Conclusões do Fórum Ferroviário “Caminho de Ferro – Regresso ao Futuro”

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Fórum Ferroviário DOCUMENTO FINAL

CAMINHO DE FERRO

REGRESSO AO FUTURO ORGANIZAÇÃO: COMISSÕES DE TRABALHADORES DA CP, IP, EMEF E CP CARGA Auditório 1 - Sede da IP - Pragal - Almada - 3 de Março de 2016 - 11h


Caminho de Ferro - Regresso ao Futuro A defesa, a valorização e o fomento do Aparelho Produtivo Nacional são componentes determinantes do desenvolvimento soberano e sustentado do nosso país que os trabalhadores desejam e necessitam. Num momento em que a ferrovia nacional assinala 160 anos de existência, importa reforçar a importância de uma visão integrada do Sector Ferroviário Nacional e do seu papel estratégico. A cegueira neoliberal, e outras cumplicidades menos cegas, têm levado os sucessivos governos a colaborarem activamente na destruição do Aparelho Produtivo Nacional, sendo essa uma das razões para a situação que o país atravessa. Quando a prioridade passa a ser «assegurar a sustentabilidade económico-financeira e melhoria do EBITDA», e a esta prioridade se sacrifica tudo, desvaloriza-se inevitavelmente a verdadeira prioridade do sector ferroviário: assegurar o transporte de passageiros e mercadorias, em segurança, com elevados níveis de conforto e fiabilidade, contribuindo para a mobilidade e para a criação de riqueza em Portugal. Se quer ter futuro, Portugal precisa de mudar de rumo. Tal como a ferrovia. E essa mudança de rumo tem que materializar-se em políticas concretas, que apontem ao desenvolvimento soberano, e de que aqui deixamos os traços essenciais: - Reunificação do sector ferroviário nacional, assente numa forte empresa pública, com reversão da fusão da REFER com a EP, da privatização da CP Carga e da subconcessão do Eixo Norte-Sul entregue à Fertagus - tudo com ganhos de segurança e profusas «sinergias»; - Contratação imediata de trabalhadores para os sectores operacionais; - Internalização de tarefas hoje subcontratadas e fim imediato do recurso a Empresas de Trabalho Temporário (integrando esses trabalhadores); - Adequado aprovisionamento de materiais e equipamentos necessários à correcta manutenção e reparação, e revogação da legislação que impede o normal funcionamento das empresas públicas; - Investimento no desenvolvimento da Rede Ferroviária Nacional, utilizando os recursos disponíveis (nacionais e comunitários) sem privatizações, PPP's ou subconcessões; - Investimento na aquisição de material circulante em falta (Cascais e Regional), integrado num plano articulado de necessidades a satisfazer a médio e longo prazo; - Realização urgente de todas as grandes reparações e outras intervenções no Material Circulante que têm sido adiadas; - Promover a reactivação de serviços encerrados, o reforço da oferta e da sua fiabilidade bem como a redução de tarifas.

O que nos traz aqui hoje

A ferrovia em Portugal contará este ano 160 anos. Cientes desta história os ferroviários aqui reunidos acreditam que o rumo de declínio foi intencionalmente ditado por políticas que fizeram de Portugal uma originalidade europeia. Ao contrário de todos os restantes países, Portugal tem perdido passageiros ferroviários, nos últimos 20 anos, a um ritmo constante e persistente. É a consequência das políticas de desmembramento da CP Pública que tiveram como único objectivo separar a carne dos ossos para entregar as partes apetecíveis como negócios limpos ao sector privado, tendo estes como garantia um cada vez maior caudal de dinheiro público. O desmembramento da CP Caminhos de Ferro Portugueses, espinha dorsal de um sistema nacional de transporte, iniciado pelos primeiros governos do PS e prosseguido com os do PSD, retirou da empresa importantes áreas: reparação e manutenção de material circulante e barcos; o transporte fluvial entre o Terreiro do Paço e o Barreiro; o transporte de pequenos volumes; os estudos e projectos de engenharia e infraestruturas; a formação; a medicina do trabalho; a Fórum Ferroviário - Documento Final - Página 2/8

impressão dos suportes gráficos da actividade (bilhetes, mapas, horários, impressos, etc) que passaram respectivamente para a EMEF, Soflusa, TEX, Ferbritas, Fernave, Ecosaúde e Fergráfica. Este retalho fez-se de várias singularidades: desde a divisão das oficinas da CP com a criação da EMEF, divisão nunca operada em nenhum outro país; culminou com a retirada das infra-estruturas à CP, deixando-a reduzida a um “operador ferroviário”, dando origem à REFER; prosseguiu com a criação da CP Carga e mais recentemente traduziu-se na suprema originalidade, qual política frankenstein, de ligar a REFER às Estradas de Portugal. ´ O monstro resultante desta política de desmembramento do sector pode bem ser caracterizado com a crua realidade dos factos. Reportando-nos ao ano de cisão entre a CP/REFER (1996-2014): - Perdemos quase dois terços dos passageiros transportados (-62%) - Encerrou-se praticamente metade da refe, entre linhas, ramais e estações à exploração ferroviária (-40%); - Desguarneceram-se estações, mesmo quando têm serviço ferroviário, tendo encerrado 2 em cada 3 bilheteiras (-71% de bilheteiras); - Abateram-se ou “encostaram-se” elevadas quantidades de material circulante, ainda que em bom estado de conservação como é o caso das locomotivas 2600 e das unidades suburbanas de Lisboa paradas para servirem de “armazém de peças sobressalentes”; - Reduziu-se para metade o número de trabalhadores (-52%); - Diminuíram 38% as indemnizações compensatórias, sendo que a CP já nem isso recebe; - Reduziram-se serviços e comboios; - Acabaram várias valências da CP como o transporte de mercadorias a retalho, o transporte de automóveis, a produção gráfica, etc. - Promoveram-se ataques sistemáticos aos direitos dos trabalhadores e às suas carreiras profissionais, provocando a desmotivação e as condições objectivas para cederem à chantagem para saírem das empresas ou aceitarem a sua privatização; - Criaram-se condições subjectivas e objectivas para reduzir a segurança do sistema ferroviário.


Nem todos perdem Passou-se de uma empresa pública com um conselho de gerência a uma miríade de empresas (algumas entretanto extintas), respectivos conselhos, administradores, assessores, consultores, todos bafejados pela sorte. Passou-se de uma empresa pública auto-suficiente para um interposto em favor de multinacionais (de material circulante, de componentes, de comunicações e sinalização, etc) e grandes grupos económicos portugueses. Passou-se de uma empresa verticalmente integrada para um regime de subcontratação de trabalho e fornecimentos, prosperando hoje como parasitas as empresas que se alimentam das ineficiências do sistema (menos trabalhadores, menos capacidade, menos escrutínio). Disto são exemplos o crescimento de subcontratação na EMEF de 713 mil euros em 2013 para 6,2 milhões de euros em 2015; a total dependência da REFER de empreiteiros para construção e manutenção da infra-estrutura. A banca foi a que mais lucrou, e não é portanto de espantar que uma parte dos responsáveis, actuais e passados, tenham ligações a este sector. A diminuição de indemnizações compensatórias e a suborçamentação de investimentos para o sector levam a que hoje o conjunto das empresas ferroviárias apresente uma dívida de mais de 11 000 M€ (milhões de euros) cujos encargos não param de crescer. A título de exemplo, a CP em 2010 tinha encargos de dívida de 157M€ para uma dívida de 3 324M€; em 2014 esses encargos da dívida subiram 30% para 203M€ enquanto a dívida subia 24%, para 4 134M€.

Perguntamos se tinha mesmo de ser assim Será este caminho de perda contínua de passageiros, de encerramento de linhas, de fim de serviços, uma inevitabilidade histórica, como o foi o fim do transporte transatlântico marítimo de passageiros com o aparecimento da aviação comercial? A resposta é que as originalidades da política lusitana para o sector se saldaram num resultado em tudo diferente do que se observa noutros países, cujo número de passageiros e mercadorias transportados não pára de aumentar. Nalguns casos evoca-se como desculpa os pacotes ferroviários da Comissão Europeia, numa mentira de perna curta, já que a própria Comissão afirma que a separação só tinha de ser contabilística. As empresas que nunca o fizeram, e foram muitas pela Europa fora, cresceram e fortaleceram-se, perfilando-se hoje os maiores interessados nas concessões de serviços públicos dos países liberalizados. Enquanto Portugal perde passageiros ferroviários, os outros países aumentam o número de passageiros. Enquanto cá se fecham serviços, as empresas congéneres mantém-nos e até criam novos. Quando em Portugal se fecham estações ou se deixam desguarnecidas de pessoal, despedindo trabalhadores, noutros países

qualquer estação pequena tem mais trabalhadores do que a maior estação de Portugal. Enquanto Portugal se destrói a capacidade técnica e o conhecimento ferroviário, subcontratando todo o tipo de trabalhos a multinacionais e grandes grupos económicos; outros países apostam nas suas empresas nacionais, fortalecendo a economia nacional e chegando mesmo a exportar serviços. Enquanto em Portugal se investe cada vez menos em ferrovia, noutros países aposta-se cada vez mais neste sector. Outra das desculpas é que partidas as empresas aos bocados podem “crescer, vender serviços para fora, arranjar outros mercados”. Um argumento sem pés nem cabeça. 89% da facturação da EMEF provém do grupo CP (89%!!) 94% dos CK (comboios kilómetro) que circulam na rede da REFER são da CP e CP CARGA Se dúvidas houvesse, isto mostra o quão as empresas são interdependentes! São-no porque têm de ser. Porque não há transporte ferroviário de pessoas e bens sem comboios, comboios esses que circulam necessariamente numa rede ferroviária e requerem manutenção e conservação. E assim será até se inventar o teletransporte.

Os últimos passos no sentido da privatização A ofensiva contra o caminho-de-ferro acentuou-se nos últimos 5 anos de governação do PSD/CDS com o objectivo de privatizar a ferrovia, mas também, enquanto tal não se alcançava, colocar em tudo o que for possível o sector ao serviço dos interesses privados. A liquidação das empresas avança com o objectivo claro de as descapitalizar, meio caminho andado para a sua liquidação. Ao nível da exploração a relação entre a CP e a EMEF caminha no sentido de clara privatização da segunda, em prejuízo da primeira e do país. A tutela/CP estrangula a capacidade humana (conhecimento técnico e operários) dando caminho a um aumento exponencial das subcontratações que se multiplicaram por 8 em apenas 2 anos tendo passado de 713 mil euros de subcontratação em 2013 para 6,2 milhões de euros de subcontratação orçamentada para 2015. No mesmo sentido empolam-se os resultados financeiros da EMEF graças a adiantamentos de serviços não executados, de que é exemplo a reparação de meia vida do pendular ainda não iniciada mas que deu direito a um adiantamento de 3,5M€ em 2014 de um trabalho que só se iniciará em 2016, passando a EMEF a “dar lucro”. Como se o lucro de uma não fosse o prejuízo da outra. O rumo da CP Carga foi traçado desde a sua autonomização da CP. O facto de não ter sido transferido o material circulante levou à criação de uma dívida entre ambas as empresas referente ao aluguer e manutenção das locomotivas. Consumada a venda da empresa, baseada num memorando de entendimento secreto entre o Estado Português e a multinacional suíça MSC, a CP transfere a título de aumento de capital, todo o parque de material circulante para a CP Carga, limpando-a assim da “dívida”, oferecendo de caminho um património estimado pelas CT em mais de 150 M€ (milhões de euros) a troco de 2 M€. Na Infraestrura assistiu-se à fusão da REFER EPE com as Estradas de Portugal SA com o único propósito de delapidar e alienar o Património Público Ferroviário, com o objectivo de pagar PPP rodoviárias e continuar a sustentar a banca pelo pagamento de juros e dívida. Prova disso, é a intenção deliberada do CAE da IP de apressar essa alienação esvaziando edifícios da REFER e mesmo da E.P. sem qualquer razão de eficiência nem sequer de mais-valia para a Empresa ou para os Trabalhadores. Pretende-se outrossim cimentar a ideia da impossibilidade da reversão da fusão, com a destruição do “quartelgeneral” da REFER, criando uma influência psicológica e deprimente Fórum Ferroviário - Documento Final - Página 3/8


nos ferroviários, acelerando o esvaziamento do edifício de Santa Apolónia, a alienação do edifício da Estação de Porto S. Bento; a movimentação precária dos trabalhadores; a destruição e alienação do Património Público Ferroviário, sem qualquer “sinergia” daí decorrente. Este processo foi justamente um dos mais contestados de quantos foram impostos pelo anterior governo no sector dos transportes. Consciente desta realidade, a Administração da IP tratou de conduzir este processo colocando factos consumados perante os trabalhadores, o pais e a Assembleia da República. O decreto- Lei nº 104/2015, que determina a fusão da Rede Ferroviária Nacional com as Estradas de Portugal, e a sua transformação em sociedade anónima, com a denominação de Infraestruturas de Portugal, S.A. é neste aspecto paradigmático. Publicado numa sexta- feira para entrar em vigor numa segunda, era completamente desconhecido (no seu conteúdo concreto) de todos aqueles que deveriam, à luz da lei e do normal funcionamento democrático, ter dado opiniões e pareceres a uma restruturação desta dimensão. Esta forma opaca e antidemocrática é reflexo do conteúdo objectivo das medidas impostas. O processo de esvaziamento da REFER e da EP, transferindo saberes, competências e equipamentos para o sector privado com custos cada vez maiores para o erário público, colocando o Estado na dependência da banca e dos grandes grupos da construção civil e obras públicas que monopolizam e cartelizam o sector é, e sempre foi, o objectivo da política de direita que o conduziu. Objectivo que é o de reduzir estas duas empresas à condição de gestoras de concessões, subconcessões, subcontratações e dívidas. Esta fusão é um salto consciente numa direcção nefasta para os interesses nacionais. Projectam-se ganhos rápidos, para ajudar a pagar os compromissos com as PPPs, com as subconcessões e com a banca. Esta é a verdadeira prioridade quando se trata do gestor das infraestruturas nacionais. Para vender esta ideia a administração nomeada pelo anterior governo, muito falou em sinergias e nos modelos Sueco e Finlandês. Mas quando questionado, nunca mostrou os estudos comparados que foram realizados sobre essas experiências, não esclareceu as diferenças entre o que na gestão das infraestruturas se passa na Suécia e na Finlândia e o imposto em Portugal. E não explicou porque escolheu rejeitar o modelo seguido na esmagadora maioria dos países do mundo, tanto assim é que hoje já nem falam em “modelos”, abandonado essa propaganda. Mas é importante recordar que há uma razão para que nenhum país do mundo tenha seguido esta originalidade lusitana: é uma ideia completamente errada do ponto de vista operacional e criminosa do ponto de vista da fiabilidade e segurança da operação. Se deveríamos apreender algo com os outros é o facto de muitos estarem a regressar a uma maior unificação dos gestores de infraestruturas ferroviárias e dos operadores de exploração, corrigindo as opções tomadas na sequência dos diferentes pacotes ferroviários. Mas há outras razões pelas quais as empresas deveriam ser reunificadas e reconstituída uma só empresa ferroviárias verticalmente integrada: é que funciona melhor, é a garantia de que todos remam na mesma direcção, defendem os mesmos interesses e aí sim, se poupa muito dinheiro, se aproveitam muitas “sinergias”. Os que defendem a divisão acham que a existência de um árbitro, um Instituto (INTF, IMT, o que seja) é o garante último de que tudo funciona pelo melhor. Ora um árbitro só é exigível quando cada equipa compete pelo seu resultado. Não há árbitro num jogo em que todos tentam atirar à mesma baliza! E a prova acabada de que separados por um árbitro não fica salvaguardado o superior interesse público são os dois casos que aqui deixamos. O acidente de Alfarelos foi provocado aparentemente por falta de adesão, motivada por fenómenos atmosféricos adversos. E será esta última uma especialidade portuguesa? Não há climas bem mais inóspitos que o nosso? É que a falta de adesão é um problema recorrente na ferrovia, em especial no Outono no caso Português. E até Fórum Ferroviário - Documento Final - Página 4/8

existem procedimentos para monitorizar as condições climatéricas que despoletam vigilância específica e em muitos casos a existência de veículos de lavagem, limpeza e desobstrução de via. Pois bem, mas na sequência do acidente de Alfarelos que felizmente não teve vítimas mortais, não se avançou um milímetro no tratamento do problema da má adesão. A responsabilidade de detectar a má adesão cai em cima da tripulação, que, detectando-a, informa a REFER, inspecciona visualmente a via e limita-se a velocidade. Repartem-se as culpas por todos e fica tudo na mesma. O caso da “crise dos rodados” das UQE da linha de Sintra é outro destes exemplos. Na sequência da abertura de um novo troço de linha, os rodados das UQE que ali passavam começam a apresentar um desgaste anómalo que levou à imobilização de mais de 50% da frota. Isto foi um acontecimento nunca antes visto em 150 anos de ferrovia lusa, pese o facto de a rede ter tido muitos troços inaugurados desde a sua fundação. Contas feitas, chama-se uma universidade qualquer para se debruçar sobre o caso, fazem-se uns relatórios, reparte-se a culpa por todos os envolvidos: REFER, CP e EMEF. Porque é que um troço novo de via causou este desgaste, onde esteve a falha: na especificação da obra, no seu projecto, na execução, na fiscalização, na recepção final, são questões que ficaram sem resposta. Se a questão da obtenção de sinergias fosse de facto uma prioridade, o caminho seguido seria o da Alemanha e da França, e que a Espanha decidiu implementar depois do acidente de Vigo: trata-se da reconstrução de uma única empresa ferroviária que reúna o operador da infraestrutura e o da circulação, fazendo regressar a CP, CP carga; EMEF e REFER a uma mesma empresa ferroviária, nacional e pública. A venda da REFER Telecom e a sua importante rede de comunicações, bem como a venda da REFER Engenharia, coloca o Estado numa maior dependência dos grandes grupos monopolistas da comunicação e da construção e obras públicas. Estas medidas destinam-se a aprofundar o processo de destruição de postos de trabalho, precariedade e subcontratação naquelas empresas, substituindo os trabalhadores do quadro por trabalhadores subcontratados pelas subconcessionárias. Estamos perante um processo onde se transferem oportunidades de acumulação da mais- valia para os grandes grupos económicos, que cresceram à custa desta política e saqueando o estado, que prejudica directamente os trabalhadores, mas não prejudica menos o desenvolvimento social e económico do país.


O que agarra isto tudo A falta de um plano nacional de transporte, que integre o transporte ferroviário, é umas das causas do estado de subdesenvolvimento do caminho-de-ferro. Tal facto é de grande conveniência para os interesses políticos dos sucessivos governos que apresentam papéis avulsos, ao sabor dos interesses circunstanciais de curto prazo, passando por cima do facto dos investimentos ferroviários serem necessariamente de médio longo prazo. Não espanta portanto que ao nível das infra-estruturas, continue uma gestão da rede ferroviária completamente desfasada das necessidades das populações, dos utentes e do escoamento de mercadorias, através de investimentos que se arrastam de um modo escandaloso, com custos em regra superiores aos que foram orçamentados, através de investimentos não coordenados com as necessidades da oferta da CP e, ao invés, condicionando a exploração. Intercidades Beira Baixa e Évora Exemplo disto foi a colocação de locomotiva e carruagens nos intercidades de Évora e as UTE 2240 nos Intercidades da Beira Baixa, quando ditava a lógica e o conforto dos passageiros que se fizesse o inverso. Mas para a REFER não perder a face por ter colocado a linha de Évora apta para 200km, a CP viu-se na contingência de alocar desta forma absurda o material circulante. O mesmo sucede com o projecto da Beira Baixa, com diversos anos de atraso, concluído até à Covilhã mas sem que estejam asseguradas as electrificações a ramais e demais instalações de mercadorias existentes na linha, obrigando a que estes comboios continuem com tracção diesel e faltando o troço entre aquela cidade e a Guarda, para assegurar o fecho da malha e criar uma necessária alternativa à linha da Beira Alta. Ramal da Lousã e Metro do Mondego Depois do escandaloso encerramento do Ramal da Lousã, cuja importância é fundamental para a mobilidade das populações dos concelhos de Lousã, Miranda do Corvo e Coimbra, em especial com deslocações pendulares do local de residência para os locais de trabalho e escolas, não se compreende que o Governo tenha anunciado um Plano de Investimento Ferroviário (PIF), mais uma vez sem um plano nacional de transporte que o legitime e sem que fosse mencionada a concretização do projecto de resolução votado pela maioria, PS incluído, de reintegração daquele troço na exploração ferroviária da CP (após reposição da via, colocação de sinalização e electrificação). A Infraestrutura ao serviço dos empreiteiros Pelo lado da Infra-estrutura a REFER endividou-se na construção e manutenção de linhas suprindo outras consideradas demasiado onerosas, ignorando as necessidades das populações. Desinvestiu em troços e linhas supostamente pouco rentáveis, como a Linha do Oeste ou a electrificação do Porto de Setúbal. A ausência, por inoperacionalidade ou até obsoletismo, das balanças que pesam vagões, permite neste momento ao expedidor de mercadoria efectuar o

transporte sem qualquer controlo do peso da carga, com graves consequências, quer no desgaste do material circulante e na via; quer na segurança da circulação que daqui advém. Entregou-se a manutenção a terceiros sem precaver os interesses do sistema ferroviário e consequentemente os interesses nacionais. A dependência externa estende-se hoje dos serviços mais básicos aos mais complexos, ficando a REFER à mercê da disponibilidade e vontade de terceiros para o seu regular funcionamento. A título de exemplo temos: - Tempo de espera para reparação de uma PN (Passagem de Nível) superior a 6 horas e isto apesar do enorme investimento feito na supressão de passagens de nível a nível nacional; - Tempos de espera superiores a 2 horas para colocação de varas de terra, mesmo em caso de acidente (!); - Limitações de velocidade extremamente restritivas (10/30km/h) nas horas de maior tráfego impostas pelos prestadores de serviços para efectuarem rotineiras inspecções visuais de via. Estas inspecções podiam e deviam ser feitas fora das horas de maior tráfego, mas para tal seria necessário ter trabalhadores a operarem por turnos, logo mais caros. Por outro lado, é frequente os maquinistas reportarem à REFER que num troço com restrições de velocidade para inspecção visual de via não se cruzaram com ninguém na via a trabalhar; o que será possível porque não há fiscalização da parte da REFER se o trabalho está efectivamente a ser feito ou não. - Os pedidos de terceiros para agendamento de trabalhos na via são processados pela REFER de forma automática, sendo imediatamente aceites. Daqui resultam frequentes sobreposições de trabalhos entre vários prestadores de serviço e/ou o agendamento incompatível com a circulação de comboios o que leva necessariamente a um novo reagendamento recaindo o ónus na REFER pelo trabalho agendado e não efectuado (mas que é pago uma vez que o prestador de serviço é alheio ao facto do agendamento ter sido mal processado). Despedir como pretexto para subcontratar Com a continuação destas medidas, não admira que o endividamento da REFER e da CP seja muito superior ao que a CP como empresa única apresentava há anos atrás. A dependência de terceiros tem vindo a ser agravada pela saída contínua de trabalhadores especializados, estando hoje as empresas públicas reféns de prestadores de serviços com custos muito mais elevados, sujeitas às condições arbitrariamente impostas, de que são exemplo, a manutenção, a segurança e a limpeza. A redução drástica de trabalhadores no caminho-de-ferro abriu asas a uma descomunal contratação de prestação de serviços através do sector privado, sempre com a justificação da falta de meios. Foram muitos os milhões entregues de forma cega e danosa desde os contratos de construção em que o Estado delegou nas empresas públicas os empréstimos (daí o grosso das nossas dívidas) até aos contratos de empresas de vigilância, de limpeza, de serviços jurídicos, etc. Conseguimos chegar ao ridículo de tirar trabalho aos ferroviários e extinguir postos de trabalho para a seguir fazer mais uma negociata com empresas de prestação de serviços privadas a desempenhar essas mesmas funções, como foi o caso mais recente da limpeza nos CCO* na Infraestruturas de Portugal. *Centro de Comando Operacional. A fusão das empresas REFER e Estradas de Portugal veio causar ainda mais turbulência no seio ferroviário. A auto-avaliação positiva feita pela Administração, pela anterior tutela PSD/CDS bem como pela actual do PS, contrasta com a essência jurídica com que foi pensada esta fusão para a ferrovia. Será no futuro a Infraestruturas de Portugal a decidir quem vai operar nas suas redes podendo desta forma dar a machadada final à tão maltratada CP. As anunciadas vendas de património e concessões de estações ferroviárias são o exemplo daquilo que não deve acontecer. Em Vila Real vende-se o património da ex-EP a uma empresa de Fórum Ferroviário - Documento Final - Página 5/8


calçado para de seguida alugar esse mesmo espaço. Excelente negócio para quem compra já que o dinheiro a prazo num banco não rende nada; aplicado desta forma tem rendimento limpo garantido que começou com 6000€/mês mas já vai em 7500€ volvidos poucos meses do contrato. EMEF Guifões Exemplo de como os sucessivos Governos falham descaradamente na defesa do sector público ferroviário é o caso da EMEF de Guifões que ficou resumida à manutenção do Metro do Porto, tendo daquelas instalações sido retirada toda a actividade ligada à ferrovia “pesada” da CP e REFER. Durante meses os trabalhadores fizeram um enorme esforço para assegurarem a manutenção dos comboios do Metro do Porto, anteriormente contratada à Bombardier em “parceria” com a EMEF. Este esforço demonstra não só o empenho dos trabalhadores como também mostra a capacidade de autosuficiência do Sector Público. E mais seria, não fosse a proibição de contratar pessoal, necessário para as operações de revisão dos 960 000 km somada à falta de peças e sobressalentes nos armazéns de manutenção. Isto leva a que actualmente estejam parados vários veículos por avaria, aos quais foram retiradas peças para colocar noutros que estão ainda em circulação, tudo aliado a veículos que por terem já atingido os 960 000 km pararam à espera de revisão. Isto é um ciclo vicioso pois exige mais dos veículos que ainda estão em circulação. Como cereja-no-topo-do-bolo temos como consequência o facto da empresa pública Metro do Porto poder aplicar uma multa à EMEF (outra empresa pública) por incumprimento de disponibilidade de comboios para o serviço.

Linhas de via estreita do Douro Relativamente às linhas do Tua, Corgo e Tâmega fez-se uso de falsas premissas, como motivos de segurança e falta de procura, para as encerrarem. Em poucos anos estas linhas foram apagadas do mapa ferroviário tendo por base políticas de desgoverno desastrosas, a mando de interesses empresariais, que não se importaram de isolar populações e promover as assimetrias regionais. O lobby rodoviário e energético agradece, e muito! Quem perde são os do costume: utentes e turistas da região transmontana.

Linha de via estreita do Vouga A Linha do Vouga é outro caso que devemos lamentar, mas sobretudo tentar melhorar: fizeram obras na linha, suprimiram PN's, gastaram-se milhões mas o serviço piorou. O material circulante é pouco e quando acontece alguma avaria nem se pensa duas vezes: suprimem-se comboios. Até uma avaria no fornecimento de gasóleo levou a que se suprimissem comboios…Por aqui se demonstra a política ferroviária que existe em Portugal despreza os utentes e as economias locais, fazendo tábua-rasa da coesão territorial. Serviço suburbano do Porto No serviço suburbano do Porto a perda diária de milhares de euros em receitas é uma triste evidência. A maior parte das máquinas de venda automática está fora de serviço, com limitações de venda, vandalizadas e assaltadas com frequência. Os validadores têm avarias constantes que, para serem resolvidas chegam a demorar semanas. Muitos até são roubados! Mesmo as máquinas de venda em trânsito que os Operadores de Revisão e Venda utilizam nos comboios são obsoletas e grande parte delas têm problemas que não permitem a fiscalização em condições.

Linhas de Douro e Minho A linha do Douro, vincadamente um destino turístico mas também de deslocações pendulares de trabalhadores e estudantes, é servida por material circulante que além de oferecer condições de conforto deploráveis, tem constantes problemas de funcionamento levando a supressões frequentes, múltiplos atrasos e desilusões. Aquele material circulante, igualmente afecto à linha do Minho foi alugado pela CP à RENFE por muitos milhões apesar de ter mais de 30 anos de vida. Investiram-se milhões de euros em material circulante que além de não ser da CP, passa a maior parte do tempo parado por avaria. Conclusão, grande parte dos comboios de passageiros que circulam nas linhas do Minho e Douro são substituídos por composições de locomotiva e carruagens da CP. Infelizmente mais coisas há em comum nas linhas do Minho e do Douro: as promessas por concretizar de eletrificação, renovação de estações, mais comboios a circular, etc e tal. Como a realidade é outra e bem diferente! São linhas que urge revitalizar mas, por causa das políticas de quem nos tem governado, têm sido esquecidas propositadamente em detrimento da rodovia. Fórum Ferroviário - Documento Final - Página 6/8

Linha do Norte Outro caso que se arrasta há muitos anos é o da Linha do Norte. A maior parte foi renovada mas ainda existem três troços que, apesar do dinheiro enterrado na linha, não sofreram qualquer


reabilitação. A título de exemplo se aponta o troço entre Válega e General Torres onde o material motor é desgastado prematuramente e os trabalhadores e passageiros são constantemente sacudidos dentro dos comboios. Volvidas décadas sobre o início da renovação da Linha do Norte como se explica que essa obra esteja por terminar? Tanto mais que o dinheiro para a realização integral da obra já se gastou várias vezes e ainda existe obra por fazer. Empregues as mais elaboradas técnicas de gestão; com Conselhos de Administração em vez de Conselhos de Gerência; com Administradores com grandes títulos académicos, resumindo tudo o que há de mais moderno e aconselhável e pese embora todas estas modernices, continuamos a ter estações com plataformas desadequadas, estações sem condições mínimas de segurança e conforto, uma linha completamente exausta e exaurida, problemática, sem complementaridade com outros meios de transporte, com horários desadequados e sem ligações, etc. Em suma, o dinheiro que foi gasto nesta Linha, daria para construir na totalidade uma linha moderna e adequada às exigências da actualidade. Os Ferroviários em devido tempo alertaram para tudo isto, denunciando os erros cometidos e os dinheiros desperdiçados. Em saco-roto caíram as nossas denúncias. O tempo, o verdadeiro dono da verdade, confirmou-as!

Vandalismo Um grave problema que existe infelizmente, até com vítimas mortais é o causado pelo denominado graffiti, que prolifera sem que os responsáveis da CP tomem decisões enérgicas no seu combate. Todos os dias existem vários comboios e instalações fixas que são vandalizados, mas, nem as autoridades, nem a empresa ponderam medidas para erradicar este problema. Os comboios são pintados quase sempre nos mesmos sítios e horários. Como é lógico, este vandalismo tem custos avultados para a CP mas nenhum dos ditos gurus da gestão parece importar-se com este problema. Linha da Beira Alta - Ramal Pampilhosa-Figueira da Foz O Ramal da Pampilhosa-Cantanhede-Figueira da Foz com 50,4km é de facto o troço final da Linha da Beira Alta, hoje resumida à extensão que une Pampilhosa à fronteira de Vilar Formoso. Para além da importância da ligação do Porto da Figueira da Foz à rede, este ramal servia uma população de mais de 30 000 habitantes sendo fundamental para o acesso daquelas populações à educação, à saúde e ao emprego, concentrados em Coimbra e na Figueira da Foz. Foi encerrado em 5 de Janeiro de 2009 sem qualquer perspectiva de reabertura, tendo sido posteriormente retirados carris e travessas, e alcatroadas passagens de nível. É urgente a reabertura e modernização deste ramal, a sua electrificação, as intervenções necessárias para o adaptar ao transporte de mercadorias, enfim, urge o

regresso do comboio, pela mobilidade que assegura a estas populações e pela possibilidade de estimular o desenvolvimento e o progresso social e económico desta região. As populações nunca deixaram de se manifestar em abaixo-assinados, em debates e outras acções pela defesa deste ramal.

Linha do Algarve e Sul Na Linha do Algarve o serviço ferroviário tem piorado, perdendo qualidade e passageiros, uma vez que os investimentos realizados são-no de forma desconexa e por empreitada: - Instalação de sinalização eléctrica de comando centralizado entre Faro e Vila Real de Santo António, deixando de fora o ramal de Lagos; - Elevação de algumas plataformas de estações e apeadeiros (nalguns casos só numa parte das linhas da estação/apeadeiro, num comprimento demasiado curto para poderem aí parar comboios mais compridos, p.ex. usar 2 unidades motoras num total de 4 carruagens como reforço da oferta); - Electrificação da via limitada ao troço entre Tunes e Faro; O facto de haver uma só via de circulação em toda a Linha do Algarve combinado com a prioridade dada aos comboios de Longo Curso na gestão de tráfego, leva a que um atraso nestes últimos provoque necessariamente atrasos nos comboios regionais. Soma-se a isto os problemas derivados de material circulante obsoleto, escasso, com avarias constantes e consequentes supressões de circulações, material que não dá resposta às necessidades actuais da população, dificultando o transporte de carrinhos de bebé e não estando adaptado a passageiros com cadeira de rodas. Tudo isto é ainda agravado pelo encerramento de estações e bilheteiras, que além de representar uma perda de receitas, deixa os passageiros entregues a si próprios, sem informação, sem assistência, com maior sensação de insegurança e vulnerabilidade. Na linha do Sul e apesar do investimento na electrificação, foi abandonado o serviço regional, deixando muitas povoações sem qualquer ligação (Luzianes, Sabóia, Pereiras, São Marques, Messines, etc). . Justifica-se plenamente a reintrodução de serviços regionais no troço Barreiro-Faro, dando cumprimento ao objectivo de prestação de serviço público ferroviário tão necessário à coesão territorial, de forma a combater a desertificação a que estas populações estão sujeitas. Informação aos Passageiros A informação é fundamental para efectivar a circulação de comboios e garantir a segurança da circulação. É fundamental também para quem procura o Caminho-de-Ferro para as suas deslocações diárias ou ocasionais e necessita para tal de obter uma informação rigorosa. Apesar da enorme evolução tecnológica e do que muito foi investido em sistemas de informação nos últimos anos, esse investimento não se traduziu numa melhor prática ferroviária, nem para os trabalhadores, nem para os utentes. A separação entre o Gestor da Infraestrutura (REFER/IP) e o Operador Fórum Ferroviário - Documento Final - Página 7/8


de transporte (CP) prejudicou e muito a transmissão da informação e a qualidade da mesma. Ao nível da informação, bem como noutros sectores, o Gestor da Infraestrutura e o Operador de Transporte, há muito que trabalham de costas voltadas. O Gestor da Infraestrutura (GI) processa a informação e transmite-a simplesmente com o índole da gestão da circulação, não tendo qualquer aptidão para a transmitir com um carácter comercial centrada no sistema de informação ao cliente. Em contrapartida, o Operador de Transporte (OT) quando recebe a informação, ou já não vai em tempo útil de a trabalhar com esse mesmo carácter comercial, ou está impossibilitado de interferir no sistema de informação. Esta falta de coordenação gera situações caricatas, que se não fosse pela sua gravidade, seriam risíveis: - Informação de “passagem de comboio sem paragem”, e entretanto o comboio pára para embarque e desembarque de passageiros. - Informação de que um comboio vai dar entrada numa linha, e acaba por entrar noutra. - Informação de que um comboio circula com atraso, anunciando a sua nova hora de entrada, e o mesmo está a dar entrada naquele preciso momento. - Informação em que o número comercial do comboio é diferente do número de circulação. - Comboios que não são sequer anunciados, e outros que dado o ser carácter de circulação especial (grupos, desdobramentos ou outros) não são anunciados com a devida precisão. Utentes e Trabalhadores entregues a si próprios O desguarnecimento das estações continua à medida que o bloco orientável avança, caminhando-se para uma situação com uns escassos trabalhadores nos locais de comando ou concentração, a par das tripulações dos comboios. Os utentes ficam “entregues” às máquinas de venda de bilhetes, quando existem, se funcionarem. O que é que representam as estações de caminho-de-ferro para as populações, para o desenvolvimento local e regional e para o próprio caminho-de-ferro? Na rede ferroviária nacional circulam cerca de 1496 comboios por dia. Perguntamos se reúne ela condições para ser o suporte da oferta ferroviária que deve estruturar um verdadeiro sistema de transportes. Se serve de plataforma onde se articula o transporte ferroviário com os outros modos de transporte. Se é dotada de estações que funcionem como locais fundamentais de acolhimento e apoio aos utentes e fácil acesso aos comboios. Se as velocidades permitidas nas linhas concorrem de facto para encurtar substancialmente os tempos de trajecto. Se no que se refere à segurança deverá caminhar-se para que tudo fique dependente de um único homem atrás de uma máquina ou se os sistemas não têm de ter mais redundâncias e a rede mais guarnecida. Se o PIF (Plano de Investimento Ferroviário do Governo de Costa) não responde a nenhuma destas perguntas, para que servirá? Urge um verdadeiro plano nacional ferroviário que agarre isto tudo, com os ferroviários e pela ferrovia.

Impacto do desmembramento nos trabalhadores Este processo de desmembramento da CP foi acompanhado de um conjunto de medidas com grande impacto nos trabalhadores e nos seus postos de trabalho. Uma das medidas passou pela destruição da cultura ferroviária, em torno da qual se unia e continuam a unir os ferroviários, na defesa dos seus interesses de classe. O objectivo era que deixasse de haver trabalhadores ferroviários e passassem a existir trabalhadores da CP, da EMEF, mais tarde da REFER, etc, procurando destruir a unidade e a resistência dos trabalhadores, porque foi essa unidade que sustentou a luta e Fórum Ferroviário - Documento Final - Página 8/8

resistência ao longo de décadas. A unidade que constrói o conhecimento e o saber fazer ferroviários, que garante diariamente o funcionamento do caminho-de-ferro em Portugal ou em qualquer outra parte. A quebra desta resistência era importante para reduzir os custos de trabalho, para se atingir os objectivos do “plano dos canadianos” de se reduzirem 10 000 postos de trabalho e destruir o AE em vigor. Em 1992, último ano em que a CP existiu enquanto empresa única, havia cerca de 19452 postos de trabalho, hoje esse número foi em dois terços (6813 trabalhadores). À medida que se proíbe a reposição dos efectivos em falta, crescem os lugares de confiança politica, admitidos nas empresas sem que isso se reflicta numa mais-valia para o sector. Simultaneamente à redução de efectivos com aspectos negativos na qualidade e regularidade no serviço público, persiste o ataque à contratação colectiva, nomeadamente com imposições legislativas, o que tem merecido combate firme da nossa parte. Não conseguindo alterar significativamente a contratação colectiva, assiste-se a um aumento das cargas e ritmos de trabalho. Temos que reagrupar forças e energias, em torno da ideia de que todos somos ferroviários, para colocar o caminho-de-ferro na via do regresso ao futuro e, dessa forma, modernizarmos e valorizamos as relações de trabalho.

Da importância do caminho-de-ferro para o país Esta caminhada contra o caminho-de-ferro só não foi mais longe porque teve sempre pela frente a luta firme, decidida e consequente dos trabalhadores ferroviários em defesa dos seus direitos, por um sector ferroviário ao serviço das populações, dos utentes e do País. Apesar de todos estes ataques, o caminho-de-ferro ainda se estende por todo o País e continua a ser um serviço de características eminentemente sociais, assentando fundamentalmente no serviço regional e no serviço suburbano que, em conjunto, representam mais de 95% do total de passageiros transportados, evidenciando a sua importância para as populações e para o País. O caminho-de-ferro, pela sua característica de transporte de grandes massas de passageiros e de mercadorias, deve dar assim um contributo importante para a eliminação das assimetrias regionais e ter uma importância determinante para o ordenamento equilibrado do território e para o desenvolvimento harmonioso e sustentado da economia local e regional. Ele deve ser a estrutura base de um verdadeiro sistema de transportes, no qual deve assentar a mobilidade das populações e o transporte de mercadorias por todo o País.


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