InformANDES Setembro 2017

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InformANDES SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR - ANDES-SN

Informativo Nº 74

Brasília (DF) Setembro de 2017

Governo joga com educação pública e direitos sociais para agradar o Capital “Cai o rei de espadas, cai o rei de ouros, cai o rei de paus, cai, não fica nada!”

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ara alimentar a jogatina do sistema capitalista, o governo federal vem utilizando as cartas dos serviços públicos, que formam o frágil castelo de garantias sociais, para satisfazer empresários e banqueiros, descartando todos os direitos da população brasileira e abrindo espaço para a privatização de todas as áreas da esfera pública.

Encontro das Iees/Imes

Direitos de aposentadoria

Entrevista

Docentes de 25 seções sindicais das Estaduais e Municipais se reuniram em Mossoró (RN) para o XV Encontro das Iees/ Imes e indicaram agenda de lutas e pauta unificada para o Setor 4 e 5

Docentes de todo o país participam das atividades da Jornada de Mobilização dos Aposentados e Aposentadas, em defesa dos direitos de aposentadoria, realizadas em Brasília (DF) 6 e 7

Durante o I Seminário Integrado do GTPCEGDS, Adriana Sales, professora da rede estadual do MT e dirigente da Antra, falou sobre a luta da população trans contra a opressão 12 e 13


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Editorial

É hora de ampliar a unidade da classe trabalhadora Em defesa dos serviços públicos contra os ataques dos Governos Federal, Estaduais e Municipais

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s governos federal, estaduais e municipais ampliaram os ataques à educação e ao serviço público em várias frentes. A revisão da meta fiscal para o próximo ano e uma série de medidas publicizadas pelo governo federal, dentre elas, o adiamento do reajuste salarial negociado para 2018 (previsto para agosto, no caso dos docentes federais); o aumento da contribuição previdenciária de 11% para 14%; a modificação nas carreiras do Executivo Federal - com inclusão de novos níveis e o aumento do prazo para progressão - e a extinção de 60 mil cargos do serviço público aprofundam os cortes nos setores essenciais dos serviços públicos e o ataque aos trabalhadores e trabalhadoras, para favorecer os setores empresariais e banqueiros. Se, por um lado, intensificam-se os ataques ao serviço público e aos direitos sociais, por outro, o ilegítimo governo Temer, a serviço do setor rentista, concedeu uma série de isenções fiscais às empresas, perdoou dívidas bilionárias de bancos, autorizou empréstimos a bancos internacionais, bem como anistiou dívidas previdenciárias do setor do agronegócio com a União. Junto a isto, promoveu uma verdadeira farra com o dinheiro público, concedendo emendas parlamentares, que já somam mais de R$ 2 bilhões. Concomitantemente, o desejo de concretizar um projeto conservador e mercantilista para a educação está a todo vapor. A autorização ao Ministério da Educação (MEC) para solicitar um empréstimo de até US$ 250 milhões

(cerca de R$ 800 milhões) ao Bando Mundial, para implementar a contrarreforma do Ensino Médio nos estados brasileiros, é uma demonstração das prioridades do governo. Nos estados e municípios, os governos, dos mais diversos partidos, aplicam o ajuste fiscal de forma brutal e extremamente danosa aos servidores públicos. Salários atrasados, ataques aos diretos conquistados, a não realização de concursos públicos e o contingenciamento violento de orçamentos destinados às Instituições de Ensino Superior Públicas. No Rio de Janeiro, os docentes da UERJ, UEZO e UENF continuam resistindo bravamente aos ataques do governo Pezão com greve, atos e uma intensa articulação com o conjunto dos servidores púbicos estaduais na defesa de sua dignidade ante a um governo afundado em escândalos de corrupção. O cenário não é diferente em outras esferas ou regiões, demonstrando que tanto na esfera federal quanto nos estados e municípios, o quadro é muito parecido. Aliado aos ataques de ordem econômica, o recrudescimento conservador em nossa sociedade tem se agudizado na educação. A criminalização dos estudantes, técnico-administrativos e docentes, levada a cabo por diretores de escolas, reitorias, conselhos superiores e Ministérios públicos é, em grande medida, uma reação ao processo de ocupação das escolas e Instituições de Ensino Superior e àqueles que se levan-

tam contra o reacionário projeto “escola com mordaça”. A mobilização contra esse recrudescimento conservador, e em defesa da liberdade de expressão e da autonomia do fazer pedagógico, está sendo feita em todos os espaços da sociedade, como, por exemplo, na cidade de Pelotas (RS), em agosto, quando o Projeto de Lei Municipal “Escola Sem Partido” foi arquivado na Câmara dos Vereadores pelos próprios parlamentares proponentes do projeto, depois da realização de uma audiência pública com mais de 400 pessoas, que lotaram o plenário e exigiram a retirada do projeto. Não podemos tolerar todos esses ataques efetuados por governos e setores reacionários da sociedade. A defesa da educação pública, gratuita, de qualidade, laica e socialmente referenciada deve ser uma bandeira da classe trabalhadora, porque é também uma luta por direitos. A retomada da mobilização, no mesmo patamar da vitoriosa Greve Geral do 28 de abril, com vistas a ações contundentes para barrar todos esses ataques ao serviço público e a reforma da Previdência é a nossa prioridade. Não serão as burocracias sindicais pelegas, prontas a fazer qualquer acordo que as beneficiem, nem os setores conservadores e reacionários que irão arrefecer nossa disposição de luta ante a atual conjuntura. Não iremos ficar de braços cruzados vendo esse espetáculo de horrores passar impune. Fora Temer! Nenhum direito a menos! Em defesa dos serviços e da educação públicas!

EXPEDIENTE O Informandes é uma publicação do ANDES-SN // site: www.andes.org.br // e-mail: imprensa@andes.org.br Diretor responsável: Giovanni Frizzo // Redação: Bruna Yunes Drt-DF 9045, Mathias Rodrigues MTb 10126, Renata Maffezoli Mtb 37322 Edição: Renata Maffezoli // Foto: Renata Maffezoli // Diagramação: Renata Fernandes Drt-DF 13743 // Ilustração da capa: Rafael Balbueno


CSP - Conlutas

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Vem aí o 3º Congresso Nacional da CSP-Conlutas A expectativa é de que mais de 2 mil delegados participem do Congresso da Central

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e 12 a 15 de outubro, ocorre o 3º Congresso Nacional da CSPConlutas, na cidade de Sumaré, em São Paulo. Neste período, representantes de movimentos sociais, sindicais, populares e estudantis se reunirão para definir as políticas que orientarão as lutas da Central e realizar o balanço político desde o congresso anterior, realizado em junho de 2015. O 3º Congresso

também será marcado pela comemoração dos 100 anos da Revolução Russa. No site www.cspconlutas.org.br/congresso há informações importantes sobre o encontro, como notícias, calendário, programação, o regimento interno e critérios de participação, além de materiais de divulgação, disponíveis para download, como cartazes, adesivos e o manifesto de lançamento do Congresso. A escolha de delegados e delegadas foi realizada através das assembleias de base das entidades que compõem a Central. A eleição para a escolha dos representantes dos movimentos de luta contra a opressão e juventude será feita entre 20 de setembro e 4 de outubro, assim como a inscrição e pagamento das taxas, deste grupo, que se encerra no dia 5 de outubro. A expectativa é que mais de 2 mil delegados participem do III Congresso da Central.

Participação do ANDES-SN Durante o 62º Conad do ANDES-SN, realizado em julho deste ano em Niterói (RJ), foi destacada a necessidade do Sindicato Nacional em continuar o protagonismo que tem assumido na construção de uni-

dade de luta com as demais organizações dos trabalhadores, ampliando a atuação no interior da CSP-Conlutas, inclusive, nas instâncias deliberativas. Na plenária, que tratou do plano de lutas gerais da entidade, os docentes aprovaram incentivar participação das seções sindicais no Congresso e a regularização financeira das seções junto à Central, entre outras medidas. “É fundamental a participação do ANDES-SN no 3° Congresso da CSPConlutas e que as nossas seções sindicais se mobilizem para enviar os delegados das bases ao encontro da Central. Com o processo que vivemos no Brasil de total retrocesso e ataque aos serviços públicos, é necessário ter uma central sindical que de fato esteja ao lado dos trabalhadores para fazer o enfrentamento contra o governo”, disse Eblin Farage, presidente do ANDES-SN.

1° Encontro da Classe Trabalhadora das Américas Logo após o 3º Congresso da CSPConlutas, nos dias 16 e 17 de outubro, acontecerá o 1° Encontro da Classe Trabalhadora das Américas em Caraguatatuba (SP), que fica a 263 km da cidade de Sumaré (SP). O encontro tem como objetivo estreitar as relações e a troca de experiências de luta entre trabalhadores de outros países e organizar a resistência contra os ataques neoliberais no continente americano. O evento é uma iniciativa da Rede Sindical Internacional de Solidariedade e Lutas e é organizado por centenas de entidades sindicais que atuam ao redor do mundo. A previsão é de que participem representações de mais de 10 países das Américas, e de sindicalistas da África do Sul, do Norte da África e do Oriente Médio.


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Movimento Docente

XV Encontro das Iees/Imes indica luta unificada em defesa da educação pública

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conjuntura política brasileira, a crise do capitalismo, os impactos dos cortes de verbas nas instituições de ensino superior, financiamento, democracia e os ataques à autonomia universitária, entre outros temas, foram debatidos no XV Encontro das Instituições de Ensino Superior Estaduais e Municipais (Iees/ Imes) do ANDES-SN, realizado de 7 a 9 de setembro, em Mossoró (RN). Sob o tema "Financiamento, Autonomia e Democracia", o evento reuniu representantes de 25 seções sindicais do Setor das Iees/Imes e foi sediado pela Associação dos Docentes da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (Aduern - Seção Sindical do ANDES-SN). O encontrou encaminhou o posicionamento do Setor das Iees/Imes do ANDESSN para o próximo período e indicou um ato nacional unificado para o lançamento da Frente Nacional em Defesa da Educação Pública, precedida de uma reunião con-

junta dos setores das Ifes e Iees/Imes para organizar a atividade. Além disso, foi apontado que os docentes realizem audiências públicas nos estados para debater a pauta unificada das Iees e Imes, façam visitas aos gabinetes dos deputados e senadores para a entrega da pauta unificada das Iees e Imes, atos locais, aulas públicas e atividades de extensão em defesa da universidade pública - articulando as atividades com o restante da comunidade acadêmica, movimentos populares e sociais e, ainda, sociedade em geral. Foi sugerida também uma campanha nacional em defesa das universidades estaduais e municipais públicas, com a realização de um dossiê e vídeos com informações sobre os ataques dos governos estaduais e municipais. “Na atual conjuntura de ataques, em nível nacional, à educação pública superior, em particular, as Estaduais e Municipais, o evento foi muito importante, porque esses ataques têm prejudicado a educação pública e um importante passo foi dado neste encontro na formulação de uma pauta unificada para a construção da Frente Nacional em Defesa da Educação Pública”, disse Alexandre Galvão Carvalho, secretário-geral do ANDESN e da coordenação dos Setor das Estaduais e Municipais, que avaliou o encontro como vitorioso, devido a quantidade de docentes que conseguiu reunir, de diversas seções sindicais do ANDES-SN, e à qualidade dos debates.

Debates O encontro teve início na tarde de quinta-feira (7) com a mesa “A defesa do serviço público e a luta contra as reformas”, que contou com a presença dos palestrantes Amauri Fragoso de Medeiros, 1° tesoureiro do ANDES-SN;

Zaíra Valeska, coordenadora-geral da Seção Sindical dos Docentes da Universidade do Estado do Pará (Sinduepa SSind); e Rivânia Moura, presidente da Aduern-SSind. A presidente da Aduern-SSind. apresentou um panorama sobre a dívida pública brasileira e desmistificou o déficit na Previdência Social. A docente também falou sobre as medidas dos governos, que no decorrer dos anos promoveram gradativas retiradas de direitos da classe trabalhadora. “Os ajustes fiscais promovidos por todos os governos nos últimos anos representam fundamentalmente a retirada dos direitos dos trabalhadores. A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)


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Movimento Docente

5 Fotos: Aduern SSind.

é outro bom exemplo, pois serviu para barrar os direitos dos trabalhadores, sob o discurso da moralização do uso do dinheiro público, quando na verdade nunca barrou pagamento aos banqueiros e empresários”, afirmou Rivânia. Zaíra Valeska deu continuidade ao debate ressaltando que a crise e os ataques à classe trabalhadora não tiveram início no governo de Michel Temer e que o desmonte da universidade pública tem total relação com os projetos de conciliação de classes e rebaixamento de pautas que vinham sendo empreendidos por governos anteriores. Amauri Fragoso destacou que as contrarreformas já estão sendo vivenciadas pelos docentes, expressas no aumento da carga horária de trabalho, com exigências de produtividade e a precarização das condições de trabalho. A segunda mesa do dia discutiu “Democracia Universitária: autonomia e processos de estatuinte nas IEES-IMES” e foi exposta pelos docentes Roberto Kanitz, da direção da Associação dos Docentes da Universidade do Estado de Minas Gerais (Aduemg-SSind.), Sâmbara Paula Ribeiro, presidente do Sindicato dos Docentes da Universidade Estadual do Ceará (SindueceSSind.) e José Carlos Santana, membro do Conselho Fiscal da Associação dos Docentes da Universidade Estadual de Feira de Santana (Adufs-BA SSind.). Os debates continuaram na manhã seguinte (8) com o painel “Ajuste fiscal: financiamento e retirada de direitos trabalhistas”, que teve início com a apresentação de Rodrigo Reis, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). “Estamos sofrendo um severo ataque à nossa autonomia financeira e a nossa dignidade enquanto servidores da Uerj. Em fevereiro de 2016, começaram os atrasos salariais. Em julho, tais atrasos já passavam de um mês. Entramos em 2017 sem receber os salários de novembro, dezembro e o 13º. Em agosto deste ano, chegamos a quatro

meses sem receber pagamento”, disse. “A situação da Uerj é de terra arrasada. Os servidores estão adoecendo, endividando-se. Mas não temos respondido aos ataques do governo com passividade, mas sim com revolta, resistência e luta”, completou o docente, emocionando os presentes. Logo após, Luiz Fernando Reis, presidente da Seção Sindical dos Docentes da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Adunioeste – SSind.), afirmou que, no Paraná, as sete universidades estaduais têm sofrido com o ajuste fiscal. Segundo Reis, o ataque à autonomia financeira

tem sido um dos maiores problemas vividos pelos professores paranaenses. Nelson Júnior, presidente da Associação dos Docentes da Universidade Estadual da Paraíba (Aduepb –SSind.), contou aos participantes do encontro o processo que garantiu a autonomia financeira da Uepb, a qual, infelizmente, vem sendo atacada pelos recentes governos. A mesa seguinte “Os ataques à educação superior e a necessidade de uma Frente Nacional em defesa das Iees/Imes”, foi composta pelos integrantes da coordenação do Setor das Iees/Imes do ANDES-SN.

Acordão no Rio

A situação dos docentes das Iees do Rio de Janeiro é uma das piores do país. Desde o ano passado, a categoria sofre com a inconstância do pagamento dos seus salários, o desmonte das instituições de ensino e a privatização dos serviços públicos, entre outros ataques promovidos pelo governador Fernando Pezão (PMDB). Para piorar a situação, no início do mês, o governo estadual assinou um acordo de adesão ao Regime de Recuperação Fiscal, que prevê ajuste fiscal de R$ 63 bilhões até o final de 2020 e dois empréstimos da União de cerca de R$ 6,5 bi ao Rio. Como contrapartida, o governo federal apresentou uma série de exigências ao estado que já vinha colocando em prática, desde novembro de 2016, o seu pacote de maldades. Entre as medidas que o Rio deve adotar para garantir o repasse dos recursos está conclusão da privatização da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae) – iniciada em fevereiro desse ano - e o aumento da contribuição previdenciária dos servidores estaduais. Caso o governo estadual não atinja o chamado “equilíbrio fiscal”, o Tesouro Nacional recomendou ao estado fluminense que revise a oferta do ensino superior e demita servidores.


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Movimento Docente

Luta conjunta entre docentes aposentados e ativos marca Jornada de Mobilização

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quanto a contrarreforma da Previdência irá dificultar e, em muitos casos, impedir o trabalhador a se aposentar, caso seja aprovada no Congresso Nacional, não é mais novidade. Além disso, diversas medidas ao longo das décadas foram tomadas com esse intuito e também para fragilizar a Previdência Social. Desde os anos 90, nos governos de Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso, a Previdência Social passou por diversos ataques, que continuaram nos anos 2000, nos governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff, e intensificados recentemente no governo de Michel Temer. A justificativa para as “mudanças” sempre foi uma suposta falência do sistema previ-

denciário público, o que tem sido demonstrado como farsa por diversas entidades, sindicatos e organizações. O ANDES-SN tem encampado as lutas contra a reforma da Previdência - Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/16 -, assim como contra todos os outros ataques à Previdência Social. Durante a Jornada de Mobilização dos Aposentados e Aposentadas do ANDES-SN, que ocorreu entre 16 a 18 de agosto, em Brasília (DF), cerca de 50 docentes aposentados e ativos debateram sobre a Previdência e as perdas históricas dos direitos de aposentadoria, participaram de audiências públicas sobre o tema e, ainda, realizaram mobilizações no Congresso Nacional contra a retirada de direitos.

Somos capazes de vencer as barreiras e mostrar que não estamos mortos. Estamos afastados do trabalho, mas não estamos afastados da vida. Eu sou aposentada e o meu coração pulsa a todo instante. Enquanto eu estiver viva, eu lutarei, pois a luta é minha forma de viver

Bernadete Gomes Mian - Adufes SSind.

No primeiro dia, Leandro Madureira, da Assessoria Jurídica Nacional (AJN) do Sindicato Nacional, relembrou os inúmeros projetos que vem alterando a aposentadoria dos trabalhadores e, mais especificamente, do servidor público, como as Emendas Constitucionais (EC) 20/98 e 41/03. Explicou também sobre os fundos de previdência complementar, como o Funpresp, e ainda falou sobre a PEC 287/16. Ana Maria Cartaxo, da seção sindical do ANDES-SN na Universidade Federal de Santa Catarina (Ufsc), afirma que a Previdência vem sendo liquidada há décadas para o mercado financeiro. “O sistema de proteção social brasileiro está ameaçado desde a década de 90, principalmente, após o governo FHC e depois o

A importância da militância na vida do aposentado é crucial. O aposentado é um cidadão de direito e precisa ser respeitado na sua dignidade plena, uma vez que ele deixa para a sociedade uma contribuição ímpar de legado e experiências

Arlete Correia de Oliveira - Adufes SSind.


Movimento Docente

A luta dos docentes aposentados, atualmente, é a mesma de todas as outras categorias dos servidores públicos federais, estaduais e municipais. Pela aprovação da PEC 555/06 e contra a PEC 287/16, que retira drasticamente os direitos de aposentadoria

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Uma luta é feita por todos e para todos. Não podemos separar a luta dos docentes aposentados dos ativos, porque pertencemos à mesma sociedade. A partir dessa organização é que podemos dar sustentação para que as necessidades sociais não sejam hierarquizadas

Maria Sueli Soares - Apufpr SSind. processo de destruição seguiu no governo Lula. Medidas infraconstitucionais, como o fator previdenciário, que atacam as pensões e, ainda, veremos a destruição geral desse sistema se for aprovada a PEC 287, que usa como desculpa o ‘déficit’ da Previdência, que sempre foi superavitária, para ser aprovada”, disse Ana Maria, que participou do encontro. À tarde, os participantes da Jornada de Mobilização foram à Câmara dos Deputados para pressionar parlamentares e apresentar o posicionamento do ANDES-SN, fundamentado política e juridicamente, sobre a contrarreforma da Previdência. Os docentes também pressionaram os deputados a aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 555/06, que inicialmente acabava com a contribuição previdenciária de servidores públicos aposentados revogando a Emenda Constitucional (EC) 41/03 e, agora, determina que a contribuição dos inativos terá o seu valor reduzido em 20% a cada ano após o titular do benefício completar 61 anos, deixando de ser cobrada quando o aposentado completar 65 anos. Maria Sueli Soares, da Associação dos Professores da Universidade Federal do Paraná (Apufpr-Seção Sindical do ANDESSN), ressaltou a importância em aprovar a PEC 555. “A quebra de uma cláusula pétrea da Constituição Federal em 2003 levou

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ao desconto de 11% das remunerações dos aposentados do serviço público, que ultrapassam o teto previdenciário do INSS. A PEC 555 pretende corrigir, em parte, essa distorção através da redução do desconto em 20% ao ano após o trabalhador completar 61 anos de idade”, afirmou. No segundo dia (17), os docentes do ANDES-SN participaram, com outras entidades, da audiência pública na Comissão de Direitos Humanos (CDH), do Senado Federal, que debateu as contrarreformas Trabalhista e da Previdência, e as consequências desses ataques para os aposentados. Mais cedo, os docentes se reuniram para a troca de experiências dos coletivos de aposentados e aposentadas das seções sindicais. No último dia (18), ocorreu uma reunião do GTSSA do Sindicato Nacional. “Participamos dessa jornada, com professores de várias seções sindicais, e tivemos a oportunidade de ir ao Senado, com outras representações sindicais e ter uma audiência a respeito das questões dos aposentados. Essa reforma da Previdência não pode passar, pois as perdas para os aposentáveis e aposentados serão muito grandes. Portanto, a nossa luta precisa ser conjunta”, avaliou Terezinha Diniz, da Associação dos Docentes da Universidade Federal da Paraíba (Adufpb – SSind). Para Sirliane Paiva, 2ª vice-presidente da

Rosilda Silva Dias - Apruma SSind. Regional Nordeste I e uma das coordenadoras do Grupo de Trabalho de Seguridade Social e Assuntos de Aposentadoria (GTSSA) do ANDES-SN, o saldo do encontro para o GTSSA e participantes, foi o entendimento de que é necessário que a luta seja conjunta para barrar todos os ataques aos direitos dos aposentados e aposentáveis. “Essa Jornada foi uma conquista dos professores aposentados. O Sindicato Nacional entende que a luta é única e a categoria uma só. Se não lutarmos contra essas incoerências, quando nos aposentarmos, se conseguirmos, iremos pagar contribuição previdenciária. O ANDES-SN defende e luta pela integralidade e paridade na aposentadoria”, explicou. A docente também ressalta a disposição dos docentes aposentados para a luta e que a Jornada rendeu bons frutos. “A Jornada refletiu de maneira positiva nos aposentados, tanto que já temos uma procura para o XIX Encontro Nacional de Assuntos de Aposentadoria, que será realizado nos dias 29 e 30 de setembro”, completou. O XIX Encontro terá como tema "Aposentadoria como direito à vida, em tempo de ataques às conquistas dos trabalhadores" e será sediado pela Associação dos Docentes da Universidade Federal do Maranhão (Apruma Seção Sindical do ANDES-SN), em São Luís (MA).

PEC 287 PEC 287 estabelece idade mínima para a aposentadoria de 65 anos para os homens e 62 para as mulheres, com tempo de mínimo de 25 anos de contribuição. Para quem já está no mercado de trabalho, a idade mínima começará em 53 anos para mulheres e 55 anos para homens, sendo elevada em um ano a cada dois anos. E ainda haverá um pedágio de 30% sobre o período que faltar para completar os tempos de contribuição atuais: de 35 anos para o homem e 30 anos para a mulher. Para receber o benefício integral a que tem direito, o trabalhador terá que contribuir para a Previdência Social por 40 anos. O valor da aposentadoria corresponderá 70% do valor dos salários do trabalhador, acrescidos de 1,5% para cada ano que superar 25 anos de contribuição, 2% para o que passar de 30 anos e 2,5% para o que superar 35 anos. No caso dos servidores públicos, a idade mínima para a aposentadoria é similar aos trabalhadores do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) de 62 anos para mulheres e de 65 anos para homens.


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Matéria Central

Governo joga com educação pública e direitos sociais para agradar o Capital

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esde dezembro de 2016, após a aprovação da Emenda Constitucional (EC) 95, que, enquanto tramitava, era conhecida como PEC 241, o governo federal tem utilizado argumento do ‘Teto de Gastos’ com despesas da União como justificativa para precarizar e atacar os serviços públicos brasileiros. Em pouco menos de um ano de teto constitucional, o Brasil já vivencia o aprofundamento da grave crise social, com os sucessivos cortes orçamentários em áreas fundamentais para a população. Na educação pública superior, por exemplo, os efeitos da política de ajuste fiscal, são sentidos na pele pela comunidade acadêmica. A continuidade das atividades de ensino, pesquisa e extensão está ameaçada. Muitos reitores afirmam não ter condições

de manter os calendários acadêmicos em vigor por muito tempo devido a falta de verbas, principalmente de custeio. A permanência estudantil está prejudicada pela falta de orçamento, e trabalhadores terceirizados já entenderam, há meses, que os cortes orçamentários significam salários atrasados e demissões. Como é possível observar na Linha do Tempo publicada nas páginas 10 e 11, a educação federal sofreu uma drástica redução orçamentária, a partir de 2012, com as reduções orçamentárias realizadas pela então presidente Dilma Rousseff. Em 2013 e 2014, por conta das eleições presidenciais, a Educação (assim como a Saúde) foi poupada de cortes e contingenciamentos, que voltaram ainda maiores em 2015, com o início do segundo mandato de Dilma e,

posteriormente, com a assunção de Michel Temer à chefia do Poder Executivo. Ao todo, desde 2012, o Ministério da Educação (MEC) perdeu cerca de R$ 23,34 bilhões de reais de seu orçamento, a partir de cortes e contingenciamentos. As universidades federais, em dados divulgados pelo próprio MEC, viram, de 2014 a 2017, o valor destinado a investimentos e manutenção passar de R$ 10,72 bilhões para R$ 7,34 bilhões, uma redução de R$ 3,38 bilhões. Ou seja, uma redução de 31% em três anos. Além da Educação, outras áreas estratégicas da nação, como Saúde, Infraestrutura, e Ciência e Tecnologia estão sendo alvos de constantes ataques, redução drástica de repasse de recursos e a abertura para o setor privado. Ao mesmo tempo, o governo federal


Matéria Central começa a coordenar um duro ataque aos servidores públicos. Recentemente, apresentou um projeto de Programa de Desligamento Voluntário (PDV) para servidores públicos federais, além de propor diminuir os salários iniciais das carreiras públicas e aumentar, de 11 para 14% a alíquota contribuição previdenciária dos servidores. E os ataques aos serviços e servidores públicos não estão sozinhos. Vêm alinhados a uma série de projetos que atacam toda a classe trabalhadora, como a contrarreforma Trabalhista, a contrarreforma da Previdência e a Lei das Terceirizações.

Meta fiscal Essa série de medidas deveria, segundo o ilegítimo presidente Michel Temer, “recolocar o Brasil nos trilhos”, atrair investimento estrangeiro e diminuir o desemprego, para fazer a economia do país “voltar a crescer”. Mas o recente recuo do governo federal quanto à meta fiscal demonstra que, mesmo para os padrões neoliberais, a política de ajuste fiscal não está funcionando. A questão é: ela pode funcionar em um mundo capitalista em crise? E, se funcionar, quanto sangue de trabalhadores será trocado por investimentos estrangeiros? O governo Temer havia previsto, inicialmente, um déficit de R$ 139 bilhões no Orçamento de 2017, mas teve que enviar ao Congresso Nacional um projeto de revisão da meta fiscal, aumentando o déficit para R$ 159 bilhões. O governo também pediu ao Legislativo a aprovação do aumento do déficit previsto para 2018, de R$ 129 bilhões para R$ 159 bilhões. A receita total da União prevista para 2018 será de R$ 3,6 trilhões, segundo o documento, sendo o orçamento Fiscal de R$ 1,43 trilhão, o orçamento da Seguridade Social R$ 997, 7 bilhões e o refinanciamento da dívida pública federal R$ 1,1 trilhão. Já o orçamento para investimentos foi estipulado em R$ 68,8 bilhões. Enquanto o Projeto de Lei Orçamentária (PLOA) de 2018 registrou queda, em relação ao de 2017, nos valores previsto para os orçamentos Fiscal (R$ 1,5 tri em 2017) e para investimentos (R$ 90 bi em 2017), o montante previsto para o refinanciamento da dívida pública foi reajustado em R$ 154 bilhões a mais que neste ano (em 2017 foi orçado R$ 946 bi). A diminuição nos recursos para investimento reflete o previsto na EC 95, que limitou os investimentos da União em políticas sociais por 20 anos. Michel Temer colocou a culpa do aumento do déficit na queda da inflação e na lenta retomada do crescimento econômico e avaliou que medidas mais drásticas preci-

sam ser tomadas. Esse discurso tem sido usado, inclusive para pautar a retomada da votação da contrarreforma da Previdência, no próximo mês de outubro. A proposta estava parada devido à falta de apoio do governo no Congresso Nacional, em grande parte dada à forte pressão exercida pelos movimentos sindical e social em defesa dos direitos de aposentadoria. Vale ressaltar que o acúmulo de déficits primários tem como principal consequência a elevação do endividamento público. A dívida bruta do governo federal saltou de 49,3% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2013, para 69,1% do PIB em junho deste ano, percentual que equivale a R$ 4,4 trilhões atualmente. A dívida bruta é o conceito mais amplo sobre o endividamento do governo e inclui, entre outras, as dívidas mobiliária e bancária, e as operações compromissadas do Banco Central. Segundo Cláudio Ribeiro, 2º vice-presidente da Regional Rio de Janeiro e um dos coordenadores do Setor das Instituições Federais de Ensino (Ifes) do ANDES-SN, os projetos de ajuste fiscal do governo federal querem reposicionar o Brasil no mercado internacional, no afã de atrair mais investimentos estrangeiros, rebaixando os direitos trabalhistas e barateando exploração da força de trabalho brasileira. “O que se coloca, a partir da crise internacional do capitalismo, é que o Brasil quer se transformar, mais ainda, em um prestador de serviços para o grande capital estrangeiro”, afirma o docente. Para Cláudio, é em meio a esse cenário de relocalização internacional que Temer tem seguido a cartilha clássica do neoliberalismo: atacar serviços públicos e o funcionalismo, colocando-os como culpados da crise econômica para, posteriormente, aumentar a presença da iniciativa privada em áreas que antes eram direito social garantidos pelo Estado. “Ou seja, todas essas contrarreformas e ajustes são para acabar com a oferta pública e gratuita desses serviços, e isso abre um enorme mercado. Quando se transformam direitos sociais em serviços privados, você faz esse mercado crescer. O que se coloca para o país, em geral, e para a educação pública em específico, é um aumento da interferência do setor privado na oferta dos serviços que antes eram públicos”, avalia o docente, ressaltando, por exemplo, a presença da Kroton-Anhanguera, maior empresa de educação do mundo, na oferta de ensino superior no Brasil. “Eles precisam derrotar o setor público, pois encaram os serviços públicos como competidores, e querem expandir ainda mais o mercado. E o Estado tem jogado

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contra ele mesmo, para possibilitar que o setor privado cresça. É uma estratégia clássica do neoliberalismo brasileiro, que opera sob essa lógica do capitalismo dependente, da articulação entre burguesia nacional e internacional por meio do Estado para criar novas mercadorias, jogando contra a própria sociedade. Temos um cenário muito dramático. Se, em 20 anos, o país continuar seguindo a lógica do Teto de Gastos, a oferta pública ou vai acabar ou vai se transformar no mais precário dos serviços”, completa Cláudio Ribeiro. “Não existe lugar para o serviço público no Brasil de 2036 com esse Teto de Gastos”, ressalta o docente.

Isenções fiscais, dívidas e empréstimos Enquanto alega a necessidade de corte nas despesas para diminuir o déficit da União, Michel Temer concedeu uma série de isenções fiscais às empresas, perdoou dívidas bilionárias de bancos, autorizou empréstimos a bancos internacionais e liberou a emendas parlamentares. De janeiro a junho, segundo levantamento da ONG Contas Abertas, o total liberado pelo governo para emendas foi de R$ 2,12 bilhões. Nas três primeiras semanas de julho,

Efeitos perversos do Teto de Gastos Um estudo publicado pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) sobre a Emenda Constitucional 95 comparou o Orçamento Federal executado em 2016 e o Orçamento Federal previsto para 2017 pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) – portanto, anterior à revisão da Meta Fiscal. Para o Inesc, o estudo prova que a EC 95 serve para achatar despesas sociais e beneficiar o sistema financeiro. De 2016 para 2017, a parte do Orçamento comprometida com despesas financeiras cresceu, passando de 45% para 53%, totalizando R$ 1,85 trilhão em 2017, o que equivale a um acréscimo de R$ 645 bilhões. Em contrapartida, as despesas primárias, de gastos sociais apesar de terem tido um aumento de R$ 77 milhões, encolheram de 55% para 47% do Orçamento.


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foram liberados R$ 2,11 bilhões de acordo com a entidade. O período corresponde ao de votação, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, da denúncia de corrupção contra o presidente ilegítimo, e também de conclusão da votação da contrarreforma Trabalhista. Recentemente, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão vinculado ao Ministério da Fazenda, decidiu favoravelmente ao Itaú-Unibanco e Santander, em processo que cobrava, das empresas, o não pagamento de tributos em valor superior a R$ 25 bilhões à Receita Federal e R$ 338 milhões de cobranças de Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), respectivamente.

Ataque aos servidores públicos O governo federal publicou, no dia 27 de julho, a Medida Provisória (MP) nº 792/17, que trata do PDV no âmbito do Poder Executivo Federal, que tem como objetivo demitir 5 mil servidores públicos federais e economizar, de acordo com cálculos do governo, cerca de R$ 1 bilhão por ano. O Congresso Nacional ainda precisa aprovar a Medida Provisória. Os trabalhadores que aceitarem o desligamento vão receber 1,25 salário para cada ano trabalhado. Por exemplo, um servidor que tenha remuneração de R$ 5 mil por mês, caso resolva aderir ao plano de demissão voluntária, vai receber mais R$ 6,2 mil por cada ano de serviço prestado.

Cortes na Educação

Matéria Central O PDV também prevê a redução da jornada de 8 horas diárias e 40 semanais para 6 ou 4 horas diárias e 30 ou 20 horas semanais, respectivamente, com redução proporcional do salário, calculada sobre o total da remuneração. Como incentivo à diminuição da jornada e do salário, o governo oferece o pagamento adicional correspondente à meia hora diária. Os funcionários públicos que optarem por uma jornada reduzida poderão ter outro emprego no setor privado, desde que não haja conflito de interesses entre as duas atividades. Outra proposta apresentada no PDV do governo é a licença incentivada em pecúnia sem remuneração. Pela proposta, o servidor tira uma licença não remunerada de três anos, que pode ser prorrogável por igual período, e recebe, no momento da suspensão das atividades, um valor correspondente a três vezes seu salário. É proibida a interrupção da licença. “O PDV é, simbolicamente, uma ação do estado contra o próprio serviço público, incentivando os trabalhadores a migrarem para o setor privado. Além de ser um desastre para quem está trabalhando, é também um anúncio de que o desmonte do Estado é obra do próprio Estado. É uma estratégia clássica de aprofundamento do neoliberalismo. Isso tudo vem permeado com a lógica da EC 95. Para garantir a EC 95, o governo quer cortar os serviços públicos”, avalia o coordenador do Setor das Ifes do ANDES-SN. Cláudio Ribeiro considera o projeto “muito

problemático”, e cita alguns elementos que, para ele, são estruturantes na tentativa de desmonte dos serviços públicos, a partir do ataque aos servidores públicos anunciado pelo governo federal quando da alteração da Meta Fiscal. São eles: a redução salarial drástica para quem ingressa no serviço público, criando uma diferenciação de categoria entre os que passaram e não passaram pelo estágio probatório; a possibilidade de criação de carreiras com 30 degraus de progressão, exigindo que os servidores trabalhem mais tempo e impossibilitando a chegada ao topo da carreira e gerando “economia”, já que maiores reajustes salariais são colocados no final da carreira; e o aumento da alíquota de contribuição previdenciária, de 11 para 14%, como já está acontecendo em vários estados. De acordo com o 2º vice-presidente da Regional Rio de Janeiro do ANDES-SN, alguns desses elementos já foram “testados” na carreira de docente federal e se demonstraram extremamente prejudiciais aos trabalhadores. Em 2012, o governo federal colocou no acordo de greve, que não foi assinado pelo Sindicato Nacional, a diferenciação entre servidores que ainda não cumpriram o estágio probatório e os que já cumpriram. O aumento dos degraus de progressão na carreira também já foi experimentado pelos docentes federais, com a criação da classe de Associado em 2006 (que retirou direitos de aposentados) e a tentativa da criação da classe Sênior em 2012, derrotada pelo movimento grevista.


Matéria Central “O ajuste fiscal é um ataque conjugado, tanto do governo dos estados quanto do governo federal. Os ataques se repetem nas três esferas. Nisso, a gente percebe uma diminuição geral de possibilidade de manutenção dos serviços públicos, sejam federais ou estaduais. Mais uma vez, o governo se utiliza do argumento de que, para garantir o ajuste fiscal, não se pode gastar com direitos sociais, o que é uma falácia”, completa Cláudio Ribeiro.

Estados e municípios Para legitimar e ampliar o ajuste fiscal nos estados e municípios, o governo encaminhou ao Parlamento o PLP 343/2017 – que suspende o pagamento das dívidas estaduais com a União por três anos, prorrogáveis por mais três, desde que sejam adotadas medidas como privatização de empresas públicas, congelamento de salários e até demissão de servidores. O projeto foi aprovado rapidamente tanto pela Câmara quanto pelo Senado e encaminhado e sancionado como Lei Complementar 159/2017 no mês de maio, em meio à crise política instalada com a divulgação da delação da JBS/Friboi envolvendo diversos nomes do atual governo, inclusive o presidente ilegítimo. As contrapartidas exigidas pelo governo federal para suspensão das dívidas e novos empréstimos às unidades federativas preveem a privatização de todos os serviços públicos dos entes federados. Antes de começar a contar com os benefícios do

regime, o estado interessado deve aprovar leis com medidas como a autorização para privatizar empresas estatais de qualquer setor, como financeiro, de energia e de saneamento, e outros, a adoção de fundo complementar de aposentadoria para os servidores e a revisão do regime jurídico dos servidores estaduais para suprimir benefícios ou vantagens não previstos no regime jurídico único dos servidores da União.

A resposta do movimento sindical O coordenador do Setor das Ifes ressalta que a EC 95 já começa a surtir efeitos negativos para a universidade pública brasileira. “Como a gente previa, essa EC é um desastre para todos os direitos sociais, e não é diferente para a educação. O que a gente percebe, de maneira drástica, é que orçamento que vinha sendo diminuído com os cortes nos últimos anos, teve mais um corte fortíssimo, de mais de R$ 4 bilhões. Sem verbas, há dificuldades de continuidade, e a continuidade no ensino, pesquisa e extensão é fundamental. Percebemos que agora, quase um ano depois, os efeitos da EC começam a aparecer, e ainda devem aparecer mais no ano que vem, após a aprovação do Orçamento de 2018, que já se mostra muito ruim para a oferta de direitos sociais”, diz o docente. Para Cláudio Ribeiro, a resposta dos servidores deve se dar com mobilização e

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unidade. O Fórum das Entidades Nacionais de Servidores Públicos Federais (Fonasefe), que organizou em 14 de setembro o Dia Nacional de Lutas e Paralisação, é citado pelo docente como um exemplo de organização entre diversas categorias de servidores públicos. “A luta do dia 14 ajuda a retomar nosso patamar de organização, para que ele cresça no futuro”, afirma. No dia 14 de setembro, servidores públicos federais, entre eles os docentes, realizaram mobilizações, atos, piquetes e paralisações por todo o país. A data contou, ainda, com a adesão dos trabalhadores metalúrgicos de todo o Brasil, em uma importante demonstração de unidade entre trabalhadores do setor público e privado. “A gente tem que, nesse momento, retomar o crescimento de lutas do primeiro semestre de 2017. Desde o ano passado o ANDES-SN tem insistido que as categorias não podem lutar sozinhas contra o ajuste fiscal. O ataque é geral e a resposta tem que ser geral. O ANDES-SN não para de organizar essa luta, em articulação com outros servidores. Os impactos da EC 95 começam a ser sentidos e, em breve, serão sentidos de forma mais direta os impactos da contrarreforma Trabalhista. Quando isso acontecer, todos os trabalhadores vão sentir muito, então devemos nos adiantar, não perdendo de vista a contrarreforma da Previdência. Não podemos vacilar, e temos que fazer a luta voltar a crescer”, conclui Cláudio Ribeiro.


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Entrevista

“A população trans não existe para a escola brasileira” A afirmação é da professora Adriana Sales, que palestrou no I Seminário Integrado do GTPCEGDS

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o final de agosto, de 24 a 26, Pelotas (RS) foi sede do I Seminário Integrado do Grupo de Trabalho de Políticas de Classe para questões Étnico-raciais, Gênero e Diversidade Sexual (GTPCGEDS). O evento foi composto por três seminários “III Seminário Nacional de Mulheres”, “II Seminário Nacional de Diversidade Sexual” e o “II Seminário de Reparação e Ações Afirmativas” e abordou questões de gênero, raça e diversidade sexual, a interseccionalidade desses temas e a relação dos mesmos com a universidade. A necessidade de reconhecer e ‘descamuflar’ as opressões, tanto na sociedade em geral quanto na universidade e no movimento sindical, para introduzir e enraizar esse debate no cotidiano dos docentes e fazer o combate às diferentes opressões, que recaem sobre a classe

trabalhadora foi intensamente discutida durante os três dias de debates. As provocações e reflexões propostas pelos debatedores, os relatos feitos pelos participantes e as apresentações culturais, que abriram cada palestra, contribuíram para aprofundar as discussões e permitir um olhar mais amplo sobre temáticas como feminismos trans e negro, o racismo, machismo e lgbtfobia no mundo sindical e acadêmico, as ações afirmativas transitórias e o impacto da política de cotas nas universidades. Palestrante do III Seminário Nacional de Mulheres do ANDES-SN, que teve como temática central “Feminismo Negro e Feminismo Trans”, Adriana Sales, professora da rede estadual do Mato Grosso e dirigente da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), trouxe aos participantes um relato da luta das

pessoas trans contra as diferentes formas de opressão e discriminação enfrentadas cotidianamente. Adriana destacou o fato que, enquanto o Brasil lidera o ranking mundial de acessos a sites eróticos com cenas de sexo protagonizadas por travestis e trans, é, também, uma das nações que mais mata pessoas transexuais e travestis: só no primeiro semestre deste ano, 118 já foram assassinadas, ela contou. Ela destacou também o fato de que as instituições de ensino ainda não estão preparadas para receber, incluir e formar essa parcela da sociedade. Para Adriana, a ocupação de espaços de conhecimento por travestis e transexuais é uma atitude política. “Não nos sentimos contempladas por uma academia que tenta falar pela gente. A escola e a universidade brasileira não dão conta da diversidade. Esses


Entrevista espaços ainda são para brancos, machos, burgueses, e não para a maioria da população brasileira”, avalia. Defendendo um feminismo que agregue ao invés de dividir, ela lança uma reflexão sobre a situação social reservada às travestis e trans. “Eu não represento 1% da minha população, pois sou branca, tenho uma família ‘estruturada’, estou na universidade. A maioria está repousando agora para ir às ruas de noite”, disse, referindo-se à prostituição como uma das únicas maneiras de sobrevivência para muitos travestis e transexuais. Em entrevista ao InformANDES, Adriana contou um pouco de sua trajetória e ressaltou que é necessário firmar a universidade pública como lugar de produção de um conhecimento calcado nas demandas sociais. “A universidade se quer reconhece a nossa existência trans. Temos de pensar para quem produzimos ciência e qual o projeto de sociedade queremos”, propõe.

Durante o debate, você abordou a sua realidade enquanto mulher trans na universidade. Você pode falar um pouco dessa experiência e de sua trajetória até à academia?

Adriana Sales: Minha trajetória se dá, e encontra um lugar de escape, um locus de sobrevivência, justamente na escola. É nesse espaço que eu descubro uma sexualidade, e que essa sexualidade não é padrão. E através do movimento estudantil que eu me aproprio dessas informações. Também acredito que, desde aquela época, a escola pública me atravessou em todos os sentidos. Por isso, me dedico a ela. Entrei num primeiro vestibular com 17 anos, e comecei a dar aula com 19 anos. Eu dava aula de línguas em escolas públicas da preferia. É nessa universidade que eu descubro a travestilidade, através do movimento estudantil, somado ao movimento LGBT no Mato Grosso. Então, tive sempre essa escola pública me encantando e me dando subsídio, em forma de conhecimento, para eu poder lutar pelas minhas questões. Claro que nada foi tranquilo. Sofri e ainda sofro muita transfobia. Mesmo agora, enquanto professora, 20 anos como professora efetiva e concursada na rede do estado, trabalhando numa secretaria de governo. Mas é nesse espaço que eu me encontro. No final da [graduação na] universidade, eu fui para a Europa, porque eu pleiteei e fui contemplada com uma pós-graduação. Fui para ficar três meses e acabei ficando um ano. Como foi difícil arranjar emprego na França - fiquei entre a região dos Pirineus e Paris - fui conhecer o que era prostitui-

ção. Sobrevivi da prostituição, mas realmente não era para mim. E, quando eu voltei da França, acabei residindo no Rio de Janeiro, quando eu realmente me encontro com militantes mais antigas travestis no Brasil e é nesse movimento que eu entendo que preciso usar dessa escola, do lugar que eu tenho talento, que é ser professora e não puta. Mas dar aula no Rio de Janeiro é um emprego muito difícil, ainda mais para travesti. Consegui algumas aulas em uma escola de línguas e acabei também tentando sobreviver da prostituição. Na sequência, passei em um concurso e é no estado do Mato Grosso que essa militância ficou muito mais forte, mesmo porque nós tínhamos poucas lideranças aqui naquela época. Aí vou para o mestrado e mais uma vez utilizo desse espaço da academia para discutir a pauta travesti e escola. Concluí o mestrado e agora estou no doutorado. Sou formada em Letras, com especialização em Antropologia, mestrado em Educação e doutorado em Psicologia, já em fase de conclusão, continuando na temática travesti e escola. Essa trajetória é muito forte, mas, mais do que isso, a questão da travestilidade e do meu ativismo eu tento sempre colocar num primeiro plano. Até porque, eu não represento a população travesti brasileira, mesmo hoje sendo colocada num hall de ativista, que tem representatividade, mesmo pelos lugares que eu ocupo hoje, estar nas duas maiores redes latino-americanas Antra - Associação Nacional de Travestis - e na ABGLT - Associação Brasileira de Gays Lésbicas Travestis e Transexuais. Na Antra, eu estou como secre-

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tária para relações internacionais, na ABGLT, eu estou como secretária de educação. Então, são espaços que me garantem muita representatividade. Porém, eu sempre procuro ter muito cuidado, muito tato para que eu utilize esses espaços da academia e da escola, para pautar as nossas questões, as nossas demandas que urgem.

Como você avalia a possibilidade e políticas de acesso e permanência para pessoas trans às escolas e universidades públicas no país? As universidades estão abertas e preparadas para receber pessoas trans?

AS: As universidades não estão preparadas para essa população, pelo contrário. O Brasil não tem nenhuma política específica que garanta a existência dessa população trans. Temos portarias, legislações municipais, estaduais, indicativos do Ministério da Educação que orientam, mas não obrigam as escolas a respeitar o nome social, por exemplo, ou o uso do banheiro. Quiçá discutir um currículo que garanta essas corporalidades, que discuta uma postura de uma escola que garanta essas singularidades travestis e transexuais, uma discussão na educação brasileira que traga o gênero feminino, discuta as mulheres e os homens trans. [A escola brasileira] não está preparada para a população brasileira, na verdade. A escola brasileira está preparada para pessoas brancas, burguesas, machistas, misóginas, e, com isso, a população trans, dentro dessa escala, fica num último plano mesmo. [A população trans] não existe para essa escola.


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Movimentos Sociais

Docentes conhecem a realidade dos indígenas no Mato Grosso do Sul

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Fotos: Arquivo ANDES-SN

realidade de opressão e exclusão vivida pelos povos indígenas no Brasil pode ser conhecida de forma mais próxima pelos participantes da segunda etapa do Curso Nacional de Formação Política e Sindical do ANDES-SN de 2017, que teve como tema “Indígenas, opressão pelo viés de classe na perspectiva revolucionária”. A etapa foi sediada pela Associação dos Docentes da Universidade Federal da Grande Dourados (AdufDourados – Seção Sindical do ANDES-SN). Como parte da programação do curso, os docentes realizaram saída de campo e visitaram comunidades indígenas Kaiowá, em Dourados (MS). Durante as visitas, tiveram a oportunidade de dialogar com lideranças indígenas sobre suas lutas e também perceber a intimidação do agronegócio, e seus pistoleiros, que cercam as áreas e ameaçam os indígenas. Vitor Wagner Neto de Oliveira, 1º vice-presidente da Regional Pantanal

do ANDES-SN, conta qu e na av alia ç ão dos participantes do curso o trabalho de campo foi de extrema importância para que os docentes pudessem ver in loco e quebrar os estereótipos construídos em relação à população indígena. “Quando se fala de indígena, é difícil compreender essa realidade sem essa visão in loco. O que vem à mente é que são populações que estão na floresta, no campo, fora da cidade. E, de repente, as pessoas se depararam com essa população vivendo praticamente na periferia de Dourados, que é uma cidade de 200 mil habitantes. E isso foi impactante. Ver a segregação dessas comunidades. Isso ficou muito presente nos relatos e nas conversar que tivemos”, relatou.

O muro da segregação A primeira parada do grupo foi na terra indígena retomada há cerca de 7 anos pelos Kaiowá, à beira do contorno rodoviário que circunda a parte oeste da cidade de Dourados (MS). Segundo o diretor do ANDES-SN, algo que impactou os docentes foi a visão do muro alto que separa a comunidade indígena da cidade. As dificuldades encontradas pelas trinta e seis famílias que habitam o espaço de dez hectares são diversas: a maior parte do território é formada por varjão, o que impossibilita o cultivo; falta assistência periódica por parte do Estado com relação à saúde, e ausência de saneamento e de moradia adequada são alguns dos problemas enfrentados pelos Kaiowá, que lutam pela permanência no território, reconhecidamente de ocupação tradicional guarani-kaiowá. Com a proximidade das terras indígenas em relação à área urbana de Dourados, devido à expansão da cidade, o que está ocorrendo é um ‘cercamento’ da cidade com muros de condomínios e de empresas privadas, bem como com rodovias, segregando os indígenas do

acesso à mesma, inclusive tornando ainda mais difícil que essa parcela da população recorra à assistência na saúde e outros serviços básicos essenciais. “O senhor Adelson, liderança dessa comunidade, relatou que o muro fora construído depois que os indígenas lutaram contra a aplicação de veneno pelos fazendeiros, que cultivavam soja e milho na área. O veneno infiltrava o solo ou escorria com a enxurrada, chegando ao riacho que serve de abastecimento de água para a comunidade. O monocultivo foi substituído por loteamento urbano e o muro construído para impedir a livre circulação dos indígenas”, disse Vitor. Adelson contou, ainda, aos docentes, que a rodovia que margeia o território indígena também é uma barreira que os isola, pois é um fator de grande risco: muitas crianças e adultos perderam a vida, vitimados por atropelamentos.

Na beira da estrada Na sequência, os professores participantes do curso foram conhecer um acampamento indígena à beira da estrada BR-463, composto pela família da senhora Florinda, liderança do grupo. O acampamento fora formado à beira da estrada, após os indígenas serem expulsos de uma área de retomada reivindicada pelos Kaiowá. Na ação violenta de despejo, as máquinas passaram sobre as casas e pertences de Florinda e seus familiares. A solidariedade de professores e estudantes da Universidade Federal de Grande Dourados (UFGD) ajudou na reconstrução das casas, à beira da estrada e na margem da área


Movimentos Sociais

reivindicada. “Os fazendeiros montaram guarita e colocaram capangas armados que vigiam cotidianamente os limites da área, na tentativa de intimidar os Kaiowá e as pessoas que se solidarizam com a luta. Quando a caravana do ANDES-SN esteve no acampamento, os capangas chegaram até a cerca para registrar em imagens os professores, numa clara atitude intimidatória”, relatou do 1º vice-presidente da Regional Pantanal do Sindicato Nacional.

Aldeamento No fim do roteiro, na manhã de 18 de agosto, a caravana chegou à Aldeia Jaguapirú, também na periferia de Dourados, onde vivem cerca de 16

mil pessoas, em 3 mil hectares. A aldeia foi estabelecida pelo governo brasileiro na década de 1920, com objetivo de concentrar os indígenas em um espaço delimitado e liberar terras para a expansão da colonização, bem como de formar um exército de reserva de mão de obra. Na década de 1940, com a criação da Colônia Agrícola Nacional de Dourados pelo governo de Getúlio Vargas, as terras indígenas foram distribuídas à colonos nordestinos e gaúchos, e os indígenas foram expulsos para outras áreas ou tiveram que se submeter ao aldeamento. Confinados em uma área insuficiente para viver e produzir alimentos de forma tradicional, os Kaiowá e Guarani dependem da assistência do Estado, inclusive para alimentação, e são impactados pelos problemas urbanos como o consumo de drogas licitas e ilícitas, além da ocupação do entorno e mesmo das terras da aldeia pelo monocultivo, que têm como consequência, entre outras, um alto índice de desnutrição, que levou à morte inúmeras crianças da aldeia, e foi amplamente de-

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nunciado no início dos anos 2000 pelo movimento indigenista. “A caravana do ANDES-SN fora recebida pelas lideranças, política e religiosa, dona Floiza (Ñandesy) e seu Jorge (Ñanderu), acompanhados de dois jovens indígenas que dançaram e entoaram cantos guarani-kaiowa empunhando o xiru marangatu - artefato de madeira cerejeira/xiru na língua guarani ornamentado com colares e chocalhos de cabaças”, explicou Vitor. Segundo o docente, Dona Floiza disse que não foi possível receber os docentes na Casa de Reza, porque a mesma havia caído e a comunidade estava trabalhando para reconstruí-la com sapé, a qual não se encontra mais nas terras da aldeia, o que torna necessário longas viagens para trazer a vegetação. Seu Jorge explicou, também, que a Casa de Reza desmoronou devido ao movimento da terra provocado pelas explosões de uma pedreira que fica cerca de 500 metros da aldeia.

Aprendizado De acordo com o diretor do Sindicato Nacional, a caravana dos participantes do curso de Formação Sindical teve a oportunidade singular de conversar e, principalmente, de ouvir os relatos das lideranças indígenas e ainda sentir o peso do agronegócio e a pressão do Capital na região. “Ouvimos relatos marcados pela violência material, física e psicológica, mas também pela memória dos ancestrais, pela luta para permanecer, retomar e ampliar o tekoha - território físico que inclui a terra e tudo que há sobre ela, e território mítico onde se realiza o modo de ser guarani”, completou Vitor.


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Internacional

O legado do direito soviético Cem anos depois da Revolução, russos deixam legado mundial no âmbito jurídico

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Arquivo da Internet

Revolução Russa que, em novembro (outubro no calendário juliano), completa cem anos, deixou um amplo legado para os trabalhadores do mundo. Entre eles, estão diversas mudanças no sistema jurídico da União Soviética que, além de pioneiras, muitas vezes forçaram países capitalistas a modificar suas leis e regulamentos pelo medo do crescimento da mobilização dos trabalhadores. Gustavo Seferian, docente de Direito da Universidade Federal de Lavras (UFLA), ressalta que, para o Direito, a Revolução Russa e as posteriores mudanças jurídicas da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) foram fundamentais como exemplo para a luta dos trabalhadores do resto do mundo, e para “assustar” governos de países capitalistas que, nos primeiros sinais de descontentamento social, preferiam garantir alguns direitos a possibilitar levantes revolucionários, que tivessem inspiração na experiência russa. “Com a Revolução Russa, muitas demandas passam a assumir efeito de universalização, haja visto que essas bandeiras passam a ser referência aos países burgueses, que, diante do primeiro despontar de efervescência social, passam a conferir direitos para inibir o crescimento da mobilização e a possibilidade de eclosão de um processo revolucionário”, afirma Gustavo, citando, por exemplo, demandas como a regulamentação da jornada de

Assembleia Soviética em Petrogrado, 1917.

trabalho, as férias remuneradas e regras que buscam garantir a segurança e saúde do trabalhador – hoje comuns no mundo, mas que, antes de 1917, eram restritas a poucas categorias em poucos países.

Exemplos de mudanças no direito soviético O docente da UFLA cita uma série de modificações no Direito soviético como exemplos da grande transformação pela qual passou o meio jurídico na URSS. No Direito do Trabalho, os bolcheviques tiveram como cerne a obrigatoriedade do trabalho, o que fez da URSS o primeiro lugar do mundo em que toda a população teve garantidas as condições para reprodução de sua vida. “Na sociedade soviética, a intenção do Direito do Trabalho seria promover a produção adequada de atenção dos anseios da população como um todo e, paulatinamente, reduzir a jornada de trabalho, ao contrário do que acontece nas sociedades capitalistas, onde o Direito do Trabalho tem como foco garantir a extração de mais-valia”, afirma. “No Direito Civil há uma série de revisões de referência que eram sacrossantas no Direito Ocidental, especialmente a questão da propriedade, que passa a ser revista e passa a ser relativizada a todo custo. Ainda que tenhamos a admissão, na URSS, da propriedade individual e particular, o Direito soviético atenta frontalmente contra a propriedade privada dos meios

de produção”, diz Seferian. No Direito Penal, a URSS deixa de ter como alvo prioritário os crimes contra a propriedade e passam a ser mais gravosos os crimes contra o regime e contra a Revolução. “Há uma alteração, também, nos tribunais soviéticos. Os antigos magistrados, juízes tradicionais, inclusive hereditários antes da revolução, são destituídos de seus cargos e os juízes passam a ser populares, como o operário, o pescador, o professor, etc. Uma coisa que não se altera fundamentalmente é a lógica punitivista do Estado penal. As prisões continuam existindo, o aparelho repressor do Estado passa por uma recomposição, mas a polícia continua tendo um grande poder, que se intensifica com a contrarrevolução burocrática de Stalin”, completa o docente. Gustavo conclui ressaltando que, para ele, o principal legado que a Revolução Russa deixa ao Direito é a demonstração de que nada, inclusive o Direito, é impossível de mudar. “O legado que a Revolução Russa deixa ao Direito é a compreensão de que aquilo que tomamos como natural, certo, eterno, não é assim. Tudo é possível de mudar, inclusive o Direito. O Direito, ainda que se afirme como inabalável e eterno, é passível de alterações, e não só alterações favoráveis à burguesia, mas também, alterações que são reflexo das ofensivas e resistências dos trabalhadores”, diz o docente da UFLA.


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