Viagem pelos mares da utópica educação
Quando terminamos um curso ligado à educação, sonhamos com a utopia de mudar o mundo, sentimo-nos donos de verdades, repletos de ideias, ouvimos sons de mares longínquos que batem nas rochas, com a força suficiente para transformar escolas, sentimos brisas suaves, como os carinhos com que pensamos vir a ter com alunos, existe no nosso coração uma mescla de sentimentos, que num ápice, vimos transformarem-se num imenso nevoeiro ou numa qualquer noite bem escura. Afinal, esse sonho é utópico? Ou será o ensino a utopia? Torna-se confuso, mais ainda quando temos credenciais para exercer uma profissão e acima de tudo a vontade e o querer de ser professor, qual a não mais nobre profissão, do que a de ensinar e tão depressa ser ensinado. Contudo, gela-nos o coração, retiram-nos a alma, tornamos a escurecer naquela mesma noite, na qual podemos apenas sonhar, pois não nos deixam ser sol, preferem manter no ensino estrelas que já não brilham e apenas ocupam espaço, por serem demasiado teimosos em querer continuar a brilhar. Estarei a ser demasiado ambicioso por querer ser sol? Talvez, mas a ambição é um primeiro passo para a concretização de um sonho, é a ambição que nos leva a navegar pelos mares da utopia. Desta forma, parece-me que qualquer professor que se tenha entregue de corpo e alma a uma profissão como esta, tem sempre no seu horizonte (pena que alguns muito longínquo), os alunos, pois são a razão da minha e de qualquer existência dum docente. Assim sendo, parti em busca, por um caminho sinuoso, frio e arrepiante, de uma casa, a que chamamos escola, onde pudesse, porventura ficar e começar a trabalhar, onde pudesse plantar ideias e fazer brilhar estrelas. Este terá sido um percurso doloroso e só, pois cada casa tinha portas bem trancadas, nas quais olhavam apenas para ver o rosto de quem batia, e como nem sempre corresponde aos requisitos pretendidos, não abrem a porta, já que a preferem abrir a alguém que conheçam, nunca a estranhos, que nada ainda provaram. Porém, a busca continua, mas chega aquele momento, em que mudamos de rumo, o navio que nos levava para além das nuvens, percorrendo um enorme arco íris a caminho dos nossos sonhos, deixa de navegar, decidimos atirarmonos ao mar e a nado encontrar um porto que nos abrigue, da enorme tempestade, a que chamamos mercado de trabalho.
É chegado o tempo, de na vida dum jovem professor, fazer outras coisas, que não aquelas para as quais sonhou, para as quais trabalhou ou estudou. A esperança de voltar aquele navio reviveu-se, já que tudo é cíclico, estava no momento de não desistir e voltar novamente para o navio, que me transportaria à fábrica dos sonhos. Enquanto navegava, encontrei uma garrafa com uma mensagem dentro, era certamente a altura em que voltamos a ter esperança, porque nessa mensagem estava uma possibilidade iniciar um trabalho projecto com o meu horizonte, os alunos, chamávamos-lhe de Internet@eb1s. Chegado a bom porto finalmente, conheci de imediato pessoas que tinham na ideia o mesmo percurso que o meu, chegar à utopia ou percorrer um mesmo sonho, um ensino de qualidade, de progresso e adaptação às necessidades que a vida de hoje nos exige. A ambição comandou-me, investi no que estava a fazer e procurei acima de tudo dignificar o projecto e dentro do que eu sabia plantar, fazer brilhar uma ou outra estrelinha. Conheci escolas, as quais abriram portas, deixaram-me entrar e já não queriam que saísse, essa experiência motivava-me mais e deixava-me certo, que era este o meu caminho para chegar ao lado de lá do arco íris, ao sonho. Coloquei-me a trabalhar com tantas crianças, tantos alunos, exerci a minha profissão, embora que não na totalidade, mas aliei o conhecimento científico às pedagogias, que naquela casa, a que chamam de Escola Superior de Educação de Coimbra, outros que procuram sonhos, me ensinaram. Comigo nasceu um amigo, seu nome Teclas, acompanhou-me escola a escola, nunca me deixou sozinho e passou a ser a minha voz junto dos alunos, passou a traduzir o que ensinava, era a forma de mostrar que temos no computador um amigo, que nos faz falta hoje em dia, e como qualquer amigo especial, tem de ser bem tratado e temos de o saber compreender e tratar. Deste modo, criei laços de amizade com alunos, professores (alguns já estrelas apagadas), terras, que me mudaram e me deixaram crescer, neste meio que é a educação. Daqui retirei experiências, aprendizagens, conhecimentos, amigos e saudades. Talvez, porque só nos abrem as portas de vez em quando, e se não entrarmos naquele momento, poderão fechar-se novamente por tempo indeterminado, uma porta se abriu e como que obrigatoriamente tive que nela entrar, mas ao ver ao longe os alunos, as escolas, os colegas de trabalho, o meu amigo Teclas, senti saudade, pena, por não poder concluir um sonho, o qual tinha sonhado naquelas noites escuras onde dormi.
Estava, por outro lado, concretizado outro sonho, o desejo de voltar a ensinar, com alunos que esperavam de mim, que os pudesse por a brilhar, que neles pudesse plantar estrelas. Assim, sendo iniciei funções de professor titular de turma, na escola de Pereira – Miranda do Corvo. Até ao momento, o último local de desembarque do meu navio, que ainda à pouco partiu rumo à utópica educação. Desta forma, era eu que tinha agora o poder de abrir portas, eu poderia contribuir, nem que seja apenas naquele espaço, nessa escola, para o crescimento de estrelas futuras, ou para a recepção de gente desconhecida que iria bater naquela porta. Na turma, pude além de progredir normalmente nos conteúdos programáticos exigidos, tive a liberdade de associá-los à informática, já que o crescimento e conhecimento de hoje passa por aí. A nova exclusão social / profissional, seja, quem não compreende os nossos amigos computadores tem de ser combatida, mas o próprio ensino deverá adaptar-se às novas tecnologias, colocando-as ao dispor da educação, os alunos sentemse motivados e o Teclas acabava de ganhar novos amigos, nova vida e manter-se ligado ao seu berço, o Internet@eb1s. Consegui manter o projecto, com a diferença de estar apenas com quinze crianças todos os dias, mas, hoje, com o orgulho de um professor que os viu crescer e os vê brilhar. Em relação ao projecto Internet@eb1s, foi uma experiência de onde apenas posso retirar pontos positivos, pelas realidades encontradas, pelas lutas travadas, mas com a mágoa de não ter podido levar a missão até ao fim, de não ter cumprido com os seus e meus objectivos, mas com a sensação de ter tudo feito, para prestigiar o Internet@eb1s e o ensino. Em suma, espero que no final deste ano, não volte para as noites escuras em que me perdi, mas a nostalgia dum projecto Internte@eb1s ou de uma escola de Pereira, farão de mim, certamente alguém que lutará, mesmo que sozinho, por um sonho utópico, em que realmente o ensino se situa, mas que se assim não for, atingiremos o horizonte e depois? Acaba? É preferível continuar à procura e nunca encontrar, isso fará de nós uns eternos navegadores, para quem a escola será sempre um lugar onde, a cada dia, nasce uma estrela.
Marco Alexandre Carvalho Bento, professor do 1.º ciclo do ensino básico