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meu museu é o mundo . elidayana alexandrino

meu museu é o mundo

ELIDAYANA ALEXANDRINO

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A ideia de que cada um de nós tem um “museu imaginário” torna se fundamento para o processo criativo de Elidayana Alexandrino (Paraíba, 1986), artista visual, educadora e curadora independente. Suas proposições alertam sobre a predominância da imagem como construção histórica e, ao mesmo tempo, instigam à leitura dessas, sem enunciações, pressupostos ou hierarquias. “Ouvir as memórias que contam as imagens” é conceito-chave e interpretá-las a partir de percepções pessoais é atributo da relação obra-público.

À primeira vista d´olhos, as escolhas de Alexandrino parecem indistintas. Ledo engano! As imagens que lhe atravessam como mulher, jovem, negra – e aqui, o adjetivo “educadora” é de forte peso – interpelam o eixo hegemônico do “mundo da arte”. Sua seleção de imagens tenciona as estruturas excludentes porque desperta referências e questionamentos. E essas provocações presentes na série Narrativas que se encontram (2015), por exemplo, tendem à descolonização do olhar. Isto porque as obras trazem a fusão entre épocas, povos e realidades diferentes, mas, com o olhar aguçado, guardam relações profundas e perturbadoras.

A série tem mais de 600 imagens e nasceu quando a artista trabalhava na Pinacoteca do Estado de São Paulo – um dos mais reconhecidos museus brasileiros. No acesso diário ao acervo, a associação dessas imagens museais com outras presentes em livros e redes sociais tornou-se repertório visual diverso. Porém, ao empregar a junção fotográfica e, incluir autorretratos e retratos de familiares, a artista voltou à sua própria história. Um álbum de família tão incomum às populações afro-brasileiras. Nessa junção, ela expôs o roubo das memórias ocasionado pela diáspora negra no Brasil. Justamente, a memória – tema tão caro à contemporaneidade. Assim, o rosto da artista busca por ancestralidade na escultura egípcia ou em retratos étnicos – como ela mesmo diz, parentes distantes. Alexandrino denuncia a incompletude e exige reparação histórica.

Nesse ponto, merece destaque a série Espelhamentos (2020), que dentro de Narrativas que se encontram, envolve questões sobre a memória e a identidade, sendo o espelho aquele que especula (especulum, espelho), os autorretratos feitos a partir do uso do celular mesclam-se às formas orgânicas e transformam-se em fractais. Flores, galhos e folhas integram-se ao rosto da artista – simbiose entre mulher e natureza. E essas colagens digitais e GIFs compõem padrões assemelhados às estamparias de tecidos africanos (de novo, a ancestralidade ecoa).

Desse modo, ao lidar com as imagens do mundo, Alexandrino através do fragmento e da citação evoca a memória, a identidade e as novas narrativas – nesse exercício ela liberta o “passado aprisionado” na fotografia porque dá às imagens autonomia, a desvincula do seu criador e do seu contexto histórico social; ao espectador dá a possibilidade de outras interpretações àquela imagem. No fundo, ela é uma colecionadora de imagens e, simultaneamente, propositora de curadorias coletivas.

Nesse sentido, a artista compartilha suas obras por intermédio das plataformas digitais. Para ela, as redes sociais são como museus, galerias e arquivos vivos. Elas facilitam a mediação, o compartilhamento e o feedback entre o público e a artista. Daí sua produção fotográfica ou nato digital nos dizer tanto sobre o cotidiano, natureza, corpo, identidade e memória.

◀ CAMINHOS (AUTORRETRATO) . Elidayana Alexandrino collage digitale, 2021 Alecsandra Matias de Oliveira Historiadora e Crítica de Arte

HAIR CLOAK (DETAIL) . Jennifer B. Thoreson fotografia . performance, 2010-2017

– 51 – IV PORTRAITS

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