Rachel bailey [filhas do poder 4] acostumado ao escândalo (desejo dueto 43 2)

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ACOSTUMADO AO ESCÂNDALO No Stranger To Scandal

Rachel Bailey

Decoro x Destino. Lucy Royall pode ser a enteada de um dos homens mais poderosos da mídia de Washington, mas não é uma princesinha mimada. Ela constrói a própria carreira como repórter. Contudo, quando o investigador Hayden Black acusa seu padrasto de um crime, Lucy demonstra lealdade à família e o desafia. A relação deles passa da prestação de contas à paixão, e ela vive uma noite inesquecível com Hayden… Não poderia existir uma situação de conflito de interesses mais apaixonada! Mas será que Lucy e Hayden conseguirão enfrentar um escândalo que irá abalar as estruturas do país? Digitalização: Simone R. Revisão: Carmita


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Tradução Leandro Santos HARLEQUIN 2014 PUBLICADO SOB ACORDO COM HARLEQUIN ENTERPRISES II B.V./S.à.r.l. Todos os direitos reservados. Proibidos a reprodução, o armazenamento ou a transmissão, no todo ou em parte. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas é mera coincidência. Título original: A WEDDING SHE’LL NEVER FORGET Copyright © 2013 by Harlequin Books S.A. Originalmente publicado em 2013 por Harlequin Desire Título original: NO STRANGER TO SCANDAL Copyright © 2013 by Harlequin Books S.A. Originalmente publicado em 2013 por Harlequin Desire Projeto gráfico de capa: Nucleo i designers associados Arte-final de capa: Ô de casa Editoração eletrônica: EDITORIARTE Impressão: RR DONNELLEY www.rrdonnelley.com.br Distribuição para bancas de jornais e revistas de todo o Brasil: FC Comercial Distribuidora S.A. Editora HR Ltda. Rua Argentina, 171,4° andar São Cristóvão, Rio de Janeiro, RJ — 20921-380 Contato: virginia.rivera@harlequinbooks.com.br

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CAPÍTULO UM

Hayden Black procurou em meio aos documentos e às fotos sobre a mesa de sua suíte num hotel em Washington até encontrar aquilo de que precisava. Olhos cor de mel assombrosamente lindos; cabelo loiro reluzente na altura dos ombros; lábios vermelhos perfeitos. Lucy Royall. A chave de sua investigação para o Congresso, que destruiria o padrasto dela, Graham Boyle. Depois de sua pesquisa preliminar, Hayden concluíra que a herdeira de 22 anos era a pessoa de quem ele poderia arrancar todas as informações sobre as atividades criminosas de Boyle. Hayden pegou outra fotografia, uma imagem publicitária dela da rede de notícias de Boyle, o American News Service, onde Lucy trabalhava como repórter júnior. Mesmo com o tom profissional e os olhos com pesada maquiagem, ela parecia jovem e inocente demais para estar envolvida com a suja invasão ilegal que o ANS praticara nas linhas telefônicas dos amigos e familiares do presidente. Contudo, aparências podiam enganar, especialmente com relação a princesas mimadas. Ninguém sabia disso melhor que Hayden. Lucy Royall era a enteada do bilionário Graham Boyle desde os 12 anos, e seu pai, falecido, deixara uma vasta fortuna para ela. Ele pegou a foto de outra jornalista loira, Angelica Pierce, repórter sênior do ANS. Hayden finalizara uma entrevista com a srta. Pierce fazia dez minutos. Angelica se mostrara ávida por ajudar, dizendo que o escândalo das escutas telefônicas manchava o nome de todos os jornalistas. E ficara ainda mais ansiosa para ajudar falando de Lucy Royall. Segundo Angelica, quando Lucy se formara na faculdade, Boyle lhe dera o emprego de repórter júnior, deixando para trás muitos candidatos mais qualificados. Agora, Angelica afirmava, Lucy “desfilava pelo escritório, recusando tarefas das quais não gostava e querendo privilégios”. Durante a entrevista, porém, Angelica fizera algo especialmente interessante: mentira para Hayden, dizendo que Lucy a ameaçara. Os sinais da linguagem corporal dela foram quase imperceptíveis, mas ele já entrevistara incontáveis pessoas ao longo dos anos e estava acostumado a detectar o que outros deixavam passar. Hayden tinha a impressão de que havia mais naquela história. Sim, sua primeira reação era sempre a de desconfiar de jornalistas; eles eram acostumados demais a manipular fatos para criar uma boa matéria. Porém, aquela investigação se concentrava em jornalistas. Sendo assim, pelo bem da objetividade, Hayden precisaria deixar essa desconfiança de lado. Ele pegou uma foto de Graham Boyle. A pesquisa que Hayden fizera ao investigar as escutas telefônicas e outras atividades ilegais para o comitê do Congresso sempre acabava levando de volta a Boyle. E a sua enteada. Talvez Angelica Pierce tivesse mentido sobre a ameaça de Lucy Royall, possivelmente para proteger seu emprego. Hayden, entretanto, não tinha dificuldade para acreditar que a srta. Royall era uma princesa mimada brincando de jornalista. O que, para ele, estava ótimo. Conseguir uma confissão dela a respeito dos negócios sujos de Boyle seria brincadeira de criança. Hayden tinha experiência suficiente com herdeiras mimadas para saber muito bem como lidar com elas. 3


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Lucy Royall seria pega, e seu padrasto cairia junto com ela.

Com o telefone ao ouvido, Lucy digitava as perguntas para Mitch Davis, o âncora de um dos programas de notícias noturnos do ANS. Ele entrevistaria um senador da Flórida dali a quatro horas e queria a lista até o meio-dia. Sendo assim, restavam a Lucy dez minutos. Ela também tinha um compromisso marcado com o detetive do comitê do congresso, Hayden Black, à uma da tarde. Por isso, o telefonema de Marnie Salloway, uma das produtoras, viera na hora errada. – Marnie, posso ligar de volta em 15 minutos? – Vou entrar em reunião. Tenho de falar com você agora. – Certo, claro. O que foi? – Preciso de uma lista de locais aos quais mandar o cinegrafista à tarde para fazer imagens para a matéria da filha do presidente. – Enviei hoje de manhã por e-mail. – Você mandou uma lista com dez opções. Não é suficiente. Quero 20 até 12h30. Lucy conteve um suspiro. – Certo. – E desligou. Quando Lucy se formara, Graham lhe oferecera o cargo de repórter pleno. Ela recusara. Então, ele oferecera a vaga de âncora dos finais de semana. Seu padrasto só estava tentando ajudar, como fizera desde que Lucy tinha 12 anos, mas ela não queria um cargo alto. Não, não era verdade. Definitivamente, Lucy queria ser uma grande repórter. Mas desejava merecer o posto, ser respeitada por sua capacidade jornalística. E a única maneira de desenvolver isso seria trabalhando como subordinada de excelentes profissionais. Contudo, ali, ela não era apenas uma repórter júnior; era tratada como uma serviçal. E a pessoa que lhe dispensara o pior tratamento fora justamente sua antiga musa, Angelica Pierce. Respirando fundo, Lucy terminou de digitar as perguntas e as enviou. Então, abriu o navegador da internet para buscar novas opções para enviar a Marnie. Em seu primeiro dia de trabalho, ficara claro para Lucy que os outros funcionários do ANS se ressentiam de ter a enteada de Graham trabalhando na editoria deles. Suspeitavam de que ela fosse uma espiã de Graham. De certa forma, ela não tinha como culpá-los, pois todos a viam como uma representante do chefe. Porém, Lucy também não permitiria que isso a abalasse. Sua atitude era a de baixar a cabeça e cumprir todas as tarefas menores que os funcionários de cargos mais altos lhe pedissem, ridículas ou não. Enviou a lista ampliada para Marnie, pegou a bolsa e saiu para seu compromisso com Hayden Black. O Congresso desperdiçava tempo e dinheiro. Estavam investigando Graham Boyle por práticas ilegais de escuta telefônica do ANS, apesar de já terem apreendido os responsáveis. Naquele dia, seria a vez de Lucy ser entrevistada, para defender Graham. Seu padrasto sempre estivera presente, ajudando-a com tudo durante quase metade da sua vida; agora, Lucy iria retribuir. 4


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O táxi a deixou no Sterling Hotel, onde Hayden Black se hospedava e conduzia as entrevistas. Pelo que Lucy ouvira, tinham lhe oferecido um escritório, mas ele preferira um território neutro; uma atitude interessante. A maioria dos detetives gostava da autoridade extra conferida por um escritório oficial. Depois de subir no elevador, Lucy verificou o número na porta da suíte e bateu, já preparando um sorriso de “não tenho nada a esconder”. Quando a porta se abriu, no entanto, ela ficou paralisada. Um homem alto, de camisa branca imaculada, gravata vermelha e calça social preta preenchia o portal... Hayden Black. O ar ficou pesado. Lucy conhecera muitos homens poderosos em seu emprego, em sua vida, mas nenhum tivera a presença daquele cavalheiro. Ela precisou se esforçar para respirar. Hayden franziu o cenho. Olhos castanho-escuros a observaram, e não pareceram gostar do que viam. Ele já a estava julgando, e a entrevista nem sequer começara. Lucy empinou o queixo. Não tinha problema; estava acostumada com o fato de as pessoas a julgarem com base em ideias preconcebidas a respeito de sua fortuna, seu estilo de vida, sua criação. Ele pigarreou. – Srta. Royall. Obrigado por ter vindo. – O prazer foi meu, sr. Black – disse ela usando a entonação educada com a qual sua mãe a ensinara a sempre começar quando queria vencer algo. É mais fácil pegar moscas com mel que com vinagre. – Quer algo para beber antes de começarmos? – Estou bem, obrigada. – Lucy se sentou. Hayden se acomodou na cadeira diante dela e a fitou de forma condescendente. – Vou fazer algumas perguntas simples sobre o ANS e seu padrasto. Se a senhorita se ativer à verdade, não teremos nenhum problema. Um surto de calor percorreu a pele dela. Que arrogância! Tinha 22 anos, era formada pela Georgetown University e dona de um sexto da maior rede de lojas de departamentos do país. Ele pensava que ela aceitaria ser tratada como uma criança? Lucy abriu seu melhor sorriso inocente e colocou sua grande bolsa vermelha na mesa diante de si. – Sabe, acho que vou querer um copo de água. Trouxe um bolinho para comer. Não se importa, não é? Tive que abrir mão do almoço para vir. Ele hesitou. Então, murmurou: – Claro. – E se levantou para buscar a água. Lucy suspirou, satisfeita; pegara-o desprevenido. Quando Hayden voltou, ela partiu um pedaço do bolinho e o pôs na boca. Ele se sentou na cadeira e a olhou fixo. Parecia ter recuperado a compostura. – Srta. Royall... Ela tirou um bloco de notas da bolsa. – Vou anotar as coisas das quais falaremos. Sempre acho melhor se todos se lembrarem exatamente do que foi dito numa entrevista, seja do tipo que for. Faz com que todos se atenham à verdade e, assim, não haja problemas. 5


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– Está pronta? – perguntou ele tenso. – Só um momento. Prefiro estar totalmente preparada para uma conversa importante como esta. Ela pôs a bolsa no chão e escreveu no alto da página: “Entrevista com Hayden Black, 2 de abril de 2013.” Então, sorriu. – Estou pronta.

Hayden resistiu ao impulso de grunhir e invocou a expressão neutra que costumava encontrar com facilidade em entrevistas. Lucy Royall era exatamente como na foto, mas também totalmente diferente. Ele ficou sem fôlego. Os olhos dela brilhavam com a mesma cor de mel, mas, naquele momento, reluziam de inteligência. Hayden compreendeu que ela tentava manipulá-lo, e, droga, estava conseguindo. Ele não sabia se ficava irritado ou se achava graça. Todavia, algo que ele não achara engraçado fora sua inesperada reação ao abrir a porta. Sentiu-se atingido no âmago. Ela não era apenas linda; era de tirar o fôlego. E aquela era a pior mulher do mundo para ele no momento. A filha do homem que Hayden vinha investigando em nome de um comitê do Congresso. Uma jovem que, se seu palpite estivesse correto, era cúmplice nas atividades ilegais do padrasto. Hayden apertou o botão para ligar o gravador. – Fale do seu relacionamento com Graham Boyle. Lucy não hesitou. – Graham é meu padrasto desde que eu tinha 12 anos. É um homem doce, de bom coração. Doce? Boyle era dono de uma rede nacional de notícias, temido por concorrentes e aliados. Para Graham Boyle, os fins justificavam os meios. Ele exigia que seus repórteres fizessem qualquer coisa para conseguir uma matéria. E alguém que fazia parte da família direta de Graham Boyle havia mais de dez anos não podia estar totalmente alheio à sua natureza implacável. – Essa não é a opinião geral. – Seus pais o veem do mesmo jeito que seus amigos, sr. Black? Suas namoradas? Seus funcionários? Chefes? Meu padrasto tem o tipo de cargo no qual precisa tomar decisões duras, e as pessoas que discordam dessas decisões podem vê-lo como um indivíduo severo. Mas, comigo, ele sempre foi bondoso e generoso. – Fico feliz de saber. Mas ele não foi acusado de tomar decisões duras, srta. Royall, e sim de autorizar, ou de ao menos aceitar, escutas telefônicas ilegais para obter informações sobre a filha ilegítima do presidente. Lucy se curvou à frente lentamente. – Vou lhe dizer de que tipo de homem ele é. Quando minha mãe morreu, há três anos, Graham ficou arrasado. Mal conseguiu se afastar do túmulo. Precisou do apoio de dois amigos. Então, apesar dos horários exigentes do cargo dele e do próprio luto,

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Graham fez questão de ligar para mim, de me visitar, de garantir que eu estivesse bem. – Ela se recostou de novo. – É um bom homem. Havia algo de profundamente atraente na defesa fervorosa que ela fazia do padrasto. Hayden, porém, ignorou. Ele era um profissional. – Al Capone era bom para a família dele – disse ele. As faces dela coraram. – Não gostei da sua insinuação. – Eu não estava insinuando nada além do fato de que ser bom para a família não exclui automaticamente a possibilidade de uma pessoa se envolver em atividades ilegais. Lucy o encarou durante vários desafiadores segundos. Em seguida, baixou o olhar para o bloco de notas, e seu cabelo loiro balançou à frente. Na mente de Hayden, surgiu uma imagem dele entrelaçando os dedos naquele cabelo, erguendo o rosto dela para si até que as bocas se tocassem delicadamente, sentindo a maciez dos fartos lábios, a paixão que ela... Controle-se, Black. – Você participou de algum tipo de vigilância ilegal no ANS? – perguntou ele, mais ríspido do que pretendia. – Não. – Tem ciência de alguma ocorrência de vigilância ilegal no ANS? – Não. – Já participou ou teve ciência de alguma atividade ilegal no ANS? – Não. – Trabalhou com os ex-jornalistas do ANS Brandon Ames e Troy Hall quando eles usaram escutas telefônicas ilegais para descobrir a história da filha ilegítima do presidente? – Não. – Eles estavam obedecendo a ordens do seu padrasto? – Claro que não. – Sabe quem pode tê-los ajudado no ANS? – Até onde sei, ninguém. – Por que você acha que foram feitas acusações contra o ANS e Graham Boyle? – Aqueles que fazem algo na vida sempre atraem alguns que querem destruí-los. Infelizmente, Hayden sabia que não fora por isso que as acusações haviam sido feitas. Graham Boyle talvez tivesse alguns argumentos, talvez tratasse bem sua enteada, mas continuava sendo um idiota impiedoso que prejudicava muita gente. – Como você acha que o ANS conseguiu as fontes que revelaram a filha do presidente Morrow? Ele era senador por Montana. Muitos já tinham vasculhado o passado dele. Pela primeira vez, uma linha de incerteza surgiu na testa de Lucy. – Não sei. Não trabalhei nessa matéria.

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Hayden teria de forçar mais, mas, que Deus o ajudasse, com aquela expressão no rosto dela, ele queria reconfortá-la. Pegar sua mão e lhe dizer que tudo ficaria bem. Apesar disso, a parte cínica de seu cérebro comentava que aquilo devia ser uma encenação. – Mas você decerto conversa com outros jornalistas, senhorita. E essa matéria e os métodos utilizados foram de nível altíssimo. Está me dizendo que não ficou sabendo de nada a respeito de como eles conseguiram as fontes? – O bom e velho jornalismo investigativo. – A petulância dela era forçada, mas Hayden não sentia que ela estava mentindo. Não como a última mulher que se sentara naquela cadeira. A jovem diante dele não se dava bem com seus colegas, sentia-se excluída. Uma flecha de indesejada ternura o atingiu no peito. Angelica Pierce, contudo, deixara claro de quem era a culpa pela falta de integração. Sentir pena de Lucy Royall seria uma perigosa armadilha. Aquela entrevista não estava levando a lugar nenhum. Talvez a insônia dos últimos meses estivesse enfim afetando a capacidade investigativa dele. Hayden consultou o relógio. Talvez fosse melhor encerrar aquele dia mais cedo, ir buscar seu filho com a babá e dar uma volta por um dos parques da cidade. Ele poderia voltar a entrevistar Lucy Royall quando sua concentração se mostrasse mais aguçada. – Obrigado pela atenção, srta. Royall. Entrarei em contato quando precisar falar com você outra vez. Ela pôs o bloco e a caneta na bolsa e se levantou. – Sr. Black, entendo que só esteja fazendo seu trabalho. Mas espero que ainda não tenha descartado a possibilidade de que Graham Boyle seja inocente. Hayden ficou de pé. – Se as evidências mostrarem que ele é inocente, srta. Royall, será isso o que informarei ao Congresso. Entretanto, a intuição dele nunca falhava, e ela lhe dizia que o padrasto de Lucy Royall era culpadíssimo. Hayden abriu a porta para ela e a viu descer pelo corredor, os quadris balançando de maneira sutil. Havia força e determinação surpreendentes naquela mulher... e isso o pegara desprevenido. Por sorte, a determinação dele era ainda maior. Quando voltasse a encontrar Lucy Royall, Hayden estaria pronto para ela.

CAPÍTULO DOIS

Lucy entrou em silêncio no escritório de seu padrasto. Graham fez um movimento de cabeça ao vê-la e, em seguida, deu mais ordens enquanto falava ao telefone.

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Acostumada a se manter por perto enquanto ele trabalhava, Lucy aproveitou a oportunidade para olhar a vista panorâmica de Washington. Ela amava aquela cidade. Mudara-se para ali de Charlotte, Carolina do Norte, quando tinha 12 anos e sua mãe se casara com Graham. A cidade e Graham tinham sido bons para Lucy. Num cesto debaixo da mesa, Rosebud, a buldogue dele, levantou a cabeça e foi até ela. Lucy se agachou para acariciá-la. – Como vai, Rosie? – sussurrou. Com um último comentário sério, Graham encerrou o telefonema. – Lucy! – Estendeu-lhe os braços. Ela se ergueu e aceitou o abraço de urso, deixando de lado todas as suas preocupações por preciosos segundos. Graham era a única pessoa com quem Lucy sempre podia contar. Sua única família. – Espere – disse ele recuando. – Tenho uma coisa para você. Lucy não conseguiu evitar sorrir ao ouvir as conhecidas palavras. – Não precisava... – Claro que precisava. E ela sabia que ele tinha razão; era sua maneira de demonstrar amor. Lucy também era tudo o que seu padrasto tinha. Ele abriu um dos armários, retirou uma caixa de veludo azul e entregou-a a Lucy, sorrindo, orgulhoso. Ela ergueu a tampa e retirou um maravilhoso buldogue de cristal do tamanho de sua palma. – É Rosebud. Ao ouvir seu nome, a verdadeira Rosebud bateu sua cauda no carpete. – Obrigada! – Lucy beijou o rosto de Graham. Ele sorriu, com o coração no olhar, como sempre. Então, pigarreou e retornou para sua mesa. Nunca se sentira muito confortável com emoções. – Conte como foi a entrevista com Black. Ela se afundou numa cadeira diante da mesa de Graham. – Mais curta do que eu esperava. Ele só fez algumas perguntas. – Isso significa que só estava testando o terreno. – Black disse que entraria em contato quando precisasse falar comigo de novo. – Lembrar-se das palavras de Hayden e de sua profunda voz ao dizê-las fez Lucy estremecer. Se ela não tomasse cuidado, desenvolveria uma atração pelo detetive. Mas aquele homem era tão delicioso! Tão alto e largo, com um comportamento soturno para combinar com sua aparência. Por um sublime momento, ela imaginara aqueles longos e bronzeados dedos a acariciar seu rosto. – Nosso maior risco é o de que alguém rancoroso dê um testemunho falso. Que minta para Black dizendo ter visto alguma coisa. Você conseguiu perceber se ele já tinha conseguido algo assim? – O sr. Black escondeu bem o jogo. Mas algo ficou muito claro – disse ela, com delicadeza, como se pudesse abrandar o golpe. – Na opinião dele, você é culpado. 9


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Graham soltou um palavrão sussurrado. – Eu me recuso a ficar parado, esperando que um detetive nada objetivo “encontre” evidências para corroborar sua teoria. Precisamos expor Black antes que ele cause estragos demais. – O que tem em mente? – Quero que dê início à sua própria investigação, Lucy. Vou afastá-la de todas as outras obrigações. Você administrará isso por conta própria, sem revelar a ninguém. Você é a única pessoa em quem posso ter cem por cento de confiança de que não irá me apunhalar pelas costas para conseguir notoriedade ou seja lá por que motivo uma pessoa resolve incriminar outra. Lucy pegou a mão dele. – Começarei imediatamente. – Você é uma boa menina. – Graham deu tapinhas nas mãos dela e as soltou. – O Congresso na certa analisou o passado dele antes de contratá-lo, mas nós somos melhores. Encontre as manchas do passado de Black e traga para nós. Vamos pôr uma matéria no ar assim que você tiver material suficiente. Ela sentiu um frio na barriga. Não gostava muito daquele estilo de jornalismo. E o fato de Hayden Black ser o alvo a deixava ainda menos confortável. Mas Lucy se lembrou da expressão fechada dele quando ela saíra da suíte, menos de uma hora antes. Black perseguiria Graham, já convencido de que era culpado. Expô-lo numa matéria poderia deixar um gosto amargo na boca de Lucy, mas as ações do próprio Hayden Black haviam tornado isso necessário. Além do mais, se ele não tivesse nenhum fantasma em seu passado, ela não encontraria nada. – Você não pode me pôr no ar com essa matéria. Todos sabem que sou sua enteada. Vamos precisar de alguém de boa reputação e um pouco mais distante de você. – Pensaremos nisso quando tivermos o conteúdo pronto. Faça a pesquisa, consiga a matéria, e eu trarei alguém para apresentá-la. Lucy apanhou seu bloco de notas. – Quem é nossa fonte no Sterling Hotel? Graham pegou o telefone, digitou, deu uma ordem e, depois de conseguir a informação, desligou. – Um concierge chamado Jerry Freethy. – Certo. – Ela ficou de pé. – Vou avisando à medida que for conseguindo informações. – Soprou um beijo para Rosebud e foi para a porta. – Lucy? Ela se virou. – Obrigado. A emoção embargou sua garganta, mas ela encontrou a voz: – Não se preocupe. Eu defenderei você, Graham.

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No dia seguinte, às 13h30, Lucy avistou seu alvo. O concierge lhe dissera que Hayden Black gostava de passear com o filho pelo parque que ficava na frente do Sterling Hotel no horário do almoço. Lucy e Rosebud tinham vagado pelo parque desde pouco depois de 11h. Rosebud arfava do exercício, mas estava se divertindo conhecendo pessoas que paravam para acariciá-la. Hayden andava rápido num caminho pavimentado a cerca de seis metros de onde ela estava e conversava com uma criança que ele carregava num dos braços. Segurava uma sacola na outra mão. Ao vê-lo, Lucy arfou. Ombros largos e fortes que se afunilavam para quadris estreitos. Pernas compridas que andavam com confiança. A graça masculina na forma de segurar o filho. – Vamos, Rosie. Quero que você conheça um garotinho. Durante sua pesquisa, Lucy encontrara reportagens que falavam da morte da esposa de Hayden num acidente de carro alguns meses antes, o que o transformara num pai solteiro de um bebê de 9 meses, Joshua, que, àquela altura, devia ter completado um ano. Quando elas se aproximaram, Lucy olhou as árvores, mas manteve os dois em sua visão periférica. Ela ouviu um guinchado, seguido por “Au-au!”. Lucy enfim ergueu os olhos para ver que Hayden parara. Lucy não costumava der muita atenção à boca dos homens – os ombros e os bíceps chamavam sua atenção antes de tudo – mas a de Hayden era algo lindo. Lábios sensuais que ela quase conseguia sentir percorrendo seu pescoço. A pele de Lucy se aqueceu; formigou. Antes de se deixar levar demais, ela encontrou um sorriso e se aproximou com Rosie. – Srta. Royall... – A voz dele soou agradável, talvez por causa do filho, mas seu rosto dizia algo diferente. Hayden se sentia incomodado por ter esbarrado com ela. Por que não queria misturar trabalho e família? Ou seria por outro motivo? – Dia lindo, não? – Lucy se curvou para coçar atrás das orelhas de Rosie. – Rosebud e eu adoramos o mês de abril. Por ter descoberto tudo o que havia para saber sobre Graham, Hayden saberia que o dono de Rosie era o alvo de sua investigação. E, pelo visto, ele acabara de perceber que poderia usar Rosie como desculpa para falar de Graham com Lucy, torcendo para que, no ambiente casual, ela cometesse um deslize. Exatamente o que ela vinha fazendo com ele. Mas isso não explicava por que ele ficara incomodado quando a vira. Talvez Hayden não quisesse que seu tempo com o filho fosse interrompido. Era possível, claro, mas parecia ser mais do que isso... Talvez Black não gostasse pessoalmente dela. Lucy sentiu um vazio no estômago antes de deixar o pensamento de lado. Só porque seus hormônios enlouqueciam quando ela o via, isso não significava que a química era mútua. Além do mais, Black perdera a esposa fazia poucos meses. Lucy devia estar feliz por ao menos um deles não se deixar levar por aquelas sensações. Envolver-se com o homem que ela estava investigando e que, ainda pior, investigava o ANS para o Congresso seria impensável. 11


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– Au-au! – Josh tornou a dizer. Hayden olhou de Rosie para ela. – Tem problema se Josh acariciá-la? – Nenhum. – Lucy sorriu inocente. – Rosie é mansa como uma ovelha. Hayden se agachou ao lado dela e apoiou Josh até conseguir se equilibrar, estendendo a mão para tocar a orelha de Rosie. – O nome dela é Rosebud – disse Lucy para o menino. Enquanto eles observavam a interação de Josh e Rosie, Hayden perguntou: – Há quanto tempo você a tem? – Ela é de Graham. Ele a tem há seis anos. Desde filhote. Hayden se curvou à frente e acariciou o animal. – Bela menina. O ombro dele estava a poucos centímetros do dela. Um travesso impulso a impelia a se inclinar na direção dele, sabendo que Hayden seria sólido e cálido. Lucy precisou de toda a sua força de vontade para resistir. Rosie rolou de barriga para cima, pedindo despudoradamente mais atenção. Lucy olhou fixo para ela, sabendo muito bem que ela própria se encontrava muito perto de ser igualmente descarada. Endireitou os ombros. Era hora de se afastar da tentação e lembrar que ela era uma jornalista trabalhando numa matéria.

Hayden não conseguia se concentrar em nada a não ser em Lucy a seu lado. Se ele quisesse, poderia estender a mão e passá-la pelo braço dela. O coração dele martelava como um bumbo. O choque de atração quando a vira no parque o abalara, e parte dele ainda buscava recuperar o equilíbrio. Lucy se levantou, quebrando o feitiço. – Eu ia dar água a Rosebud agora. – Ela pegou uma garrafa e a tigela de lona em sua bolsa. – Josh gostaria de ajudar? Hayden olhou para seu filho. Detestava não saber instintivamente aquelas coisas. Então, censurou a si mesmo. Era óbvio que Josh gostaria de ajudar. Cachorro e água; duas coisas que significavam diversão. – Ele adoraria – disse Hayden, por fim. Lucy deu a garrafa a Josh e explicou como encher a tigela. O menininho derrubou mais água no chão e em Lucy que na tigela, mas ninguém pareceu se importar, e Rosebud logo estava bebendo animada, enquanto Josh tentava pegar sua cauda, que balançava. O coração de Hayden cresceu ao ver seu filho sorrindo, tão alegre. Ele ficou de cócoras. – Li em algum lugar que Graham tinha um cachorro que ele levava todos os dias para o trabalho. – É ela. – Lucy não ergueu o olhar, mas acariciou o pescoço de Rosebud.

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– Quer dizer que você passa algum tempo no escritório de Graham para ficar com Rosebud? Ela sorriu, ciente de aonde ele queria chegar com aquilo. Rosebud terminou de beber, e Josh, procurando a próxima aventura, estendeu os braços para Lucy. Sem hesitar, ela o pegou. – Como vai, Josh? – perguntou Lucy encantando o garotinho. Então, olhou para Hayden. – Vejo Graham e Rosie algumas vezes por semana. Em vez de seguir a linha de perguntas que planejara, Hayden não conseguia para de apreciar a maneira fácil como Lucy interagia com seu filho. Josh acabara de conhecêla, mas já estava feliz em seus braços. E Lucy se mostrava relaxada, como se soubesse exatamente o que fazer com uma criança. Santo Deus, como Hayden queria saber também! Claro, ele entendia o básico, mas ainda estava se acostumando a ser o principal responsável por um bebê. Por que parecia tão natural para ela? Pela pesquisa que fizera, Hayden sabia que Lucy não tinha irmãos ou primos mais novos. Talvez fosse o fato de ele querer tanto ser um bom pai e Lucy não ter esse tipo de pressão. Hayden suspirou e se levantou. De novo perdia a concentração com Lucy Royall. Quase conseguira se recuperar da potência da atração e desviar a conversa para Graham Boyle. Agora, porém, voltara a se distrair com a maneira natural dela com seu filho. – Estamos indo para lá. E vocês? – indagou ele. – Josh e eu acabamos de sair para nosso almoço. Sorridente, Lucy o olhou. – Nós adoraríamos nos juntar a vocês para um passeio, não é, Rosie? Hayden pôs Josh no ombro, mas o menino se curvou na direção de Lucy, estendendo os braços. Hayden ergueu uma das sobrancelhas. Josh não costumava ficar tão tranquilo perto de pessoas estranhas. Lucy riu e estendeu a guia de Rosebud. – O que acha de trocarmos? Ele não se mexeu. Seria perigoso ultrapassar limites pessoais com investigados, algo que ele jamais fizera. – Papai – disse Josh apontando para Lucy. – Lá. E ali estava o ponto fraco de Hayden. Josh queria Lucy, e Hayden queria que Josh ficasse feliz. Complexas questões éticas se tornaram algo muito simples. – Claro. – Ele pegou a guia e entregou seu filho. – Eu seguro sua bolsa enquanto você fica com Josh. – Não tem problema. – Lucy fez cócegas em Josh e foi recompensada com risadas. – Estou acostumada a deixá-la pendurada no ombro. Ele assentiu, e eles caminharam pela trilha que passava ao lado de um cintilante rio. Hayden tentava não dar um soco em si mesmo. Fora chamado pelo comitê do Congresso para investigar o ANS, em especial, Graham Boyle. Agora, estava num parque em Washington passeando com a enteada do homem em questão, permitindo que ela aconchegasse seu filho, oferecendo-se para carregar a bolsa dela e conduzindo o cachorro daquele sujeito terrível.

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Sem falar em sua pulsação rápida, que tinha tudo a ver com a mulher cujo cotovelo estava a poucos centímetros do seu. – Srta. Royall... – Lucy. Estamos passeando num parque no horário do almoço. Acho que você pode me chamar de Lucy. – Lucy. O nome parecia incomum nos lábios dele. Hayden só o pronunciara até então junto com o sobrenome. Por si só, ele parecia especial, mais bonito. Mais íntimo. – Sim? – Sim o quê? – Você ia dizer alguma coisa quando eu falei para me chamar de Lucy. Verdade. Mas Hayden não fazia ideia do que era. Pelo visto, aquelas 24 horas para se recompor não tinham ajudado em nada. Hayden buscou uma maneira de encontrar um caminho para a informação que desejava. – Você sempre quis ser jornalista? – Talvez não sempre. Mas desde que me tornei estagiária de Graham, aos 16 anos. – O que você queria ser antes disso? – A família do meu pai tem lojas de departamentos. Quando papai morreu, herdei as ações dele. Sempre achei que me formaria em administração e trabalharia lá. A família dela tinha “lojas de departamentos”? Hayden quase riu. Em sua pesquisa preliminar, descobrira que Lucy era membro dos Royall das Lojas de Departamentos Royall. Uma família tradicionalmente rica, a ponto de fazer frente a gente do calibre dos Rockefeller. Lucy tinha pedigree até a alma. Uma genuína curiosidade o dominou. – Você tem mantido contato com esse lado da família? – Costumo ver minha tia Judith e a família dela – disse Lucy com um toque de remorso. – Ela tem uma casa linda em Fields, Montana, onde nos reunimos às vezes para aniversários e comemorar o Natal. – Fields é um belo lugar. Com ótimas pistas de esqui e snowboarding, ainda que, no momento, fosse mais famosa por ser a cidade natal do presidente Morrow. Enquanto ela brincava tocando o dedo na ponta do nariz de Joshua, Hayden a observava, tentando entender aquilo tudo. As escolhas dela não batiam com a imagem de princesa mimada. – Não teria sido mais fácil trabalhar na empresa da família Royall? Você já tem uma grande parte das ações de lá. Não precisaria começar por baixo, como fez no ANS. Fora o que a esposa de Hayden, Brooke, fizera. Ela trabalhara no império bancário da família. Aquilo, porém, fora apenas um emprego de fachada. Lucy arqueou uma das sobrancelhas. – O que o faz pensar que eu poderia querer o caminho mais fácil? 14


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– A natureza humana. Quem não iria querer a opção menos complicada? Ela ficou em silêncio, e o momento se estendeu. Então, Lucy o olhou com olhos perspicazes demais. – Diga, Hayden, você seguiu a opção profissional mais fácil disponível? – Não – admitiu. Mas ele não era um herdeiro como Lucy ou Brooke. Uma situação completamente diferente. – Há quanto tempo é detetive criminal? – Já faz alguns anos. – Mas Hayden não estava ali para falar de si mesmo. – Em que matéria você vem trabalhando no momento? – É uma pergunta oficial? Ele sentia a relutância dela, mas isso não era incomum. Jornalistas gostavam de manter seus furos de reportagem em sigilo. E, como as investigações dele tinham a ver com práticas passadas, a matéria atual de Lucy era irrelevante. Hayden deu de ombros. – Não, só curiosidade. – Então, vou responder com outra pergunta. – Ela o encarou, abrindo um estonteante sorriso. – Você veio aqui só para passear ou trouxe o almoço nessa sacola? Hayden ergueu a sacola de papel. – Almoço. Posso oferecer meio sanduíche de queijo com tomate do serviço de quarto. – Hayden era um homem de gostos simples; preferia sanduíches feitos com pão fresco a um almoço num sofisticado restaurante. – Pode ficar com o sanduíche. Também trouxe o meu. Eles encontraram um trecho gramado debaixo de um salgueiro. Hayden pegou uma embalagem de plástico com um lenço umedecido dentro e limpou as mãos de Josh antes de lhe entregar uma banana. – Quanta organização... – Lucy o observava com aqueles grandes olhos cor de mel. Hayden pareceu se irritar. – Para um pai, você quer dizer? – Para qualquer pessoa. Não foi minha intenção ofender. Ele assentiu. O fato de ser sensível com relação a suas habilidades como pai não significava que o que ela dissera fora uma alfinetada. Hayden abriu um sorriso autodepreciativo para compensar sua reação exagerada. – Foi a babá quem pôs tudo aqui. Eu não teria pensado num lenço umedecido. Lucy partiu um pedaço de sua barra de granola e o pôs na boca. Eles comeram em silêncio durante alguns minutos, vendo Josh devorar sua banana. Lucy apoiou uma das mãos na grama atrás de si. – É com ela que Josh fica durante suas entrevistas, Hayden? – Contratei a babá para nossa estada em Washington. Ela trabalha das nove às cinco.

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O maior problema era não ter sua irmã por perto. Era a primeira vez que ele bancava o pai por conta própria e estava determinado a fazer aquilo dar certo. – O que Josh costuma fazer durante o dia? – Quando estamos em nova York, ele passa uns dois dias por semana na casa da minha irmã. Ela tem um menino de 3 anos, e os primos gostam de brincar juntos. Nos demais dias, Josh fica numa creche no meu trabalho. Tem cinco filhos de funcionários lá, e posso vê-lo na hora do almoço. Ela sorriu para Josh. – Parece ideal. Não, ideal seria que Josh tivesse também uma mãe para passar tempo com ele, amá-lo e fazer dele o centro do mundo dos pais. Entretanto, mesmo antes da morte de Brooke, Josh não tivera isso. O peso da necessidade de tornar tudo perfeito para seu filho recaíra sobre Hayden, como sempre. Ele sentiu um aperto no estômago. Era tudo o que Josh tinha, e daria o melhor de si para tornar a infância dele o mais ideal possível. Hayden ergueu os olhos e viu que Lucy ainda o observava. Aquilo ficara pessoal demais. O que havia em Lucy Royall que o fazia esquecer tudo o que era importante? O que ele precisava fazer era marcar outra entrevista. Dessa vez, prepararia uma lista completa de perguntas para não se desviar do tema. – Josh está ficando com sono. Preciso levá-lo de volta para sua soneca. – Foi legal. – Lucy pegou o lenço umedecido e limpou os restos de banana dos dedos do garotinho. – Talvez Rosie e eu possamos nos juntar a vocês outra vez. Outra vez? Ele soltou uma risada incrédula. Levantou-se e pegou Josh. – Olhe, Lucy – disse Hayden de uma forma mais brusca do que pretendia – não sei bem o que você acha que está acontecendo aqui, mas essa investigação é séria. Não vim para fazer amizades. Os olhos dela se arregalaram, e Hayden se arrependeu na hora de seu tom. Suspirou e falou com mais gentileza: – Mesmo que eu quisesse, não poderia. Ela também ficou de pé. – Gostaria de ser meu amigo, Hayden? – Lucy arqueou uma das sobrancelhas, seus olhos reluzindo com algo que ele não conseguiu identificar. – Em circunstâncias diferentes, seria possível que fôssemos amigos. Lucy empinou o queixo. – Sei como isso é importante. Levo muito a sério o futuro de Graham. Mas só para deixar claro... – Ela fixou seus deslumbrantes olhos nele, e sua entonação mostrou sua determinação. – Em circunstâncias diferentes, eu não iria querer ser sua amiga, Hayden. Eu daria descaradamente em cima de você. Lucy se virou e foi embora, o cabelo loiro brilhando à luz do sol, Rosie em seu encalço, deixando Hayden para trás, perplexo.

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CAPÍTULO TRÊS

Às 16 horas do dia seguinte, Lucy bateu na porta da suíte de Hayden. Ele telefonara para o celular dela uma hora antes e lhe pedira para ir até ali responder a mais algumas perguntas. Lucy aproveitaria a chance de revê-lo em sua suíte para talvez encontrar mais algumas pistas para a matéria. Porém, agora que estava ali, seu corpo tremia por inteiro. Seria a primeira vez que ela o veria depois de ter dito que, se as circunstâncias fossem outras, tentaria conquistálo. E Lucy não fazia ideia de como as coisas poderiam ter mudado entre eles com isso. Na véspera, após virar uma esquina, no parque, e sair do campo de visão dele, ela chamara a si mesma de louca. Precisava ter cuidado. Não apenas pelo fato de estarem no meio de uma investigação do Congresso. Hayden Black era o último homem do planeta com quem ela poderia se envolver. As pessoas já a julgavam por ser filha de Jonathon Royall e enteada de Graham Boyle, dois homens ricos e com boas conexões. A opinião comum era de que Lucy recebera tudo o que quisera de mão beijada. Que não trabalhara para conseguir suas próprias conquistas. Se ela fosse vista com outro homem rico e bem conectado como Hayden Black, todos a considerariam definitivamente uma mulher que dependia de homens fortes. Mais uma vez, suas conquistas seriam desprezadas. Aos 13 anos, Lucy tivera sua primeira grande lição de como as pessoas tiravam conclusões precipitadas, e isso a tornara determinada a provar para o mundo que poderia conseguir qualquer coisa sozinha. Não, Hayden Black não era para ela. Lucy precisava de um homem comum, talvez um que estivesse começando a carreira, do mesmo modo que ela. A porta se abriu para revelar um homem que estava longe de ser comum. – Obrigado por ter vindo. Havia algo de novo na expressão dele. Seus olhos da cor do café mostravam tensão ao avaliá-la. Talvez tivesse sido bom Lucy ter pegado Hayden desprevenido no dia anterior. – Não há por quê. – Ela parou ao entrar. – Chamo você de Hayden ou de sr. Black, já que esta é uma entrevista oficial? – Hayden está ótimo. – Ele fechou a porta e a conduziu até a mesa e as cadeiras. Lucy olhou à volta, percebendo os detalhes que poderiam vir a ser úteis mais tarde. Além dos papéis sobre a mesa, o quarto estava organizado, nada fora do lugar. Apesar de as camareiras serem responsáveis até certo ponto, era como se ele estivesse mantendo um rígido limite entre Hayden, o pai e viúvo, e Hayden, o detetive durão. – Quer algo para beber? Lucy se sentou. – Estou bem. – Tem certeza? 17


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Quando os olhares se encontraram, o calor fervilhou entre os dois. O tempo pareceu se estender; arrepios surgiram na pele dela. Então, Hayden desviou os olhos. – Trouxe uma garrafa de água na bolsa – disse ela com uma voz que mais parecia um sussurro. Hayden se sentou na cadeira, como se nada tivesse acontecido. Lucy tirou da bolsa a água, o bloco de notas e a caneta, aproveitando o tempo para recuperar a compostura. – Avise quando estiver pronta – disse ele abrindo o laptop. Lucy apanhou a caneta, anotou a data no alto de uma página em branco e sorriu. – Prontinha. Hayden assentiu, ligou o equipamento de gravação e falou a data, a hora e o nome dela. – Você compreende o que escutas telefônicas ilegais envolvem? – perguntou com franqueza. – Sim. – Quer dizer que acredita piamente que reconheceria uma escuta telefônica caso deparasse com evidências de que uma tivesse acontecido? – Hayden a encarava, como se a desafiá-la a mentir. Lucy seria capaz de jurar que Hayden estava usando uma lista de perguntas em seu laptop desta vez. Talvez aquela fosse uma entrevista mais importante que a primeira. – Creio que sim. – Já temos evidências de que o ANS se envolveu em escutas telefônicas ilegais. As evidências contra o ex-repórteres Brandon Ames e Troy Hall, então, são indiscutíveis. Eles foram flagrados em vídeo contratando profissionais para gravar as atividades de familiares e amigos de Ted Morrow e Eleanor Albert ao telefone e no computador. As únicas dúvidas que permanecem são: quem mais estava envolvido e quem sabia disso. Lucy arqueou uma das sobrancelhas. – Isso partindo do princípio de que tinha mesmo mais alguém envolvido ou ciente disso. Ignorando o comentário dela, Hayden voltou a olhar o laptop. – Você trabalha muito com Angelica Pierce? Lucy manteve sua expressão neutra, apesar do desgosto que a percorreu. Aquela era uma mulher que seria capaz de algo imoral, como escutas telefônicas, a julgar pela forma como tratava seus subordinados. Angelica era maldosa, vaidosa e egoísta. – Faço um pouco de pesquisa de histórico e trabalho de preparação para ela. – E Mitch Davis? – Mitch tem o próprio programa, é um astro do ANS. É raro eu ter oportunidade de falar diretamente com ele. Mitch anunciara a notícia da filha ilegítima do presidente no baile inaugural, mas foram Brandon e Troy que descobriram a informação e passaram para Mitch revelá-la num brinde extremamente público que pusera o presidente na berlinda. Aqueles homens abusaram da ambição com suas táticas baixas, e mereciam todo o rigor da lei. Porém, até

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onde Lucy sabia, eles tinham agido por conta própria, e aquela caça às bruxas para tentar envolver outros nos crimes da dupla era perigosa para todos. – Você trabalhou com Brandon Ames ou Troy Hall na matéria deles sobre a filha do presidente? Lucy deu um gole em sua água. – Como eu disse quando você fez essa pergunta há dois dias, não, não trabalhei. – E Marnie Salloway? – Marnie é produtora do ANS e tem autoridade para me designar tarefas – respondeu ela, listando em seu bloco de notas os nomes que ele citava. – Ela já lhe pediu que fizesse algo ilegal? – Não. – Algo envolvendo escutas telefônicas? – Isso seria ilegal. – Sabe que seu padrasto e o presidente frequentaram a mesma faculdade na mesma época? – Sim. Aquilo não era segredo. – Tem conhecimento de alguma rixa entre os dois? Não além do fato de que Graham achava que Ted Morrow andava pelo campus como se fosse o dono do lugar. – Eles não frequentavam os mesmos círculos. Durante mais 20 minutos, Hayden fez perguntas, tentando levar Lucy a cometer um deslize, reformulando a mesma pergunta de formas diferentes, girando em círculos. Lucy admirou a técnica dele, mas, como não tinha nada a esconder, aquilo não deu certo. – Hayden, você acha mesmo que tem mais alguém no ANS envolvido nas escutas ou está só tentando fazer alguém cometer um deslize? – Tinha mais alguém envolvido. – Por que tem tanta certeza? – Em primeiro lugar, nenhum dos dois entendia o processo bem o suficiente para ter planejado tudo. Eles eram peões usados por alguém mais poderoso. – Eu não sou mais poderosa que eles. – Não. – Seu olhar se fixou no de Lucy, e ela compreendeu tudo. – Você está me usando para chegar até Graham. – Lucy engoliu em seco. – Não estou aqui para uma entrevista de rotina, como os outros. Você acha que Graham deu ordens para aqueles idiotas fazerem aquilo, e que eu sei de algo que pode incriminá-lo. Hayden deu de ombros. – É uma hipótese. Um calafrio desceu pela espinha dela. Lucy soubera da suspeita, claro. Todos sabiam. Contudo, se Hayden estava certo de que havia mais alguém envolvido, o ANS se achava em apuros bem piores do que ela imaginara. Eles ainda tinham um criminoso dentro da empresa, e, como o Congresso não conseguia descobrir quem era, vinham 19


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mantendo o foco em Graham. A matéria sobre Hayden não salvaria o padrasto dela. Lucy precisaria fazer mais. Fragmentos de ideias passaram por sua mente. Então, um plano coerente se formou. Lucy apoiou os antebraços na mesa e se curvou à frente. – Hayden, tenho uma proposta a lhe fazer. Ele parou. – Estou ouvindo. – Se houver mesmo mais alguém no ANS que tenha se envolvido nas escutas, e se essa pessoa estiver comandado Brandon e Troy, também quero saber quem é. Posso dizer que não é Graham. Conheço aquele homem e sei do que ele é capaz. Não é Graham que você está procurando. Mas o único jeito de provar é encontrando o verdadeiro culpado. – O que sugere exatamente? – Vou ajudá-lo com a sua investigação. Posso ser sua informante. Mas não vou me envolver numa caça às bruxas. Tudo precisa ser baseado em evidências. – Quer dizer que você vai coletar informações para mim? – Hayden falava devagar, como se estivesse testando a ideia. – Dentro do possível. Precisamos estabelecer alguns parâmetros primeiro. Ele inclinou a cabeça. – Seu padrasto não veria problema nisso? – Não contarei a ele ainda. É possível que Graham confie em alguém em quem não devia confiar. Então, por enquanto, ninguém do ANS saberá que estou ajudando você. Lucy se sentia um tanto desconfortável ao pensar em esconder algo daquela gravidade de Graham, mas, naquele caso, os fins justificavam os meios. O mais importante era ela trabalhar para o bem do padrasto. – Você acredita tanto assim em Boyle? – Mais do que isso. Hayden suspirou. – Certo, estou disposto a tentar e ver no que dá. Mas preciso avisá-la de que continuo achando que Boyle estava envolvido, e não vou deixar de lado essa linha de investigação só porque você está ajudando. – Combinado. – Assim que ela encontrasse a pessoa por trás dos crimes de Troy e Brandon, a teoria de Hayden cairia por terra. Houve uma batida na porta. Hayden consultou o relógio. – Com licença. – Ele fechou o laptop e atravessou o recinto. Uma mulher bem-vestida, de cerca de 30 anos, estava à soleira, atrás de um carrinho de bebê. Lucy sentiu a boca se curvar num sorriso ao ver Josh. Ele era lindo, uma versão em miniatura de Hayden, e sua expressão demosntrava imensa alegria. – Papai! – gritou ele, estendendo as mãos para Hayden.

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– Desculpe – disse a mulher. – Não sabia que você ainda estava ocupado. Quer que eu fique mais tempo com Josh? Hayden ergueu seu filho, dando um beijo no alto da cabeça dele. – Não, já estamos quase terminando. Eu fico com Josh. – Certo. – A babá se despediu do garotinho. A imagem dos três era tão linda naquele momento que Lucy sentiu um dolorido vazio dentro de si. Eles pareciam uma família. Depois que a babá se foi, Hayden empurrou o carrinho vazio pelo cômodo com Josh num dos braços. Quando Josh viu Lucy, seu rosto se iluminou e ele olhou freneticamente de um lado para o outro. – Au-au! – Oi, Josh... – Ela riu. – Rosebud está dormindo em casa. Josh fez beicinho por uma fração de segundo... até perceber que o rosto de seu pai estava bem perto dele. Então, começou a dar tapinhas nas bochechas de Hayden. – Se puder me dar cinco minutos, Lucy, vou colocar Josh no cercadinho dele com alguns brinquedos para podermos prosseguir. – Claro. Hayden abriu a porta de um dos quartos da suíte, e Lucy se levantou para segui-lo; em parte, porque seria uma ótima oportunidade para buscar mais pistas, mas também por curiosidade. Na véspera, no parque, ela carregara Josh durante a maior parte do tempo e brincara com ele. Sendo assim, não tivera muitas chances de observar pai e filho juntos. Naquele entardecer, com Hayden pondo seu filho no cercadinho, perguntando que brinquedos ele queria, Lucy conseguia ver com mais clareza. E havia algo meio... desajeitado na interação. O olhar dela percorreu o aposento. Em cima de uma mesa de canto havia uma pilha de manuais de cuidados com bebês. Talvez Hayden estivesse enfrentando dificuldades, agora que era pai solteiro. Lucy tornou a olhar para pai e filho, e seu coração se apertou por eles dois; por tudo o que eles haviam perdido. Pelo que estavam precisando passar. – Ele é um lindo menino, Hayden. – Reconhecer o óbvio não era muito, mas era tudo o que Lucy podia lhe oferecer. – Tão precioso. Hayden baixou o olhar para Josh, que escolheu aquele momento para abrir um largo e desdentado sorriso. – É, sim – disse ele levemente. Uma brilhante ideia se formou na mente dela; uma maneira de passar mais tempo com Hayden e o bebê. Lucy disse a si mesma que precisava desse tempo, pois Hayden baixava mais a guarda quando perto do filho. Sendo assim, sua sutil coleta de informações para a matéria seria facilitada. Entretanto, Lucy tinha uma desconfortável ciência de que queria passar mais tempo com os homens da família Black. Só esperava que aquilo não influenciasse seu julgamento profissional. – Conheço um parque que é o melhor lugar de todos para dar comida aos patos. – Lucy deu de ombros. – Estava pensando... Já que você não é de Washington, talvez 21


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esteja procurando lugares aonde levar Josh. Rosebud e eu poderíamos ir com vocês no final de semana. Os dedos de Hayden ficaram paralisados no topo do cercadinho. – Lucy, eu não... – Não tem problema se você não quiser. Só achei que Josh se divertiria vendo os patos. Tem um ótimo playground lá, também. E vou levar Rosie no final de semana de qualquer forma. Sendo assim, não seria nenhum incômodo. Hayden observou seu filho durante infindáveis momentos. A expressão no rosto dele era tão terna, tão cheia de amor, que partia o coração. Ele balançou a cabeça devagar. – Lucy, é inadequado me socializar com você. – E se usássemos esse tempo para planejar o que vou procurar no ANS? Uma reunião instrucional para sua espiã, por assim dizer. E Josh ainda ganha um passeio de bônus. Hayden passou as mãos pelo cabelo e as baixou para os quadris. – Certo, claro. Mas leve papel e caneta, porque vamos trabalhar. Um surto de ansiedade subiu pela espinha dela. Ele concordara. E Lucy já se perguntava se passar um dia num ambiente social com Hayden e toda aquela testosterona dele não seria como brincar com fogo. Não, tudo ficaria bem. Era um bom plano. Lucy respirou fundo e tentou acalmar seu coração em disparada. – Você pode me buscar no domingo de manhã. Dez horas? – Está ótimo. – Uma leve linha se formou na testa dele, mostrando que Hayden não estava convencido de que devia ter aceitado. E ele não era o único. – Vou anotar meu endereço. Não é longe... – Sei onde você mora. – Claro que sabe – disse ela, irônica. Hayden devia saber mais sobre ela do que a maioria de seus amigos. Contudo, era surpreendente que Lucy não estivesse tão preocupada assim com o fato de Hayden vasculhar seu passado. Havia algo de estranhamente seguro, algo honrado e decente em Hayden Black. Ele a levou para fora do quarto, na direção da mesa. – Vamos encerrar por hoje. Lucy juntou suas coisas, feliz por ter algo para disfarçar suas mãos trêmulas. – Vejo você no domingo. – Ela olhou para Hayden. A testa dele estava franzida, e Lucy sentiu uma fria apreensão preencher suas veias. Ela hesitou, e ele abriu a boca para dizer algo. Porém, antes que Hayden pudesse cancelar o compromisso, Lucy se virou e saiu pela porta.

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Dois dias depois, Lucy e Hayden, sentados à margem do Rio Potomac, tinham um menininho adormecido sobre a manta entre eles. O três tinham dado de comer aos patos, passeado, e, agora, enquanto Josh recuperava suas energias, Lucy e Hayden adentraram num silêncio quase confortável. Desde o momento em que ele a buscara, fora como se os dois estivessem contornando, ariscos, o componente social do dia. Hayden fora indefectivelmente educado, ainda que distante, e ela agira do mesmo modo. Eles conversaram quase apenas sobre Josh. Não era apenas a investigação, ainda que isso fosse suficiente para deixar as coisas entre so dois menos que confortáveis, mas o fato de ela enxergá-lo demais como homem. Lucy sentia onde Hayden estava. Quando ele se achava por perto, era possível sentir o cheiro másculo de sua pele. E havia ainda aquelas palavras nada recatadas que ela dissera da última vez em que passearam num parque juntos. Lucy continuava sem saber o que Hayden pensava delas. Porém, ela já sabia mais agora. A investigação que fizera para a matéria se concentrara na empresa dele. Parecia que trabalhar no ramo de segurança era lucrativo. Ao menos se você fosse tão bom quanto Hayden Black. A empresa que Hayden abrira poucos anos antes já tinha uma receita anual de vários milhões de dólares; sua fortuna pessoal era milionária e crescente. Hayden se desenvolvera muito desde a época em que fora um garoto que frequentara a faculdade de direito com uma bolsa de estudos militar, trabalhando como advogado investigativo no Exército até o fim de seu serviço nas Forças Armadas. Agora, era um rico pai solteiro de um menino de 1 ano. Lucy se lembrou da forma desajeitada como Hayden pusera Josh no cercadinho, na noite anterior. Aquela imagem permanecera em sua mente. Ela umedeceu os lábios e arriscou uma pergunta pessoal: – Tem sido difícil ser o único responsável por Josh? A cabeça de Hayden se levantou rápido, uma expressão de surpresa nos olhos. Então, ele se apoiou nas mãos e assentiu, parecendo cansado. – A coisa mais difícil que já fiz. Se eles entrariam numa conversa mais profunda, ela deveria buscar pistas de um passado profissional negro de Hayden para sua matéria, ou evidências de um comportamento tendencioso. Contudo, não conseguiu evitar continuar falando do relacionamento dele com o filho: – Era sua esposa quem se encarregava mais de cuidar dele? Hayden riu amargurado. – Brooke praticamente não ficava com Josh. Comprava roupas de grife para ele e o exibia quando achava que isso lhe daria um status social. – Então, era você quem cuidava do menino? – Ela cruzou as pernas e se virou para Hayden. Aquela era a informação mais pessoal que ele já revelara, e Lucy estava ávida por todos os detalhes, todas as expressões. – Não – disse ele, fazendo uma expressão de dor. – Brooke tinha empregados para tudo, incluindo Josh. Ela... – Hesitou, ponderando sobre quanto deveria contar. Lucy esperou, deixando que a decisão fosse toda dele, mas desejando poder aliviar a tensão que contraía o corpo de Hayden. 23


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– Ela era uma socialite, vinha de uma família muito rica e esperava ser mimada. No início do relacionamento, fiquei feliz em fazer as vontades de Brooke, mas ela precisava de mais mimos do que um marido poderia dar por conta própria. – A expressão dele estava melancólica, mas sem dúvida ocultava emoções mais profundas. – Brooke tinha empregados para limpar a casa, um chef, um personal trainer e, desde que Josh nasceu, duas babás, para que houvesse alguém para cuidar dele 24 horas por dia. Ele raramente via a mãe. – Ah, Hayden... Uma das irmãs do pai de Lucy, Evelyn, vivia dessa forma, mas Lucy não conseguia imaginar nada pior do que terceirizar a vida, o filho. – Eu devia ter feito algo, devia ter me envolvido mais. Mas Brooke dizia que filhos eram responsabilidade dela e que ela cuidaria deles da forma como fora criada. E detesto admitir, mas eu estava tão cansado de discussões que permiti que minha mulher fizesse o que queria, para ter paz. Por todos nós, incluindo Josh. Além do mais, eu me sentia perdido... nunca tinha sido pai antes. Como iria saber que a maneira como Brooke tinha sido criada era errada? – Imagino que tenha sido muito diferente da maneira como você foi criado – ela afirmou, com delicadeza. – Pode apostar. – Hayden observou Josh durante um longo momento antes de estender a mão para afastar o cabelo do rosto do filho. – Eu ficava com Josh quando podia. Brincava com ele à noite, fazia as coisas quando tinha um dia de folga, mas acho que parte de mim não deve ter visto problema na maneira como Brooke queria que tudo fosse feito. Do contrário, eu teria mudado tudo. Insistido. Fui burro. – Você parece estar compensando tudo isso agora. Hayden balançou a cabeça. – Falta muito ainda para eu me tornar o tipo de pai que quero ser. – Acho que você não devia ser tão duro consigo mesmo. – Lucy pôs a mão no antebraço dele, querendo lhe dar qualquer conforto que pudesse. – Josh ama você e é feliz, isso é evidente. Está fazendo algo certo, Hayden. – Obrigado. – Ele esboçou um meio sorriso, e desviou o olhar. A expressão de hayden costumava ser tão séria que até meio sorriso pareceu algo animador, prendendo toda a atenção de Lucy. Hayden olhou para a mão que ainda estava em seu braço. Quando ergueu de novo o olhar para ela, seus olhos escureceram, seu peito subiu e desceu com velocidade demais. Lucy sabia como ele se sentia. De súbito, parecia não haver oxigênio suficiente naquele parque. Os fortes músculos debaixo dos dedos dela ardiam de calor, mantinhamna presa como se por uma força magnética. Ao que pareciam quilômetros de distância, Josh suspirou dormindo e puxou seu ursinho de pelúcia para mais perto. Hayden enrijeceu e baixou o olhar para seu filho antes de afastar o braço dela. Lucy piscou várias vezes, procurando se reorientar, tentando aceitar a realidade de que quase fora dominada pelo feitiço de um homem do qual tinha de manter distância. Um homem que, provavelmente, iria se sentir traído se soubesse os verdadeiros objetivos dela naquele encontro. Hayden pigarreou.

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– Diga por que você é tão boa com Josh. Não tem irmãos, nem primos ou sobrinhos pequenos. É algo natural para você lidar com bebês? Ela olhou para Josh. Se Hayden ainda não sabia do envolvimento dela com bebês, a pesquisa dele logo revelaria, ainda mais por ele já saber que não existiam crianças na família dela. Não havia motivo para não contar. Não era um segredo, e sim algo que Lucy não costumava comentar. Entretanto... alguma coisa dentro dela queria que ele compreendesse. – Antes de o meu pai morrer – começou Lucy, ainda observando Josh – ele costumava me levar para fazer trabalho voluntário num lar que tinha criado para pessoas com deficiências. Papai acreditava fortemente que a riqueza que tínhamos herdado de nascença era um privilégio, e que era nossa responsabilidade ajudar os outros. Ele também queria que eu mantivesse contato com a forma de viver das demais pessoas. – Ele parecia ser um homem sábio. Lucy ergueu o olhar para ver se havia outro significado por trás das palavras de Hayden. Todos costumavam aproveitar a oportunidade para dar uma sarcástica alfinetada no pai dela e em sua família, uma consequência da riqueza deles. Os olhos de Hayden, porém, continham apenas interesse pela história que ela estava contando. – Depois que ele morreu, minha mãe quis continuar a missão dele comigo. Mas ela disse que eu poderia escolher minha própria ação beneficente, que o lar fora a paixão do meu pai. – E, sendo uma típica menina de 10 anos, você escolheu bebês. Ela sorriu. – Montamos uma clínica de atendimento grátis na Carolina do Norte para mães que têm dificuldades com recém-nascidos. As mamães e os bebês podem passar algumas noites lá, até uma semana, para receber ajuda para amamentar, fazer o bebê dormir ou qualquer outro problema. – Parece um ótimo serviço. – E é. Quando nos mudamos para Washington, montamos outra aqui. Passo um tempo lá na maioria dos finais de semanas, só para dar uma ajuda extra. Às vezes, fico de babá enquanto a nova mamãe descansa, atendo telefonemas... Lucy adorava aqueles momentos. Ser membro de uma equipe e ajudar a fazer a diferença nas vidas das pessoas. Lucy sempre considerara o jornalismo como uma forma de fazer a diferença também, mas, desde que o escândalo das escutas telefônicas estourara, ela começara a ter dúvidas. – É você mesma quem financia? – Comecei sozinha, mas estou trabalhando para que as Lojas de Departamentos Royall se envolvam, para construirmos mais clínicas pelo país. Tia Judith está ansiosa por ajudar. Fui encontrá-la em Montana no ano passado para discutir isso, e nós vamos levar o plano para a diretoria em breve. – Isso é incrível – disse ele com um respeito simples, mas genuíno, nos olhos. – Você criou algo que tornou o mundo um lugar melhor. Um cálido rubor se espalhou pela pele dela, e Lucy sorriu para ele, deleitando-se com sua aprovação. Então, com um sobressalto, ela percebeu que permitira que a opinião dele importasse mais do que deveria.

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Lucy se forçou a desviar o olhar. Um inofensivo flerte com Hayden era uma coisa. Derreter-se por dentro porque ele aprovara o seu trabalho beneficente era outra, bem diferente. Aquele homem continuava investigando o ANS e acreditava que Graham era culpado. A última coisa de que Lucy precisava era se envolver emocionalmente com Hayden Black. Lucy precisaria se esforçar mais para fixar seus limites onde eles deveriam ficar. Ainda assim, se ela não se lembrasse deles, Hayden se lembraria. Ele parecia ter um senso muito bom de onde esses limites se encontravam. E por que ela não gostava nada de saber disso?

CAPÍTULO QUATRO

– Sobre essa investigação... O que você quer que eu faça? Hayden não respondeu de imediato. Observou-a com aquele intenso olhar, como se pudesse enxergar dentro da alma dela e soubesse exatamente o que Lucy queria ao desviar o assunto de si mesma. – A próxima a ser entrevistada é Marnie Salloway, já que ela foi a produtora da matéria que foi ao ar. Lucy suspirou, aliviada. Eles haviam voltado a um terreno estável, em vez daquela perigosa ladeira do potencial envolvimento emocional. – E Angelica Pierce? Como foi Angelica quem fez todas as matérias seguintes, poderia ter sido ela. – Não estou preocupado com Angelica neste momento – disse ele pondo distraidamente a mão sobre Josh, que dormia sobre a manta. – Nem com Mitch Davis, já que os dois tinham recebido os roteiros. Mitch, para fazer o anúncio no baile inaugural, e Angelica, para as matérias que vieram em seguida. Mas Marnie é diferente. Ela poderia muito bem ter sido a pessoa que encomendou as escutas telefônicas ou recebeu uma ordem superior para encomendá-las. A leve brisa do rio soprou o cabelo de Lucy. – Você não está preocupado com a possibilidade de eu avisar Marnie? – Você fará isso? – perguntou ele, apenas com curiosidade nos olhos, sem preocupação. – Não. – Lucy acreditava no objetivo dele de encontrar o rato do ANS, para que ela pudesse proteger Graham. Não era do interesse de Lucy prejudicar o plano de Hayden. – De qualquer forma, ela deve imaginar que é uma das suspeitas. – Ele deu de ombros. – O que acha de Marnie? – Não é um depoimento oficial, certo? Marnie adoraria ter um motivo para reclamar dela com Graham.

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– Só estamos conversando. Lucy poderia dar sua opinião francamente ou amenizá-la, mas tinha a impressão de que Hayden preferiria que ela fosse franca. – Marnie é grossa e se acha demais. A expressão dele não se alterou, como se Hayden estivesse esperando aquilo. – Ela a trata mal? – Marnie não trata bem ninguém que esteja abaixo dela. Mas se esforça especialmente para tornar minha vida insuportável. Algo nos olhos dele se alterou, aguçou-se. – Ela é a única? – É um grupinho. – Lucy esboçou um meio sorriso para disfarçar a leve pontada da rejeição. Não era a primeira vez em sua vida que Lucy se via vítima do ciúme ou do veneno nada velado de outras pessoas e sabia que não seria a última. Aprendera a não se deixar abalar por isso já fazia muito tempo. Em geral, ela conseguia. – Você já contou isso a Graham? Contar a Graham? Ela quase gargalhou. Ah, sim, todos adorariam aquilo no escritório. – O fato de eu ser enteada do dono da empresa não significa que possa recorrer a ele quando tenho algum problema. – Mas parece que está acontecendo o oposto disso. Você vem sendo maltratada justamente por ser enteada dele. Qualquer outro funcionário teria o direito de reclamar de assédio. Sendo assim, se você não acha que pode fazer essa reclamação, está sofrendo discriminação. – Vou ficar bem. – Lucy sorriu com despreocupação, agora. Não precisava da solidariedade dele nem de ninguém para defendê-la. Era adulta, cuidava de sua própria vida. Ser o alvo de gente como Marnie e Angelica vinha incluído no pacote dos privilégios com os quais ela nascera. – Foi Graham quem ofereceu a você o cargo de repórter júnior? – Ele me ofereceu um cargo de repórter plena. Depois, quando eu recusei, um de âncora dos finais de semana. Graham só tentara ajudá-la a entrar no mercado, e ficara perplexo quando Lucy recusara as propostas; mas respeitara a decisão dela. – Eu queria o cargo, claro. Mas, quando eu chegar a esse nível, quero ser boa de verdade. – Você não é como eu esperava. – Hayden continha a custo a admiração. – Você também não é – admitiu ela, ainda que não soubesse ao certo o que esperara. Decerto, não que Hayden tivesse tanta consideração em sua abordagem, que fosse tão tranquilamente perspicaz. E de modo algum esperara a ardente química entre os dois. Ele pigarreou. 27


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– Então... Marnie... Ela poderia estar envolvida? – Bem, sim, poderia. Mas o fato de ela ser terrível e de ter tido a oportunidade não significa que tenha violado a lei de fato. – Acha que Ames e Hall podem ter conseguido as informações com as escutas telefônicas sem que Marnie soubesse? – Claro, é possível. – Possível, mas improvável? Ela deu de ombros. – A menos que você suspeitasse de que alguém tivesse fontes ilegais, não seria difícil não perceber algo assim. Numa rede de notícias, as coisas acontecem com tanta velocidade que nem todos são capazes de controlar tudo. Hayden assentiu de leve, e Lucy quase conseguiu ver as engrenagens girando dentro da mente dele. – Seria bom se você conseguisse algumas informações sobre Marnie para mim antes de eu me encontrar com ela. Algo que a abale o suficiente para que admita saber. Lucy arqueou uma das sobrancelhas. – Se ela estiver envolvida. – Evidente – disse ele, um dos cantos da boca se levantando. Lucy o encarou – o investigador do Congresso, o homem que atormentava os sonhos dela – e começou a se perguntar se conseguiria negar algo a Hayden. – Verei o que consigo fazer.

A noite já chegara quando eles pararam diante da casa de Lucy. O lugar foi uma surpresa para Hayden, que a imaginava vivendo numa cobertura duplex, não em algo que pudesse acolher uma família. Toda vez que Hayden pensava ter compreendido Lucy Royall, ela fazia algo para surpreendê-lo. Ele não devia gostar tanto disso. Não devia gostar tanto dela. Mas não havia como negar que gostava. Mal podia esperar para ouvir o que Lucy diria em seguida, o que faria. Quando ela estava por perto, Hayden tinha dificuldade para olhar para outra coisa. E aquela boca... Toda vez que Lucy umedecia os lábios ou os contraía, pensando, o calor percorria o corpo dele. Manter uma distância profissional estava se tornando um desafio cada vez maior. Hayden desligou o carro. – Só vou tirar Josh da cadeirinha e acompanho você até a porta. – Não precisa incomodá-lo. Josh está dormindo tão profundamente... E também não o deixe trancado aqui dentro. Fique com o bebê. Não são nem três metros até a minha porta. Ficarei bem. O cavalheirismo duelou com os instintos paternos. Contudo, quando ele olhou para o filho pelo retrovisor, os instintos venceram. E talvez fosse bom evitar levá-la até a porta. Ele seria capaz de resistir a beijá-la? 28


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Hayden se virou para Lucy. – Depois que você entrar e trancar a porta, ligue para o meu celular. Vou esperar aqui até que ligue. – Que meigo... – disse ela. Meigo? Hayden quase riu. Ela não diria aquilo se soubesse os pensamentos que o bombardeavam naquele instante. Coisas que queria fazer com ela, a começar por tirar aquelas roupas de seu corpo. Por baixo, Hayden sabia que Lucy seria exuberante, macia como uma pétala... Hayden tentou afastar aqueles pensamentos. Não deu certo. Distração, essa era a resposta. Precisava dizer algo, de preferência sobre um assunto neutro. – Obrigado por hoje... Josh se divertiu muito. – Também me diverti. A boca de Lucy parecia tão perto, e Hayden começou a se inclinar na direção dela antes de invocar seu autocontrole e parar. Quando Lucy percebeu a intenção dele, suas pupilas se dilataram. Seu coração acelerou. Mesmo assim, ele continuou ali; sem se aproximar mais, mas também sem conseguir recuar. Os lábios úmidos e fartos dela estavam ligeiramente entreabertos, convidando-o. Um desejo como aquele, que o consumia, engolia, mantivera-se ausente de sua vida por muito tempo. Tudo o que Hayden queria era ceder a ele, agarrá-lo com as duas mãos, agarrar Lucy com as duas mãos e afundar nas sensações que ela lhe despertava. Contudo, não podia baixar a guarda e pensar nela como mulher. Tinha uma investigação a fazer, e o envolvimento com Lucy Royall comprometeria sua objetividade. Ele tinha a obrigação ética de manter a distância emocional entre os dois. Hayden contraiu o maxilar e recuou com uma excruciante lentidão. – Hayden? – disse Lucy arfante. Ele apertou o volante até que seus dedos doessem. – Sim? – Você ia me beijar? O coração dele quase parou. Devia ter imaginado que Lucy não era do tipo de mulher que deixava as coisas passarem assim, que escolhia o caminho sensato. – Por um momento, antes de eu pensar melhor – admitiu ele. – Queria que você tivesse me beijado. As palavras de Lucy foram sussurradas, mas não havia flerte nelas. Havia honestidade e, por isso, foram ainda mais poderosas. O desejo ainda o dominava, exigindo que prosseguisse e a beijasse. Hayden fechou os olhos para limitar o número de sentidos que eram atacados de uma só vez. – Não diga isso. – Mas é a verdade. Ele ergueu as pálpebras a tempo de ver a rosada língua dela sair para umedecer aqueles lábios que o enlouqueciam. – Tenho pensado em como seria beijar você. 29


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– Lucy, não. – Hayden detestou a própria rispidez, mas foi incapaz de evitar. Estava tenso. Se ela insistisse, ele mandaria a ética para o inferno e a puxaria para si. – Como é o seu beijo, Hayden? – Lucy se virou no banco, de frente para ele. – Leve e delicado? Forte e exigente? Ele grunhiu e bateu a cabeça no encosto do banco. Lucy estava tentando matá-lo? – Isso não pode acontecer, Lucy. Não posso comprometer minha objetividade. – E se eu não contar a ninguém? – A voz dela era pura tentação, cheia de uma deliciosa promessa, o que fez o coração dele bater ainda mais forte. Por um momento, Hayden se perguntou se seria capaz. Olhou pela janela, buscando um sinal, talvez permissão. Em vez disso, Hayden viu uma sofisticada rua de Washington, e a percepção o atingiu com a força de um golpe. Washington. Ele estava naquela cidade para fazer um trabalho. Contratado pelo Congresso. Hayden esfregou as mãos no rosto e se concentrou no que era importante. Então, virou-se para Lucy para garantir que ela também compreendesse. – Mesmo assim, eu saberia. E as coisas seriam diferentes entre nós. Um canto da boca de Lucy se curvou num sorriso malicioso. – Não acha que elas já vão ser depois desta conversa? – Não sei se você percebeu, mas tentei impedir a conversa antes de ela começar. – Ops! – Ela mordeu o lábio, mas não parecia nem um pouco arrependida. – O que devemos fazer agora? – Fingir que isso nunca aconteceu. O silêncio se estendeu durante longos segundos. – E se eu não conseguir? – Não vamos falar sobre isso. – Ele bateu com a mão na coxa, esperando parecer mais decidido do que se sentia. – Nunca mais iremos permitir que o assunto surja. – Você consegue? – Sim. – Claro, ele poderia evitar mencionar aquilo, mas a expressão no rosto dela ficaria marcada na sua memória, e não havia nada que Hayden pudesse fazer para evitar pensar em beijá-la. E sonhar com aquilo. Lucy pegou sua bolsa e a segurou junto ao peito. – É melhor eu entrar. – Sim – disse ele com a voz rouca. Então, pigarreou e tentou de novo: – Sim, seria o melhor. – Então, está bem. – Ela abriu a porta do carro com apenas um rápido olhar por cima do ombro. Por pura força de vontade, Hayden a deixou subir os três degraus até a porta de casa em vez de puxá-la para si. Depois que Lucy entrou, ele meneou a cabeça para o

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volante e soltou um palavrão. Fora burro, burro por baixar a guarda e pensar em beijar uma testemunha-chave. O celular tocou, e o número de Lucy piscou na tela. Hayden inspirou fundo. – Já entrou? – Sã e salva, com a porta trancada. Os olhos dele se fecharam, reduzindo seu mundo à voz de Lucy. – Ótimo. – Hayden, sobre aquela conversa que não deveríamos ter tido... Ele sabia que devia desligar, que se arrependeria daquilo. – Sim? – Estou feliz por ela ter acontecido. Hayden conseguia imaginá-la mordendo seu exuberante lábio inferior ao dizer aquilo, e seu coração disparou. – Mas eu teria ficado ainda mais feliz se você tivesse me beijado. A cabeça dele girou. Desligue o celular, Black. Hayden invocou toda a sua força de vontade. – Boa noite, Lucy. – Boa noite, Hayden.

Três dias depois, Lucy estava na suíte de Hayden, sentada num dos sofás com folhas de papel, anotações e fotos espalhadas à sua volta. Hayden, acomodado no outro sofá, a uma curta distância, analisava outra pilha de evidências. Ele ergueu o olhar para ela. – Você falou com as recepcionistas? Durante os últimos três dias, Lucy conversara com todos que desempenhavam funções de apoio no ANS que ela conseguira encurralar, funcionários que talvez tivessem tido a oportunidade de perceber coisas que não batiam e que podiam ter sido maltratadas por Marnie e seus amigos. Naquele dia, Lucy convidara a secretária de Graham, Jessica, para almoçar com ela e os outros assistentes executivos, depois de lhe dizer que ser a filha de Graham tornava difícil fazer amigos. – Ouvi muitas fofocas sobre quem está dormindo com quem. Eu não fazia ideia de que era tudo tão parecido com um alojamento de faculdade. Hayden ergueu uma das sobrancelhas. – Alguma conexão interessante? – Por quê? Está interessado em alguém do ANS? – perguntou ela com o máximo de inocência que conseguiu fingir. O calor que estivera no olhar dele durante os últimos três dias se avivou, mas sua voz soou calma: – Eu estava pensando em termos da investigação. E você sabia disso.

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Sim, mas flertar com Hayden Black era perigosamente tentador. – Já que estamos falando da investigação, parece que Marnie teve um caso com Mitch Davis. Como não achamos que Mitch teve algo a ver com a matéria, a não ser o fato de ter lido o texto do brinde que deram a ele no baile, acho que não é relevante. – Ames está dormindo com alguém? Ou Hall? – Brandon Ames estava saindo com uma das contadoras, mas ela o largou quando descobriu o que ele tinha feito. E não sei bem se uma contadora teria sido muito útil numa escuta telefônica. – E Hall? – Ninguém ficou sabendo de nada. Se ele sai com alguém, deve ser de fora do ANS. – Talvez seja querer demais que uma conexão sexual nos leve aos cúmplices. Mas obrigado por ter tentado. – Fiz amizade com uma das zeladoras. Ou melhor, Rosebud fez. Espero esbarrar com ela amanhã à noite outra vez. Talvez saiba de alguma reunião noturna que ninguém mais tenha visto. – Rosebud é útil – disse ele seco. E Lucy se perguntou se Hayden tinha noção de que ela usara Rosie para começar uma conversa com ele naquele primeira dia no parque. Ela sorriu casualmente. – É mesmo. Conexões com outros jornalistas também eram úteis. Naquela manhã, Lucy recebera um contato de um amigo que trabalhava num jornal de Nova York. Ela lhe pedira para tentar encontrar algum segredo do passado de Hayden para a matéria de Graham. O amigo de Lucy achara alguém que conhecia os sogros de Hayden. Eles não pareciam ser os maiores fãs dele. Tinham querido que a filha se casasse com alguém da própria classe, não com um militar que surgira do nada. A única coisa com a qual eles estavam felizes era com o fato de Hayden ter posto o dinheiro herdado da falecida esposa num fundo fiduciário para Josh. Nada especialmente explosivo para a matéria. – Você sabia que Angelica usa lentes de contato? – Isso não me surpreende, mas não. – Por que não surpreende? – Ela é vaidosa e toma muito cuidado para não deixar ninguém vê-la sem maquiagem completa. As outras repórteres estão sempre com aparência imaculada quando vão ao ar, mas, fora dele, são mais casuais. – Isso não deve significar nada... Simplesmente não confio nela. – E eu muito menos. – Lucy já vira Angelica sendo maldosa e vingativa, sentira aquilo na pele. – Acha que ela pode estar envolvida? – Pode estar, mas é improvável. – Havia um inconfundível toque de frustração na voz dele. – Se Angelica tivesse encontrado as fontes, teria deixado que Ames e Hall ficassem com o crédito? Ela é ambiciosa, e aquela foi a maior reportagem do ano. Angelica iria querer expor o nome nela.

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Hayden tinha razão. Pondo as mãos na base das costas, Lucy se alongou, tentando se livrar de algumas dores que ficar sentada no sofá criara. Pelo canto do olho, percebeu Hayden a observá-la sutilmente, e sua pulsação disparou. Lucy virou a cabeça apenas o suficiente para que ele soubesse que ela notara. Hayden não desviou o olhar. Pelo contrário, sua expressão se intensificou. A boca de Lucy secou, e ela umedeceu os lábios; Hayden também observou isso. Então, ele inspirou fundo e virou o rosto. Lucy se recompôs e fez o mesmo. Ser enfeitiçada por Hayden Black fazia muito, muito mal à sua sanidade. Lucy esfregou o rosto com as mãos, esperando que isso a fizesse recuperar a concentração. – Se havia mais alguém envolvido, faz mais sentido que tenha sido alguém mais importante, não apenas outro repórter. Hayden pegou um organograma que ela desenhara duas noites antes. – Quem estava supervisionando Ames e Hall mesmo? Lucy foi para o sofá dele e analisou o organograma iluminado pela suave luz do abajur. O calor emanava do corpo de Hayden. – A cadeia de responsabilidade é esta. – Ela tocou a ponta do dedo no papel que ele segurava e, ao fazê-lo, o sensível lado interno do pulso dela roçou de leve nos pelos do antebraço dele. Um calafrio subiu pela espinha de Lucy. Ela ouviu a profunda inspiração e se virou para ver o olhar de Hayden fixo no seu. Durante um tenso momento, nenhum dos dois se mexeu. Ele estava tão perto... – Lucy, não podemos. Perceber que Hayden se achava tão à beira de sucumbir quanto ela produziu o efeito oposto ao que ele pretendia. Lucy nunca fora boa em seguir regras, em aceitar o que lhe era ordenado. Ela passou os dedos pela barba por fazer de Hayden, sentindo. – Tenho pensado em como seria a sensação de tocar você. – Os dedos dela percorriam o maxilar dele. – Na verdade, tenho desejado fazer isso. Ele fez uma expressão de dor. – Você devia ter mais cuidado com o que deseja. As pontas dos dedos dela percorreram de leve o pescoço dele. – Estou desejando de novo agora. Hayden ficou paralisado. – Eu juro, Lucy, você seria um teste até para a paciência de um santo. – O olhar dele se fixou nos lábios dela. – Detesto admitir, mas não sou nenhum santo. – Suas mãos aninharam a nuca de Lucy, massageando, como que lançando fogos de artifício pela pele dela. Ele se curvou para perto, e seus lábios roçaram nos dela, as carícias mais suaves, embora suficientes para deixá-la trêmula. – Hayden... – sussurrou Lucy com todo o desejo dentro de si. Um calafrio percorreu o corpo dele. Hayden a puxou contra si e a beijou, a cálida pressão de sua boca sendo diferente de tudo o que ela já sentira. Quando a língua de Hayden se moveu contra a dela, o fervilhante calor explodiu dentro de Lucy, e ela subiu no colo dele. Ainda não estava perto o suficiente. Enfim, depois de todos aqueles dias e

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noites esperando, sonhando, Hayden a beijava. Sedentamente. Gloriosamente. E ela se derretia. Com um grunhido, ele afastou a boca, e os dois lutaram para encontrar fôlego, mas Lucy não parou de tocar. Não conseguia. Ela passou os dedos por dentro da gola da camisa dele, querendo sentir a força de seus ombros. Contudo, antes que pudesse avançar muito, Hayden a puxou para si mais uma vez. – É uma má ideia – murmurou ele, beijando os cantos dos lábios dela. Hayden desceu com a mão pelas costas de Lucy. – Uma ideia muito ruim – concordou ela. – Mas, mesmo assim, quero continuar. – Ele segurou-lhe o rosto. – Ah, sim, também quero – gemeu Lucy. Hayden soltou uma fraca risada. – Eu estava esperando que você fosse a sensata entre nós dois. Ela mordiscou a orelha dele. – Não tem graça ser sensata o tempo todo. – Estou começando a ver isso. – Hayden a deitou no sofá, pressionando-a contra as almofadas com seu corpo, e beijou-lhe o pescoço. – Mas se fizermos isso... – Se? Ele apoiou o peso nas mãos, uma de cada lado da cabeça de Lucy. – Se formos fazer isso, precisaremos estabelecer algumas regras básicas primeiro. – Qualquer coisa. – Ela estendeu a mão, tentando puxar aquele delicioso calor de volta para si. Hayden não se mexeu. – Estou falando sério, Lucy. – Posso notar... – Suspirando, ela se sentou. Pelo jeito, eles teriam uma conversa, querendo ou não.

CAPÍTULO CINCO

– Certo, regras básicas – disse Lucy, tentando acabar logo com a parte da conversa, para que ele pudesse voltar a beijá-la. Ela ficou tonta só de pensar. – Isso só vai poder acontecer uma vez. Lucy abriu o primeiro botão da camisa dele. – Certo. As mãos de Hayden estavam imóveis nos quadris dela. 34


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– Ninguém pode saber. – Não direi nada. – Ela soltou o segundo e o terceiro botões. O quarto. E vislumbrou pelos escuros que a provocavam, desafiavam. – E nós dois vamos prometer não usar isso um contra o outro se as coisas se complicarem na investigação. Lucy parou por um instante para encará-lo. – Nós não faríamos isso. Hayden franziu o cenho. – Você não sabe se eu usaria ou não isso em proveito próprio. – Eu sei. Hayden Black era um homem de honra. E ardente. Por que ele não a puxava logo para si? – De acordo? – A voz de Hayden se mostrava tensa, seu olhar, intensamente fixo no dela. – De acordo. – Lucy mal se importava com o que concordava, contanto que aquilo levasse a mais beijos. Hayden a puxou, e sua boca encontrou a dela. Lucy envolveu o pescoço dele com os braços, não querendo lhe dar a chance de se afastar outra vez. Fazia dias que o queria naquela exata posição, e a realidade estava à altura de todas as suas fantasias. A avidez. Os sólidos músculos debaixo das suas mãos, o sabor dos lábios dele. Quando eles se afastaram para tomar ar, havia um fulgor de satisfação nos olhos de Hayden que a fez estremecer. – Lucy – disse Hayden, sua voz quase reverente, mas rouca de desejo – quis tanto você que achei que enlouqueceria. Ela sorriu, feliz por não ter sido a única a sofrer aquele tormento. – Não consigo raciocinar com clareza desde que o conheci. Grunhindo, Hayden a puxou para o colo, e Lucy enroscou as pernas nele. Encontrou a grossa protuberância do desejo de Hayden e pressionou ainda mais seu corpo contra o dele. Rápido, Hayden abriu os botões da camisa dela, empurrando a peça para trás, beijando os ombros ao expô-los e deslizando o tecido pelos braços delgados. – Sua pele parece creme – disse ele junto ao pescoço dela. – Lisa, deliciosa. Num hábil movimento, Hayden soltou o sutiã dela e o jogou junto da blusa. Dedos ardentes desceram pelo pescoço de Lucy, e a boca de Hayden os seguiu. Lucy arqueou o corpo para trás. Quando os lábios dele se fecharam sobre o bico do seio, ela entrelaçou os dedos no cabelo de Hayden. Uma das grandes palmas dele envolveu o seio dela, apertando com delicadeza, e os olhos de Lucy se fecharam para absorver o pleno efeito daquela magia. – Você tem uma habilidade e tanto – disse ela arfando. – É tudo criado por um desejo desesperado por você – ele afirmou. A camisa dele estava aberta, mas escondia demais de Hayden. Lucy abriu empurrou as laterais pelos ombros, pelos braços musculosos, até tirar a peça por 35


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completo. Com um gemido, ela espalmou as mãos no peito largo, deleitando-se. Roçou os dentes no bíceps poderoso, sentindo-o estremecer. Era demais, e não era suficiente. A mão de Hayden serpenteou por entre os corpos dos dois e abriu o botão e o zíper da calça dela. Quando os dedos dele deslizaram sobre o cetim exposto, Lucy ergueu os quadris para encontrá-los. Nunca ficara tão louca de desejo. Estar com Hayden superava seus sonhos mais loucos. Hayden girou e a pôs com as costas no sofá, assomando acima de Lucy, arfando. O tempo quase parou enquanto ela o observava, a beleza masculina que era toda dela naquela noite. Lucy jamais se esqueceria de como ele estava naquele momento, do que a fazia sentir. Nada jamais seria igual. Nada. – Hayden... – sussurrou ela, e o mundo voltou a se mover quando ele se curvou para capturar-lhe os lábios, beijando-a profundamente, sedentamente. Lucy envolveu a cintura dele com as pernas e se arqueou em sua direção, saboreando a sensação do corpo dele contra o seu. Então, Hayden parou e respirou fundo. – Diga que tem algum preservativo nessa sua bolsa. A deliciosa sensação foi bruscamente freada. – Não – disse ela devagar, repassando em sua mente o conteúdo de sua bolsa. – Você não tem? Ele sussurrou um palavrão e se afastou. – Não faço ideia, mas espero muito que sim. – Hayden tirou o jeans e foi às pressas para o banheiro, deixando Lucy pensando nas opções. Uma delas seria correr até a farmácia. Uma possibilidade, mas eles ficariam tempo demais separados; inviável na situação atual. Poderiam ir às pressas para a casa dela; havia alguns preservativos numa gaveta. Não, Josh estava dormindo; eles não podiam sair dali. Talvez telefonar para a recepção e ver se eles tinham um suprimento... Hayden reapareceu, totalmente protegido, e, com um sorriso de predador, atravessou o recinto. Lucy conseguiu tirar a calça e a calcinha antes de ele chegar até ela. – Graças a Deus! – disse ela quando ele retornou ao sofá e a cobriu com todo aquele calor. – Eu estava pensando num plano B, e as ideias começavam a ficar cada vez mais ridículas. – Estou ansioso para ouvir esses planos. – Hayden mordiscou a orelha dela. – Mas depois. – Muito depois. Tenho outras intenções para nossas bocas, no momento. Sem hesitar, Hayden a beijou, mordiscando, sugando, acariciando até fazer a cabeça de Lucy girar. – Agora – implorou ela. – Por favor, agora. Após estender o momento durante mais vários agoniantes segundos, Hayden capturou o olhar de Lucy e deslizou para dentro dela num único e profundo movimento. O mundo se avivou à volta dela. Ela se avivou. Apertou ainda mais as coxas na cintura dele, mantendo-o ali, saboreando a sensação. Hayden começou a se mover, e Lucy se perdeu na dança dos corpos, incapaz de fazer qualquer coisa a não ser acompanhar o ritmo dele e ceder às sensações. 36


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Voou mais alto que as estrelas, e a voz de Hayden em seu ouvido lhe dizendo que ela era linda, que a sensação era incrível, fez Lucy planar ainda mais alto. O ritmo que eles criavam juntos era pura magia. Os graves murmúrios de Hayden em seu ouvido se tornaram mais intensos, mais tensos, levando-a ao ápice, e ela cravou os dedos nas costas de Hayden, agarrando-se, querendo que o momento durasse. As investidas de hayden se tornaram mais rápidas, urgentes, e uma onda de prazer se ergueu dentro dela, grande demais para ser contida. Lucy gritou o nome dele quando a onda arrebentou numa explosão de cor, luz e intensidade, e, entorpecida, percebeu quando ele a acompanhou logo em seguida.

No sofá, Hayden olhava para o teto. Lucy estava a seu lado. Aquela devia ser a coisa mais idiota que ele já fizera, o que era algo muito significativo, pois já fizera muitas coisas idiotas em sua vida. Fazer amor com Lucy fora incrível, sim. Talvez Hayden não conseguisse se levantar durante uma semana. Ainda assim, fora idiotice. Ele gostava dela – talvez demais – mas, mesmo assim, ela estava mentindo para proteger o padrasto e basicamente admitira que faria tudo para salvar Graham Boyle. Hayden não tinha dúvida de que Lucy o desejara de verdade naquela noite; a paixão nos olhos dela fora algo lindo. Mas Lucy seria capaz de usar o que acontecera entre os dois para proteger Boyle se achasse que não tinha escolha? Ele sentiu um aperto no estômago. Gostaria de pensar que não, mas era óbvio que seu julgamento ficava seriamente prejudicado quando se voltava para ela. Mesmo que Lucy não estivesse mentindo para proteger seu padrasto, ela era dez anos mais nova. Hayden já tivera 22 anos, com toda a diversão e vontade de ter novas experiências que a idade envolvia. Contudo, agora, tinha 32 e um filho. Lucy e ele estavam em lugares completamente diferentes em suas vidas. O mais sábio seria largar a investigação, deixá-la nas mãos de outra pessoa de sua empresa. Agora, havia um conflito de interesses. Mas Hayden estava tão perto de encontrar a solução daquele caso... Não, contanto que mantivesse distância de Lucy dali em diante e não permitisse que isso afetasse sua integridade como detetive, manter-se no caso seria a melhor opção. Ao seu lado, Lucy se apoiou num dos cotovelos, um sorriso sonolento e satisfeito no rosto. – Em circunstâncias diferentes... Hayden a interrompeu: – Continuaria sendo apenas uma vez. – Ele falou aquilo do jeito mais delicado que conseguia. Apesar de ser a verdade, não era muito educado rejeitar uma mulher logo depois de ter feito amor com ela. – Achei que foi ótimo. Claro, podia ter sido melhor se tivéssemos conseguido chegar até a cama, e perdemos um pouco o controle mais para o fim, mas você precisa admitir que houve momentos gloriosos. A pele dele se arrepiou com a lembrança de como fora bom. – Lucy, não houve um segundo em que não tivesse sido glorioso. – Hayden tomou o rosto dela nas mãos. 37


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Lucy pôs uma palma sobre a mão dele, enquanto Hayden acariciava seu rosto, confusa. – Mas você não iria me querer de novo se tudo fosse diferente. Não iria querer? – Ah, querida, só estando morto para não querer você outra vez. – Ele retirou a mão, já sentindo falta da pele quente dela. – Porém, minha vida está confusa. Sou tudo o que Josh tem no momento. Ele merece um pai que se concentre nele. E todo o resto da minha atenção precisa estar na minha empresa. Fiquei um pouco desleixado desde que virei pai solteiro. Por isso, essa investigação é importante para a minha carreira. Simplesmente não tenho tempo para testar relacionamentos. – Não pedi para ter você para sempre. – Eu sei. Desculpe. A culpa é minha. Nunca devia ter deixado isso acontecer. – Você não estava sozinho neste sofá, Hayden – ela afirmou, com um toque de impaciência, e se sentou. – Mas um de nós acha que não tem muita graça ser sensato. Na sua idade, eu também achava isso. É por esse motivo que a responsabilidade de ter pensado nas consequências cabia a mim. Ela ficou paralisada, seus olhos se transformaram em gelo. – Isso não vai ser mais problema. – Lucy se levantou e começou a juntar suas roupas. Hayden bateu com a cabeça de volta no braço do sofá. Basicamente, ele a chamara de criança. Mesmo se Hayden tivesse se esforçado, não teria conseguido fazer daquela noite um desastre tão grande. – Lucy... – Não, você tem razão. – Ela vestia a blusa e a calça. – Fomos irresponsáveis. Não tornará a acontecer. Antes que ele pensasse em responder, ela já estava na porta. Hayden atravessou às pressas o recinto, ainda abotoando o jeans, e pôs a palma na porta, fechando-a. Lucy apoiou a cabeça na madeira, ainda segurando a maçaneta. – Lucy, eu estraguei tudo. Ela não ergueu a cabeça. – Sim. – Não precisa poupar meus sentimentos – disse ele, irônico. – O que quer que eu diga, Hayden? Você queria que fosse só uma vez. Bem, já estou saindo, sem nenhuma intenção de permitir que torne a acontecer. Você conseguiu o que queria. Então, por que não me deixa ir? – Quero que tudo fique certo entre nós. Não aceito que você vá agora com tudo nessa situação. – Ele baixou o olhar para a cabeça dela, apoiada na porta branca. Gostava de Lucy e jamais se perdoaria se permitisse que ela se fosse dali magoada. – Você disse que ajudaria na investigação. Isso não vai acontecer se for embora agora, Lucy. Ela se virou para ele com um trêmulo sorriso. – Tudo está ótimo entre nós. 38


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Segurando os ombros dela para equilibrar também a si mesmo, Hayden olhou no fundo dos olhos de Lucy, buscando evidências de que ela dizia a verdade. – Tem certeza? Ela o encarou, melancólica. – Absoluta. – Prove. – Hayden recuou, permitindo que ela fosse embora se quisesse e torcendo muito para que não o fizesse. Lucy não se foi. Em vez disso, olhou-o fixo. – Como vou provar isso? – Converse normalmente comigo. Você precisará apresentar provas ao Congresso amanhã. Terá de estar bem treinada para isso. Seria melhor debatermos. – Obrigada pela proposta, mas vou ficar bem. Basta dizer e verdade e não terei nenhum problema – disse ela, repetindo com um pequeno sorriso as palavras dele da primeira vez em que se encontraram. Hayden suspirou, aliviado. – Esse é sempre um bom plano. – Você estará presente? – No fundo da sala. Provavelmente, você não me verá. Ligo para você à tarde. – Até lá, então. E, desta vez, quando Lucy abriu a porta para sair, ele a deixou ir, apesar do aperto no peito.

Lucy entrou num táxi e deu ao motorista o endereço do ANS. Acabara de prestar seu depoimento no Congresso e se sentia exausta, mas Graham devia estar esperando para saber como tudo transcorrera. Ela se recostou no banco e cerrou as pálpebras, repassando em sua mente as perguntas que lhe foram feitas. Uma em especial não parava de se repetir. “Você já ouviu falar em Nancy Marlin?” Lucy dissera que não, mas o nome não parava de retornar à sua mente, como se houvesse uma lembrança logo além de seu alcance. Então, ela se lembrou. Seus olhos se abriram, e Lucy pegou o celular, digitando o número de Hayden por instinto. – Você foi bem – disse ele ao atender. Ela quase sorriu para a terna aprovação na voz dele, mas conseguiu evitar no último instante; estava na hora de se distanciar emocionalmente de Hayden Black. Dormir com Hayden enquanto trabalhava na matéria para expô-lo fora um erro monumental. Era provável que Hayden encontrasse a pessoa por trás das escutas telefônicas antes que Graham pudesse definir a data da exibição da matéria. Porém, se até lá Hayden descobrisse que Lucy trabalhara naquilo mesmo depois de terem feito amor, ele teria todo o direito de se sentir traído. Sendo assim, enquanto ele não encontrasse o culpado, a distância emocional seria crucial. 39


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– Onde você está agora, Hayden? – Do lado de fora do escritório do senador Tate. – Eu me lembrei de outra coisa. A voz dele se alterou na hora, tornando-se cem por cento profissional: – Encontro você no hotel daqui a 15 minutos. Lucy visualizou o quarto dele como estivera na noite anterior: as roupas dos dois espalhadas, os corpos nus estendidos no sofá. Seu sangue começou a se aquecer. Então, ela se recordou da maneira como fora embora, e seu sangue gelou. Talvez não devesse ter ligado para Hayden. – Lucy? Não, ela fizera a coisa certa. Hayden era o detetive do Congresso, a pessoa a quem ela devia contar. Eles só precisavam se encontrar num local reservado que não fosse o quarto dele. – Estou com fome e tem bolinhos na minha casa. Vamos nos encontrar lá – disse ela. – No hotel. Eu compro bolinhos no caminho. – E Hayden desligou.

Quando Hayden chegou à suíte, encontrou Lucy ali, exatamente como ele a vira na tela quando ela dera seu testemunho: com um conservador vestido verde, o cabelo preso na altura da nuca. E, assim como quando ele a vira antes, sua pulsação disparou. Hayden jogou para ela uma sacola de papel que cheirava a bolinhos recémassados e abriu a porta. – Conforme prometido. – Você é um príncipe, Hayden Black. Ele jogou as chaves e a carteira numa mesa e se virou para vê-la comendo o primeiro bolinho. Lucy parecia bastante confortável, dada a natureza do encontro deles, e aquilo o encheu de alívio. Depois da forma como as coisas terminaram, na noite anterior, ele temera que ela não retornasse suas ligações, nem concordasse em vê-lo. Porém, felizmente, tudo parecia estar bem entre eles, ainda que um pouco estranhas. Agora, tudo o que Hayden precisava fazer era não ultrapassar mais nenhum limite com ela. Jamais baixar a guarda. Hayden pegou o laptop e se sentou à mesa. – Primeiro, diga que você não se lembrou disso quando estava diante do Congresso, que não escondeu isso deles. – Não, foi no táxi, depois. – Lucy se sentou na outra cadeira à mesa. – Mas foi a pergunta deles que me fez lembrar. – Que pergunta? – Eles perguntaram se eu já tinha ouvido falar em Nancy Marlin. Eu neguei, mas o nome me deixou cismada, e me lembrei no táxi, no caminho de volta para o trabalho. Há alguns meses, ouvi esse nome por acaso numa conversa. – Quem estava conversando?

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– Marnie Salloway e Angelica Pierce. As engrenagens começaram a trabalhar na mente dele. Aquela poderia ser a peça que fazia todas as outras se encaixarem. – Quem é Nancy Marlin, Hayden? – Uma amiga de Barbara Jessup. Barbara Jessup fora empregada doméstica da família do presidente, quando ele era jovem. A lista de perguntas continha nomes aleatórios de pessoas ligadas ao presidente. Só havia um motivo para que jornalistas conversassem a respeito de uma amiga da doméstica. Os olhos de Lucy se arregalaram. – É isso! Parte dele concordava com ela. Poderia ser. Hayden, contudo, não queria contar com aquilo sem ter certeza. – Elas sabem que você ouviu? – Duvido. Eu estava no almoxarifado, e elas pararam bem do lado de fora da porta. Depois de pegar o que eu queria, esperei até que elas terminassem. Com Marnie e Angelica, não chamar atenção é essencial à sobrevivência. – Quero que você repita palavra por palavra do que elas disseram. – No início, elas reclamavam de um dos produtores. Aí, Angelica perguntou: “Algum progresso com Nancy Marlin?” Marnie respondeu: “Ainda não, mas continuamos tentando.” E Angelica: “Não deixe de me manter informada.” Depois disso, foi cada uma para um lado, e eu voltei para a minha mesa. Uma vibração de empolgação crescia no sangue dele. Hayden enfim encontrara. – As duas estão envolvidas. Encomendaram uma escuta nos telefones de Barbara Jessup. – Quer dizer ao Congresso para me chamar novamente? – Talvez precisemos fazer isso, Lucy, mas vou tentar primeiro com Ames e Hall. Uma conversa ouvida por acaso não é muita coisa, mas, se eu conseguir fazer com que eles entreguem Marnie e Angelica, talvez possam me dar mais evidências para que as acusações sejam sólidas. – Se eles fossem entregá-las, já não teriam feito isso? – Se eles acharem que já pegamos Marnie e Angelica, e é apenas questão de tempo até reunirmos provas, talvez tentem negociar com o que sabem. Também posso pegar o depoimento de Marnie e Angelica outra vez, dizendo a elas que essa conversa foi ouvida. Pode ser suficiente para que uma das duas entre em pânico ou cometa um deslize. Irrequieta, Lucy olhou pela janela. – Quem me dera ter lembrado antes. – Só de ter lembrado já está ótimo. – Delicadamente, ele a virou para si. – Vou tentar deixar seu nome fora disso. Os olhos dela fulguraram. – Nossas regras diziam que não deixaríamos nosso envolvimento interferir na investigação. Não tente me proteger. 41


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– Eu faria o que pudesse para proteger qualquer testemunha. Se conseguirmos evidências mais consistentes, não iremos precisar da sua, e não fará sentido colocá-la na linha de fogo. Se precisarmos de você... – Hayden segurou o rosto dela. – Vou colocá-la de novo diante do Congresso. Lucy sorriu. – Preciso voltar ao escritório. Graham está esperando para saber como foi. Hayden entregou os bolinhos restantes a ela. – Vai contar a ele sobre Marnie e Angelica? – Preciso contar. São funcionárias dele. A parte cínica do cérebro de Hayden ainda tinha certeza de que Lucy protegia seu padrasto. Graham Boyle estava no topo daquela cadeia de mentiras, Hayden não tinha dúvida. O que ele não sabia ao certo era se a disposição de Lucy em ajudar na investigação fazia parte do plano dela de garantir sua presença quando Hayden encontrasse provas que incriminassem Graham. Talvez ela estivesse esperando influenciá-lo para que descartasse essas provas. Ele detestava pensar assim, desejava poder ser franco com ela, mas tinha de ser realista. As informações de Lucy haviam sido valiosas até o momento, mas ela era funcionária do ANS, enteada de Graham Boyle. A lealdade dela seria sempre a Graham. Hayden compreendia isso. – Não conte a ele ainda. Volte para cá depois do trabalho e formaremos um plano para uma nova entrevista com Marnie e Angelica. Vou ver o que consigo fazer com Ames e Hall enquanto isso. Conte a Boyle quando soubermos mais. Ela mordeu o lábio enquanto seu olhar percorria o recinto. – Certo, hoje à noite. E Hayden sentiu uma empolgação igual à que experimentara momentos antes, ao fazer aquele grande avanço no caso. Pelo visto, ele precisaria conseguir o controle de seu corpo antes que Lucy tornasse a bater a sua porta.

Quando ele abriu a porta para Lucy naquela noite, havia uma terrível formalidade entre os dois. Apenas Josh parecia fazê-la relaxar. Hayden não conseguia parar de observá-la com Josh, os dois conversando e rindo. O celular dele tocou, e Hayden quase se sentiu agradecido pela distração, mas não reconheceu o número. – Hayden Black – disse. – Sr. Black, aqui é Rowena Tate. Sou filha do senador Tate. O senador mencionara que sua filha estava na cidade, mas Hayden não chegou a a conhecê-la. Sendo assim, aquele telefonema era uma surpresa. – Boa noite, srta. Tate. – Venho acompanhando a investigação do Congresso – disse Rowena. – Como sabe, meu noivo tem interesse na situação. O senador também mencionara o noivado de Rowena e Colin Middlebury, um diplomata britânico que trabalhara com o senador Tate para que o Congresso ratificasse 42


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um acordo de privacidade e ajudara o senador a formar o comitê que investigava as escutas telefônicas. – O que posso fazer por você? – Tenho uma suspeita com relação a uma das pessoas mais importantes do ANS. Talvez você esteja interessado nisso. – Estou ouvindo. – Há alguma chance de você me encontrar esta noite no aeroporto? Vou pegar um avião de volta para Los Angeles daqui a duas horas, mais ou menos. – Esta noite? – repetiu ele levando a mão à nuca. Estava quase na hora de Josh ir para a cama, e Hayden detestava a ideia de levar o menino para a rua tão tarde. – Talvez seja difícil. Lucy surgiu perto dele. – Se você precisar sair – sussurrou ela – posso ficar com Josh. – Espere um minuto, Rowena. – Hayden cobriu o fone com a mão. – Não posso lhe pedir que faça isso. – Tem a ver com a investigação? – Sim. – Estou ajudando você com a investigação. Ficar com Josh simplesmente faz parte disso. – Mas ele precisa ir para a cama daqui a uma hora. – Ele já jantou, não jantou? – Sim, mas... – Eu cuido do resto. Você pode me mostrar onde ficam as coisas antes de ir. Vamos ficar bem. Hayden olhou para Josh, que o fitava com veneração, perguntando a si mesmo se um bom pai deixaria um filho com outra pessoa daquele jeito. Tornou a encarar Lucy. Talvez ele não confiasse nela com relação a Graham, mas sua confiança em Lucy com seu filho era total. – Tem certeza? – Absoluta. Pode ir. – Obrigado. – Hayden destapou o bocal do aparelho para tornar a falar com Rowena: – Estarei lá.

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CAPÍTULO SEIS

Os olhos de Hayden percorreram a multidão no terminal do aeroporto até encontrarem Colin Middlebury num café. Hayden foi até lá e estendeu a mão. Colin e a mulher a seu lado se levantaram. – Obrigado por ter vindo, Black. – Colin apertou-lhe a mão. – É bom tornar a vê-lo, Middlebury. – Ele fora apresentado ao diplomata britânico quando assumira o caso. – Esta é minha noiva, Rowena Tate. – Colin pôs o braço em torno dos ombros de Rowena e sorriu para ela. A esbelta loira sorriu primeiro para o homem a seu lado. Em seguida, para Hayden. – Obrigada por ter vindo tão em cima da hora. – Não tem problema. – Hayden tentava não pensar em Lucy, com sua aparência sensual, no sofá da suíte dele. Colin indicou uma terceira cadeira à mesa deles, e todos se acomodaram. Os dois homens se viraram para Rowena. – Não vamos tomar muito do seu tempo, sr. Black. Pedi que viesse até aqui porque não queria discutir isso no telefone, dada a natureza da investigação. – Sensato. – Hayden sabia que seu celular estava protegido contra escutas, mas não podia garantir o mesmo quanto aos de outras pessoas. – Então, qual é a sua suspeita? – Tem a ver com Angelica Pierce. – Rowena se curvou para perto, por sobre a mesa, e baixou a voz: – Ela sempre me pareceu estranhamente familiar, mas eu a vi apresentando uma matéria na televisão, e a câmera a filmou num ângulo diferente. De repente, notei a semelhança com uma menina que estudou comigo no internato, Madeline Burch. O cabelo e os olhos têm cores diferentes, e, se for ela mesma, fez plástica no nariz e algumas outras coisas. Enquanto ela ainda estava na tela, telefonei para uma amiga que estudou na Woodlawn Academy conosco, e essa amiga também achou que podia ser Madeline. – Algum motivo para achar suspeito que uma repórter mude o nome para algo mais atraente? – Madeline era... desequilibrada talvez seja a melhor palavra. Sempre se gabando, dizendo que seu pai era importante, mas nunca dizia quem era. Ao que parecia, ele tinha dado dinheiro à mãe dela para que nenhuma das duas tocassem no nome dele. E, se alguém a desafiava, ela enlouquecia. – Defina enlouquecia – pediu Hayden, de repente muito interessado. – Uma vez, Madeline discutiu com outra menina. Não me lembro por quê. E, naquela noite, quando voltamos para nossos quartos, as roupas da garota estavam todas no chão, picotadas. – Alguém fez algo a respeito?

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– Ninguém possuía provas. Madeline disse aos professores que tinha visto uma menina mais nova entrar no dormitório, o que era mentira. Aquela garota não faria mal a uma mosca. Rowena não dava sinais de estar mentindo. Com as evidências que Hayden já tinha, estava inclinado a acreditar nela. – Foi um incidente isolado? – Ele quis saber. – Infelizmente, não. Madeline era imprevisível e vingativa. E, apesar de sempre sabermos que tinha sido ela, Madeline tentava pôr a culpa em outra pessoa. Passávamos longe dela sempre que podíamos. Até o dia em que a vimos discutindo com outra aluna sobre o “pai secreto” dela, e essa outra aluna a chamou de mentirosa e de louca. Madeline atacou a menina e acabou sendo expulsa. Os batimentos cardíacos de Hayden aceleraram quando as peças se encaixaram. – Você tornou a vê-la? Rowena balançou a cabeça. – Quando tudo isso veio à tona, recentemente, eu e minha amiga Cara procuramos na internet e não conseguimos encontrar nada a respeito de Madeline depois que ela foi expulsa. E outra coisa muito estranha: Angelica Pierce não tem nenhum histórico anterior a isso. Não sei se essa informação irá ajudar, mas achei que era melhor lhe contar. – Fico feliz por você ter feito isso. Rowena lhe entregou um envelope. – Estes são os resultados da nossa pesquisa. Em geral, informações básicas, e suspeitamos que grande parte seja falsificada. Tenho certeza de que você possui meios para aprofundar a investigação. Mas há uma foto de Madeline que Cara conseguiu encontrar com outra amiga de escola. Hayden agradeceu aos dois, despediu-se e saiu do aeroporto. Se Angelica fosse Madeline Burch, ela poderia ter armado para que Troy Hall e Brandon Ames pusessem o plano em ação e, depois, fossem pegos. Isso se encaixaria no comportamento de Madeline na época escolar.

Variações de possíveis situações se desenrolaram na mente dele no caminho de volta ao hotel. A suíte estava em silêncio. Então, Hayden foi pé ante pé verificar o quarto de Josh. Seu menininho dormia tranquilo. Aliviado, Hayden sorriu ao fechar a porta. Precisaria agradecer a Lucy depois... Foi quando ele a viu encolhida, dormindo no sofá, e perdeu o fôlego. Sua pele se aqueceu. Lucy estava tão dolorosamente linda, com seu cabelo loiro caindo por cima da curva do rosto... Lembranças de quando tocara aquela pele nua atacaram os sentidos dele. A fragrância do cabelo, o formato do quadril. Sem perceber que tinha se movido, Hayden já estava ao lado dela, agachado, perto o suficiente para sentir a respiração dela no rosto.

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Seu coração martelava como louco, e uma parte distante de seu cérebro gritava para que ele se afastasse antes que Lucy acordasse, mas Hayden não recuou. Não conseguia. A pele dela era como porcelana; seus lábios estavam entreabertos. Estaria sonhando com ele? Sem dúvida, Hayden sonhava com ela. Hayden se curvou à frente e a beijou de leve. Uma doce tortura. Seus olhos se fecharam. Ele recuaria já, já. Tão logo gravasse aquele momento em sua memória. Com um suave gemido, Lucy mexeu os lábios preguiçosamente sob os dele, suas pálpebras se ergueram. Aquela era a hora de recuar – Agora! – mas ela sorriu contra a boca dele, entrelaçou os dedos por seu cabelo, e Hayden não conseguiu invocar a força de vontade necessária para permitir alguma distância entre eles. – Hayden... – murmurou Lucy tornando a beijá-lo. Quando Lucy se apoiou no cotovelo, ele a envolveu com um dos braços, puxandoa contra o peito, amaldiçoando em silêncio o tecido que os separava. Estava perdido, afogando-se nela. Todavia, ainda restava um fio de ciência, uma luz de alerta que piscava meio apagada na periferia de sua mente. Hayden tentou deixar aquilo de lado, entregar-se por completo à exuberância da mulher em seus braços, mas, no fundo, ele sabia... Hayden a beijou mais uma vez, um beijo com um toque de desespero, antes de recuar. – Lucy, estou no limite. – Ele apoiou a testa na dela, abraçando-a com mais força. – Quero você... mal consigo dizer o quanto... mas fazer amor de novo seria errado por vários motivos. Ela recuou e umedeceu os lábios, desafiando-o inadvertidamente a esquecer a cautela. Então, relaxou e sorriu, sonolenta. – Vai ficar tudo bem. Venha cá. Depois da última vez, sei que tem espaço para dois. Frustradíssimo, Hayden uniu as mãos na própria nuca. – Não tem nada que eu queira mais neste momento, mas você sabe que não podemos. Ela se sentou e esfregou os olhos. O movimento apenas o fez querer ainda mais puxá-la para seus braços. Por isso, Hayden se obrigou a ir para o outro sofá. Lucy pôs as pernas debaixo do corpo e assentiu. – Certo. Vou fazer uma proposta. – Claro – disse ele. A proposta precisaria incluir uma armadura para um deles para dar certo. – A situação é a seguinte. Temos uma química inegável. Você vai passar pouco tempo em Washington. Não há espaço em sua vida para um namoro. Seu trabalho não permite um relacionamento comigo em especial. Ele fez uma expressão de dor. Dita em voz alta, a situação deles parecia ainda mais perdida. Mas Hayden assentiu, disposto a ouvi-la. – Sendo assim, proponho que tenhamos um caso secreto. – Lucy sorriu, parecendo satisfeita consigo mesma.

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Tudo dentro dele se contraiu, pronto para aceitar a proposta. Entretanto, Hayden franziu o cenho. – O que é isso? Apenas dormirmos juntos? – Puramente físico – ela confirmou. – Totalmente discreto. Ela falava sério? O corpo dele podia já ter aceitado, mas a ideia era louca. – A investigação... – Nós dois já estamos comprometidos. Isso não poderá piorar nada. Diga... dormir comigo o convenceu da inocência de Graham? – Não. – Há alguma possibilidade de que você altere suas conclusões por causa da nossa intimidade? – Nenhuma. – Aquilo seria inconcebível. Integridade era tudo naquele ramo de trabalho. – Nesse caso, não tem problema. Podemos ter um caso. – Um caso – repetiu ele. Não havia sangue suficiente em seu cérebro para aquela conversa. Tudo descera com aquele primeiro toque dos lábios dela. – Isso resolve tudo. É um ótimo plano. Hayden se levantou e foi até a janela. – Você não vê problema nisso, Lucy? Em ser puramente físico? – Ele podia desejála mais do que desejara qualquer mulher, mas não a usaria. Isso ia contra todos os seus princípios. – Não quero nada sério no momento. Você diz que seu foco está no seu filho e na sua empresa. Bem, o meu está na minha carreira. Carregando o meu sobrenome e tendo o padrasto que tenho, sou obrigada a trabalhar o dobro de qualquer outra pessoa para provar minha independência, meu valor. E, para ser honesta, depois de tudo o que já fiz, a última coisa que necessito é um relacionamento com um homem mais velho e rico, da alta sociedade, com boas conexões. Hayden respirou fundo, atingido de súbito pelas palavras dela. Estivera preocupado com seus próprios motivos para não se envolver, mas não pensara naquilo do ponto de vista de Lucy, que tinha tanto a perder quanto ele. Ainda assim, ela o desejava o suficiente para propor aquele plano. Hayden foi até o sofá onde Lucy estava e se sentou no braço, tomando-lhe as mãos. – Vamos ter um caso que terminará quando eu for embora da cidade. Nós dois precisamos ter isso em mente. – Quer dizer que você quer? – perguntou ela, a voz surpreendentemente incerta. – Lucy, quero mais do que consigo expressar. Mas há condições. – Hayden a soltou se tornou a se erguer, antes que mandasse aquelas condições para o inferno e a possuísse ali mesmo, no sofá. – Em primeiro lugar, vamos manter a regra que já criamos a respeito do sigilo. Ninguém poderá saber que estamos fazendo isso. E também a regra de não deixarmos que nosso envolvimento nos influencie. – Fechado. Um calafrio elétrico desceu pela espinha dele. Aquilo realmente aconteceria. 47


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– Além disso, nada de fazermos amor aqui na minha suíte. É o centro da minha investigação, guardo minhas pesquisas aqui e me encontro com as pessoas neste lugar. Só iremos dormir juntos na sua casa e só durante o dia, quando Josh estiver com a babá. – Faz sentido. Por mim, tudo bem. Hayden se ajoelhou diante dela, querendo que não houvesse nenhum malentendido. – E prometa que, se as coisas ficarem constrangedoras, ou se for demais para você, irá me dizer. Assentindo, Lucy levou as mãos ao rosto dele. – Prometo. Se você também prometer. – Claro. – Hayden se sentia quase incapaz de formar a palavra, com Lucy tão perto a tocá-lo. – Posso trabalhar de casa amanhã. Com o sangue fervendo, Hayden pensou em sua agenda. – Não tenho nenhum compromisso pela manhã. Chego lá às 9h30. Mas, se você não for embora neste instante, vamos começar agora mesmo. Com um olhar malicioso, Lucy pegou a bolsa e saiu quase correndo pela porta. Hayden ficou sozinho, perguntando a si mesmo como aguentaria esperar até as 9h30.

Às 9h10, Hayden atendeu a uma batida na porta de sua suíte. O único compromisso que ele tinha naquela manhã era encontrar Lucy dali a 20 minutos, para dar início ao caso deles. Sua pele se aqueceu. Já estava vestido e pronto para o dia – para Lucy – desde as 8h. A babá chegara para cuidar de Josh às 9h. E, nos últimos dez minutos, Hayden estivera inquietamente remexendo em papéis, desejando que o tempo passasse mais rápido. Quando abriu a porta, encontrou Angelica Pierce com um justo vestido vermelho, esticando seus lábios com botox num falso sorriso. – Hayden querido – disse ela animada. – Bom dia, Angelica. – Seu treinamento o ajudou, permitindo que ele sorrisse e fosse agradável sem deixar transparecer sua irritação. – Tínhamos uma hora marcada? – Não, não. – Ela passou por ele e entrou na suíte. – Eu estava por perto e resolvi vir aqui, para ver se tem algo que eu possa fazer para ajudar. – Você quer ajudar? – Claro que sim! Esses terríveis crimes mancham todos os jornalistas aos olhos do público. Quanto antes tudo se resolver, melhor será para todas as redes de notícias. – Angelica se acomodou no sofá. – Venha se sentar aqui, Hayden, para podermos conversar a respeito. – Sinto muito, mas tenho de sair para uma reunião.

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– Ah, querido, acho que você vai encontrar tempo para mim. – Ela esticou o pescoço para o lado e baixou o ombro, e a manga de sua blusa caiu pelo braço, revelando uma pele perfeitamente bronzeada. Apesar de sua vontade de expulsá-la, Hayden analisou sua postura. Era um claro convite. E, pelo que ele já sabia sobre Angelica, se lidasse com aquilo da forma errada, ela poderia ter uma reação exagerada. E, se isso acontecesse, talvez Angelica cometesse um deslize e revelasse algo... – Olhe... – Hayden encontrou um tom educado, mas firme. – Preciso mesmo sair. Angelica se levantou e foi até ele, perto demais. Quando Hayden se afastou, ela o seguiu. – Hayden, não vamos perder tempo com palavras. Sei que você está interessado em mim, e também me sinto atraída por você. – Angelica, isso não vai acontecer. Nem agora, nem nunca. Houve um longo silêncio. Então, os olhos dela faiscaram de fúria. – É por causa dela, não é? Hayden ficou paralisado. – Quem? – Lucy Royall – disparou Angelica venenosa. – Você só queria falar dela no outro dia. Tem uma quedinha por ela, não tem? Uma sensação de desconforto desceu pela espinha dele. Hayden pensara que Angelica descontaria sua raiva nele, não em Lucy. Teria ele posto Lucy na linha de fogo? Angelica devia ter visto algo na expressão dele que o traiu, pois ela sorriu satisfeita. – Não se preocupe, querido, todos os homens têm. É a farsa da princesa que ela aperfeiçoou. Mas vou lhe avisar. Lucy está investigando você. Juntando material para uma matéria para expor todos os seus segredos que logo irá ao ar no ANS. Eu soube disso diretamente de Graham Boyle, ontem à noite. Hayden sentiu uma fria mão apertar seu coração. Lucy o enganara? Estava trabalhando numa matéria para expô-lo quando lhe dissera que queria ajudar na investigação dele? Não, Hayden se recusava a acreditar que ela pudesse ser tão manipuladora. Mas... ele a conhecia bem? A náusea lhe revirou o estômago. Talvez ela fosse capaz de planejar aquilo. E, se fosse, a ideia de terem um caso faria parte do esquema? – Acho que está na hora de você ir, Angelica. – Hayden foi até a porta. – Claro. Quando estiver pronto para conversar, pode me procurar. Sou eu quem pode ajudá-lo, lembre-se disso. E até lá... – Ela pendurou a bolsa no ombro e foi para a porta. – ...não diga nada a Royall que você não queira que apareça no noticiário do horário nobre. Três minutos depois, Hayden estava a caminho da casa de Lucy. A visita daquela manhã podia ter sido planejada como um encontro romântico. Agora, porém, eles usariam o tempo para que Lucy lhe desse algumas informações. A verdade seria um bom ponto de partida.

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CAPÍTULO SETE

Eram quase 10 horas quando Lucy viu o carro de Hayden estacionar. Com um frio na barriga, ela olhou para seu vestido tomara que caia cor de creme, fácil de tirar, que cobria uma lingerie de renda lilás. Com a pulsação acelerada, ela abriu a porta. – Está atrasado, sr. Black – afirmou com sua melhor voz maliciosa, então, percebeu a expressão fechada dele. – O que houve? Hayden passou direto por ela, entrou na sala e se virou com as mãos nos quadris. – Você está fazendo uma matéria para me expor? Todo o ar escapou dos pulmões dela. – Como sabe? – Regras sobre o sigilo, regras sobre o caso. Só esquecemos de acrescentar uma regra sobre não reunir material para uma matéria enquanto dormíamos juntos. Com os joelhos trêmulos, ela avançou. – Hayden... Ignorando a tentativa de explicação, ele atravessou o cômodo e apoiou a mão no batente da janela, olhando para o pequeno pátio dos fundos. – Ao menos eu fui sincero com relação à minha investigação. Você sabia que eu a estava fazendo desde o início, e eu lhe disse que suspeitava de Graham e de que você o estivesse protegendo. – Hayden tornou a se virar para ela. – Pelo jeito, não mereço a mesma cortesia. – Certo, você está com raiva – disse ela indo devagar até ele. – Entendo. E acho que tem o direito de estar. Hayden soltou uma risada incrédula. – Quanta generosidade! – Mas sua investigação pode arruinar a vida de um homem. Um inocente. Graham pode perder a empresa, a reputação, até a liberdade. E há pessoas no ANS que armariam para garantir que isso acontecesse. Acha que não teríamos um plano B para essa situação? – Que Boyle e o ANS teriam um plano? Claro. Que você estaria no comando dele? É um péssimo jeito de tratar o homem com quem está dormindo, Lucy. – Tem razão. Desculpe. – Ela afundou no sofá. – Mas você precisa entender que, quando Graham me pediu para fazer a matéria, eu só o tinha encontrado uma vez, Hayden. Não sabia se podia confiar em você. – Confia em mim agora? – Sim. – Ela suspirou. – Não sei bem quando passei a confiar, mas confio.

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– Nesse caso, por que não me contou ontem? Na semana passada? Depois de termos dormido juntos? Era uma pergunta justa, uma que a própria Lucy vinha fazendo a si mesma. – Acho que eu esperava que você descobrisse o mandante das escutas e a sua investigação terminasse, para que a matéria não fosse necessária. – E se as coisas não acontecessem assim, se eu demorasse mais? Você iria me contar antes de a matéria ir ao ar? Ou me deixaria descobrir junto com o mundo inteiro? – Eu teria avisado, juro. E, se vale de algo, sinto muito, Hayden. Mas tente se colocar no meu lugar. Meu chefe, meu padrasto, um homem que amo, pede para que eu trabalhe num projeto secreto que pode salvá-lo. Só conheci você faz algumas semanas. Está dizendo que eu devia passar a ser leal a você de uma hora para outra? Ele fez uma expressão de dor quando a realidade o atingiu. – Você ficou dividida entre a sua família e o seu amante. Os ombros dela desabaram. – Essa história entre nós está passando de vários limites, não está? Hayden suspirou e foi se sentar na mesa de centro, diante dela. – Sim, está. Tenho achado que eu devia entregar o caso para outra pessoa da empresa. – Não. – Lucy tomou as mãos dele. – Por favor, não faça isso. – Mas acho que Graham é culpado. Poderia ser melhor para você tentar a sorte com outra pessoa. – Pode achar que ele é culpado, Hayden, mas você é honesto, honrado. Assim que encontrarmos evidências que inocentem Graham, irá respeitar isso. Você é nossa maior esperança. – Tudo o que ela dissera era verdade, mas havia algo mais, algo ainda mais forte que a dominava, exigindo que não o deixasse ir embora. Ainda não, por favor. Hayden a olhou durante um longo tempo. Enfim, assentiu, e o alívio a dominou. – Você disse que havia pessoas no ANS que estavam armando para cima dele. Por que acha isso? Lucy se levantou, foi até a cozinha, encheu dois copos com água com gás e entregou um a Hayden. Quando ela o viu apoiado na bancada, sua boca secou. A beleza máscula e morena dele era enfatizada pelo claro mármore da bancada e os armários brancos. Lucy bebeu um gole de água para molhar a garganta e conseguir falar. – Você mesmo afirmou que tinha alguém por trás de tudo. Seja quem for, essa pessoa não está planejando ser pega. Culpar alguém mais acima na hierarquia é o álibi perfeito. – Ela deu outro gole, pensando nas pistas que eles tinham. Então, ficou paralisada. – Quem contou a você a respeito da matéria? – Angelica. Ela acabou de passar no meu quarto, tentou me seduzir e, depois, falou para eu não confiar em você. O coração de Lucy quase parou com o tentou me seduzir, mas ela conseguiu não deixar que sua reação pessoal afetasse seu interesse profissional nos acontecimentos. – É Angelica quem está por trás de tudo. Sei que é. – Acho que você tem razão. – Ele pôs o copo vazio na pia. 51


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Hayden teria enxergado a verdade? – Quer dizer que acredita que Graham é inocente? – Não, Lucy. Ainda assim, ele deve ter sabido do que estava acontecendo, talvez até trabalhado com ela; mas suspeito que foi Angelica quem tramou tudo. Lucy cruzou os braços. – Você vai ver. Quando chegarmos ao fim da investigação, teremos as provas de que Graham é inocente. A natureza de Graham o fazia ir até onde era possível. Porém, ao chegar ao limite da legalidade, ele pararia. – Ouça. – Hayden pegou a mão dela. – Teve outra coisa na declaração de Angelica que me incomodou. – A tentativa de sedução? – Ela sorriu, satisfeita com a ideia de Hayden rechaçar os avanços de outra mulher. Ele balançou a cabeça, como se aquilo não tivesse sido nada. – Não, isso foi fácil de repelir. Foi o veneno que ela direciona a você. Angelica nem tentou disfarçar. – Ela sempre me odiou. Angelica tratava todos mal, mas parecia gostar ainda mais de ter como alvo a enteada do chefe. Ela não era a única, no entanto. Marnie e Mitch eram da mesma estirpe. Mas isso era de se esperar, tendo o sobrenome Royall e um padrasto que era dono da rede. Hayden a puxou para perto. – Era maior que ódio. Muito maior. Ela engoliu em seco. – Por que ela odiaria você especificamente? – Hayden acariciou as mãos dela com os polegares. – Vocês nunca tiveram uma desavença? – Não sei. Sempre achei que fosse por eu ser filha do dono da emissora. Eles não gostam de ter-me no seu local de trabalho. – Pode ser. Mas por que ela é mais vingativa que os demais? E, se Angelica é capaz de manipular ao menos duas pessoas num complexo esquema de escutas telefônicas ilegais, fazendo com que elas a protejam mesmo depois de terem sido presas, não deve ser subestimada. – Angelica não faria nada comigo – garantiu Lucy, mas sua voz não soou convencida nem para ela mesma. – Lucy, sou especialista nisso. Angelica Pierce machucaria você se tivesse oportunidade. Quero que fique perto de mim, onde posso protegê-la. Diga ao ANS que você precisa se manter ao meu lado enquanto trabalha na maldita matéria. Algo dentro dela gelou. Angelica a machucaria se tivesse oportunidade? Que tipo de pessoa fazia isso? Lucy sabia que Angelica não tinha ética, mas aquilo era algo completamente diferente... Lucy puxou as mãos e cruzou os braços na altura da cintura. No passado, o jornalismo lhe parecera um reluzente caminho de busca da verdade e de integridade.

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Angelica Pierce era uma repórter famosa, e, ainda que Lucy soubesse que ela era maldosa, antes de ter ido trabalhar no ANS, idolatrara as matérias de Angelica. Lucy empinou o queixo. Uma coisa estava certa: Angelica não a pegaria desprevenida. – Não sou nenhuma criança que precise ser protegida. Vou ficar bem. – Acredite, sei que você não é uma criança. – Ele desceu com os dedos pelo braço dela, e a puxou para junto de si. – Deixe que eu a proteja – murmurou na orelha dela. Em todos os pontos de contato, a pele dela se aqueceu. Mas Lucy tentou não se perder em sua reação a ele. – Seu trabalho não é esse. – Quero proteger você. Quero tê-la em segurança. Lucy fez uma expressão de dor. A última coisa de que precisava em seu amante mais velho era que ele a considerasse uma donzela em apuros. Apoiando as palmas no peito de Hayden, Lucy se afastou para poder olhar nos olhos dele. – Hayden, não quero que você me veja como alguém que precisa ser protegida. O olhar dele se abrandou. Em seguida, fulgurou. – Vejo muitas coisas em você. Sua coragem, sua determinação. Suas maravilhosas curvas. Vejo que uma mulher insana pode querer atacá-la. Que eu não consigo parar de pensar em fazer amor com você outra vez. Que... – Pare aí. – Ela umedeceu os lábios. – Volte para aquela. – Que uma mulher insana pode querer atacá-la? – perguntou ele com um sorriso malicioso. Ela se aproximou dele rápido. – A que veio depois dessa. Hayden levou as mãos dela até os lábios, beijando um dedo por vez. – Que não consigo parar de pensar em fazer amor com você outra vez? Ela perdeu o fôlego. – Essa mesma. Fale mais dessa. – Eu penso e sonho. – Comece falando dos sonhos. Hayden abriu um lento e sensual sorriso, cheio de promessas. – No meu preferido, eu estava na minha cama, em Nova York, e você entrou pela porta, ficando debaixo das cobertas comigo. Ela estremeceu quando a imagem se formou em sua mente. – O que eu vestia nesse sonho? – Nada. É por isso que é um dos meus preferidos. Ela fechou os olhos, seu centro latejando. – O que aconteceu depois que fui para debaixo das cobertas com você? Hayden pressionou os lábios contra a orelha dela. 53


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– Passei o resto da noite garantindo que você se divertisse bastante. – E eu me diverti? – Ah, sim. – Ele mordiscou-lhe o pescoço. – Foi bem entusiasmada na hora de afirmar isso. Uma fantasia tão simples, mas aquilo a deixou excitada até as pontas dos pés. Lucy envolveu o pescoço dele com os braços. – Parece que esse sonho está destinado a se realizar. – Estou trabalhando para isso. – Ele olhou à volta. – Tem algum quarto por aqui? – No fim do corredor. Fale dos seus pensamentos agora. Hayden a ergueu no colo e saiu do cômodo. – Em geral, são arrependimentos. – Arrependimentos? Com relação a ter feito amor comigo? – Sim. Tenho uma lista. – Com a cabeça, Hayden indicou a porta aberta do quarto dela, e Lucy assentiu. – Tipo? – Foi rápido demais – ele sussurrou no ouvido dela. – Não consegui fazer algumas coisas que eu queria. Hayden a pôs sobre a colcha azul-clara. Então, subiu na cama, ficando sobre ela, preenchendo a visão de Lucy. Devagar, ele soltou a faixa que lhe atava o vestido, abrindo-o. Lucy prendeu a respiração quando uma das mãos de Hayden envolveu firme a renda lilás que ele expusera e a cabeça dele mergulhou para o espaço entre seus seios. O calor da boca e da língua dele lançou uma chuva de fagulhas pelo sangue de Lucy. E, quando os dentes de Hayden mordiscaram-lhe delicadamente a base do seio, ela se arqueou, oferecendo mais, querendo mais. – Ou sentir a maciez da pele da sua coxa – disse ele quando sua mão desceu pelo corpo dela, levantando um dos joelhos. Hayden criou uma trilha de beijos até a barriga de Lucy, contornando o quadril, indo até o joelho erguido, enquanto as pontas de seus dedos desenhavam círculos na parte interna da coxa de Lucy, perto da calcinha. – Não pude passar mais tempo nos lugares que eu queria. – A língua dele se juntou aos dedos, e Lucy quase derreteu. – Sou um homem que detesta ter arrependimentos. Então, se não tiver problema para você, vou consertar essa situação agora mesmo. – À vontade – disse ela arfante. Pelo que pareceram horas, Hayden a enlouqueceu sem pressa alguma, levando-a até perto do ápice e, em seguida, voltando implacavelmente sua atenção para outra zona maravilhosa, tirando peças de roupa à medida que progredia. Enquanto isso, Lucy explorava os músculos do abdômen dele, seus poderosos ombros e braços, também tirando as roupas de Hayden até que não houvesse barreiras entre os dois, a não ser o preservativo. Lucy sabia que eles não tinham um tempo infinito, mas, por ora, Hayden era seu. E não havia nenhum outro lugar onde ela desejasse estar naquele momento. Talvez jamais fosse haver novamente. 54


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Hayden parou, olhando fixo nos olhos dela. Então, seus lábios encontraram os de Lucy, toda a sua paixão e sua sede se concentrando num perfeito beijo. – Lucy... – disse ele com a voz rouca. – Nunca quis tanto alguém assim. Ninguém. Ele ergueu o joelho dela e, sem interromper o contato visual, penetrou-a. O ar escapou sibilando por entre os dentes cerrados de Hayden, e, incapaz de se conter, Lucy gritou seu. Os olhos dele cintilaram, e Hayden começou a se movimentar. No início, devagar. Depois, mais rápido. Ela arqueou as costas, querendo tudo o que ele podia lhe dar, desejando que aquilo durasse para sempre. Quando Lucy chegou ao ápice, Hayden capturou-lhe a boca, levando-a ao orgasmo, sem reduzir o ritmo, mantendo-a nos ares. Sem demora, acompanhou-a, dizendo seu nome. Quando Lucy retornou à terra firme, Hayden a puxou contra si. Ela nunca se sentira tão segura, tão valiosa. Nunca se sentira tão plena. Algum outro homem conseguiria ser suficiente para ela depois daquilo?

Mais tarde, naquele dia, Lucy estava no escritório de Graham com uma grande buldogue arfando aos seus pés. Lucy passou o dedo pela foto emoldurada que se achava dentro de uma caixa em seu colo, envolvida por papéis: ela mesma aos 15 anos, entre Graham e sua mãe, sorrindo. Seu padrasto providenciara uma reprodução da fotografia, a emoldurara e a dera a Lucy assim que ela entrara, poucos minutos antes. – Obrigada por isto. – Foi difícil, mas ela conseguiu vencer o embargo de emoção em sua garganta. – Sei que você ainda sente falta dela. – A voz dele também soava um tanto abalada. Lucy tocou o rosto da mãe no retrato. – Sinto, sim. – Bem, como vai a pesquisa para a matéria? – perguntou ele ao se recostar na cadeira, mudando de assunto como sempre fazia quando as coisas ficavam emotivas demais. – Já estamos quase prontos para iniciar a produção? Lucy prendeu o cabelo atrás das orelhas num esforço para impedir que o rubor de culpa lhe subisse até as faces. – Ainda não. – Ainda não descobriu nada? – A testa dele se franziu profundamente. Uma torrente de imagens encheu a mente de Lucy, de todas as coisas que ela descobrira a respeito de Hayden Black: os músculos de seu abdômen, a sensação dos pelos escuros que cobriam o peito dele contra o rosto dela, a expressão dele ao encontrar a liberação dentro dela... – Parece que ele não tem nada de ruim no passado. É um bom homem, virou pai solteiro há pouco tempo e é perfeitamente honesto no trabalho.

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A pesquisa dela encontrara pequenos problemas, como um relacionamento desconfortável com os pais da falecida esposa e alguns momentos de exageros, quando Hayden cursava a faculdade; mas nada que pudesse ser usado na matéria. – Deve haver algo que você possa encontrar, Lucy. – Na verdade, creio que cheguei a um beco sem saída. – Acariciou o peito de Rosie com a ponta do sapato enquanto formulava a pergunta que precisava fazer: – Você confia muito em Angelica Pierce? Graham não hesitou: – Ótima jornalista. Tem instintos consistentes. – Ela contou a Hayden que eu estava fazendo uma matéria para expô-lo. Os olhos dele se arregalaram. – Droga! – Pensei que você não confiasse em mais ninguém para revelar esse plano. – Aquela fora a parte que mais a surpreendera. – Angelica me procurou ontem à noite, preocupada com o que essa maldita investigação de Black poderia fazer com a rede. Contei a ela que já estávamos cuidando disso. Eu iria usá-la para apresentar a matéria. Então, ela teria ficando sabendo em algum momento mesmo. Ela foi direto até Black? Direto a ele com as informações e mais uma tentativa de sedução como bônus. – Angelica foi procurá-lo hoje de manhã. – Deve ter achado que poderia usar isso para conseguir chantageá-lo. Para fazê-lo recuar ou entregar quem são as fontes dele. Lucy mordeu o lábio, perplexa por Graham já estar tentando explicar as ações de Angelica, inventando desculpas. Seu padrasto não conseguia enxergar o que estava debaixo de seu nariz? – Até isso terminar, Graham, acho que você não devia confiar nela. – Bobagem. Angelica não vai cuspir no prato em que come. Ela colocará os interesses do ANS em primeiro lugar. Como Black reagiu à notícia? Teremos dificuldades? A julgar pelas coisas que a boca de Hayden fizera com ela naquela manhã, Lucy diria que ele reagira muito bem. – Não, ele ainda vai me deixar ajudar na investigação. Eu o convenci de que manteria minha ética. Graham sorriu como se achasse que ela mentira para Hayden, e algo dentro de Lucy murchou. A falta de escrúpulos de Angelica a deixara com um pé atrás. Graham, contudo, parecia respeitar isso em sua famosa jornalista. Agora, ele demonstrara aprovação com a possibilidade de sua própria enteada ter mentido. Lucy sabia que Graham era um empresário durão, mas nunca imaginara que ele esperasse coisas diferentes dos jornalistas do ANS. O que isso fazia com os planos dela para sua própria carreira? Se Lucy se recusasse a ser como eles, teria um futuro como jornalista de televisão? Sentiu um vazio no estômago.

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– Preciso voltar para Hayden. – Ela pegou sua bolsa e se levantou. – Eu disse que o ajudaria com algumas pesquisas à tarde. A testa de Graham se franziu, deixando-o parecido com Rosie. – Você não está ficando íntima demais de Black, está? Não se permita ser solidária com seu alvo. É um erro de iniciantes. Ela pensou em Hayden deitado nu sobre os lençóis dela, algumas horas antes. Lucy levou a mão ao pescoço. – Não, não estamos ficando íntimos demais. – Ótimo. Eu sabia que podia contar com você. Lucy, porém, começara a se perguntar exatamente quem poderia contar com ela. E com quem ela poderia contar. Olhou para sua foto com Graham e sua mãe durante um longo momento. Então, deslizou-a para dentro de sua bolsa vermelha. Arregaçou as mangas e afastou os pensamentos desleais. Graham poderia contar com ela, e ela poderia contar com ele. Eles eram uma família. Acariciou Rosie mais uma vez debaixo do queixo, deu um rápido abraço em Graham e saiu.

Hayden olhava para duas fotos, lado a lado, na tela de seu laptop, uma sensação de triunfo preenchendo seu corpo. A semelhança era inconfundível. Sem tirar os olhos da tela do computador, ele pegou o celular e ligou para Lucy. – Pode vir até aqui? – perguntou quando ela atendeu. Eles tinham adentrado uma rotina nos últimos dias. Aproveitavam o tempo pessoal na casa dela, todos os dias, mas em horários que variavam, para serem discretos, e Lucy passava no hotel à tarde ou à noite para ver como ia a investigação. Agora, porém, eram apenas sete da manhã. Lucy logo estaria a caminho do ANS, e a descoberta dele não poderia esperar um dia inteiro. – Claro. O que foi? Sem querer revelar muito no telefone, Hayden simplesmente falou: – Descobri algumas coisas que você vai querer ver. – Chego assim que puder. Quando Lucy chegou, Hayden já montara uma apresentação de slides com as imagens que seu escritório lhe enviara e pusera Josh na cadeirinha para tomar o desjejum. Ao abrir a porta, ele roubou dela um demorado beijo. Então, antes que se afogasse no perfume floral de Lucy e violasse as regras deles ao levá-la para sua cama, Hayden foi lhe mostrar sua descoberta. – O que é? – Os olhos cor de mel dela reluziam de curiosidade. Lucy deu um beijo no alto da cabeça de Josh e se sentou na cadeira que Hayden puxara, diante da dele, pondo a mão em sua coxa. Com o simples gesto, algo se mexeu dentro do peito dele.

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Hayden ficou paralisado. Aquilo deveria ser um caso. Ele estaria ficando emocionalmente envolvido? Não, não permitiria que isso acontecesse. Não havia futuro para um pai solteiro de Nova York e uma herdeira de 22 anos de Washington. Ele abriu a tela do laptop para que ela pudesse ver as imagens. – Depois de investigar, encontrei uma foto de uma garota chamada Madeline Burch. – Hayden clicou no mouse, e a imagem de uma adolescente de cabelo castanho, feições comuns e olhos castanho-claros surgiu. – Quando me encontrei com Rowena Tate aquela noite no aeroporto, a srta. Tate me disse que ela e mais uma amiga tinham suspeitas a respeito de Madeline Burch. A srta. Tate me deu uma foto de Madeline da época da escola, mas a resolução estava baixa demais. Então, encontrei uma melhor e a enviei para o pessoal da informática no meu escritório. Eles trabalharam na imagem e me enviaram estas projeções. Hayden clicou o mouse. A mesma garota apareceu com cabelo loiro liso. No clique seguinte, ganhou olhos azuis. Em seguida, seus lábios ficaram mais fartos. – Se Madeline pintasse o cabelo, usasse lentes de contato, fizesse uma plástica nos lábios e no nariz... – ele tornou a clicar, e a mesma garota apareceu com um nariz diferente – ela ficaria mais reconhecível. – Angelica – murmurou Lucy. – Exatamente. Angelica Pierce começou a vida como Madeline Burch. Também rastreei os registros de Madeline, e ela desapareceu alguns anos depois da formatura. Os registros de Angelica vão até os anos de escola, mas o pessoal da informática do meu escritório analisou mais a fundo e descobriu que é tudo plantado. Ela tentou encobrir seu passado, e funcionou até certo ponto. – É uma transformação e tanto. – Não há dúvidas. – Hayden passou de novo pela apresentação de slides enquanto falava. – Minha maior dúvida agora é: ela fez isso para ter um novo começo, talvez aumentar suas chances de conseguir um emprego diante das câmeras... – Ou está escondendo alguma coisa? – completou Lucy. Ele assentiu. – Dei alguns telefonemas, e ninguém da escola dela permaneceu em contato com Madeline. A jovem foi criada por uma mãe solteira que já faleceu e não parece ter mais nenhum parente. Várias mulheres se lembram de Madeline sempre se gabar de ter um pai rico cujo nome ela não podia falar, mas, além disso, ninguém sabe de muita coisa. Pedi para minha equipe encontrar a certidão de nascimento dela, mas o pai de Madeline não estava listado. – E aposto que não vamos conseguir encontrar ninguém que tenha conhecido Angelica Pierce quando criança. – Não que eu tenha encontrado até agora. Na verdade, além de você, não consigo achar ninguém que diga algo de ruim sobre Angelica. Troy Hall e Brandon Ames não param de elogiá-la, apesar de eu ter quase certeza de que ela armou para que eles fossem pegos. – Angelica deve estar chantageando os dois com alguma coisa. – Concordo. – Após terminar de dar a salada de frutas para Josh, Hayden o retirou da cadeirinha e o pôs no sofá com os brinquedos. – Se ela teve tanto trabalho para se reinventar, não consigo imaginá-la armando para alguém sem ter tudo planejado.

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Angelica precisaria ter o material para fazer a chantagem antes de escolher Ames e Hall para serem pegos no lugar dela. – Sabe... – disse ela lentamente, como se estivesse desconfortável com que ia dizer. – Conversei com meu padrasto e falei que Angelica tinha contado a você sobre a matéria. Mas ele continua confiando nela. Hayden observou o rosto de Lucy em busca de sinais de que houvesse coisas que ela não estivesse lhe contando, mas não conseguiu encontrar nada. Ela estava lhe dizendo honestamente que ficara surpresa por Graham Boyle ainda confiar em Angelica Pierce depois de Angelica tê-lo traído. Então, Hayden enfim percebeu que Lucy acreditava mesmo que seu padrasto era inocente. Ela não tentava protegê-lo; de fato não fazia ideia de que Boyle se achava por trás das atividades ilegais do ANS. A raiva de Hayden ferveu por Boyle ter alguém de coração tão puro como Lucy em sua vida e ser capaz de arriscar levá-la consigo em seus trabalhos sórdidos. Ele devia ter mantido Lucy longe do ANS, longe de uma empresa que a deixaria manchada. Lucy merecia algo melhor. Hayden afundou na cadeira de sua mesa. Se compartilhasse aqueles pensamentos com Lucy, ela não acreditaria nele. Continuaria defendendo Boyle com mais lealdade do que o canalha merecia. Sendo assim, simplesmente falou: – A capacidade que Angelica tem de fazer as pessoas confiarem nela foi o que a fez chegar tão longe. Hayden olhou de novo para a imagem em seu laptop. Angelica parecia ser o centro de tudo, mas eles não tinham nenhuma evidência. Ainda. – Então, o que fazemos agora? Não podemos simplesmente esperar que ela se entregue. – Vou para Fields, Montana. A cidade natal do presidente foi onde toda essa história começou, e eu apostaria que foi lá que Angelica começou a investigar. Se eu conseguir as evidências de que ela fez isso mesmo, será possível pegá-la. Fields fora o lugar onde Ted Morrow engravidara Eleanor Albert, o lugar de onde Eleanor e o bebê deles, Ariella, tinham desaparecido. A cidade ficara infestada de jornalistas desde que Morrow declarara que se candidataria à presidência. E, desde que a história a respeito de Ariella Winthrop surgira, detetives particulares e a polícia se juntaram a eles, e a descoberta das escutas telefônicas gerara uma investigação do Congresso. Contudo, eles haviam se concentrado nos amigos e nas famílias de Ted Morrow e Eleanor Albert. Hayden já tinha analisado todas aquelas provas, e uma coisa ainda o incomodava: por que todos aqueles hackers procuraram especificamente por um bebê? No vídeo que flagrara Hall e Ames contratando os hackers, eles pediam especificamente uma confirmação de que houvera uma bebê. O que lhes dera a ideia de procurar isso? E quem descobrira os primórdios da história? Era hora de alargar o círculo de investigação para abranger mais cidadãos de Fields. A conversa que Lucy ouvira a respeito de Nancy Marlin, amiga de Barbara Jessup, era a melhor pista que ele tinha, e seria por ela que Hayden começaria. – Quanto tempo você vai passar fora? – Lucy quis saber. – Talvez dois dias.

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O que era tempo demais para deixar Lucy sozinha em Washington desprotegida. Ele falara sério quando dissera que Angelica era uma ameaça em potencial e não estava disposto a arriscar. Hayden segurou os ombros dela e a encarou.

CAPÍTULO OITO

Lucy olhou para Hayden, sua cabeça e seu coração em guerra. Agora que ele compartilhara a cama dela, alguns dias separados seriam como uma eternidade. Sendo assim, ir com ele para Montana era tentador. Contudo, ela intuía que Hayden não lhe dissera tudo, e por isso haveria algo mais por trás do convite. Lucy se levantou para criar um pouco de distância. – Por que quer que eu vá, Hayden? – Estamos trabalhando juntos. Faz sentido. – Ele deu de ombros e se recostou na cadeira. – Você consegue passar esse tempo longe do trabalho? Lucy tinha certeza de que sim, já que Graham queria que ela se concentrasse na matéria sobre Hayden. Ainda assim, a expressão dele se mostrava séria demais, preocupada demais. – Alguns dias atrás, você sentia uma enorme raiva de mim por não ter sido honesta a respeito da matéria. Disse-me que tinha sido franco. Então, faça isso agora, seja franco comigo. Por que quer que eu vá para Montana? Hayden se levantou, mas não se aproximou, como se estivesse respeitando a distância de que ela precisava para aquela conversa. – Não quero deixá-la na mesma cidade que Angelica sem mim por perto. Não confio nela, e ela tem fixação por você. – Antes de você aparecer, eu passei anos na mesma cidade que Angelica. – Isso foi antes. A visita dela alguns dias atrás mostrou que aquela mulher está no limite. Sabe que o cerco está se fechando. – Você acha que precisa me proteger. – Claro que devo protegê-la. Foi a minha investigação que a levou a esse ponto. É minha responsabilidade garantir a sua segurança. Responsabilidade? Lucy sentiu um vazio no estômago. A última coisa que ela queria que seu amante visse ao olhá-la era alguém por quem ser responsável. Hayden pensaria assim se não houvesse uma diferença de dez anos nas idades deles? Veria uma mulher de sua própria faixa etária como alguém capaz de cuidar de si mesma? – Eu cuido de mim, Hayden. – Sei disso, Lucy. Mas se eu estiver certo sobre Angelica, ela é capaz de coisas piores do que as de que já suspeitamos. – Com as mãos nos ombros dela, ele a puxou para si e sussurrou em seu ouvido: – Cheguei a falar que Josh vai ficar em Washington com a babá? E que eu reservaria duas suítes num novo hotel com spa, uma para nós e 60


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uma só de fachada? A nossa teria uma banheira de hidromassagem dupla. – Hayden deu vários beijos molhados na orelha dela, fazendo seu sangue ferver. – Hayden... – disse ela num sussurro ao se derreter contra ele. – Posso deixá-la muito feliz por concordar em ir. Ah, sim, Lucy sabia disso. O que ela precisava decidir era se devia ir. As mãos de Hayden deslizaram para a cintura dela e, puxando a barra da blusa para cima, encontraram a pele nua logo acima da saia. O delicioso calor começou a aumentar. – Certo. Mas chega de me dizer o que você acha que quero ouvir. Prometa que vai simplesmente dizer a verdade. – Prometo. – Os lábios dele percorreram o rosto dela e capturaram os de Lucy num beijo que também foi uma promessa.

Quando o recepcionista entregou as chaves da suíte de Lucy, ela sorriu e agradeceu. Então, recuou para que Hayden pudesse fazer seu próprio check-in. Uma vibração de empolgação vinha crescendo dentro dela desde que eles saíram de Washington. No voo e nos dois aeroportos, ela e Hayden agiram como se tivessem apenas um relacionamento profissional, uma farsa que eles manteriam por ora. Lucy olhou para a espetacular vista das montanhas. Já estivera em Fields para esquiar antes, mas sempre ficara na casa de sua tia, na montanha, e nunca fora até a cidade. Como Hayden precisava pegar o depoimento de moradores, eles tinham reservado quartos num luxuoso hotel na rua principal. Na época em que o presidente morara ali, aquela era uma pacata cidade de famílias de fazendeiros e comerciantes locais. Com o tempo, porém, isso mudou. O resto do país descobriu o magnífico local para esqui e snowboarding, e o progresso logo chegou. Agora, Fields era um misto da encantadora cidade antiga e de reluzentes novos empreendimentos. Hayden chegou por trás dela, e Lucy sentiu o calor que emanava do corpo dele. Não tocá-lo durante a viagem fora um tipo especial de tortura. – Quer ajuda? – perguntou ele, educado, pegando a mala dela. – Obrigada. É muita bondade. Eles entraram no elevador. – Espero que não tenha planos para depois que entrar no seu quarto, srta. Royall – disse ele em voz baixa. Um calafrio a percorreu. – Algo em mente? – Ah, sim – disse ele quando as portas se abriram. No instante em que eles saíram e as portas do elevador se fecharam, ela se virou para ele. – Hayden...

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Antes que Lucy pudesse falar mais, Hayden já a empurrara contra a parede, seus quadris pressionando os dela, e capturou sua boca. Tudo dentro de Lucy se derreteu. Com o toque dos dedos dela, o corpo dele estremeceu, o que só a fez desejá-lo ainda mais. Lucy arqueou as costas, levando seus quadris para um contato mais pleno com os dele, e estava pensando em levantar a camisa de Hayden quando uma campainha soou e as portas se abriram. Hayden grunhiu ao se afastar. – Não consegui esperar mais nem um segundo. – E, agora, ainda temos que andar até o quarto. O seu ou o meu? – Tanto faz. – Ele segurou o queixo dela e fez uma leve carícia no lábio inferior com o polegar. – Contanto que tenha uma cama. Ela estremeceu de expectativa. – Então, meu voto vai para o que for mais perto. Hayden pegou as duas malas e foi na frente dela. Lucy o alcançou quando ele parou para abrir a porta com o cartão. Hayden a segurou pela cintura, puxando-a para dentro consigo e empurrando a mala com o pé. A pesada porta se fechou, e Lucy teve alguns segundos para vislumbrar o opulento quarto, com lareira a gás e uma majestosa vista da montanha, antes de Hayden retomar o beijo de onde tinham parado. Enquanto a língua dele se movia dentro da boca de Lucy, ela abriu o cinto dele. Quando ela levou as mãos ao zíper, Hayden as afastou, tirando-lhe a blusa. – Preciso sentir a sua pele, prová-la. – A boca dele desceu sobre o ombro dela, a língua se movendo, os dentes raspando o pescoço. Hayden a prendeu contra a parede ao encontrar de novo sua boca. Ela puxou a camisa para fora da calça dele, e Hayden interrompeu o beijo apenas pelos segundos que levou para tirá-la. Quando Hayden retornou, a sensação do peito nu dele na pele sensibilizada dela a fez arfar. Hayden tirou a própria calça e a chutou para longe, também se livrando da cueca, erguendo a saia dela em seguida, indo até a calcinha. – Proteção? – indagou Lucy com o que devia ser seu único neurônio restante. Ele ergueu uma embalagem metalizada. – Pus alguns no bolso para o caso de uma emergência. – Definitivamente, isto é uma emergência. – Ela tomou o preservativo da mão dele, abriu a embalagem e o colocou em Hayden. No instante em que ela terminou, ele a ergueu, envolvendo a própria cintura com as pernas de Lucy. Ela se apoiou na parede e deslizou por cima dele, perdendo todo o fôlego. Hayden ficou paralisado, olhando-a com tamanha sede, tamanho desejo, que a pulsação dela disparou ainda mais. – Você sabe que tem uma cama ali do lado – Lucy sussurrou. – Longe demais – disse ele ao penetrá-la. Tudo o que Lucy conseguiu fazer foi sentir: a boca quente dele em seu pescoço, a onda que crescia dentro dela, o frenético desejo que aumentava a cada toque, cada 62


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movimento, até ser grande demais para ser contido, estourando sobre ela, dentro dela, deixando-a incapaz de fazer qualquer coisa a não ser se agarrar a Hayden com toda a força que lhe restava. Pouco depois, ele arfou o nome dela e estremeceu, e Lucy o abraçou ainda mais forte, não querendo soltá-lo jamais. Jamais. Jamais. A pele dela esfriou. Jamais? Aquilo era um caso, de duração limitada e puramente físico. Lucy foi com ele até a cama. Teria deixado seu coração desprotegido? Hayden a puxou para baixo das cobertas, envolvendo-a com os braços. Fechando firme os olhos, Lucy ignorou os pensamentos anteriores e se permitiu aproveitar o tempo que lhe restava com ele. Lidaria com a dor de um coração partido quando... se ela acontecesse.

Algumas horas depois, Hayden parou o carro alugado diante do pequeno chalé com canteiros de flores e plantas na varanda. Uma pequena placa pintada na caixa de correio indicando “Jessup” mostrava que eles tinham encontrado a casa da antiga empregada da família do presidente. Lucy se virou para Hayden. – O que você está procurando? Hayden endireitou a gravata, repensando se fora sensato trazer Lucy consigo. Sua ideia principal fora tirá-la de Washington enquanto ele também estivesse fora, mantendo-a a salvo de Angelica. Contudo, quando tentara convencê-la a vir com ele, insinuara que ela ajudaria na investigação. Infelizmente, nada além da segurança de Lucy tinha passado por sua mente até aquela manhã. – Hayden? – Diga que poderei confiar em você lá dentro. – Está duvidando de mim? – Estou reconhecendo sua lealdade dividida. – Já provei várias vezes que você pode confiar em mim, incluindo o fato de eu não ter contado a Graham sobre Nancy Marlin quando você me pediu para não contar. Estou do lado da verdade, Hayden. Ele relaxou um pouco. – Certo. Mas, só para deixar claro, a entrevista é confidencial. – Sem problema. Para ser franca, estou ansiosa para vê-lo entrevistar outra pessoa. – Costumo fazer isso sozinho, mas, se você tiver algo a perguntar, avise. – Quem eu vou ser: a policial boa ou a má? – Os olhos dela reluziram de humor, e Hayden teve que apertar o volante para evitar puxá-la para si e sentir aquela boca na sua. – Barbara Jessup não fez nada de errado. Assim, acho que podemos deixar de lado o papel de policial mau desta vez. Mas se você ainda estiver com vontade de encenar quando voltarmos ao hotel... Ela riu ao abrir a porta. 63


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– Vamos resolver isto primeiro. Barbara Jessup era uma mulher mais velha, com cabelo branco organizadamente preso e um sorriso acolhedor. Hayden fez as apresentações quando ela os encontrou à porta e explicou que Lucy era uma funcionária do ANS que vinha trabalhando como consultora naquele caso. Barbara os levou para a sala de estar, onde havia um prato de biscoitos caseiros, um bule de café e outro de chá. Hayden já conversara com ela ao telefone, e Barbara se mostrara ávida por colaborar. Então, depois de apenas alguns minutos de conversa amena, eles entraram no assunto principal. Hayden pôs seu pequeno gravador sobre a mesa e o ligou. – A senhora falou com Angelica Pierce, uma jornalista do ANS? – Ah, sim. Algumas vezes. A primeira foi quando o presidente Morrow era apenas senador. Sempre soube que aquele menino iria longe. – E tornou a falar com ela mais recentemente? – Na época em que ele foi eleito. A srta. Pierce disse que tinha mais perguntas. – A senhora contou a ela a respeito de Eleanor Albert e o bebê? Barbara pareceu desconfortável. – Na primeira entrevista, Angelica perguntou da época dele na escola, dos amigos, querendo saber se algum deles ainda morava aqui. Forneci alguns nomes e, quando começamos a falar da querida Eleanor, eu disse que não sabia onde ela estava agora, que não a via desde que tinha se mudado para outra cidade, após colocar o bebê para adoção. Como Hayden suspeitara, Angelica encontrara por acaso as informações que tinham dado início à história. – A senhora sugeriu que o bebê poderia ser do presidente? – Claro que não! Eu jamais trairia a família assim, mesmo que soubesse da verdade. – Tenho certeza de que eles apreciam isso – disse ele com um genuíno sorriso. Gostava de Barbara Jessup. – Quando Angelica Pierce veio pela segunda vez, ela tornou a perguntar sobre o bebê? – Sem dúvida. Mas eu garanti que não sabia de nada. – E a senhora sabia mais do que revelou a ela? – Sei de muitas coisas sobre muitas pessoas, incluindo aquele bebê. Isso não significa que contarei a uma jornalista. – Ela encarou Lucy. Lucy franziu o cenho, e Hayden conteve um sorriso. – Como eu disse, Lucy está ajudando na investigação. Pode confiar nela. Sra. Jessup, tem amigos ou parentes que sabem de Eleanor e do bebê tanto quanto a senhora? Pessoas com quem possa ter falado ao telefone depois de Angelica ter partido? Barbara pensou um pouco. – Telefonei para minha amiga Nancy Marlin e contei a ela como tinha sido a entrevista. – Nancy sabia do bebê?

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– Ela trabalhou para os Morrow num verão, quando Eleanor foi embora. Portanto, ela sabia, ou suspeitava, tanto quanto eu. Hayden olhou para Lucy. Havia um leve brilho nos olhos dela que a maioria das pessoas não teria percebido, mas ele passara a ser capaz de interpretá-la; o senso de investigadora de Lucy fora despertado junto com o dele. Hayden abriu um terno sorriso para Barbara Jessup. – Isso é muito importante, sra. Jessup. Relembre esse telefonema para mim. Nessa conversa, alguma de vocês mencionou que achava que o bebê podia ser de Ted Morrow? Ela levou imediatamente a mão à boca, arregalando os olhos. – A culpa é toda minha? Aquele menino teve todos esses problemas por minha causa? Eu nem tinha certeza de que o bebê era dele. Ah, Jesus, o que fui fazer?! Lucy se sentou ao lado de Barbara no sofá e pôs uma reconfortante mão em seu braço. – Não, sra. Jessup. A culpa não é sua. A senhora foi muito bem na entrevista. Guardou todos os segredos dos Morrow. Hayden apostaria que, depois da eleição de Ted Morrow como presidente, Angelica, assim como centenas de outros jornalistas, buscaram um novo ponto de vista para as matérias. Algo diferente para pôr no ar. Ela teria revisto as filmagens e entrevistas da primeira ida a Fields, em busca de pistas. Quando vira o bebê sendo mencionado, simplesmente fizera uma busca na internet, como Hayden fizera, e vira que Eleanor Albert fora a companhia de Ted Morrow no baile de formatura. Não havia nada sobre um bebê de Eleanor Albert, nem mesmo sobre a própria Eleanor depois do colégio. Assim, provavelmente, Angelica não soubera que ela engravidara numa época que poderia ter envolvido o presidente. Desse modo, buscando um furo de reportagem, Angelica voltara a Fields, entrevistara as mesmas pessoas, despertara as lembranças e instalara as escutas telefônicas. Dera sorte ao ouvir Barbara e Nancy falando do bebê e da teoria delas de que Ted Morrow era o pai. Em seguida, Angelica pedira a Ames e Hall que contratassem os hackers, que se concentraram nos amigos e parentes de Ted Morrow e Eleanor Albert – e conseguiram a cena flagrada em vídeo – e eles conseguiram informações suficientes para fazer a matéria, que fora ao ar depois do baile da posse do presidente. Tudo se encaixava. – Sinto muito, sra. Jessup – disse Hayden da forma mais delicada possível – mas é muito provável que haja uma escuta no seu telefone. O rosto dela se contorceu de desgosto. – Isso é errado. O olhar de Lucy encontrou o dele de novo, e Hayden soube que os pensamentos deles estavam em total sintonia. Hayden se sentiu aquecido. – Concordo plenamente. E vou trabalhar duro para garantir que os responsáveis enfrentem a justiça. Enquanto isso, posso resolver o problema do telefone da senhora. E, se me der uma lista dos amigos com quem Angelica conversou, posso dar uma olhada nos telefones deles também. – O senhor é um bom homem, sr. Black. – Ela se virou para Lucy. – Cuide bem dele.

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A boca de Lucy se abriu, surpresa. Hayden parou enquanto levava sua caneca de café à boca. Se Barbara Jessup suspeitara da ligação dos dois, eles precisariam tomar mais cuidado. E, ainda que Hayden pudesse admitir que havia algo entre ele e Lucy, aquilo seria temporário. Físico e temporário. Antes que Lucy pudesse responder, Hayden se levantou e foi para o telefone no canto da sala. – Vou começar por este.

Eles pararam numa padaria para almoçar. Enquanto Hayden esperava os sanduíches ficarem prontos, Lucy encontrou uma boa mesa na calçada. A cidade tinha um ar interessante, um misto de tradicional e novo, e ela logo se concentrou em observar as pessoas. – Lucy? É você? Ela girou na cadeira para ver sua tia, uma mulher alta e vestida com elegância comedida, saindo da loja de esqui ao lado. Lucy ficou de pé e logo foi envolvida por um terno abraço. – Tia Judith! – Lucy a estreitou com força. – Eu não sabia que você estava em Fields, querida. Devia ter me avisado. Lucy sentiu seus os olhos lacrimejarem e piscou para conter a umidade. Devia se esforçar mais para ver a família de seu pai; duas vezes por ano não eram suficientes. – Vim a trabalho. Do contrário, teria telefonado, sem dúvida. A expressão de Judith se iluminou. – Quanto tempo ficará? – Só esta noite. – Você vai ter que ir jantar na minha casa. – Estou viajando com um colega. – Leve quem quiser. Philip e Rose também estão aqui. Pelo canto do olho, Lucy viu Hayden se aproximando da mesa. Como reagiria ao convite? Ele deixara muito claro o que pensava da família de sua ex-esposa; dinheiro herdado não o impressionava. Na verdade, ele desprezara aquele estilo de vida luxuoso. Tia Judith era irmã do pai dela, uma Royall até a alma, e tinha gostos caros que acompanhavam sua fortuna. Lucy se virou para Hayden, que já pusera os sanduíches e as bebidas na mesa. – Judith, este é Hayden Black. Hayden, esta é minha tia, Judith Royall-Jones. Hayden estendeu a mão. – É um prazer. – O prazer é meu, sr. Black. Eu estava dizendo a Lucy para levá-lo para jantar hoje na minha casa.

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Hayden se virou para Lucy e ergueu uma das sobrancelhas. Ela começou a balançar a cabeça, querendo poupá-lo de uma situação desconfortável. – Não vemos muito a nossa Lucy. Então, não aceitarei um não como resposta. Hayden olhou de Judith para Lucy. Em seguida, um encantador sorriso surgiu no rosto dele. – Nesse caso, eu adoraria ir.

CAPÍTULO NOVE

Naquela noite, Hayden dirigia o carro alugado, subindo a montanha até a casa da tia de Lucy. Eles tinham passado a tarde visitando amigos de Barbara Jessup que Angelica entrevistara e verificando os telefones de todas as residências. A maioria tinha escutas. Havia mais algumas pessoas que ele queria entrevistar pela manhã. Depois, ele e Lucy pegariam um voo na hora do almoço de volta a Washington. Hayden lançou um rápido olhar para o banco do carona. Lucy olhava fixo pela janela, parecendo absorta em pensamentos. – Quem vai estar lá hoje? – perguntou ele. Ela se virou. – Tia Judith e tio Piers... é a casa deles. Meu primo Philip e a esposa dele, Rose. Titia não falou de mais ninguém, mas, com Judith, nada me surpreende. – Ela pôs a mão na coxa dele. – Hayden, desculpe por você ter sido arrastado para isso. – Não tem problema. Além do mais, talvez eu goste de conhecer sua família. Era verdade, ele estava curioso em relação aos Royall. Durante seu casamento, Hayden pensara que a riqueza da família de Brooke tivesse sido a causa da atitude mimada dela. Mas a família de Lucy era muito mais rica que a de Brooke, e Lucy não demonstrara nada da arrogância de sua mulher. Hayden cobriu a mão dela em sua coxa com a palma. – Mas, se você quiser mesmo se desculpar, o que acha de compensar depois? Ela deu risada. – Fechado. Lucy o orientou até a casa e, quando Hayden fez a última curva, soltou um assovio. – Eu esperava talvez um chalé. Não uma mansão. O lugar era imenso. Quatro andares, vidro e madeira por toda parte, um leve brilho dourado vindo de várias janelas e um tapete de flores que acompanhava os caminhos. Parecia saído de um conto de fadas. – Tia Judith gosta dos pequenos confortos dela – disse Lucy com um sorriso irônico. 67


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Ele achou graça. Judith os encontrou na porta, pegando as mãos de Lucy e as apertando. – Lucy querida. Mal consigo dizer como fiquei empolgada por tê-la visto na cidade, hoje. – Eu também – Lucy afirmou com genuína ternura. – Sr. Black... – Ela abriu um sorriso de boas-vindas para ele. – Estou feliz que tenha vindo. Hayden apertou a mão dela. Judith era alta, com cabelo grisalho reluzente até a altura do queixo e olhos cor de mel, que lembravam os de Lucy. – Pode me chamar de Hayden. – Sendo assim, você precisa me chamar de Judith. Por favor, entrem. Ela os conduziu, passando por lareiras acesas e grossos carpetes, que mantinham os cômodos aquecidos contra o ar da noite das montanhas. Entraram numa grande biblioteca com paredes amarelo-claras, flores recémcolhidas sobre mesinhas e estantes embutidas em todas as paredes. Já havia três pessoas no recinto, todas segurando taças de cristal. Pelas descrições que Lucy lhe dera, Hayden as reconheceu como sendo Piers, Philip e Rose. Piers e Philip vieram abraçar Lucy, e Judith fez as apresentações. Em poucos minutos, Hayden já estava com um martíni na mão e envolvido numa conversa sobre esqui e vinhos com Philip. Vez por outra, encontrava o olhar de Lucy do outro lado do cômodo e perdia o fio da meada. Em determinado momento, Judith os interrompeu para levar o grupo para a sala de jantar, um cômodo com uma vista espetacular da cidade lá embaixo. Hayden se flagrou sentado com Lucy num dos lados e Rose do outro, sendo servido de cogumelos recheados que pareciam ser um dos pratos favoritos da família. O prato principal se seguiu, e a conversa fluiu tranquila em meio ao grupo. – Então, Hayden – disse Judith numa voz enganosamente meiga depois que os pratos foram retirados. – Você é casado? Solteiro? Hayden pigarreou. – Viúvo. – Ah, sinto muito por saber disso. – O tom de Judith era solidário, mas ela sem dúvida pretendia continuar com o assunto. Hayden se remexeu na cadeira e se preparou para desviar o tema. – Hayden tem um filhinho – disse Lucy ao lado dele. Ele conteve um sorriso; ela interviera para protegê-lo de sua família. – Qual a idade? – Judith quis saber. – Acabou de fazer 1 ano. – Uma idade tão adorável! – Judith suspirou. – Eu me lembro de quando Philip era bebê. Um garotinho tão doce, sempre chegando correndo com as flores que colhia para mim. Hayden viu Philip olhar para Lucy com uma expressão de exasperação divertida. Sem perceber ou ignorando, Judith prosseguiu:

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– E Philip sempre era carregado de um lado para o outro por uma das irmãs dele quando tinha 1 ano. O danadinho abusava o máximo que podia. – Garoto inteligente – disse Hayden para Philip e sorriu. Philip fez um movimento de cabeça em resposta. – Qual o nome do seu menino? – Joshua. Josh. – Ele sentiu uma dor no peito, saudade de seu filho. Não passara uma noite sequer longe dele desde a morte de Brooke. Judith se curvou à frente. – Você tem uma foto de Josh? Hayden encontrou uma em sua carteira e a passou para Rose, sentada a seu lado. – É de alguns meses atrás, mas ele está basicamente do mesmo jeito. Só maior. – Ele é lindo! – E Rose passou o retrato pela mesa. O peito de Hayden inflou. Josh era o melhor filho que um homem poderia ter. – Quer dizer que você logo vai procurar uma nova mãe para ele? – Judith sorriu para disfarçar sua completa falta de sensibilidade. – Mãe – interveio Philip bem-humorado – o homem perdeu a esposa faz pouco tempo. Dê um descanso a ele. – Está tudo bem. – Hayden meneou a cabeça. – Faz só três meses, mas não, não vou procurar uma nova mãe. Não irei me casar outra vez. Ele resistiu ao impulso de olhar para Lucy e observar-lhe a reação, mas ela sabia que o relacionamento dos dois era temporário. Aquilo não devia ser nenhum choque para ela, portanto. – Talvez com o tempo... – começou Judith, mas suas palavras desapareceram quando Hayden balançou a cabeça. – Não é questão de tempo, nem de me recuperar. Isso pode soar egoísta, mas não estou disposto a compartilhar nunca mais decisões com relação a Josh. As sobrancelhas de Judith se ergueram de interesse. – Você não concordava com a filosofia de criação da sua esposa? – Nem perto disso – Hayden falou com honestidade, o que pareceu agradar Judith. – Na verdade, eu era deixado de fora da maioria das decisões. Sim, eu devia ter discordado na época, mas não o fiz. Não vou arriscar a possibilidade de não poder definir nada a respeito do meu próprio filho outra vez. – E o amor? – perguntou Judith. – Não se pode controlar isso. – Amor não é o mais importante. Josh é. – Não havia nada de mais certo em sua vida. – Sei que não sou o pai perfeito. Ainda estou aprendendo, mas tenho uma visão clara do que quero para ele e não vou ceder. Não cederia nem mesmo para alguém que eu amasse. – Tia Judith – disse Lucy – eu estava pensando em mostrar seu jardim a Hayden antes da sobremesa. Mesmo à noite, é lindo. Além do mais, acho que a cota dele de interrogatório dos Royall já foi ultrapassada. Todos riram. – Pode ir. – Judith piscou para a sobrinha. 69


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– Vamos – sussurrou Lucy. Hayden a seguiu até um pequeno quarto cheio de botas, casacos e apetrechos, feliz pela oportunidade de ficar sozinho com ela durante alguns minutos. Lucy parecia ter uma bela família, mas ele escolheria passar tempo com ela lá fora, no escuro, sem pensar duas vezes. Lucy pegou dois casacos e entregou um a ele. – É bem frio à noite. Hayden segurou o casaco de Lucy enquanto ela passava os braços pelas mangas. O pátio lateral tinha um terraço coberto por uma explosão de flores. – Desculpe pelo interrogatório de titia. – Lucy o conduziu a um caminho pavimentado. – Ela não é mal-intencionada, mas está acostumada a ser a matriarca e poder fazer e dizer tudo que quer. Ele tomou-lhe a mão, entrelaçando os dedos, adorando a sensação da pele dela. – Não me importei. Judith me faz lembrar da minha mãe. Um pouco enxerida, mas boa gente. Caminharam um pouco mais. Então, Lucy parou e apontou para o céu. – A lua está ali. Será que crescente ou minguante? Morando na cidade, já nem sei mais. – Está bonita – murmurou ele. – Mas não é a coisa mais bonita aqui. Tomando o rosto dela nas mãos, Hayden acariciou o lábio com o polegar. Lucy estava tão linda... E quando ela o olhou com aqueles olhos cheios de desejo por ele, Hayden se perdeu. Baixou a cabeça e encontrou a boca de Lucy, pronta para ele. Hayden a beijou de leve. Ela estremeceu e se aproximou mais. Os lábios dela estavam maliciosamente macios ao se moverem sob os dele, mas Hayden se controlou. Então, Lucy suspirou, e sua língua deslizou contra a dele. De súbito, o beijo se tornou carnal, e Hayden foi incapaz de contê-lo. Abraçou-a com mais força, e Lucy enfiou as mãos por baixo de seu casaco, para movê-las sobre seu peito. Estavam prestes a perder o controle. Por isso, Hayden interrompeu o beijo, mas ficou ali, arfando, durante vários minutos antes de conseguir fazer sua garganta funcionar: – Lucy, a menos que esteja pronta para voltar ao hotel agora mesmo, precisamos parar. – Tem razão. – Ela fechou os olhos, mas não o soltou. – E se entrarmos agora, com você toda corada e com os lábios inchados, será fácil perceber o que estávamos fazendo. Embora tivesse dito aquilo, Hayden detestava o segredo. Se pudesse voltar para aquela sala e mostrar a todos que beijara Lucy loucamente ao luar, seria o homem mais orgulhoso de todos. Lucy era uma mulher que qualquer homem se orgulharia de ter ao lado. – O que acha de conversarmos por alguns minutos? – O que disse sobre nunca mais dividir Josh é sério? Que você vai ser sempre um pai solteiro? – Sim. – Pensara muito naquilo nos últimos três meses. Era o melhor para todos, sem dúvida. 70


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– Isso é meio triste. Não quero imaginá-lo sozinho pelo resto da vida, Hayden. – Não é pelo resto da minha vida. Só até Josh ficar mais velho. E eu não ficaria sempre sozinho. Só não me casaria de novo. Ela olhou para a cidade lá embaixo. – Ainda assim, é triste. Com um dedo, Hayden virou o rosto dela de volta. – Você só acha que é triste porque tem um coração muito bondoso. – Você também tem – disse ela, mas parecia haver mais por trás de suas palavras. Lucy estaria se arrependendo de terem concordado em dar um fim ao relacionamento dos dois? Talvez aquela solidariedade fosse o jeito dela de lhe dizer que ele não precisava ficar sozinho, que ela queria que tudo continuasse. O peito de Hayden se apertou dolorosamente. Não podia permitir que Lucy começasse a pensar assim, que se abrisse para a decepção que viria. – Talvez eu tenha tido, no passado. Mas ele está marcado agora. O seu é novo e puro demais para ser poluído por alguém como eu. Detesto admitir isso, mas quanto mais rápido eu sair da sua vida, melhor será para você. Mas não posso negar que irei sentir uma falta incrível de você quando isso acontecer. – Também sentirei saudade. – Ela respirou fundo. – Quem sabe, se eu for a Nova York... – Não. – Mas ele fez uma expressão melancólica ao dizer aquilo. – Quanto mais abrupto for o fim, melhor. Lembra-se das nossas regras? Nada de envolvimento emocional. Apenas físico. Se deixarmos isso durar, vai se transformar em algo que nenhum de nós quer. Algo que pode se tornar amargurado, e não quero que nada manche as lembranças que guardarei de você. – Vou guardar essas lembranças para sempre – disse ela, e ele viu seus olhos reluzindo ao luar. Incapaz de evitar, Hayden tornou a beijá-la, puxando-a contra seu corpo, querendo criar o máximo de recordações que pudesse antes do inevitável fim do tempo deles juntos.

Uma hora depois, Lucy e Judith levavam os pratos de sobremesa para a cozinha. – Obrigada por ter nos convidado. Foi muito bom ver você. Judith a abraçou. – Quem me dera nós nos víssemos mais. É uma pena que esse seu homem esteja tão determinado a não se casar. – Ele não é meu homem. – Vi o jeito como ele olha para você. É seu, mesmo que só por enquanto. Além do mais, você voltou do jardim sem batom. Sem pensar, Lucy levou dois dedos aos lábios e viu Judith sorrindo. – É temporário. Mesmo se Hayden estivesse interessado em algo de longo prazo, com a maneira como as pessoas me tratam, as expectativas que têm de mim por causa 71


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do meu pai e de Graham, a última coisa de que preciso é um homem mais velho que já tem boas conexões e é rico. Vão achar que segui de novo o caminho mais fácil, que encontrei alguém para cuidar de mim. – Talvez. Mas gosto dele. – Eu também. – Lucy mordeu o lábio inferior. Era a primeira vez que admitia para si mesma que ela realmente gostava de Hayden. Talvez estivesse até começando a amá-lo. Porém, definir seus sentimentos seria inútil. Independente do que ela sentisse, o caso deles logo terminaria. – A única coisa que aprendi sobre relacionamentos ao longo dos anos é que gostar o suficiente um do outro é tudo o que importa. Lucy sorriu, mas não respondeu. Do ponto de vista de Judith, casada e feliz havia 32 anos, as coisas podiam parecer simples assim. Mas, para o resto do mundo, relacionamentos eram coisas complicadas e confusas que podiam ou não contar com a ajuda da sorte. Como seria bom se, em vez de terem se encontrado naquele momento de suas vidas, ela e Hayden fossem se conhecer só dali a dez anos. As coisas poderiam dar certo entre eles dali a uma década. Lucy já teria se estabelecido sem ter se cercado de homens fortes; Josh estaria com 11 anos, e assim Hayden se sentiria mais relaxado com a ideia de ter uma mulher em sua vida. Mas desejar que as coisas fossem diferentes não a ajudaria quando chegasse a hora de Hayden e Josh partirem de Washington.

Quatro dias depois, com um braço envolvendo a cintura de Lucy, Hayden fechou o chuveiro do banheiro dela e se apoiou na parede, arfando. Eles tinham feito amor na cama. Em seguida, ele sugerira que eles tomassem um banho antes de irem trabalhar. Porém, ver o corpo molhado de Lucy tornara inevitável o resultado daquela ideia. Lucy o olhou satisfeita. – Sua imaginação é maravilhosa, Hayden Black. – Meu objetivo é satisfazer. – Hayden sorriu e invocou toda a energia para sair do chuveiro. – O que você tem para fazer hoje? Ela foi para o quarto. – Mais pesquisa sobre o seu passado. Graham vai pôr a matéria no ar na semana que vem, mesmo que eu não tenha material suficiente. – Lucy largou a toalha e vestiu uma calcinha branca. – Boa sorte. A ideia de a matéria ir ao ar não o deixava feliz, mas, naquele ramo, era o preço de seu trabalho. Hayden não tinha nenhum segredo macabro, nada de ruim em seu passado. E se eles inventassem histórias, ele lidaria com aquilo na hora em que acontecesse. – Pode me dar algumas dicas? – Lucy vestira um sutiã de renda branca e estava sentada no banco diante da penteadeira, penteando o cabelo molhado. – Você colou em alguma prova do colégio ou se envolveu em alguma briga de rua? – Esta vai ser a única pista que vou dar: cheguei a organizar um boicote à lanchonete da escola. Os olhos dela reluziram, e Lucy o olhou pelo espelho. 72


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– Um movimento político radical? Por favor, diga que você queimou uma bandeira. – Oito alunos tiveram intoxicação alimentar na mesma semana, e ninguém quis investigar. Nós boicotamos até que a diretoria investigasse. Eles demitiram alguns funcionários que não estavam seguindo os procedimentos de segurança e tornaram as práticas mais rígidas. – Justamente o tipo de história de que precisamos. – Lucy abriu um sorriso irônico ao se virar para ele. – Você vai ficar parecendo um herói. Lutando pela verdade e pela justiça desde pequeno. Hayden achou graça. – É pegar ou largar. – Eu pego. Talvez consiga encontrar um ponto de vista diferente. – Ela foi até o armário, apanhou uma blusa verde-clara e a vestiu. – O que vai fazer hoje? Hayden vestiu a calça e se calçou, dando a si mesmo tempo para pensar no que dizer a ela. Lucy se mostrara confiável naquela investigação, mas essa informação era algo bem diferente. Naquele dia, ele se encontraria com um juiz para conseguir permissão para vigiar Angelica Pierce. O menor deslize com alguém em quem Lucy confiava, como Graham, e que pudesse vazar a informação para Angelica inutilizaria toda a ideia. Lucy vestiu uma calça cor de creme antes de pôr as mãos nos quadris. – Alguma missão supersecreta? – provocou-o. – Talvez seja melhor se eu não contar. – Está brincando, não está? – perguntou ela incrédula. – Fiz tudo o que você me pediu. Nem falei a Graham que Angelica é Madeline Burch. Por que não confiaria em mim agora? Lucy tinha razão, mas aquilo era diferente. – Você tem sido ótima nessa investigação. A diferença é que está ajudando para tentar limpar o nome de Graham. Se precisar escolher, você escolherá Graham em detrimento de todas as outras opções. – Claro que vou ficar do lado de Graham. Ele é inocente. Está me dizendo que tem provas contra meu padrasto? – Não, mas acho que não vai demorar. E se você precisasse escolher entre a verdade e o seu padrasto? O que faria, Lucy? Com os olhos faiscando, ela pareceu crescer vários centímetros. – Está questionando minha integridade pessoal? A acusação o atingiu em cheio, mas Hayden não vacilou. – A maioria das pessoas tem um limite. Muitas não sabem qual é esse limite até chegarem a ele. – E você, o famoso detetive que, mesmo quando criança, defendeu a verdade e a justiça, tem um limite? – Ela o encarou, esperando, mas ele não respondeu. Então, os olhos de Lucy se abrandaram de súbito. – Josh. Hayden assentiu, seu corpo se contraindo por inteiro. Deixara Josh passar os primeiros nove meses de vida sendo criado do jeito de Brooke, contra o que ele considerava certo. Nada era mais importante que Josh. E Hayden nunca mais poria nada acima do bem-estar de seu filho. Nem uma mulher. Nem sua carreira. Nem sua própria vida. Josh era seu limite. 73


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O de Lucy era Graham. E Graham estava envolvido com Angelica, Hayden não tinha dúvida. – Responda honestamente. – Hayden se sentou na cama. – Digamos que Graham tenha feito algo ilegal. Não as escutas telefônicas, algum outro crime, só para tirar do contexto. Na hipótese de Graham ter feito algo ilegal que tivesse prejudicado alguém, você o entregaria? Lucy franziu o cenho. – É uma pergunta impossível. Ninguém tem como responder sem saber qual foi o crime. – Isso já é uma resposta. Impor condições simplesmente mostrava que havia crimes que ela acobertaria por Boyle. Lucy cruzou os braços. – Então, é a sua vez de me responder. – Claro. – O que você vai fazer hoje é legal? – Lógico que é. – Hayden se surpreendeu com a pergunta. – É ético? – Para mim, sem dúvida. Todos possuíam sua própria ética e seus princípios, mas ele tinha quase certeza de que seu plano também estaria dentro do que Lucy consideraria ético. Ela se sentou ao seu lado. – Se é assim, diga o que é, e eu juro que vou ajudar. Hayden a olhou, ponderando as opções. A ajuda dela seria útil. E, se Lucy lhe dera sua palavra, ele poderia confiar. – Vou a um juiz conseguir uma ordem para pôr Angelica sob vigilância. – Só isso? – Se essa informação chegar até ela, digamos, via Boyle, a vigilância será inútil. Portanto, preciso tomar extremo cuidado. Mas possuo as provas para conseguir a ordem judicial para Angelica. Se eu tivesse provas, também conseguiria uma ordem para Boyle. – A palavra-chave é se. Se você tivesse provas contra ele. Você não tem porque elas não existem. – A vigilância sobre Angelica fará surgir algo com relação a Boyle. – Mas Hayden sabia que nada a convenceria até que ele tivesse descoberto as evidências. – Ainda está disposta a ajudar? – Pode apostar. Quero estar presente quando Angelica incriminar a si mesma e a pessoa que a está ajudando. – Nós dois queremos.

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CAPÍTULO DEZ

– Oi, Roger – Lucy cumprimentou o segurança noturno do ANS ao passar com Hayden rumo aos elevadores. Como era mais de meia-noite, apesar dos estúdios onde os âncoras davam o noticiário da madrugada, o lugar estaria relativamente deserto. Era o único momento em que Hayden conseguiria instalar a escuta no telefone de Angelica. Assim que recebera a ordem do tribunal, Hayden trouxera alguns funcionários de sua empresa para fazer um trabalho mais elaborado nas linhas telefônicas de Angelica, mas ele não queria arriscar naquele caso. Sendo assim, sua intenção era a de plantar também uma boa e antiquada escuta no telefone. As portas do elevador se fecharam, e eles ficaram sozinhos, a não ser pelas câmeras, a respeito das quais Lucy contara a Hayden enquanto discutiam a ação na suíte dele. Josh estava lá, dormindo, e a babá pernoitaria com ele. Um nervosismo a dominou. Aquilo tinha de funcionar. A escuta precisava fazê-los descobrir com quem Angelica vinha trabalhando e limpar o nome de Graham. Ela fez uma pequena prece, pedindo para que tudo desse certo. O elevador chegou ao oitavo andar, onde ficava a maior parte dos jornalistas, mas os funcionários da noite trabalhavam em outros andares. O escritório de Angelica ficava na ponta, e Lucy tinha um cubículo no centro do recinto aberto. – Por aqui. – Lucy guiou Hayden pelo corredor feito de paredes de vidro de um lado e divisórias na altura da cintura do outro. – Qual é a sua mesa? – A voz dele estava sussurrada, e aquilo a fez experimentar um calafrio. Mesmo com tudo o que se encontrava em jogo para Lucy, esgueirar-se por um lugar escuro, com Hayden atrás de si, perguntando em voz baixa onde ela trabalhava, era suficiente para distraí-la da missão. Lucy o levou para sua mesa e estendeu o braço, como se estivesse lhe mostrando uma vista de um milhão de dólares. – É mais organizada que as outras – disse Hayden virando-se para analisar as mesas à volta. – Gosto de ser organizada. Ele arqueou uma das sobrancelhas. – Sou organizado, mas minha mesa é mais bagunçada que esta. – Sua mesa é organizada – ressaltou ela. E o cômodo onde ele trabalhava na suíte era tão organizado, tão desprovido de personalidade, que Lucy tivera dificuldades para sondar Hayden quando eles se conheceram. – Não é uma mesa de verdade. É só para entrevistas desse caso. Minha escrivaninha em Nova York tem pilhas de documentos desarrumadas e bandejas cheias de papéis. Como as mesas devem ser. 75


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Lucy pensou na montanha de manuais sobre bebês que ela vira no quarto de Josh e na maneira como Hayden espalhara os papéis sobre a mesinha de centro nas noites em que ela fora ajudá-lo na pesquisa. Um caos organizado combinava mais com a personalidade dele do que a mesa arrumada pela qual o vinha julgando. Era como se Lucy tivesse tido um vislumbre a mais do homem dentro dele – o que Hayden não mostrava para todos – e aquilo aqueceu seu coração dela. – Onde fica o escritório de Angelica? – Bem ali. – Lucy apontou para a sala escura do outro lado do estreito corredor. – Do jeito que a minha mesa é posicionada, posso ver o rosto sorridente dela o dia inteiro. Claro, Angelica aproveitava todas as oportunidades de fazer cara feia para ela ou de dizer algo mordaz ao passar por Lucy. O alerta do elevador soou, e os dois ficaram paralisados. Quando as portas se abriram, a voz ríspida de Angelica preencheu o ar. – Não, isso não é aceitável. Se você quiser ser creditado na matéria, terá que deixar a pesquisa na minha mesa até as oito da manhã. Fim da discussão. – Então, um segundo depois, como se estivesse falando consigo mesma: – Idiota... Houve um silêncio, interrompido apenas pelos saltos de Angelica batendo no piso, indo na direção deles. Lucy olhou para Hayden, sua pulsação em disparada. Se Angelica os visse, havia uma boa chance de que ela fosse suspeitar do que eles estavam fazendo e ficaria alerta, o que estragaria o plano. Hayden segurou o braço de Lucy, puxando-a para o chão e encaixando os dois debaixo da mesa dela. Para caber no pequeno espaço, Lucy ficou no colo de Hayden, seu rosto apoiado no peito dele, as pernas dos dois entrelaçadas. O coração dela martelou, e Lucy conseguiu sentir os batimentos do coração de Hayden, acompanhando o seu, sabendo que aquilo se devia apenas em parte à chance de serem flagrados. Os passos de Angelica chegaram à porta da sala de Lucy, a pouco mais de um metro de onde eles se escondiam, com apenas uma divisória entre os dois. Ela acendeu a luz, mas continuou meio escuro debaixo da mesa. Os dedos de Hayden acariciaram os braços de Lucy, o que lhe causou um arrepio. Ela ergueu o olhar e viu o brilho malicioso nos olhos dele. – Quero você – disse ele apenas com o movimento dos lábios. – Você é louco – respondeu ela do mesmo jeito. O sorriso dele mostrou que estava satisfeito com aquela resposta, e Hayden soltou o primeiro botão da camisa dela. Lucy não sabia se ria ou se se derretia. Então, quando a boca dele cobriu a sua, ela não precisou mais pensar. A mão de Hayden entrou devagar por baixo da camisa dela, segundos antes de Hayden ficar paralisado. Mais passos vinham pelo corredor. Quando quem quer que fosse adentrou a sala de Angelica, a mão de Hayden se afastou da pele de Lucy, e ele fechou o botão da blusa dela. – Depois – murmurou em seu ouvido. Ela mordeu o lábio. Parecia faltar uma eternidade para “depois”. – Obrigada por ter vindo – disse Angelica.

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Com a porta aberta, as palavras ficavam claras como se Lucy e Hayden estivessem ao lado dela. Hayden pegou o celular no bolso e apertou um botão que Lucy teve certeza de que iniciava um programa de gravação. – Por que diabos isso não podia esperar até amanhã de manhã? Lucy levou um susto ao reconhecer a voz de Graham, mas Hayden a segurou firme contra seu peito, mantendo-a imóvel. Encontrar-se com Angelica em plena madrugada não parecia nada bom, mas Graham trabalhava em horários loucos. Haveria uma explicação inocente. – Há algo que quero lhe dizer faz muito tempo – disse Angelica, claramente se deleitando com as palavras. – Diga logo. Não tenho a noite toda. – Não? Nem mesmo para a sua filha? – Mas que diabos... Está me dizendo que...? Hayden ergueu o queixo de Lucy, uma pergunta em seus olhos, mas ela deu de ombros. Sabia tanto quanto ele sobre aquilo, mas, fosse o que fosse, ela não estava gostando. – Mamãe sempre disse que eu tinha herdado o seu queixo. – A voz de Angelica soava casual, como se ela estivesse num café falando da cor de suas unhas. – Sem dúvida, você percebeu isso antes. – Madeline? – Madeline. – Angelica deu risada. – Diretamente do passado. Não uso esse nome faz muito tempo. – Você trabalha aqui há cinco anos. Cinco anos sem dizer nada. Por que não me contou que era você? – exigiu saber Graham. – E dar a oportunidade de você me rejeitar pela segunda vez? – Não a rejeitei! Paguei pensão. Paguei seus estudos. Garanti que você tivesse tudo de que precisava. A náusea preencheu o estômago de Lucy. A única coisa que a mantinha firme era a reconfortante mão de Hayden, que acariciava seu cabelo. Angelica era filha de Graham? Não era de admirar que Angelica sempre a tivesse detestado. Lucy tinha o amor, o afeto e o reconhecimento público de Graham. – Ah, sim, eu tive tudo – disse Angelica. – Menos o detalhe de um pai. Parece que você estava guardando todo esse afeto paterno para sua preciosa Lucy. Hayden a abraçou com mais firmeza. Uma parte de Lucy sentia solidariedade por Angelica – partindo do princípio de que aquilo era verdade – mas, ainda assim, ela queria desesperadamente entrar correndo naquele escritório e salvar Graham do veneno de Angelica. Independentemente do que ele tivesse feito, Graham valia por cem Angelicas. – Isso não tem nada a ver com Lucy – rosnou Graham. – Tem razão – afirmou Angelica animada. – Tem tudo a ver com você. Na verdade, é só por isso que estou aqui no ANS. – Do que está falando? Claro que está aqui por minha causa. Fui até a NCN contratá-la.

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– Ouvi dizer que você está tendo problemas com as audiências no Congresso. Creio que as prisões de Brandon Ames e Troy Hall não foram suficientes para satisfazêlos. Eles estão procurando o mandante. Houve um momento de silêncio. Então, a voz de Graham soou incrédula: – Foi você! Angelica tornou a rir. – Não há provas dessa teoria. – Você manipulou Ames e Hall. Despertou o que havia de pior neles. – Acho que você me confundiu com alguém. Mas seja lá quem tenha sido, não teve nenhum problema em despertar o que havia de pior neles. – E Marnie? Foi você quem a trouxe também. – Eu não me surpreenderia se ela estivesse envolvida – sugeriu Angelica, sua entonação indicando claramente que ela sabia do envolvimento de Marnie. – Ela está tão desesperada para chegar ao topo... – E você usou isso para fazê-la levar o esquema para que eu aprovasse. – Eu, não. Marnie deve ter feito tudo isso sozinha. Graham soltou um suspiro que parecia vir do fundo de sua alma. – Olhe, não quero falar dessas bobagens. Não agora que reencontrei você. – E, lógico, você estava desesperado para me encontrar. – Talvez não no início. Quando sua mãe disse estar grávida, aquilo me abalou. Eu não estava esperando. – E, depois, passou 16 anos abalado? – Sinto muito. Mas ao menos não agi como nosso presidente idiota, que abandonou completamente o bebê dele, fingindo que não existia. Paguei pensão. Paguei por tudo de que você precisava. – Mesmo? – A voz dela se tornou maliciosa. – Ah, você vai pagar, sim. Boa sorte. – Angelica... – Graham parecia confuso. – Adeus, papai querido. – Os saltos de Angelica ressoaram no piso enquanto ela retornava pelo corredor. Lucy escapou dos braços de Hayden e entrou correndo no escritório de Angelica, onde encontrou Graham petrificado. Ele ergueu o olhar e seu rosto perdeu os últimos resquícios de cor. Lucy parou a uma curta distância dele, sem saber o que dizer, agora que estava ali. Por fim, Graham desabou, sentando-se na mesa de Angelica. – Você ouviu. – Ouvi – afirmou ela com delicadeza, tudo em seu íntimo se estilhaçando. – Lucy, eu sinto muito. Dentre todos os que foram prejudicados ou serão por causa dessa confusão, é por você que lamento mais. – Graham baixou os olhos. – Amo você mais do que qualquer pessoa no mundo. Parte de Lucy queria abraçá-lo e lhe dizer que tudo ficaria bem, mas seria uma mentira. E ela não conseguia percorrer os últimos passos até o lado dele. 78


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– Você sabia, Graham. Durante todo esse tempo, eu o defendi, acreditei em sua palavra, e você havia autorizado o esquema corrupto de Angelica. Ele não a encarou. – Não sei o que dizer. – O que acha de começar pedindo desculpas a Ariella Winthrop por ter deixado que ela descobrisse ao vivo em rede nacional a identidade do pai dela? – Foi um infeliz efeito colateral. Lucy sentiu um peso no estômago ao perceber o pouco remorso que Graham sentia por aquilo. – Também foi uma infelicidade que o nome de Ted Morrow tenha sido jogado na lama? – Não – disse ele contraindo o maxilar. Lucy o ouvira falar do presidente antes; de tudo, desde suas políticas, passando por seus discursos, até de como ele fora arrogante quando os dois estudaram juntos. Mas ela jamais dera muita atenção. Dessa vez, Lucy o estava levando a sério; queria entender. – Você o odeia tanto assim? – A verdade é que... – Graham olhava pela janela escura – eu me apaixonei duas vezes na minha vida. Uma foi por sua mãe. A outra, por Darla Sanders, na faculdade. Pensei que ela também me amasse, que tivéssemos um futuro, mas, com um olhar de Ted Morrow, Darla me largou sem nem ao menos se virar para trás. O desgraçado nem sequer se casou com ela! Lucy abriu a boca e tornou a fechá-la, incapaz de acreditar no que ouvira. – Tudo isso foi por causa de um rancor de 30 anos atrás? – A maior parte foi para fazer um bom noticiário – disse ele, já reassumindo seu comportamento. – As pessoas têm o direito de saber sobre o homem que age em nome delas como presidente. – Elas também têm o direito de esperar que as leis sejam seguidas, seja de quem for a privacidade em questão. Um dos cantos da boca dele se levantou. – Você é mesmo filha da sua mãe, Lucy. Tenho orgulho disso. O terno calor que ela em outra circunstância teria sentido ao ouvir aquele comentário não foi capaz de vencer o caos das outras emoções. – E Angelica? – perguntou Lucy. – É filha de quem? Graham suspirou. – Ela foi criada pela mãe, mas parece que acabou herdando meu comportamento implacável. Hayden entrou na sala, e Lucy perdeu todo o fôlego. Esquecera-se de que ele estava ali fora, ouvindo tudo o que ela e Graham diziam. Lucy relembrou a conversa em sua mente, rezando para não ter metido Graham em ainda mais problemas. – O que diabos ele está fazendo aqui?! – berrou Graham. – Vim com Lucy. 79


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De queixo caído, Graham se virou para a enteada. – Você o trouxe aqui?! Lucy fitou Hayden, sem saber quanto poderia divulgar. Resignado, ele deu de ombros e assentiu. Ela abriu a boca, mas, agora que tinha permissão, não sabia o que dizer. Não conseguia pensar em como explicar. Hayden assentiu de novo, incentivando-a. Lucy se virou outra vez para seu padrasto. – Hayden suspeitava de que você e Angelica estivessem envolvidos nas escutas ilegais. Eu garanti a ele que você não estava e decidi ajudá-lo para poder limpar o seu nome. – Ouvindo secretamente as minhas conversas? – Graham se mostrava ultrajado. Nada acostumada a ser o alvo do desprazer de seu padrasto, Lucy recuou. Então, recompôs-se. Talvez ele tivesse cavado a própria cova – ela já não tinha mais ilusões com relação a isso –, mas, mesmo assim, aquilo seria difícil para ele. E só pioraria. Lucy podia ser tolerante com as reações emocionais dele sob estresse; sem dúvida, Graham a ajudara durante suas tentativas de rebeldia quando adolescente. – Graham – disse ela delicadamente –, nós não fazíamos ideia de que você estaria na sala de Angelica. A compreensão surgiu nos olhos dele. – Vocês estavam atrás dela. Hayden assentiu. – Imagino que você também tenha ouvido a conversa. – Graham já parecia conformado com a inevitabilidade da resposta. – Ouvi. – Conseguiu o suficiente para nos incriminar? – Você, sim. Angelica não chegou a admitir nada. Sabe, ajudaria muito a sua situação se você cooperasse falando do papel dela nas escutas. Graham grunhiu. Então, cobriu os olhos com a mão. – Não posso fazer isso. Ela tem razão. Fracassei com minha filha de quase todos os jeitos que um pai pode fracassar. – Graham baixou a mão e olhou fixo nos olhos de Hayden. – A única coisa que posso fazer por ela agora é protegê-la nisso. – Não vai ser suficiente para salvá-la – avisou Hayden. – Veremos. – Graham expirou devagar. – Então, o que acontece agora? – Você, Marnie e Angelica serão chamados para testemunhar diante do comitê do Congresso. Eles estarão com as minhas anotações. Sendo assim, vão poder fazer as perguntas certas. – Farei um acordo com você, Black – afirmou Graham mal humorado. – Eu confesso tudo o que fiz, e você deixa o nome de Angelica e de Madeline fora disso. Hayden considerou aquilo. Então, assentiu. – Não tenho autoridade para fazer esse acordo, mas vou levá-lo às pessoas que têm e ver o que elas dizem. – Agradeço. – Graham esfregou o rosto com os dedos, e Lucy quase conseguiu vêlo encolher. – O que acontece depois que eu testemunhar? 80


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Hayden nem sequer piscou. – Provavelmente haverá uma sentença de prisão, e você terá que vender o ANS. A agência reguladora não permitirá que você mantenha a posse de uma rede depois que confessar ser culpado dos crimes que cometeu. – Não. – Lucy se recusava a considerar a prisão uma opção. – Lucy... – Graham soava dolorosamente cansado. – Querida, talvez seja inevitável depois que eu testemunhar. – Não – repetiu ela e se virou para Hayden. – Se é possível fazer um acordo para proteger Angelica, também é possível fazer um para proteger Graham. – Não é a mesma coisa – contrapôs Hayden. – Não há nada para ser usado na negociação da liberdade de Graham. O que quer que eu faça? – Não sei. Como você já disse várias vezes, essa é a sua área de especialidade. – Ela pegou as mãos de Hayden, pondo-as sobre seu coração. – Você pode salvá-lo. Ele é a única família que tenho. Por favor, não o leve. – Lucy, eu sinto muito. – Hayden estava tenso. – Não há nada que eu possa fazer. O desgraçado tinha até a audácia de fingir estar triste, apesar de aquele ser o resultado que ele quisera desde o início. Claro que Hayden não ajudaria só porque uma mulher com quem ele vinha tendo um caso lhe pedira. Lucy baixou as mãos, endireitou o corpo e se concentrou no mais importante. – Ele pode ao menos ir para casa? – Sim, mas será chamado para ir às audiências do comitê do Congresso. Imagino que daqui a uns dois dias. – Hayden se virou para Graham com a expressão séria. – Você não vai sair da cidade, não é? – Claro que não – disparou Lucy indo para o lado de seu padrasto. – Venha, Graham. Vou levar você para casa. Os ombros de Graham estavam caídos com a derrota e, quando ele ergueu o olhar para ela, seus olhos mostravam a desolação de uma noite de inverno. – Rosie está na minha sala. – Hayden, posso acreditar que você sairá do prédio sem parar em nenhum lugar onde não deveria? – A voz de Lucy continha um toque de desprezo que não era intencional. Uma linha de confusão surgiu na testa de Hayden. – Evidente. – Nesse caso, vou me despedir. – Ela dizia rápido as palavras, como se estivesse arrancando um curativo. Na certa, doeria menos se fosse rápido. – Não vamos pôr a matéria sobre você no ar. Então, está a salvo. E finalmente conseguiu a cabeça de quem queria. Acho que aqui termina tudo o que vínhamos fazendo juntos. Ele a fitou durante um longo momento. – Creio que sim. – E Hayden deu meia-volta. Lucy o viu ir até o elevador; ele não olhou nem uma vez para trás. A cada passo de Hayden, algo dentro dela era puxado, como se estivesse preso a ele. As regras dos dois haviam deixado claro que o que eles tinham era temporário. Os

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dois quiseram algo daquela forma. O fato de Hayden ter pegado Graham significava que o tempo deles acabara. Porém, quando ele entrou no elevador, Lucy se sentiu vazia. Lucy cerrou as pálpebras para conter a emoção que os atingia e se virou de novo para o padrasto. Tinha um trabalho a fazer, pois Graham precisava dela. Deu o braço a ele e o puxou para que se levantasse. – Vamos pegar Rosebud e ir para casa. – Lucy? – Ele permitiu que ela visse a emoção em seu semblante sem se esquivar pela primeira vez. – Sinto muito mesmo. – Eu sei, Graham. Está tudo bem. Mas o coração dela estava morrendo. As únicas duas pessoas que ela amava no mundo iriam deixá-la. Uma, provavelmente, indo para a cadeia, e a outra voltando para sua vida em Nova York. Lucy acabara de mentir para Graham, pois as coisas não estavam bem. E ela não conseguia imaginá-las melhorando nunca mais.

CAPÍTULO ONZE

Sentada de pijama num banco da cozinha enquanto o sol surgia no horizonte, Lucy assistia ao noticiário da manhã. Era um apanhado geral do depoimento de Graham ao comitê do Congresso na véspera. Ela apontou o controle remoto para a TV e mudou para a NCN, onde eram reexibidas as filmagens de Graham sendo levado em custódia. A Comissão Federal de Comunicações também ordenara que ele vendesse o ANS ou a rede perderia sua licença. O que eles não sabiam era que Liam Crowe, um magnata da mídia que criara uma carreira a partir do nada, já tinha feito uma proposta de compra do ANS que seria anunciada naquele dia. Eles também informavam que Marnie Salloway testemunharia dali a algumas horas, já que, em seu depoimento, Graham dissera que fora ela quem o mantivera informado a respeito das escutas. Como Lucy esperara, Graham não mencionara Angelica nem uma vez. Os promotores e o comitê aceitaram o acordo oferecido por Graham, incluindo a ideia de manter em segredo seu relacionamento com Angelica, o que significava que a mídia não descobrira a história... ainda. Lucy piscou para conter as lágrimas. Passara com Graham a noite em que ela e Hayden tinham ouvido a conversa dele com Angelica, a noite em que a vida dela se despedaçara. Ela o levara para sua casa e dormira no quarto extra. Ou fingira dormir. Mal conseguira ter mais de uma hora de sono desde então. Graham fora levado em custódia na tarde anterior, e ela trouxera Rosie consigo. Dormira durante pouco mais de uma hora, e só por volta das três da manhã. Agora, estava totalmente acordada outra vez.

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Quando não estava pensando em Graham, sua mente se voltava, teimosa, para o assunto que ela vinha lutando para evitar. Hayden. Seus olhos se fecharam, e Lucy viu o rosto dele, seus olhos cor de café, seu maxilar escurecido precisando ser barbeado ao fim do dia. O peito dela doeu; seu coração estava tão vulnerável... Lucy não fazia ideia de quanto tempo passara negando isso, mas já ficara claro: ela o amava. E nunca ficara tão triste. O amor não devia ser revigorante? Todas as suas ressalvas originais com relação a se envolver com um homem mais velho continuavam existindo, mas tinham sido subjugadas pelo que acontecera na semana anterior. A questão era que seu amor por Hayden estava manchado. Ficaria para sempre marcado pela prisão de Graham. Lucy jamais conseguiria pensar em Hayden de novo sem que aquilo se misturasse à dor do que acontecera com seu padrasto. O que ele lhe dissera naquela noite em Montana? “Se deixarmos isso durar, vai se transformar em algo que nenhum de nós quer. Algo que pode se tornar amargurado; e não quero que nada manche as lembranças que vou guardar de você.” Aquilo acontecera mesmo assim. Agora, o que lhe restava eram doces lembranças de seu tempo com Hayden para mantê-la aquecida à noite. O melhor que poderia esperar seria um pouco mais de tempo com ele antes que Hayden pegasse Angelica, encerrasse a investigação... e fosse embora. Talvez ele não quisesse tornar a vê-la depois de ela ter sido tão grossa com ele. Talvez os dois pudessem criar novas regras. Ou quem sabe Lucy estivesse se iludindo e tudo se achasse manchado demais até mesmo para que o caso deles sobrevivesse? O celular de Lucy tocou. Não estava com humor para falar com a maioria das pessoas, mas precisava ficar de olho nos telefonemas de Graham ou da instalação para onde ele fora levado. Quando pegou o aparelho, seu coração palpitou. O número na tela era o de Hayden. – Acordei você? – A voz, tão profunda e familiar, entristeceu Lucy. – Não. Estou acordada faz um tempo. – Posso conversar com você? – Já está conversando. – Pessoalmente. Ela fechou os olhos com força. Àquela hora da manhã, não se sentia com a cabeça em ordem suficiente para se encontrar com ninguém, muito menos Hayden Black, com todas as emoções conflitantes que ele despertava em seu íntimo. Lucy queria conversar com ele quando estivesse pronta. Talvez depois de mais um café... ou três. – Posso encontrar você daqui a umas duas horas. – Estou na frente da sua casa. O coração dela martelou contra as costelas, e Lucy foi até a janela. Ao abrir as cortinas, viu o carro alugado de Hayden na rua. – Está mesmo. – Posso entrar por alguns minutos?

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– Não é uma boa hora, Hayden. – Lucy precisava de uma chance de conversar com ele sobre continuarem com o caso durante o tempo que fosse possível. E o momento de convencê-lo não era no início da manhã, com ela de pijama e depois de apenas uma caneca de café. – Tem que ser agora. E algo na voz de Hayden a afetou. – Claro. – Lucy suspirou, sabendo que, provavelmente, iria se arrepender daquilo. Era difícil ser sedutora de pijama depois de ter dormido apenas uma hora. Ela desligou e jogou o celular numa mesa de canto. Não tinha tempo de se trocar, mas entrou no quarto e pegou seu vestido de cetim azul. Abriu a porta para encontrá-lo ali, com Josh adormecido num dos braços. Lucy encarou Hayden, que usava calça escura, camisa azul-clara, gravata e um paletó escuro, e sentiu um aperto no coração. Tudo o que queria era tirar aquelas roupas dele. – Desculpe pelo horário, Lucy. – Entre. – Ela se curvou para dar um beijo no rosto de Josh, tentando não demorar muito, não se afogar no cheiro de Hayden. Então, virou-se e foi até a cozinha. – Quer café? – Não, obrigado. – Ele se abaixou para afagar atrás das orelhas de Rosie, e, em seguida, pondo Josh, que já estava despertando, no chão. – Não vou demorar muito. Lucy serviu mais um café para si. Qualquer ajuda ao seu estado de alerta mental seria bem-vinda. – Vim me despedir – Hayden firmou, a voz profunda, mas desprovida de emoção. Lucy sentiu um frio no estômago. Colocou a caneca na bancada com cuidado, antes que a deixasse cair. Ele iria embora? Era cedo demais. Demais. Ela se segurou nas beiras da bancada para se apoiar. – Hayden... – Lucy engoliu em seco. – Desculpe pelo que falei naquela noite. Eu estava chateada. As feições dele pareciam muito bem treinadas para não deixar transparecer coisa alguma. – Não foi nada que você tenha dito, Lucy. Preciso ir. – Antes do fim da investigação? – É melhor assim. Eu me envolvi demais. Um dos melhores detetives da minha empresa, John Harris, vai chegar aqui à noite. Ele será mais imparcial, e é disso que a investigação precisa agora. – Hayden franziu o cenho e olhou para Josh, que afagava Rosie. – Sempre precisou. – E você vai embora de Washington? – Ela soubera que aquele momento chegaria, mas... Por favor, ainda não. Não estava pronta. Hayden assentiu, o maxilar tenso. – O voo para Nova York sai daqui a duas horas. Nossas malas já estão prontas. Lucy respirou fundo para tentar ignorou a dor em seu peito. Não havia chance de um futuro para os dois. E, se ela tivesse dúvidas disso, Hayden teria acabado com todas elas na casa da tia Judith, em Montana.

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Assim sendo, talvez fosse bom que Hayden partisse. Apenas dez minutos antes, ela pensava que as coisas entre eles podiam estar manchadas demais até para aquele caso, com todas as regras. Talvez eles até piorassem tudo se não encerrassem tudo ali. Querer um pouco mais de tempo com ele era simplesmente a necessidade desesperada de uma mulher apaixonada que não aceitava que não poderia ter aquele futuro. Lucy empinou o queixo e forçou um sorriso educado, determinada a se despedir ao menos de forma civilizada. – Obrigada por ter vindo se despedir. Hayden passou os dedos pelo cabelo antes de baixá-los para os lados do corpo. – Droga, detesto essa formalidade entre nós... – Não podemos ter as duas coisas, Hayden. Era temporário. – Um manto de tranquilidade desceu para abafar as emoções tumultuadas que a vinham atingindo. Aceitação. Não duraria muito, ela sabia, mas se sentia agradecida por ter aparecido naquele momento. – Obrigada por ter organizado o acordo de Graham para manter o nome de Angelica fora dos depoimentos. Quero vê-la sendo pega pela justiça, mas sei que Graham teria odiado a si mesmo se houvesse sido culpado por isso. Hayden assentiu, mas parecia distraído. – Foi um bom acordo para nós. Ele fez uma confissão completa e franca e deu nomes como o de Marnie Salloway. Vamos pegar Angelica. O acordo foi só para manter o nome dela fora do interrogatório de Graham. Agora que já acabou, ele não vale mais. – Mas não vai ser você quem irá pegá-la. – Não. – Ele deu de ombros. – John Harris trabalhará no caso. Mas ficarei de olho em tudo, do escritório em Nova York. A forma casual como ele falava sobre ir embora estava dando nos nervos dela. – Então, você vai se afastar. – Vou levar meu filho para casa. É o certo a se fazer. – É tão fácil assim me deixar? – Assim que pronunciou as palavras, Lucy quis puxá-las de volta. Para onde fora aquela aceitação? Os olhos dele brilharam. – Droga, não chega nem perto de ser fácil, Lucy! Mas sim, vou embora. – Hayden estendeu uma das palmas, como num gesto de rendição. – Não posso dar o que você precisa. A afirmação foi como um fósforo em lenha seca. Todas aquelas emoções turbulentas que vinham se revirando dentro dela enfim tinham um motivo para explodir. – Quem é você para me dizer do que preciso?! – Eu direi o que eu sei. Sou cínico, marcado pelo mundo. Um viúvo cansado. Sei que nunca mais vou amar com o coração aberto e desprotegido, nem com a intensidade com que já amei. Meu coração simplesmente não é capaz disso. É como um carro velho, surrado, de segunda mão. Você merece alguém cheio de vida. De otimismo. Como você. Uma irônica risada surgiu do íntimo dela, mas morreu antes de alcançar os lábios de Lucy. Ele estava de novo dizendo do que ela precisava. E não podia estar mais enganado. De repente, Lucy enxegou tudo com clareza, talvez pela primeira vez. Seu amor não estava manchado; simplesmente tinha alguns obstáculos a superar. Mas, para amar, 85


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eram necessárias duas pessoas. Amor não correspondido era um jogo bem diferente, e parecia ser o único que Hayden oferecia. – Você está enganado. – Ela o encarou. – Mas, se não está nem disposto a ficar do meu lado e acreditar no que poderíamos ter, talvez seja melhor que vá agora. Hayden esfregou um dos olhos com a mão. – Estraguei tudo desde o início. – Eu me apaixonei por você, sabe? – Ela falou as palavras de forma leve, mais uma observação do que uma recriminação. Seria justo que ele ficasse sabendo. O rosto de Hayden perdeu a cor. – Deus, sinto muito, Lucy... Sinto demais. Ele sentia muito? O lábio inferior dela estremeceu. – A culpa não é sua – ela afirmou com mais rispidez do que pretendera. – É minha. O olhar dele permaneceu fixo no rosto dela. – Mais um motivo para eu ir embora. Depois que eu for, não poderei mais magoála. Tudo dentro de Lucy gritava Simplesmente fique! Fique comigo!. Mas ela se recusava a implorar. Se houvera um momento para ele declarar que queria ficar com ela, fora quando Lucy lhe dissera que se apaixonara por ele. Hayden simplesmente pedira desculpa. Lucy não permitiria que a ardência em seus olhos se transformasse em lágrimas. Tudo o que lhe restava era sua dignidade. Ela jogou o café frio na pia da cozinha e se virou para ele com uma máscara de tranquilidade. – Então, é isso. – Lucy cruzou os braços. – Sim. Imagino que eu a verei na televisão. Talvez como âncora do noticiário, mas, na verdade, como qualquer coisa que você quiser. É uma mulher de talento, Lucy. Depois de ver o que acontecera com Angelica, Marnie e Graham na busca por audiência, aquela ideia a deixava enojada. – Não creio que meu futuro esteja no jornalismo televisivo. Vou entregar meu pedido de demissão ao novo proprietário do ANS hoje. O olhar dele se aguçou. – O que pretende fazer, então? – Não sei. Acho que vou tirar longas férias e descobrir o que de fato me agrada. – No momento, ela não estava em posição para tomar decisões que alterariam sua vida. – Faça o que fizer, sei que você terá sucesso. As palavras gentis foram um baque quase mais forte do que se ele tivesse desprezado os planos dela. – E você vai fazer um ótimo trabalho com Josh, Hayden. Ele é um menino de sorte por ter um pai como você. – Lucy sentiria uma saudade imensa de Josh, que para sempre teria um lugar em seu coração.

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Hayden assentiu. Então, pigarreou. – Precisamos ir para conseguirmos pegar o voo. Hayden de um passo na direção dela, e Lucy lhe virou as costas, incapaz de aguentar vê-lo tão perto sem tê-lo. – Lucy... – E, sem aviso, ele a puxou contra si e a beijou ferozmente. O último fio de controle dela se rompeu, e Lucy reagiu ao beijo com a mesma ferocidade. Os dedos dele se fecharam sobre o braço dela, que acolheu a sensação, desejando sentir tudo o que lhes restava. Entrelaçando os dedos na nuca de Hayden, Lucy o puxou para baixo, não querendo soltá-lo nunca mais, desejando que aquele momento durasse para sempre. Sentiu as lágrimas escorrerem por suas faces, mas não conseguiu impedi-las. Quando a mão de Hayden segurou seu joelho e o levantou, ela envolveu sua cintura com a perna, desesperada com a necessidade de ficar mais perto. Cedo demais, Hayden afastou a boca e apoiou a testa na dela, arfando. E, sem dizer nada, deu um rápido beijo em sua testa, pegou Josh e desceu pelo corredor. De olhos bem fechados, Lucy ouviu os passos dele desaparecendo ao se afastarem, até a porta da frente se abrir e se fechar. Foi quando permitiu que seu corpo deslizasse para o chão.

CAPÍTULO DOZE

MANTENDO OS cacos de si mesma unidos por pura força de vontade algumas horas depois, Lucy atravessou uma pesada porta que um guarda segurava aberta para ela e adentrou uma sala pintada de verde-claro. Graham já a esperava, parecendo muito menor, com seus ombros caídos e a falta de movimentos expansivos. Ao contrário do jeito terno como ele costumava recebê-la, seus olhos se mantinham atentamente fixos nas próprias mãos, unidas firme sobre a mesa. Graham sempre fora uma figura tão exagerada para ela; seu padrasto desde que Lucy tinha 12 anos, proprietário de uma rede de notícias nacional, um homem confiante de seu lugar no mundo. Agora, encarcerado, aguardando o dia de alegar sua culpa e receber sua sentença, ele estava vestido com um macacão laranja, despojado de sua posição e sua riqueza. Nem sequer lhe deram a opção de pagar fiança. Com a seriedade das acusações, a fortuna de Graham e nenhum parente verdadeiro para segurá-lo, o juiz considerara que havia o risco de fuga. Quando Lucy se sentou na cadeira de plástico marrom, Graham ergueu o olhar pela primeira vez, e a incerteza ali, o medo da rejeição, fez o coração dela chorar. Não ocorrera a Lucy que ele duvidaria de seu amor, de sua constância. – Você é uma menina muito meiga por ter vindo.

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– Meiguice não tem nada a ver com isso. Você é meu padrasto e amo você. O maxilar dele se contraiu fortemente antes de Graham falar: – Mesmo depois de tudo? – Haja o que houver. Você sempre esteve presente para mim. Agora, estou aqui por você. Graham cobriu o rosto durante longos momentos e, ao baixar as mãos, seus olhos estavam marejados. – Lamento tanto, Lucy. Parecia que aquele era o dia de ela receber pedidos de desculpas dos homens de sua vida. – Não posso dizer que não tenho problemas com o que você fez no ANS, mas isso é só parte de quem você é. Você também é o homem que me acolheu no seu coração quando se casou com a minha mãe e me manteve lá mesmo depois de ela ter partido. O homem que quis o melhor para mim, que me deu um emprego e me manteve fora das sujeiras do ANS. – Essa sempre foi a minha condição, que nada tocasse você – afirmou ele com ferocidade. – Que os envolvidos jamais a arrastassem para aquela sujeira. Aquilo tinha todo o jeito de Graham. Ele era honrado; simplesmente demarcava para ela limites diferentes dos do resto do mundo. Mas Lucy nunca duvidara de que o padrasto daria prioridade a ela e a protegeria. O que só teria alimentado o ódio de Angelica. Graham não apenas era como um pai para Lucy, mas também a protegera, ao passo que permitira que Angelica fizesse algo ilegal. – Como está Rosebud? – perguntou ele. Rosie passara a noite inteira ganindo quando percebera que não voltaria para casa, para Graham. Então, Lucy a deixara dormir debaixo das cobertas com ela. – Sentindo sua falta, mas eu a tenho mantido ocupada. Sendo assim, acho que ela está relativamente feliz. – Obrigado por ter ficado com Rosie. – Isso tem sido bom para mim também. Um corpo quente junto ao qual se aninhar no sofá naquela manhã, quando o mundo parecera tão escuro, não tinha preço. Lucy perdera Hayden, o homem que ela amava; Josh, o menininho junto do qual tanto desejava ficar; e seu padrasto. Tudo de uma só vez. Rosie perdera seu dono, sua única família. Assim, uma estava consolando a outra. – Lucy... Existe algo entre você e Graham, não existe? Havia uma negação na ponta da língua dela, mas por que esconder agora? Hayden se fora, e o pior já acontecera com Graham. – Para mim, existiu. – Você o ama? De repente, o ar foi sugado da pequena sala. – Não é tão simples assim. Existem... – É simples assim. Você o ama?

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– Sim – ela sussurrou. – Vou lhe dizer uma coisa. Quando relembro a minha vida, há coisas que eu queria ter feito de um jeito diferente. Mas meu maior arrependimento é com relação à sua mãe. Ela piscou. – Pensei que você a amasse. – Amava. Muito. Mais do que ela imaginava. Eu devia ter dito isso a ela mais vezes, dado mais valor... Ela era o amor da minha vida, mas gastei meu tempo construindo impérios. Achei que tínhamos a eternidade pela frente, mas só tivemos sete anos juntos. Muito pouco. Pouco demais. Ela se foi, e, agora, o ANS também. Então, todo aquele tempo que sacrifiquei do meu casamento pelo ANS foi por nada. – Mamãe sabia que você a amava. – Obrigado. – Um pequeno sorriso nostálgico surgiu em sua boca antes de Graham fixar seu olhar em Lucy. – Agora, é a sua vez. Parecia haver um conselho nas palavras dele, mas aquilo não fazia sentido. – Você não odeia Hayden? Foi ele quem o perseguiu até você vir parar aqui. – Se eu passar o resto da minha vida sem pôr os olhos naquele homem, darei graças a Deus. Mas, por mais que o odeie, amo você mais do que isso. Daria qualquer coisa para vê-la feliz, querida. Lucy venceu o embargo em sua garganta e conseguiu dizer: – Obrigada... Graham olhou diretamente nos olhos dela, sem se dar ao trabalho de disfarçar as emoções, como costumava fazer. – Se isso é amor, Lucy, agarre-se a ele. Dê valor. Não deixe que nada fique no seu caminho. – E se ele não quiser se agarrar a isso? Se... A dor do pedido de desculpas de Hayden em resposta à declaração de amor de Lucy a dominou, até que ela enfim conseguiu contê-la mais uma vez e respirar. – Se ele tiver desistido de tudo? – Então, Black é um idiota, como eu suspeitava. – Ele se curvou à frente na cadeira. – Mas, se você ainda o ama, vá atrás do que quer. A vida é curta demais, imprevisível demais para desperdiçar um segundo que seja. Lucy encarou o homem sentado diante dela. Aquele não era o mesmo Graham que conhecera, um homem que era distante, apesar da proximidade deles. Ele nunca falara com Lucy a respeito de seu relacionamento com sua mãe, nunca se abrira daquela forma. Apesar de o mundo de Lucy estar desmoronando à sua volta, aquilo, a primeira conversa de coração aberto deles, era como um pequeno raio de sol em meio às nuvens. – Hayden tem um filho. – Lucy se flagrou dizendo. – É viúvo e tem um filhinho de 1 ano chamado Josh. Graham franziu o cenho. – Você é muito nova para ser mãe. Pouco tempo atrás, ela teria pensado a mesma coisa. Porém, desde que conhecera Josh, Lucy passara a ver a ideia de ser mãe de um jeito diferente, como algo

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que a deixaria deleitada, se tivesse essa oportunidade. E, sem dúvida, ela se apaixonara pelo menino. – Ele é um menininho tão especial... E ama Rosie. Na ocasião em que o conheci, eu estava com Rosie, e ele a chamou de “au-au”. Quando o reencontrei no dia seguinte, Josh perguntou onde ela estava. – Você não me perguntou sobre Angelica – Graham afirmou abruptamente. Lucy hesitou, tentando assimilar a mudança de assunto. – Isso é só da sua conta. Não vou me intrometer. – Eu nunca deveria tê-la abandonado quando bebê. – Ele cerrou um dos punhos sobre a mesa. – Achei que eu estivesse fazendo o suficiente dando dinheiro para mantêla abrigada e alimentada. Para que ela estudasse. Mas não era suficiente. Eu devia ter enxergado isso naquela época, em vez de ter me concentrado no próprio desprazer de ter o peso de um bebê me prendendo... ou a mãe dela, uma mulher irritante. Se eu tivesse criado Madeline, talvez tudo tivesse sido diferente. – A expressão de Graham desabou, como se o peso do mundo estivesse sobre os seus ombros. – Talvez ela não tivesse virado uma pessoa tão amargurada. Lucy mordeu o lábio inferior. Talvez Angelica tivesse virado uma pessoa diferente se Graham a houvesse criado. Sem dúvida, ele devia tê-lo feito. Mas dizer isso não ajudaria em nada um homem já cheio de arrependimentos. E, com toda a honestidade, aquele seria o único problema de Angelica? Lucy não conseguiu pensar em nada de útil para falar. Então, acabou dizendo algo genérico: – Bebês são tão preciosos... – Pelo jeito, você adora Josh. Sendo assim, está prestes a repetir meus dois maiores erros de uma vez só. Quer mesmo se afastar do homem que ama e também do menino que você quer que seja seu? – Não sei, mas prometo que vou pensar nisso. Graham assentiu, satisfeito. – Sei que fará a coisa certa. Você sempre faz. – Graham se levantou. – Agora, vá e me deixe aqui. Não há de querer passar os seus dias fazendo companhia para um velho. – Vou voltar para vê-lo antes do seu julgamento. – Lucy continha a custo as lágrimas que ameaçavam vir. A última coisa de que Graham precisava era achar que ele a fizera chorar. – Seja qual for a sua sentença, estarei sempre presente, meu querido. Ao chegar a seu carro, Lucy não conseguiu mais conter o pranto. Apoiou a cabeça no volante e permitiu-se chorar. Chorava por Graham e também por si mesma. Se você ainda o ama, vá atrás do que quer. A vida é curta demais, imprevisível demais para desperdiçar um segundo que seja. Desta vez, as palavras a atingiram no âmago. Graham tinha razão. Ela amava Hayden. Era simples assim – e tão gloriosamente complicado. Lucy não se importava se Hayden tinha uma ideia ridícula a respeito da adequação deles um para o outro, ou da capacidade de seu coração. Ela lutaria pelo amor dos dois. Todos os motivos que deram para não ficarem juntos... não eram nenhum grande obstáculo. Tudo poderia ser superado se eles fizessem isso juntos. 90


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Se Lucy aprendera uma coisa com o exemplo de Graham fora que ninguém devia viver com arrependimentos. Que ela devia fazer as mudanças em sua vida enquanto pudesse. Ainda que uma nova conversa com Hayden estivesse fadada ao fracasso, tinha de ao menos tentar. Ela verificou o relógio. Ainda era suficiente cedo para pegar um voo. Lucy ligou para seu agente de viagens e comprou uma passagem de ida e volta para Nova York. Teria tempo de ir para casa, juntar algumas coisas e pegar o avião. Como não poderia levar Rosie, Lucy teria que estar de volta a Washington à noite. Se tudo desse certo com Hayden, Rosie faria parte dos planos permanentes deles, mas, naquele dia, ela precisaria esperar ali. A empolgação encheu o corpo de Lucy. Sabia o que queria, e iria atrás disso. Quando o semáforo ficou vermelho, ela tamborilou com os dedos no volante. Primeira coisa a fazer: pensar no que dizer quando visse Hayden novamente. Ele se mostrara determinado naquela manhã. Sendo assim, Lucy teria de achar a maneira perfeita de explicar que nada importava mais do que eles dois criarem uma nova família com Josh e seus futuros filhos. Palavras rodopiaram pela mente dela, formando frases para convencê-lo, e se desfaziam à medida que ela as descartava. Lucy teria algum tempo no avião para ponderar sobre as palavras perfeitas. Lucy estacionou diante de sua casa, pegou sua bolsa e abriu a porta do carto. Ao sair, hesitou. Havia alguém sentado nos degraus de concreto de sua residência. Duas pessoas. O coração dela quase parou. Duas pessoas que ela amava. Hayden se levantou e pegou Josh, mas não se aproximou dela. Os joelhos de Lucy estavam trêmulos, e ela se apoiou no carro. O olhar dele encontrou o dela, mas não deixou nada transparecer. Ele voltara. Estaria precisando de alguma coisa? Talvez mais algum depoimento? Esquecera algo na casa dela? Roupas? O celular? O plano era dizer a Hayden o que ela queria para o futuro deles, mas isso era para acontecer depois de Lucy ter tido tempo de organizar tudo em sua mente. Aperfeiçoar as palavras para não estragar a oportunidade. Mas ele estava ali. Antes do planejado. Ela precisaria aproveitar ao máximo a situação. Lucy pendurou a bolsa no ombro e trancou o carro. Respirou fundo e se afastou do veículo. Um passo por vez. Quando aproximou-se, Josh soltou um grito e estendeu-lhe as mãos, mas Hayden o segurou. – Oi – cumprimentou Hayden, o cenho um tanto franzido. Lucy endireitou a postura e esboçou um sorriso de boas-vindas. – Esqueceu alguma coisa? – Sim. O coração dela se estilhaçou, e Lucy só conseguiu se manter de pé por pura força de vontade. Ele voltara porque esquecera algo. Mas isso não significava que ela não seria capaz de convencê-lo. – É melhor você entrar.

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Lucy passou por ele e destrancou a porta. Se pudesse fazer com que entrassem, teria uma chance melhor de que Hayden ouvisse o que ela precisava dizer. Talvez até trancar a porta depois que entrassem. Lucy abriu a porta com a mão trêmula. Rosie correu para eles e recebeu todos com o entusiasmo de um cachorro que não via pessoas fazia horas, apoiando-se nas patas traseiras e balançando sua cauda enrolada. Formando mentalmente seu argumento, Lucy entrou na sala de estar. Era um lugar seguro para Josh engatinhar pelo chão, para que ela pudesse ter toda a atenção de Hayden. Deu meia-volta e pôs as mãos na cintura. – Antes de você pegar o que esqueceu, Hayden, há algo que eu... – Você – disse ele, a voz profunda e séria. Lucy parou no meio da frase, a boca ainda aberta para formar a frase seguinte: – Como é? Ele pôs Josh no sofá, e Rosie logo se juntou ao menino. Então, Hayden tornou a olhar para Lucy, com uma intensidade incrível. – Esqueci você. Assim que o avião decolou, eu soube que tinha cometido um erro idiota. Um erro colossal. Quando desembarcamos em Nova York, peguei na hora um voo de volta. Ela começou a tremer. A esperança era tão forte que doía, mas nada daquilo fazia sentido. – Você quer continuar nosso caso? – Quero mais do que um maldito caso. Quero tudo, Lucy. – Hayden tomou-lhe as mãos dela e as apertou. – Quero viver minha vida com você. O tremor dentro dela ficou mais forte, até Lucy conseguir sentir os lábios estremecendo, assim como os dedos. Tudo o que ela queria parecia tãoperto... mas não viveria com arrependimentos. Não aceitaria menos do que o pacote completo. – E Josh? – perguntou ela, olhando para o garotinho, que afagava a barriga de Rosie. – Eu não teria como ficar com você e ser excluída do seu relacionamento com ele. Você disse que nunca mais o dividiria com ninguém. – Eu estava errado. – Hayden largou as mãos dela e passou os dedos pelo cabelo, parecendo nervoso. – Algo em que pensei durante o voo foi que ser pai de uma criança sua seria algo totalmente diferente de ser pai de um filho de Brooke. Era o medo falando... medo de ser excluído de novo da vida do meu menino. O melhor para Josh é ter um pai e uma mãe que o amam. Mas sei que é pedir demais aceitar Josh e eu juntos. Você deve estar... Lucy pôs um dedo sobre os lábios dele. – Você não irá me dizer o que eu tenho que fazer outra vez, não é? A boca dele se curvou sob os dedos dela. – Não, senhora. – Ótimo. – Lucy sorriu. – Porque amo Josh. Quando vocês foram embora, senti quase tanta falta dele quanto de você. Quero os dois num pacote só. O pomo de adão de Hayden subiu e desceu devagar. Então, Hayden se ajoelhou no carpete e tornou a pegar as mãos dela.

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– Lucy Royall, quer se casar comigo? Comigo e com Josh? A alegria borbulhou por todo o corpo dela, preenchendo cada célula, cada canto escuro até ficar grande demais para ser contida. Porém, além de um sorriso, Lucy conseguiu evitar reagir por enquanto. – Antes de eu responder – disse ela com meiguice – quero estabelecer algumas regras básicas. A boca dele se abriu. E se fechou outra vez. – Regras básicas? Você vai me matar assim, Lucy. Ela ergueu um dedo. – Primeira regra: chega de pensar que você sabe o que é melhor para mim. – De acordo – disse ele rindo. – Fracassei terrivelmente nisso mesmo. – Além disso, vou voltar a Washington ao menos uma vez por semana para visitar Graham, independentemente de qual for a sentença dele. Desse modo, não quero morar muito longe. Mas também não vou querer ficar longe depois que ele sair. – Lucy falara sério quando dissera a Graham que estaria presente, ao lado dele. Sem soltar as mãos dela, Hayden se levantou. – Eu já esperava que você fosse querer ficar por perto, e tenho uma sugestão. Estou aberto à ideia de montar um escritório para a minha empresa em Washington se você quiser ficar aqui. Ou poderíamos morar nas duas cidades. Ainda faltam alguns anos até Josh entrar na escola. Então, por ora não precisamos ficar presos a um lugar específico. Vamos nos organizar de acordo com a sentença de Boyle. Depois de ter investigado os crimes de Graham e ser o responsável por sua prisão, Hayden ainda se dispunha a organizar sua vida de acordo com a sentença do homem, se necessário. Por ela. Porque ele sabia que era importante para Lucy. Naquele momento, Lucy soube que o amava de verdade. – Você ficaria mesmo feliz com isso? – Aprendi algumas coisas com o meu primeiro casamento, querida. Desta vez, quero uma parceria de verdade, na qual nossas vidas reflitam o que nós dois queremos, aquilo de que nós dois precisamos. Graham faz parte da sua vida. Então, vamos incluí-lo. Tenho certeza de que acabarei apreciando as virtudes dele – disse Hayde com ironia. – Uma coisa de que gosto em Graham é o fato de ele se importar de verdade com você. Respeito isso. Com a emoção a embargar sua garganta, ela envolveu a cintura de Hayden com os braços. – Eu achava que não teria como amar você mais do que já amava. – Lágrimas de alegria começaram a escorrer pelas faces dela. – Sabe... Há cerca de uma hora, meu padrasto me disse para ir atrás de você. Reservei uma passagem para Nova York. Ia até lá convencê-lo a nos dar uma chance. Ele achou graça. – Quem diria que eu precisaria agradecer a Boyle? – Hayden apoiou a cabeça de Lucy em seu peito, passando a mão no cabelo dela. – De qualquer forma, sua casa é grande demais para uma pessoa só. Talvez fosse bom se nós a enchêssemos. Por que você tem uma casa tão grande? – Acho que sempre esperei ter uma família toda minha. 93


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– Agora, você já tem. – A voz dele estava rouca. – Josh, eu e Rosebud. Rosebud se aproximou ao ouvir seu nome, arfando com a língua de fora. Lucy olhou para Rosie, para Josh no sofá, para Hayden em seus braços. E sorriu. – A família perfeita. – Quer dizer que já acabaram suas regras básicas? – perguntou Hayden, curvando-se para trás o suficiente para que ela visse seus olhos. – Sim. – Não havia mais nada que pudesse querer. Lucy estava pronta para se casar com o homem que amava. – Eu... – Bem, eu tenho algumas próprias antes de você responder à minha pergunta. – Hayden a puxou para o sofá, para que eles ficassem sentados com Josh. Lucy se acomodou no colo de Hayden. Josh, no de Lucy. Os braços de Hayden envolvia os dois. Ela piscou. – Tem? – Primeira regra básica – disse ele, de olhos semicerrados. – Chega de segredos. Se eu quiser beijá-la no meio de um parque ou nos degraus do Capitólio, vou beijar. Ela conteve o largo sorriso que ameaçava surgir, precisando ao menos parecer séria nas negociações. – Acho que consigo suportar essa regra. Obviamente farto da falta de atenção, Josh saiu do colo de Lucy, foi até a outra ponta do sofá e começou a tocar no focinho de Rosie e gargalhou por ela lamber seus dedos a cada toque. – Segunda regra. – Hayden voltou a atenção de Lucy de novo para si ao virá-la, fazendo com que ficasse montada nele. – Chega de condições para os lugares onde podemos fazer amor. Poder ter você apenas na sua casa estava me enlouquecendo. Ela deu vários beijos no rosto dele e foi recompensada quando Hayden estremeceu. – Outra regra que posso aprovar sem ressalvas – murmurou Lucy no ouvido dele. – Então... – Hayden tomou o rosto dela nas mãos, trazendo-o para diante do dele – ...acho que temos um acordo para nos casarmos. A intensidade no olhar dele, seu amor por ela, que reluzia ali sem resguardos, fez tudo dentro de Lucy vibrar. Então, Hayden capturou-lhe a boca, e Lucy soube que jamais iria querer mais do que aquilo: estar com o homem que amava, que a amava, e com a família de seu coração.

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Próximo Lançamento

NOIVADO EXCLUSIVO ANDREA LAURENCE

Figlio di un allevatore di maiali. Liam Crowe não falava italiano. O novo proprietário do American News Service, uma rede de notícia, mal sabia pedir comida italiana e tinha quase certeza de que sua vice-presidente executiva de relações comunitárias sabia disso. Francesca Orr resmungara aquelas palavras durante a reunião de emergência da diretoria naquele dia. Ele as anotara para poder pesquisar depois. As palavras tinham saído dos lábios dela de forma sedutora. Contudo, Liam tinha a distinta impressão de que não iria gostar do que ela lhe dissera. Ele não esperara que fosse fácil assumir o comando da empresa que era de Graham Boyle. O ex-proprietário e vários funcionários estavam na cadeia depois de um escândalo com escutas telefônicas que atingira o presidente dos Estados Unidos. Liam estava em meio a um caos corporativo e político, mas fora justamente por isso que conseguira se tornar acionista majoritário da empresa. Ele sempre quisera o ANS, a joia da coroa da imprensa. Assim, eles tinham um grande escândalo a superar e uma reputação a reconstruir. Nada era fácil na vida, e Liam gostava de desafios. No entanto, certamente esperara que os funcionários do ANS, especialmente a diretoria, fossem lhe dar apoio. Desde o zelador da noite até o diretor financeiro, todos os empregos estavam em risco. A maioria das pessoas com quem ele conversara estava empolgada com a chegada dele. Mas não Francesca. Aquilo não fazia sentido. Sim, seu pai era um rico e famoso produtor cinematográfico que a sustentaria se perdesse o emprego no ANS, mas caridade era o trabalho dela. Sem dúvida, ela se importava tanto com os funcionários quanto com órfãos e pacientes de câncer. Entretanto, não era o que parecia. Francesca se sentara à mesa de conferência com seu terninho vermelho justo e se transformara no diabo. Liam fora avisado que ela era uma mulher fervorosa e teimosa, mas não estava pronto para aquilo. Com a simples menção ao racionamento do orçamento da empresa para ajudar a absorver os prejuízos, ela se enfurecera. Mas eles simplesmente não podiam investir milhões em causas beneficentes se estavam numa posição financeira complicada. Suspirando, Liam saiu da sala de conferência para almoçar. Planejara ir com alguns dos diretores, mas todos tinham se dispersado depois que a constrangedora reunião se encerrara. Estranhamente, a única coisa que tornara aquilo tolerável para ele fora observar a própria Francesca. Numa sala cheia de executivas mais velhas e homens de ternos

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escuros, Francesca era a cor a e a vida. Mesmo quando ela não estava falando, o olhar de Liam não parava de buscá-la. Seu cabelo era como ébano, fluindo sobre os ombros, descendo em ondas pelas costas. Seus olhos eram castanho-escuros, intrigantes. Quando ela discutira com ele, a cor subira a seu rosto, dando um tom rosado à imaculada pele bronzeada. Liam costumava ter uma quedinha por mulheres ardentes e exóticas. E Francesca, se não estivesse tentando arruinar o dia dele, e talvez até o ano, seria exatamente do tipo de mulher que ele convidaria para sair. Ele estava feliz pelo fato de a sede corporativa do ANS ficar em Nova York. Apesar de adorar sua casa em D.C., Liam gostava de voltar para sua cidade natal. Os melhores restaurantes do mundo, assentos privilegiados para assistir a seu time de beisebol favorito… o clima de Manhattan era muito diferente. Ele iria até lá de tempos em tempos, a trabalho. Na verdade, Liam queria que fosse o tempo inteiro, entretanto, como precisava se envolver na política, que era o foco do ANS, Washington era onde ele precisaria estar. E leia também em Filhas do Poder: A Capital 3/3, edição 44 de Desejo Dueto, Interesses do amor, de Jennifer Lewis.

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