A história se “repete” e a democracia brasileira volta a correr risco
Contra a corrupção de todos, em todos os lugares
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Uma ponte para o atraso: plano de Michel Temer é a verdadeira ameaça ao povo Pág. 04
REPRODUÇÃO
Boletim informativo da Frente Brasil Popular | Março/Abril 2016
Em defesa do Brasil O
Brasil vive momentos de turbulência política. O mundo atravessa mais uma crise econômica sem precedentes com índices de desemprego altíssimos nas principais economias. Nos últimos anos, o fortalecimento de instituições como a Polícia Federal e o Ministério Público deflagraram uma luta intensa contra a corrupção nas diversas esferas de governo. A apuração e punição aos(às) que comprovadamente estiverem envolvidos(as) deve ser princípio de uma democracia. Movimentos sociais e diversas entidades como a CNBB, por exemplo, têm denunciado que alguns setores têm se aproveitado da situação de caos para atenta-
rem contra o estado democrático de direito, algo muito parecido com o que ocorreu em 1964 com o golpe militar. O que está em jogo neste momento, muito além da queda de um governo, é a tentativa de retomada do projeto neoliberal de privatização das empresas públicas e a retirada de direitos históricos alcançados pelos(as) trabalhadores(as) como 13º salário, 1/3 de férias, FGTS e o índice de aumento do salário mínimo e do piso do magistério conquistados recentemente. O momento atual exige de cada um(a) de nós muita mobilização em defesa dos nossos direitos, em defesa de cada brasileiro e brasileira, em defesa do Brasil.
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A história se “repete” e a democracia brasileira volta a correr risco Diante dos últimos acontecimentos, não podemos correr o risco de “repetir” a história, onde são recorrentes os ataques à nossa democracia
“Ele não pode ser candidato. Se for candidato, não pode ser eleito. Se for eleito, não pode governar”. Quem será o autor dessa frase e a quem ela se refere? Seria do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sobre o futuro presidente Luiz Inácio Lula da Silva? Ou seria do senador Aécio Neves, sobre supostos planos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva? Não. Esta é uma célebre frase de Carlos Lacerda, ferrenho opositor do presidente Getúlio Vargas e do Estado Novo, do presidente Juscelino Kubitschek (JK) e, por fim, apoiador declarado do golpe militar que derrubou o então presidente João Goulart (Jango). Lacerda foi uma versão muito mais autêntica, sofisticada e inteligente do atual deputado federal Jair Bolsonaro. E as ‘coincidências’ não param por aí. Historiadores relatam que Lacerda se recusava a aceitar o resultado da eleição de Jango e fez de tudo para impedir que o presidente exercesse o seu mandato. Além disso, o ‘Lacerdismo’ - movimento político de direita e anticomunista – recebia apoio declarado de setores do Estado, da elite econômica e
social, da mídia e dos grandes capitais internacionais. Alguma similaridade com o que acontece, hoje, no Brasil? “O Lacerdismo e o Udenismo possuem em si o mesmo DNA do ‘Vai pra Rua’, ‘Movimento Brasil Livre’ etc. A utilização das expressões ‘mar de lama’, ‘corrupção’ e ‘renuncie’ é tão comum com Dilma Roussef, quanto foi com Vargas. A caça desmesurada, superando os limites da legalidade e do bom senso, contra o líder popular de plantão e sua família, também são marcas comuns aos dois períodos. Por fim, a decisão estratégica acerca do futuro da propriedade do petróleo nacional está no coração da escaramuça de 1954 e de 2016”, aponta o professor e pesquisador Guilherme Santos Mello, do Instituto de Economia da Unicamp, em um artigo publicado no Portal Vermelho. Outra ‘coincidência’ histórica foi que assim como o ex-presidente Lula, JK foi acusado de ser dono de imóvel em nome de amigo. Vários jornais, da época, acusaram Juscelino Kubitschek de possuir um apartamento em Ipanema, no Rio de Janeiro.
Por conta disso, Juscelino teve a vida escancarada após o golpe militar e seu mandato como senador foi caçado. A história se “repete” com o ex-presidente Lula. Depois da punição, nem julgamento houve. O procurador, de então, considerou não haver provas de que JK fosse o dono do imóvel. O juiz mandou arquivar o processo. Democracia e liberdade - Você tem ideia do que seja o Estado Democrático de Direito, garantido na Constituição Brasileira em suas cláusulas pétreas (ou seja, direito que nem por emenda constitucional poderia ser abolido)? Bom, basicamente, é a garantia a todas as pessoas – da mais humilde a mais poderosa – de que suas liberdades civis (direito de ir e vir, de livre credo e associação, de pensamento, de expressão, de propriedade, etc.) sejam respeitadas, evitando abusos por parte do Estado. E este é um dos pilares básicos de uma democracia. E é pela manutenção destes direitos que a Frente Brasil Popular luta: para que nenhum Poder – seja Executivo, Judiciário ou Legislativo – suplante a democracia e os seus processos.
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Contra a corrupção de todos, em todos os lugares Em momentos de debate sobre a corrupção no Brasil, é hipocrisia não encarar os problemas estruturais existentes no país
F
alar em corrupção parece nunca ter sido algo tão frequente em nossa sociedade. Dos telejornais às mesas de bar. Do ônibus à fila do supermercado. No entanto, isso não significa que a corrupção é algo atual. Mesmo que seja um assunto que, atualmente, move a sociedade brasileira, o combate à corrupção sempre foi uma das bandeiras dos movimentos sindical e social. A ironia é que, antes, as elites sociais e econômicas do Brasil pareciam desconhecer o tema, bem como a mídia monopolizada e que, nos últimos anos, tem agido como partido. De acordo com o cientista político e professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Másimo Della Justina, a corrupção existe no Brasil há muito tempo. Ela está presente nestes últimos 50 anos, do período democrático anterior à Ditadura Militar, durante o próprio regime e, depois, com o novo processo democrático no país. Para ele, o que muito se discute atualmente é a quantidade de corrupção, mas não ela em si. “Nós, hoje, estamos discutindo somente a quantia e não o princípio”, aponta. Quando questionado sobre o quanto a democracia brasileira e o Estado Democrático de Direito são afetados pela corrupção, Másimo apontou o sistema eleitoral brasileiro como sendo um dos setores corruptíveis no país. “Existe, hoje, a necessidade de financiamento privado de campanhas políticas”, explica. Ao citar o sistema eleitoral como é, Másimo indica que o país ainda não foi, economicamente, democratiza-
ço principal dessa elite que nos dá sua dose de veneno midiático a cada dia. Dizemos que o problema é a corrupção, mas ao mesmo tempo mantemos uma das sociedades mais perversas e desiguais do planeta”, diz.
Corrupção: eu pratico?
do. “O Brasil se democratizou politicamente, mas não economicamente. Quando você tem oligopólios na sociedade, que pensam muitas vezes que são donos do país, você tem uma situação em que acham que têm o direito de fazer o que lhes atraem, para garantir seus superlucros”, explica. O pesquisador também aponta que, além do fator econômico, o setor judiciário como outra forma de promover a corrupção, dando benefício a determinados grupos e utilizando brechas na lei para isso. “Outro tipo de corrupção é feita por advogados, juristas de grupos e organizações, que fazem mais esforço para proteger alguns grupos do que fazer, exatamente, justiça”. Ele definiu isso como “legalismo corrupto”, onde se usa a própria justiça e legislação para esse tipo de ação. “Não é a lei que é corrupta, nem o sistema, mas são utilizados mecanismos a partir dela”, diz. O papel da desigualdade – Outro aspecto que deve ser considerado é o que indica o soció-
logo, e presidente do Ipea, Jessé Souza. Em entrevista à Gazeta do Povo, ele foi categórico: a desigualdade social é o maior problema do país. “Quero mostrar que é uma mentira o que os intelectuais e as ciências sociais dizem sobre o Brasil. Com raras exceções, o que afirmam é que o grande problema é a corrupção. Isso é uma manipulação. Nada prova que nosso país seja mais corrupto que os EUA (...). A corrupção existe em todo lugar, não é uma jabuticaba. O interesse em dramatizar o tema é um mecanismo dos mais ricos para imbecilizar a sociedade. Só as elites ganham nessa luta de classes invisível”. O presidente do Ipea também não poupa o que ele considera ‘o falso moralismo e a manipulação da mídia’ para disseminação da ideia de que, acabando com a corrupção, o país terá seus problemas resolvidos. “Quero pôr a classe média no espelho: ‘Olhe o que você constrói, quem você abandona, bem você, que tira onda de campeão da moralidade’. A classe média vampiriza esses trabalhadores. É farisaica. E a imprensa é o bra-
Em junho de 2013, a Controladoria-Geral da União (CGU) criou uma campanha chamada “Pequenas Corrupções - Diga não”. Com o objetivo de “conscientizar os cidadãos para a necessidade de combater atitudes antiéticas - ou até mesmo ilegais -, que costumam ser culturalmente aceitas e ter a gravidade ignorada ou minimizada”, a campanha exemplifica ações que, comprovadamente, são detectadas no dia a dia das pessoas. Apresentar atestado médico falso, colar na prova da escola, não dar nota fiscal ao cliente, comprar produtos falsificados - inclusive carteirinha de estudante - são alguns exemplos da campanha. Como aponta o promotor de Justiça, Jairo Cruz Moreira, “muitas pessoas não enxergam o desvio privado como corrupção, só levam em conta a corrupção no ambiente público”.
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Uma ponte para o atraso: plano de Michel Temer é a verdadeira ameaça ao povo Por trás do teatro do impeachment e da espetacularização da Operação Lava jato, setores conservadores já tramam sobre como o Brasil será governado. E pode ter certeza: nenhum direito da classe trabalhadora sobreviverá!
U
m ilusionista, para alcançar o seu objetivo, sabe que precisa tirar a atenção da sua plateia para uma coisa, enquanto, de fato, a verdadeira ação acontece em outro lugar. Bom, basicamente, é o que está acontecendo no Brasil. No atual cenário, quando a sociedade só ouve e fala sobre ‘corrupção’ e ‘impeachment’, poucas pessoas dão a devida atenção ao projeto que está sendo esboçado por setores conservadores, com o apoio da mídia, com o objetivo de destroçar, completamente, vários direitos que a população brasileira levou décadas para conquistar. É o que propõe o documento de autoria do PMDB - partido do atual vice-presidente - que a imprensa identifica como o “plano de governo pós Dilma”. Em um primeiro momento, o texto foi ironicamente chamado de ‘Uma ponte para o futuro’; depois, ‘Agenda Brasil’. Agora, recebeu o nome que lembra um filme B: Plano Michel Temer II. Mas a inocência para aí. Em reunião com o empresariado, em dezembro do ano passado, apenas cinco dias após Eduardo Cunha (PMDB-SP), presidente da Câmara, concordar em aceitar a abertura do processo de impeachment contra Dilma Rousseff, Temer falou sobre o seu plano. Como noticiado pelo jornal Va-
lor Econômico, o vice-presidente afirmou que o plano “tem propostas na área econômica, como a flexibilização das leis trabalhistas, o fim da indexação do salário dos aposentados ao salário mínimo e o fim das vinculações constitucionais no Orçamento, que deve afetar os recursos destinados, sobretudo, à saúde e educação”. Segundo a matéria, Temer foi aplaudido de pé pelo empresariado, que aprovou entusiasticamente uma “agenda liberal na economia”. E o que isto significa para o cidadão comum, para o(a) trabalhador(a) que tem carteira assinada, para o(a) aposentado(a), para quem atua na educação e saúde pública?
Em um pronunciamento feito, na última semana, o deputado estadual Professor Lemos revelou a verdadeira intenção por trás deste acontecimentos. “A meta é empossar o vice -presidente Michel Temer, para por em prática um projeto que é contrário ao interesse dos brasileiros, inclusive dos milhões que estão indo às ruas. São exatamente 36 itens, mas existem alguns que preocupam muito. É um texto que fala de privatização geral, fala de acabar com as vinculações institucionais, fala da terceirização que, nós sabemos, será do jeito que eles estão propondo, basicamente a escravização do trabalhador na era moderna”.
Veja como o Plano Temer II abre a porteira para ataques a direitos históricos: Acabar com os direitos trabalhistas – Temer, o PMDB e os partidos que apoiam o golpe prometem no documento: “na área trabalhista, permitir que as convenções coletivas prevaleçam sobre as normas legais”. O resultado, disso, será a terceirização escancarada e o fim anunciado da CLT e dos direitos trabalhistas, como férias, 13º salário, licença maternidade e outros. Achatar as aposentadorias – O plano prevê a suspensão das indexações, entre elas (e principalmente), a da previdência ao salário mínimo. Na prática, isto significa que se o salário mínimo for corrigido, e o governo de plantão não quiser – ou alegar que não pode –, não precisará corrigir as aposentadorias. Isto significará que, ao longo do tempo, os(as) aposentados(as) vão ganhar cada vez menos, mesmo tendo contribuído a vida inteira.
Tirar do Estado a obrigação de cuidar da educação e saúde pública – Hoje, o governo é obrigado a repassar percentuais específicos do seu orçamento para as áreas públicas de saúde, educação e tecnologia. Com o fim da vinculação, como promete o Plano Temer, esta obrigatoriedade acaba. E se hoje a maioria dos Estados e municípios já não cumprem a Lei do Piso do magistério, com o ‘plano de governo pós Dilma’ é que isto não ocorrerá mesmo.
Privatizar o que ainda não foi privatizado – Está lá, com todas as letras, que o Estado irá “executar uma política de desenvolvimento centrada na iniciativa privada, por meio de transferências de ativos que se fizerem necessárias, concessões amplas em todas as áreas de logística e infraestrutura, parcerias para complementar a oferta de serviços públicos”. Não tem como este texto deixar dúvidas, a ordem será privatizar, como aconteceu com a Vale do Rio Doce, com a Eletrobrás e vários bancos estatais. Até hoje, estas privatizações são lembradas por suas negociações nebulosas.