Galeria Ouvidor - Memória descritiva

Page 1

A N D R E A

L A C E R D A

D E

M O R A I S

1. Introdução A presente memória descritiva refere-se ao projeto gráfico do livro “Galeria Ouvidor”, apresentado para obtenção da graduação no curso de Design Gráfico, na Escola de Design da Universidade Estaual de Minas Gerais, em dezembro de 2008, orientado pela professora Daniela Luz. A Galeria Ouvidor, inaugurada em 1964, é o 1º centro comercial vertical de Belo Horizonte, capital do estado de Minas Gerais, Brasil. Tendo em vista a necessidade de registro para preservação de sua memória, foi proposto um projeto gráfico-editorial cuja abordagem principal fosse a documentação. O ponto de partida foi uma pesquisa a respeito dos aspectos culturais locais, seus estabelecimentos comerciais (lojas de produtos e serviços), análise das atividades mais característicos e peculiares, “personagens” pitorescos e representativos, arquitetura e a sua relação com a cidade em seus diversos aspectos.

2. Desenvolvimento 2.1 O que é a Galeria Ouvidor? Quando iniciou suas atividades, na década de 1960, a Galeria Ouvidor abrigava em seu interior lojas de artigos finos e era um ponto de encontro para o lazer da população. Foi referência de hábitos, costumes e responsável por novas tendências na capital. Abrigou o primeiro salão unisex de Belo Horizonte, a principal loja de discos da época, a maior livraria do estado e joalherias importantes. Atraiu milhares de curiosos por causa das primeiras escadas rolantes do estado. O nome é uma homenagem à movimentada via comercial do Rio de Janeiro, a rua Ouvidor. No Brasil colonial, o Ouvidor era uma espécie de juiz posto pelos donatários em suas terras. O condomínio foi um dos símbolos da modernidade que avançava pelas grandes cidades brasileiras. Naquele momento de crescimento econômico, outros centros comerciais e shoppings centers surgiram na mesma época no país. A galeria fez parte da revolução arquitetônica que verticalizou o hipercentro da cidade de Belo Horizonte e seu projeto é um legítimo representante do modernismo brasileiro, que

|

L I V R O

G A L E R I A

O U V I D O R

surpreendeu o mundo com grandes vãos, organização modular e entradas para ventilação. Ao longo de quatro décadas a Galeria passou por transformações em seu perfil, seguindo as mudanças ocorridas no hipercentro da capital. Atualmente possui seis pisos (três a mais que no início), e ao contrário do glamour dos primeiros tempos, é um centro de comércio popular que abriga um extenso leque de serviços e atividades, caracterizado pela comercialização de insumos utilizados na fabricação de acessórios femininos, bijuterias e artesanato. Os números impressionam, são 353 unidades comerciais, pelas quais circulam mais de 45 mil pessoas diariamente. O número de empregados e empresários está acima de 1550 pessoas. A diversidade de atividades é enorme, são quase 50 categorias: Alfaiataria, aluguel de roupas, armarinho, artesanato, aviamentos, bolsas e malas, calçados, escola de informática, fotos e filmagens, gráfica, sex shop, tatuagem, tecidos, etc. Vários estabelecimentos funcionam há quatro décadas, ininterruptamente, como é o caso da Joalheria Cruz e da Filatélica Globo. O local também guarda personagens interessantíssimos que testemunharam a metamorfose cultural da galeria e da cidade. É o caso do cabeleireiro Nero, proprietário do primeiro salão unisex de BH, que recebeu da Câmara Municipal o Título de Cidadania Honorária em setembro de 2007. Andar pelos seus corredores é como mergulhar num mar de cores, texturas, brilhos, sons e cheiros completamente diversos e múltiplos. 2.2 Contexto: Memória, cidades,relações sociais e cultura Após a realização de breve estudo sobre o histórico da Galeria, percebeu-se sua íntima ligação com a história da cidade. O centro de Belo Horizonte é a representação das relações sociais desenvolvidas ao longo de seus 111 anos. A paisagem urbana é tal qual um rosto, no qual se inscrevem rugas, marcas, cores, que é essencialmente humana. Compreende a história, o que foi socialmente reproduzido pelo homem e é também a expressão de um modo de vida. A Galeria Ouvidor é uma dessas “rugas”, inscrita na cidade e, ao mesmo tempo, um organismo vivo, que muda de acordo com as relações humanas que se desenvolvem em seu interior e exterior.


A N D R E A

L A C E R D A

M O R A I S

ór ia

m

lt u Cu

ur ba

na

Preservação

ra

sa Pai

|

L I V R O

G A L E R I A

O U V I D O R

3. O projeto gráfico e o editorial

Me m

Patr im ôn i

o

ral ltu Cu

D E

ge

Fig.1 Infográfico que demonstra relação entre os diversos conceitos tradados.

Os conceitos de cultura, memória e patrimônio cultural também foram analisados. Entendeu-se que a Galeria Ouvidor tem todas as características para ser considerada um importante patrimônio cultural e arquitetônico da cidade de Belo Horizonte. O local esteve no centro das mudanças culturais e inovações arquitetônicas na década de 1960 e concentra inúmeras formas de expressão, modos de criar, fazer e viver, fundamentais para a memória dos belo-horizontinos. Nela se reproduzem práticas culturais coletivas, relacionando-se à identidade de vários grupos sociais diferentes ao longo do seu funcionamento. 2.3 Conclusão acerca do contexto: Ficou evidente que a preservação da Galeria é fundamental para a memória de Belo Horizonte. Existe a necessidade de valorizar a diversidade de suas atividades e consolidá-la como local de encontro, de oportunidades de negócios e geração de emprego, aproveitando a oportuna revitalização do hipercentro, em curso. A falta de documentação e registro compromete o conhecimento de futuras gerações sobre determinados aspectos de sua história. Privase a coletividade da possibilidade de estudo acerca dos temas que foram ignorados pela organização e sistematização. Assim, é que cada vez mais, o mundo contemporâneo compreende a importância da documentação. Através do registro é possível preservar idéias, contribuindo para a memória e o desenvolvimento da humanidade. Devido à falta de referências impressas sobre o tema, torna-se premente a necessidade de documentar e dar acesso, através de um livro - que seja distribuído a órgãos e entidades do Brasil e do mundo -, à sua história e cultura.

3.1. Conteúdo O livro impresso é sempre resultante de um processo colaborativo. O conhecimento e o trabalho de vários profissionais foi necessário para a obtenção do produto final aqui abordado. O conteúdo textual, elaborado a partir de entrevistas e pesquisas, foi escrito pela jornalista Verônica Anselmo e as fotos foram realizadas pelos fotógrafos Alessandro Coelho e Cecília Araújo. As diretrizes que nortearam o conteúdo foram: a) registrar o local na atualidade através do relato dos próprios comerciantes e do olhar dos fotógrafos convidados (catalogar); b) relatar de forma sucinta sua história e aspectos marcantes; c) trazer à tona curiosidades do lugar através de um texto jornalístico (informativo) e muitas imagens (fotografias e padrões gráficos); d) fotos naturais e reveladoras e detalhes. Algumas referências do estilo de publicação são: Que chita bacana, História do Vazio em Belo Horizonte, Almanaque dos Anos 80, Rio Bossa Nova. 3.2 Conceitos do projeto gráfico: O projeto desenvolvido teve como conceitos norteadores: a) Documentação/catalogação (sub-conceitos: curiosidade, pitoresco, popular, urbano); Segundo HASLAM (2006): “Todo design gráfico envolve o trabalho de documentação. (...) está na raiz da escrita e da imagem.” A documentação pode ser a principal abordagem editorial e de design. O livro terá como objetivo principal a documentação do local, a realização do seu registro histórico, “catalogação” dos hábitos, cultura e iconografia através da fotografia e criação de padrões gráficos. b) Multiplicidade e diversidade; A partir da constatação da diversidade existente na Galeria (de atividades, tipos de pessoas, produtos, lojas, placas, diferentes formas de conservação dos estabelecimentos, etc.) a multiplicidade e a diversidade foram eleitas como conceitos-chave do projeto. c) Organização, linearidade, modularidade; Referência da Arquitetura Moderna Brasileira. A linearidade e a modularidade da construção do


A N D R E A

L A C E R D A

D E

M O R A I S

prédio organizam toda a variedade já mencionada. Elas serão o ponto de partida para a organização do livro: estrutura, construção do grid, navegação. d) Linguagem contemporânea A Galeria se transformou ao longo de quatro décadas, para se adequar aos hábitos de consumo e de lazer da população de Belo Horizonte. Para falar dela foi escolhida uma linguagem gráfica contemporânea para haver dialogo com essa metamorfose e tornar o livro um produto do seu próprio tempo. 3.3 Formato, tamanho. O formato do livro tem a relação de 1,133 entre altura e largura. Seu tamanho é de 21 x 23,8 cm 21 cm

|

L I V R O

G A L E R I A

O U V I D O R

3.5 Tipografia A família principal escolhida para compor o livro foi a Vista Sans, criada por Xavier Dupré em 2004. Ela combina em seu desenho características do estilo das blackletters - contraste, ênfase na vertical e impacto visual - com as formas das fontes humanistas. A mistura tem seriedade suficiente, devido ao não emprego de serifas e à simplicidade, para ser empregada adequadamente em textos longos ou curtos. Motivos da adequação ao projeto gráfico do livro Galeria Ouvidor: Ela é facilmente reconhecida como uma fonte contemporânea; possui ótima legibilidade - em razão do contraste dos caracteres e de seu espacejamento; excelente completude - caracteres básicos, variações de peso em maiúsculas, minúsculas, itálico e versão alternativa. Para os textos curtos como títulos, legendas e leads foi usada a versão Alternate que possui caracteres com semi-serifas. Elas conferem mais descontração e pregnância à fonte.

23,8 cm

O texto corrente tem alinhamento à esquerda. A cada parágrafo existem recuos alternados, à direita e à esquerda, de 14mm ou aproximadamente 39 pt. O espaço entre parágrafos é de 3mm ou 8 pt. A entrelinha generosa de 15pt para um corpo de 9pt somada à largura geral das colunas, garante uma ótima leitura.

Fig.2 Esquema demonstra Proporção e medidas do livro.

3.4 Grid A organização modular da Galeria definiu como seria o grid básico do livro. Divisões de 14mm. 15 horizontais x 17 verticais. Os blocos de texto são variáveis. Aderem ao grid conforme a organização de cada página. O único elemento completamente fixo é o fólio. Padrão gráfico

Título

Imagem

Bloco de texto

Fólio

Fig.4 Especificação da tipografia e exemplos. Padrão gráfico

Padrão gráfico

3.6 Estrutura e Navegação

Título Texto corrente Imagem

Bloco de texto

Fólio

Imagem

Fólio Legenda Imagem

Fig.3 Posicionamento variável dos elementos sobre o grid .

Cores diferentes e padrões gráficos guiam o leitor com segurança pelos assuntos, além de produzir sentido para os temas. Páginas duplas de abertura dos capítulos reforçam a mudança.


A N D R E A

L A C E R D A

D E

M O R A I S

Capítulo 4 Estabelecimentos Comerciais Cor: Laranja. Padrões extraídos das placas das lojas. Tipografia, linhas, pitoresco. Capítulo 5 - Olhares Cor: Verde. Estampas de papéis para decupagem, produtos alinhados que formam padronagens. Capítulo 1 História da Galeria Cor: Vermelho. Padrões geométricos inpirados no modernismo brasileiro. Capítulo 2 Personagens Cor: Azul. Padrões de formas orgânicas e desgastadas. Subjetividade, memória, nostalgia. Capítulo 3 Entendendo a estrutura Cor: Magenta. Padrões de linhas retas. Estrutura, arquitetura. Magenta.

Fig.5 Navegação. Exemplos das cores e padrões gráficos de cada capítulo.

3.6 Suporte e acabamentos A escolha dos materiais de suporte e acabamento do livro deveria refletir e traduzir de maneira tátil o universo da Galeria Ouvidor. O miolo foi composto tendo como diretrizes a simplicidade e a multiplicidade. Foram usados os

|

L I V R O

G A L E R I A

O U V I D O R

papéis não revestidos: Evenglow Opalina 120 g/m² para os 4 primeiros capítulos e Color Plus metálico, Marakesh e Sil Print 120 g/m² para o capítulo Olhares. A lombada tem costura aparente, fazendo uma referência direta aos insumos para o artesanato, que são a característica mais marcante do comércio na Galeria na atualidade. A capa é ao mesmo tempo rica e simples. Nela figura a assinatura visual criada para representar uma síntese acerca da multiplicidade, da diversidade e da atualidade da Galeria Ouvidor. Um acabamento-chave foi escolhido para a capa: a laminação holográfica 3D. Esse tipo de laminação evoca o popular e o Kitsch dos corredores, as múltiplas e vibrantes cores da Galeria e o brilho das bijuterias e jóias à venda em seu interior. Para uma maior proteção o livro conta com uma sobrecapa em filme de poliéster impressa em serigrafia. 3.6 Divulgação Como suporte ao lançamento e à divulgação do livro foram criadas peças gráficas para serem distribuídas e colecionadas: Uma série de posters colecionáveis que podem ser usados como cartazes de divulgação nas livrarias, um guia dos serviços e lojas, àlbuns portáteis de fotografia wa serem distribuídos como brinde, e um display para balcão.

3. Bibliografia principal HASLAM, Andrew. O livro e o designer II – Como criar e produzir livros. São Paulo: Edições Rosari, 2007. Hendel, Richard. O Design do Livro. São Paulo: Atelie Editorial, 2001. SAMARA, Timothy. Grid: Construção e Desconstrução. São Paulo: Cosac Naif, 2007. TANG, Roger Fawcett. O livro e o designer I: embalagem, navegação, estrutura e especificação. São Paulo: Edições Rosari, 2007. WHITE, Jan V. Edição e design. São Paulo: JSN Editora, 2006.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.