13ยบ CONGRESSO DO PCdoB
13 a 16 de novembro de 2013 - Sรฃo Paulo
13º Congresso do PCdoB
TRIBUNA DE DEBATES Suplemento de A Classe Operária
Comitê Central do PCdoB, 11 de setembro de 2013
Sumário
Textos em ordem alfabética pelo nome do autor
Tribuna da militância organizada e consciente.....................................................................................................................9 Governos Lula e Dilma. Dados e danos aos povos indígenas no Brasil.................................................................. 10 Sobre a crise estrutural do capitalismo....................................................................................................................................11 Sobre a centralidade da questão racial....................................................................................................................................13 A luta latino-americana contra o imperialismo.................................................................................................................. 15 Um olhar para o Estado Nacional (e não a partir dele)....................................................................................................16 Uma Escola para todos e todas...................................................................................................................................................17 Marx, Lênin, Gramsci e a imprensa............................................................................................................................................19 O PCdoB e a luta pelo direito à cidade................................................................................................................................... 22 Limites e desafios na transição ao socialismo.................................................................................................................... 23 Democratização e controle social dos meios de comunicação,imprescindível para o avanço da luta revolucionária..................................................................................................................................................................................... 25 Mundo em guerra - crises, antagonismos e indícios de preparação..............................................................................................27 Frente institucional, luta de massas e disputa de ideias: é necessário assegurar o equilíbrio..................... 29 Mulheres comunistas, mais ousadia, mais política............................................................................................................31 Um livro essencial para se compreender o momento atual é:” Esquerdismo, doença infantil do comunismo”.....................................................................................................................................................................................32 A atual tática: O dilema da estratégia do PCdoB............................................................................................................... 33 O setor produtivo privado tem papel no NPND?............................................................................................................... 35 Governos progressistas e movimentos sociais................................................................................................................... 37 Macroeconomia e estratégia, a batalha pelo longo prazo............................................................................................ 39 Reflexões e propostas para as Teses do 13°Congresso................................................................................................... 41 Administrar e abrir o Partido........................................................................................................................................................42 O legado da era Lula - Dilma no ensino superior e seus desafios................................................................................... 44 Ser governo.......................................................................................................................................................................................... 46 Equilibrar e reforçar o tripé que pende para um lado.................................................................................................... 48 A forma leninista perdeu a validade?.......................................................................................................................................50 O papel do PCdoB na atual conjuntura.................................................................................................................................. 52 O Partido e as Manifestações de Junho................................................................................................................................. 53 A luta ambiental anticapitalista e anti-imperialista.................................................................................................................. 54 O óbvio precisa ser dito................................................................................................................................................................. 56 A questão da terceira idade.......................................................................................................................................................... 57
Mais progresso social......................................................................................................................................................................58 Privatizar a educação é a solução?........................................................................................................................................... 59 Defender o caráter revolucionário do PCdoB......................................................................................................................60 Para as lutas atuais e as rupturas revolucionárias.............................................................................................................. 62 O Anti-imperialismo na América Latina................................................................................................................................. 64 A Petrobras como indutora do desenvolvimento nacional.......................................................................................... 65 A Petrobras e a segurança nacional......................................................................................................................................... 66 Diretrizes para o setor do petróleo........................................................................................................................................... 67 É o Partido, camaradas!.................................................................................................................................................................. 69 Como avançar nas mudanças?...................................................................................................................................................71 Resgatar o trabalho de massas................................................................................................................................................... 73 Por que uma Secretaria de Combate ao Racismo............................................................................................................. 75 Saúde Pública com Qualidade para todo o Povo Brasileiro...........................................................................................77 Meio ambiente, um debate ainda incipiente....................................................................................................................... 78 A centralidade do Centralismo Democrático, ou, dos riscos inerentes ao crescimento partidário em uma sociedade “liberal”..................................................................................................................................................................80 Partido de massas ou um partido formador das massas? Ainda sobre os riscos do momento presente....................................................................................................................................................................................... 81 A Visão de partido: Reflexo de suas ações e forma organizativa............................................................................... 83 O conhecimento-mercadoria na produção de mais-valia relativa e a valorização do capital - 1.............85 O conhecimento-mercadoria na produção de mais-valia relativa e a valorização do capital - 1............. 87 O desafio da construção do pensamento revolucionário............................................................................................. 89 Sobre o Leninismo Contemporâneo........................................................................................................................................ 91 Não podemos esconder o bosque atrás das árvores....................................................................................................... 93 PCdoB, militância, religiões e períodos eleitorais.............................................................................................................. 94 Organização pela base e partido revolucionário............................................................................................................... 96 Sem teoria revolucionária não há revolução....................................................................................................................... 98 A mídia e a construção discursiva da realidade: A luta de ideias não pode ser um trabalho de Sísifo.............................................................................................................................................................................100 Crise de representação e institucionalização da luta....................................................................................................102 O tema Partido no 13º Congresso..........................................................................................................................................103 Limpeza das instituições..............................................................................................................................................................104
Tribuna de debates
Tribuna da militância organizada e consciente José Reinaldo Carvalho, secretário nacional de comunicação
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Tribuna é um espaço democrático de debate e exposição da consciência da militância comunista. Até o momento, cerca de 40 artigos foram enviados para incrementar o debate do 13º Congresso. Para estimular ainda mais a discussão dos temas do Congresso, informamos à militância que o Caderno de Teses está disponível para leitura em nossa página ou aqui. Conclamamos os camaradas a participarem deste importante debate, escrevendo para tribuna@pcdob.org.br. Os membros do Partido são chamados a debater os documentos aprovados pelo Comitê Central com senso de responsabilidade, espírito de unidade partidária e vontade de contribuir para que a linha política e orgânica do Partido continue correspondendo à sua natureza de partido comunista, cuja missão histórica é lutar pelo socialismo, baseado no marxismo-leninismo, enriquecido pelo rico manancial de experiências da luta revolucionária dos povos e pela trajetória de lutas democráticas e patrióticas do povo brasileiro. Um Partido de quadros e de massas, internacionalista, uma organização de combate a serviço dos trabalhadores e do povo brasileiro, de defesa de seus interesses e aspirações mais profundas. No Congresso passado, realizado em outubro de 2009, os comunistas aprovaram o Programa Socialista, que consubstancia a estratégia e a tática dos comunistas brasileiros para a atual etapa da luta pelo socialismo no país. Este programa, que contém um novo projeto nacional de desenvolvimento e uma plataforma de luta por reformas estruturais democráticas, está em plena vigência, é atual e acaba de
ser confirmado pelo Comitê Central nas teses para o 13º Congresso. O Congresso dos comunistas enfrentará os problemas candentes e agudos da realidade nacional e internacional e, nesse marco, examinará e oferecerá soluções para os desafios e tarefas do Partido para o próximo período de quatro anos, incluídos os problemas relacionados com o seu fortalecimento político, ideológico e orgânico. A pauta do congresso abordará prioritariamente o balanço de uma década do ciclo de governos democráticos e progressistas no Brasil iniciado em 2003. E a partir dele, extrairá as lições do período, para orientar as lutas do povo brasileiro pela ampliação e aprofundamento da democracia, o fortalecimento da soberania nacional, o desenvolvimento, a integração regional e o progresso social. Também consta da ordem do dia a análise sobre a crise do capitalismo e o posicionamento sobre os acontecimentos internacionais e a luta dos trabalhadores e dos povos. Como desdobramento, o grande coletivo comunista vai elucidar os desafios e tarefas do PCdoB na sua ininterrupta construção como partido de identidade comunista e fortes vínculos com as massas populares. Um partido sempre vigente, que se reafirma e renova em meio aos combates e batalhas da vida política contemporânea, um partido em linha com época em que vive, voltado para a solução dos agudos problemas do presente, para construir no futuro um sistema político e econômico e social dirigido pelos trabalhadores. 9
Tribuna de debates
Governos Lula e Dilma. Dados e danos aos povos indígenas no Brasil
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ovas expansões das bandeiras do capital, somadas com as velhas aliadas, invadem as fronteiras e continuam a solapar o que restou dos povos indígenas e se decreta a sua extinção no Brasil? Os povos indígenas continuam ao longo e mais de cinco séculos na pauta dos preferidos ao extermínio. Eles foram (e são?!?!) donos imemoriais desse território e foram exterminados, tapeados, minimizados, desterrados, aldeados... E mais crueldades continuam seus cursos. Por Ademário Ribeiro*
Na atualidade as desgraças continuam a lhes abater. Diante desse contexto, muito se esperou dos governos de esquerda. Esses povos e suas lideranças simpatizaram e apostaram com essa possibilidade que tanto anelaram que chegaram a colocar seus cocares sobre a cabeça do Lula e da Dilma. Que dor de cabeça! Sofrem com eles o que nem sofreram com os presidentes militares e nem com o Fernando Henrique Cardoso (FHC). De acordo com o levantamento do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), durante os oito anos do governo Lula e nos dois anos da presidenta Dilma, “560 índios foram assassinados no Brasil, cuja média de 56 por ano também apresenta um crescimento de 168,3% em relação à média dos oito anos do governo de Fernando Henrique Cardoso”.
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Proposição para ser encaminhada à Conferência do PCdoB Nesse contexto em que se agravam às violações dos direitos indígenas e que as adversidades políticas e econômicas rasgam a Constituição Cidadã de 88, que reconhece a esses povos a sua organização social, costumes, línguas, crenças, tradições como direitos originários sobre as terras por eles tradicionalmente ocupadas, assim como a Convenção 169 da OIT - Organização Internacional do Trabalho, da qual o Brasil por ser signatário tem a obrigação de tomar “medidas necessárias para identificar terras tradicionalmente ocupadas pelos povos interessados e garantir a efetiva proteção de seus direitos de propriedade e posse”, o Estado Brasileiro parece estar concentrado apenas na mão única das expansões do capital desigual sem sensibilizar e criar ações efetivas em defesa dos povos indígenas, encaminho esse nosso ponto de vista à Conferência Estadual do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) na Bahia, a fim de que seja avaliado e incluído nas Teses do seu 13º Congresso, com vistas a salvaguarda dessas populações, por um meio ambiente equilibrado e pelo desenvolvimento sustentado. * Filiado ao PCdoB, Simões Filho (BA)
Tribuna de debates
Sobre a crise estrutural do capitalismo
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esde a sua formação, o Partido Comunista do Brasil jamais arrefeceu na luta contra seus inimigos (Estado Novo, TFP, CCC, ditadura militar/64), inimigos do povo e da Pátria. Por Aglaete Nunes Martins* Buscando sempre a construção de uma sociedade igualitária, fundada na divisão da riqueza, sem propriedade privada (latifúndios), divisão de classes, de gênero, racial, pugnando pela reforma agrária, segue sua trajetória histórica. “O marxismo, fundamentado no materialismo dialético, criado por Karl Marx e Engels, ao estudarem o desenvolvimento da natureza e da sociedade, se revelou o caminho que se apresenta como a fórmula propícia à concepção deste objetivo” (Politzer - 1). As inquietações humanas impulsionam as mudanças sociais e favorecem suas transformações. Quanto maior a sua quantidade, melhor será a qualidade resultante de suas transformações, operadas nas relações com o Estado. É o acirramento das contradições e o seccionamento das relações de produção com as forças produtivas (trabalhador), que acarretam o volume das ideias revolucionárias. O marxismo “é a ciência das leis do desenvolvimento da natureza e da sociedade”, segundo Stálin. Tendo por base a revolucionária filosofia marxista, é que o proletariado poderá enfrentar os novos desafios rumo ao socialismo. Na contemporaneidade a tecnologia é a ferramenta utilizada pelos inimigos, cujo objetivo é retardar o avanço da luta dos trabalhadores, incitando o consumismo, sobrepondo o individualismo à causa comum, deixando expostas as contradições do capitalismo. É a luta das forças contrárias (operariado x patronato). As nações que se formaram no combate ao feudalismo instituíram as relações capitalistas de produção, sujeitando as classes trabalhadoras ao jugo do patronato, pagando baixos salários para manter seus privilégios, trouxeram consigo os males que se
disseminaram na sociedade, propagando a desigualdade entre seus membros. Segregaram negros com a eugenia utilizando os higienistas (médicos e jesuítas), excluíram as mulheres do mundo dos homens, mediante a andocentria, alijaram idosos (detentores do saber). Instituíram a hierarquia de classes racial, de gênero, semeiam a discórdia entre lideranças e liderados, negam os partidos políticos organizados, suas conquistas históricas, incutem a divisão entre os povos e a exploração capitalista externa, esta é representada pela interna, na pessoa de seus governantes que se beneficiam do lucro auferido com a exploração da força de trabalho da mão de obra dos trabalhadores, aos quais pagam cada vez menos, exploração esta que é aumentada com a cobrança de impostos e taxas extorsivas. O racismo é implementado “no preconceito sutil ou na discriminação explícita, na tendenciosidade cultural, através de normas egocêntricas de comportamento e de beleza, mediante estereótipos e estigmas”, (2) sobrepondo a cor da pele ao conteúdo do caráter (Martin Luther King). O trabalhador negro é remunerado, porém em valor abaixo do salário pago ao não negro, que já percebe remuneração inferior ao preço da força que despende na produção de bens e serviços. “No capitalismo à diferença entre ricos e pobres veio somar-se a diferença entre homens livres e escravos.” (Engels- 3). Surge o sexismo, que nega cidadania plena à mulher, e a conciliação de sua função reprodutiva com o labor produtivo, segregando-a numa posição inferior, mistificando sua condição genérica, desqualificando sua contribuição social para baratear sua força de trabalho e inviabilizar seu empoderamento. Utiliza-se da mídia disseminando a pornografia, potencializando o erotismo, propagando a violência, desconstruindo sua personalidade e mitificando sua sexualidade. Contrapondo-se a esta prática, insurge-se o feminismo surgindo no século 19, para ser um movimento autônomo sem objetivos políticos, para 11
Tribuna de debates não tornar moeda de acordos para as perspectivas masculinas. Simone de Beauvoir preconizou, “o destino da mulher e do socialismo, estão intimamente ligados”. (4) O “Contrato Social” que constitui o Estado, se legitima na existência de leis, que impeçam a institucionalização da violência, como ordem a ser imposta para a concessão de direitos aos exploradores e obrigações aos explorados, não pode tolerar, sob sua égide, “grupamentos especiais que sujeitem à sua vontade os demais grupos sociais, sequer políticos voltados a governar em causa própria” (Politzer), nem a mídia manobrada como órgão de pressão ideológica, desvinculados do coletivo popular. A proposta anarquista visa seccionar a luta contra o Estado burguês, da luta de classes. “A força real do Estado, se solidifica no apoio, confiança e no crédito que tiver junto aos trabalhadores na democracia.” É a república democrática, segundo Engels, “a mais elevada das forma de Estado “(5). A sociedade capitalista já não nos oferece esta confiança. Apresenta um processo de entropia, e vai perdendo sua corporeidade. É neste contexto que surge o Partido, operando
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o movimento contrário a tais antagonismos, aprofundando as mudanças necessárias, sem afastar-se de seus princípios, para assumir o seu protagonismo histórico e atingir o estagio, onde possa travar “a definitiva batalha, rumo ao Estado socialista “. Aglaete Nunes Martins é militante do PCdoB Rio de Janeiro. * Militante do PCdoB, Rio de Janeiro
Bibliografia
• Georges Politzer, Guy Besse e Maurice Caveing. Princípios Fundamentais de Filosofia – Hemus Livraria Editora Ltda-SP. • Laurence Thomas. Igualdade Invertida uma Resposta ao Pensamento Kantiano - Michael P.Lavine e Thomas Pataki- Racismo em Mente-Ed.Madras-SP. • Simone de Beauvoir - O Segundo Sexo - Ed. Nova Fronteira-RJ. • Friedrich Engels - A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado - Ed. Civilização Brasileira
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Sobre a centralidade da questão racial
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ara as minorias nacionais: leis específicas que garantam o seu livre desenvolvimento” Stálin. A questão racial, ou como Stálin a debatia enquanto questão nacional e por Marx como uma questão colonial, não é uma luta de negros contra brancos na busca por melhores posições econômicas na sociabilidade do capital (Chasin,2000). Alexandre Braga* Muito menos é a questão racial um ajustamento de contas contra os senhores de engenho (Moura,1988). Isto é, não existe capitalismo sem racismo, como pregou Malcom X, pois na exploração do capital este se beneficia da discriminação racial para desvalorizar uma fração (Giddens,2001) da classe trabalhadora extremamente pujante para as pretensões burguesas, a mão de obra negra. Assim, a questão da etnia não está em contradição com a questão de classe, mas com aquela que dá um caráter inovador a esta, de forma a mobilizar uma massa muito importante para eliminar não só a exploração de raça, mas toda e qualquer exploração e na construção da emancipação geral da humanidade. Nisso, o Partido, neste 13º Congresso, tem certas tarefas de solidariedade antirracista, no que Chadaverian (2013, p.76) é categórico: “A questão negra, à qual dedicaremos atenção especial, ilustra bem esta problemática. Em um primeiro momento, as análises marxistas que emanavam de Moscou não davam conta da magnitude do problema, reduzindo a opressão racial a uma mera opressão de classe. Posteriormente, no fim dos anos 1920, como resultado de uma série de discussões, a questão do negro passa a ser analisada como uma questão nacional, o que levaria a uma reorientação teórica fundamental na crítica marxista do racismo”. Apesar disso, tivemos no plano internacional orientação racial, entre as quais: 1- A Iº Internacional envia comunicado pelo “direito à autodeterminação dos povos” e se preocupa com a “raça subordinada”, os negros, na Guerra Civil de 1861 nos EUA;
2- A partir de 1919, Lênin consolida a 3º Internacional Comunista onde denuncia a falsa promessa de igualdade racial, religiosa e sexual das democracias burguesas; 3- No 3º Congresso da 3º Internacional, em 1921, David Jones publica na Revista da IC um artigo que caracteriza pela primeira vez o racismo contra o negro como problema mundial; 4- No seu 4º Congresso, a IC publica as “Teses Sobre a Questão Negra”, em 1923; 5- Ainda em 1923, Moscou cobra do Partido posição para a realização de uma conferência internacional sobre a questão negra; 6- Iº Conferência Comunista Latino-Americana, em Buenos Aires, 1929, mas a delegação brasileira nega haver o problema do racismo; 7-Em 1930, a IC volta a criticar o Partido pela pouca atenção dada à questão racial; 8-Em 1931, Moscou envia ao PCB um questionário pedindo informações sobre a situação dos negros no Brasil; 9- Em 1934, o Partido tenta aproximação com a Frente Negra Brasileira; 10- Em sua Conferência Nacional de 1934, o Partido finalmente insere a questão racial; 11- Em 2005, o documento “Luta Antirracista é Parte Integrante do Projeto de Emancipação Nacional e Social”, é aprovado pela Comissão Política Nacional. Nesse evento é sugerida a criação do organismo auxiliar da Coordenação Nacional do PCdoB de Combate ao Racismo; 12- Em 2011, o Partido realiza o Encontro Nacional: “Desafios da Luta Contra o Racismo e as Desigualdades Sociais”, em dezembro. Apesar desses diversos esforços, agendas e ações nos movimentos e parlamentos, no entanto, esta resistência em aplicar as determinações teóricas e políticas de Moscou gerou, de um lado, uma crise que terminaria com a expulsão de diversos líderes dos partidos comunistas dos países em questão; de outro lado, provocou um atraso na avaliação teórica e na atuação política sobre a questão racial nesses países. (Chadaverian, 2013, p.89) 13
Tribuna de debates Ou seja, ao longo desses 93 anos de intensa atividade a questão racial ainda não foi tratada como uma questão da inteligência coletiva partidária, mas ficou relegada aos militantes que dela fizeram bandeira e razão de ser. Raça e classe sempre foram amálgamas do proletariado no Brasil, cuja miscigenação fundou um povo novo e um modo absolutamente peculiar de lutas contra a exploração promovida pelas elites e pela burguesia (Moura,1988). Assim, consideramos de fundamental importância entender essa estratificação, essa divisão no interior da classe operária e essa variedade de fatores econômicos que contribuem sobremaneira na formação da consciência de classe, cuja posição no mercado e cuja cor da pele fundamentam juntas um status e um estilo de vida todo diferenciado que constituem uma comunidade com fortes noções de identidade weberiana. Nisso propomos:
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1- Realização da 1ª Conferência Nacional do PCdoB Sobre Questão Racial 2- Fundação da Secretaria Nacional de Combate ao Racismo do PCdoB * Membro do PCdoB, Minas Gerais
Nota
1-Sobre essa linha histórica ver Chadaverian (2013) e documentos das 1º e 3º Internacional.
Referências Bibliográficas
• CHADAVERIAN, Pedro Caldas. Alcances e limites da interpretação comunista do racismo no Brasil (1922-1964).
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A luta latino-americana contra o imperialismo
retendo neste texto fazer algumas breves contribuições ao debate da nova luta pelo socialismo na América Latina feito na tese do Congresso do PCdoB. Alissom Lemos* Ressalto este aspecto do debate por entender que além da notável sobrevida que os países latino-americanos possuem neste período de crise econômica do sistema capitalista, as forças de esquerda também demonstram grande amadurecimento tanto do ponto de vista político e ideológico, como de seus lastros sociais, resistindo e avançando contra as forças reacionárias. Este amadurecimento certamente diz respeito às grandes lutas feitas contra as ditaduras apoiadas pelo imperialismo e nas lutas contra o neoliberalismo. Tal fato tem distinguido a luta política na América Latina de outras regiões, onde as opções à direita têm se imposto eleição após eleição. No entanto, apesar da tese reconhecer as singularidades de cada processo, a tese não as identifica, e ao fazê-lo, pretende reuní-las na chave da luta anti-imperialista através do desenvolvimento. Creio que as iniciativas como o banco comum, o fortalecimento das relações comerciais através do Mersocul são movimentações fundamentais, porém devemos entender o debate da integração da América Latina em nível ainda mais elevado. No nosso continente surge a oportunidade de construção de um novo padrão civilizatório e isso exige entender as diversas dimensões da luta (econômica, política, mas também cultural) e como elas se relacionam. Além de desenvolver as forças produtivas, derrotar as forças reacionárias no sentido de conduzir a uma direção da classe trabalhadora, precisamos propor também uma alternativa no campo dos valores à sociedade de consumo imposta pelas grandes potências capitalistas. Afinal a dominação imperialista funciona também em todos estes aspectos. Este entendimento é a razão do sucesso da vitória do Movimiento al Socialismo (MAS) e de Evo Morales na Bolívia. Em contraposição à esquerda tradicional da Bolívia, que sob a visão de uma aliança tática com os
setores burgueses nacionalistas defendiam a integração do índio à vida nacional (Garcia Linera), que na prática significava a transformação do indígena em camponês, abandonando-se seu modo de viver e tornando-se um cidadão boliviano, o MAS e sua base social passaram a defender a junção do discurso étnico com o discurso de classe. Assim, o indígena das comunidades tradicionais e os cocaleros passam a ser representados como os “indígena-originário-camponeses”. Ou seja, só o aprofundamento do programa revolucionário no aspecto do reconhecimento identitário do povo boliviano como indígena e camponês permitiu uma ampla coalizão popular, que se uniu contra o neoliberalismo. A pauta que era contra as mazelas trabalhistas e pela retomada dos recursos naturais das mãos do capital consolidou-se com a lei do “vivir bien”, que diz respeito às tradições culturais dos povos bolivianos e é contra a sociedade de consumo. Este debate se espalha principalmente nos países andinos. Longe de reivindicar uma cópia deste modelo ao Brasil, chamo a atenção para a necessidade de se reivindicar uma identidade latino-americana que nos aproxime destes povos e nos distancie dos valores da sociedade de consumo. A nossa visão de desenvolvimento deve ter essa perspectiva humana, na qual entender como nosso povo assimila os discursos políticos e a partir de então defender pautas que desenvolvam suas potencialidades assume caráter fundamental. Parece-me que iniciativas que mexam nos programas escolares, fazendo com que desde a mais tenra idade se conheça melhor a história do continente, contrastando o eurocêntrico ensino de História que vemos hoje, que construam uma universidade que não só forme mão de obra para o mercado de trabalho, mas que forme cidadãos críticos e que influencie na formação de uma identidade contra -hegemônica, assim como a divulgação da produção científica e artística do continente sejam fundamentais na luta anti-imperialista. Esta deve ser a lógica do desenvolvimento que devemos construir, evitando a cooptação cultural imposta pela burguesia. * Militante do PCdoB, Rio de Janeiro 15
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Um olhar para o Estado Nacional (e não a partir dele)
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ara fazermos um debate acerca da disputa pelo poder e conjecturar sobre o Estado brasileiro, é preciso antes detectar como se entende o Estado Nacional moderno e o discurso liberal que se faz através dele e de seus aparelhos ideológicos, para então propormos uma visão de classe sobre o tema. Por Allysson Lemos* A ideia de uma nação em escalada linear rumo ao progresso, em benefício de todos os seus compatriotas, iguais entre si, ganharia a forma do Estado Nacional moderno, na visão do historiador Benedict Anderson, no século 19. A nação, atemporal, é marcada por grandes acontecimentos e grandes heróis que tem sua importância para a consolidação de seu Estado Nacional, esse sim finito, datado. É o marxismo que aponta a contradição deste discurso, apontando que é a luta entre classes antagônicas que move a História, e não uma parceria coletiva pelo desenvolvimento duma comunidade de iguais. Assim, o tão proclamado e defendido Estado uno brasileiro não pode ser entendido como se a qualidade de unidade fosse oriunda de sua essência, mas sim possui condicionantes históricos como o genocídio de indígenas, a repressão à cultura afro-brasileira. Assim planejou-se um Estado que mantivesse uma unidade inspirada em tradições europeias, ainda que aspectos indígenas e africanos sobrevivam em nossa cultura dada à luta de resistência. Demarcada esta perspectiva de classe, podemos compreender que papel tem o PT neste processo de afirmação de um Estado Nacional brasileiro. É notório que os governos petistas têm um caráter popular e que têm a marca do combate às desigualdades sociais através das políticas de elevação de renda e do investimento em programas sociais, (ainda que a estes deva ser feita à crítica dos malefícios da terceirização de seus serviços). É espantoso que milhares de famílias não tivessem acesso à energia elétrica em pleno século 21, por exemplo, e 16
o PT tem cumprido o papel de garantir o acesso às necessidades básicas de nosso povo, ainda que com debilidades nas áreas da saúde e da educação. Por outro lado, a visão de inserção cidadã do governo ainda se limita à aquisição de padrão de consumo. O governo petista não cumpre o papel de subverter a visão de que o acesso à felicidade se dá pelo consumo pleno. Em última instância, o que está colocado é o que Marx descreve como a lei geral da acumulação capitalista, que é garantida pela extração cada vez maior do valor excedente do trabalho e o incentivo cada vez maior ao consumo da classe trabalhadora. O fim é o seu endividamento e a crise do sistema capitalista. A ideologia do consumo, portanto, não é posta em xeque. É papel nosso questioná-la. No lugar do cidadão-consumidor, que com poder de compra vê-se como autossuficiente independente do outro, quase um Robinson Crusoé do mundo contemporâneo, precisamos reforçar a consciência coletiva, a necessidade de participação política, a identidade de classe trabalhadora. Quando fazemos o bom exercício de buscar entender a realidade brasileira, precisamos também colocar na balança os elementos de nossa cultura que apontam para uma consciência revolucionária. As recentes manifestações populares mostram a urgência da necessidade de organizar o povo, de construir pautas avançadas junto aos movimentos sociais. Avancemos em termos de democracia, para além do que rege a democracia liberal! Deve estar ainda em nosso horizonte produzir conhecimento e memória autônomos. A mídia vem construindo uma memória do momento histórico brasileiro (e futuramente as instituições educacionais reproduzirão este discurso) que é antagônico à luta do povo e suas expectativas, já que nos vemos dando passos em termos de soberania. É preciso desenvolver estratégias eficazes na disputa dessa hegemonia, e é preciso que isto esteja no centro de nosso debate partidário! Entendo o movimento que faz o Partido ao buscar ampliar seu espaço no parlamento, no poder político, no entanto, isto não pode significar o rebai-
Tribuna de debates xamento de nossa pauta política. É preciso pensar o partido de forma global, para a disputa do Estado, mas também dos movimentos, e, nesse sentido, precisamos dar passos largos ainda em termos de alcançar uma unidade política partidária. * Militante do PCdoB, Rio de Janeiro
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Bibliografia
• ANDERSON, Benedict. Comunidades Imaginadas. Companhia das Letras, 2008. • MARX, Karl. A Lei Geral da Acumulação Capitalista” In: “O Capital. Civilização Brasileira, RIBEIRO, Darcy. O Povo Brasileiro. Companhia das Letras, 1995.
Uma Escola para todos e todas
documento apresentado pelo Comitê Central para o debate do 13° Congresso é rico, equilibrado e aponta os caminhos percorridos no Brasil pelas forças democráticas e progressistas e pelo PCdoB em particular, na trajetória de lutas iniciada em 2002 com a vitória de Lula à Presidência da República. Por Altair Freitas* Aponta com muita propriedade os limites desse processo e identifica e propõe caminhos a serem trilhados para que tenhamos no Brasil um processo de intensificação das mudanças que possibilitem ao povo brasileiro, em especial à grande massa trabalhadora, alcançar patamares superiores de desenvolvimento econômico e padrão de vida, ao mesmo tempo em que impõe derrotas ao capitalismo neoliberal e nos aproxima da transição para a construção do socialismo. No balanço dessa década o documento busca ainda identificar os principais problemas enfrentados cotidianamente no trabalho de crescimento, estruturação e influência do PCdoB junto ao povo. Nós últimos anos uma consigna importante passou a fazer parte do pensamento sobre a estruturação do nosso Partido: “Construir um Partido à altura dos desafios atuais!” Como sabemos, os desafios são gigantescos, complexos, difíceis de serem articulados de modo harmonioso e rápido para que tenhamos sucesso em larga escala nas diversas frentes de luta nas quais atuamos. Mas são desafios de caráter histórico, transformadores e cada um deles e o seu conjunto devem ser tratados pela militância comunista como o seu desafio. Como o nosso desafio!
Vários são os aspectos envolvidos no processo de estruturação partidária e um deles é o trabalho de formação. Nos últimos anos vivencio diretamente o processo de formação da militância a partir da atuação na Secretaria Executiva da Escola Nacional. Nesse período, junto aos demais camaradas responsáveis pelo trabalho específico de Formação e Propaganda um complexo que envolve a própria Escola, a Fundação Maurício Grabois e a realização de um amplo leque de cursos e atividades variadas e importantes para o trabalho formador vários aspectos saltam aos olhos, tanto no que diz respeito aos avanços que foram muitos nessa década bem como em relação aos limites, gargalos e insuficiências a serem analisados, compreendidos e superados. O processo de formação precisa ser entendido na sua íntegra. Formar de modo consistente e avançado militantes e quadros de um partido revolucionário implica conjugar um amplo conjunto de elementos que passam pela atividade organizada e periódica nas bases e comitês partidários, pela presença nas lutas diversas dos movimentos sociais, lutas de ideias e nas disputas institucionais. Mas implica também no estudo sistemático da teoria e ideologia revolucionárias. Implica conhecer as bases e fundamentos principais do marxismo-leninismo e buscar interpretar a realidade brasileira, a dinâmica do capitalismo do nosso tempo e da luta travada pela edificação socialista à luz desses referenciais teóricos primordiais do movimento comunista. Se o Partido é em si uma grande escola, é preciso compreender que ele precisa de uma Escola que possibilite à militância ter de modo abrangente o acesso sistematizado e sistêmico aos principais elementos do seu pensamento teórico e análises sobre 17
Tribuna de debates os processos revolucionários passados e os em curso. Sem uma Escola que possibilite a cada camarada estudar individual e coletivamente, vários aspectos do processo de estruturação ficam pela metade. E fora das fronteiras partidárias a sociedade capitalista não forma quadros marxistas-leninistas! Esse é um elemento central a ser compreendido por todo o coletivo partidário. A tarefa de formar política, teórica, política e ideologicamente é nossa! Não basta apenas querer fazer a revolução. Querer é fundamental, mas é preciso também que a militância comunista tenha ciência e consciência dos múltiplos aspectos que envolvem a luta transformadora. A frase de Lênin é muito conhecida e não custa relembrá-la, inclusive por ser absolutamente atual: ”sem teoria revolucionária, nada se constrói”! Termos uma Escola. E ela e o seu trabalho precisam ser encarados como uma das tarefas prioritárias do próprio Partido. Nossa Escola é valorosa, valiosa e muito tem produzido e contribuído para o desenvolvimento do pensamento tático e estratégico do PCdoB. Constituiu um currículo rico e seus cursos são muito elogiados pelas diversas forças de esquerda do Brasil e da América Latina. Produziu cursos voltados para a militância – a que atua regularmente nas bases e para os (as) novos (as) filiados (as) e para quadros dirigentes com larga experiência. Nos últimos quatro anos, cerca de vinte mil comunistas participaram das atividades da Escola Nacional em âmbito nacional. É muito, quando comparamos com os anos anteriores, quando a Escola ainda dava seus primeiros passos nessa nova fase iniciada no século 21. Mas quando olhamos o volume de camaradas organizados em algum grau nas estruturas
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partidárias e frentes de atuação, é pouco! Onde estão os gargalos? Sem dúvida estão muito relacionados com as próprias fragilidades estruturais do Partido, que tem variados graus de inserção social e política e organicidade, conforme cada Comitê Estadual. Mas sem dúvida também, podemos dizer que há ainda uma grande subestimação em várias direções estaduais e municipais sobre a importância do trabalho de formação política, teórica e ideológica. Do CPS Curso do Programa Socialista aos Estudos Avançados, os(as) comunistas têm um grande acervo de material à sua disposição. São cursos que podem ser realizados de modo coletivo ou individualmente através da internet utilizando o Ensino à Distância. Nos dias presentes, não há mais entraves de tempo e espaço para que cada camarada possa participar dos cursos do Partido. Mas como mostra a experiência, a formação em larga escala não se faz de modo espontâneo. Ela se dá principalmente a partir de uma firme ação articulada pelos comitês estaduais e municipais, organizando turmas, controlando o fluxo e a evolução pedagógica de cada camarada ao longo da estrutura geral de cursos da Escola. Sem essa ação articulada dos comitês, a partir das respectivas Secretarias de Formação, a formação militante enfrenta dificuldades para avançar. Nos tempos atuais, militantes e dirigentes que desconhecem o Programa Socialista e os elementos básicos do nosso pensamento pouco contribuem efetivamente para o avanço da luta socialista. Repetindo Lênin, é preciso estudar e estudar! * Militante do PCdoB, São Paulo e secretário executivo da Escola Nacional do PCdoB
Tribuna de debates
Marx, Lênin, Gramsci e a imprensa
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iante do poder alcançado pela mídia hegemônica e das ilusões ainda existentes sobre seu papel, revisitar as ideias de intelectuais marxistas sobre o tema é da maior importância e causam surpresa por sua enorme atualidade. Por Altamiro Borges* Marx, Lênin e Gramsci, entre outros pensadores revolucionários, sempre destacaram o papel dos meios de comunicação. Exatamente por entenderem a importância da luta de ideias, do fator subjetivo na transformação da sociedade, fizeram questão de desmascarar o que chamavam, sem meias palavras, de “imprensa burguesa” e de realçar a necessidade da construção de veículos alternativos dos trabalhadores. Estes dois elementos, a denúncia do caráter de classe da imprensa capitalista e a defesa dos instrumentos próprios dos explorados, são as marcas principais destes intelectuais marxistas. Marx, Lênin e Gramsci dedicaram enorme energia ao trabalho jornalístico, escrevendo centenas de artigos e ajudando a construir vários jornais democráticos e proletários. Foram jornalistas de mão cheia, produzindo textos que entraram para a História. Sempre estiveram sintonizados com o seu tempo, pulsando a evolução da luta de classes; nunca se descuidaram da forma, da linguagem, para melhor difundir os seus conteúdos revolucionários.
Defesa da liberdade de expressão Vítimas da violenta perseguição das classes dominantes, os revolucionários nunca toleraram a censura dos opressores e foram os maiores defensores da verdadeira liberdade de expressão. A própria ampliação da democracia foi decorrência das lutas dos trabalhadores, já que nunca interessou à reacionária burguesia. Mas os revolucionários nunca confundiram esta exigência democrática com a proclamada “liberdade de imprensa”, tão alardeada pela burguesia que controla os meios de produção
e usa todos os recursos, legais e ilegais, ardilosos e cruéis, para castrar a própria democracia e o avanço das lutas emancipadoras. Numa fase ainda embrionária do movimento operário-socialista, Karl Marx logo se envolveu na atividade jornalística. Após concluir seu doutorado em filosofia, em 1841, ele pretendia seguir a carreira acadêmica e ingressar na Universidade de Bonn, mas a brutal repressão do governo prussiano inviabilizou tal projeto e o jovem filósofo alemão manteve seu sustento através do jornalismo. Em 1842, ingressou na equipe do jornal Gazeta Renana e virou o seu redator-chefe. Sob sua direção, este periódico democrático triplicou o número de assinantes e ganhou prestígio, mas durou poucos meses e foi fechado pela ditadura prussiana.
Sem ilusões na imprensa burguesa Na seqüência, entre 1848/49, passou a escrever no jornal Nova Gazeta Renana, que se transformou numa trincheira de resistência ao regime autoritário. Em menos de dois anos, Marx escreveu mais de 500 textos e tornou-se um articulista de sucesso. O combate ao código de censura do governo prussiano resultou na proibição do jornal. Marx ainda escreveu para o Die Press e o New York Tribune sobre política, economia e história. “Era um jornalismo que revelava a minuciosa leitura de Marx, seu alto grau de informação não apenas sobre os fatos e conflitos, como também sobre os atores individuais e a própria imprensa”, relata José Onofre, na apresentação do livro recém-lançado “Karl Marx e a liberdade de imprensa”. Em sua defesa da liberdade de expressão, ele nunca vacilou na denúncia da ditadura burguesa. Para ele, o jornal deveria ser uma arma de combate à opressão e à exploração e não um veículo neutro. “A função da imprensa é ser o cão de guarda, o denunciador incansável dos opressores, o olho onipresente e a boca onipresente do espírito do povo que guarda com ciúme sua liberdade”. Em outro texto, afirma: “O dever da imprensa é tomar a palavra em 19
Tribuna de debates favor dos oprimidos à sua volta. O primeiro dever da imprensa é minar todas as bases do sistema político existente”. Por estas ideias libertárias, ele foi processado e perseguido.
Poder do capital sobre a imprensa Outro que nunca se iludiu foi Vladimir Lênin. Atuando num período da ascensão revolucionária, ele foi ainda mais duro no combate aos jornais burgueses. Num texto intitulado “a liberdade de imprensa do capitalismo”, ele desnuda esta falácia. “A ‘liberdade de imprensa’ é também uma das principais palavras de ordem da ‘democracia pura’. Os operários sabem e os socialistas de todos os países reconheceram-no milhares de vezes que esta liberdade é um engano enquanto as melhores impressoras e os estoques de papel forem açambarcados pelos capitalistas, e enquanto subsistir o poder do capital sobre a imprensa”. “Com vista a conquistar a igualdade efetiva e a verdadeira democracia para os trabalhadores, é preciso começar por privar o capital da possibilidade de alugar escritores, de comprar editoriais e de subornar jornais, mas para isso é necessário destruir o jugo do capital... Os capitalistas chamam sempre ‘liberdade’ à liberdade para os ricos de manterem seus lucros e liberdade para os operários de morrerem à fome. Os capitalistas denominam de liberdade de imprensa a liberdade de suborno da imprensa pelos ricos, a liberdade de usar a riqueza para forjar e falsear a chamada opinião pública”. Nada mais atual! Numa outra fase histórica, em que o setor da comunicação ainda não era um poderoso ramo da economia, Lênin chegou a se contrapor à participação dos comunistas na imprensa burguesa. “Poder-se-á admitir que colaborem nos jornais burgueses? Não. A semelhante colaboração se opõe tanto as razões teóricas como a linha política e a prática da social-democracia... Dir-nos -ão que não há regra sem exceção. O que é indiscutível. Não se pode condenar o camarada que, vivendo no exílio, escreve num jornal qualquer. É por vezes difícil criticar um social-democrata que, para ganhar a vida, colabora numa seção secundária de um jornal burguês”. Mas, para ele, tais casos deveriam ser encarados como exceção e com princípios. 20
“Boicote, boicote, boicote” Para encerrar este bloco, que evidencia que os marxistas nunca nutriram ilusões sobre o caráter de classe da imprensa burguesa e nem se embasbacaram com o seu poder de sedução, vale reproduzir uma longa citação de Antonio Gramsci, o revolucionário italiano de padeceu onze anos nos cárceres. No texto “Os jornais e os operários”, escrito em 1916, ele faz uma conclamação aos trabalhadores que bem poderia servir para uma campanha contra a revista Veja e outros veículos da mídia brasileira na atualidade: Para ele, a assinatura de jornal burguês “é uma escolha cheia de insídias e de perigos que deveria ser feita com consciência, com critério e depois de amadurecida reflexão. Antes de mais, o operário deve negar decididamente qualquer solidariedade com o jornal burguês. Deveria recordar-se sempre, sempre, sempre, que o jornal burguês (qualquer que seja sua cor) é um instrumento de luta movido por ideias e interesses que estão em contraste com os seus. Tudo o que se publica é constantemente influenciado por uma ideia: servir à classe dominante, o que se traduz sem dúvida num fato: combater a classe trabalhadora. E, de fato, da primeira à última linha, o jornal burguês sente e revela esta preocupação”. “Todos os dias, pois, sucede a este mesmo operário a possibilidade de poder constatar pessoalmente que os jornais burgueses apresentam os fatos, mesmo os mais simples, de modo a favorecer a classe burguesa e a política burguesa em prejuízo da política e da classe operária. Rebenta uma greve! Para o jornal burguês os operários nunca têm razão. Há uma manifestação! Os manifestantes, apenas porque são operários, são sempre tumultuosos e malfeitores. E não falemos daqueles casos em que o jornal burguês ou cala, ou deturpa, ou falsifica para enganar, iludir e manter na ignorância o público trabalhador. Apesar disso, a aquiescência culposa do operário em relação ao jornal burguês é sem limites.” “É preciso reagir contra ela e despertar o operário para a exata avaliação da realidade. É preciso dizer e repetir que a moeda atirada distraidamente é um projétil oferecido ao jornal burguês que o lançará depois, no momento oportuno, contra a massa operária. Se os operários se persuadirem desta elementar verdade, aprenderiam a boicotar a imprensa burguesa, em bloco e com a mesma disciplina com
Tribuna de debates que a burguesia boicota os jornais operários, isto é, a imprensa socialista. Não contribuam com dinheiro para a imprensa burguesa que vos é adversária: eis qual deve ser o nosso grito de guerra neste momento, caracterizado pela campanha de assinatura de todos os jornais burgueses: Boicotem, boicotem, boicotem!.”
Construtores da imprensa revolucionária Exatamente por não nutrirem ilusões na imprensa burguesa, Marx, Lênin e Gramsci sempre investiram na construção de instrumentos próprios das forças contrárias à lógica do capital. Segundo o biógrafo David Riazanov, “a Nova Gazeta Renana tratava de todas as questões importantes, de sorte que o jornal pode ser considerado um modelo de periódico revolucionário. Nenhum outro periódico russo nem europeu chegou à altura da Nova Gazeta... Seus artigos não perderam nada de sua atualidade, de seu ardor revolucionário, de sua agudeza na análise dos acontecimentos. Ao lê-los, sobretudo os de Marx, acreditamos assistir à história da revolução alemã e da revolução francesa, tão vivo é o estilo, como profundo é o sentido”. Já Lênin, que viveu numa fase de efervescência revolucionária, dedicou boa parte das suas energias para a construção de jornais socialistas dos mais diferentes tipos, sempre sintonizados com a evolução da luta de classes. Iskra, Vperiod, Pravda, Proletari, Rabotchaia Pravda, Nievskaia Svesdá, entre outros jornais organizados e dirigidos por ele, servirão para agregar as forças de esquerda, fazer agitação nas fábricas, aprofundar os debates ideológicos e construir o partido. Na sua mais célebre definição, Lênin sintetizou: “O jornal não é apenas um propagandista coletivo e um agitador coletivo. Ele é, também, um organizador coletivo. Neste último sentido, ele pode ser comparado com os andaimes que são levantados ao redor de um edifício em construção, que assinalam
os contornos, facilitam as relações entre os diferentes pedreiros, ajudam-lhes a distribuírem tarefas e a observar os resultados gerais alcançados pelo trabalho organizado”. A reacionária burguesia russa logo entendeu o perigo representado por estes jornais, tanto que os reprimiu ferozmente. No caso do Pravda, de um total de 270 edições, 110 foram objeto de ações judiciais e os seus redatores foram condenados a um total de 472 anos de prisão. Mas isto não abrandou o seu vigor!
Atualidade das noções marxistas No caso de Gramsci, o longo período de cárcere dificultou a sua atividade jornalística e castrou seu desejo de organizar a imprensa operária. Antes da prisão, ele editou vários jornais de fábrica e empenhou-se na difusão do Ordine Nuovo. Na sua rica elaboração sobre o papel dos intelectuais e a luta pela hegemonia, ele chega a afirmar que, em momentos de crise, o jornal pode funcionar como partido político, ajudando a desnudar a ideologia dominante e a construir a ação contra-hegemônica do proletariado. Para ele, o momento da desconstrução do velho é, ao mesmo tempo, o da construção do novo. As contribuições de Gramsci servem para desmistificar o papel da mídia hoje, mantendo impressionante atualidade. Para ele, a imprensa burguesa é um “aparelho privado de hegemonia”, capaz de disputar os rumos da sociedade por meio de uma verdadeira guerra de posições em todas as “trincheiras ideológicas”. Através da imprensa privada e mercantil, que objetiva o lucro e que faz da notícia uma mera mercadoria, a burguesia tenta se aparentar como representante da esfera pública. Além disso, em momentos de crise da ideologia dominante e de fratura dos partidos burgueses, a imprensa se apresenta como “o partido do capital”, que organiza e amalgama os interesses das várias frações de classe da burguesia. * Secretário nacional de mídia do PCdoB
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Tribuna de debates
O PCdoB e a luta pelo direito à cidade
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s manifestações que ocorreram em junho, com grande intensidade e com uma enorme participação popular, deixaram todos perplexos: de onde vieram e por que vieram se os grandes problemas que sempre atormentaram os brasileiros (desemprego, inflação, violência urbana e no campo) estão com soluções bem encaminhadas e reina a estabilidade política? Por Ângela Almeida* Como diz Marilena Chauí, “as perguntas são justas, mas a perplexidade, não”. Basta que voltemos nosso olhar para o verdadeiro insuportável da urbanidade brasileira atual. Apesar dos grandes avanços dos últimos dez anos, as condições de vida de milhões de brasileiros continuam difíceis nas cidades, incluindo aí os milhões que viveram recentemente uma ascensão econômica e social. A democratização do acesso à educação não foi acompanhada em todo o país por uma melhoria equivalente da qualidade. Nos serviços de saúde, áreas de excelência convivem com setores extremamente deficientes. E a urbanização acelerada do país, que conta aproximadamente com 200 milhões de habitantes, colocou em evidência a situação precária do transporte, onde os trabalhadores perdem horas de sua jornada para saírem de suas casas. A referência a esses três temas, evocados nos cartazes dos manifestantes, é pertinente. Ela diz respeito a problemas que fazem parte do cotidiano de milhões de brasileiros. E um dos aspectos positivos dessas manifestações foi justamente demonstrar que aquilo que defendemos no programa do PCdoB, em relação à reforma urbana, que inclui a mobilidade, estopim das manifestações, é uma demanda do povo. Esse problema nos diz respeito hoje, de forma grave, figurado, por exemplo, em um movimento que, a princípio, pedia menos R$ 0,20 na tarifa do transporte urbano. No fundo, o que se deseja é reivindicar o direito à cidade, que, como explica David Harvey, “não é simplesmente o direito ao que já existe na cidade, mas é o direito de transformar a cidade em algo radicalmente diferente”. Quando olhamos para a His22
tória, constatamos que as cidades foram regidas pelo capital, mais do que pelas pessoas. A cidade foi estruturada de modo a facilitar a articulação entre os sistemas de produção, consumo e circulação, permitindo a maior fluidez do capital. Nesse sentido, a cidade tornou-se palco dos meios de produção, dos serviços, das informações, das mercadorias e da força de trabalho. O espaço urbano, nessa lógica, é entendido como capital fixo, visto que é planejado para permitir o processo de produção. Essa é a cidade do capital, ou seja, a cidade que produz e se organiza de acordo com a lógica das relações econômicas capitalistas. Mas como fica o cidadão nesse espaço? A cidade do capital deveria ser também a cidade do cidadão, que tem direito à habitação, à saúde, ao transporte, à educação, ao trabalho, à cultura, enfim, a todos os serviços de consumo coletivo, que possam lhe garantir uma vida digna. Henry Lefebvre reforça a importância do direito à cidade quando o coloca como uma exigência, como um “direito à vida urbana, transformada, renovada”. Na cidade capitalista, o direito à cidade é objeto de luta e reivindicações, pois não é exercido plenamente. A cidade reproduz um espaço urbano repleto de desigualdades e injustiças sociais, no qual o acesso aos bens de consumo é diferenciado de acordo com a classe social a que pertence cada cidadão. Nesse sentido, a afirmação de Iná Costa de que “o crime de lesa humanidade do capitalismo não é ter criado uma sociedade materialista em que se desejam bens de consumo, mas tê-la organizado de modo a impedir que a maioria tenha acesso aos bens que produz”. Parece-nos claro, portanto, que o direito à cidade deve ser o norte fundamental a ser construído nas manifestações. Como diz Alexandre Pilati, “não importa mais muito de onde elas partiram, ou que problemas apresentaram até aqui”. É tarefa dos comunistas e de todas as forças políticas e sociais avançadas aproveitarem o espaço de ressignificação da cidade provocado por elas. Embora haja interesses contraditórios em jogo e exista um grande perigo das manifestações serem apropriadas por forças conservadoras da sociedade brasileira, até aqui elas
Tribuna de debates têm o grande mérito de colocar os donos da cidade frente a frente com aqueles que dela se apossaram e a tornaram um inferno de tráfego e frustrações. Os protestos são sintomas do desejo do direito que os cidadãos têm de viverem a cidade e não serem consumidos por ela, enquanto grandes somas de dinheiro são acumuladas por aqueles que, por exemplo, mantém relações espúrias com o poder público em nome do capital. Esse é um direito mais que legítimo e é bom que ele possa se tornar efetivo. * Militante do PCdoB, Caxias do Sul, RS
Bibliografia:
• CHAUÍ, Marilena. As manifestações de junho de 2013 na cidade de São Paulo. Disponível no sítio:
<http://www.cafecomsociologia.com/2013/07/as -manifestacoes-de-junho-de-2013-na.html>. Acesso em jul. 2013. • COSTA, Iná Camargo. Por uma crítica dialética. In: COSTA, Iná Camargo. Nem uma lágrima – teatro épico em perspectiva dialética. São Paulo: Expressão Popular/Nankin Editorial, 2012. • HARVEY, David. Alternativas ao neoliberalismo e o direito à cidade. Disponível no sítio: < http:// www.periodicos.ufpa.br/index.php/ncn/article/ view/327/513>. Acesso em jul. 2013. • LEFEBVRE, Henry. O direito à cidade. São Paulo: Moraes, 1991. • PILATI, Alexandre. A hora do direito à cidade. Disponível em: < http://www.revistaprincipios.com.br/ principios/digital/encarte125/>. Acesso em ago. 2013.
Limites e desafios na transição ao socialismo Parte 1
As experiências que persistem no caminho da transição ao socialismo, cada país com suas peculiaridades, e, diga-se de passagem, todos enfrentando com audácia a 3° grande crise do capitalismo, são frutos das lutas revolucionárias desses povos e nelas, estava no centro da contenda à questão anti-imperialista e a luta permanente por soberania nacional. China, Vietnã, Cuba, República Democrática da Coreia e Laos. Por Antonio Barreto* Em todos os casos, o caminho foi a luta revolucionária com o povo em armas contra as elites locais e o inimigo externo. Após a débâcle, no inicio dos anos 90 do século passado, da histórica Revolução de outubro de 1917 na velha Rússia, pensada, organizada e conduzida por Lênin, experiência que se expandiu por todo o Leste Europeu com a vitória da URSS sob o comando do revolucionário Josef Stálin sobre as forças do
nazismo hitlerista, desponta uma única superpotência militar, política, econômica e cultural, a ditar as regras para o resto do mundo, os Estados Unidos. Chegamos à época do neoliberalismo. Apesar da crise sistêmica e estrutural do capital que atinge o centro do poder imperialista em decadência e seus aliados na Europa, o imperialismo ainda mantém poder suficiente para deixar em situação de defensiva estratégica os comunistas e todas as forças progressistas, em todo o mundo, situação que já dá sinais de mudança, a exemplo do vigoroso desenvolvimento econômico e social dos Brics e da maioria dos países em transição ao socialismo e da firme posição da Rússia e da China nas escaramuças contra a Síria e a acolhida da Rússia a Snowden, que denunciou o grampo do governo estadunidense contra todos os povos. Poucas organizações revolucionárias que sobreviveram à hecatombe, entre elas o Partido Comunista do Brasil, após profunda análise marxista na busca incessante das razões e fatores que contribuíram para a derrota, identificaram como uma das causas 23
Tribuna de debates daquele penoso processo, a crise da teoria marxista. A derrocada daquela experiência resultou em uma prolongada temporada de confusão ideológica, mas ao mesmo tempo, no descortinar de um novo tempo de atualização da teoria revolucionária do proletariado, o marxismo-leninismo. Tempo da nova luta pelo socialismo, numa situação de defensiva estratégica. Estamos em tempo de luta revolucionária sob novas formas. As técnicas sofisticadas utilizadas pelo sistema capitalista, em seu ponto alto do desenvolvimento das forças produtivas, levaram, por exemplo, a luta guerrilheira na Colômbia, após quase meio século em armas no campo e na cidade, resistindo de forma heroica, mas acuada pelas forças da reação daquele país, com forte apoio do imperialismo estadunidense, a buscar o diálogo para deposição das armas e a continuidade da luta no campo da política institucional. No Brasil, o Programa Socialista do PCdoB “traça o caminho, isto é, faz indicações sobre meios políticos e organizativos que possam levar à vitória da conquista da República de democracia popular, condutora da transição para o socialismo. O Caminho para se alcançar esse objetivo é o Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento (NPND), com caráter anti-imperialista, anti-latifundiário e anti-oligarquia financeira, (...) através de uma ampla frente política e social que tem como centro os trabalhadores e amplos segmentos da nação”. “A acumulação de forças para a conquista da hegemonia passa pela atuação na esfera institucional parlamentos e governos democráticos e a construção de frentes amplas com a intervenção política que tem por fim a mobilização e organização dos trabalhadores e do povo e a participação criadora e permanente na luta de ideias”. A situação de defensiva estratégica levou e tem levado os comunistas e progressistas na nossa América a implementar a luta revolucionária por dentro da institucionalidade capitalista. Nesse campo, os limites impostos pela democracia burguesa e as contradições a serem enfrentadas e superadas, são de novo tipo. É um caminho, uma tática cuja teoria está em construção com base na própria experiência e que corre o risco cotidiano de retrocesso. Aqui, estamos tratando apenas de um aspecto: Os processos eleitorais para as instituições de poder. Para manter o poder politico conquistado através 24
do voto popular e avançar nas mudanças, é preciso reformas profundas, em todos os campos, mas principalmente na política, instituindo instrumentos que, no curso do processo de acumulação de forças, vão dando sustentação e garantindo a continuidade do projeto, reduzindo assim o risco de retorno, até que em um determinado momento aconteça o rompimento dos grilhões institucionais da burguesia. Na luta revolucionária, devemos levar em conta a correlação de forças, que só será favorável à revolução se atuarmos conscientemente pela conquista da hegemonia política. Nós, os revolucionário não temos direito à ingenuidade. Na acumulação, os processos eleitorais são cruciais e precisam, aos poucos, serem normatizados de forma a que prevaleça o interesse da maioria. A permanecer a democracia burguesa em toda a sua amplitude, o retrocesso pode ocorrer a qualquer momento, como pouco faltou recentemente na Venezuela. Corremos o risco de uma grande derrota com possível efeito regressivo da marcha batida rumo ao progresso e ao socialismo, em algumas experiências com mais consistência, em outras com menos, na nossa América. Essas mudanças só serão possíveis com desenvolvimento que permita a implementação de políticas públicas voltadas para os interesses da classe operária e dos trabalhadores em geral, da cidade e do campo e da maioria do povo, sem deixar de travar, um minuto sequer, a luta de ideias para ganhar as grandes massas do povo para o novo projeto de sociedade. A conquista da hegemonia política, portanto, não pode prescindir de nenhuma dessas duas linhas paralelas cujo futuro é a convergência para uma sociedade sem classes, o comunismo.
Liberdade e democracia na transição ao socialismo Nas sociedades em luta há mais de meio século experiências que resistem e inovam com avanços e vitórias, mesmo em tempo de grande crise global do capitalismo para que o interesse público, individual e coletivo prevaleça sobre o privado, para superar o modo de produção capitalista, sistema antagônico e hostil aos trabalhadores, a questão da liberdade e da democracia foi, e continua sendo, um problema e um desafio no processo de transição para uma sociedade superior, solidária e mais avançada em todos os aspectos, considerando aí os interesses
Tribuna de debates primordiais dos produtores e da maioria do povo, em cada um desses países. Essa questão está sendo levada em conta na maioria das experiências que persistem nesse período histórico da Nova Luta pelo Socialismo, em cada uma de acordo com a sua realidade e suas peculiaridades. A democracia socialista é inerente ao processo de construção da nova sociedade e deve ser levada em conta. A restrição à liberdade é contraditória ao modo de produção socialista, como já vimos nas experiências que fracassaram. O florescer da liberdade e da democracia depende das condições objetivas e subjetivas, internas e externas e do momento histórico em que cada povo implementa a luta pela nova sociedade. No socialismo, a democracia deve considerar sempre a decisão da maioria consciente, sem, no entanto, alijar do processo as minorias descontentes, desde que respeitem a ordem constituída
a serviço da maioria do povo. A luta de classes continua sob novas formas e as minorias descontentes devem ser ganhas através do convencimento e até mesmo de concessões pontuais e temporárias. Democracia no socialismo não tem valor universal, daí não ter lugar a tentativa à contrarrevolução pela minoria através da violência, internamente ou sob qualquer forma em conluio com o inimigo externo. Como disse o comandante Hugo Chávez, em um momento crítico de orquestração de golpe pela direita venezuelana, com apoio dos Estados Unidos: “A revolução é democrática, mas não é desarmada”. Deve estar sempre preparada para sufocar qualquer tentativa de insurgência contrarrevolucionária. Exemplos clássicos: Cuba – Invasão de Playa Girón (Bahia dos Porcos); China - Praça da Paz Celestial. * Membro da Direção Estadual do PCdoB, Bahia
Democratização e controle social dos meios de comunicação,imprescindível para o avanço da luta revolucionária Parte 2 “A liberdade só pode ser conquistada pela ação coletiva das classes subalternas”. Karl Marx Por Antonio Barreto* Marx tentou mostrar que “a história é a luta dos homens na constituição da subjetividade livre e criativa” e que “a práxis coletiva trouxe a humanidade até o ponto em que essa aspiração pôde ser realizada”. Mas ao realizar a crítica da economia política e examinar a natureza das relações capitalistas de produção, ele desvendou uma “incompatibilidade entre o caráter despótico, centralizador do capitalismo e as promessas de autodeterminação do indivíduo
que acompanharam a ascensão da burguesia”. * Paul Virilio (1996), chegou a uma conclusão um tanto drástica: “a mídia é o único poder que tem a prerrogativa de editar suas próprias leis, ao mesmo tempo que sustenta a pretensão de não se submeter a nenhuma outra ”. Para Belluzzo, “essa reivindicação tornou-se mais agressiva, na proporção em que os meios de divulgação e opinião transformaramse em grandes empresas e ampliaram suas relações com o mundo dos negócios” e que nesse caso, dada “a peculiaridade da mercadoria à venda, o objetivo legítimo de ganhar dinheiro formou uma unidade inseparável e ameaçadora com o desejo de ampliar a influência e o poder sobre a sociedade e a política”.* “O jovem Marx (1980, p.42) era um denodado defensor da liberdade de imprensa. Dizia Marx: ‘a imprensa livre é o olhar onipotente do povo, a con25
Tribuna de debates fiança personalizada do povo nele mesmo, é a franca confissão do povo a si mesmo’”.* A assertiva é em “defesa apaixonada da liberdade de imprensa contra a censura estabelecida pelo Estado prussiano”. Acrescenta Belluzzo que Marx suspeitava que a ausência de uma lei que regulamentasse o exercício da liberdade de opinião e de informação, tornando -as disponíveis para todos os cidadãos, transformaria a livre opinião no privilégio e no capricho de poucos. “Capricho do Estado contra a livre manifestação dos cidadãos, mas também capricho dos que detêm o monopólio da informação exercido em detrimento dos que não dispõem dos meios necessários à expressão de suas opiniões” e que (...) “estupidez e intolerância tornar-se-iam leis de imprensa. (Idem)”. Para que o sistema capitalista atinja o seu objetivo, que é a acumulação de riqueza, exige disciplina rigorosa e limites à liberdade dos trabalhadores, de quem é extraída a mais-valia. Na contenda pela superação desse sistema de exploração, o desenvolvimento livre do indivíduo, em particular dos que vendem sua força de trabalho, passa pela conquista da liberdade de imprensa, liberdade de informação e de produção e divulgação da cultura. No curso da
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luta pela derrubada do capitalismo, utilizando-se dos instrumentos da própria institucionalidade burguesa, deve-se persistir na luta por mais democracia, o que pressupõe, entre outras questões, eliminar a concentração do poder da comunicação monopolizada por setores da burguesia, na atualidade entrelaçado com mais força, com outros meios de produção e o sistema financeiro nacional e global. Iniciativas avançadas nesse campo já foram tomadas pela Venezuela, Equador e Argentina. No Brasil, o governo patina e se submete às pressões de cima. O movimento popular começa a tomar iniciativas que podem resultar em mudanças substanciais. Reformas progressistas para democratizar os meios de comunicação e a política só acontecerão com vigoroso movimento de massas sob a direção do PCdoB e demais forças de esquerda e progressistas. * Membro da Direção Estadual do PCdoB, Bahia
Bibliografia
• *“O capital e suas metamorfoses”, Título I – Luiz Gonzaga Belluzzo – Editora Unesp
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Mundo em guerra - crises, antagonismos e indícios de preparação
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s teses ao 13º Congresso do PCdoB abordam de maneira insuficiente o recrudescimento da violência das classes dominantes nas relações internacionais conduzidas pelo imperialismo central e na lida com os trabalhadores em luta no interior das nações. Por Bruno Barbosa (Lobão)* No que se refere à inerente agressividade do imperialismo, cabe indagar: há conexão entre fatos da atualidade que sugerem preparação de confronto político-militar de escala mundial entre blocos antagônicos? E, a depender da resposta: como lidarmos com esta eventual preparação e catalisarmos mudanças anti-imperialistas na correlação de forças? As respostas, longe de serem conclusivas, podem surgir a partir da interpretação de fatos recentes como a renovação e reposicionamento das capacidades militares de alguns países ou agressões regionais promovidas pela Otan num claro movimento de pinça sobre a Eurásia. A mensagem vem desde a guerra na Sérvia nos anos 1990 e, principalmente, a guerra da Geórgia em 2008, maquinada pelos EUA/ Otan, para controle da Ossétia do Sul, região onde escoa gasoduto russo. EUA/Otan perseveram na doutrina de aumento contínuo do poder em relação a outros Estados, inclusive para anular as capacidades dissuasórias destes, aproveitando as oportunidades e vantagens estratégicas atuais para lutas futuras. Convém relacionar outros fatos atuais: ação da Otan contra o atual regime sírio e o fechamento do estratégico porto militar russo em Tartus/Síria; fomento a celeumas regionais por um novo realinhamento pró-EUA no Sudeste/Leste asiático e Oceano Índico para controle de rotas comerciais e contenção da China; incremento de espionagem virtual e ataques cibernéticos; financiamento de ONGs e grupos de mídia para desestabilizar estados; cerco à América Latina e África pela ativação da 4ª Frota e Africom; controle de nações com posições geoestratégicas (Mali, Líbia, Egito, Colômbia, Honduras e Paraguai); busca do colapso da articulação Brics; militarização e engajamento cres-
centes da UE, emprego clandestino de drones e sabotagens; acirramento das disputas por recursos naturais, financeiros, mercados, rotas comerciais ou virtuais e satélites; uso das crises induzidas na Síria, Irã e Coreia para implantar escudos antimísseis e anular dissuasões nucleares de Rússia e China. Neste ambiente enfraquecem-se as normativas do pós-guerra e ONU. Como reação: russos, chineses e aliados regionais criaram o Pacto de Xangai que articula seus interesses de desenvolvimento econômico e segurança; ampliação dos orçamentos militares chineses e russos e aquisição de tecnologias, equipamentos, veículos militares, incremento de guerra eletrônica e espacial, capacitação de pessoal e estabelecimentos de novas bases capazes de romper o cerco da Otan; desenvolvem-se escudos antimísseis na Rússia, China e Irã. Rússia e China participam de medidas políticas e econômicas como a criação do banco Brics, gradual substituição do dólar e compra de ouro em larga escala; russos associam-se a alemães para construção do óleo-gasoduto norte via Mar Báltico (afetando a correlação de forças na Otan) e visam ainda novos óleo-gasodutos direcionados à Europa, um pelo Mar Negro e outro pelo já mencionado Porto de Tartus/Síria (desafiando EUA, Catar, Turquia, Arábia Saudita, que ainda lutam pelo óleo-gasoduto Nabucco). A Rússia realiza obras para integração de infraestruturas de transportes para dar elo, a baixos custos, às trocas comerciais entre UE e Leste/Sudeste asiáticos; incorporação da China nos mercados africanos e latino-americanos. E nós nisso? “... tendo toda essa riqueza natural, esse parque industrial e essa capacidade de produção que a gente tem, quem garante que, no futuro, um conflito até entre terceiros não poderá ter uma repercussão aqui?(...) do ponto de vista regional, na América do Sul, cooperação; do ponto de vista global, dissuasão.” Celso Amorim O Brasil, com a condução soberana dada por Lula e Dilma, vai inexoravelmente sendo lançado ao 27
Tribuna de debates centro dos acontecimentos: como global player fez a escolha de integrar-se aos vizinhos; opta pelo multilateralismo, expressado nos Brics e diversificação de mercados internacionais. Quanto à defesa, aprovouse a inédita Estratégia Nacional de Defesa, focada na “teoria da dissuasão a eventual potência inimiga ao norte”; reforça sua indústria de defesa a partir de investimentos públicos em P&D, compra de material com transferência de tecnologia, modernização das Forças Armadas. Aposta no projeto de submarino nuclear nacional e renovação dos caças. Mesmo com esforços do Planalto para situar melhor o país contra adversários potenciais, o que reflete nova correlação de forças no Brasil, há muitos desafios. Nossos problemas históricos não residem apenas na desídia imobilizante das elites que sempre apontaram vizinhos como inimigos. Essas elites, desalojadas do Planalto nas derrotas eleitorais dos tucanos, ainda conservam profunda influência, particularmente em setores militares específicos. A superação dessa influência é preliminar na estratégia contra potenciais agressões vindas do norte. É necessária a crítica ao pacifismo despolitizado e estímulo à luta pela paz com sentido socialista, internacionalista e anti-imperialista. O tema deve ser democratizado, ganhar os trabalhadores brasileiros e o povo em geral, ser organizado no seio das lutas
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populares. Para tal, ao PCdoB cabe apreender experiências anteriores, reforçar-se ideologicamente, dar solidez organizativa nos marcos do marxismo-leninismo, combater o fenômeno do rebaixamento político pelo pragmatismo; construir capacidades para desenvolver as variadas formas de luta exigidas agora e adiante. Dissuasão, o Brasil só poderá alcançar pelo engajamento dos trabalhadores e das camadas populares na discussão consciente do tema defesa, predispondo a mobilizarem-se em defesa do território, da infraestrutura, do modo de ser e se transformar; e conter o fascismo nacional em sua sanha contra instituições democráticas. Nossa estratégia de defesa deve ser coisa de todo o povo, e não somente da caserna. Isso requer abertura e participação, afastando o velho enredo determinado pela traição das elites. Por fim, devem ser agregadas considerações econômicas, políticas e doutrinárias que ajudem na compreensão do fenômeno da guerra contemporânea, seja na modelagem fria, como aparentemente já se recoloca, ou como tragédia geral. O assunto deve ser integrado às Resoluções para armar politicamente a militância, e as camadas populares que pretendemos influenciar. * Militante do PCdoB, Santa Catarina
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Frente institucional, luta de massas e disputa de ideias: é necessário assegurar o equilíbrio
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ma verdadeira epopéia da luta pela liberdade: é o que representa a heróica trajetória de mais de nove décadas do Partido Comunista do Brasil, que apenas sobreviveu à cruel perseguição da qual foi vítima porque soube extrair ensinamentos de seus erros e acertos e, principalmente, por guiar-se por uma teoria revolucionária: o socialismo científico. Por Caio Botelho* Em cada época, na medida em que tarefas eram superadas, novos desafios iam surgindo, tanto do ponto de vista da construção partidária quanto aquelas trazidas pelo contexto político em que o Brasil, o mundo e a luta pelo Socialismo iam encontrando pela frente. Não foram poucas as vezes em que vacilações e tentativas de liquidação do nosso “DNA” revolucionário tiveram que ser combatidas. Destaca-se, nesse sentido, a vitoriosa reorganização do Partido em 1962. Também ocupa lugar de destaque nessa história o 8º Congresso, realizado no auge da crise do Socialismo e que acabou por reafirmá-lo, ainda que analisando criticamente os equívocos cometidos. Impossível não lembrar o papel do lendário dirigente João Amazonas que, com seus ensinamentos que continuam atuais deu uma significativa contribuição para manter em riste a bandeira comunista. Pois a nossa geração não foge à regra e também possuem em suas mãos os desafios próprios da atualidade. Não somos um Partido pronto, mas em constante construção e, dessa forma, enfrentamos cotidianamente as possibilidades de desvios de direita e de esquerda, que surgem com mais rapidez e de forma mais ardilosa do que buracos em uma estrada escura e mal conservada. Não deve ganhar terreno em nossas fileiras a ideia de que somos invencíveis: não existe vacina que imunize contra as degenerações de todos os tipos. Se mesmo a mais poderosa organização re-
volucionária do século 20 o PC da URSS sucumbiu diante de inimigos internos, não seremos nós que escaparemos desse destino se faltarmos com a vigilância necessária.
A responsabilidade histórica dessa geração de comunistas O Partido Comunista do Brasil vive o momento mais rico de sua história: oxigena-se com a ampliação do número de membros em suas fileiras, amplia o respeito junto à sociedade e cumpre importante papel na ocupação de espaços relevantes na vida do país. Aprimorou a sua formulação teórica na medida em que propôs, em seu Programa aprovado no último Congresso, um novo projeto nacional de desenvolvimento, cuja consecução representa uma fase preliminar de transição ao Socialismo e que permitirá o acúmulo de forças “via reformas estruturais e rupturas” revolucionárias, como diz o documento. O novo momento histórico aberto com a vitória, há dez anos, de uma ampla coalizão progressista possibilitou que, em março de 2007, o Comitê Central publicasse a histórica resolução em defesa de uma “tática mais afirmativa e audaciosa”. A partir daí, nosso Partido começou a encarar com certa centralidade a questão da disputa eleitoral, estimulando o lançamento de candidaturas comunistas a cargos majoritários e a ampliação do nosso protagonismo nas disputas proporcionais. Naturalmente, isso acabou por elevar os esforços das direções e da militância em torno da disputa do voto. Concordamos com essa orientação, mas sabemos também que ela nos traz novos desafios: como nos tornarmos um Partido com forte atuação na frente institucional sem virarmos um Partido institucionalizado? Como ampliarmos a nossa presença na máquina do governo sem nos tornarmos um Partido da máquina do governo? Essas são questões que, em nossa opinião, estão na ordem do dia e precisam ser respondidas por esta geração de comunistas. 29
Tribuna de debates Isso porque compreendemos que o necessário equilíbrio entre a frente institucional, a luta de massas e a disputa de idéias junto à sociedade que, como aprendemos nos cursos iniciais do Partido, se entrelaçam tem sido alterado nesses últimos anos em favor da primeira. Elevar o nosso patamar nas disputas eleitorais é de suma importância, mas não pode ocorrer à custa do rebaixamento do papel de nossa presença nas lutas do povo brasileiro e na defesa de uma consciência revolucionária.
O papel do PCdoB à frente de governos Temos assistido, em cidades importantes onde o PCdoB passou a exercer funções de governo, um verdadeiro desmonte da vida militante e da estrutura partidária. Instâncias de direção deixam de se reunir e quando o fazem dedicam suas pautas exclusivamente às demandas governamentais. Também deixam de acompanhar as lutas da juventude, a nossa atuação entre a classe trabalhadora e em demais segmentos dos movimentos sociais. Obviamente, a existência de honrosas exceções deve ser devidamente registrada. Mas então com qual finalidade o Partido Comunista anseia ocupar espaços de poder nos marcos da sociedade capitalista? Por que dirigir prefeituras, governos estaduais, secretarias e ministérios seria tão importante para nós? Certamente não é para fazer mais do mesmo. Para tapar buracos, construir duas ou três pra-
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ças, um ou outro posto de saúde e pôr em prática demandas rotineiras da administração pública já existem os outros partidos. Se fosse para cumprir apenas essas tarefas seria dispensável a presença dos comunistas nesse campo. É por isso que precisamos fazer tudo isso e algo mais. Não interessa ao Partido Comunista ocupar espaços de poder se isso não refletir na elevação do nível de consciência do povo. E esse ensinamento não é uma novidade: em 1986, ao participar da posse de Luiz Caetano como prefeito da cidade de Camaçari (BA), primeira a ser governada pelo PCdoB após a ditadura militar, João Amazonas afirmou: “O nosso partido, que apoiou candidatos democráticos em todo o país, vê-se agora diante da questão de tomar parte na administração pública. Esperamos colaborar, desprendidamente, na administração municipal, no sentido de que realizamos as reivindicações do povo e de que os prefeitos realizem gestões democráticas e populares. (...) nosso objetivo é servir ao povo. É ajudá-lo a se organizar melhor, a elevar sua consciência política, a fim de obter novas conquistas”² Como dito, continuam atualíssimos os pensamentos de Amazonas. * Militante do PCdoB e da UJS, Bahia
Bibliografia
• ² BUONICORE, Augusto. Meu verbo é lutar - a vida e o pensamento de João Amazonas. 1ª ed. São Paulo: Anita Garibaldi, 2012.
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Mulheres comunistas, mais ousadia, mais política
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s definições de desigualdades existentes entre o gênero masculino e o gênero feminino são conhecidas e largamente discutidas, perpetuando-se desde a família patriarcal, que seriam as atribuições de cada sexo. Por Cleusa Lima* Desde o século 15 o trabalho feminino passou por transformações e a mulher vai adquirindo novas responsabilidades para além da esfera doméstica. A conquista de direitos foi marcante no século 20, dentro das alterações macroeconômicas e sociais que caracterizaram a evolução da sociedade contemporânea. Ao fazermos uma retrospectiva, constatamos que no caso das mulheres, as mudanças superaram diversas etapas e mesmo resistências, onde a mulher saiu do casulo familiar e entrou no mercado de trabalho, afastando-se do domínio patriarcal, procurando ocupar espaço, passando muitas vezes com o seu trabalho a ser mantenedora do lar, conferindo-se certa independência, e sem dúvida maior participação no meio social. O processo histórico do gênero feminino passou por grandes lutas, em que a relativização de culturas e valores vai além do olhar feminino. Muitas pessoas juntam-se nesta caminhada, e através da união surgem movimentos sociais que ganham força em prol dos direitos e da igualdade nas relações de gênero. As mulheres começaram a se organizar em prol de seus direitos, como qualquer outro grupo humano, lutando para vigorar a igualdade, tanto no que diz respeito ao mundo político bem como sua participação na prole da família. Durante o processo de militâncias realizadas pelos movimentos feministas, os movimentos das mulheres buscavam se expandir visando uma maior participação política, a igualdade de opiniões, bem como visualizar novos horizontes no qual a mulher possa estar na posição de sujeito das ações. A Política Nacional para Mulheres, estabelecida pela Secretaria Especial de Políticas Públicas para Mulheres, apresenta como objetivo garantir às
mulheres condições necessárias para continuar no pleno exercício da cidadania, com direitos sociais e autonomia, integração e efetiva participação na sociedade, conforme preconiza a Legislação Brasileira e a Declaração dos Direitos Humanos. O ingresso da mulher na política deu uma visão e mudanças em determinados padrões, comportamentos e valores, delineando uma nova estrutura nos espaços políticos. Destaca-se que a política foi um reduto quase que exclusivo do homem, sendo assim a mulher tem uma experiência menor neste aspecto. Mas isso não garante que ela esteja livre dos preconceitos e das críticas que ainda subsiste em nosso meio. É possível saberem que, homens e mulheres são submetidos às mais diversas formas de exploração e controle da força de trabalho. É importante frisar que embora ainda predomine o sistema de dominação masculina, podem-se destacar na atualidade muitos casos em que a mulher encontra-se ocupando cargos públicos do alto escalão. Isso significa uma conquista relevante na medida em que a mulher sempre foi vista na sociedade com imagem de submissa e de inferioridade. A mulher precisa estar na política em equidade de gênero, superando os estereótipos e suas manifestações consideradas como inadequadas e negligentes devido ao fato de não ficarem cuidado dos filhos em casa e querem assumir o papel que historicamente é do homem. A mulher, no Brasil, tem procurado mostrar que faz a diferença nos espaços públicos, bem como sua representatividade na política e sua importância na atuação nesta área para a construção de novos projetos e olhares diferenciados. A participação feminina na política é sem dúvida ainda um processo no qual as mulheres necessitam apresentar mais ousadia, sair dos espaços privados e se incluir nos espaços públicos. Muitas mulheres acabam entrando em um jogo intrapartidário, pois somente assim elas passam a ter chances de engajamento político nas tomadas de decisões, bem como representar a população feminina, pois ainda existe muita discriminação pelos 31
Tribuna de debates próprios colegas de partido, quando se refere ao poder exercido pelo gênero feminino. A tarefa de mudar a mentalidade das pessoas, conscientizando-as de que as mulheres são seres com direitos iguais aos dos homens, tem sido árdua e acidentada, mas é com muita reflexão e trabalho que muito se tem conquistado para a mudança de paradigmas vivenciados ainda hoje. A possibilidade de superação está na questão do poder, e só com muita iniciativa e vontade será
possível respeitar os decretos sobre os direitos humanos se manifestem sensíveis à violação dos direitos humanos das mulheres. É com igual iniciativa e vontade que será possível a criação de espaços, dentro e fora dos sistemas, em que as mulheres participem, de forma significativa, na formulação da agenda dos direitos humanos para o futuro. * Militante PCdoB, Curitiba, PR
Um livro essencial para se compreender o momento atual é:” Esquerdismo, doença infantil do comunismo”
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scrito entre abril e maio de 1920, Esquerdismo, doença infantil do comunismo nos traz críticas pontuais de Lênin contra os “revolucionários” da II Internacional (Karl Kautsky, Otto Bauer e Friedrich Adler) e contra os “comunistas de esquerda” de países como Alemanha, Inglaterra, Itália e da própria Rússia. Por Clovis Calado* Kautsky (chamado por Lênin em um famoso livreto de “o renegado”) militava contra a ditadura do proletariado instalada na Rússia soviética e clamava por uma “democracia pura”, criticando duramente o regime soviético, isto em plena guerra civil, quando a burguesia de 14 países tentava raivosamente derrubar o poder recém-construído. Lênin classificava estas posições como “traição” por parte destes sociais-democratas. Já no capítulo II de Esquerdismo..., Lênin destaca que o fator principal da vitória dos bolcheviques dependia da “disciplina rigorosíssima, verdadeiramente férrea” do Partido e defendia a ditadura do proletariado como necessária para derrotar a burguesia. Além disso, o grande líder revolucionário nos deixa a lição de que este partido (idealizado e desenvolvido por ele, neste caso é de suma importância estudar sua obra Que fazer?) deve estar próximo das massas 32
trabalhadoras e não trabalhadoras (neste sentido a crítica é direta contra os que se negam a lutar em sindicatos), deixando claro que “as massas se dividem em classes”. Portanto, todo cuidado é pouco ao se aproximar das massas não trabalhadoras. Esta aproximação com as massas não descarta a vigilância revolucionária e o combate ao oportunismo de esquerda e de direita e este combate se torna mais direto quando a formação e a educação revolucionária de quadros são ininterruptas e seguem a linha justa do marxismo-leninismo. Mais à frente, Vladímir Lênin faz um pequeno histórico do bolchevismo e volta a lembrar que a vitória dos bolcheviques “foi exclusivamente porque desmascarou sem piedade e expulsou os revolucionários de palavras”que se negavam a participar do parlamento burguês (incluindo aí o mais reacionário, dessa vez uma crítica aos “comunistas de esquerda” Pannekoek e Silvia Pankhurst). No entanto, esta participação dos comunistas no parlamento burguês não se trata de uma mera participação, de colaboração com o parlamento burguês, mas sim, uma participação crítica, de denúncia diuturna contra o sistema capitalista e contra a ideologia burguesa, analisando as contradições desse sistema e propagandeando a ideologia marxista-leninista do proletariado e a transformação do mundo em um mundo socialista e comunista. O político comunista, para
Tribuna de debates Lênin, “que quiser ser útil ao proletariado revolucionário deve saber distinguir os casos concretos de compromissos que são precisamente inadmissíveis, mas que é uma expressão de oportunismo e traição”. O parlamento burguês para um comunista revolucionário não pode ser igual a uma confraria, um clube de amigos onde tudo acaba em tapinhas nas costas e boas risadas. A luta de classes também deve penetrar no parlamento burguês. O Partido, como defendia Lênin, além da disciplina férrea para lutar contra os oportunistas e provocadores de direita, precisa “saber combinar acertadamente o trabalho ilegal com o legal”. Os ensinamentos de Lênin continuam atuais,
principalmente quando vemos uma gama de defensores da liquidação do Partido Comunista, transformando-o num organismo sem rosto, sem identidade, multicolorido, eclético, que recebe a influência de ideias totalmente estranhas ao marxismo-leninismo. Portanto, é necessário mais do que nunca reforçar o papel combativo do Partido, tornando-o próximo das massas trabalhadoras, com uma linha mais justa e um incansável trabalho ideológico, formando combatentes revolucionários para a luta. Sem isso, o Partido se transforma em Partido Comunista apenas nas palavras. * Militante do PCdoB, Pernambuco
A atual tática: O dilema da estratégia do PCdoB
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PCdoB tem trabalhado na perspectiva de um longo processo de transição do capitalismo para o socialismo no Brasil, que passa pelo aprofundamento das mudanças desenvolvidas, no atual quadro, pelos governos progressistas de Lula e Dilma, oriundos das urnas, na perspectiva de implementar um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento no rumo do Socialismo. Por Daniel V. Sebastiani * O nó górdio desta política está no fato de que a possibilidade concreta deste avanço (que procura aprofundar e radicalizar, mantendo a máxima amplitude política possível em cada cenário) depende do crescimento da força política revolucionária mais consequente: o Partido Comunista. Para que isto seja viável, além das medidas políticas e organizativas que permitam crescer na institucionalidade, no movimento de massas e na luta de ideias, é necessário ocupar o espaço político singular que cabe ao PCdoB. Este espaço político é a expressão dos interesses políticos das classes e segmentos que podem objetivamente se identificar com o Programa do Partido
mais do que com qualquer outro. Nesta medida, entende-se como espaço do PCdoB aquele que está situado entre os interesses reformistas, que procuram desenvolver um processo de caráter nacionalista/distributivo, sem mudanças profundas que levem a rupturas estruturais com a sociedade capitalista, e os setores ultrarrevolucionários que procuram construir uma ruptura imediata e completa das estruturas, sem clareza quanto ao que se quer alcançar com estas rupturas, para onde levam e sua viabilidade. Pode-se dizer que os interesses estratégicos do Partido Comunista estão, na objetividade social, entre os segmentos das camadas médias mais e menos radicalizados em termos progressistas, o que é natural, uma vez que representa os trabalhadores, conforme análises já feitas por Marx e marxistas sobre as camadas médias. A dificuldade está em dar expressão política a este locus político, ou seja, a efeitos das transformações que estão sendo feitas já existe um grande partido, o PT, e outros que reivindicam essas ações, em termos do combate radicalizado pela esquerda às mesmas, também temos o PSol e outras forças. No entanto, o PCdoB tem objetivos de futuro 33
Tribuna de debates que não tem como se transformar em políticas concretas em função da atual correlação de forças na luta de classes. Políticas relevantes foram formuladas, nesse cenário, para tentar individualizar a ação do Partido e ocupar o seu locus: • A luta contra os juros, sem romper com o governo; • A luta pelo controle do mercado financeiro e o câmbio, sem romper com o governo; • O combate ao monopólio da imprensa, sem romper com o governo; • A tentativa de construir uma central menos governista e mais associada às ideias de luta social e do desenvolvimentismo, sem romper com o governo, a CTB, talvez a mais bem-sucedida de todas essas políticas; • A defesa da construção de um núcleo estratégico de esquerda, junto ao governo, com as forças mais comprometidas com o aprofundamento das mudanças, etc. O problema é que a ocupação dos espaços não se dá pela ideia, mas pelo fato político-histórico. Constitui o fato na história, sem dúvida, a propaganda e ação feita em torno das bandeiras políticas no seu mais alto grau. Qual o mais alto grau hoje na disputa: as ações institucionais, de massas e a luta de ideias. A institucionalidade cumpre, nesta quadra, papel de particular importância e qual a marca, para as grandes massas, do PCdoB na mesma, o voto na reforma da Previdência, a Copa, as Olimpíadas e o Código Florestal. Isto, somado ao ecletismo das alianças (não confundir com amplitude), mal compreendido pelos eleitores e à pasteurização marqueteira da propaganda do Partido, cria um quadro que afasta o Partido da condição de instrumento que conscientiza através da sua política, traduzida em fatos, e capitaliza politicamente através destes fatos a concretude do corpo social que lhe cabe na luta de classes.
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Estes fatos políticos-históricos garantem uma ocupação concreta do Partido Comunista do seu locus político nacional? Qual deles diferencia o PCdoB do PT, do PDT ou do PSB? Qualquer um destes poderia capitanear estas políticas e práxis eleitorais. O PCdoB vem desenhando uma tática acertada, mas encontra dificuldade para criar os fatos políticos que a individualizem na concretude histórica e, entre outros problemas, abre, assim, flanco para o crescimento de forças esquerdistas pela sua esquerda. É desnecessário dizer que este artigo não pretende a análise rebaixada que desconsidera que os espaços e terrenos de luta, assim como os métodos, não estão à disposição do bel prazer do Partido Comunista e que os quadros partidários, atores desses momentos, não têm outra responsabilidade que não seja o mérito de suas habilidades e a firmeza de sua disciplina. Não simplificar e pessoalizar a análise da macropolítica deveria ser a atitude óbvia de qualquer analista, mas nunca é demais explicitá-la. O que se afirma é que é preciso enquadrar mais claramente as ações do PCdoB, sobretudo na esfera institucional, a sua necessidade tática, forçando com mais critério as escolhas dos espaços de governo, aliados eleitorais, focos de campanha, numa perspectiva que, sem abandonar a concepção da imperiosa necessidade de acumulação de forças, particularmente no campo institucional, consiga realizá-la numa perspectiva que priorize o médio e longo prazo no sentido da sua individualização enquanto força política e da ligação às classes/segmentos sociais de seu interesse. Neste aspecto a ação no movimento de massas, sobretudo sindical, deve ser mais efetiva e ousada, jamais se subordinando às necessidades imediatas e aparentes da busca de espaço institucional. * Secretário de Formação do PCdoB, Rio Grande do Sul
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O setor produtivo privado tem papel no NPND?
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esponder a essa pergunta ajuda-nos a analisar a relação do Estado nacional com o segmento produtivo privado. É um debate que sempre esteve presente entre as conferências ou congressos do PCdoB, e que agora no Brasil, sob nova orientação política neste último decênio, ganha mais uma vez dimensão prática. O documento que orienta o 13º Congresso do Partido aborda essa questão, atualizando-a à luz dessa nova realidade. É sobre ele que opino nesta contribuição. Por Divanilton Pereira* Os governos de Lula a Dilma revelaram suas opções de buscarem incorporar o setor produtivo privado em seus programas governamentais. Justificam que o Brasil precisa estimular o investimento privado, que conjugado com o público, possibilita a elevação dos níveis do crescimento econômico brasileiro, sobretudo em época aguda de crise capitalista. Com essas razões implementam projetos e programas com medidas que incluíram desoneração em folha de pagamento, incentivos fiscais e tributários, parcerias, concessões, leilões, além de novos modos de gestão em setores da prestação do serviço público. É importante considerar que esse projeto político herdou uma bomba macroeconômica tucana montada sobre o tripé dos juros altos, câmbio flutuante e compromisso com o superávit primário. Uma situação que fragiliza a capacidade indutora do Estado brasileiro. Esse fato explicava a insuficiência do investimento governamental, pois o acordo tácito firmado entre o tucanato e o rentismo drenava (ainda continua) volumosos recursos públicos para o sistema financeiro internacional e seus vassalos nacionais. No entanto, constata-se que as medidas implementadas por esse novo projeto desde 2003, até os diais atuais, não enfrentam efetivamente esse limitador estrutural. Em seu conjunto mantém-se uma postura frágil e dúbia. A Carta ao Povo Brasileiro, assinada por Lula em
2002, sinalizou um compromisso com os contratos anteriores sobretudo com os do rentismo justificada pela delicada transição política de então. Entretanto, o circunstancial ganhou dimensão de permanência e só recentemente o governo Dilma Rousseff abriu uma transição para desarmar esse artíficio que asfixia as finanças públicas de todo o sistema federativo brasileiro. Mesmo que tardia e lenta, com idas e vindas, esse caminho está sob fogo cruzado do sistema de oposição fora e dentro do país. A permanência dessa opção macroeconômica conservadora significa continuar limitando os orçamentos estatais, inviabilizando o planejamento público de longo prazo e o atendimento às demandas populares surgidas nas recentes manifestações. Estas clamaram em seu conjunto por uma intervenção maior do Estado. Nesses últimos dez anos revelou-se que o ciclo Lula e Dilma não deve ficar preso a essa lógica do possibilismo orçamentário e nem tornar os meios paliativos com o setor privado como perenes. Este capital têm objetivos exclusivos de acumulação e em alguns casos utilizam-se do patrimônio público fragilizando o controle da soberania nacional. Para ajustar essa diretriz faz-se necessária uma nova repactuação política entre o núcleo de esquerda desse governo, comprometendo-se com um novo projeto nacional de desenvolvimento e sua viabilização através da liderança insubstituível do Estado nacional. Percorrendo o desenvolvimento programático do PCdoB encontramos algumas respostas sobre o tema em tela. Em sua sistematização o Partido caracteriza o estágio do desenvolvimento brasileiro que continua como base no programa aprovado em 2009 aplicando os pressupostos das transições, seus papéis e suas etapas e assim conclui: “Um país marcado por uma longa formação mercantil-capitalista -escravista, de um capitalismo de desenvolvimento médio tardio e do tipo dependente. Essa condição cria deformações estruturais e crescimento heterogêneo. Por isso restam importantes tarefas demo35
Tribuna de debates cráticas e nacionais, de cunho capitalista a serem efetivadas”. Acrescenta ainda: “Em função do seu estágio de desenvolvimento, essas transições podem ser mais longas, irregulares e acidentadas”. *¹ Na 8ª Conferência Nacional em 1995, marco dessa elaboração, afirma que o conjunto de medidas de feição capitalista em nosso país já é parte integrante da fase de transição ao socialismo. “E para termos êxitos em nosso rumo socialista, devemos compreender que caminhos, métodos, recursos e instrumentos intermediários são necessários para a passagem a esse modo de produção”. *² A chegada de Lula à Presidência da República abriu uma possibilidade de estabelecermos uma transição rumo a um projeto estratégico para o desenvolvimento do Brasil. Como este assim afirma o programa atual do PCdoB é o caminho ao socialismo no Brasil, temos, portanto, uma transição dentro de outra. Esse novo ciclo político, mesmo imerso em contradições, condicionado por fatores políticos, econômicos e ideológicos, estabeleceu alguns caminhos que dialogam com as remoções dos entraves que obstaculizam o progresso brasileiro apontado pelo PCdoB. Ao buscar mesmo que de uma forma híbrida uma nova orientação macroeconômica, realizando programas com foco na superação dos gargalos na infraestrutura, estímulos à produção e a competitividade do país, busca disputar as condições do desenvolvimento pleno das forças produtivas no país. E para esse objetivo atrai o investimento privado produtivo. Em seu conjunto esse esforço é uma condição necessária nas transições como a que está em disputa no Brasil. Ela pode pavimentar um rumo de largo alcance. Não obstante perceber o capital privado produtivo com um papel complementar, sobretudo nas fases transitórias do desenvolvimento brasileiro, não podemos admití-lo exercendo o controle em atividades estratégicas da economia nacional. Ao contrário, ele deve estar sob as diretrizes estatais, evitando a inversão do privado sobre o público.
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Nesse processo um dos meios difundidos as concessões públicas e suas derivações, sejam por tempo determinado ou não compreendo-os como uma privatização temporária ou permanente dos bens e dos serviços públicos, uma modalidade justificada pelos seus gestores pelo esgarçamento do orçamento público. Penso ser mais precisa essa concepção do que outras que resultam mais da justificativa política e não de um novo conceito. Assimilo seu papel assegurado com premissas que salva guardeiem o controle da soberania nacional, o interesse público e sejam aplicadas num ambiente de transição programática progressista. Que não seja guiado pelo espontâneo do mercado e sim pelo consciente de um planejamento estratégico conduzido pelo Estado nacional. Transposto, da teoria do Capitalismo de Estado de Lênin e desenvolvido em artigo por João Amazonas, duas passagens que situam minha opinião: Lênin: “Tendo em conta que a etapa imediata não podia ser o trânsito direto à construção socialista.” “Tinha-se que recorrer aos métodos de rodeio, ao capitalismo de Estado, etc. sem o que a revolução poderia estagnar ou mesmo sucumbir”. “Chegar ao poder, em certas circunstâncias, não é tão difícil. Difícil mesmo — a experiência o tem demonstrado — é construir o novo regime, identificar e agarrar um por um os elos de uma infinita cadeia de complicados problemas econômicos e sociais nos quais muitas vezes o novo aparece mesclado com o velho”. João Amazonas Assim penso. * Membro do Comitê Central do PCdoB
Notas *1 e *2 – trechos da exposição especial de Renato Rabelo na 8ª Conferência Nacional do PCdoB em 1995.
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Governos progressistas e movimentos sociais
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ascensão de forças progressistas à Presidência da República foi rica em ensinamentos, mas ficaram lacunas que deve ser solucionadas para um projeto de nação próximo ao Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento (NPND). Uma das grandes questões a ser respondidas é: como os movimentos sociais devem atuar em governos de esquerda? Por Edson França* Em governos reacionários, pró-imperialistas e neoliberais como de FHC as contradições se evidenciam, os projetos são sempre antagônicos ao povo, assim a coesão das forças de esquerda se dá com naturalidade. Em governo de esquerda, quando os compromissos e a orientação governamental se dirigem majoritariamente aos interesses populares outros cálculos se impõem. Podemos considerar que o caminho mais correto é o que harmoniza e evita sobreposição entre as lutas institucionais, das ideias e dos movimentos sociais, por se tratar de três eixos fundamentais de acumulação de forças.
Três leituras que determinaram o comportamento dos movimentos sociais Três principais posições se colocaram com a ascensão de Lula e influenciaram os movimentos sociais determinando seu comportamento. Inicialmente a consequência prática dessas posições atentou contra a unidade dos movimentos, outra consequência imediata que tem perdurado foi à diminuição das mobilizações e o enfraquecimento dos movimentos sociais enquanto ator político capaz de impulsionar os avanços.
Esquerdismo e os movimentos sociais Uma das posições, advogada pelo PSTU, PSOL, PCB, PCO, considera que os governo Lula e Dilma
foram capitulados ao neoliberalismo, representam os mesmos interesses econômicos e não se diferenciam do governo anterior. Para esse campo a posição adequada aos movimentos sociais deve ser de combate ao governo e distanciamento das forças políticas e sociais que a sustentam. A atuação dessas forças políticas foi de sistemática oposição a Lula e Dilma; romperam com a UNE, CUT e CMS; e tem posição refratária ao Fórum das Centrais Sindicais. O esquerdismo desse campo demonstrou superficialidade analítica, inviabilidade para o avanço da luta social e infantilidade política, visto que em vários momentos da luta contra a direita neoliberal apareceram de mãos dadas com setores mais reacionários da política nacional (DEM, PSDB e PPS), invariavelmente os extremos se encontraram, nesses casos, a direita sempre se beneficiou da inusitada relação.
Confusão entre governo e movimentos sociais A outra posição, defendida pelo PT, considera que a presença de movimentos sociais nas ruas tem apenas um objetivo: desestabilizar governo. Mais ainda, consideram que os movimentos sociais fizeram sua parte ao enfraquecer FHC e contribuir para eleição de Lula, agora cabe ao governo eleito operar as mudanças e ao movimento dar estabilidade. Por se tratar da força política majoritária do movimento social brasileiro, as decorrências dessa posição foram determinantes ao grande refluxo das lutas sociais, principal marca nos dois últimos governos. Evitaram ir às ruas sempre que foi possível, quando foram esforçaram para não se dirigirem ao Executivo Federal; frearam o ímpeto mobilizatório afetando a combatividade da CMS, esvaziaram e desviaram sua atenção para realização de seminários, plenárias e assembleias; adotaram uma postura ambígua no Fórum das Centrais Sindicais, atentando contra sua unidade com pautas que dividia as Centrais; fez opção de dialogar com o governo através das conferências de políticas públicas, fenômeno 37
Tribuna de debates que se consolidou como um importante espaço de articulação e mobilização social, responsável pela circulação de 07 milhões de brasileiros de 2003 a 2012, as conferências se constituíram no principal canal de diálogo do governo e do PT com os movimentos sociais.
Autonomia entre governo e movimentos sociais A terceira posição, na qual incluiu o PCdoB, separa movimentos sociais de governos por isso compreende que os movimentos sociais devem se manter unidos e mobilizados para avançar nas mudanças e elevar a consciência política do povo. Sabem que sem pressão popular nas ruas mesmo os governos de esquerda não produzem mudanças importantes. Ao longo dos últimos dez anos - com a provocação dos comunistas - foram realizados sucessivas ações em busca de unidade e convencimento das forças políticas sociais para organizar presenças nas ruas reivindicando mudanças na política macroeconômica; pautando as reformas política, da comunicação, e urbana; denunciando o golpismo midiático e da direita; prestando solidariedade aos povos violados. Apesar dos êxitos, essa posição nunca hegemonizou os movimentos sociais e não se constituiu numa sólida e permanente força de pressão capaz de garantir os avanços.
A rua sempre recepciona quem luta As mobilizações de julho sacudiram o Brasil, seu caráter autônomo, espontâneo, crítico aos políticos e as instituições preocuparam todos. Dilma leu corretamente os anseios dos manifestantes e prontamente apresentou uma pauta para a nação. A rápida resposta derrotou imediatamente a ideia que movimentos sociais desestabilizam ou atrapalham governos de esquerda, ao contrário, nutrida pela força das
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ruas, Dilma ousou propor ao Brasil cinco pactos, dentre eles a Reforma Política. Conclui-se com essa experiência prática que governo de esquerda é sensível aos gritos das ruas; as ruas não ficam vazias ou cheias por vontade das forças políticas organizadas, as ruas sempre recepciona quem a ocupa para luta, o povo pressionado pelas vicissitudes econômicas e sociais naturalmente se levanta e protesta. Por isso, os movimentos sociais organizados e as forças políticas antineoliberais estão desafiados a construir alternativas para recuperar o protagonismo nas ruas e nelas defender as mudanças e o projeto que elevou Lula à Presidência.
PCdoB propõe unidade das forças progressistas e retomada do desenvolvimento O PCdoB respondeu rápida e adequadamente ao fenômeno de junho ao se posicionar pela necessidade de a Presidenta ouvir e envidar os esforços necessários para atender as reivindicações. O PCdoB se posicionou corretamente nos últimos dez anos ao defender a união e mobilização dos movimentos sociais para tomar as ruas e defender o aprofundamento das mudanças e o projeto representado por Lula e Dilma, esses sucessivos acertos o credenciam a propor a articulação de um campo de afinidade de esquerda composto por todos os partidos e intelectualidade progressistas, movimentos sociais e setor produtivo com interesses nacionais para alavancar uma nova retomada de desenvolvimento. Tendo como pontos nodais dessa aliança a defesa das reformas (comunicação, política, e urbana), 10% do PIB e 100% do Fundo Social do Pré-Sal para educação e 10% do orçamento bruto para saúde. * Secretário Nacional Adjunto de Movimentos Sociais e membro do Comitê Central do PCdoB
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Macroeconomia e estratégia, a batalha pelo longo prazo
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ais um processo congressual ao PCdoB. Mais uma oportunidade para colocarmos à prova nossa história e nossa consequência política. A noção de uma longa transição do neoliberalismo ao Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento é mais profunda do que se imagina para uma relação de causa e efeito com as peculiaridades inerentes a uma formação social complexa como a brasileira. Por Elias Marco Khalil Jabbour* Peculiaridades tais acertadamente diagnosticadas pelo PCdoB: transições lentas, graduais, nem sempre seguras e onde a própria complexidade de nossa formação enceta tanto possibilidades (amplitude tática e formação de maiorias heterogêneas), quanto limites (meias-revoluções e gradualismo excessivo nas transformações no seio da superestrutura, engendrando unidades de contrários como a convivência e luta entre neoliberalismo e desenvolvimentismo no seio do mesmo governo). O mérito das teses é grande. É clara a percepção dos limites políticos da contemporaneidade nacional e como afetam os rumos da economia. Esgotamento do modelo de crescimento puxado pelo consumo, críticas à políticas cambial. Denúncia do pacto de 1994 da troca de ganhos da inflação pelos obtidos via dívida pública, etc. Porém, existem lacunas a serem não somente preenchidas com mais historicização e análise, mesmo, do pacto de 1994 e da transformação do neoliberalismo de política de governo em política de Estado. Falta discutir qual o fundo, de fato, da plena utilização do consumo como alternativa de crescimento em detrimento do investimento e as razões que escondem o senso comum para quem a inflação é um problema puramente de demanda, da mesma forma que a dita “inflação de alimentos” ocorre por uma, vulgarmente, chamada inelasticidade da oferta. Neste aspecto (inflação e agricultura), vale um parêntese: não está em pauta a submissão da produção agrícola à lógica da financeirização e a formação de
novas modalidades de monopsônios/oligopsônios. Ainda discutimos a questão agrária de forma pobre e ideologizada sob o prisma da falsa oposição entre pequena produção e grande produção. Enfim, o debate econômico nacional está recheado de mentiras convencionais comungadas não somente pelas grandes forças políticas do país, mas também desde simples donas de casa a iminentes acadêmicos e mesmo por “movimentos sociais”. Existe uma luta que não estamos vencendo. Trata-se de uma luta que envolve não somente uma chamada “estratégia nacional”, mas também o direito ao longo prazo. Ambas assertivas foram proscritas com a transformação do neoliberalismo em política de Estado. Pode-se dizer que a estabilidade monetária é uma estratégia nacional contemplada pelas maiores forças do espectro político brasileiro, incluindo o PT e o PSDB. Por outro lado temos de ter clareza que sendo a busca por estabilidade monetária o que une gregos e troianos, democratas e republicanos, a mesma não combina com objetivos de longo prazo. E que somente com visão de longo prazo é que podemos vislumbrar crescimento pautado pelo investimento e não pelo consumo, sob o preço da alta do preço do tomate simplesmente paralisar uma potência do tamanho do Brasil. Retomar a tendência de alta na taxa de juros é somente uma expressão de um país sem direito ao longo prazo. Se os juros param de subir, que o Estado intervenha no mercado cambial no sentido de baratear o dólar. Uma coisa ou outra. Sem falar no contingencionamento orçamentário, outro instrumento de grande valia à estratégia da estabilidade monetária. Sem longo prazo não existe possibilidade de realização do nosso Programa Socialista. Neste sentido seria interessante sermos mais agudos apontando que a derrota do longo prazo é expressão de um golpe político engendrado com o anúncio do Plano Real em 1994. Um golpe no coração da nação, digase de passagem. O que existe não é o esgotamento do modelo pautado pelo consumo e sim o esgotamento do Plano Real como experiência. Experiência que se perpetua na mesma proporção em que toda 39
Tribuna de debates discussão econômica (mesmo entre desenvolvimentistas e neoliberais no seio do governo) se pauta pelos marcos institucionais criados no âmbito deste mesmo Plano Real. Discute-se que a política cambial é equivocada. Ótimo. Critica-se os contingencionamentos orçamentários. Coloca-se em questão a perversa relação entre União, estados e municípios. Enfim, não precisa ser comunista para criticar, nesse nível, esse estado de coisas. Só a título de exemplo da profundidade que o debate exige de nós: por que não colocar em questão a própria existência da Selic como indexador tanto da dívida pública quanto do restante da economia? Que país do mundo utiliza o mesmo indexador de seus títulos da dívida para mediar o restante de sua economia? Não seria interessante extinguir as chamadas Letras Financeiras do Tesouro (LFTs), desvinculando o mercado de reservas bancárias do mercado de títulos da dívida pública? Continuaremos a combater a inflação enquanto exportamos ferro para a Coreia e importamos carros de luxo desSe país e, contraditoriamente, denunciando de forma vazia a “guerra cambial”? A prolongada luta por mudanças na macroeconomia é a outra face da batalha pelo longo prazo. É ilusão supor que poderemos chegar ao patamar de
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25% na relação investimentos x PIB nos marcos das instituições criadas pelo Plano Real. Não existe inflexão na política monetária que resista ao primeiro indício de alta inflacionária e as recentes medidas do governo Dilma atestam isso. Existe uma combinação de fatores que se expressa na correlação de forças encerrada não somente na política em si, mas também na falta de criatividade intelectual, convicções estratégicas e muito medo de si mesmos. A estabilidade é instável, como marxistas não podemos duvidar disso. A economia e a sociedade avançam de desequilíbrios em desequilíbrios. A estabilidade monetária antes de ser, conforme o senso comum, uma conquista, é fato trágico. A barbárie da criminalidade e a crise urbana são inversamente proporcionais à relação investimentos x PIB. Não podemos ser um país de cegos, guiado por cegos no rumo do abismo. A responsabilidade dos comunistas na atual quadra histórica de nosso país é muito maior do que nós mesmos imaginamos. Não nos percamos nas armadilhas e na sedução do curto prazo. * Da Comissão Auxiliar da Presidência Nacional do PCdoB e professor da Escola Nacional
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Reflexões e propostas para as Teses do 13°Congresso
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s teses para o 13º Congresso Nacional do PCdoB fazem um balanço dos governos Lula e Dilma, enfatizando que num primeiro momento o governo FHC instaurou um período de instabilidade política onde os neoliberais impuseram um grande desmonte no setor econômico e social do Brasil. Neste sentido podemos pontuar com mais ênfase o momento critico que os trabalhadores e trabalhadoras sofreram e que até hoje sofrem o amargo das atrocidades deste governo. Por Elza Sônia Duarte de Alencar* A flexibilização das leis trabalhistas, vieram culminar com as terceirizações e as cooperativas, que não condizem com o verdadeiro papel do cooperativismo, uma farsa para fortalecimento dos detentores das máquinas, fortalecendo a mais valia. A forma de contratação mais deprimente da flexibilização é a terceirização no Setor público, que vem a precarizando os serviços em total desrespeito a lei maior, a constituição que garante o concurso publico. Diante destes aspectos o PCdoB se apresenta com um grande desafio para a derrocada desta forma de relação de Trabalho. Seja através das mobilizações sociais ou denunciando nos parlamentos e instâncias dos governos, pois se trata de um partido que sempre esteve na defesa de um Estado Democrático de Direito com perspectiva de avançar para o socialismo. Temos que exigir a manutenção dos direitos garantidos perante as leis constituídas, tais como os concursos públicos a nível municipal, estadual e federal. No item 12 enfatiza a democratização, verdade, bem verdade, no entanto, percebemos a centralização das discussões nas grandes metrópoles. No que se refere às políticas públicas para as mulheres, como também a falta de ações nos interiores principalmente no nordeste, palco de uma cultura machista e preconceituosa repassada de geração e geração, onde a violência perpetua-se de forma brutal com o desrespeito a lei Maria da Penha. Só a lei não é suficiente, precisa de estratégias voltadas para a
educação orientando formadores sobre a questão de gênero que seja estendida para todas as famílias não só para as mulheres. No item 14 da tese fala-se dos amplos programas de inclusão social destacando os 30 milhões de pessoas retiradas da vergonha extrema da pobreza. Não podemos nos conformar com esta estatística. Nós do Partido Comunista do Brasil não queremos desigualdades, mas também não podemos nos conformar com isto. A bolsa família foi um projeto que seria substituído com ações voltadas para o resgate da desigualdade de homens e mulheres, no entanto há 10 anos a submissão de uma ajuda de custo não é o suficiente, falta trabalho, sem mais esta sujeição a esta situação deprimente, que não levanta a autoestima do ser humano. Como diz a canção dos Titãs: “a gente não quer só comida, a gente quer diversão e arte”. Somente assim poderemos chegar a um patamar de igualdade. E isso se pudermos por em prática um projeto de inclusão, através de cooperativas que socializem os lucros e dignifiquem o homem que poderão ser financiadas pelo Banco do Nordeste do Brasil como se faz o credi-amigo. Na página 11 relata-se o ingresso dos estudantes através do ProUni, que beneficia milhões de brasileiros, ocasionando inclusão social. Não restam dúvidas que este teve uma grande influência para a inclusão, mas como a bolsa família há também alternativas para que o governo não subsidie as universidades particulares, pois proporcionam prejuízos econômicos quando é dispensado da faculdade os impostos, deixando de circular as verbas que viriam dos mesmos e que poderiam ser investidas no saneamento básico, na educação e na saúde nos municípios e Estados, mantendo o papel do Estado, investindo no setor público, principalmente em educação e saúde. As universidades federais na sua maioria são constituídas de alunos oriundos das escolas privadas, pois os mesmos tiveram melhores oportunidades de aprendizagem, garantindo assim uma boa classificação nos vestibulares, enquanto alunos da rede pública não estão preparados para estes desa41
Tribuna de debates fios com leal concorrência. Portanto o PCdoB, como um partido revolucionário poderia propor o debate com a sociedade através de uma consulta popular sobre a grande deficiência pedagógica instituída nas escolas públicas e a inserção dos alunos oriundos das mesmas sem ter que passar por processo seletivo. A tese do 13º congresso na sua página 18 relata a grande vitória das domésticas em relação aos direitos adquiridos recentemente e garantidos pela Constituição Federal e CLT. Louvável! Mas, lamentável em um país capitalista de exploração desenfreada, onde os órgãos fiscalizadores estão sucateados, e as leis não são cumpridas de forma harmônica, e mesmo com pressões dos órgãos representantes dos trabalhadores como os sindicatos não têm a força suficiente de pressão contra os descumprimentos. Quem poderia defender com muita força esta categoria deveria ser o Ministério do Trabalho e Emprego, porém este órgão não têm critérios para a escolha dos coordenadores das Delegacias Regionais do Trabalho, pois são cargos políticos que funcionam de acordo com a conjun-
tura política do momento, não havendo fiscais que atendam as demandas para inibir os desrespeitos aos diretos trabalhistas. A prática dos patrões é de burlar as leis, deixado os sindicatos desmoralizados diante dos trabalhadores. Além das intervenções nos sindicatos por parte do Estado como na época de Vargas e no período da Ditadura Militar, onde havia intervenção nas eleições e nas administrações, controlando os bens das entidades sindicais. A Constituição é clara, garantindo a liberdade sindical sem a sua intervenção. Precisamos estar atentos para não sermos pegos de surpresa. Não bastam apenas leis, mas mecanismos que façam cumpri-las. Neste sentido os parlamentares do Partido Comunista do Brasil poderiam comandar uma grande luta nacional pela defesa da autonomia dos sindicatos e manter em constante evidência os direitos garantidos pelos trabalhadores, bem como avançar ainda mais as conquistas que o proletariado necessita, para que o plano de desenvolvimento do PCdoB se torne ordem do dia. * Militante do PCdoB, Crato-CE
Administrar e abrir o Partido
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PCdoB é um partido de envergadura nacional, nonagenário, detentor de uma história de luta em defesa do povo brasileiro e, sobretudo, concatenado, ao longo dos tempos, com as mudanças políticas vivenciadas no Brasil e, também, no mundo. Por Gutemberg Dias* Durante muitos anos, desde a sua fundação em 1922, o Partido manteve uma linha de atuação que focava seu crescimento de forma “interna corporis”, ou seja, devido às grandes perseguições nas quais seus membros foram submetidos, a própria essência partidária se ateve a dificultar o acesso de qualquer interessado ao seio da agremiação. Nada mais justo do que resguardar a segurança de seus membros durante os anos de ditaduras e perseguições sofridas àquela época. Nesse processo de fechamento, muitas discussões 42
foram feitas, muitos camaradas seguiram outros caminhos, mas a linha partidária foi mantida até alguns anos, quando de forma correta e inequívoca o Partido fez um chamamento a todos os seus membros em ousar e, sobretudo, abrir o Partido a todos aqueles que quisessem seguir as diretrizes partidárias e defender o socialismo com a cara do Brasil. Tivemos, e ainda temos embates de ideias no tocante à quebra dos grilhões da xenofobia partidária. Felizmente, hoje as atitudes da direção nacional e também, das teses dos últimos congressos, projetam um partido mais amplo e plural, desvencilhado do corporativismo exacerbado. O crescimento do Partido acontece de forma paulatina, mas de uma envergadura moral e organizativa exemplar. A forma de se organizar está centrada num modelo de Partido onde se tem claramente duas frentes coabitando, ou seja, as frentes política e a administrativa. É notório que o crescimento do
Tribuna de debates Partido não só acontece no campo da política e da institucionalidade. A organização administrativa talvez, seja o grande salto que essa agremiação deu após a redemocratização do Brasil. É imprescindível que a abertura que o PCdoB promoveu nos últimos anos seja capaz de mesclar todas suas matizes político-ideológicas com o fator administrativo. Pois, cuidando de forma profissional do Partido e deixando de lado o espontaneísmo, teremos um Partido forte e capaz de responder de forma rápida e concisa às mudanças sociais que acontecem, atualmente, de forma muito rápida, devido à grande força da comunicação virtual e da grande rede de computadores. Temos que abolir definitivamente as práticas corporativistas e estreitas que Lênin convencionou chamar de doutrinarismo “de esquerda”, para colocarmos o Partido, em todas as suas instâncias, numa linha de crescimento reto e organizado a partir de seu ideário político e de sua forma moderna de se autoadministrar. O Partido está acima de qualquer interesse particular. Ele tem vida própria e não pode ser confundido com uma entidade de apoio mútuo, ou seja, ele é um ente vivo que precisa de forças vitais (recursos financeiros, administrativos, logísticos, etc.) para continuar atuando na sociedade de forma incisiva e
levando seu ideário a maior quantidade de pessoas. Eis um ponto que todos precisam comungar ou arcar com as consequências do minimalismo. O 13° Congresso se avizinha e as teses precisam ser amplamente debatidas e pontos como esses, expostos neste escrito, podem ser pinçados do documento oficial para ampliação do debate, buscando, dessa forma, nortear as discussões mais amplas do âmbito das instâncias do PCdoB. Este texto é encerrado com uma passagem do livro Esquerdimo: Doença Infantil do Comunismo, para que todos possam refletir nesse processo de modernização partidária. “O que importa agora é que os comunistas de cada país levem em conta com plena consciência tanto as tarefas fundamentais, de princípio, da luta contra o oportunismo e o doutrinarismo de esquerda, como as particularidades concretas que esta luta adquire e deve adquirir inevitavelmente em cada país, de acordo com os aspectos originais de sua economia, sua política, sua cultura, sua composição nacional (Irlanda, etc.), suas colônias, diversidade de religiões, etc., etc.” Ser plural é o caminho da vitória comunista junto às massas. * Presidente do Comitê Municipal do PCdoB, Mossoró-RN
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O legado da era Lula - Dilma no ensino superior e seus desafios
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universidade pública brasileira, em especial, o sistema federal de ensino superior viveu nos últimos dez anos grande processo de transformações e discussões. Pela primeira vez o ensino universitário compartilha de uma agenda prolongada de oportunidades no sistema nacional de educação superior voltada ao projeto nacional para desenvolvimento do Brasil. Por Hélio Alves* O acesso ao ensino superior continua sendo monopólio social das elite que o utiliza como modelo de exclusão social. Em 2003, apenas 10% dos jovens entre 18 e 24 anos estavam matriculados em instituições, as quais 2% constituiam-se em universidades públicas. Mas, alguns indicadores apresentaram mudanças. Ao longo dos últimos 10 anos o orçamento do MEC triplicou, passando de R$ 17,4 bilhões, em 2003, para R$ 51 bilhões em 2010; chegando em 2012 em R$ 72,2 bilhões e R$ 92,5 bilhões em 2013. O governo federal nesse período investiu R$ 8,4 bilhões na expansão e reestruturação das universidades federais. Esses recursos foram acompanhados de expansão de pessoal com 42.099 postos de trabalho que foram abertos por meio de concurso, sendo: 21.421 para docentes e 20.678 para técnicos administrativos. O ReUni foi um dos melhores e maiores projetos estruturantes para a sociedade brasileira. Somente em 2012 foram contratados 3.059 professores para o sistema de ensino superior das universidades públicas. A expansão do ensino superior nesse período ocorreu, também, nas universidades privadas através do ProUni e do financiamento através do Fies. Esses investimentos em vagas e verbas permitiram ao país chegar em 2012 com 15% dos jovens entre 18 e 24 anos matriculados em instituições de ensino superior; e, uma projeção para 2020 de elevar as taxas para 30%, colocando o Brasil em patamar de igualdade entre os países das Américas. Mesmo assim, longe dos patamares da Europa e Estados Unidos que chegam a 85 a 90% e que estão em crescimento da universalização do ensino supe44
rior. Esse esforço nos levou a sairmos de uma escala evolutiva de 3 milhões e 500 mil matrículas em 2001para algo em torno de 7 milhões e 500 mil em 2012. Foi vitorioso projeto estruturante implantado em curto período, para nos tirar do atraso de décadas de falta de investimento na formação de quadros da nação brasileira. Mas isso não foi suficiente para atender as demandas em áreas estratégicas, como engenharia, onde temos uma falta de 30.000 profissionais, e medicina, onde existem enormes carências de profissionais no entorno das grandes cidades e no interior. A introdução do Enem-Sisu e a política de cotas sociais ajudaram a expandir o sistema de acesso, assim como a democratizar o acesso à universidade através de jovens da escola pública. Mas sem a continuidade de oferta de vagas, principalmente no ensino superior público, não iremos efetivamente trazer a maioria da juventude brasileira que está no ensino médio público para a excelência dos nossos cursos universitários. Ao trazer parcelas da escola pública para as universidades federais, para os cursos em período integral surgem desafios. Esse está relacionado às políticas públicas de cidadania que têm o objetivo de contribuir para a permanência de estudantes nas universidades, oriundos das classes C, D e E que hoje representam mais de 40% dos alunos regularmente matriculados. Sair de um orçamento de Assistência Estudantil de R$ 85 milhões em 2001 para R$ 650 milhões em 2012 foi um grande avanço nessa década, porém são recursos insuficientes para atender ao crescimento do sistema federal de ensino superior e a entrada de alunos de baixa inclusão social com o Enem-Sisu e as cotas sociais. É preciso entender que uma política de assuntos estudantis que vise à assistência do corpo discente não pode se limitar a criar e executar mecanismos destinados somente à população de baixa renda. Ela deve também se preocupar com princípios de atendimento universal, conforme preconiza a nossa Constituição Federal: Estabelecer políticas integradas, que visem ao atendimento das necessidades de todo o corpo discente já que o Estado retira do mercado de trabalho jo-
Tribuna de debates vens entre 18-24 anos, para na maior parte do tempo se dedicarem à formação em período integral. Não desconsiderando, entretanto, as especificidades como: Programa de Bolsa Permanência PBP do governo federal, de concessão de auxílio financeiro a estudantes matriculados em instituições federais de ensino superior, em situação de vulnerabilidade socioeconômica, e para estudantes indígenas e quilombolas. No ProUni, foram concedida mais de 1,1 milhão bolsas com 580 mil alunos atendidos, entre 2010 e 2012. Desde 2005 até hoje, o ProUni já beneficiou mais de 1 milhão de estudantes em todo o país. Ele surgiu como uma perspectiva de responder, de forma imediata, à pressão social de acesso ao ensino superior. Em especial esta resposta deve ser dirigida ao jovem trabalhador, que deve ser colocado como uma forma transitória, para que o Estado possa cada vez mais inverter a lógica do caráter privado da educação superior no Brasil, e garantir a expansão de vagas nas universidades públicas. Mas não podemos desconsiderar a relevância
dessa política na real expansão do ensino superior e colocar o ensino privado no Sistema Nacional de Educação, cobrando cada vez mais do MEC o controle social dessas instituições. Quando foi criada, a ampla maioria dos egressos trabalhava antes de ingressar na universidade, e se manteve inserida no mercado de trabalho após a conclusão dos cursos e com carteira assinada mostrando a relevância ao acesso desses jovens ao mercado de trabalho formal e a elevação da renda e mobilidade social. A nossa juventude quando luta por 100% da verba dos royalties do petróleo para serem investidos no setor da educação, assim como 50% do fundo social do Pré-Sal mostra o nível de compromisso com termos a educação como um fator estruturante no desenvolvimento do país e colocar a qualidade e excelência das universidades federais na ampliação e democratização do acesso ao ensino superior. * Membro da direção estadual do PCdoB, Rio de Janeiro.
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Ser governo
s teses apresentadas ao 13º Congresso do Partido coroam de forma exitosa o esforço do Comitê Central e de suas comissões de trabalho, de contribuir para o importante debate que ora inicia-se. Por Jairo José Junior* O texto é um bom ponto de partida para este fundamental evento da vida partidária. Não encará-lo como mera obrigação estatutária e buscar, sobretudo, desenvolver os documentos através de um debate vivo e participativo, indo além do que está escrito. Ao estudá-las resolvi, dentro das minhas limitações teóricas e intelectuais, destacar três aspectos, que apresentarei nos artigos a que tenho direito de acordo com as normas estabelecidas.
“Balanço do Decênio: Governos Lula e Dilma” Nesta parte a tese apresenta um balanço equilibrado e com grau de consistência razoável dos 10 anos de governoS dirigidos pelo PT. Com razão destaco: “O partido defende”, para a coalizão governista, uma relação na qual predomina a unidade, mas refuta o “seguidismo” preservando sua independência política com relação ao governo e continua “... julga que a crítica é indispensável ao próprio governo para corrigir descaminhos e a mobilização do povo é a força motriz indispensável às mudanças”. O que vejo, é que nem sempre ocorre desta forma. Não quero simplificar o exercício de tal constatação, pois considero que o dia a dia é repleto de armadilhas e condicionantes que a toda hora colocam a prova tal atitude. A definição é justam o esforço do núcleo dirigente central partidário é visível e meritório. Ser governo, não deve ser confundido com governismo. Pois um considera, a preservação da independência crítica o outro diz “amém” a tudo que do governo vem. Os governos no geral querem e adoram os seguidistas. O termo “seguidismo” grafado entre aspas na tese nos permite uma reflexão sobre como tem sido na 46
prática nossa participação no governo e se ela tem de fato nos conduzido, no seio da frente ampla que participamos, ao crescimento partidário e de nossa influência onde ela é necessária aos nossos objetivos estratégicos que é entre os trabalhadores e o povo. Considero imperativa a participação no governo que nós ajudamos a eleger. A sociedade não entenderia se nós assim não procedêssemos. Além disso, não seria correto nós emprestarmos nosso apoio e participação durante as campanhas e não durante o exercício dos mandatos. A questão se impõe ao nosso Partido como fruto, portanto, de um conjunto de circunstâncias. Mas será que nós estamos sendo suficientemente independentes e sendo reconhecidos como tal pelos trabalhadores e o povo? Claro que as limitações impostas por um ambiente onde somos via de regra amplamente minoritários, por vezes nos força a assimilarmos o “modus operandi” predominante. A resolução do 9º Congresso diz: “nós nos propusemos nestas funções barrar as consequências brutais do neoliberalismo que deixou sequelas e práticas perversas impedem que se consumissem danos irreversíveis à democracia, aos direitos sociais do povo e ao patrimônio econômico da nação” e vaticina “sempre buscando elevar a luta social e educar politicamente o povo”. Nós sabemos que a universalização é concreta, não deve diluir-se em matizes peculiares a cada caso, contudo, é importante avaliarmos de forma franca, transparente e corajosa, se o partido nestes dez anos em questão, não se deixou levar, aqui e acolá, por posições, que em nome da unidade ampla nos afastaram, mesmo que momentaneamente, dos objetivos buscados. Esta não é, repito, uma movimentação fácil. É preciso, que tenhamos (e nem sempre temos) mecanismos de aferição que a todo o momento nos ajudem a controlar a ação e quando necessário corrigir rumos daqueles que em nome do partido assumem funções nos governos. A nossa linha política exige a interação entre as frentes de luta teórica, luta social e luta institucional. A participação em governos, a conquista de governos e/ou cargos no executivo não é a nossa única tática. As vitórias neste campo são muito importan-
Tribuna de debates tes, mas não nos aproximarão automaticamente dos objetivos estratégicos. Um projeto verdadeiramente coletivo, transformador, em consonância com as aspirações populares, precisa encontrar nas nossas participações, estímulo e reforço. Não ser “seguidista” é, principalmente, construir no âmbito do governo e das frentes que participamos referências individuais e principalmente coletivas que aos olhos do povo apareçam como diferença positiva num ambiente que é muito criticado pela sociedade. No que pesa a tentativa da direita e das elites de tentar tirar proveito do ambiente crítico que se vive no país. É inegável que existe uma insatisfação popular e dos setores médios com o que eles entendem sendo descaso, lentidão, e até irresponsabilidade dos que governam. As passeatas de junho demonstraram isso. Nós devemos compreendê-las como, no geral, positivas. E é neste contexto que devemos debater este balanço com a militância e com o povo. No ambiente dos governos que participamos é necessário, ainda mais que antes, privilegiar a construção de uma ampla base de massas, construir re-
dutos sólidos em apoio à nossa corrente de opinião e pensamento, seja no esporte, na cultura, no turismo, meio ambiente, etc. Construir e fortalecer uma base social que reforce o PCdoB, enquanto projeto coletivo. Geralmente nós trabalhamos as lideranças que participam do governo para se tornarem candidatos. Só que nem sempre são eleitos, e isso termina por limitar o alcance de nossa participação. Resgato, por fim, um trecho (mais um) da intervenção ao 9º Congresso, primeiro a tratar desta questão de forma resolutiva: “devemos ressaltar que tal participação deve ocorrer nos marcos dos princípios e normas do nosso Partido, do desenvolvimento de sua identidade própria e de seu fortalecimento”. Mais a frente continua o texto: “... devemos ser autorizados pelo Partido a essa participação, prestar-lhes contas deste trabalho, submetê-lo ao crivo partidário e também da base social de apoio...” e por fim conclui: “... se a participação em governo fragiliza o trabalho da direção partidária, é pouco provável que avancemos em nossos objetivos”. * Membro da Comissão Política Municipal-SP
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Equilibrar e reforçar o tripé que pende para um lado
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Partido Comunista do Brasil tem se pautado, neste período de defensiva estratégica, de acumulação de forças por parte do proletariado brasileiro e internacional, pela combinação das ações institucionais e de massas. Por Jefferson Tramontini* É nítida a ascensão das forças do imperialismo após a queda da URSS e do Leste Europeu que, ainda hoje, dominam o cenário internacional, tanto do ponto de vista bélico, quanto econômico e ideológico, em que pese mudanças na correlação de forças, especialmente na América Latina. O Brasil não está imune a isso. A derrota das primeiras experiências socialistas coincidiu com os governos neoliberais que, sem entrar em maiores detalhes, por simples falta de necessidade, deixaram os ricos e suas máfias mais ricos e o povo trabalhador desempregado e mais pobre. Nesse cenário o Partido realiza o esforço de reafirmar seu projeto socialista e sua bandeira, sua identidade e; ser parte de uma ampla frente progressista, nos movimentos de massas e na institucionalidade, com objetivo de romper o cerco do capital. Com isso, além da abertura do Partido, mantendo seu centro único e qualificado de direção e do Programa Socialista, elabora-se uma diretriz de acumulação de forças, combinando três frentes indissolúveis, a luta de massas, a luta de ideias e a luta institucional. Essa diretriz, de três frentes concomitantes e complementares entre si, deve nortear toda a ação do Partido, em qualquer situação onde se encontre um de seus militantes. Esse é o tripé que sustenta a ação política dos comunistas para acumular forças e conscientizar a classe dos trabalhadores, com objetivo no socialismo. No entanto, por condições conjunturais e por equívocos de compreensão política de vários quadros partidários, o que temos, na prática, salvo exceções, é um tripé capenga. O relativo aumento da força eleitoral do Partido; a participação em gover48
nos progressistas, especialmente no governo federal; a letargia dominante no campo acadêmico e teórico; bem como a defensiva, ainda reinante, nos movimentos populares fizeram com que o ímã da institucionalidade atraísse as maiores atenções de nossa organização que, priorizando-a, deixou em segundo plano as duas outras pernas. Disso surgem inúmeras incompreensões, equívocos e mesmo degenerações. A ação institucional isolada das demais, especialmente em nosso torto sistema eleitoral, empurra o Partido a um pragmatismo rasteiro que, não poucas vezes, prejudica a conscientização do proletariado. Há um descompasso considerável, e perigoso, entre a luta institucional e as outras duas frentes. Como as candidaturas do Partido não possuem a máquina eleitoral dos partidos conservadores ou social-democratas, esse descompasso prejudica inclusive a luta institucional, pois inviabiliza o diferente, o novo, e minimiza a necessária base social de apoio ao projeto do Partido, prejudicando a conquista de corações e mentes, o que se traduz também em votos. Exemplo dessa realidade foram os resultados das últimas eleições municipais quando, mesmo aumentado à quantidade de votos recebidos e vencendo em importantes cidades médias, o Partido sofreu reveses importantes nas capitaiss que, além de constituírem o centro político, ainda concentram a maioria do proletariado. Não raro, dirigentes partidários tentam arrefecer greves de trabalhadores, especialmente quando há confronto com governos dos quais participamos. Muitas vezes o maior esforço de elaboração política se dá na construção de programas de governo, em detrimento do desenvolvimento do marxismo-leninismo. São sintomas do pragmatismo em nome de uma possibilidade eleitoral ou de uma pretensa governabilidade com forças heterogêneas. É necessário entender que não há problema no pragmatismo, desde que tático subordinado à estratégia contida no Programa; bem como que a conjuntura torna necessária a constituição de frentes amplas e heterogêneas em governos. Mas jamais se pode perder de vista a obrigatória distinção entre o
Tribuna de debates Partido, os movimentos populares e os governos, o Estado. A confusão entre esses elementos leva à degeneração, à perda do horizonte socialista e, portanto, da própria essência do Partido Comunista. O Partido ainda é pequeno, mesmo crescendo em número e influência política, se comparado à dimensão de sua tarefa histórica, a construção do socialismo no Brasil. Não há contradição entre a abertura do Partido às massas trabalhadoras, à intelectualidade progressista, aos meios artísticos e acadêmicos e a manutenção de sua organização leninista. O partido preconizado por Lênin é flexível e adaptável à necessidade política, porém, firme e inabalável em sua estratégia, seu programa, seu centro único de direção e seu compromisso de classe. Isso só pode ser garantido pela formação e zelo com os quadros partidários, com o reforço cotidiano do centralismo democrático e com a ação política a partir de organismos de base sólidos, que debatam e executem o Programa, mesmo que possam ser constituídas, hoje, de forma mais flexível que anteriormente. O Partido lançou a bandeira das reformas democráticas estruturantes, a saber, política; tributária; das comunicações; da educação; urbana e agrária. Movimento tático correto após a eleição de um governo de origem popular, porém, refém de
penosos acordos de classes. Tais reformas, mesmo não tendo ainda caráter socialista, são proposições para melhoria das condições de vida e elevação do protagonismo do povo trabalhador no cenário político. Mas o Partido fez com que essas bandeiras fossem vistas pela maioria da classe? Com exceções, obviamente, não o fez. As reformas ficaram restritas ao interior do Partido e a alguns espaços institucionais, privilegiando as negociações em torno desses temas e não a mobilização de amplas parcelas do proletariado capazes de forçar sua aprovação, mesmo que não em sua totalidade. O resultado é que as reformas não ecoaram no meio da classe e, dessa forma, não se concretizaram devido à força político-econômica e parlamentar da burguesia. O Partido Comunista, para realizar seu objetivo, precisa ser reconhecido como vanguarda pelo proletariado. O 13° Congresso deve fazer essas reflexões sobre o Partido e suas ações; deve reforçar a indissociabilidade do tripé da luta por acumulação de forças; deve se fazer ouvir e conquistar hegemonia política no meio da classe, sob pena de se perder no caminho, caindo na vala comum e inviabilizando a perspectiva de um Brasil socialista. * Militante do PCdoB, Ceará
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Tribuna de debates
A forma leninista perdeu a validade?
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ara um Partido Comunista a questão da forma não é secundária, porque diz respeito à natureza proletária e aos objetivos revolucionários estratégicos da organização. Por Jeosafá Fernandes Gonçalves*
Esse aspecto foi alvo de acérrimas polêmicas no período da 2ª Internacional e, a rigor, só foi equacionado satisfatoriamente no âmbito da Revolução Russa de 1917, quando Lênin, num combate teórico e ideológico agudo a Plekanov e a diversas outras correntes políticas atuantes no campo revolucionário, sistematizou as duras experiências dos trabalhadores russos e envidou todos os seus esforços intelectuais e sua vida para estruturar o PSDOR (depois Partido Comunista). Obviamente o Brasil não é Rússia de 1917, e perto de 100 anos nos separam da revolução que virou o século 20 do avesso e de cabeça para baixo. Porém é necessário refletir: 1) se a forma de organização revolucionária proposta por Lênin está superada e decidir e 2) em caso afirmativo, se ela é ainda referência prática, não apenas teórica, para os comunistas do PCdoB. Essas duas indagações ganham certa feição retórica, uma vez que os estatutos do PCdoB são peremptórios na defesa da forma leninista de organização partidária. No entanto, entre as letras dos documentos partidários e a realidade há um hiato que merece ser alvo de debate. Os estatutos do Partido estabelecem uma situação que deve ser perseguida diuturnamente por todos os militantes, da base ao Comitê Central, mas que é fruto do embate consciente entre a determinação militante e a realidade social, na qual o Partido se insere e na qual busca extrair os melhores lutadores. Movimentos sociais, culturais, intelectuais, populares têm sua própria forma de organização, sempre adequadas dinamicamente aos respectivos objetivos. Quanto mais fortes e atuantes esses movimentos, mais suas formas de organização repercutem em outras das quais estão próximos ou com as quais compartilham militantes. Estruturas não são despidas de sentidos: são entes históricos, portam 50
carga social e, antes de formas vazias, muito menos neutras, são verdadeiros depositórios de culturas organizativas, hábitos, costumes longamente sedimentados e práticas sociais intrinsecamente ligadas às origens de que partem. Quando o Partido opta corretamente por se enraizar em todas as dimensões da vida social, por um lado o faz estabelecendo canais e estruturas de contato com todas as organizações com as quais se comunica, porém, não o faz sem riscos, uma vez que é também um organismo vivo e sob pressão em sentido contrário: as organizações com as quais se comunica também, voluntariamente ou não, podem, numa relação dialética de pressão e contrapressão, exportar para o Partido suas práticas, seus costumes, suas culturas organizativas. Caso no campo da luta política o Partido não equacione dinamicamente essa contradição, na prática, vai tendo suas estruturas assimiladas às das organizações sociais com as quais faz interface, seja elas sindicatos, associações de moradores, grupos culturais, gabinetes parlamentares ou do Poder Executivo, entre outros. Uma vez que nenhuma estrutura é neutra, imperando em organismos do Partido costumes, práticas e formas de mobilização exteriores a ele, esses organismos deixam de perseguir, na prática, os objetivos partidários, e passam a se converter em satélites de objetivos circunscritos à organização com a qual se comunica. Obviamente o Partido não deve impor sua cultura organizativa sistematizada nos Estatutos às organizações de massa, muito menos converter gabinetes parlamentares ou dos Executivos de que faz parte em meras extensões de comitês partidários. No entanto, há que se cuidar para que o Partido não se dilua na prática, pois, quando isso ocorre, a própria forma leninista foi simplesmente destruída. A estruturação partidária leninista diz respeito a um longo estágio da luta de classes divisado por Lênin, na qual a luta contra as formas cada vez mais monopolistas e financeirizadas do capitalismo exige uma organização revolucionária hierárquica, cujas bases, órgãos políticos de circunscrição claramente definida, têm por responsabilidade, na luta prática e na luta de ideias, disputar e conquistar corações
Tribuna de debates e mentes para transformação revolucionária da sociedade. Essas organizações de base, por sua vez, reportam-se à estrutura partidária imediatamente superior e esta à qual se submete e assim sucessivamente. Uma vez diluída, vale dizer, destruída, a estrutura da base, os militantes não mais se reportam à estrutura superior, mas ao líder pessoal, ao chefe do departamento, ao parlamentar, ao secretário de governo ou ao amigo de maior experiência. O problema, então, não é haver lideranças carismáticas, nem chefia de gabinetes, nem parlamentares ou mesmo prefeito comunistas ao contrário, é extremamente necessário que haja mais, posto que a luta hoje tem nos Executivos e parlamentos o epicentro, sem sombra de dúvidas. O problema é nos descuidarmos de diariamente, dinamicamente, dialeticamente, insistentemente lutarmos para manter as estruturas partidárias em funcionamento com objetivos e tarefas mediatas imediatas claramente estabelecidas. Se do ponto de vista programático e estatutário
o PCdoB está no caminho certo desde 1922, muitas vezes áreas do Partido se descuidaram desse particular. O resultado não custa a aparecer: perda de mandatos, perda de sindicatos, perda de militantes e perda de rumo. Dos órgãos partidários, nestes tempos de crescimento do Partido e de ampliação de influência, os mais necessitados de cuidados são os intermediários e as células de base, verdadeiras placentas de militantes revolucionários. São eles também os mais frágeis e expostos a, no embate de classes, verem suas estruturas se diluírem em face de outras, externas ao partido, mais poderosas. Em que pese à consistência dos atuais documentos partidários, as duas indagações do segundo parágrafo deste texto não podem ser respondidas de uma vez para sempre: precisam ser respondidas cotidianamente, uma vez que ser comunista, não sendo uma opção definitiva, é um batismo diário. * Militante PCdoB, São Paulo
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Tribuna de debates
O papel do PCdoB na atual conjuntura
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visão de que a luta para uma transição para o socialismo ao nível dos países não teria mais viabilidade nos parece equivocada, pois as lutas nas instituições do capitalismo internacional são muito lentas e enfrentam grande resistência da classe econômica conservadora com o surgimento e reaparecimento de forças de extrema direita, principalmente na Europa, onde a crise do capitalismo se faz mais forte a avassaladora. Por Jerônimo de Boni* Os movimentos de instituições, como o FMI, que para dar auxílio exige forte ajuste fiscal e politicas econômicas que têm efeito negativo direto aos trabalhadores. Cada Estado tem peculiaridades específicas no sentido político, econômico, cultural e principalmente social. No que tange ànação brasileira os governos progressistas que tiveram a participação do PCdoB a partir de 2002 mostraram um avanço considerável das classes baixas, inflando uma classe média que sendo “trabalhada” pela imprensa culminou nas desfocadas “manifestações de junho”. Os manifestos iniciaram legitimados em cima de uma luta por um pacto nacional de mobilidade urbana, que se faz cada vez mais necessário devido ao aumento da renda e das condições de vida do povo brasileiro. Aproveitando esta mobilização de massas a classe média pequeno-burguesa tradicional foi às ruas reivindicando o movimento sob a motivação principal da “luta contra a corrupção” e responsabilizando integralmente os governos progressistas por isto. Esta insuflada classe média se utilizou deste movimento para manifestar todo o descontentamento com vários avanços que tivemos, como: direito do filho do pobre frequentar a universidade juntamente com o filho do doutor; o direito da classe baixa construir com subsídios estatais a sua casa própria e não pagar mais o absurdo aluguel de propriedades arcaicas localizadas em guetos; A possibilidade que o povo tem agora de viajar de avião, até para o exterior, transformando os aeroportos em verdadeiras “rodoviárias”; A 52
obrigação de agora ter que pagar os direitos trabalhistas às domésticas que viviam em situação de semiescravidão, entre tantos avanços econômicosociais. A principal função do partido é hegemônica, isto é, a de direção (influência e orientação) política e cultural das massas, da sociedade e, última fase do processo, do Estado. Esta função deve ser feita através das claras informações, sem qualquer inocência no todo do processo, pois vivemos situação análoga na situação de pré-golpe de 1964. Hegel já alertava que “a história se repete, pelo menos duas vezes.”, porém completando, Marx escreveu que “a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”. É importante preservar taticamente as condições de liberdade que permitam o avanço democrático para o socialismo e para isso a atuação do Partido no que tange a influência das massas é deveras importante e crucial para que exista, inevitavelmente, o processo de transição. Essa preservação deve partir do Partido, de forma afirmativa, orientando a totalidade dos seus militantes a fazer parte deste processo, vislumbrando a estratégia partidária, colaborando para a construção do socialismo. A atuação partidária será principalmente de propaganda junto à população, através da reafirmação de nossas políticas e acumulação de forças, tanto na exposição de quadros eleitorais como com a reacumulação de forças nos movimentos sociais. Jamais devemos esquecer a importância e influência sobre os povos, de eventos e intervenções culturais e políticas transversais ao sistema capitalista. Mas não restam dúvidas de que as classes e camadas subalternas e suas lideranças podem estruturar-se e desenvolver um conjunto de ações políticas e de lutas, que permitam uma progressiva acumulação de forças com o propósito estratégico do seu acesso ao poder político, sem o qual não há mudança de estruturas possível. * Militante e coordenador da Base de Educação e Cultura do PCdoB, Passo Fundo-RS
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O Partido e as Manifestações de Junho
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Partido operário deposita todas suas esperanças nas massas, mas não em massas atemorizadas, que se submetem com passividade e toleram resignadamente à opressão, mas em massas conscientes, que reivindiquem e lutem V.I Lenin – Os Comunistas e as Eleições. Por João Augusto Moojen* Muito se ouve que o Partido deve “ouvir as ruas”, inclusive descrito no item 88 de nossas teses. Penso que esta premissa coloca o Partido em condição de coadjuvante nas lutas que virão, como fomos nas travadas com as manifestações ocorridas no mês de junho, e nos mostra uma dificuldade para compreender o que ocorreu nas cidades brasileiras desde o inicio de junho. Não faltam teorias e conceitos, o que falta é análise política, análise concreta da situação concreta. Nosso Partido tem o papel histórico de ser a vanguarda revolucionária, com objetivos permanentes, estratégia de ação e nossa afirmação como comunistas. A voz das ruas que atingiu alto e bom som mostra a emergência de um novo modo de luta política e o esgotamento do atual. Nas últimas décadas se formatou um modelo de crescimento e de ascensão social onde se obteve algumas conquistas, mas criou muitas ilusões consumistas naturais do capitalismo, jogando os trabalhadores numa armadilha, da qual eles agora querem se libertar. Os milhões que foram às ruas ou pelas redes sociais mostraram um claro indicativo de que as instituições governo, parlamentos, sindicatos, partidos estão desacreditadas, prova disto foi a não aceitação de bandeiras, e não basta a análise simplista de que as manifestações foram encabeçadas pela classe média e pelos que são contra o governo Dilma.
Não haviam pautas definidas nas manifestações, mas as que predominaram foram avançadas, no campo político o “Fora Rede Globo” e na luta de classes “que os ricos paguem à conta”. Quem foi para as ruas acumulou esta experiência. Penso que nossa atuação no movimento foi tímida e com excesso de cautela, havia opiniões internas de que o movimento foi dirigido pela direita e pela mídia, ora camaradas em todo movimento há disputas e quando estabelecemos estruturas de contato com as massas, não o fazemos sem riscos, pois somos um organismo vivo em constante luta dos contrários. Porém, mesmo com nossa tímida atuação, conseguimos junto com outros setores avançados, neutralizar a direita e a mídia. Acredito que temos a obrigação de sermos protagonistas e dar continuidade às ações de rua para avançar na luta, visto que, o governo Dilma hoje, na sua essência, é de centro e só vai avançar para esquerda se for com pressão popular. Essa tarefa é nossa e não é pelo fato de estarmos no governo que não temos que travar a luta de classes também fora das instituições. Lênin assim defendia: “O Partido deve saber combinar acertadamente o trabalho ilegal com o legal”. Nossa ação como Partido revolucionário leninista não pode estar presente somente na teoria e no discurso. Nosso Congresso vem em boa hora, onde penso que o principal tema a ser aprofundado é o tema sobre o Partido, quem somos o que queremos e nossa missão histórica, pois não podemos ser um organismo sem rosto, pautado pelas prioridades das ações governamentais e parlamentares, descuidando de nossa estrutura partidária organismos de base, que hoje, em grande parte, de forma equivocada, estão atrelados a chefes de governo, parlamentares ou líderes pessoais. * Militante do PCdoB, Porto Alegre-RS.
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A luta ambiental anticapitalista e anti-imperialista
A
questão da defesa do meio ambiente, abordada pelas Teses para o 13º Congresso, nos parágrafos 151 e seguintes, explicita a preocupação dos comunistas contra as profundas agressões à natureza que decorrem da busca absoluta do lucro típica do modo de produção capitalista. Por José Carlos Ruy* Não é uma questão nova para os comunistas; a denúncia destas agressões já está presente na obra fundadora de Karl Marx e Friedrich Engels, ou em escritos de estudiosos e dirigentes soviéticos da década de 1930. Em sua voragem insaciável de lucros cada vez maiores, o modo de produção capitalista explora os trabalhadores e a natureza, submetendo -os às imposições comandadas pelo dinheiro. É importante destacar isto, pois, de maneira unilateral, é comum a acusação de que os pioneiros da construção do socialismo foram responsáveis por desastres ambientais que igualariam a atuação dos dois sistemas, o capitalista e o socialista. É uma maneira de ver canhestra, que disfarça mal a apologia do modo de produção capitalista. É preciso reconhecer a diferença fundamental entre os dois sistemas. Sob o capitalismo as agressões capitalistas são movidas pela busca do lucro; sob o socialismo, pela busca do desenvolvimento e pelo empenho em construir uma sociedade capaz de atender às necessidades de todos os seus participantes. Esta é uma diferença essencial. É preciso lembrar também que as ações socialistas que resultaram em desastres ambientais ocorreram na mesma época em que, nos países capitalistas, a natureza era vista como fonte inesgotável de riquezas que podiam ser sacadas privadamente, gerando desastres muito mais profundos. Os comunistas, corretamente, relacionam a defesa da natureza com as necessidades do desenvolvimento. Considerando a questão ambiental como “parte integrante de um novo salto civilizacional”, nunca minimizam a dimensão humana envolvida nele, e enfatizam o homem como parte integrante 54
da natureza. “Na relação do homem com o restante da natureza, o marxismo privilegia o ser humano”, dizem as Teses. Não existe um ser humano abstrato, nem uma natureza abstrata - neste sentido, corretamente, as Teses acentuam as dimensões nacional e de classe que perpassam as relações entre os seres humanos e a natureza. Assim, o desenvolvimento sustentável soberano que os comunistas defendem tem três eixos fundamentais - o econômico, o social e o ambiental. Mas é importante avançar nas Teses, e afirmar com clareza o caráter anticapitalista e antiimperialista da luta pelo desenvolvimento sustentável soberano e pela defesa da natureza. Os comunistas não defendem a natureza e o meio ambiente à maneira dos demais ambientalistas que, quase sempre involuntariamente e de boa fé, deixam de dar esse passo essencial na compreensão da questão e deixam de incorpora a visão do caráter de classe (anticapitalista) e nacional (antiimperialista) da luta ambiental. É preciso destacar isto com força num programa que aborda “as condições da nova luta pelo socialismo”. Faz parte deste programa a defesa do direito ao desenvolvimento, como as Teses acentuam. Não se trata de qualquer modelo de desenvolvimento, mas da defesa do atendimento das necessidades das pessoas, e não das imposições da busca desenfreada do lucro. Neste sentido, o modelo de desenvolvimento defendido pelos comunistas rejeita a maneira predatória e irresponsável do modo de produção capitalista. O Novo Modelo de Nacional de Desenvolvimento não esquece as condições concretas da sociedade concreta em que se vive hoje, e não faz apelos utópicos contra a presença do lucro, móvel do modo de produção capitalista ainda dominante. Mas a aceitação destas condições não significa a rendição perante elas; exige a luta contra elas! Luta por cidades mais humanas, por moradias dignas, pelo saneamento, contra a especulação imobiliária, contra o transporte individual e pelo transporte
Tribuna de debates público de qualidade, contra a poluição do ar, das águas, dos solos, visual e sonora, por uma agricultura ambientalmente não agressiva, pela integridade das florestas, dos rios e do mar, pelo direito à alimentação regular e saudável; é a luta por um modelo de desenvolvimento mais avançado e justo que ultrapasse o modo de produção capitalista. Faz parte essencial desta luta a denúncia das agressões ambientais promovidas, para benefício de poucos, por este modo de produção baseado na busca de lucros gananciosos. Esta é a face anticapitalista da luta ambiental. Esta face anticapitalista só se completa com a dimensão antiimperialista da luta ambiental. A defesa pelo direito ao desenvolvimento se confrontou, nos fóruns internacionais das últimas décadas, com a pregação pelos países dominantes do desenvolvimento zero, do congelamento do desenvolvimento. Pregam esta tese com a desculpa esfarrapada da defesa da Terra, embora não existam provas científicas - apesar de todas as alegações em contrário feitas pelos ideólogos capitalistas que se disfarçam de ambientalistas - da alegada capacidade humana de colocar o planeta em risco. Na verdade, se deixassem de falar em “defesa da Terra” e apregoasse a “defesa do modo de produção
capitalista”, aqueles ideólogos seriam mais francos. Mas não podem ser tão honestos e defender o indefensável: o congelamento do desenvolvimento dos povos pobres que habitam a Terra, e precisam criar as condições de superação de sua pobreza. Os impasses que marcaram todas as reuniões mundiais sobre o clima, desde 1972, ocorreram sobre este pano de fundo: a pretensão dos países capitalistas de paralisar o desenvolvimento do mundo pobre e, assim, manter o status quo mundial que justifica e sustenta a distribuição internacional do poder e da riqueza, da qual o imperialismo se beneficia. Isto é, nas condições concretas do capitalismo contemporâneo, lutar em defesa da natureza e do meio ambiente tem o duplo caráter antiimperialista (a luta pelo desenvolvimento das nações) e anticapitalista (a luta por um modelo de desenvolvimento cujo escopo seja o atendimento das necessidades humanas e não a ambição do lucro). Estas duas dimensões precisam, por isso, serem afirmadas com clareza num programa comunista voltado para as novas condições da luta pelo socialismo. * Membro da Comissão Nacional de Comunicação.
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O óbvio precisa ser dito
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or mais que esteja fora do alcance das gerações atuais e das próximas gerações deste século, trabalhamos para que um dia a sociedade comunista se torne realidade. Esta possui apenas referências gerais sem nenhuma elaboração mais profunda ou desenvolvida sobre o que seria esta inédita experiência política, econômica, cultural, social e jurídica, definida por Marx como uma sociedade sem classes, sem Estado, sem hierarquia, sem exploração do homem pelo homem. Por José Carlos Madureira*
Uma ilação possível e inicial seria a exigência mínima de instituições com essa perspectiva e um elevado grau de consciência do ser humano em sua fase adulta. O caminho para chegar neste elevado grau de vida econômica, política e social é o socialismo e nós, engenheiros sociais contemporâneos, não saberemos com antecipação como será, quando, em quanto tempo, em que data ou em que período ocorrerá. Dito isto, é preciso resgatar a compreensão do caráter de transitoriedade do sistema socialista para nós comunistas, ou seja, não é o fim em si mesmo e sim um caminho, uma transição, um lugar de passagem do capitalismo para o comunismo, com fases, etapas, transições, recuos e avanços. Como sistema de transição ainda guardará uma sociedade dividida em classes, com todas as consequências deste conceito, o que acentua a necessidade e a clareza de um novo bloco histórico, uma nova hegemonia política e ideológica, uma nova maioria para um novo poder político de Estado que de conta desta transição. O movimento comunista internacional viveu sua primeira experiência prática na Rússia e logo expandiu sua força para os países vizinhos, constituindo assim a URSS, hoje extinta. Logo após, processos revolucionários se seguiram na Europa Oriental, na Ásia, na África e nas Américas, todos sem exceção entenderam a questão nacional no seu tempo histórico, souberam identificar qual era o curso político, econômico, cultural, social e jurídico de suas respectivas nações, desencadeando processos de luta política para atingir a ruptura com o velho sistema (colonialismo) e dar inicio à transição da velha para a nova ordem (modernidade). 56
Este período estava contextualizado pela ação imperialista e pelo processo de descolonização com consequente formação das “condições modernas”, ou seja, Estado moderno, economia nacional, industrialização, burguesia nacional, operariado, proletariado e demais instituições próprias da modernidade. Naquela fase do desenvolvimento capitalista (civilização ocidental) conceber duas etapas para a revolução era coerente e consequente com o momento, pois construir as condições modernas significava uma revolução para as ex-colônias e ao mesmo tempo poderia constituir contradições entre as nascentes burguesias nacionais com as burguesias imperialistas. Neste curso surgiram processos de conteúdo pró-socialista, mas também processos de conteúdo pró-capitalista. No final do século 20 presenciamos a queda da URSS e dos países do Leste estabelecendo o fim da Guerra Fria, iniciando o período da Globalização (hegemonia do capitalismo), com a unipolaridade norte-americana. No embalo da era do conhecimento e da revolução tecnológica, o imperialismo estadunidense impõe a abertura das fronteiras econômicas, nas nações em desenvolvimento, para livre circulação do capital estrangeiro produtivo e, ou especulativo. No caso brasileiro, além de derrubar barreiras para livre circulação, foram realizadas privatizações de empresas estatais estratégicas, quebra de monopólios, associações de empresas nacionais ou bancos com capital estrangeiro, entre outras medidas. O processo de internacionalização das economias promoveu fusões, formação de oligopólios, aumentou ainda mais a concentração da riqueza em poucos países e as burguesias nacionais não assumiram nenhum papel de contestação dessa ordem ou muito menos conduziram movimentos de defesa de suas respectivas soberanias, na verdade defenderam e se incorporaram ao processo de integração internacional, deixando claro que sua perspectiva é da maximização do acúmulo de capital e por consequência do lucro na disputa de mercado externo, com foco na competitividade e não mais no desenvolvimento das nações. O movimento geral foi muito claro, desmonte do Estado nacional na parte
Tribuna de debates econômica, comercial, financeira e em alguns casos até mesmo militar. Em nosso país é muito fácil de demonstrar tal opção na produção agrícola (agronegócio), altamente mecanizada, industrialização de ponta, voltada para o mercado externo, sem nenhuma demonstração de preocupação com o desenvolvimento da nação, apenas para disputar o mercado internacional, privatizações de áreas estratégicas para qualquer desenvolvimento nacional soberano, entre outras medidas. Este rumo no Brasil foi bancado pelo PSDB, DEM e PMDB. Iniciamos o século 20 com a corrida pela construção das condições da modernidade capitalista em disputa com as condições da modernidade socialista, o concluímos com a hegemonia do capitalismo. Iniciamos o século 21 com uma crise no capitalismo de proporções inimagináveis, exponencialmente muito maior do que a de 1929, crise que atinge o coração do sistema capitalista. Não é uma crise de um só país, é uma crise geral, mas atinge o principal centro de maior poder econômico, político e militar do mundo, os EUA. Esta crise aponta para uma mudança na política mundial. Já é possível vislumbrar
o fim da unipolaridade norte-americana e a multipolaridade se estabelecendo no jogo internacional, o que seria muito positivo para as nações em desenvolvimento, mas ao mesmo tempo uma bomba relógio em função das políticas protecionistas dos grandes centros do capital. Não está na ordem do dia a revolução socialista simultânea, assim como também não há indicativos de revoluções nos grandes centros capitalistas. É preciso observar as condições concretas de cada país na luta da velha ordem com a nova ordem, onde sinais de ruptura estão em desenvolvimento. No início do século 20 a luta pela soberania se materializava na construção dos elementos que a constituem. A luta hoje não é pela construção dos elementos da soberania. É preciso dizer com muita clareza o que é lutar pela soberania hoje, para ter claro o que será possível conquistar nos marcos do sistema capitalista. A natureza da atual crise do capitalismo não permitirá alternativas fora de seu escopo. * Membro do Comitê Estadual do Rio de Janeiro
A questão da terceira idade Partido e terceira idade: Um momento histórico. Por José Lucio da Silva* Proponho ao artigo 56°: Esse dispositivo já existe no estatuto do Partido Comunista Chinês. Os orientais e os africanos dão muita atenção aos idosos, enquanto os ocidentais não absorvem a cultura dos idosos. Dados atuais do IBGE sobre a terceira idade no Brasil:
O número de idosos segundo a ultima avaliação é de 73,3 anos de expectativa de vida da população brasileira. Diante dessa realidade, proponho a esse Congresso a criação do conselho nacional de idosos do PCdoB. Dentro da ótica vertical: Constituindo o conselho nacional, estadual e municipal, nas estruturas partidárias, dentro das proporções de avaliação do IBGE. Obedecendo as proporções de gêneros na formação do conselho de idosos do Partido. * Militante do PCdoB, Niterói, RJ 57
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Mais progresso social
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Art. 149
s questões raciais não estão expostas dento do nível cientifico e histórico, cujos objetivos são desmantelar o racismo institucional de Estado implantado após abolição em (1888) construído pelos filhos dos senhores donos de escravos e filhos de imigrantes europeus. Estado esse que não definiu o projeto de nação brasileira. Por José Lúcio da Silva* Antes descrever teoricamente o projeto de nação, um fator histórico que devemos denunciar: Em 05 de dezembro de 1824, houve a lei completar a constituição do império: Nesta lei completar o império brasileiro proíbe que escravos (oriundos da África) e leprosos a frequentarem escolas públicas. Não era fundamental para o império instruir a escravaria, a classe trabalhadora escrava. Os senhores donos de escravos e os legisladores da época cometiam crimes. Passaram 188 anos e a lei não foi revogada até hoje. É neste momento que começa a se desenhar o projeto de nação europeia, digo, Eurocentrista para o Brasil. Assim inicio do racismo institucional de estado no Brasil, e o mesmo tem esta divida para o povo negro que terá que ser reparado pelo estado brasileiro. Faz-se necessário neste momento inclusão na tese do 13º congresso a definição da nação: Esta nação esta desenhada depois da abolição, pelos filhos de senhores donos de escravos e filhos de imigrantes europeus, e não incluíram no projeto de nação os negros e indígenas (verdadeiros donos das terras).
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Precisamente em 1914 Stálin começou o estudo das nacionalidades na Rússia e nele define o projeto de nação agora com a participação de Lênin. Aprovado o projeto de nação, definiram o projeto de Estado a ser construído estados socialistas, Lênin escreve: “ Queremos alcançar uma organização nova e melhor da sociedade,na qual não haja ricos nem pobres, e todos tenham que que trabalhar! que não sejam um punhado de ricaços, mas sim todos trabalhadores proveito dos frutos do trabalho de todos! Que as maquinas e outros aperfeiçoamentos facilitem o trabalho de todos e não sirvam apenas para enriquecer alguns a custa de milhões e milhões de homens do povo! Esta sociedade nova e melhor se chama sociedade socialista a doutrina que trata dessa sociedade se chama socialismo.
Concluindo: A definição de projeto de nação de nação é o primeiro passo para participação de todo o povo desta nação para construção do estado socialista. Para tanto precisamos que o PCdoB convoque uma conferencia nacional para sociedade civil participar: Os povos indígenas (Os verdadeiros donos das terras no Brasil )Os povos negros como os Quilombolas, enfim, todas as entidades que se relacionam com as questões raciais no país, as igrejas que possuem pastorais de negros, os terreiros de candomblé e comunidades de matrizes Africana. Assim se inicia a construção de uma nação que inclua seu povo verdadeiramente Brasileiro e caminhe para construção do socialismo. * Membro do Comitê Municipal de Niterói-RJ
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Privatizar a educação é a solução?
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efinitivamente, a resposta é não. A alternativa para fortalecer a educação no país passa por uma forte e necessária política de Estado que mire a valorização dos professores e técnicos que atuam nas instituições escolares e nas universidades públicas Por José Luis Simões* A partir dos anos 1980 importantes mudanças aconteceram nos sistemas de educação de países desenvolvidos. Na América do Sul, especialmente no Brasil e na Argentina, mudanças gerais na direção de pavimentar o setor educacional para o processo de privatização tiveram seu auge no final dos anos 1990. E esse movimento continua a recrudescer. O lobby dos empresários da educação no Congresso Nacional é forte na direção de isentar ou amenizar taxas e tributos pagos por essas instituições. O ProUni, por exemplo, é um sistema de bolsas assumido pelo governo federal que financia o estudante universitário dentro de uma instituição privada. Em suma, é o poder público financiando o setor privado. É uma “privatização dissimulada”. Não podemos negar aspectos positivos nas instituições privadas de ensino, em todos os níveis da educação formal. Em primeiro lugar, algumas instituições podem ter melhores professores mediante oferta de salários mais atrativos e boas condições de trabalho. Então, propõe comprometimento a partir de estratégias empresariais, incluindo sistemas de avaliação e desempenho. Na verdade, é um mercado: a boa “mercadoria”, em geral, é mais procurada, por isso, tem mais valor.
Outro aspecto que conta a favor do sistema privado de ensino é a capacidade gerencial, ou seja, se uma torneira, um quadro negro ou um freezer se quebra, imediatamente o proprietário providencia a reposição, afinal, a ordem é atender bem ao cliente, no caso, os estudantes. Para aquisição de bens nas instituições públicas é preciso iniciar um processo de “licitação”. Assim, se burocratiza a manutenção da escola, da universidade, emperrando a gestão administrativa, o meio (gerência administrativa) prejudica o fim (formação do educando). E some-se a esse tipo de dificuldade a má gestão pública, muitas vezes desconectada do cotidiano da instituição de ensino. Mas é preciso fincar bases na seguinte tese: educação não é mercadoria. Os rumos da educação no país não podem ser definidos pelo setor empresarial. A política educacional é dever do Estado e a construção de uma nação mais desenvolvida é responsabilidade dos gestores do Estado e, portanto, cabe ao poder público definir os rumos e assumir as rédeas do sistema educacional no Brasil. Educação é elemento-chave para um país mais desenvolvido, justo e democrático. Investir em educação é investir em oportunidade, em produção do conhecimento, em formação de cidadãos críticos, conscientes, participativos e exigentes de uma sociedade cada vez melhor. E educação pública não é gratuita, muito pelo contrário. É paga. É muito bem paga pelos impostos que recolhemos cotidianamente. * Coordenador do Comitê PCdoB na UFPE, Centro de Educação UFPE
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Defender o caráter revolucionário do PCdoB
esde a derrocada das primeiras experiências de construção do socialismo na ex-União Soviética e países do Leste europeu, o mundo tem passado por muitas transformações. Radicais alterações na correlação de forças entre as correntes revolucionárias e o imperialismo ainda marcam negativamente o desenvolvimento da luta de libertação nacional e social dos povos e dos trabalhadores em todo o mundo. Por José Reinaldo Carvalho*
Se bem seja verdade que no início do século 21 se operam lentamente modificações positivas na acumulação de forças, é forçoso reconhecer que ainda vivemos no quadro geral da derrota histórica das forças da revolução e do socialismo, inteiramente contrastante com a época gloriosa da história da humanidade, que vem desde 1848, quando Marx e Engels escreveram o documento fundador do socialismo científico, o Manifesto Comunista. É inegável que a partir deste evento, os trabalhadores e os povos oprimidos lançaram-se em epopeias gloriosas para “conquistar os céus de assalto”, e efetivamente alcançaram marcantes vitórias que condicionaram o desenvolvimento de toda uma época histórica. Foi a grande época de afirmação teórica e prática do partido comunista. Igualmente é inegável que ao serem liquidadas essas conquistas, a história deu um grande salto para trás, o que obviamente influi no rebaixamento do nível de consciência e no surgimento de tendências à capitulação. Tendo destruído importantes conquistas civilizacionais, a derrota histórica do socialismo espalha seus efeitos deletérios, sobretudo no plano da subjetividade. Princípios da teoria e da prática revolucionárias são alvo de sistemática negação e a aparente força dos fatos é tão avassaladora, que os dogmas revisionistas que se apresentam como versões rebuscadas do liquidacionismo e do oportunismo de direita, adquirem foro de cidadania e passam a ser objeto de culto. O próprio conceito de partido comunista, sua necessidade como instrumento para dirigir a luta emancipadora da classe operária, é 60
posto em causa. Os processos atuais de transformação política e social prescindiriam supostamente de um partido desse tipo e, no caso de sua preservação, este deveria passar por tamanhas modificações políticas, organizativas e até mesmo ideológicas, que se transformaria em seu contrário, dele mantendo-se não mais que o nome, mas não a identidade nem a essência e o caráter. Num ambiente de ataque às conquistas do proletariado e de ofensiva ideológica contra os valores do socialismo e os princípios do partido comunista, é comum a tendência a adaptar-se à ideologia dominante, a achar superado o corpo doutrinário do marxismo-leninismo, o arcabouço teórico-filosófico do socialismo científico e refugiar-se em formulações supostamente “contemporâneas”. É meritório o esforço que o PCdoB faz para, mantendo a sua essência, a sua identidade de partido de classe cujo objetivo programático é o socialismo, navegar nas procelosas águas da contrarrevolução da atualidade e buscar meios, modos e formas novos de atuação, a fim de credenciar-se como alternativa política, evitar o isolamento e escapar à atuação caricatural de uma seita desligada da realidade. Principalmente através de uma formulação programática consentânea com a realidade do Brasil e do mundo e de uma postura audaciosa na aplicação de uma tática ampla, combativa e flexível, o Partido assume o desafio de crescer, tornar-se uma poderosa força política, eleitoral, de massas, sob a direção de quadros política e ideologicamente preparados. Não há cartilhas, modelos, esquemas nem dogmas para nos ensinar como fazê-lo. Vamos aprendendo na prática, confiando na perspectiva histórica. Apoiar governos progressistas e deles participar são circunstâncias fortuitas que a história nos colocou. Saber tirar proveito disso para acumular forças está mostrando ser um caminho válido para o credenciamento político do Partido e seu afiançamento perante as classes trabalhadoras como força capaz de conduzir uma revolução político-social. Por meio das teses em debate no 13º Congresso, a direção partidária faz um esforço de sistematização da atual experiência de construção partidária,
Tribuna de debates na nova época histórica, em termos mundiais, e no novo quadro político, no plano nacional. Mas o documento contorna o que me parece ser o principal desafio do momento no que se refere à existência do Partido: crescer defendendo ao mesmo tempo o seu próprio caráter comunista e revolucionário. Circula no Partido a concepção que se tornou predominante em outras correntes que lutavam pelo socialismo e depois o renegaram de que o movimento tático é tudo e o objetivo final, nada. Com o agravante de que movimento tático se confunde com ação no e do governo, limitando-se a isso o horizonte do Partido por mais que os seus documentos fundamentais digam o contrário. É corrente também no Partido não gozando de foro formal de cidadania, mas desfrutando de amplo espaço a concepção liquidacionista de que a “forma partido” está superada. É insofismável que vivemos um período de conquistas e de crescimento quantitativo, bem assim da influência política do Partido. Mas não devemos ler a realidade como Polyana e ver sempre um lado bom naquilo que não anda bem. Podemos e devemos aproveitar o debate congressual para fazer com frontalidade sem crispações, açodamentos nem divisões com a responsabilidade que temos, o bom combate ideológico, para soerguer um Partido
Comunista à altura dos seus desafios históricos. Até porque o bom combate às tendências ideológicas malsãs é indispensável para manter o leme da própria condução política do Partido. Esta é a razão por que proponho que o tema sobre o Partido não seja tratado apenas sob a chave geral de “Virtudes e Vicissitudes” proposta nas teses, mas sob uma ótica mais ampla e de fundo sobre o caráter do Partido, seus objetivos permanentes, o sentido estratégico de sua ação e a missão histórica dos comunistas. Em uma realidade em mutação, decerto que os princípios também são adaptáveis e alguns mesmo deixam de ser vigentes. Não há problema em flexibilizar normas e formas, nem se deve perseguir a construção do Partido segundo modelos que foram úteis em outras latitudes e épocas. É de grande valor prático experimentar novas formas de atuação, inventar novos arranjos organizativos, novos métodos de ligação com as massas. Contudo, a arte e a ciência que se exige do nosso grande coletivo é fazer isso aperfeiçoando o caráter do Partido como o partido da luta de classes, da revolução, da luta pelo socialismo e do ideal comunista. * Secretário nacional de comunicação do PCdoB
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Para as lutas atuais e as rupturas revolucionárias
s Teses em debate no 13º Congresso do PCdoB fazem corretamente um balanço positivo dos 10 anos de governos progressistas no Brasil, pontuando ao mesmo tempo, numa abordagem multilateral, os graves problemas conjunturais e estruturais que o país enfrenta. Os problemas sociais são gravíssimos e sua solução requer medidas emergenciais e enérgicas, além das medidas estruturais cujo processo de implementação não pode estiolarse com postergações nem atitudes conciliatórias. Por José Reinaldo Carvalho * Estas medidas vão além da mitigação da pobreza. Os níveis de miséria no Brasil são chocantes, a desigualdade aterradora, a concentração de renda e riqueza na mão de um punhado de bilionários, uma aberração, a desídia dos poderes públicos na prestação de serviços ao povo, intolerável, as violações de direitos, condenáveis. O enfrentamento desses problemas requer luta política e de massas enérgica. As reformas estruturais democráticas necessárias para fazer avançar as mudanças contrariam os interesses das classes dominantes e do imperialismo. Por isso, a linha política com visão tática e estratégica de longo prazo, a metodologia da linha de massas e das alianças políticas e a acumulação revolucionária de forças, mesmo que prolongada, são os predicados que deve ter um partido de vanguarda como o nosso. As reformas estruturais ainda não foram feitas nem encaminhadas, malgrado os avanços políticos e sociais alcançados, porque o país vive o paradoxo de encontrar-se na vigência de governos progressistas no quadro de uma correlação política de forças desfavorável, nos marcos de um Estado reacionário, hegemonizado por classes dominantes retrógradas. O governo, nucleado pela esquerda e apoiado pelos movimentos populares, tem, em nome da governabilidade, uma composição política complexa, com a presença de forças centristas e até mesmo de centro-direita e fisiológicas, que atuam como freio às mudanças. Em face disso, o PCdoB, com as responsabi62
lidades que tem, inclusive como partícipe desde o primeiro momento das campanhas eleitorais de Lula e Dilma e integrante do governo desde o início do primeiro mandato de Lula, considera que a tarefa política central do momento é mobilizar apoio para que o governo realize as mudanças que a nação reclama, através das reformas estruturais democráticas, tendo como ideia-força o Plano Nacional de Desenvolvimento, incluído no Programa Socialista do Partido (2009), e que tem plena vigência. Precisamos de um movimento de massas forte, uma frente das forças democráticas, patrióticas, progressistas, de esquerda, que reúna os partidos políticos, as personalidades independentes e os movimentos sociais. As teses falam de construir uma “frente de afinidades de esquerda”. Esta frente deve encabeçar a luta para avançar nas mudanças. Tarefa de magnitude é a consolidação do Partido Comunista, o nosso PCdoB, como um partido forte e capaz de dar orientação correta para conduzir as mudanças no Brasil. Nada se fará em termos de aprofundamento da democracia, reforço da soberania nacional e realização das aspirações das massas populares sem um Partido Comunista forte. Precisamos de um Partido Comunista apetrechado com uma linha política, uma estratégia e tática e autoridade moral para enfrentar os grandes desafios atuais e os que se podem vislumbrar em perspectiva, um Partido para o presente e o futuro, disposto a dar o melhor de si para transformar o Brasil e fazer com que o país avance num processo complexo de acumulação de forças para o socialismo, um partido que, sem clichês, mas também sem temor, esteja à altura das tarefas da revolução política e social indispensável para resgatar a dignidade do povo brasileiro, defender a independência da Pátria e avançar para a emancipação nacional e social. Por isso não somos nem devemos ser um partido qualquer, mas um partido com nítida identidade de classe um partido dos trabalhadores, das massas exploradas e oprimidas da sociedade -, um partido convicto de que é possível promover rupturas políticas e sociais e abrir caminho ao socialismo.
Tribuna de debates Somos um Partido com unidade doutrinária, de pensamento, linha política e ação. A diversidade de opiniões encontra sua síntese nas decisões coletivas e unificadas. Diferentemente dos outros partidos, o PCdoB não tem alas nem frações e não obedece a determinações de individualidades ou grupos de interesses, mesmo que essas individualidades tenham projeção e poder eleitoral e institucional. O Partido não tem multiplicidade de “centros de poder”, mas um centro único de direção. Voltado para a mobilização política do povo brasileiro, concentrado no seu enraizamento entre as classes trabalhadoras, empenhado nas alianças políticas amplas de caráter progressista, determinado a ampliar suas fileiras com a adesão de ativistas e lideranças, os melhores filhos e filhas do povo, o Partido mantém a sua unidade e independência política e ideológica. O PCdoB nunca foi um partido fechado nem descurou do seu crescimento. É justo o empenho para fazê-lo crescer eleitoralmente e buscar a adesão às nossas chapas eleitorais de políticos progressistas com influência nas massas populares. Mas é um método falso e perigoso abrir indiscriminadamente as fileiras do partido e dar acesso a postos de direção partidária local a políticos conotados como fisiológicos, ligados a forças municipais e estaduais reacionárias e cujo objetivo ao aderir a uma legenda eleitoral é meramente fazer uma carreira para benefícios pessoais e do seu grupo político. Avesso a todo tipo de dogmatismo, esquematis-
mo e cópia de modelos, o Partido reafirma e enriquece a teoria do marxismo-leninismo e do socialismo científico, ao tempo em que se encontra imerso no esforço para conhecer e interpretar o mundo atual e a sociedade brasileira, tal como evolui e se apresenta, sempre com o intuito de transformá-la e de superar revolucionariamente o capitalismo. Sem a referência teórica e ideológica do marxismo-leninismo, seríamos ecléticos, faríamos política às cegas e nos perderíamos na torrente inexorável da luta de classes. Capacitado política, teórica e ideologicamente, o Partido, como forma superior de organização da classe trabalhadora e das massas exploradas e oprimidas, não se confunde com o movimento e trata cientificamente nunca espontaneamente da sua estruturação orgânica, da ligação com as massas e da formação e promoção dos seus quadros. O Partido está chamado a aperfeiçoar seus métodos de atuação e direção, a melhorar o estilo e sintonizar dialeticamente a compreensão sobre as linhas de acumulação de forças. Tendo como eixo o Programa Socialista e a evolução da realidade concreta, concentra suas energias na luta de massas, na luta eleitoral, na ação nos órgãos de governo e na luta de ideias, sem fetiches, deformações nem unilateralidades arbitrárias e metafísicas. * Secretário nacional de comunicação do PCdoB
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O Anti-imperialismo na América Latina
aplicação do neoliberalismo na América Latina, conduzida pelo imperialismo estadunidense em parceria com grupos oligárquicos internos, implicou no retardamento das revoluções burguesas e na eliminação de indispensáveis mecanismos de autodeterminação nacional. Por Lucas dos Santos Ferreira* A sustentação de âncora cambial no Brasil e, sobretudo, na Argentina (currency board), gerou graves déficits comerciais, fragilizou edifícios fabris e elevou a pobreza a níveis alarmantes, enquanto o Equador perdeu seu principal mecanismo de promoção de exportações e defesa aduaneira (moeda) ao ter sua economia dolarizada no ano 2000. Predatórias privatizações de setores ligados à segurança nacional ocorreram por todo o continente (PDVSA-Venezuela, YPF-Argentina, Usiminas/Vale-Brasil, Comibol-Bolívia, etc.) provocando maior concentração das riquezas nacionais, que deixaram de ser aplicadas em fomento produtivo e infraestruturas (nós de estrangulamento) e passaram a ser destinadas ao pagamento de abusivos juros de dívidas públicas e à manutenção de currais eleitorais, que nada mais são que uma das expressões políticas do feudalismo latino-americano. No Chile, embora diretrizes neoliberais tenham sido adotadas em parte do regime Pinochet e posteriormente na década de 1990, importa destacar que sólidas instituições do período Frei-Allende como a Codelco mantiveram sua condição, garantindo movimentações políticas menos abruptas, não obstante as aguerridas mobilizações de segmentos como o movimento estudantil. Em outros casos, do Brasil e Argentina, a resposta ao período de deterioração nacional foi a ascensão de blocos políticos desenvolvimentistas que abandonaram diretrizes anteriores e conquistaram maiores taxas de crescimento econômico. A positiva radicalidade dos argentinos não se apresentou em igual medida no Brasil, que apesar dos avanços (BNDES, PAC, etc.) não modificou sua política cambial desindustrializante e nem promoveu grandes reformas constitucionais (imprensa, Judiciário, etc.). Na Venezuela, Bolívia, Equador e Nicarágua, países 64
de menor complexidade econômica, os novos governos estão construindo processos de democracia direta (comunas, plurinacionalismo, etc.) que além de garantirem reformas burguesas inconclusas (agrária, trabalhista, etc.) apontam para possibilidades de construção de novos sistemas socialistas, visto que se processa a modificação do regime de propriedade e o controle popular dos meios de produção fundamentais. Não obstante as conquistas angariadas, é mister destacar que o imperialismo e seus aliados continuam representando sério risco aos projetos nacionais de desenvolvimento em curso no continente. Além de permanecerem constituindo oposição eleitoral, mesmo que fragilizada em alguns casos, sua atuação ainda é perene nos judiciários e nos grandes veículos de comunicação tonificados pelas ditaduras militares do último quartel do século 20. Isso sem mencionar as intervenções diretas contra as vitórias eleitorais de Honduras e Paraguai e a manutenção de vergonhoso bloqueio contra Cuba. A garantia de respaldo popular para o aprofundamento dos processos em curso em grande medida será derivada da obtenção de altas taxas de crescimento dos Produtos Internos Brutos acompanhados de mais complexas substituições de importações e da continua aplicação dos dividendos oriundos das exportações de commodities (encarecidas por financeirização e dilatação da demanda chinesa) em programas sociais. Essa complexa continuidade, entretanto, exigirá simultaneamente a utilização das capacidades ociosas nacionais, explorando o potencial empresarial existente, e o alijamento das agremiações pró-imperialistas dos núcleos institucionais de poder. O Brasil, com a árdua tarefa de constituir um capitalismo financeiro nacional, reúne condições para figurar como líder do processo de integração continental, mantendo apoio a construção de infraestruturas como a Rodovia Panamericana no Peru e as linhas metroviárias de Caracas e Panamá, ampliando as ligações de seu mercado interno com os produtores latino-americanos e ofertando sustentação política aos governos progressistas como vem fazendo desde a gestão Lula. * Membro do Comitê Estadual do PCdoB-SC.
Tribuna de debates
A Petrobras como indutora do desenvolvimento nacional Parte 1
A cadeia do Setor Petróleo conjunto de atividades que viabilizam a produção, refino e distribuição tem um poder multiplicador que precisa ser considerado nas políticas públicas de geração de emprego. Por Luís Fernando Gutman* Sendo a Petrobras, há mais de uma década, uma Empresa de Energia, há que considerar também seus projetos de geração de energia elétrica e de desenvolvimento de energias alternativas, renováveis ou complementares. A lista abaixo exemplifica algumas propostas de atribuições da Petrobras como empresa de Energia que podem ajudar na implantação de políticas públicas para reduzir a pobreza no país e melhorar as condições de atendimento às necessidades básicas da população brasileira e, inclusive, dos países onde atua: • Apoiar os fornecedores nacionais de bens e equipamentos para o setor energético, aumentando o conteúdo nacional de suas encomendas, induzindo sua capacitação para atendimento nos prazos e qualidades desejados • Criar parcerias com empresários nacionais para viabilizar a implantação de unidades de produção de fármacos e produtos químicos. • Criar parcerias com empresários nacionais para empreendimentos de geração elétrica com fontes renováveis (eólica, PCH, solar). • Investir em desenvolvimento tecnológico para aumentar a competitividade de placas fotovoltaicas • Ter política de preços de derivados ex-refinaria compatível com o combate à inflação e alinhada com as metas de racionalização do uso de derivados de petróleo, seja para cocção, transporte ou eletricidade. • Garantir preço de fertilizantes no mercado nacional que permita a expansão da fronteira agrícola, em especial fortalecendo a agricultura familiar.
• Reduzir o preço do óleo diesel para transporte ferroviário ou aquaviário. A lista de derivados do petróleo pode ser classificada de acordo com sua utilização, conforme é apresentado abaixo, sem se pretender esgotar as possibilidades: • Combustíveis industriais: óleos combustíveis, diesel, gases (natural ou industrial) • Combustíveis para Setor Transporte: gasolina, gás natural veicular (GNV), querosene de aviação (QAV), gasolina de aviação, diesel • Insumos para Petroquímica: nafta, gás natural • Insumos para Fertilizantes: gás natural • Insumos para Química Fina e Indústria Farmacêutica ou de Cosméticos: derivados aromáticos (Benzeno, Tolueno, Xileno – BTX) Outros insumos: solventes, graxas, lubrificantes, parafinas, querosene de Iluminação, asfaltos. Fica evidenciada a importância da agregação de valor aos derivados de petróleo quando se implantam as unidades de transformação, sejam simples refinarias ou indústrias de 2ª e 3ª gerações, com produção de plásticos, fármacos, cosméticos, fertilizantes e outros produtos químicos, alavancando o PIB industrial. É importante que a Petrobras, nas suas decisões de negócios, considere sua característica “Estatal”, sem privilegiar os aspectos empresariais, na resolução dos conflitos de interesses entre o sócio majoritário governo e os minoritários. Não há razão para questionamentos dos acionistas, pois aos comprarem suas ações sabiam que a Petrobras era, é, e deverá ser uma companhia cuja avaliação não está baseada apenas em variáveis financeiras (geração de caixa, Ebitda, por exemplo), mas subordinada a variáveis de interesse nacional, como economia de divisas, geração de empregos, redução de impactos ambientais, absorção de tecnologia ,etc. * Membro do PCdoB, Rio de Janeiro
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A Petrobras e a segurança nacional
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Parte 2
defesa da Soberania Nacional, o crescimento do mercado interno, o apoio aos fornecedores nacionais de bens e serviços, a mitigação de impactos negativos ao meio ambiente, a aceleração do processo de integração latino-americana e a redução de desequilíbrios regionais e sociais são os pilares que devem nortear as decisões de curto, médio e longos prazos da mais importante empresa nacional. Por Luis Fernando Gutman* Nascida de uma luta em que a sociedade brasileira se engajou, com a participação de movimentos populares, militares nacionalistas, estudantes e dos partidos progressistas, em especial o Partido Comunista do Brasil. Em primeiro lugar, há que se conscientizar que a Petrobras tem um papel fundamental na garantia da Segurança Nacional, conceito a ser redefinido, haja vista a conotação simplória de considerá-la apenas como: • Proteção da nação brasileira frente a ameaças externas; • Preservação da soberania e independência nacionais; • Manutenção da ordem constitucional; Há que acrescentar aos itens acima o fato de que ter Segurança Nacional implica em reforçar a democracia, a justiça social, as liberdades individuais e a paz interna; as estratégias para alcançá-la buscam atingir um equilíbrio entre os interesses dos diversos setores da sociedade e os interesses da coletividade. Políticas públicas são necessárias para atingir esse equilíbrio, assim como a autonomia e a harmonia entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário servem de sustentação da democracia institucio-
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nalizada através dos diversos órgãos que compõem a estrutura orgânica do Estado Brasileiro. Mas todo esse esforço pela democracia será infrutífero se não houver um desenvolvimento econômico e social que garanta uma distribuição de renda justa, uma redução drástica do nível de pobreza de grande parte da população, aliada à oferta de instrumentos que permitam o atendimento universalizado das necessidades básicas, como saúde, educação, alimentação, habitação e transporte. Um dos eixos da Segurança Nacional é, sem dúvida, a segurança energética, sendo a Petrobras seu principal vetor, haja vista sua missão formalizada nos diversos Planos Estratégicos e ratificada no Plano de Negócios publicado este ano Atuando em todos os estados brasileiros e em 27 países, busca rentabilidade, inovação tecnológica e eficiência operacional, com preocupação constante em relação aos impactos ambientais de suas atividades. A Petrobras pode, e deve, como empresa estatal, cumprir um papel fundamental, seja garantindo os insumos para esse desenvolvimento econômico, seja viabilizando projetos de responsabilidade social que criem as condições de surgimento dos instrumentos de universalização do atendimento de necessidades básicas mencionados acima. A mensagem deste trabalho é que a Soberania Nacional, definida não apenas como subordinação a aspectos de proteção da nação e defesa do território, mas como uma expansão do conceito de segurança energética, pode ter a Petrobras como uma aliada na sua consecução. Cabe a nós, comunistas do PCdoB, o papel histórico de retomar a luta em defesa da Petrobras e do seu papel de indutora do desenvolvimento econômico e social do Brasil. * Membro do PCdoB, Rio de Janeiro
Tribuna de debates
Diretrizes para o setor do petróleo
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Parte 3
Otimizar a exploração e a produção de óleo e gás Os investimentos da Petrobras devem ser avaliados em cenários de longo prazo, de modo a garantir o suprimento de óleo e gás para as estratégias definidas em conjunto com o governo federal. Por Luis Fernando Gutman* É fundamental garantir reservas de óleo, mas nem sempre é mais econômico acelerar a produção, pois isso pode levar à depleção antecipada dos campos, como aconteceu no caso da Argentina, após a privatização da YPF.
2 - Privilegiar o Mercado Interno de Derivados
A geração de empregos e a melhoria da balança de pagamentos podem ser alcançadas quando deixamos de exportar os derivados na sua forma bruta, logo após o refino, e lhes agregamos valor através da transformação em outros produtos, como petroquímicos, ou através da sua utilização na cadeia da química fina. O gás natural, por sua vez, pode ser utilizado no consumo interno, como GNV e gás de cozinha ou queimado em usinas termelétricas, mas defendemos sua utilização também nas indústrias de fertilizantes, de petroquímicos ou como insumo da química fina. A Petrobras deve reanalisar seu papel no setor petroquímico, voltando a ser majoritária nos empreendimentos.
5 - Participar proativamente da consolidação do Novo Marco Regulatório
O crescimento econômico do Brasil na última década permitiu a transferência de milhões de brasileiros para a classe média, criando grande massa de novos consumidores de bens e serviços anteriormente inacessíveis, como automóveis, viagens, luz elétrica, aparelhos eletrodomésticos e todos aqueles que trazem dignidade e cidadania aos que se situavam abaixo da linha de pobreza. O dilema exportar ou suprir o mercado interno de derivados de petróleo deve considerar como prioritário o atendimento dessa população, antes invisível economicamente.
A Petrobras deve apoiar a ANP na definição de áreas a serem exploradas e garantir suportes técnicos, operacionais, tecnológicos e financeiros para atender às demandas necessárias ao seu novo papel, como detentora de pelo menos 30% dos campos do Pré-Sal e sua única operadora. Mas a Petrobras deve também mostrar à ANP o prejuízo potencial de se continuar a realizar os leilões de petróleo, apontando o risco do Brasil ter reservas de petróleo de propriedade de terceiros.
3 - Massificar o uso do Gás Natural no país
6 - Cancelar os leilões e retornar ao monopólio estatal do petróleo
As grandes descobertas de gás associado ao óleo do Pré-Sal permitem sua inserção definitiva na Matriz Energética Nacional, aumentando seu consumo na cocção, no transporte de passageiros ou de cargas rodoviárias - e reduzindo a utilização de insumos com maiores impactos ambientais, como lenha, GLP, diesel ou carvão. Além do aspecto ambiental, a redução do uso do GLP ou do diesel favorece a balança de pagamentos do país.
A história de sucesso da criação da Petrobras e sua atuação nas décadas anteriores à quebra do monopólio estatal do petróleo precisam ser reescritas no século 21, com as grandes descobertas do Pré-sal. O PCdoB defende o retorno ao monopólio estatal, tanto para a área do Pré-sal como para as áreas ainda não leiloadas. Defendemos negociação dos contratos assinados para reembolsar às empresas os recursos comprovadamente investidos, de modo a poder otimizar o nível de exploração e produção em harmonia com as diretrizes emanadas do CNPE.
4 - Aumentar o valor agregado dos derivados e do gás natural
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Tribuna de debates 7 - Recuperar a participação da União na Petrobras É inaceitável que uma empresa estatal, sendo a União sócia majoritária, tenha quase 20% de suas ações de propriedade de estrangeiros. Deve ser feito um esforço no sentido de recomprar as ações, principalmente as que estão nas mãos de estrangeiros, de modo a fortalecer o caráter nacionalista da Petrobras e o seu papel de indutor do desenvolvimento nacional.
8 - Alavancar a cadeia nacional de bens e serviços da indústria do petróleo O setor petróleo no Brasil, principalmente após as grandes descobertas do Pré-Sal, tem um poder estruturante, podendo impactar no crescimento dos seus fornecedores e ajudar a reduzir desigualdades regionais. A Petrobras deve buscar reduzir as desigualdades regionais, desenvolvendo a qualificação de fornecedores dos diversos estados, principalmente os das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. À Petrobras deve ser permitido, nas licitações, privilegiar fornecedores nacionais, aproveitando a economia de escala de seus investimentos, mas sempre enfatizando o controle da evolução da competitividade nacional através da curva de aprendizado. A Petrobras deve continuar a apoiar o desenvolvimento de micro, pequenos e médios fornecedores de equipamentos, materiais e serviços na cadeia do Petróleo; deve também induzir a construção de embarcações no Brasil, tendo a Empresa papéis
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fundamentais, seja no processo de definição das especificações do Projeto Básico ou na fiscalização da construção e montagem.
9 - Apoiar o Projeto de Integração Energética da América Latina A Petrobras deve buscar integração, a partir da área internacional, com os outros países da América Latina, com escritórios em cada um ou articulação com os consulados brasileiros naqueles países, de modo a criar uma cultura que privilegie a variável Integração Latino-americana, interagindo com outras forças sociais da América Latina para buscar uma atuação conjunta.
11 - Apoiar desenvolvimento tecnológico em fontes alternativas de energia A Petrobras deve ser instrumento para desenvolvimento tecnológico de fontes alternativas de energia (eólica, solar térmica, solar fotovoltaica, etc).
11 - Atuar com visão de responsabilidade social A Petrobras deve incentivar o desenvolvimento de comunidades carentes, inserindo indicadores sociais na avaliação de seus projetos; deve também permanecer com os campos ditos maduros ou marginais, dentro de política de desenvolvimento regional. * Membro do PCdoB, Rio de Janeiro.
Tribuna de debates
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É o Partido, camaradas!
m tema crucial que nunca abandonou as reflexões partidárias, mas que de uns tempos para cá, sobretudo no presente processo do 13° Congresso, vem se impondo com ênfase, diz respeito à natureza, missão e princípios ideológicos, políticos e organizativos norteadores do Partido Comunista. Por Luiz Manfredini *
O tema é crucial porque a existência do partido comunista é decisiva para impulsionar a luta socialista, em produtiva, sinérgica interação com as demais forças de esquerda que também reivindicam o socialismo. A essencialidade desse tipo de partido decorre de sua responsabilidade histórica de perseguir a construção do sujeito político isto é, a massa consciente de trabalhadores e seus aliados capaz de levar adiante a transformação radical da sociedade, com vistas à substituição do capitalismo pelo socialismo. No artigo “Partido das grandes causas do povo brasileiro e da humanidade”, veiculado pelo Vermelho por ocasião do 91° aniversário do PCdoB, o camarada José Reinaldo Carvalho sintetizou com propriedade: “A outra pedra de toque do pensamento e da ação do PCdoB é o esforço persistente para construir um partido comunista organicamente forte, ideológica e politicamente capaz, à altura da sua missão histórica, ligado às massas, em especial aos trabalhadores, um Partido com força militante, influência política ampla, presente nos acontecimentos candentes, dotado de amplo horizonte histórico, cultural e teórico, enraizado no solo nacional, patriótico e internacionalista”. A trajetória de um partido comunista deve ser considerada sempre em perspectiva, no cenário dinâmico de seus objetivos estratégicos e não apenas diante das emergências da tática. E, outras palavras, o que verdadeiramente interessa e serve à causa revolucionária, no âmbito dos debates do 13° Congresso, é verificar se o partido que estamos construindo hoje, de acordo com as circunstâncias históricas do momento e todas as suas possibilidades e limitações, fortalece ou não a acumulação estratégica de forças. Em outras palavras, a tática deve ser vista no arco de
um horizonte estratégico. O contrário nos conduzirá a um taticismo esvoaçante e inconsequente. A construção de um partido nos moldes propostos, com essa visão estratégica, não é tarefa para quando estivermos nas portas do socialismo, mas para já. Caso contrário, as portas do socialismo estarão fechadas para nós. Obviamente a ideia de um partido de massas e de quadros está aberta às indicações contemporâneas da luta política e social. Aqui não se defende um partido cristalizado, impermeável ao que de novo o desenvolvimento histórico nos vai apresentando. Não seríamos, se o fizéssemos, os dialéticos que pretendemos ser. Mas atualização alguma poderá negar questões essenciais como o fundamento teórico e o caráter de classe do partido, sua identidade comunista, sua concepção organizativa, seus compromissos estratégicos, pois daí não seria atualização, mas capitulação. As teses congressuais reconhecem que o Partido, no período examinado, viveu “novas oportunidades, desafios e riscos”. Numa trajetória considerada fundamentalmente positiva, surgiram pressões próprias da época, voltadas para “o rebaixamento do papel estratégico do Partido”. Alinham, as teses, os riscos mais perniciosos a evitar, entre os quais o liberalismo, o corporativismo, o dogmatismo, o carreirismo e o personalismo. Não é de subestimá-los, até porque não me parecem, tais desvios, apenas riscos (no sentido de probabilidade de existir). Já estão presentes por vezes furtivamente em diversas circunstâncias. Revelam-se, por exemplo, num certo discurso que propõe, ainda que de modo subliminar, a adoção de um “pragmatismo controlado” com vistas a resultados eleitorais mais favoráveis, ou o que prega um “partido sem porteiras”, conduzindo-o, segundo temo, a um perigoso estado de obesidade mórbida. A gana eleitoral que se percebe acaba por facultar as fileiras partidárias, indiscriminadamente, a quem oferecer maior punhado de votos, mesmo que, com isso, o Partido venha a se tornar mero trampolim para carreiras nada recomendáveis. A esse impulso pela formação, a qualquer custo, de bancadas parlamentares, vê-se, em algumas situações, forte apetite por cargos governamentais, muitas vezes sem conexão com a tática partidária. São alguns exemplos de 69
Tribuna de debates como o viés eleitoral termina, nesses casos, por embaçar os dois outros (e insubstituíveis) pés da ação partidária, ou seja, a luta de massas e a luta de ideias. Não é por menos que as teses dedicam todo um trecho (“Perspectivas atualizadas para a edificação partidária”) para advertir contra tais tendências negativas. Não identificadas e não combatidas adequadamente, contribuem até decisivamente para nublar o rumo estratégico do Partido. E, na medida em que turvam esse rumo, não ajudam na acumulação de forças em direção a ele. Ou seja, corre-se o risco de adotar ainda que involuntariamente o conceito fundante do revisionismo moderno: “o movimento é tudo, o objetivo final, nada”. Frente a isso as teses orientam “tratar de maneira combinada três formas de luta entrelaçadas para acumular forças em caráter estratégico, portanto revolucionário, sem unilateralismos: a luta social de massas, a luta política-eleitoral e a luta de ideias, todas elas com caráter político. Junto a isso, disputar ativamente as bases sociais fundamentais, a saber, os trabalhado-
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res, a juventude e as mulheres. E seguir aprimorando o centralismo democrático, para um partido com liberdade de opinião e unido na ação concreta em cada caso”. O que indicam as teses, no entanto, deve se tornar realidade mais efetiva e abrangente. Refletir criticamente sobre essas e outras questões importantes para a luta socialista no Brasil, fortalecendo o protagonismo revolucionário do PCdoB, é o sentido maior dos debates do 13°Congresso. Afinal, o grande encontro dos comunistas não deve se restringir às loas e exaltações de praxe. O marxismo e o movimento comunista, desde os seus primórdios, se desenvolveram a base de intensas reflexões e debates e quase sempre em polêmica com ideias contrárias. Foi esse exercício dialético que o robusteceu. E será sob o influxo de um pensamento vivo, crítico, que o PCdoB fortalecerá seu protagonismo essencial frente aos desafios contemporâneos da revolução brasileira. * Militante do PCdoB, Paraná
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Como avançar nas mudanças? Parte 2
O documento “Avançar nas Mudanças” propostas pelo Comitê Central faz um diagnóstico preciso dos avanços alcançados pelos Governos Lula/Dilma nos últimos 10 anos e suas limitações. Apresenta bem a participação protagonista do PCdoB nestes anos assim como as vicissitudes sofridas. Define bem o que precisa ser feito para avançar, no entanto, desenvolve pouco o como fazer as mudanças avançarem. Vejamos: Por Marcos Panzera (Neco)* No ponto 122 afirma que: “ O ritmo de execução de propostas de governo, convergentes com o NPND, é lento e aquém das necessidades objetivas e das possibilidades existentes. Existe inclusive a possibilidade de retrocesso, com a perda das conquistas do povo e da nação no último decênio.” No ponto 124 acrescenta: “Como resultado desse percurso de dez anos, o campo político progressista acumulou forças e foram criadas melhores condições para as mudanças estruturais.” E define “três pontos fundamentais para que seja aumentada a velocidade das transformações: ampliação da democracia, nova arrancada para o desenvolvimento e mais progresso social.” Quando vai tratar de como enfrentar esses desafios afirma no ponto 165 a necessidade de se construir uma unidade: “Esta unidade visa à construção de um grande bloco político no âmbito dos parlamentos, nas esferas de governo, no seio dos movimentos sociais e da intelectualidade. Este grande bloco de afinidades de esquerda, assim compreendido, poderia de forma pactuada estabelecer uma plataforma comum”, e propõe referências para um programa comum. Considero que aqui é que está o “x” da questão. Para dar maior velocidade às mudanças, como defendemos, precisamos de uma correlação de forças mais favorável. E se dependermos do Congresso Nacional para avançar nas reformas estruturais, a cor-
relação é desfavorável mesmo considerando a ampla base de apoio do Governo. Um dos elementos para a continuidade do processo de mudanças, nosso Programa Socialista define bem, no item 34: “A vitória das forças democráticas, progressistas e populares em eleições presidenciais impulsionará a luta pela aplicação do NPND.” Afirma também o Programa, no ponto 35 :”Impõe-se distinguir novas oportunidades e caminhos.” E no ponto seguinte afirma que “A luta em todos os terrenos pela sua concretização (NPND) eleva a consciência política e social, obtém vitórias e acumula força. Esta conduta visa o alcance da hegemonia dos interesses dos trabalhadores e da maioria da Nação.” O elemento central hoje para dar continuidade ao processo de mudanças, sem dúvida é a reeleição da Presidenta Dilma. Entretanto, como vamos mudar a correlação de forças para avançar nas mudanças? Vamos esperar maioria parlamentar das forças mais avançadas? Há ainda um complicador: “a possibilidade de retrocesso” como afirma o documento. Penso ser preciso um maior tratamento dessa questão no documento e que devíamos avaliar o que diz nosso Programa: “ Impõe-se distinguir novas oportunidades e caminhos.” Defendo que deveríamos dar um destaque maior ao papel das mobilizações de massa como caminho indispensável para avançar nas mudanças. Em nossa história, várias vezes, as mobilizações de massa mudaram a correlação de forças do Congresso. Ocorreu no movimento das diretas e pelo candidato único das oposições, no processo do impeachment do Collor, assim como na derrota da PEC-37 recentemente. Essa também é a experiência vivida por nossos vizinhos, Venezuela, Bolívia e Equador onde os processos de mudança contam com poderosos movimentos sociais, como o bolivariano. 71
Tribuna de debates A debilidade em nosso caso é que os governos dessa década não constituíram uma base social organizada de sustentação. A sustentação do governo apenas através dos Partidos e parlamentares tem se mostrado muito frágil, instável e precária, sobretudo quando se coloca a necessidade de mudanças de fundo: vide reforma política. Dessa forma, para avançar nas mudanças, é indispensável a construção de um poderoso movimento social em prol das mesmas. Sabemos que não realizaremos qualquer das mudanças estruturais sem grandes enfrentamentos de poderosos interesses. Será muito difícil conseguir uma maioria no Congresso capaz de enfrentar esses desafios. Quanto tempo vamos esperar? Vejo como impositivo, nosso Partido junto a outras forças políticas, vanguardear a construção de um poderoso movimento de massas em prol das
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mudanças. Para tanto buscar estudar os caminhos, os meios e as formas de realizar essa tarefa. Tivemos a experiência da Coordenação dos Movimento Sociais que não teve muito êxito. Embora ache que em parte por não ter se dado a devida importância para a tarefa. Nesse sentido defendo a necessidade de direcionar o trabalho das entidades de massa que dirigimos para que aumentem sua capacidade mobilizadora. Para se transformarem em referências para os segmentos que representam visando conquistar a hegemonia entre os trabalhadores, as mulheres, os jovens e o povo em geral no rumo de constituir a necessária base social organizada para impulsionar as mudanças. * Membro da Comissão Política Estadual do PCdoB, Pará
Tribuna de debates
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Resgatar o trabalho de massas
egundo o Programa Socialista do Partido, dentre as três tarefas que adquiriram um fundamento que orienta a prática do PCdoB, destaca-se “a mobilização e organização das massas trabalhadoras e do povo, fonte principal de crescimento do Partido e força-motriz fundamental das mudanças...” Por Marcos Panzera (Neco) * Entendo que a concretização das principais bandeiras e reformas para o avanço do Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento dificilmente serão realizadas sem um poderoso movimento de massas. A mudança da correlação de forças no Congresso Nacional, por exemplo, dificilmente ocorrerá se não houver como base o movimento de massas. Vide experiência das Diretas Já e pelo candidato único das oposições; e do movimento “Fora Collor”, ambos em que a correlação de forças foi alterada graças à pressão das ruas. Defendo a necessidade de maior destaque ao papel do movimento de massas em articulação com a luta de ideias e a frente institucional nas resoluções a serem aprovadas no 13º Congresso, indicando como um dos caminhos fundamentais para a realização das reformas estruturais. Penso que nosso Partido tem subestimado essa questão. Com a justa priorização da luta institucional, temos aos poucos abandonado o trabalho de massas. E mesmo no trabalho com as frentes de massa priorizamos os encontros, congressos, eleições de entidades, abandonando o trabalho com os milhões de trabalhadores, jovens, mulheres, comunitários, etc. É evidente que a conjuntura mudou e novos desafios se apresentam, entretanto, acho que devemos tirar as consequências do entendimento de qual é a força motriz das mudanças. Tive o cuidado de pesquisar as orientações nacionais para as frentes de massa. Vejamos: A UJS: As Resoluções da Plenária Nacional da UJS, após realização de curso de formação no dia 23 de julho de 2013
“Novos desafios foram lançados para manter a juventude mobilizada por transformações mais profundas na sociedade. Dos objetivos aprovados na plenária nacional, quatro se destacam com muita força: a luta pela democratização da mídia, a luta pela memória e verdade sobre os crimes da ditadura militar, a desmilitarização da policia militar e a nova campanha de filiação.”
Não se coloca com força a necessidade da mobilização dos milhões de jovens, o necessário aumento da representatividade da UJS e das entidades por elas dirigidas, como UNE, Ubes e muitas outras com campanhas que coloquem em movimento os estudantes e demais jovens. Há os argumentos de que vivemos um momento de descenso dos movimentos sociais, que os movimentos adquiriram outras características, etc. Mas as recentes jornadas de junho desmentem essas assertivas. O último Congresso da UNE, por exemplo, reuniu 10 mil estudantes, um número expressivo, mas, por exemplo, na Universidade Federal do Pará, que conta com mais de 44 mil estudantes, a UJS não tirou 100 delegados. Não quero menosprezar o trabalho de nossos camaradas da juventude, mas o que levanto é a necessidade de se mudar o foco. Nossa preocupação deve ser como atingir os milhões de estudantes e mobilizá-los por suas aspirações buscando politizar o movimento. O movimento sindical: Nas resoluções do 5º Encontro Sindical Nacional do PCdoB realizado no Rio de Janeiro em maio de 2013. As resoluções do encontro foram: contribuir para o fortalecimento da CTB, com base na unidade em torno do programa e no pluralismo de sua composição, intensificando o processo de filiação de novas entidades à Central; renovar métodos de orientação política e sindical; ampliar a participação no sindicalismo internacional; fortalecer a presença dos comunistas nos sindicatos para disputar sua hegemonia, e por aí vai. Aqui também, não se vê a preocupação de transformar os sindicatos filiados em verdadeiros sindicatos classistas, de luta, de massa, que se enraízem entre os trabalhadores e os orientem para a luta política. Tudo bem que as proposições apro73
Tribuna de debates vadas são justas. Mas, em minha opinião, falta a preocupação de atingir os milhões de trabalhadores, sindicalizá-los, mobilizá-los, organizá-los e politizá-los. O movimento de mulheres: É inegável a contribuição dada pela UBM na luta pela emancipação. Mas também é inegável que não há a preocupação de atingir as milhões de mulheres com campanhas de massa que tornem a entidade em efetiva representante das mulheres brasileiras. O movimento comunitário nem se fala. Tenho conhecimento que o acompanhamento nacional a essa frente é mínimo. E não é por falta de problemas urbanos de saúde, mobilidade, saneamento, que as massas urbanas tem como serem mobilizadas. O que quero concluir é que vai se formando uma concepção no Partido que subestima o trabalho de massas, o trabalho de base. As explicações e justificações são variadas. Mas as consequências são sérias. O Partido corre o risco de se transformar em partido eleitoral. E sem trabalho de massa e de base é muito difícil organizar bases partidárias. O Partido deixa de ter raízes. A luta de massas é que dá vida à organização de base e a todo o Partido. Sem ela não se renova a militância e se fortalece o caráter comunista do Partido e das entidades que dirige. As pautas definidas pelas entidades e o Partido são somente pautas gerais. Bandeiras gerais, tirar delegado para o congresso tal e qual, participar da eleição de entidades. Longe de subestimar a importância das bandeiras gerais, dos congressos e eleições de entidades. Entretanto não há a preocupação de pautar a luta de massas com bandeiras que mobilizem a população e que sem dúvida seriam essenciais para organizar as bases partidárias. Mede-se o desempenho das entidades e do Partido pelo
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número de delegados que tirou e não pelas lutas que desenvolveu. Não que os congressos e encontros não sejam importantes. Mas cada vez mais se tornam sem representatividade. Vamos fazer uma pesquisa nas escolas para ver quem já ouviu falar em UJS, ou entre as mulheres se já ouviu falar de UBM. E aí aparecem mil e uma desculpas e dificuldades. Que o movimento está em descenso, que o movimento social só alcança uma pequena parcela do povo, etc. Fica-se esperando que espontaneamente as coisas aconteçam para a gente se meter no meio. Mas não deveria ser papel do Partido de vanguarda criar o movimento, unir, mobilizar e organizar as massas em torno de seus interesses? Agora somos surpreendidos com toda essa movimentação espontânea de massas por todo o país. Diferente dos “caras pintadas” no “fora Collor” cuja direção foi da UNE e Ubes dirigidas por nós. Meia dúzia de internautas consegue mobilizar milhares de jovens e nós com a maior organização de jovens do país vamos a reboque. Alguma coisa está errada. É preciso pautar a luta de massas, o trabalho de massas desde cima. A orientação atual retrata uma concepção de abandono do trabalho por baixo. De priorizar a organização em detrimento da luta. Enquanto vigorar essa orientação será muito difícil organizar bases partidárias e colocar em prática resolução da Carta Compromisso que coloca a necessidade de “estender vida militante definida, estruturada e duradoura às bases militantes, retificando práticas que subestimem esse rumo”. É preciso resgatar o papel da luta de massas no Partido e compreende-la como “força motriz das mudanças”. * Membro da Comissão Política Estadual do PCdoB, Pará.
Tribuna de debates
Por que uma Secretaria de Combate ao Racismo
É
preciso fazer uma reflexão sobre a questão da igualdade racial na agenda política do PCdoB, considerando o acúmulo e aprendizado dessa nova etapa á frente da SMPIR de São Paulo, chamando atenção para o papel dos partidos no fortalecimento da democracia. Por Netinho de Paula* A SMPIR é um novo marco institucional no combate ao racismo e às desigualdades raciais na capital paulista, através do qual o Estado assume como compromisso a responsabilidade de desenvolver políticas públicas e construir uma agenda política voltada, em especial, à população negra. Essa construção política traduziu e se inspirou no reconhecimento da luta do movimento negro, concretizando-a e adentrando definitivamente na institucionalidade pública, constituindo-se numa possibilidade de ter autonomia orçamentária e promover o esperado reordenamento institucional capaz de combater o racismo institucional. De que universo falamos? No recorte do estado de São Paulo, trata-se de cerca de 34,63% da população, segundo o censo 2010 do IBGE. Na capital esse percentual sobe para 36,83%, ou seja, de um universo de 11.316.149 habitantes, ou seja, falamos de quase 4,2 milhões de pessoas, com níveis de desigualdades que atravessam os diversos setores governamentais e da iniciativa privada. Assumir o debate de combate ao racismo a partir de uma agenda afirmativa, seja pelo Estado, seja pela sociedade e suas organizações, deve induzir mudanças nos indicadores e estatísticas, como os índices de mortalidade da juventude negra. Na cidade de São Paulo cerca de 28% dos óbitos por causas externas ocorrem entre jovens e deste universo, cerca de 57,6% dos jovens do sexo masculino vítimas de homicídios são negros e pardos. No Brasil esse número sobe para 75,5% (Datasus, 2010). É preciso recuperar a história da luta pela igualdade racial e seu reconhecimento pelo Estado. Foi uma caminhada longa, cujas origens vêm das bases
sociais, destacando-se alguns símbolos do trajeto e da construção histórica da luta do povo negro, desde Zumbi, o Teatro Experimental do Negro, Abdias do Nascimento, o ato público organizado em São Paulo contra a discriminação sofrida por quatro jovens negros no Clube de Regatas Tietê, que originou o Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial (MNU). É um movimento que tem como marca a resistência do povo negro, mas com uma lentidão histórica na abertura do Estado para incorporar essa pauta na agenda política. No estado de São Paulo, apenas em 1984 foi criado o primeiro órgão público voltado para o apoio dos movimentos sociais afro-brasileiros: o Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra, no governo Franco Montoro. Em relação à pauta partidária, em 1985 o Partido dos Trabalhadores criou um espaço para a discussão da luta racial, a Secretaria Nacional de Combate ao Racismo do PT. No que diz respeito ao PCdoB, em seu interior organiza-se e nasce a União de Negros pela Igualdade (Unegro), fundada em 14 de julho de 1988, na cidade de Salvador. Hoje está organizada em 23 Estados da Federação e compõe o Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial – CNPIR, Conselho Nacional de Saúde e o Conselho Nacional de Políticas de Juventude – Conjuve e conduz o debate sobre a questão racial no PCdoB. Articulada ao processo constituinte foi ainda no governo Montoro a iniciativa de indicar um representante dos negros para a chamada Comissão Arinos, que criminalizou a discriminação racial, inscrevendo a pauta racial e da igualdade, como um princípio do Estado Democrático de Direito. A definição e tipificação do racismo como crime foi estabelecida pela Lei Caó, de autoria do deputado Carlos Alberto de Oliveira, em 1989. Nessa articulação entre movimentos, partidos e sindicatos, a CUT reconhece a importância da agenda racial em 1990, entrando no 5° Congresso Nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT), adentrando o universo da organização dos trabalhadores. 75
Tribuna de debates A agenda da igualdade racial foi se construindo e entrando nas institucionalidades públicas, partidárias e sindicais, sempre impulsionada pelo movimento social. Chegando à criação da Seppir em 2005 e no processo de construção e aprovação do Estatuto da Igualdade Racial. Mas é preciso assumir os desafios, reconhecendo os impasses impostos pelo racismo, que atravancam esse processo, revelando-se lacunas na construção do Estatuto. Se considerar a composição dos parlamentos, pode-se compreender os porquês de alguns entraves institucionais, seja pela pequena bancada defensora do Estatuto, até mesmo pela escassez de negros nos quadros do Legislativo, refletidas nos cortes e ajustes que impactaram na organização do modo de gestão e do financiamento da política de promoção da igualdade racial no Brasil. O desafio ainda não foi superado e permanece a convicção de que os partidos devem assumir a pauta étnicoracial com urgência, mobilizando sua base para que seja possível ter uma democracia racial articulada e integrada à atividade política e institucional. Um destaque importante que permite compreender as faces do racismo moderno está no mundo do trabalho. Considerando-se o tipo de ocupação, apenas 21,4% dos cargos de direção são ocupados por negros no Brasil (IBGE, 2010); é preciso construir novas estratégias de enfrentamento junto aos setores públicos e privados, pois ainda não se derrubaram as barreiras do racismo institucional que bloqueiam a ascensão dos negros a cargos de gerência, coordenação e chefia. Urge que os sindicatos abracem esta bandeira, pois falar em democracia racial sem romper a or-
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dem econômica histórica, onde os negros ocupam as bases da pirâmide sem que se tenha a mobilidade racial e social esperada pelas ações afirmativas, pode comprometer a sua concretude. É preciso articular definitivamente o desenvolvimento econômico à igualdade racial. “Eu olho o dia de hoje e fico imaginando que nós já avançamos bastante se a gente analisar o patamar de onde começamos, mas ainda falta uma estrada enorme a ser percorrida. Eu costumava dizer que tudo que a gente fizer para estabelecer a igualdade racial nesse país, é um pagamento de uma dívida que não pode ser mensurada em dinheiro. Ela tem de ser mensurada em solidariedade, em compromisso de ajuda mútua que o Estado brasileiro precisa cada vez mais assumir. E às vezes me inquieta profundamente porque há uma visão equivocada sobre a África. Não é que as pessoas não sabem da história da África, mas que muita gente não quer saber.(Presidente Lula. Lançamento da SMPIR/SP, 2013). O caminho que se apresenta como possível é a criação de uma Secretaria de Combate ao Racismo dentro da estrutura orgânica do PCdoB, sem prejuízo das organizações como a Unegro, mas trazendo a sua luta para o funcionamento e organização do Partido. É preciso ampliar o número de negros nos postos de comando e decisão para derrubar as barreiras que limitam uma democracia de fato, uma democracia que se funde na igualdade e na justiça social, numa sociedade sem racismo. * Membro da Comissão Política Estadual do PCdoB, São Paulo
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O
Saúde Pública com Qualidade para todo o Povo Brasileiro
governo brasileiro tem conseguido melhorar a economia do nosso país no cenário mundial, no entanto, não vemos isto se traduzir na área da saúde. O clamor do movimento das ruas teve o mérito de chamar a atenção dos governantes para as reformas estruturais e entre elas está a saúde. Por Pablo Vazquez Queimadelos* Existem inúmeros fatores que contribuem para essa situação. Um dos mais importantes é o subfinanciamento, o nosso país investe menos que a Argentina, o Uruguai e o Chile. A Emenda 29 foi aprovada, mas o financiamento foi retirado e o Ministro da Saúde ficou omisso. As faculdades públicas e privadas de medicina sofrem com as condições de ensino. A Universidade Gama Filho não tem Hospital Escola e os professores estavam em greve no início do ano, quando o vínculo do aluno com a universidade se restringia ao boleto bancário. Os estudantes se organizaram e junto com a UNE foram protestar na ALERJ e no MEC. Vale a pena dizer que a primeira reação do MEC à manifestação dos estudantes era a de mandá -los reclamar no Procon. Que absurdo chega a visão liberal de parte do governo!
Por que é fraca a interiorização dos médicos? Porque apesar de algumas prefeituras oferece-
rem salários atrativos o médico fica na dependência do prefeito, que no decorrer do tempo não oferece o salário prometido nem condições de trabalho minimamente aceitáveis. Por isso as entidades médicas defendem a carreira de Estado com vínculo federal para os médicos e profissionais de saúde para oferecer saúde com qualidade em todo o território nacional. Mas infelizmente o governo cinicamente quer optar por alternativas tampão, superficiais e mentirosas. Ora fala de importar médicos estrangeiros sem revalidação como se estivéssemos num país “República das Bananas”, pois nos outros países é exigida a revalidação para os médicos estrangeiros, já que os outros governos se preocupam com a qualidade dos médicos que querem ir para lá. Ora se fala de jogar os estudantes de medicina no interior sem supervisão. Em relação à regulação da medicina, é dito que os médicos fazem defesa corporativa, mas não é dito que todas as profissões da saúde estão regulamentadas, menos a medicina e que ela é importante para definir a responsabilidade do médico para dar transparência às ações de saúde, não por se considerar melhor, mas porque as ações são multiprofissionais e deve ficar muito clara a responsabilidade de cada um, até para facilitar a integração. Parece que o governo escolheu para Judas o médico, talvez seja mais fácil para esconder a incompetência do ministro da Saúde. * Militante do PCdoB, Rio de Janeiro
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Meio ambiente, um debate ainda incipiente
U
m dos temas que mais tem repercutido na atualidade se chama Meio Ambiente. É praticamente impossível verificar algum veículo diário de comunicação, seja este vinculado à grande imprensa ou mesmo alternativo, que não aborde tal temática. Por Pedro Luíz Teixeira de Camargo (Peixe)*
Entretanto, a abordagem em cima dos recursos naturais, principalmente a abordagem acadêmica não vai de fundo à raiz do problema que gera de fato a degradação ambiental: a coletividade da produção econômica e a individualidade do lucro. Isto se dá pelo fato da definição de trabalho para Marx (1978) começar no momento que o homem começa a modificar as forças da natureza, colocando-a seu serviço. Ou seja, o ato de modificar um bem natural para uso próprio ou de outro gera uma relação de trabalho. Porém se só se pode considerar como trabalho o que o homem pode ou possa modificar, como considerar os bens naturais e sua preservação uma relação econômica? Eis uma pergunta que os marxistas precisam ainda descobrir a resposta, entretanto é possível entender algumas coisas, como por exemplo, ser impossível, dentro das relações econômicas atuais, buscar o que se convencionou chamar de “desenvolvimento sustentável”. O motivo para isso é simples, como se ter uma produção sustentável dentro de uma corporação capitalista, tendo em vista que seu objetivo final é o lucro? Somente será possível se o bem natural representar um valor monetário para ficar onde está, e para tal, só temos medidas paliativas, como os modelos de valoração ambiental. Solução de fato, somente com uma produção coletiva que não vise o lucro, algo impossível no modo de produção dominante (Capitalismo). De maneira a contribuir com esta reflexão e entrar de fato neste debate, é que o PCdoB precisa abordar este tema com a seriedade que merece, e não devendo mais o Meio Ambiente ficar refém de 78
apenas alguns poucos “ambientalistas vermelhos”, pois a falta de participação dos comunistas abre um espaço vazio que vem sido ocupado cada vez mais pelo discurso neoliberal, especialmente pelo realizado por ONGs internacionais, que de internacionalistas não têm nada, como WWF e Greenpeace. Por trás de um belo discurso ambientalmente justo, vemos a saída de produtos nacionais de maneira irregular (biopirataria) que gera inclusive conflitos econômicos de interesse nacional (caso do pedido de quebra de patente do cupuaçu pela França em 2000, por exemplo). Fora a biopirataria, outro problema que vemos está em relação à prestação de contas, pois muitas ONGs nada mais são que entidades para lavagem de dinheiro, o que coloca em xeque, mais uma vez, o porquê da existência de tantas em nosso território e da necessidade da atualização das leis brasileiras sobre tal tema. Após estes breves comentários, são possíveis algumas medidas importantes a serem tomadas neste Congresso em relação ao tema ambiental, sendo a primeira delas, a obrigatoriedade de existência de Secretarias de Meio Ambiente em cada um dos diretórios estaduais e municipais do Partido. Apesar de termos tido um recente encontro nacional para debater a política ambiental do PCdoB (2013), ainda não são todos os estados que possuem uma Secretaria para tratar especificamente disto, ficando muitos estados reféns de “Comissões”. Este é um assunto estratégico para os comunistas e que precisa ter a devida importância por parte de suas direções, sendo que o primeiro passo para se mostrar tal seriedade é cobrando da própria máquina partidária intermediária a existência e funcionamento de tais Secretarias. Portanto, com base nos escritos acima e de maneira a enfatizar o que apresento, proponho também que o Estatuto do Partido Comunista do Brasil, em seu Artigo 15 e Parágrafo 7º, acrescente a palavra Meio Ambiente após Juventude, ficando com a seguinte redação: “Os Comitês elegem, de acordo com as circunstâncias de cada caso, responsáveis pelas Secretarias de Organização, de Finanças, de Comunicação, Sindical, de Formação e Propaganda, de
Tribuna de debates Juventude, de Meio Ambiente, de Movimentos Sociais, de Relações Institucionais e Políticas Públicas, e outras, bem como as Comissões Auxiliares, que possuem responsabilidades executivas e respondem pelas tarefas cotidianas perante a Comissão Política”. Outro tema polêmico que se observa se dá na busca desenfreada pela preservação da Amazônia. É bem verdade que a biogeodiversidade amazônica é uma das mais belas e importantes do planeta, mas deixar de fora a Mata Atlântica (ou o que sobrou dela), o Pantanal e mesmo o Cerrado, a meu ver não faz sentido, haja vista a importância estratégica e biodiversa de cada um. O avanço do agronegócio, em especial na região central do país (ameaçando o Cerrado e o Pantanal), assim como as monoculturas de cana de açúcar no litoral (ameaçando a Mata Atlântica), precisam ter a mesma importância da preservação amazônica, pois apesar do impacto econômico ser menor, em termos de biodiversidade vegetal e animal podem chegar a ser, até mesmo, maiores. Com base nisso apresento também a proposta de inclusão das palavras Mata Atlântica, Pantanal e Cerrado após Amazônia no artigo 47 do Programa Socialista para o Brasil e também no artigo 155 das Teses para Debate do 13° Congresso do PCdoB, ficando estes, então, com as seguintes redações (respectivamente): “Proteção do meio ambiente. Soberania nacional, desenvolvimento e proteção do meio ambiente, compatíveis com as atuais exigências de um desenvolvimento sustentável (...), Proteção de todos os biomas do país, com destaque para a Ama-
zônia, Mata Atlântica, Pantanal e Cerrado. É necessário assegurar o equilíbrio ecológico e promover o desenvolvimento socioeconômico que garanta ao povo trabalho e vida digna (artigo 47 do Programa Socialista para o Brasil)” e “Com base nesses fundamentos, o PCdoB formula uma proposta de luta ambiental que compreende os seguintes itens: Luta em defesa do desenvolvimento sustentável soberano, (...) defesa da Amazônia, Mata Atlântica, Pantanal e Cerrado (...), defesa do princípio das ‘responsabilidades comuns, porém diferenciadas’ entre os países”. Para concluir, justifico minhas propostas de emenda aditiva, pedindo a reflexão dos camaradas para este tema, ter quadros partidários destacados nesta função deve fazer parte da estratégia socialista, hoje é comum vermos o PCdoB dirigindo Secretarias de Meio Ambiente sem saber bem o que deve ser o papel do gestor comunista, investir nos estudos nesta área, assim como também investir politicamente, pode ser a chave para levarmos o debate marxista onde hoje ele ainda é minoritário, entretanto não menos importante: no Meio Ambiente, afinal de contas, somente o socialismo poderá garantir de fato um futuro sustentável, e é nosso dever propagar esta ideia.
Referência
• MARX, K.O Capital [Livro I]. São Paulo: Ciências Humanas. 1978. * Militante do PCdoB, Ouro Preto, MG
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Tribuna de debates
A centralidade do Centralismo Democrático, ou, dos riscos inerentes ao crescimento partidário em uma sociedade “liberal”
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Parte 1
Centralismo Democrático é um pilar de sustentação para um partido leninista. Sua construção como ideia força reside na própria origem do Partido, como vanguarda de uma classe explorada, que aprendeu no dia a dia das fábricas a importância da disciplina e da unidade. Por Renato Arthur* Tanto que Marx, ao tratar do fantasma que rondava a Europa, no Manifesto Comunista, aponta a classe operária como a portadora do germe da destruição do capitalismo. E é esta vivência, pela prática, que faz dos operários os responsáveis pelo futuro de uma nova sociedade. Podem perguntar: mas isto não é a reafirmação de princípios do PCdoB? Seria necessário falar sobre isto, neste momento de manifestações populares? Creio que sim! No parágrafo 113 das Teses, está em destaque o crescimento de nosso Partido, expresso em números, mas que, podemos dizer, estão ainda distantes da nossa necessidade de expansão. E da sua possibilidade também. Potencialmente podemos mais! Mas... As virtudes e vicissitudes deste crescimento devem ser pesadas. Em uma balança que contemple todas as características necessárias para tal. A importância da adesão de novas lideranças de massas com certeza é fundamental. Mas um contraponto deve ser pensado. Um partido com experiência de anos em sua formação ideológica pode ceder espaço na condução efetiva de sua direção, em todos os níveis? Em nome do crescimento e da organização interna, creio que não. Seria um contrassenso, se me colocasse contra a expansão do PCdoB, mas o que argumento aqui é que, em uma sociedade dita “liberal”, onde o democratismo é uma ideia-força, a percepção social80
democrata como forma de organização partidária está presente na maioria da militância de esquerda. E estes militantes, ao aderirem ao Partido, trazem consigo estes velhos vícios e, em boa medida, negam a necessidade do centralismo como algo anacrônico, oposto à visão “deles” do que seja democracia. Esta visão social-democrata passa a ser assimilada e quando não, implantada em níveis de direção, como reflexo de uma nova base de militância, distante da realidade comunista apesar da boa vontade. A questão do pragmatismo está colocada no item 117 de maneira apropriada, que rebaixa a importância da discussão política em prol de uma “outra” abordagem. Mas como ainda estamos na balança, do outro lado se toca no dogmatismo, que serviria como freio, em uma atitude defensiva contra as mudanças. Mas questionar estas mudanças, no que elas acarretam de retrocesso na linha de conduta do Partido, é dogmatismo? Será? Visto assim poderia ser chamado de dogmático, mas não me sentiria ofendido. O PCUS, em seu 20° Congresso, ao fazer uma flexão na sua proposta de alcance partididário, formulou a consigna: Partido de todo o povo. Quem poderia se colocar contra esta visão? Os dogmáticos? Que não iriam aceitar modificações de caráter mais profundo na vida do partido? Mas a resultante não foi o de um alargamento das fronteiras organizativas? Além até do que seria prudente? No item 119, o Partido aponta os rumos para o enfrentamento destas vicissitudes. Citando aqui um trecho: “As maiores respostas dadas às vicissitudes foram as de tratar de maneira combinada três formas de luta entrelaçadas para acumular forças em caráter estratégico, portanto revolucionário, sem unilateralismos: a luta social de massas, a luta polí-
Tribuna de debates tica-eleitoral e a luta de ideias, todas elas com caráter político. Junto a isso, disputar ativamente as bases sociais fundamentais, a saber, os trabalhadores, a juventude e as mulheres. E seguir aprimorando o centralismo democrático, para um partido com liberdade de opinião e unido na ação concreta em cada caso.” A formulação apresentada aponta claramente o rumo a seguir, sem sombra de dúvidas. Porém, mais uma vez alerto, uma nova base se faz presente em nosso meio e tem uma visão ainda não elaborada da militância comunista. Uma visão social-democrata, que se apresenta desde uma forma de organização não leninista, passando pela primazia da luta político-eleitoral, como resultado de sua militância anterior à filiação ao PCdoB.
Como se contrapor a isto? A resposta vem de pronto: Formação. Na disputa das bases sociais que são fundamentais para a luta e que são o nosso maior patrimônio: trabalhadores, juventude e mulheres. Preparando a fermentação do novo ser humano. E seguir aprimorando o Centralismo Democrático. Posto assim, temos as ferramentas para encarar esta tarefa, mas precisamos ter a exata compreensão de que os enfrentamentos virão. E que haverá horas em que será necessário enfrentar camaradas, amigos até. Mas que devem se colocar antes como membros de um Partido de orientação marxista-leninista e que tem neste pilar, o Centralismo Democrático, a sua principal força para enfrentar as verdadeiras vicissitudes. * Membro do Comitê Municipal de Santa Inês, Maranhão
Partido de massas ou um partido formador das massas? Ainda sobre os riscos do momento presente
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Parte 2
ensando ainda na perspectiva do meu artigo anterior, que tratava da centralidade do centralismo e dos riscos a que estamos submetidos, gostaria de ir além nesta discussão. Por Renato Arthur* Reconhecer que existe uma pressão externa e/ou interna para a adequação do Partido ao momento atual é o primeiro passo. Um dos sintomas desta pressão se dá na elaboração, talvez ainda inconsciente, de uma redefinição do partido. Afinal, que partido queremos? Será que é este o partido de que necessitamos? Durante o 7° Congresso tínhamos uma palavra de ordem que me marcou, quando juntos, todos os delegados presentes gritavam: “Em breve, em breve, seremos um milhão pra junto com o povo fazer Re-
volução”. Os anos se passaram e o partido continua a sua trajetória de crescimento, conforme demonstra o item 113 das Teses. Este deve ser nosso rumo, mas qual a fronteira entre um partido de massas e um partido revolucionário? Há uma linha de corte? A preocupação que me fez voltar à Tribuna de Debates persiste. Esta pressão, necessária, pela ampliação de nossa força é justa, mas abre precedentes perigosos, como a influência de uma visão social-democrata trazida pelos novos aderentes. Mas que pode se consolidar na redefinição pragmática de nosso Partido, ao crescermos rapidamente sem uma barreira organizativa. Como leninistas, vivemos nos dias atuais o processo constante de Unidade e Luta em um governo de alianças, nem sempre com os melhores aliados. Mas em uma aliança com o PT estamos pondo à prova este princípio da unidade, com o combate permanente pela condução política. 81
Tribuna de debates Podemos dizer que o PT é um partido de massas. Em parte pela presença e participação popular. Mas isto não implica dizer que não existam revolucionários nesse partido, sim existem, mas não existe uma base organizada para que estes se expressem. Seus quadros dirigentes vivem o “democratismo” da Social Democracia, pela sua prática e formação. A experiência tem demonstrado o acerto em nossas ações no jogo político até aqui. E é esta base organizada, voltada para a revolução que deve distinguir os partidos de massa daquele que se quer revolucionário. Aí encontramos a nossa linha de corte. Um partido centralizado, que discute e prepara a sua ação política, mas que age e reage como um organismo vivo, enfrentando as dificuldades que se apresentem como um só centro de lutas. Pronto a dar respostas a tudo de maneira única. Esta é a disposição! Mas aqui eu pergunto: a realidade de nossa expansão e crescimento nestes novos tempos nos permite pensar e agir assim? Quanto de nossas ações passaram a serem retardadas ou mesmo impedidas pela presença desta nova base de visão socialdemocrata, quando o jogo eleitoral passou a ter uma importância maior? As vezes única opção. O revisionismo de Kruschov lançou a teoria dos Dois Todos, (Partido de todo o povo e Estado de todo o povo), a que nos opussemos, em conjunto com o Partido Comunista Chinês. Por ser uma porta para o fim do partido de classe e da ditadura do proletariado. Se hoje trabalharmos com a hipótese da batalha eleitoral, nos marcos da democracia vi-
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gente, como a forma de luta prioritária não corremos este mesmo risco? Aqui quero destacar minha visão. O Partido que precisamos não é de massas, mas um Partido formador das massas. Que seja o condutor das lutas e um exemplo revolucionário. Não podemos perder este rumo. Um partido de massas, dirigido pelas massas, não é revolucionário, é conduzido, Transforma-se em passageiro em um carro desgovernado! Não bastaria somente investir na formação, que continua a ser de fundamental importância, mas a relação crescimento/formação ainda não é suficiente para responder a esta necessidade, tendo em vista a nossa taxa de adesões ser superior nossa possibilidade de formar quadros, e isto num tempo curtíssimo. O que fazer? Penso que a resposta pode desagradar a alguns camaradas, pois acho que em muitos casos seria necessário intervir nos organismos intermediários, alterando direção ou decisões políticas que firam o princípio norteador de um Partido pautado pela revolução e não pela eleição como batalha principal. Quando alianças eleitorais pontuais jogam por terra o Centralismo Democrático e a perspectiva da via revolucionária, precisamos parar e pensar em nossa conduta. E este é o momento de refletir internamente, fazendo deste Congresso uma tribuna para as transformações que necessitamos. * Membro do Comitê Municipal de Santa Inês, Maranhão
Tribuna de debates
A Visão de partido: Reflexo de suas ações e forma organizativa Parte 3
Como este é o meu último artigo, dos três possíveis, quero concluí-lo apresentando minhas preocupações sobre a questão que considero de extrema importância, a visão de partido, sua prática a as ações consequentes em sua conduta na aplicação da política, interna e externamente; certa formulação me chamou a atenção. Por Renato Arthur Nascimento* Em um artigo apresentado à Tribuna de Debates um camarada trata da questão partidária. Fala em “corporativismo exacerbado”, em “xenofobia partidária”, opondo claramente duas visões de partido. Aquela, que ele defende ser a de um partido mais aberto e arejado, em sintonia com o momento atual, onde falaria mais alto a “democracia”, um partido “administrado” para o crescimento. Em oposição à visão leninista de partido, de caráter revolucionário, que trava a luta política, porém, com uma preocupação quanto à forma e à sua organização interna, onde o Centralismo Democrático tem o seu peso maior, contrário ao democratismo desta visão mais “aberta”. Se esta dicotomia entre a amplitude e o leninismo for vista como corporativa e exacerbada, onde o Partido deve rebaixar sua posição frente às necessidades administrativas, então assumo esta formulação como a minha visão de partido. Pois quero que meu Partido seja um condutor da luta de massas e não um partido desfigurado, a reboque das massas, dependente de questões alheias à sua linha política, com uma prática distante daquela que considero a mais correta. Serei então mais um membro do “corporativismo exacerbado”. Mas, como a História sempre nos dá pistas para seguir em frente, vamos pensar no que e como se deu o processo revolucionário na Rússia, com Lenin a frente do Partido. Além dos bolcheviques, existiam outros partidos que dividiam o campo revolucionário, além dos partidos de direita. Mas vamos nos concentrar naqueles que estavam mais próximos nas ações revolucionárias.
Os mencheviques, que não se pautavam pela mesma visão organizativa e política, em oposição ao Partido. E os socialistas revolucionários, representantes de parcelas expressivas de camponeses e que também tinham uma prática política diferenciada. Lembro aqui um detalhe importante, quase nunca comentado, principalmente por seus seguidores. Trotsky era menchevique e aderiu aos bolcheviques em um momento mais próximo da revolução. E, mesmo durante os momentos iniciais, ainda não fazia parte do Comitê Central bolchevique. Destes dois partidos, certamente muitos aderiram aos bolcheviques após a vitória da Revolução. E com esta adesão levariam consigo as suas práticas e uma outra visão de partido, mais “aberta”, mais “ampla”; mas Lenin e Stalin, posteriormente, iriam defender o caráter revolucionário do Partido, na defesa de sua organização e prática política. Deveríamos então dizer que tanto Lenin quanto Stalin se pautaram pelo “corporativismo exacerbado”, em oposição a esta “visão mais ampla de democracia partidária”? Ou que sofriam de “xenofobia partidária”? Como sindicalista, embora hoje quase aposentado, sempre lutei pela visão da luta sindical pelo viés revolucionário, oposto à visão economicista, que influencia uma parcela significativa do movimento sindical, pois para muitos companheiros a luta sindical, estrita, prescinde da luta política. Algo que Lenin deixava bem claro em seus escritos sobre os sindicatos. A posição mais “ampla”, “aberta”, seria a prática economicista em oposição à visão revolucionária? Já que uma atingia a massa de trabalhadores no que ela tem de mais sensível, o bolso? E a outra preparava os trabalhadores para uma luta incansável contra o sistema capitalista. Seria este um confronto entre o “corporativismo exacerbado” de Lenin frente os interesses “maiores” daqueles que não se pautavam pela Revolução? Tenho visto com reservas companheiros que utilizam um texto de Lenin contra Lenin. Citar o livro “Esquerdismo, a doença infantil do comunismo,” como argumento de defesa em oposição aos que 83
Tribuna de debates defendem o Partido pela sua forma de organização leninista, não é atacar Lenin? No item 105 das teses do Congresso encontramos a citação do Leninismo Contemporâneo, que é uma expressão que deverá ser mais bem compreendida, já que tem possibilitado uma visão de negação do caráter revolucionário de nosso partido para alguns militantes e dirigentes. Como se esta deveria ser a “grande novidade” a ser implementada. Porém, a ressalva contrária a esta posição se encontra no mesmo item, ao colocar que: “O desafio é firmar a concepção de permanência de princípios e identidade comunistas, renovação de concepções e práticas com base em um caminho próprio para o socialismo, e abertura para ampliar as fileiras partidárias e falar a toda a sociedade.” Trabalhar a dialética do movimento revolucionário brasileiro, mas a partir da permanência de princípios e identidade comu-
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nistas, reafirmo aqui. Mas com o devido cuidado, para evitar desvios, seja à esquerda ou à direita em nosso caminho para a Revolução. Por fim, gostaria de fazer minhas as palavras do camarada Clovis Calado, que em seu artigo sobre a leitura correta do livro Esquerdismo..., de Lenin diz: “Portanto, é necessário – mais do que nunca – reforçar o papel combativo do Partido, tornando-o próximo das massas trabalhadoras, com uma linha mais justa e um incansável trabalho ideológico, formando combatentes revolucionários para a luta. Sem isso, o Partido se transforma em Partido Comunista apenas nas palavras.” * Militante do PCdoB, São Luis, MA
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O conhecimento-mercadoria na produção de mais-valia relativa e a valorização do capital
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Parte 1
m dos fatores que causam uma sobreacumulação de capital sem precedentes é um ponto em que o capitalismo no período hodierno apega-se, é em investimento maciço em produção tecnológica e desenvolvimento científico, o que tem entre tantos subprodutos um aumento da extração da mais-valia relativa, o que em última instância propiciou mudanças no processo produtivo, tendo efeitos sem precedentes sobre a lucratividade de grandes corporações antes da crise. Por Renato Gomes dos Reis* O que os operários parcelares perdem concentrase, face a eles, no capital. É um produto da divisão manufatureira do trabalho colocar face a eles as potências espirituais do processo material de produção como propriedade estranha e poder que os domina. [...] Este processo de cisão começa na cooperação simples onde o capitalista, perante os operários singulares, representa a unidade e a vontade do corpo de trabalho social. Desenvolve-se na manufatura, que mutila o operário em operário parcelar. Completa-se na grande indústria, que separa a ciência — enquanto potência autônoma de produção — do trabalho e a espreme ao serviço do capital.(O Capital – Karl Marx) Podemos conjecturar que o processo de aumento da exploração da mais-valia relativa gerou o fulcro da crise,uma vez que propiciou um aumento do fluxo de capital fictício, sendo um efeito do desenvolvimento da tecnologia. Temos que a produção como a formação do operário, digamos em princípio de uma forma acadêmica, isso em nada altera a relação, despende força de trabalho (Marx, 1983, pp. 105-106), que está inclusa de forma implícita no processo, destarte, a força de trabalho é, concomitantemente, agente e suporte de mais-valia (SANTOS, 1992). A lógica do capitalismo impele-o a promover a
integração econômica e tecnológica entre as empresas, objetivando cada vez mais reduzir o tempo de trabalho incorporado ao produto que fabrica. O caso particular que estamos aqui discorrendo é uma situação de alta produtividade, prevalecendo nesta a mais-valia relativa, sendo requisito e condição sine qua non ocorrer em países com alto desenvolvimento econômico, em que o crescimento demográfico é baixo ou estagnante. Temos então que o tempo de trabalho incorporado nas novas gerações supera a precedente, reduz-se também o tempo de trabalho doméstico. Na razão inversa, promove-se um acréscimo do tempo de trabalho escolar, em países periféricos do ponto de vista do desenvolvimento econômico dá-se o inverso. No caso em que consideramos a mais-valia relativa, temos um aprofundamento da divisão social do trabalho, os conhecimentos científicos e tecnológicos advindos dos primeiros e as novas especialidades reforçam a relevância das instituições de ensino, impelindo o proletariado em uma luta visando o aumento do tempo de trabalho incorporado à sua força de trabalho. A burguesia mobiliza-se objetivando que seja mais qualificada a força de trabalho, ocultando o caráter vil da subtração da mais-valia, aumentando-a exponencialmente, promovendo uma conciliação de interesses em que apenas são levados em conta os seus próprios como classe, isso resultando em um aumento da instrução, por um lado, e passa a ser uma das condições gerais da produção e da reprodução da força de trabalho. Por outro, o proletariado por sua vez é expropriado de forma espúria dos saberes adquiridos tendo-os que verter no final de um complexo processo em mercadorias. Neste momento da evolução do capitalismo podem os capitalistas não só explorar o trabalho físico, mas também o intelectual, uma vez que primordialmente o capitalismo via das duas componentes a possibilidade de exploração de apenas a física, atualmente, relativiza o valor da primeira, assumindo assim uma forma nova de exploração. 85
Tribuna de debates Consoante a teoria marxiana (MARX, 2003): “O modo de produção da vida material condiciona o processo da vida social, política e espiritual em geral”. Naturalmente isso permeia o sistema escolar, cuja forma organizacional é moldada à imagem e semelhança do capitalismo, nos aspectos de divisão de atribuições, hierarquia do poder, na abolição da liberdade de cátedra. Também observamos isso na determinação dos horários escolares, dos processos de avaliação. Destarte, recruta a escola operários objetivando formar os educandos operários, caracteriza-se aqui notoriamente a força de trabalho sendo usada na produção de outra. Dá-se o mesmo no processo de trabalho pedagógico, ocorre um cisma entre o trabalho docente e os gestores, decorre daí também que a avaliação da docência dá-se pela observação da execução integral do programa ou pela falta deste resultado. Assim, dentro de um processo em que se desconsideram várias variáveis, o trabalho do docente será considerado eficiente se no final do ano letivo conseguiu cumprir todo o programa, como por exemplo, a defasagem entre as potencialidades dos estudantes e o programa. Submetidos ao jugo do capital que se faz
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presente a uma perversa lógica no antro escolar ocorre ou impõe-se uma submissão hierárquica na distribuição de afazeres, ao corpo docente não se permite a participação no processo de produção do saber, está sob o jugo de seus superiores quebrantando a liberdade de cátedra. O desenvolvimento tecnológico inerente ao capitalismo causa um cisma e causa uma oposição entre os trabalhos de execução e os de concepção, aprofundando esta separação e oposição, afastando, cada vez mais, os trabalhadores do conhecimento científico, assim com ocorre com o campo e a cidade, em um antagonismo sistêmico (SANTOS, 1992), (MARX, 1983). Com o desenvolvimento da lógica capitalista, ocorreu também institucionalizado na sociedade capitalista, isso é descrito na obra marxiana, isso reproduz-se em profusão e de forma contínua. A lógica do capital acaba por legitimar a dominação burocrática, como instrumento de poder. Dessa forma a racionalidade instrumental associada à acumulação capitalista figura como um mecanismo reprodutor de mais-valia. * Membro do Comitê Municipal de Birigui, SP
Tribuna de debates
O conhecimento-mercadoria na produção de mais-valia relativa e a valorização do capital
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Parte 2
capitalismo desenvolve e introjeta a gestão do conhecimento em todos os setores da economia, desenvolve mecanismos para monitorar o capital intelectual o proletariado como classe passa a integrar a lógica de exploração implícita na maisvalia relativa, em um processo complexo e intrincado, ocorre o conhecimento-mercadoria na valorização do capital (PAZ; BEZERRA, s/d). Por Renato Gomes dos Reis* Podemos conjecturar a institucionalização da mais valia relativa seria utilizando um do modelo descrito por (DEMAREST, 1997) que versa sobre a apropriação do conhecimento, via incorporação e aplicação do conhecimento, isso poderia descrever o intrincado processo de legitimação da mais-valia relativa nas instituições pesquisadas e a intensidade de ocorrência, podemos também ainda nos valer da hermenêutica marxiana podemos ampliar nossa análise da força de trabalho docente e discente na dialética infraestrutura superestrutura, (op.cit. s/d), quanto aos docentes são trabalhadores assalariados, não obstante, os discentes desenvolvem atividades cuja convenção nos leva a uma nomenclatura o não trabalho (GRAMSCI, 1985). Observando-se e fazendo-se uma análise da infraestrutura, a obra marxiana a explica, bem como a fenomenologia do capitalismo moderno e a sua relação com o processo de exploração e expropriação do conhecimento-mercadoria, não obstante, a compreensão destes mecanismos estão ainda distantes no que tange a superestrutura (MARX (1980, 1984, 1985). Surge na segunda metade do século 20, um corpo teórico que destaca a importância do conhecimento para o processo de valorização do capital, destarte, irá figurar a educação na função produção que terá uma resultante macroeconômica. A teoria do capital humano desenvolvida por Be-
cker (BECKER, 1964) e Schultz (SCHULTZ, 1962), (SCHULTZ 1973), apresenta uma amplitude na esfera da valorização do conhecimento-mercadoria nas unidades educativas de produção de conhecimento formais e informais (op.cit. s/d). Seu destaque foi ressaltado quando da inserção dos modelos fordistas e tayloristas do modo de produção capitalista, doravante verteu-se o conhecimento-mercadoria em uma referência no sistema capitalista de produção, erigida sob uma base técnica original: O conhecimento (op. cit. s/d). Observando-se a conjuntura internacional e o desenvolvimento capitalista das últimas três décadas do século 20, as descrições dos processos de apropriação que descrevemos acima tiveram como resultado que a valorização do capital passa a ter uma relação de pertinência com a parte superestrutural, o que resulta na abolição vil da liberdade de cátedra. Devemos entender também os lugares da força de trabalho docente e discente no projeto emancipatório sem olvidar sua participação nas revoluções científica e burguesas (op. cit. s/d). Do ponto de vista da formação da força de trabalho temos as unidades de profissionalização de trabalho discente, que funcionam como espaço de enriquecimento, que posteriormente será agregado á valorização do capital como capital variável, destarte, denomina-se conhecimento de conhecimento-mercadoria. Ocorre que o trabalho pedagógico, são concomitantemente profissionalização e sujeição da força de trabalho aos imperativos de expropriação do conhecimento no processo de valorização do capital, cuja execução ocorre no ato de concretização do contrato de trabalho (op. cit. s/d). Do que discorremos podemos concluir que a exploração do capital intelectual não ocorre ao acaso, e é imperativo fazer-se um estudo sobre o processo de introjeção dos processos de gestão do conhecimento objetivando legitimar mecanismos de extração de mais-valia relativa, essa institucionalização relacio87
Tribuna de debates na-se diretamente com o advento da racionalidade instrumental e uma lógica utilitarista, sobre esta égide edifica-se o capitalismo moderno cuja reprodutividade dá-se com uma visão de mundo instituída.
Bibliografia • BECKER, B. F. Human capital: a teorical and empirical analysis with special reference to • education. Columbia, s. ed., 1964. • DEMAREST, M. () - Understanding knowledge management. Journal of Long Range Planning, v. 30. n.3, pp. 374-384, 1997. • GRAMSCI, Antonio. Os Intelectuais e a organização da cultura. 6ª ed. Rio de Janeiro: • Civilização Brasileira, 1985. • MARX, K. Contribuição à Crítica da Economia Política: Martins Fontes, 2. ed., 2003 O Capital: Crítica da economia política. Vol. I, Tomo I. São Paulo: Abril Cultural, 1983.
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• Capítulo VI Inédito de O Capital: resultados do processo de produção imedianta. São Paulo: Editora Moraes, 1985.. Manuscritos: economia y filosofia. Madrid: Alianza Editorial, 1984. A ideología alemã. São Paulo: Martins fontes, 1980. • PAZ, S. R.; BEZERRA, C. O conhecimento-mercadoria na valorização do capital a produção social do conhecimento nas unidades educativas formais e informais. Disponível em: http://www.unicamp. br/cemarx/anais_v_coloquio_arquivos/arquivos/ comunicacoes/gt5/sessao1/Sandra_Paz.pdf. Acesso em: 10/abr de 2013. • SANTOS, O. J. Escola e trabalhadores: o campo básico da prática dos trabalhadores. In: Pedagogia dos conflitos sociais. Papyrus. São Paulo, 1992. • SCHULTZ, T. O valor econômico da educação. Rio de Janeiro: Zahar, 1962.. O capital humano. Rio de Janeiro: Zahar, 1973. * Membro do Comitê Municipal de Birigui, SP
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O desafio da construção do pensamento revolucionário
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Partido Comunista tem como sua causa o grande ideal da superação revolucionária do capitalismo e da construção da nova sociedade socialista. Este objetivo maior somente será alcançado com o desenvolvimento da teoria revolucionária, que plasme um pensamento avançado engajado no seu tempo histórico. – 1ª Parte. Por Renato Rabelo* A luta pelo desenvolvimento e aplicação de um pensamento de esquerda revolucionário, marxista, em nosso tempo no Brasil, que se concretize na existência de um partido comunista de feição e prática revolucionárias - condutoras da maioria dos trabalhadores e das camadas populares - tem sido o centro de um embate histórico incessante do Partido Comunista do Brasil. Esse grande embate transcorre desde a fundação do Partido em 1922, passando pela reorganização de sentido revolucionário em 1962, seguindo no 8º Congresso, em 1992, quando enfrentou e venceu a avalanche da derrota estratégica do socialismo. Segue, hoje, na tarefa primordial de reavivar a perspectiva comunista, na luta do PCdoB que compreende a acumulação estratégica de sentido revolucionário nas novas condições políticas inauguradas pela vitória de Luiz Inácio Lula da Silva em 2002, num mundo em que o movimento revolucionário está sujeito ainda a uma correlação de forças que favorece o imperialismo-capitalismo. O PCdoB analisa que esse hodierno período histórico coloca os comunistas diante da disjuntiva - de colocar em marcha uma nova luta pelo socialismo, retirando as lições da construção do socialismo do século passado, atualizando o caminho e reavivando seu rumo – ou prevalecerão o sistema e a ordem capitalistas por longo período histórico, num retrocesso civilizacional. Na avaliação histórica feita pelo Partido, ressaltando ensinamentos capitais, depreendemos que o socialismo inicia seus passos na história. O seu propósito primordial é resolver a contradição essencial do capi-
talismo: produção cada vez mais social em antagonismo crescente com a forma de apropriação privada da renda e da riqueza. Somente será possível essa realização com o estabelecimento do poder de Estado dos trabalhadores e seus aliados. Mas o aprendizado da construção do socialismo ressalta que não há modelo único nem de socialismo, nem de revolução. Sua edificação passa por um período objetivo de transição, com etapas conforme as peculiaridades de cada país. O PCdoB - nesta fase de sua direção na quarta geração - conseguiu situar e determinar, num esforço baseado na teoria marxista-leninista, compreendendo a realidade do atual período histórico, uma visão que embasa nosso pensamento tático e estratégico, definida no conceito: a acumulação estratégica de forças, cujo objetivo é a conquista da hegemonia dos trabalhadores e das camadas populares, configurado no poder estatal de caráter democrático-popular, visando à transição ao socialismo. A acumulação para alcance da hegemonia dá-se pela via das reformas estruturais e de rupturas com a ordem vigente. Esta tarefa estratégica do PCdoB é delineada no seu Programa -- o caminho de fortalecer a nação, no rumo da luta pelo socialismo. Portanto, o caminho não deve se perder nos desvãos da caminhada, não se esgota, até que seja atingido o destino socialista. Na linha programática atual, a realização plena de Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento se constitui no caminho brasileiro para o socialismo. Portanto, esse não é um fim em si mesmo. Este novo Projeto é compreendido essencialmente no entrelaçamento entre as tarefas fundamentais da luta pela soberania nacional, a democratização da sociedade, o progresso social, a defesa do meio ambiente, a integração solidária da América Latina. A concretização dessas tarefas se realizará por meio das reformas democráticas na superestrutura político-institucional (reforma política, reforma do poder judiciário, democratização dos meios de comunicação), e nas reformas econômicas e estruturais da sociedade (reforma financeira, reforma tributária, reforma urbana, reforma agrária consequente, universalização de qualidade da saúde e educação). 89
Tribuna de debates Neste conjunto de tarefas a questão nacional assume a centralidade. Isso é decorrência da etapa do imperialismo, sobretudo nos países da chamada periferia do sistema, que estão submetidos a uma contradição básica: anseio dos povos por mais profundo desenvolvimento e progresso socialversus a hegemonia dominante do imperialismo e de seus aliados internos voltados para prevalecer seus desígnios antinacionais. O pensamento revolucionário do PCdoB, em desenvolvimento, compreende a visão da construção e gestão de nossa instituição política maior e instrumento imprescindível para aplicação da nossa linha básica e Programa, reduto da nossa ideologia transformadora - o Partido Comunista. Reafirmamos a identidade do Partido Comunista do Brasil, que é expressão do desenvolvimento da nossa teoria base, o marxismo-leninismo, partido político da classe trabalhadora destinado à conquista e construção do socialismo, partido patriótico e internacionalista. A continuidade da opção revolucionária, marxista-leninista, nas condições históricas de nova luta pelo socialismo, se traduz no modo da edificação atual do Partido Comunista. Para cumprir sua missão o Partido não se encerra no principismo - restri-
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to a propaganda revolucionária, sem influência no curso político e nas massas - nem deve se tornar um agrupamento possibilista e pragmático. Concebemos hoje o PCdoB, na exigência da acumulação de forças estratégica, como vanguarda na articulação dialética entre a luta política em todas as suas dimensões, a luta social de massas e a luta de ideias. Na sua estruturação perseguimos a formação de um Partido sem alas nem grupos, com um único centro dirigente, com ampla liberdade de opinião e debate de ideias, com unidade ideológica e unidade de ação política. Composto por núcleos dirigentes com firmeza e convicção revolucionárias, esteios para construção de um partido orgânico de massas de militantes, voltado para a ação política. Ao fim e ao cabo a aplicação da linha política e da edificação partidária depende dos quadros, eles são o fator decisivo para aplicação das decisões. A nossa política atualizada de quadros procurou responder às novas exigências da linha programática e da construção partidária. A segunda parte versará sobre a aplicação do nosso pensamento revolucionário pelo PCdoB. * Presidente nacional do PCdoB
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Sobre o Leninismo Contemporâneo
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m uma fala dirigida contra Trostky, Lênin disse certa vez que a insistência de alguns intelectuais em inventar categorias servia unicamente para confundir o povo e tergiversar sobre os princípios, levando a discussões inúteis, enormes perdas de tempo e até mesmo a cisões no seio do partido. Por Rita Coitinho* São momentos históricos bastante diferentes, mas nas teses do 13°Congresso do PCdoB é inevitável que nos surja uma interrogação sobre uma nova categoria que aparece no parágrafo 105: o “leninismo contemporâneo”. Ele parece estar ligado à outra formulação, a de “um partido de feições modernas”. É de fato necessário lançar mão dessas novas categorias? Nosso primeiro exercício é o de refletir sobre o leninismo ou, para usar o termo exato, o marxismo -leninismo, para a seguir entender as razões por que se busca substituir um conceito por outro. Em artigo que publiquei há alguns meses citei uma passagem de Álvaro Cunhal em que ele definiu de maneira clara e profunda a essência do marxismo-leninismo: “um sistema de teorias que explicam o mundo e indicam como transformá-lo”. Seus princípios e o método são instrumentos indispensáveis à análise científica da realidade e à definição de soluções concretas para os problemas concretos que a situação objetiva e a luta colocam às forças revolucionárias. Constituem-se em patrimônio teórico e enriquecem-se com a assimilação crítica das experiências históricas. O partido aprendeu com seus próprios reveses que o dogmatismo a substituição da análise das situações e dos fenômenos pela transcrição sistemática dos textos clássicos como respostas a situações que só a análise atual pode permitir precisa ser combatido, sob pena de levar o partido a ações desconectadas da realidade e ao isolamento. E o entendimento da teoria marxista-leninista como instrumento de análise é a negação do dogmatismo. É a permanente confrontação da realidade com a teoria e o desenvolvimento criativo do pensamento em interação com a prática.
Na luta contra o dogmatismo o partido tem buscado com seriedade o estudo da realidade brasileira, trazendo novos intelectuais para o partido, incentivando a produção de estudos sobre as mais diversas áreas. Por outro lado a grande influência da academia nas formulações partidárias vem trazendo algumas inovações que nos levam a um problema que, se por um lado se opõe ao dogmatismo, por outro nos leva ao abandono dos princípios do marxismo-leninismo e das experiências de validade universal do movimento revolucionário com uma vulgar preocupação em dar valor às “novidades” sem, no entanto, verificar sua validade de maneira criteriosa. Nas universidades a derrota do marxismo se deu justamente pela separação entre o marxismo e o leninismo, como se negar o desenvolvimento da teoria em sua unidade fosse uma inovação. O que se rejeita de Lênin? Unicamente o papel revolucionário e de vanguarda da classe operária, substituindo-o pelo papel de vanguarda dos intelectuais e da pequena burguesia urbana. Rejeita-se a concepção de aliança da classe operária com o campesinato substituindo-a por uma aliança indefinida de forças sociais heterogêneas. Rejeita-se a teoria do Estado que o concebe como instrumento de dominação de classe, donde decorre a noção de ditadura do proletariado. Refuta-se a teoria do Partido - como fração mais consciente da classe trabalhadora - substituindo-o por um amálgama sem caráter de classe. Na medida em que se refuta a crítica leninista à democracia burguesa e ao parlamentarismo burguês como formas políticas de opressão econômica e social, descobrem-se valores “novos” (que nada mais são que os valores da burguesia) que sobrepõem aos objetivos de emancipação social. Põe-se em questão a validade do partido revolucionário e da luta de classes. Acreditando inovar, os novos “marxistas” repõem na ordem do dia ideias ultrapassadas, desacreditadas já na época em que o próprio Lênin combatia a velha socialdemocracia. Dizia Marx que “a tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos. E justamente quando parecem empenhados em revolucionar-se a si e às coisas, em criar algo que jamais existiu, precisamente nesses períodos 91
Tribuna de debates de crise revolucionária, os homens conjuram ansiosamente em seu auxilio os espíritos do passado, tomando-lhes emprestado os nomes, os gritos de guerra e as roupagens, a fim de apresentar e nessa linguagem emprestada”. Parece que os “espíritos” da socialdemocracia do passado voltaram a nos assombrar. A “nova conformação histórica” ou seja, o fim da URSS parece sugerir que fomos derrotados e que todo o arcabouço teórico e todas as concepções que forjamos precisam ser refutados. Resgata-se a validade universal dos princípios democráticos e anuncia-se que nessa nova etapa já não haverá revoluções (como já decretaram Bernstein e Kautsky). Substitui-se a classe trabalhadora pela “maioria”. O aperfeiçoamento das instituições democráticas levaria essa “maioria” ao poder. O partido “moderno”, de “leninismo contemporâneo” então, já não é mais o partido da classe. É um partido que pretende representar no parlamento os interesses de uma “maioria”, onde todas as concepções teóricas são bem-vindas. Do leninismo, despido de seu caráter revolucionário e de classe, conserva-se apenas a diretiva do centralismo democrático, que acaba se tornando apenas burocrático devido à falta de democracia interna, ao mandonismo e à aversão à boa prática da crítica e da autocrítica. E, cabe ainda perguntar, que maioria é essa que se busca representar?
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Lênin, assim como Gramsci, tinha claro que a classe Revolucionária nem sempre é a maioria numérica. Não o era na revolução Frances onde a burguesia revolucionária aliou-se a outras classes e tampouco o era o proletariado na Rússia revolucionária de 1917. Dificilmente será em algum momento histórico. Não é o número de indivíduos que compõem a classe trabalhadora que determina seu papel histórico. Mas sua situação social de oposição ao velho regime. É essa situação que define a classe trabalhadora como a classe capaz de dirigir a derrubada do capitalismo e a construção de uma sociedade socialista. O Partido Comunista é o partido da classe trabalhadora. Mais do que isso: é a fração mais consciente dessa classe e é isso que o define. Sua teoria orientadora é o marxismo-leninismo, evidentemente entendido como uma teoria viva, em permanente construção. O Partido Comunista é o “partido de novo tipo”, conforme Gramsci, porque é uma organização diferente dos partidos da burguesia. Participa da institucionalidade quando pode, disputa a hegemonia na sociedade e, por meio de uma forte disciplina interna, está preparado para todas as formas de luta. Este deve ser o PCdoB. * Militante do PCdoB, Santa Catarina
Tribuna de debates
Não podemos esconder o bosque atrás das árvores
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credito que até a etapa nacional debateremos até a exaustão, da base às direções, todo temário proposto nas teses do 13° Congresso do PCdoB. O intuito é estimular o debate franco e impessoal, e acreditando nas sábias palavras do mestre Engels que é na coletividade que se formam as individualidades, na pluralidade e contradições de ideias que se tem a totalidade. Por Roberto César Cunha* Certamente o PCdoB sairá mais forte para trilhar seu rumo e azimute ao socialismo. A luta de classes está estreitamente ligada à luta de ideias. Acredito que estamos em uma retração ideológica e perdendo a luta nas ideias para direita conservadora, por isso é mister o debate, a formação teórica de todos os militantes do PCdoB. Como dizia o grande mouro alemão “as ideias dominantes são as ideias das classes dominantes”. Boa discussão a todos. *** Fazer um balanço de 10 anos dos governos progressistas depois de três décadas de paralisia econômica progênie de um entreguista e deletério plano de nação neoliberal, principalmente de Collor e FHC, seguindo ipsis literis o consenso de Washington não é tarefa simplista. Pois qualquer tipo de avaliação carece de leitura do processo histórico de nossa formação social para não cairmos em ideologismos abstratos e fora da base histórica que vivemos, por isso “não é fácil e pacífica a caracterização do processo do desenvolvimento econômico. Tratase, como em todo fato histórico, de processo extremamente complexo, ao longo do qual tudo muda na vida social: a distribuição da população, as condições de trabalho e a produção, a distribuição da riqueza social e seu modo de apropriação, a quantidade e a qualidade do capital necessário ao processo produtivo, a técnica da produção. Paralelamente, muda também a cultura, isto é, a ideia que o homem faz de si mesmo e do mundo em que vive.” (Ignácio
Rangel.) Não podemos esconder o bosque atrás das árvore Temos que pôr a descoberto todo o mecanismo, sem apresentá-lo sob inocentes roupagens. O Brasil afasta-se do infortúnio neoliberal e recomeça o seu meândrico caminho. Sem paralelo na história chegam ao poder central do país forças populares, capitaneadas por Lula e Dilma. Vários programas assistencialistas e de inclusão social são criados e ampliados, entre eles: Bolsa Família, ProUni, Pronaf. Uma inegável criação de emprego em massa (cerca de 21 milhões). Em dez anos o Brasil teve avanços principalmente na área social onde cerca de 30 milhões de pessoas foram transplantadas da miséria extrema. O Brasil ganhou conotações importantes no cenário internacional, principalmente, após ser escolhido como sede dos dois maiores eventos esportivos do mundo (Copa 2014 e Olimpíadas 2016). Isso tudo dentro do contexto especial que vive a América Latina. Um aumento abissal nas suas exportações de commodities e produtos industrializados. O país é uma potência mundial no setor da agroindústria e não podemos cair no reducionismo, como setores da esquerda, que são apenas commodities. Só relembrando que foi a agroindústria que minimizou a crise dos anos 1980 e que, eminentemente, responsável pelos nossos saldos comerciais atuais. E ainda, às duras penas, há conteúdo tecnológico na agroindústria, via a Embrapa. No Brasil esse setor vive a reprodução ampliada de capital. Tudo isso tem uma única forma: capital financeiro. Isso está disponível desde 1885 no segundo livro do O Capital. A lógica é D-M-D’ e/ou D” da financeirização com Hedge, CPR, leilões, e outras engenharias financeiras. ***
Até aqui beleza Entrementes, após décadas de remédios pestíferos do prognóstico neoliberal e 10 anos de governos progressistas, o maior legado ficou enraizada no centro do poder político e econômico: O pacto de 93
Tribuna de debates poder do plano real com o capital financeiro internacional sendo o sócio maior. Isso nos aprisiona. E nesse esquema as transferências unilaterais são altas para o exterior, a balança de pagamentos é demasiado desfavorável para o país ser uma potência econômica. Grandes oligopólios e oligopsônios nas mãos de estrangeiros (principalmente de alimentos), isso é altamente perigoso. Como sabemos, os exportadores internacionais no Chile provocaram crise de desabastecimento de alimentos para desestabilizar e desmoralizar o governo de Salvador Allende, e recentemente o golpe contra Fernando Lugo no Paraguai. Outro erro, por exemplo, é etiquetar e classificar o Brasil abstratamente como tônica sonora de desenvolvimento transplantado ao consumismo europeu, seguindo ipsis literis a fiabilidade dos grandes centros ocidentais no processo de intemperismo da economia e do desenvolvimento econômico. Isso demonstra uma herança cepalina por genuflexão pelo subdesenvolvimento. As únicas atitudes são insuficientes: as gangorras de corte e subida de juros são extremadamente irrisórias e aumento e isenção de impostos em alguns produtos importados e linha branca; nenhuma severidade em ações de dumping e anti dumping; e claro, a“jihad”contra a inflação. É mister no Brasil: portos; estradas; ferrovias; aeroportos; sistemas de fibra óptica; hidroelétricas; oleodutos; aquedutos; indústrias; fábricas; linhas de
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metrô; túneis; viadutos e toda e qualquer infraestrutura nas cidades. Se investir nisso cresce o emprego nas indústrias de bens de capital e consequentemente nas de bens de consumo, resultando no maior poder de compra da classe dos trabalhadores como um todo. A economia gira, os investimentos privados anulam os investimentos públicos e assim o crescimento é natural e não artificial. Essa bastilha só ruirá com um novo pacto de poder com os setores progressistas do empresariado nacional com os trabalhadores e movimentos sociais organizados interessados no desenvolvimento do país. O Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento só tem sentido se liquidarmos o desenvolvimento desigual e combinado que assola interna e externamente nossa formação social. A nossa luta de classes hoje no país é sem dúvida: se libertar da dependência de tecnologia, como D’ ou D”, do imperialismo; desenvolver um gordo capital financeiro nacional; equilibrar a balança de pagamentos; estatizar o comércio exterior; concessões dos serviços de utilidade pública às empresas privadas nacionais. Ignácio Rangel dizia: “o verdadeiro teste de progressismo, fazse na adesão ou no repúdio às ideias de unidade, soberania e planejamento”. *Militante PCdoB, em São Luis, MA
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PCdoB, militância, religiões e períodos eleitorais
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PCdoB tem compromisso com a defesa do Estado laico. Isso não está em discussão. O PCdoB foi o propositor da liberdade religiosa no Brasil, a partir de 1946, isso é fato. A recente visita do Papa, o crescimento do número de evangélicos no Brasil e sua influência política, as manifestações de junho, tem reavivado o debate sobre as relações do Estado (e suas leis) e religião. Por Romulo Messias Kipper* Embates acontecem em temas como homossexualidade, drogas, aborto, células-tronco, símbolos religiosos. Nos períodos eleitorais, a temática aflora com intensidade, e por vezes, setores conservadores a utilizam para constranger e tentar criar ambientes desfavoráveis para a apresentação das candidaturas progressistas. As religiões são construções da engenhosidade (ou da falta dela) da humanidade. Influenciaram, e influenciam as relações sociais em todo planeta. No Brasil, 92% declararam possuir alguma religião, de acordo com o último censo. É nessa realidade concreta que o PCdoB atua. Na atual quadra da luta política brasileira, as eleições majoritárias e proporcionais têm ocupado papel central, assim necessitamos, a fim de cumprir nossos objetivos programáticos, acumular força nesta frente. E para esta acumulação é necessário fazer votos e conquistar mandatos. Para sermos vitoriosos precisamos montar estratégias eleitorais que dialoguem com amplas massas, incluindo as influenciadas pelas diversas religiões. O isolamento do PCdoB só serve para os reacionários.
Sendo a espiritualidade e o exercício de uma religião, em um Estado laico, uma questão de escolha pessoal, a explicação sobre uma eventual contradição existente entre a opção eleitoral, ou a adesão ao Partido Comunista, e as opções religiosas de um indivíduo, cabe muito mais ao indivíduo do que ao Partido. Apesar do acalorado debate que as questões religiosas despertam entre os debatedores, o eleitorado brasileiro, nos diferentes níveis, e principalmente nas eleições majoritárias, parece que tem decidido seu voto levando em consideração aspectos mais próximos de suas condições concretas de vida dos problemas dele decorrentes e das soluções para eles propostos. Desta forma, nos períodos de disputas eleitorais (que pela lei atual duram três meses) este deve ser nosso foco: criar um ambiente favorável para apresentar a plataforma eleitoral do Partido às amplas parcelas do povo, disputando, para ganhar, seus votos. A luta política e de ideias não ocorre somente no período eleitoral. Fora dele dispomos, apesar do monopólio da mídia, de oportunidades de expor e a isto não podemos nos furtar pacientemente, nossa concepção materialista de mundo: para as amplas massas, para os nossos filiados, para os nossos militantes e para nossos quadros, respeitando e compreendendo o tempo e as condições objetivas e subjetivas de aprendizado de cada um desses segmentos, tendo sempre por objetivo a consecução do programa do Partido. * Militante do PCdoB, Novo Hamburgo, RS
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Tribuna de debates
Organização pela base e partido revolucionário
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Partido tem que apostar no institucional como tarefa principal? O Partido deve ou não saber dar a dose certa a sua atuação institucional. O Partido deve ou não dar prioridade à organização da classe operária, e demais trabalhadores, como centro vital da organização política que servirá para a construção da revolução? A revolução socialista é parte ou não dos objetivos estratégico do Partido? Por Roque Assunção da Cruz (Roque Tarugo)* Portanto, se fazemos essas indagações aqui acima pontuadas é para fazermos o exercício fraterno de construção do partido que sirva para a construção do socialismo. Olhar de frente a realidade, de forma séria e com rigor de classe, buscando interpretá-la, não é somente uma necessidade conjuntural ou estratégica para os comunistas, os marxista-leninistas; é um dever político de revolucionários. Encobrir erros, simplificar o que é grave, suavizar a situação objetiva e subjetiva existente em numerosos partidos comunistas, sendo um posicionamento totalmente errado é também uma traição aos ideais e patrimônios revolucionários constituintes legados por Marx, Engels, Lênin, Stálin e João Amazonas, ideais e patrimônios aos quais entregaram o melhor de si sucessivas gerações e milhões de comunistas, em todos os continentes, desde há mais de um século. Uma grelha de avaliação rigorosa é de construção relativamente simples, se para tal recorrermos aos eixos políticos e concepções ideológicas básicas, umas e outras definidoras da condição comunista. Dentre elas, podemos enunciar as seguintes: • A existência das classes sociais, a exploração da força de trabalho e a luta de classes; • O Estado, seus fundamentos e objetivos como instrumento de domínio de classe; • A democracia e as suas componentes - política, económica, social, cultural; 96
• Imperialismo, o estádio atual do capitalismo, seu grau de internacionalização (globalização) e centralização; • Política de alianças, sociais e políticas, suas qualidades e seus limites; • A via para o socialismo e o comunismo, suas fases e etapas; • Partido comunista, partido de classe, suas específicidades e identidades, características; • Organização partidária, centralismo e funcionamento democráticos e a política de quadros; • Base teórica e o papel da teoria, o materialismo histórico e dialético, na formação dos militantes e a sua aplicação e uso práticos; • Revolução, um conceito subjetivo utópico ou um objetivo programático central; A utilização deste conjunto de itens operativos, se usados para uma análise objetiva a cada partido, é um exercício trabalhoso e requer espaço e tempo, e esse é o tempo de fazer esse exercício no processo congressual que estamos fazendo. Tal propósito deve ser examinado para o fortalecimento revolucionário do nosso PCdoB, que desde a sua fundação em 25 de março de 1922, tem construído a sua história de existência na luta contra o Estado capitalista, no enfrentamento na luta teórica e na organização nas bases que lhe tem dado condições de resistir aos ataques das classes burguesas e seus aliados. A luta do PCdoB é para as classes pobres controlem as riquezas produzidas pelos trabalhadores, acabando com os privilégios da burguesia. Assim, para alcançarmos êxito na luta pela conquista do poder é indispensável a construção de um partido operário marxista-leninista com a missão de educar o proletariado, principalmente por meio de suas experiências de luta, para conquistar o poder e estabelecer o socialismo no Brasil. Como afirmou Lênin em sua frase célebre: “Deem-nos uma organização de revolucionários e revolucionaremos o mundo”. (Que Fazer?, Lênin) Aos militantes do Partido Comunista do Brasil,
Tribuna de debates cabe a histórica tarefa de colocar o centro dinâmico do crescimento do nosso partido na classe operária. Para dar cabo desta tarefa e atender ao imperativo do caráter proletário da nossa revolução, todos os militantes devem empenhar-se, com o máximo de suas forças, para fazer crescer o partido na classe operária. Mas para aprofundarmos os vínculos com o proletariado, necessitamos ligar o Partido com os sindicatos, isto é, fazer ingressar, rapidamente, o maior número possível de comunistas revolucionários nas empresas e nos sindicatos. Só com um trabalho sistemático dos comunistas nos sindicatos operários é possível aproximar as massas operárias do Partido e adquirir sua confiança. Para a grande maioria do proletariado, os sindicatos são suas fortalezas, que os ajudam a defender o salário e a combater os abusos dos patrões. Aliás, como muito bem mostrou Lênin, a própria história da classe operária confirma essa verdade: “O desenvolvimento do proletariado, porém, não se realizou, e nem podia realizar-se, em nenhum país de outra maneira senão por intermédio dos sindicatos e por sua ação conjunta com o partido da classe operária.” (Lênin, Esquerdismo, a doença infantil do comunismo, Editora Símbolo) De fato, de todas as organizações de massas, os sindicatos são aquelas de que mais a classe operária participa e onde mais se mobiliza para lutar por seus direitos e reivindicações. Constitui, portanto, um enorme prejuízo para o Partido os militantes não compreenderem a importância da atuação nos sindicatos, e que para impulsionar a revolução é necessário que ingressem nos sindicatos e se apóiem neles sem que façam dele meios escusos que traiam a classe. Lênin, em seu importante trabalho Esquerdismo, doença infantil do comunismo, revelou o quanto a posição esquerdista de se ausentar dos sindicatos, alegando que seus chefes são reacionários, era errada. Vejamos: “(…) Os comunistas alemães ‘de esquerda’
deduzem do caráter reacionário e contra revolucionário dos chefes dos sindicatos que é necessário … sair dos sindicatos!, renunciar ao trabalho neles!, criar formas de organização operária, novas, inventadas! Uma estupidez tão imperdoável, que equivale aos melhores serviços que os comunistas podem prestar à burguesia”. Para saber ajudar as ‘massas’ e conquistar sua simpatia, adesão e apoio é preciso não temer as dificuldades, mesquinharias, armadilhas, insultos, perseguições dos chefes. “Além disso, devem trabalhar obrigatoriamente onde estejam as massas.” (Lênin, Esquerdismo, doença infantil do comunismo, Editora Símbolo) Portanto, não atuar nos sindicatos significa abandonar as massas operárias, em particular as mais atrasadas, à influência desses oportunistas e reacionários; significa beneficiar a burguesia e sua dominação política e ideológica sobre o proletariado. Mesmo nos sindicatos que dirigimos a vigilância deve ser permanente, para que não sucumbam os seus dirigentes ao canto da sereia, para que o trabalho não tenha então, uma queda ou mesmo seja interrompido, abandonando uma tarefa que é fundamental e decisiva para realizar a revolução: a conquista da classe operária. O resultado é que ficamos ainda mais distantes de alcançar nosso objetivo perante a classe operária. Ora, o único critério que deve ser levado em conta para definir nossa atuação é o de trabalhar onde estão as massas e ganhá-las para a revolução. E, como provaram as constantes greves por salários, o número de sócios dos sindicatos, a grande maioria dos operários brasileiros continua a ver os sindicatos como uma organização de sua classe na luta contra os patrões capitalistas. O Socialismo Vive! * Militante do PCdoB, Salvador, BA
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Tribuna de debates
Sem teoria revolucionária não há revolução
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13º Congresso do Partido Comunista do Brasil se realiza num momento em que internacionalmente se agudiza a crise do capitalismo e começa a dar sinais de que atingirá brevemente o Brasil. Como estudioso da ciência marxista, aponto que o Brasil não é uma ilha, não está blindado será atingido, mais cedo ou mais tarde, pela crise do capital. Afinal, se não é possível, como a história demonstrou, socialismo num só país, muito menos capitalismo (sadio!) num só país. Por Roque Assunção da Cruz*
O trabalho teórico e a luta revolucionária A teoria revolucionária é a consequência do estudo da realidade política e social, nada tendo a ver com a repetição empolgada de chavões ou a aplicação mecânica de princípios gerais a uma situação em específico, sem olhar as novas configurações do capitalismo, do Estado e da correlação de forças no mundo globalizado e os avanços técnico-científicos, por isso, não se confunde com o verbalismo vazio dos esquerdistas, nem com a chamada renovação que caracteriza o reformismo. “A teoria revolucionária não abdica nem dos princípios fundamentais do marxismo -leninismo (…), nem da necessidade de compreender novos fenômenos; a teoria revolucionária aplica criativamente os conceitos nucleares do marxismo ao contexto em que os revolucionários atuam numa determinada época e sociedade.” Na ciência burguesa é relativamente difundida a ideia que a célebre XI Tese sobre Feuerbach – “todos os filósofos limitaram-se a interpretar o mundo, trata-se agora de transformá-lo” seria uma afirmação em que Marx acharia desnecessária toda e qualquer teorização do real. Na realidade, tais noções não fazem sentido. Basta lembrar toda a imensa obra te98
órica de Marx e Engels para se perceber o colosso intelectual dos dois grandes revolucionários. Por outro lado, o marxismo nunca desqualificou o labor teórico. Mais uma vez, lembrem-se duas clarividentes lições de Lênin: “não há movimento revolucionário sem teoria revolucionária” e a importância para os partidos comunistas da “análise concreta da situação concreta”. Por conseguinte, há em toda a história do marxismo-leninismo uma ligação indissolúvel entre trabalho teórico e prática revolucionária.
Qual a relação entre teoria revolucionária e luta prática? Devemos considerar que a teoria revolucionária não existe fora da luta revolucionária. Quer dizer, Marx não nasceu comunista e até atingir os seus 25-26 anos de idade nunca se considerou socialista ou comunista, apesar de já ter entrado em contato com as correntes anticapitalistas da época. Para além da ruptura com o hegelianismo e da leitura do artigo “Esboço para uma crítica da economia política” de Engel e publicado nos Anais Franco-Alemães em 1844, foi o contato de Marx com emigrantes e refugiados políticos socialistas de origem alemã em Paris e, sobretudo, com o desenvolvimento da luta operária por exemplo, os tecelões da Silésia em luta no ano de 1843 que iriam estar na gênese do marxismo como teoria revolucionária. Outro exemplo. A obra de teoria (científica e política) mais brilhante de Lênin é não por acaso, “O Estado e a Revolução”. Obra escrita em julho e agosto de 1917 em pleno fogo da luta revolucionária. A percepção do poder de classe do Estado e a percepção das tarefas que cabiam (e cabem) ao proletariado num contexto de transição para o socialismo seriam aspectos de todo inacessíveis fora da luta revolucionária. O marxismo não é um mero pragmatismo. De fato, a luta e a prática nas organizações marxistas necessitam sempre de um programa, de resoluções po-
Tribuna de debates líticas, de debate político e ideológico. É quase como que (o oxigênio para a vida) das organizações políticas e sociais da classe trabalhadora. Outro, exemplo repare-se que, ao contrário do preconceito da elite e da mídia dominantes de que o PCdoB seria um partido sectário, sem debate político e condenado a desaparecer, a verdade é que o PCdoB não teria a força eleitoral e, fundamentalmente, social e sindical se não debatesse e aplicasse enunciados políticos e ideológicos que se ajustam à realidade concreta das massas populares. Assim, considere-se a relação entre teoria e luta revolucionárias a partir das seguintes noções: • A teoria revolucionária faz parte da luta de ideias, da batalha política e ideológica contra a ideologia dominante; • A teoria revolucionária não é o repetir de chavões ou o aplicar mecânico de princípios gerais a uma situação em específico, sem olhar a novas configurações do capitalismo, do Estado e da correlação de forças a teoria revolucionária não se confunde com o verbalismo oco do esquerdismo; • A teoria revolucionária não é igual à revisão de princípios do marxismo em favor da busca de pretensas soluções novas para uma realidade social capitalista que, apesar de novos ajustamentos, continua a reproduzir os seus pilares fundamentais (exploração da força de trabalho; racismo; machismo; mercantilização de todas as atividades sociais, culturais e naturais; Estado de classe controlado pela burguesia; força e peso da ideologia dominante, etc.) – a teoria revolucionária não se confunde com a busca da “renovação” pela “renovação” típica do reformismo; • A teoria revolucionária não abdica nem dos princípios fundamentais do marxismo-leninismo (primado da luta de classes, papel de vanguarda da organização revolucionária, natureza de classe das várias instituições da sociedade, etc.), nem da necessidade de compreender novos fenômenos; • A teoria revolucionária aplica criativamente
os conceitos nucleares do marxismo ao contexto em que os revolucionários atuam numa determinada época e sociedade. Portanto, o mundo não nos aparece tal como ele é. Senão, segundo Marx, não teríamos necessidade da ciência, da reflexão teórica, para captarmos seus significados. Assim, reafirma-se que a teoria não nasce da teoria, nasce das distintas práticas, individuais e sociais (coletivas), mas ela representa um momento específico de reflexão, de diagnóstico decifrado dos mecanismos do concreto, de apreensão dos seus sentidos, das suas articulações internas, da própria relação entre teoria e prática. Os que se apropriam do saber como destacou Foucault – detêm grande parte do poder, porque impõem seus significados às coisas, as chamam pelos nomes que lhes convêm, dizem o que é o real e tornam invisível o que lhes importuna e os descoloca. A teoria não existe sem a prática, ela é sempre teoria de uma determinada prática, ainda que a não nomeie, ainda que se articule justamente para esconder a que prática – e a que interesses - ela remete. A prática é implacável com os erros da teoria, cobra caro pelos erros teóricos. Conclui-se que uma compreensão mais profunda dos fenômenos sociais permitirá a desmontagem de enunciados da ideologia dominante, e os comunistas e revolucionários têm um largo patrimônio teórico sobre estas questões. Trata-se aqui da necessidade de se aprofundar ainda mais esse patrimônio e não de descartá-lo ou ignora-los. Com efeito, a própria teoria revolucionária será tanto mais eficaz quanto mais se avançar na discussão coletiva dos problemas em causa. Discussão que tem de estar sempre inserida no quadro de fortalecimento da luta de classes. O marxismo consagra essa unidade entre pensamento e ação, só a luta (teórico-ideológica e de massas) é o caminho! * Militante do PCdoB, Bahia
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Tribuna de debates
A mídia e a construção discursiva da realidade: A luta de ideias não pode ser um trabalho de Sísifo
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a Grécia clássica, berço da civilização e da sabedoria ocidentais, contava-se o mito de Sísifo. Certo cidadão chamado Sísifo, depois de blasfemar contra os deuses foi condenado a fazer, pelo resto de sua vida, um trabalho cujo resultado era igual a zero: Ele foi obrigado a botar uma pedra enorme na cabeça e subir a montanha mais alta da pátria de Ulisses. Por Tinoco Luna* Chegando lá em cima, soltava a pedra e ficava olhando ela rolar até embaixo. Depois descia, colocava a pedra de novo na cabeça, subia a montanha e fazia tudo de novo. Sua sentença foi fazer esse trabalho sem futuro pelo resto de seus dias. Pois bem, o artigo que ora escrevo para a Tribuna de Debates tenta fazer uma vinculação entre o mito grego e o estágio em que estamos no campo da luta de ideias, particularmente da batalha que se trava na mídia. Nesses momentos que antecedem os nossos últimos Congressos, como já é de praxe na cultura partidária que estamos construindo no PCdoB pós-legalidade, assiste-se a um rico debate de ideias, uma verdadeira demonstração do caráter democrático e revolucionário do Partido. Dos temas em pauta para o 13° Congresso, todos eles de indiscutível relevância, gostaria de chamar a atenção dos camaradas para um em particular: trata-se da necessidade que se coloca acerca de uma urgente reforma e consequente democratização da mídia, medida sem a qual ficaremos patinando indefinidamente, sem avançar na luta de ideias rumo ao socialismo e, na prática, fazendo trabalho de Sísifo. A mídia, dados os avanços da tecnologia neste setor, joga papel central na acirrada luta de ideias e é instrumento de primeira linha, e decisivo, na conquista da hegemonia de classe. É certo que não abrimos mão do poder político, como reza nosso Programa Socialista, porém é bom não esquecer que o poder político sem hegemonia cultural fica sempre vulnerável a 100
retrocessos. Ou não foi isso que aconteceu no Leste europeu e nas primeiras experiências socialistas? A mídia, como atividade que trabalha com o discurso, diga-se melhor com a linguagem no curso da história, gerando sentido e interpretação, é insumo estratégico da cultura e, consequentemente, da formação das ideias. Michael Bakhtin, destacado filósofo marxista da linguagem, dizia com brilhante sapiência que “a palavra é uma arena onde se dá a luta de classes; um cadinho onde se formam e se reformam as ideologias”. Por seu turno, Michel Foucault, célebre intelectual francês da segunda metade do século 20, falava da existência de uma tal “ordem do discurso” em favor do poder constituído, um processo de exclusão e seleção criteriosa do que interessa ser dito ou silenciado; também pregou que o discurso é um “bem finito, desejável e útil”, em torno do qual se trava uma verdadeira batalha pela sua produção, posse e controle. A própria noção de verdade e realidade é construídas pelo discurso e, para efeito de nosso artigo, podemos afirmar que a mídia, historicamente inserida na ordem do discurso (burguês, claro), é quem discursivamente constrói essa verdade e essa realidade, naturalmente obedecendo a critérios de poder econômico e de hegemonia cultural. A realidade não nos chega diretamente, pois não é possível ter acesso direto aos fatos, fenômenos e objetos do mundo, logo toda a realidade que nos chega se apresenta semioticamente (por meio de símbolos e signos) e mediada pela linguagem. Sendo assim, os discursos, constantemente, dialogam com outros discursos para construir a realidade em que vivemos. Nessa perspectiva é possível afirmar que o discurso é o elemento fundante do homem moderno / contemporâneo, pois não há qualquer atitude humana que não esteja, de um modo ou de outro, articulada a uma prática discursiva. A diferença entre o verdadeiro e o falso, em essência não existe, sendo muito mais uma questão de construção discursiva, aliada a um processo de exclusão de caráter histórico.
Tribuna de debates Que o maior partido de direita no Brasil é a mídia, disso não se tem dúvidas. A coisa piora quando constatamos que se trata de um partido que não precisa de voto para estar no poder e que é isento de qualquer alternância ou controle social. Os efeitos dessa constatação são catastróficos para a luta progressista no campo das ideias. A forma como a mídia trata o “mensalão” e o escândalo do Metrô paulista, só para citar dois casos emblemáticos, é reveladora da ação nociva que a mídia exerce sobre a consciência coletiva. Enquanto o “mensalão”, um evento para o qual não se tem provas materiais, se transformou no “maior escândalo da história do país” (com aspas) e na maior campanha difamatória contra a esquerda em todos os tempos; já o propinoduto tucano, este sim, sem aspas, maior escândalo da história, é chamado de cartel; na prática é a linguagem sendo utilizada pela mídia como um atenuante semânticodiscursivo para limpar a barra do PSDB e da direita brasileira.
Aproveitando os debates para o 13° Congresso, fazemos aqui uma convocação: Os parlamentares comunistas, os intelectuais, a CTB, os movimentos estudantil, de juventude e de mulheres, a imprensa partidárias, e enfim, todas as forças vivas do Partido precisam fazer um pacto por um esforço permanente e diuturno para aprovarmos a reforma da mídia e uma Lei democrática para regulação dos meios de comunicação de massa. Sem essa reforma na estrutura do sistema midiático ficaremos a patinar indefinidamente na estratégica luta de ideias. Precisamos, sim, subir a montanha, não para fazer trabalho de Sísifo, mas para colocar bem no alto a bandeira vermelha do socialismo e da revolução. A propósito, devemos voltar a falar em revolução nos nossos discursos... Não podemos esquecer que são as práticas discursivas que constroem a realidade. * Presidente do PCdoB, Aracati, CE
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Crise de representação e institucionalização da luta
ualquer debate político atual como o do 13º Congresso precisará incidir sobre o tema partido e a forma de torná-lo vivo é fazê-lo se confrontar com a realidade aguda que se manifestou nas ruas em junho, no Brasil, como também em muitas partes do mundo. Por Walter Sorrentino*
Creio que dois temas sensíveis, que já estavam estabelecidos há tempos, são o da crise de representação política que conduziria à crise da forma partido e a chamada institucionalização da luta política – como um risco ou desvio para a esquerda. Se é para ir a algum fundamento da crise de representação, não há como desligá-la da crise estrutural capitalista. A lógica da reprodução do capital sob a hegemonia financeira, com a ideologia neoliberal, conduziu o mundo a tremenda crise financeira, econômica e social para trabalhadores, povos e nações. A questão é que as finanças e a mídia hegemônica, junto ao poder militar e das moedas fortes, se tornaram os verdadeiros poderes da sociedade, de tal monta que capturam a política partidos e representantes dependem cada vez mais deles, seja em financiamento aberto ou escuso. Daí a política como espetáculo, desnaturando-a como a forma mais elevada da consciência social, promovendo e refletindo a crescente alienação na sociedade. A política se despolitiza, os partidos se tornam um ajuntamento, os políticos em muitos casos se venalizam. No caso brasileiro, historicamente, isso se reforça com a tradição patrimonialista e clientelista na política, de difícil remissão. Alimenta o sentimento de que, entre nós, nada valeu, ou seja, tudo foram transições por cima, sem participação popular, portanto conservadoras. É uma verdadeira ironia: justamente a esquerda, cujos partidos tanto deram ao longo de décadas para democratizar, alcançar mais justiça social e soberania nacional, autonegam o resultado de seu esforço. Com isso, desmotivam o próprio povo que, esse sim, compreende bem como se alcançaram as conquistas com muito sofrimento e luta. E as forças conscientes não se dão conta da singularidade 102
da experiência brasileira: transições prolongadas, sob a forma de movimentos que unem espectro improvável (à primeira vista) de forças sociais e políticas. Mas, em qualquer caso, sempre fermentadas por forças-partidos políticos com ideais definidos. O fato parece ser que a crise de representação, de bases reais como vimos, é mais bem um argumento a mais para desmoralizar a política e os partidos políticos na luta de ideias. Dão ensejo crescente a manifestações espontâneas, que não podem deixar de se repor a cada situação histórica em face da opressão, exploração e alienação da sociedade capitalista. O espontâneo não deve assustar ninguém com autênticos ideais de mudança e revolução. O que deve preocupar é a pregação do espontaneísmo como forma de luta. Não só porque ineficaz, ao fim e ao cabo, mas por consistir num perigo para a democracia, na medida em que leva água para o moinho da negação da política. Goste-se ou não, partidos políticos nos marcos dos Estados-nação seguem sendo os instrumentos necessários e menos ou mais eficazes para as mudanças sociais; nada se inventou ainda que os supere. Esse é um tema em torno do qual se deve demarcar campos, sem contemplação, se de fato lutamos por uma democracia mais vigorosa. E, claro, no Brasil, onde alcançamos alguns importantes resultados históricos democráticos, seria necessário barrar o dinheiro privado corporativo no financiamento eleitoral. Há um parentesco muito visceral entre essa chamada crise de representação e a crítica à “institucionalização” da luta política, sobretudo na perspectiva da esquerda. Ponho o termo entre aspas porque, no caso, confunde. A institucionalização é argumento central na ciência política para expressar como o fez o clássico Michels, retomado mais recentemente por Gorender que a burocratização dos partidos (inclusive de esquerda) é fenômeno inevitável e inexorável, opondo dirigentes e dirigidos no seu interior, a formação das castas partidárias. Muito já se escreveu sobre essa pretensa inevitabilidade... Usar o mesmo termo para a crítica da participação da esquerda na luta eleitoral e participação em governos ou mesmo centro de governos não é apropriado. So-
Tribuna de debates bressai então outro caráter da crítica: a prioridade à “luta institucional”, aliás bem presente no debate dos comunistas no 13º Congresso. Não julgo apropriada também essa segunda acepção do termo “luta institucional”. Na realidade política atual, a luta eleitoral adquire centralidade nos termos das disputas e das correlações de forças políticas. Implicam, nos casos de vitórias das forças populares, alcançar poderes de Estado que são postos a serviço menos ou mais das mudanças em patamar mais elevado e com resultados concretos na vida do povo. Foi assim em vários países da América Latina, incluindo o Brasil do último e inédito decênio. São formas da luta política de classes que, a rigor, não se inventam nem se escolhem. Quem busca fazer uma crítica a essas opções políticas não deveria despolitizar o debate, portanto, mas confrontar as opções derivadas da leitura da realidade política e da estratégia transformadora. Menos ainda pôr a questão em contradição antagônica com a luta social. Porque tanto a luta eleitoral e participação em governos, como as principais estruturas da luta dos movimentos sociais, são institucionalizadas, ou seja, têm por substrato instituições – partidos, sindicatos, entidades nacionais etc. Que ninguém se iluda: mesmo as ONGs são institucionalizadas, dependem de financiamento, têm direção, estratégias, centros de comando (e muitas vezes tudo isso depende até de interesses e financiamento estrangeiro nada desinteressado). Aliás a vida é impagável: há “movimentos sociais” atuando como verdadeiros partidos... No fundo, o que se precisa, tanto na luta política eleitoral, participações institucionais, na luta social e de ideias, é pô-las a serviço de um projeto de nação. Todas e cada uma precisam liderar o esforço para despertar no povo a fome espiritual para alcançar uma nação desenvolvida, soberana, democrática
e de progresso social, mediante a luta política em cada uma daquelas frentes. E considerar que cada uma delas a luta política, social e de ideias não são raias independentes, que não se comunicam, mas uma única via para acumular forças no rumo de um projeto de nação. No fundo, para um projeto transformador, o que se precisa não é apenas de mais luta sindical ou comunitária, entre outros, mas nelas atuar com uma perspectiva maior, política, de um projeto transformador. Diria mesmo que os próprios movimentos sociais precisam de mais política, inclusive para eleger eles próprios mais representantes de cada frente. Como se vê, julgo haver alguma confusão conceitual nos debates em torno dessa matéria. Nada exime, no entanto, do necessário debate crítico para confrontar desvios, insuficiências ou deficiências de um problema real para a esquerda, qual seja, o de unilateralizar conscientemente ou não a acumulação de forças na luta eleitoral ou de participação em governos. Inclusive esse é um debate muito necessário no PCdoB, para chegarmos a um juízo coletivo mais sóbrio, menos simplista ou escapista. No fundo, tal prática é um tiro no pé, caminho falso, na medida em que não se puser em movimento as forças motrizes fundamentais para o projeto de esquerda os trabalhadores, o povo, juventude, mulheres, intelectuais progressistas e se não se as armar com um projeto avançado e exequível, construído na luta de ideias. Não tenho pretensão de estar certo, mas apenas indicar como o debate sobre o tema partido pode ser muito vivo e atual, dialogar com o sentimento (negativo) das ruas e não ser apenas interno ao PCdoB de modo autoreferido. * Secretário nacional de organização do PCdoB
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O tema Partido no 13º Congresso
m meio à agudeza da situação política atual, que emula o debate das proposições do documento aprovado para o 13º Congresso, indispensável não perder de vista o tema partido. Não como algo alheio ao curso político, mas intimamente imbricado à superação das contradições presentes nesta transição representada pelo ciclo político do decênio. Por Walter Sorrentino* A própria metodologia do enfoque da questão partido, no documento, é expressão dessa exigência: partido é sua intervenção política, partido é ideologia, partido é organização, e tudo precisa pressupor sua construção em patamar superior. Essencialmente porque um PCdoB mais forte é necessidade inerente para o projeto socialista para o Brasil. Uma síntese da questão está contida no documento. Naturalmente, destaca-se a potencialidade para maior vigor partidário no próximo período. Ao mesmo tempo, atenta-se para aquilatarmos as virtudes e vicissitudes do crescimento, que implica em manter vigilância sobre o caráter do Partido. Concretamente, isso se expressa hoje em manter o rumo que está sendo trilhado, mas dar um passo adiante, qual seja, de apontar para o PCdoB como uma corrente efetivamente de opinião pública e ação política de massas, unido e combativo, que constitua progressivamente um eleitorado próprio maior, expressão de representação política e social dos trabalhadores, do povo, da juventude e das mulheres brasileiras. Isso envolve todas as frentes partidárias, não apenas a frente “eleitoral”. As vias de acumulação de forças a luta política, social e de ideias não são raias próprias, independentes uma das outras, mas a serviço daquela ideia-força. E é também a essa exigência política que devemos ligar a questão de dar vida militante de base cada vez mais consequente ao partido, no espírito do 7º Encontro sobre Questões de Partido. Isso quer dizer conferir de fato projeto político, pauta e agenda permanente às bases, sob a liderança de quadros de base essencialmente voltados a essa responsabilidade, como tarefa principal de suas militâncias. Sem bases desse tipo não se produz aderência maior da base social ao projeto político partidário, não se reconstroem redutos eleitorais, se revivificam as inserções 104
de partido junto ao povo, que vive grandes transformações sociais e de sua própria consciência política. Ao mesmo tempo, as orientações políticas, a par de sua incidência na vida política nacional, precisam pressupor também estimular e emular a atuação das bases militantes. No outro vértice, o documento aponta para reforçar os contrapontos contra as pressões pelo rebaixamento do papel estratégico do Partido, tema dos dois últimos Congressos. A consequência maior extraída é que, nas três vias de acumulação de forças, a construção partidária representa como que o quarto pilar, indispensável, para que se possa avançar na atual transição vivida no país. Isso envolve todos os quadros partidários, sobremodo suas lideranças políticas – e não apenas os quadros “organizadores” , que precisam sustentar tal discurso. As vicissitudes são apontadas como situações objetivas derivadas da realidade política concreta do país, bem como das opções políticas feitas pelo Partido e também como deficiências e insuficiências do trabalho realizado. São patentes e carecem de maior enfrentamento, desde uma reforma política de fato democrática, até os esforços de direção partidária. Para isso são reiterados os esforços de maior trabalho de formação política e ideológica centrado no Programa Socialista e no Estatuto – com seus fundamentos de princípios e tira-se nova consequência, qual seja a de intensificar o controle político da vida partidária, mediante um trabalho de direção geral mais voltado a isso por parte das comissões políticas, e um trabalho de direção concreto mais intensivo por parte do setor de organização, que deve ser fortalecido em todo o partido. Mais uma vez fica claro, em termos da luta pelo caráter e papel do PCdoB na realidade atual, que mais que tudo isso depende de induzir a Política de Quadros como centro da direção organizativa, seja a de direções comprometidas, fortes e coesas em torno do projeto político, seja a de vida militante de base para referenciar a vida estruturada do Partido de modo mais permanente. Essa é uma síntese do que se propõe ao debate. Só o saber coletivo pode nos levar a novo patamar de formulação, necessário ao fortalecimento do PCdoB em todas as esferas. * Secretário nacional de organização do PCdoB
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O
Limpeza das instituições
sistema capitalista predomina no planeta impondo as suas regras até à China e demais países socialistas. Neste terreno minado o Brasil cria recursos democráticos e a América Latina vai desenvolvendo uma política de união para apoiar o desenvolvimento e a independência de todas as nações. Por Zillah Branco* Exatamente o contrário do que sempre fizeram os organismos internacionais e a União Europeia, onde uma elite imperialista impõe modelos tecnocráticos que empobrecem os países pobres recomendando substituição de culturas agrícolas e formas de produção que liquidam o equilíbrio das forças produtivas nacionais, para escravizá-los pela via da comercialização e dos créditos. Mas, mesmo na máquina institucional do Estado brasileiro, como em outras nações, a mentalidade criada pelo sistema capitalista está entranhada (autoritarismo de chefes, discriminação de classe, uso perverso de leis mal elaboradas, corrupção, sabotagem por motivos pessoais, corporativismo e outros vícios mesquinhos), o que faz da burocracia uma
arma antidemocrática. Esta situação existe claramente nas áreas de atendimento social onde o cidadão está sozinho pedindo socorro, especialmente no INSS e no SUS. É necessária uma campanha ideológica ampla, tipo mutirão dentro dos partidos e das associações de massas para denunciar todo tipo de obstáculo burocrático usado como arma antidemocrática com uma ação clara e forte de promotores e juízes para impedir que o cidadão permaneça sujeito às humilhações habituais, e não conquiste os seus direitos elementares que a Constituição assegura teoricamente. As reformas e revisão de leis levam uma eternidade e a vida de cada cidadão é curta e a saúde frágil. As crises do capitalismo não farão, por si, que o sistema seja substituído pela única meta conhecida que é o socialismo. O caminho das reformas introduzido por Lula caminha amarrado por compromissos comerciais e financeiros, mas a ação de conscientização e participação popular tem demonstrado que avança mais rápido e serve de pressão para apoiar governos democráticos como o de Dilma. * Militante do PCdoB, São Paulo e reside temporariamente em Portugal.
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