artigo
SUPPLY CHAIN
O PAPEL DA AUTOMAÇÃO NA GESTÃO DA CADEIA DE SUPRIMENTOS
Ricardo Caruso Vieira (rcaruso@aquarius.com.br), Departamento de Serviços Especiais da Aquarius Software Ltda.
INTRODUÇÃO
CADEIA DE SUPRIMENTOS
Peter Drucker, um dos pensadores mais influente da área de
Ao investigarmos a disciplina de gestão da cadeia de
gestão empresarial do século passado, foi o primeiro a descrever
suprimentos, logo encontramos uma semelhança muito
cada empresa como uma cadeia de elementos cujo objetivo é
grande com um conceito bem mais antigo, de origem
gerar valor, seja para seus clientes, empregados, acionistas ou
militar, que é o de logística. As diferenças e semelhanças
parceiros. Essa descentralização conceitual das companhias foi
entre os dois deram origem a tantas discussões nos meios
a principal origem das modernas teorias de gestão estratégica
especialistas, que Halldorsson e Larson, em 2004, lideraram
que têm como principal foco o alinhamento das diversas áreas
uma vasta pesquisa internacional com os maiores nomes do
da empresa com um objetivo comum.
tema sobre as diferenças entre as duas abordagens.
Dentro desse contexto, a automação tem sido vista como
Eles conseguiram identificar quatro correntes diferentes:
uma área estratégica cada vez mais importante dentro do
os que defendem que a gestão de cadeia de suprimentos
negócio. Além das responsabilidades tradicionais como
é parte da logística (que chamou de tradicionalist), os
gestão e manutenção das malhas e sistemas de controle,
que consideram a logística parte da gestão da cadeia de
ela tem passado a ser a responsável pelos sistemas de
suprimentos (unicionist), os que definem gestão de cadeia
informação de chão-de- fábrica e muitas vezes chamada
de suprimentos como o novo nome da logística (re-labelist) e
de TA, tecnologia de automação, em contraposição a TI,
os que consideram duas disciplinas diferentes, com algumas
tecnologia de informação, responsável pela gestão dos
sobreposições (intersectionist).
sistemas corporativos.
Apesar dessas correntes, podemos considerar que ambos
Dessa forma a automação é um dos grandes pilares para a estratégia de gestão integrada de processos como os de qualidade, manutenção, produção e cadeia de suprimentos, ou Supply Chain.
tratam da gestão da rede de materiais e serviços industriais desde sua origem até o seu consumo. Na definição da APICS (Advancing Productivity, Innovation, and Competitive Success) para o termo SCM (Supply Chain Management), ele é o design, planejamento, execução controle e
Com a convergência de tecnologias entre as áreas de TI e
monitoramento das atividades da cadeia de suprimentos
automação, a contribuição do chão de fábrica à gestão da
com o objetivo de criar uma rede de valor, construindo
cadeia de suprimentos vem sendo estudada sobre a ótica de
uma infraestrutura competitiva, alavancando uma logística
integração de sistemas, com o levantamento das informações
internacional, sincronizando o fornecimento com demanda e
a serem compartilhadas entra as camadas de software.
medindo o desempenho globalmente. InTech 130 27
artigo
SUPPLY CHAIN
A metodologia de gestão da cadeia de suprimentos mais
modelo de integração de sistemas de chão de fábrica com
comumente adotada é a SCOR (Supply Chain Operation
sistemas corporativos aderentes ao SCOR, composto por
Reference Model), desenvolvida pela SCC (Supply Chain
três níveis: planejamento, execução e controle. Em termos
Council). A SCC é uma associação fundada em 1996 pela
de sistemas, temos o ERP (Enterprise Resource Planning),
AMR Research, instituição independente de pesquisa
responsável pela gestão corporativa e planejamento,
adquirida pela Gartner em 2009, pela empresa de consultoria
o MES (Manufacturing Execution System), gerindo a
Pittiglio Rabin Todd & McGrath e 54 grandes indústrias.
produção industrial e o sistema de controle, composto
A proposta da metodologia é simplificar o estudo
pelos sistemas de chão de fábrica.
da gestão da cadeia de suprimentos por meio da
Com essa integração, o planejamento realizado pelo ERP
padronização da terminologia, padronização dos passos de
passa a ter acesso aos dados mais precisos de desempenho
melhoria e padronização dos processos.
e disponibilidade de recursos fornecidos pela automação
Esse modelo propõe que os processos sejam organizados em níveis, do mais genérico ao mais específico para as
e o chão de fábrica às necessidades e alterações de planejamento da área de negócio.
particularidades de cada organização. Conforme a Figura 1,
Com isso, temos um impacto direto sobre as atividades de
o primeiro nível é formado pelos processos de planejamento,
planejamento de produção e gestão da produção.
abastecimento, produção, distribuição e devolução. O segundo nível é o que descreve a configuração da cadeia de suprimentos. Intimamente ligado à atividade produtiva, é onde o processo é classificado. Por exemplo, em make-
CONTROLE E PLANEJAMENTO DE PRODUÇÃO
to-stock, empresas que produzem com o objetivo de
A área de controle e planejamento de produção, ou PCP,
atingir metas de níveis de estoque, ou make-to-order, que
é responsável por garantir que o processo de fabricação
produzem com base em pedidos.
seja realizado de forma a atender os prazos acordados
O nível três é o que possui o detalhamento da cadeia e os indicadores de desempenho. Entre os principais indicadores, estão grau de flexibilidade, tempo de resposta, eficiência na gestão de recursos e custos.
com as próximas fases da cadeia logística. As principais ferramentas utilizadas para isso são a otimização de rotas de chão de fábrica, sequenciamento adequado de ordens de produção e alocação ótima de recursos. Para que esse planejamento seja bem sucedido, é importante que os dados de recursos disponíveis, como operadores e equipamentos, e desempenho das células produtivas sejam os mais acurados possíveis. A melhor fonte de informações sobre velocidade real de produção e disponibilidade de equipamentos são os próprios sistemas de automação. Para apoiar a atividade do PCP, e permitir a troca de dados entre automação e sistemas de planejamento, foram desenvolvidos os sistemas de planejamento de produção para chão de fábrica (Plant Floor Scheduler). Esses sistemas trabalham com um modelo do chão de fábrica capaz de prever tempos e rotas para uma
Figura 1 – Modelo SCOR.
sequência de ordens de produção, e coleta dados do chão de fábrica, via sistemas de automação ou de
Tendo em vista esses indicadores, a gestão da produção
gestão da produção, para garantir que os equipamentos
assume um papel bastante central para o desempenho
estão apresentando o desempenho previsto ou estão
global da cadeia. Dessa forma a AMR Research propôs um
disponíveis dentro da agenda desejada.
28 InTech 130
SUPPLY CHAIN
artigo
1 – Modelo de chão de fábrica A
modelagem
parametrização
do de
chão
de
fábrica
quatro
é
feita
elementos:
pela
recursos,
operações, rotas e calendários. Os recursos são os equipamentos
envolvidos
no
processo
produtivo.
As operações são os passos necessários para uma determinada fabricação. As rotas são as sequências de recursos que podem ser usadas para uma sequencia de operações. Os calendários são os períodos de disponibilidade dos recursos. Para processos de manufatura fortemente dependentes de ação humana, o calendário é bastante próximo da agenda de turnos. Essa informação é usada pelo sistema para a previsão de data de término das ordens de
Figura 3 – Configuração de Recursos.
produção. Um exemplo de configuração de turnos pode A
ser visto na Figura 2.
configuração
de
operações
e
rotas,
por
fim, conecta as atividades necessárias para a manufatura aos equipamentos. A separação da configuração de operação da de equipamentos é
fundamental
em
processos
onde
existem
alter nativas de localização para execução de uma determinada atividade. Uma atividade de corte, por exemplo, que normalmente é executada em um determinado equipamento pode ser alocada para outro com a mesma capacidade visando à otimização do uso dos recursos disponíveis.
2 – Planejamento Com o modelo de chão de fábrica configurado, a
Figura 2 – Configuração de Calendários.
atividade de planejamento se concentra em ordenar de
No modelo de equipamentos ficam as informações de capacidade produtiva e eficiência de cada recurso. Essa é a fonte mais comum de erros no processo de planejamento. Sistemas estáticos de apoio ao PCP, que não possuem conexão com os sistemas de
forma otimizada as ordens de produção nas diversas rotas. Sistemas de planejamento para chão de fábrica normalmente ordenação
apresentam
das
ordens
recursos de
para
produção,
auxiliar
a
tipicamente
recebidas do sistema ERP.
automação, mantêm valores estáticos para desempenho
Esses recursos variam bastante entre as ferramentas
e
ocorre
de mercado, mas normalmente são baseados na
uma parada de equipamento ou degradação de seu
teoria das restrições observando datas de entrega de
desempenho, são necessários ajustes manuais que,
materiais, data prevista para finalização da produção
em ambientes produtivos complexos, são bastante
e melhor ocupação dos equipamentos. Alguns,
complicados. A configuração vista na Figura 3 mostra a
ainda, disponibilizam heurísticas de otimização que
parametrização de um recurso com suas características
sugerem uma alocação ótima para um determinado
de desempenho e capacidade.
período de tempo.
disponibilidade.
Nesses
casos,
quando
InTech 130 29
artigo
SUPPLY CHAIN
estar organizados de forma hierárquica, respondendo aos seguintes níveis: enterprise, site, area, production line (ou process cell) e unit. Cada unit, que representa um equipamento ou unidade de armazenamento da linha de produção, mantém a lógica de interpretação das variáveis de automação, tipicamente coletadas via OPC. Um tanque de armazenamento de insumo, por exemplo, pode guardar referência do tag de medição de nível, responsável por indicar eventos de consumo e capacidade atual da unidade de estoque.
Figura 4 – Interface de Planejamento.
A Figura 4 mostra uma interface típica de planejamento, com as atividades alocadas por equipamentos e prazos para término das ordens de fabricação. Figura 5 – Modelo de Equipamentos
SISTEMAS DE GESTÃO DA PRODUÇÃO Os sistemas de gestão da produção são sistemas da camada MES responsáveis pelo acompanhamento da
2 – Modelos de Eventos
execução das ordens de produção no chão de fábrica. Por
A modelagem dos eventos de produção está intimamente
meio de acesso aos sistemas de automação, interação com
ligada à decisão das unidades a serem rastreadas. Cada
os operadores e leitura de identificadores, como códigos
segmento industrial possui um ou mais tipos de unidades,
de barra e tags RFID, eles são capazes de monitorar as
podendo ser lotes, bateladas, rolos, chapas e muitos outros.
atividades de movimentação, consumo e genealogia
Essa modelagem deve estar alinhada às políticas gerais de
rastreando cada produto através das células produtivas.
gestão da cadeia de suprimentos e cada item deve ter um
Quando presente na indústria, ele se torna a principal
identificador único para os sistemas MES e corporativo.
fonte de dados para a atualização das informações de
Como o evento é disparado pela unidade produtiva,
desempenho dos sistemas de controle e planejamento de
ele deve também respeitar ser relacionado a um
produção, e também o principal responsável por reportar
status.
detalhes da execução da ordem de produção para sistemas
testes de qualidade podem afetar esse status, e
corporativos como o ERP.
consequentemente a sua rota. Um exemplo seria uma
Eventos
de
paradas
de
equipamentos
e
batelada de um processo farmacêutico que não recebe a aprovação da área de qualidade. Ao invés de seguir 1 – Modelo de Equipamentos A base para a configuração do sistema de gestão da produção é o modelo de equipamentos. Ele que vai representar os recursos físicos do chão de fábrica, e mapear as variáveis dos sistemas de automação a serem
a rota natural para a área de embalagem, ela passa por um processo de rejeito. Os status normalmente relacionados aos eventos são completos, em progresso, congelado, em inventário, processando, consumido, rejeitado em inventário, e rejeitado.
monitoradas. De acordo com a norma S95 da ISA,
Um modelo de evento que merece atenção especial
norma que trata sobre a troca de dados entre sistemas
é o modelo de genealogia. Ele é o responsável por
corporativos e de chão de fábrica, os equipamentos devem
monitorar a relação entre produtos e subprodutos
30 InTech 130
SUPPLY CHAIN
no
decorrer
das
linhas
ele
acompanha
o
os
indicadores
dos
fluxo
de
produção.
de
insumos,
materiais
Para
isso,
integrando
responsáveis
pela
rastreabilidade de fornecedores, até os indicadores de
artigo
BIBLIOGRAFIA 1. DRUCKER, Peter F. The Essencial Drucker, Elsevier, USA, 2001.
produtos acabados integrando a cadeia logística externa 2. HALLDORSSON, A., Larson, P.
à interna da fábrica.
Logistics versus supply chain management: an international survey, International Journal of Logistics, 2004.
3. UNGER, K. Manufacturers' needs not changing - but acronyms are, Industrial Computing Journal , p. 46-48, The International Society of Automation (ISA), Outubro 2001.
4. Documentação da Suíte Proficy, GE Intelligent Platforms http://www.aquarius.com.br/pdf/proficy_plant_apps_4.4_ds_ gfa1086a.pdf Figura 6 – Exemplo de Modelo de Genealogia para Carregamento de Silo.
CONCLUSÕES A pressão pelo alinhamento das atividades de todas as áreas da corporação tem levado seus gestores a
se
aventurarem
interdisciplinares.
cada Aliar
vez
mais
por
conhecimentos
assuntos de
áreas
diferentes, como engenharia e negócio, ou TI e automação, tem se mostrado em inúmeros exemplos uma estratégia bastante bem sucedida. A adição das informações coletadas do chão de fábrica aos sistemas tradicionais de monitoramento e otimização de cadeias de suprimento ajuda a eliminar alguns dos diversos pontos cegos encontrados pelos gestores de negócios ao preverem prazos para as atividades da cadeia logística. Os novos desafios, porém, estão na integração de equipes com formações e culturas diferentes para conduzirem, citando Drucker, a cadeia de valor da empresa. InTech 130 31