Maleta dos Bonecos
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maleta dos bonecos do Domingos Basto Moura | fotografia de António Azevedo | espólio do Teatro d’Àgua Acesa
OAi!...meu rico Artur…
“O meu rico Arturinho que vai para a cova fria”. Nos anos 60 do século passado, ainda era possível ouvir os fantásticos Rober tos nas romarias, nas praças ao domingo ou nas praias no Verão. O articulado som estridente da palheta amplificada da voz do fantocheiro, enchia o espaço e o públi co, o respeitável público rejubilava de in disfarçada emoção. Depois os tempos enegreceram: por um lado, com a guerra colonial, o Estado tor nou-se mais repressivo, os ajuntamentos menos consentidos e mais vigiados (per
seguiam-se os artistas de rua, como se perseguiam os mendigos); por outro lado, com a evolução tecnológica e o consumis mo, as romarias e as praças tornaram-se mais ruidosas que nunca. Com as elec trificações sonoras as festas e romarias ficaram impossíveis de competir para os fantocheiros. Muitos desistiram da arte das Marionetas, alguns continuaram nas feiras vendendo jogos tradicionais ou em pavilhões de matraquilhos.
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Com a recuperação da República e a res tauração da Liberdade tudo parecia possí
4 vel, mas não foi fácil: recuperar do anal fabetismo, do alto índice de mortalidade infantil, do baixo nível de esperança de vida, da paupérrima economia, factores com que se aferem os indicadores civi lizacionais de uma sociedade. Lá se foi construindo o caminho: umas vezes para a frente, outras vezes para trás. De igual modo, a Educação, a Cultura e a Arte recuperaram do atraso de décadas face aos países mais desenvolvidos da Europa. No caso concreto das marionetas, esse esforço nasceu da vontade de grupos in dependentes de jovens e de amadores de teatro, um pouco por todo o país que se consolidaram nos finais da década de 70. Seguindo o exemplo de companhias, nesse tempo existentes, como o Teatro de Branca Flor (1962-1981) da escritora Lília da Fonseca e as Marionetas de S. Louren ço e o Diabo (1973-1989) de Helena Vaz e José Alberto Gil. Da maior importância se revelou a criação do FAOJ. Este organismo de Estado para a juventude veio galvanizar o movimento e, sobretudo, fornecer apoio na formação e na realização dos Encontros Nacionais de Teatro de Fantoches, iniciativa anual que durou até finais dos anos 80 e que se rea
lizavam em várias cidades do país. Nes ses Encontros os grupos apresentavam e assistiam a espectáculos, trocando expe riências e ideias. Organizaram-se oficinas de construção de vários tipos de marione tas, tudo com o intuito de contribuir para a formação dos actores e manipuladores e, por que não, dos públicos. Importa referir o nome de uma figura tutelar destes primeiros Encontros, pelo seu alto valor pe dagógico que foi Francisco Esteves, actor, encenador, fundador da Casa da Comédia em Lisboa e um grande amante das ma rionetas que, nestes Encontros, fez inúme ras sessões de projecção de diapositivos comentados sobre a história da Marioneta no Mundo e sobre as diferentes técnicas utilizadas nos vários continentes. A Fran cisco Esteves deve-se, de igual modo, a entrada para os quadros do FAOJ do fantocheiro popular António Dias, (19221986) natural de Rossio ao Sul do Tejo, no concelho de Abrantes.
A vida do António Dias tinha sido ma drasta, nestes últimos anos da sua vida, o seu estado de saúde era já muito de bilitado, apesar dos seus pouco mais de sessenta anos. No entanto, apresentou ainda inúmeras vezes os seus robertos
de vista: na manipulação dos bonecos, na movimentação adequada das persona gens, na utilização da palheta, na repesca gem dramatúrgica dos poucos textos do reportório a que acedeu e na construção simples mas prática dos bonecos. O discí pulo rapidamente se tornou mestre. João Paulo Seara Cardoso, não apenas recriou o Teatro Dom Roberto, como lhe deu no toriedade nacional e projecção internacio nal. Em 1988, fundou o Teatro de Mario netas do Porto que dirigiu até à sua morte
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nos Encontros e na Feira dos Fantoches, em Matosinhos em Maio de 1984, numa organização do Teatro d’Água Acesa. Ten do vindo a falecer tragicamente em 1986, levando consigo os seus bonecos. Foi a partir deste contacto com o António Dias que se conseguiu recriar pela primeira vez o Teatro Dom Roberto. João Paulo Cardoso, igualmente técnico do FAOJ (Porto), foi quem tomou a tarefa da recriação dos robertos e fê-lo de uma forma magistral. E, sobre todos os pontos
apurar a forma do mestre, em virtude de há muito tempo não pegar nos bonecos, para duas ou três actuações na Feira de Fantoches de 1994, que organizamos em sua homenagem. Os espectáculos foram realizados na Festa da Cidade, junto da Câmara Municipal e participaram, (uns a seguir aos outros, sem qualquer pausa como numa robertada) o Domingos Basto Moura, o João Paulo Seara Cardoso e o Raul Constante Pereira, assim como os Tanxarina da Galiza, o Beto Hinça do Brasil e o Teatro d’Água Acesa. Voltaríamos em Junho desse mesmo ano para repetir a ho menagem na sua freguesia natal. Assim como o António Dias, também o Domingos Moura não teve vida fácil. Mui to novo trabalhou no Pavilhão Mexicano de Manuel Rosado, enquanto espiava os roberteiros até conseguir aprender a arte, ter a sua barraquinha e andar na itinerân cia. Chegou a ter funcionários, um cão que colocava no cimo do teatrinho, uma águia que foi muito difícil de amestrar, embora nada fizesse além de permanecer quieta e até uns ratos hamsters numa roda e era tudo, como que um circo ambulante, no seu dizer, para atrair a pequenada. Morou em Matosinhos até 1967, pela facilidade
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precoce em 2010. Os espectáculos que o TMP produziu de cariz marcadamente contemporâneo, foram dos mais elabora dos técnica e artisticamente falando, na sua época, capazes de nos provocarem aquele calafrio que somente as grandes criações conseguem.
Ai!... O meu rico Artur… “O meu rico Artu rinho que vai para a cova fria”. Era assim que nos anos 60 do século passado, ainda era possível ouvir os fantásticos Robertos na Romaria do Senhor de Matosinhos. Só muito mais tarde, porém, é que consegui mos encontrar o artista que interpretava os bonecos. Chamava-se Domingos Basto Moura (1921-1995) natural de Forjães, no concelho de Esposende. Entre Janeiro e Maio de 1994 fizemos várias sessões de trabalho com a finalidade de registar em áudio e vídeo testemunhos da sua vida e do seu reportório: nomeadamente, a Rosa e os três Namorados que tinha algumas di ferenças em relação à fixação do texto que Azinhal Abelho havia publicado no Teatro Popular Português VI volume; assim como o Barbeiro Diabólico, numa versão muito mais alargada da que se conhece a sul, onde se inclui as deixas com que abrimos este texto. Por outro lado, interessava-nos
JOSÉ curadoriaQUEIROGAdaexposição
cesso esse que prestigia o teatro popular português e os seus executantes, quer os do passado, quer os desta geração actual detentora de uma mais sólida desenvol tura intelectual, sobre quem pesa agora o futuro. Aqui fazemos justa menção a Raul Constante Pereira, Manuel da Costa Dias, José Valbom Gil, Jorge Soares, Filipa Mes quita, Sara Henriques, Ricardo Ávila, Nuno Pinto, Fernando Cunha, João Costa, Sérgio Rolo, Rui Sousa e Vítor Costa que estiveram presentes no Olhó Boneco – I Festival de Marionetas de Vila do Conde, para uma grande Robertada, em Agosto de 2022 a convite da Lafontana, Formas Animadas.
7 de deslocação e a proximidade do Porto. O que possibilitava, aos fins-de-semana, uma peregrinação sui generis, a pé e com todas as tralhas às costas os animais atrás seguindo-o, assim como os putos à solta na rua. Começava no Jardim Basílio Teles e em cada paragem, uma representação, descansar, copo e bucha. Siga viagem. Pa ragem no Castelo do Queijo, na Rotunda da Boavista e no jardim da Cordoaria. Dez quilómetros ida, mais coisa menos coisa, a pé e com as tralhas às costas. Voltou depois para a sua aldeia Forjães, no inte rior do concelho de Esposende, onde sub sistiu precariamente com um barracão de matraquilhos que mal dava para comer e onde faleceu em abril de 1995. Felizmente para a cultura e para a cultu ra popular portuguesa, que o trabalho e a dedicação destes artistas, a quem presta mos homenagem, frutificou nos inúmeros companheiros que hoje de norte a sul e ilhas apresentam regularmente o Teatro Dom Roberto. Tudo isto tornou inequívoco o reconhecimento público em 2021, com a integração no Inventário Cultural Imaterial Nacional. Num processo laborioso e feliz liderado por Maria José Machado Santos do Museu da Marioneta em Lisboa, pro
Viva o Teatro Popular Português. Viva o Teatro Dom Roberto.
Teatro Dom Roberto | 1º Festival das Marionetas de Vila do Conde | 1 a 15 agosto 2022
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Domingos Basto Moura início da década de 60 do século passado.
Porto Jardim da Cordoaria
Acompanhei o João Paulo sempre que possível, nas suas digressões para fazer “os Robertos” e foram muitas, em Portugal e no estrangeiro. Recordo uma, que não vou esquecer, foi num festival em Jerusa lém, numa praça cheia e o público mesmo sem entender, aderiu com imensa alegria às pauladas e ritmo alucinante dos bone cos, que às vezes pareciam querer saltar da barraca. Passados alguns anos, nós e as nossas duas filhas, e lá íamos com verdadeiro espirito ambulante e familiar. A última vez que o João Paulo fez o Teatro Dom Roberto, foi em 2010, na Guarda e lá estávamos os quatro, felizes e unidos.
O Roberto é bom rapaz
Escrever um texto sobre o Teatro Dom Ro berto é escrever sobre o que ficou inscri to em mim da experiência de vida com o João Paulo.
O Roberto é bom rapaz, esta é a imagem que eu guardo de um boneco que tem uma voz estridente mas única para mim, é um herói simples, que marcou gerações e hoje faz parte do Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial.
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Para mim, o Teatro Dom Roberto começa va em casa, quando o João Paulo verificava os materiais, experimentava a palheta e de repente era como se estivéssemos já numa praça ou noutro lugar público. Nes ses momentos, com a voz estridente, dizia coisas divertidas, que nos incluíam.
As nossas filhas gostavam de ficar atrás da barraca a desenhar, no fim, quando o público se aproximava para ver os bone cos, as duas gostavam de fazer parte da quele momento mágico de descoberta, os olhares das outras crianças pareciam surpreender sempre e sentiam que tudo era especial.
Muito interessado pelas novas formas de fazer teatro com marionetas, sempre ficou contudo, a profunda ligação à tradição, ao Teatro Dom Roberto, legado que teve o pri vilégio de receber do mestre António Dias.
Quando conheci o João Paulo, ele já fazia o Teatro Dom Roberto há mais de uma dé cada e não hesitei quando me pediu para o acompanhar, fui sempre com todo o meu entusiasmo. Nunca me cansei de assistir, descobria sempre algum detalhe, era de um rigor espantoso, movimento e voz pa reciam nunca faltar.
O Teatro Dom Roberto do João Paulo Sea ra Cardoso (1956-2010), meu marido e pai das minhas filhas, encontra-se em exposi ção permanente no museu sonhado por ele, o Museu das Marionetas do Porto, inaugurado no dia 3 de fevereiro de 2013, dia do seu aniversário.
Isabel Barros
maleta dos bonecos de João Paulo Seara Cardoso
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Hêê Touuuro... hêê Tourito... Estás morto ou estás surdo?!
E uma vez mais, o João Paulo convida-me para participar na série A Árvore dos Pata fúrdios que ia dirigir na RTP e que foi para o ar um ano depois. Seguiram-se anos di
Nunca tinha pensado nisso antes, mas achei uma excelente ideia e no ano a se guir, com vários amigos, tinha um grupo de marionetas a funcionar numa garagem emprestada, onde construímos e estrea mos a minha primeira peça de teatro de formas animadas, o Romance da Raposa de Aquilino Ribeiro. Este trabalho levou-me a participar em alguns dos últimos Encon tros Nacionais de Teatro de Fantoches, organizados pelo FAOJ. Foi nessa altura que conheci o José Gil☺. Foram momentos fantásticos de descoberta, aprendizagem com diversos formadores e espetáculos nacionais e estrangeiros, onde podíamos ver o que se fazia com as marionetas neste nosso país, onde não existia nenhum festival de marionetas... nem telemóveis… nem Internet... mas não se estava mal… tí nhamos dois canais de televisão!
A minha vida com o Teatro de Formas Ani madas e com o Teatro Dom Roberto tem um responsável a quem dedico este texto. Em 1982 fazia parte do grupo de teatro da escola e no âmbito de um encontro nacio nal de teatro escolar, realizado no Porto, frequentei um workshop de formas ani madas orientado pelo João Paulo Seara Cardoso, na época um jovem formador do FAOJ, teria ele 26 anos. Não fazia ideia de que viríamos a ser amigos e a trabalhar juntos mais tarde. A forma como se sen tia a sua alegria a dar vida aos bonecos, a forma como comunicava e partilhava esse prazer era contagiante. A experiência foi para mim uma fantástica descoberta de realização pessoal. Animar bonecos e ob jetos e conseguir que respirassem e falas sem …?! Imaginar e construir as histórias e os mundos que quisesse…?!
Pediram-me para escrever este texto so bre a minha relação com os Robertos o que me obriga a fazer uma viagem de vol ta a 40 anos atrás.
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presas, ano após ano. Foi também nesta feira, em 1985, que vi a estreia do João Paulo a fazer os Robertos no jardim de Matosinhos, onde apresentou uma nova estrutura dramatúrgica, mais teatral e coe sa, onde os gestos e intenções ganharam uma renovada energia. Foi também nesse ano que vi na Feira o Javier Villafañe com os seus bonecos e alguns anos mais tar de, em 1994, também o Domingos Basto Moura com os seus Robertos. Ainda em 1985 foi o Ano Internacional da Juventude e nessa comemoração aconteceu na RTP o concurso televisivo Formula J, em que
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maleta bonecosdosdo Raul
vertidos com a gravação de Os Amigos do Gaspar e de No Tempo dos Afonsinhos, também para a RTP. Mas também tínha mos o Teatro D´Agua Acesa, dirigido pelo José Queiroga Santos, que organizou a I Feira de Fantoches de Matosinhos em 1984. Teve dez anos de existência... Parti cipei na primeira e na última edição e foi aí que vi pela primeira e única vez o mestre António Dias a fazer os Robertos. Ao ver o espetáculo veio-me à memória aquele som estridente da palheta que já tinha ouvido e visto quando era pequeno… A Feira de Fantoches era um espaço de sur
Constante Pereira
Deu-me uma palheta, ajudou-me no jogo e nas rotinas e lá fui eu, a tremer, apre sentar ao júri a Tourada. Correu bem :) No ano seguinte estreei-me com A Tou rada e O Barbeiro na Feira de Fantoches, em Matosinhos. Em 1987 acontece a 1ª BIME – Bienal Internacional de Mario netas de Évora dirigida pelo José Russo, onde aconteceu a minha primeira reunião de Roberteiros e onde se estreia o Manuel Dias com o seu Teatro Dom Roberto. Em 1989 cai o muro de Berlim e aparece o FIMP, criado pela Isabel Alves Costa, que desde sempre acarinhou e programou o Teatro Dom Roberto. Uns anos depois, se não me engano, aparece o Jorge Soa res, depois o José Gil, depois o Fernando Cunha e todos os outros a seguir… E a SA Marionetas da Sofia e do Gil organizam os primeiros encontros de Teatro Dom Rober to e junta-nos com o Punch and Judy… e
Para finalizar, é hoje incontornável referir a Maria José Machado Santos que desde 2001 dirigiu o Museu da Marioneta de Lisboa e me convidou a apresentar o Teatro Dom Roberto, na sua inauguração. Duran te os vinte anos em que dirigiu o museu, apoiou sempre o teatro de marionetas e, com um carinho especial, o Teatro Dom Roberto com a organização em Lisboa de várias maratonas, em que conseguiu juntar praticamente todos os que neste momento apresentam este teatro. Foi o motor do processo de candidatura para a inclusão na lista do Inventário Nacional de Património Cultural Imaterial do nosso Teatro Dom Roberto, o que veio a concreti zar-se em 2021.
a Alma D´Arame do Amândio Anastácio também organiza um encontro de teatro popular e junta-nos com o Mamulengo, e o FIMFA também surge e programa o Dom Roberto.
RAULPalhetadas.CONSTANTE
Ao Fernando Cunha e ao Marcelo Lafon tana obrigado e bem hajam pelas vossas
PEREIRA
13 equipas de jovens de todas as capitais de distrito competiam em diversas provas. O responsável pelo grupo do Porto, do qual eu fazia parte, era o João Paulo. Na pro va de criatividade do concurso escolheu apresentar o Teatro Dom Roberto e desa fiou-me a fazer A Tourada.
Guardo uma impressão agradável desta recordação sem, no entanto, ter imagens do que vi na altura.
maleta bonecosdosde Manuel Costa Dias
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TRULÉ
O porquê de Trulé Trulé.
Porque na região da Beira Baixa no início da representação dos Robertos o manipu lador rufava um tambor ao mesmo tempo que um jovem saltimbanco evoluía em cima de um tapete, pousado sobre a ter ra, com a finalidade de atrair público para
O princípio. Na Aldeia da Aparecida, em Lousada, no decorrer das festas de Nª Srª da Aparecida, teria na altura cerca de quatro anos, assisti a uma representação de Robertos. A imagem que guardo é de uma barraquinha de ar miserável e tom acastanhado por cima da qual surgiam os bonecos. Recordo que, em frente da barra quinha, havia um montinho de terra onde me encontrava em pé a assistir ao espetá culo e que o público era quase inexistente.
O despertar do interesse. Acompanhei os últimos Encontros Nacionais de Teatro de Fantoches como formador assistindo a espetáculos de Robertos quer por António Dias como por João Paulo. Decidi então criar o meu próprio espetáculo de Robertos que acabei por estrear em 1987 na 1ª BIME – Bienal Internacional de Marionetas de Évora.
O Teatro de Robertos - marionetas de luva que fazem parte da tradição das marione tas em Portugal, foi muito recentemente inscrito no Inventário Nacional do Patri mónio Cultural Imaterial.~
a representação. Com a “casa composta” iniciava-se a “função”. Do som produzido pelo rufar do tambor resultou a designa ção de “Trulés” forma regional para desig nar os Robertos.
Em 1993 dois novos sketches “o Namoro” e “a Tourada”. Atento aos sketches tradi cionais, a Tourada neste espetáculo, salvo
1º espetáculo “Baile de Máscaras” e “Ma ria Liberdade” Nestes 2 sketches originais a técnica e a manipulação é a de Robertos, luva, cabeças de madeira, utilização da palheta, da cana de bambu e a velocidade de manipulação, acrescentei à sua originalidade o acompanhamento musical por um acordeonista, o Gil Nave. O músico ao vivo só aconteceu nas primeiras presentações sendo posteriormente substituído pela música original gravada.
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Mais recentemente novas propostas.
A construção dos bonecos. Esculpi as ca beças na forma que fui capaz e que sen ti que correspondia ao personagem que quis representar. Para o corpo fiz a luva em tecido mais grosso e por cima vesti o fato que o caracteriza.
algumas particularidades, é semelhante ao conhecido.
Em 2012 “Uma tourada dos diabos”, pre tende promover a tradição milenar das marionetas, em particular o espetáculo de Robertos juntando-lhe o instrumento musical tradicional do Alentejo, a viola campaniça, e a voz do fado, resultando num espetáculo de forte raiz tradicional e popular da cultura portuguesa.
Em 2019, estreia “o Namoro”, novo sketch de robertos manipulados por mim, Manuel Costa Dias, acompanhados pela viola e voz de Nuno do Ó e pela campaniça e voz de António Bexiga. Conta as aventuras e desventuras do Roberto e de quem com ele se cruza, no intento de se casar com uma rapariga, a Maria, “que é toda boa, que é toda gira”.
MANUEL DA COSTA DIAS
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maleta dos bonecos de José Gil SA Marionetas – Alcobaça
Obrigado por tudo companheiros…… JOSÉToma!...Toma!…Toma!…MANUELVALBOM
Hoje penso que o Mestre Dias e o João Paulo devem estar orgulhosos disto tudo.
GIL
Toma!...Toma!...Toma!...
Ao longo dos últimos 25 anos, com a companhia S.A. Marionetas, percorri o mun do a apresentar o nosso herói por quase todos os continentes recebendo o reco nhecimento do público e dos meus pares através de prémios e nomeações nos prin cipais certames dedicados ao teatro de Recentementemarionetas.
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Anos depois surgiu a oportunidade de me formar na Universidade de Évora onde re cebi o grau de Mestre em Teatro com uma tese sobre o Teatro Dom Roberto.
contribuí no processo de candidatura para a inclusão na lista do In ventário Nacional de Património Cultural Imaterial do nosso Teatro Dom Roberto, que se concretizou em 2021.
Assim o fiz durante muitos anos. Tinha uns 13 anos. Só mais tarde, em 1998, de pois de saber falar bem com a palheta e por muita insistência dos marionetistas mais velhos como o João Paulo S. Cardo so e o Manuel Dias montei o meu Teatro Dom Roberto.
Desde esse dia a minha vida mudou para sempre. Não tenho memória do acontecimento, mas a professora Lúcia Serralhei ro, que ainda é grande entusiasta desta forma de arte, contou-me que pediu ao Mestre Dias para me mostrar a tão famo sa “Palheta”, um segredo dos deuses na altura. Ele tirou-a da boca e deu-ma. Eu recebi-a na minha mão e coloquei-a na boca fazendo de imediato um som que surpreendeu o Mestre. Disse-me para ficar com ela e praticar muito.
O Teatro Dom Roberto está na minha vida desde os dias que o via, na praia da Naza ré, em pequeno, sem nunca imaginar que uns anos mais tarde iria conhecer o Mes tre António Dias.
maleta dos bonecos de Filipa Mesquita Teatro e Marionetas de Mandrágora - Espinho
Desde 2010 que percorro festivais e con tato com os bonecreiros tradicionais. Durante estes anos, fotografei, conversei, filmei e desde o início surgiu uma grande paixão que me levou a uma maior investi gação tentando compilar registos escritos da presença dos Robertos em Portugal.
Bonecros apaixonamque
FILIPA MESQUITA
Observei as histórias, as barracas, os fan toches, os adereços e tornou-se inevitável criar um teatro dom Roberto, caminhando pelo legado tradicional, mas fazendo apropriações pessoais.
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Reconhecendo a importância desta tradi ção inscrita no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial em Portugal, os Valdevinos organizaram em 2021 o “É Só Palheta” Encontro de Teatro Tradicional Dom Roberto, em 2023 terá a sua 2ª edição e tudo faremos para que esta nobre arte se mantenha viva.
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maleta dos bonecos de Fernando Cunha
do Teatro Dom Roberto quando finalizou as suas 18 primaveras. Uma boa idade para enfrentar tão respeitosa arte, retor nando de novo esta tradição para a nos sa terra, Agualva. A Companhia delegou a tarefa de construir os Robertos à Ana Pinto, a cenografia e adereços a Fernando Cunha e Carlos Apolo, assim como, mais recentemente a José Quevedo. A anima ção dos Robertos ficou a cargo do bonecreiro Fernando Cunha.
VALDEVINOS TEATRO DE MARIONETAS
SaloiosRobertos
O concelho de Sintra testemunha a tradi ção do Teatro Dom Roberto. Contam os mais velhos que as praias, feiras e mercados eram sempre visitadas pelos “Rober tos”. A Feira de Maio de Agualva, feira que existe há mais de 300 anos, era um desses locais por onde os bonecreiros se instalavam para animar a malta e conseguirem um pouco para o seu sustento. Diz o povo: “lembro-me da paulada e da voz dos Ro bertos”, voz essa transmitida pela famosa palheta, fundamental para a distinção do que é ou não Teatro de Robertos.
As primeiras produções foram as histórias tradicionais que chegaram aos nossos dias: “O Barbeiro Diabólico” e “A Tourada à Portuguesa” com estreia na Casa da Ma rioneta de Sintra em Setembro de 2015. No ano seguinte, mais duas histórias tra dicionais: “O Castelo dos Fantasmas” e ”A Rosa e os Três Namorados”. Não que rendo ficar por aqui e como entendemos que o Teatro Dom Roberto não tem, não pode e não deve estagnar, foram criadas mais duas histórias originais, “O Moleiro e o Burro” e “O Pescador” dedicadas à terra de origem dos Valdevinos: Sintra.
A companhia Valdevinos Teatro de Mario netas apresentou a sua primeira produção
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maleta dos bonecos de Sara Henriques
Na verdade, a fisionomia das minhas ma rionetas incita ao tipo de manipulação e in terpretação que imprimo às personagens, aos detalhes que vou experimentado e tra balhando. Salvaguardo que, as rotinas no repertório tradicional, são muito parecidas entre os bonecreiros e que os detalhes de
Falar com a palheta foi um processo bas tante moroso e onde contei com o apoio de muitos colegas “roberteiros” dos quais des taco o Raúl Constante Pereira e o José Gil.
Codiretora artística Red Cloud Teatro de Marionetas | Criadora, Atriz e Marionetista
cada manipulador, além das personagens utilizadas, conferem as maiores diferen ças entre elas.
Aprendi as rotinas e a fazer o espetácu lo através dos registos de vídeo de João Paulo Seara Cardoso, a quem presto eter na homenagem e com quem tive a oportunidade de trabalhar como atriz e marione tista desde 2003 até ao seu falecimento.
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As marionetas que utilizo são também de Rui Rodrigues, que as esculpiu a partir das de JPSC, acentuando a sua aparência có mica e de desenho animado, pelas expres sões como, olhos muito abertos, “esbuga lhados” e sorrisos marotos.
A experiência que adquiri e tenho vindo a desenvolver desde então tem sido bas tante enriquecedora e reveladora. O “Tea tro Dom Roberto” permite, pelo seu cariz popular e exigente, uma evolução artística contínua em contacto direto com o públi co. Encontro nesta prática um trilho para uma fonte interminável de conhecimento, que talvez não se encontre em textos es critos, mas apenas com a experiência seja possível acessar. Não esquecendo que este é um caminho que pode ter a duração da vida e como é natural, muitas coisas es tarão ainda por descobrir (no meu caso!), no poder da reunião popular, os jogos de interação que acontecem em cada apre sentação entre os bonecos e o público. Como profissional de teatro na área da criação, interpretação e manipulação, observo estas formas tradicionais e po pulares com todo o interesse tentando estabelecer pontes com a contempora neidade. Estas impressões e curiosidades são basicamente o mote para continuar a apresentar com entusiasmo o Teatro Dom SARARoberto. HENRIQUES
Apresento o Teatro Dom Roberto desde 2012 em contextos variados: festivais de teatro de marionetas nacionais e interna cionais, eventos municipais, feiras, praias, jardins, praças e escolas, mas também em teatros, bibliotecas e museus.
RobertoDomTeatro
“Pelo sonho é que vamos”
maleta dos bonecos de Ricardo Ávila, fotografia de António Araújo
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Encontrei ou encontraram-me, eis a questão. Tudo parece ter caminhado para esta guarita de pano, casa com telha do de céu, paredes de chita, janela de ou vidos atentos, alicerce de pés dançantes onde começa a manipulação. Aqui se can ta, dança, narra, anima, aqui o teatro se re-
Saber-me membro da família Dom Roberto deixa-me comovido e contemplativo, em si lêncio, a saborear o sonho, a sentir uma ale gria plena mas de saudade feita, um pouco mais consciente da finitude, mais próxima da paz que o desapego dá, porque meu é nada, e nisso está o real ganho.
pete, condensado, desde o rito primordial.
Nestas palavras de Sebastião da Gama me revejo, sossego e me restabeleço. Haja ou não haja frutos, conto histórias para con tar histórias; já lá vão 19 anos. Nessa andança, os “robertos” são a língua que mais recentemente quis aprender. Mas, quando olho a longínqua infância, vejo que já por lá andavam, pacientes, à espera. Escondi dos, naquele curral de galinhas, nos uten sílios rejeitados: uma colher de latão, um frasco de remédio, um naco de telha... e nas coleções de caricas e latas e anéis de garrafa, com que fingi os seres e os mun dos que me ajudaram a ser neste, o das coisas exatas. Escondidos nos contos do tempo antigo, que escutei à madrinha e ao padrinho. À espera na atração pelas formas, vida latente, “anima”, que alguém, amando incondicionalmente, me passou.
Em 2018 recebi a palheta do José Gil Val bom. Um ano depois lá tirei a custo umas berlaitadas e apresentei-me ao público da Terceira, meu berço. Fui a Alcobaça, em 2019, digamos que ao Baptismo. Fui a Sintra, com os Valdevinos, à maratona no Museu de Lisboa, em 2021. Vou-me mostrando aqui e ali mas é na Praça do Gado da ilha Terceira que me esbardalho, aos domingos de manhã, a competir com o ruído e o caos e a indiferença de muitos, que para cada cigarra cantando há mil for migas desdenhando. Mas também a rece ber as prendas do acaso criador.
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RICARDO ÁVILA
É ali, no fio da navalha, que quero caminhar, no encalce possível dos antepassa dos, que triunfaram sobre a fome e sobre a máfia do esquecimento.
Pelo sonho é que vamos, comovidos e mudos.
maleta dos bonecos de Jorge Soares palheta”
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25 anos “à
“… Barraca do Gregório!?… Ele há coisas… era o avô Gregório que me levava a ver os Robertos às feiras da Fuzeta e de Olhão” (Disse-me, entusiasmado, o meu primo Ál varo sobre o nosso avô, o único que partiu antes de eu ter chegado.) Roubados aos clássicos, apareciam da madeira, pelo meu velho canivete, a Rosa, o Barbeiro, o Soldado 31 e o Padre; depois, o Diabo, a Morte, o Guarda e, posteriormente, Dom Roberto… o Algarvio. Em simultâneo, a Barraca do Gregório, feita de ferro e for-
À palheta com bonecos de pau e pano, almados por sorrisos, espantos e gargalhadas de tintas garridas. Coração livre e asas à flor dos dedos. Em duas pauladas passaram 25 anos… e o seu coração ainda faz
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A Barraca do Gregório foi armada pela primeira vez, perante um público, antes no Natal de 1997, em Lagoa, na escola primária, a convite da professora Teresa Rodrigues.
“Meninas e meninos, senhoras e senhores, rrrrrrrespeitável público: Dom Roberto e a Namorada”
JORGE SOARES
lo Cardoso cujo espetáculo, no Jardim da Estrela, em Lisboa, me apaixonou para a vida; o Raul Constante, um companheiro; o Francisco Mota através duma pequena publicação; e o José Gil, que conhecia das Bienais de Évora, antes de fazermos Tea tro Dom Roberto, por entre bares, amigos e públicos de rua; E ainda, o Domingos Moura, de quem eu assisti a uma valente “palhetada” com o Manuel Dias apesar de já não fazer espetáculos.
rada por uma lona de barraca de praia de riscas verticais azuis e brancas, encimada pelo “palco” bordado do mesmo azul-es curo, onde os bonecos começaram a pro cura da sua existência.
Apalpava as velhas maneiras, cantigas, brigas, danças e brincadeiras, almando, ao seu ritmo, cada uma das personagens. Depois, essas personagens foram-me le vando para outras histórias deixando, para mais tarde, as originais.
«trucla… trucla… trucla».
Na minha memória bailavam os bonecos do João Paulo Cardoso, do Manuel Dias e do António Dias; as descrições da Lour des dos bonecos nas feiras; o bonecreiro Sainhas, filho da Maria Sainhas procurado pelas ruelas de Messines. Soprado por uma musicalidade ao sul, vou adivinhando o ambiente dos espetáculos no trinar da palheta, na velocidade de manipulação, na sonoridade dos adereços.
Éramos poucos bonecreiros de Dom Ro berto. Eu, na altura, conhecia o Manuel Dias, a quem chamo de mestre e me pas sou a voz secreta da palheta; o João Pau
Começava uma viagem alucinante da Ilha da Culatra a Chaves, de Sagres a Vila Real de Stº. António. Pelos caminhos ainda apa nhou o autocarro do teatro, projeto ACTA/ VATE, prémio Gulbenkian Educação 2010objetivos comuns - levar o teatro onde não há teatros e promover o encontro entre gerações. Quando os mais velhos levam os mais novos a ver os “Robertos” como momentos felizes da sua infância, como revisitam essa mesma infância nos olhos destes pequenos espetadores. Pelo cami nho fica essa relação única com o público. Momentos inesquecíveis de excitação, ternura, empatia, loucura, liberdade… mo mentos únicos de humanidade.
maleta dos bonecos de Nuno Pinto
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dedeTestemunhoumaprendizfeiticeiro.
NUNO CORREIA PINTO
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retirei cenários e centrei-me no “jogo” para encontrar a minha maneira. Os Robertos, aqueles Robertos que o João Paulo quis que eu fizesse, tinham, desde o princípio, características diferentes de um espetá culo “tradicional” de Robertos e de como ele o fazia – sinal que não há A Fórmula: Dois atores, com vários cenários, dois manipuladores e sem palheta, mas com dispositivo sonoro. O espetáculo foi evo luindo, agora é meu – Mas pode estar na altura de fazer algumas mudanças, não digo que não. Sempre que faço Robertos continuo entusiasmado e pasmado, pois os Robertos continuam a mandar em mim, em vez do contrário, mas acima de tudo, quando faço Robertos é sempre uma ho menagem ao Mestre.
O meu primeiro contacto com os Robertos foi no Centro Histórico da Vila de Sintra, numa iniciativa do Chão de Oliva, o Mer cado de Teatro, em 1988 ou na edição de 1989, onde vi o saudoso João Paulo Seara Cardoso na sua função como roberteiro. Desde aí, fiquei trespassado com aquela paródia e o sarcasmo do sorriso dos Ro bertos. Mais tarde, depois de algumas ten tativas, finalmente o contacto direto com os Robertos e com o Mestre. Em 1998 o João Paulo realizou várias sessões comi go com o intuito de montar um espetáculo de Robertos.
fui ganhando experiência nas praias, nas feiras, salas, … copiando e se guindo o Gil, o Raul… que serviram para sedimentar o que o Mestre me tinha en sinado, mas principalmente servindo para perceber que podia fazer à minha manei ra, respeitando uma determinada matriz. Acrescentei historietas ao reportório, no vas rotinas, novas dinâmicas e estrutura,
E em 1999 fiz, pela primeira vez, um es petáculo de Robertos com a validação do EntretantoMestre.
Diretor Artístico do Fio d’Azeite –Marionetas do Chão de Oliva
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maleta dos bonecos de Rui Sousa
Cada um de nós, que transporta esta tra dição, é único. É único nas suas rotinas teatrais, único nas suas piadas, único nas suas apresentações, único nos seus ros tos rosados e sorrisos rasgados.
Viva o Teatro Dom Roberto!
em 2010, acreditava que muitos mais iriam aparecer a ‘vingar’ neste teatro e apareceram.
RUI SOUSA Santa Maria da Feira
O
Amanhã, em 2023 ou 2033, ou noutro ano mais longínquo, espero ver um maior re conhecimento, como aconteceu em 2021, com a consolidação do Teatro Dom Ro berto como Património Cultural Imaterial de TodoPortugal.estecenário é verdadeiramente me recedor, pois durante estes anos tenho recebido elogios, abraços, recordações, crónicas e lágrimas de quem recorda com alegria infâncias passadas.
Hoje em 2022, vejo cada vez mais gente apaixonada por este teatro de Marionetas tão singular. Vejo também jovens e crian ças querendo aprender esta arte, que vou deixando sementes nestes para estimular uma maior paixão.
Mas todos descendemos dos antigos exe cutantes de Teatro Dom Roberto e no fun do, todos convergimos para a vasta identi dade desta antiga arte portuguesa.
RobertoDomTeatromeu
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Mas ainda agora a minha viagem comeOntem,çou.
Assim continuemos a divulgar e a apresentar esta forma de teatro ao longo das gerações atuais e vindouras, para que as crianças de hoje sejam os adultos de amanhã, que isto irão recordar e a outros contar.
De robertoscomdadasmãosos
maleta dos bonecos de Vítor Costa Teatro BárbaraSanta–Barreiro
Dizer que a tradição familiar de Vítor Costa, de 51 anos, anda de mãos dadas com as marionetas não é apenas uma metáfora. Pai de 6 filhos, 3 raparigas e 3 rapazes, e com 5 irmãos, Vítor é o único que mantém vivos os robertos, bonecos de madeira do Teatro Dom Roberto. A sua mulher costura as roupas e os filhos acompanham-no, de vez em quando, nos espectáculos o que é para ele um prazer. O início desta história remonta à década de 50, 60, quando o pai do Vítor, João António Santa Bárbara co nheceu esta arte com Manuel Rosado, seu mestre e ex-sogro.
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adepto do diálogo entre os bonecos, “está provado que o atractivo dos robertos reside mais no som e na pan cada. Isso aliado à palheta é o que cha ma mais as pessoas.” Nos últimos tem pos, Vítor acredita que as pessoas, assim como as Câmaras e Juntas de Freguesia já estão aderir mais. “Houve uma altura que fui criticado porque os bonecos são violentos”, e até já experimentou que não houvesse tanta pancada entre eles, mas rapidamente percebeu que assim as pes soas não acham graça, “quando apareço com um boneco e dou uma pancada, to das as crianças se desatam a rir”.
Entretanto juntou-se com a mãe do Vítor e em 1968 trocou os pavilhões de feira pela guarita, espécie de barraca individual. Só parou em 1991, ano da sua morte, por Vítor,atropelamento.queacompanhava o pai juntamente com os irmãos, admite que a vida nas feiras não era fácil, passava-se fome, frio e à noite viravam a guarita e era lá que dormiam.
Durante a hora de almoço do pai, funcio nário da Câmara Municipal de Cascais, brincava com os robertos e até estragou alguns pelo caminho. Os seus brinquedos de criança foram estes e a imaginação encarregava-se do resto. “Fui apanhando sempre o gosto, de tanto ver o meu pai a fazer os bonecos, eu já conseguia saber as histórias de trás para a frente”, recorda, “um dia, nas festas de Santiago, em Setú
bal, as pessoas estavam à espera de ver o espectáculo, e o meu pai não aparecia, en tão resolvi, com o meu irmão mais velho, pegar nos bonecos e começar a trabalhar. Isto foi em 1983 e a partir daí nunca mais parei.” Começou então a trabalhar sozi nho, embora tenha tido a ajuda de um dos irmãos, que talhava o rosto dos bonecos. As pessoas incentivaram-no a não desistir e a manter viva a tradição que já poucos dominam. E o brilho dos olhos dos mais velhos que se recordavam dos robertos deu-lhe Assumealento.nãoser
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Em cascais onde viviam, corriam as praias da linha e da Costa da Caparica, desde o Barbas até à Fonte da Telha, com espec táculos itinerantes. As crianças senta vam-se em roda para o ver. Santa Bárbara recorria à ajuda dos filhos como chamariz de público nas apresentações, e receber as moedinhas de recompensa.
No entanto, era onde passava as férias de Verão e por isso guarda também boas re cordações de brincadeira e liberdade.
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Em 2008 realizei um workshop com Toni Rumbau no Museu da Marioneta, onde aprendi a construir a palheta e a partir daí iniciou-se uma relação intensa com o tea tro popular de bonecos. Na prática da pa lheta divertia-me dentro do carro a condu-
zir a falar para os outros condutores: Bora, vamos embora que o sinal já abriu! Porra!! ahahahhah e ria-me ...com o sorriso típico (malandro) do Roberto. Tinha a capacidade de falar com a palheta e, apaixonado por tradições portuguesas, pensei que dia iria conseguir fazer pelo menos 1 espetá culo de Robertos na rua!
Robertos
maleta dos bonecos do João Costa
Duas semanas depois parti para o Méxi co: com uma mochila de 60lts, dos quais 30lts eram ocupados pela guarita (adapta da para viajar: feita de pvc e mais peque na) e os bonecos. Do México ao Panamá fiz muitos espetáculos na rua, em jardins, em praças, em restaurantes, em centros sociais! No início de Setembro voltava para Lisboa, sem casa, sem dinheiro, mas com uma “mochila” cheia de experiências e recordações incríveis!
continuar a minha vida a via jar aqui e ali a apresentar o teatro D. Ro berto (entre outras coisas, claro!)
Com essa motivação extra parti para a criação da peça O BARBEIRO, que levaria comigo mais tarde em viagem pela América Central.Em Março de 2010, depois de muitos ensaios e prática, fui aos jardins de Belém fazer um espetáculo de Robertos pela 1ª vez para o público! Assim: espontaneamente, como seria quando andasse a viajar pela América Central! Esse seria o 1º de muitas apresentações públicas!.
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nesse mesmo ano fui viver para Aveiro e no festival IMAGINARIUS tive oportuni dade de ver o João Paulo Seara Cardoso a atuar com o teatro D. Roberto. Aí con firmou-se o bichinho de querer fazer algo mais a sério com o Teatro D. Roberto! Con tactei o João Paulo que ao telefone me passou uma grande lição: a tradição dos Robertos tinha algo precioso que havia de se preservar, mas que as “passagens de testemunhos” não eram como ir ao super mercado e pedir 1 kg de batatas!
JOÃO COSTA Mão Zorra – Teatro de Marionetas
Assim foi a minha “entrada” e “viagem” pelo mundo dos Robertos, que na verdade dura até aos dias de hoje: daqui a 2 sema nas irei apresentar os Robertos no espa ço da Mãozorra (Vila do Bispo) para um campo de férias do Burgau e para o Grupo de Teatro Sénior da Mãozorra! Em Agosto vou à Bulgária participar em alguns festi vais, regresso a 12 para no 14 de Agosto ir para o festival Olhó Boneco e apresentar o EsperoCAÇADOR!poder
Compreendi e respeitei, mas continuei na minha pesquisa!! No ano a seguir, vi o José Gil a atuar em Leiria! Nesse encontro o Gil foi como é o Gil: de coração aberto, disse-me para um dia aparecer em Alco baça e visitar a companhia dos SAMario netas e ver os seus bonecos! Mostrou-me a sua guarita e os seus bonecos! Ficou surpreendido de como eu já falava com a palheta e disse-me: Opá já fazes o mais difícil, que é falar com a palheta, agora é só seguires em frente!
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eXPO Maleta dos Bonecos 01-15 aGOSTO
Maleta dos Bonecos testemunhos do Teatro Dom Roberto Património Cultural Imaterial Português
Organização Lafontana – Formas Animadas Direção de MARCELO LAFONTANA Produção de FÁTIMA PEREIRA Curadoria da Exposição JOSÉ QUEIROGA
Parque da Cidade 1 a 15 Agosto 2022
1º Festival de Marionetas de Vila do Conde
Olhó Boneco!
Apoio DGArtes / MC Câmara Municipal de Vila do Conde