Roupa Desconhecida - o fetichismo da mercadoria como omissão dos fazeres

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Faculdade Santa Marcelina Bacharelado em Moda

Roupa Desconhecida: O fetichismo da mercadoria como omissĂŁo dos fazeres Ana Carolinna Gimenez

SĂŁo Paulo / 2018



Ana Carolinna Gimenez

Roupa Desconhecida: O fetichismo da mercadoria como omissão dos fazeres

Monografia apresentada à Faculdade Santa Marcelina como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Moda. Orientação: Profa. Ms. Simone Mina e Prof. Dr. Vinicius Saragiotto Magalhães.

São Paulo / 2018



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Agradecimentos

Me sinto muito sortuda quando observo minha trajetória

de vida até aqui. Sou muito grata às pessoas que compartilharam um pouco de si e de seu tempo comigo, assim me tornaram alguém melhor e fizeram este trabalho ser possível.

Agradeço muito à equipe Fernanda Yamamoto, por te-

rem me acolhido e me ensinado tanto; à minha avó Célia, cujo amor infinito foi capaz de me guiar durante todos estes anos de faculdade, sendo minha maior inspiração e me ajudando até o último segundo; aos meus pais, por segurarem a barra tantas vezes; ao Bruno por ser meu maior companheiro em tudo na vida e não ter desistido de mim durante estes quatro anos (risos); aos meus professores por acreditarem no meu potencial; e aos meus amigos, que fazem os momentos difíceis serem mais amenos.

Muito obrigada!




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Resumo

Relacionando a teoria marxista do Fetichismo da Mer-

cadoria com a moda, esta pesquisa propõe questionar a barreira entre cadeia têxtil e consumidor, que contribui para a omissão dos aspectos humanos em nossas roupas. Através de um panorama histórico da moda, observa-se que a fetichização de seus produtos sempre foi um aspecto importante para a manutenção de sua dinâmica de consumo, sendo levada até às últimas instâncias a partir do século XX, contribuindo para tornar a moda cada vez mais frívola, efêmera e antiética, assim, enfatizando a omissão dos fazeres. Este cenário servirá de inspiração para o desenvolvimento do trabalho, revelando um outro cenário coexistente, que repensa a moda e propõe um propósito maior a ela, que vai além do consumo. Logo, como síntese de tais ideias, a autora apresenta uma coleção de roupas, que narra os principais processos produtivos da cadeia têxtil, fazendo referência a vários elementos do fazer e como estes podem se unir para comunicar algo que é pouco transmitido aos consumidores, indagando sobre a falta de conhecimento das pessoas diante de suas roupas.

Palavras-chave: Fetichismo. Mercadoria. Consumo.

Cadeia Produtiva Têxtil. Sustentabilidade. Moda.


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Abstract

Establishing a relationship between the Marxist’s Mer-

chandise Fetishism and fashion this research proposes a debate about the barrier between textile chain and consumers which contributes with the omission of human aspect’s in our clothes. Through a fashion history panorama you can observe how product fetishism has always been an important aspect for maintaining dynamic consumerism and from the 20th century it has been taken to the last instances contributing to make fashion more and more frivolous, ephemeral and unethical, emphasizing the omission of actions. This scenario will serve as inspiration for the development of the work, reveling another coexisting scenario that rethinks fashion and proposes a greater purpose to it that goes beyond consumerism. Thus, as a synthesis of those ideas the author introduces a new clothes collection, which narrates the main productive processes of the textile chain, making a reference of the several elements of the doing and how they can come together and communicate something that isn’t displayed that much to consumers and also shows the lack of people’s knowledge about their clothes.

Keywords: Fetishism. Merchandise. Consumption. Textile Productive Chain. Sustainability. Fashion.


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Sumário

1

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Introdução

16

Fetichismo da mercadoria, moda e a roupa desconhecida

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1.1

O segredo da mercadoria – seu fetiche

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1.2

Moda e suas relações fetichistas

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1.3

Moda fetichismo da mercadoria: abismos entre criar, fazer e consumir

42

O cenário contemporâneo da moda diante da sustentabilidade

52

Metodologia

64

3.1

Estratégias de design

68

3.2

Inspirações e mapas mentais

72


13

3.3

Cartela de cores

86

3.4

Cartela de matérias

94

3.5

Bordados, estampas e maquetes têxteis

98

3.6

Estudo de formas e processos

104

3.7

Público-alvo

116

3.8

Line Up

120

Considerações Finais

136

Referências

140

Pessoas por trás deste trabalho

151




Introdução

Este trabalho tem como pretensão explorar

questionamentos a respeito do fetiche da mercadoria que ocasiona o desconhecimento diante dos processos e pessoas que fazem parte do processo produtivo das mercadorias de moda, junto à bibliografia de autores que explicam e exemplificam melhor estes fenômenos, para assim propor diálogos e novas vivências nos fazeres. Pensar sobre moda é algo visto como menos importante por muitos profissionais e estudantes da área, devido à lógica alienante e a valorização de modismos que geram lucro a esta cadeia econômica, perpetuando paradigmas. É indo na contramão deste pensamento que a autora resgata suas inquietações diante de alguns pontos da moda, para problematizar a normativa das relações do vestir e mostrar a importância do coletivo, da transparência e do conhecimento do processo produtivo das roupas.


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Durante suas vivências, dentro do ambiente de ateliê, percebeu a importância do todo durante a concepção do produto de moda, e foi no meio acadêmico que notou a falta de diálogo a respeito disso. Por mais que sejam ensinados os fazeres, o que é levado em consideração, na grande parte das vezes, é o produto final: como ele é especial, sedutor e convence o público consumidor de que deve ser adquirido.

O conceito marxista de fetiche da mercadoria (MARX, 2016) explora

a duplicidade do valor (de uso e de troca) dos objetos. Segundo Marx, a centralidade dada aos valores de troca propicia que relações sociais presentes na produção fiquem invisibilizadas, bem como as pessoas envolvidas em manufatura e consumo das mercadorias. Assim, o valor de troca se sobrepõe às relações de produção, que estão por trás das mercadorias, havendo uma inviabilização entre quem compra e quem faz. Neste contexto, pode-se notar que dentro do universo da moda não é diferente; seus produtos estão imersos em fetichismo, causando extrema falta de interesse e ausência de olhar diante da cadeia de produtores. Portanto, este trabalho propõe discutir consumo, sociedade e moda, trazendo questionamentos a respeito das pessoas envolvidas nos muitos processos produtivos dos artigos de moda, a fim de subverter seu feitiço. Dessa forma, trazendo à tona conhecimento a respeito das nossas roupas.

Todo este fetiche vem causando certo mal-estar com a “lógica” da

moda, sendo necessário repensar paradigmas de produção, desmistificando-os e questionando o papel do designer nesta possível moda em questão, em que há uma rede colaborativa de produtores, que tem sua importância tão reconhecida quanto a do estilista dentro do processo produtivo. Logo, é apresentada uma questão a ser debatida: “Como fazer o consumidor final reconhecer e conhecer os processos humanos por trás das roupas sem que o fetiche o aliene?“. A moda se encontra em constante atualização e sintonia


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com o contexto contemporâneo mundial, portanto, é necessário serem questionadas as formas conservadoras de se fazer moda, e qual o papel de cada contribuinte. A partir das vivências ao longo do projeto, poderão ser elaborados materiais gráficos que exponham informações a fim de conscientizar o consumidor, logo, dando maior visibilidade aos produtores e mostrando outros significados por trás das roupas que vestimos.

Através de pesquisas bibliográficas, foi constatado que o tema em

questão possui poucas publicações. O fetiche da mercadoria é um assunto que já foi bastante explorado pelas ciências sociais; entretanto, sob a ótica da moda, não; assim, acima de tudo, este estudo tem relevância acadêmica. Sua relevância, também, se dá no âmbito da sustentabilidade, por informar sobre a cadeia da moda, chamando atenção ao comércio justo e propondo, ao usuário, transparência a respeito das pessoas envolvidas nos vários processos, para a criação de uma peça. Assim, trazendo à tona o conceito de design pela empatia:

Ao estabelecer um relacionamento contínuo entre o usuário e a

roupa é muito provável que o usuário se preocupe, cuide da peça e valorize até o final de sua vida, dessa forma, reduzindo o impacto provocado pelo consumo. [...] O design pela empatia pede que você ouça as pessoas e as comunidades que estão envolvidas com seus designs e dê mais destaque a uma abordagem de design centrada no ser humano (GWILT, 2014, p.56).

A cadeia de produtores é extremamente ampla e complexa, mas,

muitas vezes, esta informação não chega ao consumidor final, fazendo com que a roupa seja apenas um objeto de consumo alienado; assim, todas as etapas que o antecedem são omitidas. Consequentemente, esta pesquisa busca homenagear o aspecto humano e social da cadeia têxtil, logo, dando devida importância ao assunto e criando diálogos. Desta forma, a moda,


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como “campo do saber”, exige constante reflexão a respeito de seus modos de fazer, produções criativas e significados; contudo, o estudo propõe um olhar crítico que repensa superestruturas dominantes da moda e o papel de seus contribuintes.

O objetivo principal deste trabalho é estudar a teoria do fetiche da

mercadoria de Marx (2016) e relacioná-la com a moda, a fim de entender melhor seus efeitos sobre o consumidor e a própria indústria. Além de refletir e propor questionamentos sobre o papel do designer contemporâneo, do consumidor e da roupa, através de um desfile com peças elaboradas para provocar diálogos.

A autora pretende confeccionar um conjunto de 7 looks, que contém

a história de vida da roupa, desde a concepção de sua fibra até o pós-consumo, expondo um olhar atento à cadeia têxtil, e dando protagonismo a seus trabalhadores, mostrando sua importância dentro de cada processo produtivo. Estas peças irão compor uma apresentação que trará diálogo entre a dualidade estética e simbólica das roupas, sendo vistas como um enorme campo exploratório de integração entre consumidor e produto, pois a roupa nunca se esgotará após ser adquirida por alguém. A roupa fala por si só. Para tal, será tido, como objeto de estudo e exemplo, o trabalho de designers consagrados como Martin Margiela e Yohji Yamamoto.

A metodologia de pesquisa adotada é qualitativa, pois abordará uma

pesquisa bibliográfica a respeito do fetiche da mercadoria, moda e cadeia têxtil. O tipo de pesquisa será de campo; serão visitados ateliês, lojas e espaços colaborativos de moda, a fim de se vivenciar moda em rede. Investigando através de vários meios a moda como rede colaborativa (coletivo), pesquisando mais sobre as visões que vêm surgindo a respeito do novo paradigma do estilista.

Por fim, não menos importante, espera-se que este trabalho possa


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servir de inspiração para outros estudantes e profissionais, para que possam questionar cada vez mais os paradigmas normativos do sistema da moda, procurando sempre propor melhorias a todos os colaboradores da cadeia têxtil. A moda é feita de gente; portanto, o coletivo é importante para que o resultado final chegue até o consumidor. É papel do profissional da moda deixar isto aparente, informando, a seu usuário, a respeito de todos os processos e pessoas envolvidas no produto que ele está adquirindo, valorizando ainda mais a roupa e criando laços afetivos com ela. Portanto, indo contra a lógica efêmera e consumista que a moda, hoje em dia, se encontra.


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1

Fetichismo da mercadoria, moda e a roupa desconhecida


Este primeiro capítu-

moda; e o terceiro, apresenta

lo está dividido em três sub-

a enorme cadeia de produtores

capítulos: o primeiro, explica

por trás da mercadoria, que fica

conceitos básicos da teoria

omitida pela noção de “gênio

marxista do fetiche da merca-

criador” concedida ao estilista,

doria, relacionando-o com a dando a falsa impressão de que ideia da alienação e a distinção os produtos de moda são fruto social através das vestimentas; do imaginário de uma única o segundo, relaciona a moda

pessoa, favorecendo sua mis-

com o fetichismo, mostran-

tificação.

do a dinâmica capitalista da



1.1 O segredo da mercadoria – seu fetiche

Em 1867, Karl Marx publicou sua principal obra: “O Capital” – uma

das leituras mais importantes para a atualidade, por interpretar o capitalismo e explicar ideias que englobam o âmbito do valor, mercadoria e capital. O fenômeno de acumulação do Capital é extremamente amplo, denso e vasto; portanto, nesta monografia será apenas abordada uma pequena parte contemplada no Volume I, primeira parte, tópico intitulado “O fetichismo da mercadoria: Seu segredo”. Este aspecto descrito pelo autor possui relação com a moda por “dar vida” a objetos inanimados como a roupa, por exemplo, em desfiles onde o vestuário é personagem principal, que seduz o espectador, através de sua estética, que parece falar por si só. A dinâmica do fetiche da mercadoria diante da moda será abordada com maior foco nos próximos tópicos.

É importante, primeiramente, conceituar a mercadoria; Marx diz

que “A riqueza das sociedades onde rege a produção capitalista configura-se em ‘imensa acumulação de mercadorias’, e a mercadoria, isoladamente considerada, é a forma elementar dessa riqueza” (2016, p.57). As mercadorias são criadas para atender às necessidades humanas, e seu uso muda ao longo da história, cabendo aos homens decidir como empregá-la. Elas possuem uma duplicidade por ao mesmo tempo possuírem utilidades, contemplando um valor de uso, e, também, serem veículo de valor; assim, valor de troca


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(MARX, 2016). Contudo, o valor depositado em cada mercadoria está diretamente relacionado à quantidade de trabalho humano realizado sobre elas.

Todo objeto é possuidor de um valor de uso, que se caracteriza como

um valor qualitativo, referente ao conteúdo material, sendo veículo material para o valor de troca. Seu nome faz referência à utilidade daquela coisa. O trabalho humano é um gerador de valores de uso, pois apenas com a elaboração humana de alguma matéria é possível criar produtos, sendo assim fundamental no mundo das mercadorias:

O trabalho, como criador de valores de uso, como trabalho útil,

é indispensável à existência do homem – quaisquer que sejam as formas de sociedade –, é necessidade natural e eterna de efetivar o intercâmbio material entre o homem e a natureza e, portanto, de manter a vida humana (MARX, 2016, p.64-65).

Portanto, a mão humana é mediadora de valores, criando o valor

de uso para que seja meio para o valor de troca. Este último confere intercâmbio entre coisas, podendo haver mudança conforme o tempo e espaço. Antigamente, era comum a prática de permuta entre mercadorias, logo, na atualidade, o valor de troca pode ser tido como o valor monetário. Quando o produto se reduz a valor de troca, há um ocultamento referente ao trabalho humano empregado naquele artigo, desaparecendo o caráter útil dos produtos do trabalho. O valor social das mercadorias sofre um ocultamento, assim provocando uma invisibilização dos muitos valores de uso que as compõem, eclipsando, consequentemente, o trabalho humano ali presente. Esse processo resulta na falsa impressão do produto possuir um valor intrínseco e próprio, alienando sua origem. Este fenômeno provoca um efeito misterioso sobre a consciência humana, atribuindo poder aos bens de consumo e dando origem ao que Marx denomina como Fetichismo da mercadoria.

Durante o processo de produção, a mercadoria ainda é matéria que

o produtor domina e transforma em objeto útil. Uma vez posta à venda no


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processo de circulação, a situação se inverte: o objeto domina o produtor. O criador perde o controle sobre sua criação e o destino dele passa a depender do movimento das coisas, que assumem poderes enigmáticos. Enquanto as coisas são animizadas e personificadas, o produtor se coisifica. Os homens vivem, então, num mundo de mercadorias, um mundo de fetiches. Mas o fetichismo da mercadoria se prolonga e amplifica no fetichismo do capital (MARX, 1996, p.33).

O processo criativo é algo complexo; a mente humana é capaz de

criar infinitamente, e para concretizar suas ideias, se utiliza do fazer manual para modificar matérias, ressignificando insumos. Até então, o homem ainda é detentor de sua criação; os inúmeros processos e pessoas por trás dos objetos são fundamentais: há uma relação social entre produtores e produtos. Entretanto, a partir do momento em que sua criação se transforma em mercadoria, assumindo um valor de troca, todas aquelas características sociais presentes são ocultadas, transmitindo ao consumidor apenas suas qualidades “mágicas”, que irão atender necessidades mundanas, contribuindo para sua felicidade material, gerando uma crença das mercadorias como figuras autônomas. Dessa forma, o trabalho humano é mera ferramenta para produzir coisas que possuem vida própria, que conversam com consumidores e os enfeitiçam.

Cada mercadoria é composta por um aglomerado de relações sociais

do mundo do trabalho, que interagem entre si direta ou indiretamente para elaborar a forma final do produto. Apesar de sua aparência única, o produto passa por diversas fases produtivas durante sua produção. Marx (2016) exemplifica tal dinâmica através do vestuário, afirmando que a ideia de que casaco, botas, etc. estabelecem relações com o linho através do trabalho humano, que causa estranheza no consumidor. Sendo assim, o tempo de trabalho social serve como forma de medida para a participação individual dos produtores em uma única peça1. Contudo, cada trabalho particular é somado e sua soma é convertida num trabalho humano homogêneo, termos 1

A partir daqui poderíamos desenvolver o conceito de mais-valia. Esta pesquisa, foca da na moda, não tem pretensão de entrar neste âmbito.


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do autor. É importante ressaltar que o valor monetário de cada mercadoria também contribui para dissimulá-la, pois mascara através de números a realidade social por trás daquele produto. Sendo assim, não é possível saber se os trabalhadores que despenderam horas de sua labuta foram devidamente remunerados.

Sintetizando, o autor retrata uma grande problemática no mundo

capitalista: o processo de dominação do homem pela mercadoria é algo tão natural na sociedade burguesa quanto o próprio trabalho produtivo. Assim, o ocultamento das relações entre os seres humanos é ignorado. Há um processo de alienação dos trabalhos manuais que compõem os objetos e essa alienação é dissimulada.

Base do processo social de dominação, as mercadorias são o

instrumento através do qual mantém sua hegemonia, apresentando-as como se estivessem num livre mercado. Mas a própria mercadoria detém o seu segredo, sendo, simultaneamente, enigma e chave para decifrá-lo (KANGUSSU, 2015, p.221).

A temática do fetichismo da mercadoria já despertava a preocupação

de Marx em outros escritos, como “Manuscritos Econômicos-Filosóficos de 1844” (1964), desenvolvida sob outra ótica, através da ideia da “alienação de si”, conceituada por Kangussu (2015) como “O processo de escavação de sentido, que atinge o ápice ao transformar quase tudo em mercadoria, começa através da alienação do indivíduo em relação a seu trabalho e culmina na reificação do homem e do mundo”. Não há reconhecimento do trabalhador por seu processo produtivo, assim como ele mesmo não reconhece aquilo que produz, dando origem a um objeto que é visto como um ser estranho (MARX, 1964), distante. Além da distância entre trabalhador e objeto, há uma objetificação do trabalho.

O fenômeno da alienação não só produz apatia do trabalhador diante

da mercadoria e do meio de produção, como também uma alienação social. Há uma estranheza diante de toda a cadeia produtiva: desde quem faz até quem compra. Desta forma, o sujeito alienado se deixa levar mais facilmente


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pelos feitiços da mercadoria, que, ao seduzir o consumidor, cria “necessidades consumistas” para reverter o efeito alienante de sua existência.

O ato de produção consome imediatamente as forças nele gastas,

enquanto o ato de consumir produz novas forças produtivas, pode-se dizer que produção é imediatamente consumo, e que consumo é imediatamente produção, i.e. cada qual é imediatamente seu contrário. Entretanto, cada um é mediador do outro, pois a produção cria objetos para o consumo e o consumo cria os sujeitos para os produtos. A produção fornece um objeto material à necessidade e uma necessidade ao objeto material, porque o consumo é mediado pelo objeto, na medida em que a percepção do objeto cria sua necessidade. A produção cria o consumo fornecendo-lhe material, determinando o modo de consumo (como por exemplo, o uso de talheres para comer), e criando a necessidade dos produtos e o impulso para consumi-los (como por exemplo, a moda). O consumo cria a produção porque o produto só é efetivo quando consumido, e o seu consumo cria a necessidade de nova produção, sendo assim o consumo é o pressuposto que move a produção (KANGUSSU, 2015, p.217).

Outros autores também escreveram sobre a teoria do fetichismo da

mercadoria, um deles é Walter Benjamin (apud Kangussu, 2015), em seu livro “Passagens” (2007). Ele enxerga na Moda muita proximidade com o conceito marxista de fetichismo, pois nela existe um desejo de distinção entre classes sociais, provocando a efemeridade daquilo que é vestido pelas classes superiores. Portanto, existe um fetichismo das roupas, mais especificamente da moda que se comporta como um fetiche de consumo de produtos e pertencimentos, relações e posições sociais, determinando novas normas de identificação. Nos dias de hoje, pode-se usar como exemplo desta dinâmica, o fenômeno brasileiro dos “rolezinhos”, que ficou famoso em 2014, onde adolescentes das periferias urbanas começaram a se reunir em shopping centers – muitas vezes de luxo –, frequentando espaços que antes não lhes pertenciam. Pinheiro-Machado e Scalco (2014) expõem que sua origem pode ser relacionada à “expansão do capitalismo” e isto ecoa no comportamento de consumo das periferias urbanas do mundo: os jovens


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passaram a venerar marcas globais, de forma a ostentá-las e criar um efeito de contraste com sua realidade socioeconômica. Sendo assim, a roupa possui fetiche, provocando nestes jovens um desejo de ascensão social através de suas vestimentas, consequentemente afirmando sua presença de forma a gerar contrastes na sociedade.

Esse assunto será desenvolvido no próximo tópico. A moda será nosso

objeto de estudo diante do legado de Marx, procurando refletir sobre os caminhos para a desmitificação do feitiço de suas mercadorias e as relações entre consumo, criação e paradigmas pré-estabelecidos pela sociedade capitalista contemporânea juntamente com a Moda. Vamos investigar a respeito da origem das nossas roupas, para que elas possam cada vez mais ser algo conhecido para seu produtor e consumidor, indo contra a alienação dos fazeres.


1.2 Moda e suas relações fetichistas

Ao caminhar pelas ruas todos os dias, podemos observar diversas

pessoas transitando, e se, de repente, alguma delas nos abordar, a primeira reação, inconscientemente, será avaliar como esta pessoa está vestida. As roupas retratam o que Marx (2016, p.95) chama de hieróglifos sociais, sustentando símbolos, que comunicam relações sociais identitárias. Ou seja, ao criar coisas que serão convertidas em valor, os homens também criam linguagens sociais que revelarão distinções e desigualdades. Portanto, vestir-se é um ato de significação. A Moda está presente em nossas sociedades desde sempre, devido à necessidade humana de estar se diferenciando perante ao outro, seja por suas vestimentas, costumes ou opiniões.

Deveras, segundo Marx, é pouco provável que jamais tenha

existido uma sociedade que não fosse, ao menos potencialmente, uma sociedade onde tivesse havido moda. Isto porque, para Marx, “a história de todas as sociedades que existiram até o presente é a história da luta de classes” (Marx e Engels 1992: 3). É uma frase muito complexa, que se refere a muitas questões e debates diferentes, mas uma das coisas que ela diz é que todas as sociedades têm sido sempre sociedades constituídas de classes diferentes. Todas, portanto, têm sido sociedades que usaram mudanças na indumentária para constituir e comunicar identidades de classe (BARNARD, 2003, p.149).


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Desta forma, a moda é responsável por estabelecer interpretações num

material bruto de significados. É possível perceber uma forte relação entre a Moda e a obra marxista, principalmente por dialogar com o capitalismo de forma tão direta. Observemos a etimologia da palavra fashion – tradução da palavra moda para a língua inglesa – e análise feita por Barnard: [...] remete ao latim factio, que significa fazendo ou fabricando [...]. Portanto, o sentido original de fashion se referia a atividades; fashion era algo que uma pessoa fazia, diferentemente de hoje, talvez, quando a empregamos no sentido de algo que usamos. O sentido original de fashion refere-se também à ideia de fetiche, ou de objetos que são fetiches, uma vez que factere é também raiz da palavra fetiche. E pode bem ser que os itens de moda e indumentária sejam os produtos mais fetichizados entre os fabricados e consumidos pela sociedade capitalista (BARNARD, 2003, p.23).

Esta noção da fetichização das roupas pode ser percebida através da

história da Moda, onde, desde seu principio, houve a adoração e sedução da novidade, sendo traduzidas pelas dinâmicas sociais entre classes, que valorizavam produtos a fim de se vangloriarem. A princípio, só foi possível reconhecer a Moda como sistema, no final da Idade Média (Lipovetsky, 2009), quando a alta sociedade produz uma renovação constante de suas vestimentas, exibindo exageros e fantasias, dialogando com uma quebra de tradições imutáveis; assim, cultuando as novidades trazidas do estrangeiro através das expedições realizadas na época. Foi-se estabelecendo um novo valor social: o êxtase pelo presente. Porém, mais do que isso, surge um processo de diferenciação exercido pela alta sociedade, que produz uma autoafirmação da diferença, satisfazendo sua necessidade de conectar-se a determinada camada social e, assim, uma satisfação no pertencimento de iguais. A distinção sozinha não faz a moda, é necessário um comburente para este combustível: a imitação, fruto de uma vontade pela novidade e por mudança, como um novo valor social.


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[...] é em razão do desejo dos indivíduos de assemelhar-se àqueles que são considerados superiores, aqueles que brilham pelo prestígio e pela posição, que os decretos da moda conseguem propagar-se: no coração da difusão de moda, o mimetismo do desejo e dos comportamentos, mimetismo que, nos séculos aristocráticos e até uma data recente, propagou-se essencialmente de cima para baixo, do superior ao inferior, como já o formulava G. de Tarde. Tal foi a marcha das ondas de imitação: enquanto a corte tem os olhos fixados no rei e nos grandes senhores, a cidade toma exemplo nos modelos em vigor na corte e na nobreza. A difusão de moda foi menos uma forma de coação social do que um instrumento de representação e de afirmação sociais, menos um tipo de controle coletivo do que um signo de pretensão social (LIPOVETSKY, 2009, p.36).

Tudo isso pode caracterizar os primeiros traços da dinâmica da

moda na história da humanidade moderna. A roupa é representada por uma vontade psicológica do indivíduo em ser visto e percebido diante do olhar do outro, sendo um atrativo. Seu “poder mágico” se estabelece através da ideia de diferença, em que ao vestir aquela peça, haverá uma nova percepção diante do sujeito que a veste. Entretanto, o fetiche transmitido pela mercadoria apenas é validado através da interação entre indivíduo, roupa e contexto; logo, “o significado de um objeto é derivado daqueles atributos e características de desempenho que os indivíduos acreditam que o objeto possua” (MIRANDA, 2008, p.32-33).

A partir da segunda metade do século XIX, a Moda começa a con-

figurar-se de uma outra maneira, mais consolidada e organizada, entrando numa nova fase, intitulada como “Moda de Cem Anos” por Lipovestky. Com o crescimento do capitalismo industrial, a moda moderna vai se estruturando em um novo formato bipolar: em que de um lado há a Alta Costura – que cria roupas luxuosas e sob medida – e de outro, a confecção industrial – produzindo roupas massificadas, baratas, e que levam para as camadas mais baixas da sociedade suas versões dos modelos produzidos pela moda luxuosa. “[...]a Alta Costura monopoliza a inovação, lança a tendência do ano; a confecção e as outras indústrias seguem, inspiram-se nela


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mais ou menos de perto, com mais ou menos atraso, de qualquer modo a preços incomparáveis” (LIPOVETSKY, 2009, p.80). Novamente, uma nova dinâmica começa a surgir: a democratização da moda, que leva informação ao vestuário de classes menos abastadas, porém a diferenciação das altas classes continuou assegurada.

A democratização da moda não significa uniformização ou igualação

do parecer; novos signos mais sutis e mais nuançados, especialmente de griffes, de cortes, de tecidos, continuaram a assegurar as funções de distinção e de excelência social[...]. A moda de cem anos não eliminou os signos da posição social; atenuou-os, promovendo pontos de referência que valorizam mais os atributos mais pessoais: magreza, juventude, sex appeal etc. (LIPOVETSKY, 2009, p.87).

A Moda de Cem Anos foi responsável por democratizar o desejo de

Moda, que antes era privilégio da aristocracia, difundindo a valorização das novidades e reconfigurando as ambições das massas. A Alta Costura teve um papel essencial, através da forma como divulgava suas criações, por meio de revistas, celebridades e coleções sazonais, tornando a moda um “imperativo categórico”, preparando as massas para o código da moda (Lipovetsky, 2009, p.90). Outro ponto importante inaugurado pela Alta Costura, foi a comercialização de modelos através de desfiles espetáculos; “ao lado dos grandes magazines, das “galerias” parisienses, das exposições universais, uma tática de ponta do comércio moderno fundada na teatralização da mercadoria, no reclame feérico, na solicitação do desejo” (LIPOVETSKY, 2009, p.110-111). Consequentemente, o vestuário é ainda mais fetichizado, colocando os modelos desfilados em uma posição mística, estimulando sua compra e tornando-o uma figura autônoma de desejo. “[...]a sedução opera pela embriaguez da mudança, pela multiplicação dos protótipos e pela possibilidade da escolha individual” (LIPOVETSKY, 2009, p.110-111). Um exemplo interessante de uma publicidade da época, que foi analisado por Faurschou (apud Barnard, 2003), é o do espartilho de “Dowager”:


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O anúncio é adequado, de modo

especial à análise geral de Faurschou desse período do marketing capitalista. Ele enfatiza “a habilidade artesanal, valores e gostos tradicionais que eram importantes para a economia social de prestígio e distinção de classe” (Faurschou 1988: 80). Pode-se ainda observar que a moda está aqui sendo vendida principalmente pela força de sua utilidade, seu valor de “uso”: o fato de que os espartilhos funcionarão, e funcionarão por longo tempo, são aspectos do produto que estão sendo usados para vende-lo. No anúncio faz-se ainda referência ao valor de ‘troca”: os espartilhos são definidos em termos do que uma pessoa teria de trocar para obFigura 1 – “Propaganda do espartilho Royal Worcester, século XIX”

tê-los. Faurschou resume: “no início do século XX, os objetos modernistas ainda retinham alguma capacidade para um

investimento simbólico, seja o do valor de uso, de prestígio ou da expressão da identidade”; havia uma conexão confiável entre o produto e o seu significado, mesmo se este estivesse ligado à classe, gênero, prestígio ou ao uso para o qual o item seria destinado (Faurschou 1988: 81) (BARNARD, 2003, p.222).

É interessante notar que, por mais que o intuito era vender aquele

produto fetichizado, ainda assim, o publicitário se atentava em exibir características que estavam diretamente ligadas ao seu valor de uso; porém, cada vez mais vão sendo ocultadas pela mídia, afim de persuadir o consumidor por outros meios. A massificação dos produtos contribui para tal. Barnard expõe isto comparando a modernidade e a pós-modernidade, a fim de pontuar como, na primeira, o produto era concebido em “termos de produção” e, na segunda, é concebido em “termos de consumo”.


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Somente no século XX, em meados da década de 1950, a moda começa

a mudar seu sistema mais uma vez. Mas, a Moda de Cem Anos possui um papel importante para esta nova fase, pois instituiu “[...]uma produção burocrática orquestrada por criadores profissionais, uma lógica industrial serial, coleções sazonais, desfiles de manequins com fim publicitário” (LIPOVETSKY, 2009, p.123). O surgimento do prêt-à-porter foi um caminho sem volta para a moda, por fabricar roupas acessíveis, com informação de moda atualizada, de forma a não copiar a Alta Costura, mas sim produzir seus próprios modelos. Esta nova forma industrial de moda introduz roupas em larga escala com uma estética mais jovial, desenvolvidos por novos estilistas em ascensão, democratizando por inteira a moda para as massas.

Após a Segunda Guerra Mundial, o desejo de moda expandiu-se

com força, tornou-se um fenômeno geral, que diz respeito a todas as camadas da sociedade. Na raiz do prêt-à-porter, há essa democratização última dos gostos de moda trazida pelos ideais individualistas, pela multiplicação das revistas femininas e pelo cinema, mas também pela vontade de viver no presente estimulada pela nova cultura hedonista de massa (LIPOVETSKY, 2009, p.132).

Assim a sociedade pós-moderna começa a se estabelecer, de forma

a supervalorizar o consumo e as marcas, dirigindo-se ao desejo perpétuo pela novidade e diferenciação de sua identidade. “[...]a moda tornou-se a mercadoria par excellence” (FAURSCHOU apud BARNARD, 2003, p.226). Esta nova fase da moda é nomeada como “moda aberta” por Lipovetsky, sendo caracterizada como essencialmente hedonista, em que há o impulso de compra de vestuário sempre relacionada com o desejo de sedução do Outro e de “mudança de pele”, ou seja, existe sempre a vontade de exercer uma outra personalidade através da roupa, que por possuir poderes mágicos irá lhe conceder esta nova identidade para, assim, poder seduzir o seu semelhante. Portanto, Miranda (2008) afirma que as pessoas compram produtos por conta de seus significados pessoais e sociais, aliados aos funcionais, consolidando símbolos; e, para que eles existam, são necessários ao


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menos dois participantes neste diálogo social: “o possuidor do símbolo (o desejo de um consumidor em expressar sua identidade aos outros mediante a exibição de símbolos) e o observador do símbolo (outro indivíduo ao qual o consumidor deseja comunicar sua identidade)” (MIRANDA, 2008, p.29). Os símbolos servem como comunicadores de autoimagens sociais, numa realidade em que o indivíduo está inserido.

E, por fim, chegamos à etapa atual da moda, chamada por Lipovetsky

de “Moda Consumada”, por se tratar de uma época explosiva, de excessos e extremos, onde todas as classes sociais têm poder de consumo e compartilham da mesma paixão pela efemeridade. A moda agora se tornou imersiva: todos os âmbitos do consumo se tornaram fugazes e levaram o fetichismo da mercadoria ao extremo, através da obsolescência programada de seus produtos. Ao levar design para a indústria, os produtos tornam-se mais atrativos e charmosos, mas para que estes produtos tenham rotatividade, e abram espaço para novos produtos, produz-se peças com baixa qualidade, focando apenas na momentaneidade daquela compra. A consequência da voracidade do consumo pouco importa para os compradores, o importante é estar na moda, possuir uma roupa que irá sustentar a identidade desejada.

Sedução fria, unívoca, modernista, após a teatralidade caprichosa

e ornamental. Com o design, o mundo dos objetos se desprende da referência ao passado, põe fim a tudo que pertence a uma memória coletiva para não ser mais que uma presença hiperatual. [...]. O objeto design aparece sem raiz, não induz nenhum mergulho em um imaginário alegórico e mitológico, mas oferece-se numa espécie de presença absoluta sem apontar para alguma coisa que não ele mesmo, sem outra temporalidade que não o presente. Mostra-se no aqui e no agora; seu atrativo se sustenta nessa carga de modernidade pura que o constitui e que ele legitima. Hostil ao fútil, o design é, no entanto, sustentado pela mesma lógica temporal da moda — a do contemporâneo; ele aparece como uma das figuras da soberania do presente (LIPOVETSKY, 2009, p.194-195).


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Neste sentido, as marcas de moda são responsáveis por venderem

símbolos de pertencimento e lifestyles para seus clientes, facilitando o processo de comunicação social, “[...]. Esta capacidade simbólica que transforma a marca em mito, fazendo com que o consumidor não compre o objeto em si, mas a sua narrativa” (MIRANDA, 2008, p.110). O culto às marcas pode exemplificar a teoria do fetiche da mercadoria, por colocar estas empresas num patamar mitológico, em que são as provedoras de mercadorias mágicas que transferem qualidades e status a quem as adquire; dessa forma, omitindo as relações sociais por trás destes produtos, dando-lhes a falsa impressão de terem “surgido” na loja, quando na realidade, são fontes da manipulação humana. Essa lógica é ainda mais intensificada com o artifício da publicidade, que cria um cenário imaginário para as mercadorias, as espetacularizando.

A publicidade tem por tarefa divulgar as características deste ou

daquele produto e promover-lhe a venda. Ela pode ser encarada, ao mesmo tempo, como artifício de consumo e manifestação de certa cultura. Em verdade, a demonstração do produto não guia o movimento do consumidor pela adoção do objeto de consumo apresentado; ela serve para racionalizar a compra que de qualquer maneira precede ou ultrapassa os motivos racionais; “Qualquer objeto será considerado mau enquanto não resolver esta culpabilidade de não saber o que quero ou o que sou” (BRAUDRILLARD, 1973, p.180). Essa capacidade de significar para os outros mediante a posse de objetos passa a ser de tal importância que Baudrillard (1972) rejeita a ideia de que o consumo tenha alguma coisa a ver com necessidades, usos ou utilidades e afirma que os consumidores são manipulados pelas campanhas publicitárias, que o consumidor busca se transformar naquilo que compra. Outra vertente de pensamento é a de Bourdieu (1984) que afirma que nós consumimos de acordo com quem somos (MIRANDA, 2008, p.41).

É possível observar a presença de significado nos produtos de moda

na publicidade através da atribuição de personalidades em suas propagandas, transcendendo o valor de uso das mercadorias, afirmando símbolos e status. É o caso de marcas de luxo que atribuem sua imagem a celebridades em anúncios de perfumes. Por exemplo, nesta peça publicitária, de 2017,


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do perfume 212 VIP Rosé da marca de ready-to-wear2 americana, Carolina Herrera, que usa como garota propaganda a topmodel brasileira, Gisele Bündchen, que claramente é um símbolo de status e isso se solidifica com a frase “Are you on the list?”3, ou seja, perguntando ao consumidor se ele é tão “VIP”4 quanto a moça. Desta forma, induz à compra de um produto fetichizado – o perfume – que transmitirá seus poderes ao usuário, deixando-o tão importante quanto Gisele. Portanto, a publicidade é uma ferramenta de fetichização para a moda.

A publicidade e a moda juntas

prometem beleza e sedução. Os anúncios de moda utilizam as necessidades e desejos de seu público-alvo para a construção de uma linguagem específica, que comunica e afirma que a utilização de tal marca trará benefícios que o consumidor deseja possuir (MIRANDA, 2008, p.47-48).

Ao longo da história da

Moda podemos observar as diversas manifestações entre a roupa e seu fetiche, provocados pela alienação do sujeito, que se entrega aos desejos criados pelas Figura 2 – Publicidade do perfume 212 VIP Rosé 2017 de Carolina Herrera com a modelo brasileira Gisele Bundchen

mercadorias, assim, perpetuando um ciclo de consumo, movendo a dinâmica frívola da moda. Enfim, será possível subverter tal feitiço a fim de haver um consumo mais consciente?

2

Tradução de Prêt-à-porter para o inglês.

3

Você está na lista?

4

Very Important People


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A autora procura responder esta questão através do processo de

conhecimento das roupas, sendo protagonista essa “roupa desconhecida” que pouco conta sobre sua história e sua origem, colocando em foco o valor de uso em evidência, ou seja, as relações humanas que compõem as mercadorias. Este assunto será abordado no próximo tópico, procurando caminhos para uma moda mais transparente.


1.3 Moda e fetichismo da mercadoria: abismos entre criar, fazer e consumir

O produto de moda provoca desejos no consumidor, evocando uma

vontade por consumir um artefato em troca de status, pertencimento, identidade, etc. Contudo, podemos observar um ponto curioso em questão: muito se fala em produtos com benefícios e significados, porém pouco se fala a respeito do quê está nos bastidores destes objetos. Resumindo, o item de moda, para chegar até o comprador, passa por diversos processos, afazeres e pessoas, que, em boa parte, não é apresentada e identificada, gerando uma omissão da cadeia de moda, intensificada pelo fetichismo da mercadoria.

Sabrá (2016) também identifica tal problemática, propondo uma

questão a ser respondida: “como identificar com clareza e objetividade a influência dos diversos agentes sociais envolvidos no que normalmente chamamos de processo criativo do desenvolvimento de produtos desta cadeia?” (p.24). Muito desta omissão se dá pela noção de um processo criativo individual concebido pelo estilista ou designer de moda, que carrega o nome de uma marca, e suas criações são tidas como algo genial puramente elaborado por ele. Logo, não se torna clara a interdependência de vários agentes sociais para o surgimento de uma peça e sua posição no coletivo, sendo assim, um processo criativo amplo, subordinado e coletivo.


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Enfatizando o que já foi dito em tópicos anteriores, a roupa seduz a

quem se identifica com símbolos presentes nela; quando isto é aliado à ideia da genialidade do criador, intensifica-se a noção de que uma única pessoa consegue traduzir os anseios e vontades do consumidor num produto final; mas, quando damos luz ao que realmente acontece no processo criativo, é possível observar que: [...]diferentes práticas envolviam vários setores e interferiam, direta e indiretamente, na criação, no desenvolvimento, na produção e na distribuição de objetos têxteis. O consumo desses objetos orienta, muitas vezes, as decisões dos empreendedores e, em consequência, influencia o momento primeiro (criação), normalmente associado apenas ao criador único, o designer, o estilista, ou qualquer outra denominação similar codificada por esse contexto (SABRÁ, 2016, p.20).

Assim, a criação está subordinada a outros aspectos, como análise de

vendas anteriores da marca – o que foi bem recebido pelos consumidores –, o que está sendo pesquisado pelas agências de tendências, quais são os materiais disponíveis pelos fornecedores de tecido, e, até mesmo, aproximando de um contexto contemporâneo, o que está sendo falado nas redes sociais. A noção de cadeia de moda, que temos hoje em dia, tem sua origem na Moda de Cem Anos, com o surgimento das casas de Alta Costura, que deram um novo olhar a quem desenhava roupas, havendo uma valorização dos ofícios de moda:

A nova vocação do costureiro foi acompanhada por uma extraor-

dinária promoção social. Sob o Antigo Regime, alfaiates e costureiras eram personagens anônimos relegados à esfera inferior das “artes mecânicas”; seus nomes, nos opúsculos e textos que ecoam de perto ou de longe a moda, quase nunca eram consignados. As novidades em voga levavam, então, o nome do grande personagem, do nobre, que lançara tal ou tal moda. A mudança sobrevém no século XIX e sobretudo com Worth5: a partir desse

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O autor se refere a Charles Frederick Worth, apelidado como “pai da Alta Costura” e criador dos desfiles de moda.


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momento, o costureiro vai gozar de um prestígio inaudito, é reconhecido como um poeta, seu nome é celebrado nas revistas de moda, aparece nos romances com os traços do esteta, árbitro inconteste da elegância; como as de um pintor, suas obras são assinadas e protegidas pela lei (LIPOVETSKY, 2009, p.94-95).

Surge a noção de genialidade do criador de moda, que trabalha junto

aos outros agentes da moda, mas quem recebe a glorificação pela peça é ele. Antes, o alfaiate, a costureira, o comerciante de moda, etc trabalhavam em ligação direta com o cliente, que orientava seu gosto e preferências aos profissionais. Já com a Alta Costura, o cliente vai até o criador autônomo, em busca de modelos originais, concebidos a partir da “inspiração” e bom gosto, não precisando mais elaborar suas roupas, e, sim, comprá-las prontas. Lipovetsky (2009, p.108) chama atenção para o “aparecimento de novas formas de gestão e dominação que podemos chamar de burocráticas”, através da Alta Costura, elaborando uma nova ordem social do trabalho, que separa os poderes, propondo uma “disjunção sistemática das funções de direção e de execução, de concepção e de fabricação”. É interessante notar como esta lógica burocrática influenciou até na disposição arquitetônica das casas localizadas, as maisons, estruturadas de forma piramidal: no andar de cima, ficava o atelier de criação, onde o “estilista” trabalhava; e, nos andares debaixo, ficavam as oficinas com tarefas mais mecânicas, como corte e costura, além do que, dentro das próprias oficinas, “haviam índices hierarquizados (‘primeira’, ‘segunda de oficina’, primeira e segunda contramestras, ajudante, aprendiz)” (LIPOVETSKY, 2009, p.109). Essa dinâmica se reflete até os dias de hoje, não de forma tão explícita, mas o criador está considerado num patamar mais elevado do que o resto da equipe.

Quando a moda evolui para uma nova ordem sistemática, denomi-

nada Moda Aberta, instaurando o prêt-à-porter, e havendo um aperfeiçoamento tecnológico da indústria do vestuário, o estilista se vê num novo paradigma. Agora, sua função é democratizar estilos em escala industrial, levando informação de moda para um vasto público, por preços acessíveis, colocando em xeque a ideia de criações exclusivas e sob medida. Mas isso


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não diminuiu a ideia de gênio criador; apenas abriu espaço para que novos estilistas surgissem, agregando criatividade e personalidade ao vestir. Sendo assim, o prêt-à-porter se torna um grande sucesso, delimitando ainda mais o sistema de moda que até hoje prevalece.

Desde a Moda de Cem Anos, até os dias de hoje, os desfiles de moda

são usados como publicidade para marcas, tornando-se cada vez mais famosos, e fazendo parte de um momento chave onde são exibidas elaborações “geniais” dos criadores de moda. Sendo assim, a apresentação dos produtos é o ápice do fetichismo da mercadoria, onde a moda reserva espaço para enfeitiçar o espectador e glorificar aquele objeto único, exclusivo e autônomo. Porém, pouco é revelado a respeito dos processos envolvidos para que aquela coleção de moda seja desfilada; muitas pessoas despendem horas infindáveis de trabalho para que tudo esteja pronto no tempo previsto. A passarela desfoca o coletivo e enfatiza o individual, “mitificando a concepção, construção e distribuição dos objetos de vestuário” (SABRÁ, 2016, p.27). É importante ressaltar que toda moda só se concretiza através da aceitação, tanto interna quanto externa à cadeia de moda, e os desfiles podem ser uma ferramenta de divulgação, ou seja: [...]cabe julgar se os produtos eleitos atendem aos valores estabelecidos por jornalistas de moda, revistas do setor, blogs, compradores, consumidores, entre outros; podemos considerar que, de certa forma, todos esses atores parecem estar acima dos próprios agentes envolvidos com a produção dos objetos têxteis, validando, legitimando e consagrando os objetos produzidos e seus criadores (SABRÁ, 2016, p.34).

A moda se movimenta de forma rápida e imponente, vivendo do ci-

clo de renovação, aceitação e desgaste de seus produtos, para que o “novo” seja sempre introduzido aos consumidores. Nos dias atuais, a dinâmica de concepção de um novo artigo de moda se dá desta forma: através de um diálogo constante entre a indústria e o público-alvo, envolvendo uma série de pessoas e setores para que novas modas sejam percebidas, criadas e esquecidas, para que outras surjam. Basicamente, no primeiro estágio – de


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renovação –, os pesquisadores de tendências percebem um novo interesse vindo dos consumidores, que pode ser revertido em um produto; logo, isto é introduzido às empresas, que transmitem aos seus estilistas esta novidade, para que traduzam tal interesse em mercadoria, para que uma pequena parcela da cadeia possa produzi-la. No segundo, a peça já foi lançada no mercado; acontece o estágio de aceitação, onde a mídia – contemplada por jornalistas, revistas, redes sociais, compradores, influenciadores num geral – legitima aquela moda, influenciando consumidores no geral, para que exista um desejo por imitar o que encontram em seus veículos de comunicação, e, assim, possa ser democratizada, sendo produzida em maiores quantidades, tornando-se popular. E por fim, o terceiro estágio – de desgaste –, os consumidores começam a receber outros estímulos, de forma a surgirem outros interesses e desejos, para que a cadeia de moda renove seus produtos. Portanto, é possível perceber a grande complexidade da cadeia de moda, na qual o estilista sozinho não faz a moda acontecer, é preciso muitos colaboradores, e até mesmo a participação do consumidor para consagrá-la.

É um engano concebermos que esse criador, dito principal, é

único, tendo em vista que ele só se constitui quando os que o cercam lhe prestam serviço e assessoria e, consequentemente, constroem o produto final – ou seja, estão inseridos no processo criativo, no qual também figuram como componentes. Entretanto, um produto da cadeia têxtil, segmentado no vestuário, enquadrado e dito como produto de moda, só será reconhecido pelo mercado quando for notoriamente aclamado pelo meio que o constitui. Este meio considera o designer de vestuário um gênio, porém este só alcança tal classificação quando auxiliado pelas cadeias produtivas que o cercam e pelos agentes que atuam direta ou indiretamente na constituição de um novo produto, tanto para uma coleção quanto para uma série exclusiva. Parece contraditório valorizar a mitificação e endeusamento de tais criadores, sem considerarmos todos os envolvidos no processo de criação, desenvolvimento e produção de outras cadeias que a influenciam direta ou indiretamente (SABRÁ, 2016, p.27).


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Sendo assim, é um equívoco considerar o produto da cadeia têxtil

como algo concebido apenas da criatividade de um criador; é preciso observar com atenção esta indústria que envolve tantas práticas, de forma direta ou indireta, suas mercadorias. Entre elas podemos identificar a “produção; distribuição; divulgação; consagração; legitimação do produto e de seus produtores” (SABRÁ, 2016, p.44). Esta mitificação dos produtos de vestuário também tem uma correlação com o trabalho dos agentes de moda, envolvidos nos processos de comunicação, distribuição e recepção, devido ao fato de transmitirem ao consumidor uma supervalorização do gênio e de sua criação, que dialoga com valores ou referências simbólicas de uma época.

Essa temporalidade decorre do valor de uso, travestido ou dis-

simulado em valor de troca, para atender a uma necessidade objetiva ou subjetiva. O produto marcado pela temporalidade está conectado a um universo simbólico — cor, fibra, textura, forma, aviamento, acabamento, estampa, tecnologia — e sistematicamente ligado à sociedade de um período histórico qualquer (SABRÁ, 2016, p.33).

Como mencionou Sabrá na citação acima, os produtos estão marcados

por sua temporalidade que se conecta ao universo simbólico da sociedade de um período, e nestes símbolos estão contempladas as materialidades que compõem o produto de moda, que são escolhas feitas pelo designer na hora da concepção da peça, mas estas escolhas só são possíveis se o restante da cadeia têxtil, que fornecem tais materiais e tecnologias, trabalharem em conjunto com ele. Após serem escolhidas as matérias-primas e os primeiros croquis serem desenhados, o desenvolvimento do produto começa a ser feito: a modelagem é elaborada, o tecido é cortado, as partes são costuradas e os aviamentos pregados; aí nasce a peça piloto. Caso a pilotagem seja aprovada, parte-se para a peça final, quando se repete as etapas de corte e costura; aí, sim, o produto pode ser finalizado e apresentado para o público. Nesta etapa, entram os influenciadores, que irão introduzir a mercadoria aos consumidores, e haverá, ou não, sua aceitação, para daí repetir-se novamente, visualizando o desgaste daquela moda. Mas, afinal, quem são estas


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pessoas envolvidas neste grande processo? Nas palavras de Sabrá: [...]. A concepção, a construção e a entrega de um produto de vestuário dependem diretamente de inúmeros agentes sociais, muitas vezes esquecidos, não percebidos, e até nem reconhecidos. Entre estes últimos figuram várias categorias: desde os que preparam a terra para o plantio, na cadeia técnica agrícola da produção dos insumos para a cadeia têxtil, como os produtores de algodão; passando por agricultores, pesquisadores e técnicos responsáveis pelo desenvolvimento de tecnologia para o aumento da escala de produção; até os técnicos e trabalhadores diretamente envolvidos com a produção, tanto artesanal quanto industrial, desses produtos de vestuário. Incluem-se nesse quadro: plantadores; operadores de máquinas plantadeiras; colheiteiros; operadores de máquinas colheitadeiras; além de engenheiros e técnicos têxteis; tecelões; engenheiros e técnicos químicos; estampadores; engenheiros e técnicos em produção; técnicos em confecção; tecnólogos e técnicos em produção de vestuário; modalistas; coloristas; costureiras; pilotistas; passadeiras; arrematadeiras; bordadeiras; estoquistas, entre outros. Além destes, também podemos levar em conta os agentes que, embora pertençam a outras cadeias de produção, também vêm a contribuir para que o produto de vestuário seja entregue ao usuário final. Um designer gráfico, por exemplo, aparentemente não atua dentro da cadeia têxtil, mas, quando desenvolve a identidade visual para determinada marca de roupa, seja esta de alta-costura ou de “modinha’, ou quando desenvolve uma embalagem para esta marca, contribui para o processo e interfere na distribuição e divulgação deste produto têxtil (SABRÁ, 2016, p.32).

A cadeia têxtil trabalha de forma integrada, havendo vários pequenos

núcleos que colaboram entre si, em busca de um único objetivo: levar ao consumidor final um produto de moda. Para que esta mercadoria seja bem-sucedida, é necessário “o reconhecimento constante do público a que se destina o objeto desenvolvido”, levando em consideração que a sociedade influi diretamente nas decisões destes indivíduos, ou seja, os produtos de moda devem conversar diretamente com os desejos de seus usuários, a fim de proporcionar a noção de pertencimento à sociedade que desejam adequar-se, afinal, as mercadorias são elementos sociais. “O produto in-


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dustrial muitas vezes é constituído ao mesmo tempo que se produz sua demanda, sua tendência ou seu desejo” (SABRÁ, 2016, p.56). Vale a pena resgatar a ideia de Kangussu (2015), já mencionada no tópico 1.1, de que “a produção cria objetos para o consumo e o consumo cria os sujeitos para os produtos” (p.217), logo, ao mesmo tempo em que a indústria da moda analisa os anseios e desejos dos consumidores, ela também cria o próprio consumo. A alienação social conserva o ritmo constante da moda, não há porquê conceber novos produtos se não existe uma demanda.

Sendo assim, o consumidor final é parte importantíssima da vida

de um artefato, pois a partir do momento em que o produto não pertence mais a quem o produziu, ele se torna parte do universo pessoal de cada indivíduo, partindo para uma nova fase de sua vida-útil: o consumo. Até que, por fim, caia em obsolescência, surgindo uma outra problemática da cadeia têxtil: o pós-consumo. O fetichismo da mercadoria pode acarretar num consumo frívolo e que rapidamente se esgota, de forma a haver o consumo pelo consumo; a questão pendente é: será que, caso haja um diálogo entre a cadeia têxtil e o usuário, ocorrerá uma maior desmistificação do produto de moda? A roupa se tornando menos desconhecida influenciará na decisão de compra e no relacionamento entre consumidor e peça?

Podemos observar que o endeusamento do criador, durante a história

da moda até os dias de hoje, acarretou na frivolidade dos produtos de moda, tornando-os cada vez mais produtos desconhecidos, que não criam conexões a respeito de sua história e seus colaboradores, com o consumidor final. O que é ainda mais problemático é a facilidade com que estes artigos serão descartados por seus usuários, afinal, poderão ser substituídos por novas peças de forma descomplicada. É neste ponto que o fetichismo da mercadoria deve ser pensado como uma problemática para os produtos de moda. É de responsabilidade, social e ecológica da cadeia de moda, repensar sua dinâmica, de forma que não sejam produzidos artigos que apenas atendam ao abastecimento de uma suposta demanda alienada, “cada vez mais abstratos e apartados da demanda de uso, limitados apenas à reprodução frívola do valor de troca” (SABRÁ, 2016, p.35). Portanto, deve-se haver discussão e


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divulgação diante da cadeia de processos, para que o consumidor se torne mais incluso, de forma a deixar transparente a história de cada produto, e, assim, possa tornar-se cada vez menos alienado. A cadeia de produtores também sofre com a sua coisificação, não havendo sua valorização, deixando de lado o aspecto humano por trás das roupas, sendo apenas mera moeda de troca. A moda vem discutindo seus valores ao longo dos anos; enquanto se colocar de forma fria e efêmera, ela continuará dissimulando e omitindo seu aspecto humano; as consequências ecológicas que isto acarreta continuarão esquecidas. Esta discussão será melhor estabelecida ao longo da monografia; cada aspecto terá um espaço determinado, e esperamos que sua leitura provoque novas interações, a fim de evocar outros questionamentos.


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2

O cenårio contemporâneo da moda diante da sustentabilidade


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Para esta discussão é importante levar em conta o cenário atual da

moda, que se tornou favorável a este tipo de premissa, que propõe rever os modos de fazer moda e coloca em foco questões que antes eram pouco levadas em consideração. Portanto, este capítulo expõe sobre esse cenário que tem como pauta estabelecer diretrizes mais sustentáveis para a moda, em âmbitos ambientais, sociais e econômicos.

Fazendo referência ao período da Moda Consumada, de Lipovestky

(2009), já comentado anteriormente, em que a efemeridade, o esteticismo e a individualidade se fazem muito presentes, revelando uma moda extremamente veloz diante das mudanças, criando diversos mundos estéticos em função da realidade criada pela imagem vendida por seus produtos, que proporcionam estilos de vida a seus consumidores. A moda se faz um grande atrativo, induzindo ao consumo excessivo dessas realidades. Este cenário de hiperconsumo cria, consequentemente, uma obsolescência programada dos produtos de moda, e acarreta significativamente na dinâmica da indústria da moda.

A produção não moveu somente o mercado de massa, mas, tam-

bém, a maneira como consumimos roupas mudou muito nos últimos 20-30 anos. Nós compramos mais roupas do que costumávamos e gastamos menos nelas. Um século atrás, gastávamos mais da metade de nosso dinheiro em comida e roupas, hoje gastamos menos de um quinto. (The Atlantic, 2012)6. Ainda como sociedade, nós compramos 400% mais roupas hoje do que há 20 anos atrás (Forbes, 2014)7. Hoje, mais de 80 bilhões de roupas são produzidas todo ano (Greenpeace, 2016)8. 6

ATLANTIC, The. How America Spends Money: 100 Years in the Life of the Family Budget. Boston, EUA. 05 de Abril de 2012. Disponível em: https://www.theatlantic.com/ business/archive/2012/04/how-america-spends-money-100-years-in-the-life-of-the-familybudget/255475/. Acesso em: 04 de julho de 2018.

7

FORBES. Why Brands and Retailers Are Running With the ‘Slow Fashion’ Movement. Nova Iorque, EUA. 20 de novembro de 2014. Disponível em: https://www.forbes.com/sites/ aliciaadamczyk/2014/11/20/why-brands-and-retailers-are-running-with-the-slow-fashionmovement/2/#283cf4f5ae14. Acesso em: 04 de julho de 2018.

8

GREENPEACE. Fast fashion is “drowning” the world. We need a Fashion Revolution!. 21 de abril de 2016. Disponível em: https://www.greenpeace.org/international/story/7539/ fast-fashion-is-drowning-the-world-we-need-a-fashion-revolution/. Acesso em: 04 de julho de 2018.


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Em média, americanos compram 64 peças de roupa em um ano. No Reino unido, somente 2.15 milhões de toneladas de roupas e sapatos são comprados todo ano (Universidade de Cambridge, 2006)9, no entanto, é estimado que os cidadãos do Reino Unido têm 30 bilhões de euros em roupas não usadas paradas em seus closets (WRAP, 2012)10.

Hoje, o calendário sazonal foi dramaticamente acelerado. Por

décadas, coleções de moda eram produzidas duas vezes por ano: Primavera/Verão e Outono/Inverno. Agora temos coleções de resort ou cruzeiro e pré-coleções com o objetivo de faturar com uma crescente classe global de riqueza. Na moda de rua, novas coleções agora são expostas nas prateleiras a cada semana ou duas (FASHION REVOLUTION, 2015a, p.13, tradução nossa).

Este ritmo insano de produção, denominado Fast Fashion, gerou

muitas críticas ao redor do mundo, visto por muitos como extremamente superficial e problemático, devido ao excesso de produtos gerados pela indústria, resultando num desperdício muito grande de dinheiro, tempo e matéria-prima. Contudo, novos estudos foram relatando a complexidade dos exageros da indústria da têxtil, mostrando-se uma das atividades mais poluidoras e antiéticas do mundo – vide o documentário The True Cost (2015), que aborda o colossal impacto da indústria da moda em milhões de pessoas e ao planeta. Apresentando cenas que retratam trabalhadores em situações análogas à escravidão e o esgotamento dos recursos naturais, o uso de pesticidas e sementes transgênicas para que a produção de algodão consiga atender à demanda de consumo, a consequente poluição do meio ambiente e os problemas de saúde decorrentes destes mesmos –. Portanto, a moda passou a ser pauta de estudos relacionados a sustentabilidade, focando em seu desenvolvimento responsável, de forma a não prejudicar o planeta 9

JULIAN M. ALLWOOD (United Kingdom). University Of Cambridge. Well Dressed?: The Present and Future Sustainability of Clothing and Textiles in the United Kingdom. Cambridge: Institute For Manufacturing, 2006. Disponível em: https://www.ifm.eng.cam.ac.uk/ insights/sustainability/well-dressed/. Acesso em: 04 de julho de 2018.

10

WRAP. WRAP reveals the UK’s £30 billion unused wardrobe. Banbury, Reino Unido. 11 de julho de 2012. Disponível em: http://www.wrap.org.uk/content/wrap-reveals-uks-%C2%A330billion-unused-wardrobe. Acesso em: 04 de julho de 2018.


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e às pessoas que nela trabalham. Mas, foi somente após o acontecimento de uma das maiores tragédias trabalhistas da história da humanidade que a moda sustentável ganhou popularidade.

Em 24 de abril de 2013, o edifício Rana Plaza, em Dhaka, Bangladesh

– que contemplava quatro fábricas de vestuário, todas produzindo para o mercado ocidental – desabou. Com a queda dos oito andares sobre as pessoas que ali trabalhavam para marcas conhecidas de moda, 1133 pessoas morreram e outras 2500 ficaram feridas, configurando como um dos acidentes mais negligentes da história da indústria do vestuário. Foi então que um grupo de pessoas no Reino Unido se juntaram para criar o movimento Fashion Revolution a fim de dar um basta à moda desrespeitosa, irresponsável e frívola. Mas como chegamos a este ponto na história da moda?

No início da cultura do consumo, em meados das décadas de 1950 e

1960, muitos países procuram desenvolver seus mercados internos, porém a oferta estrangeira de importação tornava-se cada vez mais atrativa; foi então, em 1973, que os EUA e outros países estabeleceram um sistema de cotas para limitar a quantia de artigos têxteis importados. Entretanto, isto acabou por encarecer o custo da manufatura e produção local, dando início a uma onda de terceirização externa de seus produtos. O início do modo de produção Fast Fashion começou a ganhar popularidade na metade da década de 1970, quando muitas marcas, hoje grandes varejistas mundiais, começaram a rapidamente copiar o que era apresentado nas passarelas, disponibilizando produtos com preços muito menores. Portanto, a confecção externa dos artigos de moda contribui muito para que a moda se democratizasse, pois, para se tornarem competitivos, estas indústrias confeccionavam peças em tempo recorde, oferecendo aos varejistas algo nunca visto antes.

Devido ao crescimento da oferta da terceirização exterior industrial,

em 2005, o sistema de cotas foi extinto e substituído pelo acordo World Trade Organization, que efetivou a abertura dos portos para este tipo de prática. Por volta dos anos 2000, o mercado de moda tomou enormes proporções globais – tornando-se o terceiro maior pátio industrial do mundo. Para proporcionar um baixo preço final de seu produto, buscavam produzir


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suas mercadorias em países que ofereciam mão-de-obra barata e com pouca regulamentação, tornando-se um mercado extremamente negligente quanto ao bem-estar dos trabalhadores e meio ambiente. Todo este cenário contribui para que a moda chegasse a uma alienação extrema, a ponto de um consumidor no ocidente não saber ao certo aonde e por quem suas peças estavam sendo produzidas.

O relatório Behind the Barcode11 (Por trás do código de barras)

descobriu que de 219 grandes marcas de moda somente metade sabia em quais fábricas seus produtos eram produzidos, e somente um quarto delas sabia de onde vinham os zíperes, botões, linhas e até mesmo os tecidos (FASHION REVOLUTION, 2015b, p.17).

O Fashion Revolution olha para a moda contemporânea como um sistema quebrado, com muitas brechas éticas que tornaram o modo de produção insustentável. Mas, além de apontar falhas, este movimento propõe um trabalho coletivo de conscientização, tanto das pessoas que estão diretamente envolvidas com a moda, quanto dos consumidores – que são a ponta final da cadeia – a fim de exigir uma moda e indústria têxtil mais segura, justa, transparente e responsável. O trabalho do movimento Fashion Revolution inspirou muito esta pesquisa, devido ao fato de encorajar as pessoas a perceberam a complexidade envolvida em cada roupa adquirida, que ainda hoje é omitida pela própria indústria.

É preciso muita coisa para produzir uma roupa. Não apenas aquilo

que ouvimos: designers, marcas, lojas, desfiles e festas; mas também os agricultores de algodão, descaroçadores, fiadores, bordadeiras, tintureiras costureiras e outros trabalhadores que fazem as roupas que amamos. Mas, as pessoas que fazem nossas roupas estão escondidas. Nós não sabemos quem faz as nossas roupas. E elas não sabem quem compra as roupas que elas produzem. Nós precisamos reconectar esse elo perdido, porque quando

11

Disponível em: https://baptistworldaid.org.au/faith-in-action/behind-the-barcode/. Acesso em: 05 de julho de 2018.


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compramos um produto, nós também compramos uma cadeia inteira de valores e relacionamentos. Pensando sobre as pessoas e histórias por trás das nossas roupas, podemos contar uma história diferente sobre a moda (FASHION REVOLUTION, 2015b, p.14).

A ideia da roupa desconhecida, trazida anteriormente, é muito as-

sociada a estas ideias, que podemos sintetizar da seguinte forma: muito é escondido pela indústria da moda, devido a sua enorme escala e complexidade, não deixando acessível ao público os processos e pessoas envolvidas em um simples produto. Portanto, devemos nos perguntar: “Quem fez minhas roupas?”. Também é preciso exigir mais transparência da cadeia da moda, de forma a haver maior abertura, comunicação e responsabilidade com o consumidor, a fim de combater essa omissão dos fazeres proporcionada pelo fetichismo da mercadoria. O consumidor tem muito poder de fala, podendo cobrar das marcas este tipo de iniciativa, assim, acredita-se que muitas dessas mudanças já estão sendo exigidas pela geração millennial – jovens nascidos entre a década de 1980 até o começo dos anos 2000, que estão muito acostumados com a internet em seu cotidiano e estão quebrando muitos paradigmas de consumo.

Acreditamos que é a geração millennial que está impulsionando

esta mudança de pensamento. McKinsey (2013) estima que os millennials serão responsáveis por um terço do gasto total global até 2020, e já representa um quarto da população dos EUA, juntos detém cerca de $200 bilhões de poder de compra. Embora a geração millennial (entre 17 a 34 anos) em breve será a maior geração consumidora da história (Advertising Age, 2012)12, os jovens têm uma visão diferente das outras gerações anteriores. A Elite Daily entrevistou 1300 millennials e 75% disseram que é tanto justo como muito importante que uma empresa retorne para a sociedade em vez de apenas gerar lucro (FASHION REVOLUTION, 2015a, p.17, tradução nossa).

12

ADVERTISING AGE. Millennials want to party with your brand but on their own terms. Nova Iorque, EUA. 02 de Agosto de 2012. Disponível em: http://adage.com/article/digitalnext/ millennials-party-brand-terms/236444/. Acesso em: 05 de julho de 2018.


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Por se tratar de uma geração que “nasceu” envolta da tecnologia e se

utiliza constantemente de ferramentas virtuais em seu cotidiano, como as redes sociais, o espaço digital é seu lugar de ativismo. A tecnologia dá voz a cidadãos comuns, chamando a atenção de marcas e até de governantes. O Fashion Revolution se utiliza disso como ferramenta para a conscientização, reunindo pessoas para debates, ações, e divulgação de conhecimento. As redes sociais são parte importante do movimento, pois existe uma campanha de popularização do uso da hashtag #quemfezminhasroupas (em inglês, #whomademyclothes), a fim de questionar toda a cadeia produtiva diante das roupas que vestimos.

No Fashion Revolution day de 2014 e 2015, a hashtag es-

teve em primeiro lugar no Twitter global. Em abril de 2015, sozinha a #whomademyclothes foi usada por 64 milhões de pessoas no Twitter e Instagram atingindo 124 milhões de impressões no total. O alcance total estimado da mídia on-line foi de 16,5 bilhões - ou seja, a quantidade de vezes em que conteúdos sobre o Fashion Revolution foram vistos em abril de 2015 (FASHION REVOLUTION, 2015a, p.24, tradução nossa).

O objetivo principal do movimento é instigar pessoas a mudarem

a forma de pensamento diante de suas roupas, para que a moda se torne algo positivo, passando a valorizar as pessoas que produzem seus artigos, o planeta, e seja ética, de forma a deixar transparente seus processos. Assim, o primeiro passo para obter uma moda mais consciente é observar atentamente nossas roupas, olhando-as pelo avesso e percebendo os vestígios das muitas pessoas que despenderam várias horas de trabalho em nossas peças – elas merecem ser respeitadas e valorizadas. O Fashion Revolution contribuiu muito com a divulgação de ideias relacionadas a moda e sustentabilidade, levando para um número considerável de pessoas um outro jeito de pensar moda, além de desmistificar este mercado totalmente fetichista e problemático. Outros autores também produziram bibliografias relevantes sobre como a moda atual exige uma mudança de paradigma, além dos possíveis caminhos que podem ser tomados tanto pelos


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agentes da cadeia têxtil como pelos consumidores. Um deles é Fletcher e Grose (2011), que chamam atenção para o fenômeno da despersonalização dos produtos de moda, devido a grande velocidade e volume de produção, consequentemente, levando o desconhecimento das roupas:

Já não conhecemos os fabricantes ou a origem dos materiais; isso

já não fala de nossos mitos, comunidades ou sociedades. Nossas roupas tornaram-se objetos inanimados, proporcionando, sobretudo, um meio de cumprir metas comerciais. O significado poético perdeu importância, em nome das eficiências de produção, e a estética de uma peça de vestuário reflete não mais que uma atratividade mínima, desenvolvida basicamente para garantir sua venda inicial. [...]. Somada a baixo custo e facilidade de compra, a limitada presença de significado e empatia em tantos produtos de moda comerciais contribui de forma decisiva para que sejam descartados muito antes de estarem gastos (FLETCHER; GROSE, 2011, p.85).

Segundo Fletcher e Grose (2011), para mudar este cenário, será

necessário mudar a forma como a roupa é pensada, como tudo o que influencia sua vida útil (durabilidade), mas é preciso pensar também em “termos materiais, estilísticos e emocionais” (p.85). A durabilidade pode ser uma peça chave para produzir uma moda mais consciente. No mesmo sentido, Berlim (2015) nos mostra que o designer tem papel importante diante das escolhas que acarretaram num produto com maior apelo sustentável, assim: [...] o papel do design enquanto agente integrador de objetos e pessoas deveria funcionar não apenas na avaliação da qualidade dos materiais, mas também desenvolver uma proximidade com os aspectos mais sutis e profundos das necessidades humanas, como afeto, proteção e memória. O aspecto relacional é determinante para a durabilidade do objeto (KAZAZIAN, 2005); assim, guardam-se os bens materiais em função não apenas das relações utilitárias, mas cognitivas, afetivas e hedonistas que se estabelece com eles. Quanto mais significado possui um objeto, maior o seu prazo de durabilidade, menor sua obsolescência (BERLIM, 2015, p.53).


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Esta é a oportunidade do criador reverter a frivolidade que o

endeusamento de sua própria figura acarretou durante os tempos. É uma postura ética do designer de moda criar um produto que possa conversar diretamente com o consumidor, e quebrar uma verdadeira barreira imposta pela moda. Além disso, é preciso, também, quebrar a visão egoísta do designer que concentra a autoria das peças - na prática os produtos são fruto de inúmeras mãos e cabeças; os designers servirão como facilitadores (FLETCHER; GROSE, 2011, p.162) para uma moda que integra agentes, que estão fortemente interligados.

Esse novo papel dos designers como facilitadores pode assumir

várias formas, desde desenvolver estratégias para transformar a indústria e o negócio de moda, até ser um “facilitador prático e um provocador criativo nas ruas”, com a função de orquestrar a mudança, criando oportunidades para que as pessoas trabalhem de maneira completamente nova. Em muitos contextos, esse papel é mais complexo que as atividades de design tradicionais e requer negociação intensa e manobras perante os interesses dos investidores, além de ações práticas. É, também, imprevisível, e produz resultados que podem não se adequar às normas de design tradicionais. Pois o papel de facilitador tende a enfatizar o processo, em detrimento do resultado, e redesenha as fronteiras do ego dos designers, por entender o “sucesso” como consequência de esforço coletivo, não de talento isolado (FLETCHER; GROSE, 2011, p.162).

Partindo dessa lógica, os fazeres dos agentes podem estar ilustrados

nas “entrelinhas” das roupas, através de etiquetas, avessos, ou até mesmo em um pequeno detalhe no direito das peças13; o designer poderá determinar estas escolhas nas peças, mas isto não lhe faz mais importante durante o processo produtivo. A moda não pode mais ser negligente diante de seus trabalhadores, cada vida importa e cada etapa na fabricação de uma peça é necessária. 13

A comunicação dentro e fora da cadeia de moda é uma atitude Termo utilizado para denominar o lado que fica aparente quando vestimos uma roupa.


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poderosa, quanto mais houverem discussões, maior será a transformação dos costumes, dos modos de consumo e do impacto na vida da terra; a moda é feita de gente, quanto mais gente trabalhar de forma coletiva, maiores mudanças positivas surgirão.

A coleção de roupas que será apresentada no próximo capítulo, pre-

tende ser, antes de mais nada, um meio de comunicação capaz de ilustrar os vários caminhos e as várias pessoas que fazem parte da cadeia produtiva da moda. Ela é também uma homenagem aos trabalhadores pouco retratados durante o processo. O objetivo deste trabalho é trazer ao público uma coleção de roupas conhecidas, em que cada peça conta sua história e nos lembra de sempre questionarmos “Quem fez minhas roupas?”. Também não existe uma pretensão ao consumo a priori. Caso houvesse, as roupas cairiam automaticamente no fetiche da mercadoria. Nessa tentativa de desenquadrar as peças como mercadorias, ou como uma mudança de território para elas, pretende-se subverter seu valor de uso. Assim, conectando pessoas, aproximando-as, e percebendo uma diferença que estava invisível, que não podia ser discutida pois era omitida. Conhecer nossas roupas transforma nossa relação com toda a cadeia têxtil, aumentando seu valor, não aquele financeiro, mas afetivo, tornando-se uma roupa que entrosa produtor e consumidor, criador e usuário. Faz tanto usuário e trabalhador compartilharem do mesmo mundo, havendo uma conexão entre estes.


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3

Metodologia


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Neste capítulo serão apre-

O conceito proposto é uma narrativa linear

sentadas as metodologias utilizadas que conta o processo produtivo das roupas, durante a confecção do projeto final

ou seja, desde o plantio da matéria-prima

de graduação, transparecendo suas

até o seu pós-consumo, passando pelas

escolhas estéticas, inspirações, desejos

diversas etapas durante sua fabricação,

e angústias diante da coleção. Trans- como modelagem, corte e costura. Asformar todas as ideias apresentadas sim, a cadeia de produtores é homenageanteriormente em uma peça de roupa ada, sendo ilustrada a partir de signos nas é desafiador, pode-se facilmente cair roupas que fazem alusão às pessoas e aos em uma armadilha, criando peças que

processos expondo a interdependência

perpetuam a lógica efêmera, frívola e

do processo criativo, enfatizando o valor

consumista da moda, e esta foi a prin- humano por trás de cada artigo. Propõe-se cipal preocupação da autora durante uma desmistificação da roupa desconhecio processo criativo de suas roupas.

da, indo contra a lógica da roupa como um

Como levar conhecimento diante do objeto de consumo alienado. A narrativa processo produtivo da moda e de seus

explora a importância do coletivo, pro-

colaboradores para um grupo de es- duzindo conexões entre agentes sociais da pectadores através de um desfile?

cadeia e o espectador, quebrando barreiras

e propondo questionamento.

Antes de mais nada, perce-

beu-se que talvez uma coleção com

A passarela é um meio de comu-

cunho estritamente comercial não nicação abrangente. Cada pessoa ali pode caberia nesta discussão, simplesmente tirar a sua própria interpretação do trabalho por obedecer ao paradigma do fetiche apresentado, porém, com este projeto, da mercadoria e, assim, normatizan- existe a preocupação de não apenas seduzir do-o. As roupas não cumpririam seu

o espectador com roupas esteticamente

papel fundamental. Portanto, a autora apreciáveis, mas também convidá-lo a se optou por peças mais “conceituais”, perguntar a respeito da origem do que está com maior elaboração, mais artesanais

vestindo. Acredita-se que só assim será

e que se comunicassem melhor com

possível combater a alienação da cadeia têx-

o espectador, sem restrições quanto til, explorando meios de comunicação ena forma, técnica, experimentações e tre produtores e consumidores, deixando criatividade.

transparente as relações humanas enrus-

tidas nas roupas.



3.1 Estratégias de design

O papel do designer como facilitador da cadeia produtiva de pro-

dutores exige algumas tomadas de decisão diante da fabricação das peças. Para melhor fazê-las algumas estratégias de design sustentável são adotadas, levando em consideração que o estilista tem como obrigação já pensar em suas criações ponderando quais impactos negativos pode minimizar ou eliminar, possibilitando uma moda mais sustentável.


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Gwilt (2014) apresenta um modelo de estratégias interessante nesse sentido:

Figura 3 - “O uso de estratégia de design sustentável”

Este modelo foi desenvolvido para servir de guia ao designer no mo-

mento em que está planejando suas criações, a fim de que ele possa avaliar melhor quais caminhos seguir para que se obtenha um equilíbrio entre questões sociais, éticas e econômicas, minimizando impactos ambientais. Todos estes caminhos estão contemplados dentro de cinco âmbitos na vida de um produto: design, produção, distribuição, uso e fim da vida. Portanto, as principais estratégias expostas por Gwilt (2014, p.42) são: minimização do consumo de recursos; escolha do processo e dos recursos de baixo impacto; melhora das técnicas de produção; melhora dos sistemas de distribuição; redução dos impactos gerados durante o uso; aumento da vida de uma peça; e melhora no uso dos sistemas de final de vida.

Seguindo este modelo, a autora se baseou nas estratégias de: design,

produção e fim de vida para a criação de suas peças. Dentro do âmbito do


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design, optou-se por seguir a estratégia de design pela empatia em toda a coleção, estabelecendo um relacionamento entre usuário e roupas, dando foco para a relação humana dentro dos processos produtivos, assim, enfatizando o caráter emocional das vestimentas, e transformando o significado do vestir.

As outras estratégias adotadas pela autora são mais pontuais, servin-

do como ponto de partida para alguns looks específicos, de modo a servir como um desafio de projeto, havendo o desejo de poder levar a pesquisa para outros caminhos exploratórios. A estratégia de produção adotada é o design pelo desperdício zero: em um determinado look, será utilizada uma técnica de modelagem eficiente para minimizar ao máximo o resíduo têxtil, elaborando uma peça que impactará menos no meio ambiente. Hoje em dia, os novos recursos facilitaram o desenvolvimento desta técnica.

A tecnologia (além de oferecer a oportunidade de reduzir, ou

eliminar o desperdício durante a modelagem) permite que os produtores de moda explorem a abordagem de desperdício zero já na etapa da construção. Essa abordagem quase sempre pede que as peças de vestuário sejam confeccionadas diretamente, sem que haja a necessidade de recortar as partes em um corte de tecido. Vários designers começam a explorar técnicas que envolvem a costura direta das partes de uma roupa já no tamanho e formato corretos, criando a possibilidade de reduzir de maneira drástica as sobras de tecido durante a confecção (GWILT, 2014, p.82).

Em relação à estratégia de fim de vida, antes de mais nada, existe

uma preocupação da autora em identificar ao usuário que as roupas nunca acabam, elas sempre podem se transformar em algo novo, portanto, o look final será a desconstrução do penúltimo, de forma a quebrar o paradigma do fim da vida dos produtos. A técnica utilizada será o upcycling, já bastante popular no Brasil, que consiste em: [...] aprimorar e agregar valor a um produto ou material que, de outra forma, seria jogado fora. Diferente da reciclagem, que pode resultar em depreciação


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e redução do valor de um material ou produto, o upcycling permite que você aumente o aproveitamento e o valor de um material, prolongando sua vida (GWILT, 2014, p.146).

É uma técnica muito positiva, que vai contra a lógica de obsolescência

programada, mostrando que é possível dar uma nova vida às roupas, além de deixar a vestimenta com um olhar único e personalizado, aproveitando todo o potencial do material.

Criar roupas é um ofício que exige responsabilidade, pensando nos

impactos positivos e negativos que estão envolvidos durante todo o processo. Logo, é necessário pensar cada processo de forma a valorizá-los e utilizá-los. Estas estratégias se referem à prática do designer nesse ofício. O mundo já está lotado de roupas. É preciso criar de forma respeitosa e sensível, entregando ao usuário peças que possuam propósito, não trazendo esgotamento ao vestir e sim uma experiência de consciência para este ato tão banal. Sempre deixando todos os processos transparentes, criando assim um relacionamento entre cadeia produtiva e usuário.


3.2 Inspirações e mapas mentais

Como ponto de partida para a concepção das peças, foram elaborados

mapas mentais que pudessem ajudar a interpretar e guiar melhor esta etapa de tradução do material teórico em algo vestível. Pode-se observar na imagem abaixo o termo “roupas conhecidas” está centralizado, sendo a síntese de todas as ideias expostas, ou seja, é o fio condutor desta coleção. Assim, para criar uma vestimenta que possa trazer conhecimento, existem alguns outros caminhos a serem seguidos como o da transparência – desmistificando o processo produtivo das roupas, desalienando a cadeia de produtores e mostrando que cada etapa de produção importa, logo, homenageando os trabalhadores. Dessa forma, a narrativa servirá como meio de comunicação para criar uma conexão entre colaboradores e usuários – repensando paradigmas de produção, valorizando o coletivo, mostrando a interdependência dos vários agentes sociais e o processo criativo amplo e subordinado.



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Figura 4 – Mapa mental elaborado pela autora


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Legenda para leitura do mapa mental: 1. Homenagear os trabalhadores; 2. Cada etapa de produção importa; 3. Transparência; 4. Conhecimento do processo produtivo; 5. Desmistificar; 6. O valor social das mercadorias sofre um ocultamento, assim, provocando uma invisibilização dos muitos valores de uso que os compõem, eclipsando, consequentemente, o trabalho humano; 7. Alienação da origem; 8. Cadeia produtiva extremamente ampla e complexa; 9. Informação não chega ao consumidor; 10. Roupa = Objeto de consumo alienado; 11. Roupa desconhecida; 12. Narrativa; 13. Mostrar a importância do coletivo; 14. Produtos que criam conexões a respeito de sua história e seus colaboradores com o consumidor final; 15. Comunicação -> dentro e fora da cadeia; 16. Rede colaborativa de produtores; 17. Interdependência de vários agentes sociais; 18. Omissão se dá pela noção de um processo criativo individual concebido pelo estilista ou designer de moda, que carrega o nome de uma marca, e suas criações são tidas como algo genial puramente elaborado por ele; 19. Processo criativo amplo, subordinado e coletivo; 20. Repensar paradigmas de produção; 21. Coletivo; 22. Questionar o papel do designer; 23. Criar roupas que possam conversar diretamente com o usuário, e quebrar a barreira imposta pela moda; 24. Meio de comunicação capaz de ilustrar os vários caminhos e as várias pessoas que fazem parte da cadeia produtiva da moda.


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Conceitualmente, este primeiro mapa mental representa bem as

ideias da autora, mas no âmbito do design, o referencial imagético é algo fundamental no ato de criação e no processo de pesquisa. Nele está contemplada a atmosfera que será transmitida para o expectador. Segundo Matharu (2011), existem duas vertentes de pesquisa em design de moda, uma que consiste em reunir objetos reais como inspiração para textura e caimento, e a outra é mais abstrata e investigativa, se utilizando de fontes imateriais de pesquisa: O segundo método de pesquisa é um pouco mais abstrato, visual e investigativo que tangível. Livros, revistas, periódicos de design e a Internet servem como fonte de informações e imagens que você pode usar indiretamente e com distanciamento; por exemplo, um edifício interessante do outro lado do mundo, ou documentos relativos a movimentos históricos. Essas fontes podem servir na proposição de um pano de fundo detalhado de filosofia e imagens, impressas ou armazenadas digitalmente para estimular o pensamento criativo (MATHARU, 2011, p.97-98).

Seguindo esta metodologia, a autora se inspirou em suas vivências

dentro do ambiente de ateliê da marca Fernanda Yamamoto, convivendo com costureiras, modelistas, cortador e estilistas. O período de estágio durou cerca de um ano, e foi extremamente fundamental para sua formação como profissional, pois trouxe muita reflexão a respeito da importância de cada colaborador para a criação dos modelos, respeitando o tempo de cada processo e pessoa dentro da empresa. É importante ressaltar que um dos ideais da marca é a valorização dos processos manuais, retratando através de suas redes sociais alguns episódios do desenvolvimento das coleções junto a seus agentes, apresentando para seu consumidor a ideia das “mãos que fazem”. Não há dúvidas que esta experiência influenciou diretamente a autora, reconectando-a com a moda de uma outra forma, e possibilitando um maior amadurecimento diante das ideias apresentadas neste trabalho, deixando-o mais próximo da realidade.


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Dentro deste universo, a mão é o instrumento mais importante de

cada colaborador, por possibilitar que cada etapa seja realizada de forma única; por mais que haja o auxílio de um instrumento como a máquina de costura, tesoura, agulha, etc. o caráter humano do trabalho se dá pelas mãos. O cotidiano dentro do ateliê foi seu ponto de partida para a criação deste projeto.



Figura 5 – Fotos autorais ilustrando alguns dos processos que são realizados dentro do ateliê


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Para sintetizar suas primeiras ideias a respeito do mundo imagético

do fetichismo da mercadoria como omissão dos fazeres, realizou-se um mapa mental imagético e textual para melhor ilustrar suas inspirações. Este mapa contempla tanto referências que dialogam com o universo do hiperconsumo da moda, provocado essencialmente pelo fetichismo das mercadorias, quanto referências do cotidiano de ateliê e moda consciente, além de algumas imagens que representam inspirações estéticas de cores, formas e materiais.


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Figura 6 – Mapa mental elaborado pela autora


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O mapa mental foi construído de forma a representar a problemática

desta pesquisa. Os elementos maiores e mais chamativos estão posicionados na parte inferior e central, revelando o universo do fetichismo da mercadoria; subindo, os elementos relacionados ao manual e à cadeia têxtil estão menores, revelando sua pouca visibilidade e contrastando com o hiperconsumo. Outra interpretação possível é que o universo da moda consciente, justa e transparente ainda se encontra no plano das ideias, porém, caberia aos consumidores e agentes da cadeia mudar este cenário, quebrando esse muro de alienação. A potência que a roupa tem em uma revolução de costumes, a roupa pode ser justamente o ponto de virada.

Por fim, para relacionar todas estas referências, a autora se inspirou em

dois estilistas contemporâneos que transformaram o mundo da moda com suas criações: Yohji Yamamoto e Martin Margiela. Respectivamente, impactou o mundo na década de 1980 por apresentar uma moda intelectualizada, contestadora e, também, chamada de antimoda – uma moda que não acreditava no que era apresentado como tendência na época –, subvertendo corpo, formas e texturas. Margiela, por sua vez, desenvolveu seu trabalho trazendo muitas referências da desconstrução fashion apresentada por Yohji e seus colegas, mas com uma identidade totalmente única; seu auge foi durante a década de 1990, fazendo parte de um movimento chamado Desconstrucionismo, revolucionando a forma tradicional de construção do vestuário e questionando o significado e usabilidade das roupas.

Depois de trabalhar como assistente de Jean Paul Gaultier a par-

tir de 1984, Margiela lançou sua marca homônima em 1998, com grande aclamação da crítica. Na coleção de estreia, um tema recorrente do estilista: a recuperação e a reciclagem, com objetos existentes redesenhados para criar uma peça de roupa nova. Assim, luvas de couro transformam-se em gargantilha; sapatilhas de balé, em bolsas para a noite; meias militares, em blusa; cacos de pratos, num colete; roupas velhas e descoordenadas, em matéria-prima que, desmontada e fundida, resultaram em nova indumentária (MACKENZIE, 2010, p.120).


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O modo de fazer moda de Margiela é muito inspirador, propondo

roupas que comunicam uma metalinguagem do fazer, logo, evidenciando estruturas internas como costuras, revéis e etiquetas; propondo peças que remetem ao processo no ateliê, como manequins e técnicas de modelagem. Além de ser considerado um “estilista anônimo”, cultuando a impessoalidade de suas criações e atribuindo mérito à criação coletiva desenvolvida por todos que trabalham na Maison Martin Margiela, legitimando a moda como um coletivo.

Figura 7 – Desfile da Maison Martin Margiela Fall 1997 Ready-to-Wear

Figura 8 – “SS 1995 _ Women’s presentation _ Design elements revealed the hidden details of garment construction” (MAISON Martin Margiela, c2009, p.197)


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Em 1989, foi lançado um documentário, dirigido pelo alemão Wim

Wenders (comissionado pelo Centro Pompidou de Paris), sobre Yohji Yamamoto. Intitulado como Notebook on Cities & Clothes (título em português: Identidade de nós mesmos), o documentário reúne uma série de entrevistas com o estilista, havendo muitas reflexões a respeito de identidade, moda e modernidade; ao mesmo tempo, mostrando os preparativos para seu desfile na semana de moda parisiense.

Em algumas cenas, é mostrado o trabalho em processo, as mãos –

tanto de Yohji, como de sua equipe – trabalhando conjuntamente, dando apoio ao criador enquanto desenha; são cenas extremamente inspiradoras, pois mostram a força do coletivo, tanto é, que a última passagem do filme é exatamente sobre isso e Wenders diz que “guardou sua cena favorita para o final”. Sem os agentes da cadeia têxtil colaborando conjuntamente, as ideias do designer não conseguiriam ser traduzidas para as roupas tão facilmente. Em dado momento, o narrador nos mostra a importância daquele trabalho em união: “Com toda sua atenção, o seu cuidado, o seu fervor, eles garantiam que a integridade do trabalho de Yohji ficasse intacta e vigiavam para que a dignidade de cada vestido, camisa e paletó fosse preservada” (IDENTIDADE..., 1989), denominando-os tradutores de Yohji Yamamoto.

O filme foi importante por influ-

enciar tanto em questão estética quanto filosófica através do trabalho de Yohji, que não apenas coloca em foco as tendências vigentes, mas toda uma identidade que é feita em conjunto. É extremamente poético este retrato que Wenders nos transmite de um momento tão importante que é o desfile: todo trabalho de muitas pessoas Figura 9 – Pôster de divulgação do documentário


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se dilui em alguns minutos de espetáculo, mas o prazer pelo fazer com as mãos torna tudo muito orgânico, aqueles minutos estarão para sempre eternizados e quem fez aquelas roupas deixou sua marca no tempo e espaço.


3.3 Cartela de cores

A escolha das cores durante o processo criativo é parte fundamental,

além de estar muito atrelada ao início da cadeia têxtil, ou seja, às tecelagens que oferecem tecidos com uma gama restrita de cores. Logo, o designer de moda deve adaptar sua coleção ao que o mercado oferece, dessa forma, sendo dependente de escolhas providas por outros agentes da cadeia. Neste tópico, serão apresentadas as escolhas cromáticas da autora, e o que esta cartela de cores representa para a coleção.

O mapa mental imagético (figura 6), apresentado anteriormente,

norteou a busca pela cartela de cores, contemplando imagens que serviram de inspiração para um exercício de extração da cor. Foram selecionadas quatro imagens que mais chamavam atenção no aspecto cromático, com ajuda de um recurso digital, as imagens foram pixelizadas, evidenciando os tons que compõem a foto.

Na figura 10, podemos observar modelagens penduradas, o papel

kraft é muito utilizado para a elaboração de moldes, portanto está bastante presente no universo da moda, remetendo ao trabalho do modelista14; a figura 11 é muito representativa para o trabalho, pois, através da fotomontagem, o 14

Pessoa que cria e corta os moldes às vezes alterando um molde já pronto, conhecido como bloco básico” (NEWMAN, 2011, p.124).


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autor da imagem evidencia um rosto que faz parte da roupa da garota, assim, pode-se associar à ideia de uma vestimenta que traz traços humanos. Já a figura 12, é uma montagem digital feita pela própria autora, representando a omissão das pessoas que produzem as roupas; e por último, temos a figura 13 que contrasta muitas cores com tons de cinza, possuindo praticamente todos os tons que estão na cartela de cores escolhida.

Figura 10 – Modelagens em papel kraft penduradas na parede

Figura 11 – Montagem fotográfica retirada da internet


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Figura 12 – Montagem digital realizada pela autora

Figura 13 – Montagem fotográfica retirada da internet

Para sintetizar as inúmeras cores presentes nas imagens, foi elaborada

uma cartela com 10 cores, bastante sucinta, contemplando tons mais opacos, conforme será justificado a seguir, com base em Pedrosa (2014). Destas quatro figuras acima, foram escolhidas as cores que mais interessavam a autora, além de ser possível perceber uma forte presença do branco, preto e cinzas. Logo, essas serão definidas como as cores regentes dos looks.


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A seleção do preto como uma das cores principais da coleção se dá,

também, devido a algo que Yohji Yamamoto disse no filme “Notebooks on Cities & Clothes” (IDENTIDADE..., 1989), já citado anteriormente, quando lhe perguntaram o porquê de trabalhar tanto com tecidos pretos e sua resposta foi que o preto representa uma extrema neutralidade, ou seja, apenas uma textura, sendo a “conclusão da cor”, deixando as formas falarem por si só. Portanto, a autora busca esta neutralidade, utilizando o colorido como um bônus, uma forma de chamar atenção para detalhes.

Figura 14 – Cartela de cores pintada manualmente

A autora usou como base, para estudar sua cartela cromática, a teoria

de harmonização de Johannes Itten, integrante da escola Bauhaus no início do século XX, em que explorou suas relações entre cores e efeitos visuais


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porquê sua tese era baseada na ideia “de que as cores poderiam ter efeitos psicológicos e espirituais sobre as pessoas, e influenciar ativamente o modo como se sentiam” (FRASER, 2007). Durante seus estudos, desenvolveu uma roda de 12 tonalidades a fim de demonstrar as harmonias das cores entre si, extremamente subjetivas e experimentais. Neste diagrama, no centro há um triângulo contemplando as cores primárias, que dão origem a cores secundárias, nascidas da mistura de 2 tons primários, presentes no hexágono, e a mistura de cores primárias com secundárias, resultando em tons terciários; todos estes tons estão no círculo cromático exterior. Logo, a roda cromática propõe ser uma ferramenta para encontrar harmonias, geralmente compostas por matizes similares, ou mais de uma cor no mesmo tom.

Conforme Itten

(1970) escreveu sobre harmonizações, algumas formas geométricas como triângulos equiláteros ou isósceles, e quadrados ou retângulos, dentro do círculo cromático possuem uma predisposição a serem harmônicas, formando tríades e quartetos, senFigura 15 – Roda de cores (Farbkreis) desenvolvida por Itten

do possível rotacioná-los para formar outras combinações. Segundo esse au-

tor, podemos encontrar “exemplos de quartetos harmônicos são amarelo/ vermelho-alaranjado/violeta/azul-esverdeado e as tonalidades de um retângulo harmônico são amarelo-alaranjado/vermelho-avioletado/amarelo-esverdeado” (ITTEN, 1970, p.22, tradução nossa).


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Inspirado na roda

cromática de 12 cores de Itten, a autora criou seu próprio diagrama a partir das cores da coleção, excluídos apenas o branco, preto e tons de cinzas. O esquema abaixo (figura 17) não segue fielmente a ideia de que se formos somando as cores o círcuFigura 16 – Construção de acordes de cor

lo se completará naturalmente, devido à algumas cores como o pardo e o

rosa, que são derivações de outras matizes, mas se utilizado a roda apenas com fim harmônico, ela funciona conforme o esperado. Como podemos observar na figura 18, a construção de acordes na roda cromática da coleção é bastante triangular, formando algumas tríades e um quinteto.

Figura 17 – Roda de cores desenvolvida pela autora com as cores de sua cartela

Figura 18 – Construção de acordes de cor a partir da cartela da coleção


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A escolha das cores foi muito natural e subjetiva, havendo uma von-

tade de, com a ajuda dos tons escolhidos, fazer referência ao universo do ateliê; por exemplo, o pardo, cor do papel kraft usado em modelagens. A cartela escolhida é feita de tons menos brilhantes, possuindo as três cores primárias, uma secundária – verde, harmonizando diretamente com o vermelho, sendo sua cor complementar – e duas terciárias – ocre e rosa. Num primeiro momento, esta seleção pode parecer algo ingênuo, mas Pedrosa (2014, p.112) nos mostra que as cores também podem projetar aspectos da personalidade individual de quem as escolhe – no caso aqui, da designer de moda.

Dentre os vários métodos cromáticos de projeção da personali-

dade, destacam-se o Psicodagnóstico de Hermann Rorschach e o Teste das Pirâmides Coloridas de Max Pfisfer. Ambos adotam valores interpretativos aproximados para julgar as preferências por certas cores, que resumidamente são os seguintes: o vermelho está relacionado com necessidades afetivas, afetos e suas manifestações, das mais suaves às mais violentas, em direção extroversiva; o azul expressa mais diretamente uma disposição introversiva das funções emocionais e intelectuais – pode ser racionalização ou sublimação e capacidade de intuição; o amarelo corresponde a anseios volitivos e liga-se à disposição afetiva e à iniciativa; [...] o verde mostra o grau de adaptação ao ambiente, a capacidade de contato; [...] o preto, o branco e o cinza parecem ligados mais diretamente ao inconsciente (PEDROSA, 2014, p.112).

Diante das teorias apresentadas por Pedrosa (2014), podemos rela-

cionar estes significados das cores com o que a autora inconscientemente procurou transmitir em seu trabalho. Este trabalho é bastante pessoal e traz uma carga emocional muito grande. Logo, algumas das definições acima têm muito a ver com o que se procura transmitir através deste trabalho. O vermelho remete a afetos com a roupa e trabalhadores da cadeia têxtil; o azul é a reflexão diante do conhecimento das roupas, de forma emocional e intelectual; o amarelo é o anseio por transformar a moda em algo muito


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mais positivo; o verde remete à adaptação necessária para uma mudança efetiva. E todos estes aspectos pertencem ao inconsciente, a um sonho extremamente pessoal da autora, mas que precisa ser externalizado através desta discussão da roupa desconhecida.


3.4 Cartela de Matérias

Dentro do desenvolvimento de uma coleção de moda, muito mais

fundamental que os desenhos e as referências imagéticas coletadas para dar vida às roupas, as matérias escolhidas durante o processo criativo dão caimento, forma e textura aos pensamentos do estilista. Ainda assim, o criador está muito subordinado àquilo que é oferecido pelas indústrias de tecidos – logo, também deixando a cartela de cores interdependente, como já foi comentado no tópico anterior, muitas vezes limitando-o a alguns tipos de fibra. Por exemplo, durante seu processo criativo, a autora decidiu que optaria por usar tecidos que tivessem em sua composição uma maior porcentagem de algodão; mas o que foi percebido é que, atualmente, as tecelagens estão produzindo muito mais artigos feitos com fibras sintéticas do que naturais, portanto, houve uma dificuldade para encontrar tais matérias. Esta questão já vem se mostrando presente no mundo da moda há algumas décadas, criando-se a ideia de que fibras naturais são coisa do passado, e o que está em voga são fibras com “bom desempenho”, reflexo do investimento de empresas gigantes da indústria química no setor têxtil em fibras sintéticas (JONES, 2005, p.126). Como já mencionado, a cadeia da moda é interligada, portanto, o que as tecelagens desenvolvem como pesquisa têxtil, muito possivelmente será o que estará nas cartelas de matérias das próximas coleções.


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Esse processo é dirigido para o mercado e as tendências de moda

atuais são o resultado final de um intenso trabalho de pesquisas e desenvolvimentos das indústrias química, de corantes e pigmentos e de tecidos e aviamentos, que se adiantam em até cinco anos em relação às tendências de moda. Especialistas na área recolhem informações, fazem consultas e reúnem-se duas vezes por ano para definir as futuras linhas de produtos, o que garante certa consistência de ideias e direções. As fiações e os designers têxtil apresentam suas linhas cerca de dezoito meses antes das apresentações do mercado de moda na Europa. Negociantes e transformadores de tecidos apresentam seus mostruários com uma antecedência de três a doze meses, dependendo do volume, da facilidade de produção e da demanda (JONES, 2005, p.126-127).

A escolha por usar, preferencialmente, tecidos naturais15 se deu

por conta da necessidade de criar uma linearidade dentro da narrativa – o primeiro look faz referência aos processos de obtenção da matéria-prima, o algodão colhido nos campos, depois transformado em fibra, fio, e por último, tramado para ser tecido –, e como essa matéria pode se transformar em tantas outras formas e texturas ao longo da coleção. O algodão é uma das fibras naturais vegetais mais antigas do mundo e até hoje se mantém como a principal fibra têxtil do mundo, porém, devido às tendências da indústria química, ele foi um pouco ofuscado pelas fibras químicas, portanto, propõe-se uma revalorização desta matéria-prima tão versátil e confortável. Algumas características do algodão são citadas nesta passagem de Pezzolo:

Fibra natural de origem vegetal procedente do algodoeiro. Apli-

cação têxtil: fabricação de inúmeros tecidos para uso doméstico e profissional: brim, cretone, popeline, cambraia, sarja, fustão, etc. Essa variedade depende da densidade, do ligamento ou do trabalho final. Características: 15

São aquelas fornecidas pela natureza e transformadas em filamentos por processos mecânicos como torção, limpeza e acabamento. Podem ser de origem vegetal ou animal. Exemplos: lã, algodão, linho, seda, cânhamo, juta, etc (PEZZOLO, 2007, p.305)


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macio e confortável; durável; resistente ao uso e à lavagem, mas amarrota e tende a encolher. O tecido à base de algodão possui boa capacidade de absorção de umidade e é adequado para o clima brasileiro, quente e úmido (PEZZOLO,2007, p.298).

Foram selecionadas 20 matérias (de um modo geral, optou-se por

tecidos planos16 e sarjas17, que possuem caimento mais estruturado, combinando melhor com as formas escolhidas para os looks), sendo elas têxteis e não têxteis – como o papel kraft –, dentre elas, 60% possui apenas algodão em sua composição; 20% possui em sua composição mais de 90% de algodão; e 20% não são feitas de algodão. Portanto, procurou-se utilizar tecidos com o maior percentual desta fibra possível. Apenas 4 matérias são feitas de outros materiais, e sua escolha foi devido a fatores como aparência, textura e reaproveitamento têxtil. Outro ponto importante diante da sustentabilidade foi que a autora procurou comprar boa parte dos tecidos em um banco de tecidos de reuso, ou seja, reaproveitando matérias que caíram em desuso, dando-lhes um novo sentido.

16

Estrutura resultante de sucessivos entrelaçamentos de dois fios (um do urdume e um da trama), que se cruzam formando um ângulo reto (PEZZOLO, 2007, p.317)

17

O nome é dado a um tipo de ligamento que resulta em estrias no sentido diagonal do tecido e também ao tecido de seda, lã ou algodão produzido com esse tipo de ligamento (PEZZOLO, 2007, p.315)


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3.5 Bordados, estampas e maquetes têxteis

Numa coleção de moda, muitos elementos podem ajudar a compor

a narrativa presente nas roupas, como tecidos, cores, formas, texturas, etc; dentre estes elementos, estão os bordados, estampas e maquetes têxteis, trazendo alterações de superfície para as matérias. Cada look possui suas particularidades, neste subcapítulo serão descritas as intervenções utilizadas para criar significados e símbolos em algumas peças, enfatizando o trabalho humano presente nos processos produtivos.

Há quem diga que a roupa nasce das ideias do designer, mas obser-

vando por outra perspectiva, sem a matéria-prima, nenhum artigo de moda pode existir, portanto, quando se trata de uma fibra natural vegetal, como o algodão, a roupa nasce na lavoura.


99

Assim, o primeiro look (figura 40) conta um pouco sobre este material, que precisa ser plantado, colhido, descaroçado, transformado em fio e, finalmente, tecido. Foi desenvolvida uma estampa digital corrida, que faz alusão aos trabalhadores que trabalham em lavouras de algodão e estão no início da cadeia têxtil. Figura 19 – Estampa “Campos de algodão”

Dialogando com a sequência

produtiva do tecido plano de algodão, foi elaborada uma maquete têxtil com algodão encontrado em farmácia, remetendo à fibra de algodão crua, antes de ser manufaturada.

Por fim, o fio precisa ser tra-

mado em um tear para virar tecido. Figura 20 – Maquete têxtil com algodão colado sobre tecido

A fim de fazer esta representação, também foi desenvolvida uma maquete têxtil: na perna esquerda da calça que compõe o look, foram cortadas verticalmente tiras – representando o urdume do tecido – e tramado um fio de algodão perpendicularmente – representando a trama –, reproduzindo o ligamento sarja.

Figura 21 – Maquete têxtil com fio de malha de algodão


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Logo após a finalização dos

moldes – que darão tridimensionalidade às peças –, vem a fase do corte, quando todas as partes da modelagem precisam ser desenhadas no tecido e cortadas, para que sejam costuradas na próxima etapa. É um desafio para a indústria da moda lidar com os resíduos gerados no corte, por isso, o terceiro look (figura 42), possui a aplicação de matérias que

Figura 22 – Maquete têxtil de resíduo

seriam descartadas, dando-lhes um novo significado. A ourela retirada do tecido plissado foi cortada em vários pedaços, que foram tingidos com tinta Guarany para criar efeito degrade, e costurados em outro tecido.

Conforme o tecido vai sen-

do riscado, formam-se desenhos curiosos, que podem levar-nos a imaginar a peça finalizada, e de que forma cada parte deste quebra-cabeças irá se encaixar perfeitamente. Logo, foi desenvolvido um bordado imitando a mesa já com os moldes traçados e iniciando a etapa de corte. Figura 23 – Bordado à máquina

Seguindo para o fechamento das

peças, as costuras unem as partes da modelagem que foram cortadas

em tecido e terminam de dar vida às roupas. Ficam sempre escondidas no avesso, mas na camisa que compõe o quarto look (figura 43), a ideia é exibir suas peculiaridades e sútil poesia. A mão é o instrumento principal de tra-


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balho de cada colaborador, portanto, o bordado realizado no bolso da calça relata o lado humano da costura, cada ponto possui a dedicação e cuidado de quem o fez.

Figura 24 – Maquete têxtil com diversos tipos de costuras aplicadas, adornando a camisa

Figura 25 – Bordado manual

Para estudarmos melhor uma peça, seus volumes, acabamentos e

soluções, é elaborada uma peça piloto, antes da roupa final; assim, podemos ser mais assertivos na hora de elaborar uma nova vestimenta, economizando tempo e dinheiro. O quinto look (figura 44) é inspirado nesta etapa, onde a roupa ainda está em processo de teste, podendo haver diversas mudanças até chegar em sua versão que será comercializada. Em meio a tantos processos produtivos existem milhares de pessoas envolvidas em diversas etapas desta narrativa das roupas, e cada uma delas deve ser homenageada por seu trabalho, que agrega valor humano às roupas. Este mesmo look traz mãos bordadas durante ações, em preto, e os utensílios que auxiliam o fazer estão bordados com linhas coloridas, mostrando a integração entre humano


102

e objeto. Sendo assim, as pessoas que o fazem são o foco neste look, e para transmitir ainda mais esta mensagem, também se elaborou um bordado manifesto feito através da máquina de costura caseira.

Figura 26 – Bordado manual

Figura 27 – Bordado feito na máquina caseira

Por fim, a última in-

tervenção se dá no penúltimo look (figura 45), quando a roupa está finalizada e pronta para ser consumida, contudo, contempla a omissão das pessoas que trabalharam para construí-la. Portanto, há bordado mãos realizando ações feito com linha preta sobre tecido preto, dialogando com este universo quase que transparente dos fazeres.

Figura 28 – Bordado manual


103


3.6 Estudo de formas e processos

Antes da etapa de confecção das peças, acontece o estudo de silhuetas

e formas, realizado pelo estilista, que dará melhor clareza à coleção, podendo avaliar a harmonia do conjunto. Como Jones (p.99, 2005) explica, este processo de articulação e análise das roupas “[...]permite correções, ampliações e desenvolvimento da criação”, por mais que, eventualmente, o processo criativo ocorra de forma acidental, refletir sobre o que se está produzindo, pode ajudar a “dimensionar a distância que lhe falta para chegar ao resultado desejado”. Por mais que o designer comunique suas ideias através de desenhos para os outros colaboradores, até chegar num veredito final, a peça será modificada por estas outras pessoas por diversas questões, como ergonomia, custo, funcionalidade, etc. Portanto, fica evidente o processo produtivo como algo interdependente.


105

A autora realizou seus estudos primeiramente por meio de desenhos,

se inspirando, principalmente, em peças de alfaiataria como casacos, camisas e seus avessos. Explorando, também, a assimetria e volumes, revelando uma influência direta do trabalho de Yohji Yamamoto e Martin Margiela, já citados anteriormente.

O desequilíbrio assimétrico pode ser visto em peças despropor-

cionais ou desconstruídas que foram contrabalançadas por pequenas ou grandes características de design em uma ou em diversas áreas cuidadosamente planejadas, que atuam como “eco” ou “contrapeso”, criando um equilíbrio geral na forma. Essa é uma característica-chave na obra de designers japoneses e belgas como Yohji Yamamoto e Martin Margiela, que questionam e manipulam os princípios do equilíbrio para expressar uma estética de design vanguardista (MATHARU, p.105, 2011).

Por se tratar de uma coleção que narra uma história, cada look é único,

exigindo uma silhueta única, que chamem atenção para detalhes específicos que farão referência a parte determinada do processo produtivo. Os materiais também influenciaram muito ao definir formas e volumes, por exemplo, ao propor peças que misturam materiais tão distintos como o papel e o tecido, era necessário estudar a melhor forma de uni-los, sem que houvesse uma desarmonia, e ainda trazer elementos gráficos da modelagem. Por isso, um outro recurso utilizado para estudo foi o manequim escala-metade, onde é possível observar como os materiais se comportam na prática.


106

Figura 29 – Estudos diversos feitos em papel com låpis grafite


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Figura 30 – Estudo realizado em manequim escala-metade misturando papel Kraft e tecido de algodão cru


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Há também casos que exigem um tipo de estudo mais específico,

como o look da roupa refeita (figura 46), em que foi utilizada a técnica de upcycling para criar a forma desejada. Ou seja, exige bastante experimentação para criar uma nova peça em cima de uma roupa já existente, consequentemente, o desenho por si só acaba restringindo muito o processo criativo a fim de alcançar todas as possíveis formas e volumes, que podem ser obtidas através do manuseio no manequim.

Figura 31 – Estudo da mistura entre um blazer e uma camisa desconstruídos

Feitos e refeitos os primeiros desenhos e estudos das peças, realizou-se

uma primeira edição, compondo o line up18 inicial – que pode ser redesenhado quantas vezes for necessário a fim de chegar a um resultado mais 18

Expressão da língua inglesa que significa “1. Alinhar; pôr em linha; 2. Organizar em fila; pôr em fila; 3. Preparar; organizar” segundo o dicionário Infopedia de inglês. Ou seja, seria uma forma de organizar os looks em fila, antecipando a ideia destes na passarela. line up in Dicionário infopédia de Inglês - Português [em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2018. [consult. 2018-09-01 14:41:22]. Disponível na Internet: https://www.infopedia.pt/dicionarios/ ingles-portugues/line up


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harmonioso e impactante –. Segundo Matharu (p.102, 2011), a forma e estrutura são o contato inicial do espectador com a coleção na passarela, podendo causar uma impressão duradoura, ou não, portanto, “a silhueta é essencial para o sucesso de qualquer modelo ou coleção; ela pode ajudar a apresentar um contexto atual ou a estabelecer uma atitude e visual para a coleção”.

Figura 32 – Primeiro line up proposto pela autora

Tendo os modelos definidos, torna-se possível realizar as primeiras

peças-piloto. Estas que não serão feitas no tecido final, pois o intuito é de realizar um estudo prévio, economizando também tempo e dinheiro. Nesta fase do processo, entra o trabalho de uma figura muito importante para a elaboração das peças: o(a) modelista. Esse(a) profissional é responsável por tirar as ideias do papel elaborando moldes que darão forma e volume às roupas; ele(a), muitas vezes, sugere ao estilista algumas mudanças no modelo para que possa ser melhor executado, portanto, agregando ao processo criativo. Para se obter uma peça final mais bem resolvida, é importante que haja sintonia entre estilista e modelista.


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Figura 33 – Processo de estudo: peças-piloto


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Figura 34 – Processo de estudo: peças-piloto


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Figura 35 – Processo de estudo: peças-piloto


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Figura 36 – Processo de estudo: peças-piloto


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No caso deste trabalho, os profissionais que desenvolveram os moldes

das peças, também atuaram como cortadores e costureiros, havendo uma cadeia muito menor envolvida e muito mais próxima, sendo possível acompanhar boa parte do processo produtivo das roupas. Foram realizadas algumas fotografias para ilustrar melhor o feitio da coleção, retratando a poética do fazer. Figura 37 – Gabriel Pauletto durante a elaboração de uma das peças da coleção


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3.7 Público-alvo

Anteriormente, no capítulo 2, falou-se um pouco sobre a fase con-

temporânea da moda, em que valores de cunho ético, ecológico e social vinham sendo pauta de discussões ao redor do mundo. Houveram muitas mudanças em pouquíssimo tempo, inclusive a forma como os consumidores se relacionam com o que consomem, ficando cada vez mais difícil enquadrá-los num perfil pré-definido indicando idade, gênero e classe social. “O consumidor contemporâneo está mais fluido. Tem mais informação, possibilidades, poder de compra, senso crítico, e por isso não se identifica mais com apenas um estilo ou marca” (CARVALHAL, 2016, p.23-24).

Muitas dessas mudanças têm a ver com a inclusão tecnológica

cotidiana, que transformou o modo como as pessoas veem o mundo e tomam decisões. A internet possibilitou uma maior interação entre as pessoas, de forma extremamente rápida e personalizada, além de facilitar o acesso à informação, dando espaço para novas formas de expressão. Morace (2009) chama atenção para um novo conceito de consumo que vem surgindo, muito devido aos novos paradigmas do mundo tecnológico, denominado como “consumo autoral”, em que as pessoas se tornaram “empresas” criativas, sendo menos influenciadas pelo o que as marcas propõem e tomando mais as suas próprias decisões quanto a imagem pessoal que desejam comunicar.


117

O autor sugere uma readequação da postura das empresas diante deste novo consumidor, focando em novas práticas que possibilitem uma aproximação do que chama sua atenção, fazendo produtos e serviços com um maior propósito:

Trata-se então de recomeçar por práticas simples, concretas,

cotidianas, que deem espaço às mesmas lógicas que hoje em dia parecem guiar o consumidor: o Consumo Combinatório como capacidade de remexer as cartas e as informações de maneira criativa; a Fascinação Imediata como coragem de deixar espaço à intuição e ao “vislumbre, o lance rápido do olhar; a Sociedade Projetual como reconhecimento do valor do outro e das suas ideias e como disponibilidade para compartilhar; a Alimentação Narrativa como necessidade de redescobrir as próprias histórias, de empresas e de pessoas que sabem deixar a marca; o Território sob Medida como capacidade de ouvir e de estabelecer relação focada, para alcançar objetivos ambiciosos; a Memória de Si Mesmo como vocação reflexiva, de redescoberta de si próprio e dos percursos únicos e singulares; o você pelo vocês e o vocês pelo você como descoberta de reciprocidade e da extraordinária potência do mútuo socorro; e enfim a Experimentação Expressiva como desafio para valorizar os próprios talentos, a própria criatividade e o próprio ponto de vista original e também o custo de não ser sempre entendido e apreciado. Como se vê, trata-se de um conjunto de valores e comportamentos que implicam grande lucidez e muita decisão, que exige uma precisa capacidade de escolher, mesmo que à custa de errar, o que hoje as empresas tendem a evitar, enquanto o consumidor autor aprendeu a lição, se transformando numa verdadeira empresa criativa (MORACE, 2009, p.16, grifo do autor).

Desta forma, é possível observar um novo movimento de consumo

ganhando vida; cada vez mais há um questionamento crescente diante da forma como e porquê se consome. Inclusive, podemos relacionar este cenário ao já citado Fashion Revolution, fruto de um conjunto de pessoas que não se identificavam com a atitude das marcas em diversos aspectos, denunciando uma falta de ética das empresas e a dinâmica frívola e insustentável da moda. Carvalhal (2016) crê numa mudança de atitude global, em que a moda como


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um todo deverá se adaptar a um novo paradigma de produção, consumo e pós-consumo, devendo construir um modelo mais consciente, que não priorize apenas a compra. Também, enfatiza que o consumo nunca deixará de existir, sendo importante ter em mente que sempre resultará em certo impactos, portanto, deve ser feito com responsabilidade.

O que escolhemos comprar pode mudar o rumo do planeta. O

consumo sem consciência gera impactos negativos. São ações e perguntas diárias e constantes que fazem a diferença. Na Black Friday de 2015 vimos marcas e pessoas tomando novas atitudes. Surgiu um chamado na internet para não comprar nada por um dia (nem um cafezinho, o.k.?). A Green Friday incentivava a troca e o compartilhamento, em vez da compra.

Todas as ações tinham como propósito questionar: preciso deste

produto ou serviço? Mesmo? Por quê? Ele é socialmente justo? O produto é adequado? O que está contemplado nele? É econômico? Poluente? A extração da matéria-prima respeita a natureza? Onde foi produzido? Com que mão de obra? Quanto tempo vai durar? (CARVALHAL, 2016, p.54).

Por mais que este trabalho não possua como fim a elaboração de

peças para o consumo, ele introduz uma forte conexão com esse novo tipo de consumidor engajado e questionador, o tendo como inspiração. A maioria deste grupo de pessoas, que se interessa por iniciativas ligadas ao consumo consciente e ético da moda, faz parte da geração millennial – também já citada no capítulo dois –, possuindo uma forte inclinação à preocupação em relação ao meio ambiente, questões sociais, e ao que consomem. Dessa forma, espera-se que a coleção possa criar uma conexão com essas pessoas, a fim de oferecer-lhes mais conhecimento diante de suas roupas e inspirá-las a transmitir cada vez mais uma nova forma de observar a moda, valorizando processos e pessoas. A mudança só ocorrerá, de fato, caso cada vez mais pessoas se empoderarem e tiverem maior acesso à informação, como por exemplo, do que uma peça de roupa realmente representa, bem como a quantas pessoas estão envolvidas em sua fabricação. É dever do consumidor usar sua postura questionadora e cocriadora para mudar os paradigmas da


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moda, pois, foi lhe dado um poder maior do que apenas servir como inspiração para a criação de novos produtos, assim como Carvalhal expõe nesta passagem:

O consumidor hoje tem a vida nas próprias mãos, não está mais

topando se encaixar em padrões comportamentais e de segmentação conhecidos. Não é somente público-alvo (ou comprador), ele é produtor de inovação, cocriador, colaborador, financiador, produtor, disseminador... Isso muda tudo. Na vida. Na moda (CARVALHAL, 2016, p.57).

Figura 38 – Painel de público-alvo elaborado pela autora


3.8 Line Up

O Line Up é a síntese de todo o trabalho, nele estão contidas as vivências do estilista e a maneira como conseguiu decodificar o assunto através da roupa. A coleção passou por um longo processo de amadurecimento até chegar na proposta final de formas, texturas, estampas, bordados, etc. Logo, se trata da visão geral do projeto desenhada e editada – os looks estão posicionados da forma que serão desfilados posteriormente –, sendo muito importante para perceber a harmonia como um todo e quais são suas potencialidades. Neste subcapítulo será apresentado o Line Up final e a descrição look a look de forma mais detalhada, explicando peça por peça.

Conforme foi mencionado anteriormente, a ideia é criar uma coleção

em forma de narrativa, onde cada modelo comunique uma etapa do processo produtivo das roupas, desde o plantio da matéria-prima até o pós-consumo – quando a roupa poderá ser refeita e ganhar uma nova forma –. Estes possuem vários elementos que fazem referência a particularidades do fazer na moda, como a tesoura, a construção têxtil, as costuras, etc. Cada look é único e comunica uma estrofe da poesia que é o processo produtivo na cadeia da moda.


121

Figura 39 – Versão final do Line Up


122

1 Matéria-prima

O primeiro look é composto por três peças: trench coat19 com aboto-

amento duplo frontal, forro estampado desenvolvido pela autora (figura 19), bolso chapado na lateral direita, e barra assimétrica, mais curta do lado esquerdo; calça pantacourt20 com aplicação de maquete têxtil (figura 21) na perna esquerda; e blusa sem manga com gola olímpica21 feita em tecido plano e com aplicação de maquete têxtil (figura 20). Como elemento de styling, no bolso do casaco serão colocados alguns ramos de flor de algodão.

19

Casaco inventado por “Thomas Burberry (1835-1926) e usado na Segunda Guerra Mundial por soldados nas trincheiras […]. Mais tarde, foi amplamente adotado por civis” (NEWMAN, 2011, p.186).

20

A palavra de origem francesa significa “calça curta” em português, segundo o dicionário infopédia de francês. Disponível em: https://www.infopedia.pt/dicionarios/frances-portugues/ pantacourt.

21

“O mesmo que gola rulê, com as laterais altas, envolvendo o pescoço; pode ou não ser dobrada” (NEWMAN, 2011, p.86).


123

Figura 40 – Croqui 1 e desenhos técnicos do look


124

2 Modelagem

O segundo look traz uma mistura inusitada de materiais; o papel

e o tecido são utilizados fazendo referência ao universo da modelagem plana e moulage. Ele é composto por duas peças: camisa assimétrica com abotoamento frontal com colchetes de pressão – lado direito em tecido plano e esquerdo em papel kraft –, sendo que o de tecido possui manga comprida com punho pespontado e o de papel tem manga com aba aplicada22 e pregas faca23, sua gola é com colarinho simples; e saia com camadas irregulares, havendo uma camada de pregas faca em papel kraft, do lado esquerdo e na barra. Ambas as peças possuem pespontos em linha vermelha e marcações com caneta para tecido.

22

“Manga pequena, triangular, que forma uma abinha dura ou cai sobre os braços, dando uma proteção mínima” (KAULING, 2008).

23

“Pregas estreitas de largura regular que são bem dobradas a fim de ficarem achatadas em uma direção” (NEWMAN, 2011, p.149).


125

Figura 41 – Croqui 2 e desenhos técnicos do look


126

3 Corte

O terceiro look possui apenas um vestido, com decote canoa24; mangas

feitas a partir de modelagem tridimensional extraída de exercício criativo com “envelopamento”25 de uma mão, criando recortes inusitados; saia com recorte na lateral direita e possui uma camada de outro tecido formando uma barra, em que há uma fenda na parte traseira. Aplicou-se maquete têxtil (figura 22) em sua parte superior e há bordados (figura 23) na parte interior.

24

“Decote amplo e alto que passa de ombro a ombro. Seu formato ligeiramente abaulado lembra o do interior de uma canoa, daí o nome” (NEWMAN, 2011, p.65).

25

Exercício de envolver uma parte do corpo com papel filme, passar fita adesiva em seu entorno, extrair a forma do corpo e planificá-la a fim de criar uma modelagem inusitada.


127

Figura 42 – Croqui 3 e desenhos técnicos do look


128

4 Costura

O quarto look é composto por duas peças: camisa oversized26 com

barra arredondada – sendo a frente mais curta que atrás –, bolso debruado27 duplo suspenso, imitando um bolso moeda28, só que exposto, e aplicação de maquete têxtil (figura 24) no lado direito da camisa, gola com colarinho simples; e calça pantacourt com barras arredondadas – frente mais curta que atrás –, bolso externo com abertura lateral, imitando o forro interno do bolso tipo faca, e aplicação de bordado (figura 25) no bolso esquerdo.

26

A palavra e origem inglesa significa “desproporcionado, com tamanho fora do normal“ em português, segundo o dicionário Infopédia de Inglês. Disponível na Internet: https://www. infopedia.pt/dicionarios/ingles-portugues/oversized

27

“Bolso aplicado com acabamento em debrum ou cairel, seja ao longo de ambas as bordas (chamado por vezes de “debrum duplo”) ou ao longo apenas da bainha inferior ou superior. É comum no bolso esquerdo de paletós e casacos de alfaiataria” (NEWMAN, 2011, p.28-29).

28

“Pequeno bolso localizado acima ou dentro do bolso direito de um paletó masculino” (NEWMAN, 2011, p.29).


129

Figura 43 – Croqui 4 e desenhos técnicos do look


130

5 Peça-piloto

O quinto look é composto por um macacão29 pantacourt sem man-

gas com fechamento nas costas com zíper, contém tiras de tecido duplo a partir da cintura adornando as laterais e pespontos com linha branca. Do lado direito da peça, há metade de um casaco costurado à mão no ombro e na lateral do macacão, possuindo bolso lateral reto, bordado (figura 26) na manga e maquete têxtil frontal (figura 27).

29

“Termo que descreve uma roupa de pernas longas e mangas curtas ou longas, que se fecha com zíper, botões ou velcro na parte frontal do torso” (NEWMAN, 2011, p.115).


131

Figura 44 – Croqui 5 e desenhos técnicos do look


132

6 Roupa pronta

O penúltimo look se constitui por duas peças: sobretudo transpas-

sado com abotoamento duplo frontal, seis botões, possuindo três bolsos debruado duplo – um na linha do peito esquerdo e dois pouco abaixo do quadril –, lapela chanfrada e aplicação de bordado (figura 28) no barrado; e vestido de malha, inspirado em uma camisa longa.


133

Figura 45 – Croqui 6 e desenhos técnicos do look


134

7 Roupa refeita

O último look toma como ponto de partida o look 6, pois a partir

do sobretudo elaborado, serão utilizadas as mesmas partes da modelagem para criar uma nova peça, evidenciando avessos das estruturas de alfaiataria – como entretelas30 e forros –, reposicionando as formas e criando novos volumes. Alguns pespontos na hora da montagem da peça foram deixados para dialogar com a ideia de “work in progress”.

30

“Em geral são tecidos (algodão) ou tecidos não tecidos (TNT) usados para dar maior estrutura para punhos e colarinhos de camisas. São encontradas com ou sem colas adesivas” (NEWMAN, 2011, p.70).


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Figura 46 – Croqui 7


Considerações Finais

Ao longo da história da moda, pode-se notar o fenômeno do fetichismo

da mercadoria bastante presente, quase como uma dinâmica intrínseca a ela, e como seu desenvolvimento chegou até as últimas instâncias, resultando numa moda frívola, efêmera e impulsiva. Além de ser possível considerá-lo como uma ferramenta de manutenção do capitalismo contemporâneo, cujo interesse maior é o acúmulo de capital. Porém, atualmente observam-se movimentos contrários à esta dinâmica, que não estão de acordo e buscam alternativas a fim de subverte-la. A moda como fenômeno social elege suas mudanças conforme aos anseios e desejos sociais, por isso, nos dias de hoje, há um espaço mais bem estabelecido para discussões como este trabalho. Entretanto, essa discussão não pode ser considerada como finalizada.

A coleção “Roupa desconhecida: o fetichismo da mercadoria como

omissão dos fazeres” questiona os paradigmas existentes na moda, em que o “ter” é mais importante que o “ser”. Como futura designer de moda, a autora sente a necessidade em criar roupas de forma responsável e empática com os outros colaboradores, visualizando uma moda com um propósito que vá além da venda. Dificilmente o estilista vai fazer moda sozinho, portanto, acredita-se que a interdependência deve ser valorizada e o processo produtivo deve ser desmistificado.


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Assim, foram apresentadas ideias de alguns autores que pudessem

explicar melhor a falta de visibilidade das relações humanas na cadeia têxtil, revelando que a teoria de Marx (2016) ainda se faz muito atual e pertinente. O fetichismo da mercadoria sempre existirá enquanto o capitalismo, como conhecemos hoje, continuar a existir; mas conforme foi citado anteriormente, a moda encontra-se num período de transição, em que muitas iniciativas em prol de uma moda mais consciente vêm se destacando, influenciando até as grandes marcas de fast fashion. Muito disto aconteceu devido à internet, que trouxe maior informação e revolucionou os meios de comunicação, possibilitando que pequenos movimentos ganhassem notoriedade, como o Fashion Revolution, Ateliê Vivo31, D.A.M.N. Project32, entre outros.

Vivemos em um tempo de crise econômica e identitária, em que muitas

instituições se encontram falidas, havendo a necessidade de se reinventar, e assim está a Moda. Muitos profissionais vêm se questionando a respeito da forma tradicional de fazer moda, relatando frustração e esgotamento, e acabam propondo novas formas de fazê-la: em que as relações humanas acabam se aproximando. Por exemplo, vem surgindo cada vez mais pequenos negócios que priorizam uma moda mais justa, transparente e/ou ecológica, e por não terem grandes estruturas, acabam deixando o consumidor muito mais próximo do processo produtivo.

A Moda é feita de gente, portanto, para mudá-la é necessária uma união

de forças, um grande coletivo que esteja interessado em subverter a lógica alienante da moda, revelando esta relação entre quem faz e quem compra. É necessário que cada vez mais marcas ajam de forma transparente, promovendo uma relação mais humana com seus consumidores, como por exemplo através de redes sociais, contando mais sobre seus colaboradores e sobre as etapas produtivas por trás das roupas, e até mesmo promovendo visitas 31

Biblioteca pública de modelagens, que repensa as formas tradicionais de fazer moda a partir do coletivo, aproximando as pessoas de suas roupas ensinando-as a costurar e apresentando-as a diversas técnicas manuais, como tricô e crochê. Site do projeto: http://www.atelievivo.com. br/.

32

Projeto que promove o consumo consciente através do compartilhamento de roupas entre pessoas.


138

ao seu ambiente de trabalho ou eventos a fim de favorecer a transparência. E também é necessário que consumidores exijam uma postura mais ética das empresas, as questionando a respeito da origem de suas roupas.

Portanto, este é só o começo da discussão. A luta por uma moda

menos alienante é diária e exige persistência, mas é um caminho possível, que deve ser explorado cada vez mais por outros estudantes, pesquisadores e profissionais. Que sigam cada vez mais em busca de uma moda menos fetichista e mais ética. Pela roupa conhecida.


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Filmografia

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Referências imagéticas

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Figura 8 - “SS 1995 _ Women’s presentation _ Design elements revealed the hidden details of garment construction” (MAISON Martin Margiela, c2009, p.197) / Fonte: Marina Faust Figura 9 - Pôster de divulgação do documentário / Fonte: © 2018 AX1 Entertainment Ltd. Disponível em: https://images-na.ssl-images-amazon.com/ images/I/81lGrMm2RlL._SL1500_.jpg. Acesso em: 02 de agosto de 2018. Figura 10 - Modelagens em papel kraft penduradas na parede / Fonte: S.E.H. Kelly ©2017. Disponível em: https://www.sehkelly.com/makers/master-shirtmaker-kent/. Acesso em: 23 de julho de 2018. Figura 11 – Montagem fotográfica retirada da internet / Fonte: Pablo Thecuadro. Disponível em: https://www.ignant.com/2016/01/16/abstract-photo-collages-by-pablo-thecuadro/. Acesso em: 23 de julho de 2018. Figura 12 – Montagem digital realizada pela autora / Fonte: Autor desconhecido. Disponível em: https://blogsigbolfashion.com/2015/10/17/profissao-piloteira/. Acesso em: 09 de outubro de 2018. Figura 13 – Montagem fotográfica retirada da internet / Fonte: Autor desconhecido. Disponível em: https://i.pinimg.com/originals/49/db/06/49db061deab8c980fd25799dc0dc59d6.jpg. Acesso em: 09 de outubro de 2018. Figura 14 – Cartela de cores / Fonte: Acervo pessoal. Figura 15 – Roda de cores (Farbkreis) desenvolvida por Itten / Fonte: Domínio público. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Johannes_Itten#/media/ File:Farbkreis_Itten_1961.png. Acesso em: 24 de julho de 2018. Figura 16 – Construção de acordes de cor / Fonte: ITTEN (1970, p. 21). Figura 17 – Roda de cores desenvolvida pela autora com as cores de sua cartela / Fonte: Acervo pessoal. Figura 18 – Construção de acordes de cor a partir da cartela da coleção / Fonte: Acervo pessoal. Figura 19 – Estampa “Campos de algodão” / Fonte: Acervo pessoal. Figura 20 – Maquete têxtil com algodão colado sobre tecido / Fonte: Acervo pessoal. Figura 21 – Maquete têxtil com fio de algodão / Fonte: Acervo pessoal. Figura 22 – Maquete têxtil de resíduo / Fonte: Acervo pessoal Figura 23 – Bordado à máquina / Fonte: Acervo pessoal


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Figura 24 – Maquete têxtil com diversos tipos de costuras aplicadas, adornando a camisa / Fonte: Acervo pessoal Figura 25 – Bordado manual / Fonte: Acervo pessoal Figura 26 – Bordado manual / Fonte: Acervo pessoal Figura 27 – Bordado feito na máquina caseira / Fonte: Acervo pessoal Figura 28 – Bordado manual / Fonte: Acervo pessoal Figura 29 – Estudos diversos feitos em papel vegetal com lápis grafite / Fonte: Acervo pessoal Figura 30 – Estudo realizado em manequim escala-metade misturando papel Kraft e tecido de algodão cru / Fonte: Acervo pessoal. Figura 31 – Estudo da mistura entre um blazer e uma camisa desconstruídos / Fonte: Acervo pessoal. Figura 32 – Primeiro line up proposto pela autora / Fonte: Acervo pessoal. Figura 33 – Processo de estudo: peças-piloto / Fonte: Acervo pessoal. Figura 34 – Processo de estudo: peças-piloto / Fonte: Acervo pessoal. Figura 35 – Processo de estudo: peças-piloto / Fonte: Acervo pessoal. Figura 36 – Processo de estudo: peças-piloto / Fonte: Acervo pessoal. Figura 37 – Gabriel Pauletto durante a elaboração de uma das peças da coleção / Fonte: Acervo pessoal. Figura 38 – Painel de público-alvo elaborado pela autora / Fontes: 1. Autor desconhecido. Disponível em: https://www.facebook.com/jakandjil/ photos/a.1556653551023409/1741898429165586/?type=3&theater. Acesso em: 10 de outubro de 2018. 2. Franz-Michael S. Mellbin. Disponível em: https://www.flickr.com/photos/ mellbin/6303779725/in/photostream. Acesso em: 10 de outubro de 2018. 3. Ebonee Davis. Disponível em: https://www.instagram.com/p/BdEbhKWBLFU/?hl=pt&taken-by=eboneedavis. Acesso em: 10 de outubro de 2018. 4. Ruby Cup. Disponível em: https://www.instagram.com/p/BHbvRG8Dqdx/. Acesso em: 10 de outubro de 2018. 5. Alexgowon. Disponível em: https://www.instagram.com/p/BiSL0Y4DvOj/?tagged=uoonyou&crlt.pid=camp.xoegxum1an5G. Acesso em: 10 de outubro de 2018. 6. Victoria Villasana. Disponível em: https://victoriavillasana.com/#jp-carou-


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html. Acesso em: 10 de outubro de 2018. Figura 39 – Versão final do Line Up / Fonte: Acervo pessoal. Figura 40 – Croqui 1 e desenhos técnicos do look / Fonte: Acervo pessoal. Figura 41 – Croqui 2 e desenhos técnicos do look / Fonte: Acervo pessoal. Figura 42 – Croqui 3 e desenhos técnicos do look / Fonte: Acervo pessoal. Figura 43 – Croqui 4 e desenhos técnicos do look / Fonte: Acervo pessoal. Figura 44 – Croqui 5 e desenhos técnicos do look / Fonte: Acervo pessoal. Figura 45 – Croqui 6 e desenhos técnicos do look / Fonte: Acervo pessoal. Figura 49 – Croqui 7 e desenhos técnicos do look / Fonte: Acervo pessoal. Imagens de abertura e transição de capítulos todas fotografadas por Ana Carolinna Gimenez.


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Pessoas por trás deste trabalho

Idealização: Ana Gimenez

Modelagem e costura: Gabriel Pauletto

Modelagem e costura: Fernando Jeon

Modelagem e costura: Célia Bueno

Modelagem e costura: Gabriele Gaido

Diagramação: Bruno Camello

Bordados: Júlia Ribeiro



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