TORRÃO DO ALENTEJO
Elementos sobre História e Arqueologia
Colecção - Elementos para a História do Município de Alcácer, nº 2 (II Parte) http://www.cmalcacerdosal.pt/PT/Actualidade/Publicacoes/Paginas/EstudosdoGabinetedeArqueologia.aspx
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Elementos sobre História e Arqueologia
Ficha Técnica
Tema do Segundo Volume - TORRÃO DO ALENTEJO: Elementos sobre História e Arqueologia.
Colecção Digital – Elementos para a História do Município de Alcácer do Sal, nº 2 (II Parte) (Para facilitar a consulta em PDF, o livro foi dividido em 3 Partes, seguindo de perto a estrutura inicial)
Coordenação – Vereação do Pelouro da Cultura
Concepção: Gabinete de Arqueologia para apoio da Feira Anual do Torrão.
Capa, Grafismo e Desenhos – Dos autores
Cartografia elaborada pelos autores sobre bases digitais do Google Earth 2008 e do Earth Explorer 5.0, da Motherplanet.com
Fotografias – António Rafael Carvalho e Mário Perna
Edição on-line – Município de Alcácer do Sal, com colaboração da Junta de Freguesia do Torrão
Freguesia do Torrão; Município de Alcácer do Sal, Agosto de 2008
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Índice
II Parte – Arqueologia
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João Carlos Faria (†) e Marisol Aires Ferreira Descoberta de Duas Sepulturas Romanas na Vila do Torrão
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A. Catarina Cabrita, António Rafael Carvalho e Fernando Gomes Contributo para o estudo das Cerâmicas Baixo Medievais/Modernas do Torrão: O Largo Bernardim Ribeiro
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1 Publicado na revista, Movimento cultural Ano III – Nº 5, Dezembro de 1988, p. 29-35. Precocemente desaparecido, João Carlos Faria era o Vereador do Pelouro da Cultura do Município de Alcácer do Sal. Actualmente, Marisol Aires Ferreira é Arqueóloga no Município de Alcácer do Sal
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1. Introdução As peças objecto deste estudo foram recolhidas por um de nós (Fernando Gomes), nos anos 80 do século passado, dentro de um silo encontrado de forma causal no decurso de obras camarárias no Largo Bernardim Ribeiro, no centro da actual vila do Torrão. Foi efectuado um estudo detalhado, apresentado no decurso do I Encontro de Arqueologia Urbana que decorreu em Setúbal, em 1985, mas por razões que desconhecemos o trabalho não foi publicado nas Actas entretanto publicadas em 1986. Pelo interesse que tem, tratando-se do primeiro estudo de cerâmicas tardo medievais da vila do Torrão e porque se trata de um contexto fechado, achamos oportuno dar a conhecer este conjunto documental, que tem permanecido inédito e que se encontra nos reservados do Museu Municipal Pedro Nunes. Ele deve ser entendido como uma introdução ao estudo das cerâmicas medievais de uma vila que em meados do século XV/XVI era sede de município e que tinha a sua autonomia plena em relação a Alcácer.
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Localização do Torrão no Município de Alcácer e na região do Médio Sado.
2. O Torrão no Final da Idade Média: Enquadramento Geral
A História do Torrão, como antigo concelho Medieval do Alentejo Litoral, confunde-se com a História da Ordem de Santiago e com o avanço e consolidação da conquista portuguesa em direcção ao Reino do Algarve. Após a sua inserção em território português, após 12182, o castelo do Torrão e a sua Musalla, serão provavelmente transformados numa importante base militar dos Espatários para a vigilância da fronteira com o território muçulmano. O castelo de Beja, com a sua torre de menagem é visível do Torrão. Apesar desta visibilidade, se tomarmos como certa que Beja terá sido conquistada em 1234, chegamos à conclusão que o Torrão terá sido um castelo da Ordem de Santiago de “dupla fronteira”3 nesta região do Médio Sado durante pelo menos 16 anos.
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Em data desconhecida e não fixada em documentação para memória futura! Realçamos o papel de “dupla fronteira” do Torrão, sob jurisdição da Ordem de Santiago, porque desta praça forte, os Espatários conseguiam dominar o território envolvente, não só frente ao muçulmanos instalados em Beja, como servia para impedir a expansão da jurisdição da Ordem de Avis para o Alentejo Litoral. Talvez aqui resida a razão para a urgente conquista do hisn Turrus após a conquista de Alcácer em 1217. Estava em causa a manutenção da coesão territorial alcacerense que os Espatários queriam herdar do poder Wazirí, frente a pressões do lado português instalados em Évora desde 1165, provavelmente relacionados com a Ordem de Avis. 3
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Terá sido um tempo de guerra de “baixa intensidade”, em que o comércio entre os beligerantes seria fomentado4, dentro de regras muito apertadas. Nestes 16 anos, a linha defensiva islâmica, imediatamente localizada a sul, terá sido estruturada de forma a responder aos anseios da população muçulmana, numa fase em que o Império Magrebino dos Almóadas é uma superstrutura estatal estranha ao quotidiano e rejeitado pelas elites que se formaram após 1217.5
4 A questão do comércio entre beligerantes na fronteira Nazari/Castelhana encontra-se bem documentada em estudos recentes dados a conhecer por colegas do país vizinho. O tema em Portugal tem sido escassamente explorado, contudo é de admitir que terão existindo acordos, cuja natureza desconhecemos, entre povoações e castelos de fronteira. Bastante paradigmático desta situação é a ajuda que um mercador cristão, que comerciava com os muçulmanos do Garb, resolve prestar à Ordem de Santiago e que se encontra descrito na Crónica Portuguesa que relata a conquista do Algarve. Parece-nos interessante transcrever esta parte da referida Crónica, porque permite-nos antever como seriam as práticas de comércio em zona de fronteira (Crónica Portuguesa da “Conquista do Algarve” segundo Fernando Venâncio Peixoto da Fonseca, 1988, p. 82-83) “ [Script.416 A] …. (após a conquista do castelo de Aljustrel em 1234, pelo Mestre da Ordem de Santiago, D. Paio Peres Correia (Sic) …” Ganhou majs este Mestre aos Mourros auzultrel(ll) que he no Campo de Oujque e estando neste lugar ouue conselho com (os) seus cavaleyros de que maneyra podia(õ) jr ao Reyno do Algarue mas todos em hum acordo por recearem a grande pasajem da será (lho estrovavaõ) e o Mestre tendo (em) vontade de jr la todauja veyo a falar com hum mercador que andaua vendendo suas mercadarjas amtre os Mouros e os Christãos (a qu)e chamauom Garcia Rodrigues …” 5 As Ordens Militares tinham consciência da crise politica em que tinha caído o Garb al-Andalus. Segundo a Crónica da Conquista do Algarve (Ob. Cit., p. 82), uma das justificações para a conquista do sul de Portugal, residia no facto das elites muçulmanas estarem em constante guerra entre si. (Sic) “…a vontade que tinha de conqujstar aquela terra (que era) por seriço de Deos e que o leixaua de fazer porque não sayba todo ho Reyno do Algarue e os Reys que avya e como erom em gramde desvayro (hus com outros)…”
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Se tomarmos à letra as palavras da Crónica da Conquista do Algarve, o panorama apresentado em 1234, mostra-nos uma desintegração politica do Califado Almóada a uma escala cada vez mais local, que com início após a derrota almóada de 1212, na batalha de Navas de Tolosa, foi-se acentuado com o passar do tempo. Como já afirmamos noutro estudo, após 1212, os Banu Waziri instalados em Alcácer, nominalmente prestavam obediência ao Califa Almóada, mas na prática actuam com total autonomia politica. Curiosamente as fontes cristãs coevas da conquista, tratam o governador alcacerense como rei mouro.
Face ao novo quadro politico após 1217, defendemos a hipótese de o Torrão, devido ao seu papel de base militar, que aliado à mais “valia sagrada” derivado da existência de uma musalla, ter-se-á tornado politicamente autónomo, tanto em relação ao reino de Portugal, como em relação ao poder politico muçulmano instalado em Beja. É provável que logo em 1218, a componente militar da Ordem de Santiago, procure conquistar o Torrão. Nenhum documento chegou até nós que relate a sua conquista. Sabemos que terá existido uma Crónica Espatária sobre a vida e feitos do Mestre D. Paio Peres Correia, sendo admissível que mais documentação desta natureza existisse, contudo nada sobreviveu até ao presente. Entretanto a sul do eixo português de Alcácer, Torrão e Évora, ter-se-á formado com início na costa Atlântica, uma linha defensiva muçulmana, que incluía provavelmente o castelo de Odemira e os castelos de Messejana, Aljustrel, Beja e Moura. Colecção - Elementos para a História do Município de Alcácer, nº 2 (II Parte) http://www.cmalcacerdosal.pt/PT/Actualidade/Publicacoes/Paginas/EstudosdoGabinetedeArqueologia.aspx
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Durante 16 anos, ter-se-á mantido esta fronteira. Esse estado de coisas só se irá alterar, quando na década de 30 do século XIII, a Ordem de Santiago fica impaciente ao verificar que o rei D. Sancho II e algumas Ordens militares suas directas rivais retomam as conquistas em direcção ao vale do Guadiana e para sul. Querendo manter o seu domínio no Alentejo, os Espatários retomam a iniciativa militar, num percurso que culminará com a conquista do Algarve e destruição da última soberania muçulmana autónoma, com a conquista do castelo de Aljezur em 1249. Parece-nos sintomático, que seja nesse ano de 1249, que o Torrão é referido pela primeira vez nas fontes portuguesas. Parece-nos que a necessária reorganização interna do espaço conquistado pela Ordem, desde 1217, estará estado em letargia, como que a aguardar a conclusão das operações militares no Algarve. Por outro lado, esta fase militar coincidiu igualmente com uma guerra civil entre os partidários do rei D. Sancho II e do seu irmão, que com o apoio do Papa virá a ser D. Afonso III. Até que ponto esta luta interna no reino de Portugal afectou o Torrão? Inicialmente a retoma da conquista Espatária para sul em direcção ao castelo de Aljustrel, efectuou-se num quadro legal em que governava o rei D. Sancho II. Na década de 40 de Duzentos, o poder régio sofre uma grave erosão de autoridade e o país divide-se em duas facções. A Ordem de Santiago decidiu manter as antigas lealdades e as orientações vindas de Castela, não lhe restando alternativa senão apoiar D. Sancho II. Quando a luta começou a pender mais para o seu irmão D. Afonso, a Ordem de Santiago viu-se perante um dilema: - Será que iria ser penalizada por D. Afonso III? Caso a Ordem fosse sujeita a pesada pena régia, parece-nos natural que o Torrão sairia da jurisdição da Ordem de Santiago e a sua História futura seria outra. O conflito pela posse do Algarve, digladiados entre D. Afonso III e o herdeiro da Taifa de 6
Niebla , o rei Alfonso X de Castela, vieram absorver muita atenção e recursos por parte do soberano português. Parece-nos que seria contraproducente criar novos conflitos com uma Ordem Militar de obediência duvidosa, mas profundamente instalada em espaço português. Após a inclusão do reino do Algarve em espaço português, cedido pelo rei Castelhano ao seu neto D. Dinis, a Ordem de Santiago vê confirmada a sua posse, no vasto território Alentejano e Algarvio, construídos por direito de conquista. A constituição de um termo autónomo para o Torrão, por iniciativa da Ordem de Santiago, em data indeterminada, mas seguramente após 1249, nascerá num momento em que não existe dúvidas sobre a jurisdição dos Espatários nesta parcela do Médio Sado.
6 O soberano da Taifa de Niebla assome-se após 1235 como emir do Garb. Teoricamente considerava como seu, todo o território muçulmano, que ia desde Odemira até Niebla. A realidade seria outra e o seu reino teria menor expressão territorial. Quando se dá o avanço português para o vale do Guadiana, o soberano de Niebla “sente-se atacado” e solicita apoio militar ao soberano castelhano que vê com bons olhos o projecto. Quando este último anexa o reino de Niebla, reclama como seu, o território Algarvio entretanto conquistado pelos portugueses, nascendo assim o diferendo entre os dois reinos cristãos.
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Limites prováveis do Município do Torrão no Século XVI. A amarelo, a delimitação actual da Freguesia do Torrão. A azul, a proposta apresentada, elaborada com base em documentação coeva.
Nos séculos seguintes, os elementos disponíveis sobre o Torrão, não nos falam de uma História de Conflitos Militares, mas repousam antes em nomes de pessoas e nos direitos que elas reedificam para si. Fazer a História Local após o século XIII, é na realidade, apresentar a “visão” da Ordem de Santiago, porque a restante documentação ainda não foi trabalhada de forma adequada. O Torrão vai manter-se como concelho nesta região do Médio Sado até meados do século XIX. Por determinação régia será relegado para a condição de freguesia do concelho do Alvito. Pouco depois, por questões de natureza eleitoral do ciclo de Alcácer, será integrado neste ultimo município, situação que mantêm actualmente. Não temos elementos cartográficos que delimitem as fronteiras do município do Torrão, contudo, pela leitura da documentação que chegou até ao presente, podemos concluir que o Termo Torranense estendia-se para sul, acompanhando o amplo horizonte que podemos actualmente vislumbrar no sítio dos Castelos. O comércio estabelecia-se por meio de acordos com os concelhos vizinhos. Mais uma vez, estamos perante uma vila que se consolida como ponto de apoio ao caminho que vinha de Beja e que se dirigia para Alcácer e Évora.
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Listagem de individualidades ligadas ao Torrão, comenda da Ordem de Santiago, no tempo do Mestrado de D. Jorge.7
Aires Rodrigues – Juiz da Confraria de nossa Senhora da igreja de santa Maria de Torrão, em 8 de Novembro de 1510.
Álvaro Falcão – Administrador da capela de João Falcão na igreja de Santa MARIA DE Torrão., aparece referido por ocasião da visita á comenda de 8 de Novembro de 1510.
Álvaro de Mendonça – Cavaleiro, encontra-se registado no Livro de Matrícula da Ordem a 17 de Fevereiro de 1494. Foi comendador de Torrão até 10 de Março de 1517, quando a mesma passa para as mãos de D. João de Lencastre.
Álvaro Mergulhão – Morador em Torrão, cavaleiro, nomeado almoxarife da dita vila em 13 de Abril de 1524, substituindo no cargo Vasco Figueira.
António Pinto – Morador em Torrão, recebe nomeação para o cargo de procurador do número da localidade, pela Ordem de Santiago.
Bastião Pinto – Natural de Torrão, recebe carta de hábito para clérigo da Ordem de Santiago, a 10 de Março de 1540.
Belchior Peres – Morador em Torrão, clérigo de missa, a 31 de Maio de 1542 recebe carta de hábito, da Ordem de Santiago. Encontra-se registado no Livro de Matrícula da Ordem de Santiago, como freire clérigo, a 20 de Junho desse ano. Mais tarde, a 20 de Junho de 1545 recebe a capelania da matriz de Torrão, por morte de Pedro Anes Aparício.
Brás da Silva – escudeiro, foi renovado no cargo de escrivão da almotaçaria de Torrão por mais três anos e em Janeiro do ano seguinte, foi nomeado escrivão dos órfãos por igual período de tempo, mantendo-se ainda em 27 de Janeiro de 1534, altura em que recebeu visitação. A 4 de Junho de 1527, foi nomeado escrivão das águas de Torrão e Ferreira.
Brás Gomes – Morador em Torrão, é nomeado tabelião do judicial da referida localidade, a 15 de Novembro de 1548, o que acontece por renuncia de João Matoso.
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Segundo, Pimenta, 2001. As Ordens de Avis e de Santiago na Baixa Idade Média: Governo de D. Jorge, p. 300-353. Colecção - Elementos para a História do Município de Alcácer, nº 2 (II Parte) http://www.cmalcacerdosal.pt/PT/Actualidade/Publicacoes/Paginas/EstudosdoGabinetedeArqueologia.aspx
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Diogo Rodrigues – Capelão e cantor do Mestre, recebe uma mercê de 4 moios de trigo a 12 de Julho de 1516. Pouco depois, a 18 de Dezembro de 1518 foi nomeado prior da igreja de Santa Maria de Torrão, pedindo confirmação a D. Afonso, bispo de Évora. Viria também a ser juiz dos dízimos de Torrão e prior de Almada, a 24 de Fevereiro de 1524, renunciando a este ultimo priorado a 6 de Setembro de 1527, sendo substituído por Bartolomeu Fernandes.
Estêvão “Gaades” – Capelão da ermida de Santa Maria de Torrão, esteve presente por ocasião da visita á comenda de 12 de Novembro de 1510.
Fernão Cardim – Cavaleiro, recebe carta de hábito da Ordem de Santiago, a 15 de Março de 1537. É provável que assoma o cargo de almoxarife e recebedor da fabrica de Torrão, pela Ordem de Santiago na visita efectuada a 27 de Janeiro de 1534 e de 11 de Janeiro de 1544.
Fernão Pinto – recebe nomeação de vedor das águas em Torrão e em Ferreira, pela Ordem de Santiago, em 4 de Junho de 1527.
Francisco do Pó – Morador em Torrão, clérigo de missa, recebe carta de hábito, da Ordem de Santiago, a 24 de Novembro de 1533. Aparece na comenda, com funções na igreja do Torrão, autorizadas pelo então Prior da Matriz, no início de 1534.
Gaspar Nunes – Nomeado ermitão da ermida de Santa Maria em Torrão, em carta de 25 de Julho de 1521
Gonçalo Pires – Escrivão dos órfãos, contador das custas, inquiridor, distribuidor e tabelião das notas de Torrão, pela Ordem de Santiago, em 6 de Novembro de 1510.
3. As Cerâmicas: Metodologia. Os materiais seleccionados para este estudo pretendem reflectir um pouco sobre a riqueza arqueológica existente na área em questão e o contributo que a Arqueologia Medieval pode dar para o estudo do Torrão. O objectivo último será sempre a divulgação do património para que este seja verdadeiramente valorizado e compreendido, como fonte documental, como passaporte para o acesso ao nosso passado colectivo. De facto para nós tem tanto valor um edifício, uma igreja, uma porta manuelina ou um simples fragmento de cerâmica.
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Uma vez seleccionados os materiais, procedeu-se ao desenho bem como à posterior tintagem dos mesmos. As peças foram ainda fotografadas. O estudo das peças passou então pela análise morfológica e tipológica de cada uma. Tal permite definir e caracterizar possíveis origens para os fabricos. Os critérios utilizados para análise correspondem aos definidos na ficha para descrição de cerâmicas de Vipasca. Para a descrição das pastas bem como da coloração das superfícies (interna e externa) foi utilizada a Munsell Soil Color Chart. Pretendeu-se assim estabelecer possíveis origens para os vários fabricos presentes neste conjunto, localizar eventuais centros produtores e por fim enquadrar os materiais em balizas cronológicas válidas. Os materiais apresentam-se segundo um critério tipológico, isto é procurando agrupar formas, bem como de acordo com o local de onde provêm. Infelizmente não foi possível equacioná-los correctamente no espaço, numa leitura estratigráfica, porque se tratou de uma recolha efectuada por um de nós (F.G.) no decurso de uma obra. Mediante a bibliografia consultada procurou-se ainda compreender eventuais paralelos tanto formais como cronológicos, padrões decorativos e o seu enquadramento histórico-cultural. Tudo para que seja possível a visão abrangente das peças em análise.
Torrão; Largo Bernardim Ribeiro
O conjunto de peças recolhidas no Largo Bernardim Ribeiro, dentro de um silo, insere-se num contexto cronológico Baixo Medieval/moderno.
Testos. As primeiras quatro peças são testos, mobiliário de cozinha utilizado como tampa para outros recipientes. Correspondem a fabricos de cerâmica comum, com cozeduras em ambiente oxidante realizadas a torno rápido, de origem local/regional. Todos os exemplares apresentam perfil completo. Sendo peças sujeitas a reconstituição torna-se impossível uma correcta descrição das suas pastas. Tem termos globais tratam-se de produções comuns nos contextos Tardo Medievais portugueses, de sul a norte, nomeadamente em Alcácer do sal, Palmela, Sesimbra, Setúbal, Lisboa, etc. O primeiro testo revela fundo raso, bordo em barbela com lábio amendoado com um ligeiro ressalto e pega central em forma de pitorra. Note-se que o bordo em barbela desapareceria depois do século XV. A superfície externa é alisada e a interna áspera, ambas de cor laranja baço. Colecção - Elementos para a História do Município de Alcácer, nº 2 (II Parte) http://www.cmalcacerdosal.pt/PT/Actualidade/Publicacoes/Paginas/EstudosdoGabinetedeArqueologia.aspx
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É a tampa de maiores dimensões deste conjunto com um Ø de 6 cm de fundo e 15.2 cm de bordo, tendo como altura máxima 3.2 cm. O segundo testo detém um fundo raso, bordo extrovertido, lábio boleado, e pega central também seguindo o mesmo modelo que a peça anterior. A sua superfície é de cor laranja baça, sendo a externa áspera tendo a interna sido sujeita a algum alisamento. A pasta é de textura semi-compacta em tom laranja (5YR 7/6). Tem um Ø de fundo de 4.4 cm, espessura média de paredes de 0.8 cm e altura máxima de 2.4 cm. O próximo exemplar apresenta um fundo raso, bordo extrovertido e lábio boleado, novamente uma pega central. Ambas as superfícies são de cor cinzento acastanhado (5YR 6/1), a externa revela-se mais áspera, com menos cuidado que a interna. Como Ø de fundo tem 4.1 cm, 0.5 cm de espessura média de paredes e uma altura máxima de 2.9 cm. O quarto e último testo tem um fundo raso, bordo extrovertido, lábio boleado e pega central conseguida de modo muito tosco. Ambas as superfícies são de cor laranja baço, algo rudes. A pasta desta peça é de textura arenosa, cor laranja baço (5YR 7/4). Detém um Ø de fundo de 5.6 cm, espessura média de paredes de 0.8 cm como a peça anterior e uma altura máxima um pouco menor de 2.1 cm. Note-se que nenhum destes testos detém uma concepção a nível de forma muito regular, bem como que as pegas centrais em forma de pitorra, presentes nos quatro exemplares são uma característica que estaria em uso pelo menos desde o século XIII, desaparecendo no século XV.
nº 1
nº 3
nº 2
nº 4
5 cm
Tigelas
Seguem-se as tigelas; as três primeiras correspondem a fabricos de cerâmica comum, produções de origem local/regional. São peças realizadas a torno rápido, com cozeduras oxidantes. Apresentam perfil completo, tendo sido sujeitas a reconstituições parciais.
Tratam-se de formas com uma representação geográfica idêntica á descrita para os testos.
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nº 5
nº 6
nº 7 5cm
A tigela nº 5 (T-PBR 47) detém um fundo raso, parede semi-esférica com bordo recto e lábio boleado. As superfícies são de tom laranja baço, sendo a exterior de tendência mais áspera por oposição à interior alisada. No que se refere a dimensões o Ø de fundo é de 6.6 cm e de bordo de 18 cm. A espessura média de paredes é de 0.4 cm, variando a altura entre os 6 e os 6.6 cm.
O nº 6 (T.PBR 38) também é de fundo raso, com paredes semi-esféricas e um ligeiro ressalto antes do bordo sendo este algo extrovertido seguindo a orientação do corpo da tigela, de lábio boleado. Ambas as superfícies são alisadas de tom laranja. Como Ø de fundo tem 10.5 cm e 18 cm bordo. A espessura média de paredes é de 0.4 cm, tendo de altura 6 cm.
A tigela nº 7 (T.PBR 39), igualmente de fundo raso, apresenta paredes semi-esféricas com um ligeiro ressalto antes do bordo extrovertido que segue a orientação do corpo da tigela, tendo depois um perfil de lábio direito. As superfícies variam entre o laranja e o laranja baço, sendo a exterior mais áspera que a interior, mais cuidada, com algum alisamento. As dimensões de Ø do fundo são de 10.3 cm tendo 18 cm Ø de bordo e uma altura variando entre os 6 e os 6.5 cm. A espessura média de paredes é de 0.5 cm. Colecção - Elementos para a História do Município de Alcácer, nº 2 (II Parte) http://www.cmalcacerdosal.pt/PT/Actualidade/Publicacoes/Paginas/EstudosdoGabinetedeArqueologia.aspx
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A peça nº 8 (T.PBR 40) corresponde a uma grande tigela, de perfil completo, sujeita a reconstituição. Trata-se de um fabrico em cerâmica comum a torno rápido de produção local/regional. O fundo é raso, as paredes bastante abertas de perfil semi-esférico com um bordo de perfil recto e um pequeno sulco a demarcar o lábio direito. As superfícies são de cor laranja baça, apresentando a interior uma ténue aguada. Como Ø de fundo tem 8.8 cm e 27 cm de bordo. A espessura média de paredes é de 0.6 cm, tendo de altura 6 a 8 cm.
nº 8 5cm
Taça (Produção exógena). A taça nº 9 (MMPN 5603) apresenta um perfil completo, tendo também sido sujeita a um processo de reconstituição. Trata-se de uma grande taça de origem exógena, de meados do século XV. A nível morfológico detém um fundo em pé anelar, paredes de perfil semi-esférico com uma acentuada inclinação, bem como um sulco a delimitar claramente o bordo algo extrovertido quase recto de lábio boleado. A superfície externa, alisada, apresenta um espesso engobe de tom cinza (7.5 YR 8/2), salpicado por gotas de esmalte verde. A superfície interna encontra-se totalmente coberta por esmalte verde, mostrando reflexo metálico. Como dimensões assinala-se o Ø de fundo com 6.9 cm e 26.5 cm de bordo. Colecção - Elementos para a História do Município de Alcácer, nº 2 (II Parte) http://www.cmalcacerdosal.pt/PT/Actualidade/Publicacoes/Paginas/EstudosdoGabinetedeArqueologia.aspx
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A espessura média de paredes é de 0.6 cm, variando a altura entre os 7.8 e os 8.3 cm.
nº 9
5 cm
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Paralelos e Atribuição Cultural.
Até muito recentemente, pensávamos que estaríamos em presença de uma produção, algo atípica, esmaltada a verde proveniente das oficinas de Sevilha. Sabe-se actualmente que Sevilha no reino de Castela e as oficinas da região Valenciana, inserida na Coroa de Aragão, exportaram em grandes quantidades para Portugal, em concorrência directa com as produções Nazarís do reino de Granada. Mais recentemente, num trabalho sobre as cerâmicas do “Mercado Velho” de Palmela, demos a conhecer as primeiras cerâmicas do Reino de Fez/Merinidas8 exumadas em Portugal, em contexto arqueológico. Pouco depois, identificamos algumas cerâmicas Merinidas em Alcácer do Sal, que contamos dar conhecimento futuramente. Em síntese, ao contrário do que poderíamos pensar, chegaram ao reino de Portugal, em contexto cristão Tardo Medieval e anterior à conquista de Ceuta, um conjunto de produções cerâmicas, de centros que as fontes não mencionam. Correspondem certamente a escassas quantidades, quase sem expressão arqueológica. Uma questão interessante que as cerâmicas Merinidas encontradas em Alcácer (Século XIII) e Palmela (Século XIV) levantam, é a sua ocorrência em duas vilas sob jurisdição da Ordem de Santiago. Esta questão terá que ser desenvolvida noutro estudo, contudo é importante assinalar que o primeiro contacto e conflito que a Ordem de Santiago terá tido com o poder Merinida, ocorreu no decurso da 2ª Fase da Conquista do Algarve, com a conquista dos últimos enclaves islâmicos, que após 1240/45 se terão desligado da suserania da Taifa de Niebla, optado por solicitar apoio militar aos Banu Marín, que entretanto continuavam em Marrocos, a sua guerra de desgaste contra os resquícios do Califado almóada. A peça exumada no Torrão levanta algumas questões ainda mal resolvidas! Em termos de acabamento final, este tipo de esmalte verde é comum nas produções tardo medievais dos reinos Peninsulares, contudo a associação de esmalte, na superfície interna, com a utilização de um espesso engobe na superfície externa, aparece quase sempre nas produções da região Valenciana e Nazaris. Se a este tipo específico de tratamento final da peça, aliarmos a forma desta taça, de formato levemente “fusiforme”, verificamos que os melhores paralelos tipológicos, se encontram nas produções do reino de Granada. Os dados disponíveis permitem então supor que estaremos em presença de uma produção muçulmana Nazari, de finais do século XV. Podemos citar também, os exemplares encontrados na Rua Augusto Cardoso9 e as do Mercado velho de Palmela.10
8
Anteriores à conquista de Ceuta pelos Portugueses em 1415. Fernandes e carvalho, 1993, Arqueologia em Palmela 1988/92. Catálogo da Exposição, p. 79 (fig.213) e p.80. 10 Carvalho, 2005. Mercado Velho de Palmela. 9
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Centros Produtores de cerâmica, que abasteciam o Torrão, em finais da Idade Média/Inícios do Período Moderno. (Mapa adaptado de António R. Carvalho, 2005/07, Intervenção Arqueológica no Mercado Velho: Musa nº 2, p. 79)
Prato
nº 10 5 cm
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O exemplar seguinte é um prato, (nº 10) de perfil completo. Foi sujeito a reconstituição parcial. Realizado em ambiente oxidante, corresponde a uma produção de origem local/regional. O fundo é raso, com um bordo em barbela, extrovertido com uma ligeira inflexão, e lábio boleado semi-circular. Ambas as superfícies são alisadas de tom laranja baço. A pasta é de textura algo arenosa, de cor laranja baço (5YR 7/4). O Ø de bordo é de 19.5 cm, tendo uma espessura média de paredes de 0.8 cm. A altura é de 2.4 cm. Trata-se de uma forma muito interessante, tendo em conta a cronologia proposta (Séculos XV/XVI). Em termos formais, apresenta as características encontradas em peças similares, exumadas em contextos coevos junto ao litoral, desde Lisboa, Sesimbra, Setúbal, Palmela e Alcácer. Enquanto nestas povoações do litoral, os pratos apresentam sempre o pé é sempre em anel e raramente em ônfalo, no exemplo do Torrão a base não apresenta nenhuma destas características tipológicas. O exemplo do Torrão, aparentemente único neste contexto cronológicos para a área em estudo, parece indicar um outro centro de produção, provavelmente ligado ao Alentejo Central. Por razões ainda desconhecidas, esta característica do pé em anel, irá desaparecer em finais do século XVI. Um bom exemplo desta tendência podemos verificar na área urbana de Palmela.11 (Fernandes e Carvalho. Utilizando pastas diferentes e tamanho variado, apresentam contudo os elementos tipológicos comuns a esta “série tipológica”. Excluindo o prato típico do século XV/XVI (Fig. 84), as restantes peças foram exumadas em contextos de finais do século XVI, ganhando expressão no século XVI (em numero e variedades tipológicas). Em termos de distribuição geográfica, esta forma encontra-se bem representada na área urbana de Palmela e no espaço rural (Convento de S. Francisco de Alferrar)
11
Fernandes e Carvalho, 1998, Conjuntos Cerâmicos Pós-Medievais de Palmela, páginas 223 e 244 (Fig.84, 85, 86, 87, 88 e 89) Colecção - Elementos para a História do Município de Alcácer, nº 2 (II Parte) http://www.cmalcacerdosal.pt/PT/Actualidade/Publicacoes/Paginas/EstudosdoGabinetedeArqueologia.aspx
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Pote
Forma tipológica com boa representação em Portugal, de norte a sul, aparecendo nos locais atrás referidos. O nº 11 (T.PBR 63) pertence a um pequeno pote, de perfil completo. De cozedura oxidante, deverá ser a nível de fabrico de origem regional. O fundo é plano, com um bordo recto de lábio boleado, bem diferenciado do bojo de carácter ovóide, tendo ainda uma asa lateral de perfil vertical. As superfícies são de cor laranja baço, tendo a externa sido mais alisada, sendo a interna (não tão visível) mais áspera. Denotam-se as marcas de contacto com o fogo, possivelmente fruto do seu uso enquanto recipiente para aquecimento de líquidos. O Ø de fundo é de 5.3 cm e de bordo de 6.2 cm. A espessura média de paredes tem 0.5 cm e uma altura que varia entre os 8 a 8.4 cm, dado ser uma peça algo irregular.
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nº 11 5 cm
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Bibliografia
Carvalho, A Rafael, 2004.Intervenção Arqueológica no “Mercado Velho de Palmela”: Primeiros resultados. Al Madan, série II, nº 13, Adenda Electrónica.
Carvalho, A Rafael, 2007.Intervenção Arqueológica no Mercado Velho: Novos Contributos para o Conhecimento do quotidiano em Palmela, no final da Idade Média. Musa nº 2, 2005/07, p. 74-82.
Fernandes, I. Cristina e Carvalho, A Rafael, 1993. Arqueologia em Palmela 1988/92: Catálogo da exposição. Ed. C M Palmela.
Fernandes, I. Cristina e Carvalho, A Rafael, 1998. Conjuntos Cerâmicos Pós-Medievais de Palmela. Actas das 2ªs Jornadas de Cerâmica Medieval e Pós-Medieval, p. 211-255, Tondela.
FONSECA, F. Venâncio Peixoto da, (1988). “CRÓNICA DA CONQUISTA DO ALGARVE”. Boletim de Trabalhos Históricos. Arquivo Alfredo pimenta, p. 81-109.
PIMENTA, Maria Cristina Gomes, 2001. As Ordens de Avis e Santiago na Baixa Idade Média: O Governo de D. Jorge. Colecção Ordens Militares nº 1. Separata do nº 5 da Revista Militarium Ordium Anacleta.
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