Inovadores por Natureza

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>tecnologia

Inovadores por natureza Estudantes e profissionais brasileiros usam ferramentas tecnológicas para alavancar o desenvolvimento econômico do País Por Arivaldo Silva foto joão alvarez

magine acordar e não ter mais os movimentos dos membros inferiores ou superiores. A situação é comum para vítimas de Acidente Vascular Cerebral (AVC) ou de lesões medulares, que muitas vezes perdem a dorsiflexão – o movimento de flexão na articulação do tornozelo. Foi o que aconteceu, por exemplo, com o estudante Vitor Veiga, 18 anos, quando tinha apenas 14, em 2008. Contudo, em meio ao drama familiar, o poder de se colocar no lugar do outro pode dar um rumo diferente a essa e diversas outras histórias. Comovido com a situação do irmão, Daniel Veiga, 22, estudante de engenharia mecatrônica da Unifacs, criou, em parceria com os colegas Bruno Cavalcanti e Bruno Soares, o protótipo de uma palmilha inteligente, que evoluiu para uma tornozeleira batizada de Motus (do latim movimento). A tecnologia é capaz de impulsionar o músculo que movimenta a ponta do pé de uma pessoa com deficiência, por meio da eletroestimulação, funcionando como uma central de processamento de dados ligada ao músculo por elétrodos. Os estudantes criaram a Startup Vitae – Soluções em 38 crea V.3, n. 41, p. 38 - out/nov/dez.2012 - Bahia

acessibilidade, empresa de engenharia que desenvolve produtos na área de reabilitação. O aparelho foi concebido dentro do Laboratório de Robótica, da Incubadora de Negócios Unifacs, sob a coordenação do engenheiro mecânico Thomas Buck, com consultoria de professores de fisioterapia da universidade. O projeto aguarda agora a liberação do Comitê de Ética Médica, do Conselho Nacional de Saúde, para que os primeiros testes sejam realizados. “Meu irmão sofreu a dissecção da artéria carótida, vaso sanguíneo que leva sangue do coração ao cérebro, por conta de um problema genético. O quadro evoluiu para um AVC. Parti para a pesquisa e consultei um amigo fisioterapeuta, que disse já existir um aparelho parecido para auxiliar na locomoção de pacientes com dificuldade de mobilidade. Usamos como base e criamos o Motus”, conta Daniel. capacitação

O jovem faz parte de um grupo cada vez maior de brasileiros que buscam capacitação para o salto de qualidade tão necessário para o desenvolvimento nacional. “O quanto você

está motivado é o quanto você pode alcançar. É a medida para chegar mais longe”. O Motus é uma órtese, complementa o membro danificado, diferentemente de uma prótese, que substitui um órgão. O sistema é acionado por uma conexão sem fios via rádio a partir da tornozeleira, onde está instalado um módulo de sensores que detecta as características do passo a ser dado após a retirada do calcanhar do chão: aceleração, inclinação, velocidade e deslocamento. Com o dispositivo, os estudantes venceram a edição 2011 do prêmio Ideias Inovadoras, promovido pela Fundação de Amparo à Pesquisa da Bahia (Fapesb), com apoio do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e receberam o prêmio de R$ 8mil, investido na patente do invento. Esse trabalho levou Daniel a Washington (EUA), em abril de 2012. Ele foi o único brasileiro, entre cem estudantes de 96 países, escolhido pela Laureate International Universities, para representar o Brasil no Clinton Global Initiative University, evento criado pelo ex-presidente Bill Clinton para premiar iniciativas inovadoras,


Daniel Veiga, estudante de mecatrônica, e atornozeleira Motus

COMO FUNCIONA central de processamento de dados O dispositivo detecta a da 1 Uma 3 Através é ligada ao músculo através de eletrodos. 2 aceleração, inclinação, eletroestimulação é O sistema é acionado por uma conexão sem fios via rádio a partir da tornozeleira, onde está instalado um módulo de sensores que detecta as características do passo a ser dado após a retirada do calcanhar do chão

habilidades em liderança e comprometimento social em universidades de todo o mundo. “A importância do Motus vai além do estímulo elétrico. Os dados armazenados no aparelho serão usados por fisioterapeutas e médicos para balizar e aprimorar o tratamento do paciente”, explica Bruno Cavalcanti. Outro dispositivo desenvolvido pelos estudantes é uma impressora braile de baixo custo que

velocidade e deslocamento

possível movimentar a ponta do pé de uma pessoa com deficiência

ganhou, pelo segundo ano consecutivo, o prêmio da Fapesb para inovação, desta vez no valor de R$ 15 mil. Fenômeno startup

Empreendedorismo social e inovação. Estas palavras traduzem o espírito dos que se dedicam à área de tecnologia de ponta. O fenômeno é chamado de startup, empresas que, geralmente, surgem em incubadoras,

com ideias promissoras ligadas a pesquisa. Estes empreendedores estão antenados com as mudanças históricas e atuam no desenvolvimento de tecnologia e conhecimento de ponta, seja dentro de empreendimentos de base tecnológica, seja em incubadoras, instaladas nas universidades, com o objetivo de gerar inovação em prol da sociedade. Projetos surgidos na capital baiana destacam-se pela inovação e uso da tecnologia em áreas distintas. Um deles é um sistema de automação batizado de “Barras de Proteção para Metrôs e Trens Metropolitanos”, que recebeu menção honrosa durante a 15ª Edição Internacional - Negócios nos Trilhos, que ocorreu em novembro do ano passado na capital paulista. Desenvolvido pelos baianos João Marques (tecnólogo de petróleo e gás), Álvaro Lessa (inventor e projetista) e Daniel Santos (metalúrgico), o invento foi escolhido entre mais de 30 projetos de renomadas empresas do segmento metroferroviário de todo o País. “Os acidentes em estações são rotineiros. Sem a proteção adequada, são ainda mais frequentes. Esperamos que Salvador seja a primeira cidade a usar este equipamento”, afirma João Marques. Incentivo e Inovação

No bojo das inovações tecnológicas que estão surgindo, o Parque Tecnológico da Bahia tem papel importante, com seus grupos de pesquisas divididos nas áreas de: tecnologia da informação e comunicação, energia e engenharias e biotecnologia e saúde. O empreendimento conta hoje com as seguintes empresas: IBM, Unigel, Softwell, Jus Brasil, VCR Informática, Cetene, Prodeb, Grupo Meta, EriccsonInovação, Indra. Implantado em 2007, o Programa Estadual de Incentivo à Inovação Tecnológica – Inovatec – dispõe V.3, n. 41, p. 39 - out/nov/dez.2012 - Bahia

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>Tecnologia de R$ 15 milhões em recursos do Fundo de Investimento Econômico e Social (Fies) para fomentar projetos que contribuam para o desenvolvimento científico e tecnológico do Estado. As incubadoras

Segundo dados do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, a Bahia é o sexto Estado com mais pesquisadores no País e o primeiro do Norte/Nordeste. De acordo com o secretário estadual de Ciência Tecnologia e Inovação, Paulo Câmara, o cenário é propulsor e o investimento é indispensável para o desenvolvimento de uma cultura de empreendedorismo. “No Tecnocentro, já temos nove empresas totalmente voltadas para a sinergia inovadora. E novos investimentos estão sendo feitos. Agora, o programa será estendido para cidades do interior, como Ilhéus, Itabuna, Vitória da Conquista e Feira de Santana”. O Tecnocentro, edifício central do Parque Tecnológico da Bahia, foi inaugurado em setembro de 2012 e, nele, foram investidos R$ 53,3 milhões do ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e R$ 7,1 milhões de contrapartida do Governo da Bahia. Todo esse investimento, objetiva abrigar pequenas, médias e grandes empresas a fim de gerar novos negócios e impulsionar a economia baiana. Dados do estudo Demografia das Empresas 2009, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontam que quatro em cada dez empresas fecham após os dois primeiros anos. Já o estudo do Sebrae, Taxa de Sobrevivência de Empregos no Brasil, de 2011, indica que mais de 1,2 milhão de novos empreendimentos formais são criados anualmente no País. Desse total, mais de 99% são micro e pequenas empresas e Empreendedores Individuais (EI). 40 crea

A quase inacreditável revolução da bio-retina Em meados dos anos 1960, quando a série de ficção científica Jornada nas Estrelas - Star Trek estava no auge, o engenheiro-chefe da nave Enterprise, comandante Geordi La Forge, chamava atenção por conta de um acessório que utilizava como visor. Portador de cegueira congênita, La Forge usava uma prótese que funcionava como uma espécie de retina artificial, transformando sinais luminosos em imagens enviadas diretamente ao cérebro, fazendo-o enxergar. Hoje, os avanços da bioengenharia focados em regeneração ocular divulgados em pesquisas da Universidade de Cornell (EUA), e de uma empresa de Israel, rompem as barreiras entre ficção e realidade e trazem esperança a pessoas que perderam a visão, por doenças oculares degenerativas. Batizada de bio-retina, o invento é um chip com uma célula fotovoltaica implantada por meio de uma incisão e fixada na retina. O chip é alimentado por uma fonte de lasers instalados nos óculos do paciente.

Outro vetor de crescimento destas empresas são as incubadoras, como a de Base Tecnológica da Escola Politécnica da Ufba – a Inovapoli, ambiente onde são gerados produtos, processos ou serviços a partir de pesquisas aplicadas, nas quais a tecnologia representa alto valor agregado. De acordo com o conselheiro do Crea-BA e diretor da Escola Politécnica, engenheiro civil Luís Edmundo Campos, as universidades e o governo estão estimulando as ideias dos empreendedores. “É preciso fomentar o empreendedorismo desde a universidade para mudar a cultura do estudante em relação ao mercado. Na Bahia, o profissional, não só de engenharia, conclui a faculdade para ser empregado. Não existe inovação sem empreendedorismo”. E para isso, segundo ele, a incubadora é fundamental. “Se a incubadora consegue proteger a empresa nesse período, consegue-se melhorar a situação do País e dar mais emprego e renda para a população”.

A linguagem do empreendedorismo tecnológico Startup > A expressão em inglês é usada nos EUA há várias décadas. No entanto, foi com a chamada bolha da Internet, entre 1996 e 2001, que o termo começou a ser usado no Brasil como sinônimo de um grupo de pessoas trabalhando em ideias que podem gerar dinheiro. Startup também é aquela ebulição criativa, própria de quem inicia uma empresa e a coloca em funcionamento. Incubadora de base tecnológica > É um ambiente que permite o acesso a serviços especializados, orientação em gestão, espaço físico e infraestrutura técnica, administrativa e operacional, para o desenvolvimento de empreendimentos inovadores.


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