InformANDES Abril 2016

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InformANDES SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR - ANDES-SN

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iante dos constantes ataques aos direitos e conquistas sociais e trabalhistas do povo brasileiro e da crise política instalada, intensificamse os questionamentos sobre qual democracia deve buscar a sociedade. No final de março, a diretoria do ANDES-SN

Diversos estados já realizaram encontros preparatórios ao II Encontro Nacional de Educação, com discussões centradas nos eixos temáticos. O II ENE acontece de 16 a 18 de junho, em Brasília (DF). 4 e 5

Informativo Nº 57 Brasília (DF) Abril de 2016

divulgou uma nota na qual avalia o cenário atual, relembra a atuação do Sindicato Nacional contra a ditadura empresarialmilitar e em outros momentos de ataques aos trabalhadores. Reafirma sua posição autônoma a governos e a partidos políticos e a luta permanente por democracia. 8 a 11

No setor das Federais, abril é o mês de luta por carreira e melhores condições de trabalho. Já docentes das Estaduais seguem mobilizados em todo o país e realizam Semana Nacional de Lutas em maio. 6 e 7

Levantamento do Ipea aponta que mais da metade (31,5 mil) das pessoas assassinadas no Brasil são jovens entre 15 e 29 anos, e revela o extermínio da juventude brasileira. 14 e 15


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Editorial

Ocupar e resistir!

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desmonte da escola pública alcançou patamares sem precedentes no último período. Trata-se, entretanto, de um processo que vem de longe e que a corrói não só pela falta de verbas e não só pela destinação privilegiada do fundo público para os empresários da educação. Destrói a escola enquanto espaço público de debates e reflexão crítica sobre a sociedade em que vivemos. A subordinação à lógica privada perpassa os orçamentos e as práticas politico-pedagógicas. A existência de conglomerados que atuam na educação pública vendendo seus serviços e sua ideologia, comprovada em várias pesquisas, aponta para as ocupações, que desde o final de 2015 se generalizam pelo país, como espaço necessário de resistência à privatização, mas também de conscientização sobre a escola que temos e a escola que queremos. Os estudantes são nossos professores. Nas universidades não é diferente a situação. A privatização, que já vem de longa data, segue alcançando novos e superiores patamares, quando, dentre outras medidas, assistimos a aprovação o Código Nacional de Ciência e Tecnologia, assim como a tramitação da proposta de carreira e tantas outras medidas no Congresso Nacional. Trata-se de ampliar a subordinação à lógica privada, ampliando a ocupação dos espaços públicos pelo setor privado, vendendo aos lotes as universidades e instituições públicas de pesquisa, mas também, e sobretudo, subordinando a pesquisa que realizamos na universidade aos ditames do capital. Está em curso a venda de nossos corpos e de nossas almas. Tais processos só se efetivam sob a lógica política da exceção, como nos casos das diversas experiências de aprovação da entrega dos HU à EBSERH. A lógica da exceção segue necessária aos vendilhões da coisa pública. Posto isso, segue necessário aprendermos a lição com nossos estudantes. Ocupar é necessário, ocupar as ruas e ocupar a universidade, para refletir sobre que universidade temos e que universidade queremos, sobre que sociedade temos e que sociedade queremos. Ocupar não só questionando a privatização e a venda da coisa pública, mas a subordinação de nossas práticas cotidianas ao espaço privado. Ocupar significa reivindi-

car os espaços democráticos da universidade atacados pela lógica da exceção. Os conselhos universitários, os conselhos de unidades, de departamentos, de cursos. Sair da lógica que cotidianamente nos é imposta, e que para alguns é de interesse, sair da lógica da individualização da prática docente, da caça aos editais, da competição, tão caras à contrarreforma gerencialista da educação superior. Refletir criticamente sobre nossas próprias práticas, sobre o intenso processo de alienação e lutar e resistir. Trabalhadores em diferentes países, nesse momento, em países centrais do capitalismo, ocupam as ruas contra a retirada de seus direitos. No Brasil, seguem as ocupações que demandam democracia. Somos contra o golpe, na verdade segue necessário dizer somos contra todos os golpes, sempre! Somos contra o golpe que a direita neoconservadora e reacionária quer nos impor. Consequentemente, importa dizer que somos contra a Lei antiterrorismo, expressão mais acabada da criminalização dos que lutam e dos que vão às ruas e que foi aprovada e sancionada recentemente, em meio às manifestações. Não custa lembrar que esse processo de criminalização se aprofundou com a crescente mobilização que teve como importante momento as jornadas de junho de 2013. Trata-se de uma proposição urdida nos gabinetes a partir de acordos transnacionais que exigem calar os lutadores. Somos contra o golpe de aprofundar a destruição do serviço público e dos direitos sociais a partir dos ataques aos servidores públicos, tal como proposto no recente Projeto de Lei Complementar 257/16, enviado ao Congresso pelo governo. Somos contra os golpes nos direitos dos trabalhadores que estão em curso no Congresso Nacional, avançando na destruição dos parcos direitos trabalhistas

que temos. Somos contra o golpe, golpe de morte, quando se implantam cortes no orçamento público para a saúde, dentre outros setores sociais, e ampliam-se as garantias da remuneração dos setores financeiros. Ao tempo que as atenções se voltam para o impeachment, com razão, várias medidas de ataque aos trabalhadores tramitam no Congresso, têm sido aprovadas e sancionadas e implementadas. Para elas temos que dizer, não passarão! Ocupar as escolas, ocupar as ruas, demanda de nós a reflexão sobre qual o objetivo de nossa ocupação, avançar nos direitos sempre, nunca admitir retroceder. Aos que concebem e implementam tais medidas, dizemos: que ouçam as ruas! As ruas, desde 2013, dizem não aos ataques à democracia, que a juventude e os trabalhadores não coadunam mais com ataques aos seus direitos, ao tempo em que são dadas cada vez mais garantias ao capital, razão pela qual a democracia é atacada. Venha de onde vier, não aceitaremos golpe de nenhuma ordem!

EXPEDIENTE O Informandes é uma publicação do ANDES-SN // site: www.andes.org.br // e-mail: imprensa@andes.org.br Diretora responsável: Marinalva Silva Oliveira // Redação: Bruna Yunes 9045 DRT-DF, Mathias Rodrigues MTb 10126, Renata Maffezoli MTb 37322 e Paola Rodrigues 10982 DRT-DF // Edição: Renata Maffezoli // Fotos: Renata Maffezoli // Diagramação e Ilustrações: Paola Rodrigues


Entrevista

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Eleições ANDES-SN Biênio 2016-2018 Em entrevista ao InformANDES de abril, a candidata à presidência do ANDES-SN, Eblin Farage, destaca os desafios do processo eleitoral em uma conjuntura de acirramento da crise política e do Capital e de constantes ataques aos direitos dos trabalhadores e aos serviços públicos. A candidata faz um chamado a todos os docentes para que participem do processo eleitoral com o objetivo de intensificar o enraizamento do sindicato na base. Confira. ANDES-SN: Quais os desafios de realizar o processo eleitoral nessa conjuntura – política e também de intensificação dos ataques aos trabalhadores e precarização das condições de trabalho?

Eblin.Farage: Em qualquer conjuntura, a realização de eleições para um sindicato nacional, que se organiza pela base, é um desafio. A crise que é política, econômica e social, e que vem se materializando com a intensificação dos ataques aos direitos dos trabalhadores, materializa o projeto do Capital, em curso há séculos, o que inclui suas crises cíclicas. Nesse sentido, a

realização de eleições diretas, nesta conjuntura, impõem-nos, como desafio, dialogar com a categoria, dar visibilidade ao nosso projeto de sociedade, de educação e de universidade, reafirmando a impreterível necessidade de organização de nossa categoria, articulada aos demais segmentos da classe, para que possamos de fato fazer frente ao projeto de sociabilidade imposto pelo Capital. Só a construção efetiva de um polo classista e a reafirmação de outra forma de sociabilidade, construídas em diálogo efetivo com a categoria, serão capazes de não nos deixar cair em falsas polarizações.

Qual a importância do processo eleitoral e a forma como ele se dá – via eleições direta - para a representatividade do ANDES-SN?

E.F.: O processo eleitoral de forma direta reafirma a construção de um sindicato classista e que se organiza pela base, como um dos seus princípios fundamentais. Nesse sentido, aproveitar o momento da eleição para dialogar com a categoria, em suas diversas realidades, é fundamental para redimensionar a representatividade de nosso sindicato junto à categoria.

Nos debates que você tem feito, o que você destacaria da realidade da categoria? Quais pontos são comuns e quais as diferenças nas regiões que visitou?

E.F.: O que se tem em comum é um projeto de educação - contrarreforma da educação

- sendo implementado tanto pelo governo federal como pelos governos estaduais e municipais, que têm por base o sucateamento da educação pública e a imposição da mercantilização. O que temos de diferente é o nível de capilaridade dessa política nas diferentes IES, e que tem relação direta com o nível de organização da categoria em cada local de trabalho.

Quais os principais desafios que a nova diretoria irá enfrentar a partir do segundo semestre? E.F.: São muitos os nossos desafios,

mas acredito que um dos principais é intensificar o enraizamento do nosso sindicato na base, tornando-o conhecido e reconhecido, em especial para os professores recém-ingressos na carreira, com menos de 10 anos de docência nas IES, difundindo e aprofundando o projeto de educação e de universidade que construímos ao longo dos 35 anos de existência do ANDES-SN. Por outro lado, como o projeto de educação que defendemos não deve ser tarefa apenas dos profissionais da educação, nosso desafio consiste também em contribuir para a organização da classe trabalhadora, ampliando nosso arco de alianças com os movimentos sindical, popular, estudantil e social. Assim como, a partir das deliberações de nossos congressos, enraizar a CSP-Conlutas nos estados, os Comitês ou Fóruns Estaduais em defesa da Educação Pública (Fedep) e pautas unitárias no Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos (SPF).


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Movimentos Sociais

Encontros preparatórios discutem eixos temáticos do II ENE

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iversos estados do país estão realizando desde o final de fevereiro encontros que integram as etapas preparatórias à realização do II Encontro Nacional de Educação (ENE), antecipando e aprimorando os debates acerca dos problemas estruturais da educação pública brasileira, desde a educação infantil até a superior. Os espaços de discussão nos estados, realizados através dos Comitês Estaduais em Defesa da Educação Pública e Gratuita, aglutinaram movimentos sindicais, estudantis, sociais e populares, que, em de grupos de trabalho, promoveram amplos debates sobre os eixos que estarão no centro do II ENE, que ocorrerá de 16 a 18 de junho, em Brasília (DF). Nesse ano, além da indicação de novos eixos, foram criadas ementas de cada temática para orientar a discussão dos participantes durante os encontros preparatórios e nacional. As etapas regionais e estaduais já foram realizadas no Pará, Piauí, Maranhão, Fortaleza, Pernambuco, Bahia, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Mato Grosso do Sul. Já estão agendadas etapas também nas capitais Curitiba (PR), Porto Alegre (RS) Boa Vista (RR), Manaus (AM) e Belo Horizonte (MG). Lucas Hippólito, coordenador Geral do Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Rio de Janeiro (Sepe), conta que o Encontro Estadual preparatório do Rio de Janeiro, organizado pelo Fedep – Fórum em Defesa da Escola Pública - teve como foco o debate acerca do desmonte

da Educação Pública e a defesa da democracia dentro da escola pública. As discussões sobre a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a falta de democracia nas escolas, a implantação da gestão das Organizações Sociais (OS) e o desmonte do caráter público da educação foram alguns dos pontos centrais dos debates, “especialmente nesse momento em que estamos em meio à greve estadual da educação”, contou. Docentes e funcionários da rede estadual de ensino fundamental, médio e tecnológico do Rio de Janeiro, filiados ao Sepe, entraram em greve em início de março, assim como a comunidade acadêmica das três universidades estaduais fluminenses (Uerj, Uenf e Uezo).

Novos eixos de discussão Devido à complexidade da conjuntura atual e dos efeitos nocivos, que levaram ao recrudescimento dos ataques à Educação Pública, o Comitê Nacional em Defesa dos 10% do PIB para a Educação Pública, Já! reformulou as temáticas que nortearão as discussões do II Encontro, mantendo os principais eixos de debate, como Financiamento; Avaliação; Acesso e Permanência, Gestão, e criando novos, como Trabalho e Formação dos trabalhadores e das trabalhadoras da educação; e Gênero, Sexualidade, Orientação Sexual e Questões Étnico-raciais. “Fizemos uma avaliação e percebemos que havia uma necessidade de ampliar os eixos de discussão do II ENE como forma de complementar o

que já estava sendo debatido no primeiro encontro”, apontou Olgaíses Maués, uma das coordenadoras do Grupo de Trabalho de Política Educacional (GTPE) do ANDES-SN e 2ª vice-presidente da Regional Norte II. O eixo Acesso e Permanência, que no primeiro encontro focou na educação superior e em questões como bolsas e políticas de assistência estudantil, foi ampliado. No II ENE, será discutida a garantia à uma educação universal, pública, gratuita, laica de qualidade e socialmente referenciada da creche até a universidade, com um projeto político-pedagógico que garanta uma educação inclusiva e que apresente condições de acesso e permanência para toda a classe trabalhadora. “Uma educação que inclua pobres, negros, indígenas, quilombolas, mulheres, mães, LGBTs, adultos e crianças com deficiências físicas ou intelectual de qualquer natureza. Que permita a verdadeira apropriação do conhecimento aos trabalhadores e seus filhos”, destacou Olgaíses. Já a criação do eixo Gênero, Sexualidade, Orientação Sexual e Questões Étnico-raciais, de acordo com a diretora do ANDES-SN, “vem em um momento oportuno para realizarmos a discussão acerca de temas, como gênero e etnia, que o PL 867/2015, que trata da Escola Sem Partido, quer justamente proibir. E não podemos permitir, pois são questões presentes nos nosso cotidiano e de debate imprescindível dentro da sociedade”. A docente também explica que o eixo

II Encontro Nacional de Educação 2016

Por um projeto classista e democrático de educação - Contra o Ajuste Fiscal e a Dívida Pública

Eixos: gestão; financiamento; avaliação; trabalho e formação dos trabalhadores e das trabalhadoras da educação; acesso e permanência; gênero, sexualidade, orientação sexual e questões étnico-raciais.

Data: 16 a 18 de junho de 2016 Local: Universidade de Brasília (UnB) - Brasília-DF Inscrições: de 15 de abril a 30 de maio no blog do II ENE

Mais informações: acesse o blog (www.ene2016.org) e o facebook (facebook.com/ene2016)


Movimentos Sociais Trabalho e Formação dos trabalhadores e das trabalhadoras da educação sofreu uma reformulação para incluir no debate, além do trabalho docente, a discussão acerca dos trabalhadores técnicos, tanto da educação básica quanto da educação superior. No eixo sobre Financiamento, Olgaíses afirma que é necessário ampliar o debate sobre a luta pela aprovação dos 10% do PIB para a Educação Pública, Já!. “Em junho, completará dois anos da aprovação do Plano Nacional de Educação (PNE), e as metas não estão sendo atingidas. E, mesmo que estivessem, a aplicação do investimento de 10% do PIB do país ocorreria somente em 2024. Por isso, precisamos discutir hoje a necessidade da auditoria da dívida pública para que possamos ter mais recursos para investir em políticas sociais”, afirma. O recente bloqueio de R$ 6,4 bilhões no orçamento da pasta da Educação e a diminuição no repasse de verbas públicas para as escolas das redes federais, estaduais e municipais de ensino evidenciam a prioridade dos governos em manter o superávit primário - saldo usado para o pagamento de juros e amortizações da dívida pública ao sistema financeiro. Dessa forma, greves estão sendo deflagradas nos estados, como Pernambuco e Rio de Janeiro, em que professores da rede de ensino público reivindicam o pagamento do piso nacional da categoria e melhores condições de trabalho e ensino. Em relação ao que será debatido sobre Avaliação, Hippólito afirma que o atual modelo de avaliação educacional adotado no Brasil não garante a qualidade da educação. “O que a gente tem vivenciado na educação pública, na verdade, é um controle cada vez mais estrito do que é trabalhado nas escolas, através dos processos de avaliação externa”, aponta. Olgaíses também concorda que as avaliações externas, como a Prova Brasil e o Enem, aplicadas na educação básica e no ensino médio, respectivamente, “levam a um estreitamento curricular, ao instaurar uma lógica de ensino que amplia a carga horária de certas disciplinas que caem nesses exames”. Na educação superior, a coordenadora do GTPE do ANDES-SN critica o modelo de avaliação produtivista implementado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que inicialmente era somente aplicado na pós-graduação, e que agora passa a ser exigido também na graduação.

A Educação que queremos “É evidente que existem escolas precarizadas, que falta verba para a educação, mas porque que hoje existe um projeto que é tipicamente a gestão empresarial dentro do serviço público, como uma forma de desmonte do caráter público da escola”, reforça o coordenador Geral do Sepe. Diante disso, o II Encontro Nacional de Educação tem como objetivo apontar, através dos debates sobre gestão, um projeto alternativo de Educação Pública para o Brasil, que se contraponha ao atual conjunto de políticas educacionais do governo, que buscam a mercantilização, a privatização e a precarização do trabalho e ensino. “Na rede básica, a contratação de Organizações Sociais (OS), por parte das secretarias de educação, escancara um processo de gestão das escolas públicas

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dentro de uma concepção empresarial. Não podemos permitir isso”, afirma Olgaíses. Hippólito destaca a necessidade de aglutinação dos setores progressistas da sociedade e empenho na construção do II ENE, para apresentar à sociedade um projeto de educação que se contraponha ao modelo mercantilista atual. “Falta mostrarmos para a sociedade o que a gente entende que deva ser a educação pública e fazer a denúncia desse processo de desmonte do que ainda tinha de público na educação brasileira. Eu acho que esse é o grande foco. Eu clamo todos os setores que defendem a educação pública que se juntem a esse esforço de se contrapor ao projeto que está em curso, gerencial e privatista da educação, que não vende a escola, mas insere a lógica privada por dentro”, ressalta.


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Movimento Docente

Instituições estaduais e municipais realizam Semana Nacional de mobilização em maio

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iante dos ataques aos direitos dos servidores e do serviço público, com atraso nos salários, o não pagamento de bolsas e terceirizados, corte no repasse de recursos, descumprimento de acordos e péssimas condições de trabalho, docentes estaduais e municipais estão mobilizados para lutar por maiores repasses orçamentários às instituições de ensino superior e contra os ataques dos governos ao funcionalismo público. Para marcar a mobilização, de 23 a 27 de maio acontece a Semana Nacional de Lutas 2016 do Setor das Instituições Estaduais e Municipais de Ensino Superior (Iees/Imes) do ANDES-SN. A data foi definida no 35º Congresso do Sindicato Nacional, realizado em janeiro, em Curitiba (PR). Epitácio Macário Moura, um dos coordenadores do Setor das Iees/Imes e 2° vice-presidente do ANDES-SN, afirma que o eixo central da mobilização neste ano será a luta por maiores investimentos e verbas públicas para as instituições estaduais e municipais. Além da pauta geral, a mobilização também irá incorporar as lutas específicas de cada localidade contra o arrocho salarial, na defesa por salários dignos e reajuste salarial, visto que em vários estados os salários dos servidores ainda não foram recompostos de acordo com a inflação de 2015. Em outros casos, os governos estão parcelando os salários dos servidores estaduais para manter o superávit primário e pagar as suas dívidas com os bancos. Para agravar ainda mais o quadro, o governo federal enviou, recentemente, ao Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar (PLP) 257/2016, que possibilita aos governos estaduais e municipais a renegociação de suas dívidas com o Tesouro em troca de reduzir o gasto com pessoal e implementar a previdência complementar. “Este ano, além da pauta referente ao orçamento, resolvemos incorporar as pautas locais. Os governos romperam

com a data-base, como foi o caso do Ceará e, em alguns estados, não houve o repasse aos salários da inflação de 2015, e em outros, ainda há o parcelamento de salários - como no Rio de Janeiro e Amapá, e agora mais uma ameaça aos direitos dos servidores públicos com o PLP 257”, disse Macário, lembrando que a Semana será realizada no período em que os Executivos estaduais e municipais encaminham as Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDO), do ano subsequente, às Assembleias Legislativas.

Mobilizações e greves Muitas instituições estaduais já intensificaram a luta de tal maneira que, em alguns locais, levou à radicalização do movimento e à deflagração de greve. É o caso dos docentes das universidades estaduais do Rio de Janeiro (Uerj), da Zona Oeste (Uezo), e do Norte Fluminense (Uenf) e do Amapá (Ueap), que estão em greve por maior orçamento para as instituições e, também, pelo atraso ou parcelamento dos salários dos servidores públicos estaduais. Minas Gerais e Rio Grande do Sul vivem realidade semelhante. Desde o ano passado, os servidores sofrem com o parcelamento dos salários. Na Bahia, os docentes das universidades estaduais se uniram às demais categorias do funcionalismo público em diversos atos para reivindicar melhorias na infraestrutura das instituições, aumento salarial e reajuste linear dos servidores públicos. No Ceará, o movimento docente exige o cumprimento imediato das reivindicações da categoria e, também, o reajuste dos salários dos servidores.

A Semana Nacional de Lutas das Iees/ Imes tem a intenção de sensibilizar as comunidades acadêmicas das instituições estaduais e municipais sobre a importância de reivindicar orçamentos adequados, que possibilitem a manutenção de ensino, pesquisa e extensão de qualidade e socialmente referenciados. No Paraná, o governador prossegue com o “pacote de maldades” retirando direitos, apossando-se da poupança previdenciária dos servidores, e se apropriando de 80% dos recursos arrecadados pelas universidades estaduais e cortando 50% das verbas de custeio das instituições. “É muito importante que as seções sindicais das estaduais e municipais de fato se empenhem na realização desta Semana, participando das manifestações de rua, e em frente às assembleias legislativas. Somente de forma unificada, nós podemos enfrentar os ataques que estão em curso, seja referente ao corte de verbas dado ao ajuste fiscal, seja em relação ao corte dos salários dos servidores que precarizam o serviço público”, concluiu o docente.


Movimento Docente

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Setor das Ifes amplia luta por carreira e contra precarização do trabalho

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s cortes orçamentários promovidos pelo governo federal em 2016, sobretudo na Educação, têm inviabilizado o pleno funcionamento das instituições federais de ensino (IFE) em todo país. Ademais, o governo federal, através do Código Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (Lei 13.243/2016), sancionado em janeiro deste ano, e do Projeto de Lei (PL) 4251/2015, que altera a remuneração e as regras referentes à promoção e à progressão dos docentes federais, tem preparado o terreno para aprofundar o sucateamento e a mercantilização da Educação Pública no país, incluindo a possibilidade de contratação de docentes federais,

através de Organizações Sociais (OS). Para combater tais medidas, a agenda de atividades e ações do Setor das Instituições Federais de Ensino (Setor das Ifes) do ANDES-SN destaca para o mês de abril, a luta pela reestruturação da carreira docente e por melhores condições de trabalho com base na agenda temática do plano de lutas específico do Setor, aprovada no 35º Congresso do Sindicato Nacional, realizado no final de janeiro em Curitiba (PR). Giovanni Frizzo, 1º vice-presidente da Regional Rio Grande do Sul e um dos coordenadores do Setor das Ifes, afirma que a intenção do governo com essas medidas é aprofundar a desestruturação da carreira docente e precarizar, ainda mais, as condições de trabalho. Segundo ele, o Código de C&T favorece radicalmente, e sem precedentes, a privatização das instituições, fragilizando o regime de Dedicação Exclusiva (DE) do magistério federal, aumentando a carga horária máxima destinada à pesquisa, à extensão e à inovação de 120 para 416 horas anuais com recebimento de bolsa via fundações. “O Código permite que professores utilizem algumas horas da sua carga horária em Regime de DE nas atividades desenvolvidas nas empresas privadas - fruto dos convênios com as instituições públicas-, com isso, permitindo que o docente dedique parte do seu tempo e produção para a lucratividade dessas empresas”, argumentou. O diretor do ANDES-SN chama a

atenção também para o PL 4251/2015, de autoria do Executivo. O projeto propõe que a remuneração dos docentes federais seja estabelecida a partir do regime de 20h, com aumento de 40% no vencimento base (VB) para o regime de 40h e de 100% para o regime de dedicação exclusiva. O ANDES-SN reivindica que o VB do regime de 40h seja o dobro (100%) da remuneração do regime de 20h e que o vencimento para Dedicação Exclusiva seja 210% maior que a remuneração para 20h. “A proposta do projeto faz com que, na prática, o regime de DE receba a mesma remuneração do regime de 40h”, critica o docente. Além destes ataques, tramita na Câmara, o Projeto de Lei Complementar (PLP) 257/2016, que propõe a suspensão dos concursos públicos, o congelamento de salários e das despesas de custeio, a limitação do reajuste do salário mínimo à inflação e a instituição de programas de desligamento voluntário e licença incentivada de servidores e empregados, além da destruição da previdência social e a revisão dos Regimes Jurídicos dos servidores. O PLP 257/2016 pode ter impacto direto na carreira docente, uma vez que prevê ainda a suspensão da licença prêmio, a licença sabática, os quinquênios, a sexta parte, as progressões, as promoções e as vantagens de natureza transitória - como, por exemplo, gratificações, e, no caso dos docentes federais, a retribuição por titulação. Para o diretor do ANDES-SN, essas medidas em curso têm o intuito de sucatear os serviços públicos, impondo uma legislação que descaracteriza a carreira e desvaloriza a forma da remuneração dos docentes, suspendendo concursos públicos, limitando os investimentos nas instituições e abrindo as portas para as OS, com relações promíscuas entre o público e o privado, para gerir os espaços da educação pública. “Essas medidas significam a destruição da Dedicação Exclusiva - que é uma conquista do movimento docente para garantir melhores condições de trabalho e remuneração à categoria e também caracteriza um trabalho de dedicação à instituição pública, na medida em que todas as suas ações e atividades dentro das instituições seriam de interesse público”, disse.


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Brasil enfrenta, desde o último ano, uma grave crise econômica, social e política. E nesse momento, em especial pela tentativa de setores da sociedade de aprovar o impeachment da presidente Dilma Rousseff, um dos temas que aparecem nos debates políticos é a democracia. Os defensores da manutenção do governo afirmam que, caso haja o impeachment sem comprovação legal de crime de responsabilidade, ocorrerá um golpe – um ataque à democracia.

Matéria Central

Ao mesmo tempo, Dilma Rousseff segue governando sob a lógica de retirar direitos dos trabalhadores, precarizar e privatizar serviços públicos e favorecer o setor privado – a mesma postura dos governos que antecederam aos do PT. Medidas como o Plano de Proteção ao Emprego (PPE), a Lei Antiterrorismo (lei 13.260/2016) e o Projeto de Lei Complementar (PLP) 257/2016 (que ataca os servidores públicos e o salário mínimo) são apenas alguns dos exemplos mais

recentes desse cenário. Isso sem citar os cortes orçamentários e as tentativas de terceirização da saúde e da educação públicas. Uma lógica pouco democrática para a maioria da população. Por conta dessa situação, a diretoria do ANDES-SN divulgou, no dia 21 de março, uma nota na qual avalia a atual situação de crise política. Na nota, a diretoria relembra a atuação do Sindicato Nacional contra a ditadura empresarial-militar, avalia a situação de crise econômica e política vivida


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Matéria Central

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no país, e reafirma sua posição autônoma a governos e a partidos políticos. A nota vai mais além, debate qual a democracia que deve ser buscada pela sociedade.

Existe democracia?

Manifestação dos servidores estaduais do Paraná, em Curitiba (PR), em 2015

lhadores é inerente ao sistema político da democracia representativa. “O processo da democracia representativa é, invariavelmente, dominado pelo poder econômico. Nós temos, no Brasil, um processo particular de desenvolvimento da pobreza como alimento das máquinas eleitorais, o clientelismo”, comenta o docente.

Direitos democráticos na década de 80 Paulo Rizzo relembra que o Sindicato Nacional surgiu durante a ditadura empresarial-militar (1964-1989), em meio a um grande processo de reivindicações por direitos democráticos. No entanto, os docentes não lutavam pela redemocratização, pois não acreditavam que havia

Arquivo ANDES-SN

Para uma grande parcela da população brasileira, como os trabalhadores e a juventude, nunca houve democracia. É o que diz Atnágoras Lopes, membro da Secretaria Executiva Nacional (SEN) da CSP-Conlutas. “A democracia que o povo pobre da periferia conhece é só o braço armado, a polícia. Não se conhece outra democracia. Nas fábricas e nos canteiros de obras também não há democracia, não há muitas vezes nem direito à sindicalização. Na justiça, o mesmo. Quantos trabalhadores ganham processos de assédio moral?”, critica Lopes. Atnágoras diferencia a defesa da democracia representativa e do Estado Democrático de Direito da defesa dos direitos democráticos. Para ele, os trabalhadores não devem defender um sistema que não é democrático para eles. No entanto, devem lutar ferrenhamente pelos direitos democráticos historicamente conquistados. “O movimento dos trabalhadores nunca defendeu o Estado Democrático de Direito, o que defendemos com unhas e dentes são os direitos democráticos já conquistados, e que vêm sendo atacados”, diz. Ele cita direitos que já foram retirados nessa crise, como o acesso ao Programa de Integração Social (PIS) e o pleno acesso ao seguro-desemprego – ainda mais grave em um momento de crescimento do desemprego. Para Paulo Rizzo, presidente do ANDESSN, a retirada de direitos sociais dos traba-

Marcha Nacional em Defesa e Promoção da Educação Pública, em 2001, em Brasília (DF)

democracia plena antes do golpe de 1964. “No período que surge o movimento docente e é criada a ANDES [então associação], a gente busca se construir em um terreno de autonomia, independência, sem imposto sindical e sem a tutela do estado em nossa organização. Era uma postura radical em relação à democracia. Não lutávamos para redemocratizar o país, porque não acreditávamos que o que existia antes era democrático. Fomos radicais na luta pela democracia, e na defesa do protagonismo da classe trabalhadora nas disputas políticas do país”, afirma. Para o presidente do ANDES-SN, a ditadura ainda teve um fôlego com a crise mundial, já que o Brasil passou a receber capitais de países que começaram a investir na dívida pública, na época do chamado “Milagre Econômico”, que resultou num ‘boom’ de investimentos, obras, infraestrutura, criaram-se empresas estatais, além da integração no território nacional. Mas, de acordo com o docente, esse modelo rapidamente entrou em crise. Isso se deu, segundo Rizzo, quando houve o aumento dos juros por parte do mercado financeiro internacional. Foi o início da “Década Perdida”, a década de 80, com estagnação do crescimento econômico. “Então, a década de 80 tem esse esgotamento do modelo econômico e o crescimento das lutas dos trabalhadores e da juventude. São lutas pela democracia, como a luta pela anistia, por liberdades democráticas, e a luta pela construção de um novo sindicalismo – levando os direitos sindicais até as ultimas consequências. Esse movimento era de ruptura com a estrutura sindical”, completa Paulo Rizzo.


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O presidente do ANDES-SN lembra que os docentes participaram ativamente do processo da Constituinte, cujos resultados, na opinião de Rizzo, foram contraditórios. De um lado, foram conquistados direitos como a gratuidade da educação em estabelecimentos oficiais e a autonomia universitária. De outro, já havia elementos neoliberais na Constituição. Para Paulo Rizzo, a promulgação da Constituição é um marco na luta por direitos democráticos já que, após 1988, teve início o período de destituição desses direitos, que segue até os dias de hoje. A conquista de direitos democráticos que se deu durante a década de 1980 e culminou na Assembleia Constituinte e na Constituição Federal de 1988 tem relação direta com o momento econômico pelo qual passava o Brasil. “Foi uma luta intensa, em todo o continente, contra as ditaduras da América Latina - que tinham o apoio dos EUA. O ascenso de lutas no final da década de 70 foi em um momento em que o modelo econômico da ditadura começou a entrar em colapso, após as crises mundiais do petróleo”, diz Rizzo.

Ameaças à Constituição Mal promulgada a Constituição, teve início um processo de críticas e ataques aos direitos sociais garantidos na Carta Magna. Com a década de 90, Fernando

Matéria Central Collor de Mello, eleito presidente em 1989, não tinha base social para aprofundar a retirada de direitos, tampouco para se manter no poder. Essa é a avaliação do presidente do ANDES-SN, para quem só Fernando Henrique Cardoso (FHC), presidente de 1995 a 2002, conseguiu fazer as contrarreformas que eram requeridas pelo sistema neoliberal capitalista, a partir de cartilhas como a do Consenso de Washington, que exigiam a privatização do Estado como pré-requisito para o crescimento econômico. Essas alterações tiveram impacto também no movimento sindical. Ganhou força o “sindicalismo de resultado”, adaptado à ordem institucional, mudando sua agenda de lutas para defender não mais conquistas democráticas, e sim o pacto social entre as classes, que gerou a Força Sindical, mas que acabou por atingir a própria Central Única dos Trabalhadores (CUT). A lógica de retirada de direitos democráticos e sociais se manteve durante os governos de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) e Dilma Rousseff (2011 até agora). Para o presidente do ANDES-SN, portanto, o Brasil chega à atual crise política já em um processo de retirada de direitos democráticos, ou de ataque à democracia. E Rizzo atribui esses ataques à política de “governabilidade” para manter o pacto social. “Para manter a governabilidade, que passou a ser o objetivo estratégico do PT, o governo tomou como linha mestra não atender às necessidades populares, não fortalecer a democracia. Pelo contrário, nas suas alianças, acaba cerceando a democracia. E digo mais, jogando contra as esperanças de transformações sociais. Porque o partido que é da classe, faz um governo de coalizão de classes, e não avança, só retrocede”, comenta o presidente do ANDES-SN. Para Paulo Rizzo, esse modelo de coalizão de classes é inviável em um momento de crise econômica, pois a crise impede os governos de cederem às reivindicações dos trabalhadores e dos ricos ao mesmo tempo – e como a democracia representativa é dominada pelo poder econômico, o governo acaba retirando ainda mais direitos dos trabalhadores para dar

mais direitos aos ricos. “É inviável, porque com a crise econômica a exigência do Capital é de ter um controle direto do poder. As frações do Capital estão em disputa. Katia Abreu ficou no governo, porque o agronegócio não vê motivos para romper com o governo. Os bancos também não. Quem está na linha de frente do impeachment, pelo menos aparentemente, é o setor industrial através da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) e de seus patinhos. Porque é um dos setores mais afetados com a queda de lucros e, portanto, mais exigente em relação à disputa dos recursos públicos – que é o que está em questão, seja através de redução de impostos para empresas, seja através de subsídios”, completa.

Os ataques em curso São muitos os ataques aos direitos democráticos em curso hoje no país (veja alguns exemplos nas páginas 12 e 13). E, ao contrário de muitos projetos que têm sua tramitação adiada no Congresso Nacional por conta da crise política, projetos que retiram direitos sociais têm sido votados, na maioria das vezes, com acordo entre situação e oposição. Atnágoras Lopes, da CSP-Conlutas, ressalta essa questão. “Enquanto os dois blocos, pró e contra o impeachment, se digladiam politicamente, no ajuste e na retirada de direitos eles têm acordo. Há a Lei Antiterrorismo, que é uma ação preventiva à reação que os trabalhadores podem ter contra os ataques. Há o PLP 257, que ataca os servidores públicos e congela o salário mínimo. Há o projeto de terceirização (Projeto de Lei da Câmara 30/2015), que precariza ainda mais os vínculos de trabalho”, diz o dirigente da CSP-Conlutas. Paulo Rizzo, presidente do ANDES-SN, afirma que os ataques são a demonstração de que o Capital está assaltando o Estado de maneira deslavada. “Como o governo lança esse PLP 257 agora, que rompe o pacto federativo? Ele está impondo uma chantagem aos estados e municípios, ao afirmar que só haverá renegociação da dívida se seguir as medidas de ajuste. Todos esses setores, inclusive os que deixam o governo afundando, querem fazer o ajuste. Na Previdência, querem cortar gastos. Há certo consenso neoliberal entre oposição e situação”, critica. Para o presidente do ANDES-SN, os golpes à democracia estão postos, todos os dias, em projetos de retirada de direitos trabalhistas, de subfinanciamento de políticas sociais, nos cortes


Matéria Central no orçamento para retirar recursos da educação e saúde, na criminalização dos movimentos sociais e na lei de greve em tramitação, entre outros.

Saída é reorganização da classe Para Paulo Rizzo, o momento de crise, por mais terrível que seja, apresenta a possibilidade de reorganização dos trabalhadores para defender seus direitos e conquistar novos. “Nós temos que ter uma perspectiva em relação ao que vai acontecer. Com impeachment ou sem, a luta de classes se intensifica no Brasil. Ela nunca deixou de existir, mas tende

a se intensificar. Isso porque o governo, independente de quem esteja nele, será de atenção ao Capital, que já tem controle sobre o poder”, diz o docente. Rizzo ressalta que o ANDES-SN tem uma concepção sindical que compreende que o sindicato é um órgão de frente única e de unidade, e não um partido político. Para ele, não compete ao ANDESSN apresentar uma alternativa política – que, ainda assim, precisa ser criada. “Quando lutamos contra a ditadura, lutamos pela democracia, pelas liberdades democráticas, incluindo a liberdade partidária. E, numa perspectiva classista, sempre lutamos por independência e

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autonomia dos movimentos”, comenta o presidente do Sindicato Nacional. “A solução, acreditamos, vai ter que ser construída pela classe trabalhadora nas ruas. O ANDES-SN tem que apostar na reorganização da classe. É um momento importante para isso. E nós temos que estar na rua lutando contra todas as medidas que atacam a classe trabalhadora. Nós estamos disputando as condições de vida da população brasileira”, conclui Paulo Rizzo, que acredita que a maior ameaça que paira sobre o Brasil não é ao Estado de Direito, e sim aos direitos e conquistas sociais e trabalhistas do povo brasileiro.


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Especial

Raio X do Congresso Nacional identifica PLs e PEC que atacam direitos

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ma série de projetos de Lei, alguns deles parte da Agenda Brasil apresentada no final de 2015, tramitam no Congresso Nacional representando ameaças concretas aos direitos sociais dos trabalhadores, ao caráter público e gratuito da Educação e inclusive à carreira do docente federal. No final de março, entrou na pauta o Projeto de Lei Complementar 257/2016,

de autoria do Executivo, que integra o pacote de ajuste fiscal e traz uma série de ataques diretos aos servidores públicos das três esferas: federal, estadual e municipal. Por tramitar em caráter de urgência constitucional, o projeto deve ser votado até o dia 6 de maio e encaminhado ao Senado, que terá mais 45 dias para apreciar a proposta, que visa manter o pagamento de juros e amortizações da dívida ao sistema financeiro e aumentar

a arrecadação da União. Suspensão dos concursos públicos, congelamento de salários, não pagamento de progressões e promoções na carreira, retirada de gratificações, destruição da previdência social e revisão dos Regimes Jurídicos dos Servidores estão entre as medidas nefastas a serem implementadas caso o PLP 257/2016 seja aprovado. Confira algumas das outras ameaças em pauta no Congresso.

PLC 30/15 (ex-PL 4330)

PLS 555/15 PLP 92/07 O PLS 555/15 cria o "Estatuto das Estatais", transformando empresas públicas em sociedades anônimas. Já, o PLP 92/07 permite que as fundações estatais de direito privado atuem no desenvolvimento de atividades sem fins lucrativos, que não sejam exclusivas do Estado e não exijam o exercício do poder de autoridade. Ambos os projetos privatizam ainda mais as gestões das estatais e das fundações públicas.

PLS 397/15 PLS 327/14 PLS 513/07

Conhecido como PL da Terceirização, o PLC 30/15 regulamenta de forma irrestrita a terceirização de atividade-fim, flexibilizando as relações de trabalho e retirando dos trabalhadores direitos como férias e Fundo de Garantia para aumentar os lucros dos patrões.

O PLS 397/15 estabelece as normas gerais para a negociação coletiva na administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, enquanto os PLS 327/14 e PLS 513/07 restringem o direito de greve dos servidores públicos, previsto no inciso VII do art. 37 da Constituição Federal.


Especial

PL 4251/15 Altera a remuneração, regras de promoção, incorporação de gratificação de desempenho a aposentadorias e pensões de servidores públicos da área da educação.

Passa ao Congresso as competências exclusivas à aprovação de demarcação de terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e quilombolas e a ratificação das demarcações já homologadas, deixando na mão de ruralistas o futuro desses povos.

Propõe o Programa Escola sem Partido, apensado ao PL 7180/2014, que inclui entre os princípios do ensino o impedimento da manifestação de professores sobre política, questões de gênero e orientação sexual, entre outras, classificando tais manifestações como “doutrinação”.

Põe fim ao princípio constitucional da gratuidade das atividades de cursos de especialização (extensão e pós-graduação lato sensu) oferecidas pelas Instituições de Ensino Superior (IES) públicas, alterando o inciso IV do artigo 206 da Constituição Federal.

PEC 171/93 Reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos e altera os artigos 129 e 228 da Constituição Federal, acrescentando um parágrafo que prevê a redução da maioridade penal para os crimes considerados hediondos (como estupro e latrocínio), lesão corporal grave e roubo qualificado. Na prática, aumenta a criminalização da juventude pobre e negra, sem atacar o cerne da violência, que é a desigualdade social.

PL 478/07 PL 4643/12 Cria Fundo Patrimonial nas instituições federais de ensino, possibilitando investimentos da iniciativa privada, de pessoa física e jurídica, nas IFE.

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PL 867/15

PEC 395/14 PEC 215/00

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PL 1545/2011 O PL 478/07 dispõe sobre o Estatuto do Nascituro e prevê uma “bolsa-estupro” para as mulheres sexualmente violentadas que ficarem grávidas e mantiverem a gestação e o PL 1545/2011 penaliza o médico que interromper a gravidez fora das hipóteses existentes na lei atual, criminalizando as mulheres pobres que não podem ter acesso ao aborto seguro.


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Movimentos Sociais

Juventude brasileira é a maior vítima da violência no país

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Brasil é o país com o maior número absoluto de homicídios no mundo. Em 2014, 59,627 mil pessoas foram assassinadas no território brasileiro - o que equivale a 29,1 homicídios a cada 100 mil habitantes. A juventude é a maior vítima da violência no Brasil, mais da metade (31,5 mil) das pessoas assassinadas são jovens entre 15 e 29 anos, em sua maioria homens negros e com baixa escolaridade. Os dados são do Atlas da Violência 2016, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). O estudo analisou a evolução dos homicídios por macrorregiões, unidades da federação e microrregiões, provocadas por armas de fogo, violência policial, assim como homicídios de negros, mulheres e jovens. Os números estão no Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde. Mais de 76% dos homicídios ocorridos no país, em 2014, foram em decorrência do uso das armas de fogo. Os dados revelam que o extermínio da juventude no país é direcionado. Quando o jovem atinge os 21 anos de idade, se ele é negro ou pardo, a sua probabilidade em ser assassinado aumenta em 147% em relação a indivíduos brancos, amarelos e indígenas. De 2004 a 2014, houve um crescimento na taxa de homicídio de negros em 18,2%, enquanto no mesmo período houve uma diminuição na vitimização de outros indivíduos em 14,6%. O estudo apontou também que a proporção de mortes para os indivíduos que possuem menos do que oito anos de estudo é 5,4 vezes maior do que para os que têm grau de escolaridade superior a esse tempo. Já em comparação com alguém que ingressou no ensino superior, as chances de um indivíduo, com até sete anos de estudo, ser vítima de homicídio no Brasil são 15,9 vezes maiores. Janaína Oliveira, representante da Assembleia Nacional dos Estudantes (Anel), afirma que os números apresentados pelo

estudo não são novidade, e apenas evidenciam a supressão da juventude negra no país. “O Brasil ainda apresenta todos os traços de uma colônia. Ele é dividido racialmente, mesmo com uma população quase 70% negra. E os governos federal, estaduais e municipais não têm interesse em acabar com a situação de desigualdade que vivem os negros e as negras no Brasil, isso ficou nítido no estudo. Ser um jovem negro no país significa que você não terá condições de transporte e, consequentemente, não terá acesso a sua escola. Precisará ajudar na renda de casa e procurar um trabalho. Então, desde cedo, o jovem negro está associado ao trabalho infantil e, também, ao fato de não ter acesso à educação. Por isso, os principais alvos da violência são os jovens negros mais pobres e que, muitas vezes, por total ausência de oportunidade acabam recorrendo ao crime para conseguir condições mínimas para sobrevivência ou são cooptados pelo tráfico de drogas”, disse.

Regiões Quando analisamos a taxa de homicídios no país, por regiões, podemos apontar que os índices têm diminuído ao longo dos anos

As chances de uma pessoa sofrer homicídio no Brasil aumenta aos 21 anos, e a probabilidade cresce em 147%

se a vítima for negra ou parda.

nas cidades da região Sudeste e Sul e aumentado na região Nordeste. Em 2014, Alagoas possuía uma taxa de 82,5 por 100 mil habitantes negros vítimas de homicídio no país. No mesmo período, a taxa de habitantes não negros assassinados no estado foi de 7,8 mortes por 100 mil habitantes. O que significa que para cada não negro assassinado, outros 10,6 negros foram mortos em 2014. O Rio Grande do Norte registrou aumento de 360,8% na taxa de homicídios em dez anos, e a taxa de vitimização de negros aumentou 388,8%. Enquanto em São Paulo, houve uma redução de 52,4% no número de assassinato, e de 61,6% na vitimização de negros no Estado. “O aumento da taxa de homicídios na região Nordeste e a queda no Sudeste, especificamente, em São Paulo, deve-se a diversos fatores. Primeiro, que essa metodologia é questionável, pois não leva em conta a manipulação de dados das polícias, com a restrição do Boletim de Ocorrência e a mudança, recente, dos critérios sobre a letalidade policial em São Paulo. Os programas do governo do estado e da prefeitura maquiam os números e não representam a realidade da periferia. Em São Paulo pesa nas costas, ainda, ter uma polícia que é uma das mais violentas do mundo. Somando-se a isso, temos algo concreto que foram as manifestações de junho de 2013 e o seu impacto no avanço das lutas raciais, colocando os governos em alerta. Já no Nordeste, o coronelismo está presente até hoje nos estados da região, com uma forte relação com o poder público e as polícias, o que tem bastante influência no número apresentado. Da mesma forma, é a política do Estado, que é voltada apenas ao combate a violência, de forma genérica, e desconsidera a desigualdade existente entre negros e brancos”, apontou Janaína.

Mortes causadas pela polícia O levantamento também alerta para o fenômeno da subnotificação de mortes causadas pela polícia. Muitas vezes, a notificação do crime não


Movimentos Sociais ocorre e, raramente, o policial infrator é responsabilizado pelo uso da força letal. Segundo os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, foram oficialmente registrados 3.009 óbitos provocados por ações policiais no país em 2014. Os estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia são os mais afetados, com 965, 584 e 278 óbitos registrados, respectivamente. De acordo com a representante da Anel, infelizmente esses dados não são confiáveis e é preciso cobrar dos governos e das instituições policiais que não mascarem os dados e que sejam responsabilizados pelo uso da força letal. Ela afirma que os números de mortes causados por policiais são muito maiores que os apresentados. Em fevereiro deste ano, o governo do estado de São Paulo decretou sigilo de 50 anos para dados dos boletins de ocorrência registrados pela polícia, desta forma, acobertando o acometimento de ilicitudes pelo Estado e impedindo o controle da sociedade sobre a atividade policial. Diante dos números divulgados pela pesquisa, Janaína explica que o combate à violência não se dá pelo aumento do

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efetivo policial e, muito menos, do aparato policial. Mas entendendo as desigualdaA taxa de homicídios des raciais de negros aumentou existente em 18,2% entre 2004 no país e, e 2014, enquanto que a de fato, taxa na população de possibilitannão negros diminuiu do medidas de reparação em 14,6%. social. “O estado já aborta esses jovens desde que eles nascem, pois não existem políticas voltadas para essa parcela da sociedade. O genocídio da juventude negra não se dá apenas pelo combate às drogas, mas garantindo os direitos aos jovens negros no país, para que possam estudar, trabalhar, e ter oportunidades na vida. É preciso avançar de fato nas políticas de reparação e reconhecer que o Estado brasileiro se envolveu no crime de escravidão e, ainda, matou, negro, periférico e de baixa escolaridade estuprou e cometeu inúmeras barbáries a é marginalizado no nosso país. E, para ela, um povo. Apoiar o mito da democracia racial não existem expectativas de vida e nem é ignorar as diferenças e contribuir para o mesmo a garantia da própria vida. Não se extermínio da população negra. O jovem tem o direito de viver”, disse. Agência Brasil

Silhuetas de corpos desenhadas no Rio de Janeiro alertam para assassinatos de jovens negros


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Internacional

Curdos lutam contra repressão do governo da Turquia Fotos: Kurdishstruggle

Recep Erdogan, presidente turco, persegue docentes e estudantes curdos contrários ao governo

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s curdos são o maior povo sem pátria do mundo. São cerca de 30 milhões de pessoas vivendo na região autodenominada como Curdistão: o leste e o sudoeste da Turquia, o norte do Iraque, o norte da Síria e o noroeste do Irã. Nesses países, os curdos estão sujeitos, há séculos, à opressão dos governos centrais – que não respeitam seus direitos sociais, sua língua e suas tradições. Na Turquia, onde já houve uma série de levantes curdos contra o governo, um novo caso de repressão tomou as manchetes internacionais no começo de 2016. O governo do presidente Recep Erdogan iniciou uma série de ataques contra cidades curdas, com objetivo de combater o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK, em curdo) – considerado uma organização terrorista pelos governos turco e por outros países europeus por ter aderido à luta armada como forma de conquistar a independência. “Historicamente, o movimento nacionalista curdo dividiu-se entre os que buscavam a autonomia política para as áreas habitadas por curdos da Síria, de modo semelhante ao Curdistão iraquiano, e os que reivindicavam a independência total como parte de um Curdistão unificado, incluindo os territórios habitados por curdos da Síria, Irã, Iraque e Turquia. O PKK confrontava-se, na maioria das vezes, com o exército turco, porque a Turquia é o país onde os trabalhadores curdos são mais humilhados. A língua curda é terminantemente proibida na Turquia”,

afirma Osvaldo Coggiola, docente de história da Universidade de São Paulo (USP). A nova crise acontece em meio ao crescimento do Estado Islâmico, que até poucos meses era combatido apenas pelos curdos – também perseguidos pelo grupo na Síria e no Iraque. O governo turco, com o intuito de combater o PKK, silenciava frente às denúncias contra o Estado Islâmico, e só o colocou na lista de inimigos após o atentado terrorista em Istambul, no dia 12 de janeiro. Em meio a esse cenário, há ainda a crise de refugiados e imigrantes, que coloca a Turquia, por sua localização geográfica na “entrada” da Europa, no foco da questão. Para Coggiola, os curdos cumprem papel fundamental na disputa política e bélica da região. “O chamado ‘confederalismo democrático’ vêm sendo levado adiante nessa região pelo grupo Unidades de Defesa da População (YPG, em curdo – ligado ao PKK). Ele se baseia na rejeição da ideia tradicional de que o problema se solucionaria com a criação de um Estado-Nação curdo. A pers-

pectiva parte de uma impugnação ao conceito de Estado-Nação e à ideia de uma organização verticalista. Propõe organizar a sociedade de baixo para cima, a partir das comunidades locais, com assembleias e organizações populares”, ressalta o docente da USP, que acredita que a resolução do problema curdo na Turquia, sem recorrer ao Estado-Nação e ao sistema capitalista seria, assim, um fator chave para resolver os problemas do Oriente Médio.

Perseguição a docentes curdos Após os ataques no início do ano, cerca de 1.200 intelectuais, professores, pesquisadores e estudantes assinaram a “iniciativa Universidade para a Paz”, exigindo o fim da intervenção das forças de segurança turcas contra os apoiadores do PKK. Nela, denunciaram “um deliberado e planejado massacre em violação das leis turcas e tratados internacionais assinados pela Turquia”. A reação de Erdogan, no entanto, foi aumentar a repressão. A polícia turca deteve 22 acadêmicos curdos, acusados de “propaganda terrorista” por assinarem o manifesto. Além disso, a justiça turca iniciou uma investigação criminal sobre outros 130 pelo mesmo motivo - e os centros educacionais abriram expedientes contra dezenas de professores que incluíram seus nomes no manifesto.


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