com ferramentas sofisticadas e prensas poderosas, então ele passou a desenvolver métodos e recursos para trabalhar peças grandes, como a Estátua do Gari, peça de 5 metros instalada no Distrito Industrial de Aracaju (DIA), obra em aço inoxidável que simboliza os garis e margaridas de Aracaju. Construídas com cabos, barras curvas ou fios de aço, suas esculturas são lúdicas e multifacetadas, possuem beleza única e
suscitam o inusitado. Geralmente são suspensas e estimulam interatividade com o observador, inclusive convidando-os a tocar nelas. “Uma de minhas obras é uma figura metafórica, uma simbiose entre mulher e borboleta, e ela foi feita de tal forma que balança no vento. Muitas das obras que eu faço balançam, então não fica aquela obra estátua, não tem rigidez”, explicou. A primeira exposição coletiva aconteceu na Galeria de Arte Álvaro Santos (GAAS), em 1974, da qual se tornou diretor anos mais tarde, entre 2011 e 2005. Ao longo de sua trajetória, participou de várias exposições e festivais de arte, como os de São Cristóvão, Laranjeiras e Propriá. Na Bahia, participou de uma coletiva de intercâmbio e da segunda edição do Afro-Americano; já em Brasília, fez parte de exposição em parceria com Hortência Barreto. O artista plástico estudou em escolas públicas: foi aluno do SENAI e de lá, depois, professor. Na antiga Escola Técnica de Sergipe, formou-se em Eletrotécnica; mas, paralelamente à vida profissional, sempre esteve ligado às artes visuais, seja desenhando, pintando e/ou esculpindo. Também foi coordenador de difusão e intercâmbio cultural da Fundação Municipal de Cultura, Turismo e Esportes (Funcaju) e é membro do Fórum Permanente de Artes Visuais de Sergipe, do qual foi um dos criadores e coordenador. 77
Seu histórico de militância inclui forte participação dentro do movimento cultural sergipano. Atuou como presidente e diretor da Associação Sergipana dos Artistas Plásticos e de Artes Visuais (ASAP), entre 1996 e 2001, e participou também do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversão (SATED). É possível encontrar as artes de Antônio da Cruz no Museu da Gente Sergipana, no Museu-Palácio Olímpio Campos, na Sociedade Semear, no Hospital Nestor Piva, no Sindicato dos Petroleiros, na Unit, na GAAS, na Pinacoteca da UFS, no SESC, na Procuradoria Geral do Estado, no Yázigi, no Museu da Câmara Federal e no Museu de Vitória da Conquista.
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Sindicalize-se Por que se sindicalizar? Pensar conjuntamente e interferir ar culadamente nas questões que dizem respeito à educação pública e à defesa dos direitos dos professores é um dos fundamentos do ANDES-SN. E essa é, também, uma das maiores vantagens de se sindicalizar, pois agir em grupo é sempre muito mais eficaz e producente que agir individualmente. Mas, apesar de estarmos unidos pelas mesmas ideias, as individualidades devem ser respeitadas. É o respeito às individualidades que faz um cole vo forte. Por isso, a democracia e a liberdade de pensamento e expressão são a base do ANDES-SN, que rompeu com a estrutura sindical autoritária implantada no Brasil na década de 30 e se consolidou pela organização de base nos locais de trabalho Esses são os principais direitos dos nossos sindicalizados: • Votar e ser votado para os cargos de representação. • Apresentar propostas, sugestões ou representações. • Par cipar diretamente das deliberações. • Par cipar de Grupos de Trabalho. • Recorrer das decisões da Diretoria. • Permanecer sindicalizado do ANDESS N em caso de revogação da homologação da Seção Sindical ao qual estava vinculado.
Mais de 30 anos de força conjunta Há mais de três décadas, professores de todo Brasil que vinham se o rga n i za n d o e m A s s o c i a ç õ e s d e Docentes (tanto em ins tuições públicas como par culares) fundaram a ANDES – Associação Nacional dos Docentes das Ins tuições de Ensino Superior. Em 1988, logo após a promulgação da nova Cons tuição, a ANDES tornou-se o ANDES – SINDICATO NACIONAL, por decisão do II Congresso Extraordinário do Rio de Janeiro. Com a criação do S i n d i cato N a c i o n a l , o s d o c e nte s passaram a se filiar a uma única en dade. Ficou estabelecido que a Seção Sindical é indissociável do A N D ES-S N, cons tuindo-se na sua menor instância o rga n i za va e d e l i b e ra va , co m regimento próprio aprovado pela assembleia geral e com autonomia polí ca, administra va, patrimonial e financeira dentro dos limites do Estatuto. O ANDES-SN é mais forte com a participação de todos! O Sindicato mantém-se aberto ao diálogo com todos os setores do campo classista, buscando a unidade na luta pela transformação social e para alcançar um novo patamar de sociedade. Esta luta não tem limites geográficos e por isso irmana aqueles que compar lham desta mesma natureza de propósitos, e aprofunda a solidariedade com outros trabalhadores de diversos povos e culturas do mundo. Queremos melhores condições
de trabalho para os docentes, sem precarização, sem abusos e cerceamento de direitos, sem prejuízos para a saúde. Queremos salários dignos na lógica do crescimento e desenvolvimento pessoal e profissional, por meio de uma carreira parte de uma polí ca integradora. Criação da ADUFS A Associação dos Docentes da Universidade Federal de Sergipe (ADUFSSSIND) foi criada em 10 de novembro de 1979. Lutando pelos interesses dos docentes da UFS ao longo de mais de 30 anos de existência, a ADUFS consolidouse como uma en dade autên ca de harmonia entre seus associados. Mesmo após tantas mudanças, seja na carreira docente ou na própria vida acadêmica, a en dade con nua desempenhando seu papel, mas necessita da atenção e ajuda de todos os seus membros, sejam os an gos ou os novos, para a melhoria e manutenção da Universidade Pública, Gratuita e de Qualidade. O maior compromisso da ADUFS é lutar pela qualidade da educação pública e pela valorização do trabalho docentes. A ADUFS oferece aos professores associados vários serviços, entre eles o convênio de saúde com a Unimed e assessoria jurídica para defender os direitos dos docentes. Há ainda os Grupos de Trabalho, abertos a todos os docentes, que cumprem importante papel na formulação das polí cas da ADUFS.
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Filie-se! Para fazer parte da ADUFS, basta comparecer à sede da associação com seu contracheque. Nosso endereço é o: Cidade Universitária Prof. José Aloísio de Campos, Casa do Professor, bairro Rosa Elze - São Cristóvão/SE CEP: 49.100000
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Contato (79) 3259-2021 / (79) 3259-2541 E-mail: adufssergipe@gmail.com / site: www.adufs.org.br h ps://www.facebook.com/Adufs-se-Seção-SindicalAndes-969360586464713