Almas Suspensas - [Amigo Otaku - Writers Project] 01

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Almas Suspensas

1 M. AugustoFalk


M. Augusto Falk

Almas Suspensas 2015


A gente é otaku. A gente se entende. Diagramação Marcelo Augusto Edição Marcelo Augusto Capa Marcelo Augusto Leitura Crítica Jonathan Gomes Design Gráfico Douglas Brilhante Publicação Amigo Otaku Group


Agradeço a você por dedicar um pouco do seu tempo para viver essa história. M. Augusto Falk


Capítulo 1 - Forte Isabella -

O

frio tornava os magos de fogo requisitados durante o inverno, como gravetos secos que você arremessa nas chamas, mas para os laboratórios de extração de energia a estação pouco importava, funcionavam 24 horas por dia, 7 dias por semana. — Quero ver se você consegue dessa vez — disse o médico. Carregava uma prancheta de anotações na mão, assim como um lápis de tom forte. Lee se aproximou da plataforma de aço, pôs os dois pés sobre a marcação no chão e ergueu as mãos. Mirava num boneco de palha a três metros de sua frente, amarrado com uma faixa no peito com dois sensores de energia acoplados. Ele movimentou as mãos no ar, encarou o objeto e lançou todo o seu poder de fogo. — Exploda — gritou. Das mãos do menino saiu uma nuvem de fumaça, cercou todo o recinto, mas logo desapareceu. Era o sinal de que era um mago. O médico caminhou até o alvo, deu duas voltas ao seu redor anotando todo o procedimento na sua tabela. — Limpo — anunciou. Então sinalizou para que dois homens armados que faziam a segurança na porta da sala se aproximassem. — Acompanhem o prisioneiro — disse ele. Lee levou as mãos ao rosto e suspirou. Agradecia por finalmente não ter |4|


mais nenhum resquício de magia dentro de seu corpo. Nunca possuiu mais do que algumas chamas e agora que estava vazio não existia mais motivos para permanecer preso. Pelo menos nenhum além do fato de ser um mago. Os dois soldados escoltaram o garoto até outra sala, aquele corredor era a ala principal do presidio, onde ficava todo o serviço de pesquisa do Forte Nacional Isabella. O nome veio da primeira mulher que foi capturada logo que a guerra entre magos e humanos acabou. Lee foi arremessado para dentro da sala com o empurrão do soldado que o escoltava, caiu no chão acertando a mesa, derrubando os equipamentos do consultório médico. — Seus malditos — pensou em dizer, mas os homens já haviam fechado a porta. — Espero que o bisturi tenha caído em seu rosto — ele escutou. O menino se levantou desviando as mãos dos objetos que havia derrubado, juntou algumas ferramentas e colocou sobre a mesa da mulher — desculpa — ele disse. Ela sorriu para o garoto no chão e disse — claro, Só porque você é o mais bonito de todos que eu atendo — Deixou o seu jaleco deslizar um pouco enquanto seu curvava em direção a gaveta da mesa, colocou a mão dentro dela e começou a vasculhar. — Achei — disse ela. Lee já tinha passado o dia inteiro na fila esperando sua vez de ser analisado, suas costas doíam, além disso, o fato do consultório médico não ter uma cadeira o fazia ter pensamentos de que deveria sentar na mesa da mulher ou principalmente no colo dela. Ela retirou uma barra de chocolate da gaveta, desembrulhou delicadamente o produto e se esticou para entregar o chocolate nas mãos de Lee. — Grandes — pensou ele quando notou o decote da mulher, parecia um grupo de magos quando passavam por sua primeira extração, se espremiam desesperados ao tentarem sair da sala. A mulher sorriu ao ver para onde o garoto olhava — Se continuar, eu mordo — disse ela. Lee agarrou o objeto e tentou chamar a atenção da mulher mordendo sensualmente o chocolate — me morde então — pensou ele. A mulher copiou os movimentos que o garoto fazia com a boca, passou a língua ao redor dos lábios — Leite Matutino é seu preferido também? — perguntou a mulher ao ver o como o Lee parecia se deliciar com o chocolate. Ele quase se engasgou ao ouvir a pergunta da moça, colocou a mão na garganta e tossiu o chocolate pra fora. — Que porra de nome é esse? — ele perguntou. A mulher então apontou para a embalagem do produto e fez um sinal com a cabeça. “Leite Matutino, 50 anos fazendo a alegria dos jovens” Ela afastou os objetos da mesa e se esticou, agarrou o braço do jovem deitando o na sua mesa de madeira. Pressionou para que não escapasse e disse |5|


— Lee, certo? Em seguida, pegou uma seringa de seu jaleco, deu duas batidas no braço do jovem e enfiou a agulha. — Você substituiu muito bem o médico — disse ele reparando na figura da moça. Devia estar nos seus vinte sete anos. Sentiu a agulha perfurando mais do que devia, talvez até fosse de propósito por causa do comentário. A moça era uma pessoa muito maldosa comentavam os guardas durante a ronda noturna. — Por que dói tanto toda vez? — O garoto levou a mão ao rosto tentando aguentar a dor das mordidas por todo seu antebraço. Larvas percorriam o seu corpo e fome era suas primeiras sensações. se alimentavam do corpo do hospedeiro crescendo conforme a quantidade que consumiam, caso o núcleo de energia tentasse combater a invasão liberando essência de fogo, elas o devorariam até ficar tão grandes ao ponto destruírem o indivíduo por dentro. — Ainda está vivo... então não mentiu para os guardas — ela retirou a agulha e liberou o garoto. O garoto parou de sentir qualquer movimento ou mordida quando as larvas se misturaram ao seu núcleo de energia, transformaram se em serpentinas de luz e desapareceram. — Eu estou meio tonto — ele reclamou ao perceber o sono vir até ele. — agora só é preciso que me carreguem... Sentiu então uma bofetada no rosto. — É muito deselegante da sua parte dormir durante minha consulta — disse a moça. Lee recolheu o braço alisando o local onde havia recebido a ponta da agulha. Pensava em como seria bom dar uns pega nessa mulher. — Pegue o chocolate que está no chão e coma, se não te mando para o pior lugar que tenho aqui — disse a médica. Colocou um papel na sua máquina de escrever e começou a datilografar. — Puta que pariu — Lee pensou. O garoto levou a barra de chocolate até a boca e mordeu a beirada, era até bom, mas aquele nome era muito suspeito. — Lee — continuou a moça enquanto retornava a máquina para fazer outra linha. – Já pensou em ser cobaia? — Jamais — respondeu o garoto. — Você já está limpo, se aceitasse, em menos de 10 anos, ganharia o suficiente para pagar sua taxa de liberdade. O garoto refletiu como aquilo era verdade. Tinha apenas 17 anos, precisaria trabalhar 30 anos se ganhasse um salário de um mecânico em qualquer fábrica de armas do império. — Você já se despediu de sua família? — perguntou a moça — Hoje pela manhã — Lee respondeu. Assim que terminou com a folha, a moça se arrumou na cadeira e procurou seu carimbo. Tirou a folha da máquina, mergulhou o carimbo na tinta e encostou na parte de cima do documento. — Uma semana lá e outra aqui — disse ela. |6|


Esticou a mão e entregou o papel carimbado nas mãos do garoto — você vai ser ajudante de um casal de químicos na cidade imperial. Lee ouviu os guardas baterem na porta, era o seu tempo limite dentro do consultório. Em seguida, abriram a porta e acenaram para que o garoto saísse da sala. Seguiu os guardas por todo corredor até sair da área administrativa da prisão, assim que chegou no pátio central, viu dezenas de pessoas sentadas no chão arrumando seus papéis, não tinham quase nada além disso, afinal ainda eram prisioneiros, mas agora tinham uma liberdade maior. Nos últimos duzentos anos a prisão, passou a ter um área com alojamento para famílias e ao lado das casas, pequenas plantações de cenouras, batata e outros vegetais eram cultivados durante o ano. Assim que se juntou aos demais prisioneiros que obtiveram a permissão de trabalho, Lee recebeu um colete de proteção e um capacete. Esperou por vinte minutos então escutou a campainha sinalizando que portão estava abrindo. Quarenta carros de guerras começaram a se mover, equipados com mantimentos suficientes para fazer o percurso até a cidade imperial, cada carro carregava dois soldados, o motorista e alguns prisioneiros. Lee seguia logo atrás, no último carro da frota. Os raios que constantemente caíam naquela manhã se misturavam com o tom esverdeado que o céu tinha do lado de fora da prisão, a zona no verde no céu era resquício da guerra na qual os magos haviam perdido. — Esse tempo de chuva vai adicionar duas semanas de viagem, talvez tenhamos que parar para reabastecer — comentava um dos guardas dentro do carro. Ele criava imagens desse momento na cabeça a vida toda. Logo que Lee atravessou o a muralha de aço escancarada, sentiu o cheiro de podridão. Mal deu alguma distância do portão escutou o carro passar por cima de algo, olhou para trás e avistou uma ossada em pedaços. Assim que o carro tomou distância do portão, Lee viu dezenas de corpos espalhados por todo o perímetro da prisão. Havia corpos por entre as árvores, no lago que ficava logo a frente, alguns ainda apodreciam e animais selvagens se alimentavam de seus restos. — Me pergunto se vocês vão gostar dos seus trabalhos, seus imundos — disse o guarda sorrindo. — Estamos limpos, maldito — Lee falou.

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