Lapa segue caótica e sem Ordem na Casa

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SALVADOR

SALVADOR TERÇA-FEIRA 30/11/2010

Raul Spinassé / Ag. A TARDE

ESTRUTURA Usuários condenam acessibilidade para deficientes na estação

Lapa segue caótica e sem Ordem na Casa ARIVALDO SILVA

O caminhar de dona Maria da Pureza, 76 anos, revela todo o peso das primaveras em suas costas. Na manhã de ontem, ao descer com dificuldade a interminável escadaria da estação da Lapa, que dá acesso à Avenida Joana Angélica, a idosa parou para respirar diversas vezes. No local, só existe escada rolante para subir. Como consequência, pessoas com dificuldade de locomoção sofrem ao passar pelo local, que é a maior estação de transbordo de Salvador. “Preciso passar aqui todos os dias para trabalhar. Sou diarista e ainda trabalho muito para sobreviver”, relata a trabalhadora doméstica. A secretária-executiva Rosana Lago, 39, é cadeirante e trabalha voluntariamente em uma associação, no bairro da Mouraria. Todos os dias, ela e o marido, Marcos Pancho, 32, saem de sua residência na Pituba e passam obrigatoriamente pela Lapa, enfrentando diversos obstáculos para chegar ao destino. “É muito difícil chegar ao trabalho. Por se tratar de uma grande estação, acredito que a acessibilidade deveria ser priorizada”, queixa-se.

Ministério Público

De acordo com a coordenadora do Grupo de Atuação Especial de Defesa dos Direitos dos Deficientes Físicos (Gedef), do Ministério Público estadual, promotora de justiça Silvana Almeida, desde agosto de 2006 foi instaurada uma ação na 5ª vara da Fazenda Pública solicitando que a prefeitura promova com urgência a acessibilidade na estação da Lapa. “O MP entende que o direito de ir e vir é fundamental e o poder público tem o dever de prover isso. Não pedimos uma ação paliativa, mas uma solução definitiva. Se for necessário fechar, que o administrador tenha coragem para isso”, é taxativa a promotora. À época, o juiz da 5ª vara da Fazenda Pública, Ricardo D’Ávila, negou a antecipação da tutela, e o processo está parado desde então.

REGIÃO METROPOLITANA

Lixo e animais compõem cenário desordenado

Sanitários têm reservados depredados e chão sujo

Cães de rua adotam o local como morada “tranquila”

A acessibilidade é apenas um dos muitos problemas que os 460 mil usuários do local enfrentam diariamente. Mesmo com o anúncio da prefeitura de que no final de semana foi realizada uma grande faxina e manutenção nos equipamentos da estação, os usuários continuam reclamando do lixo, banheiros insalubres e animais que perambulam pela área.

Prefeitura promete Ordem na Casa na Lapa, mas estação permanece caótica

Pessoas com deficiência física sofrem com escadas rolantes interditadas

Animais acompanham ex-moradores da Fonte Nova A administração da Estação da Lapa reconhece que a quantidade de funcionários para a limpeza é insuficiente, comparada ao número de pessoas que circula pelo local. “Mesmo com a manutenção preventiva que fazemos, é notório que a população não conserva os equipamentos. Precisamos da compreensão das pessoas para que não depredem e mantenham a limpeza como se estivessem em suas casas”, apela Marcos Guerra, coordenador da Gerência de Equipamentos Urbanos (Geurb), da Superintendência Municipal de Transportes e Infraestrutura (Setin).

Problema social

Em relação aos animais soltos na Lapa, Marcos Guerra argumenta que moradores de rua saíram da área da Fonte Nova e se alojaram na estação, trazendo consigo animais de estimação. “Esse é um problema social, que estamos combatendo com uma ação conjunta com a Secretaria Municipal do Trabalho, Assistência Social e Direitos do Cidadão (Setad) e o Centro de Controle de Zoonoses para retirar os indigentes e seus animais daquela área”, explica Guerra.

Sujeira

A operação Ordem na Casa tem o mérito de ter reativado duas escadas rolantes, mas outras duas ainda continuam inertes. Uma situação recorrente é a sujeira, o mau cheiro e a lama que toma conta do piso dos banheiros. “Não tem papel, nem água. O mau cheiro é insuportável. Jogaram uma tinta para enganar e continua tudo como antes”, reclama o cabeleireiro Frank Santos. Ontem, a equipe de A TARDE presenciou mais uma cena de abandono na estação. Ao lado de uma escada rolante interditada, um cachorro dormia calmamente em meio à sujeira e aos pedestres. “O que mais me incomoda aqui são esses animais soltos”, lamenta a atendente Risoleta Rodrigues, 24.

A7

Ambiente abandonado do subsolo assusta usuários Dona Maria da Pureza, 76 anos, tem dificuldades para descer as escadas diariamente

Promotora acusa prefeitura de desinteresse em melhorar acessos Com 150.000 m², a maior estação de transbordo da capital baiana, a Estação Clériston Andrade, mais conhecida como Estação da Lapa, não sofreu ao longo do tempo reformas significativas que possam garantir às pessoas com deficiência o direito de ir e vir com autonomia e segurança. Para a promotora de justiça Silvana Almeida, a Prefeitura de Salvador não demonstrou interesse em criar mecanismos que assegurem o acesso das pessoas com deficiência física aos logradouros e edi-

fícios públicos ou privados. Em 2008, outra ação civil pública do MP-BA para que a prefeitura promovesse a acessibilidade em prédios públicos foi deferida pela 5ª Vara da Fazenda Pública, mas a Procuradoria do Município recorreu da sentença e o Tribunal de Justiça da Bahia concedeu efeito suspensivo, alegando que nenhum direito fundamental era lesado.

Exclusão

A presidente da Associação Baiana de Deficientes Físicos (Abadef), Luiza Câmera, res-

salta que a questão da inclusão social passa pela acessibilidade. “Salvador é uma cidade totalmente despreparada para a pessoa com deficiência e, para o exercício da cidadania plena, a acessibilidade é essencial”, afirma. Ela lembra que, desde a criação da Estação da Lapa, esse item não foi contemplado. “Somos cerca de 500 mil pessoas com algum tipo de deficiência em Salvador e somos vistos como inaptos. Não é possível conviver com tanta exclusão social”, brada.

O subsolo da Estação da Lapa, onde circulam diversas linhas de ônibus para bairros do subúrbio de Salvador, é um capítulo à parte. O local é quente, úmido, sujo e insalubre. A dona de casa Cátia Reis, 42 anos, reclama do abandono. “Aqui falta segurança. As escadas rolantes estão sempre quebradas. A Lapa precisa de uma manutenção urgente e de fiscalização contínua”, fala dona Cátia.

Rampas

O cadeirante e funcionário público Luís Mário de Jesus, 48 anos, revela que o maior problema para quem tem alguma deficiência é a relação com alguns motoristas. “Eles não respeitam nossos direitos. Colocam a rampa do ônibus longe da calçada, alegando que se fizessem o correto danificaria o equipamento. Essas atitudes prejudicam nossa entrada nos coletivos”, reclama Luís Mário.


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