Dani collins [legado e paixão] dívida paga com paixão jessica 220 2

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Dívida Paga Com Paixão (A debt paid in passion)

Dani Collins

Quão linda poderia ser uma ladra? Raoul Zesiger tem tudo o que um homem poderia desejar, incluindo uma assistente pessoal tão bela e perfeita quanto Sirena Abbott. Pelo menos, era isso o que parecia, até a relação profissional ser substituída por uma noite de paixão abrasadora... sucedida pela denúncia de Raoul que leva à prisão de Sirena por desfalque! Apesar de ter escapado da condenação, Sirena sabe que está amarrada ao ex-chefe por algo mais do que o passado. E quando ele descobrir seu segredo, poderá, enfim, se vingar dela! Digitalização: Simone R Revisão: Cris V.


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Querida leitora, Lyn e Sirena, as heroínas de Jessica 220, fazem de tudo pelo bem de suas crianças, até mesmo enfrentar homens poderosos e arrogantes, ainda que muito sensuais... Em O legado do grego, Lyn Brandon não quer perder a guarda de seu sobrinho órfão, para isso, ela precisará da cooperação do magnata Anatole Telonides, primo do pai da criança. Um casamento de fachada parece a melhor opção para os dois, mas a atração incontrolável que sentem pode complicar as coisas. Já em Dívida paga com paixão, tudo o que Sirena Abbott quer é criar sua filha em paz, e para isso precisa manter Raoul Zesiger, o pai da criança, a distância! Mas ele não permitirá que sua herdeira seja criada pela mulher que o roubou! A tentação que Sirena representa é apenas um detalhe. Impossível de ignorar! Boa leitura! Equipe Editorial Harlequin Books Tradução Fabia Vitiello HARLEQUIN 2014 PUBLICADO MEDIANTE ACORDO COM HARLEQUIN BOOKS S.A. Todos os direitos reservados. Proibidos a reprodução, o armazenamento ou a transmissão, no todo ou em parte. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas é mera coincidência. Título original: SECURING THE GREEK'S LEGACY Copyright © 2014 by Julia James Originalmente publicado em 2014 por Mills & Boon Modern Romance Título original: A DEBT PAID IN PASSION Copyright © 2014 by Dani Collins Originalmente publicado em 2014 por Mills & Boon Modern Romance Projeto gráfico de capa: Núcleo i designers associados Arte-final de capa: Isabelle Paiva Editoração Eletrônica: ABREUS SYSTEM Impressão: RR DONNELLEY www.rrdonnelley.com.br Distribuição para bancas de jornais e revistas de todo o Brasil: FC Comercial Distribuidora S.A. Editora HR Ltda. Rua Argentina, 171,4o andar São Cristóvão, Rio de Janeiro, RJ — 20921-380 Contato: virginia.rivera@harlequinbooks.com.br

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Capítulo 1

Olhe para mim, pensou Raoul Zesiger, tentando influenciar Sirena Abbott com a força de seu pensamento. Raoul precisou se recostar contra a cadeira para vê-la além dos três homens sentados entre eles. Deveria estar olhando para o juiz, mas não conseguia tirar os olhos de Sirena. Ela estava muito quieta, o rosto inclinado para frente, o perfil sombrio. Seus longos cílios ciganos mostravam que seus olhos haviam ficado baixos enquanto o advogado dele se levantava para falar. Sirena nem ao menos relanceou um olhar em sua direção quando o próprio advogado ficou de pé para argumentar que uma condenação em regime fechado seria contraproducente, já que ela precisava trabalhar para devolver os fundos roubados. Os advogados de Raoul haviam deixado claro que ela não iria para a cadeia, mas ele tinha pressionado para que acontecesse. Veria essa traiçoeira mulher de aparência inocente, a boca carnuda gravemente tensa e seus espessos cachos castanhos presos em um coque enganosamente respeitoso, ir presa por tê-lo traído. Por roubar. O padrasto havia sido um ladrão. Raoul esperava que nunca mais tirassem vantagem dele de novo e, principalmente, não esperava que a pessoa a fazer isso fosse sua assistente, uma mulher em quem ele viera a confiar e que achava que sempre estaria lá. No entanto, ela enfiara os dedinhos na sua conta bancária privada. E, então, tentara manipulá-lo com seus muitos encantos. Raoul não queria que a lembrança voltasse. Seus ouvidos esperavam que o juiz pronunciasse que a sentença seria progressiva, mas seu corpo se arrepiou de calor quando se lembrou da sensação daqueles lábios polpudos, tão macios sob os seus. Os seios dela, exuberantes, de encher as mãos, cheiravam a verão. Os mamilos eram como amoras aquecidas pelo sol sob sua língua, suculentos e doces. O traseiro em forma de coração, que ele havia observado com excessiva frequência sempre que ela saía de seu escritório, revelou-se ao mesmo tempo rijo e liso quando ele ergueu a saia dela e puxou para baixo a calcinha de renda. Coxas brancas como açúcar de confeiteiro e, entre elas, um perfume almiscarado e sedutor, que o deixou em rígida posição de sentido quando se recordou do quanto era apertada, quase virginal, mas tão quente e acolhedora. Porque ela soubera que seu ato criminoso estava a ponto de vir à luz. Raoul sentiu um aperto no peito, em uma mistura de fúria e desejo carnal sem paralelo. Por dois anos, havia conseguido manter essa fome contida, mas agora, que a possuíra, só no que podia pensar era em tê-la novamente. Raoul a odiava por ter tal poder sobre ele. E poderia garantir sob juramento que jamais machucaria uma mulher; queria, porém, esmagar Sirena Abbott. Erradicá-la. Destruí-la. A batida do martelo o levou de volta ao tribunal. Estava vazio, exceto pelas cinco pessoas por trás das duas mesas, ambas de frente para o juiz. Seu advogado acenou 3


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com a cabeça, resignado, e Raoul percebeu, desgostoso e enojado, que a decisão havia favorecido Sirena. Na outra mesa, parcialmente oculta pelo advogado dela, Sirena suspirou de alívio. Seus grandes olhos se ergueram para o céu, brilhando de gratidão. Seu advogado agradeceu ao juiz e colocou a mão sob o cotovelo da mulher para ajudá-la a se levantar, inclinando-se para lhe dizer algo. Raoul sentiu uma pontada de possessividade ao ver o solícito advogado de meiaidade orbitando em torno dela. Disse a si mesmo que era raiva, nada mais. Odiava ser uma vítima outra vez. Ela não devia poder escapar com um plano de devolução de 600 libras por mês. Isso não era reparação. Era uma piada. Por que Sirena não olhava para ele? Era o mínimo que podia fazer: olhá-lo nos olhos e reconhecer que ambos sabiam que ela estava se safando de um crime. Sirena, contudo, murmurou algo para o advogado e deixou o homem arrumando sua pasta enquanto circulava a mesa e se dirigia para o corredor. Suas curvas sensuais estavam disfarçadas pela jaqueta chique e pela saia-lápis, mas ela ainda era sedutora como o diabo. Seus passos se tornaram mais lentos quando chegou ao portão que levava à galeria. Olhe para mim, Raoul ordenou em silêncio mais uma vez, prendendo a respiração quando a bela mulher hesitou, sentindo que estava a ponto de encará-lo. Mas Sirena parecia fitar o infinito, piscando e piscando... — Ela está desmaiando! — Raoul empurrou seus dois advogados e derrubou cadeiras para alcançá-la ao mesmo tempo em que o advogado dela também se virava e reagia. Eles a ampararam juntos. Raoul odiou o homem outra vez enquanto os dois a deitavam com cuidado no chão. Sirena não estivera tão etérea da última vez em que ele a segurara nos braços. Era tão frágil naquela época. Raoul gritou pedindo por ajuda médica. Alguém surgiu com oxigênio em um tempo abençoadamente curto. Ele se deixou empurrar cerca de meio passo e não conseguia tirar os olhos de Sirena, vendo a forma como as maçãs do rosto pareciam afundadas, sua pele cinzenta. Tudo nele, respiração, pulsação, pensamento, parou e ficou em alerta, esperando por um novo veredicto: o de que ela ficaria bem. Era igualzinho ao que acontecera com seu pai. A falta de reação, o pânico selvagem tomando conta dele enquanto lutava contra o desamparo e a realidade brutal. Sirena estava respirando? Não podia estar morta. Abra os olhos! Raoul ouviu, como se a distância, um dos atendentes perguntando por condições preexistentes, e ele tentou lembrar se Sirena mencionara algum problema de saúde. Não era diabética, nunca havia tomado nenhuma medicação que ele tivesse visto. — Ela está grávida. As palavras explodiram feito vidro estilhaçado nos ouvidos de Raoul.

Sirena sentiu algo sendo pressionado contra seu rosto. Suor frio cobria sua pele e 4


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um turbilhão de náusea girou impiedosamente dentro dela. Ergueu a mão com dificuldade para afastar o que quer que a estivesse sufocando, e uma voz disse: — Você desmaiou, Sirena. Fique quieta por um minuto. Abrindo os olhos, viu John, seu advogado, e, atrás dele, Raoul, que a fuzilava com os olhos por cima do ombro de John, parecendo furioso. Ela havia tentado com todas as forças não olhar para Raoul, antigo chefe, breve amante, pai de seu filho. Ele era muito... tudo. Alto, moreno, despudoradamente educado e sofisticado. Severo. Crítico. Só que, em vez de obedecer-lhe, seus olhos famintos percorreram o corpo dele pela primeira vez em semanas, e ela não perdeu um detalhe de seu terno cor de grafite, superelegante, e de sua austera gravata preta. O rosto estava recém-escanhoado para o compromisso matutino, o cabelo escuro recentemente cortado em estilo simples e severo. E ali estavam seus olhos, as íris cinzentas tempestuosas que pareciam repreendêla enquanto se prendiam às dela sem hesitar. John perguntou: — Você está com alguma dor? Nós chamamos uma ambulância. Sirena olhou novamente para Raoul apavorada. Fora um erro. Ela percebeu imediatamente que ele havia entendido a situação como o que realmente era: uma admissão de culpa. Uma traição. Fechando com força seus olhos traiçoeiros, Sirena desejou que ele não tivesse compreendido o que fora revelado; no entanto, ele era a pessoa mais inteligente que já conhecera. Se Raoul soubesse que ela estava carregando um filho dele, haveria outra briga, e Sirena não queria brigar pela custódia do bebê. — Sirena — disse Raoul com sua voz grave e maravilhosa. A pele dela se arrepiou em um prazeroso tremor de reconhecimento. Dois anos ouvindo cada entonação daquela voz a deixaram com a certeza de que seu nome nos lábios dele naquele momento era um aviso implacável. — Olhe para mim — ordenou ele. Sirena estendeu a mão, cegamente, procurando pela de John, apertando os dedos secos e mornos dele com os seus, gelados. Sob a máscara de oxigênio, a voz dela era oca e fraca como um sussurro. — Diga àquele homem para me deixar em paz ou eu peço uma ordem de restrição.

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Capítulo 2

A primeira bomba da segunda guerra estava esperando por Sirena depois de vários exames, e ela chegou em casa, voltando do hospital. Novos exames haviam sido marcados, mas por enquanto seu médico atribuía seu desmaio ao estresse e à hipoglicemia causados por sua náusea constante. Sirena achava que nada poderia ser mais estressante do que o risco de ir presa enquanto lidava com uma gravidez não planejada; contudo, Raoul não conhecia limites quando se tratava de tortura psicológica. Ela leu o e-mail que John lhe encaminhara: Meu cliente tem todas as razões para crer que sua cliente está esperando um filho dele. Ele insiste em ter total envolvimento nos cuidados durante a gravidez e pedirá a custódia exclusiva assim que o bebê nascer. O sangue de Sirena congelou em suas veias, apesar de não ser nenhuma surpresa. Raoul era possessivo. Isso ela havia aprendido. Ainda assim, era impensável que alguém tentasse tomar o bebê dela. Piscando para tentar tirar o ardor do desespero dos olhos, digitou: O filho não é dele. E, em voz alta, completou: — E diga que vá para o inferno. Sirena tentou não se deixar comover pelo fato de Raoul desejar tanto o bebê. Pensar nele como um pai interessado faria com que enfraquecesse seu julgamento contra um homem que precisava odiar, apesar de saber que era um filho carinhoso e um meio-irmão protetor. Ela sempre soube que, de certa forma, eram parecidos. Ambos haviam perdido um dos pais e queriam o melhor para os irmãos mais jovens. Durante muito tempo, Sirena o considerara um homem admirável, correto, justo e bom. Não, ela lembrou a si mesma enquanto preparava uma torrada que se obrigaria a comer. Raoul era uma pessoa cruel, raivosa, mesquinha e que não sentia nada. Pelo menos não por ela. Provara isso ao fazer amor apaixonadamente em um dia, mandando-a no dia seguinte para a cadeia. Um buraco negro de desespero ameaçou abrir-se sob seus pés, mas ela estava em segurança agora. Tinha cometido um erro terrível, embora o juiz houvesse entendido que não agira de má-fé, ainda que Raoul não tivesse feito o mesmo. Sirena não sabia como pagaria a dívida, o que era uma preocupação menor comparada com a de ter de convencer Raoul de que o bebê não era seu filho. Sirena não sobreviveria se outra pessoa amada fosse arrancada de sua vida. O medo de ter seu bebê crescendo sem a mãe, como acontecera com ela, fizera com que lutasse para se livrar da cadeia e para expulsá-lo de sua vida. Agora, sentia-se mais sozinha que nunca e tentava ignorar o sentimento. Levando chá, torrada e um comprimido contra a náusea para o sofá, procurou no 6


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computador para ver se havia aparecido algum trabalho de transcrição. As contas do advogado eram apavorantes e ter sido demitida três meses antes tinha dizimado suas muito modestas economias. Se pelo menos ela pudesse voltar atrás naquele terrível momento em que pensara: Raoul vai entender... Pegar dinheiro emprestado dele parecera a coisa mais simples e óbvia a fazer quando sua irmã estava em lágrimas, dizendo: Acho que não está escrito que devo ser professora. O pai delas estava esperando pelo pagamento de um grande cliente para os próximos dias. Ali havia lutado tanto para melhorar suas notas e ser aceita no programa de especialização. As taxas deviam ser pagas, só que eles não tinham o dinheiro em mãos. Eu posso cuidar disso, Sirena havia garantido à irmã, confiante de que o valor sairia e voltaria à conta de Raoul no mesmo extrato mensal. Ele provavelmente não iria nem notar, quanto mais se preocupar com aquilo. E então o cliente do pai delas foi à falência. O dinheiro não tinha aparecido e a oportunidade de se explicar não havia surgido, não antes que outros eventos se desenrolassem. E já que não quisera envolver o pai enquanto seu ganha-pão estava desmoronando, Sirena escondera seus motivos de Raoul, não revelando à própria família o que fizera, nem o fato de que estava correndo o risco de ir presa por causa disso. Um bipe abafado anunciou a chegada de um e-mail. De Raoul. O coração dela saltou com uma ansiedade inapropriada. Era uma só palavra. Mentirosa. Raul não estava acreditando que o bebê não era dele. Apertando os dentes contra a dor que tomava seu peito, Sirena acrescentou o endereço de Raoul à sua lista de bloqueios e mandou um novo e-mail para John. Diga a ele que me contatar diretamente é inaceitável. Se o bebê fosse dele, eu o processaria por pensão. Teria pedido clemência quando estava tentando me colocar na cadeia. Este bebê não é do Raoul e ele deve ME DEIXAR EM PAZ. Apertar “enviar” foi como cortar a própria carne. Sirena inspirou dolorosamente, lutando contra a sensação de perda. Mas a vida atinge a todos com mudanças súbitas, e é preciso aprender a cair e seguir em frente. Ela havia aprendido isso com a morte da mãe e novamente quando sua madrasta levou seu pai e a meia-irmã para a Austrália assim que Sirena se formara e entrara na faculdade de administração. As pessoas partiam, era o que aprendera. Elas desapareciam de sua vida, quisesse você ou não. Algumas vezes até demitiam você e tentavam trancá-la na prisão, para nunca ter de vê-la outra vez. A única coisa que a havia ajudado a suportar o processo humilhante de ser presa, fichada e acusada fora a certeza de que Raoul não sabia o que estava acontecendo e que tudo aquilo era um equívoco. Sirena acreditara de todo o coração que, assim que dissesse a Raoul pelo que havia passado, ele colocaria as coisas nos eixos. Não tinha sido assim, entretanto. Raoul a fizera esperar na chuva, do lado de fora 7


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do portão de sua mansão fora do centro de Londres, finalmente indo até ela com passo firme e coração frio, a expressão severa demonstrando desgosto enquanto a observava. — Tentei falar com você! — disse Sirena através das grades do portão de segurança, assustada com o quanto ele parecia inalcançável. — Fui presa hoje. — Eu sei — respondeu Raoul sem um fiapo de preocupação. — Fui eu quem registrou a queixa. O choque e a angústia perplexa dela devem ter sido óbvios, embora ele mal tivesse movido um músculo do rosto em reação. — Mas... — Tudo o que ela queria dizer entalou em sua garganta. Eles haviam construído amizade, confiança e respeito ao longo de dois anos trabalhando juntos e tinham acabado, no dia anterior, de levar seu relacionamento a um novo nível. Ele fora terno e provocante, e... Deus, ela achara que ele havia sido amoroso. — Mas o quê? — desafiou ele. — Você achou que dormir comigo influenciaria na minha reação quando eu descobrisse que me roubou? Eu estava entediado e você estava disponível. Foi só isso que aconteceu ontem. Arrume um advogado. Você vai precisar.

Durante as semanas seguintes, os ataques de Raoul continuaram. Ofertas de acordos que aumentavam de valor. Exigências de testes de paternidade. Prazos. Caminhando de um lado para o outro no escritório de John, Sirena precisou se segurar para não repreendê-lo por ter revelado sua gravidez no dia do julgamento. Ela não havia admitido a ninguém que Raoul era o pai e estava determinada a nunca fazêlo. — John, por que sou obrigada a discutir isso com quem quer que seja? Por que Raoul não pode simplesmente me deixar em paz? — Seu desejo pode estar se tornando realidade, Sirena. Raoul deixou bem claro que esta é sua oferta final e que você deve aceitá-la até segunda-feira ou vai ficar de mãos vazias. Agora, sei que você se recusa a admitir que o bebê é dele e... — Não é! — Ele obviamente acha que é possível. Vocês devem ter se envolvido. — As amantes dele gastam mais em um vestido do que o dinheiro que peguei, e ele tentou me mandar para a prisão! Que tipo de relacionamento é esse? — E agora você pune Raoul porque ele tentou mandá-la para a cadeia? Ou por não ter lhe comprado um vestido? — Não estou punindo ninguém — resmungou Sirena. — Você está punindo seu filho, mantendo o pai dele fora de sua vida, seja esse pai Raoul Zesiger ou qualquer outro homem. Sou pai e sei que os melhores interesses da criança não são atendidos quando o acesso a um dos pais lhe é negado apenas porque o outro está com raiva dele. Você tem algum motivo para crer que ele seria um pai inadequado? 8


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Muito pelo contrário, admitiu Sirena silenciosamente, enquanto um pequeno tentáculo de saudade se enroscou em seu coração. — Você já pensou no futuro da criança? — continuou John. — Há certos direitos, tais como uma boa educação, herança... Os punhos de Sirena se fecharam sob seus cotovelos enquanto ela se curvava, abraçando a si própria em busca de consolo. Sua mãe havia morrido tentando dar à luz o bebê que teria sido o irmãozinho de Sirena. Sua própria pressão sanguínea estava em constante monitoramento. Entre isso e as reuniões com o advogado, ela mal estava trabalhando. O estresse estava deixando os resultados dos exames ainda mais preocupantes. — Sirena, eu não estou tentando... — Ser minha consciência? — interrompeu ela. Ele ainda estava agindo como se fosse. — Tenho uma consulta com um especialista na segunda-feira. Diga que darei minha total atenção à oferta dele depois disso e que entrarei em contato até o final da próxima semana. A atitude de John mudou. — Então ele é o pai. — Isso será determinado pelo teste de paternidade, depois que o bebê nascer, não é? — devolveu Sirena, tentando esconder o jogo o máximo que pudesse, porque sentia que estava ficando sem carta nenhuma e muito rápido. A mente de Raoul estivera andando em círculos durante semanas, deixando-o louco. Se Sirena estivesse grávida dele, teria usado isso para impedi-lo de tentar prendê-la. Já que não o havia feito, o bebê não devia mesmo ser dele. Mas ela podia ter usado seu estado em busca de clemência durante o processo e não o fizera. O que significava que quisera manter a gravidez em segredo. O que o levava a crer que o bebê era dele. E, o mais intrigante, se ele não era o pai, quem seria? Raoul estava ciente de que havia uma grande quantidade de homens em suas numerosas empresas com os quais Sirena, com seu corpo voluptuoso e sorriso caloroso, poderia facilmente ter se envolvido. O pensamento o afligia e o deixava repugnado. Raoul nunca pensara nela como promíscua, mas obviamente possuía uma vida secreta. Não era como se ele tivesse tomado uma virgem inocente, apesar de ter surgido um toque de hesitação tímida no comportamento dela, que acabara se transformando em prazer inesperado. Abafando um gemido, Raoul tentou não pensar na tarde em que visitara um imóvel pensando em um possível investimento. Todos os dias lutava contra a lembrança do encontro apaixonado que tivera com aquela mulher, e todas as noites ela o assombrava, seu cabelo sedoso se espalhando por sobre a pele dele, seu riso tímido se transformando em um suspiro de encantamento quando ela o tocara. O murmúrio de entrega em sua garganta quando encontrara o centro do prazer dela quase o fazia perder o controle durante o sono. A cada manhã ele se lembrava de que havia usado um preservativo. Um preservativo que estava em sua carteira fazia tanto tempo que nem conseguia lembrar onde ou que época o havia colocado ali. Ele só ficara grato por encontrá-lo 9


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quando uma tempestade trouxera Sirena correndo porta adentro até seus braços. Um tropeço a fizera girar e cair contra ele, que cavalheirescamente tentara mantê-la de pé, causando a colisão de curvas macias contra um corpo já carregado de apetite sexual. Ao olhar surpresa para ele, assim que percebera que o que pressionava seu abdômen era a ereção daquele homem, havia aberto os lábios e olhado para sua boca como se tivesse esperado a vida inteira que ela cobrisse a sua... Xingando, Raoul se levantou para caminhar de um lado para o outro em seu escritório de Paris. Era o mais longe que ele estava disposto a ficar de Londres, depois de tentar entrar em acordo com Sirena de uma vez por todas. A visão relembrada dos olhos dela, vidrados de paixão, foi coberta por uma mais recente, quando o advogado mencionara a gravidez e ela lançara aquele olhar apavorado para Raoul. O bebê era dele. Raoul sabia disso instintivamente, e, se Sirena achava que fora cruel com ela ao descobrir sobre o dinheiro, não fazia ideia do que ele faria por um filho. A dúvida o importunava, ainda assim Se o bebê era dele, e ela era do tipo capaz de desviar dinheiro e depois tentar se livrar dormindo com a vítima, por que não estava tentando arrancar uma gorda pensão? Nada daquilo fazia sentido. Se pelo menos falasse com ele. Ambos costumavam se comunicar com uma fluidez incrível, terminando as frases um do outro, preenchendo as lacunas com um olhar... Mentiras, Raoul se obrigou a lembrar. Tudo uma farsa para fazer com que ele confiasse nela, e havia funcionado. Isso era o que mais doía. E como diabos ele havia se transformado no próprio pai? Seria genética essa propensão para se apaixonar pela assistente? Ele ignorara com sucesso atrações desse tipo durante anos. Seu pai se matara por causa de um caso no escritório, então ele tinha criado uma regra para si próprio, para evitar a qualquer custo coisas do tipo. Era um caso de sobrevivência básica. Sua onda de interesse por Sirena havia sido intensa desde o começo. Ele a contratara apesar disso, parcialmente porque estivera certo de ser um homem mais forte que o pai. Talvez estivesse até mesmo tentando provar isso a si mesmo. Irritava-se por ter finalmente cedido aos encantos dela. Mas poderia ter feito as pazes consigo próprio a esse respeito se ela não o tivesse traído. Subitamente, Raoul não apenas se tornara o pai como também a mãe, ingenuamente observando o saldo bancário ser exaurido enquanto engolia palavras doces e reconfortantes como desculpa. Eu ia devolver antes que você descobrisse. O fato de Raoul sempre ter considerado Sirena honesta até sofrer tamanha decepção fizera com que questionasse o próprio julgamento, o que fora um enorme golpe contra sua autoconfiança. Um simples ressarcimento não era o suficiente para compensar tudo. Gente como ela precisava aprender uma lição. Observando sua mesa cheia de trabalho a fazer, Raoul praguejou contra a concentração perdida porque tudo isso, todo o tempo perdido em reuniões com advogados, poderia ter sido passado trabalhando. Aquela situação era insustentável. Raoul havia finalmente, e de forma relutante, 10


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enviado a ela um ultimato com palavras duras, e suas mãos tremiam ao pensar que ela rejeitaria este também. Sirena o conhecia o suficiente para acreditar que quando ele dizia “último” realmente queria dizer “último”. Nunca tivera nada tão valioso quanto o próprio sangue em jogo. Se aquela mulher se recusasse outra vez... Sirena não o faria. Sirena Abbott era mais gananciosa do que ele pensava, no entanto, naturalmente prática. Reconheceria que ele havia chegado ao seu limite e cederia. Como se fosse para provar tal coisa, seu e-mail emitiu um som que indicava que uma mensagem havia chegado. Era de seu advogado. Sirena Abbott tinha um compromisso na segunda-feira e queria o resto da semana para pensar. Raoul se inclinou, apoiando-se sobre as mãos fechadas em punhos. Seu peito estufou com a sensação de vitória. Mulher tola. Quando dissera segunda-feira, era segunda-feira.

Quando Sirena entrou em seu prédio, ainda estava preocupada com o sermão do obstetra sobre tirar um tempo para relaxar. Ela também precisava ler sobre os efeitos colaterais da medicação que o médico prescrevera. Distraída, não notou ninguém até que um corpo masculino de forte presença saiu das sombras. Seu pulso acelerou em reconhecimento excitado ao mesmo tempo em que ela pulava de susto. Suas chaves caíram, fazendo barulho, sobre o chão de pedra. Encolhendo-se contra a porta de vidro, ela puxou a gola para proteger mais o pescoço. O conhecido perfume dele a dominou, pungente e masculino sob uma camada de chuva. A obscuridade do fim de tarde jogava sombras ameaçadoras nos ângulos de seu rosto e transformava seus cílios curtos e espetados em lâminas afiadas sobre olhos turbulentos. Ele estava atraente como sempre, e ela, suscetível como de costume. — Olá, Sirena. Aquela voz. — O que você está fazendo aqui? — Sirena deveria evitar elevação em seus batimentos cardíacos, mas Raoul sempre tivera esse efeito sobre ela. Graças a Deus, passara dois anos aperfeiçoando formas de esconder seus ataques infantis de excitação e de admiração enfeitiçada. — Você não achou de verdade que eu esperaria até sexta-feira — disse ele inflexível. — Darei uma resposta amanhã, prometo. Raoul balançou a cabeça condescendente. — Hoje, Sirena. — Hoje foi um longo dia, Raoul. Não o torne ainda mais longo. — Que tipo de compromisso você teve? Médico? O bebê está bem? — Raoul exigiu uma resposta. A nítida preocupação em sua voz a afetou, fazendo com que ela relaxasse e se enrijecesse ao mesmo tempo. 11


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— O bebê está bem — disse ela firmemente. Se a mãe pudesse se manter saudável o suficiente para o parto e garantir que houvesse ao menos um dos pais presente para criá-lo, o bebê certamente teria uma vida longa e feliz. — E você? — Estou cansada e preciso ir ao banheiro. São 17h. Isso me dá sete horas. Volte às 23h59. Raoul travou a mandíbula. — Chega de jogos, chega de advogados. Você e eu vamos resolver isto. Agora. Sirena tentou pegar as chaves, mas Raoul a impediu. O contato das mãos dele nas dela fez o corpo da bela mulher estremecer. Ela estivera estressada e nauseada demais para ter impulsos sexuais nos últimos meses, só que, de repente, cada milímetro de sua pele voltou à vida com a presença daquele homem, o deus vingador que nunca tivera nenhum respeito genuíno por ela em primeiro lugar. — Vamos deixar algo bem claro. Qualquer acordo a que cheguemos depende de testes de paternidade que provem que você é o pai. Raoul recuou quase imperceptivelmente. Sua cara de negociação entrou em ação, e ele conseguiu disfarçar o choque. Na entrada cheia de sombras do prédio, Sirena não pôde ter certeza se as pupilas dele haviam realmente se contraído até ficar do tamanho de cabeças de alfinete, mas sentiu o olhar de Raoul como uma lança que a perfurava e a mantinha parada no lugar. Isso a deixou nervosa e também orgulhosa de si mesma por tê-lo surpreendido. Ela não podia se permitir ser fraca. — Quem mais está na competição? — cuspiu ele. — Tenho uma vida além de sua gloriosa presença. — As mentiras brotavam feito ervas daninhas, mas Sirena tinha tão poucas vantagens... Raoul permaneceu impassível, porém, havia algo em seu comportamento que tocou o coração dela, que sabia que ele era o pai. Mantê-lo na incerteza era algo cruel a se fazer. Ela se envergonhou de sua atitude. Não seja molenga, Sirena. Ele podia tomar conta dele mesmo. A única coisa com a qual ela deveria se preocupar era com o bebê. — Vamos resolver esta história — disse ela.

Capítulo 3

Raoul não conhecia o apartamento de Sirena. Quando entrou, ficou surpreso por sentir-se imediatamente como se estivesse voltando a um lugar ao mesmo tempo confortável e familiar. O lugar era tão ela. 12


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Sirena era uma pessoa organizada e de gostos simples, mas sua sensualidade inata transparecia em sua escolha de texturas e nas fáceis misturas de cores. O espaço aberto, com a cozinha integrada à sala, era minúsculo, no entanto, havia lugar para tudo; as plantas eram viçosas e bem cuidadas; retratos de família sorriam das paredes e prateleiras. Ele teve tempo, enquanto ela estava no toalete, para observar o pequenino quarto de dormir, mantido tão escrupulosamente arrumado quanto o resto da casa. Ela dormia em uma cama de solteiro. A dona da casa deu-lhe um olhar atormentado quando voltou e tirou o casaco, colocando-o nas costas de uma das cadeiras da mesa de jantar. Sua silhueta, voluptuosa como sempre, tinha uma nova curva que o fez inspirar rapidamente surpreso. Até aquele momento, grávida tinha sido apenas uma palavra atirada de um lado para o outro em e-mails hostis e documentos legais. Enquanto observava a calça justa e a blusa esticada sobre um corpo que não havia se alargado muito, exceto pela barriga, Raoul se arrepiou. Sirena estava gerando um bebê. Obrigando-se a olhar para o rosto dela, Raoul viu cautela defensiva e vulnerabilidade, o que disparou seus mais profundos instintos protetores. Felizmente ela desviou o olhar, o cabelo espesso caindo sobre o rosto para esconder sua expressão. Raoul se recompôs, lembrando-se de não permitir que Sirena o comovesse, mas não conseguia tirar os olhos daquela curva firme. Queria tocá-la, começando pela misteriosa elevação em sua barriga e depois explorando o restante das formas sedutoras. Enfiou os punhos nos bolsos do sobretudo e a fuzilou com os olhos cheios de ressentimento. — Vou tomar água e comer uma laranja. Você quer café? — perguntou ela. — Não — rosnou ele. Raoul não conseguia sequer começar a pensar no que faria se não fosse o pai. O fato de não saber o deixava inquieto, especialmente por não conseguir entender por que Sirena o estava atormentando. Sim, sua posição seria fortalecida se ela admitisse que ele era o pai, e a dela também seria. Raoul faria qualquer coisa por seu filho. Uma olhadela em uma barriga grávida não deveria afetá-lo tão profundamente, mas tudo em que podia pensar era como sua vida inteira havia mudado. Cada decisão de agora em diante seria pesada em comparação com o efeito que teria naquele ser minúsculo abrigado no âmago da bela gestante. Ela levou para a mesa seu copo embaçado pela condensação e o prato com uma laranja cortada em gomos,abrindo uma pasta assim que se sentou. Um olhar o convidou a ocupar a cadeira em frente à dela. Raoul comprimiu os lábios para não deixar escapar uma exigência por respostas. Por quê? Se ela havia precisado de dinheiro, por que não lhe pedira um empréstimo? Um aumento? O salário que ele vinha lhe pagando era generoso, mas ele vira que estava pronta para maiores responsabilidades e para a compensação que viria com isso. Teria sido esse seu plano o tempo todo? Gravidez e um acordo de custódia? O pensamento lhe ocorreu quando ela abriu a pasta e ele notou uma cópia do contrato cheia de anotações e rabiscos. — Você leu mesmo — disse com tensa repugnância. 13


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— Eu faço meu dever de casa, igual a você — retrucou ela. Sua pele, lisa como a de um bebê, estava pálida. Mulheres grávidas não deviam ficar radiantes? Sirena não parecia doente, mas havia sombras escuras sob seus olhos e dentro deles também — Quero boletins médicos — declarou ele com tom mais exigente e áspero do que normalmente usaria na abertura de uma negociação. — Não tenho problema em compartilhar os exames sobre a saúde do bebê. Até agora está tudo perfeito. Eu tenho um ultrassom no meu notebook que posso lhe enviar assim que tivermos assinado o acordo. — Quem é você? — murmurou ele. — Não é a Sirena que eu conheci. — Sua assistente havia sido acessível e alegre, com sorriso fácil, rápida para ver o lado engraçado das coisas. Aquela mulher era distante, séria e mais reservada do que jamais imaginara. Igualzinha a ele, o que era um pensamento perturbador. — O que o faz pensar que me conhece, Raoul? Você alguma vez perguntou sobre minha vida? Meus planos? Do que eu gostava, do que não gostava? Tudo de que me lembro são exigências que giravam em torno das suas necessidades. Sua decisão de trabalhar até tarde. — A água gelada parece estar correndo direto para suas veias. — Ah, coitadinho de você. Melhor ler minhas anotações e seguirmos em frente. Sirena parecia julgá-lo por ter sido insensível quando, na verdade, dormira com ele para obter vantagens. Possivelmente pensando nesse mesmo bebê pelo qual estavam brigando. Puxando os papéis para mais perto, começou a ler as anotações dela. A primeira era uma recusa a se submeter a testes de paternidade até o nascimento, quando o contrato passaria a ter valor, caso ficasse provado que ele era o pai. Raoul não gostou, contudo, rubricou a anotação, para poder seguir em frente. As coisas ficaram rapidamente mais confusas e audaciosas. — Por que diabos tudo deve ser mantido em fundo fiduciário para o bebê? — Não quero seu dinheiro — disse ela tão sem emoção que ele quase acreditou. Não se deixe distrair, disse a si mesmo. Claro que Sirena queria o dinheiro, ela inclusive o roubara, mas não adiantaria discutir naquele momento. Tudo o que importava era resolver a questão da paternidade e garantir seu direito de se envolver na vida do filho. Ou da filha. Raoul baixou os olhos para as páginas à sua frente, tentando entender as mudanças que ela fizera, porque todas favoreciam o futuro financeiro do bebê e a deixavam sem nada. Ninguém abriria mão de tanta coisa... — Ah. — Ele fez um ruído de escárnio quando chegou ao codicilo final e entendeu tudo. — Não. — Pense um pouco. Você não pode amamentar. Faz sentido que eu tenha a custódia exclusiva. — Por cinco anos? Valeu a tentativa. Cinco dias, talvez. — Se não vai ser razoável, vá embora agora. Você não é o pai mesmo. 14


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Sirena se levantou e Raoul fez o mesmo, pegando-a pelos braços quando tentou passar ao lado dele. O pequeno inchaço da barriga de grávida o empurrou de leve, estranho e desconcertante, fazendo as mãos dele se fecharem com mais força, com um desejo possessivo de mantê-la perto. Manter o bebê perto, corrigiu-se ele, em silêncio. — Não me toque! — Tem certeza de que você não quer tentar me persuadir a ser clemente outra vez? — Eu não o processei por assédio sexual, mas tinha todo o direito. As palavras dela o atingiram. Com força. Soltando-a, ele recuou profundamente ofendido. — Você me queria tanto quanto eu a você — fumegou ele. Suas lembranças explodiam diariamente com a forma pela qual a expressão dela brilhara de excitação. A forma como ela havia encaixado o corpo no dele e arqueado as costas para colar-se inteira nele, e gritado de alegria quando os tremores do clímax percorreram a ambos. — Não, você estava entediado — devolveu com fúria ardente, que traía um toque de mágoa. — Vá embora, Raoul. — Ela soava derrotada. Arrasada. — Eu lamento ter conhecido você. A resposta de que o sentimento era mútuo flutuou por um instante em sua língua, só que permaneceu trancada atrás dos dentes, travados contra uma surpreendente chicotada de... que diabos, por que ele sofreria de remorso? — Vamos contratar uma junta de especialistas para organizar uma agenda dos cinco primeiros anos do bebê, baseada nas necessidades dele ou dela. Aos 4 anos, nós começaremos a negociar o período escolar. — Uma junta de especialistas — repetiu ela engasgando-se de rir. — É, eu sou cheia de dinheiro, igual a você. Vamos fazer isso. — Se está preocupada com dinheiro, por que está recusando um acordo? A resposta foi calma e sombria, perturbadoramente sincera. — Porque não quero dinheiro. Eu quero meu bebê. — Ela foi até a janela com a mão pousada na barriga. Seu rosto estava sério. Raoul tirou relutantemente os olhos de cima de Sirena, inquieto com o quanto sua simplicidade honesta o afetara. Ela o havia feito se contorcer de vontade de tranquilizá-la, e não apenas verbalmente. Por algum motivo, queria tanto abraçá-la que seu corpo todo doía. Aquilo não combinava com ele. Tinha seus momentos de delicadeza quando se tratava da mãe ou da meia-irmã. Elas eram amadas por ele e eram também sua responsabilidade, apesar de não serem mais tão desamparadas como antigamente. Ele ainda se encolhia de culpa quando se lembrava de como passara seu primeiro ano de faculdade na farra, bebendo e andando atrás de garotas, completamente alheio ao que acontecia em sua casa. Então, apesar de o vício em jogo de seu padrasto ter sido tão brutal e egoísta, a morte do homem havia estilhaçado os corações de duas pessoas com quem ele se importava profundamente. Por mais que tentasse ser solidário enquanto recuperava as finanças da família, Raoul nunca fora do tipo sensível e tátil, disposto a abraçar e acarinhar as duas para 15


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afastar o sofrimento. Por que ele ansiava para oferecer a Sirena esse tipo de consolo era algo que o aturdia. Obrigando-se a ignorar o desejo, passou os olhos pelas mudanças que ela havia feito no acordo, pensando que talvez tivesse sido mais egocêntrico do que se dera conta, já que estivera o tempo todo concentrado no que a criança significava para ele, como sua vida mudaria, como abriria espaço para ela e o que faria por seu herdeiro. No que ele queria. Subitamente, estava vendo e ouvindo o que Sirena queria, e não era feri-lo. Ela possuía múltiplas formas de fazê-lo, se quisesse, mas suas mudanças no documento tinham mais a ver com manter o bebê junto dela do que afastá-lo dele. — Você alguma vez chegou a pensar em interromper a gravidez? — perguntou ele com repentina curiosidade. — Sim. Eu só estava grávida havia poucas semanas quando descobri. Parecia haver uma porção de bons motivos para não levar a gravidez adiante. Mas eu... eu não conseguiria arrancá-lo da minha vida assim. Quero este bebê, Raoul. Eu sei que é tolice deixar que você saiba o quanto o quero. Você vai dar algum jeito de usar isto contra mim. Porém, preciso que você acredite no que digo. Eu nunca vou deixar ninguém tirar meu bebê de mim. Sirena estava revelando o tipo de instinto materno atávico que seus ancestrais das cavernas teriam valorizado em uma companheira. O macho alfa que existia nele exultou ao ver tal qualidade na mãe de seu filho, enquanto o negociante implacável que havia nele reconheceu um adversário feroz. — Você está tentando me convencer de que eu não posso comprá-la. — E não pode. O único motivo pelo qual estou falando com você a este respeito é para dar ao meu bebê as mesmas vantagens que o pai dele pode proporcionar a seus futuros irmãos, sejam elas monetárias, sociais ou em termos de apoio emocional. Considere quais podem ser enquanto você analisa o resto disso — disse ela, indicando o documento com a cabeça e sumindo no toalete novamente. Futuros irmãos? O cérebro de Raoul virou um quadro branco vazio enquanto se segurava para não dizer que não havia esperado nem por esta criança; ele certamente não estava pronto para pensar em outras.

Três meses depois, Raoul tomava medidas para garantir que estaria pronto para o parto, limpando sua agenda para dali a seis semanas. Raramente tirava férias e achava que passar o Natal com a mãe já era um teste de resistência contra a pressa de voltar ao trabalho. No entanto, estava ansioso e cheio de energia para essa folga. Seria porque era um novo desafio? Ou porque veria Sirena? Ele se fechou contra esse pensamento. O bebê era seu único interesse. Estava curioso para descobrir qual o sexo, saber que era saudável e ter a confirmação definitiva de que era dele. Não que tivesse muitas dúvidas a esse respeito. Fiel ao acordo entre eles, Sirena 16


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havia lhe enviado atualizações sobre a saúde do bebê. Nada sobre ela, Raoul percebera com vaga insatisfação, mas imaginava que seria informado se houvesse algum problema. O segundo ultrassom, feito mais tarde, não revelara com certeza que seria um menino, então presumira que seria menina, e se surpreendeu embevecido com a visão de uma filha com cachos escuros e encantadores olhos verdes. Quanto à paternidade, em sua cabeça o fato de Sirena ter assinado o acordo fazia com que a criança fosse dele. O teste final, depois do parto, era uma formalidade que daria início aos procedimentos para que o acordo fosse cumprido, só isso. E tudo seria dali a um mês e meio; agora ele tinha pessoas para organizar. Que estavam agitadas com a notícia de que o dedicado diretor de sua empresa multinacional de software estaria tirando uma licença prolongada. Apenas um punhado de seus subordinados mais próximos e confiáveis sabia o motivo e, ainda assim, não imaginava quem era a mãe. As circunstâncias escandalosas da infidelidade e do suicídio de seu pai haviam feito de Raoul um homem circunspecto. Sua nova assistente, srta. Poole, entrou na reunião com uma expressão preocupada no rosto. — Eu disse que só se fosse assunto de vida ou morte, srta. Poole — lembrou-lhe ele, tentando ser paciente. — Ela é muito insistente — disse a mulher alta e magra, levando um celular até ele. — Quem? — Ele evitou a tempo a pergunta, Sirena? A tenacidade dela era algo que ele viera a respeitar, ainda que nem sempre a apreciasse. — Molly. Sobre seu acordo com a srta. Abbott. Ele não conhecia nenhuma Molly, mas algo sobrenatural pesou em seu peito como se fosse o salto de uma bota, agudo e doloroso, causando uma pressão que se espalhou como ondas em um lago onde alguém tivesse jogado uma pedra. Estranho. — Sim? — disse Raoul, ao atender o telefone. — Sr. Zesiger? Eu sou a parteira de Sirena Abbott. Ela me pediu que o informasse de que o bebê está a caminho. — Está adiantado — protestou ele. — Sim, eles tiveram de induzir... — Ela se interrompeu. Ele ouviu uma conversa abafada do outro lado e prendeu a respiração enquanto se esforçava para entender o que era dito. Ela voltou. — Acabo de ser informada de que haverá uma cesariana de emergência. — Onde ela está? — Pelo que me disseram, o senhor só deveria ser informado disso e de que um teste de paternidade seria solicitado, não que estaria presente... — Poupe-me dos telefonemas que eu faria para encontrá-la para que eu possa ir logo — atacou ele. A mulher fez uma breve pausa antes de lhe dizer o nome do hospital e depois acrescentou: 17


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— Mas os resultados não sairão antes de vários dias. — Diga a ela que eu estou indo — disse Raoul, mas Molly já havia desligado.

Capítulo 4

Uma senhora abordou Raoul na recepção do hospital. De óculos vermelhos, usava um pulôver tricotado à mão e o cabelo preso em uma trança grossa. Sua expressão era séria. — Raoul? Eu sou Molly. — Ela estendeu a mão e sorriu tensa. — Sirena me disse que eu o reconheceria quando o visse. O bebê é uma menina. Amostras de sangue foram colhidas na sala de parto e os resultados devem chegar em alguns dias. — A mulher parecia preocupada e desconcertada. Talvez porque não quisesse dar a ele muitas esperanças. O bebê nascera, o momento em que tudo se esclareceria estava próximo. A rapidez do procedimento o surpreendeu. E mesmo surpreso e um pouco confuso, Raoul reconhecia sua vontade de conhecer a criança e descobrir se era dele. Uma menina. Não tinha percebido o quanto desejava uma. E o parto ocorrera sem problemas. A ligação abrupta e a falta de detalhes o aborreciam, porém, mãe e filha estavam ótimas. — Fico satisfeito em saber que passam bem — Fez um gesto para que a mulher apontasse o caminho para o quarto de Sirena e da bebê. Molly não se moveu. — Os prematuros são sempre mais frágeis, mas o pediatra está confiante de que ela apresentará progressos. — Molly pareceu hesitar. — E Sirena? — perguntou Raoul. Uma vozinha dentro da cabeça dele o avisou para que se preparasse para a resposta nem bem terminou de fazer a pergunta. Um medo inusitado tomou conta dele e se espalhou como se fosse veneno, uma coisa não desejada e que enrijecia seu corpo com negação e recusa, antes mesmo de saber o que Molly diria. Os olhos de Molly se encheram de lágrimas. — Eles estão fazendo tudo que podem. Por um bom tempo, nada aconteceu. Nenhum movimento, som, nada. Em seguida, vindo de longe, Raoul ouviu um suspiro rasgado, como se fosse um último sopro de vida. Não. As palavras dela não faziam sentido. — O que aconteceu? — Pergunto-me se Sirena lhe contou sobre sua condição. Foi uma gravidez de 18


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risco desde o começo. Pressão alta, depois pré-eclâmpsia. Sirena estava conseguindo levar todos os problemas nas últimas semanas, tentando dar mais tempo ao bebê para que ele se desenvolvesse. Hoje não foi possível esperar mais sem colocar em risco a vida da mãe e da criança, e por isso os médicos induziram o parto. Depois de Sirena ter uma convulsão, optaram por uma cesariana. Ela perdeu muito sangue. Sinto muito. Posso ver que é duro para você ouvir isto. Se era duro? Toda a sua força se esvaíra, deixando-o com frio e vazio. Sufocado pelo medo. A vida de Sirena estava por um fio e ela nem se preocupara em contar. Ela também poderia ter engolido uma cartela de comprimidos e se deixado ficar para ser encontrada por ele, quando Raoul voltasse da escola. De repente, tinha 9 anos de novo, mal compreendendo o que estava vendo, incapaz de conseguir qualquer resposta do corpo que ele chacoalhava com toda a sua força. Não chegara a tempo. Sentira-se impotente diante daquilo. — Por que diabos ela não disse nada? Molly balançou a cabeça, perplexa. — Sirena não falou sobre o acordo de custódia, mas tive a impressão de que as coisas haviam se tornado um tanto hostis. A ponto de esconder dele que sua vida estava em perigo? — Não quero que ela morra! — A palavra saiu de forma irregular e inesperada. Raoul falou aquilo de todo o coração, olhando de um jeito para Molly que a fez estremecer. — Ninguém quer — assegurou-lhe serenamente Molly, com a voz típica de quem está acostumada a lidar com vítimas. Era o mesmo tom prudente e distante que a assistente social tinha usado depois de examinar o corpo jovem do pai de Raoul. — Leve-me até ela! — ordenou. Uma onda horrível de medo, como nunca sentira, tomou conta de seu corpo. Queria correr, gritar por Sirena. Aquilo não era real. Não poderia ser. — Não posso. Mas... bem, talvez possamos entrar no berçário. Raoul forçou-se a caminhar, como se atravessasse uma parede gelatinosa, densa e sufocante, ao seguir Molly até a UTI neonatal. Ele era o responsável pelo estado atual de Sirena? Raoul realmente queria o bebê, mas a ideia de que aquela vida poderia custar outra o atormentava. Aproximou-se da incubadora onde estava a menina, quase nua. Era um bebê pequeno, usava apenas uma fralda, bem maior do que ela. Havia fios conectados ao seu corpo frágil e seus lábios, cópia em miniatura da boca da mãe, estavam fechados na forma de um beijo. Não conseguiu ver nada de seu na menina, embora a necessidade de cuidar e de proteger aquele bebê nascesse dentro dele. Colocando as mãos geladas no vidro quente da incubadora, implorou em silêncio para que a garotinha aguentasse firme. Era tudo que sobraria caso Sirena... Recusou-se firmemente a continuar pensando naquela possibilidade. Em vez disso, empenhou-se em transmitir um pensamento profundo e imperativo através das paredes até o local desconhecido onde estava a mãe daquela criança. Aguente firme, 19


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Sirena. Aguente.

Sirena acordou sentindo-se mal como jamais se sentira. Todo o seu corpo doía, sua boca estava seca e sentia-se nauseada. Em seu torpor, colocou a mão sobre a barriga, na qual a forma sólida de seu bebê tinha sido substituída por curativos e uma cinta macia. Um gemido de angústia escapou de seus lábios. — Lucy está bem, Sirena. — A voz de Raoul soou quente e reconfortante, apesar de claramente amarga. — Lucy — disse ela, piscando os olhos. O teto era branco, o dia doía de tão brilhantemente claro. Aos poucos, o aço acinzentado do olhar de Raoul tornou-se nítido. — Não foi isso que você disse à Molly? Que desejava que sua filha tivesse o nome de sua mãe, Lucille? Você não se importa?, quase perguntou, mas não tinha certeza de onde estava o teste de paternidade. Ao assinar os formulários de consentimento, foi avisada de que aquele exame era complexo, admissível no tribunal e que levaria vários dias para ficar pronto. Perguntou a si mesma se a espera pelo resultado tinha sido a única coisa que o impedira de levar Lucy daquele hospital antes que ela acordasse. Sirena não conseguia falar, sua boca parecia cheia de bolas de algodão. Precisou de toda a sua energia e concentração para permanecer impassível. Vê-lo deixava-a tão aliviada que só desejou poder explodir em lágrimas. Lembrou a si mesma para não tirar segundas conclusões baseada na péssima aparência dele, sua barba por fazer, as olheiras sob os olhos. O homem era uma máquina quando se tratava de trabalho; poderia ter ficado até mais tarde no escritório e não ter tido tempo de passar em casa. Ainda assim, a barba de dias a excitou. Tinha visto Raoul tantas vezes e sempre experimentava aquele tipo de atração. O mesmo desejo de acariciar seu rosto áspero. Não hoje, contudo. Naquele momento, ele estava desarrumado de um jeito sensual, mas seu comportamento era antagônico, fazendo com que Sirena sentisse um arrepio de apreensão quando ele falou com a voz rouca. — Você deveria ter me contado que não estava bem de saúde. A acusação dura foi tão cortante que ela se encolheu. Só conseguia se lembrar do medo que sentira quando lhe disseram que o parto teria de ser feito imediatamente. Temeu não pelo bem de Lucy, mas por si mesma. O medo que sentira fora tão grande que chegara a ponto de implorar a Raoul para que ficasse junto dela. Mas Raoul a odiava. Não se importava com ela. Como sempre, estava sozinha. Aguentou o início das contrações sem ninguém ao seu lado. Telefonou para Molly apenas quando a enfermeira confirmou que o trabalho de parto tinha realmente começado. Foi quando pediu para avisarem Raoul. Estava explicando isso à Molly quando as coisas começaram a se complicar. Sirena nem mesmo sabia o que tinha acontecido. Havia um enorme e enervante 20


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vazio em sua memória. Raoul culpando-a por não o avisar antes de suas condições de saúde era um insulto, além da confirmação de que ela o machucara. Então, imediatamente, ficou na defensiva. — Por que eu lhe contaria alguma coisa? — perguntou em voz fraca, mas em um tom de desafio, aproveitando o fato de estar em desvantagem, deitada na cama e atada a fios e tubos. — Você não deve estar feliz por eu continuar viva. — Você ainda não escapou do perigo — disse ele inclinando-se para a frente de um modo que fez o coração dela saltar. Raoul a segurou e se inclinou ainda mais sobre a mulher, como prometendo uma revanche, apesar da condição em que se encontrava. — E nunca mais me acuse de uma coisa tão horrível assim de novo. Sirena tentou tossir; não conseguiu. Sentia sua língua áspera, os lábios ressecados. — Posso beber um copo de água? — pediu em um sussurro. — Por favor? Estou com muita sede. — Não sei se é permitido você ingerir qualquer coisa — respondeu ele. Um brilho ávido e desesperado surgiu em seus olhos, lembrando um falcão prestes a atacar sua presa. Seus lábios cobriram os dela por um breve segundo. A língua de Raoul percorreu sua boca, umedecendo cada pedaço que antes padecia de secura. O alívio foi incrível e o gesto, íntimo e surpreendente. — Direi à enfermeira que você está acordada. Raoul saiu do quarto deixando-a sem palavras e tremendo com o retorno da vida ao seu corpo. Sua mente estava confusa; Sirena temeu ainda estar inconsciente e alucinando.

Pensou que nada a afetaria tanto quanto constatar a fragilidade da filha prematura. Depois, ouviu as histórias de Raoul aprendendo a trocar fraldas e a alimentar o bebê, sem saber se era ou não o pai. Soube também que ele ainda falara incessantemente com ela durante o coma, dizendo o quanto temia que não acordasse mais. Só fora para casa tomar um banho e dormir depois que Sirena acordara, quase 72 horas depois do nascimento de Lucy. Ela disse a si mesma para não tomar aquele comportamento como um sinal de carinho. Se Raoul estava cuidando da menina, fazia isso apenas para provar que a mãe era dispensável. Até certo ponto era. Aprendera rapidamente a forma certa de segurar o bebê nos braços, mas estava muito doente e fraca para qualquer outra coisa. Tirava seu leite com uma bomba de sucção, apenas para que não secasse, na esperança de que, um dia, pudesse amamentar. Por causa de todos os remédios que a mãe tomava, Lucy precisava ser alimentada com leite em pó. Abatida e arrasada por sentir que perdia os primeiros momentos da vida da filha, Sirena arrastou-se de volta para a cama, esgotada pelo pequeno ato de escovar os dentes. Raoul entrou no quarto quando ela tentava escalar o leito com as pernas nuas. Rapidamente, então, ela tentou ajeitar a camisola do hospital. 21


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Apesar das olheiras tênues sob os olhos, Raoul parecia tão bonito e seu cheiro era tão familiar, tão bom. Por um segundo, Sirena viu-se de volta ao escritório, compartilhando o café com ele enquanto discutiam o que enfrentariam no dia. Raoul a olhou feio, embora isso pudesse ter sido uma reação à careta que Sirena fez para ele. Tinha sido proibida de beber café desde o início da gravidez e era isso justamente o que ele trazia. Raoul era o retrato de tudo o que ela não poderia ter. — Por que você está aqui? — perguntou, esforçando-se para subir na cama. Ele, de modo tranquilo, caminhou até ela, deixou o copo de café de lado e a ajudou na empreitada. — Eu não... Sirena enrijeceu, rejeitando-o, mas Raoul a envolveu nos braços mesmo assim. A pressão do calor do corpo dele passou pelo tecido e queimou-a quando ele a abraçou de leve para erguê-la. Sua mão livre acariciava a perna da bela mulher enquanto a colocava na cama, como se Sirena não pesasse mais do que um gatinho. Tremendo, ela puxou o lençol até o queixo e olhou para Raoul. Ele pegou seu café e tomou um gole, encarando-a com expressão impassível. — Seu médico disse que o resultado do teste de paternidade chegou quando ele fazia a ronda do turno da manhã. Sirena sentiu o coração afundar. Não estava preparada para enfrentar aquilo. Dormira mal na noite anterior; assombrada por pesadelos nos quais Raoul desaparecia com a filha. Nos quais ele desaparecia de sua vida de novo. Por que era tão importante aquele homem estar em sua vida? Sirena não sentia nada além de ódio e desconfiança em relação a ele. As semanas que ficara sem vê-lo, entretanto, enquanto esperava o desenrolar de sua gravidez, foram as piores de sua vida, piores até do que a partida de sua família para a Austrália. A razão lhe dizia que não valia a pena dar valor àqueles sentimentos, mas ela sentia uma onda de prazer sempre que o via. Quando Raoul estava no quarto, o desejo que a consumia durante a ausência era saciado e as sombras que habitavam nela se evanesciam Contudo, não poderia se esquecer de que era o inimigo. E estava ficando sem defesas. Raoul percebeu seus temores. — O que foi? Você parece apreensiva. Teme que eu possa ser o pai? Ou está assim porque sabe que sou? A pergunta desconcertante rondava seu coração como se fosse um inquisidor espanhol. — Você vai tomá-la de mim caso seja o pai? “Caso seja?” Maldição!, pensou enquanto a tensão de não saber se era o pai da menina crescia em seu peito. Os últimos três dias tinham sido infernais e, quanto mais se afeiçoava à pequenina, mais temia que fosse de outro homem. Assim como a mãe. 22


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— Poderia tê-la tirado de você uma dúzia de vezes — rosnou ele. — Deveria tê-la levado. Aquilo não era de todo verdade. O hospital tinha permitido que ele visitasse o bebê, mas apenas porque Raoul era o tipo de homem que não desistia até ter o que desejava. Não deixariam, porém, que ele saísse de lá com a menina. Se Sirena acreditasse que isso poderia ter acontecido, ótimo. Queria puni-la por não lhe ter contado sobre seu estado de saúde. Suas mãos jaziam sobre o lençol, sem forças. Sirena, aliás, estava pálida, sua tez, acinzentada, sem cor. Sentia que ia desmaiar de novo. Raoul ajudou-a a se recostar nos travesseiros. Ela tentou evitar aquele toque. Seus olhos revelavam a frustração por se sentir tão vulnerável, a dor física, o estado defensivo que se encontrava diante da audácia que Raul teve em tocá-la e também terror. Um terror genuíno brilhava no verde de seus olhos. É uma vantagem para mim, pensou ele, tentando livrar-se do incômodo que sentia, mas a culpa e a autoaversão pesavam dentro do peito. Tudo em que conseguiu pensar foi nas horas que passou ali, dizendo a Sirena o quanto era injusto uma criança crescer sem um dos pais. Laços sanguíneos não importavam naquele momento. Lucy e ele tinham sido ligados pela perspectiva de ela sofrer uma dor que ele conhecia, um lance do destino cruel para uma criança que apenas começava sua vida. O tempo todo, Raoul implorava para Sirena aguentar firme, catalogava em sua mente tudo o que sabia sobre ela, desejando ser para Lucy a fonte de informações sobre a mãe. Enquanto isso, tudo aquilo que ouvia em sua mente era a voz rascante dela perguntando: O que o faz pensar que me conhece, Raoul? Seu coração afundou. Sirena queria aquele bebê. E Raoul sabia bem disso. Quando ouviu todos os detalhes sobre a gravidez que quase a matou, perguntou-se sobre os sentimentos daquela mulher pelo pai da criança. Esse homem ao menos sabia o quanto Sirena esteve determinada a ter a filha? Se aquele homem fosse ele... Raoul ficava tenso ao pensar naquilo. Não queria saber a resposta, pois isso o colocaria em dívida com ela. O médico entrou no quarto, afastando a tensão com uma expressão séria. — Bom dia. Sei que você estava esperando o resultado, Raoul. Deixe-me tranquilizá-lo. Você é o pai biológico de Lucy. Uma sensação de alívio tomou conta de seu ser, como se o sangue voltasse a circular pelo seu corpo, enchendo-o de confiança e orgulho: era uma menininha cheia de vontade de viver. Sirena não esboçou nenhuma reação. Manteve seu rosto virado, como se Raoul e o médico nem mesmo estivessem no quarto. — Não tenho planos de tomá-la de você! — explodiu ele. As palavras saíram de sua boca antes mesmo que percebesse. Sirena o olhou com os olhos cheios de lágrimas e descrença, o que o fez recuar. O médico a distraiu, fazendo perguntas sobre a cicatrização da cirurgia, deixando 23


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Raoul lidar com a realidade por alguns instantes: jamais poderia separar mãe e filha. A acusação que Sirena lhe fizera no dia anterior, quando acordara, de que ele tinha desejado que ela morresse, fez com que Raoul se sentisse tão mal a ponto de ficar sem palavras. — Quando posso levar minha filha para casa? — perguntou Sirena ao médico. — Você não vai levá-la para seu apartamento — afirmou Raoul, preocupado com o quanto se encontrava doente e fraca. — Mas você acabou de dizer... — Eu disse que não seria tão baixo a ponto de roubar o seu bebê de você, que estava mais do que preparada para tirar Lucy de mim, não é? — A verdade era bem clara. — É você quem está acostumada a roubar, Sirena, não eu. A humilhação tornou rubro o rosto dela. O médico fez um esforço para apaziguar o impasse antes de deixar o quarto. — Vamos nos preocupar em deixar você e Lucy bem de saúde, depois discutiremos onde ela irá morar, certo? — O contrato está valendo a partir de agora — disse Sirena assim que o médico saiu. — É mesmo. Depois de tudo o que fez para me impedir de saber que a bebê é minha filha? — Raoul parecia furioso. — Como você pôde fazer isso? Eu perdi meu pai, Sirena. Sei como é crescer sem um. — E eu perdi minha mãe. Por qual motivo acha que enfrentei o homem mais impiedoso do mundo? Você sabe de verdade como fazer uma mulher se sentir mal, Raoul. Eu nem consigo andar direito até o corredor e você se diverte fazendo jogos mentais estúpidos. Não irei pegá-la, mas você não pode tê-la. Talvez você merecesse um lugar na vida dela, caso mostrasse um pouco de compaixão. O silêncio surgiu entre eles. Sirena cobriu os olhos com o braço, tentando conter as lágrimas e concentrandose em respirar e se recompor. A pior parte é que se sentia horrível por tentar mantê-lo distante de Lucy. Raoul tinha o direito de estar bravo, com aquela situação e com o roubo. Sua vida estava um caos e ela não sabia como arrumar aquela bagunça e seguir em frente.

— Ei. — Raoul chamou em um tom zangado que veio de muito perto da cama. Sirena abaixou o braço e olhou para ele, surpresa ao perceber que trouxera uma cadeira de rodas para ela. — Vou levar você para ver Lucy. Vamos nos acalmar e começar a conversar como adultos. — Não seja bonzinho comigo. — Ela gemeu. — Isso faz com que eu me sinta horrível. — Você deveria se sentir assim Raoul a ajudou a sair da cama e a sentar-se na cadeira de rodas. 24


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— Eu a amo mais do que você imagina, Raoul. E você foi horrível, tentando tirá-la de mim no momento em que soube que eu estava grávida. O que mais eu poderia fazer a não ser mentir sobre a paternidade? — Você está errada. Sei que você a ama. Eu sinto o mesmo por ela. E foi por isso que agi de forma tão dura. Não sabia sobre sua mãe, pensei que você estivesse me punindo pela acusação de roubo. — Não — murmurou sem defesa. — Fiquei brava com isso, mas... eu apenas queria ser mãe dela. — O que aconteceu com sua mãe? A voz de Raoul soou mais profunda e tranquila do que Sirena já ouvira, fazendo-a sentir-se pior por tentar tirá-lo da vida da filha. Não sabia como Raoul havia perdido o pai, mas tinha certeza de que aquela conexão que sempre sentiu com ele vinha de uma dor compartilhada, como se procurasse um meio, mesmo que inconsciente, de ligar-se a ele. — Da mesma forma que quase perdi Lucy. As complicações dela foram diferentes, então não é um problema hereditário. Eu tinha apenas 6 anos quando minha mãe morreu, não tenho muitas lembranças, é por isso que perdê-la doeu tanto. Não posso suportar a ideia de Lucy crescer, tornar-se adolescente, ter namorados, filhos sem a mãe ao lado dela. Por mais que estivesse ressentida com ele, queria que Lucy tivesse o pai por perto.

Depois de alimentar e trocar a filha e saber dos seus progressos, Raoul levou Sirena de volta ao quarto. Ela estava quieta; era visível sua exaustão, apesar de o silêncio entre eles não ser mais hostil. Quando aquele homem forte a ajudou a subir na cama, ela murmurou: — Muito obrigada. — Depois caiu no sono. Sirena era do tipo feroz, briguento, e agora ele entendia o motivo. A imensa falta que ela sentia da mãe o encheu de pesar. Seu ressentimento: nunca sonhei que ela fosse capaz de roubar, estava se transformando em: ela é melhor do que parece. Raoul não gostou daquela mudança. Aquilo o fez pensar sobre os motivos dela para roubar. Não queria ter compaixão e perdoá-la pelo que fizera. Os oportunistas tiravam vantagem de emoções fracas como afeição e confiança. Entretanto, não tinha dúvidas de que ela amava a filha. Enquanto estavam no berçário, ela parecia a antiga Sirena: feliz, engraçada e divertindo todos à sua volta. Raoul teve de se conter mais de uma vez, lutando contra o desejo de parar de se defender e cair sob o feitiço dela de novo. Carrancudo, tentou imaginar como aquela situação impossível se resolveria. Uma ideia tola formava-se em sua mente; conforme o tempo passava, era tudo em que conseguia pensar.

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A trégua entre eles durou até a semana seguinte. Sirena e Raoul passavam a maior parte do tempo juntos. Sirena parou de usar a cadeira de rodas e começou a amamentar. Enfrentar a realidade de não poder levar a filha para morar com ela a devorava por dentro, porém. Quando o médico lhe deu alta, deveria ter ficado feliz, mas se sentia de tal maneira sufocada por seus medos que mal conteve as lágrimas. Raoul chegou no exato momento em que isso acontecia. Usava terno e gravata. O paletó dobrado, jogado sobre um ombro, manchado pela chuva típica do fim da primavera. Não havia tempo para Sirena se preocupar com qualquer outra coisa quando existia algo maior a afligi-la diante de sua cama no hospital. Uma aflição morena, linda e com desejos de vingança. — Eu disse, há uma semana, que você não levaria Lucy para o seu apartamento — lembrou ele, sem nenhuma emoção na voz. Era essa a discussão que Sirena estava evitando, mas ainda não se encontrava preparada para ela. — E eu estou bem certa de que assinamos um acordo que dizia que eu poderia levá-la para minha casa — respondeu. — Uma flor pisoteada tem mais força do que você. E se alguma coisa acontecer? Não. Vocês vêm para casa comigo — encerrou ele. Por alguns segundos, Sirena nem ao menos conseguiu piscar. Uma voz fraca perguntou do fundo de sua alma: Eu também? Não apenas Lucy? Seu coração disparou e a excitação correu pelo seu corpo. Recomponha-se, Sirena! — Raoul, os pontos da cesariana ainda não foram tirados. Não me faça rir — respondeu ela, tentando arrumar os cacos de seus pensamentos espalhados por sua cabeça como os vidros de uma janela recém-quebrada. Ficar na casa dele? Com ele? Sirena já se sentia vulnerável só em vê-lo durante o dia. Viver com Raoul acabaria de vez com seu orgulho e a deixaria em dívida com ele. — Sim, você ainda está com pontos — concordou ele, fazendo graça. — Pontos, tubos e recebendo sangue de outra pessoa. Está tomando remédios que deixam sua cabeça confusa e tem compromissos médicos e um bebê para cuidar. Não pode fazer tudo isso sozinha. No fundo do seu coração ela contava com um milagre, a ajuda de sua irmã, mas é claro que isso não funcionaria. Seu pai estava desempregado e não poderia pagar uma passagem de avião. Além disso, era o primeiro semestre de Ali na universidade, o motivo de Sirena ter enviado aquele dinheiro meses antes. Tinha amigos a quem poderia recorrer em um momento de aperto, mas não do tipo que ajudava de forma incondicional, que era o que ela necessitava nas primeiras semanas em casa. A frustração transpareceu em sua voz. — Por que você está sugerindo isso mesmo? Não quer nada comigo — acusou, deixando à tona o medo que a afligia. Raoul fez um movimento de cabeça ao mesmo tempo arrogante e condescendente.

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— Você pode não ser minha escolha ideal para mãe da minha filha, mas não posso passar por cima do fato de que você é ou de que a ama tanto quanto eu. Nós dois queremos estar com ela, e você precisa de cuidados. Levá-la para minha casa é, com certeza, a solução mais prática. A forma direta com a qual ele falou não ser minha escolha ideal a enlouqueceu. Sabia que estava horrível, descabelada, sem maquiagem. E que seu corpo também estava um desastre. De repente, Sirena quis saber se Raoul estava saindo com alguém. Esse era o tipo de informação que ela recebia a toda hora, quando trabalhava com ele. O mais estranho foi descobrir, depois de ter sido despedida, que era pior ainda não saber. Como se sentiria ao saber que ele estaria com outra mulher enquanto estivessem morando sob o mesmo teto? — Nem ao menos nos gostamos. Isso seria um desastre. — Precisaremos passar por cima disso pelo bem de Lucy, não é? — perguntou ele. — Se eu fosse ter outro filho, cuidaria da saúde da mãe dele também. Você não me disse que espera que eu ofereça a Lucy as mesmas considerações que eu ofereceria a todos os meus filhos? O argumento dele era frio e exato. Também era a saída perfeita. Contudo, Sirena temia ceder à tentação. Bem no fundo, uma parte tola dentro dela achava que, se conseguisse a atenção dele, poderia lhe explicar tudo e, assim, merecer seu perdão. — Eu já lhe disse o quanto você consegue ser irritante quando pensa que tem a última palavra sobre tudo? — murmurou Sirena enquanto buscava por uma boa desculpa para refutar o que ele dissera. — Não penso que tenho a última palavra. Sei que tenho. O médico não vai liberá-la a menos que você receba cuidado intensivo. — Você é meu passe para fora da prisão? Quando põe as coisas dessa forma... Todos os músculos do corpo dele enrijeceram. — Tome cuidado, Sirena. Ainda estou levando em conta o fato de você estar fraca. Assim que ficar boa, não serei tão caridoso. — Você sabe que não posso fazer amor por mais cinco semanas, não é? — disse ela em tom de provocação. Raoul a olhou com piedade, o que a lembrou de que estava muito abaixo de seu melhor. Odiou a ambos naquele segundo. Por que lhe importava se ele estava atraído por ela ou mesmo se estivera um dia? — Bem, só ficarei em sua casa até que o médico diga que posso morar sozinha — murmurou ainda mais ruborizada, encarando a expressão implacável no rosto de Raoul. — Ficarei até me recuperar por completo. Depois Lucy vai para casa comigo. — Vamos falar disso quando essa hora chegar.

Apesar de sentir-se acolhida pelos jardins da casa em Ascot, Sirena estava gelada quando passaram pelos portões onde tinha esperado por ele, implorando pelo 27


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interfone que conversassem. Encontrá-lo ali naquele dia tinha sido uma questão de pedir um favor a um colega. Depois que fora despedida, os itens pessoais de sua mesa foram mandados para ela e suas chaves, seu crachá, o equipamento e seus cartões de despesas da empresa foram confiscados. Incapaz de olhar para o ex-chefe, pousou de leve sua mão no bebê que estava entre eles e balançou-o, embalada pelo movimento do carro, até o motorista parar na entrada da casa. Quando foi desafivelar o assento da menina, Raoul colocou a mãos sobre a dela. — Eu a levarei. Raoul entregou a sacola de fraldas para o motorista e saiu do carro com Lucy nos braços, dando a volta para encontrar Sirena. Ela tentou descer do veículo e ficou mais agradecida do que ressentida quando ele a ajudou, oferecendo seu braço como apoio. Os músculos dela queimavam com o esforço de manter-se sobre as pernas fracas. A dor irradiava do ponto onde começava a incisão da cesariana. Enquanto subiam as escadas, Raoul passou seu braço ao redor da bela mulher e quase a carregou no colo. Sirena quis protestar, mas não deixou de se recostar no braço dele, sentindo-se, ao mesmo tempo, fortalecida e trêmula junto ao corpo musculoso. Por fim, cedeu à atração e deitou a cabeça no ombro dele por um segundo, antes que o tom direto da voz de Raoul a trouxesse de volta à realidade. — Você não deveria ter recebido alta do hospital. — Não me sinto tão fraca assim — resmungou, afastando-se quando cruzaram a porta da frente. Ficar distante do toque dele a fez sentir-se mais fraca, e Sirena lamentou por si mesma. — Até mesmo no Peru consegui me virar sozinha. Vou melhorar. Preciso melhorar. Afundou-se no sofá aveludado do vestíbulo e segurou a cabeça entre as mãos. — Mas você não ficou doente em nossa viagem de negócios ao Peru, ficou? Metade do pessoal passou mal por intoxicação alimentar; não você. — Fiquei, sim. Mas cumpri minhas obrigações. Raoul não podia acreditar no que ouvia, que mulher impossível. — Você deveria ter me contado. Naquela época e agora. — Era meu trabalho, ora. Raoul a encarou sério. — Espero que você me diga quais são suas necessidades, Sirena. Não tenho a capacidade de ler mentes; vamos para seu quarto agora, assim você pode descansar. Consegue subir as escadas com minha ajuda ou devo mandar preparar um quarto aqui embaixo? — Lá em cima está bom, mas preciso amamentar Lucy antes de me deitar. Sirena adorava aquela casa e a decoração eclética e, como a tola que era, sempre 28


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tivera o sonho secreto de ser a dona do lugar. A sala para a qual Raoul a levou para amamentar a filha era uma de suas favoritas, pintada com cores mediterrâneas, com mobília contemporânea e vista para um jardim Por influência de sua mãe espanhola, Raoul adorava a sensualidade e o calor que as cores vivas traziam para a decoração, mas a explosão era bem temperada pela austeridade que herdara de seu pai suíço. Tinha sido educado na América, de onde trouxera elementos modernos: ali se misturavam elementos da pop culture, arte moderna e gadgets eletrônicos. Todas as suas propriedades eram elegantes, confortáveis e funcionais. E todas elas dispunham de um ingrediente que atraía muito Sirena: o próprio Raoul. — Você vai ao escritório esta tarde? — perguntou ela em dúvida se queria que ele saísse. Armar-se contra aquele homem sugava todas as suas forças; no entanto, outro lado dela precisava da presença de Raoul como se fosse um oásis no deserto. — A equipe me perguntou a mesma coisa; o lugar está um caos. Quando Lucy nasceu, eu tinha começado a deixar tudo em ordem para me ausentar no próximo mês. — Lamento — disse ela sentindo as palavras habituais saírem de seus lábios e pensando: Por que você está se desculpando? Não é sua culpa. — Um aviso sobre a possibilidade de um parto prematuro teria sido útil, você sabe. A observação arrogante dele a fez recuar. — Eu não precisava passar por mais estresse com você em cima de mim, me dizendo o que fazer — replicou Sirena cheia de rancor. — Segui as ordens do médico e tentei ir até o fim com a gravidez, e isso foi tudo o que pude fazer. Se o parto prematuro lhe causou inconvenientes, bem, isso é a paternidade. Acredito que nós dois estamos passando por ajustes. — Um pouco de comunicação seria bom, é o que estou dizendo. Guardar as coisas para si sempre atrai problemas. O tom de voz dele, embora tranquilo, soou como um alerta de perigo. — Ah, e você me deu uma boa oportunidade de me comunicar com o senhor depois de me informar, através de mandados de prisão, que sabia que o dinheiro tinha sumido? — Isso foi antes! Você poderia ter me dito que estava com problemas financeiros e teríamos pensado em alguma coisa. Roubar foi inaceitável. — Concordo com isso e esse é o motivo de eu ter apenas pegado emprestado. — Bem, isso foi o que você falou, mas... Lucy fez um barulho baixinho. Sirena sentou-se com rapidez, esperando que ele terminasse de falar. No entanto, Raoul parou de falar e começou a encarar abertamente o seio nu da bela mulher. E ela chegou à conclusão desmoralizante de que não havia dignidade no parto, nem durante, nem depois. Você precisa das duas mãos para cuidar de um recém-nascido, o que não deixava muito espaço para coisas cheias de armações e fechos, como um sutiã. — Você a faz arrotar — ordenou Sirena, tomando consciência de sua nudez 29


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parcial, cobrindo-se assim que ele pegou o bebê. Foi um momento estranho, que antecipava a noção do quão sua estada ali seria conturbada. Raoul ajudou Sirena a subir as escadas alguns minutos depois, fez com que se deitasse, cobriu-a e colocou uma babá eletrônica na mesa de cabeceira ao lado dela. Uma onda de lágrimas quase a sufocou. Um misto confuso de gratidão e alívio, com uma boa dose de frustração e medo do desconhecido tomou conta dela. Não era assim que esperava que sua vida fosse acabar; não sabia o que viria a seguir. Não podia confiar nele, embora precisasse, pelo menos por hora, enquanto seu corpo se recuperava o bastante para levá-la adiante, para onde quer que ela fosse. Esforçando-se para manter os olhos abertos, apesar de suas pálpebras pesarem de sono, Sirena disse: — Não vi em qual quarto você a colocou. Não sei para onde ir se ouvi-la chorar. — A babá eletrônica está aqui para que eu possa ouvir você, Sirena, e monitorar seu sono. Coloquei um berço em meu escritório para Lucy. Aquilo a emocionou. Ficou claro que iria mesmo cuidar delas. Adormeceu assim que um cobertor foi colocado sobre seu corpo.

Em dúvida, Raoul desejou colocar a mão sobre o rosto dela para verificar a temperatura, mas não quis perturbá-la; ela precisava muito descansar. Contudo, insistia em lutar com ele a cada instante. O que aconteceria quando se recuperasse? Raoul queria a velha Sirena com seu humor afiado de volta. A hostilidade e o perene tom de desafio eram novos e desconcertantes. Quanto de sua personalidade fora suprimida quando trabalhavam juntos, por ele ser o chefe e ela, a empregada? Raoul fez uma careta. O roubo não condizia com as atitudes da mulher que encarava o trabalho mesmo estando doente em uma terra estranha. Nem com a coragem da mulher que enfrentara praticamente sozinha uma gravidez de alto risco para dar um melhor começo de vida a um bebê cujo nascimento poderia tê-la matado. Ele jamais esqueceria a imagem de Sirena, pálida e inconsciente, cheia de tubos e fios que a mantinham viva. Apenas por isso ele já lhe devia consideração. E, pelo menos, a chance de se recuperar. O amor óbvio que ela sentia pela filha também o tocava. A preocupação que demonstrava após cada exame médico, o modo como o procurava em busca de proteção e auxílio. Uma parte cínica de Raoul o advertiu sobre o perigo de se envolver de novo, mas o carinho daquela mulher pela filha deles era bastante verdadeiro para ser tomado como algo fabricado. E ainda havia a atração sexual tão intensa como sempre, apesar de Sirena estar fraca e pálida. Raoul não conseguiu deixar de admirar seu seio nu. O bumbum era maravilhoso, todo arredondado, e implorava para ser acariciado. Sempre que chegava perto o suficiente para sentir o cheiro dela, queria puxá-la para si e beijar a boca carnuda, cheia de respostas inteligentes a dar. Esfregou o rosto, mais preocupado do que nunca com uma mulher que nem sequer deveria ter tocado. Precisava trabalhar, ocupar-se. Estudar tinha sido sua válvula de escape, algo que o manteve são quando tudo o que conseguia pensar era na 30


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razão desconhecida do suicídio de seu pai. Desde os 20 anos, uma vez que os problemas financeiros de seu padrasto vieram à tona, sua missão era recuperar as finanças da família. A urgência da tarefa atuara como antídoto contra sua angústia. Ainda bem que, apesar de ter largado a universidade, Raoul conservara uma versão básica de um software que criara. Vendê-lo ajudou-o a diminuir a sensação de fracasso por não perceber o que seu padrasto estava fazendo. Acumular dinheiro e propriedades como quem acumula meias ou clipes dava uma sensação de segurança. Era a garantia de que poderia cuidar de sua família. Uma família que, agora, incluía uma criança indefesa. O que lhe dava mais motivação do que jamais sentiu. E a mãe do bebê? Raoul sentou-se à mesa de trabalho e ajustou a babá eletrônica, observando-a até que ouviu o suspiro de Sirena, imaginando onde aquela mulher incrível se encaixaria, em longo prazo, em sua vida.

Capítulo 5

Em alguns pontos, viver com Raoul era bem fácil. Por já terem trabalhado juntos, haviam estabelecido uma espécie de comunicação que quase prescindia de palavras. Essa foi a base para a nova fase do relacionamento entre os dois. Sirena conhecia os humores dele, entendia as pequenas indicações no comportamento, que possivelmente significavam que iriam conviver por um longo tempo, e já conhecia os limites que Raoul impunha ao abrir espaço para ela na vida dele. Além disso, era do tipo que se dedicava integralmente ao trabalho; Sirena sempre sabia quando se afastar em silêncio para um dos muitos cantos discretos da casa antes que ele tivesse uma folga e fosse ver a filha. Ficar fora da vista dele não significava que não pensava naquele homem E por que, em nome de Deus, tinha de pensar nele o tempo todo? Era como se um radar dentro de seu peito o encontrasse, sinalizando ininterruptamente a presença imperiosa. Não importava quantas vezes já dissera a si mesma para ignorá-lo: saber o quanto estava perto de Raoul fazia Sirena se lembrar da tarde chuvosa e apaixonada que passaram juntos. Sentia-se uma tola... Idealizar daquela forma um encontro que, para ele, não passara de um antídoto contra o tédio. Sabia que precisava voltar a seu apartamento o quanto antes, mas seu retorno estava condicionado a outros fatores, o que a deixava ansiosa. — Era o médico? — perguntou Raoul assustando-a. Sirena pensou que ele estivesse no escritório. Tentando disfarçar a forma como se alegrara ao ouvir aquela voz, cruzou a sala para colocar o telefone sem fio na base.

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— Era Indra, minha vizinha. Sua pele formigava, o calor espalhava-se por seu rosto. Esbarrar com ele pela casa a todo instante era insuportável. — Aconteceu alguma coisa? Você parece preocupada. Quis gritar. Não me analise! Nunca imaginou que sentiria saudades da época em que era apenas mais uma peça na engrenagem do escritório de Raoul. Agora, ele observava cada movimento seu, como se tentasse pegá-la em uma mentira. — Tudo está ótimo — respondeu com falsa indiferença. — Ela só queria saber como estou e quando voltarei. E se pode hospedar a sobrinha e o marido em meu apartamento por algum tempo. — O que você respondeu? — Que gostaria de ajudá-la, mas que logo estarei de volta. Pronto. Ela dera início à discussão. Raoul a encarou com firmeza. — O que o médico disse? — Para eu não entrar na piscina por mais uma semana. No entanto, posso fazer pequenas caminhadas, desde que descanse. Aparentemente, ele não sabe que os bebês trocam a noite pelo dia. — Mas por que você não me falou? Posso ficar com Lucy durante a noite. — E para quê? Você não pode amamentá-la. Oh, meu Deus, por que dissera aquilo? Agora, tudo em que conseguia pensar era Raoul nu, seu peito másculo, emoldurado por músculos e uma fina camada de pelos. Pare! Virou-se para esconder o rosto corado pela imagem em sua mente. — Posso prepará-la para dormir tão bem quanto você — argumentou. Sirena ficou tensa. Ele estava provando ser o pai generoso e participativo que ela pensou que seria, mas depois de tantos anos sem nenhum tipo de ajuda estava acostumada a fazer as coisas sozinha. — Preciso aprender a fazer — explicou. — Logo não terei escolha. E você está trabalhando, precisa dormir. — Você vai acabar doente de novo se não se poupar — disse ele como o presidente confiante de uma empresa. Que homem irritante! — Ah, não, minha recuperação é minha prioridade. Sei que minha vida com Lucy depende disso. — Sorriu. — Não se preocupe. Não ficarei sob seu teto mais do que o necessário. Aquela resposta não pareceu tranquilizá-lo. A preocupação em seu rosto era visível. Por sorte, Lucy acordou; era o motivo que Sirena precisava para escapar da presença sufocante de Raoul.

Cheio de desejo, observou o corpo curvilíneo daquela linda mãe. Sabia muito bem 32


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o significado de todos os rubores e dos desaparecimentos repentinos dela. Eram esses os sinais que aumentavam o interesse de qualquer homem com sangue quente nas veias, e Raoul já estava interessado. Muito interessado. Mesmo na época em que a contratara, notara a atração que exercia sobre ela. Não havia pensado duas vezes naquilo, já que as mulheres costumavam se encantar com ele: tinha dinheiro, estava em forma, vestia-se bem, era educado. O comportamento de Sirena era rotina na vida dele. Raoul ignorara isso e sua própria atração por ela até aquela fatídica tarde chuvosa, quando tudo mudou. E agora, nesta nova fase de seu relacionamento, Raoul se sentia um calhorda por desejá-la, enquanto ela ainda se recuperava, cheia de dores e desconforto. Fazia o melhor para se controlar, contudo, vê-la arrumando o cabelo para disfarçar o nervosismo e o desejo por ele era de deixar qualquer um louco. Raoul, porém, sabia que o sexo entre eles tornaria o relacionamento, que já era complicado, impossível. Seria mais fácil para ele se Sirena já tivesse partido, reconheceu de má vontade. Ela ter reagido à investida, mesmo que involuntariamente, fez com que seu desejo ficasse ainda mais forte. Estava tão excitado que era impossível esconder o despertar de seu corpo que pulsava, desejando aquela mulher, ansiando pelas profundezas úmidas do corpo dela, as mesmas que o acolheram há quase um ano. Ali estava o problema. Tinha se passado um ano, desdenhou, tentando esquecer a coisa toda. Fazia um ano que se dedicava de forma quase integral ao trabalho, à empresa, às reuniões com os advogados... Estivera muito ocupado para encontros amorosos e seu recolhimento não tinha nada a ver com o fato de estar encantado por uma mulher em particular, nem com a crença secreta de que apenas ela serviria para ele. Diabos. Deveria ir até a cidade, dar vazão às suas necessidades. Sim, aquela era a solução. Detestava a ideia de Lucy se mudar dali, precisava encontrar uma forma de conviver com a mãe de sua filha, então...

Ao apagar a luz do quarto, ouviu a bebê começar a chorar de novo. Sirena continuava lhe dizendo que as noites eram responsabilidade dela, mas aquilo era tolice. Cuidavam juntos da menina durante o dia, e o arranjo parecia funcionar muito bem. Quando Raoul percorreu o corredor escuro, Lucy já tinha se aquietado e a mãe fechava a porta do quarto. Foi quando levou um susto ao perceber a sombra dele; arfava quando se virou para encontrá-lo. — Você me matou de susto! — Eu moro aqui — respondeu da forma mais neutra que pôde. Sirena contemplou o peito nu do ex-chefe, seus olhos perplexos brilhavam à luz da lua. Usava um short folgado e uma blusinha sem alças, cujo tecido fino não permitia que ela escondesse estar toda arrepiada com a simples presença daquele homem viril. Droga. Era o jeito errado de passarem a noite. E Raoul não conseguia ignorar as ondas sensuais que ela emitia. Ondas do cabelo solto de Sirena cobriam seus ombros. 33


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Estava perfumada, recém-saída do banho. Ela ofegava; seus lábios entreabertos confirmavam seu desejo, enquanto o olhar faminto mirava o peito dele. A calça do pijama não era larga o suficiente para esconder o desejo que ele sentia. Sirena desviou o olhar, constrangida e apreensiva, e, se não estava enganado, tão atordoada com o que sentia quanto ele. — Lucy me pareceu agitada — explicou ele de forma ríspida, lembrando-se de onde estava. — Vinha pegá-la para que você pudesse voltar para a cama. A cama. Era tudo no que ele conseguia pensar. Tinham feito amor em um sofá e não durou quase nada. Queria mais. Queria horas, dias com Sirena. A voz de Raoul deixou-a ainda mais arrepiada, como se isso fosse possível. O aroma imponente e agressivo que se desprendia do corpo dele deixava claro que sua disposição não era a de dormir, e Sirena se sentia sonolenta e tonta. Não parecia sexy usando aquelas roupas; estava toda desgrenhada. Aquilo com certeza era uma coisa boa, embora em segredo desejasse estar mais atraente. Idiota! — Lucy está dormindo agora — murmurou enquanto ambos se moviam ao mesmo tempo, esbarrando-se, o corpo dela contra o dele. A mesma coisa que acontecera antes. Chocada, viu o olhar dele sobre sua boca. O coração disparou e seus pensamentos deixaram de existir, como da última vez. Não, isso de novo, não!, pensou, e não conseguiu se mover, paralisada pela atração e pelo desejo que sentia por ele. Raoul levantou a mão e hesitou. A pele nua do ombro de Sirena esperava o seu toque, cada nervo ansiava por ele, que começou a inclinar a cabeça. Não deixe que isso aconteça, Sirena implorou a si mesma, mas seu sentido de autopreservação evaporou-se com tamanha rapidez que ela não conseguia sequer raciocinar para decidir se deveria dar meia-volta no corredor, passar por Raoul ou entrar novamente no quarto da filha. Ele acariciou o rosto dela, levando a boca à dela até que as duas se encontraram em um gemido doloroso. Não... oh, não... Raoul era pura força, e a maneira como sua boca cobriu a dela foi tão confiante e faminta que superou a força de vontade de Sirena. Os lábios se encaixavam com perfeição. Quando a língua de Raoul abriu espaço entre seus lábios, ela estremeceu, sentindo seu desejo se renovar. Oh, por favor! As formas se moldaram às dele. Não conseguiu evitar. Sabia o quanto era bom ficarem juntos daquela maneira. O corpo dela se lembrou de como ele a preenchia. Raoul a abraçou com uma força que dizia que era o seu dono, o corpo todo contra o dela, o que a fez suspirar. As roupas de dormir que vestiam não eram barreiras para o desejo que ambos sentiam Ela sentia tudo. Os músculos do peito de Raoul, sua cintura sob as mãos hesitantes dela e a força suprema de seu desejo desperto, pressionando-a. Sirena o abraçou, voltando todo o seu ser para o beijo que a consumia. Doce, excitante, uma sensação que não tinha há meses tomava o corpo dela de um jeito 34


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delicioso. Era tão bom ser abraçada; a forma como Raoul respirava contra a sua boca e a tomava como se disso dependesse sua vida arrebatou Sirena, anulou sua consciência de um jeito que nada mais conseguiria, fazendo-a corresponder ao seu desejo voraz. Enquanto as mãos de Raoul deslizavam por seu corpo, Sirena se contorcia, quase desmaiando de prazer quando ele a pressionou contra a parede e jogou o peso de seu corpo contra o dela. Ao acariciar sua coxa e perceber que a mulher estava sem calcinha, Raoul gemeu de prazer, mordiscando o pescoço dela e deslizando a mão livre pelas costas até o seu traseiro, apertando-o com delicadeza e propriedade. Sirena arqueou o corpo contra o dele, para que seus seios deslizassem contra o aquele peito e suas mãos encontrassem seu desejo, que latejava, intenso, projetado no pijama. — Isto, Sirena, toque em mim — disse com a voz rouca, segurando e apertando a mão dela contra seu membro. Beijou-a para abafar o grito de surpresa, enquanto com a mão massageava a área mais íntima do corpo dela, deixando-a ainda mais úmida e cheia de desejo a ponto de beijá-lo com completo abandono. Raoul livrou o seio dela da blusa e inclinou a cabeça. Sirena pensou: Estou amamentando. A realidade do que estavam prestes a fazer a atingiu em cheio. Ela o empurrou, afastando-se e evitando seu toque, fazendo-o hesitar e erguer a cabeça. Havia razões demais para que se sentissem perplexos com a situação. O medo de Sirena estava claro em seu rosto. Os olhos vidrados de Raoul encontraram os dela e ele também pareceu chocado. Talvez estivesse também horrorizado ao constatar como tinha sido fácil ceder aos encantos dela, fácil se perder em sua boca. Sirena era a mulher mais próxima, mais disponível, aquela que estava à mão. A dor excruciante tomou todo o corpo dela. Humilhada, passou por Raoul e correu até o quarto.

Já era bem tarde quando Sirena conseguiu pegar no sono. Depois que adormecera, Raoul se esgueirara pelo quarto e levara a babá eletrônica. Ele estava à mesa do café da manhã quando deveria estar em seu escritório. Por que não ia para o escritório, meu Deus, porque não trabalhava longe dela? Já fazia quase um mês que não saía de casa. — Como está Lucy? — perguntou. — Dei-lhe a mamadeira, mas ela não estava com muita fome. Está dormindo agora, com certeza não por muito tempo. Pelo menos isso deu a Sirena uma desculpa para evitá-lo. Retirou-se para usar a bomba de sucção, porque seus seios estavam doloridos. Raoul ainda estava à mesa quando ela voltou. E tinha um ar de determinação no rosto. — Não quero falar sobre a noite passada — disse Sirena, tentando soar enfática. Se não estivesse com tanta fome, nem sequer se sentaria à mesa com ele. Colocando de lado seu tablet, apoiou-se nos braços cruzados sobre a mesa. 35


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— Sei que você não pode fazer amor e não deveria ter levado aquilo tão longe. Também não tinha nenhuma proteção e certamente não quero engravidá-la de novo. Toda a mágoa que Sirena ainda sentia, mas que conseguira sublimar, voltou de repente; sua garganta fechou-se de tal forma que ela mal conseguia engolir. Levantouse demonstrando o que esperava ser indignação suficiente para disfarçar seu orgulho ferido. — Creia, desejo todos os dias que o pai de Lucy fosse qualquer um, menos você. Sirena ouviu a respiração dele falhar e soube que o atingira; não ficou feliz com isso. — Não a quero grávida porque não quero arriscar sua vida de novo, Sirena. Já que aprendi o quanto pode ser perigoso dar à luz, não pretendo fazer nenhuma outra mulher passar por isso. — A maioria das mulheres não enfrenta tantos problemas, Raoul. Você não sabe como se sentirá no futuro, com uma mulher diferente. Raoul lhe deu um olhar que encerrava qualquer discussão sobre o assunto. Estava perdendo o seu tempo se pensava que poderia argumentar com ele. A expressão rígida era tão familiar, sua certeza de que estava absolutamente certo era tão firme e óbvia que Sirena teve vontade de rir. Essa era a última reação que esperava ter. O corpo ainda ardia de desejo não satisfeito, o que piorava a já cambaleante autoestima. Seu coração tinha se fechado para se proteger durante a noite, mas, por alguma razão, a curiosa declaração fora de hora de Raoul fez com que ele se abrisse de novo. Aquele era o cuidado que Sirena tanto admirava nele, e Raoul o demonstrava naquela hora. Bem, na verdade, talvez ele fosse protetor com todas as mulheres, e mesmo assim aquele gesto pareceu nobre. Uma pequena parte dela fraquejou e ficou feliz em saber que ele não pretendia ter filhos com outras mulheres. Pensar em Raoul fazendo bebês com alguém que ele amasse de verdade a torturava. — O que é engraçado? — perguntou ele. — Nada. Raoul estava impaciente. Puxou a cadeira para Sirena. — Sente-se. Coma. Você precisa se alimentar. Ela deu a volta para sentar-se, enquanto a empregada a servia. Para seu desespero, ele se sentou à mesa de novo. A lembrança da noite anterior tomou conta de Sirena quando a empregada saiu e os deixou a sós. Havia se revirado na cama, repassando cada instante do que acontecera, tentando entender como tudo começara. Para ela era simples; ainda se sentia atraída por Raoul. E para ele... Bem, aquele era um relacionamento conveniente? Ora, claro que sim! Afinal, ficavam juntos o tempo inteiro, já que não saía de casa nem para trabalhar. Sentindo-se enrubescer de raiva e lembrando-se da excitação que sentira, Sirena encarou seu prato e começou a comer bem devagar. Aquele momento de insanidade ficaria entre eles como uma parede de ressentimento pelo dinheiro roubado, enchendo de obstáculos o relacionamento de ambos. Ela sabia que precisava 36


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sair dali. — Devo poder me mudar depois da minha próxima consulta — disse. Raoul negou com a cabeça. Sirena tentou disfarçar a emoção. Ainda estava processando o fato de ele não a ter insultado minutos antes. Resistia à partida dela porque a queria ali? Pressionando as mãos em seu colo, perguntou: — Então, quer que eu vá embora antes? — Nunca. Quero ficar com Lucy o tempo todo. O que significa que você também precisa ficar. Aquelas palavras caíram como uma bomba, deixando-a em estado de atenção. O desejo inesperado tomou conta dela e a excitação da noite anterior fez-se presente. Sinos de alerta soaram em sua cabeça. Perigo, perigo! — Ei, eu já pedi a você que não me faça rir — disse ela. — Não posso ficar aqui, Raoul. — Por que não? — Por causa de tudo o que aconteceu ontem à noite, para começar — disse, o rosto ardendo de vergonha. Se ele demonstrasse algum interesse e ela o rejeitasse, seria uma coisa, mas o modo como havia respondido fisicamente àquele homem tinha sido revelador demais. Baixou os olhos, desejando que pudesse mudar o passado, sobretudo quando pensou que Raoul poderia usar o que ela sentia para conseguir o que quisesse. — Então a química entre nós ainda vive e está forte. Nós a ignoramos muitas vezes no passado. Talvez possamos tentar olhar para esse lado do nosso relacionamento quando você estiver recuperada. No entanto, acredite, isso não tem nada a ver com o meu desejo de criar minha filha. Sirena ficou espantada. — Qual relacionamento? Que química entre nós? Incrédula, levantou-se antes que se desse conta disso. Rejeitava tudo o que ele dizia. Era tão cruel que nem mesmo conseguia suportar ouvir. — Vou mudar para meu apartamento assim que o médico me liberar. Jogou o guardanapo na mesa e começou a se afastar. — Você vai sozinha — disse ele em um tom implacável que a gelou por dentro. — Lucy fica aqui. Bum! Ali estava. A parede que Sirena sempre soubera que ele ergueria entre sua filha e ela. Tinha mesmo acreditado que Raoul seria razoável? O homem era um canalha, era cada vez mais evidente. E aquilo doía! Raoul a magoava tratando-a daquela forma e a machucava por não ser o homem que queria que fosse. — Não é isso que diz o nosso acordo legal — disse ela, virando-se para dar mais ênfase à frase. — Mantenha seu advogado a postos, minha querida. Vamos reescrever esse acordo. Raoul não estava blefando. Sirena sentiu seu coração se retorcer, mas não seria 37


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intimidada de novo por aquele valentão. Jamais quisera machucar alguém, só que, naquele momento, movida por uma onda de sentimento de injustiça, foi na direção dele para um confronto agressivo. Surpreso e em guarda, Raoul levantou-se bem rápido quando ela se aproximou. O tamanho daquele homem foi a única coisa que a impediu de atacá-lo. — Ora, ora, sr. Raoul. — A única arma de Sirena contra ele eram suas palavras, revestidas de indignação e ressentimento. — “Quero você, Sirena” — zombou. — “Toque-me, Sirena”, e no dia seguinte, pegue tudo o que importe para ela, antes de jogála no meio da rua. Vá em frente. Envie-me ao escritório de John, para outra pilha de contas e custas judiciais que não poderei pagar. Pois eu vou aumentar a aposta: vou levar o caso para ser julgado pela opinião pública. Vou feri-lo de todos os modos que conseguir. Levarei sua filha, porque eu não vou deixá-la ser criada por alguém que faz o que você faz. Sirena limpou os lábios com as costas das mãos, a emoção diminuía à medida que ouvia suas palavras e sabia que era inútil lutar contra o arsenal de dinheiro, posição e poder de Raoul. O que tinha de seu? Apenas as acusações de roubo que pesavam contra ela. Não conseguiria encará-lo sem ceder. — De onde você tira coragem para me julgar? — Sirena disparou antes de escapar para um lugar seguro.

Atônito, Raoul permanecera em silêncio enquanto ouvia Sirena despejar aquilo tudo nele, para depois se retirar. Sentiu como se tivesse sido atacado por uma leoa ferida e escapado por pouco, muito pouco. A adrenalina em sua corrente sanguínea acelerara seus batimentos cardíacos e o fizera retesar os músculos. Teve de se concentrar para relaxar. Nada poderia preencher o imenso vazio que se abrira em seu peito. Toque-me, Sirena. A vergonha tomara conta dele, travando seu maxilar quando quisera revidar em sua defesa. Era ele quem tinha o direito de não confiar nela. Como ela ousara acusálo de ser manipulador? A governanta apareceu de repente, pegando-o de surpresa. — O senhor quer mais café? — perguntou surpresa em ver a mesa vazia. — Não! — gritou em resposta, reagindo sem pensar. Respirou fundo ao perceber que assustara a pobre mulher, que não tinha nada a ver com a confusão. — Desculpeme. Não, obrigado — disse controlado, passando a mão pelo rosto e depois pelo cabelo desarrumado. — Por favor, faça alguns sanduíches para Sirena, já que ela não terminou o café da manhã. Estarei em meu escritório. Na privacidade do cômodo onde trabalhava, usou o silêncio para analisar o confronto entre eles, sem conseguir diminuir um centímetro da pilha de trabalho que se acumulava em sua mesa a cada minuto que passava distraído com a nova família. Mas não era uma nova família. Era apenas uma filha, lembrou Raoul a si mesmo. Não uma companheira.

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Toque-me. Sentiu seu corpo arder quando se lembrou do prazer que experimentara ao ter os dedos suaves de Sirena tocando-o novamente. O desejo o inundara na noite anterior. E era todo por ela. Apesar das tentativas de enganar a si próprio, a triste verdade não era outra senão que aquela mulher o tentava. Mesmo antes de terem Lucy, Raoul perdera o interesse por outras mulheres com as quais saía, apenas para jantar. Nada mais. Não queria que Sirena fosse a única mulher que realmente desejava. Deveria ter mais controle sobre si. Deixara bem cedo o sono de lado naquela manhã para pensar em como mantê-las morando com ele. Convencera-se de que uma solução conveniente para o problema da custódia nada tinha a ver com atração sexual. Quando reviveu os gemidos suaves da bela mulher e a resposta apaixonada ao beijo que ele lhe dera no corredor, seu corpo se acendeu de desejo mais uma vez. Contudo, Sirena não queria nada com ele. Talvez estivesse fisicamente atraída, mas a ferocidade que demonstrara naquela manhã deixara claro que ela preferia sufocá-lo durante o sono a fazer amor com ele. Olhou para o jardim colorido através da janela de seu escritório sem conseguir, entretanto, enxergar suas cores. A mente estava ocupada em remontar cada nuança da expressão selvagem de Sirena no portão quando tentara falar com ele meses antes, idêntica à sua expressão naquela manhã. Era como se um punho tivesse se fechado em torno de seu coração, apertando-o, causando desconforto. Um milhão de vezes dissera a si mesmo que era apenas mais uma mulher descartável, como tinham sido todas as suas amantes. Mas daquela vez era tudo diferente, inusitado. Temia machucá-la de uma forma que não sabia que podia até aquele instante. Mas de que jeito o modo como a tratava era diferente de como Sirena o tratava? Tornara-o dependente dela para então roubar dinheiro dele. Havia arruinado todas as possibilidades que Raoul poderia ter de se relacionar com outras mulheres, ao mesmo tempo que se tornava a escolha mais errada para ele. Um movimento capturou sua atenção. Sirena trouxera Lucy para o jardim. Usava um vestido de verão e estava descalça. O cabelo caía em leves ondas pelos ombros, secando ao sol. Ela se sentou sobre uma das pernas, coisa que sempre fazia, em um balanço coberto, chutou de leve uma pedra e reclinou-se para trás, respirando fundo. Apesar de exalar maternidade e docilidade naquele momento, trazia em si uma forte dose de sensualidade. Estava linda. O desejo dentro dele assumiu uma nova e desconcertante direção. Não era só sexual. Lembrou-se da eficiência de Sirena, seu jeito de lidar com pessoas difíceis, seus sorrisos rápidos. Oh, meu Deus, não lidava bem com relacionamentos complexos. Mãe e filho? Simples. Bancar o irmão mais velho protetor? Fácil. Chefe e empregado? Era preto no branco. Havia uma exceção, porém. O suicídio de seu pai, um evento sórdido, ainda que comum, começava a merecer um pouco de sua simpatia. Seu pai enfrentara problemas ao ultrapassar limites no local de trabalho e sentir uma volúpia que disputava lugar com o amor que nutria pelo filho. Agora, Raoul era capaz de entender (ou, pelo menos, começar a perceber) como o pai se sentira fragmentado, confuso e sem rumo. Não estava nem perto de se matar 39


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como ele o fizera, mas ultimamente não desfrutava do que se poderia chamar de sono tranquilo. Sirena ameaçara expor a situação deles e Raoul acreditava que o faria. Descobrira que ela podia não agir de forma gentil, nem mesmo ser razoável, quando se tratava de seus direitos básicos como mãe. Parte dele a respeitava por isso. E se havia uma coisa da qual Raoul se orgulhava era de se defender bem em uma negociação. Praguejando, abriu a porta que dava para o jardim e caminhou na direção da mulher. Os olhos dela se abriram e não eram mais que fendas em seu rosto. — Estou flutuando nas águas do rio da negação. Não estrague o meu momento — advertiu ela, sua voz suave revelando uma leve impaciência. Ele sorriu. Sirena sempre o pegava desprevenido com seus comentários espirituosos. Havia um poeta escondido dentro dela, Raoul suspeitava, um romântico. Ele franziu o cenho. Aquilo não se encaixava na imagem de mulher fatal e calculista que Raoul sabia que ela era. — Olhe — disse, esquecendo as várias facetas de Sirena a fim de não complicar os fatos, — eu estava errado ao dizer que voltaria atrás com nosso acordo. Você está certa. Negociou de boa-fé e as coisas entre nós só vão piorar se não conversarmos. — Você está drogado? Pensei tê-lo ouvido dizer que eu estava certa. Os olhos de Sirena permaneciam fechados, não revelando nenhuma vontade de estabelecer o comprometimento que tanto desejava Raoul. — De onde vem esse atrevimento todo? — perguntou ele. — Você nunca disse tais coisas para mim. — Claro que disse. Na minha cabeça, sim Agora que você me despediu, posso falar o que quiser em voz alta. Raoul aceitou aquilo comprimindo os lábios com desgosto, enquanto afundava os punhos nos bolsos e balançava-se sobre os calcanhares. O sol forte batia em suas costas; ele conseguia sentir os raios queimarem a pele através do tecido da camisa. Sirena e o bebê estavam na sombra, por isso não insistiu que voltassem para dentro de casa. — Você concorda em ficar? Conhece minha carga de trabalho. Preciso viajar e não quero metade do planeta entre mim e Lucy, não a cada vez que tiver que me ausentar. — Quando você diz “ficar” quer dizer “segui-lo para onde for”, como se fôssemos nômades? — Por que não? Você gostava de viajar quando trabalhava para mim, não é? Sirena fez uma careta. — Eu gostava de escapulir do hotel e passear por cidades que não conhecia. Mas não importa o que eu quero ou gosto. Lucy terá a escola e... — Ainda falta muito para isso acontecer — argumentou Raoul, não deixando que Sirena terminasse a frase. — Farei arranjos quando a ocasião chegar, e você sabe tanto quanto eu que levará tempo para ajeitarmos as coisas. Pelos próximos anos, contanto que ela tenha a nós, será feliz em qualquer lugar. Não estou falando sobre partir amanhã. Sei que você tem acompanhamento médico. Ficaremos aqui pelo tempo que 40


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precisar, mas no fim do ano não vejo motivo para não passarmos algumas semanas em Milão. Minha mãe já está perguntando quando a levarei para Nova York. — Não posso viver com você de modo permanente. Como explicaríamos para as pessoas? Com certeza, as próximas mulheres na sua cama não gostariam de me ver por perto. E se um de nós quiser se casar? Irritado com a menção de futuros consortes, Raoul contra-atacou. — Nunca tive interesse em casamento e agora a instituição me parece mais sem sentido ainda. Quanto a possíveis namoros, acho que, pelo bem de Lucy, devemos manter isso entre nós. Sirena parou de balançar-se. A recusa dela era tão tangível que Raoul chegou a arrepiar-se. — Uau! Por Lucy, eu devo dormir com você? Esse é o tipo de raciocínio que mesmo alguém com minhas limitações morais tem dificuldade em entender. — Se dormirmos juntos, será porque ambos desejamos — disse ele ciente de que estava conduzindo mal a questão ao permitir que sua irritação com Sirena o tirasse do sério. — O que aconteceu ontem à noite foi como uma batida de trem Mas você me deseja e, quando o médico a liberar, poderá voltar a fazer sexo. Pense sobre isto.

Capítulo 6

Sirena não teve muita escolha, a não ser pensar sobre aquilo. Seu corpo parecia encantado com a ideia de ir para a cama com seu antigo chefe. Seus pensamentos voavam nessa direção ao menor encorajamento, ela dormindo ou acordada. Raoul estava sempre por perto, o cheiro viril e provocativo de sua loção pós-barba tornou-se onipresente, assim como o cheiro de talco de bebê que agora parecia carregar. Ele estava em todos os lugares, contando segredos de família a Lucy ou falando em alguma língua estrangeira sexy ao telefone, cada sílaba fazendo o corpo de Sirena estremecer e queimar. Ela se obrigava a pensar em todas as razões lógicas para não confiar nele, precisava combater aquela atração, que não era saudável. Nunca tive interesse em casamento e agora a instituição me parece mais sem sentido ainda. A frase certamente deixava claro o tipo de interesse que Raoul tinha por ela. Aos poucos, conseguiram manter conversas curtas e objetivas, pontuadas por olhares de advertência e demonstrações de teimosia de ambas as partes, comportamento que tacitamente concordavam em evitar. Sirena precisava voltar para seu próprio apartamento. No entanto, a sobrinha de sua vizinha ainda implorava para alugá-lo. Sirena começou a pensar na possibilidade de encontrar um emprego decente em uma parte 41


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menos cara de Londres. Assim, manteria seu apartamento alugado para que pudesse contar com uma pequena renda fixa. Procuraria um lugar menor para si e Lucy. Seu apartamento era um bem que não queria perder e, sem uma renda mais alta, corria esse risco. Mesmo assim, não tinha certeza de como pagaria uma creche para a filha quando voltasse a trabalhar. Era o tipo de preocupação que a fazia voltar a pensar no que Raoul oferecia a ambas. Mas, meu Deus, que tipo de vida teria? Ele havia sido injusto e mesquinho com ela, e mesmo assim continuava a bancar a vítima da história. Sirena seria capaz de beber todas as noites, até esquecer aquela situação, afogando em um copo toda a sua frustração, se não tivesse um bebê para cuidar. Porém, se não podia beber até a abençoada inconsciência, poderia, ao menos, sair para relaxar com uma amiga e um copo de vinho.

Raoul não soube o que responder quando Sirena o informou de que sairia à noite. Ergueu as sobrancelhas, mas ela não se deixou intimidar. — Amber é uma amiga que se mudou para o Canadá há anos. Está chegando a Londres esta noite. É seu único tempo livre, então eu gostaria de sair com ela, conversar, beber um pouco... Se você concordar em ficar com Lucy. — Tem certeza de que está preparada para isso? — perguntou Raoul, encarandoa com os mesmos olhos que a faziam arder. — É claro! — respondeu Sirena, a voz mais estridente do que pretendia; a maneira como estremecia a cada vez que Raoul virava a cabeça em sua direção deixava-a louca. Mal podia esperar para ouvir a opinião objetiva de Amber sobre a situação em que vivia. Dando de ombros, Raoul disse: — Separe umas roupas para você e a bebê, vamos passar a noite na cobertura no centro de Londres. Dessa forma, você não chegará tão tarde e eu posso ir para o escritório pela manhã. Vamos fazer uma experiência com nosso estilo de vida e ver como nos saímos. Uma experiência. Parte dela queria recusar, mas Sirena gostou da ideia de voltar mais rapidamente para junto da filha. A mansão de Raoul era mesmo muito afastada do centro. Seu médico estava satisfeito com seu progresso, mas, entre as necessidades de Lucy e o desejo que a consumia, Sirena não estava dormindo o suficiente. E depois de preparar as malas, chegar à cobertura no centro, desfazê-las e acomodar o bebê, estava pronta para a cama, e não para uma noitada em um bar. Ainda assim, vestiu uma saia preta e uma blusa verde de babados. Suas roupas ainda estavam um pouco apertadas, contudo, seu cabelo revelou-se espetacular. Sirena usava-o preso há meses e não tinha percebido o quanto crescera. Quis deixá-lo solto, desviando a atenção da cintura ainda grossa. Usando salto alto e maquiagem pela primeira vez em muito tempo, parecia ótima. Ouviu dentro de si as críticas de sua madrasta, a voz ferina e desagradável listando suas falhas. Por um instante, Sirena sentiu-se insegura. Entretanto, 42


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disciplinara-se por muitos anos para bloquear aquela depreciação dolorosa. Sirena endireitou-se e ignorou as vozes que tentavam desestabilizá-la, pulando de susto quando Raoul apareceu na porta do quarto. — Quem é essa Amber? — perguntou ele quase rosnando. — Uma amiga da escola. — Sirena virou-se do espelho, um arrepio de excitação subindo por ela conforme ele entrou. — Você se veste assim para sair com uma amiga? — É a única roupa que tenho que me cabe. Não posso sair de moletom e tênis. Você acha que não estou bem? Devo me trocar? — Sim. Não. — Diabos, ele estava perdendo a razão. — Você está bem. Ótima. Linda. Tem certeza de que seu encontro não é com um homem? — Sim, tenho certeza, apesar de saber que nós, mães-desempregadas-e-recémparidas somos irresistíveis. Não faça piadas comigo. — Falo sério, você realmente está linda — disse Raoul com olhar faminto. Sua expressão estava carregada de desconfiança. Sirena curvou os dedos dos pés dentro dos sapatos, desconcertada com o olhar dele, cheio de admiração e possessividade. — Eu não estava esperando elogios. Achou que fosse desmaiar de excitação quando ele se aproximou dela. Sirena obrigou-se a ficar parada, até que os olhos cinzentos dele pairassem acima dos dela, apesar de usar saltos altos. Raoul acariciou os cabelos dela e depois suas mãos emolduraram o rosto de Sirena com uma ternura desconcertante. Ela prendeu a respiração conforme ele começou a inclinar a cabeça, olhando para sua boca. — Raoul, o que você está fazendo? — perguntou pressionada contra o peito dele. Raoul fez uma pausa, olhando-a cheio de intenções. — Dando um jeito de lembrá-la de que, se algum homem der em cima de você hoje à noite, há outro aqui disposto a satisfazê-la. Ele começou a abaixar a cabeça novamente, mas ela se afastou. — Não borre meu batom — pediu trêmula, a melhor desculpa que pôde inventar enquanto todo o seu corpo ansiava por ele. Seus seios doíam, desejando o contato com a dureza de seu peito, e o calor subia entre as suas coxas. Um tremor dominou seus membros, tornando-a fraca. Seus braços desejavam tocá-lo e agarrar-se a ele. No último segundo, ele desviou e enterrou seus lábios no pescoço dela. Sua barba roçou a pele dela enquanto a boca procurava um ponto sensível em sua nuca, o que fez os joelhos de Sirena vacilarem. — O que você está fazendo? — gritou Sirena, derretendo nos braços que a seguravam Seus mamilos se arrepiaram enquanto Raoul sugava seu pescoço delicadamente, marcando-a. Sirena deveria tê-lo detido, mas se sentia dominada não apenas pela força dele, como também por uma sensação de felicidade que a paralisou. A boca ansiava pela pressão dos lábios dele enquanto sua mente se perdia em um turbilhão de 43


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pensamentos inconscientes, processando apenas as sensações daquelas mãos enormes deslizando por suas curvas e a pressão dele contra seus quadris e a região íntima. Ele estava rígido, pronto para ela, tão tentador... — Você me faz perder a cabeça — rosnou ele com Sirena bem presa em seus braços. — Não comece nada com ninguém esta noite. E o carro que vai levá-la está esperando. Foi isso que eu vim aqui dizer.

Raoul não se ressentia por Sirena sair uma noite, no entanto, não gostava de não ter o direito de questionar suas idas e vindas e suspeitava de que o motivo era o bom e velho ciúme, uma emoção que nunca nutrira por mulher alguma. Definitivamente, uma emoção desagradável, mas não havia nada que ele pudesse fazer. Sirena estava linda, deliciosa. Tão sexy como há um ano, só que menos séria e arrumadinha. Com os cabelos soltos e os seios maiores, enchendo o decote, Raoul sabia o que todo homem em Londres diria ao encontrá-la: Uau! E ele não estaria ao lado dela fazendo cara ameaçadora. Sabia que não deveria têla beijado, mas não tinha sido capaz de resistir. Sirena o evitava desde o beijo no corredor e Raoul estava tentando ignorar o quanto ele a desejava, sem sucesso. Era frustrante como o inferno, mas não importa o quão desconfortável ambos se sentiam um com o outro, eles eram igualmente dedicados a Lucy. Raoul não queria e não iria morar longe da filha. Descontente, ainda com o cheiro do perfume dela em suas roupas, ele esperou no vestíbulo que Sirena apanhasse a bolsa. Quando ela apareceu, chamou o elevador e abriu a bolsa sem olhar para ele. — Estou levando o telefone... caso Lucy precise de mim. — Nós vamos ficar bem Você tem o número do David? — perguntou ele referindo-se ao seu motorista em Londres. — Sim, está gravado no meu celular. — Sirena correu o dedo pela tela e franziu a testa. — Ah, essa não, perdi uma ligação de Amber. Ela está doente. Que chato... Raoul estava repugnantemente aliviado, porém, ao observar os ombros dela caindo e o brilho de emoção de seu olhar se apagar, não pôde deixar de sentir pena. Sirena transformou a tristeza em resignação. — Desculpe fazê-lo vir até Londres para nada. Acho que vou vestir meu pijama, mas antes vou avisar Amber de que recebi a mensagem. — Abaixou a cabeça para digitar uma resposta. — Você estava realmente ansiosa para vê-la — comentou Raoul quando ela enviou a mensagem. — Nós conversamos on-line, mas não é a mesma coisa. É muito frustrante não poder ver os amigos. Quando Sirena deu meia-volta para ir ao quarto se trocar, Raoul a chamou. — Sirena? — Sim? 44


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Raoul sabia que se arrependeria disso, mas havia algo na expressão contrariada dela que o atraía, e estava linda. Ele não podia deixar aquela borboleta voltar para o casulo. — Venha beber alguma coisa comigo. — Ele fez um gesto em direção à sala de estar, que estava com as luzes apagadas. — O quê? Não. Eu vou amamentar Lucy mais tarde. Não posso... — Ora, vamos, dois velhos amigos bebendo alguma coisa juntos e tendo uma conversa agradável. — E qual é o propósito disso? — Sirena ouvia seus saltos pontiagudos ressoando pelo chão de tábuas corridas conforme Raoul a conduzia para a sala, acendendo apenas uma luminária de canto para manter o clima suave e intimista. — Eu a levaria para sair, mas, diferentemente de você, não arranjei uma babá. Aqui. Sente-se e conte ao barman sobre o seu dia. Ele segurou um dos bancos altos do bar, e ela hesitou antes de cautelosamente acomodar o quadril nele. Raoul deixou seu olhar deslizar pela curva de seu traseiro empinado até o início de suas costas. Nossa, como ele a desejava! — Deveria liberar David — disse Sirena. Depois que ela digitou, Raoul pediu o telefone dela. — David, boa noite — disse Raoul, — tivemos uma mudança de planos. Você pode ir ao restaurante Angelo’s e pedir-lhes para nos preparar dois pratos? Sim, o prato do dia, sem cogumelos para Sirena. Você pode ir para casa depois disso. Obrigado. — Vamos trabalhar até tarde? — brincou Sirena. — Eu não estou com vontade de cozinhar. E você? — Você sabe cozinhar? — Eu sei fritar bife. — Ora, vamos, um homem como você não precisa fazer nada, não é? — Sempre me irrita a sugestão de que não trabalhei para conquistar o que eu tenho. Tudo o que tenho eu mesmo construí. Sirena observou a taça de vinho que ele acabara de lhe servir e, erguendo-a, aguardou que ele brindasse. — Às conversas agradáveis entre velhos amigos — disse Sirena com ironia. Raoul olhou para ela através dos olhos semicerrados. — Eu não consigo me acostumar com isto. — Com o quê? — Essa mulher cheia de sarcasmo. Cheia de segredos e com uma vida dupla. — Você está me atribuindo mais mistério do que possuo. Sim, estou sendo mais franca com você do que era enquanto trabalhávamos juntos, mas não se pode dizer ao seu chefe que ele está sendo um idiota arrogante, não é? — Eu não a teria demitido por dizer isso. Só teria dito que estava errada. Um formigamento de puro desejo masculino cresceu dentro dele. Admirou o belo rosto de Sirena, seu pescoço gracioso e a pele alva nas curvas de seus seios. Por que ele 45


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nunca a levara para jantar? Ah, certo. Ela trabalhava para ele. Era libertador não ter mais esse obstáculo entre ambos. Devagar, ele lembrou a si mesmo, conforme ela se tornava séria e lançava um olhar em sua direção. A tensão sexual cresceu, mas só porque ele queria ir para a cama com ela não significava que deveria. Sem conseguir tolerar o olhar cheio de intenções de Raoul, Sirena escorregou do banquinho de bar e, com sua taça de vinho na mão, afastou-se na direção de uma das janelas para observar o rio. — Então é assim que você começa todas as suas investidas? Ou elas acabam aqui? — Investidas? — As mulheres ficam impressionadas quando você as traz aqui para tomar um drinque? — Eu não faço nada de mais para impressionar, se é isso que você está insinuando. Jantar. Um show. Será que isso é assim tão diferente dos seus encontros? — Eu trabalhava demais para ter encontros. — Pensei que você estivesse feliz com a carga de trabalho. Não me ocorreu que eu estava destruindo sua vida social. Você deve ter ficado muito ressentida. — Raoul imaginou que talvez esse fosse o motivo do roubo. — Não. Eu nunca tive uma vida social, de modo que não havia nada para destruir. — Você não era virgem. Houve pelo menos um homem em sua vida. — Um — concordou Sirena ainda sem encará-lo. — Seu nome era Stephan. Vivemos juntos por quase dois anos, mas éramos estudantes, então nossa diversão noturna resumia-se a pipocas e televisão. — Você viveu com ele? — Raoul franziu a testa. — Bem, não era exatamente um grande romance. Era... conveniente. Uma busca desesperada por companhia em uma época de solidão. Um erro. — Sério? — Raoul se aproximou. — Ah, pelo amor de Deus! Já passou. Não foi nada. — Você viveu com um homem por dois anos, Sirena. Não pode chamar isso de “nada”. Vocês chegaram a falar sobre casamento? — Eu... — Sirena não queria falar sobre isso. Cruzando os braços, admitiu: — Ele me pediu em casamento. — Você já foi noiva! — Psiu! Vai acordar Lucy! — sussurrou ela. — Por que está gritando? Raoul mal podia processar o que ouvira. Outro homem havia chegado tão perto de ficar com aquela linda mulher para sempre. Como ele não soubera disso? — Trabalhar para mim causou a separação? — Não. — Ela parecia irritada. — E então... O quê? — Por alguma razão aquilo era importante. Precisava ter certeza se havia cortado todos os laços com esse outro homem, de forma irrevogável. 46


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— Ainda tem algum sentimento por ele? — Seremos amigos a vida toda. Afinal, foi isso que sempre fomos. Você realmente precisa de todos os detalhes? — Preciso, sim — respondeu Raoul ainda aturdido por descobrir mais um lado de Sirena. Quando ele ergueu o olhar para pedir que ela continuasse a falar, uma sombra de tristeza cruzou o rosto da mulher. — Foi uma época solitária na minha vida. Amber estava no Canadá, minha família tinha ido para a Austrália. Stephan foi o primeiro rapaz que me notou. — Acho difícil acreditar — interrompeu Raoul. — Talvez tenha havido paixões antes disso, mas eu não tinha permissão para sair quando estava morando na casa dos meus pais, nem mesmo passar a noite na casa de Amber, pois poderíamos fugir para ir a uma festa. Minha madrasta não queria uma adolescente grávida sob sua tutela, então havia um toque de recolher e eu precisava levar minha irmã mais nova junto comigo a todos os lugares. Quando fui para a faculdade, Stephan foi o primeiro rapaz com quem eu tive a oportunidade de me divertir. Ele era gentil e eu, romântica o suficiente para transformar o que havia entre nós em algo maior do que realmente era. — E então ele a pediu em casamento. — Foi uma bobagem, coisa de criança: desistir do diploma para começar logo a trabalhar. Stephan teve medo que eu encontrasse alguém, mas eu me dei conta de que aquilo não era o que eu desejava. E terminamos. Raoul sentiu-se penalizado pelo desespero do concorrente. E, ao mesmo tempo, aliviado por não a ter perdido, uma sensação que o perturbou. — Uma relação de afeto não é algo de que você devesse se envergonhar. Por que se sente culpada? — Porque eu o machuquei. Parte de mim imaginava se eu não o estava usando. Estava sem dinheiro e não tinha outro lugar para viver. Não tive a intenção de usá-lo, mas fiz isso. A campainha anunciou que David estava de volta com o jantar. Raoul voltou-se para ir até o vestíbulo abrir a porta, só que tudo no que conseguia pensar era: Você me usou. Sente-se mal com isso?

Capítulo 7

Sempre atento aos detalhes, Angelo enviara uma rosa branca envolta em uma fita de seda. Sentimos a sua falta, dizia o cartão. Sirena abafou uma pontada de melancolia ao pegar o botão ao lado de seu prato, 47


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procurando por seu perfume entre as pétalas ainda fechadas. David havia posto a mesa ao lado da piscina. Arrumara a louça fina rapidamente, como se tivesse muita prática; sem dúvida, fizera aquilo inúmeras vezes para os jantares de Raoul e suas amantes. Tudo brilhava, da prata às velas, estrelas e luzes da cidade piscando no ar quente da noite. Depois de fazer soar uma relaxante música nos alto-falantes ao ar livre, Raoul chegou com as taças. Suas sobrancelhas se arquearam em silêncio. — Dormindo profundamente — adivinhou Sirena. Ela sabia que Lucy estaria, mas a verificação tinha sido um pretexto oportuno para deixar a intensa presença daquele homem Ela não tinha certeza se estava pronta para enfrentá-lo novamente. Uma campainha soou distante, indicando que David havia deixado o apartamento. Eles estavam sozinhos novamente. Segundo round, pensou Sirena, pegando a taça que Raoul colocara em frente ao seu prato. Raoul a enchera para diminuir a temperatura do pinot grigio a fim de que o vinho acalmasse a garganta dela enquanto bebia. Sirena hesitou em começar a comer, embora o prato fosse uma apetitosa massa típica do Angelo’s: cremoso, com pimentas brilhantes e manjericão perfumado. Mas aquele não era como outros momentos em que os dois tinham um tablet ou um laptop entre eles e ela mastigava ao mesmo tempo que digitava e atendia ao telefone. Eles nunca usaram de cerimônia quando trabalharam juntos, mas agora era diferente. Mais do que nunca, Sirena estava ciente da masculinidade potente de Raoul, seu costume de observar tudo silenciosa e atentamente, seu ar inegável de comando. E sabia que estava bonita e bem arrumada. Até Angelo parecia ter adivinhado que a ocasião era diferente, mandando o jantar em porcelana e talheres de prata. Aquilo parecia um encontro. — Algum problema? — perguntou Raoul. Sirena meneou a cabeça, repreendendo-se por seus devaneios antiquados de romance. — Só pensando que eu deveria colocá-la na água — disse apontando para a rosa. — Isso pode esperar até acabarmos de jantar — respondeu Raoul. Parecia incomodado em começar antes dela, o que a deixava nervosa. Sirena procurou por um tema neutro para quebrar o que parecia ser um silêncio tenso. Raoul falou primeiro. — Por que não foi para a Austrália com sua família? — Não fui convidada. Raoul abaixou seu garfo conforme absorvia a resposta lógica e sensata, mas sem sentido algum. Franziu o cenho: — Por que não? Sirena segurou a língua para não dar uma resposta rude à pergunta que nunca fora capaz de responder. — O semestre na faculdade havia começado — disse ela, oferecendo a desculpa que Faye, sua madrasta, tinha usado. — Meu pai me deu dinheiro para as mensalidades, aproximadamente o mesmo valor das passagens aéreas. Não fazia sentido jogá-lo fora. 48


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— Então você pôde escolher entre estudar e ir com eles? — Não. — Ela não pôde evitar o tom de ressentimento que endureceu sua voz. — É por isso que estava ansiosa para jantar com Amber. Ela conhece minha história com minha madrasta e me deixa desabafar sobre tudo o que está me incomodando, sem eu precisar preparar o terreno e analisar o quanto é culpa minha e se estou sendo paranoica. Amber me deixa falar sobre o que me incomoda; se eu tentar explicar tudo a você — ela balançou a mão na direção de Raoul, sentindo exaltar-se, mas incapaz de se controlar, — vai ser igual a Stephan e dizer que talvez Faye não quisesse dizer isso dessa forma. Que eu estava sendo sensível demais, as razões dela faziam sentido e eu a estava interpretando mal. As razões dela sempre fizeram sentido, Raoul. Essa é a beleza da ditadura que ela impôs. Oh, Deus, cale-se, Sirena. — Por que você não me dá um exemplo? — sugeriu Raoul. — Por exemplo — disse ela com firmeza, — quando eu estava grávida e tão inchada que mal conseguia sair da cama, preocupada em morrer, perguntei se minha irmã poderia vir; e eles me disseram que os negócios do meu pai estavam mal, que Ali tinha exames a fazer e que os médicos estavam de olho na tireoide de Faye. Não haveria tempo para mim. Ela ergueu os olhos e viu o rosto dele transformado em uma máscara de gelo. — Você deveria ter me ligado. Sirena sentiu uma pontada de angústia. Ficara tentada a fazer o que ele sugerira um milhão de vezes, mas não o confessou. — As pessoas que deveriam me amar e cuidar de mim não vieram. Que sentido fazia pedir a você? Ele recuou como se ela tivesse jogado o prato em seu rosto. Sirena desviou o olhar, tentando conter as lágrimas que os conflitos antigos, nunca resolvidos, sempre provocavam. Sua madrasta não se importava com ela, mas Sirena amava o pai e a irmã. Não havia nada que pudesse ser feito, exceto administrar a situação. Depois de alguns segundos, Raoul perguntou: — E Amber? Por que não ligou para ela, se são tão boas amigas? — Ela está em uma cadeira de rodas. O que não quer dizer que não me ajudaria; no entanto, meu apartamento tem escadas e ela sofre de outros problemas de saúde. Foi o que a trouxe a Londres. Ela está se consultando com um especialista. A surpresa ecoava no silêncio dele. — Eu realmente não sei nada sobre você, Sirena, mas seu pai não estava preocupado com você? — Claro, só que ele se casou de novo; não sabia o que fazer com uma menina e não estava disposto a bancar a parteira para uma mulher adulta. — E sua irmã? Ela não toma suas próprias decisões? Sirena suspirou exasperada, enfurecendo-se com ele por julgar sua irmã. Se ele não entendesse a vulnerabilidade de Ali e o quanto ela precisava de apoio, nunca compreenderia o porquê de ter pegado o dinheiro dele para a jovem. 49


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— Ali é criança demais para sua idade. Ela se esforça na escola, por isso as provas são um problema real para ela. Colocá-la contra sua mãe nunca me pareceu certo, não importava o quanto eu quisesse. Eu a adoro, nem sei dizer o quanto, e sinto falta dela terrivelmente. Praticamente a criei. Faye não mudava uma fralda se eu estivesse por perto para fazê-lo. As lições de casa eram minha responsabilidade, assim como estudar com ela, as questões sobre puberdade e sexo, comprar o primeiro sutiã... Mas eles partiram há quase oito anos, e eu não a vejo desde então. Faye planejou a mudança enquanto eu estava estudando para entrar na faculdade, sem nunca mencionar a viagem até que minha admissão se concretizasse. Diga-me que isso não foi mesquinho e dolorosamente cruel. — Você poderia ter ido vê-los. — Ah, com todo o tempo livre que eu tinha trabalhando em dois empregos enquanto estudava? Ou você quer dizer depois que me contratou? Ir até a Austrália em uma daquelas semanas que você generosamente me deu? Todas as vezes em que eu pedi mais de cinco dias de folga você parecia que estava expelindo uma pedra dos rins. Um músculo tremeu no maxilar de Raoul. — Você poderia ter explicado as circunstâncias... — Com que fim, Raoul? Você nunca mostrou o mínimo de interesse por minha vida pessoal. Queria uma extensão do seu laptop, não uma mulher viva, respirando. — Porque você era minha funcionária! — esbravejou, empurrando a cadeira para longe da mesa. Sirena já o tinha visto chegar ao limite de sua paciência, geralmente por causa de um negócio que dera errado. Ter essa energia masculina agressiva direcionada para ela a fez sentar-se paralisada. Raoul, entretanto, não estava jogando sua raiva sobre ela. Andou até a beira da piscina, onde afundou as mãos nos bolsos e franziu o cenho, olhando para o brilho estranho das profundezas da água azul-esverdeada. — Você não tem ideia de como é desejar uma colega de trabalho, sabendo que ela está fora do alcance. Eu discordo, ela pensou, mas engoliu as palavras. Meneou a cabeça. — Como você pode dizer algo assim quando deixou bem claro que... — Eu sei o que eu disse naquele dia. Pare de jogar isso na minha cara! — rosnou ele. — Por que você acha que eu deixei tudo ir tão longe e tão rapidamente na tarde em que ficamos juntos? Eu havia passado dois anos desejando aquilo. E no dia seguinte — Raoul fez um gesto de frustração, — descobri que você tinha me roubado. Você traiu minha confiança e me usou. O que diabos eu deveria dizer? Admitir que você me magoara? Foi muito humilhante. Ela o havia magoado? Não. Sirena não se permitiu acreditar, não depois de todos esses meses tentando eliminar a alegria e a ternura de suas memórias, tentando aceitar o que acontecera como tendo sido apenas uma aventura de um só dia. — Eu estava tentando ser uma boa profissional — disse ela, — evitava arrastar minha vida pessoal para o escritório. E não vejo razão para compartilhá-la agora. — Ela jogou o guardanapo ao lado do prato. — Você continua não se importando e eu continuo não podendo ver a minha família. 50


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— O que a faz pensar que eu não me importo? — Raoul virou-se para desafiá-la. — Você me odeia e eu vivo bem com isso, porque odeio você também. Mentirosa, uma voz sussurrou em sua cabeça, e ela a ignorou, juntamente com o som da respiração dele. — Vamos manter as coisas da forma mais honesta possível. Pelo amor que temos a Lucy. — Eu queria que fosse assim tão simples. — Raoul avançou e apoiou-se no encosto da cadeira. — Quero odiar você, mas agora eu entendo por que sentiu que não poderia me procurar. Você não sabia que eu estava agindo de forma desinteressada para conter a minha atração, mas ela estava lá, o tempo todo. Ela recuou, o coração acelerado pela emoção e descrença, sentindo uma intensa dor por ele a ter tratado do jeito que o fizera, independentemente de ter sentimentos por ela. Não eram sentimentos muito fortes se pôde se comportar assim, não é? Falando com muito cuidado, torcendo dolorosamente os dedos gelados em seu colo, ela lhe lembrou do óbvio. — Desejar não é cuidar, Raoul. Ele se empertigou, assumindo uma postura arrogante. — Não, ouça — Sirena apressou-se em dizer, temendo que ele pensasse que estava implorando por afeto. — Não acho que termos um caso nos levaria a casar e a viver felizes para sempre. Só estou dizendo que pensei que você tivesse algum respeito e consideração por mim Mesmo uma demissão teria sido melhor do que precisar mandar me prender sem falar comigo. Aquilo foi... Sirena vacilou. Raoul olhava para ela sem nenhuma expressão no rosto gelado. Então ela se forçou a continuar, apesar da voz que enfraquecia. — Descobrir que estava grávida, sabendo que tomariam o bebê de mim na prisão... — Sirena se interrompeu e recuou, temendo começar a chorar ao reviver as memórias trancadas dentro dela. — Nem minha madrasta iria tão longe para me machucar. — Eu não sabia que você estava grávida! — Raoul a lembrou, ferozmente. — Exatamente! E se soubesse teria sido mais indulgente por causa do bebê, não por minha causa. Você não se importa comigo. Nem um pouco.

Capítulo 8

Raoul sentiu como se estivesse caminhando na névoa de Londres. As paredes do seu apartamento eram claras o suficiente, o céu além das janelas parecia um teto alto, mas sua mente não conseguia formular uma única ideia razoável. Ele continuava ouvindo o que Sirena dissera na noite anterior. Aquilo o havia feito se contorcer em um 51


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turbilhão de arrependimentos e inconformismo. Lucy se remexeu em seus braços. Ele olhou para a menina, certo de que a filha devia estar captando sua tensão. É por isso que estava tão agitada. Raoul andava pela casa tentando acalmá-la, mas nenhum deles foi capaz de encontrar alguma paz. Como Sirena teria conseguido se manter calma andando em círculos em uma cela estreita? O coração dele estava apertado. Ele não queria pensar naquela imagem; queria afastá-la, mas agora não conseguia tirá-la da cabeça. A Sirena vibrante, que esticava o pescoço com curiosidade desde o aeroporto até o centro de negócios de todas as cidades que visitara, trancada em uma jaula de tijolos cinzentos e barras de ferro geladas. Você me odeia e eu vivo bem com isso, porque odeio você também. — O que você está fazendo aqui? A voz de Sirena o assustou, e uma onda de prazer e dor percorreu sua espinha. Raoul piscou, tornando-se consciente de que entrara na pequena dependência que separava o apartamento principal do resto da casa. O quarto fora feito para uma empregada ou babá, mas estava vazio porque a sua arrumadeira dormia em casa e voltava pela manhã. — Só procurando coisas diferentes para ela olhar. — Ele parou de esfregar as costas de Lucy e mudou sua posição para que ela pudesse ver a mãe. — Ela é exigente. Sirena franziu a testa ao notar as roupas amarrotadas de Raoul, as mesmas que estava usando no jantar inacabado junto à piscina. A neutralidade de sua expressão era negada pela tensão sobre as maçãs do rosto, porém, ele se recusou a deixá-la ver as emoções mais complexas que se contorciam dentro de seu peito: a incerteza e um anseio que ia além do desejo simplesmente sexual. Dor. Havia algo pulsando, queimando dentro dele, que Raoul não conseguia identificar ou acalmar. — Você ficou acordado a noite toda? Devia tê-la trazido para mim. — Sirena se aproximou para levar o bebê e foi recebida com beijos por todo o rosto. Ela riu com a surpresa, um som que sua tentativa enraivecida de mandá-la para a cadeia poderia ter silenciado para sempre. Seu coração murchou no peito. — Será que o papai esqueceu-se de alimentar você? — murmurou enquanto se encaminhava para o sofá. — Eu tentei, há alguns minutos atrás. Ela não estava interessada. Sua voz soou áspera. Sirena se encolheu. — Lucy deu trabalho, não é? — Sirena encolheu o ombro. A manga do robe deslizou e ela deixou cair a alça da blusa, expondo o seio. Ele já a tinha visto amamentar tantas vezes que ela nem se importava mais com isso. Raoul não pensava naquilo como algo sexual, contudo, vê-la alimentar sua filha o afetou, a suavidade que tomava conta de Sirena. Seus dedos delicadamente enrolavam o cabelo escuro de Lucy em cachos enquanto o bebê relaxava e fazia ruídos ávidos. Sua expressão de amor maternal era tão intensa que fez o peito dele doer. Raoul não sabia que Sirena estava grávida quando a mandara para a prisão, mas 52


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ela sabia, e deve ter ficado apavorada. E ele, o primeiro em quem ela deveria ter sido capaz de confiar, tinha sido a última pessoa que ela jamais pensaria em procurar. — Eu fico com ela — disse, fechando os olhos. — Você pode dormir ou ir para o escritório, como planejado. — Não. Eu não posso. Raoul passou a mão pelo cabelo, tornando-se consciente de uma dor de cabeça persistente e da agonia que lhe tomava todo o corpo. — Sirena, você sabe que perdi meu pai. O que eu nunca disse a ninguém... Eu o encontrei. Cheguei da escola e lá estava ele. Teve uma overdose. Ele a provocou, deliberadamente. Estava tendo um caso com a secretária. — Fez uma pausa. — Eu chamei a ambulância, tentei reanimá-lo, mas eu tinha apenas 9 anos. E já era tarde demais. Sirena encarou-o, os olhos verdes fixos em seu rosto, arregalados com o choque. — Eu não tinha ideia. — Odeio falar sobre isto. Minha mãe também não fala. — Não, as poucas vezes em que ela mencionou seu pai soou como se... — Ela o amasse? Ela o amava. Eu só sei sobre o caso porque achei anotações no cofre quando nos mudamos. Garantias de que ele nos amava muito, mas, ainda assim, escolheu a morte porque não poderia viver sem aquela mulher, e não posso deixar de culpá-la. As anotações foram a única coisa que restou no cofre — continuou. — Meu padrasto tinha levado todo o resto. Minha mãe o amava, também, e ele parecia sentir o mesmo por ela. Pensei que mamãe tivesse encontrado algum conforto nessa união após a nossa perda, mas meu padrasto usou-a. Ele jogou fora cada centavo que tínhamos. Larguei a universidade porque ele teve um ataque cardíaco, e foi aí que descobri que os telefones estavam prestes a ser cortados, assim como a luz. Os dois foram-se no mesmo mês: a casa e meu padrasto. — Oh, meu Deus. O que você fez? — perguntou Sirena cheia de compaixão. — Eu desenvolvi uma profunda animosidade com quem tenta me roubar — admitiu com tranquila brutalidade. — Talvez não seja desculpa para mandar prendê-la sem falar com você primeiro, porém achei minhas ações plenamente justificadas quando aconteceu. Sirena assentiu conforme tirava o bebê sonolento de seu peito e ajeitava o robe. — Eu entendo. Pela primeira vez, ele ouviu o desânimo gritante em sua voz. Tinha a mesma incompreensão subjacente que sentira quando falara sobre o suicídio de seu pai. Ela não entendera, realmente. Estava simplesmente aceitando o que não podia ser mudado. Raoul tinha perguntado por que ela precisara do dinheiro. E ela nunca respondeu, apesar de ele sempre ter a certeza de que o roubo não fora motivado por dívidas de jogo, gostos caros ou drogas. — Por que você roubou dinheiro de mim, Sirena? Ela se encolheu ao ouvir a palavra roubar. — Minha irmã precisava de dinheiro para pagar as mensalidades da faculdade. 53


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Ela estava muito chateada depois de trabalhar tão duro para ser aceita. Há uma enorme lista de espera. Ela não podia esperar um semestre e tentar novamente. O arrependimento dela era tão palpável que ele podia sentir o gosto. — Acho que Lucy vai dormir por um tempo, agora. — Levantou-se com a menina nos braços, pálida e sem encará-lo. Sirena hesitou, os olhos baixos. Ondas sutis de tensão emanavam dela. Ambos haviam rasgado as cortinas e exposto os motivos para tratarem um ao outro daquele jeito, mas isso não mudava o fato de que ela roubara dinheiro dele e que ele não hesitara em mandar prendê-la. Essas feridas levariam muito tempo para cicatrizar. — O mais simples, a solução mais vantajosa para Lucy seria vivermos juntos de forma permanente — disse ele. — Eu sei, Raoul. Mas não funcionaria, Nós não confiamos um no outro. — Podemos começar de novo. Nós já esclarecemos tudo. Droga, Sirena! Quero ficar com a minha filha e você quer o mesmo. Não pode dizer que prefere colocá-la na creche durante a maior parte do tempo em que ela estiver com você. E quando ela estiver comigo, vou contratar uma babá para poder trabalhar? Não faz sentido. — Mas... — Vamos deixar tudo para trás — insistiu ele, interrompendo-a. — Você apenas precisa ser honesta a partir de agora. Jure que nunca vai me roubar de novo. Os olhos dela se encheram de lágrimas. Ele atacava de todos os lados, sem trégua, e ela ainda estava confusa depois de uma noite difícil. Sentira-se profundamente ferida na noite anterior. Revirava-se na cama, convencida de que ter-lhe dito o quanto ele a ferira tinha sido um erro. E por acaso ele se importava? Ou encontraria uma maneira de usar aquilo contra ela? Estava determinada a voltar para seu apartamento. Só que ao vê-lo parecendo uma pilha de roupa suja, cabelo amassado, a barba por fazer, que deixava seu rosto com ar sexy, e olheiras sob os olhos torturados, seu coração tinha sido tirado do lugar e ainda estava torto no peito. Tudo o que ele havia dito colocara sua determinação em xeque. — Conseguimos até agora, mesmo estando furiosos um com o outro — disse, sedutor. — Eu ainda estou furiosa — interrompeu Sirena com mais irritação do que calor. Parte de seu ódio amargo estava se dissolvendo. Ela não podia evitar. Aquele acontecimento do passado explicava muita coisa, assim como sua obstinada determinação para obter sucesso. E aquilo em nada dissipou a atração que sentia por ele. Pior, tivera o efeito de aumentá-la. A grossa proteção que erguera contra ele havia começado a ruir e pequenas fantasias de ter um futuro com Raoul insinuavam-se dentro dela, sua confiança e seu amor brilhando como pó mágico nos olhos de Sirena. Que tola! Depois do que Raoul tinha acabado de dizer, era hora de aceitar que nunca, nunca iria amá-la. O melhor que podia esperar era isso: uma trégua e um novo começo. 54


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A injustiça queimava no peito. Lucy começou a pesar em seus braços. Ela a mudou de posição e deixou Raoul pegá-la, observando como a criança se aninhava carinhosamente no peito do pai. Cruzando os braços vazios, Sirena tentou dizer a si mesma que conseguiria sozinha, mas não podia ignorar o argumento sobre a creche. — Minha mãe quer vê-la — acrescentou Raoul. — Você sabe como é difícil viajar com ela. Lucy obviamente odeia a mamadeira, mas, se você não for, podemos acostumá-la a... — Não — disse Sirena. Lucy realmente preferia o peito, e aquele era um momento sagrado na vida das duas. — Você irá para Nova York conosco, então. — Não comece com suas táticas agressivas! Eu sei como você trabalha, conseguindo uma pequena coisa e transformando-a em uma grande concessão — disse ela com leve desgosto. — Eu vou pensar sobre Nova York. E, se eu for, não vai ser como sua... — Babá? — sugeriu Raoul, arqueando levemente a boca, para então completar sério: — Eu teria de contratar uma, se você não for. Prefiro pagar você, que poderia deixar tudo escrito. — Não faça isso parecer fácil. Porque não é. Um dedo masculino longo tocou seu queixo, virando o rosto para ele. — O que é mais difícil? Fazer a promessa de não me roubar? Ou mantê-la? Encarando-o fixamente, respondeu, desafiadora: — Nunca vou tirar nada de você. Nunca mais. Raoul sustentou o olhar por tanto tempo que Sirena quase não podia suportar. Um aperto pressionava o peito e sua pele parecia pequena demais para o seu corpo. Ele meneou a cabeça. Quando se afastou, Sirena deixou-se ficar onde estava, tremendo. Teria ela perdido ou ganhado?

A mãe de Raoul chorou ao segurar a menina pela primeira vez. — Nunca imaginei que Raoul me daria uma neta. Ele é um viciado em trabalho! Beatrisa era uma mulher alta e esbelta que se vestia bem e prendia o cabelo grisalho em um coque atrás da cabeça. A maquiagem sutil reforçava seus traços aristocráticos; usava joias elegantes que Sirena suspeitava serem presentes do filho. Sempre pareceu faltar uma faísca real de vida a Beatrisa, e agora Sirena entendera o porquê. Ela sentiu uma tremenda necessidade de ser gentil com a mulher mais velha e estava feliz por ter feito a viagem, mesmo tendo estranhado se hospedar naquela casa. — Ela pensa que somos um casal — sussurrou Sirena quando lhes foi dado um quarto para dividir.

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— Que suposição louca, só porque temos um bebê! — provocou Raoul. — Você precisa explicar a ela. — Como? — perguntou ele irritado. A atitude de Raoul a enervava. Especialmente porque ela podia prever o que aconteceria. Beatrisa estava sendo incrivelmente educada, claramente tentando aceitar seu relacionamento “moderno”, traduzindo o que sentia em um comentário sobre admirar as mulheres independentes. Raoul não via nenhuma vantagem em esclarecer a questão do casamento. Não que Sirena quisesse se casar com ele. Raoul tinha partido seu coração uma vez. Ela não podia deixá-lo fazer isso de novo. — Vou usar a cama no quarto de Lucy — disse ela. O suspiro revelava sua frustração masculina. — O médico a liberou para mais que apenas a viagem, não foi? — Então preciso ir para a cama com você? Sei que acha que dormi com você para esconder o meu crime. Para mim, sexo não é algo casual. É preciso haver sentimentos de ambos os lados. Um arrepio tomou conta dela conforme escutava as próprias palavras. Sentiu uma onda nauseante provocada pela profunda mortificação. Sirena era uma mulher independente, cujo único consolo em sua obsessão pelo chefe era que ele jamais soubera o quão profunda como pessoa ela era. E apenas saiu do caminho dele, humilhada. Suas roupas poderiam muito bem estar no chão, a seus pés. Ela jamais se sentira tão nua e exposta. Ele permaneceu parado, mas seus pensamentos giravam rapidamente por trás do olhar inescrutável. Tentando se antecipar a toda e qualquer conclusão a que ele poderia chegar, ela pegou a escova de dentes e o pijama na mala, consciente de que tremia, e incapaz de se controlar. — Claro, sou mestre em enganar a mim mesma — gaguejou ela. — E, graças a Deus, ou não teríamos Lucy, não é? Mas nós dois sabemos o que sentimos um pelo outro, e agora vou cometer erros novos, sem precisar repetir os antigos, então... Ela praticamente saiu correndo antes de trancar-se no quarto de Lucy. Jogou-se de bruços na cama e, em silêncio, descontou sua frustração no travesseiro.

Capítulo 9

Raoul havia crescido em Nova York, mas ele não dava muita importância a isso. O lugar estava irremediavelmente ligado a lembranças sombrias. O clima não ajudava, 56


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sempre opressivo: debaixo de chuva, enterrados na neve ou sufocando no calor úmido do verão. A cidade fizera crescer dentro dele um peso do qual não conseguira se livrar. Ele lutava contra essa sensação quando, em seu caminho para uma reunião, parou para instruir a recepcionista a interrompê-lo se Sirena ligasse. — A srta. Abbott? Pensei que havia sido desligada da empresa! Como ela está? — A cordialidade e o interesse da mulher eram sinceros. A resposta seca de Raoul, dizendo que estava bem, foi bastante rude. Além de mentirosa. Saíra de casa antes de vê-la naquela manhã, mas sabia, pela maneira como Sirena empalidecera na noite anterior, que ela não estava bem. Suspeitava de que a tinha magoado de uma maneira que não pensara ser possível. Seus pensamentos voavam enquanto mal ouvia o que diziam seus engenheiros sobre um cronograma. Raoul fez as contas. Ele não havia percebido todos os fatos até aquela noite, bebendo à beira da piscina. Estivera distraído com outras revelações. Se era verdade que Sirena não tinha namorado ninguém depois daquele rapaz na faculdade, ela tivera apenas um amante desde o fim do seu malfadado relacionamento. Ele. Para mim, sexo não é algo casual. E preciso haver sentimentos de ambos os lados. A forma como Sirena dissera aquela frase, de maneira brusca e, ainda assim, insegura, deixava claro que jamais tivera a intenção de admitir aquilo para ele. O que tornava a declaração perturbadoramente sincera. Claro, eu sou mestre em me enganar, Sirena acrescentara para disfarçar, mas aquilo só o fizera ranger os dentes, perguntando-se se ele também não fazia a mesma coisa: se enganar. Apesar de os motivos dela para roubar revelarem uma mulher descrente de uma resposta dele a um pedido de ajuda, Raoul jamais duvidara de que Sirena havia dormido com ele apenas para encobrir o que tinha feito. Raoul precisava acreditar naquilo. Qualquer outra hipótese era muito desconfortável. Não era um mulherengo. Não queria tirar vantagem de uma mulher vulnerável. Não andava por aí colecionando amantes. Sirena afirmara não esperar uma proposta de casamento, mas queria ao menos ser tratada com um mínimo de respeito. Quando se envolveram, Raoul não apenas a respeitava, como realmente gostava dela. Afeto. Algo muito mais profundo do que qualquer coisa que Raoul já se permitirá sentir por uma mulher. Deus, quando ele parava para pensar em como fora aquele dia de amor com Sirena, ele... Parecia outra vida. A doçura, o alívio de finalmente vê-la ceder e poder tocá-la, a entrega absoluta que balançara suas crenças mais profundas... Uma janela se abrira em seu coração, levando luz a cada ponto escuro da alma. Quando estavam enlaçados, com seus corpos úmidos e parcialmente vestidos, vibrando e encontrando juntos o êxtase, Raoul fora atingido pela realidade do que tinham acabado de fazer. E se conscientizara de quem realmente estava ali com ele. Nunca se sentira tão vulnerável. Era quase uma revelação para ele. Enquanto observava os lábios cheios de Sirena, 57


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sentindo-se zonzo de tanto desejo, entendeu que seu pai não tinha se matado porque tivera um caso com a sua secretária. Ele se matara porque tinha sido capturado. Pelo amor. Emoções profundas levavam os homens a cometer atos desesperados. O que Raoul sentira por Sirena durante aquele tempo carregado de intimidade sensual deixara-o apavorado. Depois do amor, havia se afastado dela fazendo algum comentário sobre a chuva. Durante todo o dia, ao deixá-la no apartamento e voltar para a cobertura, Raoul procurara por uma razão, qualquer uma, para mantê-la afastada de sua vida, de uma maneira tão definitiva que ela jamais poderia alcançá-lo de novo. E ele encontrara. ... Nem minha madrasta iria tão longe para me machucar. Em vez de se matar, Raoul destruíra o que vinha crescendo entre eles. Aquela era uma visão repugnante, horrível de si mesmo. Levantou-se abruptamente. Precisava escapar da própria fraqueza patética, mas só chamou atenção para si. — Algo errado, senhor? — As pessoas presentes na reunião ficaram em dúvida se deveriam olhar para ele ou para o quadro com os cálculos e o cronograma. Tudo aquilo poderia estar em sânscrito, no que dizia respeito a Raoul. — Preciso telefonar — mentiu antes de deixar a sala rapidamente, contornando o labirinto de cubículos barulhentos, odiando-se por se sentir culpado. Esfregou o rosto, obrigando-se a não esquecer que ela havia roubado o dinheiro, e nada alteraria esse fato. Porém, ele não a queria na prisão por isso. Claro que o roubo o enfurecera, mas o verdadeiro crime havia sido atingi-lo. Sirena ousara derrubar muralhas das quais ninguém havia sequer se aproximado. Desejar não é cuidar. Não, não era, mas o que Raoul sentia não se tratava de mero desejo.

Sirena sentia-se grata por Raoul ter saído para o escritório antes de ela se levantar. Claro, também fora hipócrita o suficiente para dizer que não sentia a falta dele, apesar do desgosto sobre a revelação na noite anterior. Houve também a inveja e o descontentamento, que ele ainda trabalhava em um dos muitos escritórios dinâmicos que ela tanto amava. Quem tinha tomado o seu lugar? Ela odiava seu usurpador por princípio. Conversava muito com Beatrisa; ouvir histórias da infância de Raoul se tornou uma agradável distração para as emoções confusas. Quando ele voltou inesperadamente na hora do almoço, foi com uma surpresa: ingressos para uma matinê. — Não gosto muito de musicais — disse Raoul. — Eu fico com Lucy. Vão vocês, senhoras, e divirtam-se. Foi uma saída maravilhosa, o tipo de coisa que Sirena sempre desejara fazer todas 58


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as vezes que visitara Nova York, mas nunca tivera tempo ou dinheiro. Depois, as duas foram a um bistrô, onde comeram bolinhos e tomaram chá, até a hora em que Raoul mandou uma mensagem avisando que a filha estava indócil em casa. Rindo da avaliação que Raoul fizera de Lucy (tal pai, tal filha), as duas correram para casa a tempo de Sirena amamentar o bebê, àquela altura faminto. Entusiasmada com o passeio, ela ficou desapontada quando Raoul disse: — Fico feliz que você tenha gostado. Comecem a jantar sem mim. Tenho que dar um telefonema. E ao voltar para a mesa, estava outra vez distante. Sua mãe não percebeu o quanto se encontrava distraído, mas Sirena, sim. Quando Beatrisa terminou sua narrativa, Raoul finalmente disse: — Receio termos de mudar nossos planos, mãe. Não poderemos ficar a semana toda. A empresa foi indicada para um prêmio em Los Angeles e eu preciso estar lá, se ganharmos. — Você odeia essas coisas! Certamente você poderia fazer isso sem arrastar Sirena e o bebê pelo país, não? Elas podem ficar aqui comigo — disse a mãe. — A organização do evento pediu que Sirena comparecesse. Vamos ser premiados com a equipe que trabalhou com o software de efeitos especiais — disse a ela. — Você sempre impressionou meus associados e faz falta para um monte deles. — Eu nunca frequentei esse tipo de evento com você. — As coisas são diferentes agora, não são? — Não há ninguém com quem possamos deixar Lucy. — Miranda concordou em voar e ficar com ela. — Você quer levar sua meia-irmã para Los Angeles só para tomar conta de Lucy? — Ela voa o tempo todo para participar de feiras. Vamos precisar sair bem cedo. Na volta, podemos passar aqui um dia ou dois a caminho de Londres. — Raoul... — Isso é importante para mim, Sirena. Por favor, não discuta. Uau. Ele tinha dito por favor. O choque não deu à sua voz tempo suficiente e ele escapou sem que ela pudesse argumentar.

Pela manhã já era tarde demais para discutir. Quando Raoul dissera mais cedo, significava o início do dia: assim que amanheceu entrou no quarto onde ela dormia para embalar as coisas da filha, quando percebeu, espantado, uma sonolenta Sirena no chuveiro. Estar nua e saber que aquele homem se encontrava um pouco além da porta fez seus sentidos se incendiarem, mas ele estava completamente indiferente. Precisavam estar no avião em uma hora. Lucy não percebeu a mudança de altitude, e Sirena sentia-se grata por isso. Agarrou uma xícara de café enquanto Raoul trabalhava em seu tablet. — Eu também gostava da equipe que trabalhou no filme, mas não acredito que você nos tirou tão cedo da cama por causa deles. O que realmente está acontecendo? 59


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— Você pode usar a cabine, se quiser dormir mais. — Raoul sequer ergueu os olhos. — Não, já tomei minha dose de café. Você vai precisar me entreter — retrucou Sirena. Seus olhos se voltaram para ela; as pupilas estavam tão dilatadas que os olhos de Raoul pareciam negros. Depois de verificar se Lucy dormia, ele resmungou um “tudo bem” e se voltou para Sirena. Em um piscar de olhos, havia se transformado de um homem absorto em seu trabalho, como ela já o vira um milhão de vezes, em um macho predador que não pensava em mais nada, a não ser em sexo. Sirena levou seu olhar para longe, mas a imagem da beleza masculina de Raoul ficou com ela. Ansiava por ver aquele peito nu novamente, passar as mãos nos ombros lisos e no abdômen tenso. Envergonhada por sua respiração entrecortada e pelo formigamento de excitação que a percorria, Sirena engoliu em seco e disse, a garganta estrangulada: — Já passamos por isto. Não vamos levar esta situação adiante. — Porque acredita que eu não tenho sentimentos por você — rosnou ele. — Eu não espero isso de você — afirmou rígida enquanto mergulhava o olhar na caneca vazia para esconder o rosto vermelho de indignação. — Obviamente, você foi muito decente, levando-me para sua casa quando eu estava doente, mas foi por causa de Lucy, não foi? E ontem, com as entradas para a matinê: foi muito bom, mas era um prazer que você deu à sua mãe, não a mim. — Você tem uma bela opinião sobre mim e meus motivos, não é? — Eu não estou tentando insultá-lo. — Você está fazendo um trabalho dos diabos, de qualquer maneira. Vamos torcer para que esta viagem me redima aos seus olhos. Raoul voltou para o tablet, ignorando-a, o que era provavelmente uma coisa boa. Sirena ficou desconcertada; ele soava como se estivesse magoado. Apesar da cafeína em seu sistema, ela acabou cochilando e, antes que percebesse, estavam na Califórnia. Eles não ficariam na suíte que tinham usado há dois anos, quando trabalhavam com a empresa de efeitos especiais. Era um novo prédio, projetado em curva, como um meio cilindro gigante de vidro e bronze voltado para o oceano. Dentro da cobertura luxuosa, as janelas do chão ao teto ofereciam uma deslumbrante vista de 360 graus das montanhas, do mar e da paisagem da cidade. Como era seu hábito, fez um inventário rápido do que o apartamento oferecia, garantindo que tudo o que Raoul precisasse estivesse disponível. — Sem uísque nem conexão de internet segura. — Ela ajustou as cortinas na sala principal para deixar entrar mais luz do sol e aumentar a vista para o oceano. — Vou ligar para a administração. Você vai querer um pouco mais daquele pó de café especial para levar para casa? — Eu adoraria, muito obrigado. A apreciação dele derramou luz diretamente em sua alma. Sirena quase abriu um 60


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sorriso enorme, mas girou o rosto para esconder a facilidade com que ele a virava do avesso. Felizmente sua filha acordou e exigiu atenção, então um estilista apareceu com uma fita métrica e amostras de cores. Depois do banho, foi até a varanda tomar um pouco de ar. Uma brisa fresca vinda do mar varrera a poluição, ajudando a aliviar a mente inquieta. Raoul se juntou a ela, o que a deixou feliz. — Está gostando daqui? — Eu vim aqui para ver os fogos de artifício sobre o lugar mais feliz do mundo e não estou vendo nenhum. Uma decepção grande. — Eu vou procurar um apartamento perto de lá — disse Raoul. — Rá! — riu Sirena. — Penso que eu deveria consultar um mapa. Sempre esteve na minha lista de desejos a realizar antes de morrer vir a Los Angeles, visitar os parques temáticos, usar os arcos de orelhas... Pensei em, pelo menos, ver o castelo e os fogos de artifício. — Você pode fazer isso! Ficaremos uma semana. Leve... — Lucy não tem idade suficiente para apreciar o passeio — zombou Sirena, prevendo o que ele ia dizer. — Não, eu posso esperar por outra ocasião de voltar a Los Angeles. Ela apertou os lábios, imaginando se aquilo se tornaria sua vida. Suspeitava de que sim — Honestamente, Raoul? Eu não sei se teria apreciado tanto a viagem se ficássemos em motéis baratos e andássemos de ônibus. Você vive muito bem. Faz-me ficar tentada a permanecer com você por tempo indeterminado. — Essa é a única coisa que a atrai? — perguntou ele com desgosto suave. — Oh, por favor! Você não é tão inseguro. Poderia dirigir ônibus para hotéis de uma estrela apenas e ainda ser atraente. Mas estou nesse relacionamento por razões práticas, e elas não são tão importantes assim quanto parecem. Não quero começar um relacionamento, a menos que eu saiba que poderemos viver juntos por um bom tempo. — Odeio ouvir você falar sobre isto. Esta é a relação menos prática ou conveniente em que eu já estive, mas eu ainda a quero. Eu quero você. — Quer dizer que você... — Não — interrompeu ele, chegando tão perto que ela recuou até pressionar o corpo junto à balaustrada às suas costas, o coração tremendo com a potente masculinidade dele nublando tudo à sua volta. — Não o quê? — Não diga que eu só quero a minha filha. É verdade, mas não é só por isso que estou aqui. Eu vi você passar com esse robe agarrado à sua pele úmida... Suas narinas tremeram quando ele baixou o olhar, queimando o que via à frente. Raoul ergueu a mão para puxar levemente o cinto do robe de Sirena. Ela deveria ter-se deixado atrair, mas resistiu e o cinto cedeu. Algo brilhou nos olhos dele. 61


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— Raoul... Sirena queria que aquilo soasse como um protesto, no entanto, era mais um sussurro sedutor. — Não tente me impedir — rosnou e, com deliberada lentidão, abriu o robe dela. Sirena estava nua por baixo e ele praguejou baixinho antes de murmurar: — Você é tão bonita... Ela precisava desesperadamente ouvir aquilo. Ninguém nunca a admirara daquele jeito, e ver a maneira como ele a devorava com os olhos era intensamente gratificante e preenchia uma parte vazia de sua alma. O ar frio da noite fez sua pele se arrepiar, seus mamilos enrijecerem em botões apertados, tocando os lugares mais quentes de seu abdômen e das coxas. Uma onda de calor se seguiu, provocada pela fome e admiração que havia no longo estudo de seu corpo nu. — Raoul... — Sirena suspirou novamente, desta vez como um apelo desamparado. Ele gemeu e se aproximou. As mãos quentes procuraram por sua cintura e massagearam as costas, puxando-a até que ela se colasse ao corpo ainda vestido. Sirena deixou cair a cabeça para trás e colou sua boca na dele, gemendo com o quão errado aquilo era, mas... Ah, Deus, ela o queria tanto! As mãos dela largaram a balaustrada e subiram para acariciar-lhe os ombros, enquanto Raoul mergulhava as mãos na curva abaixo das costas de Sirena, segurando seu traseiro e pressionando sua pélvis dolorida, num contato firme com o ápice de sua ereção. Não houve nenhum conflito, nenhum debate mental: ela não se perguntou se o seu desejo seria a ruína. Tudo o que sentira por aquele homem voltara. Simplesmente o que ele tinha que fazer era tocá-la, seus quadris se inclinando, buscando um contato mais íntimo com a sua dureza. Raoul enfiou a língua em sua boca, numa afirmação ousada de seu domínio, virando o lado do rosto dela para dominá-la com seu beijo devastador. Ela o puxou, querendo mais, amando o curso de suas mãos inquietas, a maneira como ele apertava seus seios, ao mesmo tempo esmagando-os e massageando-os. Suavemente, mordeu os lábios dela, antes de erguer a cabeça. — Quarto — disse ele puxando-a pelo braço. Sirena retomou a razão e levou a mão ao peito. — Nós não podemos! — Por que não? Tudo o que Sirena mais queria na vida naquele momento era senti-lo dentro dela, mas aquilo era tudo o que existiria. Sensações físicas. Para ele. Por mais que quisesse sentir-se livre do domínio daquele homem, sabia que nunca seria capaz de mantê-lo ao seu lado, não daquela maneira desapaixonada. Quando Raoul viu no rosto dela a rejeição, sua expressão fechou-se. Com um rosnado, cambaleou para longe, agarrou-se na balaustrada e saltou para o pátio, poucos metros abaixo. — O quê...?

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Ele aterrissou entre um par de espreguiçadeiras, deu três passos largos e mergulhou na piscina. Sirena levou a mão à boca, espantada, enquanto o observava atravessar, com velocidade surpreendente, a piscina por baixo d’água. Ele estava a meio caminho de voltar quando emergiu para respirar. — O que diabos você está fazendo? — choramingou ela. — O que diabos você está fazendo? — respondeu ele, nadando na direção da borda e erguendo-se sobre a beirada da piscina. Ele lutou para tirar a camisa molhada, deixando-a cair ao lado. — Fique aí dentro ou eu vou atrás de você, e dessa vez eu não vou parar. Sirena se virou e correu para o quarto, onde abraçou um travesseiro e disse a si mesma que tomara a decisão certa. Mesmo que parecesse a escolha mais estúpida do mundo.

— Sirena! Já estava na hora. Homem detestável. Primeiro, ele a deixara tão louca que passara a noite recriminando-se por não dormir com ele, apesar de saber que se odiaria caso tivesse cedido. Em seguida, saiu sem deixar um bilhete, nenhuma indicação de onde tinha ido ou quando voltaria, embora tivesse preparado a máquina de café: tudo o que ela precisava fazer era apertar o botão. Mas isso não era desculpa para se intrometer no quarto dela, gritando seu nome quando tentava acalmar a filha. — Sirena, onde...? Oh, você está aqui. — Ela estava quase dormindo. Ninou Lucy levemente para que o bebê fechasse seus olhos sonolentos novamente. — Vou pegá-la — disse Raoul, avançando de forma marcial. — Tudo bem. Talvez com você ela pegue no sono — murmurou aborrecida. Sirena precisava de um cochilo também Talvez ir para a cama com ele agora... Cale a boca, Sirena! — Eu não quero que você a deixe comigo — disse ele, — e sim que você veja quem eu trouxe. Havia uma jovem junto à porta. Ela era loira, esbelta, dolorosamente doce no seu jeito inocente de ser, ainda que alta e cheia de curvas, sem o ar de pré-adolescente que Sirena se lembrava da última vez que tinham se visto. Os olhos castanhos de Allison se encheram de lágrimas gigantes enquanto um grande e travesso sorriso iluminava seu rosto. Ela estendeu os braços. — Sou eu! — explodiu ela. — Surpresa! Um grito subiu pela garganta de Sirena, fechando-a, fazendo seus olhos marejarem. Ela engasgou, tentando respirar, e começou a tremer. Queria abraçar a irmã, mas seus joelhos começaram a ceder. Raoul segurou-a, xingando baixinho. 63


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— Eu deveria ter avisado você, mas não queria criar expectativas se alguma coisa corresse mal. — Está tudo bem — balbuciou Sirena, querendo inclinar-se para ele, mas forçando as pernas a suportar o próprio peso. Ela atravessou o que parecia uma névoa espessa de puro brilho e magia. Quando alcançou a irmã, ela lhe pareceu ainda mais adulta, mas, ainda assim, familiar. As duas não se viam pessoalmente há bastante tempo. Seu rosto estava iluminado pelo maior sorriso que ela já dera na vida. Abraçaram-se por um longo tempo, fazendo a garganta de Raoul se fechar de emoção. — Posso pegar Lucy? Eu estava morrendo de vontade de segurá-la. — Com a sobrinha nos braços, Ali suspirou com adoração. — Oh, Sin, ela é linda! Sin, ele silenciosamente repetiu, gostando do apelido imediatamente. — É mesmo — concordou Sirena sem pudor. Com os olhos úmidos e os lábios trêmulos, apoiou nas mãos o rosto corado. Ela parecia lutar para conter as emoções. Gentilmente, ele afastou seu cabelo do rosto. — Eu não sabia que isto seria um choque. Você está bem? Sirena atirou-se nos braços dele. Surpreso, Raoul a abraçou com força. E ela escondeu o rosto no peito de Raoul, agarrando-o com vontade, dizendo num tom quase inaudível: — Você não tem ideia do que isto significa para mim. Todo o calor do abraço sexual da noite anterior voltou quando ele sentiu a pressão de seus seios e viu-se envolto naquele perfume feminino. Uma onda de ternura o envolveu. Queria fazer algo de bom, mas nunca suspeitara de que uma coisa tão pequena teria tamanho impacto. Raoul tinha esquecido como era deixar-se sentir por outra pessoa. Quando quem amamos está feliz, nós estamos felizes. Ele deveria ter feito isso há muito tempo; a ferida em seu coração se fechara ao se encher de alegria, e não lhe custara quase nada. Alguns telefonemas e um bilhete de avião. O que isso diz sobre o quão solitário estivera? — Vocês dois... — Ali vibrou — são tão fofos juntos! Na noite anterior, Sirena não sabia em que ponto estavam naquela estranha relação e, naquele momento, sentiu-se positivamente ligada a ele, coração a coração. Afastando-se, esfregou os olhos, tentando se controlar. Estava abalada pelo que Raoul tinha feito. Será que ele sentia algo por ela depois de tudo? Sirena estava com medo de olhar para ele, com medo de ver nada mais do que olhos vazios e se decepcionar. — Isto é como o Natal — disse ela, limpando a garganta e tentando firmar a voz. — E nem se compara com a gravata que eu ainda nem comprei para Raoul. Todos riram e o dia tornou-se uma celebração. Raoul pediu um brunch, juntandose a elas quando se sentaram à beira da piscina, revezando-se para segurar Lucy e 64


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deixar que as duas irmãs conversassem. À noite, a emoção e a troca de fusos horários fizeram com que todos fossem se deitar cedo. Na manhã seguinte, Sirena encontrou Raoul na cozinha. — Não consigo dormir — disse nervosa, sentindo-se indefesa sem a filha ou Ali junto de si, as vibrações sexuais queimando entre eles. — Nem eu. Tenho uma manhã cheia antes que o expediente se encerre na Inglaterra, mas eu queria lhe dar isto. — Raoul tinha ingressos na mão. — Quase contei sobre a vinda de Ali quando você estava falando sobre ir aos parques temáticos na outra noite. Cheguei tão perto de sugerir que você deveria levá-la! Sirena engasgou ao ver o desenho da famosa fadinha jogando seu pó mágico em torno do castelo. — Raoul... — Para que fique registrado, as entradas não são para Ali, embora eu espere que ela goste do dia tanto quanto você. São para você, porque é algo que sempre quis. E então Raoul a beijou. O gesto era tão doce que Sirena não podia deixar de corresponder. O gosto da boca de Raoul arrepiou-a e fez com que levantasse todo o seu corpo. Ela engoliu em seco e tentou esconder o quanto se sentira tocada: — Eu realmente não sei o que pensar de tudo isto. Você está comprando um monte de problemas só para manter esta situação somente entre nós. — Sirena...! — Eu sinto muito. Estou sendo atrevida porque não sei mais o que dizer, não porque acredito que você tenha segundas intenções. Raoul suspirou. — Percebo que não estou deixando claras as minhas intenções. — Inclinando-se perto da pia, o corpo rígido, ele a estudou. Uma gama de emoções correu por seu rosto normalmente impassível. Elas eram profundas e, suspeitava, um indicativo de cicatrizes antigas. Sirena imediatamente quis se aproximar dele, mas se sentia muito tímida e incerta para agir. Acabou ali, torcendo as mãos, um silêncio espesso e estranho tomando a cozinha. O que ela poderia dizer, afinal? Que alguns beijos e gestos agradáveis haviam vencido sua resistência? Eles não tinham. Ainda estava soterrada por toneladas de dúvidas. — Depois do que aconteceu com o meu pai, afastei todos de mim. O que ele fez foi muito cruel. Ele era um bom homem, um bom pai. Mas nunca vou entender por que ele se matou ou como alguém pode dizer que ama sua família e depois machucá-la tão profundamente. Não baixei minha guarda para ninguém desde então... Não é algo confortável para mim. — Eu entendo, Raoul. Tenho minha própria bagagem emocional e me preocupo quando você sai arrancando os espinhos do meu peito sem aviso prévio. Isso me deixa apavorada de levar as coisas para... — Ela engoliu em seco, tentando encontrar uma descrição que não revelasse muito. — Para um grau de dependência maior. — Eu não vou a lugar nenhum Tudo o que desejo está aqui. — Ele apontou para o chão entre eles, sugerindo a domesticidade de acordar todas as manhãs com ela e sua 65


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pequena família, o que foi bom, mas que não era o conto de fadas impresso nos ingressos do parque. Sirena teria de se conformar. Melhor manter suas expectativas realistas, mesmo que isso machucasse. E doeu tanto saber que Raoul nunca iria amá-la. Não do jeito que ela o amava. Ah. O entendimento de quão profundos seus sentimentos haviam se tornado atravessou-a como uma doce e potente poção. Isso não era paixão pelo chefe. Não eram seus hormônios em fúria empurrando-a para o homem errado. Era a evolução dos sentimentos, da atração que sempre tivera por ele, sentimentos que se transformaram em profunda devoção e desejo de construir uma vida ao lado daquele homem. Engolindo o nó que travava sua garganta, Sirena escondeu sua angústia com um sorriso. — Que tal um café da manhã? — Ela lhe virou as costas para olhar dentro da geladeira, fazendo a cobrança que estava no ar sumir.

Os mimos não cessaram, no entanto. Raoul continuou sendo gentil, levando-as para almoçar nos restaurantes mais caros da cidade, para a praia e para passear de lancha. Então os preparativos para a entrega dos prêmios de tecnologia começaram Raoul levou-as a uma loja de grife na famosa rua Rodeo Drive e entregou seu cartão de crédito para um estilista. — Ali, encontre algo para você e para sua mãe. Estou com um protótipo do meu novo gadget reservado para o seu pai. Você pode levá-lo quando voltar, mas se vir algo de que ele goste... Ele se inclinou para beijar o rosto do Sirena em despedida antes de sair. — Os gostos do papai são muito simples — disse Sirena atordoada. Ela ainda não se acostumara àquilo. — O que você achar que é melhor. Enquanto vocês se divertem, vou provar meu smoking. Venho buscar Lucy quando terminar. As vendedoras serviram champanhe às irmãs e Ali sussurrou: — É como se estivéssemos no filme Uma linda mulher. Você vai se casar com ele, não é? — Querida, continuo dizendo a você: não é assim. Nós só tivemos um momento que nos levou a esta situação. Estamos tentando fazer o melhor. — Ela não sabia mais como explicar a situação sem revelar detalhes que estavam longe de ser românticos. Grávida e sob suspeita de roubo, sua família não soubera que ela havia sido presa. Não fora culpa de seu pai, mas ele tomaria para si a responsabilidade do que acontecera. Sirena certamente não queria que sua irmã se sentisse culpada por perseguir seu sonho acadêmico. Ela não queria contar a Ali tudo o que acontecera por medo de que a irmã fizesse mau juízo de Raoul. As coisas que ele tinha compartilhado eram profundamente pessoais. Fora do contexto, sem o equilíbrio de suas ações contra seus motivos, ele 66


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seria parecido com ela, um monstro implacável e frio, o que estava a quilômetros longe da verdade. Suspirando, teve de admitir que Raoul possuía os traços masculinos que sempre admirara: um homem forte, ambicioso, com um profundo senso de responsabilidade e lealdade com sua família. Ele era cortês, depois de crescer no meio de mulheres, por natureza desejando proteger e prover o próprio sustento. Mesmo se Raoul fosse desdentado, pobre e gordo, ainda abriria portas e mostraria uma incrível paciência para mulheres indecisas na escolha de que sapatos ou batom usar. Ele ainda andaria com um bebê nos braços durante toda a noite e faria o café para a mãe da criança. E ela ainda o amaria. — Oh, Sin, você está linda! — murmurou Ali quando Sirena caminhou de volta para ela. Com o coração aos pulos, ela estudou o vestido verde-esmeralda e pensou em como era o oposto de Raoul. Ela podia vestir-se com elegância e amar seu bebê, e ele ainda só a veria como uma ladra.

Capítulo 10

Procurando por Sirena, Raoul ouviu Ali dizer com exasperação: — Ela vai ficar bem! Nós duas iremos. Prometo. — Mas ligue se precisar. Ou mande uma mensagem de texto. Você tem o número de Raoul também, caso eu não atenda ao telefone? Suprimindo um sorriso, ele entrou pela porta da sala que havia se transformado em um berçário. Mal se lembrando de que Ali também estava no cômodo trocando a fralda de Lucy, ele olhou cheio de desejo para Sirena, quase sem conseguir respirar. Sirena estava de costas para ele, que parecia hipnotizado... e acariciou seu cabelo brilhante. A alça do vestido verde-esmeralda dela escorregou, revelando um ombro de pele alva e macia. Um recorte do outro lado ofereceu o vislumbre de sua cintura e das costas. A saia caía em drapejados graciosos sobre seus quadris arredondados, brilhando suntuosamente atrás dela. Raoul estava zonzo simplesmente por estar perto da bela mulher. — Seu acompanhante está aqui. E ele não é de se jogar fora — observou Ali. Raoul mal teve tempo de olhar para Ali, porque Sirena se virou para ele. Mordia o lábio inferior e seus olhos verde-escuros eram piscinas de incerteza. Sirena, que era linda, não precisava de maquiagem; por isso, o maquiador tinha apenas dado um toque de verde e dourado em suas pálpebras. Ela usava brincos e pulseira de esmeraldas. As joias eram apenas um empréstimo, mas Raoul decidira comprá-las. Combinavam demais com Sirena para que fossem parar na caixa de joias de qualquer outra mulher. 67


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— Desculpe-me — disse ela. — Você estava esperando por mim? Toda a minha vida. — Leve-a daqui! — implorou Ali — Ela está com medo de deixar o bebê e me enlouquecendo. Vão embora. Raoul a tomou pelo braço, para depois dizer com a voz grave, inebriado com o perfume: — Você está linda. Ele esperou até que estivessem no elevador antes de ceder à tentação, correndo as mãos pelo corpo dela. — O que você está fazendo? — Não se mova, Sin. Você está maravilhosa — murmurou Raoul, tirando o celular do bolso. Sirena riu. — Os homens são tão previsíveis. — Isso é um fato — concordou ele, tirando uma foto dela. — Somos criaturas simples. — Deixe-me ver a foto — pediu, apoiando a mão levemente no ombro dele e se inclinando. Raoul gostava da maneira como o espelho do elevador revelava a parte de trás do vestido dela, mas não estava preparado para a própria expressão capturada no reflexo. Havia desejo, sim, mas também algo mais. Ele guardou o telefone abruptamente. Não queria lidar com aquilo agora. Desconcertada, Sirena disse a si mesma que deveria ter previsto que as súbitas mudanças de humor dele voltariam. Ela não queria ter expectativas demais, contudo o romantismo de Ali era contagiante. Ele ia pedi-la em casamento. Por que outro motivo um homem se daria a todo esse trabalho? Ali não entendia, claro, que jogos de sedução não eram problema para Raoul. Ele os encarava como coisas normais e provavelmente anotava todos os seus encontros em um caderninho de capa preta, para que pudesse manter o controle de quem era quem. Esse pensamento doloroso deu lugar a outro, e ela se encolheu: seria a mais equivocadamente devotada das ex-assistentes dele se não se contivesse e contasse a Raoul que um caderninho preto para anotar sobre amantes seria uma ótima ideia para um aplicativo. — O que há de errado? Tentando fazer graça a respeito de sua distração, Sirena citou uma fala de Julia Roberts no filme Uma linda mulher: — Se eu me esquecer de agradecer mais tarde, a noite foi realmente ótima. Raoul não entendeu. Elegante, como sempre, disse a ela: — Bem, eu também Oh! Sirena aceitou a mão que Raoul ofereceu e deixou que a levasse até a limusine que os aguardava. 68


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Flashes das inúmeras máquinas fotográficas explodiram na direção dela enquanto caminhava pelo tapete vermelho. Para onde quer que olhasse, via estrelas de cinema. Aquela nem era uma premiação importante: todo o glamour era apenas Hollywood se lembrando de que aquele era o lugar mais incrível do mundo. Pelo menos, tinha sido o que Raoul dissera; Sirena mal conseguia manter a boca fechada. O show havia sido maravilhoso e uma das cantoras quase levou Sirena às lágrimas. Durante o intervalo, Raoul perguntou: — Você está gostando, não está? — E como eu poderia não gostar? Não tenho nenhum talento, por isso sou totalmente fascinada por quem tem algum. — Você é uma excelente mãe, Sirena. — Ah, por favor! — disse, desconfortável com o elogio. — Ter um bebê quase me matou e estou sempre tropeçando nesse caminho com coisas como cólicas e amamentação. Não é talento, é insistência. — Não brinque com isso — disse ele com gravidade. — Jamais. Sirena entendeu a observação como uma crítica e suspirou cansada. A categoria dele era a próxima, o que cortou a conversa ali. Raoul ganhou, claro, e foi mais do que merecido. E, como se não bastasse, ao se levantar para ir ao palco, ele agarrou a mão dela e tentou levá-la consigo. — Oh, não, por favor! — suplicou, aterrorizada. Parecendo contrariado, Raoul foi sozinho receber o prêmio. — Este software inovador surgiu da necessidade de um efeito especial. Mas acredito que toda a equipe concordará comigo que não teria sido entregue a tempo se não fosse o árduo trabalho de minha excepcional assistente naquela época, Sirena Abbott. Ela se recusou a subir ao palco comigo porque se sente mais confortável apoiando e fazendo as coisas acontecerem, em vez de ser o centro das atenções. Entendi isso sobre você, Sin. Era uma demonstração de carinho que Raoul a chamasse assim em público, e a intensidade do olhar que atravessou o auditório para encontrá-la foi avassaladora. Mais tarde, Sirena veria que cabeças e câmeras se voltaram em sua direção, embora naquele instante tudo o que ela conseguisse notar fosse Raoul. — Você trabalhou muito para que esse projeto fosse bem-sucedido. Você é responsável por ele, assim como por aquele lindo bebê que espera por nós em casa. Se fossem distribuídas estatuetas douradas por maternidade esta noite, você seria a vencedora. Oh, meu Deus, aquele homem impossível iria fazê-la borrar a maquiagem Sirena piscou, tentando conter as lágrimas. Raoul foi escoltado para fora do palco para tirar fotografias. E Sirena aproveitou o momento para ir até o banheiro se recompor. Nunca merecera tanta atenção, tantos elogios, e não sabia como lidar com aquilo. 69


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De volta ao auditório, ela procurou por Raoul. — Ei, querida. Estava à sua procura — disse ele acariciando o cabelo dela. Sirena sorriu em resposta. — Ei, você está chateada comigo? — Por que estaria? — Sirena abaixou a cabeça, não querendo que ele notasse que não sabia receber um elogio. — Por dizer ao mundo que temos um bebê. — Ah, aquilo. — Sirena hesitou. — Bem, não foi do jeito que eu escolheria, mas não vou fingir que Lucy não existe. — Bem, eu não queria ter feito dessa forma, mas... Eu me deixei levar. E nos bastidores fizeram algumas perguntas embaraçosas sobre nós e... se vamos nos casar. Isso me fez perceber que deveríamos mesmo nos casar. O que você diz? Atordoada, Sirena fixou o olhar na gravata borboleta do homem à sua frente, sentindo seus olhos arderem enquanto dizia a si mesma que aquilo era ainda mais estranho do que as tentativas românticas desajeitadas de Stephan. — E antes que você me acuse de estar sendo pragmático demais, permita-me lembrá-la de que existe um motivo para que tenhamos sido apanhados de surpresa por uma gravidez — disse Raoul, empurrando-a para um nicho entre as colunas do saguão do teatro, onde ficariam protegidos dos olhares curiosos, e colocando a estatueta que ganhara em um canto. Lá estava aquela mão possessiva, mais uma vez percorrendo as costas dela enquanto a forçava a aproximar-se, os seios dela junto ao peito dele, os lábios de Sirena entreabertos e ofegantes. — Você vai borrar meu batom — disse Sirena, conforme o rosto dele se aproximava mais e mais. — Não me importo com isso — respondeu Raoul. Os lábios dele tomaram os lábios trêmulos dela, fazendo com que seu corpo doesse de desejo, implorando pelo dele. O calor produzido pelos dois poderia queimar o mundo todo. Sirena gemeu e permitiu que sua língua explorasse a dele, ficando nas pontas dos pés para beijá-lo com mais força, mergulhando seus dedos nos cabelos curtos e puxando-o contra ela. A fome que Raoul sentia era enorme, avassaladora, e a ousadia dela o incitava a beijá-la com mais fúria. Ele plantou suas mãos no traseiro da exassistente, trazendo o corpo dela para mais junto dele. A impressionante ereção através do tecido da calça fazia com que o vestido de seda etéreo de Sirena parecesse inexistente. Ela não queria nada entre eles. Queria sentir apenas a pele de Raoul junto da sua, os músculos rijos envolvendo-a, o coração dele batendo sobre o dela. Sirena choramingou, sentindo que o desejo que sentia a estava enlouquecendo. Recuando um pouco, ele murmurou: — Isto é loucura. — Raoul segurava o cabelo dela, apertando de forma que a mantinha imóvel. Isso seria típico de um homem das cavernas, se ele não se agarrasse a ela como um náufrago, cobrindo de beijos seu rosto e o pescoço. Sirena tremia, mortificada por estar tão perto de perder-se em público. Não era 70


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nenhum consolo estarem escondidos. As pessoas continuavam passando atrás deles. Talvez atraindo olhares. As mãos dela o acariciavam por baixo do casaco, tentavam tirar sua camisa de dentro da calça, para que pudessem acariciar as costas. — Raoul, precisamos parar. — Eu sei. Estou prestes a arrastá-la para o armário do zelador. — Raoul se endireitou e tirou um lenço do bolso. Passou-o pela boca e em seguida perguntou à Sirena se seu rosto estava limpo. Ela tirou uma pequena mancha do canto dos lábios dele e pegou o lenço para limpar-se, pensando em seguir para o banheiro feminino, mas ele a pegou pela mão junto com seu prêmio e rumou para a saída. — O que foi? — Não me faça agarrar você, Sin. — Tenho a impressão de que você acabou de fazer isso — murmurou ela, e ouviuo rir quando chamou uma limusine. — Esta não é a nossa — avisou Sirena. — A nossa irá nos encontrar quando estivermos prontos — tranquilizou-a enquanto eram levados até a entrada palaciana de um hotel. Jogando seu cartão de crédito sobre o balcão da recepção, pegou a chave de um quarto em tempo recorde e, segundos depois, os dois estavam caminhando para uma suíte de lua de mel. Sirena parou a alguns passos da porta, perguntando-se o que estava fazendo. Uma coisa era agir por impulso, outra era reservar um quarto de hotel e tirar a roupa. Raoul desabotoou o paletó do seu smoking, jogando-o sobre uma poltrona. — Preocupada? Fiz uma vasectomia, se sua preocupação for outra gravidez. — O quê? Quando? — Cerca de uma semana depois de termos discutido sobre isso. Você perguntou se eu tinha me machucado na esteira e eu respondi que “mais ou menos isso”. — Você deveria ter me contado. — Sirena estava chocada, incapaz de processar o que tinha acabado de ouvir. — Por que você faria isso? Eu sou um caso em sua vida. Há outras mulheres. — Não penso em me relacionar com outras mulheres. Só com você. O coração de Sirena falhou e ela sentiu os joelhos fraquejarem. — Tenho preservativos também — Raoul tirou um pacote do bolso. — Caso você esteja preocupada com qualquer outra coisa. Fiz todos os exames e nunca fiz amor sem usar isto, o que me deixa nervoso quanto a minha performance sem um, já que faz muito tempo que ficamos juntos. Sirena estava perplexa. Queria falar alguma coisa, mas não encontrava palavras. Sua voz sumira. Raoul tinha ficado sozinho por todo aquele tempo? — Nós estamos bem juntos, Sin. Sem mencionar o quanto somos bons entre quatro paredes. Sempre fomos ótimos juntos. — Porque eu fiz o que me foi dito para fazer — comentou ela só para contrariar. Raoul segurou-lhe o queixo, forçando-a a encará-lo. Ela sentir seu cabelo se arrepiar com o toque. A proximidade de ambos e o jeito como ele olhava sua boca a 71


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deixavam sem fôlego. — Não consigo ficar perto de idiotas, bajuladores ou mulheres impotentes. Você é brilhante, engraçada e muito competente. Sempre me senti atraído por você, assim como por seu corpo estonteante e pelos olhos de cigana. Os lábios dela começaram a tremer. — Ainda sinto como se qualquer coisa pudesse acontecer, que tudo desmoronaria e você me odiaria de novo. Raoul sentiu um espasmo percorrer seu corpo. — Sabe o que detesto? Não ter você em tudo na minha vida. Ah, inferno, não chore. Há muito para ser construído aqui, Sin. — Eu sei — murmurou ela, tocando sua gravata borboleta, desejando ter coragem de arrancá-la. — Sem mencionar o quanto significa para mim saber que Lucy não acabará com uma madrasta como a minha. — Raoul pareceu ressentido. — Ah, por favor, não precisa pensar que esse é meu único motivo. Sou louca de desejo por você há anos. — Eu precisava ouvir isso — disse ele. — Preciso ouvir, ver, sentir... Quando a beijou, a paixão era enorme. Se queria ser levada, o maremoto de desejo estava ali, apertando-se contra ela, levando-a para a cama. Mas uma calma estranha se apoderou de Raoul. Tudo ficou em suspenso. Sentou-se ao lado dela e acariciou seu ombro, descendo pelo braço até o pulso, levando a mão de Sirena à sua boca. Beijou-a com lábios quentes e úmidos, pressionando a pele fina do braço, seguindo a linha azulada que descia até o cotovelo. Sirena acariciava o cabelo macio de Raoul, brincando com os fios entre seus dedos. Ele cheirava a loção pós-barba misturada com o próprio cheiro. O aroma irresistível se abateu sobre ela quando ele se aninhou na curva de seu braço e roçou os lábios na parte de cima de um dos seios. A camisa que ele vestia era um obstáculo para Sirena, que se via restringida por botões e gravata, além da recusa de Raoul em deitar-se sobre ela. — Quero sentir você — reclamou, passando os dedos pela cintura dele, para soltar a camisa, amassando o fino tecido de seda. Raoul se sentou. Seus olhos estreitos brilhavam, presunçosos e arrogantes, e seus movimentos foram urgentes quando tirou a roupa. Ele precisava ouvir aquilo, pensou Sirena, ao ajudá-lo com os botões da camisa, tentando apressá-lo. Quando Raoul se viu livre daquele obstáculo, Sirena acariciou os músculos rijos daquele peito, arranhando-o de leve, enquanto acariciava seu abdômen. — Você é tão sexy — suspirou Sirena. Raoul tinha o físico de modelo, mas irradiava calor de seu torço moreno. Sua sexualidade máscula a enfraquecia. Sentia-se feliz de estar ali com ele, embora em uma parte distante dela soasse um alarme. Já tinha feito isso uma vez, acariciou e satisfez sua curiosidade e seu desejo e, no dia seguinte, seu mundo fora devastado. — Toda vez que você prende seu cabelo, quero soltá-lo — disse Raoul com voz sensual, procurando o prendedor de cabelo dela, abrindo-o. Inclinou-se e sussurrou ao ouvido. — Penso em você fazendo coisas deliciosas comigo, com esse cabelo solto. 72


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As palavras e os lábios dele roçando sua pele quase a fizeram gritar. Ele a levara a um novo nível de excitação, passando sua língua e mordendo de leve a orelha. No momento em que Raoul começou a beijar seu pescoço, Sirena foi tomada por arrepios, uma agonia maravilhosa. E quando ele a mordeu de leve, Sirena gemeu e se ofereceu a ele. — O que você está fazendo comigo? — perguntou ela em um suspiro, sem protestar, quando Raoul prendeu seus dois pulsos entre as mãos, acima de sua cabeça. — Ora, eu nem a despi ainda — zombou, procurando e encontrando o zíper do vestido. Ele o abriu devagar, apreciando a lingerie que ela usava, enquanto Sirena esperava, completamente absorta, querendo nada além de pertencer àquele homem. — Você é como uma deusa. A fantasia feita realidade, deixando-me louco. Não consigo pensar em nada além de possuí-la. — Soltou-a para descer uma alça do vestido, expondo os seios, para os quais olhava ávido. — Raoul... Sirena tentou se proteger com os braços, mas o desejo indisfarçável daquele homem era uma arma de sedução. No fundo, queria agradá-lo, e se a visão de seus seios o excitava, queria lhe proporcionar isso. Ele os apertou com as mãos espalmadas, enchendo-os de beijos, reverenciandoos. — Tão bonitos, tão perfeitos. — Suas mãos empurraram o vestido mais para baixo e Sirena ergueu o quadril, deixando a roupa descer por suas pernas... nua, exceto pelos sapatos de salto e uma calcinha que não cobria quase nada. Tinha se preparado ao máximo para aquela noite, mas ainda temia que Raoul reparasse em suas imperfeições. Ele riu com um prazer primitivo e acariciou com o dedo a parte mais íntima do corpo de Sirena, que estava quente e pulsante. Livrou-a daquela barreira e, de repente, ela percebeu que estava sem roupa, só de sapatos, em uma cama enorme, enquanto se contorcia de excitação diante de um homem seminu. — Raoul... Não sabia o que dizer, mas ele a mandou ficar quieta com um comando silencioso. Concentrou-se, enquanto segurava um dos quadris de Sirena, acalmando-a. Sua outra mão percorria a barriga dela, onde estava a cicatriz de sua cesárea. Era a marca do nascimento da filha, ainda bastante acentuada, com uma linha marrom que descia a partir do umbigo de Sirena. — Não faça isto — disse ela contorcendo-se e tentando afastar a mão dele. — Dói? A cicatriz doía e... não doía, mas o toque de Raoul pareceu muito íntimo. Ele se inclinou para beijá-la ali, deixando Sirena surpresa e comovida, inundada por um entusiasmo envergonhado. Em seguida, Raoul passou a soprar de leve o centro de seu corpo. Tentava seduzila com tanta gentileza que Sirena se esqueceu do quanto ele era forte e poderoso. Sentiu suas coxas se abrirem, e Raoul se acomodou entre elas, começando a beijá-la. — Você não precisa... 73


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— Oh, doce Sin, eu preciso. Quero fazer isto, na verdade. Sirena fechou os olhos enquanto dedos a acariciavam. Aquele era o tipo de intimidade que nunca a deixava relaxar, pois sabia que ele estava olhando a sua parte mais íntima. Ah, Deus. Sentiu seus músculos se apertarem em volta do dedo que testava suas profundezas úmidas. — Diga-me quando eu chegar ao ponto — pediu Raoul, mordendo-a de leve. Ao mesmo tempo, retirou seu dedo, colocando agora dois, acariciando-a também com a língua. Ela não conseguiu reprimir um gemido alto. Tudo nela era pura sensação, o paraíso lhe acenava em cada carícia que Raoul fazia, como se tivessem todo o tempo do mundo. Era pura tortura e ainda assim tão bom, e Sirena estava morrendo, perdendo-se, sendo inundada de desejo, convidando-o com seus quadris, encorajando-o com seus suspiros e murmúrios soluçados. — Não consigo mais aguentar — gritou ela puxando o cabelo de Raoul. Ele recuou, ficando de joelhos depois daquele grunhido quase primitivo, fazendoa lamentar a perda, mesmo sabendo que a tinha provocado. Então Raoul tirou a calça, libertando-se, deitando-se depois sobre a bela mulher. Sirena, como que por instinto, passou suas pernas pela cintura dele, apertando-o para trazê-lo mais para perto de si. Segurando seu rosto, beijou-a com força. Acomodou-se sobre a amante, tocando sua pélvis, antes de guiar o seu membro para dentro dela. Foi um mergulho delicioso que transformou todo o seu corpo. Por alguns segundos, ele era como uma bolha de sabão flutuando ao redor de Sirena, com suas bocas unidas e com seu coração tentando acompanhar as batidas do dela. Sirena suspirou de pura felicidade. Como era bom tê-lo dentro de si, preenchendo a dor e o vazio que pensou que ficariam ali pelo resto da vida. E Raoul, então, recuou, deixando-a mais tensa, como se fosse a corda de uma harpa, proporcionando-lhe um êxtase incrível antes de penetrá-la mais uma vez. A alegria cresceu dentro dela. O prazer aumentava, ambos estavam perto do clímax, e lutavam para prolongar aquilo ainda mais, aprofundar-se até que não pudesse ser desfeito. Isso não ocorria apenas com ela, Sirena sabia. Raoul estava também perdido de desejo, ansiando por satisfação, como se suas vidas dependessem disso. Dependiam. Ela precisava daquilo, precisava dele, do desejo primitivo, da luta doce e do esforço para se segurar, segurar para nunca mais ter fim, para dar e receber... O êxtase os alcançou, deixando-os prestes a explodir, a respiração de ambos presa enquanto balançavam entre a angústia e alegria. E a alegria ganhou, pegando-os por completo. Ele a apertou, vibrava dentro dela, fazendo arrepios de arrebatamento percorrerem o corpo da bela mulher. Surda, muda e cega, agora ela só conseguia sentir. Estava no céu.

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Capítulo 11

Raoul jamais temera perder a vida durante o sexo, mas na noite anterior chegara perto disso. O coração ainda parecia estar sob estresse. Sobrecarregado. Sentado na beira da cama, quis acreditar que uma ida ao cardiologista resolveria o que sentia, mas sabia que aquela não era a solução. A mulher que evitava seu olhar, enquanto se vestia, era o caco de vidro que perfurava seu coração. — Você está bem? — perguntou ele. Sua voz queimava. — Claro que estou. — Sirena jogou o cabelo para trás e se concentrou em fechar o zíper do vestido. Foi a única a ouvir o bip da mensagem de texto de sua irmã, enquanto Raoul ainda se sentia entorpecido pelo orgasmo mais poderoso de sua vida. Sentia as pernas fracas, a pele não desejava nada além do toque sedoso da nudez de Sirena. Tudo o que sua libido conseguia pensar era em querer mais. Esse tipo de dependência o assustava, fazendo-o querer recuar, talvez trabalhar por algumas horas. Com certeza, afastar-se da presença dela até que recuperasse o equilíbrio. Ao mesmo tempo, sentia-se perturbado pelo distanciamento emocional de Sirena. Ela se entregara tanto quanto ele e havia sido incrível, mas agora parecia tensa, oferecendo-se para chamar o motorista da limusine para levá-los. Raoul aquiesceu e disse a primeira coisa que lhe veio à mente. — Não estou pronto para dividi-la com ninguém. Talvez, se passássemos uma semana... Como mágica, a aura de distanciamento de Sirena evanesceu-se e um sorriso doce apareceu em seus lábios. — Se esses seios fossem destacáveis, eu os enviaria na frente e pediria para o motorista pegar o resto de mim amanhã. A corrente que apertava o coração de Raoul se afrouxou. O bom humor de Sirena facilitou a aproximação dele e o carinho que fez em seu ombro. — O que tivemos... foi incrível. Obrigado — admitiu ele. — Também achei. A voz suave de Sin arrepiou os pelos de seu corpo. — Nós vamos nos casar — disse tranquilo. Sirena sentiu-se aliviada. Em segredo, debatia-se com a ideia de aquele paraíso tornar-se o inferno de novo, mas a ordem arrogante de Raoul a fez saber que ele não pretendia terminar tudo tão rápido quanto a seduziu. Ainda assim, não ouviu nada sobre amor, o que quase arrebentou seu coração. — Deixe-me adivinhar. Tenho duas escolhas? Dizer sim agora ou dizer sim mais tarde? — Você quer dizer que não? 75


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O ar de distanciamento de Raoul empurrou o coração de Sirena para a borda de um abismo; entretanto, ela supôs que, para ele, seria tão difícil abrir a guarda quanto para ela. — Não, não quero. — A frase tinha um tom de desamparo. Nunca imaginara casar-se com um homem que não a amava, no entanto, se Raoul não conseguia se ver fazendo sexo com mais ninguém, ela, por sua vez, não conseguia se imaginar casada com outro homem — Então está combinado — disse ele. Sirena mordeu os lábios, que não paravam de tremer. Chegaram à cobertura e Ali apareceu ansiosa na frente dela quando Sirena sentou-se para amamentar Lucy. — E então? — perguntou a irmã. — Então o quê? — devolveu Sirena, seguindo Raoul com os olhos ao vê-lo se encaminhar para o bar e se servir de uma bebida. — Oh, você está perdida. Raoul, você a pediu em casamento, não foi? Ele deteve o copo a meio caminho dos lábios, olhando de soslaio para Sirena. — Decidimos nos casar, sim — respondeu Sirena, com o mínimo de emoção na voz. — Eu disse que um homem não deveria fazer isso sem um anel no bolso. Deixeme vê-lo. — Ali bateu palmas, depois mostrou os próprios dedos para encorajar Sirena a fazer o mesmo. — Eu... À sua direita, ouviu quando ele bateu o copo com força no balcão do bar, só que se recusou a olhar naquela direção. — Querida, temos um bebê — disse ela a Ali. — Casar é uma formalidade. Não preciso de um anel de noivado pelos poucos dias que serão necessários para correrem os papéis. — Você não terá um casamento de verdade? Mas sempre sonhou com um vestido bufante, um bolo espalhafatoso e com papai levando-a até o altar. — Eu era uma menina quando falei isso! Não, escute... — apressou-se, tentando impedir sua irmã de continuar. — Papai e Faye já deixaram claro que não podem fazer uma viagem e Raoul perdeu muito tempo com Lucy chegando antes da hora. Foi muito gentil da parte dele preparar essa visita para nós — Sirena fez questão que ele visse que era sincera a sua gratidão, mas a expressão impenetrável daquele homem a intimidava, — no entanto, não precisamos de mais eventos quebrando a rotina — finalizou. Ali não queria deixar aquilo de lado, o que era de sua natureza. Podia ter 19 anos, mas ainda era uma menina em alguns aspectos. Sirena crescera o bastante para perceber que é preciso deixar os sonhos de criança no passado e ser realista. Conseguiu que Ali esquecesse o assunto e Raoul as deixou sozinhas na sala.

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Era a última noite de sua irmã ali, então Sirena não estava arrependida por completo de ter voltado mais cedo. Acomodou Lucy, tirou a maquiagem e depois tomou chá com a irmã. Já era tarde quando se deram boa noite e foram dormir. Sirena colocou o pijama e encontrou sua cama ocupada. Raoul deixou de lado o seu tablet quando ela apareceu na porta. Os abajures lançavam uma cor dourada sobre o seu peito nu, fazendo um mapa em relevo de seus ombros e do abdômen musculoso. Sirena não conseguiu decifrar a expressão séria, mas não teve dúvida quanto a possessividade que aquele rápido olhar deixou escapar quando viu as pernas nuas dela. A verdade a atingiu. Brincando com o fecho de seu roupão, tentou demonstrar indiferença quando falou com ele. — Não sabia que você estava esperando por mim — Eu estava tentando consertar aquele problema em Milão. — Seu tom de voz indicou que Raoul ainda estava tentando. — Darei uma olhada na minha agenda para descobrir quando poderemos ir à Austrália. Você quer adiar o casamento até lá? — Não. — Marquei com um joalheiro para trazer alguns anéis de noivado antes de sairmos para levar Ali ao aeroporto. — Não vou usar um anel de noivado. — Bem, você pretende usar uma aliança de casamento? Sirena ficou chocada do quanto a ideia de usar uma aliança a fez sentir-se sem esperanças, mas, ainda assim, maravilhosa. Um anel de noivado era um gesto romântico, uma aliança de casamento era um compromisso de vida. Sentiu vontade de chorar quando murmurou. — É claro. — Por que você não vai usar um anel de noivado, então? — Joias não são práticas para quem tem bebê. Não estou interessada em ser uma noiva. Apenas quero que sejamos uma família. Raoul estendeu a mão para puxar o lençol, indicando-lhe o lugar na cama a seu lado. Sirena hesitou, incapaz de agir naturalmente, apesar de terem estado tão íntimos há algumas horas. Raoul estava nu e, apesar de se sentir cansada, Sirena morria de vontade de senti-lo contra si, mas tirar seu roupão e deitar-se, como se sempre tivesse sido assim entre eles, era impossível. Raoul sorriu de divertimento. — Sério que você está hesitando? — Não ria de mim — resmungou ela, aproveitando que agora estavam no escuro para despir-se e deitar ao lado dele. Mãos quentes a puxaram para perto do seu corpo totalmente pronto. — Tenho coisas melhores para fazer do que rir, Sin.

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Casaram-se em Las Vegas no caminho de volta para Nova York. Sirena organizou tudo pela internet e, dessa vez, quando a mãe dele reservou para os dois apenas um quarto, Sirena não hesitou em aceitar. Voltaram com facilidade para os velhos hábitos. Poucos dias após retornar a Londres, Raoul convenceu a esposa a desistir de seus trabalhos de transcrição para assumir o controle de sua agenda pessoal. Deu-lhe uma mesada semelhante ao antigo salário que recebia, o que foi bastante generoso, considerando que o apartamento dela estava alugado e ela não tinha quaisquer outras despesas. — E você pode contratar uma assistente para mim, não é? — perguntou ele, assim que terminou seu café da manhã, em um dos primeiros dias depois que voltaram para Londres. — Talvez eles tenham uma especial que desempenhe também a função de babá — brincou ela. — Você se acha muito engraçada, não é? — perguntou Raoul no mesmo tom ameaçador que costumava fazê-la tremer, só que agora a fez sorrir. — Foi-me entregue uma lista que incluía reservar apenas uma data para um encontro — era para jogar squash, mas Sirena fez questão de não mencionar — e comprar um presente de aniversário para sua mãe. Sobre trocar fraldas, eu estou sempre a postos. — Esse é o tipo de coisa que você sentia vontade de dizer, mas não falava, pois tinha medo de que eu a demitisse? — Estava apenas fazendo graça, Raoul. — Estava? — Sim — resmungou em resposta. — Porque houve um momento em que pensei em oferecer-lhe uma posição na minha equipe. Se quiser prosseguir com sua carreira, pode trabalhar comigo e não será nepotismo. Você é qualificada para a função. Ou pode procurar por outra coisa que lhe agrade. — Gosto de trabalhar com você, sendo parte da ação, sem precisar assumir a liderança. Faz-me sentir necessária. Isso é ruim? — Você é necessária. — Raoul apontou para Lucy, que estava em sua cadeirinha. — Para nós dois. — Obrigada por me dizer isso. Raoul se inclinou para roubar um beijo rápido que se transformou em um bem longo e doce. Quando se endireitou, pegou suas coisas e acrescentou: — E você já deveria saber que minhas fantasias envolvem secretárias sensuais, e não babás impertinentes. Sirena estava tão apaixonada que era difícil lembrar que ele não sentia o mesmo. Quando era sua subordinada, exercia a função de ser apenas mais uma engrenagem na máquina de trabalho perpétuo dele. Agora era parte do mundo de Raoul, de uma forma que não esperava que pudesse acontecer. Raoul não tentou deixála em um canto de sua vida agitada. Abriu um espaço para ela e Lucy, tornando-as prioridade, acima de todo o resto. Quando o trabalho exigia um tempo fora do 78


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escritório, fazia todos os esforços para incluí-la, mantê-la a seu lado, o que não era estranho, já que trabalhara como sua assistente.

A festa daquela noite era diferente de uma cerimônia de premiação ou de um encontro com novos clientes, como o da semana anterior. Ninguém ali sabia que Sirena fora funcionária de Raoul, a não ser os anfitriões: estes com certeza se lembrariam dela como a menina com um tablet e fone de ouvido que lhes trazia café e organizava o almoço. Sirena alegrou-se quando Paolo Donatelli, um banqueiro internacional, e sua esposa, Lauren, cumprimentaram-nos no saguão da luxuosa cobertura em Milão: eles formavam um casal surpreendente. Paolo exalava a extrovertida elegância italiana e sua esposa, alta e agradável, brilhava ao seu lado. — Parabéns pelas ótimas novidades! Você pegou todo mundo de surpresa, até mesmo Paolo! — cumprimentou Lauren, beijando-a no rosto. — Não foi bem isso o que eu disse, bella. Eu disse que, se os dois estivessem tendo um caso, ninguém saberia, exceto se Raoul quisesse tornar público. Ele é o homem mais discreto que conheço. Sirena corou, ansiosa por mais detalhes de como o seu casamento e o nascimento de Lucy passaram a ser domínio público, assim como o relacionamento deles. — Nós também nos surpreendemos — comentou Raoul, puxando-a para mais perto dele, encarando-a e tornando mais fácil aquele momento desconcertante. — E a discrição é pelo que você paga, Paolo — acrescentou, a fim de evitar mais comentários curiosos. — Isso é verdade — disse o italiano com ironia. — Sobre isso... Eles desapareceram no interior do escritório de Paolo. Antes de levar Sirena até os convidados, Lauren a segurou pelo braço. — Será que a colocamos em evidência? Sinto muito. A verdade é que estou muito feliz. Nem sempre me sinto à vontade com as esposas dos associados de Paolo, mas sempre gostei de você. — Estou morrendo de vontade de fazer compras com você. Sempre está incrível... e aqui é Milão, mas não falo italiano — disse Sirena. Os olhos de Lauren se arregalaram de empolgação. — Adoraria que fizéssemos isso. Foi o impulso de aceitação que Sirena precisava. Lauren também a ajudou a encontrar o próprio estilo, assim a confiança em si mesma crescia e passava mais tempo nos braços de Raoul. Seus dias eram ocupados e suas noites, incríveis. Construíam pequenos laços que ela achava serem fortes e confiáveis. Esse sentimento de proximidade e familiaridade a levou para o escritório de Londres, em uma tarde, apenas porque estava sentindo falta de Raoul. — Olá! — cumprimentou-o, fechando a porta atrás de si, enquanto se deliciava com a visão conhecida de Raoul em sua mesa, com o horizonte de Londres atrás de si. — Este é um prazer inesperado. 79


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— Lucy fez uma sessão de fotos nesta manhã. Queria ver sua expressão quando visse como ela... Sentada no colo de Raoul, Sirena precisou de um segundo para descobrir como tinha acabado ali. E como se houvesse algum mistério, o marido a olhava querendo comê-la viva. Um sorriso surgiu em seus lábios, enquanto a tensão percorria seu rosto. — Onde está Lucy? Raoul soltou o cabelo da esposa. Sorrindo, Sirena brincou com o nó da gravata. — Observando a nova babá flertando com o seu novo assistente, completamente alheia de que está dando em cima da pessoa errada. Raoul desceu o zíper da bota de Sin e massageou com um toque morno o tornozelo dela, subindo até o joelho. Sirena gemeu, perdendo o controle. Ajeitando-se no colo dele, sentiu a pressão da excitação crescente. A carícia de Raoul subiu até a lateral de sua coxa, sob a saia que usava. Quando beijou o pescoço dele, sentiu um gemido de prazer. — Você trancou a porta? A mão do marido estava embaixo de sua saia agora, movendo-se de forma insistente, indo até o topo da perna. — Uma garota detalhista como eu? O que você acha? — Acredito que estou prestes a embaralhar minha agenda. — Raoul inclinou a cabeça para beijá-la e o telefone tocou. A chama que brilhava em seus olhos deu lugar à frustração. — Só você e minha mãe têm este número. — Poderia ser eu, telefonando por engano, se é o meu celular que está cutucando o meu quadril. Raoul riu. — Espertinha. — Inclinou-se para atender a ligação no viva-voz. — Mãe? — Sim, sou eu. — Ótima hora para me telefonar. Sirena está aqui. Eles trocaram amabilidades antes que a mãe falasse do motivo da ligação. Uma pulseira desaparecida. — Sei que é bobagem perguntar se você se lembra de onde a deixei, mas procurei pela casa toda e ela não apareceu. Raoul lançou um olhar para Sirena. Foi como uma facada inesperada entre suas costelas, com sabor de um de novo? Ele se recuperou rápido, ainda mostrando uma ponta de culpa, quando desviou o olhar vacilante. — Lembro-me de você a ter usado para jantar — disse à mãe. — Sirena? — Ela chamou. Seus ouvidos zumbiam com tudo o que tinha acabado de ser dito. Sentia a pele gelada e o coração árido; o que antes era um campo florido agora estava reduzido a um terreno envenenado. 80


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— Vi o mesmo que Raoul — respondeu ela com um nó da garganta. Todos sabiam que ela admirara a pulseira. Ouvira a história de Beatrisa, de como se sentira tocada com o presente de seu filho pelo seu aniversário de 60 anos. Raoul estava ciente de que sua esposa ficara pálida quando terminou de falar com Beatrisa. Ele apressou a ligação porque a tensão crescente de Sirena precisava ser solucionada. Ela tentou por diversas vezes descer do colo dele, mas Raoul a impediu até que terminasse a ligação. — Solte-me! — pediu ela com frieza na voz. — Não suspeito de você, querida. — Tire suas mãos de mim! Sirena se levantou e fechou a bota. Corada, com o cabelo solto e despenteado, pegou a bolsa e teria saído sem dizer uma palavra caso Raoul não tivesse se colocado entre ela e a porta. — Você não vai sair assim — Ah, você espera que eu fique aqui e continue o que estava fazendo, para que possa me acusar de usar meu corpo para conseguir seu perdão de novo? — Não. Espero que possamos conversar sobre isto como adultos. — Fui eu que reagi mal à notícia do sumiço da pulseira? Seu primeiro pensamento foi que eu tinha roubado de novo! — Você já fez isso. Não é coisa de causar espanto. — Foi uma vez! — gritou ela, erguendo o dedo. — Uma vez, aproveitei-me das condições de alguém, sem tentar fazer tudo sozinha. Foi errado, sei disso, mas foi uma vez. — Querida, eu... — Não quero ouvir, não quero mesmo. Você vai me deixar levar Lucy para casa? Ela precisa tirar uma soneca.

Quando Raoul conseguiu se livrar do trânsito e chegar em casa, ficou aliviado ao encontrá-las lá, embora Sirena estivesse pálida e cansada. Estava começando a pensar que a filha herdara a natureza sensível de Sin, pois com certeza parecia perturbada com a tensão da mãe. Assumiu os cuidados com a criança e, apesar de sua necessidade urgente de resolver as coisas entre eles, sugeriu que Sirena fosse tomar um banho. Já era tarde quando se sentaram para um jantar tranquilo, apenas os dois. A esposa serviu-se. O silêncio pesava entre ambos. — Sin... — Não quero falar sobre isto. — Telefonei de novo para minha mãe. A empregada viu a pulseira na parte superior de uma cômoda depois que saímos. Deve ter caído atrás de algum móvel ou coisa assim — Portanto, não é que você acredite em mim Acredita na empregada da sua mãe. 81


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— Você nem usa a joia que lhe dei e não gasta nem metade do dinheiro que tem na conta que abri para você. Não tenho nenhum motivo para acreditar que queira ou precise daquela pulseira. Deixei o que aconteceu entre nós no passado. Hoje foi um descuido da minha parte, isso é tudo. — Tudo bem — disse ela da forma como as mulheres fazem quando o que querem dizer é Para o inferno. Raoul, porém, não quis estender a conversa, determinado a que voltassem a ser como antes. Quando foram se deitar, estendeu a mão para ela, como fazia todas as noites. Só que Sirena não se aninhou contra aquele corpo como ele esperava que fizesse. Desejava-a. Com desespero. O contato entre eles precisava ser restabelecido com a junção física que tanto lhe dava prazer e um sentimento de certeza que ele nem mesmo conseguia entender. Contudo, mesmo não o afastando, Sirena não se abriu ao seu beijo nem correspondeu ao toque como costumava fazer. Guiado pelo desejo, diminuiu as carícias, tentando tranquilizá-la de que nada havia mudado. Conhecia todos os pontos de estímulo do corpo de Sirena e os explorou. O toque nas covinhas na base de suas costas, que a fez estremecer, a parte de trás do pescoço, que relaxou quando ele dava pequenas mordidas, a parte inferior do braço, onde ela sentia cócegas... Com isso, Sin virou-se e passou sua perna em volta da cintura dele. Quando ela gemeu baixinho, com os dedos nos cabelos do marido, Raoul estremeceu de alívio, mas manteve o ritmo gradual e completo, querendo que ela soubesse o quanto reverenciava aquele vínculo entre ambos. Sirena passou a mão inquieta pelo ombro de Raoul, que a beijou por todo o braço, que tremia contra a língua dele, assim como seus dedos em sua boca. Sugou de leve um, depois outro, passando por todos os seus lugares sensíveis, mordendo a parte de baixo do dedão até se juntar a ela, como se fosse uma tábua de salvação. Ela arqueou o corpo, um sinal de procura bom o bastante para dar fim ao restante do controle que Raoul possuía, mas ele estava determinado a ter cada centímetro dela, antes que a esposa tivesse cada parte sua. Colocou-a de bruços e usou sua perna para prender a de Sirena, e então acariciou o belo corpo com o seu. A pele de Sin era macia e suave; o corpo, encantador e curvilíneo, rescendia a um aroma cítrico. Raoul beijou suas costas, enquanto acariciava pernas e traseiro, sentindo-se ainda mais tomado pelo desejo quando ela respondeu ao toque e sussurrou o seu nome. Deixando o pescoço dela livre, colocou-se por cima da mulher, deixando-a sentir como estava excitado. Seu coração batia com rapidez. Deslizou a mão para debaixo dela, pegando um de seus seios, depois moveu-se mais para baixo, para aquele lugar do corpo de Sirena que era todo dele. — Não me canso de você — admitiu em um sussurro quente contra o ouvido dela. — Penso sobre isto o tempo todo, em lhe dar prazer, sentindo você se derreter por mim Sirena estava perto do clímax, contorcendo-se embaixo dele, dando gemidos lindos que arrepiavam cada pelo do corpo de Raoul, enquanto ele lutava para que ela atingisse o prazer sem que a penetrasse. 82


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Soltando-a, virou seu corpo para que pudessem se olhar nos olhos um do outro. Sirena tremia, assim como seus braços quando tentou abraçá-lo. As coxas se abriram, mas Raoul a beijou apenas até a linha da cintura. — Raoul, estou morrendo — gemeu ela tentando atraí-lo para junto de si. Ele estava prestes a atingir o orgasmo, porém, dedicou-se ao prazer dela. Penetrála era como subir aos céus. Foi devagar, saboreando cada batida de seu coração, enquanto segurava a ameaça de erupção. Segurou as mãos de Sirena nas suas, manteve-a imóvel e a deixou senti-lo todo dentro de si. — Nunca serei descuidado com você — revelou, muito ciente do efeito que exercia sobre a esposa, cujas pernas apertavam sua cintura, a parte mais íntima emoldurando seu membro, a respiração ofegante escapando por entre os lábios. — Isto é muito importante para mim Raoul interrompeu seu gemido quando cobriu aqueles lábios trêmulos com os seus, querendo esmagá-los com todo o desejo apaixonado que existia dentro dele; contudo, em vez disso, beijou-a com veneração, fazendo de tudo ao seu alcance para transmitir a Sirena o quanto ela era pura doçura, uma alegria absoluta para ele. Perfeita. Ele, no entanto, não era um super-humano. A conexão tão vital para ele também era seu combustível, e precisava dele para viver. Estar dentro dela lhe causava um prazer incrível, que o excitava ainda mais, fazendo com que o desejo de penetrá-la fosse quase insuportável. Deleitou-se com a pura magnificência de Sirena, tomando-a com suavidade, enquanto saboreava o efeito dele sobre ela, o jeito como respondia aos seus movimentos. Sua agonia foi longa, lenta e profunda. Impossível de ceder e de prolongar ainda mais. Quando o clímax chegou em forma de um ruído agudo que escapou entre os dentes fechados de Sin em seu ouvido, quando o prazer dela era apenas um suspiro, Raoul deixou-se cair sobre a esposa, que o segurava com firmeza nos braços.

Capítulo 12

Assim que Raoul terminou de dar o nó na gravata, não tinha certeza se deveria sentir-se vitorioso ou lamentar. No espelho, via o reflexo de Sirena, imóvel na cama desarrumada, dormindo profundamente. A noite anterior fora intensa. Mesmo depois de ter ido buscar Lucy para mamar e levá-la embora depois de algumas horas, esperando que os dois pudessem por fim dormir. Sirena havia se chegado a ele, como se nada tivesse acontecido a noite inteira. Quase se mataram por causa da intensidade com a qual fizeram amor. Depois, desmaiaram de cansaço. Quando despertou, por força do hábito, por volta 83


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das seis, considerou cancelar as reuniões do dia, mas dois compromissos seriam com pessoas que iriam vê-lo a seu pedido. Não gostava de sair sem se despedir da mulher, no entanto, ficou relutante em acordá-la, já que era ele o motivo de ela precisar descansar. Vestindo o paletó, aproximou-se para ver se dormia mesmo. O rosto de Sirena estava contorcido e seus braços, tensos. Alarmado, Raoul sentou-se para agarrar o ombro dela e chamou-a para acordá-la. — Ei, Sin. — Não! Sirena choramingou, e sua mão subiu tão rápido que o acertou no queixo, sem que ele percebesse. — O que é isto? Esfregou um dedo contra os lábios, esperando que ela o soltasse. Os olhos selvagens de Sirena o encararam. — Será que bati em você? Oh, meu Deus, sinto muito. — Você estava tendo um pesadelo. O que foi? Sombras da lembrança do sonho ficaram visíveis em seus olhos, antes que ela os fechasse. Sem dizer mais nada, cobriu-se inteira, tremendo e olhando para o relógio. — Que horas são? Não sabia que era tão tarde. Você desligou seu alarme? — Sin? Conte-me sobre seu pesadelo. — Não quero pensar nisso. Pode dar uma olhada em Lucy enquanto eu tomo um banho rápido? Sirena saiu da cama, deixando Raoul inquieto.

Apesar da paixão que permanecia intensa entre eles, Sirena não conseguia afastar a sensação de que alguma coisa estava prestes a acontecer. Deixou de lado as preocupações durante o dia, dizendo a si mesma que confiar em Raoul tinha afastado suas suspeitas, mas seu subconsciente a torturava durante a noite, desolada com os sonhos assustadores. Nos pesadelos, Raoul arrancava Lucy de seus braços e a condenava ao abandono. Às vezes, ela estava na prisão. Outras vezes, do lado de fora dos portões da casa de Raoul, a chuva encharcando sua pele, o metal frio entorpecendo seus dedos. — Não sei mais o que dizer! — explodiu ele uma semana depois, em um jantar mal-humorado, quando comentou sobre as olheiras que ela trazia sob os olhos. Estavam em Paris, a cidade dos amantes, tomando um café depois do jantar na sala. Para além da janela salpicada pela chuva, o rio Sena corria sob as luzes de várias cores que vinham dos edifícios da margem oposta. — Diga-me que a pulseira apareceu — disse ela com um encolher de ombros em melancolia, tentando não se importar, mas na verdade sentindo-se muito desesperada. A resposta foi um silêncio pesado. Ele a fizera contar sobre o que eram seus pesadelos, o que não tinha ajudado a qualquer um dos dois a lidar com o problema. 84


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O celular tocou na bolsa, e ela se levantou para pegá-lo. — Você poderia tentar confiar em mim É daí que vem o problema. Sirena bufou. — Eu confio. — Você ainda não confia em mim o suficiente para falar sobre isso, sem dar qualquer desculpa para ir embora. Preciso ignorar o fato de que não há ninguém a quem acusar? Sua mãe está perdendo a memória? Não pelo que percebi. Poderia ser a governanta? A pessoa que está com ela há dez anos? Oh, eu sei, é Miranda, que recebe uma fortuna pela confiança que você deposita nela. Um ladrão arrombaria uma casa e roubaria uma única pulseira, quando tinha à mão eletrônicos e quadros valiosos? Não! A menos que tenha sido você, a única pessoa que poderia ser responsável pelo roubo sou eu. — Apontou para si mesma. — Estou pronta para confessar, apenas para conseguir a separação. — Um divórcio? É isso que você quer? Não era, mas para Raoul pensar tão rapidamente nisso era porque a ideia já o rondava. A dor que a atingiu não tinha um nome, era muito intensa, quase mortal. — É isso mesmo? — perguntou ele, sibilando e ignorando o celular. — De que forma você vai reagir se a pulseira nunca aparecer? O celular ficou em silêncio e o tablet de Sirena, também dentro da bolsa, emitiu um som. Suspirando, resolveu apanhá-lo para conferir quem a chamava. Bateu na tela, abrindo o gerenciador de mensagens. — Ali? — perguntou antes que a imagem da irmã, que estava chorando, aparecesse. — É o papai. Ele teve um ataque cardíaco. Mamãe está na ambulância. Vou encontrá-los no hospital. Sirena perdeu o equilíbrio e Raoul apanhou o tablet que ela deixara cair. — Ela estará no hospital assim que eu tomar as providências necessárias — disse ele com a voz rouca, terminando a chamada. Tentou pegar nas mãos dela, mas a esposa o empurrou colocando-se de pé. — Preciso fazer as malas. — Você está em estado de choque. — Preciso fazer alguma coisa. — Tudo bem. Vou marcar o voo. Raoul não apenas marcou o voo, como organizou tudo, até acomodá-las dentro do jatinho. — Envie-me uma mensagem de texto quando pousarem, assim saberei que chegaram em segurança — pediu ele. — Você não vem? — Sirena sentiu o seu controle, que já era pífio, desaparecer. — Há uma coisa que preciso fazer. Divórcio. A feia palavra voltou à mente de Sirena, mais nociva do que nunca. Era 85


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isso que temia, ser expulsa da vida dele. Sem dizer uma palavra, colocou a mão sobre a filha com o olhar perdido. Engraçado como, depois de todo esse tempo ansiando pelo perdão de Raoul, não se importava com o que ele acreditava. Só queria que ficassem juntos. Enquanto o observava partir, tudo dentro de Sirena calou-se. Sentia-se desprotegida. Minutos depois, o avião levantava voo, e as cordas delicadas que os ligavam foram esticadas até partirem-se por completo.

Quarenta e oito horas depois, a única boa notícia da vida de Sirena era que a cirurgia de seu pai tinha sido um sucesso e ele iria se recuperar. Por outro lado, havia ali um bebê que chorava caso ela pensasse em tirá-lo do colo. Como se o constrangimento de interagir com Faye não fosse ruim o bastante sem a presença de seu pai para apaziguar o clima entre as duas, Ali decidira voltar para a faculdade a fim de ficar com o namorado, e pediu: Não conte nada para a mamãe! — Assim, você vai dormir na minha cama — insistiu Ali. Com um berço emprestado para Lucy, Sirena se acomodou na casa do pai, tolerando todo tipo de comentário grosseiro da madrasta. — Imagino que a bebê já estaria sentando, se não estivesse tão gorda. Lucy puxara a mãe, era isso que Faye queria dizer, e ela engoliu a resposta que gostaria de dar. Pergunte ao meu marido se isso é algum problema. Seu peito ardeu quando se perguntou por quanto tempo ainda poderia se referir a Raoul daquela forma. Foi surpreendida naquele momento por uma ligação do marido. Atendeu e soube que estava no escritório de Nova York. Ele perguntou sobre o pai dela e desejou que se recuperasse rapidamente. — Você ficará aí até que ele receba alta? — perguntou Raoul. — Sim, eu... — Preciso saber de algumas coisas. Ligo para você assim que tiver novidades. — Tudo bem. Raoul parecia tão amigável quanto sua madrasta. Passou a noite com uma sensação de opressão, esforçando-se para não revelar seu sofrimento e o sentimento de fracasso para uma mulher que dançaria sobre sua dor. Quase não dormiu, contudo, quando acordou, foi com um novo propósito.

No hospital, fraco, porém orgulhoso, seu pai segurava a neta no colo. Sirena resolveu ligar para um corretor de imóveis. Seria um novo começo em um lugar que não a fazia lembrar-se de Raoul. Uma hora mais tarde, foi conhecer um apartamento que estava em reforma. 86


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Sirena gostou do que viu e resolveu dar o apartamento de Londres de entrada. Teria de contar com seus trabalhos de transcrição para pagar as prestações até que arranjasse um emprego decente, mas ficaria bem. Precisava do próprio espaço. Seu coração estava em cacos, assim com seu casamento. Depois de sua primeira noite e de Lucy no silêncio de seu novo apartamento, acordou cedo para a visita do turno da manhã no hospital. Fez compras na volta e, como uma distração ao sofrimento, convidou Faye para conhecer o lugar. Sirena inventara a história de que Raoul queria que tivessem um apartamento para as visitas à Austrália. Uma batida na porta salvou-a de discutir sobre as cores que a madrasta queria que as paredes do apartamento fossem pintadas. O coração saltou de surpresa quando deu de cara com Raoul à sua porta. — Oh! Eu não o esperava aqui! — Eu notei. Ele cumprimentou Faye com uma inclinação de cabeça, antes de acariciar a barriga de Lucy. — Como vai você, lindinha? A criança chutou em emoção, com um sorriso sem dentes cheio de reconhecimento e alegria, batendo os braços. — Também senti sua falta — disse ele. — Você deve ser o pai? — perguntou Faye. — Raoul, esta é minha madrasta, Faye. — Prazer em conhecê-la — cumprimentou Raoul. — Você se importaria de tomar conta de Lucy enquanto eu e Sirena conversamos em particular? Seu tom de voz era de um homem confiante, acostumado a mandar; Faye não discutiu. Sirena o acompanhou até o elevador, nervosa. — Não entendo como você chegou aqui. — Seu corretor ligou para verificar suas finanças e em cinco minutos estava tentando me vender a cobertura. Parecia a forma mais conveniente para entrar neste prédio, se você se recusasse a me deixar entrar; por isso, peguei as chaves e disse a ele que olharia a cobertura. O elevador parou e os joelhos de Sirena enfraqueceram. Manteve-se ereta, mas sua voz era vacilante. — Claro que eu o deixaria entrar. — Vamos dar uma olhada? — murmurou Raoul. O espaço recém-reformado estava vazio, sem trabalhadores, o chão ainda no concreto, manchado com alguns respingos de tinta; as paredes ainda tinham madeira e encanamento aparente. — Eu não posso morar com a Faye e meu pai e... 87


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— Entendo. Mas você poderia ter ido para um hotel. — Teria custado caro. — Isto não é um arranjo temporário, não é? Você vai ficar aqui. Não voltará para mim. — Minha família está aqui, Raoul. Com certeza você entenderá por que prefiro assim, não é? — Ficar longe de Londres é o que você quer e eu aceito isso. Se quer viver naquele apartamento que acabou de comprar, acatarei essa decisão. Sei que não tenho o direito de impedi-la de partir, mas o pensamento de vê-la indo me deixa doente. — Eu... — Foi Miranda quem pegou a pulseira — disse Raoul sem rodeios. — Fui para Nova York para confrontá-la. Ela a pegou emprestada e esqueceu-se de devolver. Acrescentou, em um murmúrio, que sua irmã era uma “desmiolada esquecida”. Sirena estremeceu, feliz por ver o mistério solucionado, mas, no quadro geral das coisas, o que isso importava? Raoul dissera que não pensava que ela fosse a responsável pelo sumiço da pulseira, no entanto, tinha ido até Nova York para confirmar. E isso a magoava. — Sem mais pesadelos, certo? — perguntou ele com a voz rouca. — Está resolvido. Você não corre o risco de ir para a cadeia. Eu nunca tentarei colocá-la atrás das grades e não deixarei ninguém fazer isso. Você entendeu, Sirena? Essa ameaça se foi. Para sempre. Já lhe causei tanta dor, não é? E por quê? Porque estava com medo de sentir qualquer coisa! Seus pesadelos são o meu castigo. Diga-me que eles acabaram agora, por favor. Quando penso no que tentei fazer quando você estava tão frágil, correndo risco de vida para levar adiante a gravidez de nossa filha, eu... — Não — disse Sirena, aproximando-se dele. — Foi horrível ficar longe de você, não estar lá para acordá-la — falou ele aflito. A voz de Raoul parecia de alguém cujo espírito já morrera. — Parti porque queria que o mistério fosse resolvido de uma vez, assim você poderia dormir em paz de novo. — Aqueles pesadelos não eram tão ruins... — Não subestime o que eu fiz. Você é generosa, doce e eu preciso de você em minha vida, a cada segundo de cada dia. Sin, não deixe seu coração generoso me perdoar. Não mereço isso. Deixe-me viver seis andares longe de você e faça-me sofrer como uma alma no inferno. — Não posso. Quero viver com você. Você que me fez pensar em divórcio, que foi a pessoa que me colocou em um avião e me mandou embora! Os pesadelos são sobre você não me amar. Eu amo tanto você que não consigo suportar isso! Mãos fortes a seguraram pelos braços e Sirena colidiu contra o peito de Raoul. O gemido dele vibrou pelo corpo dela, enquanto a segurava com firmeza, a ponto de parecer que desejava uni-los em um só corpo. — Eu a amo, Sin. Fiquei doente sem você e tudo em que conseguia pensar era no meu pai, que também se sentiu assim, e no quanto sua dor por não ter a mulher que amava era profunda. No meu caso, era ainda pior porque eu tinha você e arruinei 88


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tudo... — Não, você não arruinou — disse ela, cortando-lhe as palavras de autorrecriminação com um beijo carinhoso, querendo provar o gosto de cada palavra daquela declaração que o marido fizera. Raoul correspondeu ao beijo com vontade. A química entre eles faiscou, e dessa vez foi muito maior. Beijaram-se com ânsia e desejo, pressionando-se um contra o outro com mais força, espalhando a excitação por seus corpos. — Não vou amá-la sobre um chão de concreto, correndo o risco de sermos pegos por qualquer um que entrar. O piso superior chamou sua atenção, e ele pensou por um segundo... Quando olhou para a esposa, ela trazia em seus olhos o mesmo pensamento sensual. Sirena inclinou o corpo contra o dele. Bastante tentado, ele a abraçou e percebeu que era uma sorte incrível ter aquela segunda chance. Não iria estragar tudo. Raoul a beijou na testa. — Eu não a mereço. Deixe-me fazer a coisa certa, desta vez. Eu a amo, querida — repetiu, apesar de isso não refletir a profundidade do respeito e da adoração que sentia por ela. — Você não precisa dizer isso se não é verdade. Ainda quero que vivamos juntos. — Não é uma escolha consciente, Sin. — Mas você não é feliz. Sirena mordeu seu lábio, vacilante. — Não foi uma viagem agradável, mas neste momento eu não poderia estar mais feliz. Sirena pressionou seu corpo contra a ereção de Raoul. Inclinou a cabeça como se perguntasse: Você tem certeza disto? Raoul acariciou sua pele macia com os olhos dela presos aos dele. — Quero tanto fazer amor com você que mal consigo respirar. Um arrepio agradável percorreu o corpo daquele homem ao simples pensamento de tê-la em seus braços. — Abraçá-la, tocá-la é a experiência mais incrível da minha vida. Estava com muito medo, Sin. Não sabia como iria convencê-la a me dar outra chance. — Amei você desde o primeiro minuto depois de nos conhecermos. Você é o único homem com quem quero ficar para sempre. — E você é a única mulher com a qual posso pensar em passar o resto da minha vida. Você acredita nisso, não é? — É claro — respondeu ela. — Eu tenho a guarda de Lucy — acrescentou, em tom de brincadeira. — Não brinque com isso. Raoul se inclinou um pouco, esperando o olhar de reprimenda da esposa. — Falo a verdade. Quero passar minha vida com você. Quero que nos casemos. 89


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Um casamento de verdade, dessa vez. Seu pai pode levá-la ao altar... Sirena balançou a cabeça, tentando impedi-lo de continuar. — Por que não? — quis saber Raoul. — Você não quer ser o centro das atenções? Aquela era a única desculpa que poderia aceitar. Não a forçaria a fazer uma coisa que lhe provocasse incômodo. — Esses sonhos românticos eram o resgate das fantasias de uma jovem. Eu sou adulta, tenho minha cabeça no lugar. Não preciso de um gesto vazio porque você se sente culpado. Estou bem. Nós estamos bem — Você ainda não confia em mim — Claro que confio. — Não acredita que meus sentimentos por você sejam tão fortes como os seus em relação a mim — Eu... — O que poderia dizer? Aquilo era verdade. — Não estou tentando começar uma briga. Sei que as coisas ficarão melhores a partir de agora. Raoul permitiu que a conversa terminasse ali e eles voltaram para junto da filha. Depois, seguiram para o hospital, para que ele fosse apresentado ao pai de Sirena. Quando foram dormir, ela sentiu de verdade que estavam no caminho para um relação mais forte do que nunca. Raoul fez amor com ela da mesma forma doce e potente de sempre e ficaram abraçados a noite toda.

Pela primeira vez em muito tempo, Sirena começou a sentir que tinha uma família coesa. Com a confiança renovada como mãe e esposa, tentou abrir mão de suas preocupações e desfrutar de seu tempo com o pai e a irmã. Faye se tornou alguém que ela ouvia, mas não registrava as palavras ditas em seu coração, sobretudo depois que seu pai comentou sobre o relacionamento deles. — Depois que sua mãe morreu, vi você crescendo tão rápido, tentando assumir todas as responsabilidades dela. Casei-me com a primeira mulher que parecia se importar comigo, com a esperança de devolver-lhe a infância. Vocês nunca se deram bem. Você era tão independente. Faye não sabia o que fazer. Até aqui, com toda a sinceridade, eu não pensei que você iria sentir nossa falta ou que demoraria tanto para vê-la outra vez. Você parecia feliz com o seu trabalho e as viagens. Assustada com aquela visão de si mesma, Sirena expôs sua dúvida a Raoul, depois da conversa com o pai. — Será que consigo dar conta de tudo? — Você é inteligente, confiante e boa em qualquer coisa que queira fazer. Isso pode ser uma ameaça para alguns homens, mas eu preciso desse tipo de força interior em minha esposa. É reconfortante para mim saber que você não vai desistir. — Não, nunca — prometeu. Na verdade, sentia-se mais ligada a ele e como se realmente fizesse parte de sua vida. Raoul transformou todas as suas contas bancárias em contas conjuntas e deixou sob sua responsabilidade o orçamento da família. Sirena, então, fraquejou diante da 90


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profundidade da responsabilidade e da confiança que ele estava depositando nela. Talvez fizessem aquilo dar certo, depois de tudo.

Uma semana depois, seu pai já se recuperara o suficiente para eles encerrarem a estada ali. Manteriam a cobertura para futuras visitas, planejando pelo menos duas ao ano, mas Raoul tinha trabalho a fazer. Tudo estava retornando ao normal, a uma atmosfera estável e confiável. Sirena sentia-se um pouco melancólica cada vez que ele falava que a amava, e dizia a si mesma para ser grata por ele lhe dizer aquelas palavras, mesmo que não tivessem o mesmo significado que tinham para ela. Um dia antes da viagem de volta, Sirena acordou tarde. Foi até a sala, onde Raoul acabara de entrar e estava fechando a porta principal. — Bom dia. — Bom dia. Onde está Lucy? — Ali acabou de levá-la para cima. — Para a cobertura? Pensei que todos estivessem almoçando. Raoul tomou as mãos dela. — O que há de errado? — perguntou Sirena em um sussurro. — Você é tão linda — respondeu ele, como se isso o machucasse. — Raoul... — Não estou tentando fazer mistério, Sin. Estou bem nervoso. Bem, não há nada a dizer, exceto que... — Ele a soltou e deu meio passo para trás. Para sua surpresa, Raoul se ajoelhou. Segurando um anel, ele fez o pedido. — Quer se casar comigo? Raios de sol brilharam sobre o diamante, fazendo surgir faíscas de todas as cores. Aquele momento foi impresso na eternidade. As notas delicadas da música ao fundo, o perfume das frésias e das rosas, a forma como o coração dela começou a bater com alegria pura, os sentimentos no rosto amado de Raoul quando ele a olhou. Desejo, respeito, admiração. Sirena se deu conta de que não conseguia falar nada, e levou as mãos à boca. — Já estamos casados — lembrou-lhe em um som abafado. — Quero me casar com você do jeito certo. Todo mundo está lá em cima esperando por nós. Os olhos dela se arregalaram, cheios de lágrimas. — Sei que você não queria isso, mas preciso saber se deseja se casar comigo, tanto quanto amo estar casado com você. Falei com o seu pai, contei-lhe tudo, pedi a ele a sua mão... — Você fez o quê? — perguntou ela em choque. — Ele levou um tempo pensando sobre isso, e não o culpo. — Os ombros de Raoul relaxaram. — Se pudesse voltar atrás e mudar as coisas... Mas eu não posso. Sei que 91


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pensa que estou apenas tentando amenizar a culpa. Não estou. Se você me aceitar, saberei que agora confia em mim O arrependimento nos olhos de Raoul era doloroso demais. Ele se levantou e abraçou-a. Ela apertou seu rosto contra o peito dele. — Você fará até o mais impossível dos relacionamentos dar certo para que possa fazer parte da vida das pessoas que ama. Sei isso sobre você, Sin. Eu amo você. Case-se comigo porque me ama também Não por Lucy, mas porque nos amamos. Se você não quer isso, não acredita que estamos os dois nesta relação, então não aceite. — É o que eu sempre quis, a fé em meus sentimentos e nas minhas intenções em relação a você... Raoul acariciou o rosto dela. — Este é o nosso novo começo. Sirena concordou e, encostando a cabeça no peito dele, disse: — Eu amo você demais. É difícil acreditar que fosse recíproco. É tão grande e infinito, e você é tão incrível. Merece ser amado assim, mas eu sou só eu. — Se você pudesse ver a si mesma do jeito que eu vejo. A maneira como todos nós a vemos. Você é uma mulher incrível, Sin. Tão forte, mas tão amável. Estou orgulhoso de que seja a minha esposa. Quero que o mundo saiba o quanto você significa para mim Para um homem tão recluso por natureza, aquele fora um grande gesto e a emocionara de verdade. Ela se deixou ficar ali, abraçando-o, apoiada nele, impedindose de explodir de emoção. — Você aceita? — perguntou ele, beijando seu cabelo. — Aceita se casar comigo? Sirena balançou a cabeça em meio a lágrimas felizes. — Claro. Com prazer. Eu amo você, Raoul. — E usará aliança a partir de agora — resmungou ele, enfiando o anel no dedo dela. Feito todo em diamantes, delicado o bastante para não enroscar em roupas de bebê ou na pele, brilhante o bastante para surpreendê-la. Sirena riu, em seguida, olhou para Raoul. — Não sei como lidar com tanta felicidade. — Seu rosto até doía, pois não conseguia parar de sorrir. — Isto significa muito para mim Não era o pedido de casamento o motivo de sua felicidade. Estava feliz por saber que Raoul a amava. Sirena sentiu seus lábios tocarem os dela, piscou tentando conter as lágrimas. — Ali me ajudou a planejar tudo. Espero dar a você um casamento que seja o que você sempre imaginou. Já era melhor do que Sirena se atrevera a imaginar, mas estava impressionada pelos pequenos detalhes que tornaram a cerimônia de casamento perfeita. Ali tinha encontrado um vestido de renda sobre seda com uma cauda modesta. Sirena fez o próprio cabelo e a maquiagem; Ali a ajudou com o véu. Faye emprestou-lhe o medalhão azul que estava em sua família há muito tempo e seu pai a encontrou no elevador, ainda fraco, mas orgulhoso de levá-la ao altar. 92


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Quando viu a filha com um vestido florido, sentada no colo de Amber, quase tropeçou. Em seguida, a mãe e a meia-irmã de Raoul apareceram; alguns de seus colegas de trabalho de longa data também estavam lá. Raoul tinha feito um excelente trabalho. Ele usava um terno que a deixava sem fôlego de tão lindo, e virou-se para encarála com enorme admiração e sem constrangimento no olhar. Sirena ficou sem palavras. Os votos que trocaram foram comoventes e, sentindo dentro de seu coração a sinceridade de Raoul enquanto proferia os dele, Sirena soube que aquele homem a amava. A ela. E eles tinham uma vida inteira pela frente. Raoul ergueu seu véu e Sirena manteve os olhos abertos, querendo que ele visse a mesma devoção em seu olhar que encontrava refletida no dele. Selaram as promessas feitas um para o outro com um beijo carinhoso.

Fim

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Próximo Lançamento

PROMESSA DE PAIXAO Annie West — Receio que a última auditoria apresentou uma... irregularidade. Jonas olhou para a grande mesa polida e franziu a testa enquanto seu chefe de finanças mudou de posição na cadeira, nervoso. Que tipo de irregularidade poderia deixar Charles Barker assim? Ele era o melhor. A política de Jonas era contratar apenas os melhores. Não tinha paciência com os menos experientes. Barker comandava com excelência sua parte na empresa de Jonas. — Uma irregularidade significativa? — Não em termos financeiros gerais. — Barker balançou a cabeça negativamente. Uma vez que os ativos totais da empresa estão na casa dos bilhões, Jonas supôs que deveria se sentir aliviado, mas ao ver Barker afrouxar a gravata, Jonas teve um mau pressentimento. — Desembucha, Charles. O chefe das finanças sorriu, contudo, o sorriso se transformou em uma careta enquanto deslizava o laptop sobre a mesa. — Ali. As duas primeiras linhas. Jonas observou a primeira linha. Uma transferência de milhares de libras. Abaixo, havia outra, muito maior. Não havia detalhes sobre nenhuma delas. — O que é isso? — Retiradas de sua conta-investimento original. A expressão de Jonas ficou igual a de uma carranca. Atualmente, usava essa conta apenas para transferências de fundos pessoais entre investimentos. — Alguém acessou minha conta? A resposta era óbvia. Jonas não fizera essas retiradas. Movimentava despesas do dia a dia em outros lugares, e, embora fossem bem maiores que o normal, esses saques não eram tão significativos quanto seus investimentos pessoais de costume. — Nós rastreamos. É claro. Barker tentaria resolver sozinho antes de levar o problema até Jonas. — E? — A curiosidade aumentou. — Você deve lembrar que essa conta foi originalmente criada como parte de uma empresa familiar. Como Jonas poderia esquecer? Seu pai lhe dera valiosas lições sobre como administrar uma empresa, fingindo que ele, como chefe da família, era o sócio majoritário. Contudo os dois sabiam que era o talento de Jonas para os investimentos e sua fome implacável por sucesso que transformaram a sociedade. Piers simplesmente pegou carona, deleitando-se com o sucesso. Até que pai e filho se separaram 94


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— Eu lembro. — A lembrança tinha um gosto amargo. — Os saques foram feitos usando um velho talão de cheques que, supostamente, havia sido destruído. Jonas ergueu os olhos, percebendo um leve rubor no rosto de Barker. — Os registros mostram que foram todos justificados, menos este de seu pai... — Está certo, já entendi. — Jonas admirou a vista incomparável da cidade de Londres, contemplativo. Seu pai. Jonas não o chamava assim desde a infância, quando descobriu que tipo de homem era Piers Deveson. Apesar de sua arrogância sobre a honra e o nome de família, Piers não foi nenhum modelo de virtude. Não é de surpreender que o velho tenha encontrado uma maneira de acessar ilegalmente os bens do filho. Por que não fizera isso antes? — Então. Piers... — Não! — Barker ficou ereto, enquanto Jonas voltava-se para ele. — Sinto muito, no entanto temos motivos para crer que não foi seu pai. Veja. — Ele entregou algumas páginas fotocopiadas. Jonas analisou-as. Dois cheques com a assinatura de seu pai. Só que aquela não era a assinatura de Piers Deveson. Era boa o suficiente para enganar um estranho, entretanto ele estava bastante familiarizado para detectar as diferenças. — Observe as datas. Jonas olhou e, para sua surpresa, sentiu um soco no estômago que o deixou sem fôlego. Já é terrível pensar que o pai o havia roubado. Mas isso era... Jonas meneou a cabeça, o estômago contorcido pela emoção inesperada. — O segundo cheque foi datado um dia depois da morte de seu pai. E leia também em Poder & Desejo, edição 221 de Harlequin Jessica, Uma reputação a zelar, de Victoria Parker.

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