Instituições de Ensino Superior: Desenvolvimento Urbano e Regional

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INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR: DESENVOLVIMENTO URBANO E REGIONAL Patrícia Costa e Silva Cruz Alexandre Augusto Bezerra da Cunha Castro Eitonilda de Assis Bezerra Neta Mariana da Nóbrega Cesarino Gomes RESUMO As Instituições de Ensino Superior (IES), juntamente com o governo e os órgãos de iniciativa privada, são os principais atores responsáveis pelo desenvolvimento socioeconômico local e regional em longo prazo. Com o objetivo de investigar, por meio de revisão de literatura, o papel das IES no desenvolvimento regional onde estão inseridas, este artigo apresenta-se dividido em introdução e investigação teórica, a qual encontra-se por sua vez subdividida em quatro temas principais. Essa revisão bibliográfica é composta pela retomada da discussão sobre a evolução e o quadro atual da educação de ensino superior no Brasil, a sua relação com o desenvolvimento local e regional e os desafios enfrentados para atingir esse desenvolvimento. Por fim, após revisão de literatura, o presente trabalho procura evidenciar as várias dificuldades enfrentadas pelas IES na participação, junto ao governo e indústria, para o desenvolvimento em longo prazo nas escalas local e regional, e também elenca a necessidade de construção de uma ideologia comum entre esses três atores responsáveis pelo desenvolvimento. Palavras-chave: Desenvolvimento Urbano e Regional; Instituições de Ensino Superior; Planejamento Urbano e Regional; Polos de Desenvolvimento; Educação no Brasil.

INTRODUÇÃO O desenvolvimento econômico e social das regiões e cidades pode ser analisado a partir de várias vertentes, das quais é destaque neste artigo a implantação das Instituições de Ensino Superior, a partir de agora referidas por IES, responsáveis não apenas pela formação de mão de obra qualificada, tanto quanto pela geração de uma série de multiplicadores de produtos, técnicas, tecnologias e ainda novos conhecimentos e inovações, traçando uma espiral do ciclo da produção científica (DE OLIVEIRA, 2014). As universidades influem em diversas escalas, à medida em que possibilitam aos lugares se conectarem com o mundo concomitantemente ao enraizamento local, regional e por vezes global, com efeitos consideráveis nos circuitos de produção e consumo da economia. Estas produções e consumos, por sua vez, repercutem de forma multiplicadora nas estruturas espaciais, principalmente das cidades onde as instituições estão situadas (idem). A curto e médio prazo, tal conjuntura expressa nitidamente o aporte de recursos do Governo Federal, contribuinte no surgimento de diversas atividades; por outro lado, a médio e longo prazo, as IES contribuem ainda com a qualificação de mão de obra, promovendo desenvolvimento e a oferta de serviços mais qualificados, antes difíceis de serem ofertados devido à ausência de instituições de nível superior. Assim, as IES, enquanto instituições de ensino, pesquisa, extensão e promoção 3º SAU – Simpósio de Arquitetura e Urbanismo das FIP – ISSN 2526-3927 1


social, assumem importância estratégica no processo de desenvolvimento. O conjunto de atividades ofertadas promove uma força capaz de atrair consumidores e outras empresas, que terminam por contribuir com o crescimento econômico-social local e regional (ibidem). Nos últimos anos, a sociedade exigiu um engajamento maior dessas empresas, principalmente as relacionadas à educação de nível superior e de maior porte. Com isso, a responsabilidade social cresceu atrelada às obrigações de melhorar o bem-estar da sociedade. Estabeleceram-se cobranças pelas práticas sociais das empresas e, neste contexto, também se enquadraram as Instituições de Ensino Superior. Por serem organizações de educação, atingiram um patamar mais elevado de comprometimento social, tendo como principal função o encargo da responsabilidade com a sociedade de um modo geral. Conforme Chiavenato e Arão (2004, p. 332), o “dever social” está associado ao nível de compromisso de uma organização mediante os desempenhos que defendem e melhoram o bem-estar da sociedade à medida que buscam cumprir os seus respectivos interesses. Em meio a tantas responsabilidades, é fundamental a existência de uma conexão mais efetiva entre as IES e o desenvolvimento regional, sendo a educação elemento-chave para esse desenvolvimento. Na última década, a partir de uma nova abordagem governamental voltada às IES, aumentaram as possibilidades de financiamento para cursos de nível superior, facilitando a relação entre universidades e sociedade. O objetivo deste estudo é, por meio de uma revisão teórica, investigar o papel das IES no âmbito do desenvolvimento regional. O dever social, associado à produção de conhecimento, tornou-se uma temática primordial em relação ao crescimento e desenvolvimento das empresas, e neste caso, merece ser motivo de aprofundamento nos variados tipos de sistematização, nas quais estão contidas as Instituições de Ensino Superior (REIS; BANDOS, 2012). METODOLOGIA Optou-se pela construção de uma investigação embasada em levantamento de material bibliográfico e pesquisa documental, retomando a importância do estabelecimento das Instituições de Ensino Superior públicas ou privadas no Brasil, no decorrer das últimas décadas. Nesse contexto, o artigo estruturar-se-á em quatro partes: primeiramente, convém introduzir a problemática abordada seguida pela metodologia utilizada; em um segundo tempo, retomar-se-á o quadro teórico da pesquisa, subdivido em quatro subtópicos que abordarão a evolução dos IES no território nacional e sua correlação com o desenvolvimento local e regional; as principais informações serão então brevemente expostas, abrindo espaço para as reflexões esboçadas à guisa de conclusão. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA O ensino superior no Brasil nas últimas décadas: Um breve panorama No Brasil, o ensino superior só obteve de fato um caráter universitário a partir da década de 1930. Até esse momento, o modelo de ensino caracterizava-se pela formação de profissionais liberais, a exemplo dos cursos de Direito, Medicina e Engenharias. Somente a partir de 1934 é que surgiram as primeiras escolas superiores. Nas duas décadas seguintes, o ensino superior não passou por um 3º SAU – Simpósio de Arquitetura e Urbanismo das FIP – ISSN 2526-3927 2


crescimento significativo, mas foi nesse período em que foram inauguradas as primeiras Universidades Federais, Universidades Católicas privadas e o sistema de ensino superior estadual em São Paulo. Entre 1930 e 1960, o número de escolas superiores passou de 86 para 226 (SAMPAIO, 1991). Ainda de acordo com a autora supracitada, tanto o aumento do número de instituições como o de matrículas (Tabela 1) não são necessariamente reflexo de uma política expansionista do ensino superior, e sim resultado de um ajuste da demanda dos setores médios, como produto de um processo de desenvolvimento urbano-industrial. Esse fato justifica o crescimento lento, principalmente entre 1957 e 1960. Tabela 1 – Evolução das matrículas (1940-1960) Ano Total de Matrículas % de crescimento 1940 27.671 1950 48.999 1954 64.645 1955 72.652 12 1956 78.659 8 1957 79.505 1 1958 84.481 6 1959 87.603 4 1960 93.202 7 Fonte: Levy (1986).

O ensino superior no país passou por um acentuado crescimento quantitativo entre as décadas de 1970 e 1990, que foi caracterizado pelo aumento do número de instituições, matrículas, cursos, funções docentes, entre outros. Contudo, esse processo não se deu de maneira uniforme no decorrer do tempo, passando por períodos tanto de expansão quanto de estagnação do crescimento. Anteriormente, na década de 1960, a quantidade de IES em todo o país permeava cem unidades, estas em sua maioria de pequeno porte e com professores com qualificação reduzida. Essas instituições na época eram voltadas para atender em torno de 100 mil estudantes, com público majoritariamente masculino de classe abastada. A partir da década seguinte, 1970, o país passou por um período de expansão quantitativa de suas instituições de ensino superior, em que houve uma propagação descontrolada de IES, acarretando a redução de qualidade acadêmica das mesmas. Entretanto, não houve aumento no número de matrículas na graduação. Já na década de 1990, por sua vez, o país retomou o processo de expansão das IES, atingindo a taxa de expansão anual de 7% (MARTINS, 2000). Ainda segundo o mesmo autor, com essas etapas evolutivas, o quadro da educação de ensino superior se apresenta totalmente diferente no início do século XXI. Ao longo dos anos foi desenvolvida uma complexa rede de estabelecimentos escolares, que atendia mais de 2 milhões de estudantes de graduação e 78 mil de pós-graduação. Além da evolução quantitativa, houve uma diferenciação no público alvo dessas instituições e a localização das mesmas que atualmente atendem diferentes gêneros, classes sociais e, inclusive, estudantes que estão situados longe de polos educacionais. Essa complexa rede de estabelecimentos escolares é bastante heterogênea no que diz respeito à natureza das instituições. São incluídas nessa rede 3º SAU – Simpósio de Arquitetura e Urbanismo das FIP – ISSN 2526-3927 3


universidades federais, estaduais, municipais e particulares, indo desde centros de pesquisa e ensino complexos até escolas menos expressivas. Apesar dessa tentativa de abranger diferentes regiões e atender a diferentes públicos independente de localização, a distribuição das universidades em território nacional ainda acontece de forma desigual já que na região Sudeste estão situadas mais da metade de todas as IES do país. Essa distribuição também se mostra desigual quando observadas as naturezas das IES, em que é possível observar que a rede privada possui um número muito mais expressivo de instituições do que a rede pública (MARTINS, 2000). As universidades particulares, nesse contexto, começaram a surgir no final dos anos 60, orientadas pela lógica de mercado e voltadas ao perfil empresarial, constituindo o novo ensino privado a partir da década seguinte. Algumas dessas universidades privadas tiveram início a partir da junção de outros estabelecimentos isolados que perderam sua representatividade no contexto acadêmico ou da criação de faculdades integradas particulares. Essas instituições privadas igualmente se fundamentam no modelo universitário baseado na integração entre ensino, pesquisa e extensão, embora não tenham obtido tanta representatividade na prática de pesquisa científica quanto às instituições públicas (idem). As Instituições de Ensino Superior enquanto Polos de Desenvolvimento Mas o que torna uma IES um polo? A indução dos fluxos de crescimento com a formação de mão de obra que dê conta de suprir demandas locais e regionais? Do mesmo modo como são capazes de induzir fluxos, as IES são capazes ainda de atrair investimentos, pessoas, capital, que distribuídos na cidade são capazes de requalificar e dinamizar as economias locais, podendo inclusive especializar determinados locais como afirma MAILLAT (2002 apud DE OLIVEIRA, 2014). Nesta circunstância de mudanças, os locais adquirem um nível de especialização e concentração em que a ação destinada a estas “novas localidades” construídas a partir da valorização baseada na competitividade, especialização e seletividade de lugares, não vai mais estar voltada ao planejamento em escala intermunicipal, mas na escala municipal, onde surgirão novas formas de aglomeração econômicas que constituirão novos espaços de produção. Assim, o polo modifica o seu meio geográfico imediato (idem). Segundo Botelho Júnior (2005 apud DE OLIVEIRA, 2014), por meio da instalação de novas atividades em uma região ocorre o denominado “efeito multiplicador” dos investimentos que provoca um aumento do dispêndio, uma vez que os trabalhadores optam por gastar sua renda adquirindo produtos e serviços locais, que proporcionam o aumento do insumo das firmas que, por sua vez, acrescenta a produção e gera novos postos de trabalho, causando uma elevação maior no setor terciário, mais especificamente no setor de serviços (figura 1).

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Figura 1 – Processo circular e cumulativo do crescimento regional

Fonte: Botelho Junior (2005 apud DE OLIVEIRA, 2014)

O surgimento de uma nova economia, que é impulsionada pela tecnologia de informação e comunicação e baseada principalmente na capacidade intelectual mais do que em bens físicos, ou recursos naturais, essa nova realidade implica na rápida obsolescência do conhecimento e necessita da atuação constante das IES (MORAES, 2014). Diversos autores consideram as três instâncias mais importantes para o desenvolvimento econômico baseado nessa nova economia como a academia, o Estado e indústria. Para a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), são considerados os três atores do desenvolvimento, sendo as Instituições de Ensino Superior responsáveis por garantir a sustentabilidade do setor produtivo a partir de políticas públicas. Já os autores Etzkwoitz e Leydesdorff (2000 apud MORAES, 2014), em seu modelo de Hélice Tríplice, consideram também os três autores do desenvolvimento e o papel das IES de forma semelhante ao OCDE, mas considera a possibilidade de sobreposição e troca entre o papel de cada um desses atores devido à intensidade de integração entre eles. Segundo este modelo, as universidades são responsáveis pela produção de novo conhecimento e tecnologia, a indústria pela produção e o governo sendo a fonte de relações contratuais. Por fim, segundo John Goddard e Lundvall (2002, 2003 apud MORAES, 2014), as IES devem representar o papel animador da região onde atuam devendo focar sua missão nos objetivos que promovam o desenvolvimento econômico, estrutural e cultural local. O papel das IES no desenvolvimento regional se dá a partir da capacitação da sociedade e transferência de tecnologia para que estes estejam aptos a promover junto à indústria e governo o desenvolvimento local e regional. Portanto, é papel das IES promover, de forma planejada e empreendedora, um dinamismo econômico que consiga reter as novas gerações no mercado de trabalho local a partir do controle da relação entre oferta e demanda. As IES podem ainda viabilizar a sustentabilidade da região através da competência e sua constante reavaliação. Por fim, para que uma IES obtenha sucesso na promoção do desenvolvimento regional, a mesma deve ter conhecimento aprofundado da situação 3º SAU – Simpósio de Arquitetura e Urbanismo das FIP – ISSN 2526-3927 5


da cidade e região com relação a diversas temáticas como desigualdades, exclusões sociais, limitações e potenciais econômicos, causas de desemprego regional, etc. Esse conhecimento por sua vez deve ser obtido dentro e fora da região pelos professores e pesquisadores das IES de distintas áreas do conhecimento. As Instituições de Ensino Superior apresentam então um caráter empreendedor que, em conjunto com governo e iniciativa privada, resulta em uma atmosfera inovadora, que atrai indústrias externas e as pessoas criativas para a região, caracterizando-se enquanto polos de desenvolvimento da região na qual estão inseridas. É muitas vezes por meio dessas instituições que motores de desenvolvimento e crescimento, mesmo que tardios, chegam em determinados lugares distantes dos principais centros nacionais. Assim, apresentam-se as IES como uma nova forma de gerar riquezas, estas últimas baseadas no conhecimento capaz de gerar inovações. Assim, o desenvolvimento não se restringe mais apenas à capacidade de recursos minerais que um território possui, mas também no seu capital humano, único, capaz de gerar produtos inovadores, embasados na informação e no conhecimento (DE OLIVEIRA, 2014). Relação entre as Instituições de Ensino Superior e o desenvolvimento urbano e regional: Uma perspectiva teórica A contribuição das IES para o desenvolvimento de um país é inequívoca. Entretanto, a preocupação com o papel desempenhado por elas no desenvolvimento das regiões é relativamente recente (OECD, 1999, 2007; GODDARD, 1998, 2005; ATKINS; DERSLEY; TOMLIN, 1999; HOLM-NIELSEN; THORN; BRUNNER; BALÁN, 2005 apud SERRA; ROLIM, 2013). Essa preocupação é consequente de pressões de uma economia mundial atualmente mais globalizada em que o ambiente regional/local é tão importante quanto a situação macroeconômica nacional na determinação da habilidade das empresas em equiparar-se numa economia global (OECD, 2007 apud SERRA; ROLIM, 2013). Dentro desse contexto, a disponibilidade regional/local de conhecimentos e capacidades passa a ter o mesmo grau de importância que a infraestrutura física, o que torna as universidades regionalmente engajadas um elemento-chave no processo de desenvolvimento socioeconômico regional (SERRA, ROLIM, 2013). Toda essa conjuntura mundial, relacionada a uma crescente valorização do conhecimento, da inovação e por mão de obra cada vez mais qualificada tem impactado nas IES, que começam a ser concebidas como importantes instrumentos de mudanças sociais e econômicas a serem operadas em suas regiões. As possibilidades para tal são consideráveis, mas os desafios – além das expectativas criadas – a serem enfrentados pelas universidades devem ser fortemente considerados uma vez que há diversas frentes de “luta” estabelecidas, tais como a qualificação de mão de obra, a geração e o intercâmbio de importantes ideias e atividades para a sociedade e a parceria ativa com o setor produtivo. Nesse sentido, há um novo papel em questão para as universidades, faculdades e instituições de ensino superior, de maneira geral, que contribuem, além das suas funções tradicionais de ensino e de pesquisa, para o desenvolvimento econômico, social e cultural das regiões em que estão inseridas. Este novo papel tem sido caracterizado como uma Terceira Missão (SERRA; ROLIM, 2013). O envolvimento regional das IES significa, em último grau, a efetivação do compromisso destas com o desenvolvimento econômico, social e cultural de suas próprias regiões. A Terceira Missão das universidades tem sido reconhecida no âmbito acadêmico e das políticas públicas como uma ferramenta com grande 3º SAU – Simpósio de Arquitetura e Urbanismo das FIP – ISSN 2526-3927 6


potencial de contribuição ao desenvolvimento socioeconômico. Ela envolve amplamente diversas ações, as quais estão relacionadas com a geração, uso, aplicação e exploração de conhecimentos e outras capacidades da universidade superando o limite acadêmico. No entanto, a concretização desse engajamento regional enfrenta os mais variados obstáculos, que vão desde a adequação do ensino e da pesquisa às demandas do mercado de trabalho local até as incompreensões entre os agentes regionais/locais e as instituições de ensino superior, sendo que este último obstáculo está intrinsecamente relacionado aos seus compromissos incompatíveis e mesmo às políticas públicas difusas (SERRA; ROLIM, 2013). Dados estatísticos comprovam que o modelo que associa o desenvolvimento baseado no alcance de um nível de desempenho do ensino superior a altos investimentos em ciência e tecnologia contribui para que os países, as regiões e os lugares tornem-se não apenas mais competitivos, mas com alto nível de qualidade de vida, dado o elevado grau de desenvolvimento socioeconômico. Autônomo disto a fundação de IES em cidades de pequeno e médio porte causa um conjunto de efeitos, que possam vir a dinamizar ou não o crescimento dos lugares onde se encontram (DE OLIVEIRA, 2014). Especialmente nessas cidades, a maior parte da circulação de recursos financeiros realizados por meio de pagamentos de salários de funcionários e docentes, somados às necessidades de obras, equipamentos e despesas de custeio e manutenção das IES, é de extrema relevância para o meio socioeconômico da urbe onde a instituição está inserida. Superando essa questão, relacionam-se ainda os gastos do corpo discente provenientes de outras localidades capazes também de fomentar as atividades locais, principalmente voltadas à prestação de serviços relacionados ao meio acadêmico. Essas condições traçam uma conjuntura representativa na economia local, pois propicia um “efeito dinamizador e multiplicador sobre as atividades locais” (BOVO; SILVA; GUZZI, 1996, p. 71 apud GOEBEL; MIURA, 2004, p.37). Dentre os serviços favorecidos por essa realidade, destacam-se atividades relacionadas às dimensões de ensino e aprendizagem como livrarias, atividades de lazer, restaurantes, bares, infraestrutura de alojamento e transporte, entre outros, capazes de desencadear um processo de desenvolvimento e geração de empregos, principalmente no entorno próximo às IES. Assim, de maneira geral, estabelece-se uma força centrípeta de atração de diversidades culturais e de lazer envoltas ao polo educacional (GOEBEL, MIURA, 2004). Para SCHNEIDER (2002 apud GOEBEL; MIURA, 2004), os recursos injetados na economia local favorecem o desenvolvimento do município, uma vez que atuam como um elemento multiplicador, desencadeando efeitos favoráveis à economia local. Esses efeitos positivos relacionam-se ao processo de diversificação e qualificação do ensino, das atividades culturais e das necessidades inerentes ao meio acadêmico, favorecendo o desenvolvimento, via processo de aglomeração (GOEBEL; MIURA, 2004). A política nacional de democratização da educação de nível superior tem não apenas permitido uma democratização do acesso de milhares de estudantes possibilitados de ingressarem no ensino superior como também contribuído para impulsionar o crescimento e o desenvolvimento das localidades. Isso pode indicar que nas próximas décadas algumas dessas cidades onde se instalaram novas universidades, campi, ou demais instituições de ensino superior, possam vir a tornarse importantes polos de produção econômica (DE OLIVEIRA, 2014). 3º SAU – Simpósio de Arquitetura e Urbanismo das FIP – ISSN 2526-3927 7


Os Atores Regionais e os Desafios Existentes No entanto, o desenvolvimento dessas cidades e regiões não é uma realidade fácil. A retomada da discussão sobre desenvolvimento regional indica que as regiões com maiores probabilidades de desenvolvimento são aquelas que tenham capacidade de estabelecer projetos políticos de desenvolvimento que congregam os seus diferentes atores regionais, fazendo parte desse projeto, na sua vertente econômica, a utilização intensiva e coordenada do conjunto de conhecimentos existentes na região para aumentar a sua competitividade (SERRA; ROLIM, 2013). De acordo com Rolim e Serra (2015), um dos desafios que os atores regionais vêm enfrentando é a ausência de um consenso sobre os problemas que estão relacionados ao futuro da região. Esses atores, ainda que encontrem conselhos que tratem do desenvolvimento da cidade e operem com certa independência, encontram-se sem ferramentas para criar planos de desenvolvimento no intuito de atender às necessidades da região que estejam em entendimento com um plano de desenvolvimento das IES. Outro desafio que está vinculado ao de antes citado é o das universidades ficarem com a responsabilidade da liderança no andamento do desenvolvimento regional. Independentemente das universidades participarem dos comitês de desenvolvimento, institutos de tecnologia, associações de municípios e de planejamentos de desenvolvimento das suas regiões, a sua função no procedimento de desenvolvimento regional ainda é muito pouco em relação ao que poderia ser. Notoriamente que o exagero de burocracia e o impedimento da legislação das universidades tornam-se uma barreira, porém, pode-se perceber um certo conforto no mundo acadêmico, o que dificulta ainda mais a interação das universidades com a sociedade. Apesar de as IES orientarem os seus valores universais a partir de currículos e criação de cursos, elas necessitam de informações sobre o que a região espera dos estudantes e qual o destino dos alunos formados, os quais são desafios presentes no espaço de formação dos profissionais, enquanto inseridos no mercado de trabalho. Possivelmente, o maior problema está relacionado à comunicação com os usuários e com empresários típicos da região. Identifica-se a falta de comunicação voltada à compreensão das necessidades dos empresários da região e a vinculação destas aos conhecimentos adquiridos durante as graduações e demais cursos. Outro elemento integrador, que associado às IES proporciona desenvolvimento regional, são as prefeituras e órgãos governamentais. Para DOWBOR (1996 apud GOEBEL; MIURA, 2004) as prefeituras são capazes e devem realizar ações que auxiliem e estimulem a geração de renda e emprego para os habitantes locais, o que pode ser fomentado por meio do incentivo da instalação de novas formas de organização, produtivas e cooperativas, associadas à realidade das IES e das demais cidades que integrem a região. As dificuldades dos municípios em formular, financiar e gerir eficientemente determinadas políticas socioeconômicas favorecem a interação entre a universidade e a administração pública, uma vez que as IES acabam por assumir um papel preponderante nas questões socioeconômicas locais, o que resulta em aproximação entre comunidade acadêmica e sociedade (GOEBEL; MIURA, 2004).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS As abordagens mais atuais da literatura têm direcionado para um novo papel das IES, que transcende as suas funções de ensino e de pesquisa: o do seu engajamento regional em prol do desenvolvimento social, econômico e cultural das regiões em que elas estão inseridas, sendo este novo papel chamado Terceira Missão (SERRA; ROLIM, 2013). Na atualidade, a IES tornou-se uma organização vinculada ao setor produtivo, onde as necessidades socioeconômicas locais, regionais e até nacionais devem integrar os objetivos destas instituições, pois é um espaço próprio para o desenvolvimento e transferência de conhecimento e tecnologia gerados no meio acadêmico e nos laboratórios (GOEBEL; MIURA, 2004). As universidades estão tendo suas funções ampliadas, em detrimento de indicadores estabelecidos pelos órgãos de gestão universitários. No entanto, as IES, especificamente as públicas, possuem determinada autonomia para a captação de recursos em fontes alternativas e formação de parcerias com a iniciativa privada, procurando através destas estratégias pôr em prática os seus princípios (CHAUI, 1999 apud GOEBEL; MIURA, 2004). Um fator importante para o desenvolvimento da capacidade competitiva de determinadas regiões e até de países tem sido o seu crescimento econômico e seu desenvolvimento social, decorrente da melhoria educacional. Para que este processo continue, faz-se necessário que o ensino superior, através de seus programas de ensino, tenha também uma função social, criando oportunidades para o desenvolvimento intelectual dos acadêmicos e, por consequência, gerando desenvolvimento para a sociedade, permitindo assim a divulgação deste conhecimento junto à sociedade (GOEBEL; MIURA, 2004). Ressalta-se aqui o aspecto qualitativo do ensino superior, por vezes menosprezado diante dos dados quantitativos, pois tem-se visto no Brasil e na região a abertura de um elevado número de faculdades e universidades, com o argumento de transmitir conhecimento e favorecer o desenvolvimento local e regional, o que muitas vezes não condiz com a realidade, devido à má qualidade de ensino, sendo o objetivo destas instituições somente a receita financeira como prestadora de serviços, deixando em segundo plano as demais funções da universidade de ampliar o espectro de ação vinculado com um compromisso socialeconômico, fica num plano inferior (idem). Há várias dificuldades para o estabelecimento de uma parceria mais sólida com o setor produtivo, tais como: a estrutura e a burocracia das universidades brasileiras (principalmente as públicas); as diferentes lógicas (curto x longo prazo) dos agentes e a consequente desconfiança mútua; a falta de uma visão compartilhada sobre o futuro desejado para a região, a sua competitividade e o próprio papel das IES no processo de desenvolvimento regional; a resistência ideológica de boa parte dos pesquisadores das escolas de nível superior em relação às parcerias inovadoras com as indústrias em que as atividades sejam direcionadas para o mercado; as pequenas, médias e grandes empresas têm uma visão limitada sobre a função das universidades para o desenvolvimento das regiões; e as políticas públicas difusas. Portanto, é fundamental a construção de uma visão sobre o futuro almejado e, ao mesmo tempo, de um projeto político comum a toda região de modo a torná-la mais competitiva e dinâmica em todas as escalas (SERRA; ROLIM, 2013). Nesse cenário, as instituições de ensino superior exercem funções na cidade maiores que simplesmente as que lhe são atribuídas: as IES contribuem para a estruturação do espaço intraurbano e na rede de cidades, por funcionarem como 3º SAU – Simpósio de Arquitetura e Urbanismo das FIP – ISSN 2526-3927 9


plataformas de desenvolvimento urbano e regional, atraindo tanto fluxos migratórios como pendulares de pessoas (usuários dos equipamentos e terceiros que se beneficiam indiretamente), dinamizando o movimento de capital e informação e promovendo o crescimento socioeconômico da região de influência. REFERÊNCIAS CHIAVENATO, Idalberto; ARÃO, Sapiro. Planejamento Estratégico: Fundamentos e Aplicações. N. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. N p. DE OLIVEIRA JR, Antonio. A universidade como polo de desenvolvimento localregional/The university as a center for local-regional developing-DOI 10.5752/P. 2318-2962.2014 v24nespp1. Caderno de Geografia, v. 24, n. 1, p. 1-12, 2014. GOEBEL, Márcio Alberto; MIURA, Márcio Nakayama. A universidade como fator de desenvolvimento: o caso do município de Toledo-PR. Universidade Estadual do Oeste do Paraná, 2004. LEVY, D.C. Higher Education and the State in Latin America: Private Challenges to Public Dominance. Chicago: The Universityof Chicago Press, 1986. MARTINS, C. B.O ensino superior brasileiro nos anos 90.São Paulo Perspec. São Paulo, v14. n.1, p.41-60, 2000. MORAES, E. A. S. O impacto da Instituição de Ensino Superior no Desenvolvimento Local e Regional: Estudo de Caso da Universidade Federal de Pelotas (RS). 1 v. Tese (Doutorado em Planejamento Urbano e Regional) – Faculdade de Arquitetura. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 2014. REIS, A. L.; BANDOS, M. F. C. A Responsabilidade Social de Instituições de Ensino Superior: Uma Reflexão Sistêmica Tendo em Vista o Desenvolvimento. Revista Gestão e Conhecimento. 2012. ROLIM, C.; SERRA, M. Ensino Superior e Desenvolvimento Regional: Avaliação do Impacto Econômico de Longo Prazo. Revista Brasileira de Estudos Regionais e Urbanos. v. 3, n. 1, 2009. SERRA, Maurício; ROLIM, Cássio. Desenvolvimento e Engajamento Regional: O papel das universidades. ln: Observando o desenvolvimento regional brasileiro: processo, políticas e planejamento [recurso eletrônico] / organização: Rogério Leandro Lima da Silveira. – Santa Cruz do Sul: EDUNISC. p.73-88, 2013. SAMPAIO, H. Evolução do Ensino Superior Brasileiro, 1808-1990. São Paulo: NUPES, USP, 1991.

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