Ao ritmosom de Shot in The Back of the Head Moby
Vinte e duas vezes a Terra percorreu o vazio ao redor do Sol. Oitenta e oito estações cresceram e morreram nos campos. Mil e cinquenta e seis fases da lua dançaram marés. Pouco tempo, diante de tudo que ainda está para nascer. Mas neste espaço, Jaya percorreu sua história, marcando sua vida pelo mundo. Silenciosamente, ela pensa. Intensamente, eu sinto. Tempo e espaço. Relação com o espaço, com o que nos cerca. Cursar a graduação em Arquitetura e Urbanismo não foi uma decisão qualquer. No momento desta escolha, ela se deparou com a longa trilha de seu futuro. Como fazer sua vida uma parte da transformação deste mundo. Em que mundo ela vive? Pensar e sentir a cidade, o território, como essa distribuição de terras, concretos, asfaltos e ruas, prédios e árvores, pessoas e vidas afeta a realidade de cada uma? Durante sua adolescência e primeiros anos da graduação quatro horas de seus dias eram absorvidos pelo passar e transpassar o espaço, pendulando de São Gonçalo do Amarente, onde vivem seus pais, até a zona sul de Natal, em direção do instituto e da universidade federal do rio grande do norte. Esse tempo perdido, ou comido pela urbes, reduzia sua vida à educação formal, pois não lhe sobravam horas no dia. Em que medida a concentração de oportunidades na cidade prejudica ou amplia a vida de cada uma? É uma pergunta que ela se faz, ou que se impõe a ela sempre que olha ao redor. Essa longa distância a levou tantas vezes a dormir na casa de colegas mais “bem localizadas”, para fazer trabalhos, entre outras necessidades. Até ser “adotada” por uma companheira de vida e de curso, Bartira, que a acolheu em sua casa e com quem viveu durante meio calendário. Este novo lar-lugar, abriu novos horizontes em sua vida. Do acesso facilitado à cidade, que lhe proporcionava tempo para viver, às experiências imateriais, como o Santo Daime, apresentado pela amiga, yoga, meditação e piano, foram seis meses significativos em sua caminhada. Até partir suas fronteiras. Um ano e meio na Filadélfia em programa de intercâmbio público federal redimensionou uma vez mais seu espaço-tempo. Conectando-a mais intensamente consigo mesma. O criar, o artear, sempre acompanhou sua vida, do violão viciado na adolescência ao curta de animação rudimentar produzido no peinte e no muuvimeiquer, à experiências com vídeo motivados pela graduação. Mas ali ela pôde respirar arte como nunca antes. Convivendo com artistas tão surpreendentes por suas histórias de vida, originalidades, transcendências, experimentações, inspirações. Mulher de ideias brotantes pelos cabelos longos castanhos cobrindo sua orelha direita, de sapatilha de tecido, saia estampada, mãos contadoras de imagens e emoções, ela tinha uma angústia: como tornar visível tudo isso que há em mim, tudo que sonho, que quero, que imagino, meus projetos, minhas vontades de mudança? O audiovisual tem sido sua resposta. Ainda que imaterial, pode-se ver. E resolveu então produzir seu documentário Musicadelphia, que traz as vozes, sons e imagens da criatividade que marcaram sua passagem estadunidense. A lua acima de nós cresce com aquele contar simples sobre tudo que importa. As árvores em torno quase se deitam para melhor ouvir, enquanto contemplamos as paisagens verde-atlânticas da memória. Seus olhos brilham ao olhar para dentro. Naquela quieta penumbra universitante. Assim ela toca, no improviso, sentindo o ritmo do instante. Amadurecendo seu jeito de ser, atraindo centelhas de beleza para seu caminho. Rodri Nazca 17/05/2016