VERÃO 17/18
VERÃO 17/18
MODA SUSTENTÁVEL E CONSUMO CONSCIENTE
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MANIFE S TO
APOENA
Somos a Apoena
Acreditamos que a moda está nas pessoas, na natureza e na harmonia das relações humanas. Enxergamos longe e lutamos por um mundo com escolhas mais justas e que contribuam para o meio ambiente. Valorizamos todas as diversidades e sabemos que a autoestima é o que há de mais bonito nas pessoas. Sentimos empatia pelo próximo e consumimos apenas o necessário. Valorizamos a história das peças de roupas e o trabalho de toda a cadeia produtiva. Sentimos o vento em meio à rapidez da vida moderna e paramos para apreciá-lo. Resistimos e seguimos na contramão. Todos juntos. Entrelaçados. Vamos?
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Sobre Carol Por Kátia Zanvettor
Se quiser conhecer a autora dessas linhas você precisa lê-la, sim, ler em um duplo sentido: ler seu texto e ao mesmo tempo ler a jornalista por trás da menina tímida. Não há nada mais intenso e verdadeiro que conhecer uma pessoa por meio de suas palavras escritas, ainda mais quando se trata de uma jornalista. Sou professora da Ana Carolina desde o primeiro ano de faculdade e tenho acompanhado com admiração seu crescimento pessoal e profissional. A escolha do Trabalho de Conclusão de Curso com um tema, ao mesmo tempo, tão importante e tão complexo, já diz muito sobre ela. Em tempos de reportagens superficiais, como um fastfashion do jornalismo, propor um tema que investiga padrões de consumo, questiona a indústria da moda e
propõe novas possibilidades de pensar as relações sociais, tudo isso ainda desenvolvido dentro de uma linguagem inovadora de revista, já é um sinal de que Ana Carolina é sobretudo uma mulher de força e uma jornalista diferenciada. Ao ler Apoena você vai confirmar minhas palavras e verá, por você mesmo, como essa jovem jornalista levou a sério a tarefa de desconstruir velhos chavões da moda e trazer para seu público novos olhares sobre o consumo consciente. É uma honra ter participado, como orientadora, deste projeto. Espero que ao ler “duplamente” esta revista os leitores compartilhem comigo os sentimentos que ele me proporcionou: de orgulho pela nova geração de jornalistas que nasce com ela e de esperança para um futuro com um consumo mais livre e consciente.
Expediente A publicação Apoena é um projeto experimental realizado como Trabalho de Conclusão de Curso de Comunicação Social Jornalismo desenvolvido na Universidade do Vale do Paraíba (Univap) pela aluna Ana Carolina Oliveira. Repórter, editora e designer gráfica: Ana Carolina Oliveira. Orientação: Kátia Zanvettor Ferreira. Co-orientação: Vinícius Coquette. Colaboradores: Mara Débora, Gabriela Oliveira, Coletivo Las Chicas, Fernanda Waisman, Thamires Sena, Heloisa Oliveira e Yara Gariglio Imagens: Gabriela Oliveira, Pâmela Mello, Gutyerrez, Flaticon, Freepik e redes sociais de digulgaçãoo das marcas. Contato: contatoapoenarevista@gmail.com facebook.com/apoenarevista instagram: @apoenarevista
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Indíce
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Carta da editora Passeando por aí...
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Entrelinhas
20 O impacto de cada um 23
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Editorial
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Apoena apoia! Estilo
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Pretérito-perfeito Apoena Convida
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Carta da Editora
A necessidade do (re)pensar
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ma nova forma de consumir é necessária. Atualmente, a sociedade consome a quantidade suficiente para 1,6 planetas Terra. A indústria têxtil ocupa o segundo lugar no ranking de poluição. O tingimento químico polui os rios, a extração de matéria-prima e agricultura intensiva polui os solos e o uso de derivados do petróleo polui o ar. As regras capitalistas seguem com suas diretrizes e determinam os padrões de compra. Sempre o melhor. Sempre o novo. Por outro lado, há quem reme na contramão. Projetos sociais restauram calçados e geram inclusão social, tingimento natural se vale da qualidade vegetal de nossas espécies nativas e marcas surgem com propósito em modificar a vida de seus clientes. A coletividade ganha espaço em um cenário competitivo e baseado em lucro. Mulheres se unem em prol do empreendedorismo feminino e diferentes belezas refletem a liberdade de ser quem você é. Essa é a Apoena - moda sustentável e consumo consciente. Um novo jeito de pensar e de refletir sobre as regras sociais. (Re)pense junto a nós. Boa leitura e fique à vontade!
Beijos,
Ana Carolina Oliveira
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P a s s e a n d o p o r a í ...
O “mercadinho artesanal” é um projeto que reúne em um mesmo local produtos artesanais e de pequenos produtores. Moda, alimentação, cosméticos e decoração em um único lugar. O evento ocorre no início das estações e em datas comemorativas como o Natal. Acompanhe os próximos encontros por meio das redes sociais @mercadinhoartesanal. Local: Av. Dr. Adhemar de Barros, 1597, São José dos Campos - SP.
Muitos procuram passeios alternativos aos finais de semana e feriados e o “Café na Horta” pode ser uma boa pedida já no início do dia. Além do ótimo preço, o local fornece alimentos simples e saudáveis e ainda permite a compra direto da horta. O horário de funcionamento é das 9h às 13h. Mais informações: @cafenahorta. Local: Rua Shishima Hifumi, 2211, São José dos Campos - SP.
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A “Feira Multi” também integra produtos artesanais de diferentes áreas, mas seu diferencial são a venda de objetos semi-novos com o objetivo de incentivar um consumo mais responsável. O evento acontece em determinados domingos das 10h às 17h. Acompanhe a próxima data em @feiramulti. Local: Estacionamento do shopping Colinas. Av. São João,2200. São José dos Campos - SP.
Feira “Agroecológica” do Parque Vicentina Aranha. O local concentra expositores produtores da região e pede que os consumidores levem a própria sacola para auxiliarem o meio ambiente. Acontece todos os domingos a partir das 9h. Local: Parque Vicentina Aranha. Rua Prudente M. Morais, 302. São José dos Campos - SP.
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Passos inclusivos e sustentáveis Projeto recicla calçados e oferece profissionalização
Por Ana Carolina Oliveira
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ma das principais formas de se pensar no amanhã é por meio do uso da reciclagem dos produtos consumidos hoje. A Recicalce é uma organização sem fins lucrativos que une atividades em prol ao ambiente com inclusão social. Criada em 2011, a associação possui um trabalho pioneiro. Em parceria com a marca regional Oscar Calçados, a associação reforma sapatos usados e oferece capacitação profissional a pessoas com necessidades especiais ou que se encontram em vulnerabilidade. O senhor Carlos Holanda é coordenador do projeto e, segundo ele, um dos principais objetivos da organização é promover a independência de seus atendidos. “Nós queremos que essas pessoas não criem dependência do outro, o que infelizmente é comum elas serem dependentes. Muitas não podem ir à padaria, não penteiam o próprio cabelo sozinha e, quando os cuidadores morrem, elas ficam desamparadas.”, afirma Holanda. Além do ensino das atividades profissionais, a ong atua com assistência de terapeutas e psicólogas que integram o auxílio a essas pessoas com diferentes deficiências ou vítimas de traumas como abusos sexuais. Os sapatos são recolhidos por contêineres da própria organização espalhados em diversas localidades, em postos de coleta nas próprias
lojas e também por voluntários independentes que contribuem com a instituição. “Atualmente, recebemos 40% dos calçados das lojas e 60% vem de doações desses parceiros, dos voluntários”, diz o gestor. Depois que chegam à Recicalce, os calçados ainda têm um longo caminho até a destinação final. Primeiro, os sapatos passam por triagem, são reformados os que ainda podem estar em uso para doação, outros materiais são desmontados e reciclados e o restante que não pode ser aproveitado é enviado para o aterro industrial de Tremembé. São várias as entidades que recebem os calçados reformados. Só neste ano, até Julho foram atendidas 11 instituições sociais que somam 4.800 pares recolocados de volta ao uso e 13.200 pares recebidos pela organização. A Recicalce ainda possui como missão a responsabilidade de conscientização ambiental com a realização de palestras e eventos que buscam a reflexão sobre o consumo e o descarte inadequado dos produtos. De acordo com Holanda, o calçado é um dos produtos mais difíceis de serem reciclados. “O calçado é um produto fechado e tem mais de 40 componentes, muito tóxicos, voláteis, que contaminam o lençol freático e que podem causar doenças”, explica Carlos.
RECICALCE
2011 - 2016 79.300 pares reciclados 49.000 pares doados
30% masculino e infantil
70 % femininos
Produção de calçados no Brasil 2015
944,2 mihões de pares
Fonte: Associação Brasileira das Indústrias de Calçados
Doe: Recicalce: Rua Professor Giordiano de Faria Alvim Filho, 133 Residencial União - SJC/ SP
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T i n g i m e n t o n a t u r a l d e t e c i d o s: o retorno de um conhecimento milenar Por Ana Carolina Oliveira
O
s corantes químicos foram desenvolvidos no período da Revolução Industrial e são conhecidos por utilizam combustíveis fósseis em seu processo produtivo. Além de poluir o meio ambiente com os resíduos tóxicos, seu uso indiscriminado ainda pode causar danos em toda a cadeia alimentar por serem bioacumulativos. Uma alternativa é a retomada do uso dos corantes naturais provenientes de matéria-prima vegetal. Cascas de plantas, folhas, frutos e temperos podem garantir uma tonalidade diferente em muitos produtos. O Ateliê Etno Botânica & Studio InBlueBrazil é uma empresa mineira que possui o enfoque na sustentabilidade ao comercializar corantes e pigmentos naturais, tecidos em malha de algodão orgânico e realizar oficinas de conscientização sobre o uso das técnicas de tingimento. Leka Oliveira, 38, designer têxtil e colorista natural, é uma das responsáveis pela empresa junto com o empresário Eber Lopes. Segundo a empresária, um dos maiores empecilhos para o uso dos corantes vegetais é a falta de
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conhecimento e a crença de que as cores naturais são de qualidade inferior. “A única limitação é o preconceito. As pessoas imaginam que corantes naturais são cores opacas, tons terrosos, que não possuem intensidade nas cores nem solidez. Isso é mito. Podemos tingir fibras naturais, artificiais e sintéticas, adequando o melhor corante para a fibra”, ressalta Oliveira. Atualmente, dados da Natural Science apontam que 20% da contaminação das águas tem origem dos tingimentos químicos da indústria têxtil. Leka Oliveira também destaca que o uso dos corantes vegetais é benéfico não só para o meio ambiente como permite desenvolvimento da agricultura familiar que cultiva tais plantas. A tecnologia, entretanto, não é uma vilã. A designer afirma que a união entre todos os conhecimentos é necessária. “A Revolução é Artesanal e aliada a tecnologias e indústria. Não há como retroceder a tudo o que o planeta nos responde em relação a deterioração da vida com a utilização de sintéticos, industrializados entre outros”, diz Leka.
Malefícios do tingim ento químico Ar
Emissões atmosféricas (troca de calor)
Água
Contaminação por meio da eliminação de efluentes
A indústria têxtil é reponsável por 20% da contaminação das águas
Solo
Contaminação por meio de resíduos sólidos das embalagens
Fonte: Sinditêxtil
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Moda
com Propósito
Cresce número de marcas que desejam “fazer a diferença”
Por Ana Carolina Oliveira
Galpão da Malha Espaço de coworking no RJ
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“P
ropósito tem a ver com intenção, com objetivo. É a declaração da diferença que você pretende fazer no mundo. É a resposta clara de por que você faz o que faz (como organização ou pessoa)”. Essa é uma das maiores citações do livro “Moda com Propósito: Manifesto pela grande virada” do André Carvalhal, co-fundador da Malha, um espaço de moda colaborativa no Rio de Janeiro. A marca, ao lado de muitas outras do setor, tem se destacado por suas práticas ambientais baseadas nessa máxima. Com apenas um ano de funcionamento, a Malha já registra números expressivos como a marca de 500 pequenas empresas em parceria com o galpão localizado em São Cristóvão. Além de residência para as marcas, a empresa também realiza eventos como feiras e palestras com a temática sustentável, além de possuir estrutura para ensaios fotográficos, máquinas têxteis, escola, espaços para reuniões, café e lojas. Inclusive, o nome da empresa também não foi escolhido ao acaso, pois remete à união entre toda a cadeia produtiva em meio à um setor cada vez mais excludente. Herman Bessler também é co-fundador do espaço e destaca a
proposta colaborativa. “A colaboratividade vem do princípio que juntos somos mais fortes e conseguimos ir além. Apostamos na troca de energia criativa e experiências”, afirma Bessler. O empresário também frisa o papel do consumidor como agente dessa mudança ao optar por tais marcas. “Nós somos responsáveis pelas marcas que estampamos no mundo. Somos responsáveis pelo o que usamos e por quem produziu o que usamos. A responsabilidade que carregamos é dividida com cada um que, assim como nós, apostam em uma Moda inovadora, independente, colaborativa e consciente”, justifica Herman. Em um primeiro momento, esse discurso que integra moda e sustentabilidade pode parecer antagônico, mas o co-fundador da Malha comprova que essa ideia não condiz com a atualidade. “Moda é um ato político e estético capaz de contar histórias plurais de forma ímpar. Moda e sustentabilidade parecem opostos se você pensar na Moda de tempos atrás, hoje, essa união é uma necessidade. Não existem mais recursos naturais para serem explorados e essa junção é uma realidade, tem muita gente fazendo”, declara Bessler.
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Bolsa “ORNA”
Irmãs Alcântara Tudo Orna
Na outra ponta do país, em Curitiba, há outra marca que merece destaque por seu propósito, ou melhor, marcas, pois foram várias que derivaram do blog de moda“Tudo Orna” criado pelas “Irmãs Alcântara”. Além do blog, as irmãs contam com a marca de bolsas e acessórios “ORNA Concept”, a marca de maquiagem “ORNA Makeup”, o “ORNA Café” e o curso de empreendedorismo “Efeito Orna”. Tudo começou como um hobby entre as irmãs que só queriam retratar sua visão sobre a moda e registrar um olhar diferente pela cidade natal. Muito trabalho em pouco tempo. Desde o início da página de moda em 2010, Julia Alcântara, Débora Alcântara e Bárbara Alcântara possuem identidade própria em todas as suas empresas
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e, agora, com seu último projeto “Efeito Orna” pretendem incentivar negócios de seus leitores por meio de conhecimento sobre posicionamento de marca e marketing digital, já que não acreditam em concorrência. Em relação ao necessário para as empresas nos dias atuais, as irmãs são claras. “Ter uma boa estratégia de branding (gestão da marca) para que as pessoas sintam algo positivo por sua marca e se identifiquem com ela. E o principal: ter um propósito verdadeiro e acreditar sempre nele”, declara as empresárias. Na marca de bolsas, o valor da sustentabilidade também se destaca. As peças possuem design atemporal e possuem matéria-prima certificada e regional, além de serem produzidas por uma mão de obra justa.
Calçados
O propósito também é o que move a marca de calçados Maria Maria que, desde 2013, atua em Taubaté. A marca foi criada pela Karine Emboava e possui como identidade ações que minimizem os impactos ao meio ambiente. “Eu sempre acreditei nos produtores locais, de comprar de gente local, de movimentar o comércio interno e de comprar de maneira mais consciente. Eu faço questão disso, eu vou conhecer todas as fábricas que trabalham com a gente, eu vou ver se não tem nenhum tipo de desvalorização do trabalho humano e a gente foca bastante nisso porque é muito importante para gente”, explica Emboava. Em suas atividades sustentáveis, a marca não utiliza produtos de origem animal, recicla caixas de papelão dos produtos e fornece saquinhos de chita ao invés de
Insecta Shoes
sacolas aos clientes. Karine também explica que a marca possui um conceito construído para cada coleção que, ao fazer a entrega, envia junto com o produto etiquetas de papel reciclado com poemas ou frases. “Sempre gostei de coisa que agrega um pouco mais do que só um sapato. Tanto que tipo quando você compra uma Maria Maria você leva um pouquinho de cultura popular brasileira”, justifica a empreendedora. A Insecta Shoes é outra marca bastante consolidada no setor de moda sustentável de calçados. A empresa desenvolve produtos unissex, veganos (sem origem animal) e com tecidos únicos provenientes de brechós ou feitos a partir de garrafas pet. A marca possui apenas três anos de história e, com sede em Porto Alegre, realiza workshops ecológicos, entregas com o uso de bicicleta e um blog informativo.
“Saquinhos” Maria Maria
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Personalidade é o novo preto Consultorias de imagem usam o autoconhecimento para desenvolver melhores escolhas no guarda-roupa do cliente
Por Ana Carolina Oliveira
Oficina Descubra-se - Desguarda roupa
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oi-se o tempo em que a moda ditava regras. Atualmente, a única condição é se sentir bem. Nada de restrição por idade, tipo físico ou combinação de peças. Consultorias de imagens que promovem o autoconhecimento têm crescido no setor aliadas ao contexto da sustentabilidade. Bruna Castro e Nádia Mello são designers e consultoras de moda que formam o “Desguarda Roupa”, um coletivo de moda paulista que realiza oficinas e debates de conscientização ambiental.
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Uma das oficinas desenvolvidas pelas meninas é a intitulada “Descubra-se” que incentiva os participantes a escolherem um look que responda a pergunta “quem você é?”. Após a escolha, as meninas questionam a decisão de forma reflexiva e apresentam números da cadeia têxtil. Outra oficina ministrada pelo coletivo promove o upcycling (reforma ou transformação de peças) por meio da reforma de peças antigas dos próprios alunos junto ao ensino do uso da máquina
de costura. Um dos motivos para a criação do coletivo foi a desilusão com o mundo da moda. “Discursos vazios” e distanciamento do conceito real da moda foram os principais motivos que despertou a vontade de fazer diferença “Muito do que eu e a Bruna estamos fazendo é isso, mostrando um lado de como a gente pode estar trabalhando a individualidade, a criatividade e como a moda pode transformar. Existem mil possibilidades, não é só essa indústria”, declara Mello que também se deparou com o mercado ao cobrir as tradicionais semanas de moda. “A gente vê a moda muito mais como ponto de partida para a autoestima, pra visibilidade das pessoas, o empoderamento do que simplesmente a roupa ou o que você vai usar”, completa Bruna Castro. Bruna também já trabalhou como designer em confecção e se deparou com uma realidade diferente do seu imaginário na academia. “Eu ficava o dia inteiro pesquisando o que tava usando fora pra copiar e fazer igual e isso ficou impraticável. Eu fui me deprimindo e entrei na confecção e vi mão de obra escrava na minha frente e aí não consegui mais. Eu falei pra mim, chega”, relembra Castro. Segundo o coletivo, a recepção dos participantes tem sido boa em
relação a temas tão recentes. “O que a gente faz é um trabalho de reinvenção o tempo inteiro porque é um caminho novo, então se é um caminho novo, a gente também tá aprendendo”, diz a designer.
Guarda-roupa sustentável
Mara Débora, designer gráfica e consultora de imagem, desenvolveu o Guarda-Roupa Sustentável que tem por finalidade a conscientização de que não se precisa ter muito. Com 20 peças, Mara propõe a elaboração de looks diferentes ao longo de nove meses com peças que traduzem a personalidade e versatilidade de seu cliente. “Uma frase é que eu uso é “antes de olhar vitrines, olhe pro seu guarda-roupa, antes de abrir uma carteira, abra a sua gaveta”. Porque o que eu vejo é que você olha pro seu guarda-roupa buscando algo que você não tem”, afirma a consultora. A profissional ainda destaca que o exercício coloca em prática a criatividade ao incentivar novas possibilidades de uso das peças. Dentre as várias etapas da consultoria estão: diagnóstico de imagem com questionamentos sobre personalidade e cotidiano, formas geométricas corporais, estilo e análise cromoestética que estuda a reação dos pigmentos das roupas na pele e identifica a tonalidade que
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mais valoriza o cliente. Para Mara, o autoconhecimento é a razão da consultoria e permite escolhas assertivas. “Quando você compra melhor, aquela roupa passa mais tempo no seu guarda-roupa e passa a ser uma compra mais consciente e também gasta menos”, diz a profissional .
São José dos Campos
Mara Débora que também é representante do movimento “Fashion Revolution” na cidade atende no município joseense e, de
acordo com a consultora, apesar dos avanços no setor da sustentabilidade na região ainda há dificuldades. “Eu acho que as coisas tão acontecendo muito em paralelo. Assim, não está tendo uma comunicação, um compartilhamento das pessoas caminharem juntas. Cada um está buscando o seu lugar ao sol e eu acho isso ruim, acho que as pessoas deveriam se unir mais nesse propósito, já que o propósito é comum, é o meio ambiente. Eu acho que falta essa convergência”, enfatiza Mara.
Quem fez minhas roupas? Essa é a pergunta que define o movimento “Fashion Revolution” e busca levar uma reflexão sobre o processo produtivo da indústria da moda. O movimento global surgiu a partir de constantes mobilizações após o acidente em Bangladesh no prédio Rana Plaza, em 2013, em que 1.133 pessoas foram mortas e 2.500 ficaram feridas pelo desabamento de um edifício com condições precárias. O local abrigava diversas fábricas têxteis que terceirizam a produção. Na época, os donos das empresas foram arletados dos riscos estruturais, mas nada foi feito para impedir o desastre. Desde então, anualmente, o dia 24 de Abril é visto como um marco do ocorrido e a associação relembra a questão e amplia debates sobre o consumo mais consciente e uma cadeia mais transparente. Uma das mobilizações que o movimento promove é a postagem de imagens de roupas pelo avesso para mostrar a etiqueta das peças e enviar essa pergunta às marcas.
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Consumismo e Consciência
Quando a prática de compra se torna um vício
Por Ana Carolina Oliveira
A
partir da Revolução Industrial foi disseminado o discurso consumista na sociedade atual. Hoje, mais do nunca, a moda rápida e as grandes redes são realimentadas pelo consumo exagerado. No entanto, deixar de consumir totalmente é uma utopia e encontrar o limite é cada vez mais difícil. Como saber se as comprar ultrapassaram o consumo necessário? Segundo a psicóloga comportamental, Patrícia Rivoli Rossi, é quando o indivíduo relata prejuízos e possui outros problemas atrelados à prática de compra. “ O que acontece é que quando a gente pensa em alguém que pode desenvolver um comportamento consumista, quer dizer que tem problema de identidade. É fácil a gente imaginar que são pessoas que não se satisfazem muito, que não se bastam”, declara a psicóloga. Entre os problemas relatados pela especialista estão questões relacionadas à insegurança, dificuldades de relacionamentos e
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a necessidade de auto-aceitação devido a construção social capitalista que determina regras. “Assim, se o consumo tem um valor muito alto, quer dizer que outras coisas na vida da pessoa tem um valor baixo e deveria ter um valor alto. Seriam relacionamentos afetivos, relacionamentos familiares, amizades, autoestima, autoconfiança. Se a pessoa tem qualidade de vida, se a pessoa tem bem-estar, ela deixaria de ser vítima dessas regras sociais porque as regras sociais adoecem a gente. Todo mundo tem como ser a cultura gostaria? Não tem” , justifica Rivolli. Patrícia alerta, porém, sobre a real motivação de cada escolha. Pessoas que deixam o consumismo também podem estar apenas sendo vítimas de novos padrões. “Eu to ajudando porque pessoas vão achar bonito que eu faça isso? Porque se for porque pessoas vão achar bonito é o mesmo problema. O legal é que a pessoa seja o próprio controle de si, não o controle social”, afirma a profissional.
Na prática
Por outro lado, é difícil quem resista a uma liquidação e Aline Rocha, estudante de Jornalismo e estagiária de mídias sociais, declarou que age por impulso. “Na maioria das vezes, eu compro pela emoção. Se eu estou triste, compro para tentar me sentir melhor. Se estou feliz, compro para comemorar”, confessou a estudante. A jovem, no entanto, relatou que se arrepende em determinadas situações, mas que se sente “orgulhosa” quando encontra produtos com “preço baixo”. Questionada sobre o processo produtivo das lojas que consome, Aline declarou não considerar o histórico na hora da compra. “ Sendo bem sincera, eu não procuro saber não. Eu trabalhei em três lojas de roupas e tenho curiosidade sobre as grandes grifes internacionais [...] Porém, as lojas que eu compro, nunca tive interesse mesmo”, disse Rocha.
Consciência
Pamêla Melo, fotógrafa e também estudante de Jornalismo,
já foi consumista e atualmente é dona do Amoreia Brechó e mudou sua consciência em relação às compras. De acordo com a empreendedora, o interesse pela moda e sustentabilidade a fez ter acesso a maior informação sobre o assunto e modificou seus comportamentos. A jovem relata que também era consumidora de promoção. “Eu não chegava a me endividar, mas hoje sei que gastava muito mal o meu dinheiro. Deixava de fazer ou comer coisas que eu gostava para comprar roupa e pior, muitas das roupas nem me representavam, então eu deixava de usar pouco tempo depois da compra”, relembra Pâmela. Atualmente. a estudante declarou que não consome roupa há cerca de um ano em lojas. “[...] olhar para aquela blusinha de R$19,90 não era mais a mesma coisa, eu sabia que existia muita dor e devastação ambiental por trás dela. Então, eu deixei de comprar peças em lojas, disse ela que ainda
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Brechó
O Amoreia Brechó tem cerca de um ano e meio de funcionamento e começou com vendas pelo Instagram apenas para a cidade de Taubaté, mas a partir de Junho deste ano a marca possui site próprio e atende todo o país. Seu público alvo são mulheres de 18 a 27 anos e a própria estudante fotografa as peças e produz os editoriais. “O consumo mais ético resulta numa produção mais ética e eu acredito que esse cenário de maior responsabilidade social e ambiental tem tudo para se solidificar no mercado”, diz Pâmela com otimismo. Em meio ao negócio, a empreendedora também está na fase final da produção de uma websérie documental sobre consumo consciente que além de ser seu trabalho de conclusão de curso, será disponibilizada em seu canal de vídeos.
@amoreiabrecho
estendeu a consciência ambiental na alimentação e nos utensílios de casa. Lojas de departamento cederam lugar a dezenas de roupas de brechó que garimpa para seus clientes e também para seu consumo. Foi modificando seus hábitos que a jovem identificou a oportunidade de negócio e passou a se questionar sobre o porquê da falta de acesso a boas peças de segunda mão. “Entendi que algumas dessas pessoas não tinham tempo de “garimpar” as peças (comprar em brechó é maravilhoso para a sociedade e para o meio ambiente, mas dá um trabalhão), outras tinham vergonha de serem vistas entrando nesses estabelecimento e outras ainda tinham certo preconceito. Nesse dia eu resolvi que faria uma ponte entre essas pessoas e os brechós”, afirma Mello.
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Fotos: Pâmela Mello
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EDITORIAL
Produção: Ana Carolina Oliveira
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Fotos: Gabriela Oliveira
P r o d u ç ã o l o c a l, d i v e r s i d a d e e feminismo
Conheça o coletivo “LasChicas” e o Projeto Crespura desenvolvido por mulheres do Vale do Paraíba
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Thamires Sena veste: Bata ciganinha, R$ 50, Linhรก: peรงas artesanais Cordรฃo com nรณ, R$ 39,90, Bila Black - Las Chicas Coletivo Calรงa, acervo pessoal
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Colar, R$ 55, MacramĂŞ Las Chicas Coletivo Blusa, acervo pessoal
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Bruna Dutra veste: Blusa, acervo Guarda-roupa Sustentável (Mara Débora) Brincos, R$ 35, Macramê - Las Chicas Coletivo
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Fernanda Waisman veste: Vestido, R$ 60, Linhá - peças artesanais Bolsa, R$ 95, Pluie Criações ambas Las Chicas Coletivo
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Yara Gariglio veste: Blusa, acervo pessoal Mochila, R$ 130, Pluie Criações Manuais - Las Chicas Coletivo
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Saia Midi, R$ 50, Linhá - peças artesanis Las Chicas Coletivo Sandálias, acervo pessoal
Colar, R$ 79,90, BilaBlack, Las Chicas Coletivo
Brincos, R$ 35, MacramĂŞ - Las Chicas Coletivo
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Heloisa Oliveira veste: Blusa, acervo pessoal Saia, R$ 45, Linhá peças artesanais Bolsa, R$ 95, Pluie Criações Manuais ambas Las Chicas Coletivo
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Heloísa Oliveira veste: Calça, acervo pessoal Bolsa, R$ 90, Pluie Criações artesanais Las Chicas Coletivo
Yara Gariglio veste: Saia, acervo pessoal Bolsa, R$ 55, Pluie Criações manuais - Las Chicas Coletivo
Fernanda Waisman veste: Blusa, acervo pessoal Colar, R$ 50, Macramê Las Chicas Coletivo
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Fernanda Waisman veste: Calça, acervo pessoal Bolsa e lenço, R$90, Pluie Criações manuais Las Chicas Coletivo
Thamires Sena veste: Blusa e calça, acervo pessoal Pochete, R$ 59, Pluie Criações Manuais
Gabriela Oliveira veste: Faixa, R$ 20, BilaBlack Las Chicas Coletivo
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Las Chicas Coletivo
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eis mulheres da região integram o Coletivo Las Chicas. Empreendedoras independentes de diferentes áreas da Moda, uniramse por meio de valores em comum como preocupação ambiental e consumo consciente para ampliarem seu espaço em um cenário capitalista tão competitivo. Juntas, auxiliam umas as outras e mostram a força união feminina. Siga: @laschicascoletivo
F
lávia Ramos é a responsável por trás da Bila Black. Formada em Engenharia Florestal, ela divide sua atividades na cidade de Taubaté com a marca de acessórios. Seus produtos representam a cultura afro e a luta feminista. Os principais produtos da marca são colares e brincos, além de representações da cultura negra. Acompanhe: @bila.black
A
Pluie Criações manuais é a marca de bolsas e acessórios da Carol. Horak. Ela já trabalhou com Comunicação e eventos, mas descobriu sua paixão pelo trabalho artesanal. Seu maior desejo é que suas produções conquistem diferentes lugares e façam parte da vida de muitos clientes. Suas peças variam desde sacolas, pochetes e mochilas. @pluie_criacoes
Vitoria Landi é a empreendera dona da marca de roupas e acessórios Linhá - peças artesanais. Estudante de fisioterapia, a jovem também administra seu negócio junto aos estudos. Seus produtos são marcados por estampas coloridas e tecidos fluidos. A marca, porém, é administrada a quatro mãos e ainda se divide na Linhá - macramê. A responsável pelas peças em fio encerado é a Ariane que desenvolve colares e brincos por suas habilidade manuais. Conheça: @linha.roupas e @linha. macrame
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P r o j e t o: C r e s p u r a
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Foto: Carolina Romeo de Medeiros
abriela Oliveira é estudante de jornalismo e fotógrafa responsável pelo Projeto Crespura, além de ser a responsável por assinar o editorial dessa edição. Seu projeto tem pouco mais de uma ano de existência, mas possui mais de 20 exposições em diferentes cidades da região. Natural de São Paulo, Gabriela atualmente reside em Taubaté e leva suas fotos por todo o Vale do Paraíba. A Crespura surgiu como um retrato de empoderamento e resistência aos cachos em meio à ditadura dos padrões da chapinha e do cabelo liso. O objetivo das imagens é contar histórias de mulheres, homens e crianças que aceitaram e amam a raiz crespa. O projeto ultrapassou os limites da exposição e hoje conta com blog com diferentes editorias. Gabriela também alisou suas madeixas por muitos anos e agora busca levantar sua voz, ou melhor, suas lentes em nome da liberdade do cabelo natural. O prõximo passo da jovem será a publicação de seu livro fotográfico como trabalho de conclusão de curso na Universidade de Taubaté.
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L i n h a, a g u l h a e t e c n o l o g i a
Redes sociais auxiliam no resgate da tradição artesanal Por Ana Carolina Oliveira
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onsiderada por muitos como uma atividade das vovós, o artesanato tem conquistado novos públicos por meio das redes sociais e canais de vídeos. O “Clube do Bordado” é um desses que ensina a mais de 20.000 inscritos os diferentes pontos da técnica. Seis mulheres integram o time: Amanda, Dini, Camila, Laís, Renata e Vanessa dividem as funções ad-
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ministrativas e criativas do Clube desde o início em 2013. Além das aulas virtuais, o grupo realiza cursos pelo país e comercializa materiais e produtos do universo do bordado. “Grande parte do público do Clube é formado de pessoas que tem entre 18-40 anos e não aprenderam a bordar com a mãe, avó, ou na escola (como acontecia na geração das nossas mães). Esse
conhecimento parou de ser passado e tivemos uma geração de pessoas que não sabiam realizar trabalhos manuais”, diz Laís que somente aprendeu a bordar aos 27 anos com outra participante do coletivo. Além da oportunidade de constituir uma nova renda, o trabalho artesanal ainda pode auxiliar como terapia, conhecimento cultural, já que cada região possui um estilo de bordar diferente, estimula a criatividade e também permite diferentes vínculos. Para o Clube, o artesanato também significa resistência e é fundamental para o homem. “O fazer manual é uma grande expressão do nosso tempo, que não é o tempo da máquina, do digital. Essa é uma conexão que se nós perdemos ficamos desamparados, doentes. Acho que é uma necessidade vital produzir algo com as mãos”, declara Laís. Por outro lado, as atividades manuais não são valorizadas o quanto deveriam. Tanto planejamento, tempo e trabalho à mão acabam sendo comparados ao valor de produção em escala industrial. “É bem complicado, as
pessoas ficaram “viciadas” em pagar um preço muito baixo que é insustentável a longo prazo. Acho que a valorização do artesanal está crescendo e ainda tem um longo caminho para percorrer”, lamenta a bordadeira. Feminismo Uma das maiores qualidades do artesanato é a possibilidade de personalização em meio a padrões das lojas de rede. No Instagram e em lojinhas virtuais, diversas marcas vendem suas produções feitas nos bastidores. Destacam-se marcas que retratam partes do corpo feminino e frases de luta do movimento feminista que estampa a força e liberdade sexual conquistada pela mulher. O próprio Clube desenvolveu a primeira coleção com tema erótico que proporcionou um impacto da tradição com a modernidade do século XXI. O retorno do bordado é, hoje, uma ressignificação do tempo, da customização e traduz essa nova transição do momento da moda.
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História do Bordado
A
tradição do bordado é, antes de tudo, memória. A atividade define um período histórico, permeia diversas gerações, é patrimônio material e forma identidade. Por ser algo manual e com poucos registros de pesquisaa, dificilmente se sabe todo o percurso das linhas até os dias atuais. A prática originalmente feita por mulheres também contribui a isso em um contexto que sempre apontou a superioridade masculina e se baseou em relatos do homem. Restam-se apenas alguns tecidos que sobreviveram a muitas décadas em determinados museus. A técnica possui finalidade estética e alguns documentos retratam que foi no século XIX que os primeiros pontos chegaram ao país vindos pelos europeus. Os italianos eram a principal referência da arte. No começo, o bordado era usado em objetos de uso doméstico e também como forma de diferenciação com a escrita de pequenas palavras. Além disso,
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como a educação feminina não era obrigatória, mulheres letradas alfabetizavam por meio das aulas de costura. Meninas e jovens mulheres aprendiam a dominar a linha e agulha desde cedo. O bordado também por muito tempo foi importante para as mulheres poderem ter uma independência ao fazerem sua própria renda ou terem autonomia para, ao menos no linho ou algodão branco, expressarem seus sentimentos e ideais. Já no século XX, foram criadas as primeiras máquinas, mas que necessitavam de conhecimento e prática para o manuseio. E, hoje, mesmo com o avanço da tecnologia, o manual e máquina possuem seus próprios espaços. Para se aprofundar um pouco mais nessa história, fica localizado em Belo Horizonte o “Museu do Bordado” que reúne peças coletivas de doadores que auxiliam a curadora Beth Lírio na recuperação dessa história.
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Moda Abolicionista -Prazer que aprisiona!!
Por Mara Débora
ocê segue padrões? Está presa a algum hábito? A moda te escraviza? Estes questionamentos me fizeram refletir sobre por que nos prendemos a padrões? Por que temos que espelhar em alguém ou em algo. Por que temos dificuldade em mirar nosso espelho e absorver nossa própria imagem? No momento que me vi livre de um hábito, percebi que havia criado uma nova moda: a Moda Abolicionista. Um paradoxo, afinal, seria algo a ser seguido - “Para um elo que se abre, há outro que se fecha”. E nesta corrente que é a vida, o prazer será sempre o elo que une a ação ao objetivo final. Como em uma corrida, em que, entre o primeiro e o ultimo passo, o que nos motiva é endorfina, o que recompensa é a serotonina e o que seduz é a dopamina. Não há prazer se não há recompensa. O que nos prende a um hábito é a certeza em que ele nos transforma. A desejada euforia nos leva a refazer, fazer novamente e de novo fazer aquilo que há pouco foi feito. A este elo viciante nos lançamos e, inconscientemente, como num filme de Almodóvar, imploramos: ata-me!
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E, assim, por muito tempo seguimos, inicialmente inebriados, por fim cegos, surdos e alienados. E de repente subjugados a referências, tendências, modelos, contextos, estereótipos, arquétipos, protótipos, paradigmas, paradoxos, esquemas! Somos presos e nos tornamos presas. Reféns de uma imagem qualquer, que não a nossa, que não verdadeira, porém fundamentada, jurada da mais vil recompensa: a imagem irreal da imagem retocada. Quantas de nós não compramos uma imagem em forma de roupa, uma silhueta incorporada em um vestido, um status por detrás de uma marca? E como não falar do padecimento em cima de um salto, do sufocamento de um justo traje, do congelamento de um longo de alça? São prazeres que aprisionam! E como libertar desta tirania? Declaro, então, a Moda Abolicionista!
FOTO: Divulgaçã Facebook
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Declaração dos Direitos da Moda Abolicionista
É direito de todos: - Buscar pelo prazer que liberta. - Abster-se daquilo que aprisiona, que torna obrigação e não promove contentamento. - Criar padrão de beleza próprio e transformar o olhar. - Encorajar-se para reverenciar ao próprio julgamento e silenciar opiniões alheias. - Amar o que é intrínseco e recusar o extrínseco. - Vestir a essência, contudo, calçar a decência. - Desfilar somente a sua essência. Se esta é sua bandeira, levante-a.
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