20 minute read

MATERIAIS

Microestrutura e usinabilidade do ferro fundido: uma revisão da literatura

G.H. Martins e F. Deschamps

O ferro fundido é uma liga com mistura eutética composta por elementos à base de carbono e silício. O carbono é o elemento mais importante, sendo responsável por propriedades mecânicas e de fundição. Já o silício atua como grafitizante nas solidificações. Os ferros fundidos dividem-se em cinco classes: cinzento, branco, vermicular, maleável e nodular. Diante dos diferentes tipos de materiais observou-se uma lacuna para identificar quais os tipos de ferros fundidos possuem a melhor usinabilidade em função de sua microestrutura. No entanto, o objetivo desta pesquisa é a avaliação da microestrutura em relação à usinabilidade do ferro fundido por meio de uma revisão sistemática de literatura (RSL). A abordagem metodológica permite uma investigação científica para a seleção de um portfólio bibliográfico abrangendo estudos relevantes sobre o tema.

Aprodução de ferro fundido vem crescendo nos últimos anos e representa uma grande parte dos materiais utilizados nas indústrias. Segundo Souza et al (31, 32, 33) e dados do 44º Censo Mundial de Fundição, o ferro fundido grafítico constitui 71% da fundição no mundo, seguido por 17% de fundição de não ferrosos e 9% de fundição de aço. A demanda pelo uso desses materiais se deve ao seu baixo custo e ao processo de fundição, e também pela economia na usinagem de peças acabadas(25, 31, 32, 33). A estrutura dos ferros indústria(31, 32, 33). As principais aplicações deste material estão ligadas à indústria automotiva, claramente seguida de outros segmentos industriais gerando inúmeras oportunidades de pesquisas e inovações de grande importância para economia

fundidos é definida por classes de ligas de metais, tais como: silício, magnésio, cromo, molibdênio e cobre, entre outros, sendo que a aplicação do tratamento térmico adequado é que determina as características destes materiais como: resistência, dureza, rigidez e tenacidade(4, 31, 32, 33). O ferro fundido apresenta como vantagens o baixo custo, a alta resistência ao desgaste e o amortecimento, podendo ser até usinável(9). Como desvantagem, apresenta alta densidade e a produção de peças pesadas se torna um desafio para a

Gleison Hidalgo Martins (gleisonhidalgo@gmail.com) e Fernando Deschamps (fernando.deschamps@ufpr.br) são pesquisadores do Programa de Pós-graduação/Mestrado Profissional em Engenharia de Manufatura 4.0 do Departamento de Engenharia Mecânica/Setor de Tecnologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Reprodução autorizada pelos autores.

em geral(31. 32. 33). Para a construção do conhecimento sobre as várias classificações de ferro fundido, o objeto desta pesquisa é a avaliação da microestrutura do ferro fundido no processo de usinagem por meio da abordagem metodológica baseada na revisão sistemática de literatura (RSL). A aplicação do método (RSL) concentra-se na investigação científica, a qual agrupa estudos de pesquisas relevantes publicadas em bases reconhecidas

Tabela 1 - Propriedades químicas (concentração de elementos em %) e mecânicas dos ferros fundidos. Fonte: adaptada de Zeemann, 2013; Nuguyen, et al. 2016; D’Agostinho et al. 2017

Ferro fundido C Si Mn P S Dureza (HB) Ductilidade

Cinzento 2,5 - 4,0 1,0 - 2,8 0,2 - 1,0 0,002 - 1,0 0,02 - 0,25 180 a 260 Baixa

Branco 1,8 - 3,6 0,5 - 1,9 0,25 - 0,8 0,06 - 0,2 0,06 -0,2 550 Baixa

Vermicular 3,6 - 3,8 2,1 - 2,5 4,4 - 4,7 Max. 0,06 0,2 - 0,4 140 a 260 1% a 5%

Maleável 2.2 - 2,9 0,9 - 1,9 0,15 - 1,2 0,02 - 0,2 0,02 - 0,2 180 a 260 1% a 20%

Nodular 3,0 - 4,0 1,8 - 2,8 0,1 - 1,0 0,01 - 0,1 0,01 - 0,03

140 a 300 sem tratamento; 550 com austêmpera

C - Carbono | Si - Silício | Mn - Manganês | P - Fósforo | S – Enxofre | HB – Hardness Brinell (dureza Brinell) 3% a 20%

cientificamente com o objetivo de realizar uma revisão crítica e abrangente sobre o tema.

Revisão sistemática da literatura

Característica e propriedades do ferro fundido As estruturas dos ferros fundidos são definidas como uma classe de ligas ferrosas de mistura eutética com elementos à base de carbono e silício (Fe-Si-C) com teores de carbono em sua composição química (sempre superior a 1,8%) e silício (entre 0,5% e 2,8%)

(35, 22, 25, 2). Para Fernandes(10) , a determinação da composição química e a distribuição de carbono em sua microestrutura são reguladas por dois fatores: a primeira pela composição química e a segunda pela taxa de resfriamento. A concentração de silício em aproximadamente 1% e a taxa de resfriamento muito baixa durante a solidificação promovem a formação de grafita(6, 2, 27). À medida que a grafita é adicionada na matriz metálica do ferro fundido (ferrítica, perlítica, ferrítica-perlítica, austenítica) desencadeia em cada uma delas reações diferentes, dependendo dos elementos de liga ou do tratamento térmico a que elas são submetidas, gerando propriedades químicas e mecânicas de acordo com a tabela 1 e classes de materiais conforme a figura 1(11,24,

3, 10, 31, 32, 33) . A seguir são descritos alguns dos elementos químicos que exercem efeitos sobre a usinabilidade dos ferros fundidos na óptica de Nascimento et al(18), Chen et al(4) e Pereira(20) .

Grafita: É a forma estável do carbono puro, a qual determina as propriedades mecânicas do ferro fundido. A presença de grafita tem grande importância no processo de usinagem, pois atua como lubrificante sólido, facilitando a ruptura do cavaco,

Figura 1 – Classificações dos ferros fundidos: (a) Cinzento, (b) Branco, (c) Vermicular, (d) Maleável, (e) Nodular. Fonte: adaptada (Comin, 2013; Pereira, 2016; Rebouças, 2016; Rodrigues, 2017)

Figura 2 – Representação da usinagem de peças. Fonte: Diniz entre a alta resistência à ruptura e à abrasão, com ótimo potencial para a usinabilidade. Embora a perlita fina seja mais resistente e menos usinável, a perlita grossa possui baixa resistência e tem melhor usinabilidade.

impedindo a soldagem do material à ferramenta e reduzindo a formação de aresta postiça e forças de cortes. Apresentam-se como principais características físicas: a baixa densidade, a baixa dureza, a alta condutividade térmica e as propriedades lubrificantes.

Cementita: Composta de carboneto de ferro (Fe3C) possui elevada dureza, próxima de 800 HB ou mais. Mesmo com proporções pequenas de Fe3C, a composição altamente abrasiva reduz intensamente a velocidade de usinagem e acentua o desgaste de ferramentas.

Ferrita: É a forma do ferro no estado alotrópico alfa com traços de carbono. A matriz ferrítica pode ser obtida no estado bruto de fundição em alguns tipos de ferro com baixa dureza entre 100 a 150 HB, sendo encarregada por atribuir ao ferro a resiliência.

Perlita: Produzida a partir da reação eutetóide na formação da estrutura de cementita em uma matriz ferrítica. A perlíta com dureza entre 150 e 350 HB é responsável pela combinação Austenita: Solução sólida de carbono e ferro com um formato centro-estrutural cristalino cúbico formado por altas temperaturas, de pelo menos 723°C, consiste em carbono dissolvido em ferro possuindo baixa condutibilidade térmica e maior tenacidade com dureza entre 120 a 160 HB. Esta característica implica o aumento da velocidade de corte, ângulos de saídas maiores e cuidados especiais com refrigeração e lubrificação.

Usinabilidade do ferro fundido A usinabilidade do material é avaliada através da análise da vida útil da ferramenta, pelas forças de corte, pela formação de cavacos, pela qualidade da superfície da peça de trabalho dependendo das especificações de aplicações e do projeto(31, 32, 33), ou seja, para Kalyon et al(16) , a usinagem pode ser realizada sob várias condições de cortes e outros fatores de usinabilidades. Para o processo de usinagem é preciso definir as superfícies de trabalho. Diniz(7) salienta que essas superfícies são divididas em três categorias de acordo com a figura 2: superfície a usinar: superfície da peça antes da operação de usinagem; superfície em usinagem: aquela que está sendo gerada pela ferramenta; superfície usinada: face gerada pelo processo de usinagem.

Abordagem metodológica

A abordagem metodológica aplicada na pesquisa segue com base na revisão sistemática da literatura com foco na seleção de um portfólio bibliográfico de artigo para a construção do conhecimento na avaliação da microestrutura do ferro fundido na usinabilidade das diferentes classificações. Para a pesquisa foram utilizadas as bases científicas da Scopus, do Google scholar e da Web of Science, em virtude da confiabilidade e do reconhecimento científico de suas publicações. As buscas foram realizadas a partir dos descritores e operadores booleanos “search” para os determinados tipos de ferros fundidos. Exemplos: “TITLE-ABS-KEY(cast AND iron AND Gray); TITLE-ABS-KEY(cast AND iron AND White); TITLEABS-KEY(cast AND iron AND e); TITLE-ABS-KEY(cast AND vermicular OR graphite); TITLEABS-KEY(cast AND vermicular OR Malleable).

Foram incluídos na busca artigos, teses e dissertações relacionadas com os respectivos temas sobre os tipos de ferros fundidos publicados entre 2010 a 2019 nos idiomas português e inglês, sendo excluídas as publicações com acessos restritos em outros idiomas. A figura 3 descreve por meio de um diagrama o fluxo do processo de seleção do portfólio bibliográfico, o qual segue dividido em quatro fases. Na 1ª Fase foram selecionados 310 artigos. Para a 2ª fase

Figura 3 – Diagrama para seleção dos artigos. Fonte: adaptada de Pezzi; Marin, 2017(21)

restaram 248 artigos, dos quais 20 artigos foram excluídos por apresentar duplicidades, 16 artigos em outros idiomas e 26 artigos relacionados a publicações restritas, sendo analisados de acordo com os temas específicos para cada tipo de ferro fundido. Na 3ª fase 134 artigos foram excluídos por não apresentarem no título a temática principal, tais como: a microestrutura do ferro fundido cinzento, ferro fundido branco, ferro fundido vermicular, ferro fundido maleável, ferro fundido nodular e a usinabilidade destes materiais e outros 41 foram excluídos por conter as temáticas apenas no abstract. Na 4ª e última fase restaram apenas 37 artigos selecionados para compor o portfólio bibliográfico da pesquisa. No que tange às exclusões, destaca-se que a temática de ferro fundido vem sendo utilizada sob várias perspectivas com pesquisas publicadas sobre o desenvolvimento de revestimentos contra desgaste, corrosões, soldabilidade, combinações com outras ligas, entre outros.

Figura 4 – Micrografia da matriz predominantemente ferrítica (a) e da matriz perlítica (b) do Ferro Fundido Cinzento. Fonte: adaptada de (Almeida, 2014)

Análise e discussão dos resultados

O portfólio bibliográfico ofereceu 37 artigos com as informações para compreensão e avaliação da microestrutura da liga ferrosa na usinabilidade de ferro fundido, a partir de duas fontes de variáveis: a sua composição química e a taxa

de resfriamento(9, 35, 22, 6, 27, 25, 10, 2) . De acordo com Fernandes, (2018); Rebouças, (2016); Callister, (2017); Fernandes, (2018) apud Guesser (2013); Fragassa et al. (2016), e Nguyenet al. (2016), a maneira como a grafita é adicionada na estrutura da matriz metálica do ferro fundido (ferrítica, perlítica, ferrítica-perlítica, austenítica) ocasiona reações diferentes entre cada uma delas, gerando cinco classes de ferro fundido.

1 Ferro fundido cinzento A compreensão sobre a classificação de ferro fundido cinzento contemplou seis artigos que buscaram conhecimento sobre a formação da estrutura das ligas ferrosas e suas aplicações na usinabilidade de materiais a partir das fontes de dados. A figura 4 exibe a micrografia constituinte de veios das matrizes predominantemente ferrítica e perlítica e o gráfico 1 explana a microestrutura composta pelos teores de carbono 2,5<%C<4,0; Silício 1,0<%Si<2,8; e Manganês 0,2<%Mn<1,0 (antigrafitizante). A microestrutura é formada por baixa velocidade no arrefecimento, na qual o carbono se solidifica em forma de grafita (flocos), compondo uma estrutura com baixa resistência, com dureza entre 180 a 260 HB e baixa ductilidade, apresentando boa usinabilidade. Este processo forma um metal ferroso com boa resistência mecânica ao desgaste, a vibrações e à compressão. Embora seja razoavelmente resistente à corrosão e à tração, e seja classificado como ruim para soldabilidade, possui baixo custo. Este tipo de ferro fundido é o mais

Figura 5 – Micrografia da microestrutura do ferro fundido branco. Fonte: Sheid, 2010

usado na fundição em geral, sendo utilizado na fabricação de blocos de motor, tambores de freio, pratos de embreagem, cilindro de forros, anéis de pistão, vários equipamentos agrícolas, entre outros componentes de máquinas, tais como buchas, polias, anéis, mesas e bases de máquinas; contrapesos; flanges; réguas-guia; tampões; mancais; acoplamentos; cremalheiras roldanas; carretéis e

fusos (29, 30, 20, 26, 23, 37) .

2 Ferro fundido branco Para conhecimento das estruturas da composição e das propriedades mecânicas do ferro fundido branco foram usados três artigos, com os quais buscouse conhecer as variáveis na formação do metal: à medida que o arrefecimento da solidificação avança, a estrutura frágil e quebradiça vai se fundindo. A microestrutura ilustrada pelo gráfico 2 estabelece a composição pelas proporções de carbono 1,8<%C<3,6; Silício 0,5<%Si<1,9; e Manganês 0,25<%Mn<0,8 (antigrafitizante). Nesta composição, dependendo da porcentagem de carbono adicionada, pode-se dividir os materiais em hipoeutéticos, eutéticos e hipereutéticos, conforme a figura 5. A formação das propriedades mecânicas do ferro fundido branco consiste na alta velocidade do arrefecimento da estrutura solidificando o carbono sob forma de cementita em ferro fundido branco na superfície e cinzento no núcleo. Devido à alta quantidade de cementita em sua composição metálica, o material apresenta dureza elevada, resistência ao desgaste abrasivo, à tração e à compressão. Embora o metal não possa ser usinado e nem soldado, apresenta baixo custo. Sua aplicação está ligada à fabricação de ferro fundido maleável e à fabricação de equipamentos para a moagem de minérios, pás de escavadeiras e similares(35, 30, 20) .

3 Ferro fundido vermicular Foram indexados seis artigos sobre o tema ferro fundidos vermiculares, os quais descreveram como a grafita se apresenta na microestrutura e quais são suas aplicações em virtude de suas propriedades mecânicas. O ferro fundido vermicular é oriundo da adição da liga de titânio na composição do metal. Esta mistura degenera o módulo da grafita, transformado as propriedades mecânicas em uma composição intermediária entre o ferro fundido nodular e cinzento. A microestrutura do ferro fundido vermicular é mostrada na figura 6 e a composição química composta pelos teores de carbono 3,6<%C<3,8; Silício 2,1<%Si<2,5; e Manganês 4,4<%Mn<4,7 (anti-grafitizante) é indicada pelo gráfico 3. Esta combinação possui em sua microestrutura 20% de grafita esferoidal e 80% de grafita vermicular, tendo um custo médio de produção. As propriedades mecânicas apresentadas pela formação da microestrutura do ferro fundido vermicular exibem um perfil de material com dureza entre 140 a 260 HB e ductilidade entre 1% a 5% de alongamento, o que garante uma ótima usinabilidade do material quando comparado ao ferro fundido cinzento. Geralmente são utilizados em aplicações industriais automotivas, na fabricação de motores, cabeçotes de motor, discos de freios e coletores de escapamentos(20, 12, 13) .

Gráfico 3: Ferro Fundido Vermicular. Fonte: autores (2020) Gráfico 4: Ferro fundido maleável. Fonte: autores (2020)

4 Ferro Fundido Maleável Para esta análise foram relacionados três artigos do portfólio bibliográfico sobre o tema para conhecer como é formada a microestrutura do ferro fundido maleável a partir do ferro fundido branco quando submetido a um tratamento térmico de maleabilização por descarbonetação ou grafitização. A estrutura do ferro fundido maleável formada pelas combinações de carbono 2,2<%C<2,9 C; Silício 0,9<%Si<1,9; e Manganês 0,15<%Mn<1,2 (anti-grafitizante), formada pelas composições exibidas por meio do gráfico 4 e ilustradas pela figura 7, são obtidas a partir do ferro fundido branco. Quando submetido ao tratamento térmico de grafitização de aproximadamente 940°C é transformado em maleável ferrítico (resfriamento rápido até 740°C a 760°C) e maleável perlítico (resfriamento lento até 870°C). Por meio da alta temperatura, os carbonetos de ferro (Fe3C) transformam-se em grafita (nódulos de carbono), adquirindo um perfil com dureza entre 180 a 260 HB e ductilidade de 1% a 20% de alongamento, o que confere ao material boa usinabilidade, mas resulta em um custo alto de fabricação. São utilizados na fabricação de tubulações hidráulicas, elétricas e 5 Ferro fundido nodular Para conhecer as características do ferro fundido nodular, composto pelos teores de carbono 3,4<%C<4,0; Silício 1,8<%Si<2,8; e Manganês 0,1<%Mn<1,0 (antigrafitizante), representado no gráfico 5, tendo a micrografia ilustrada na figura 8, foram analisados quatro artigos do portfólio bibliográfico sobre o tema. Após 60 anos de pesquisa e desenvolvimento com foco em melhorar as propriedades mecânicas, o ferro fundido nodular possui o carbono (nódulo de grafite) em forma esferoidal junto com cementita e outros se mantendo livres na matriz metálica. Este formato contribuiu para que a ductilidade do material se aproximasse daquela verificada no aço. A presença das esferas ou nódulos de grafita na microestrutura sustenta suas propriedades mecânicas e as características como dureza entre 140 a 300 HB, podendo chegar a 550 HB, sem o tratamento de austêmpera, com 3% a 20% de alongamento, o que o caracteriza como tendo ótima usinabilidade e soldabilidade melhorada, apesar do custo médio de fabricação. Suas aplicações consistem em peças para as indústrias automotiva, tais como engrenagens, buchas, suspensão, freios, direção, virabrequins etc., além de tubulações hidráulicas para esgoto, lamas e processos químicos, aplicações como recipientes para armazenamento e transporte de resíduos nucleares, entre outros(15, 20, 8, 14) . Para uma melhor compreensão, a tabela 2 mostra a comparação entre as principais propriedades mecânicas citadas no texto e as estruturas referenciadas na obtenção de um resumo explicativo como resultado das análises da pesquisa, bem como suas aplicações industriais

Conclusões

A pesquisa organizou temas considerando trabalhos publicados entre o período de 2010 a 2019 com o objetivo de construir a avaliação da microestrutura e seu efeito sobre a usinabilidade das diferentes classificações do ferro fundido baseando-se na revisão sistemática de literatura (RSL). Para tanto optou-se pela seleção de um portfólio bibliográfico

Tabela 2 – Comparação entre propriedades mecânicas e estruturas metálicas. Fonte: autores (2020)

Autores Tipo de ferro fundido Microestrutura Propriedades Aplicações

(SHI, ZHENG, 2013; SILVA, 2015; ALMEIDA, 2014; PEREIRA, 2016; SARKAR, SUTRADHAR, 2017; PETRIC, 2019; ZHOU et al. 2019) Cinzento

Carbono 2,5<%C<4,0 C; Silício 1,0<%Si<2,8 e 0,2<%Mn<1,0(anti-grafitizante) O material possui resistência ao desgaste e à vibração, com boa compressão e frágilidade à tração. Possui resistência razoável à corrosão, é de difícil soldagem e possui baixo custo de fabricação. As características apresentadas são dureza entre 180 a 260 HB, com baixa ductilidade em função dos blocos de grafitas. Apresenta boa usinabilidade. Tipo mais utilizado na fundição em geral, para fabricação de blocos de motor, tambores de freio, pratos de embreagem, cilindros, forros, anéis de pistão, vários equipamentos agrícolas, entre outros componentes de máquinas, tais como buchas, polias, anéis, mesas e bases de máquinas; contrapesos; flanges; réguas-guia; tampões; mancais; acoplamentos; cremalheiras roldanas; carretéis e fusos.

(ZEEMANN 2013; SILVA, 2015; PEREIRA, 2016) Branco

(PEREIRA, 2016; ZHANG et al, 2016; GUO et al 2018; UZU, 2019; GUSIK et al 2012; MA et al, 2016) Vermicular

(ZEEMANN, 2013; PEREIRA 2016; FRAGASSA, 2016) Maleável

(HARA et al, 2014; PEREIRA, 2016; D’AGOSTINO et al 2017; HANDAYANI, 2018). Nodular

Carbono 1,8<%C<3,6 C; Silício 0,5<%Si<1,9 e 0,25<%Mn<0,8 (anti-grafitizante)

Devido à alta quantidade de cementita, o ferro apresenta dureza e elevada resistência ao desgaste, à tração, à compressão e à abrasão. Com dureza de 500 HB e baixa ductibilidade, com perfil duro e frágil, não pode ser usinado e nem soldado (em função da cementita)

Sua aplicação está ligada à fabricação de ferro fundido maleável e à fabricação de equipamentos para a moagem de minérios, pás de escavadeiras e similares.

Carbono 3,6<%C<3,8 C; Silício 2,1<%Si<2,5 e 4,4<%Mn<4,7 (anti-grafitizante). O material apresenta microestrutura com 20% de grafita esferoidal, 80% de grafita vermicular e não inclui grafita lamelar. Com dureza entre 140 a 260 HB e ductibilidade entre 1% a 5% de alongamento, o material apresenta ótima usinabilidade quando comparado ao ferro fundido cinzento e possui custo médio de produção.

É utilizado em aplicações industriais automotivas na fabricação de motores, cabeçotes, discos de freios e coletores de escapamentos.

Carbono 2,2<%C<2,9 C; Silício 0,9<%Si<1,9 e 0,15<%Mn<1,2 (anti-grafitizante). É obtido a partir do ferro fundido branco submetido a tratamento térmico de maleabilização por descarbonetação ou grafitização.

Dureza entre 180 a 260 HB e ductilidade de 1% a 20% de alongamento, o que confere ao material boa usinabilidade, apesar do custo alto de produção. É utilizado na fabricação de tubulações hidráulicas, elétricas e pneumáticas.

Carbono 3,4<%C<4,0 C; Silício 1,8<%Si<2,8 e com 0,1<%Mn<1,0 (anti-grafitizante) Material com maior resistência ao desgaste, tenacidade e ductilidade. Possui um custo médio de aquisição, além da soldabilidade melhorada. Apresenta dureza entre 140 a 300 HB, podendo chegar a 550 sem o tratamento de austêmpera com ductibilidade de 3% a 20% de alongamento, o que lhe confere ótima usinabilidade. É utilizado na indústria automotiva na fabricação de engrenagens, buchas, suspensão, freios, direção, virabrequins; tubos hidráulicos para esgoto, lamas e processos químicos e aplicações críticas como recipientes para armazenamento e transporte de resíduos nucleares, entre outros.

Gráfico 5: Ferro fundido nodular. Fonte: autores (2020) Figura 8 – Micrografia do ferro fundido nodular: (a) Matriz ferrítica e (b) Matriz perlítica-ferrítica. Fonte: adaptada de Almeida, 2014(1)

que melhor correspondesse ao tema. Este portfólio contribuiu para a compreensão sobre as microestruturas dos ferros fundidos formadas pelas combinações dos elementos com alta concentração de carbono, superior a 1,8%, e a formação desta microestrutura do ferro fundido está relacionada a dois fatores: a composição química e distribuição do carbono e a taxa de resfriamento, promovendo a formação de cinco classes de materiais de ferro fundido: cinzento, branco, vermicular, maleável e nodular. A análise de cada uma dessas classes, considerando uma escala de ruim, bom e ótima para avaliação da microestrutura em relação à usinabilidade, apresentou os seguintes resultados: o ferro fundido cinzento é o mais utilizado entre todos em razão de ser o mais fácil de ser fabricado e apresentar um baixo custo. Devido à grafita livre na sua microestrutura e às suas propriedades, tais como dureza entre 180 a 260 HB e baixa ductilidade, o metal possui boa usinabilidade com propriedades para amortecer vibrações. Suas aplicações principais estão na indústria de máquinas e equipamentos, automobilística, ferroviária e naval, entre outras. O ferro fundido branco, por apresentar alta concentração de cementita e propriedades mecânicas com dureza de 500 HB, baixa ductilidade e alta resistência à abrasão, não pode ser usinado, mas tem suas aplicações voltadas para as indústrias de equipamentos para a moagem de minérios, pás de escavadeiras e similares, bem como na fabricação de ferro fundido maleável. O ferro fundido vermicular, com dureza entre 140 a 260 HB e ductilidade entre 1% a 5% de alongamento, apresenta ótima usinabilidade quando comparado ao ferro fundido cinzento. É utilizado em aplicações industriais automotivas na fabricação de motores, cabeçotes de motor, discos de freios e coletores de escapamentos, entre outros. O ferro fundido maleável, obtido a partir do ferro fundido branco quando submetido ao tratamento térmico de maleabilização por descarbonetação ou grafitização, tem alto custo de produção. Em contrapartida, suas propriedades mecânicas, com dureza entre 180 a 260 HB e ductilidade de 1% a 20% de alongamento, lhes conferem bom perfil de usinabilidade. Suas aplicações baseiam-se nas fabricações de tubulações hidráulicas, elétricas e pneumáticas. O ferro fundido nodular, com maior resistência ao desgaste, tenacidade e ductilidade, possui um custo médio de fabricação. Apresenta dureza entre 140 a 300 HB, podendo chegar a 550 HB sem o tratamento de austêmpera, com ductilidade de 3% a 20% de alongamento, o que o caracteriza como tendo ótima usinabilidade. É utilizado na indústria automotiva, na fabricação de tubos hidráulicos e processos químicos e aplicações críticas como recipientes para armazenamento e transporte de resíduos nucleares, entre outros. Conclui-se que na avaliação da microestrutura em relação à usinabilidade do ferro fundido, embora haja uma exceção para o ferro fundido branco, o qual não pode ser usinado, a microestrutura do ferro fundido cinzento e maleável se mostra boa boa para a usinabilidade, seguida por ótima para os ferros fundidos vermicular e nodular. Mesmo havendo diferenças entre as microestruturas e suas propriedades mecânicas, os materiais apresentaram em comum suas aplicações em diversas finalidades e segmentos industriais. Por fim, vale destacar a importância da microestrutura em relação à usinabilidade dos materiais das diferentes classificações dos ferros fundidos, pois à medida que uma de suas composições é modificada alteram-se as microestruturas, determinando-se qual o tipo de material será transformado e para quais aplicações eles serão utilizados. Para pesquisas futuras sugere-se a busca de artigos em outras bases com a inserção de outros termos descritores e operadores booleanos tais como “ferramentas de usinabilidade”, “influência da temperatura na usinabilidade de ferro fundido” entre outros, e até a busca por um período maior de publicações.

This article is from: