Predestinados sim, de forma condicional ou incondicional não!

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Arminianismo & Calvinismo Um pequeno resumo de suas diferenças – quarta parte

13 DE OUTUBRO DE 2014 SOLI DEO GLORIAN


Predestinados sim, de forma condicional ou incondicional, não! oje finalizaremos o nosso assunto sobre o arminianismo e o calvinismo, porém antes de confessarmos qualquer uma das posições devemos entender que estamos lidando com um mistério e não precisamos pegar em armas para defender nossa posição diante de outros irmãos que discordam de nosso ponto de vista. Antes de tudo esteja o amor, o amor fraternal estabelecido como ponto de partida, qualquer atitude de nossa parte tem que estar regularizada por esta verdade. (1 Co.13). Nossa incumbência como cristão em qualquer área que estivermos atuando, deve ser a investigação, “retendo aquilo que é bom” antes de qualquer julgamento legítimo ou tendencioso. (1 Ts.5.21). A doutrina da predestinação assim como a doutrina da encarnação e da trindade são em muitos pontos um mistério, e este mistério, em determinados pontos são insondáveis devido as nossas limitações. “A predestinação de Deus e a livre – escolha do ser humano são um mistério, mas não uma contradição. Elas permanecem além da razão, mas não contra a razão. Isto é, elas são incongruentes, mas também não podemos entender como se complementam. Nós apreendemos como cada uma delas é verdadeira, mas não compreendemos como ambas são verdadeiras” (Geisler, pg.61) 1.

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Norman Geisler. Eleitos, mas livres, São Paulo, Editora Vida, 2001.

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Seja a ala calvinista ou a ala arminiana ambas não esgotarão o assunto. Estamos lidando com os decretos de Deus, e seus decretos em determinados pontos são insondáveis, isto tem que estar claro em nossa mente, por este motivo devemos ficar somente com aquilo que encontramos nas escrituras e qualquer especulação a respeito deste assunto que não esteja regularizado por ela, é perigoso e danoso para a fé cristã, então todo o pressuposto sobre este assunto “nasce e morre com as escrituras” o que for além disto deve ser rejeitado. “Se reina em nós o pensamento de que a Palavra do Senhor é o único caminho que nos conduz a investigar tudo quanto é justo dele sustentar-se, é a única luz que à frente nos resplandece para bem perceber tudo quanto a respeito dele convém considerar-se, de toda temeridade facilmente nos conterá e coibirá. Porque sabemos que no momento em que transpusermos os limites assinalados pela Escritura, seremos perdidos fora do caminho e entre trevas espessas, no qual teremos necessariamente que vagar, muitas vezes, sem rumo, resvalar e a tropeçar” (Calvino, Livro XXI – 2) 2.

Antes de iniciarmos o nosso assunto observe esta ilustração: Imagine a construção de sua casa diante de você só existe um terreno, porém você consegue visualizar em sua mente como será sua casa, ela ainda não existe de uma forma concreta, porém em sua mente ela já está pronta. Na sua mente ela já tem cor, jardins, banheiros, quartos, varanda, garagem, piscina com aquela água cristalina refletindo a luz do sol. Na sua mente em questões de segundos você já detalhou como será a decoração de cada cômodo, você já viu o filho 2

João Calvino. As Institutas ou um tratado da religião cristã, versão clássica.

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que ainda não existe correndo no quintal atrás do cachorro que não existe também, tudo isto em questão de segundos ou minutos. Existe também um detalhe muito interessante neste seu projeto de vida você já sabe o sexo do seu filho e sabe que ele será parecido com você.

Foi de modo semelhante que Deus criou seu universo e nos criou neste universo. Ele preparou tudo com detalhes excepcionais, e cada detalhe foi projetado segundo os seus propósitos. A criação não foi um erro pois Ele não pode errar. Ele nunca foi pego de surpresa, ele não teve que preparar um segundo projeto e abandonou este – Não! Tudo... tudo mesmo estava de acordo com seu eterno propósito. “O Deus que fez o mundo e tudo o que nele há é o Senhor3 do céu e da terra, e não habita em santuários feitos por mãos humanas. Ele não é servido por mãos de homens, como se necessitasse de algo, porque ele mesmo dá a todos a vida, o fôlego e as demais coisas. De um só fez ele todos os povos, para que povoassem toda a terra, tendo determinado os tempos anteriormente estabelecidos e os lugares exatos em que deveriam habitar”. (Atos 17.24-26)

O universo e o nosso planeta com seus bilhões de habitantes não são obras do acaso ou mesmo um projeto sem rota, a Santíssima Trindade continua no controle, e irá concluir tudo aquilo que na eternidade “antes da fundação do mundo” foi decretado. “Pois nele vivemos, nos movemos e existimos” (Atos 17.28) 3

A ideia contida nesta palavra expressa uma autoridade suprema, um soberano. Como afirmou Jan Gottfridsson – A palavra Senhor [gr. Kyrios] quando aplicada a Deus o Pai, Deus o Filho, Deus Espírito Santo significa que a santíssima trindade é a máxima indiscutível autoridade sobre qualquer assunto.

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A ordem da salvação. [Ordo Salutis] Os teólogos afirmam existir uma forma lógica no processo de nossa salvação isto de maneira geral chama-se Ordem de Salvação [Ordo Salutis]. Nesta ordem de salvação existe alguns processos que somente Deus pode executar e em outros processos o homem com o auxílio de Deus executa. A ordo Salutis seria assim: 1.Presciência (Deus), 2.Predestinação (Deus), 3.Chamada (Deus), 4.Fé (Deus? Homem?), 5.Arrependimento (Homem), 6. Justificação (Deus), 7.Regeneração (Deus), 8.Adoção (Deus), 9.Perseverança (Deus e o homem), 10.Mortificação (Homem e Deus), 11.Santificação (Deus e o Homem), 12.Glorificação (Deus).

A Ordo Salutis calvinista. Este é o ponto de partida da teologia calvinista Deus antes de executar seu ato criador concebeu em sua mente o seu projeto e traçou todos os detalhes. Nada fugiu ou fugirá de seu controle. Neste projeto segundo os calvinista Deus não levará ou dependerá de qualquer ação humana para estabelecer seus propósitos. Dentro deste projeto o ponto de partida para um calvinista é a predestinação então a ordem de salvação para um calvinista será:

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A doutrina calvinista será fundamentada nas interpretações de João Calvino. A doutrina calvinista irá seguir as interpretações de João Calvino, e ele por sua vez irá seguir as interpretações de Agostinho assim como Lutero seguiu. Eu não posso e não tenho como expor, e muito menos detalhar, cada argumento usado por João Calvino em suas interpretações, porém iriei compartilhar alguns de seus pensamentos que estão registrados em suas Institutas da religião cristã.

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Quando estudamos ou lemos as literaturas reformadas fica notório que cada argumento usado pelos calvinistas tem como pano de fundo as ideias estabelecidas por Agostinho, Martinho Lutero e João Calvino, estes autores são citados de uma forma abundante nas literaturas reformadas como forma de apoio e sustentação para suas exposições. A dupla predestinação ensinada por João Calvino. “Mas, já que o pacto de vida não é pregado entre todos os homens igualmente, e entre aqueles a quem é pregado não acha a mesma receptividade, quer qualitativa, quer continuativamente, nessa diversidade se manifesta a admirável profundeza do juízo divino. Pois não há dúvida de que esta variedade serve também ao arbítrio da eterna eleição de Deus. Porque, se é notório que pelo arbítrio de Deus suceder que a salvação é oferecida gratuitamente a uns, enquanto que outros são impedidos de seu acesso, aqui prontamente emergem grandes e árduas questões, as quais não podem ser explicadas de outra forma, se as mentes pias têm por definido o que se impõe manter a respeito de eleição e predestinação” (Calvino - Livro três - Capítulo XXI – 1) 4. “Chamamos predestinação o eterno decreto de Deus pelo qual houve por bem determinar o que acerca de cada homem quis que acontecesse. Pois ele não quis criar a todos em igual condição; ao contrário, preordenou a uns a vida eterna; a

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João Calvino. As institutas da Religião Cristã. Volume três.

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outros, a condenação eterna. Portanto, como cada um foi criado para um ou outro desses dois destinos, assim dizemos que um foi predestinado ou para a vida, ou para a morte” (Calvino - Livro três – Capítulo XXI – 5) 5.

A eleição para João Calvino é individual. “Se bem que já está suficientemente claro que Deus, por seu desígnio secreto escolhe livremente àqueles a quem quer, rejeitando a outros, contudo, sua eleição gratuita ainda não foi exposta, senão pela metade, até que se haja vindo às pessoas individualmente, às quais Deus não só oferece a salvação, mas de tal forma a confere, que a certeza de conseguir seu feito não fica suspensa nem duvidosa” (Calvino – Livro três – Capítulo XXI – 7) 6. “... Deus chama a si determinado povo, tem, contudo uma especial maneira de eleger uma parte do mesmo, de sorte que nem todos são eleitos pela mesma graça. O que se diz: “Amei a Jacó” [Ml 1.2], refere-se a toda a descendência do patriarca, a qual o Profeta aí contrasta com os descendentes de Esaú. No entanto, isto não impede que na pessoa de um só homem nos seja posto exemplo de eleição que não pode afluir sem que atinja sua meta. Paulo diz que estes são chamados “as relíquias” não sem motivo [Is 10.22; Rm 9.27; 11.5], porque a experiência mostra que da grande massa a maioria se esvai e se vai, de sorte que com muita frequência só permanece uma porção diminuta” (Calvino – Livro três – Capítulo XXI – 7) 7.

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João Calvino. As institutas da Religião Cristã. Volume três. João Calvino. As institutas da Religião Cristã. Volume três. 7 João Calvino. As institutas da Religião Cristã. Volume três. 6

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João Calvino nega que Deus usou “a sua presciência” para predestinar. “Pois geralmente pensam que Deus, conforme prevê que serão os méritos de cada um, assim faz distinção entre os homens. Logo, aqueles a quem pré-conhece que não serão indignos de sua graça, a esses adota em lugar de filhos; aqueles dos quais discerne que se inclinarão para e preferirão sua maldade e impiedade, a esses os devota à condenação da morte” 8. (Calvino – Livro três – Capítulo XXII – 1)

O profundo dilema que João Calvino enfrentou e que os demais calvinistas devem enfrentar. “Portanto, primeiro perguntam com que direito o Senhor se ira contra suas criaturas, das quais não foi provocado previamente por nenhuma ofensa; porque, condenar e destruir àqueles a quem ele bem quer se enquadra mais ao capricho de um tirano do que à sentença legítima de um juiz... Quando, pois, se pergunta por que o Senhor agiu assim, há de se responder: Porque o quis. Porque, se prossigas além, indagando por que ele o quis, buscas algo maior e mais elevado que a vontade de Deus, o que não se pode achar”9. (Calvino – Livro três – Capítulo XXIII – 2) Para Calvino e todos os demais calvinista Deus predestinou dois grupos de pessoas, um grupo foi destinado a vida e o outro grupo foi destinado a morte eterna. Ainda que alguns calvinistas tentem negar a dupla predestinação isto fica notório nos escritos de Calvino,

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João Calvino. As institutas da Religião Cristã. Volume três. João Calvino. As institutas da Religião Cristã. Volume três.

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Lutero e Agostinho. A dupla predestinação nos leva a crer que a queda do homem não foi uma permissão, mas foi o desejo de Deus, para que no futuro ele mostrasse sua misericórdia e fosse por meio de Filho Jesus glorificado.

A Ordo Salutis Arminiana. Muitas acusações são feitas aos arminianos e muitas delas são incoerentes para não dizermos que muitas das afirmações feitas contra os arminianos não passam de distorções dos fatos, por exemplo, é muito comum os calvinistas afirmarem que “os arminianos não acreditam na predestinação” quem faz este tipo de afirmação não deveria ser levado em consideração, como uma pessoa séria ou de confiança em estudos de teológicos, o máximo que poderíamos afirmar e que os arminianos interpretam o decreto da predestinação de uma forma diferente dos calvinistas, porém ambos acreditam na predestinação. “Fato [é] que todos os verdadeiros arminianos acreditam na predestinação, mas não na pré-ordenação calvinista. Quer dizer, eles acreditam que Deus conhece de antemão toda decisão final e última de cada pessoa em relação a Jesus Cristo, e, tendo isto por base, Deus predestina as pessoas para a salvação ou condenação. Mas os arminianos não acreditam que Deus predetermina ou pré-seleciona pessoas para o céu ou inferno independente de seus atos livres de aceitar ou resistir à graça de Deus”. (Olson, pg.232)10

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Roger E.Olson. Teologia Arminiana – Mitos e Verdades; São Paulo; 2013; Editora Reflexão.

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“Os arminianos interpretam o conceito bíblico de eleição incondicional (predestinação para a salvação) como corporativa. Deste modo, a predestinação tem um significado pessoal (presciência de escolhas individuais) e um significado coletivo (eleição de um povo). A primeira é condicional, a última é incondicional. A predestinação de Deus de pessoas é condicionada pela fé destas; a eleição de Deus de um povo para sua glória é incondicional. (Olson, pg.32)

O que Jacó Arminio afirmava sobre predestinação/eleição. "É um decreto eterno e gracioso de Deus em Cristo, pelo qual ele determina justificar e adotar crentes, e os dotar com vida eterna, mas condenar os descrentes e impenitentes". No mesmo contexto ele distinguiu sua visão da visão de seus 10


colegas calvinistas: "Mas tal decreto, como eu tenho descrito, não é que Deus resolve salvar certas pessoas e, para que Ele possa fazer isso, resolve dotá-las com fé, mas que, para condenar outros, ele não os dota com fé” (Olson, pg.236) 11 Jacó Arminio achava não haver nas escrituras suporte para a afirmação de que alguns foram destinados para perdição12. “Se você a entender deste modo [ex. predestinação] - que Deus desde a eternidade [...] determinou mostrar sua glória pela misericórdia e por justiça punitiva, e, a fim de efetuar este propósito, decretou criar o homem bom, mas mutável, também ordenou que ele deveria cair, para que desta maneira pudesse acomodar este decreto; eu digo que esta opinião não pode, pelo menos em meu julgamento, ser estabelecida por qualquer palavra de Deus”. (Olson, pg.236)13

Jacó Arminio formulou os decretos de Deus desta maneira. O PRIMEIRO decreto absoluto de Deus, concernente à salvação do homem pecador, é que Ele decretou designar seu Filho Jesus Cristo por Mediador, Redentor, Salvador, Sacerdote e Rei, que pode destruir o pecado por sua própria morte, pode obter, por sua obediência, a salvação que havia sido perdida, e pode comunicá-la por sua própria virtude. O SEGUNDO decreto absoluto de Deus é aquele no qual Ele decretou receber em favor os que se arrependem e creem, e, em Cristo, por SEU A M O R e por intermédio dele, realizar a salvação de tais penitentes e crentes conforme

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Roger E. Olson. Teologia Arminiana, Mitos e Verdade; 2013, São Paulo, Editora Reflexão. Jacó Arminio está trabalhando a ideia de que Deus, antes da fundação do mundo, preparou um povo para sofrer eternamente os frutos de sua própria ira contra o pecado. 13 Roger E. Olson. Teologia Arminiana, Mitos e Verdade; 2013, São Paulo, Editora Reflexão. 12

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perseveram até o fim; mas deixar em pecado e sob a ira todos os impenitentes e descrentes, e condená-los como desconhecidos de Cristo. O TERCEIRO decreto divino é aquele pelo qual Deus decretou administrar de uma maneira suficiente e eficaz os MEIOS necessários para o arrependimento e a fé; e ter tal administração instituída (1) de acordo com a Sabedoria Divina pela qual Deus conhece o que é próprio e adequado tanto para sua misericórdia quanto para sua severidade, e (2) de acordo com sua Justiça Divina, pela qual Ele está preparado a adotar tudo o que sua sabedoria possa prescrever e colocála em execução. Estes resultam no QUARTO decreto, pelo qual Deus decretou salvar e condenar certas pessoas específicas. Este decreto tem sua base na presciência de Deus, pelo qual Ele sabia desde toda a eternidade as pessoas que iriam, por intermédio de sua graça preventiva [preveniente] crer, e, por intermédio de sua graça subsequente, perseverar, de acordo com a administração antes descrita destes meios que são apropriados e adequados para a conversão e a fé; e que, pela presciência, ele igualmente conhecia os que não creriam e não pereceriam. (Olson, pg.239)14

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Roger E. Olson. Teologia Arminiana, Mitos e Verdade; 2013, São Paulo, Editora Reflexão.

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Jacó Arminio é um reformado, um calvinista, que neste ponto discorda de seus mentores Teodoro de Beza e João Calvino seguirá de modo semelhante o caminho de Philipp Melanchthon o sucessor de Martinho Lutero na reforma protestante alemã. Veja o que Philipp escreveu na Confissão [de fé] de Augsburg em 1530: “Quanto ao livre arbítrio se ensina que o homem tem até certo ponto livre arbítrio para viver exteriormente de maneira honesta e escolher entre aquelas coisas que a razão compreende. Todavia, sem a graça, o auxílio e a operação do Espírito Santo o homem é incapaz de ser agradável a Deus, temê-lo de coração, ou crer, ou expulsar do coração as más concupiscências inatas. Isso, ao contrário, é feito pelo Espírito Santo, que é dado pela palavra de Deus. Pois Paulo diz em 1 Coríntios 2: “O homem natural nada entende do Espírito de Deus”. E para que se possa reconhecer que nisso não se ensina novidade, eis aí as claras palavras de Agostinho a respeito do livre arbítrio, aqui citadas do livro III do Hypognosticon: “Confessamos que em todos os homens há um livre arbítrio, pois todos têm entendimento e razão naturais, inatos. Não no sentido de que sejam capazes de algo no que concerne a Deus, como, por exemplo, amar e temer a Deus de coração. Somente em obras externas desta vida têm liberdade para escolher coisas boas ou más. Por obras boas entendo as de que é capaz a natureza, tais como trabalhar ou não no campo, comer, beber, visitar ou não um amigo, vestir-se ou despir-se, edificar, tomar esposa, dedicarse a um ofício ou fazer alguma outra coisa proveitosa e boa. Tudo isso, entretanto, não é nem subsiste sem Deus; ao contrário: dele

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e por ele são todas as coisas. Por outro lado pode o homem também praticar por escolha própria o mal, como, por exemplo, ajoelhar-se diante de um ídolo, cometer homicídio, etc.” (Confissão Augsburg) 15

Jacó Arminio nunca quis dizer ou afirmar que o homem por meio de suas ações naturais sem a graça e o poder da Santíssima Trindade poderia se achegar a esta Santíssima Trindade pelo contrário no fundo ele acreditava que tudo era uma ação de Deus. “E para Armínio a fé é um dom. Mas ele é resistível contudo, ele claramente queria atribuir a Deus até mesmo a conversão, e não às pessoas autônomas. Sua declaração acerca do assunto é, de certa forma, paradoxal, mas uma perfeita expressão do sinergismo evangélico: A fé é tão da mera vontade de Deus que ele não fará uso do movimento onipotente e irresistível para gerar fé nos homens, mas de persuasão gentil adaptada a mover a vontade dos homens pela razão de sua própria liberdade; e, portanto, a causa total porque este homem crê e não crê é a vontade de Deus e a livre escolha do homem”. (Olson, pg.240)16

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Portal Lutero acessado dia 10/10/2014 - http://www.luteranos.com.br/textos/a-confissao-de-augsburgo Roger E. Olson. Teologia Arminiana, Mitos e Verdade; 2013, São Paulo, Editora Reflexão

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Os cinco pontos. Como já vimos no auge da discussão sobre predestinação/eleição Jacó Arminio faleceu, porém um grupo de pastores reformados da igreja holandesa que seguiram as ideias de Arminio, o representaram, defendendo seu ponto de vista, estes homens foram chamados de remonstrantes. A discussão durou anos até que o parlamento convocou um sínodo que durou cerca de seis meses com 180 sessões e neste sínodo o arminianismo foi condenado e todos que o aceitassem deveriam deixar a igreja reformada. Neste sínodo foi estabelecido um documento [uma confissão de fé] onde havia a exposição dos erros e as respostas positivas corrigindo estes erros este documento foi denominado como os Cânones de Dort e este documento junto com a Catecismo de Heidelberg e Confissão Belga se tornaram os símbolos da Igreja Reformada em todas as partes do mundo. Colocarei17 em primeiro aquilo que os remonstrantes [arminianos] defendiam e em seguida a resposta dos calvinistas.

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Usei os quadros que existente na obra de H. Wayne House. Teologia em Quadros; 1999; São Paulo; Editora Vida.

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O primeiro ponto a Depravação Total18. Arminianos - Livre -Arbítrio ou Capacidade Humana. Embora a natureza humana tenha sido seriamente afetada pela queda, o homem não foi deixado em um estado de total impotência espiritual. Deus graciosamente capacita cada pecador a arrepender-se e crer, mas não interfere na liberdade humana. Cada pecador possui o livre-arbítrio e o seu destino eterno depende de como o utiliza. A liberdade do ser humano consiste na sua capacidade de escolher o bem em lugar do mal em questões espirituais; a sua vontade não está escravizada por sua natureza pecaminosa. O pecador tem a capacidade seja de cooperar com o Espírito de Deus e ser regenerado, ou de resistir à graça de Deus e perecer. O pecador perdido necessita da assistência do Espírito, mas não precisa ser regenerado pelo Espírito antes que possa crer, pois a fé é um ato humano e precede o novo nascimento. A fé é a dádiva do pecador a Deus; é a contribuição do ser humano para a salvação. Calvinistas - Incapacidade Total ou Depravação Total. Por causa da queda, o ser humano é incapaz de, por si mesmo, crer salvificamente no evangelho. O pecador está morto, cego e surdo às coisas de Deus; o seu coração é pecaminoso e desesperadamente corrupto. A sua vontade não é livre, mas está presa à sua natureza maligna. Portanto, ele não irá escolher - de fato não pode escolher - o bem em lugar do mal na esfera espiritual. Consequentemente, é necessário muito mais que a assistência do Espírito para levar o pecador

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H. Wayne House. Teologia em Quadros; 1999; São Paulo; Editora Vida.

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a Cristo — é necessária a regeneração, pela qual o Espírito vivifica o pecador e lhe dá uma nova natureza, mas é ela mesma parte da dádiva divina da salvação. A salvação é uma dádiva de Deus ao pecador, e não uma dádiva do pecador a Deus.

O segundo ponto Eleição/Predestinação Incondicional19. Arminianismo – Eleição Condicional. A escolha de certos indivíduos para a salvação, feita por Deus antes da fundação do mundo, baseou-se na sua presciência de que eles responderiam ao seu chamado. Ele elegeu somente aqueles que ele sabia que iriam crer no evangelho livremente, de si mesmos. Portanto, a eleição foi determinada ou condicionada pelo que a pessoa haveria de fazer. A fé que Deus previu e sobre a qual ele fundamentou a sua escolha não foi dada ao pecador por Deus (ela não foi criada pelo poder regenerador do Espírito Santo), mas resultou do livre-arbítrio humano que coopera com a atuação do Espírito. Deus escolheu aqueles que sabia que iriam, por seu próprio livre-arbítrio, escolher a Cristo. Nesse sentido, a eleição de Deus é condicional. Calvinistas – Eleição Incondicional. A escolha de certos indivíduos para a salvação, feita por Deus antes da fundação do mundo, baseou-se unicamente em sua própria vontade soberana. A sua escolha de pecadores individuais não se baseou em resposta ou obediência prevista da parte 30s mesmos, tal como fé, arrependimento etc. Ao contrário, Deus concede fé e arrependimento a cada indivíduo 19

H. Wayne House. Teologia em Quadros; 1999; São Paulo; Editora Vida.

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que elegeu. Esses atos são o resultado e não a causa da escolha de Deus. Portanto, a eleição não foi determinada ou condicionada por uma qualidade ou um ato virtuoso previsto no ser humano. Aqueles a quem Deus elegeu soberanamente ele conduz a uma aceitação voluntária de Cristo, pelo poder do Espírito. Assim, a causa última da salvação é a escolha do pecador por Deus, e não a escolha de Cristo pelo pecador.

O terceiro ponto Expiação Limitada20. Arminianos - Redenção Universal ou Expiação Geral. A obra redentora de Cristo possibilitou a salvação de todos, mas não assegurou efetivamente a salvação de ninguém. Embora Cristo tenha morrido por todas as pessoas e por cada pessoa, somente aqueles que creem nele são salvos. A sua morte permitiu que Deus perdoasse os pecadores sob a condição de que creiam, mas não afastou efetivamente os pecados de ninguém. A redenção de Cristo somente se toma eficaz se a pessoa decidir aceitá-la. Calvinistas - Redenção Particular ou Expiação Limitada. A obra redentora de Cristo visou salvar somente os eleitos e de fato assegurou a salvação dos mesmos. Além de tirar os pecados do seu povo, a redenção de Cristo assegurou tudo 0 que era necessário para a sua salvação, inclusive a fé, que os une a eles. O dom da fé é aplicado infalivelmente pelo Espírito a todos aqueles por quem Cristo morreu, dessa maneira garantindo a sua salvação.

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H. Wayne House. Teologia em Quadros; 1999; São Paulo; Editora Vida.

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O quarto ponto Graça Irresistível21. Arminianismo - Pode-se Efetivamente Resistir ao Espírito Santo O Espírito chama internamente todos os que são chamados externamente pelo convite do Evangelho; ele faz tudo o que pode para levar cada pecador à salvação. Porém, na medida em que o ser humano é livre, ele pode resistir com êxito à chamada do Espírito. O Espírito não pode regenerar o pecador até que este creia; a fé (que é uma contribuição humana) precede e toma possível o novo nascimento. Assim, o livre-arbítrio humano limita o Espírito na aplicação da obra redentora de Cristo. O Espírito Santo somente pode levar a Cristo aqueles que lhe permitem fazê-lo. Até que o pecador responda, o Espírito não pode dar vida. Portanto, a graça de Deus não é irresistível; ela pode ser e frequentemente é resistida e frustrada pelos seres humanos. Calvinistas - A Vocação Eficaz do Espírito ou a Graça Irresistível. Além do chamado geral externo para a salvação, feito a todos os que ouvem o Evangelho, o Espírito Santo dirige aos eleitos um chamado interno especial que os leva inevitavelmente à salvação. O chamado externo (feito a todos sem distinção) pode ser e muitas vezes é rejeitado, ao passo que o chamado interno (feito somente aos eleitos) não pode ser rejeitado, mas sempre resulta em conversão. Por meio desse chamado especial o Espírito leva irresistivelmente os pecadores a Cristo. Ele não está limitado em sua obra de aplicar a salvação à vontade do ser humano, nem depende da cooperação humana para ter

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H. Wayne House. Teologia em Quadros; 1999; São Paulo; Editora Vida.

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êxito. O Espírito graciosamente faz com que o pecador eleito coopere, creia, arrependa-se e vá livre e espontaneamente a Cristo. Portanto, a graça de Deus é irresistível; ela nunca deixa de resultar na salvação daqueles a quem é estendida.

O quinto ponto Perseverança dos Santos22. Arminianos - Decair da Graça. Aqueles que creem e são verdadeiramente salvos podem perder a sua salvação se deixarem de guardar a sua fé. Nem todos os arminianos concordam nesse ponto [Jacó Arminio defendia a ideia que um cristão não perde a salvação]; alguns sustentam que os crentes estão eternamente seguros em Cristo - que uma vez o pecador estando regenerado, ele jamais poderá perder-se. Calvinistas - Perseverança dos Santos. Todos os que são escolhidos por Deus, redimidos por Cristo e recebem fé por meio do Espírito estão eternamente salvos. Eles são mantidos na fé pelo poder do Deus Todo-poderoso e assim perseveram até o fim. Estes foram os pontos expostos, discutidos e defendidos no sínodo, porém em ambos sistemas existem erros e isto é o que vamos analisar agora.

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H. Wayne House. Teologia em Quadros; 1999; São Paulo; Editora Vida.

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Os argumentos a favor e contra o Arminianismo sobre Eleição23. Argumento a favor - Deus deseja que todas as pessoas sejam salvas e não deseja a morte do ímpio (Ez 33.11;1 Tm 2.3-4; 2 Pe 3.9). Argumento contra - Deus escolheu alguns para serem salvos, não todos; ele até mesmo escolheu não revelar algumas verdades a algumas pessoas (Mt 13.10- 16; Jo 10.24-30). Argumento a favor - O caráter universal das ordens e exortações de Deus revelam o seu desejo de salvar todas as pessoas 0° 3.3,5-7; 1 Pe 1.16). Deus também faz um convite universal para todos virem a Cristo (Is 55.1; Mt 11.28; Jo 9.37-39). Argumento contra - O padrão de Deus não muda por causa da incapacidade humana de obedecer; a pessoa somente pode ir a Deus se Deus a atrair (Jo 6.35-40, 44-47, 65). Argumento a favor - Todas as pessoas são capazes de crer e ser salvas, porque Deus publicou um convite universal à salvação e porque Deus deu a todas as pessoas a graça preveniente que neutraliza o pecado e possibilita que todos respondam ao evangelho. Não há necessidade de uma graça especial de Deus para a salvação. Argumento contra - A expressão “graça preveniente” não é encontrada na Bíblia. Paulo expressa o fato de que 0 ser humano é incapaz de voltar-se para Deus e nem mesmo busca a Deus, mas rejeita a revelação que recebeu (Rm 1.18-32; 3.1019). Argumento a favor - Seria injusto que Deus responsabilizasse as pessoas por algo que elas são incapazes de fazer. 23

H. Wayne House. Teologia em Quadros; 1999; São Paulo; Editora Vida.

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Argumento contra - “Presciência”, conforme usada na Escritura, não é simplesmente o conhecimento de eventos futuros, mas é um termo relacionai para mostrar que Deus amou e relacionou-se com os eleitos antes de eles existirem, e os escolheu para serem salvos porque decidiu amá-los, independentemente das suas ações (Rm 9.26- 29). Argumento a favor - Deus escolhe alguns para a salvação e omite outros porque previu quem irá aceitar a oferta de salvação em Cristo. A presciência significa que Deus conhece de antemão quem irá receber a salvação e está intimamente ligada com a eleição (Rm 8.29; 1 Pe 1.1-2).

Os argumentos a favor e contra o Calvinismo sobre Eleição24. Argumento a favor - A raça humana inteira está perdida no pecado e cada indivíduo está totalmente corrompido no intelecto, vontade e emoções pelo pecado. 0 ser humano é incapaz de responder à oferta divina de salvação porque está espiritualmente morto (Jr 17.9; Jo 6.44; Rm 3.1-23; 2 Co 4.34; Ef 2.1-3). Argumento contra - Se o ser humano é incapaz de responder e não pode obedecer a Deus, então como pode Deus verdadeiramente oferecer salvação a todos por meio do Evangelho e esperar obediência da parte do ser humano (Mt 11.28-30; Jo 3.16; 6.35)?

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H. Wayne House. Teologia em Quadros; 1999; São Paulo; Editora Vida.

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Argumento a favor - Deus é soberano em tudo o que faz e faz todas as coisas de acordo com a sua boa vontade e prazer. Ele não tem de prestar contas ao ser humano, porque ele é o Criador e pode escolher a quem quer salvar (Rm 9.20-21; Ef 1.5; Fp 2.13; Ap 4.11). Argumento contra - Deus deseja que todos sejam salvos (1 Tm 2.3-4; 2 Pe 3.9). Argumento a favor - Deus escolheu certas pessoas para a sua graça especial, independentemente de sua ascendência física, caráter ou boas obras. Especificamente no que tange à salvação, ele escolheu salvar determinadas pessoas por meio da fé em Cristo (Jo 6.37,44,65; 15.16; At 13.48; Rm 9.6-24; Ef 1.4-5). Argumento contra - Deus não seria justo ao escolher somente alguns para a vida eterna e omitir outros, porque isso violaria o livre-arbítrio do ser humano para escolher e porque a oferta do Evangelho a todos não seria de boa fé. Argumento a favor - A eleição é uma expressão da vontade soberana de Deus e é a causa da fé (Ef 2.8-10). Argumento contra - Deus não pode exigir que a pessoa creia se a fé vem dele. Argumento a favor - A eleição é certamente eficaz para a salvação de todos os eleitos. Aqueles que Deus escolhe certamente chegarão à fé em Cristo (Rm 8.29-30). Argumento contra - Existe a possibilidade de que aqueles que vieram a crer decaiam da graça e percam a sua salvação. Argumento a favor - A eleição é de toda a eternidade e é imutável (Ef 1.4,9-11). Argumento contra - Deus previu aqueles que iriam crer e os elegeu na eternidade (Rm 8.29).

Nestas quatros semanas estudamos de um modo abreviado a história da doutrina cristã a respeito da soteriologia e suas principais vertentes. Observamos que estes homens antes de qualquer coisa amaram a Deus, estes homens 23


tentaram entender os caminhos insondáveis de Deus e nesta busca por uma melhor compreensão muitos erraram e acertaram em seus posicionamentos. Aprendemos que homens que não respeitaram aquilo que foi revelado nas escrituras se tornaram hereges e se perderam em suas interpretações trazendo condenação para sua vida. Não existe problema quando debatermos ideias, porém devemos tratar de uma forma cordial e amorosa o nosso opositor. Com isto em mente adotemos o conselho do John Newton: “Se você toma seu adversário por um crente, embora esteja grandemente errado no assunto debatido entre vocês, as palavras de Davi a Joabe, a respeito de Absalão, lhe são bastante aplicáveis: “Tratai com brandura… por amor de mim” (2Sm 18.5). O Senhor ama e tolera o seu oponente; portanto, você não deve menosprezá-lo ou tratá-lo com grosseria. O Senhor tolera igualmente a você e espera que demonstre ternura para com os outros, motivado pelo senso de perdão de que você mesmo tanto necessita. Em breve, vocês se encontrarão no céu. Ali, ele lhe será mais querido do que o amigo mais íntimo que você tem agora neste mundo. Em seus pensamentos, antecipe aquele tempo. E, embora você julgue necessário opor-se aos erros dele, encare-o pessoalmente como um irmão, com quem você será feliz, em Cristo, para sempre”. 25 Que Deus te abençoe... Andrezinho rupereta 25

John Newton. Controvérsia como um cristão deve lidar com os debates pg.4-5.

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