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Aviação e o seu primeiro campo em Portugal

Aviação e o seu primeiro campo em Portugal OPINIÃO

Apesar de não ser uma novidade, diremos que a aviação é a arte de elevar e de conduzir na atmosfera um corpo mais pesado que o ar, utilizando a resistência que qualquer meio gasoso opõe aos corpos em movimento. O homem, porém, nas suas tentativas para se elevar no ar, não tentou imitar o movimento das asas batentes, que permite ao pássaro elevar-se e voar. De facto, o homem, com o seu esforço, imaginação e talento, concebeu e realizou um movimento cuja natureza tinha como exemplo os corpos celestes, ou seja, o movimento de rotação. Curiosamente, este movimento era semelhante ao dos papagaios de papel que as crianças antigamente elevavam no ar, cujo equilíbrio, quando soprava o vento, elas manejavam através duma corda, ou cordel. Hoje, esta situação repete-se no aeromodelismo. Por alguma razão, um dos sonhos do homem foi sempre “voar”. Porém, só no século XIX é que se tentou fazer projectos e algumas experiências. John Cayley e Ader foram, então, dois percursores da aviação. Em 1809, Cayley criou um projecto de aviação completo, ou seja, com as asas, a hélice e o motor. Em 1896, Ader foi mais longe, fazendo experiências e conseguindo elevar um avião e percorrer 300 metros, em Satory. Mais tarde, o alemão Lilienthal entregou-se aos problemas do voo em vela. Assim, depois de fixar ao seu corpo asas e uma cauda, Lilienthal lançou-se de uma torre e conseguiu fazer voos horizontais, até aos 300 metros. Pereceu em 1906, quando realizava o milésimo voo. A seguir, o francês Chanute, continuando estas experiências, demonstrou o seu interesse pelo biplano. E, assim, abriu caminho aos irmãos Wright, que construíram um avião capaz de voar e até de levar um passageiro. Perante estes e outros factos, a aviação é um mundo inesgotável de surpresas, de aventuras e de heróis. Em Portugal, os heróis da aviação arriscaram a vida por orgulho e amor à Pátria. Apesar disso, foram desprezados pelo poJ. Martins Pereira Coutinho Especialista em Carga Aérea coutinho.mp@gmail.com

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der político. Hoje, graças aos seus heróis e à sua coragem, a aviação domina o mundo, transportando milhões de pessoas e de toneladas de carga entre todos os continentes, contribuindo, assim, para o desenvolvimento económico mundial. Em 1913, foi possível avistar o primeiro avião a cruzar os céus da Amadora, onde está hoje a Academia Militar. E, em 1917, a Liga dos Melhoramentos da Amadora decidiu realizar o Primeiro Festival Aéreo, o qual teve a presença do Presidente da República, Dr. Bernardino Machado. Em 1919, o Grupo de Esquadrilhas de Aviação da República (GEAR) instala-se na Amadora. O seu primeiro comandante foi António Sousa Maia, piloto-aviador, que, na Força Aérea francesa, se distinguiu na Primeira Guerra Mundial. Também em 1919, é inaugurado o Campo de Aviação da Amadora. Justificando o seu interesse, segundo o Decreto nº. 5.151, o Ministério da Guerra afirma: “Atendendo aos importantes serviços que a aviação pode prestar, quer como elemento de informação do comando, quer como elemento de observação para a artilharia, quer como elemento de combate e de destruição, quer ainda como como fator moral, e considerando que, perante os atuais acontecimentos, se torna urgente a criação imediata de uma unidade de aviação”. O terreno para a sua instalação, junto ao campo de futebol dos “Recreios”, foi cedido por António Cardoso Lopes. Nesse período, durante cerca de 25 anos, a freguesia da Amadora foi berço de algumas das mais importantes viagens da aviação nacional, nomeadamente para Macau, Guiné, Moçambique, Índia e Angola, realizadas por Brito Paes, Sarmento Beires, Sacadura Cabral e Gago Coutinho. Nesse tempo, além de muitos problemas e dificuldades para obterem autorizações, eram os aviadores que financiavam e colaboravam na angariação de donativos para poderem realizar as viagens que projectavam. Em 1924, por exemplo, na viagem Amadora- -Macau, o mecânico Manuel Gouveia afirmava não haver dinheiro para levar 1.500 litros de gasolina. Para o ajudar, o jornal “O Século” fez uma subscrição junto dos seus leitores para comprar a gasolina. Entre outros casos, em 1930, num voo histórico entre a Amadora e Goa, na Índia, Sarmento Pimentel e Moreira Cardoso compraram na Inglaterra um avião “Havillland” de 120 cv, por 1.000 libras, que baptizaram de “Marão”, devido às suas origens transmontanas. Lembramos, a propósito, que Sarmento Pimentel convenceu uns familiares a hipotecarem umas terras para pagar a sua parte. Era um avião com a carlinga fechada e, por isso, evitava que os pilotos sofressem com as intempéries, que antes apanhavam nas suas faces. Tudo isto faz parte de um período da história dourada da aviação nacional e confirma a coragem e o patriotismo dos seus heróis, figuras nacionais ímpares, determinadas e aventureiras. Estes e outros pioneiros da aviação, como Sacadura Cabral e Gago Coutinho, não mereciam o desprezo a que foram votados pelo poder político, que, por incompetência ou ignorância, sempre tentou impedi-los das suas iniciativas patrióticas, apesar de serem pagas com o seu dinheiro e através de subscrições públicas, ou seja, sem custos para o Estado. Entretanto, mais tarde, em 1938, terminava a histórica ligação da Amadora à aviação nacional, aparentemente, devido à exiguidade do espaço e da deficiência da pista, que era de terra batida. A partir de então, Tancos passou a ser a base do seu material aeronáutico e também do pessoal do GEAR – Grupo de Aviação de Informação da República, que antes estava no Campo de Aviação da Amadora, que foi o primeiro campo de aviação em Portugal.

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