Boletim CRRR - Julho / 2015

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A m a i s l o n g a gre ve d o s professores do Estado de São Paulo, que durou 92 dias, foi o ponto mais marcante da conjuntura do primeiro semestre, também marcada por uma pauta política conservadora, que inclui retrocessos como a redução da maioridade penal, uma reforma política que mantém o financiamento empresarial de campanhas e não favorece a transparência e participação popular, o ajuste fiscal e outros pontos que vão na contramão

dos avanços conquistados nos últimos anos. O momento atual também está caracterizado pela forma como diversos governos vem tratando o movimento de professores pelo Brasil, com especial destaque para o governo Alckmin em São Paulo, que desconsiderou todas as tentativas de negociação feitas pela APEOESP, descontou os salários, proibiu os comandos de greve de visitar as escolas, usou e abusou do assédio moral e todo tipo de ameaças

e, suspensa a greve, cria todo tipo de dificuldades para que os professores reponham as aulas não ministradas durante o movimento. Outro exemplo é o do estado do Paraná, onde o Governo do também tucano Beto Richa agrediu de forma violenta os professores e professoras que estavam em greve.

Redução da maioridade penal Os movimentos sociais, entretanto, continuam na luta contra a


agenda de retrocessos que setores conservadores tentam impor ao país. Uma vitória importante foi impedir a aprovação do projeto de redução da maioridade penal na Câmara dos Deputados. A APEOESP tomou parte ativa neste movimento, realizando uma webconferência no dia 25 de junho e enviando ônibus a Brasília no dia 30 de junho, quando o projeto foi votado. É preciso, contudo, continuar articulando e organizando os movimentos, pois hoje há uma maioria no Congresso Nacional composta por segmentos que não desejam a continuidade dos avanços políticos e sociais conquistados nos últimos 13 anos. (Até o fechamento deste Boletim, ainda não havia sido encerrada nova sessão na Câmara dos Deputados que discutia novo texto sobre o tema)

A importância do Plano Nacional de Educação É preciso, por exemplo, continuar avançando na educação. Os movimentos sociais, a começar pelos professores, professoras, pais e estudantes, mas também a CUT, demais centrais, sindicatos e organizações da sociedade civil organizada devem exigir do Estado, em todos os seus níveis, a aplicação imediata das metas e estratégias do Plano Nacional de Educação.

Sancionado há um ano pela Presidenta Dilma Rousseff, o PNE é desconhecido para a maioria da população e até mesmo em nosso meio. De vemos ler e disseminar o PNE, para que as comunidades escolares e toda a sociedade possam lutar para que cada uma de suas metas e estratégias se concretize. Em São Paulo, nossa greve lançou ao conhecimento público o teor da meta 17, que trata da valorização dos profissionais da educação, por meio da equiparação, até 2020, dos nossos salários à média dos demais profissionais com formação equivalente (ou seja, nível superior completo). Esta meta (valorização profissional, articulada com a meta 16, que trata da formação; meta 18, que trata da carreira; 19, que cuida da gestão democrática; e 20, que trata do financiamento da educação) é estruturante e fundamental para que todas as demais metas sejam cumpridas. A APEOESP foi a primeira entidade a fazer da meta 17 o centro de sua mobilização e, neste sentido, aponta um caminho para que a CNTE e todos os sindicatos filiados realizem uma luta nacional pela sua efetivação. A plena concretização do PNE passa pelos Planos Estaduais e Municipais de Educação, cuja maioria, em nível nacional, já foram aprovados, segundo dados do MEC.

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Os Planos Estadual e Municipais de Educação Como em todo Brasil, os estados e municípios tinham até o mês de junho para aprovar e sancionar os seus planos de educação ou atualizá-los, se estiverem em vigor. O Plano Estadual de Educação (PEE) de São Paulo, após ser elaborado em conjunto pelas 73 entidades do Fórum Estadual de Educação de São Paulo (FEESP) – com grande participação da APEOESP, sobretudo nas metas que se referem à valorização profissional e financiamento – e após consulta aos profissionais da rede, foi desvirtuado em aspectos importantes pelo executivo paulista – governo Alckmin – cuja proposta de redação retrocede em relação ao documento construído pelo FEESP e torna inócuos aspectos que já constam no Plano Nacional de Educação (PNE) ao limitar aspectos fundamentais como a Meta 17 aos limites orçamentários impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal O PEE de SP, que será enviado pelo Executivo, tramitará na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) e necessitará de ampla mobilização dos professores e de toda sociedade civil organizada para que seja retomada a proposta original do FEESP em relação ao financiamento da Educação, à gestão


democrática e à valorização dos profissionais da Educação.

Ensino Médio e o modelo de Currículo No dia 30 de junho a APEOESP promoveu uma webconferência sobre o ensino médio, com a presença dos professores José Fernandes de Lima, membro do Conselho Nacional de Educação e relator das Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio e João Cardoso Palma Filho, membro do Conselho Estadual de Educação e Coordenador do Fórum Estadual de Educação. O modelo atual de ensino médio não vem correspondendo nem aos objetivos de preparar as crianças e jovens para continuarem seus estudos no ensino superior, para o trabalho e nem para a cidadania, nem como expectativa do que seria uma escola adequada para as crianças e jovens do mundo em que vivemos. No que diz respeito ao descolamento do modelo escolar do mundo contemporâneo, este não é um problema apenas vivenciado no Brasil. Este debate vem ocorrendo em outros países, onde o destaque tem sido a Finlândia, considerado o país com melhor qualidade de ensino do mundo e que iniciou uma mudança drástica no seu modelo curricular, substituindo um modelo organizado a partir

de disciplinas para um modelo de currículo mais transversal a partir de áreas do conhecimento. Além da impossibilidade de avaliarmos os resultados deste novo modelo, seja porque as mudanças foram recentes, bem como se trata de uma realidade totalmente diversa da realidade brasileira – na Finlândia os profissionais do magistério são extremamente valorizados - temos que considerar a realidade brasileira. Caso contrário, corremos o risco de realizarmos uma reflexão totalmente abstrata, sem base na realidade. No plano nacional temos vivenciado nas últimas décadas um processo de degradação da educação pública que veio ocorrendo de forma concomitante ao ingresso dos setores populares, antes excluídos da escola pública, aos bancos escolares. Para os setores de elite de nossa sociedade esta deterioração da escola pública não se constitui um problema pois ela matricula seus filhos nas melhores escolas particulares, bem como este modelo contribui para manter um modelo social excludente. Apesar de toda experiência dos profissionais da educação básica, no seu contato com os alunos, os pais e o processo pedagógico em si, há o risco de assistirmos mais uma mudança na escola básica sem a participação dos professores. No plano federal o Ministério da Educação (MEC) criou uma Comissão de Espe-

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cialistas (PORTARIA No - 592, DE 17 DE JUNHO DE 2015), a ser formada ainda, que tem prazo até fevereiro de 2016 para elaborar e apresentar uma proposta de Base Nacional Comum Curricular ao Conselho Nacional de Educação. Estamos atentos e a CNTE está procurando o MEC para interferir nesta proposta, pois além de poder resultar em mudanças grandes na educação básica, também pode refletir no trabalho dos seus profissionais.

Em São Paulo, “currículo a la carte” No estado de São Paulo o governo divulgou de forma vaga que pretende mudar o currículo do ensino médio das escolas públicas estaduais, implantando estas mudanças a partir do início de 2016. Infelizmente, as poucas informações a que temos acesso são aquelas que o secretário da educação divulgou pela grande mídia. De acordo com estas informações, os estudantes do segundo e terceiro ano do ensino médio poderiam escolher as disciplinas a seu bel prazer, constituindo num modelo “a la carte”. Numa primeira reflexão este modelo, mesmo que implantado de forma “gradual” e por opção do Conselho de Escola, apresenta alguns problemas graves conforme segue abaixo. Este modelo aumenta o risco de exclusão ao possibilitar que


sejam retiradas da matriz curricular, disciplinas e conteúdos que são exigidos nos exames de ingresso ao ensino superior. É muito provável que algumas disciplinas que não sejam muito “simpáticas” aos estudantes sejam retiradas em favor de outros conteúdos mais “atraentes”. Não se trata de não incluir práticas como teatro e música nas práticas escolares, inclusive este tipo de experiências já são realizadas por muitos professores nas escolas onde trabalham, mas é no mínimo irresponsável a retirada de disciplinas e conteúdos básicos que possam depois prejudicar estes alunos na vida e no

prosseguimento de seus estudos. Além do prejuízo aos estudantes e ao seu futuro este modelo pode prejudicar milhares de professores que na ocasião da escola optar pelo fim de determinadas disciplinas de seu currículo, alija de seus quadros estes profissionais. Muitos destes profissionais concursados que na impossibilidade de obterem aula na escola que ele escolheu por ocasião do concurso, poderá ficar adido numa função outra que não a docência. Lembramos que este profissional estudou para ser um professor e o governo do estado desta forma encosta ele numa função burocrática e ao mesmo

tempo prejudica milhares de estudantes. Temos que envolver os estudantes, os pais e toda comunidade escolar neste debate, pois as mudanças terão reflexo no futuro do estado de São Paulo. Para isso é fundamental que os professores comecem se organizar nas regiões e discutir o modelo de currículo que de fato interesse aos filhos dos trabalhadores. No próximo dia 04 de julho haverá o II Encontro de Representantes de Conselhos de Escola do Estado de São Paulo, é fundamental que os representantes façam reuniões regionais antecedendo o encontro estadual.

A greve e a reposição das aulas

a greve não existia ou, em outros momentos, de que ela estava prejudicando os estudantes pela intransigência da APEOESP. Ao negar a existência da greve, Governo e mídia buscavam justificar a negativa em negociar, afirmando inicialmente que seria anunciada em abril uma política de reajuste para quatro anos, o que foi sendo postergado até a presente data. O Governo também tentou desprezar a APEOESP como representante dos professores, recebendo entidades que não estavam na greve, as quais tentaram explorar sua

cumplicidade com o Governador como se fosse possível conquistar reajuste salarial sem luta. Com a consolidação da greve e a impossibilidade de sua negação, a posição do Governo do Estado passou a ser de agredir o movimento como radical, partidário e intransigente. Ora, lembramos que a APEOESP vinha procurando o Governo para negociar desde o segundo semestre de 2014. Sem respostas, não houve outra alternativa a não ser a greve. Durante o movimento grevista o governo Alckmin, com amplo

No Brasil, os grandes meios de comunicação monopolistas têm tido o papel de construir versões que atendam aos interesses dos grupos econômicos dominantes e dos partidos conservadores, com destaque para o PSDB, que comanda o Governo do Estado de São Paulo. No caso da nossa greve não foi diferente. Desde o início, o Governo do Estado e a mídia trabalharam com a versão de que

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apoio da grande mídia, procurou caracterizar nossa luta também como irresponsável, deixando de informar que a nossa reivindicação de 75,33% de reajuste é baseada numa lei nacional, a meta 17 do PNE, e que a mesma define um prazo para que esta seja alcançada, até 2020 e não de uma única vez. A greve dos professores contou com o apoio de estudantes e de pais, que participaram de inúmeros atos e manifestações, além de personalidades, setores de Igrejas e muitos outros segmentos sociais. Estas manifestações refletem a compreensão por parte da sociedade da importância da categoria dos professores na formação, não apenas de seus filhos, mas da sociedade. Todavia, o governo Alckmin demonstrou total insensibilidade para com estes profissionais. Essa greve, além de ter sido a mais longa de toda história do magistério público básico paulista, se caracterizou pela grande participação em suas manifestações e pelas ações em estradas e avenidas. Ações essas que contaram quase sempre com a participação de outros segmentos sociais em apoio ao nosso movimento. Com a suspensão da greve e o retorno às aulas, a reposição tem sido marcada por um novo embate, com inúmeros diretores e supervisores se posicionando como prepostos do governo Alckmin, com uma interpretação unilateral da Instrução e do

Comunicado de orientação da reposição. Neste sentido reafirmamos a importância do diálogo com os estudantes e pais, nos Conselhos de Escola, para garantirmos que nossos estudantes tenham o direito ao conteúdo programado e com profissionais habilitados. Nossa responsabilidade é primordialmente com nossos estudantes e com seus pais. Esta é uma oportunidade para fortalecermos o Conselho de Escola como espaço privilegiado para fortalecimento de uma escola pública de qualidade.

ção, as entidades do magistério e tantos que deram crédito à palavra do Governo Estadual não vêm a público questioná-lo e dizer: os professores tinham razão? Sim, tínhamos e temos razão. Este é um governo truculento, autoritário, cruel com professores e estudantes, inimigo da escola pública e, agora mais uma vez fica provado, não é verdadeiro.

Governo Estadual descumpre palavra e não apresenta proposta salarial

A greve foi suspensa, mas nossa luta não acabou. Vamos continuar nos mobilizando por cada um dos pontos de nossa pauta de reivindicações, buscando ampliar o movimento em articulação com pais, estudantes e outros segmentos sociais. Esta mobilização conjunta já está ocorrendo em diversas escolas, por meio dos Conselho de Escola, para garantir reposição de aulas justa para professores e estudantes e deverá prosseguir. Para tanto, a APEOESP realiza neste sábado o II Encontro Estadual de Conselheiros de Escola, que reunirá representantes de pais, professores e estudantes, membros de Conselhos, escolhidos nas regiões em encontros organizados pelas subsedes.

Durante os 92 dias de greve dos professores estaduais o Governador do Estado e o Secretário da Educação disseram exaustivamente que apresentariam uma proposta de política salarial para quatro anos. Disseram que a greve era intempestiva e que deveríamos aguardar o anúncio da suposta “política salarial”, primeiro para abril, depois maio e, finalmente, 1º de julho, que dizem considerar como a data-base da categoria (quando, na verdade, pela lei nossa data-base é 1º de março). Pois bem, o dia 1º de julho se foi e nada foi anunciado. Nossa greve foi mesmo intempestiva? Por que os meios de comunica-

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Mobilização social pela valorização dos professores e em defesa da escola pública

CER decidirá o calendário de mobilizações No dia 04 de julho a reunião


do Conselho Estadual de Repre-

garantidas outras possibilidades

sentantes avaliará a greve e defi-

de reposição, conforme preveem

nirá a continuidade do movimen-

as regras da própria Secretaria.

to, decidindo as datas em que

Os Conselhos de Escola também

voltaremos às ruas e realizaremos

não estão sendo convocados em

todas as demais atividades de

muitas unidades. Nesses casos, os

luta pelo atendimento de nossa

professores devem se unir aos pais

pauta de reivindicações.

e estudantes e, com a anuência

Assim, as reuniões de Re-

de 1/3 dos membros, convocar o

presentantes devem fazer uma

Conselho independentemente do

avaliação da greve e formular

diretor.

propostas para a continuidade da nossa luta.

Reposição de aulas A APEOESP solicitou reunião com o Secretário da Educação para exigir que as escolas e diretorias de ensino cumpram as normas da reposição de aulas, pois não está sendo garantida para professores que tiveram suas aulas ministradas por professores eventuais durante a

No portal da APEOESP (www. apeoesp.org.br) a categoria pode informar os problemas que está enfrentando para repor as aulas, subsidiando a Diretoria em seu contato com a SEE.

Pedido de vista suspende julgamento do dissídio da greve

greve. Em grande parte dos casos

O julgamento do dissídio da

os conteúdos não foram ministra-

greve dos professores, solicitado

dos e isto vem sendo ignorado.

pela APEOESP, que se realizou

Em outros casos, não estão sendo

nesta quarta-feira, 1º de julho, foi

suspenso devido a pedido de vista de um dos 25 desembargadores que compõem o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado. Tanto o relator, quanto o juiz revisor pronunciaram-se de acordo com os interesses do Governo, utilizando minúcias jurídicas para considerar nossa greve abusiva e recomendar a não concessão dos pontos da pauta, além de tomar argumentos do Governo como verídicos, sem questionar, como por exemplo a concessão de 45% de reajustes em 4 anos (quando sabemos que, de fato, só houve 28% de reajustes). Entretanto o pedido de vista pode permitir o acréscimo de novos elementos que podem influenciar os 23 desembargadores que ainda não votaram. De posse do texto que embasou o voto do relator, nossa defesa irá preparar os novos argumentos para a continuidade do julgamento, no final de julho.

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