Sentença ação penal

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PODER JUDICIÁRIO JUÍZO DE DIREITO DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ/PR - FORO CENTRAL - 2ª SECRETARIA CRIMINAL AUTOS 0014562-25.2012.8.16.0017

Classe do CNJ: PROCESSO CRIMINAL / Procedimento Comum / Ação Penal - Procedimento Ordinário Assunto do CNJ: DIREITO PENAL / Crimes Praticados por Funcionários Públicos Contra a Administração em Geral / Concussão VISTOS E EXAMINADOS ESTES AUTOS DE AÇÃO PENAL Nº 0014562-25.2012.8.16.0017 EM QUE A JUSTIÇA PÚBLICA MOVE CONTRA CLAUDEMAR JOSÉ DA SILVA E OUTRO. CLAUDEMAR JOSÉ DA SILVA, vulgo 'Náilon', filho de Maria Tereza da Rocha Silva e Maurício Paulino da Silva, natural de Iguaraçu-PR e, WELLINGTON ANDRADE FREITAS, filho de Marta Correia de Freitas e Arnoldo de Almeida Andrade, natural de São Paulo-SP, foram denunciados como incursos nas sanções do art. 316 (pelo menos mais de dez vezes) c/c o art. 71 (crime continuado), ambos do Código Penal, pois consta na denúncia que, o denunciado Wellington logrou em ser eleito vereador no Município de Maringá para a legislatura 2009/2011 e, em razão do cargo e para o desempenho das funções legislativas contou com a faculdade de indicar pessoas para compor sua assessoria de gabinete. Narra ainda que, como abaixo narrado, o denunciado Wellington, indicou a vítima Nelson Hernandes Gimenes, para que fosse designada pelo Presidente da Câmara Municipal a ocupar os sucessivos cargos de Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Este documento pode ser validado no endereço eletrônico http://portal.tjpr.jus.br/web/documentos_digitais/ através do número 306.390.931 Página 1 de 17


assessoria, sempre, porém, sob a condição ilegal de partilhar os salários (vencimentos) com a pessoa nomeada. De fato, em data e horário não precisado do ano de 2009, o denunciado Wellington contatou com a vítima Nelson e o convidou para trabalhar na Câmara Municipal desta cidade, inicialmente como Assistente Parlamentar (AP2), o qual aceitando o referido cargo permaneceu assessorando-o no período de 03 a 31 de março de 2009, consoante se vê das inclusas Portarias de nomeação e exoneração n.º 202 e 304/2009. Expõe também que, posteriormente, ou seja, em data de 02 de abril de 2009, por indicação do referido denunciado, o Presidente da Câmara Municipal de Maringá, nomeou a vítima Nelson para o cargo de Assessor Parlamentar de Gabinete (AP1) o qual aceitando o referido cargo permaneceu assessorando-o no período de 02 de marco a 06 de julho de 2009, consoante se vê das inclusas Portarias de nomeação e exoneração de n.º 389 e 550/2009. Consta que, finalmente, ou seja, em data de 07 de julho de 2009, por indicação do referido denunciado, o Presidente da Câmara Municipal de Maringá, nomeou a vítima Nelson para o cargo de Assessor Parlamentar de Gabinete (AP8), o qual aceitando o referido cargo permaneceu assessorando-o no período de 07 de julho de 2009 a 01 de março de 2010, consoante se vê das inclusas Portarias de nomeação e exoneração n.º 605/2009 e 069/2010. Assim, a vítima Nelson, para o exercício do cargo de Assistente Parlamentar (AP-2), percebeu a importância bruta de R$ 839,32 (oitocentos e trinta e nove reais e trinta e dois centavos); para o exercício do cargo de Assessor Parlamentar de Gabinete (AP-1), percebeu a importância mensal de R$ 750,82 (abril/2009), R$ 769, 13 (maio/2009), R$ 933,94 (junho /2009) e R$ 430,35 (julho/2009) e, para o exercício do cargo de Assessor Parlamentar (AP-8), percebeu mensalmente R$ 2.737,21 (julho/2009), R$ 3.076,74 (agosto/2009), R$ 3.076,74 (setembro/2009), R$ 3.076,74 (outubro/2009), R$ 3.076,74 (novembro/2009), R$ 4.175,57 (dezembro/2009), R$ 3.076,74 (janeiro/2010), R$ 3.237,16 (fevereiro/2010) e R$ 2.480,32 (março/2010), consoante se vê das inclusas fichas financeiras dos períodos acima mencionados.

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A Câmara Municipal de Maringá, como sempre ocorre, no dia 15 de cada mês realiza adiantamento de 40% (quarenta por cento) de salários aos seus servidores, sem a aplicação de quaisquer descontos e no final de cada mês integraliza os 60% (sessenta por cento) subtraindo os descontos oficiais. Entretanto, narra a inicial que, ao longo de todos os períodos acima mencionados, a vítima Nelson, percebia os valores tanto do aditamento como os valores restantes de seus salários, porém, ficando tão somente com a importância que não ultrapassava R$ 600,00 ou R$ 800,00, porque os demais valores eram devolvidos ao denunciado Wellington, sob o argumento de que os valores seriam repassados ao Partido Republicano Progressista, através do assessor de gabinete e ora denunciado Claudemar José da Silva, vulgo 'Nailon', que a cada final de mês comparecia na presença na vítima e lhe exigia a entrega dos valores acima mencionados, em espécie, aproximadamente 60% (sessenta por cento) dos salários integralizados pela Câmara Municipal. Assim, o denunciado Wellington, com liberdade de escolha, consciência e vontade de atuação, valendo-se de sua condição de vereador e, portanto, dispondo do poder jurídico e político de influenciar o Presidente da Câmara de Vereadores para nomeação/exoneração da vítima Nelson Hernandes Gimenes, mancomunado com o denunciado Claudemar, vulgo 'Nailon', que também com vontade livre e consciente, aderiu o atuar ilícito do vereador Wellington, por sucessivas vezes e sempre de forma continuada, exigiu, para si e de forma indireta (ameaça implícita de demissão do funcionário/vítima), conforme acima narrado o rateio de parte dos salários recebidos pelo funcionário público municipal no desempenho daqueles cargos e funções por ele exercidos. Com a inicial foram arroladas 03 (três) testemunhas. Às fls. 271-verso foi determinada a notificação dos acusados para que, no prazo de 15 (quinze) dias, oferecessem respostas preliminares, nos termos do artigo 514 do Código de Processo Penal. Assim, devidamente notificados às fls. 275, o acusado Claudemar apresentou resposta escrita às fls. 276/281, e o acusado Wellington às

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fls. 283/288, ambos pugnando, preliminarmente, pelo reconhecimento da inépcia da inicial, por carecer de provas e elementos de convicção, ignorando o disposto no artigo 513 do Código de Processo Penal e afirmando ainda que o acusado Claudemar não tinha poder de mando sobre a suposta vítima, não preenchendo os requisitos exigidos no crime de concussão e, por fim, alegaram que a denúncia não estava apoiada em provas mínimas de materialidade do delito. Às fls. 291/294, considerando os termos das respostas preliminares oferecidas pelos acusados, o Ministério Público entendeu pelo indeferimento dos requerimentos formulados. Dessa forma, às fls. 295 este juízo indeferiu os requerimentos feitos pela defesa, recebeu a denúncia e determinou a citação dos acusados. Devidamente citados às fls. 204 e 205, os acusados mantiveram-se inertes, sendo então determinadas suas intimações para constituírem novos defensores, assim, às fls. 315/316 os referidos acusados apresentaram respostas à acusação, por intermédio de defensor constituído, requerendo genericamente suas absolvições. Dessa forma, às fls. 317 considerando os termos das respostas à acusação oferecidas pelos acusados, foi designada audiência para a instrução e julgamento. Na audiência de instrução e julgamento, foram inquiridas a vítima e duas testemunhas arroladas pela acusação, vindo os acusados a serem interrogados e, ao final, não sendo nada requerido pelas partes, foi concedido o prazo de 05 (cinco) dias sucessivos para a apresentação de memoriais. Em memoriais, às fls. 330/342, o Ministério Público requereu a condenação dos acusados como incursos nas sanções do art. 316 c/c o art. 71, ambos do Código Penal. A Defesa dos acusados, entretanto, manteve-se inerte, sendo nomeada a Dra. Isa Valéria Mariani, para patrocinar a defesa dos acusados. Assim, conforme alegações de fls. 350/356, a defesa requereu a absolvição dos acusados com fundamento no artigo 386, inciso IV do Código de Processo Penal e, subsidiariamente, em caso de condenação, pugnou Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Este documento pode ser validado no endereço eletrônico http://portal.tjpr.jus.br/web/documentos_digitais/ através do número 306.390.931 Página 4 de 17


pela consideração da primariedade e bons antecedentes dos acusados, solicitando, ao final, o arbitramento de honorários advocatícios. RELATADO. DECIDO: A materialidade delitiva não restou devidamente comprovada. Ademais, no que se refere à autoria esta não é certa e capaz de alicerçar a condenação dos acusados. Senão vejamos: O acusado Wellington Andrade Freitas, diversamente do que alegara na fase inquisitorial, às fls. 195, ao ser interrogado em juízo, às fls. 327, negou a acusação que lhe estava sendo feita na inicial, afirmando que se tratava de uma vingança por parte da suposta vítima, que mesmo quando ainda trabalhava consigo já estava em contato com outro candidato, o qual não se recordava o nome, mas que tinham feito a denúncia para lhe prejudicar. Contou que Nelson trabalhou consigo durante a campanha eleitoral e, na sequência na Câmara, mas que não era verdade que ele teria trabalhado nove meses sem receber. Questionado, respondeu que de fato possuía um escritório na Avenida Kakogawa, mesmo depois de ter sido eleito, e que Nelson havia trabalhado naquele local, no período da manhã, de forma que na Câmara ele cumpria horário no período da tarde. Asseverou que nunca se apropriou de qualquer salário da suposta vítima e que nunca ocorreu o fato descrito na denúncia, sendo que não se recordava o valor recebido por Nelson e que este teria trabalhado consigo na Câmara por, aproximadamente, 08 meses, de forma que seu horário de serviço era no período da tarde apenas. Afirmou que Claudemar era seu assessor e também tinha trabalhado com Nelson, sendo falsa a alegação de que Claudemar pegava o dinheiro com Nelson e repassava para o partido.

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Contou ainda que Nelson, quando não mais estava trabalhando consigo, e começou a trabalhar com outro candidato, começou a fazer todos os trabalhos comunitários que ele exercia, lhe copiando, de forma que seu material de campanha foi jogado por eles dentro de um salão comunitário de bairro, que era de sua responsabilidade, por ser Presidente de Bairro, sendo que os indivíduos chamaram a imprensa e lhe acusaram de utilizar-se do salão para guardar materiais de campanha. Disse também que não se recordava de ter negado que Nelson trabalhava em seu escritório na fase policial. E que respondia a outro processo criminal por motivos relacionados à Câmara. Questionado pela defesa, afirmou que a ação proposta pelo Sr. Nelson havia sido intentada após sua demissão da Câmara e que o motivo de sua demissão, não foi apenas a redução do número de assessores, mas o fato de ele sempre ter acompanhado o outro candidato, chamado Pastor Lourival, assim, quando ficou sabendo que esse candidato teria se tornado presidente de partido, entendeu por bem demitir o Sr. Nelson. Afirmou que não era coerente que a vítima tivesse continuado trabalhando consigo, caso fossem verdadeiros os fatos descritos, pois ele teria trabalhado sem receber nove meses e depois teria continuado por mais 08 meses, assim, não havia argumentos para Nelson ter entrado com uma ação trabalhista contra ele, muitos meses depois. E, por fim, disse que quando prestou a declaração de fls. 195 ainda estava em trâmite a ação trabalhista que Nelson havia intentado contra ele. Por sua vez, o acusado Claudemar José da Silva, interrogado às fls. 328, relatou que havia trabalhado como assessor do gabinete do acusado Wellington, entre os anos de 2010 e 2011 ou 2012, asseverando ainda que a suposta vítima Nelson, também havia trabalhado com o acusado Wellington, em um período anterior ao que ele tinha trabalhado, sabendo informar que ele trabalhava no escritório e também no gabinete.

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Contou que os fatos descritos na inicial não eram verdadeiros, sendo que os salários geralmente eram depositados diretamente nas contas dos respectivos servidores, não tendo acesso ao vencimento da suposta vítima. Questionado, afirmou que não se recordava dos valores auferidos por Nelson, já que havia bastantes funcionários e era responsabilidade do setor de recursos humanos. Disse que, salvo engano, Nelson realizava serviços no período da tarde, entre o meio dia e às 18h e que outra equipe fazia a parte da manhã. Asseverando também que tinha conhecimento vago sobre a ação trabalhista intentada por Nelson em face de Wellington. Questionado pelo Agente Ministerial afirmou que sua função consistia em assessorar o vereador a elaborar projetos e analisar pedidos para que fossem colocados em pauta. Disse ainda ter completado o segundo grau e com relação às atribuições da suposta vítima, a testemunha afirmou que ele ajudava a colher pedidos junto à população, anotando solicitações, mas não auxiliava na montagem de processos. Respondeu também que no período em que trabalhava com o acusado Wellington tinha que assinar um livro ponto que ficava no próprio gabinete do vereador e que não se recordava se o referido livro era assinado todos os dias, disse ainda que não havia uma pessoa responsável pelo livro, de forma que ao final do mês um funcionário do setor de recursos humanos recolhia o livro, não se recordava o nome da pessoa responsável. Disse que não se recordava o período em que o escritório do vereador ficou instalado na Avenida Kakogawa e que era uma porta na parte da frente, com uma mesa e um sofá e, indagado, confirmou que havia um cabeleireiro, que era quem havia prestado o depoimento em juízo e que não o conhecia. Por fim, questionado pela defesa, contou que antes de prestar serviços na Câmara, a suposta vítima, Nelson, prestava serviços durante todo o dia no escritório, porém, quando começou a trabalhar na Câmara não mais trabalhava em tempo integral. Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Este documento pode ser validado no endereço eletrônico http://portal.tjpr.jus.br/web/documentos_digitais/ através do número 306.390.931 Página 7 de 17


A vítima Nelson Hernandes Gimenes, ao ser inquirida em juízo, às fls. 324, contou que havia trabalhado na campanha de Wellington, sendo que ate outubro recebeu o combinado, de forma que após a eleição foi trabalhar no escritório do mencionado acusado, como assessor, por aproximadamente 09 meses, recebendo em torno de R$ 800,00 (oitocentos reais) e que não era registrado. Afirmou também que entrou com uma ação trabalhista para cobrar o que o acusado estava lhe devendo e recentemente havia recebido, sendo que após, foi convidado para trabalhar na Câmara Municipal, onde recebia na primeira quinzena 40% e o restante no final do mês, de forma que o depósito era feito em conta. Contou que no primeiro período recebia o valor integral, entretanto, no segundo período ficava com os 40% e o restante recebia e devolvia para o presidente do partido. Questionado, disse que Claudemar era assessor do acusado Wellington e era para ele que repassava o valor em dinheiro, que retirava do banco e passava para Claudemar. Contou que o combinado era receber R$ 800,00 (oitocentos reais) e devolver o restante para o partido, de forma que era apenas o servidor Claudemar quem recebia o valor, não o tendo repassado diretamente para Wellington. Afirmou também que o maior valor recebido foi de aproximadamente R$ 2.200,00 (dois mil e duzentos reais) de forma que ficava com os R$ 800,00 (oitocentos reais) e o restante devolvia. Ressaltou que a ação que havia ingressado na justiça do trabalho era referente ao primeiro período em que tinha trabalhado com o acusado Wellington, já tendo recebido e que tal ação não tinha relação com a devolução de dinheiro, já que tinha combinado isso e estava satisfeito com os R$ 800,00 (oitocentos reais) que recebia. Indagado pelo Agente Ministerial contou que trabalhava no escritório particular do acusado Wellington, situado na Avenida Kakogawa e que nunca tinha prestado serviços na câmara Municipal, de forma que

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assinava o cartão ponto na Câmara, toda semana, pelos dias que havia trabalhado. Ressaltou ainda que tinha prestado as mesmas declarações para o Dr. Cruz e que a pessoa que ia buscar o dinheiro todo mês era o Sr. indicado na sala de audiência, que conhecia apenas por 'Nailon', não sabendo declinar seu nome. Questionado pela defesa, afirmou que não se recordava o período em que havia entrado com a ação na justiça trabalhista e que trabalhava no escritório do acusado Wellington das 8h até às 11h e após, das 12h30min até às 18h, exceto aos sábados. Contou também que não tinha nenhum cunho de vingança a denúncia intentada, e que o acusado Wellington era seu amigo, mas que estava reivindicando seus direitos trabalhistas. Tendo a defesa afirmado que a vítima poderia ter intentado com a ação porque enquanto estava conveniente não entrou com a ação, porém, a partir do momento em que perdeu a regalia ele acabou denunciando. Disse que havia trabalhado durante 08 meses sem receber e que continuou trabalhando porque eram muito amigos, asseverou ainda que nas últimas eleições tinha trabalhado com o candidato Lourival, mas que não era filiado a nenhum partido. Ressaltou que ninguém havia presenciado ele entregando dinheiro para o acusado Claudemar e que ficava com R$ 800,00 (oitocentos reais) e o restante era repassado. E, por fim, disse que o valor recebido não ultrapassava R$ 3.000,00 (três mil reais), de forma que os valores indicados na denúncia não eram verdadeiros. A testemunha de acusação Elfore Sueli Manccini, ouvida às fls. 325, asseverou que conhecia o Sr. Nelson, que era seu vizinho de trabalho e que sabia que ele trabalhava na campanha do acusado Wellington e que após, com o término das eleições tinha ido trabalhar no escritório particular do candidato, localizado na Avenida Kakogawa. Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Este documento pode ser validado no endereço eletrônico http://portal.tjpr.jus.br/web/documentos_digitais/ através do número 306.390.931 Página 9 de 17


Questionado, respondeu que não sabia se a vítima exercia serviços na Câmara e que todos os dias ele estava no mencionado escritório. Relatou também que desconhecia o fato de que a vítima tinha que devolver valores e que não tinha conhecimento do quanto ele recebia, de forma que sabia sobre a ação trabalhista, mas não conhecia os detalhes. Indagado pela defesa, asseverou que a vítima teria trabalhado com o acusado Wellington por aproximadamente 01 ano, mas que não tinha certeza e que o Sr. Nelson trabalhava em período integral no escritório. E, finalmente, a testemunha Mario Massao Hossokawa, também de acusação, inquirida às fls. 326, contou que tinha sido Presidente da Câmara durante o período noticiado nos autos e que com relação aos fatos descritos não tinha conhecimento, mas poderia afirmar que durante sua gestão houve diversas alterações na estrutura administrativa, ocorrendo muitas exonerações e nomeações de assessores. Afirmou que as alterações incluíam mudanças nos salários e que os assessores eram indicados pelos próprios vereadores, não havendo qualquer interferência por parte da presidência. Disse ainda que durante sua gestão foi implantado o sistema de controle biométrico, para evitar que os servidores não fossem até a Câmara e que isso ocorreu a partir do segundo ano de sua presidência. Disse conhecer de vista a vítima Nelson e que sempre o via na Câmara, não sabendo informar se ele exercia outros trabalhos fora dali, desconhecendo também a denúncia de que ele teria que devolver determinado valor ao partido, já que os pagamentos eram feitos através de depósito em conta. Questionado pelo Ministério Público a testemunha afirmou que a Câmara não autorizava que o assessor nomeado para que realizasse serviços fora e que também não tinham conhecimento sobre a existência Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Este documento pode ser validado no endereço eletrônico http://portal.tjpr.jus.br/web/documentos_digitais/ através do número 306.390.931 Página 10 de 17


de escritórios fora da Câmara. E que conhecia o assessor Claudemar, não sabendo com quem ele trabalhava, mas que o via com o vereador Wellington Andrade. Indagado pela defesa afirmou que alguns gabinetes trabalhavam no período das 8h até as 14h e alguns realizavam o horário das 12h até as 18h, sendo plenamente possível que o assessor realizasse outras atividade fora do horário de serviço. Por fim, afirmou que já tinha visto a vítima na Câmara e que a fiscalização do ponto era feita pelos recursos humanos, não sendo possível o vereador burlar o ponto, entretanto, antes de sua gestão a frequência era feita através de livro, o que possibilitava fraudes. Feita esta análise das provas constantes dos autos, verifica-se que a prova colhida em Juízo, sob o mando do contraditório, não foi apta a comprovar a materialidade e autoria do delito de concussão pelos acusados. Senão vejamos: Primeiramente, conforme ressaltou o Agente Ministerial o delito em comento tem natureza formal, sendo suficiente para sua configuração, apenas a exigência da vantagem indevida, de forma que o efetivo auferimento do benefício é mero exaurimento do crime. Entretanto, tal conceituação não pode ser confundida com a materialidade, conforme propugnado pelo Ministério Público. Embora o crime em questão não exija provas da sua consumação, ou seja, independe da comprovação de efetivo resultado, sendo este mero exaurimento, o mesmo não se pode falar quanto a materialidade, que deve ser devidamente comprovada, sob pena de falta de justa causa para o exercício da ação penal. Assim, no caso em tela, observa-se que não houve comprovação da vantagem indevida auferida pelos acusados, o que por si só não impediria a condenação dos mesmos, por justamente tratar-se de crime formal, entretanto, a materialidade do delito, também restou comprometida, já que, com exceção da palavra da vítima, não há qualquer comprovação da exigência feita pelos acusados, como

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comprovante bancário ou até mesmo testemunhas que presenciavam ou conheciam diretamente o ocorrido. O que se tem de concreto é a palavra da vítima e a versão dos acusados e, em que pese admita-se a relevância dos depoimentos da vítima, algumas cautelas devem ser tomadas, especialmente quando este é o único elemento probatório e ainda se tem indícios de intrigas políticas. Nesse sentido, jurisprudenciais:

ressaltam-se

os

seguintes

entendimentos

"(...) Não se trata de desconsiderar a palavra da vítima, porém deve ela vir apoiada em outras provas, mesmo indiciárias, o que não é caso em tela. Ao final da instrução criminal, não restou provada a acusação, devendo, por isso, ser aplicado o princípio do in dubio pro reo. Recurso provido" (TJRJ, 7ªCCrim., Ap.Crim., j.06#03#2002, Des.Paulo César Salomão). "Sendo impossível optar com segurança entre as versões da vítima e dos acusados, quando nenhuma delas vem alicerçada em algum outro adminículo objetivo fornecido pelos autos, é impositivo que se decrete a absolvição dos réus" (TACRIM-SP, Ap., Rel.Érix Ferreira, RJD 24#37). "Existindo duas versões conflitantes nos autos, entre acusado e vítima, sem suporte probatório capaz de esclarecer qual a verdadeira, impõe-se a absolvição por insuficiência de prova, porque para um veredicto condenatório, necessário se faz que o conjunto de provas seja certo e claro" (Turma Recursal de Belo Horizonte - Rec. nº 10.137 - Rel. Juiz Adilson Lamounier - Julg. 13#11#98). "Valor das declarações do ofendido. As declarações da vítima devem ser recebidas com cuidado, considerando-se que sua atenção expectante pode ser transformada em realidade, viciando-se pelo desejo de reconhecer e ocasionando erros judiciários" (JTA Crim, 71:306). Assim, embora este juízo reconheça que o crime em questão é de difícil caracterização sendo, dessa forma, de relevante valor a palavra Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Este documento pode ser validado no endereço eletrônico http://portal.tjpr.jus.br/web/documentos_digitais/ através do número 306.390.931 Página 12 de 17


da vítima, não se pode esquecer que este é basicamente o único elemento probatório e que a vítima possuía desavenças com o acusado Wellington. Nesse diapasão, verifica-se que a suposta vítima Nelson afirmou em juízo que era bastante amigo do acusado Wellington, de forma que havia trabalhado durante 08 meses sem receber nada e que continuou trabalhando porque eram muito amigos. Ora, tal afirmação, apenas confirmar uma possível intriga política, de forma que a própria vítima assegurou que inicialmente era bastante amigo do acusado. Ademais, o acusado Wellington, em juízo, relatou que o fato descrito na denúncia se tratava de uma vingança por parte da suposta vítima, que mesmo quando ainda trabalhava consigo já estava em contato com outro candidato, o qual não se recordava o nome, mas que tinham feito a denúncia para lhe prejudicar. Da mesma forma, a vítima também confirmou que estava trabalhando com outro candidato, dizendo que havia trabalhado nas últimas eleições, com o candidato Pastor Lourival. Além disso, o acusado Wellington contou que a ação proposta pelo Sr. Nelson havia sido intentada após sua demissão da Câmara e que o motivo de sua demissão, não foi apenas a redução do número de assessores, mas o fato de ele sempre ter acompanhado o outro candidato, chamado Pastor Lourival, assim, quando ficou sabendo que esse candidato teria se tornado presidente de partido, entendeu por bem demitir o Sr. Nelson. Tais argumentações apenas indicam uma intriga política entre a vítima e os acusados, de forma que, com exceção da palavra da vítima, não se vislumbra qualquer outro elemento probatório. Corroborando o entendimento acima, vale destacar ainda o depoimento da testemunha Mario Massao Hossokawa, que afirmou que durante sua gestão houve diversas alterações na estrutura administrativa, ocorrendo muitas exonerações e nomeações de assessores, inclusive com mudanças nos salários, o que justificaria as diversas nomeações

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e exonerações da suposta vítima, e os diferentes salários auferidos por ela, trazidos como elementos de prova na peça inaugural. Ademais, a testemunha também disse que conhecia de vista a vítima Nelson e que sempre o via na Câmara, não sabendo informar se ele exercia outros trabalhos fora dali, desconhecendo também a denúncia de que ele teria que devolver determinado valor ao partido, já que os pagamentos eram feitos através de depósito em conta, diretamente ao servidor. E, afirmou ainda que alguns gabinetes trabalhavam no período das 8h até às 14h e alguns realizavam o horário das 12h até às 18h, sendo plenamente possível que o assessor realizasse outras atividades fora do horário de serviço, o que também foi asseverado pelo acusado Wellington. Por fim, embora esteja devidamente demonstrada a insuficiência probatória, é importante frisar também que a dicção do art. 316 do Código Penal assim dispõe: "Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida:" Assim, conforme obtempera Rogério Sanches Cunha, no delito de concussão o agente impõe, ordena, de forma intimidativa ou coativa, a vantagem que almeja e a que não faz jus, não se podendo confundir a exigência com solicitação, porque, no caso de mero pedido, o crime seria outro (1) . Nesse mesmo sentido, leciona Julio Mirabete que "a conduta típica está centrada no exigir vantagem indevida. Exigir significa ordenar, reclamar imperiosamente, impor como obrigação (RT 558/343),

(1) CUNHA, Rogério Sanches. Código Penal para concursos. 4ª ed. rev. ampl. e atual. Editora JusPodium: Salvador-BA.2011.pag. 558. Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Este documento pode ser validado no endereço eletrônico http://portal.tjpr.jus.br/web/documentos_digitais/ através do número 306.390.931 Página 14 de 17


constrangendo-se assim a liberdade individual para que a pessoa conceda ao sujeito ativo a vantagem indevida.". (2) Ante o exposto, no caso em tela, além de não existir provas suficientes, ainda não restou devidamente demonstrada a exigência realizada pelos acusados em face da vítima. Desse modo, não restaram configuradas as elementares do delito de concussão, uma vez que as provas colhidas na fase instrutória não demonstraram qualquer forma de exigência efetuada pelos acusados em face da vítima, com o intuito de obterem vantagem indevida, impondo-se, também por este motivo, suas absolvições. Destarte, no que tange à imputação feita aos réus Claudemar e Wellington, diversamente do que entendeu a representante do Ministério Público, entendo que o conjunto probatório é frágil e inapto para alicerçar suas condenações. Assim, em homenagem ao princípio do 'in dubio pro reo', suas absolvições se apresentam como a solução mais justa, diante da insuficiência probatória, segundo o consolidado entendimento da jurisprudência: "Se o quadro probatório não se apresenta suficientemente seguro para justificar o edito condenatório, deve-se adotar a solução mais favorável ao réu, aplicando o in dúbio pro reo." (in RT 605/304) "Em matéria criminal tudo deve ser preciso e certo, sem que ocorra possibilidade de desencontro na apreciação da prova. Desde que o elemento probante não se apresenta com cunho de certeza, a absolvição do réu se impõe" (TJSP - AP - RJTJSP 10/545) "As provas produzidas no inquérito policial, por si só, não podem embasar decreto condenatório, porque contrariam o princípio constitucional do contraditório." (JM 118/272) (2) MIRABETE, Julio Fabbrini, in Manual de Direito Penal III, Parte Especial, 20ª Ed., Editora Atlas, 2005, pág. 321. Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Este documento pode ser validado no endereço eletrônico http://portal.tjpr.jus.br/web/documentos_digitais/ através do número 306.390.931 Página 15 de 17


"Uma vez não reproduzida em juízo sob a égide do contraditório, a prova coligida no inquérito, deve ser adotada a solução absolutória." (RJD 16/132)

Face ao exposto, JULGO IMPROCEDENTE a denúncia de fls. 02/07 para ABSOLVER os acusados CLAUDEMAR JOSÉ DA SILVA e WELLINGTON ANDRADE FREITAS, qualificados nos autos, das imputações que lhes foram feitas na inicial, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, ante a ausência de provas suficientes para suas condenações. Sem custas, dando-se baixa na distribuição. Considerando a desativação da Assistência Judiciária da Universidade Estadual de Maringá e considerando que a Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe prestar assistência jurídica, judicial e extrajudicial, integral e gratuita aos necessitados, assim considerados na forma da lei (artigo 1º da Lei Complementar 80/94 e artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal), e que o Estado do Paraná ainda não implantou a Defensoria Pública, condeno-o ao pagamento de honorários a Dra. Isa Valéria Mariani, defensora nomeada aos acusados nestes autos, para o fim exclusivo de oferecer suas alegações finais, ante a inércia do defensor constituído pelos acusados, com base na tabela da OAB, arbitro em R$ 1.000,00 (mil reais), o que faço com fundamento no Ofício Circular nº 67/06 da Corregedoria Geral da Justiça e art. 33, § 1º da Lei 8.906/94. Comunique-se a vítima desta decisão. Cumpra-se o Prov. 060/2005 no que for aplicável. PUBLIQUE-SE, REGISTRE-SE, e INTIMEM-SE. Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Este documento pode ser validado no endereço eletrônico http://portal.tjpr.jus.br/web/documentos_digitais/ através do número 306.390.931 Página 16 de 17


Maringá, 29 de agosto de 2013.

DEVANIR MANCHINI JUIZ DE DIREITO

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