Velho pastor

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Oriente Médio, ano 2139 Mesmo trajando seu largo Albornoz de lã grossa e capuz, ele sentia um frio intenso que parecia petrificar sua carne, quando finalmente chegou com seu rebanho perto de uma oportuna e inóspita caverna. Começava a escurecer e o velho pastor, já cansado e apoiando-se em seu desgastado cajado, ficara feliz ao encontrar um lugar de repouso, após ter caminhado horas subindo com suas ovelhas pelas trilhas ameaçadoras dos montes Zagros. O frio lhe doía os ossos. Arduamente, ele conseguiu direcionar seus animais para dentro do abrigo sombrio. Retirou a pequena lamparina da bolsa de couro e a acendeu com um velho isqueiro. A luz provocou uma desagradável surpresa: morcegos espantados começaram a voar em bandos, sem direção, passando pelas estalactites. Eles saíam das trevas deixando para trás o cheiro insuportável de seus excrementos. Aquele mau odor perturbou os sentidos do velho pastor e ele então decidiu descer mais fundo na caverna. Conforme caminhava guiando seu pequeno rebanho, ele olhava em volta e via paredes úmidas gerando gotículas que pingavam produzindo musgos e pequenos cogumelos sobre algumas estalagmites. A fraca luminosidade de sua pequena lamparina revelou subitamente olhos brilhantes entre frestas. Assustado, o pastor notou que eram apenas lagartos em fuga, com medo da luz. Em seguida, olhou para o chão e percebeu estranhos besouros e lacraias que perambulavam agitados por causa da presença indesejável do homem com suas magras ovelhas. O temor assolava seus pensamentos, mas o espírito de luta para vencer o frio lhe garantiu coragem e um novo ânimo. Sem opção, ele encaminhou os animais rumo ao desconhecido. À medida que ele avançava no tenebroso ambiente, os mínimos problemas começavam a ficar para trás: o mau cheiro, a umidade e a baixa temperatura se extinguiam aos poucos, e os insetos eram cada vez menos numerosos. Apesar da aparente tranquilidade, o pastor percebeu que seu rebanho se tornou inquieto. Um mau pressentimento lhe veio à mente: algo indicava que naquele lugar havia perigos maiores, como animais predadores ou até mesmo bandidos foragidos. Neste mesmo instante, ele passou a relembrar casos que lhe contaram na aldeia, sobre jovens pastores que entraram em cavernas desconhecidas dos montes Zagros e nunca mais foram vistos. Os pensamentos fizeram com que o velho homem assumisse feições de assombro. A fraca luz de sua lamparina realçava os temores, porém, neste momento ele pensou que teria de se arriscar para manter-se vivo junto aos animais. Então, resolveu ir um


pouco mais à frente. Logo se deparou com uma pequena bifurcação. Daí veio a dúvida: para onde prosseguir? Ele agarrou nervosamente seu amuleto preso ao pescoço e esfregou, com pressão no polegar, a superfície do pequeno artefato. Decidiu ingressar na passagem à esquerda, obrigando as ovelhas a se movimentarem ao som de seus passos, emitindo ruídos que ecoavam com intensidade por todos os cantos. Por onde entrara havia um beco sem saída com as proporções de uma grande sala. O local lhe agradou. Seria o seu ponto de pernoite. Tudo estaria bem se os animais não ficassem espantados ao ver as silhuetas das estalagmites vibrando com a luz branda da lamparina. O pastor, ao notar o problema, teve uma ideia para acalmar as ovelhas. Fazendo uso da velha sabedoria, rasgou um bom pedaço de seu turbante, e o enrolou na ponta inferior de seu cajado, improvisando uma grande tocha. Sem perda de tempo, retirou de sua sacola de couro um pequeno recipiente de cobre contendo querosene, que logo foi derramada sobre o tecido que serviu como bucha improvisada. Com o fogo da lamparina, ele acendeu a chama da clava. Devido à forte claridade, os animais começaram a se acalmar. Ao olhar para os lados, o homem percebeu uma pequena abertura na parede da caverna, bem à sua frente. Por entre as ovelhas, se esforçou e subiu numa pedra para alcançá-la. Examinou a rachadura e, com muita força, tentou cravar sua tocha no local. De súbito, algo inusitado aconteceu: as pedras que formavam a fresta se desprenderam umas das outras e algumas quase acertaram as pernas do pastor que, instintivamente, pulou para trás, se livrando do perigo eminente. O breve desmoronamento cessou, deixando em seu rastro barulho e poeira. De cabeça baixa e tossindo, a vítima passou a mão no rosto, tentando se controlar. As ovelhas berraram espantadas com o inesperado acontecimento. Após segundos de agonia, tudo se acalmou e o pó começou a se dissipar. O pastor deu uns tapas em seu Albornoz para se limpar e logo em seguida revistou seu rebanho, no intuito de descobrir se haveria algum animal machucado. Ao perceber que tudo estava bem, o ancião segurou sua tocha e tentou avaliar o que acontecera naquele local. Foi quando teve uma surpresa: onde antes havia uma pequena fresta, um buraco se formou em razão da queda das pedras. Analisando mais detalhadamente, o homem percebeu que aquilo teria sido feito por alguém, depois de notar certas ranhuras nas laterais da abertura. Curioso, ele resolveu iluminar o buraco por dentro. Havia uma passagem cavada na rocha. Isso realçou sua desconfiança.


“Será a tumba de algum líder antigo com tesouros ou seria uma espécie de prisão de maus espíritos?” – pensou ele, coçando a cabeça. Meio atordoado, ele passou a se lembrar das lendas que ouvira em sua aldeia, sobre maus espíritos presos nas rochas do monte Zagros. Sua testa começou a ficar salpicada de suor. Estava nervoso e muito assustado. Segurou o seu amuleto fortemente, entoando preces de forma secreta. Pediu a Deus que não deixasse os espíritos do astral inferior, escaparem daquele local. Alguns minutos se passam e nada mais aconteceu. O pastor se acalmou, porém, ficou ainda mais curioso para saber o que havia do outro lado daquela passagem. Se encheu de coragem e resolveu averiguar, tomando cuidado para deixar a pequena lamparina acesa junto às ovelhas. Munido de sua tocha iluminada, ele olhou absorto para dentro do buraco. Sem pestanejar, se apoiou em sua borda e deu um salto, entrando na escuridão. Ao iniciar a exploração, fez uma prece para que Deus o afastasse de qualquer mal. O lugar era apertado. Posicionando sua fonte de luz à frente, o pastor, meio ofegante, enxergou o chão com alguma dificuldade. Poucos minutos se passaram. Ele então descobriu que o caminho iria dar em uma espécie de câmara. Observando tudo à sua volta, ficou temeroso em relação ao que poderia encontrar. Adentrando ao recinto, concluiu que sua intuição era mesmo verdadeira: aquele lugar tinha sido construído por mãos humanas. A começar pelas velhas tochas na parede que, prontamente, tratou de acender. Logo depois, percebeu algo estranho num dos cantos da sala: dezenas de peças retangulares dispostas paralelamente e embrulhadas em couro envelhecido. “Minha nossa! Isso são barras de ouro?”– perguntou ele em pensamento. Ansioso e perplexo, o pastor se aproximou rapidamente das placas e, com cautela, puxou uma para si. Foi quando a proteção de couro se esfacelou em suas mãos, revelando seu conteúdo. A frustração se estabeleceu: não era ouro, e sim argila endurecida, coberta com antigas inscrições cuneiformes. “Meu Deus! O que significa isso?” – indagou, tentando iluminar as placas da melhor maneira possível, para decifrar o que estava gravado em sua superfície.

Neste exato momento, as ovelhas, do outro lado da passagem, lhe chamaram a atenção. Produziram sons histéricos, como se algo terrível estivesse acontecendo. Estarrecido co aquela situação, o pastor, num primeiro momento, pensou: “dos males, o menor”. A luz d lamparina teria se apagado por algum acidente.


Veja a continuação no livro: “Amazônia Arquivo Das Almas”


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