Futebol e Celebridades na Pós-Fotografia

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André Carlos Zorzi Freire da Silveira, RA 00130252, JOR-NA7 Profª Angela Di Sessa Perspectivas da Fotografia Contemporânea

FUTEBOL E CELEBRIDADES NA PÓS-FOTOGRAFIA INTRODUÇÃO O tema abordado neste trabalho tem como base a experiência própria que já tive com o jornalismo até o momento, em sua maior parte relacionada à área esportiva, de meu maior interesse, e também à área de cobertura de gente e entretenimento, também conhecido como o jornalismo de celebridades, atividade relacionada aos meus empenhos profissionais na condição de estagiário. Antes de qualquer coisa, é necessário mencionar certa polêmica que envolve o uso da palavra "jornalismo" com a atividade que cobre o mundo das celebridades. Para muitos, o que é feito por parte de sites como o Ego ou o E+, por exemplo, não pode ser considerado jornalismo devido à baixa apuração ou baixa relevância dos fatos apresentados. Peguemos, por exemplo, trecho do texto “Jornalismo de celebridades, para quê”, escrito por Tiago Severino, no Observatório da Imprensa, em 16/02/2010: O jornalismo [de celebridades], que neste caso deveria ser diversional, torna-se tosco e previsível. Os textos repletos de clichês não exprimem nenhuma criatividade. Repórteres, editores e produtores parecem ser vítimas de uma febre de consenso. A efemeridade das notícias leva a questionar a própria validade deste tipo de jornalismo.


OBRAS-ORFÃS O próprio conceito de fotografia alterou-se ao longo dos tempos nestas duas áreas. Um bom exemplo disso é a própria cobertura do jornalismo de celebridades, muito por conta do advento das redes sociais, e, para o nosso campo de análise, a fotografia, em especial o Instagram. Este tipo de jornalismo atualmente se baseia no conceito de obrasorfãs, ou seja, que não possuem proteção por parte da legislação de direitos autorais, algo que abrange muitas imagens que estão na rede. Podemos pegar para exemplo de comparação o trabalho de Penelope Umbrico, que fez uma produção artística bastante interessante no mundo da fotografia basicamente sem sequer pegar uma câmera, utilizando apenas imagens disponíveis no Instagram. E isso remete ao jornalismo de celebridades, como citado anteriormente, uma vez que hoje em dia os próprios artistas fazem o papel de paparazzo, e se fotografam e expõem a própria intimidade na internet. O próprio conceito de paparazzo se alterou ao longo do tempo. A expressão “paparazzo” surgiu no filme A Doce Vida, do cineasta italiano Fellini, e remetia a um fotógrafo que acompanhava um jornalista em seu trabalho. O paparazzo na cultura popular se tornou o tipo de fotógrafo que “invade” a intimidade das pessoas. A partir do momento que elas expõem suas intimidades em redes sociais como o Instagram, perde-se um pouco do sentido, uma vez que elas próprias ostentam sua intimidade, tornando-a pública, e, desta forma, acaba quase deixando de ser íntima. Se anos atrás uma personalidade da mídia fugia de fotógrafos que se apinhavam em volta do local onde estava, hoje em dia ela própria utiliza seu celular para registrar momentos íntimos e compartilhá-los com seus fãs, e é claro, direta ou indiretamente com jornalistas.


REFLEXOS NO JORNALISMO É normal, por exemplo, que as legendas de jornais e sites onde constam as fontes das imagens possuam cada vez mais “Reprodução / Instagram”, ou “Reprodução / Facebook”, ou “Reprodução / Twitter”, e menos nomes de fotógrafos ou agências. Isso representa um barateamento e até uma certa “democratização” maior, uma vez que qualquer veículo, como um blog livre, pode contar com as mesmas imagens que serão veiculadas em grandes portais como por exemplo o Terra, ou o G1, uma vez que elas são gratuitas. Além disso, é notória a crescente e recorrente utilização de “Galerias” em sites de grandes veículos, sejam eles de quaisquer assuntos: desde as celebridades, passando por gastronomia e cultura, até chegar a assuntos mais sérios como por exemplo a política. As imagens rendem cliques e atraem olhares “preguiçosos”, que estão saturados até mesmo dos mais curtos textos. E as galerias cada vez mais possuem Reproduções e Divulgações como preenchimento da maior parte de seu conteúdo, tornando-se um fenômeno relevante ao se falar sobre o jornalismo atual. REFLEXOS NO MUNDO ESPORTIVO O mundo do futebol não fica muito distante. Durante muitas décadas, a cobertura fotográfica restringia-se basicamente a fotos genéricas de lances das partidas, e em jogos decisivos, imagens de momentos como o clássico levantamento da taça, entrega de medalhas, ou coisas do tipo. Vez ou outra, um bom fotógrafo tinha a sorte ou o tino necessários para fotografar um gol, ou um lance de lesão, ou um lance de agressão, ou de qualquer outra importância para a partida. O jornalismo esportivo, em geral, era muito mais focado no escrito do que no visual, quando o assunto era fotografia, ao passo que na TV, por


exemplo, se focava muito mais no conteúdo visual do que no conteúdo que era transmitido em teoria, por meio da fala. Hoje em dia, já há uma certa mudança. Alguns fotógrafos que contam com material de altíssima definição deixam a câmera filmando determinado ponto do campo por certo tempo, e em seguida, apenas “printam” a tela, gerando uma imagem boa, focada, em alta definição do momento que queria, sem precisar dos mesmos recursos, habilidade e técnica que seriam necessários no passado. Isso também tem a ver com o próprio fato de que, cada vez mais, os jogadores de futebol são, de fato, celebridades. Em décadas passadas, houve um crescente aumento do interesse das pessoas pela vida dos jogadores. Tal fenômeno começou a ganhar força na década de 1990, e podemos pegar por exemplo a matéria “Romário chega atrasado ao casamento”, escrita por Mário Moreira em 25/08/1996. À época, diversas imagens da cerimônia do jogador foram divulgadas pela imprensa, inclusive na seção esportiva de jornais e programas televisivos. Hoje em dia este tipo de situação acontece com ainda mais frequência, ao ponto que personagens como Neymar, por exemplo, já sejam nomes frequentes em redações mais voltadas ao ramo da “fofoca”, tornando-se figuras à parte do esporte, também. Além disso, assemelha-se à questão da pós-fotografia de forma semelhante ao já citado jornalismo de celebridades, uma vez que os próprios atletas envolvidos acabam compartilhando seu material, algo que lembra o experimento pós-fotográfico no qual câmeras (ou celulares com câmeras) eram entregues a diversos caminhoneiros, para que eles próprios retratassem suas viagens. O jornalismo esportivo se tornou um pouco isso. Por vezes, um atleta pode postar uma foto sobre seu bom desempenho em um treinamento, ou lamentando uma lesão, antes que saia uma matéria a respeito disso. É possivel que jogadores anunciem suas


transferências para outros clubes por meio de fotos, divulgando imagens trajando a camisa do novo time, por exemplo, e dando o ‘furo’ da notícia. Temos exemplos de casos como de jogadores que fazem videos de si mesmos dentro de vestiários, exibindo partes íntimas de colegas ao fundo sem querer, por exemplo, como os casos do goleiro Diego Cavalieri e do atacante Loco Abreu, que acabaram sendo “vítimas” deste tipo de gafe, e tornando-se notícia no dia seguinte. Da mesma forma que imagens de Penelope Umbrico retiradas de sites que disponibilizem o uso para reprodução, também podemos perceber isso no esporte, uma vez que basta pesquisar pelos termos certos em redes como o Twitter ou o Instagram que é possível encontrar diversas imagens de um certo jogo de futebol, por exemplo, tal como da arquibancada, ou por vezes até de algum lance polêmico de um novo ângulo de visão. Tudo isso realizado pelo público, e não mais necessariamente por um fotógrafo ou jornalista. O trabalho de fotógrafos como Daniel Uchida, por exemplo, especialista em retratar torcidas de futebol, em especial as organizadas, por mais bem feito que seja, perde certo espaço a partir do momento em que qualquer “torcedor comum” possa utilizar-se de uma câmera de alta definição de celular e filmar ou fotografar a festa da torcida em questão, numa situação de proximidade, ou até mesmo de imersão, algo que um fotógrafo em posição de neutralidade dificilmente chegaria. É como o trabalho quase antropológico de fotógrafos que convivem com determinada tribo por algum tempo para conseguir fotografias que sintetizem melhor a situação, mas sem a necessidade do tempo de adaptação. Seria como entregar a câmera diretamente aos índios. Desta forma, podemos analisar a presença constante da questão da pós-fotografia nos dois universos jornalísticos citados, e concluir que há uma grande vertente de possibilidades a partir da mesma.


EXEMPLOS

Foto tirada por um paparazzo: Kim Kardashian e Kanye West

Foto postada pela própria Kim Kardashian em sua conta no Instagram, no mesmo dia que a imagem anterior. Podemos perceber que a própria personalidade em questão estimula a exposição de sua intimidade, de uma forma que torna praticamente sem sentido que haja atuação de paparazzi, uma vez que imagens muito mais íntimas que as que conseguiram registrar encontram-se de forma gratuita na internet, por vontade própria do “alvo” das imagens.


Loco Abreu enquanto dançava e rebolava apenas de cueca no vestiário da seleção uruguaia: Intimidade exposta voluntariamente por colegas de equipe, por meio de redes sociais.

Foto de Gabriel Uchida, em partida do Palmeiras no Pacaembu: Imagens só eram possíveis graças a um certo grau de confiança entre o fotógrafo e os torcedores organizados; porém, é cada vez mais “fácil” encontrar imagens semelhantes, uma vez que os próprios torcedores encontram-se munidos de câmeras de alta definição.


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