HABITAÇÃO SANTO CRISTO
PUC-RIO ARQ1108
Ana Carolina Dias Gabriela Sad Julia Issler
ÍNDICE
MACRO Bairro Santo Cristo
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UM ENSAIO SOBRE ESPAÇO E GÊNERO
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O SÍTIO Rua Santo Cristo 271
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O VERDE
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OS HABITATS
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MACRO
BAIRRO SANTO CRISTO Sob uma luz fosca do projeto de 2009 do governo Paes, “Porto Maravilha”, Santo Cristo sobrevive a um paradoxo. Depois do falho caso de vendas de Cepacs (todas compradas pela Caixa Econômica Federal), que garantem o aumento do potencial construtivo em determinadas áreas da região, somado a um histórico atrelado a “usos sujos”, esse bairro portuário segue com a resiliência tal de um papel de parede mal arrancado. Parece mesmo que a tentativa de revitalização, além de presumir a ausência da vida local, vislumbrou mais a especulação de um uso de demanda incerta, com a construção de edifícios comerciais fantasmagóricos, do que a requalificação em prol dos moradores atuais e - por que não?- futuros.
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Imagem do grupo
O contraste é claro entre uma tipologia genérica, hermética, coberta por panos de vidro e a tipologia local, caracterizada por sobrados e armazéns, atualmente subutilizados, casas que remetem a um ritmo de subúrbio conforme sobem pelo Morro do Pinto, além dos resultados da autoconstrução, no Morro da Providência.
Quanto à população, o bairro é de maioria negra, historicamente, e feminina (6.483 mulheres 5.847 homens¹). Santo Cristo resguarda uma urbanidade latente. No quesito mobilidade, o bairro parece consolidar-se. Apesar dos impasses das obras para os grandes eventos (Copa em 2014 e Olimpíadas em 2016), as linhas de VLT implantadas facilitam a conexão ao Centro. Além disso, Santo Cristo sedia a Rodoviaria Novo Rio, possibilitando a conectividade com todo Brasil. A ocupação da Fábrica Bhering por artistas deixa uma porta aberta para o potencial cultural que pode ser impulsionado no bairro. Os galpões industrais, atualmente pouco utilizados, também comportam possíveis suportes para atividades desse caráter. Diante de um elevado deficit habitacional do Rio de Janeiro, essas potências do bairro nos permitem pensar em um movimento de adensamento que reverbere as vozes dos atuais moradores na demanda de uma qualidade de vida melhor. Isto é, mais habitações e mais habitantes em Santo Cristo ressoariam mais alto, e o bairro gradualmente se consolidaria em prol de seus moradores.
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Rachel Levit
Escolhemos partir da compreensão dos habitantes, no plural, entendendo esse espaço como diverso e híbrido. O programa volta-se para pessoas com dificuldades de acesso à habitação, na tentativa de atender ao deficit habitacional, com aluguel social mas também possibilitando em parte a compra independente de unidades. Além disso, a receita gerada por um percentual dos apartamentos alugados ajudaria na manutenção do conjunto, reduzindo custos de condomínio.
“Menos de 1% das propriedades privadas, no mundo, está nas mãos de mulheres.”²
UM ENSAIO SOBRE ESPAÇO E GÊNERO O espaço não tem sexo mas têm gênero. Na conformação de papéis sociais, o estereótipo da mulher no lar persiste até hoje e estranhamente complementa a dificuldade das mulheres no acesso à propriedade, sendo esse principalmente por meio de heranças. Trata-se de uma condição de repressão ao feminino: uma cultura machista entranhada no Brasil, que associa a figura da mulher a uma passividade pejorativa.
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2.MUXI, Zaida; MONTANER, Josep Maria. Arquitetura e política. 2014.
Rachel Levit
Escolhemos trazer o questionamento dessa lógica social e culturalmente imposta, na tentativa de enxergar como (ou se) esse enunciado se espacializa, na busca de uma reespacialização na arquitetura. Segundo um viés dessa discussão, o corpo feminino reprimido e objetificado, segue marginalizado na cidade. Andar sozinha é vulnerabilizar-se a constantes ameaças. Aqui, o positivismo dos insistentes “espaços de encontro” perde a voz quando esses encontros podem ser, por um outro lado, desagradáveis.
Como pensar um habitar contemporâneo sob a percepção da figura feminina no ambiente urbano?
O mundo material do corpo sensível, desde o pensamento platônico, sofre com a hierarquia que vangloria a ideia e a razão em detrimento da matéria e da emoção. Essa dualidade se reverbera em outros estereótipos, como a mulher passional e o homem racional, reforçando uma cultura falocêntrica. Corpo mulher, homem razão e o binarismo redutivista do corpo aquém da mente.
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Como espacializar um habitat que estimule sensações, na valorização dos corpos?
O primeiro lar Habitamos nossos corpos. Conforme crescemos tomamos a noção dos nossos limites, ganhamos gradualmente a noção de indivíduo, conquistamos nossa independência do corpo materno gerador, conquistamos nosso espaço. Nossos espaços. Ampliando a escala desse habitar, desde o corpo até a cidade.
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Zeca Osรณrio
7 Laura Berger
Aqui reside o conceito de uma arquitetura que contemple esses momentos do ser e do crescer, com diferentes espacialidades para diferentes vitalidades. O questionamento quanto a repressão do feminino, a repressão dos corpos vibráteis³, reflete-se na proposta de espaços que contemplem o bem-estar da mulher na cidade, bem como na valorização desses corpos. Sugerimos assim provocações espaciais aos corpos. Um ambiente lúdico e conquistado pelo habitante: nossos lares como extensões de nós. É no habitar que essa arquitetura se constrói. Com a vibração dos corpos no espaço, estimulados e livres.
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O SÍTIO
RUA SANTO CRISTO 271
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ZONA PORTUÁRIA
RUA SANTO CRISTO
MORRO DO PINTO
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Imagem do grupo
O terreno estende-se por aproximadamente 7 mil metros quadrados, em uma esquina entre a Rua Santo Cristo, Rua Cordeiro da Graça e Avenida Cidade Lima. A primeira, predominantemente comercial resguarda as memórias de um bairro operário, com sobrados do século XIX. Por outro lado, a Avenida Cidade Lima comporta uma escala industrial, dos galpões, além de um recente gabarito que assume edifícios de até 90m.
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Diferentes tecidos urbanos se encontram, com escalas contrastantes, propiciando a reflexĂŁo acerca de uma costura de tais ambiĂŞncias.
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Com base na largura dos sobrados preexistentes no terreno, criamos uma malha orientadora de 6x6 para o estudo estrutural e morfológico do projeto. Na Rua Santo Cristo a malha se posiciona de modo perpendicular, dando continuidade ao ritmo local. Conforme se extende em direção à Avenida Cidade Lima, gera-se uma
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nova orientação de implantação.Tendo em vista o potencial do terreno com mais de uma frente, escolhemos criar um atravessamento interno, conectando as três vias que o circundam. Cria-se assim uma rua interna para pedestres com uma atmosfera de vila.
Escolhemos seguir a ortogonalidade do entorno, como um espaço que se molda pela cidade, mas se interioriza organicamente por reentrâncias. Tal interioridade prioriza o uso habitacional. Os espaços comerciais voltam-se para a Rua Santo Cristo, dando continuidade ao seu potencial histórico. Nos sobrados preexistentes mantivemos o uso atual.
O VERDE Diante da escassez de áreas verdes em Santo Cristo, refletimos sobre esse tipo de vitalidade e sua indiscustível importância para a nossa. A porosidade do solo, que acolhe as águas da chuva, as folhas, as sombras. Deste modo, propomos um térreo com 40% de área livre e alta permeabilidade; áreas verdes por todos os pavimentos.
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OS HABITATS Células habitacionais se pulverizam ao longo do sítio, voltando-se tanto para a cidade quanto para a rua interna. O conjunto de células que se sobrepõem parte da altura de 12m, harmonicamente à altura dos sobrados, e aos poucos cresce atingindo 8 pavimentos, conforme se aproxima da Avenida Cidade de Lima e seu gabarito elevado. Criamos 5 tipologias distintas de 18, 36 e 72m². Pensamos em unidades de 18m² para amenizar os custos de um habitar mínimo ou um modelo de studio. As unidades de 72m² subdividem-se em lineares, totalmente acessíveis, e em duas tipologias de duplex. Os módulos seguem a malha orientadora, de 6x6. Deste modo, a estrutura periférica facilita qualquer modificação que o habitante desejar, valorizando a espacialização da individualidade.
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72 m2 Linear
72 m2 Duplex
72 m2 Duplex
36 m2
18 m2
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No térreo todas as unidades são duplex, tendo seus acessos pelo primeiro pavimento. A fim de preservar a privacidade dessas células, criamos elevamos 60cm em relação ao nível da rua.
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A cada dois pavimentos, lajes curvas permeiam o projeto, criando comunicações entre as células habitacionais, bem como revertendo a monotonia usual dos “pavimentos tipos”. Suas saliências presenteiam as unidades com sacadas que se voltam para a rua interna.
18m2 36m2 72m2 72m2 108m2
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Planta Baixa 1º pavimento
Planta Baixa 4º pavimento
A cada dois pavimentos, lajes curvas permeiam o projeto, criando comunicações entre as células habitacionais, bem como revertendo a monotonia usual dos “pavimentos tipos”. Suas saliências presenteiam as unidades com sacadas que se voltam para a rua interna. Planta Baixa 8º pavimento
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Ao longo do projeto, em prol da qualidade de iluminação e ventilação naturais, abrem-se largos prismas que criam também ambientes de micro vizinhança. Gradações de privacidade suavizam a relação público-privado, em nuances que proporcionam espaços de apropriação individual ou coletiva.
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0
0,5
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TIJOLO BTC
ARGAMASSA
PILAR METÁLICO 30X30CM
JANELA ECOEFICIENTES
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0,3
0,6
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Diferentes espacialidades, diferentes estímulos e percepções espaciais acompanham o conjunto como todo. Nossa ideia é de um habitar que se constrói ao longo do tempo, pelos habitantes. Uma arquitetura vital.
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Uma arquitetura vital.
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