InformANDES SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR - ANDES-SN
Informativo Nº 45 Brasília (DF) Abril de 2015
Que liberdade
é essa?
P
erseguições às lideranças dos movimentos paredistas, judicialização das greves, direções sindicais operando contra os interesses da categoria que representam, aparelhamento. Seja no setor privado ou no serviço público, um breve olhar sobre as recentes mobilizações e paralisações dos trabalhadores brasileiros mostra que, apesar do artigo oitavo da Constituição Federal assegurar liberdade sindical
Docentes das instituições estaduais e federais se mobilizam contra cortes nos orçamentos e a precarização das condições de trabalho e ensino. 4 e 5
a todos os cidadãos, na realidade as coisas são um pouco diferentes. Práticas antissindicais são comuns e recorrentes, e os trabalhadores têm, cada vez mais, seus direitos de organização sindical, de maneira autônoma e independente, ameaçados. A matéria dessa edição propõe uma reflexão sobre a liberdade sindical no Brasil. Confira. 8 a 11
Entrevista: Ricardo Antunes fala dos prejuízos da terceirização para os trabalhadores. 12 e 13
Pelo mundo, estudantes lutam contra a mercantilização do ensino superior. 14 e 15
2
InformANDES/2015
Editorial
A
valorização do trabalho docente segue sendo o eixo central da mobilização dos docentes das Instituições de Ensino. A capacidade de construir a cada dia nas Universidades, nos Institutos Tecnológicos e nos Cefets sua dimensão pública, crítica e a serviço dos trabalhadores e trabalhadoras está diretamente relacionada a determinantes dos mais diversos. As condições de trabalho e ensino a que estão submetidos os docentes, técnico-administrativos e estudantes têm incidido negativamente nas instituições. Os cortes orçamentários, que se expressam nos níveis federal, estadual e municipal de governo, mas não só eles, são prejudiciais à educação pública, sua manutenção e expansão com qualidade. A perspectiva gerencialista no serviço público, expressa na intensificação do trabalho e nas formas de avaliação produtivista -verificada nas avaliações da graduação, da pós-graduação e da pesquisa -, é outro determinante. Somos cobrados coletivamente na universidade – docentes, estudantes e técnicos – a fazer mais e impelidos para a competição, que aprofunda o individualismo e a redução dos espaços coletivos de reflexão. Defendemos o trabalho docente que permita a reflexão crítica sobre a sociedade, a partir de uma instituição que assegure uma produção inovadora e crítica, com base no debate público das diversas ideias, seja nas salas de aula, seja nos eventos em que debatemos nossa produção cultural e científica e nos espaços em que publicamos nossa produção científica, cultural e artística. Nesse sentido, o corte de verbas, a precarização do trabalho e as políticas desestruturadoras da carreira e, consequentemente, do trabalho docente são os eixos centrais das políticas governamentais que temos
EXPEDIENTE
enfrentado com grandes mobilizações e greves. Se defendemos os espaços e as condições de liberdade para a reflexão coletiva, crítica e do exercício do contraditório em nosso trabalho, também devemos defender, e defendemos, que nossa prática sindical seja sustentada pela reflexão coletiva, crítica e pelo exercício do contraditório, o que construímos a partir das assembleias convocadas em cada instituição de ensino no Brasil afora, onde estão as seções sindicais no ANDES-SN. Como trabalhadores docentes, defendemos a liberdade de nos organizarmos no ANDES-SN, construído cotidianamente em nossa prática sindical e em nossos locais de trabalho há trinta anos. Não poderia ser diferente. Poderia parecer contraditório que alguns defendam que possamos debater nossas ideias e decidir pelo que queremos lutar com base em consultas eletrônicas, e, mais absurdo, com base em procurações, com o que alienamos nosso direito ao debate e decisão ao outro. Poderia parecer contraditório, mas não o é. Os mesmos que demandam dos docentes que alienem suas decisões a eles por meio de procuração, são os que participam ativamente da formulação de políticas que precarizam e intensificam o trabalho, que desestruturam a carreira e que implicam na perda de direitos dos aposentados e pensionistas. Foi assim que fizeram na greve de 2012. Sem nenhum respaldo do conjunto dos docentes das Instituições Federais de Ensino, que disseram não ao acordo proposto pelo governo federal e assinado por esse grupo que se autodenomina representante dos docentes. Nos querem massa de manobra, alienada, por procuração, sem debate público de ideias, para que
possam fazer os acordos de gabinete e permanecer nas asas do Estado interventor, que usa o que a legislação manteve de mais atrasado e contraditório com o principio da liberdade de organização sindical – a tutela do Estado para legislar sobre quem é o representante dos trabalhadores. A legitimidade de nossa representação se fez em 2012 e se faz cotidianamente nas IE, onde o ANDES-SN segue vivo, em debates públicos das ideias aos quais são convocados todos os docentes, onde exercitamos a expressão do contraditório e deliberamos os rumos de nossas lutas em defesa da educação pública, gratuita e de qualidade socialmente referenciada. Em um ano em que as políticas de ajuste retiram direitos do conjunto dos trabalhadores para atender as demandas do capital, a exemplo da dívida pública, expressão mais contundente do capital portador de juros que se alimenta do fundo público, os movimentos dos trabalhadores, expressos no movimento sindical e em movimentos sociais – pelo direito à terra, à moradia, entre outros –, que se mantém autônomos e em luta, são alvos de processos de criminalização e de ataques à autonomia e liberdade de organização sindical. Assim tem sido com o ANDES-SN e com outros movimentos e sindicatos, que, no entanto, resistem a partir de um intenso trabalho de base, que tem como objetivo avançar no processo de consciência dos trabalhadores e, portanto, na sua não submissão aos processos de alienação. Devemos lutar, assim como lutamos pelas condições de trabalho que nos permitam exercer nosso trabalho de forma pública, crítica e autônoma, pela liberdade de organização sindical, pelo direito dos professores de se organizarem e de se fazerem representar no ANDES-SN.
O Informandes é uma publicação do ANDES-SN // site: www.andes.org.br // e-mail: imprensa@andes.org.br Diretora responsável: Marinalva Oliveira Redação: Renata Maffezoli MTb 37322, Mathias Rodrigues MTb 10126, Paola Rodrigues 10982 DRT-DF e Bruna Yunes 9045 DRT-DF Edição: Renata Maffezoli // Fotos: Renata Maffezoli // Infográficos: Paola Rodrigues // Diagramação: Ronaldo Alves 5103 DRT-DF
InformANDES/2015
Comissão da Verdade
3
Seminário Nacional conclui etapa da Comissão da Verdade do ANDES-SN uma ampla divulgação nacional, com outras entidades, no intuito de que se faça a revisão da Lei da Anistia, a exemplo do que ocorreu na Argentina, no Chile, e o que está acontecendo no Uruguai. Para que não só os militares, mas os civis que trabalharam nesses assassinatos e torturas não fiquem impunes. Precisamos fazer uma frente para reverter esse processo e ter justiça nesse país”, enfatizou. A publicação será a referência do Sindicato Nacional na luta pela restauração da memória histórica e será amplamente divulgada.
Debates Na mesa “Os movimentos em luta por memória e justiça”, Maria Bernadette Moraes, do Conselho Federal de Serviço Social (Cfess) afirmou que o resgate da memória desse período servirá para estruturar uma resistência e evitar que jamais se repita. Para Fábio Ocada, docente da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp/Marília), o militarismo e a visão autoritária ainda estão presentes, com o uso de instrumentos jurídicos da época do regime, para reprimir estudantes, docentes e técnicos nas instituições de ensino superior. Egon Heck, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), lembrou que é uma constante, na história do país, a tentativa de negar a presença dos indígenas nesses Gabriela Venzke/AdufpelSSind
C
om o intuito de resgatar fatos e os efeitos relacionados aos 20 anos da ditadura empresarial-militar no Brasil, ocorrida entre 1964 e 1984, a Comissão da Verdade do ANDES-SN realizou nos dias 31 de março e 1° de abril, o Seminário Nacional da Comissão da Verdade do Sindicato Nacional, em Porto Alegre (RS), com o tema “A Universidade e a Ditadura Empresarial-Militar no Brasil: Luta por Memória, Verdade e Justiça”, resultado dos Seminários Regionais, realizados em 2014. “Com o Seminário Nacional, precedido de três encontros regionais, cumprimos com uma das etapas desta Comissão, que é o levantamento do período da ditadura no país nessas regiões brasileiras, com uma atenção especial no interior das universidades”, afirmou Antônio José da Costa, 1º vice-presidente da Regional Norte I do ANDES-SN e um dos membros da Comissão da Verdade do Sindicato Nacional. Costa ressaltou que o trabalho precisa continuar após o encontro. Segundo o diretor do ANDES-SN, as discussões dos seminários nacional e regionais serão sistematizadas em um Caderno Especial do ANDES-SN, a ser lançado no 60º Conad, em Vitória (ES). “São instrumentos que as seções sindicais poderão utilizar para fazer
Homenagem O final do Seminário foi marcado por homenagem a personalidades que dedicaram as suas vidas na luta contra a ditadura. Na ocasião, foram lidos os nomes dos 41 professores da UFRGS afastados sumariamente durante o período ditatorial.
processos, que têm sido massacrados ao longo dos últimos séculos. Anastácio Peralta, militante do Conselho Nacional dos Povos Indígenas (CNPI), destacou - na mesa “Movimentos sociais: repressão e resistência ontem e hoje” – que os ataques aos indígenas aumentaram com o passar dos anos. Da mesma forma, ocorre com os povos que vivem próximos às barragens, denunciou Cecília Zarte, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). Guilherme Boulos, do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), apontou a fragilidade que se encontra a democracia atualmente e citou a Lei Antiterrorismo, como uma tentativa do governo de inibir as manifestações populares e criminalizar os movimentos sociais. Outro traço da herança da ditadura é o fato de alguns dos que vivenciaram e apoiaram o regime estarem, ainda, em atividade, contou Gilvan Dockhorn, professor de História da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), na mesa “Superar a herança ditatorial: o futuro da luta no Brasil”. O Golpe de 64 no Brasil foi o prelúdio para o estabelecimento de ditaduras no restante da América Latina, como no Chile, na Argentina e no Uruguai. “Luta por memória e justiça na América Latina” foi o tema da última mesa do Seminário Nacional da Comissão da Verdade do ANDES-SN. Para Silvia Larrobla, professora da Universidade da República do Uruguai, nesses países, além das ditaduras, existe em comum o fato de que houve pressão política para que se evitasse o aprofundamento das investigações contra os crimes cometidos na época. Colaboração de Elisa Monteiro (Adufrj SSind), Fritz Nunes (Sedufsm SSind) e Gabriela Venzke (Adufpel SSind)
4
InformANDES/2015
Movimento Docente
Docentes Federais lutam contra precarização e corte no orçamento
A
ausência de repasse de verbas da União, aliada à política de expansão precarizada do governo federal, tem agravado a situação das Instituições Federais de Ensino (IFE). O corte no orçamento do Ministério da Educação no início do ano apenas evidenciou o cenário de sucateamento em várias instituições de ensino, que enfrentam dificuldades no pagamento de contratos com empresas terceirizadas, nas contas de água, luz, telefone, e também com a manutenção da infraestrutura de salas, laboratórios, bibliotecas, restaurantes universitários, entre outros. É o caso das universidades federais de Goiás (UFG), Minas Gerais (UFMG), Rio de Janeiro (UFRJ), Fluminense (UFF) e Espírito Santo (Ufes), que encontram dificuldades financeiras no pagamento das contas de consumo, e dos salários dos servidores terceirizados. As federais de Santa Maria (UFSM) e São Paulo (Unifesp) também foram afetadas pelos cortes. Assim como a de Alagoas (Ufal) e de Campina Grande (UFCG), em que os estudantes se mobilizaram para receberem suas bolsas no prazo previsto. Os trabalhadores terceirizados das universidades federais de Brasília (UnB), Bahia (Ufba), Federal de São Carlos (Ufscar), Federal do Paraná (UFPR) e Federal de Juiz de Fora (UFJF) também já enfrentaram, ou ainda enfrentam, atrasos em seus pagamentos. De acordo com André Guimarães, um dos coordenadores do Setor das Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes), os professores vivenciam um processo de contenção de gastos, que afeta diretamente as condições de ensino, pesquisa e extensão. Para ele, somente a mobilização é capaz de enfrentar o ataque aos direitos dos trabalhadores, imposto pelo governo federal. “No 34° Congresso do ANDES-SN ficou definido um período crescente da mobilização de nossa categoria e isso se expressa nas assembleias realizadas nas seções sindicais e na primeira reunião do Setor das Ifes, que contou com a presença de 41 seções sindicais, o que mostra a disposição da categoria para lutar. E o que motiva essa mobilização são as atuais condições que se encontram as universidades, o aprofundamento da crise econômica no país e a responsabilização por parte do governo dos trabalhadores
por tal crise”, afirmou. Na reunião do setor, ocorrida entre os dias 28 e 29 de março, ficou definido que as seções sindicais façam um levantamento sobre os impactos dos cortes no orçamento na educação nas IFE e encaminhem ao ANDES-SN. Além da agenda específica de lutas, os docentes também aderiram à Jornada Nacional de Lutas dos servidores públicos federais, ocorrida entre os dias 7 e 9 de abril. Os docentes participaram das manifestações realizadas em Brasília e diversas seções sindicais do ANDES-SN fizeram paralisações, manifestações, panfletagens e debates junto à comunidade acadêmica das IFE, e em conjunto com demais categorias dos SPF. Entre as reivindicações estão as demandas locais de cada instituição federal de ensino, combinadas com a pauta nacional do Setor das Ifes e do Fórum dos SPF.
Uma nova rodada de assembleias nas seções sindicais do ANDES-SN será realizada, entre os dias 15 e 24 de abril, a fim de pautar a greve nacional dos docentes, com indicação de período e avaliação sobre a deflagração da greve em articulação com o conjunto dos SPF. Após a rodada de assembleias, o Sindicato Nacional promoverá uma nova reunião do Setor das Ifes, nos dias 25 e 26 de abril, em Brasília (DF), para avaliar o resultado das mobilizações e definir os próximos encaminhamentos referentes à greve. “Nós vamos jogar peso político, tem rodada de assembleias gerais nas seções sindicais pautando a greve nacional do setor com a indicação de período e da articulação com a construção da greve unificada. E essa avaliação se dará a partir da resposta do governo. No final do mês, teremos uma nova reunião do setor para avaliar”, explicou André Guimarães.
Movimento Docente
InformANDES/2015
5
Cresce mobilização nas universidades estaduais Aduneb SSind
O
Sinduepa SSind
suspensa, ela não terminou. O governo tem um prazo de 40 dias para atender o que foi pautado pelos docentes”, explica. Na Bahia, o estado de greve e a paralisação das atividades por 24 horas, no dia 8 de abril, foram as respostas encontradas pelos docentes das estaduais da Bahia (Uneb), de Feira de Santana (Uefs), de Santa Cruz (Uesc) e Sudoeste da Bahia (Uesb) ao governo estadual, que se recusa a negociar e a discutir a pauta protocolada ainda em 2014, que reivindica, entre outras, a revogação da Lei 7.176/97, que fere a autonomia das instituições de ensino superior; a destinação de 7% das receitas líquidas de impostos para a educação superior; a contratação de professores, além da suspensão do corte de R$ 19 milhões do orçamento das universidades baianas. De acordo com Gean Santana, as mobilizações, não só na Bahia como em outros estados, são reflexos da política de cortes no orçamento da educação que vem sendo implementada por diversos governos estaduais, seguindo a cartilha de ajuste fiscal do governo federal. “Tornouse algo recorrente, por exemplo, em várias universidades estaduais e federais o atraso de pagamentos dos trabalhadores terceirizados, o que vem comprometendo os serviços nas bibliotecas, nas áreas de limpeza e segurança”, ressalta o diretor do ANDES-SN. A falta de pagamento a trabalhadores terceirizados e bolsistas atrasou o início das aulas na Universidade do Estado do Rio de
Jornal da Ilha
s docentes das Instituições Estaduais de Ensino Superior (Iees) de todo o país intensificaram a mobilização em defesa da educação pública, por reajuste salarial e melhores condições de trabalho. O ataque aos direitos dos trabalhadores justificado pelo balanceamento das contas para superar a crise ocorre em todas as instâncias. Entre os docentes a resposta é uníssona: não pagaremos a conta da crise em detrimento da garantia de lucros dos banqueiros e do grande capital. Segundo Gean Santana, um dos coordenadores do Setor das Instituições Estaduais e Municipais de Ensino Superior (Iees/Imes), o corte nos orçamento das universidades estaduais tem refletido nas atividades de ensino, pesquisa e extensão, na falta de equipamentos e materiais para as aulas, de concurso público para servidores técnico-administrativos e docentes, no atraso do pagamento de direitos trabalhistas e no ataque sistemático à autonomia das universidades, como ocorreu no Paraná, e na ausência de política de permanência estudantil em várias instituições. Contra o “tratoraço”, pacote de medidas anunciados pelo governo do Paraná, os docentes das estaduais paranaenses protagonizaram neste início de ano, juntos com outros servidores, uma das maiores greves já realizadas no estado. Na pauta de reivindicações das universidades estaduais do Centro-Oeste (Unicentro), do Oeste do Paraná (Unioeste), de Londrina (UEL), do Paraná (Unespar), do Norte do Paraná (Uenp), de Maringá (UEM) e de Ponta Grossa (UEPG) a retirada do projeto de reforma da previdência e a retirada do projeto do governo de ataque à autonomia universitária, entre outros. Segundo Mary Sylvia Miguel Falcão, 2ª vice-presidente da Regional Sul do ANDES-SN e uma das coordenadoras do setor da Iees/Imes, o movimento grevista teve um grande avanço com a derrubada do decreto que fere a autonomia universitária, uma pauta específica das universidades. No entanto, ainda há muito trabalho pela frente. “A greve foi
Janeiro (Uerj) e na Universidade Estadual da Zona Oeste (Uezo). A Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf) vive uma situação dramática. O corte de R$ 19 milhões do orçamento da instituição pelo governo estadual afetou diretamente os pagamentos de contas de energia, água, telefone, e do serviço terceirizado, além do repasse dos recursos para o restaurante universitário e a contratação de professores auxiliares. As bolsas estudantis de todas as modalidades estão atrasadas há mais de dois meses. Em outros estados, como no Pará e Piauí, a situação é extremamente crítica, com o possível fechamento de alguns cursos. Os docentes da Universidade Estadual do Pará (Uepa), em conjunto com os estudantes, deflagraram greve no final do mês de março contra os sucessivos cortes no orçamento, que têm comprometido as estruturas físicas dos campi, principalmente, os do interior do estado. No Piauí, os servidores estaduais se mobilizaram em defesa da Universidade Estadual do Piauí (Uespi) devido aos cortes no orçamento do serviço público estadual com a justificativa de adequação das contas públicas à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que prevê a necessidade das administrações públicas “economizarem” para conseguir pagar juros e amortizações da dívida. Além da precarização do trabalho docente, com a contratação de professores substitutos que recebem salários de pouco mais de mil reais.
6
InformANDES/2015
Mundo do Trabalho
Servidores Públicos Federais intensificam ações no mês de abril
O
s servidores públicos federais (SPF) terão que enfrentar grandes desafios na Campanha Salarial Unificada de 2015, em grande parte decorrentes das medidas de contenção de gastos e cortes de direitos adotadas pela presidente Dilma Rousseff para conter a crise econômica no país. A política de ajuste fiscal tem prejudicado milhões de brasileiros, com a retirada de direitos dos trabalhadores, em especial, dos servidores públicos. A edição das Medidas Provisórias 664 e 665, no final de 2014, que altera direitos previdenciários e trabalhistas, aliada ao PL 4330/04, que permitirá que todas as atividades nas indústrias e nos setores de serviços sejam terceirizadas, além do aumento dos impostos, o veto da correção do Imposto de Renda (IR) em 6,5%, o congelamento salarial, o corte no orçamento e a desoneração da folha de pagamento - esta última proposta que só beneficia as grandes empresas -, são exemplos das estratégias adotadas pelo governo para sanar a situação econômica do país, porém repassando ao trabalhador o ônus dessa crise. Em reunião realizada entre entidades nacionais dos SPF, no mês de março, e o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, a crise foi utilizada como justificativa para não atender à demanda de reajuste linear dos servidores. O ministro corroborou a intenção do governo em aumentar a arrecadação da União, diminuindo o percentual da folha de pagamento do funcionalismo em relação ao PIB. Barbosa afirmou que não há espaço fiscal para consentir a reivindicação de reajuste linear de 27,3%, apresentada pelo Fórum das entidades nacionais dos SPF, que também cobra uma política salarial permanente, com correção das distorções e reposição das perdas inflacionárias, data-base em 1° de maio, direito de negociação coletiva, conforme previsto na Convenção 151, e paridade salarial entre ativos e aposentados. “Os servidores estão em campanha salarial com uma pauta unificada. O governo tem uma posição de não dar reajuste linear, embora a Constituição Federal de 1988 garanta ao servidor público o direito a revisão anual dos salários. Nós quere-
mos que o governo cumpra com o que a constituição diz. Além do que, o governo está querendo adiar as negociações para o mês de maio e não tem disposição para negociar a pauta unificada dos servidores. Ele [governo] quer negociar em separado, com cada carreira para enfraquecer os servidores e desmobilizar a categoria. O Fórum dos SPF tem a compreensão de que é preciso mobilizar o conjunto no mês de abril e discutir, inclusive, a necessidade da greve”, afirmou o presidente do ANDESSN, Paulo Rizzo.
Taxação e Auditoria Único dos sete tributos federais previsto na Constituição de 1988 ainda sem regulamentação, o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) é um imposto federal que se fosse instituído a pessoa física ou jurídica com patrimônio considerado como grande fortuna pagaria sobre a totalidade de seus bens uma alíquota progressiva de imposto. Quanto maior o patrimônio, maior o percentual incidente sobre a base de cálculo. Diante da elevada concentração de riqueza no Brasil, é difícil justificar a ausência desse imposto. França, Liechtenstein, Noruega, Suíça e Índia são países que têm adotado tributos nos moldes do IGF. Segundo Paulo Rizzo, essa seria uma das alternativas para aumentar a arrecadação do estado de forma bem mais efetiva do que o “ajuste fiscal” proposto.
Além da taxação, outra medida defendida pelos servidores públicos federais é a auditoria da dívida pública para, de fato, se obter informações sobre os juros que há anos são pagos pelo governo aos banqueiros. Dados da Auditoria Cidadã da Dívida revelam que no ano de 2014, a dívida pública representava R$ 978 bilhões, o que representa 45% dos gastos do governo federal. “Os servidores expressaram junto ao ministro que para sair da crise não pode ter política de aumento de juros, que o governo adotou, é necessário uma reforma tributária que taxe as grandes fortunas do país e, sobretudo, a questão da auditoria da dívida pública, pois todo ajuste fiscal é
Confira o calendário dos SPF 15 de abril – Dia Nacional de Lutas contra as terceirizações e MPs 664 e 665 22 de abril – Reunião do Fórum dos SPF para preparar reunião de negociação com o governo 23 de abril – Primeira reunião de negociação com o governo sobre a pauta unificada e Dia Nacional de Lutas nos estados Data a definir – Na segunda reunião de negociação com o governo, Ato Nacional e Reunião Ampliada dos SPF em Brasília-DF
Mundo do Trabalho
InformANDES/2015
7
feito para continuar pagando os juros e amortização dessa dívida”, afirmou Rizzo, que criticou que nenhuma das medidas adotadas pelo governo mexe na “sanguessuga” do orçamento da União, que é a dívida pública.
Jornada Nacional de Lutas Como parte das mobilizações da campanha salarial, os servidores públicos federais definiram abril como o mês do fortalecimento da unidade entre as categorias do funcionalismo para enfrentar os ataques aos direitos dos trabalhadores e o desmonte do serviço público. No inicio do mês (7 a 9), realizaram a Jornada Nacional de Lutas. No dia 7, os servidores realizaram manifestações em todo o país. A data marcou ainda o Dia Nacional de Paralisação, em que os movimentos No dia 8, após atos nos ministérios sindicais, estudantis e sociais, do campo do Trabalho e Emprego (MTE) e do e da cidade, protagonizaram atos contra Planejamento, Orçamento e Gestão o Projeto de Lei n° 4330/04, cujo texto (Mpog), representantes do Fórum dos base foi aprovado duranSPF foram recebidos pelo te a Jornada de Lutas dos O Fórum dos SPF divulgou Secretário de Relações SPF, sob forte protesto o boletim da Jornada, do Trabalho (SRT/Mpog), dos servidores publicos com avaliação da luta e os Sérgio Mendonça, que refederais, que se reuniram encaminhamentos. Confira conheceu a pauta unificada na entrada do Anexo 2 da dos SPF e concordou em no site do ANDES-SN. Câmara dos Deputados antecipar o calendário de para bloquear a entrada reuniões para negociação dos parlamentares, enquanto outro ato, da mesma. No dia 9, a vitoriosa Jornada também contra o PL, acontecia na frente foi encerrada com plenária do Fórum dos do Congresso. As duas manifestações Servidores na Esplanada. foram duramente reprimidas pela força O presidente do ANDES-SN destacou policial, que utilizou bombas e spray de a importância da unidade dos servidopimenta para intimidar e dispersar os res para pressionar o governo a iniciar manifestantes. o processo de negociação. “Precisamos
intensificar a luta para revertermos os ataques aos trabalhadores. Foi a mobilização e a unidade dos servidores, que forçou o governo a marcar a próxima reunião para o dia 23 de abril, antecipando o cronograma apresentado pelo Ministro do Planejamento. Mas para ocorrer efetiva negociação, será necessário intensificar a mobilização e fortalecer o Fórum dos SPF nos estados. Só com muita luta avançaremos na garantia dos direitos sociais e de serviços públicos de qualidade. As nossas seções sindicais terão papel importante nesse processo”, reforçou Rizzo. Desde o início do ano estão sendo realizados encontros estaduais e regionais para intensificar a mobilização nas Seções Sindicais e ampliar representação da categoria no movimento.
8
InformANDES/2015
Matéria Central
Que liberdade é essa?
C
idade do Rio de Janeiro, março de 2015. Os trabalhadores da Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) iniciam uma greve para reivindicar direitos básicos, como o reajuste salarial acima da inflação e melhores condições de trabalho. A prefeitura carioca, no entanto, se recusa a negociar. Ao invés de discutir as propostas dos trabalhadores em greve, a empresa decide por substituir os garis. Em seu lugar, crianças, moradores de rua, pessoas em situação de risco – sem qualquer equipamento de segurança, treinamento, ou mesmo remuneração justa. Esse caso deveria ser uma exceção, mas, infelizmente, parece ser a regra. Seja no setor privado ou no serviço público, um breve olhar sobre as recentes mobilizações e paralisações dos trabalhadores brasileiros mostram que, apesar do artigo oitavo da Constituição Federal assegurar liberdade sindical a todos os cidadãos, na realidade as coisas são um
Tânia Rêgo/Agência Brasil
Perseguições às lideranças dos movimentos paredistas, judicialização das greves, direções sindicais operando contra os interesses da categoria que representam e aparelhamento ameaçam a liberdade sindical no Brasil
pouco diferentes. Práticas antissindicais são comuns e recorrentes, e os trabalhadores têm, cada vez mais, seu direito de organização, de maneira autônoma e independente, negado.
Práticas antissindicais A greve dos garis cariocas saiu vitoriosa, apesar dos ataques à organização dos trabalhadores. Eles conquistaram, por meio de sua luta, reajuste salarial de 8%, horas extras para os líderes de turma e encarregados de coleta, auxílio funeral de até R$ 800 e manutenção do ticket refeição no valor de R$ 20. Outras, entretanto, não tiveram o mesmo destino. Os patrões têm utilizado algumas estratégias para a desmobilização de uma categoria. A pressão e o assédio moral nos locais de trabalho, com ameaças de demissão dos grevistas ou dos líderes do movimento, buscam coagir os trabalhadores a deixarem de se organizar para conseguirem manter seus empregos, e acabam por enfraquecer a greve. A Justiça do Trabalho pode, de acordo com a lei brasileira e a partir da reclamação do patrão, considerar a greve ilegal ou abusiva e, por meio de
multas e de repressão policial, também acabar ou desmobilizar a organização dos trabalhadores. Além de combater os patrões e a Justiça, o enfrentamento, muitas vezes, acaba sendo também interno, com a direção dos sindicatos, que atende a outros interesses, que não os da categoria que representa. É o caso, por exemplo, dos trabalhadores do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), localizado em Itaboraí, também no estado fluminense. Lá os trabalhadores, terceirizados que acabam por trabalhar para a Petrobras, foram avisados que a Alumini, empresa que os contratava, falira. Não obstante, muitos deles não haviam recebido sequer os salários anteriores. Ao iniciar a organização da categoria para a mobilização, os terceirizados da Comperj depararam-se contra seu sindicato. Nenhuma ajuda ou solidariedade foi prestada, e os trabalhadores tiveram que recorrer a outras entidades e movimentos, entre os quais o Sindicato dos Petroleiros do Rio de Janeiro (Sindipetro-RJ) e a CSP-Conlutas. Na Ford, em Taubaté (SP), o sindicato foi além da omissão. A empresa já demitira 640 trabalhadores desde o final de 2014 por meio do Plano de Demissão Voluntária (PDV) e em 31 de março, demitiu outros 137. O Sindicato dos Metalúrgicos de Taubaté, ligado à Central Única dos Trabalhadores (CUT), aceitou o acordo
com a patronal que garantia estabilidade aos trabalhadores da fábrica desde que os 137 em lay-off fossem demitidos. Imediatamente, os trabalhadores da Ford revoltaram-se contra as demissões e contra a conivência da direção do sindicato, que deveria representá-los, e organizaram, sem o apoio da entidade, um acampamento do lado de fora da fábrica para exigir a reintegração dos demitidos. “No dia seguinte às demissões, os trabalhadores da Ford de Taubaté ligaram para o nosso sindicato, que não os representa, pedindo ajuda para a luta e dizendo que estavam sozinhos. Levamos nosso caminhão de som e alguns trabalhadores a Taubaté para prestar solidariedade”, afirma Renato Almeida, diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região. Os operários da Ford entraram em greve, e, apenas depois de iniciada a mobilização, o sindicato local se somou à paralisação pela reintegração dos trabalhadores que ele mesmo havia acordado demitir.
Existe liberdade sindical? Todos esses entraves à organização e luta dos trabalhadores geram um questionamento: há liberdade sindical no Brasil? “O reconhecimento dos sindicatos no Brasil nunca esteve acompanhado,
conscientemente, de garantias de liberdades sindicais, muito menos no local de trabalho privado. Na fábrica ou qualquer local privado de trabalho o que impera é a ditadura do patrão”, afirma Atnágoras Lopes, da Secretaria Executiva Nacional da CSP-Conlutas. Amauri Fragoso de Medeiros, tesoureiro e Encarregado de Relações Sindicais do ANDES-SN, adenda questionamentos à falta de liberdade sindical no serviço público. “Se os governos não negociam, eles negam a liberdade sindical, concebida como liberdade individual exercida coletivamente. Isso significa que, no plano individual, a liberdade sindical, é traduzida pela liberdade do trabalhador aderir ou não ao sindicato de sua escolha. Desta forma, se o empregador adota qualquer medida discriminatória contra ele, isto representa um desrespeito à liberdade sindical”, diz o docente. Em contraposição à realidade de recorrentes práticas antissindicais, Atnágoras Lopes explica a concepção da CSPConlutas sobre o tema. Para a Central, cabe aos trabalhadores a decisão sobre suas entidades, sua organização e sua luta. No entanto, os patrões e o estado passaram a influir na organização dos sindicatos, como forma de controlá-los. “O capitalismo logo tratou de incorporar e intervir quanto à 'organização' dos
9
sindicatos, através de normas e leis para “reconhecê-los”, ou, dito de outra forma, controlá-los. A liberdade e autonomia sindical deve se dar no campo ideológico, político, financeiro e sustentar-se via o mecanismo da democracia operária, na qual tudo é decidido pela maioria dos trabalhadores reunidos em assembleia”, ressalta Lopes. Para o Encarregado de Relações Sindicais do ANDES-SN, os termos da Convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), não seguidos pelo estado brasileiro, podem basilar a concepção de uma liberdade sindical realmente livre. “Nós, do ANDESSN, defendemos a liberdade e autonomia sindical, somos contra a estrutura sindical verticalizada e de estado, sustentada na unicidade, imposto e investidura sindical. Em outras palavras, defendemos a pluralidade sindical na qual os trabalhadores se organizam a partir do trabalho político de cada sindicato e com contribuição voluntária”, afirma Medeiros. O imposto sindical é um dos temas mais polêmicos da legislação sindical brasileira. Muitas centrais sindicais o defendem como forma de financiamento do movimento dos trabalhadores. A CSP-Conlutas e o ANDES-SN, no entanto, defendem firme posição contrária ao imposto. “O imposto sindical em nosso país é um Tânia Rêgo/Agência Brasil
Matéria Central
InformANDES/2015
InformANDES/2015
Matéria Central
Arquivo/CSP-Conlutas
10
dos principais mecanismos de controle do movimento sindical. Nossa central é contra a manutenção do mesmo, e de toda e qualquer contribuição compulsória dos trabalhadores à suas entidades”, aponta Atnágoras Lopes. O dirigente da CSP-Conlutas continua. “Esse mecanismo, que dura décadas em nosso país, ganhou ainda mais força com o advento do governo petista, que passou inclusive a entregar parcelas desse dinheiro as centrais sindicais. Há um velho ditado que diz que 'quem paga a banda escolhe a música', assim pensamos que só quem deve mandar nas entidades sindicais são os próprios trabalhadores, portanto esses devem livremente decidirem pelo sustento dos mesmos”, afirma Lopes. “Nós defendemos autonomia e independência financeira, temos posição contrária ao imposto sindical e lutamos por sua extinção”, completa Medeiros, tesoureiro do ANDES-SN.
Judicialização do movimento dos trabalhadores A recorrente judicialização das greves e mobilizações dos trabalhadores, seja por abusividade ou ilegalidade, é considerada por Atnágoras Lopes mais uma forma de tutela e controle do estado sobre o movimento sindical. O argumento utilizado pelos governos e patrões de que a greve é política, logo ilegal, é amplamente rechaçado pelo dirigente da CSP-Conlutas. “Como aprendemos na história, penso que 'todo ato humano é,
em última instância, um gesto político'. A greve é um instrumento político de ação, de confronto, de choque entre a classe trabalhadora e os patrões, o estado ou mesmo contra os dois ao mesmo tempo”, diz o dirigente da CSP-Conlutas. “A Justiça do Trabalho está, em última instância, a serviço dos patrões que controlam, dominam e financiam aqueles que ocupam os cargos de governo. Assim, ela deslegitima as greves, inaceitáveis aos patrões e mais que necessárias aos trabalhadores. São os patrões, banqueiros, latifundiários e proprietários em geral que são 'prejudicados' quando ocorre uma greve, sendo essa uma das formas mais eficazes de garantir que a maioria das pessoas, os trabalhadores, não tenham intensos prejuízos”, completa Lopes. Jorge Luiz Souto Maior, juiz titular na 3ª Vara do Trabalho de Jundiaí (SP) e professor da Universidade de São Paulo (USP), critica a desigualdade com a qual a Justiça trata patrões e empregados em situações de conflito. “Se os trabalhadores em greve, ao promoverem um piquete, atingem o direito de ir e vir de alguém, ou enfrentam, de alguma forma, o direito de propriedade, a polícia, por intermédio de ação judicial, é chamada a agir e comparecer ao local, o que fazem de forma imediata, tratando de dispersar a mobilização. Eles fazem valer, em concreto, os direitos contrapostos aos direitos perseguidos pelos trabalhadores, mesmo que, dentre eles, se insiram direitos liberais clássicos como a liberdade
de expressão, o direito de manifestação e o direito à integridade física, dado que muitas vezes a dispersão se dá pelo uso da força”, afirma o juiz. Souto Maior continua. “Os trabalhadores se veem impedidos de exercer o direito de greve na forma eleita, mesmo que esta seja uma garantia constitucional, enquanto que o descumprimento da lei pelo empregador, que pode ser, em caso hipotético, o não pagamento de salários, que é um bem necessário à sobrevivência, não desafia a ação policial, tendo os trabalhadores que buscar o seu direito, se quiserem, pela via do processo, na forma já declinada”, conclui. Um dos pontos polêmicos em relação à judicialização de greves é o da manutenção de serviços essenciais durante as paralisações. Diversas greves, tanto no serviço público quanto no setor privado, são consideradas ilegais por não manterem o mínimo legal previsto de trabalhadores em serviço. Contudo, quando os próprios trabalhadores propõem soluções alternativas para a manutenção dos serviços essenciais, essas são negadas pelos patrões e pela justiça. Um caso exemplar, e que se repete a cada ano, é o das greves de rodoviários e metroviários. Os grevistas propõem, em alternativa à paralisação do serviço de transporte público, uma greve de catracas liberadas – ou seja, os ônibus ou metrôs funcionam na greve, mas sem cobrar passagem. A grande ironia é que a mesma justiça que considera ilegal a greve que
Matéria Central paralisa mais de 70% dos trabalhadores dessas categorias, impede que 100% da categoria trabalhe sem cobrar passagem da população.
Regulamentação da greve do serviço público Outro tema que tem cada vez mais sido debatido é a regulamentação das greves do serviço público. Valendo-se do fato de que a Constituição de 1988 permite a paralisação dos servidores públicos, mas deixa a regulamentação para uma lei específica, ainda não editada, alguns setores querem usar a regulamentação para cercear os direitos de organização sindical e greve dos servidores públicos. Em 2011, o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) apresentou o Projeto de Lei (PL) 710/11, justamente para regulamentar as greves do funcionalismo público. No texto são incluídas diversas propostas que, ao contrário de regulamentar, servem para desmobilizar e retirar o direito de organização sindical. É o caso da obrigatoriedade de que pelo menos 60% dos servidores continuem trabalhando em serviços considerados essenciais, 80% na segurança pública e 50% nos demais casos. O senador propõe ainda a obrigatoriedade dos trabalhadores esperarem 30 dias em estado de greve até poderem paralisar as atividades, desde que não haja resposta do poder público responsável. O início da greve, no entanto, deve esperar outros 15 dias, segundo o texto do PL. Ou seja, 45 dias entre a deliberação da paralisação e o início da greve. “O direito de greve é um direito fundamental, e como a Constituição preconiza o direito à igualdade, o direito de greve não permite distinção entre o trabalhador do setor privado e o do setor público. Desta forma, qualquer tentativa de regulamentação da greve do funcionalismo público deve ser feita à luz da Convenção 151 da OIT, que estabelece o princípio da negociação coletiva entre trabalhadores públicos e os governos das três esferas - municipal estadual e federal”, aponta Amauri Medeiros, diretor do ANDES-SN.
Defesa da liberdade sindical Para o Encarregado de Relações Sindicais do ANDES-SN, a saída para os trabalhadores rumo à maior liberdade sindical e, consequentemente, à defesa e conquista de direitos, é por meio da organização autônoma e independente. “Especificamente, as práticas antissindicais ocorrem em todos os setores, o mais comum hoje é a criação de sindicatos
pelegos, burocratas e colaboracionistas. A legislação brasileira permite que estes atos continuem ocorrendo. O que importa é nossa ação política autônoma e independente de governos, partidos políticos e da administração universitária”, ressalta o docente. Atnágoras Lopes, da CSP-Conlutas, problematiza ainda as maiores dificuldades de organização sindical no setor privado. Entretanto, para ele, esses empecilhos podem ser derrotados pelo fortalecimento da organização independente dos trabalhadores. “Não havendo garantias de liberdade sindical, o trabalhador paga o preço de sua luta com o seu próprio emprego, seu meio de subsistência. Não obstante, os trabalhadores da iniciativa
InformANDES/2015
11
privada, especialmente do setor industrial, são aqueles que mais força política possuem”, diz o sindicalista. Jorge Luiz Souto Maior ressalta que é necessário desvelar as relações de poder que estão por trás dos impedimentos ao movimento sindical. “O importante, para a preservação dessa ordem de exceção permanente, é que as contradições não sejam reveladas e a fórmula básica para o desenvolvimento de uma racionalidade reacionária é a de tratar os fenômenos sociais de forma pontual e descontextualizados da história, destacando apenas os aspectos que possam justificar o resultado que se pretenda para preservação do status quo”, afirma o juiz do trabalho.
12
InformANDES/2015
Entrevista
Antonino Perri
Ricardo Antunes: Não se deve jamais regulamentar a terceirização, mas impedi-la
ED: Como você vê a aprovação do PL 4330 neste momento e as consequências para o mundo do trabalho?
Ricardo Antunes: Vejo como algo que para a classe trabalhadora tem o significado, guardadas as diferenças do tempo histórico, ao retorno da “escravidão”. A terceirização completa, total, que é o sentido essencial deste projeto é uma tragédia pra classe trabalhadora brasileira, ao invés de regulamentar 12 milhões de trabalhadores como os defensores do projeto estão falando, eles vão criar as condições para precarizar e desregulamentar as condições de trabalho de mais de 40 milhões de trabalhadores, ao contrário do que os defensores deste projeto de lei afirmam, é a lei da selva no mercado de trabalho. Você vai criar uma situação de aparente regulamentação, mas será de fato uma clara desregulamentação das condições de trabalho de todos os trabalhadores e trabalhadoras. No fundo significa rasgar a CLT no aspecto que ela tem de mais positivo, qual seja, no aspecto em que ela cria um patamar básico de direito do trabalho, que vai ser eliminado. Porque se você permite a terceirização de tudo, basta ver o que todas as pesquisas sérias, e não as patronais, mostram, os trabalhadores e trabalhadoras
terceirizados recebem menos, em média, quase 30% a menos; trabalham, em média, quase 30% mais, acidentam-se mais. Tem a burla muito maior da legislação social protetora do trabalho, há muitos trabalhadores que entraram na Justiça do Trabalho, e é uma minoria, porque os terceirizados nem possuem sindicatos para os representarem na maioria das vezes. E muitas vezes, quando eles entram na Justiça do Trabalho, a empresa terceirizada já fechou, e eles não tem nem a quem reivindicar. Muitas vezes é um fechamento [da empresa] aparente, porque a empresa fecha sua razão social para não endividar-se e abre outra com outra razão social e continua a burla. Então, no seu sentido mais profundo é este. Ou seja, a primeira consequência brutal é a diminuição do salário, aumento no tempo de trabalho, um terceiro ponto, o aumento nos acidentes, e uma quarta consequência é aumentar a divisão da classe trabalhadora, de modo a dificultar a organização sindical. Porque, é evidente que se você tem faixas de trabalhadores, tem sido mais difícil para os sindicatos organizarem os trabalhadores terceirizados. Para o mundo do trabalho, a terceirização significa, em síntese, que nós caminhamos para ter o conjunto da classe trabalhadora brasileira desprovida de direitos fora do
O
Esquerda Diário entrevistou o professor Ricardo Antunes, da Universidade Estadual de Campinas, sobre os efeitos nefastos da aprovação do PL 4330 e da terceirização para a classe trabalhadora. Abaixo, reproduzimos na íntegra a entrevista com Antunes, que é autor dos livros “Adeus ao trabalho?”, “Os sentidos do trabalho” e recentemente escreveu “O continente do labor”, entre outros livros que abordam a temática da sociologia do trabalho. marco da regulação e sujeito a uma superexploração do trabalho ainda maior do que ela vem sofrendo nas últimas décadas.
Quais os interesses na ampliação do capital da terceirização?
RA: Esta terceirização que conhecemos há 25, 30 anos atrás é uma terceirização de atividades secundárias da empresa, fundamentalmente, alimentação, limpeza. Hoje ela já ampliou muito. Além disso, o limite entre atividade meio e fim, do meu ponto de vista, é insuficiente (eu sou inteiramente contra a terceirização, ela é um flagelo para a classe trabalhadora). Mas este projeto é pior, porque ele elimina a diferenciação criada pelo TST que de certo modo criava um limite para as atividades fins. Agora a terceirização está liberada. Isto mostra que é uma lógica do capital financeiro, que consegue com o mundo do trabalho, completamente desprovido de direitos, e aplicado por um Congresso, que é a instituição mais odiada pela população hoje. Não existe em nenhuma das instituições públicas, uma que consiga condensar toda a insatisfação popular como ocorre com o Congresso hoje. O Congresso é visto popularmente como o espaço da corrupção, da negociata. De tal modo que tem se tornado
InformANDES/2015
Entrevista
Em sua opinião, qual deveria ser a resposta dos trabalhadores e da esquerda para impedir o avanço da precarização e da terceirização do trabalho? Em sua visão, a regulamentação da terceirização seria o melhor programa?
RA: A resposta só pode vir dos sindicatos, dos movimentos sociais da periferia, dos sindicatos de classe, da classe trabalhadora e dos vários setores de esquerda que são
comprometidos com a classe trabalhadora. A esquerda de esquerda. Tem uma coisa importante, ontem [quarta-feira, 9 de abril] foi aprovado o regime de urgência, hoje estava em discussão, em sendo aprovado pela Câmara, o que me parece inevitável, visto que é o Congresso “BBB”, é o “Big Brother Brasil a la parlamento”. Isto depois vai para o Senado, e teremos mais um momento em que será possível pensar em manifestações fortes. Se no Senado não houver mudança, irá para Dilma, e ela poderá vetar. É este curto período de tempo que temos e que podemos pensar em greves localizadas e generalizadas contra este projeto de lei que afeta profundamente a classe trabalhadora brasileira. Esta não tem ideia da trama que foi urdida nessas últimas semanas e dias e que foi consolidada, na noite de ontem, contra ela. Isto tem, em termos históricos, uma equivalência à regressão à escravidão porque você eliminar numa tacada o direito do trabalho de 30 milhões de pessoas, sem garantir os 12, como eles estão dizendo, porque os elaboradores deste projeto são falaciosos, dizem que querem defender os terceirizados, mas ninguém acredita nisso, eles são os representantes da bancada do “patronato das terceiras” e das “quartas” [referente ao processo de quarteirização, ou “terceirizar o terceirizado”], e o que é mais grave ainda, a terceirização generalizada dos trabalhadores. Isto é de uma gravidade profunda porque este projeto atinge aos trabalhadores Sintae/RS
conhecida uma expressão que faz sentido, o Congresso é a turma do “BBB” (Boi, Bala e Bíblia), esta conjunção, criou um campo à direita, nefasto, que está passando a aprovação do nefasto PL 4330, está aprovando a redução da maioridade penal para 16 anos, e isto só poderá ser travado com levantes populares. Como o momento atual, é um momento de “levante da direita”, como vimos em SP dia 15 de março, mas nós temos também, e é muito importante lembrar, lutas, as mais distintas, greves de garis, professores, metalúrgicos, motoristas, etc, revoltas das periferias, movimento de sem-teto e outros movimentos populares, é daí que pode sair alguma retomada das lutas sociais que fazem sentido e produzindo levantes que lembram junho de 2013. Porque os levantes atuais são produzidos pela classe médias e vários setores conservadores da sociedade.
13
do mundo privado, as trabalhadoras e os trabalhadores da agroindústria, indústria e dos serviços, e os trabalhadores e trabalhadoras do setor público, e daqui pra frente você poderá ter trabalhadores do setor público sendo contratados por empresas terceirizadas. A resposta tem que ser da classe trabalhadora e dos seus polos mais organizados. Caminhando, se tivermos força para isto, para greves localizadas, até uma paralisação, porque é decisivo. Porque não adianta, se for aprovado e referendado pela presidente da República, que disse curiosamente na sua primeira reunião ministerial de que seria um governo dos trabalhadores, resta saber então, o que ela entende por “trabalhadores”. Ou será que para a presidente Dilma banqueiro é trabalhador? Então veremos qual será a posição da presidente, num governo que se diz um “governo dos trabalhadores”, será que ela vai permitir esta escravização geral dos trabalhadores? A resposta é decisiva. A regulamentação não é o melhor programa, veja, o que eles dizem é que estão regulamentando a terceirização. Mentira. Eles estão desregulamentando os regulamentados, esta é a falácia mentirosa do nosso empresariado. A fala do ministro Levy, que por sinal é banqueiro, o segundo homem do Bradesco, disse que, e isto é a prova cabal da tragédia, segundo a imprensa publicou, durante a negociação com Eduardo Cunha (o mesmo do “orgulho hétero”), que estava preocupado com o nível de burla que este decreto (PL 4330) traria em termos de arrecadação, o que significa reconhecer que o governo sabe que o empresariado vai burlar no pagamento de impostos. Para o empresariado burlar no pagamento de impostos é porque está burlando a legislação, esta é a confissão de que o projeto 4330 é o projeto da burla. E ele tem que sofrer a repulsa da classe trabalhadora, este é o desafio, esta é a questão vital. E não é por acaso que ele está sendo votado num momento de onda das contra rebeliões da direita, se tentasse votar este projeto há dois, três anos atrás, ele não encontraria acolhida. É um contexto de ajuste fiscal, crise política, de retração momentânea dos setores da esquerda e de uma ofensiva dos setores da direita e suas consequências são muito nefastas. Não se deve jamais regulamentar a terceirização, mas sim impedir a terceirização. Talvez seja muito importante começar uma campanha desde já pelo fim da terceirização em todos os sindicatos. Todos os sindicatos comprometidos com a classe trabalhadora deveriam lutar para acabar com os terceirizados e contratá-los com os direitos que eles exigem, com razão, nas empresas.
14
InformANDES/2015
Internacional
Estudantes de vários países lutam contra a mercantilização da educação Os estudantes criaram o movimento Ocuppy LSE como forma de contestação ao atual projeto de universidade, gerido e organizado em torno de interesses corporativos, que promovem o elitismo e perpetuam a desigualdade social. A manifestação acontece quatro meses depois de uma onda de protestos e ocupações, que envolveram a própria LSE e a University of the Arts (UAL Universidade de Artes), devido ao aumento das taxas, que veem, a cada dia, endividando mais universitários. Através de aulas públicas, encontros e oficinas, os estudantes que compõem o movimento estão propondo aos demais alunos, professores e trabalhadores o que tem sido chamado de “projeto da Universidade Livre de Londres”, que incentiva a participação política com discussões acerca da educação gratuita, dos direitos dos trabalhadores e da democracia dentro da instituição. A educação como negócio, que prioriza a eficiência e o lucro ao invés do ensino e do pensamento crítico, transformando as universidades em fábricas e os estudantes em consumidores, é realidade comum em diversos outros países. Na Espanha, estudantes do ensino superior público, ao lado de professores e técnicos, foram protagonistas de uma greve universitária, em várias regiões como Madri, Andaluzia, Valência e Galícia. O movimento contestou os recorrentes ataques que, em forma de decretos, pretendem reformar o modelo de universidade pública espanhola. As manifestações foram organizadas pelos principais sindicatos de professores e por várias organizações estudantis. No mês de março, 85% dos 147 mil trabalhadores nas universidades públicas espanholas aderiram à greve em todo o país, assim como cerca de 85% dos 1,3 milhão de estudantes. Uma das principais pautas de reivindicação é a revogação do decreto “3+2” ou “reforma de los grados universitários”, de janeiro de 2014, que Cartel-imprimirredes-huelgamanis
D
iante da abertura, por parte dos governos neoliberais de diversos países, à política de privatização das instituições públicas de ensino, estudantes têm sido protagonistas na luta em defesa da educação pública e na mobilização contra projetos de reforma universitária que vinculam, cada vez mais, o ensino aos interesses das empresas que comercializam a educação, dificultando o acesso e a permanência de estudantes de baixa renda, dado o aumento anual das taxas das matrículas e comprometendo as condições de trabalho e infraestrutura e a garantia da qualidade do ensino das universidades mundo afora. A luta histórica dos estudantes chilenos contra a privatização da educação pública em todos os níveis obteve uma grande conquista no início desse ano, com a aprovação, pela Câmara de Deputados daquele país, do projeto de lei que, até 2018, vai proibir o lucro, através da cobrança de mensalidades, nas universidades públicas subvencionadas pelo Estado. Isso significa que a gratuidade será assegurada e todos os recursos subvencionados pelo Estado destinados à educação deverão ser usados só para a educação. “O Chile, desde 1973, tem sido o grande laboratório de experiências privatistas na área educacional, e não só, dentro do modelo neoliberal, uma vez que o processo de privatização da educação foi iniciado com Pinochet, mas não finalizado após sua queda. O país aderiu à implementação das chamadas escolas “charters” - escolas públicas que são subvencionadas pelo governo, mas que são administradas por entidades privadas que podem cobrar mensalidades”, conta Olgaíses Maués, uma das coordenadoras do Grupo de Trabalho de Políticas Educacionais (GTPE) do ANDES-SN. Caso o projeto de reforma educacional - fruto das diversas mobilizações dos estudantes chilenos na luta pela educação
pública, como a conhecida Revolta dos Pinguins - seja aprovado pela presidente Michele Bachelet, os estabelecimentos subvencionados só receberão recursos públicos se oferecerem educação gratuita. “Esta será uma pesada batalha, pois os empresários da educação não aceitarão essa reforma. O Chile, como o Brasil, tem hoje mais de 70% dos estudantes do ensino superior matriculados em estabelecimentos privados”, aponta Olgaíses.
Na Europa, universitários também protestam “Os alunos deixaram claro que o atual sistema simplesmente não pode continuar. Nós não estamos sozinhos nesta luta”. Essas foram as palavras que ecoaram pelos corredores da London School of Economics and Political Science (LSE – Escola de Economia e Ciência Política de Londres), depois que estudantes ocuparam a sala da administração central da instituição, no mês de março, para protestar contra a mercantilização do ensino.
Internacional permite a criação de cursos de graduação de três anos, com um complemento de dois anos obrigatório do curso de Mestrado. O decreto foi aprovado sem a participação da comunidade acadêmica, e, na opinião dos sindicatos e organizações estudantis, visa construir um modelo de educação excludente, dado o preço alto dos cursos de pós-graduação. A aprovação da medida está sendo vista como uma agressão ao sistema universitário público espanhol, que recentemente sofreu um corte de 1 milhão de euros nos repasses. Na Universit y of Amsterdam (Universidade de Amsterdã), na Holanda, estudantes também estão engajados na luta por democracia e por transparência na administração e nos espaços de decisão da universidade, principalmente nesse momento em que a instituição está passando por um processo de reestruturação e cortes. Os estudantes ocuparam, em março, edifícios simbólicos da universidade, organizando comícios públicos e realizando passeatas nas ruas.
Canadá e Austrália também saem às ruas Na York University (Universidade de York), no Canadá, docentes e professores técnicos da graduação paralisaram suas atividades, em março, contando com o apoio massivo dos estudantes, que
estão na linha de frente da organização dos piquetes. Cerca de 5 mil graduandos assinaram uma petição exigindo que a universidade não retomasse as aulas até que o acordo com todos os funcionários em greve, que incluem também os assistentes de laboratórios, assistentes pedagógicos, os aplicadores de exames e os alunos de graduação que lecionam cursos, fosse realizado. Os estudantes estão exigindo mais financiamento para a pós-graduação e a diminuição das altas taxas de matrícula, principalmente para os estudantes internacionais. Na Universidade de Toronto, alunos da graduação estão em greve desde o início de março devido ao baixo valor do subsídio repassado pelo governo aos estudantes de graduação e pós-graduação que não tem recursos suficientes para acessar o ensino superior. Os estudantes estão exigindo um valor mínimo para o auxílio financeiro e que esse seja reajustado de acordo com a inflação e o custo de vida canadense. No Canadá, apesar dessas instituições serem públicas, para a maioria dos cursos superiores é cobrada uma taxa escolar anual, e os governos federal e provincial – que têm responsabilidade exclusiva pelo ensino em seu território – subsidiam, de diferentes formas, o ensino dos estudantes. Na Austrália, milhares de estudantes também saíram às ruas em diversas ci-
InformANDES/2015
15
dades contra as políticas educacionais do governo liberal do primeiro ministro Tony Abbott, logo após o Dia Nacional de Ação (National Day of Action) - protesto nacional contra os cortes e as propostas de privatização na educação, e em outros serviços públicos que são total ou parcialmente subsidiados pelo estado, como energia, saúde e os direitos trabalhistas. Além do corte de cerca de 20% no programa que financia parte das mensalidades de estudantes de baixa renda, o sindicato dos profissionais que trabalham em instituições de ensino superior estima que o reajuste das mensalidades dos cursos deve ultrapassar 200%. “A crise estrutural do capital, que se instalou desde 2008, tem trazido pesados ônus para classe trabalhadora. No afã de superar a perda de lucro e de acumulação - marcas do capitalismo -, a burguesia, por meio do Estado, aplica a já antiga e surrada receita: o ajuste. A educação nessa concepção neoliberal de mundo, na qual o Estado deve estar voltado para o mercado, deve se voltar para atender as demandas também do mercado. Essa é a função que a educação tem para o neoliberalismo: formar o consumidor e não o cidadão. Com isso, friso a importância da luta dos estudantes por uma sociedade melhor, o que inclui a luta em defesa da educação”, avalia Olgaíses Maués, diretora do ANDES-SN.
16
InformANDES/2015
Movimentos Sociais
Lançamento da cartilha do ENE mobiliza entidades em defesa da educação pública Material foi entregue ao MEC em 26 de março – Dia Nacional de Luta pela Educação Pública
R
epresentantes do Comitê Nacional em Defesa dos 10% do PIB para a Educação Pública, Já!, lançaram em Brasília, no final de março, a cartilha “Em defesa da educação pública, gratuita e dos 10% do PIB para educação pública já!”, que traz a síntese dos debates do Encontro Nacional de Educação (ENE), realizado em agosto de 2014, no Rio de Janeiro. O material apresenta os princípios e conteúdo programático do projeto de educação pública classista, que se contrapõe às políticas privatizantes do governo federal, buscando contribuir para a construção do próximo período de lutas no Brasil. “O lançamento da cartilha do ENE acontece em um momento em que o agravamento da crise econômica do país vem afetando diversos setores públicos, especialmente o da educação. O que torna isso evidente é a previsão dos cortes, a partir da lei orçamentária anual, que aponta para um aumento da precarização da educação pública”, apontou Giovanni Frizzo, representante do ANDES-SN no Comitê Nacional em Defesa dos 10% do PIB para a Educação Pública, Já! A cartilha está dividida em três partes principais. A primeira retoma a construção dos encontros preparatórios regionais que culminaram na realização do ENE, em 2014, a partir da atuação do Comitê Nacional em Defesa dos 10% do PIB para a Educação Pública, Já!, do qual fazem parte o ANDESSN, a CSP-Conlutas, a Assembleia Nacional dos Estudantes Livres (Anel), a Oposição de Esquerda da União Nacional dos Estudantes (UNE), a Executiva Nacional dos Estudantes de Educação
Física (Exneef), a Associação Brasileira dos Educadores Marxistas (Abem), a Federação Nacional dos Estudantes das Escolas Técnicas (Fenet), o Sinasefe e o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS). Na segunda parte do documento é apresentada uma análise aprofundada relativa às políticas educacionais, implementadas pelo governo federal nas últimas décadas, tendo como destaque a discussão acerca do Plano Nacional de Educação (PNE), com vigência de 2014 até 2024. De acordo com Frizzo, “o PNE do governo aprovado no Congresso Nacional no último ano, não representa os interesses da classe trabalhadora, da juventude e da população brasileira como um todo, e sim intensifica, ainda mais, a destinação de verbas públicas para o setor privado, retirando os processos de autonomia e de controle do trabalho por parte dos docentes e intensificando o processo de alienação da formação da juventude, tanto da rede básica quanto do ensino superior”. Dessa forma, as diversas entidades responsáveis pela elaboração da cartilha apontam, de forma propositiva, na última seção do material, os pontos centrais sobre os quais a construção de um projeto em defesa da educação pública deve estar
embasada. A defesa do financiamento pelo Estado, na ordem de 10% do PIB, Já!, exclusivamente para a educação pública, que possibilite condições democráticas de acesso e permanência em todos os níveis de ensino e o repúdio a todas as formas de precarização das condições de trabalho bem como à lógica da avaliação meritocrática e produtivista do ensino e do trabalho docente estão entre os principais norteadores desse projeto. Além da defesa do passe livre e do transporte público de qualidade e do fim da privatização e da mercantilização da educação da creche à pós-graduação. De acordo com o diretor do ANDES-SN, a cartilha entregue ao Ministério da Educação (MEC), em 26 de março - dia que ficou marcado pela luta, protagonizada por estudantes e professores, em defesa da educação pública em vários estados do Brasil -, vai ser usada também, nesse segundo momento, para mobilizar a constituição dos comitês estaduais, onde não existem, e para fomentar o debate nos fóruns estaduais e municipais, para a construção e realização dos encontros estaduais e/ou regionais preparatórios para o II Encontro Nacional de Educação de 2016.