FUNDAÇÃO MARIO COVAS
em revista
ano 1 - março 2009 - n º 5
Em revista
propaganda
polĂtica
editorial
O bom ‘campanheiro’ Na rua, sempre com muita gente em volta, ouvindo, falando, discutindo ideias e meios de melhorar a vida das pessoas na cidade, no Estado, no país todo. Esse era o lugar predileto de Mario Covas, o pedaço do mundo onde ele se sentia feliz e confortável. Gostava de exercer o poder público, no Legislativo ou no Executivo, mas era na campanha eleitoral que brilhava a sua estrela política. O próprio Mario Covas se considerava um bom “campanheiro”, e ninguém ousaria negar. Seu negócio era ir para o corpo a corpo, suar muito a camisa. Subia ao palanque com gosto, inflamando a audiência com seus discursos. Tinha o dom da palavra, e a usava como ninguém. Nas pausas, não dispensava um pastel com guaraná e, de sobremesa, um sorvete de coco. Não prometia nada que não tivesse certeza de que poderia realizar, mesmo que isso pudesse lhe custar votos decisivos. Os marqueteiros que se virassem, sempre desafiados a encontrar saídas criativas para tornar amistosa sua mensagem austera. Covas acompanhava com atenção as pesquisas de intenção de voto. Se o resultado dos institutos não batessem com o das pesquisas realizadas pela equipe, o pesquisador teria trabalho para explicar a razão. Covas adorava discutir com as pessoas, até para testar a força de suas convicções. Ao todo, foram nove as suas campanhas eleitorais em 37 anos de vida pública. Sem contar, é claro, todas as outras das quais participou em apoio a causas, como as Diretas Já, pelo retorno às eleições diretas durante a ditadura militar, e a candidatos, como Fernando Henrique Cardoso, Lula e Marta Suplicy. Aliás, foi de Marta a última campanha da qual participou. Covas iria aproveitar o feriado do dia da eleição a prefeito de São Paulo para continuar sua luta contra o câncer numa sessão de quimioterapia. Mas como ainda havia risco de Marta perder para Paulo Maluf, ele adiou a internação e foi à rua pedir votos para a petista até que as urnas se fechassem. Até o fim, um bom “campanheiro”.
Antonio Carlos Rizeque Malufe Presidente da Fundação Mario Covas
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Índice
Fotoclip
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37 anos caçando votos
8
A sensibilidade do político
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Em Santos, a primeira candidatura
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Memória do palanque
20
Material de campanha
23
Rumo à Câmara dos Deputados
25
Da Câmara ao Senado
29
O desafio da corrida presidencial
34
Por um governo honesto
44
A revolução ética
49
Principais realizações do Primeiro Mandato
54
Negão e dona Maria marcam 1994
61
Vence o apelo à continuidade
67
Principais realizações do Segundo Mandato
75
A marca da legalidade
79
Créditos
86
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fotoclip
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A TRAJETÓRIA
37 ANOS CAÇANDO VOTOS Firme na defesa de sua mensagem política, Mario Covas concentrava-se em conquistar o eleitor nas ruas – o pessoal de campanha que cuidasse do resto
Covas em caminhada com a população durante a campanha de 1994 a governador de São Paulo
8
Político em tempo integral, Mario Covas
Na primeira campanha, em 1961, Mario
disputou cargos públicos por nove vezes, em
Covas candidatou-se a prefeito de Santos
nove campanhas memoráveis. De todas, a
com o apoio de Jânio Quadros. A atuação
parte que mais gostava era conquistar votos
solidária e efetiva no socorro às vítimas
nas ruas, conversando com a população,
de deslizamento de encostas dos morros
convencendo o eleitor de que era possível
santistas
melhorar a sua vida e a de seus vizinhos
engenheiro a participar da disputa. Uma
e cuidar da coisa pública honestamente.
girafa e a vassoura janista eram os ícones
Preocupava-se com sua mensagem e, para
de sua campanha, que reciclava o slogan de
defender a forma que considerava mais
Carvalho Pinto – “Nunca foi tão fácil escolher
adequada para expressá-la, era capaz de
o melhor” –, e acontecia basicamente nas
discutir durante horas com os responsáveis
ruas e nos comícios. Numa época em que a
pelas
contrapartida,
imprensa tomava partido de um ou outro
delegava completamente a costura dos
candidato, Covas ganhou o importante apoio
programas de TV e a escolha dos materiais.
de A Tribuna, um dos jornais mais influentes
campanhas.
Em
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havia
credenciado
o
jovem
de Santos. Perdeu a eleição para La Scala,
Quércia levaram Covas e seus aliados a
apadrinhado de Adhemar de Barros, mas
fundar, em junho de 1988, o Partido da Social
acumulou expressivo cacife político.
Democracia Brasileira – PSDB.
Em 1962, conhecido pela campanha do
No partido dos tucanos, Covas aceitou
ano anterior, Mario Covas candidatou-se
o desafio de disputar a Presidência da
a uma vaga na Câmara Federal, pelo PST.
República em 1989, na primeira eleição
Venceu e, em 1964, tornou-se líder do bloco
direta para o cargo desde o fim da ditadura
dos partidos pequenos. Dois anos depois,
militar. Mesmo com pó de guaraná no arsenal
reelegeu-se deputado federal pelo MDB,
de campanha, perdeu no primeiro turno e
partido de oposição ao regime militar.
apoiou Lula no segundo. Os eleitores deram
Conquistou a liderança da Câmara em 1967,
a vitória a Fernando Collor de Mello.
militando com Ulysses Guimarães e Tancredo Neves, entre outros nomes de peso.
A melhor chance de Covas viria em 1994, ao lançar-se candidato a governador de São
Democrata por natureza, defendia seus
Paulo. Seu programa de governo apoiava-se
princípios,
significasse
em três revoluções: ética, administrativa e
confronto com os militares. A defesa que
contra o desperdício. Para medir as intenções
fez do deputado Marcio Moreira Alves, que
de voto, o pessoal de campanha introduziu
proferira um discurso considerado ofensivo
um aparelhinho por meio do qual o eleitor
pelas Forças Armadas, custou-lhe o mandato,
poderia expressar aprovação ou reprovação
em 1969. Mas a cassação não o impediu
ao que via no programa de TV, ajudando a
de participar da campanha de Fernando
corrigir as rotas de campanha. O discurso de
Henrique Cardoso ao Senado, em 1978. Em
Covas agradou, levando-o ao segundo turno
retribuição, FHC apoiou a candidatura de
com Francisco Rossi e, depois, à vitória.
mesmo
que
Covas à presidência do MDB paulista. O saneamento das finanças do Estado A recuperação dos direitos políticos veio em
de São Paulo e a política de austeridade,
janeiro de 1979. Dedicado à conquista de
embora previstos e desejados, não foram
votos para a renovação da Câmara Federal,
digeridos por parte da população. A equipe
em 1982 Covas elegeu-se deputado. No ano
de campanha à reeleição, em 1998, teve de
seguinte, assumiu a prefeitura de São Paulo,
trabalhar dobrado para vencer as resistências
por indicação do governador Franco Montoro.
do eleitorado. Com esforço, Covas passou ao
Na gestão Covas, os bem-sucedidos mutirões
segundo turno junto com Paulo Maluf. Nas
para a pavimentação de ruas habilitaram
pesquisas de intenção de voto, perdia para
seu nome para cargos mais elevados.
o ex-colega da Escola Politécnica. Mas num dia inspirado, diante das câmeras, num
Em 1986, Covas elegeu-se senador com
debate pela TV, disse ao adversário que
quase 8 milhões de votos, o maior resultado
o eleitor não era bobo e saberia comparar
eleitoral da história política do país até
as duas biografias. O que Covas queria era
então. Logo conquistou a liderança do
colocar em discussão o caráter de cada um.
PMDB na Assembléia Constituinte, mas os
Estava certíssimo – reelegeu-se com folga
constantes atritos com o grupo de Orestes
na última campanha de sua vida.
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A sensibilidade do político Imune à ação dos marqueteiros, Mario Covas definia o discurso, delegava a execução e intervia só em correção de rumo, diz Osvaldo Martins, coordenador das campanhas eleitorais
Mais preocupado em pedir votos aos eleitores na rua, no corpo a corpo, Mario Covas delegava à equipe a tarefa de escolher materiais, aprovar peças de campanha, definir as imagens que iriam ao ar no programa de televisão. Definia o discurso, e a equipe de comunicação que se virasse para dar o melhor tratamento àquele conteúdo. Construiu um Programa de Governo dentro dos programas de campanha e praticamente definiu, num debate na TV, a disputa com Paulo Maluf pelo governo paulista em 1998, tirando da cartola a comparação da biografia dos dois. Sensibilidade de político, segundo Osvaldo Martins, coordenador das campanhas eleitorais de Mario Covas. Nesta entrevista, ele conta como era trabalhar com o Covas candidato.
FMC - Como o Mario Covas participava das decisões da campanha eleitoral? Osvaldo Martins - O Mario sempre repetia: “Eu sou candidato, meu negócio é ir para a rua pedir voto”. Ele nunca viu o layout de uma peça antes de ela ir para a gráfica. Eu sabia que ele não ia querer ver, mas levava a arte final, o layout dos outdoors e a fita da gravação do programa de televisão que ia ao ar no dia seguinte. Ele nunca assistiu nem a gravação nem o programa no ar porque estava na rua, em eventos. Covas era completamente desligado desse assunto, o que aumentava a
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responsabilidade de quem conduzia a área. Delegava totalmente, mas existem momentos em que há necessidade de falar, são decisões políticas de muita importância. FMC – Cite um desses momentos. Osvaldo Martins - Lembro que, em 1994, o Fernando Henrique Cardoso ganhou no primeiro turno, e nós fomos para o segundo turno contra o Francisco Rossi. O Mario fez uma reunião no escritório dele e chamou toda a cúpula do PSDB para definir os rumos, as estratégias do segundo turno. Reuni meu
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pessoal dois dias antes, discutimos e cheguei ao encontro cheio de propostas do que deveria ser feito. Começou a reunião, e eu quieto, esperando que o candidato pedisse que eu falasse alguma coisa. Mas, antes de mim, até pela ordem hierárquica, estava o Franco Montoro e outros políticos de peso. Ninguém deu sugestão, a não ser uma, do Montoro. Na campanha do Fernando Henrique Cardoso, que ganhou no primeiro turno, os jingles cantados pelo Dominguinhos fizeram grande sucesso, e o Montoro sugeriu contratá-lo para fazer os jingles do Mario Covas para o segundo turno. A sugestão, muito boa, foi adotada. Então eu disse: “Acho que a gente deve colar na vitória do Fernando Henrique. A nossa estratégia deve ser de união do governo do Estado e do governo federal”. Já cheguei com o slogan e o layout da fusão da bandeira de São Paulo com a do Brasil, foi tudo aprovado e eu saí dali já para fazer as coisas. FMC - Era fácil lidar com essa questão, apesar do aumento da responsabilidade... Osvaldo Martins - Sempre foi fácil, porque eu sempre fiz aquilo que me pareceu o melhor. Procurei me cercar de pessoas competentes, que deram grandes contribuições às campanhas. Eu era um coordenador, mas de uma equipe altamente qualificada em todas as áreas. Tinha tranquilidade e segurança de que aquilo era o melhor que podíamos produzir, e o Mario Covas achava a mesma coisa, por isso, não opinava. Esse assunto para ele era tabu; negócio de comunicação ele nunca entendeu direito. Nós tivemos brigas homéricas a vida inteira, e todas as vezes que eu tentei explicar pacientemente algumas coisas dos fundamentos da comunicação, ele nunca quis saber. Trabalhava muito com a sensibilidade de político. Ele tocava, criava, discursava, tinha criação, como, por exemplo, o tiro mortal no Paulo Maluf.
causa dos pedágios, frutos das concessões de rodovias. Ele foi para o debate principal, na TV Bandeirantes, armado até os dentes de coisas de pedágio para infernizar o Covas, numa estratégia orientada pelo Duda Mendonça. O Mario Covas adotou a seguinte postura: “Ô Maluf, nós fomos colegas de escola, somos contemporâneos, temos sessenta anos, temos história, temos uma vida política. O eleitor vai decidir por um de nós por tudo o que já fizemos, pela nossa história, pela nossa biografia. Não vai ser por essa questão boba aí que você está querendo impingir, como se o eleitor fosse tolo e tomasse uma decisão importante dessa, sobre duas figuras conhecidíssimas, em cima de tema menor. O eleitor vai parar para pensar e vai ver a minha biografia, vai ver a sua e tomar a decisão”. FMC - E isso foi ideia dele? Osvaldo Martins - Foi. Infelizmente, os políticos atuais se demitiram do comando da campanha, entregaram-se de corpo e alma aos marqueteiros e, por isso, não têm mais ideias, essa coisa que está na sensibilidade do político. No momento em que o político usa um determinado discurso, cabe à comunicação dar o melhor tratamento àquele conteúdo. Atualmente, o político quer que o marqueteiro crie também o discurso, é uma inversão total. E não é de hoje. FMC – Os marqueteiros ajudam a organizar as ideias. Osvaldo Martins – Exato. Pegam a ideia, vão até mudar as palavras, criar slogans, mas a sensibilidade política é do político, e essa é intransferível. Transferir isso para os publicitários é a falência da ação política. FMC - O Mario Covas gostava de ir para o telemarketing da campanha conversar com as pessoas por telefone...
FMC – Que tiro foi esse? Osvaldo Martins – Gostava muito porque Osvaldo Martins - A guerra das biografias. Em 1998, o Paulo Maluf escolheu como tema do segundo turno bombardear o Mario Covas por
era uma forma de comunicação direta. Ele gostava de rádio também porque era ágil, conversava ao vivo com os ouvintes. O que ele
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não gostava da imprensa, em geral, era falar uma coisa, o sujeito anotar e depois escrever outra coisa. Ele morria de medo disso, que acontece com muita frequência no dia-a-dia. No call center da campanha a governador, ele falava mais com lideranças, prefeitos do interior etc., sobretudo nos dias da semana que antecediam o da eleição, para animar o pessoal, dar uma injeção de ânimo, dizer “vamos que vamos”. Tem um efeito grande no ânimo das lideranças o candidato ligar e dizer: “Olha, conto contigo”. Ele sabia que era eficiente. FMC - E os resultados das pesquisas, como é que ele recebia? Osvaldo
Martins
Gostava
muito
das
pesquisas qualitativas, porque, mais uma vez, são de linha direta, as pessoas presentes discutem. Numa única vez eu o levei para assistir
à
pesquisa
por detrás do vidro, do
outro
lado
do
espelho que fica na sala da discussão e impede
que
quem
está debatendo veja quem está assistindo. Nessa única vez eu
FMC - Ele respeitava o resultado da pesquisa, acreditava na ferramenta? Osvaldo Martins - O Mario passou a acreditar em pesquisa vendo que a análise que a gente fazia se comprovava nos fatos. Participava da análise e fazia a dele. Aí é que entra o diferencial do político experiente e sensível: as análises dele eram perfeitas. Uma coisa que o Mario Covas sempre teve era a capacidade de analisar a cena política como se ele próprio não participasse dela. Quando ele era deputado e senador, os jornalistas de Brasília gostavam muito de ir conversar com ele, principalmente os comentaristas, porque um papo com Mario Covas gerava material abundante para a análise do quadro político. O Mario sentava e conversava, fazia a análise de coisas nas quais ele estava envolvido, mas falava com tal isenção que os jornalistas adoravam. De outro aspecto, o Mario Covas era uma péssima fonte de informação para os repórteres.
“Mario Covas gostava das pesquisas qualitativas, porque são de linha direta, as pessoas presentes discutem as questões. Uma vez, ele foi ver a discussão sem ser visto. Quando um dos debatedores disse ‘esse Mario Covas é um ladrão’, ele queria invadir a sala, queria tomar satisfação com o cara, foi um sacrifício segurá-lo.”
disse a ele que nunca mais o levaria. Um dos debatedores tinha aquele discurso “político é tudo igual, tudo farinha do mesmo saco, esse Maluf é ladrão, esse Mario Covas também é ladrão”. Quando
FMC - era Ruim de síntese.
o Mario ouviu isso, ele queria invadir a sala, queria tomar satisfação com o cara, foi um sacrifício segurá-lo. Depois que acabou, ele queria ir lá para a calçada pegar o sujeito e discutir, e nós não deixamos. Foi um sufoco. O Paeco segurando de um lado, eu do outro.
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Osvaldo Martins – Isso. Ele sempre ia pelo caminho da análise, e o repórter queria uma resposta sim ou não. Por isso o Mario nunca foi uma boa fonte de informação para repórter, embora fosse o craque da análise.
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FMC – mario Covas era um excelente articulador e tinha um discurso muito afiado. Qual era a importância do debate para a campanha política? Osvaldo Martins – Uma importância muito grande. Por exigência da legislação, os debates ficam um pouco engessados - tempo para cada um, réplica, tréplica, tudo muito chato. Os debates anteriores a essas regras, como os de Jânio Quadros versus Franco Montoro e Brizola versus Collor, eram muito interessantes. Covas gostava de se preparar bem, em reuniões que simulavam o debate. Numa dessas simulações, um dos membros da nossa equipe de comunicação, o Raul Bastos, foi escalado para fazer o papel do adversário, que era o Francisco Rossi, em 1994. FMC – E qual foi o resultado? Osvaldo Martins – Simulando o debate, o Raul se comportou como nós achávamos que o Rossi poderia se comportar. Os dois começaram a discutir, faltou pouco para o Mario Covas dar um murro na cara do Raul, coisa que talvez também faltasse pouco para fazer com o Rossi na mesma circunstância, no ar e ao vivo. Debate era com ele mesmo. Se tivesse que pagar ingresso para entrar na discussão e se meter naquela encrenca, ele pagaria, era o rei da encrenca. Ele tinha orgasmos toda vez que tinha a oportunidade de discutir seus pontos de vista. FMC – A gente sabe que ele tinha sede de informação. Como era, então, montar o conteúdo do programa de televisão para ele? Osvaldo Martins – Houve duas fases, considerando as campanhas de 1994 e de 1998. Em 1994, ainda no primeiro turno, foi um inferno total, entre outras razões porque em paralelo estava sendo produzido o Programa de Governo, que é mais intelectual, enquanto que a produção do programa de televisão é muito mais dinâmica. O compromisso do candidato com o eleitor é quase que exclusivamente aquilo que ele
diz no programa de televisão do horário gratuito do que aquilo que está escrito no Programa de Governo, que vai sair sabe-se lá quando. Ele deixou bem claro que o Programa de Governo era o texto do programa de TV. Moral da história: inverteram-se as coisas nas reuniões realizadas na produtora. Ele chamava pessoas que estavam estudando determinada área, e o que fosse decidido e gravado ali iria para o Programa de Governo e não o contrário. Até o bom entrosamento de todos sobre esse assunto foi um desastre, porque ele encrencava na hora de gravar. Ele não gravava nada do que não concordasse. Afinal de contas, o candidato era ele. FMC – Ou que ele não pudesse cumprir... Osvaldo Martins – Da segunda metade para a frente, ainda no primeiro turno, as coisas ficaram mais fáceis, ele passou a confiar mais na equipe. Em 1998, foi totalmente diferente. Covas gravava uma fala para o programa de educação, trocava de roupa, gravava uma outra fala para o programa de transporte, e a coisa estava tão azeitada, tão entrosada, que raramente ele mudava alguma coisa no texto. Gravava e ia embora para casa, aquele assunto para ele tinha acabado. Ele nem via no ar, porque estava sempre na rua, e muito menos assistia as fitas que eu mandava todo dia para ele ver antes de ir para o ar. FMC – Covas era um candidato bom para a comunicação trabalhar? Osvaldo Martins – Muito bom. Acho que, quando a pessoa é sincera, transparente, é boa para trabalhar em qualquer área, principalmente pessoas que estão no comando do processo, que têm opinião, que não têm cartas na manga. É muito difícil fazer isso hoje em dia. Havia uma relação de interação, respeito mútuo, delegação, sem truques. Atualmente, essa relação não existe, tornouse estritamente profissional. A questão ética fica para segundo plano. O marketing é cada vez mais determinante, impõe coisas a que o candidato se submete. O Mario dizia: “não sou sabonete” e tinha razão.
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FMC – Muita gente fala da participação do Fausto Lourenço Gomes, irmão da Lila, na vida política do cunhado. Que papel ele exerceu na trajetória do Covas? Osvaldo Martins – O Fausto era antenado em política, uma pessoa que tinha muitos atributos. Sou muito suspeito ao falar dele porque sempre fomos muito amigos. Aliás, eu fui para a campanha do Mario em 1962 levado pelo Fausto. Ele era comerciante em Santos, como a família toda da Lila, um cara que conversava com todo mundo, se relacionava com pessoas das mais diferentes categorias, entre elas Roberto Santini, dono do A Tribuna, o principal jornal da cidade. Era amigo mesmo, fraternal. Graças ao Fausto, A Tribuna apoiou a candidatura do Mario Covas a prefeito de Santos. A maior força política da cidade sempre foi e ainda é o jornal A Tribuna. Se você morrer e não sair a notícia “faleceu ontem” no jornal, ninguém vai ao seu velório.
As análises políticas dele eram perfeitas. Foi importantíssimo na vida do Mario Covas. FMC – O Fausto chegou a ir para a prefeitura com o Covas? Osvaldo Martins – O Fausto nunca teve um cargo, mas era o cara que o Mario Covas consultava, respeitava. Fui a única testemunha de um episódio até desagradável na campanha do Fernando Henrique, numa discussão entre os dois. Discutiram sobre coisas que o Fausto estava fazendo na campanha com dinheiro do próprio bolso, dilapidando o patrimônio da família. Ele vendeu um terreno no litoral porque precisava de dinheiro para a campanha do Fernando Henrique. A mulher dele, Dóris, comentou com a Lila, e ela, com o Mario. Ele se achou no direito de puxar a orelha do Fausto. “Você não tem o direito e tal...”. O Fausto ficou caladinho, ouvindo, e eu, quieto feito um vaso. FMC – O Fausto não reagiu?
O Fausto acabou sendo o que hoje chamam de marqueteiro do Mario Covas, na campanha para prefeito em 1961, e no ano seguinte, para deputado federal. Adorava criar materiais originais, e fazia tudo bem feito, com prazer. Era um pouco mais velho que o Mario, e, na função de coordenador da campanha, não só da imagem e da propaganda, o numero 1 da campanha, o Fausto fazia e desfazia, mandava e desmandava, e sempre alegre. Ele foi uma pessoa importantíssima no início da vida política do Mario Covas. Fez essas duas campanhas, o Mario se elegeu deputado federal. Quatro anos depois, em 1966, reelegeu-se deputado já pelo MDB, e o Fausto sempre presente. A última campanha em que o Fausto se meteu de corpo e alma foi a do Fernando Henrique para prefeito, em 1985, aquela que o Jânio ganhou. Aí ele já estava doente, morreu no ano seguinte. Mas era como uma despedida da vida, porque ele adorava fazer campanha eleitoral. Em 1985, eu larguei tudo o que estava fazendo para andar com ele, segurar a pasta, porque eu sabia que ele estava se despedindo da vida, fazendo a coisa de que mais gostava.
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Osvaldo Martins – O Mario falou mais um pouco e, numa pausa mais longa, o Fausto perguntou: “Zuza, já acabou?” O Mario: “Já acabei”. E o Fausto: “Em primeiro lugar, eu queria que você fosse tomar no olho do seu... Segundo lugar, quem é você pra dizer pra mim o que eu devo ou não devo fazer numa campanha eleitoral? O que você sabe de campanha de eleitoral? Você não sabe coisa nenhuma, nunca soube quanto custa uma resma de papel, nunca soube quanto custa um metro de morim (o tecido que se usava para fazer faixa), agora você vem dizer o que eu tenho que fazer? Vá cuidar da sua vida”. Saiu pisando duro, e eu, babaca, saí atrás. FMC – O Covas gostava muito dele e de pessoas que reagiam. Deve ter feito o discurso todo muito constrangido... Osvaldo Martins – Para poder dizer para a família que tinha dado uma dura nele. Deve ter sido muito doído esculhambar o Fausto. Acho até que a esculhambação que ele levou de volta deixou o Covas aliviado, porque chumbo trocado não dói.
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ANOS 60
Em Santos, a primeira candidatura A atuação do jovem engenheiro Mario Covas no socorro às vítimas de deslizamentos nos morros o habilita a candidatar-se a prefeito com o apoio de Jânio Quadros
Foi no final da década de 1950 que Mario Covas uniu-se a Jânio Quadros, uma das grandes forças políticas em São Paulo, para ingressar na vida pública, quando trabalhava como engenheiro da Secretaria de Obras de Santos. Em 1956, depois de três dias de tempestades, a cidade foi assolada por uma série de alagamentos e deslizamentos de encosta dos morros. Como engenheiro da prefeitura, Mario Covas não só participou como dirigiu os trabalhos de socorro à população atingida, tornando-se conhecido. Em 1960, seus contatos políticos foram suficientes para ser convidado a se candidatar à prefeitura de Santos. Jânio Quadros, então candidato a presidente da República, buscava uma liderança política jovem e promissora, e deu a seu fiel escudeiro, Saulo Ramos, a missão de convencer Mario Covas a se candidatar pelo PST – Partido Social Trabalhista. Ele aceitou. 16
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Enfrentando a UDN Nas eleição a prefeito de Santos, Adhemar de
Adesivo de campanha com a girafa de Covas e a vassoura janista; abaixo, trecho de editorial do jornal A Tribuna
Barros, outra grande força política paulista, apoiava Luís La Scala Junior, candidato da UDN – União Democrática Nacional e do então prefeito Silvio Fernando Lopes, seu afilhado político. Os dois grandes jornais de Santos, A Tribuna e O Diário, assumiram posições opostas em relação aos dois candidatos. O Diário apoiava Luís La Scala, e A Tribuna favorecia Mario Covas. Um editorial de A Tribuna ilustra bem isso: “O nome do sr. Covas Junior consubstancia, mais que qualquer outro, o sentido de renovação político-administrativa, que se identifica na atuação dos srs. Jânio Quadros e Carvalho Pinto, consagrada por Santos, ainda há pouco, nas urnas de três de outubro.” (Trecho de Política em Santos — O espírito de renovação, editorial de A Tribuna de 3 de janeiro de 1961).
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A FORÇA DA CORRENTE (Marchinha) A Força da corrente está no Presidente Um bom Governador já temos sim senhor Queremos nesse pleito Para nosso Prefeito O MARIO COVAS que é moço lutador! O MARIO COVAS é o ideal Vai trazer para Santos um progresso colossal O MARIO COVAS sendo eleito É o meu desejo Quem anda para trás... Ei! É caranguejo!
CONSELHO DE AMIGO (Marchinha)
Na primeira marchinha, a alusão ao apoio de Jânio Quadros era explícita: “A força da corrente está no presidente, um bom
OLHE MEU AMIGO! Tenho um recado para você Para Prefeito Municipal Queremos MARIO COVAS Porque é o ideal
governador já temos sim senhor, queremos neste pleito, para nosso prefeito: Mario Covas que é moço lutador!”. Em Conselho de Amigo, a letra enfatizava o que seria a característica mais marcante da vida política
Ele é honesto? É sim senhor! Trabalhador? É sim senhor!
do candidato: “Ele é honesto? É sim senhor! Trabalhador? É sim senhor! O Mario Covas não precisa de confete, eu voto nele nem que chova canivete!”.
O MARIO COVAS não precisa de confete Eu voto nele nem que chova canivete E não precisa serpentina nem confete Eu voto nele nem que chova canivete
Como hoje, a tradição da época exigia de um bom político o apreço pela família. Num dos panfletos de campanha, Covas aparecia em foto com a esposa, Lila, e os três filhos. Abaixo da foto, havia os dizeres: “Este é o
Com o apoio de Jânio, e concorrendo
lar de Mario Covas Junior; na família, um
pelo PST, a campanha de Covas utilizou
símbolo de responsabilidade; na prefeitura,
grandemente os símbolos janistas, como
um padrão de honestidade”.
a girafa com a vassoura. Um leque foi
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produzido e distribuído. Nele, de um lado,
Outro material de campanha de Covas era
havia a fotografia de Covas; do outro, as
um panfleto no formato de uma cédula.
letras de duas marchinhas cantadas à época:
Como o nome dele era o último a figurar
A Força da Corrente e Conselho de Amigo.
na lista dos candidatos, no panfleto havia
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os seguintes dizeres: “Não se esqueça – o último será o primeiro!”. Um “X” ao lado do nome de Mario Covas, já impresso no panfleto, marcava a opção que o eleitor deveria copiar na hora do voto.
Justiça e seriedade desde o início Ao lado de Mario Covas, na chapa, estava o candidato a vice, Nelson Noschese. Após o sufrágio, apenas 5.917 votos separaram ambos do candidato eleito, Luís La Scala Junior, que obteve 28.286 votos, mas não chegou a tomar posse, pois morreu logo depois, vítima de
um acidente de automóvel. Esse fato gerou uma controvérsia na cidade. Uns diziam que o candidato a vice era quem deveria assumir a prefeitura, outros defendiam a diplomação do segundo candidato mais votado. Mas a discussão não foi longe, pois o próprio Covas resolveu a questão, afirmando que o vice deveria assumir. O fato foi de tamanha repercussão para a história nacional que o Supremo Tribunal Federal referendou o entendimento de Covas, criando uma jurisprudência que seria invocada, anos mais tarde, para garantir a posse de José Sarney, Aos 30 anos, mas com cara de 25, Mario Covas fez a foto com a esposa, Lila, e os três filhos para mostrar que tinha responsabilidades
o vice de Tancredo Neves. A Covas restou esperar mais um ano para candidatar-se novamente, desta vez, a deputado federal.
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ANOS 60
Memória do palanque Osvaldo Martins, amigo de Covas e jornalista, relembra aqui momentos da campanha à prefeitura de Santos. Olhando as fotos de época do acervo do Centro de Memória da Fundação Mario Covas, Osvaldo nos ajuda a contar a história. Acompanhe.
“Nesse almoço do Rotary Clube, em Santos, Mario Covas faz uma palestra. Sobre a mesa, o jornal do dia, lido do começo ao fim. À esquerda de Mario Covas está Jorge Bechara, ex-secretário de Turismo da cidade e dono da Casa do Rádio, uma loja de eletrodomésticos”
“Aqui, Mario Covas discursa em comício de sua campanha a prefeito de Santos, em 1961. O slogan ‘Nunca foi tão fácil escolher o melhor’ era reciclado. Ele foi criado três anos antes para a campanha de Carlos Alberto Alves de Carvalho Pinto ao governo do Estado de São Paulo”
“Covas ouve eleitora em meio aos participantes do comício que acabara de fazer. Na mão esquerda, o texto do discurso”
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“No palanque, está o microfone da extinta Rádio Cacique, registrando a fala do candidato. À esquerda de Mario Covas, Átila Casal, ex-secretário de Turismo de Santos e comerciante de café. Ao fundo, o pescoço de uma enorme girafa, símbolo da campanha”
“No Caminhão da Vitória, enfeitado com as vassouras-símbolo de Jânio Quadros, um sindicalista assume o microfone para defender o voto no engenheiro Mario Covas”
“Líderes sindicais e apoiadores da campanha estavam sempre no palanque de Mario Covas”
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“Lila Covas, à direita do marido, acompanha o candidato a prefeito em evento de campanha com um grupo de mulheres santistas. Ela sempre estava por perto”
“Ao final do comício, Mario e Lila Covas se misturam aos apoiadores da campanha. De cabelo liso, à esquerda do candidato, está Gilberto Freitas Guimarães, um entusiasta; de chapéu, Nego Orlando, leão de chácara do Samba Danças. Atrás de Lila está seu irmão, Titi”
“A girafa, símbolo da campanha, rouba a cena no comício. Por que uma girafa? Porque Covas era um candidato ‘à altura’ do cargo. Estima-se que o criador da girafa tenha sido o Dino Andrade, publicitário da agência santista Sinex, responsável pelo visual da campanha. Bom desenhista e caricaturista, Dino publicava charges no jornal A Tribuna”
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ANOS 60
MATERIAL DE CAMPANHA A sofisticação dos materiais de campanha atuais era menos que um sonho no começo dos anos 60, quando Mario Covas concorreu à prefeitura de Santos. Prevaleciam as visitas às comunidades, os comícios e a veiculação de anúncios nos jornais impressos. Em Santos, a maior força política era do jornal A Tribuna, que apoiou a candidatura de Mario Covas, graças a seu cunhado, Fausto Gomes, comerciante bem relacionado na cidade. Veja alguns itens dessa campanha.
Uma das raras peças da campanha de 1961, o pin com a imagem da girafa covista e a vassoura janista era obrigatório na roupa dos correligionários
Boa parte da comunicação dos passos de Mario Covas durante a campanha a prefeito era veiculada nos jornais, como o anúncio da participação na TV (acima) e do roteiro de comícios (ao lado)
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Publicadas no jornal A Tribuna, de Santos, as charges tratam Mario Covas como o candidato de renovação da envelhecida política santista (no alto, à esquerda) e o cavaleiro habilidoso que iria compor com outras figuras proeminentes locais
O programa de governo e as providências planejadas por Mario Covas para conter os deslizamentos nos morros santistas também ganharam as páginas do jornal A Tribuna
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ANOS 60
Rumo à Câmara dos Deputados A carreira política de Mario Covas decola em 1962, quando concorre auma vaga de deputado federal e ganha
A candidatura à prefeitura de Santos permitiu a Mario Covas arrebanhar um eleitorado de proporções suficientes para levá-lo à Câmara Federal: na eleição de 1962, ele entrou na disputa por uma vaga de deputado pelo PST e se elegeu com 30.976 votos. O número com que concorreu era o 615. Na mesma chapa, estava o candidato a deputado estadual Osvaldo Martins. Num dos panfletos de campanha, os dois apareciam em foto, lado a lado; ao centro, os escritos “Candidatos janistas”, abaixo, o lema “Idealismo, trabalho e renovação”. Santinho da campanha de Mario Covas a deputado federal em 1962. O acento agudo no a, de Mario, sumiria do nome do candidato nas eleições seguintes
Na carta de princípios, assinada por Covas e Martins e publicada em jornal santista, os candidatos apareciam em fotos com suas famílias e seus ideais eram enumerados num longo texto datado de 30 de setembro de 1962. Das idéias explicitadas, destacavamse a valorização da família, do respeito às instituições, da ética e da honestidade:
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Mario Covas (à esq.), candidato a deputado federal, e Osvaldo Martins (à dir.), a deputado estadual, posam com suas famílias para a carta de princípios
O credo da dobradinha de candidatos do PST, escrito em 1962, seria revisto e ampliado por Covas em 1968, às vésperas do AI-5, e após os dez anos de cassação de seus direitos políticos
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“CREMOS na Família, célula primeira da
obrigou os produtores a afixarem os preços de
sociedade, na infância, e na juventude,
venda nos rótulos dos produtos de primeira
credoras do melhor de nossos esforços e
necessidade, e o projeto que acrescentou
sacrifícios;
parágrafo ao artigo 20 da lei número 2.800 de 18 de junho de 1956, criando o Conselho
CREMOS na harmonia e independência dos
Federal e Regional de Química. Vários
poderes constituídos legalmente, alicerce da
assuntos e temas foram contemplados nos
ordem jurídica, econômica e social;
projetos de lei do deputado Mario Covas. Mas algo mais sério estava por vir. Com o golpe
CREMOS na Pátria, Livre, independente
militar de 1964 e a derrubada do presidente
e soberana, mercê do trabalho de seus
João Goulart, o país começava um processo
filhos, e da predestinação da nacionalidade
de endurecimento político contra o qual
brasileira; e, porque
Covas iria se contrapor ferozmente.
CREMOS, daremos de nós a parcela de trabalho e idealismo que nos compete, na
O fim do pluripartidarismo
concretização das aspirações populares, que Após o Ato Institucional nº 2, que extinguiu
nos propomos representar.”
o pluripartidarismo, Covas filiou-se ao MDB (Movimento Democrático Brasileiro), partido Depois de eleito, Mario Covas mostrou que
de oposição que ajudou a fundar e pelo qual
não desejava ser apenas um deputado a
foi reeleito deputado em 1966, tornando-
mais. Logo, tornou-se o vice-líder do PST
se o seu líder na Câmara em março do ano
na Câmara, ficando em evidência para a
seguinte. A seu lado estavam outros políticos
sociedade, para os colegas de mandato e
que se tornariam conhecidos, como Ulysses
para os ocupantes do poder.
Guimarães, Tancredo Neves e André Franco Montoro. Como líder da oposição, Covas Covas
tentou derrubar os projetos do governo que
como deputado foi de bastante trabalho,
limitavam ainda mais a tênue democracia
como demonstrado pelos 23 projetos de
vigente. Em 23 de julho de 1968, Covas
lei
pode-
conseguiu, através de requerimento, criar
se destacar o projeto que autorizou o
uma Comissão Parlamentar de Inquérito
abatimento da renda bruta da pessoa física
para apurar os ataques contra o Teatro Ruth
no imposto de renda relativo ao exercício
Escobar que, em 18 de julho, fora vítima
financeiro (01/08/1963); o projeto que alterou
durante a encenação da peça “Roda Viva”, de
a redação do artigo 33, “caput” do decreto
Chico Buarque, e as origens das organizações
número 51.900, de 10 de abril de 1963, que
Comando de Caça aos Comunistas (CCC) e
elevou os limites para opção pela tributação
Movimento Anti-Comunistas (MAC).
O
primeiro
mandato
apresentados.
de
Dentre
Mario
esses,
baseada no lucro presumido; o projeto que dispôs sobre o recebimento integral do 13º
Tanto
embate
e
salário a todo empregado que, na ocasião do
resultaram
seu pagamento, se encontrasse em gozo do
quando o deputado Márcio Moreira Alves
seu benefício-enfermidade; o projeto que
fez um discurso inflamado contra a ditadura
em
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participação
perseguição.
Em
política 1968,
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que se avizinhava, os militares requisitaram à Câmara licença para processá-lo, o que foi imediatamente rejeitado por Covas, que articulou a sua rejeição. Em 12 de dezembro de 1969, Covas discursou em defesa de Márcio Moreira Alves. A licença para processá-lo foi de fato negada, mas a reação do regime militar foi violenta, com a edição do Ato Institucional nº 5, um dos mais poderosos instrumentos de arbítrio que o país conheceu, fechando o Congresso e cassando mandatos. Mario Covas foi preso e levado para um quartel do Exército em Brasília, onde ficou por oito dias. Ao sair, ficou preocupado, pois o seu nome não constava da primeira lista de políticos cassados pelo regime. Covas temia que a ausência significasse para a opinião pública e os colegas algum tipo de acordo realizado com os militares. Mas em 16 de janeiro de 1969, um mês e três dias depois da promulgação do AI-5, Mario Covas foi destituído do cargo e teve seus direitos políticos suspensos por dez anos.
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Covas discursa em defesa de Márcio Moreira Alves, em 1968; abaixo, material da campanha à reeleição pelo MDB
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ANOS 80
Da Câmara ao Senado Recuperados os direitos políticos, Mario Covas voltou às campanhas, elegendo-se deputado em 1982 e senador em 1986
Após dez anos de cassação, Mario Covas é eleito presidente do diretório estadual paulista do MDB
Enquanto durou a cassação de seu mandato de deputado federal, Mario Covas dedicou-se à iniciativa privada. Montou uma companhia de importação e exportação, mas não teve muito sucesso. Acabou transferindo-se, primeiro, para uma empresa de engenharia de um ex-colega da Escola Politécnica e, depois, para a Ductor, firma que ganhou a concorrência para desenvolver o projeto de gerenciamento do metrô da cidade do Rio de Janeiro. Covas trabalhou na Ductor até 1982. Mesmo cassado, Mario Covas jamais deixou de lado a atividade política. Acompanhava de perto o crescimento do MDB e participava intensamente de muitas reuniões com diversas lideranças oposicionistas ao regime militar. Nas eleições de 1974, o partido deu sinais claros de fortalecimento, elegendo 15 senadores e 165 deputados federais. Nos pleitos seguintes, mesmo não podendo concorrer, Mario Covas coordenou a candidatura de Fernando Henrique Cardoso ao Senado, participando inclusive de comícios. Fernando Henrique elegeu-se senador suplente de Franco Montoro.
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Em 16 de janeiro de 1979, Mario Covas recuperou seus direitos políticos. Ao discursar em Santos, no Teatro Independência, reafirmou os valores democráticos e mandou recado aos militares, dizendo que nenhuma de suas convicções havia sido abalada com o ostracismo a que fora arbitrariamente submetido. Em setembro, foi indicado a presidente do diretório estadual do MDB paulista. Apoiado por Franco Montoro e Fernando Henrique Cardoso, Mario Covas disputou o cargo com Alberto Goldman, que era o indicado de Orestes Quércia. Para evitar uma divisão no partido, optou-se pela chapa única, com Mario Covas na presidência e Alberto Goldman na secretaria-geral. No mesmo ano, o regime militar, procurando enfraquecer a oposição, editou um novo ato, que extinguiu o bipartidarismo. Imediatamente, os políticos oposicionistas fundaram o PMDB, do qual Covas tornou-se o presidente do diretório paulista. Nas eleições de 1982, o PMDB concorreu ao governo do Estado de São Paulo com Franco Montoro. De olho na vaga a vice-governador, estavam Covas e Quércia, nomes fortes do partido. Novamente, para evitar uma divisão interna, Covas desistiu da disputa e dedicou-se à candidatura a deputado federal. Seu número nessa eleição foi o 554. No panfleto de campanha, em cor alaranjada, um longo texto contava a história do engenheiro santista, desde o primeiro mandato até ser cassado pelo regime militar: “Com destacada atuação na Câmara Federal, Mario Covas foi incluído durante seis anos consecutivos na lista dos dez melhores deputados pelos jornalistas credenciados no Congresso Nacional. Líder da oposição na Câmara, ele comandou a resistência democrática que negou licença para processar o deputado Márcio Moreira Alves”. A peça da campanha eleitoral de 1982 explicava ao eleitor a importância que teve Mario Covas na fundação e na consolidação do partido: “O PMDB nasce e se forma em todas as cidades do Interior do Estado e em todos os bairros da Capital, organizando-se em 608 diretórios a partir de diretrizes democráticas, ou seja, com o absoluto predomínio das bases partidárias em todas as decisões. Mario Covas sempre esteve ao Iado dos militantes do PMDB e sempre colocou os interesses do partido acima de tudo”.
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Panfleto da campanha de Mario Covas a seu terceiro mandato como deputado federal, em 1982
O texto terminava enfatizando a sua convicção política, que sempre foi a de defender a ética e o interesse geral: “A ação política de Mario Covas está vinculada à construção de uma sociedade justa e democrática para todos os brasileiros. Sua pregação tem como objetivo o interesse das grandes maiorias e a valorização das classes trabalhadoras. Para Covas, ‘mais importante que falar pelo povo é encontrar os meios pelos quais o povo fale por sua própria voz’”. No panfleto, em letras maiúsculas, estavam escritas as ideias que se tornaram lemas da campanha: “Covas não apenas apóia o trabalhador. Covas trabalha. Covas não apenas prega democracia. Covas faz democracia”. Em novembro de 1982, foi eleito com 300.391 votos para assumir seu terceiro mandato na Câmara de Deputados. Mario Covas tentou a candidatura ao governo estadual, mas Orestes Quércia já havia ocupado a vaga; o próximo passo, então, foi candidatarse ao Senado Federal, em 1986, para participar diretamente da formulação da nova Constituição brasileira, prevista para ser promulgada em 1988. Na campanha ao Senado, as peças da campanha de Mario Covas eram principalmente os bottons, as viseiras, as sacolas e os adesivos. Em todos, estava estampado o seu número, 151. Num dos bottons, os seus marqueteiros inscreveram a frase: “Levo São Paulo no peito”.
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Acima, Mario Covas dá entrevista em 16 de janeiro de 1979, data em que recuperou seus direitos políticos
No alto e ao lado, cenas da convenção do MDB com Mario Covas, como presidente do diretório regional paulista, e Alberto Goldman, como secretário-geral
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Orestes Quércia foi eleito governador e, pelo bom desempenho do PMDB nas eleições, Covas teve votação histórica – a maior já registrada na vida política brasileira: 7.785.667 votos. Em 1º de fevereiro de 1987, ele foi empossado senador. Durante os trabalhos da Assembléia Nacional Constituinte, Covas foi apontado como o parlamentar de atuação mais destacada na sua primeira fase, estando presente em 80% das votações gerais, realizando discursos que mudaram o rumo dos resultados, assumindo posturas nacionalistas e, por vezes, favoráveis à estatização. Sozinho, ele não tinha condições de enfrentar o chamado bloco do “centrão”, que se caracterizava pela postura conservadora em vários assuntos pertinentes à nova Constituição. Por isso, mostrou-se um hábil negociador ao conseguir levar adiante assuntos tidos como indiscutíveis, como foi o caso da reforma agrária.
Em maio de 1982, Mario Covas desiste de postular a candidatura a vicegorvernador, cedendo a vaga para Orestes Quércia
Bottom (acima), sacola de tecido, viseira, mais bottons e adesivos da campanha de Mario Covas a senador, em 1987
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Mario Covas faz o que mais gosta: discurso inflamado na tribuna do Senado Federal; foi o candidato que obteve a maior votação para o cargo, arrebanhando 7,7 milhões de votos
As bandeiras da campanha do PMDB em 1987 unem dois grandes adversários: Mario Covas, candidato ao Senado Federal, e Orestes Quércia, postulante ao governo do Estado de São Paulo
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ANOS 80
O desafio da corrida presidencial Até pó de guaraná entrou no arsenal da campanha de Mario Covas à Presidência da República pelo recém-nascido PSDB
A atuação incansável de Mario Covas fez vários políticos do PMDB se unirem em favor das convicções por ele defendidas. Um deles, entretanto, passou a fazer-lhe oposição velada, atravancando certas tomadas de decisão da ala mais conservadora do partido. O opositor era Orestes Quércia. Essa antiga rivalidade e um sério distanciamento pessoal e político entre ambos provocou o afastamento em definitivo de Mario Covas e seus aliados da cúpula do PMDB, tornando irreversível o racha no partido. Em 25 de junho de 1988, surgiu o Partido da Social Democracia Brasileira, o PSDB, que nasceu da vontade de nomes mais do que conhecidos da política brasileira, como o próprio Mario Covas, Fernando Henrique Cardoso,
José
Serra,
Franco
Montoro,
Pimenta da Veiga e José Richa. Havia o consenso de que o novo partido precisava de um candidato à Presidência da República, inclusive para consolidar suas bases. Mesmo não sendo favorável a participar da disputa, por entender que o momento era complexo, Mario Covas aceitou o desafio e entrou na corrida para a primeira eleição direta para presidente desde o golpe militar de 1964. No dia 28 de junho de 1989, Mario Covas apresentou as bases de sua campanha à Presidência da República. O lema principal era o chamado Choque do Capitalismo. Covas dizia que era hora de o Estado voltar a cumprir as O supertucano MC ilustra o rótulo do democrático pó de guaraná da campanha
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funções para as quais havia sido criado e que, nas últimas décadas, tinha deliberadamente
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Covas discursa sobre o Choque do Capitalismo no Fórum Paranaense de Debates; abaixo, panfleto de campanha
negligenciado. Sua idéia era voltar a focar as diretrizes do Estado para as suas funções típicas e não mais tê-lo apenas como um produtor direto de bens. A campanha de Mario Covas a presidente contou
com
vasto
material.
Foram
confeccionados bonés, viseiras, agendas de telefone, canetas, chaveiros, saca-rolhas, sacolas, batons e pó de guaraná, num recipiente que se assemelhava a um pequeno pote de remédio efervescente de vitamina C, onde estava escrito “Guaraná Tucano – contém alto grau de democracia”, o que lhe garantiu enorme sucesso. Do material escrito, um dos panfletos mostrava Covas acenando, com uma frase sua bem ao lado: “O PSDB fará o que deve ser feito porque conhece o sofrimento do povo e tem a força deste ensinamento para vencer”.
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Em outro material, o partido exibiu, bem
Mario Covas Presidente
resumidamente o que seria o programa
Compromisso e soluções
de governo do candidato a presidente da
. Acabar com o analfabetismo
República, com doze itens:
. Combater doenças endêmicas . Democracia com intensa participação do
. Construir moradias de baixo custo
povo;
. Punir exemplarmente todo e qualquer
. Acabar com a inflação;
caso de corrupção
. Mais empregos e melhores salários;
do governo ou fora dele
. Educação e saúde para todos;
. Oferecer melhor transporte a população
. Reforma agrária e apoio ao uso produtivo
. Promover a reforma agrária
da terra;
. Defender o meio ambiente
. Política agrícola para a produção de
. Apoiar o desenvolvimento da ciência e
alimentos;
da tecnologia
. Primeiro o povo brasileiro, depois a dívida externa; . Administração descentralizada e governo controlado; . Combate intransigente às mordomias, ao privilégio e à corrupção; . Mais casas para quem precisa; . Defesa do meio ambiente e da natureza e . Apoio ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia Jornais de campanha foram cuidadosamente elaborados, redigidos e diagramados pela equipe de Mario Covas. Num deles, a foto aparece em tamanho grande na primeira página, em meio a uma multidão de anônimos. Foi pensada exatamente para transmitir a idéia de que Covas era igual aos que nele depositavam a confiança do voto. A legenda era clara: “Mario Covas: a cara do Brasil”. Nessa
edição,
os
assuntos
abordados
com ênfase eram o discurso no Senado, a
As metas de gestão de Mario Covas eram apresentadas como o programa de governo de seu partido, o novíssimo PSDB
convenção do PSDB que o indicou oficialmente
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e a opinião do próprio candidato quanto às reais chances de se eleger presidente da República. Eram tempos de otimismo, apesar de as chances não serem tão boas.
Na campanha presidencial, os panfletos tornaram-se mais sofisticados, ganhando a feição de jornal. Assim, davam um ar de notícia fresca às atividades do candidato
Os panfletos de campanha reproduziram diversas posturas quanto à candidatura de Mario Covas à Presidência.
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A força da democracia foi o mote da campanha de Mario Covas à Presidência da República
Alguns veículos de comunicação expuseram
no Senado, disse que havia sido a primeira
opiniões, que tiveram diversos trechos
apresentação de um “programa de governo
reproduzidos no panfleto: “O jornal ‘O
completo”. De acordo com a direção da
Estado de São Paulo’ informou que o discurso
campanha do PSDB, importantes apoios
de Mario Covas no Senado teve grande
ingressavam a cada dia, como os aeroviários
repercussão,
inclusive
de São Paulo, os metalúrgicos e professores
pelos líderes de todos os outros partidos
de Santos, os portuários e trabalhadores
com grande entusiasmo. O ‘Jornal da Tarde’
rurais, representados pela Contag.
sendo
aplaudido
afirma que foi um discurso de estadista. Para o ‘Jornal do Brasil’, Mario Covas colheu
Ainda segundo informações de um dos
êxito indiscutível em seu discurso, saudado
panfletos
em prosa e verso, a esquerda e a direita, no
da USP montaram três núcleos do PSDB
mais miraculoso consenso.”
e prepararam kits de propaganda do
de
campanha,
professores
candidato para entregar aos estudantes que Adversários políticos não economizavam
viajaram nas férias, com o slogan: “Se vai
elogios
deputado
sair de férias, leve Covas em sua viagem”.
afirmou
Diversas personalidades do meio artístico
que a candidatura emprestaria à eleição
e dos esportes declararam o voto em favor
“um padrão de ética altíssimo”, e Jarbas
do tucano, como Carlos Alberto da Nóbrega,
Passarinho que, após o discurso do tucano
Sócrates,
Mauricio
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a
Covas,
Correa
como
(PDT-DF),
o que
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Arrigo
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Barnabé,
Gianfrancesco
Angelo Perosa
Fotógrafo da campanha “Minha maratona covista começou na campanha presidencial. Recebi uma missão do Osvaldo Martins, o coordenador, para fazer uma foto do candidato para um outdoor. O publicitário Marcelo Magalhães fez a criação, e a mídia já estava comprada. A ideia era fazer uma foto que ressaltasse os olhos do Covas com a frase ‘Olho no olho, ele é o mais competente’. Fui para Brasília cumprir a tarefa e levei uma armação de óculos, sem as lentes, igual a que o candidato usava. Foi uma confusão total. A foto seria feita no estúdio do programa de televisão. Tudo acertado, no primeiro flash estourou tudo. As instalações eram 220 volts, e o equipamento de luz, 110 volts. O Covas não podia fotografar e nem gravar o programa de televisão. Foi o maior bate-boca entre ele e o Woyle Guimarães. Eu saí correndo e consegui achar um transformador em Brasília. Comprei, voltei para o estúdio, religamos tudo, e o Covas irritadíssimo. O olho dele parecia uma brasa, mas a foto foi feita. Saí correndo para o aeroporto e voltei para São Paulo. Fazia 28 horas que o laboratório fotográfico estava aberto, esperando para fazer a revelação.”
Outdoor feito com óculos sem lentes e um candidato irritado com os problemas de equipamento
Guarnieri, Jô Soares, Arnaldo César Coelho,
honestidade na política, por ele defendidas
Juca Kfouri, Lima Duarte, Toquinho, Rita
desde o seu ingresso na vida pública. Um
Lee e Roberto de Carvalho. Numa pesquisa
samba foi composto por Hélio Turco, Jurandir
realizada na Faculdade de Comunicação
e Alvinho com uma letra mais que divertida
Cásper Líbero, Covas aparecia em primeiro
e que continha todos os ingredientes para
lugar com 36% dos votos, seguido por Lula,
conquistar o eleitor indeciso. A música
Brizola e Collor. A campanha de Mario Covas
falava de esperança, ética e uma necessária
enfatizou bastante a questão da ética e da
“libertação” do sofrido povo brasileiro:
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O Brasil de Mario Covas (Vai Mudar) Samba de Hélio Turco, Jurandir e Alvino Brasil... oh meu Brasil Chegou a hora O sol da liberdade vai brilhar Não será em vão a nossa luta Hoje o mundo pergunta Quando este gigante irá despertar O pobre chora de agonia O rico embala sua rede (bis) O meu Brasil ainda é Só um mapa na parede Vai mudar com Mario Covas Tudo isso vai mudar Chega de corrupção Colarinho branco Seu lugar é na prisão As injustiças sociais Não existirão jamais No amanhã republicano Quem voa mais alto (bis) É o tucano
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Apesar de tanto esforço e trabalho na
brasileiro. Em seu Estado, ele ficou em
campanha, a experiência política de Mario
segundo, atrás de Fernando Collor. Houve
Covas o permitia enxergar que seu nome
uma tentativa de Leonel Brizola, no terceiro
não estava entre os favoritos da corrida
posto, de fechar acordo com o segundo
presidencial. Mesmo assim, em alguns
colocado, o candidato do PT, Luis Inácio Lula
momentos, ele chegou a acreditar que
da Silva, para que ambos renunciassem em
poderia tornar-se uma surpresa.
favor da candidatura de Covas.
Mas não foi assim. Depois que as urnas foram
Brizola dizia que “apenas Covas conseguiria
abertas e todos os votos contabilizados, o
derrotar Collor no segundo turno”. Lula não
resultado conferiu a Covas o quarto lugar,
aceitou. Mesmo assim, obteve o apoio do
com 11,52% da preferência do eleitorado
tucano, explicitado em palanque, no Rio.
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p r o p a g a n d a p o l í ti c a
Woyle Guimarães
coordenador do programa de televisão
Bottons da campanha presidencial de Mario Covas
“Eu tinha acabado de sair da TV Globo quando o Osvaldo Martins me convidou para fazer o programa de televisão da campanha presidencial de Mario Covas. Fiquei muito honrado e fui para Brasília. Naquele momento, a agência DPZ já estava envolvida na campanha de um partido político que estava nascendo, o PSDB, que trazia uma nova visão política. O Covas que conheci era explosivo, autêntico e tinha consciência do papel que representava como político. À primeira vista era formal, preocupado com a campanha, mas depois foi ficando alegre e expansivo. Era reflexivo e tinha medo de ser transformado em boneco de TV. Ele queria gravar como se estivesse em uma tribuna, onde podia ser eloquente, falava de cima para baixo e com maior volume de voz. Mas na televisão tinha que ser diferente. Começaram as gravações e a campanha na rua era tumultuada por ser a primeira de um partido que não tinha base pelo país. Em alguns Estados, nem lugar para comício tinha, e muitas vezes o candidato chegava e não havia ninguém esperando. Foi uma campanha guerreira, com envolvimento, Covas olhando de frente, falando a verdade, como sempre. Era um grupo de políticos idealistas, já com experiência e que acreditavam que Covas ganharia. No final, escrevi uma carta para Covas, declarando minha admiração por sua luta, por seus ideais e sua intransigência com as coisas malfeitas. Era uma carta de carinho. Covas respondeu meses depois, já em campanha para o governo de São Paulo. A resposta veio com um pedaço de discurso e uma dedicatória. Vou guardar isso para sempre.”
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Saca-rolhas e batom integraram o material de campanha de Mario Covas
Para lembrar do candidato tucano na corrida presidencial, canetas esferográficas com tinta vermelha e azul, além de sacolinhas plásticas e agenda de telefones
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Viseiras e bonés para a cabeça do eleitor
Eleitora de Mario Covas ganhava lápis preto para os olhos; para os homens, chaveirinhos dos mais diversos formatos e cores
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ANOS 90
Por um governo honesto Sem muito entusiasmo, em 1990 Mario Covas concorre ao posto de governador de São Paulo, mas perde para Fleury
No ano seguinte à campanha presidencial, Mario Covas concorreu ao governo do Estado de São Paulo. Foi à luta sem o mesmo entusiasmo da campanha anterior, mas, como homem do partido, aceitou a convocação das principais lideranças do PSDB e de suas bases eleitorais. O partido precisava de um candidato forte, e Covas, novamente utilizando o número 45, adotou como um dos lemas o “Hoje, seu voto pode valer um governo honesto”, estampado em panfletos de sua campanha eleitoral. 44
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Mario Covas, em campanha ao governo do Estado de São Paulo, ergue os braços com Fernando Henrique Cardoso (à esq.), André Franco Montoro e Paulo Renato (à dir.)
A campanha de 1990 caracterizou-se pela ampla utilização de cores, como o amarelo, o azul, o verde, o vermelho, o laranja e a diversidade de apetrechos, como apitos, chaveiros, camisetas, adesivos e papéis de vários tamanhos e formas. A eleição acabou vencida pelo candidato de Orestes Quércia, Luiz Antonio Fleury Filho. Covas não conseguiu sequer disputar o segundo turno.
Apitos de todas as cores marcaram a barulhenta campanha ao governo de São Paulo
Compromissos de Mario Covas com São Paulo • Estimular o crescimento de sua economia, em parceria com a iniciativa privada e municípios, com projetos que transfiram renda para os mais pobres, como um forte programa de construção de moradias. • Cuidar das pessoas e do meio ambiente em que vivem, preservando sua saúde, recuperando seus rios e seu solo, e exterminando a imperdoável incompetência que causou o sucateamento dos hospitais. • Fortalecer o patrimônio de seus habitantes, modernizando sua economia, melhorando e ampliando a infraestrutura e investindo na educação, nos equipamentos de ensino e nos professores. • Administrar com competência, autoridade, sensatez, austeridade, e valorização do serviço e dos servidores públicos. • Preservar suas conquistas culturais e econômicas, para o bem do Brasil e dos brasileiros.
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No corpo a corpo no interior, Covas cumprimenta um simpatizante de sua candidatura
Zulaiê Cobra Ribeiro
candidata a vice na chapa de Mario Covas “Mario Covas me chamou no dia 1 de junho de 1990, e a convenção era no dia 3. Fiquei muito contente, encantada, era viúva recente, não sabia se sairia candidata a deputada federal, o que significava mudar para Brasília, e meus filhos eram pequenos. Deputada estadual não era do meu feitio, eu queria fazer reformas constitucionais. Mario Covas me chamou para vice, ele ia apresentar meu nome na reunião da executivae. Ele falou: ‘Só saio candidato se você for minha vice e não quero você lá’. Eu não fui. Tinha cinco pré-candidatos a vice, todos homens, Geraldo e Robson Marinho entre eles. Eu não tinha sido nada ainda, e ele cortou qualquer manifestação contra mim: ‘Ou aceitam ou saio e não volto!’ Fui para a convenção, tenho belas fotos, muito orgulhosa. É bom que se saiba que em 1990 era muito difícil mulher ser vice. No comício, em carreata, perguntavam: ‘Quem é aquela mulher ali?’”
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Na camiseta, o tucano aparece discreto, mais gráfico, dando força a Covas, em letras graúdas
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O candidato, rodeado de crianças. Atrás e à esquerda dele, Antonio Perosa, deputado federal
Convenção do PSDB. Essa foto foi feita para o encerramento da campanha no programa de televisão. Foram ao estúdio: Ruth Escobar, Rubens Lara, José Serra, Franco Montoro, Ricardo Trípoli, José Maria Guimarães Monteiro, Paulo Kobayashi, Getulio Hanashiro, entre outros
Pausa na campanha para um cafezinho no bar com Zulaiê Cobra, candidata a vice. Na mão de Zulaiê, os santinhos de Covas
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nacional em torno de Itamar. Em janeiro
“Na campanha para o Senado, Mario Covas sentava num banquinho no estúdio e contava uma história. Foi eleito com quase 8 milhões de votos. Em 1990, ele insistia no mesmo conceito. Mas era preciso apresentar o programa de governo, e Covas não aceitava ponderação de não entrar na briga com Fleury. A campanha começou com 42 pontos nas pesquisas e terminou com 14. Ele não queria ser candidato, estava extremamente mal humorado. Quatro anos depois, ele quis e se elegeu. A coisa era tão complicada que um dia me ajoelhei aos pés dele e implorei que gravasse o programa. Mas não adiantava, qualquer alternativa que eu ou o Marcelo Vaz apresentássemos ele não aceitava. Mas não dizia o que queria. Fomos ficando sem programa.”
de 1993, Fernando Henrique Cardoso deixou o Senado para assumir o Ministério das Relações Exteriores. Covas, então, assumiu a liderança da bancada do partido. A passagem de Mario Covas pelo Senado foi de intenso trabalho. Os seus projetos foram quase sempre pautados pela defesa do interesse social, das minorias e da transparência
no
exercício
da
política.
Um deles, de 19 de abril de 1990, instituía renda mensal vitalícia em favor de pessoas portadoras de deficiência e dos idosos; outro, de 24 de abril do mesmo ano, dispunha sobre a proteção do mercado de trabalho da mulher. Mario Covas também apresentou projeto de lei em favor da regulamentação do regime de trabalho da categoria dos trabalhadores domésticos, um projeto para regulamentar
Paulo Markun
as profissões de engenheiro, arquiteto e
coordenador do programa de TV
engenheiro agrônomo e, inclusive, numa arrojada empreitada, projeto para disciplinar a prática do aborto.
De volta ao Congresso Nacional
Na questão da transparência, nem os partidos políticos escapavam de Covas: um
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Depois de perder a disputa para o governo
projeto de lei de 24 de setembro de 1992
de São Paulo, Mario Covas voltou à vida
dispunha sobre a imunidade tributária
parlamentar num momento importante
dos partidos políticos, vedando-lhes a
para o país. Logo ele, que a vida toda
isenção de impostos na importação de
defendeu a ética e a honestidade, deparou-
veículos automotores. Outro projeto tornou
se com um processo de impeachment do
obrigatório,
então presidente Fernando Collor de Mello,
divulgada pelas emissoras de televisão, a
acusado de estar ligado a Paulo César Farias
apresentação ao vivo dos candidatos; em 16
na suposta operação de um poderoso
de abril de 1991, um projeto de lei de Mario
esquema de corrupção no governo federal.
Covas estabeleceu normas para a realização
Fernando Collor renunciou ao mandato
das eleições municipais que iriam acontecer
em 29 de dezembro de 1992, antes de seu
em 3 de outubro de 1992. Enquanto senador
impeachment ser votado no Congresso.
da
Quando o vice Itamar Franco assumiu a
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do
Presidência, no PSDB foi Covas quem primeiro
Congresso Nacional, encarregada de levantar
defendeu a tese de um governo de união
as causas do atraso tecnológico do país.
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na
República,
p r o p a g a n d a p o l í ti c a
propaganda
Mario
Covas
eleitoral
presidiu
a
ANOS 90
A revolução ética Com jargões simples e certeiros, Mario Covas expressou o cansaço do eleitor com políticos que prometiam e não cumpriam, elegendo-se governador em 1994
Convenção do PSDB, no Anhembi, São Paulo. Mario Covas, muito suado, dá a mão a Fernando Henrique, Franco Montoro e Robson Marinho, à direita, e a Geraldo Alckmin, José Serra e Antonio Cabreira, representante do setor rural paulista, à esquerda
Em dezembro de 1993, Mario Covas candidatou-se novamente ao governo de São Paulo. Nessa campanha, ele ampliou o número de colaboradores para contribuir com a união do PSDB. Sua proposta para São Paulo era arrojada e séria: Covas queria inovar em várias frentes, que chamou de “revolução ética”, “revolução administrativa” e “revolução contra o desperdício”.
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Mario Covas sabia que iria encontrar um Estado
praticamente
falido.
Por
isso,
planejava de forma muito racional como iria começar o seu governo se vencesse as eleições. O ambiente político da época era muito favorável ao PSDB. Como ministro de Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso
Robson Marinho
havia lançado o Plano Real e, praticamente,
coordenador geral da campanha de 1994
selado sua vitória à Presidência da República. O partido teria uma das melhores votações de sua curta história.
“Em 1994, eu estava afastado da vida pública e recebi o convite de Covas para coordenar a campanha. Junto com o convite vieram duas recomendações: primeiro, que nenhuma briga, nenhuma
“Várias pessoas queriam ajudar Mario Covas na Fundação Getúlio Vargas. Também havia os engenheiros da Poli que sempre o acompanharam, além do pessoal que havia vivido a experiência da prefeitura. Além desses, muita gente procurava a Casa do Programa. O que na verdade era um complicador: talvez seja mais fácil administrar a escassez do que a abundância. Foram criados 30 grupos de trabalho. Para que não houvesse um único coordenador em cada grupo, que poderia pensar que já seria secretário, entregamos o comando a três pessoas: um político, um ligado a universidade e outro de empresa. Cada um levou seu próprio contingente. Era muita gente, a dificuldade era deixar de discutir o programa, todo mundo queria conversar. Eu não podia derrubar o entusiasmo nem deixar o programa escapar de nossas mãos. Era uma loucura. A campanha já nas ruas e o programa sendo elaborado. Havia divergências, discórdias, conflitos entre a equipe. E a GW, produtora do programa de televisão, pressionando. Até que um dia, o Luiz Gonzalez pega um livrinho qualquer e mostra no ar como sendo o Programa de Governo. Mario Covas ficou muito bravo!”
Antonio Angarita
coordenador do Programa de Governo e secretário de Governo
disputa, nenhuma fofoca de campanha eleitoral chegasse até ele. Que tudo fosse resolvido e estancado antes de chegar a ele. E, segundo, que fizéssemos uma campanha de acordo com os recursos arrecadados e no ritmo dos recursos financeiros que estivessem disponíveis. Nunca gastar um tostão além daquilo que fosse arrecadado, porque ele não tinha patrimônio pessoal para honrar dívida de campanha. E assim foi feito.”
Com Mario Covas, não foi diferente. Em sua campanha, os jargões foram simples e certeiros, demonstrando a certeza do candidato de que o povo já estava cansado de políticos que prometiam muito e não cumpriam quase nada. Covas foi direto, exprimindo o pensamento coletivo
num
de
seus
panfletos:
“Quero respeito, experiência e pé no chão”. Noutro, prometeu, com a frase: “Compromisso com o Povo” e num outro impresso, escreveu uma quase profecia pois, com a foto desenhada do Palácio dos Bandeirantes ao fundo, em primeiro plano, lia-se: “Breve aqui Mario Covas”.
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Os adesivos tomaram as mais diversas formas e conteúdos na campanha de 1994. Num deles, que trazia estampado o desenho do Palácio dos Bandeirantes, escapou o acento agudo que tanto irritava Mario Covas, mas foi profético, com a inscrição: “Breve aqui Mario Covas”
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A verdade é que a campanha foi tão séria como as outras, mas o clima favorável ao PSDB oferecia um ambiente de tranqüilidade ao candidato. Não poderia ter sido diferente o resultado das urnas, que deu a Covas vitória fácil sobre o adversário Francisco Rossi.
A combinação de amarelo e azul utilizada pelo PSDB cede à predominância do azul nas bexigas, indicando otimismo com a candidatura de Mario Covas
Sergio Kobayashi
coordenador de infraestrutura e eventos “Mario Covas era uma figura ímpar. A gente sempre tinha certeza de que no palanque, de todos os oradores, o melhor discurso seria o dele. Na campanha, eram cinco ou até oito cidades por dia e, é claro, que o discurso, para nós, ficava repetitivo. Mas ele tinha a sagacidade e a experiência de colocar coisas locais, às vezes fruto de um pequeno briefing. Todos adoravam, paravam para ouvir e com atenção, pois achavam que aquele era um discurso único, preparado exclusivamente para eles. Típico orador de instinto humanista, mesmo com sua formação na área de exatas. Covas era engenheiro, mas um humanista por excelência. Ele sabia que aquilo era o cerne do processo eleitoral. Mario Covas detestava ficar no comitê. Nós tivemos comitê na avenida Brasil. Ele foi lá três vezes, odiava, até porque achava que todo mundo que ficava em comitê não fazia nada. Covas sabia que em eleição era preciso buscar votos, portanto, tinha uma agenda horrorosa e cansativa. Começava às nove da manhã e era uma verdadeira máquina de caçar votos. Passava meses comendo sanduíche, de preferência dentro do carro ou do helicóptero para não perder tempo. Campanha para ele era rua, abraçar as pessoas, abraçar, pedir voto, ouvir reclamação e conversar. Ele vivia isso como um dos momentos deliciosos de sua vida.”
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No primeiro turno, Covas obteve
6.574.517 votos.
No segundo turno,
8.661.960 votos
contra 6.771.456 votos do pedetista.
Ao assumir, o Estado estava um pouco pior do que ele havia imaginado, pois a dívida vencida já era de, pelo menos,
70
bilhões de reais e quase toda a arrecadação de impostos consumia-se no pagamento da folha. Era preciso pôr em prática o chamado ajuste
Danilo Palásio
Editor Chefe do Programa de Televisão “Lembro que aquele foi um ano atípico porque não podiam ser usadas imagens externas nos programas. Foi uma dificuldade. Na pré-campanha, nós viajamos pelo interior do Estado e tínhamos as imagens de todas as obras que estavam paradas, mas a lei não permitia, portanto só pudemos usar fotos. Fizemos vários testes no estúdio e Mario Covas queria dar o tom do texto. Ele brigava sempre com o texto. Suas atitudes deram para a equipe o sentido de seriedade, que acabou cativando a todos. As novas regras também proibiam a computação gráfica, e o cenário desenvolvido tinha as cores de São Paulo, portanto, o mais conveniente era usar roupas claras. Pois bem, Covas chegava para gravar com as roupas dele, escuras e com listas. A figurinista apresentava camisas e gravatas mais adequadas. Covas olhava e era sempre uma dificuldade convencê-lo a usar aquelas roupas. O segundo turno foi com Francisco Rossi. Foi muito tranquilo. Covas ia muito bem nas pesquisas, tinha mais estofo político e muito mais credibilidade.”
fiscal e tentar a renegociação da dívida com o governo federal.
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Principais realizações do primeiro mandato A União queria intervir no Banespa e, para
O governador Mario Covas também se
isso, entrou em contato com Mario Covas para
preocupou em imprimir qualidade ao serviço
que ele, governador, pedisse a intervenção.
público para melhor atender à população.
Covas negou: disse que, se o governo federal
A principal ferramenta utilizada por sua
queria o banco, que o tomasse por conta
administração foi a tecnologia. Em dezembro
própria, obedecendo aos limites legais. O
de 1995, foi criado o Programa Permanente
problema é que, quanto mais se estendia
de Qualidade e Produtividade; no ano
a renegociação, mais a dívida paulista
seguinte, houve a instalação da Câmara
aumentava. Covas, um homem de centro
Paulista de Telecomunicações e Informática.
esquerda, relutou, mas acabou aplicando
A ideia era interligar diferentes setores do
a cartilha liberal, pois reconheceu que
governo para tornar as transações mais ágeis
era impossível, àquela altura, investir na
e precisas. Na verdade, o que Covas queria
melhoria das empresas públicas paulistas,
era criar o “governo eletrônico”, tanto
por isso, aceitou as desestatizações como
para aprimorar o atendimento à população
parte do seu programa de governo.
quanto para fiscalizar de perto, e com precisão milimétrica, os gastos do Estado.
Primeiro, foi a Companhia Paulista de Força e
54
Luz, em novembro de 1997. No mês seguinte,
O Cartão Eletrônico de Compras, para o
a Eletropaulo. Em julho de 1998, a CESP foi
controle dos adiantamentos de despesas
privatizada e, no primeiro semestre de
de funcionários, e a Bolsa Eletrônica de
1999, a Comgás. Antes das desestatizações
Compras, destinada a racionalizar e controlar
terminarem, o Estado já havia obtido
as aquisições do governo, foram os primeiros
condições
poder
produtos tecnológicos de grande repercussão.
renegociar a dívida com o governo federal.
Para acabar com a prestação de contas dos
Todo o dinheiro obtido foi utilizado para
servidores através de notas fiscais, origem
pagar dívidas. Cerca de 120 mil postos de
de fraudes inúmeras, o governo de Covas
trabalho foram fechados na administração
implantou cartões de crédito com limites
direta e nas empresas estatais.
iguais aos dos adiantamentos.
Apesar de as medidas de austeridade sempre
A ideia de criar a Bolsa Eletrônica foi a de
configurarem um perigo para qualquer
promover uma espécie de mercado virtual,
político, Covas foi o que mais as consumou
pela internet, num ambiente asséptico
de maneira profunda. Para o cidadão, a
de concorrência entre compradores do
impressão que se tinha é que, apesar das
governo e vendedores da iniciativa privada.
medidas, o Estado estava fazendo a sua
O passo seguinte foi investir num salto de
parte. Não foi possível evitar a privatização
qualidade no atendimento ao público. Para
do Banespa, mas a Nossa Caixa foi salva, e
isso, foi criado o Poupatempo – Central de
o governo paulista, finalmente, fechou um
Atendimento à População, a fim de reduzir
acordo para interromper em definitivo a
drasticamente o tempo que o cidadão
escalada da dívida que assolava o Estado.
gastava para conseguir informações nas
mais
favoráveis
para
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Na convenção do PSDB, Covas anima os correligionários ao lado de dona Lila, Geraldo e Lucia Alckmin e Greco, que elegeu-se prefeito de Mauá posteriormente
Em carreata no centro de Campinas, ainda no primeiro turno, José Roberto Magalhães Teixeira, prefeito da cidade e mais conhecido como Grama; Fernando Henrique Cardoso, Mario Covas e José Serra
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Mario Covas no estúdio da produtora GW, gravando o programa de televisão da campanha
Mario Covas adorava pastéis, mas os que mais gostava eram os feitos por Fofa (à dir.). Ela e a irmã Lurdinha (à esq.), ambas da Zona Leste de São Paulo, eram militantes do PSDB e covistas de carteirinha
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repartições públicas, para obter ou renovar
rapidamente alcançado e abriu caminho
documentos. O Poupatempo não só se
para a implantação do sistema de progressão
consolidou, atendendo a milhões de pessoas,
continuada, já largamente utilizado em
como foi copiado por outros Estados.
países da Europa. Por esse sistema, o aluno que não conseguisse a aprovação em uma
Mario
Covas
enfrentou
outro
desafio
determinada disciplina, em vez de repetir
assim que assumiu o governo: devolver a
integralmente a série, receberia reforço
credibilidade à educação pública. À época,
escolar no que não conseguiu aprender.
os estudantes das escolas estaduais ficavam
Mas talvez a principal medida adotada
pouco tempo em aula, o material pedagógico
pelo governo Covas foi a informatização
era atrasado ou estava em mau estado, e a
do cadastro de matrículas na rede, que
infraestrutura escolar era avaliada como
contabilizou a existência de quase 300
muito ruim. Através da sua então secretária,
mil matrículas duplicadas, o que gerava
Rose Neubauer, Covas decidiu que era preciso
desperdício na compra de merenda e na
realizar uma reforma que contemplasse
contratação de professores.
todos os estudantes da rede. Na área da habitação, Mario Covas exigiu A proposta era racionalizar a ocupação e
modernização.
estender o tempo de aula. O objetivo foi
construtoras e indústrias da construção
O
governo
incentivou
Mario Covas, Lila Covas, José Serra, Ruth Cardoso e Fernando Henrique Cardoso no encerramento da campanha de primeiro turno, em 1994
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No segundo turno, Mario Covas e Francisco Rossi participam de debate na TV Bandeirantes, mediado por Joelmir Beting. Duda Mendonça, marqueteiro de Francisco Rossi, seria derrotado de novo na eleição seguinte, em que pilotou a campanha de Paulo Maluf
civil a desenvolverem tecnologias para a
No âmbito da Saúde, o governador Mario
realização de testes na CDHU. Um exemplo
Covas encontrou uma situação que beirava o
dessa proposta foi a implantação das caixas
caos: havia catorze obras iniciadas e jamais
d´água acopladas aos vasos sanitários, que
concluídas. Optou, num primeiro momento,
economizavam, cada uma, oito litros de
por terminar essas construções e somente
água a cada descarga. Outra alteração foi
depois planejar o que fazer. Terminada essa
a realização de sorteios para a aquisição
primeira fase, o governo do Estado construiu,
da casa própria. Ao contrário de antes,
ao todo, quinze hospitais, aumentando para
quando o sistema de escolhas quase sempre
seis mil o número de leitos disponíveis.
privilegiava afilhados políticos, o novo método oferecia chances iguais a todos.
Outra medida foi a criação das chamadas Organizações Sociais, através de aprovação
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O sucesso foi tão grande que milhares de
da Assembléia Legislativa. Dessa forma,
pessoas acompanhavam os sorteios quando
o governo podia autorizar a assinatura
eram realizados. Mas uma outra inovação foi
de contratos de gestão com entidades
tão contundente que marcou a concessão
beneficentes que recebiam dinheiro estatal
de casas próprias pelo governo do Estado de
para a contratação de pessoal e compra de
São Paulo. O contrato da nova casa não seria
medicamentos, o que facilitava a tomada de
mais posto em nome do marido, mas da
decisões em favor do melhor atendimento
mulher, que se tornaria a única proprietária
justamente por ser realizada no âmbito
do imóvel. Essa medida foi diversas vezes
da iniciativa privada. Em Saúde, Covas
ovacionada pelo público que acompanhava
não hesitou. Logo no início do mandato,
os sorteios. Foi uma escolha mais que
começou a regularização dos contratos de
acertada, na opinião de toda a sociedade.
trabalho de 12 mil pessoas que, de forma
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No intervalo do debate na TV Bandeirantes, no primeiro turno, o mediador José Paulo de Andrade toma um café e Covas conversa com Luiz Gonzalez, coordenador do programa de TV da campanha; à esquerda, o candidato Francisco Rossi
irregular, atuavam como prestadores de
foi entregue o novo prédio do Arquivo do
serviços nos hospitais estaduais localizados
Estado de São Paulo e concluídas as reformas
no município de São Paulo, criou o programa
da Pinacoteca do Estado. Unindo a Educação
“Dose Certa” – garantia de fornecimento de
e a Saúde, houve a implantação do projeto
41 medicamentos básicos aos 645 municípios
“Prevenção também se ensina”, voltado para a
do Estado, forneceu apoio técnico a 402
promoção da cidadania saudável, que atingiu
municípios para a implantação do Programa
3.500 escolas estaduais.
de Saúde da Família e apoio financeiro para
municípios
com
menor
grau
de
Nos Transportes, o primeiro mandato do
desenvolvimento, inaugurou o Laboratório
governador Mario Covas criou a Câmara
de Produção Industrial da vacina contra
Paulista do Setor Portuário, reiniciou as obras
hepatite B do Instituto Butantã, instituiu o
de duplicação e melhorias da Rodovia Fernão
Sistema Estadual de Transplante e conseguiu
Dias, assinou a Portaria Intergovernamental
reduzir em 90% os casos de raiva canina no
entre o Ministério dos Transportes, o governo
Estado de São Paulo.
de São Paulo e prefeitura paulista referente às obras do Rodoanel Metropolitano de São Paulo,
O primeiro governo de Mario Covas deixou
entregou 12 trens de seis carros reformados da
realizações em praticamente todas as áreas.
Companhia Paulista de Trens Metropolitanos
Para citar apenas as principais, no âmbito
(CPTM), retomou as obras da Rodovia Carvalho
da Cultura, o Estado construiu a Sala São
Pinto e iniciou as obras de contenção na
Paulo, um dos mais modernos espaços
Serra do Mar. Na área da agricultura e do
para concertos do mundo e revitalizou de
abastecimento, houve a criação da Câmara
forma surpreendente a estação ferroviária
Paulista
Júlio Prestes, no bairro da Luz. Também
Coordenadoria Estadual de Controle Interno.
do
Setor
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Sucroalcooleiro
e
da
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O candidato Mario Covas ergue o indicador ao dar uma resposta em debate na TV Cultura
Na Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento
constituíram-se na principal realização na
Econômico, foi assinado o contrato com o
área de Ciência e Tecnologia.
Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), criando o Plano Preventivo de Defesa Civil
Na Segurança Pública, Covas impôs uma
para a Serra do Mar e, em abril de 1997, a
diretriz voltada aos direitos humanos. Uma
participação da Universidade de São Paulo
de suas principais medidas foi a criação
(USP) em parceria com a National Aeronautics
da Ouvidoria da Polícia do Estado de São
and Spaces Administration (NASA) na primeira
Paulo. Também se preocupou em dar maior
experiência de biotecnologia da América
assistência aos policiais, com o lançamento
Latina na órbita terrestre.
do Programa “Segurança ao amparo à família de policiais mortos em serviço” e a criação
60
O lançamento do Programa de Incentivo para
de programas de assistência psicológica a
Erradicação do Trabalho Infantil, em parceria
policiais envolvidos em ocorrências com
com a Fundação Abrinq, Unicef e governo do
disparo de arma de fogo. Em junho de 1996,
Estado de São Paulo foi uma das principais
uma resolução conjunta das Secretarias
realizações na área do Emprego e Relações
de
de Trabalho. Houve ainda a assinatura
Penitenciária iniciou o processo gradativo
do
de transferência de presos dos distritos
Pacto
Bandeirantes,
por
usineiros,
Segurança
Pública
e
Administração
plantadores de cana, trabalhadores e o
policiais
governo estadual, visando a eliminação total
Sistema Penitenciário. Houve, ainda, a
do trabalho infantil no setor sucroalcooleiro
descentralização das unidades da FEBEM,
e a implantação do Fundo de Investimento
abandonando o modelo de grandes unidades
de Crédito Produtivo Popular, o Banco do
que eram palco de repetidas rebeliões nos
Povo. No setor de Energia, o governo Covas
governos anteriores, e a criação, em julho de
concluiu, em 19 de agosto de 1996, as obras
1998, do Centro de Referência e Apoio à Vítima
da Usina Hidrelétrica Rosa e, no mesmo ano,
(Cravi). No Meio-ambiente, Recursos Hídricos,
assinou o decreto que instituiu o Programa
Saneamento e Obras, lançou o Programa
de Eletrificação Rural “Luz da Terra”. Por
Estadual de Microbacias Hidrográficas, para
meio do Projeto Genoma, a descoberta e a
uma mudança de conceito na produtividade
identificação da praga do amarelinho, que
rural, e implantou o Plano de Fomento da
afetava boa parte dos laranjais paulistas,
Hidrovia Tietê-Paraná.
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e
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cadeias
públicas
para
o
ANOS 90
Negão e dona Maria marcam 1994 Com jargões simples e certeiros, Mario Covas expressou o cansaço do eleitor com políticos que prometiam e não cumpriam, elegendo-se governador em 1994
Quem disse que enfrentar o personalíssimo Mario Covas era fácil? Que o diga Antonio Prado, o conhecido Paeco, responsável pelas pesquisas qualitativas realizadas pela equipe de campanha. Em 1994, ele passou a avaliar a reação do público aos programas de TV com o view facts, um aparelhinho em que a audiência indica o que aprova e o que reprova no que vê. A audiência, apelidada de Negão ou dona Maria, manifestava sua opinião. Como Covas a encarava, é o que veremos nesta entrevista de Paeco.
FMC – Como funciona o view facts?
Paeco – Reúne-se numa sala um grupo de pessoas. Naquele tempo, eu colocava de dez a doze pessoas. Dávamos para elas um aparelhinho que parece um controle remoto e tem um dial: se você aumentar o dial, estará aprovando a pessoa; se diminuir, estará reprovando. As pessoas assistem a um programa
FMC – Quando você participou de
qualquer com aquele aparelhinho na
campanha de Mario Covas?
mão para ir dando, segundo a segundo,
Paeco - A primeira campanha que eu
sua
fiz com o Gonzalez foi em 1994. Eu
vendo. A informação é passada para
fazia a pesquisa qualitativa, e o Olsen,
um computador e transformada em um
a
um
gráfico. O gráfico é sobreposto à imagem
diferencial, o view facts, um instrumento
que você está testando, permitindo ver
pelo qual você consegue aferir a reação
a reação das pessoas. Aquilo era uma
das pessoas ao assistir a uma peça de
grande novidade, o Covas não conhecia.
vídeo. É possível mensurar, por meio de
Quando viu, ele gostou. O problema é que
um aparelhinho, a reação das pessoas
o Covas tinha a visão dele de como queria
diante de um vídeo, que pode ser um
fazer a campanha. Ele queria uma bem-
discurso, uma peça de campanha, o
sucedida aparição na televisão, contando
programa eleitoral gratuito. Aquilo era
histórias como coadjuvante e não como
uma grande novidade no Brasil.
ator principal, como na campanha ao
quantitativa.
Nós
tínhamos
impressão
F UN DAÇ ÃO M A R IO C OVA S E M R E V I S TA
sobre
o
que
estão
p r o p a g a n d a p o l í ti c a
61
Senado. Nessa campanha do Senado, ele
tempo, passar a imagem que já estava
contava uma parábola, uma receita que
gravada. Mas eu mostrei a ele os
fez grande sucesso, as pessoas o paravam
gráficos, apontando detalhe por detalhe.
na rua etc. Mas a campanha de 1994 não
Evidentemente, o Covas disse: “Naquele
podia ter tomadas externas.
momento não era aquilo que estava sendo mostrado”. Na subida da curva ou
FMC - A regra era terrível...
na descida, eu dizia que era uma coisa,
Paeco - Hoje não pode ter externas
e ele dizia que era outra. Mas eu tinha
comerciais, mas, naquele tempo, era
decorado tudo, eu sabia tudo. Aí eu passei
tudo feito em estúdio, e ele queria contar
o vídeo, mostrei os pontos a ele. A partir
as
parábolas.
daquele momento,
Então, pegamos
o Covas passou a
o
aparelhinho
acreditar
de
view
naquele
“Eu me referia sempre aos
instrumento
participantes
de
nunca mais tivemos
mostramos como
avaliação do programa de TV
mais do que provado
funcionava.
como o Negão e a dona Maria,
que ele tentou, de
facts,
explicamos para ele o que era,
do
grupo
e
problema. Mas ficou
Gravamos
as
parábolas
dele
sem nenhum sentido pejorativo.
que aquilo estava
e a versão do
E toda vez que o Covas me
errado.
encontrava, perguntava: ‘O que
FMC - Para
foi que o Negão achou?’”
derrubar...
Gonzalez. FMC - Que era o programa
todo modo, mostrar
Paeco – Exatamente,
editado, bonito,
para
imagens...
Quando ele viu que
derrubar.
Paeco - Era um
não
dava
mais,
programa pouco
curvou-se e aceitou
tradicional, inovador para aquela época.
a ideia. Aquele momento ficou para
Fizemos os testes dos dois modelos
sempre na minha memória. Todo mundo
diante de todo mundo e fui apresentar o
chamava aquilo de view facts, mas
resultado para o Covas. Como eu conhecia
quando eu expliquei para ele, dei outros
a fama dele, eu estudei aquele negócio
nomes. Eu falei: “Olha senador, a gente
como um leão. Não era apresentação
está vendo o vídeo e aí o Negão fala o
em PowerPoint, era transparência, e a
seguinte: ‘desse jeito não é possível’”. Eu
reunião era numa sala grande...
me referia sempre aos participantes do grupo como o Negão e a dona Maria, sem
FMC - A casa era numa travessa da
nenhum sentido pejorativo.
avenida Rebouças.
Paeco – Isso mesmo. Eu tinha as transparências
62
com
os
gráficos
FMC – O Negão era o cidadão.
das
Paeco – Sim. Naquele momento eu me
duas aparições dele e podia, ao mesmo
expressei dessa maneira, e o Covas não
F UN DAÇ ÃO M A R IO C OVA S E M R E V I S TA
p r o p a g a n d a p o l í ti c a
falou nada. Depois, quando começaram os
que do lado de lá não tem ninguém. O
programas eleitorais, ele me encontrava
Covas chegou, sentou bem pertinho
e perguntava: “E aí? E o Negão? O que
do espelho. Do outro lado, tinha um
foi que o Negão achou?” Eu respondia:
cidadão sendo entrevistado. Estávamos
“Ô senador, o Negão está gostando” ou
vendo a sala com as pessoas sentadas
“o Negão não gostou disso aqui, mas
nas cadeiras, como se elas estivessem no
daquilo ali ele gostou muito”. O Negão
cinema, olhando para a frente, para a
virou a marca da campanha de 1994.
gente. Uma pessoa ficou exatamente em frente ao Mario Covas e foi essa que falou:
FMC - Covas era um homem que gostava
“Ah, esse homem aí nunca fez nada,
de argumentar, de pessoas que
esse tal de Covas Governador, nunca fez
discutissem com ele. O interlocutor
nada”, e o Mario Covas bufava. O cidadão
tinha de estar muito bem preparado,
falou mais, o Covas bufou forte, bateu o
porque ele ia até o final...
pé e foi embora. Ele queria pular naquele
Paeco - Conheci o Covas na vida pública
espelho e pegar o cara.
porque fui filiado ao MDB, e ele era presidente do diretório municipal do
FMC - Ele aceitava o resultado das
partido. Mas eu não o conhecia face a
pesquisas?
face até o dia de defender o Negão. Foi
Paeco - O Luiz Gonzalez escrevia uma
uma coisa definitiva no relacionamento
coisa e o Mario Covas queria que fosse
com ele. Nunca deixei de argumentar
outra,
toda vez que ele discordava. Quer dizer,
Ninguém mudava o jeito básico do
sempre. Ele nunca concordou comigo em
Covas, era impossível. Mas ele aceitava o
nenhum momento, mas eu tenho certeza
resultado das pesquisas e mudava, como
que respeitava o meu trabalho.
aconteceu no caso das parábolas. Ainda
era
assim
o
tempo
inteiro.
nessa campanha de 1994, nós estávamos FMC - Ele acreditava nas pesquisas?
numa reunião de avaliação sobre o tema
Paeco - No Negão ele acreditava, e
educação, e a avaliação do governo Covas
em pesquisa também. Quando ele foi
nesse tema não era boa, as pessoas
candidato à reeleição, em 1998, estava
odiavam, como odeiam até hoje.
com uns 14% dos votos antes de começar o programa de televisão. Fizemos um
FMC - A progressão.
grupo com Negão, e ele resolveu ir ver.
Paeco – Sim. Era um momento difícil, a
Ele sempre via os gráficos, os resultados,
educação estava se reestruturando, a
mas nunca tinha ido. Tivemos que montar
Rose (Neubauer, secretária de Educação)
todo um esquema porque as pessoas
fez uma mudança corajosa, separou a
não podiam vê-lo. De novo, umas doze
classe dos meninos mais velhos. A dona
pessoas numa sala com espelho, como
Maria ficou furiosa porque tinha dois
num filme americano. A pessoa que está
filhos na mesma escola, ia e voltava uma
sendo interrogada vê um espelho. Do
vez só. Com turnos diferentes, tinha de ir
outro lado do espelho, outra pessoa vê o
quatro vezes à escola, e isso atrapalhava
interrogatório. É assim que a gente faz as
a vida dela uma barbaridade, ela tinha
pesquisas, só que falamos para as pessoas
que trabalhar, voltar. Nós estávamos
F UN DAÇ ÃO M A R IO C OVA S E M R E V I S TA
p r o p a g a n d a p o l í ti c a
63
discutindo que ele tinha de falar algumas
campanha
coisas sobre a questão e ele estava
estávamos muito na frente e fomos
resistindo. Eu falei para ele assim:
perdendo
“Governador, o senhor não acredita
foi muito desgastante. A de 1998 foi o
que o seu segundo mandato vai ser
contrário. Começamos muito embaixo,
melhor que o primeiro? Nós temos que
passamos apertado para o segundo turno
difícil,
terreno.
porque
Ganhamos,
nós mas
passar isso, é muito
e, depois, viramos
importante.”
a
Ele
pesquisa
“Não!
“Estava indo fazer uma avaliação
faltando
segundo
com um grupo, quando o Luiz
dias.
Gonzalez me ligou e perguntou
e na terça-feira
quanto eu achava que estavam
saiu o resultado
estruturei,
as intenções de voto, e eu falei:
Ficamos sabendo
não vou ter mais
‘42 a 40 para o Maluf’. Era muito
do
ter mais isso, não
bom porque a gente estava
estava
indo
vou ter mais aquilo,
encostando nele. Aí o Gonzalez
de
fazer
respondeu: O
meu
mandato vai ser pior que
o
primeiro”.
E
começou
argumentar: não
a “Eu
dinheiro, não vou
o
meu
primeiro
cinco
A
eleição
seria no domingo,
do
Datafolha. resultado
na véspera. Eu carro
avaliação com o
mandato
vai
ser
disse: ‘Você quase acertou: é 42
grupo, era mais
melhor
que
o
a 38, só que para o Mario Covas’.
ou menos sete
No carro, sozinho, comecei a
quando
chorar
Gonzalez
segundo”. FMC - E dá-lhe argumentos. E como experiência, como foram esses períodos eleitorais?
Paeco
-
compulsivamente.
A
horas da noite, o
Luiz me
ligou e perguntou
relação da equipe com ele não
quanto eu achava
era só profissional, era muito
que
emocional também.”
de voto, e eu
A
estavam
as
intenções
falei: “42 a 40
convivência com o
para
Mario Covas sempre
Era muito bom
o
Maluf”.
foi com muita polêmica, mas também
porque a gente estava encostando nele.
muito respeitosa. A relação de afeto
Aí o Gonzalez disse: “Você quase acertou:
que toda a equipe tinha com ele era
é 42 a 38, só que para o Mario Covas”.
muito grande, isso ficou claro em alguns
No carro, sozinho, comecei a chorar
momentos
essa
compulsivamente. A relação da equipe
campanha a gente só virou efetivamente
com ele não era só profissional, era muito
faltando cinco dias para a eleição.
emocional também.
dramáticos,
porque
FMC – Em 1994 ou 1998?
FMC – Em qual pesquisa ele acreditava
Paeco - Em 1998. A de 1994 foi uma 64
mais
F UN DAÇ ÃO M A R IO C OVA S E M R E V I S TA
mais: na feita pela equipe ou nas
p r o p a g a n d a p o l í ti c a
realizadas pelos institutos de
virada. Terminou o debate no domingo,
pesquisa?
e na segunda-feira tinha programa
Paeco - Teve um dia em que nós fomos
eleitoral. Nós fomos para uma reunião, eu
mostrar as nossas pesquisas para ele,
tinha todos os números, as pesquisas. Eu
indicando que o Paulo Maluf estava
disse: “Gente, nós ganhamos esse bloco,
começando a cair. Depois, num programa
o do caráter, e perdemos esse outro. No
de televisão, uma pesquisa dizia que o
geral, a gente ganhou, mas bloco a bloco,
Maluf subiu. Aí ele mandou me chamar:
não”. Então fomos para uma reunião
“Você não falou que ele estava caindo,
na GW. O Zé Maria ficou furioso comigo:
pô?” Respondi: “Governador, ou a gente
“Paeco, nós ganhamos esse debate!” E
acredita no nosso trabalho ou a gente
eu: “Ô Zé Maria, estão aqui os dados da
vai acreditar em quem?” Ele concordou.
pesquisa”. O Covas não estava, foi uma
Na verdade, os resultados das pesquisas
discussão sem fim. Enquanto a gente
do Ibope e do Datafolha estavam muito
discutia, o Gonzalez editava o debate.
próximos dos nossos, não houve uma discrepância muito grande. Teve um
FMC – E pôs no ar.
famoso Datafolha antes do segundo turno
Paeco - Ele colocou uma edição do
de 1998 que nos deu três pontos a mais,
debate na segunda-feira, ressaltando os
enquanto a nossa indicava empate. Foi
aspectos positivos. Foi muito importante
uma encrenca, a Marta Suplicy reclamou,
aquele momento, exatamente porque
mas, em geral, não tinha problema com o
ficou ressaltado que o caráter é relevante
Ibope e o Datafolha.
numa eleição. Em todas as eleições das quais eu participei, pergunta-se: você
FMC - Você também fazia pesquisa do
acha que o fulano de tal vai melhorar a
desempenho do candidato em debate na
vida das pessoas? Sempre o candidato
televisão?
que ganha está com esse diferencial
Paeco - No debate, a gente usava
razoavelmente
o mesmo aparelhinho e fazia umas
eleição, estava empatado. A diferença
contagens de quem ganhava. O Duda
foi, efetivamente, a história do caráter.
alto.
No
caso
dessa
Mendonça, marqueteiro do Paulo Maluf, foi nosso oponente. Durante o debate,
FMC – Que experiência fica da sua
eu passava as informações do grupo no
vivência com o Mario Covas?
intervalo para o Gonzalez, e ele passava
Paeco - De todo mundo que eu fiz
no outro bloco para o candidato. O
campanha, o mais próximo, apesar das
Covas perguntava: “E o Negão?” Quando
discussões, foi o Covas. Era uma relação
terminava o debate, ele mandava me
estranha, porque de grande proximidade
chamar para fazer uma exposição geral. O
e afeto e, ao mesmo tempo, de grande
debate mais dramático de todos foi o do
discussão e debate. Ele nunca concordou
domingo, na TV Bandeirantes, ele contra
comigo em nada, mas era uma pessoa
o Maluf no segundo turno de 1998.
muito diferenciada mesmo. Um dia, ele já doente, encontrou a Yara, minha mulher,
FMC – Foi o debate do caráter?
Paeco – Sim. Foi muito importante, uma
no elevador e disse: “Eu gosto muito do seu marido”. E para o Covas falar isso...
F UN DAÇ ÃO M A R IO C OVA S E M R E V I S TA
p r o p a g a n d a p o l í ti c a
65
ANOS 90
Vence o apelo à continuidade Na campanha à reeleição, Mario Covas pede à população para prosseguir com seriedade nos investimentos em São Paulo e ganha o aval do eleitorado no segundo turno
Covas discursa na convenção estadual do PSDB que aprovou seu nome à reeleição, acompanhado, à esquerda, por Vilma Motta e o deputado estadual Sidney Cinti, e à direita, por Geraldo Alckmin
Depois de anos de ajustes e medidas nem sempre bem vistas pela maior parte do eleitorado – embora absolutamente necessárias – Mario Covas conseguiu colocar a casa em ordem para, enfim, poder governar com certa tranquilidade. No final de seu mandato, em 1998, Covas lançou sua candidatura à reeleição, licenciando-se do cargo e deixando o governo nas mãos de Geraldo Alckmin, vice-governador. Seus adversários diretos eram Paulo Maluf e Marta Suplicy, que estavam à frente nas pesquisas. Pouco antes do primeiro turno, a candidatura decolou, e Covas passou para o segundo turno disputando com Paulo Maluf. F UN DAÇ ÃO M A R IO C OVA S E M R E V I S TA
p r o p a g a n d a p o l í ti c a
67
Na campanha à reeleição, Covas utilizouse grandemente do que havia feito como governador.
Alguns
claramente
a
slogans
idéia
da
passavam necessária
continuidade de um governo que fez a lição de casa: “O PSDB não pára. Faz o que tem que ser feito”; “Seriedade faz bem e tem que continuar”; “Faz mais e melhor” e “Ajustou
Geraldo Alckmin
as finanças sem parar de investir em obras”.
“Mario Covas era contrário à reeleição, mas, premido pela responsabilidade de homem público, foi candidato. Um dia ele me chamou e travamos o seguinte diálogo: Covas - O que você pretende? Alckmin – Sou um soldado do partido. Covas - Larga mão! Alckmin - A eleição vai ser dura, o senhor precisa do PFL por causa do tempo da TV. Covas - Você está com medo de perder eleição? Alckmin - Não, é que os meus votos já são seus, não vou acrescentar nada. Covas - Se você não aceitar eu vou colocar outro tucano. Fomos juntos à convenção, na Assembléia Legislativa. Ainda no elevador do Palácio dos Bandeirantes, ele me disse que anunciaria que iria se afastar do governo durante a campanha e acrescentou: ‘Confio no vice’. Mario Covas anunciou o afastamento e foi cuidadoso, porque Fernando Henrique Cardoso não se afastaria da Presidência, e a imprensa iria cobrar, iria comparar. Ele alegou que não era uma questão ética e afirmou: ‘Tenho dificuldade, uma limitação e o governo vai estar bem nas mãos do vice’. Foi uma campanha muito dura, muito difícil. No primeiro turno, tínhamos menos da metade do tempo de TV de Paulo Maluf, que estava coligado com o PFL. No segundo turno, os tempos eram iguais e Covas ganhou com mais de 2 milhões de votos. O debate da TV Bandeirantes foi memorável. Ele deu uma aula sobre caráter e espírito público.”
Música de campanha
candidato a vice-governador
68
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COVAS 98 Letra: Dominguinhos São Paulo, coração desse Brasil voltou a caminhar agora tá nos trilhos ainda falta muito pra fazer mas vejo casa pra morar escola boa para os filhos Eu vou de Covas botou a casa em dia Eu vou de Covas esse nome é garantia Pensa no amanhã quando assume um compromisso Tá do nosso lado quer o nosso benefício Por que o perigo é como já diz o ditado fazer o filho é fácil, criar é que é difícil... Eu não tô não tô maluco não eu vou de Covas eu não mudo não quero respeito experiência e pé no chão
p r o p a g a n d a p o l í ti c a
Jingle PARA O BEM VENCER O MAL
José Maria Guimarães Monteiro coordenador geral da campanha de 1998
Todo o mundo sabe bem Quem é do mal (uf!), quem é do bem Quem é quem, quem tem moral Quem pode ser nosso porta-voz
“Foi uma campanha densa, penosa, difícil. Durante o primeiro mandato, Mario Covas consertou as finanças do Estado, cuidando do dinheiro público como se fosse dinheiro da feira, mas com muita discrição, ninguém sabia nada do que tinha feito. Ficou em quarto lugar por muito tempo e, por 70 mil votos a mais do que Marta Suplicy, foi para o segundo turno. Quatro dias antes do segundo turno, Mario Covas recebeu uma ligação do Otávio Frias, publisher da Folha de S. Paulo, falando que as pesquisas mostravam sua vitória. A coordenação da campanha era compartilhada. A Renata Covas foi uma guerreira. Em cem dias de campanha, foi apenas duas vezes para a casa dela, em Santos. Zuzinha, Malufinho, Serginho, Oswaldinho e Edsinho foram gigantes, mas eu tinha algumas missões ingratas, como contar para Covas que ele tinha caído nas pesquisas. Uma das coisas deliciosas daquela campanha foi o telemarketing, uma ferramenta nova de comunicação usada pela primeira vez pelo PSDB. Mario Covas foi conhecer de perto e ficou ‘abestalhado’ com aquela metralhadora digital. Ele adorava. Chegava lá e percorria as estações de trabalho prestando atenção no que estava sendo dito, principalmente as respostas aos ataques feitos por Maluf no programa de televisão. Não satisfeito, ocupava um dos postos e falava diretamente com os eleitores. As pessoas do outro lado da linha não acreditavam. Ficavam satisfeitas por não ser uma gravação e honradas em poder conversar pessoalmente com o candidato. Ele ganhava todos os votos.”
Quem tem mal (uf!) Até no nome Não pode falar por nós. Por isso eu voto em Covas! Eu quero (eu quero) Um futuro (futuro) Mais bonito (bonito) Mais seguro (seguro) Eu quero a certeza De que o bem vai vencer Doa a quem doer Para o bem vencer o mal (uf!) É preciso dar a mão E fazer uma corrente Com cada amigo, cada irmão Juntos vamos em frente Cantando a mesma canção Eu quero...
Os marqueteiros de Covas também investiram nas comparações com os governos anteriores e enumeraram, num dos panfletos, as dez razões pelas quais ele deveria ser reeleito: •
Tirou o Estado do buraco e fez São
Paulo voltar a crescer; •
Nunca se construiu tanto: 120 mil
moradias entregues em sorteios públicos; mais de 540 mil novas vagas nas escolas, cinco horas de aula por dia, uma evolução na educação; •
Fim do rodízio: água limpa todo dia,
em todas as torneiras; •
Nove
hospitais,
3.394
leitos
e
médicos em casa para 80 mil famílias;
F UN DAÇ ÃO M A R IO C OVA S E M R E V I S TA
p r o p a g a n d a p o l í ti c a
69
Panfleto de campanha compara as realizações de Covas com as de governos anteriores
•
Ir e vir ficou mais fácil: novas
nela realizadas pelo governo nos quatro anos
estradas, metrô e trem espanhol;
anteriores. Assim, eram distribuídos em cada
•
Prioridade para a Segurança: 21
município, transformando-se em mensagem
penitenciárias, 8.824 novos policiais e
direta ao cidadão, a fim de que soubesse o
mais 5.540 viaturas;
que de fato foi feito em seu favor.
•
Menos imposto sobre os alimentos
deixa a cesta básica mais barata;
Sensibilizar o eleitor para as mudanças
•
40 bilhões de reais de investimentos
importantes que aconteceram na primeira
públicos e privados estão gerando 1,7
gestão deu o resultado esperado. Atrás de
milhão de empregos;
Marta Suplicy em boa parte do tempo, nos
•
últimos dias de campanha o panorama se
Qualidade e rapidez no serviço
inverteu e Covas foi para o segundo turno.
público; •
Respeito ao cidadão. Uma estratégia parecida com a do primeiro turno foi traçada para vencer Maluf. Somou-
70
Outra estratégia bastante eficiente foi a
se a isso o apoio explícito do PT à candidatura
impressão de milhares de panfletos com o
tucana, inclusive com a produção de adesivos
nome de uma cidade paulista e todas as obras
em que se lia: “Sou PT, estou Covas”.
F UN DAÇ ÃO M A R IO C OVA S E M R E V I S TA
p r o p a g a n d a p o l í ti c a
Os panfletos com a lista de obras realizadas em cada cidade conquistaram o eleitor
Outdoor da campanha de 98 com Covas e Fernando Henrique Cardoso
F UN DAÇ ÃO M A R IO C OVA S E M R E V I S TA
p r o p a g a n d a p o l í ti c a
71
O adesivo com o apoio petista ajudou a transferir para Covas os votos de Marta
Na comparação com o adversário, Covas valeu-se do passado. Num dos panfletos, cujo título era “Quem compara vota Covas”, a campanha do PSDB deixava claro ao eleitor que a escolha do futuro governador paulista era apenas questão de bom senso. Mas a comparação ia além do candidato adversário. A campanha procurou mostrar ao eleitor como o governo Covas havia sido melhor que todos os anteriores. Nisso, foi contundente, não economizando na enumeração das obras realizadas.
A comparação entre as realizações do primeiro mandato de Covas e as de Paulo Maluf ajudou o tucano a ganhar a eleição com folga no segundo turno
72
F UN DAÇ ÃO M A R IO C OVA S E M R E V I S TA
p r o p a g a n d a p o l í ti c a
Nos panfletos, a defesa das diretrizes para a educação, assunto polêmico na época
Luiz Gonzalez – coordenador do programa de televisão “A campanha de 1998 foi a mais sofrida. Mario Covas saiu em quarto lugar, e a população o odiava. Fez o primeiro governo na marra, brigando na rua, teve uma postura diferente da que o eleitor tinha visto na campanha. Ele resolveu ir ver a primeira pesquisa qualitativa e ouviu: ‘Esse é o maior ladrão que tem no país. Todo político rouba, mas faz alguma coisa, esse não fez nada!’. O Covas ficou doido. Havia muita pressão, e ele queria polemizar com Maluf. Na TV, Covas tinha 3 minutos e 14 segundos, e Maluf, 10 minutos, metade do tempo dando pau no Covas. O Maluf colocou o Afanásio Jazadji para bater, atacava o Zuzinha e falava da CDHU. Em resposta, o Woyle escreveu um texto violentíssimo. Covas chegou na produtora babando, mas quando viu o texto, avaliou: ‘Não dá, isso aqui vai dar problema, direito de resposta e punição’. A maior briga foi sobre a educação, a reorganização das escolas, a progressão continuada. Todo dia tinha crítica na qualitativa. Fiz um texto para o Covas explicar o que estava acontecendo na educação, mas ele não quis gravar porque parecia que estava pedindo desculpas. Foi uma briga danada, Covas dizendo que o problema não era ganhar a eleição, mas ‘os companheiros que não acreditam na gente’. Ficamos os três – Covas, Woyle e eu –, alucinados, gritando um com outro, parecia cais do porto. Com o Covas era assim, e eu admirava isso. Quando tinha que brigar, brigava pela frente.”
F UN DAÇ ÃO M A R IO C OVA S E M R E V I S TA
p r o p a g a n d a p o l í ti c a
73
Na convenção do PSDB, um abraço de Mario Covas em Geraldo Alckmin, novamente candidato a vice-governador; ao lado de Geraldo, sua mulher, Lu Alckmin
Mario Covas acabou reeleito governador do Estado de São Paulo com 9.800.253 votos. O segundo mandato não teria a duração esperada, pois um câncer iria abreviálo. Mesmo assim, enquanto teve saúde, o governador Mario Covas trabalhou de forma incansável para colher os frutos dos ajustes realizados nos anos anteriores. O Estado de São Paulo estava financeiramente saudável, as dívidas haviam sido renegociadas de forma positiva, e os serviços públicos tinham nova forma e conceito desde a privatização de setores outrora estatizados. O governador Mario Covas Junior morreu em 6 de março de 2001, vítima de câncer. Em seu lugar, assumiu o vice Geraldo Alckmin, que deu continuidade às mudanças
Privilegiados entre os materiais da campanha de 1998, os panfletos procuravam mostrar as realizações de Mario Covas em seu primeiro mandato à frente do governo do Estado
realizadas pelo antecessor, aprimorando-as e consolidando cada uma delas.
74
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p r o p a g a n d a p o l í ti c a
As principais realizações do segundo mandato
Após ser indicado candidato à reeleição na convenção do PDSB, Mario Covas discursa em palanque montado na área externa da Assembléia Legislativa
Das obras realizadas por Mario Covas
através da Fundação de Amparo à
no segundo mandato, estão entre as
Pesquisa
mais relevantes a criação da Fundação
(Fapesp). Na Cultura, houve a assinatura
Instituto de Terras do Estado de São
do acordo de participações que instituiu
Paulo “José Gomes da Silva” (Itesp), que
o Programa de Estímulo à Indústria do
consolidou a política agrária e fundiária
Audiovisual do Estado de São Paulo.
estadual com economia orçamentária, o
Na Educação, ocorreu a assinatura do
lançamento do Plano de Modernização
protocolo de intenções entre o governo
do Programa “Viva Leite” e do Programa
do Estado de São Paulo, a Telefônica e
“Alimento São Paulo”.
o Ministério da Educação referente à
do
Estado
de
São
Paulo
implantação da rede de alta velocidade, Na
área
da
Ciência,
Tecnologia
e
ampliando o uso da internet nas escolas
Desenvolvimento Econômico, em 2000,
da rede pública de ensino e, logo depois,
iniciou-se o projeto Genoma Estrutural,
o lançamento do Programa de Tecnologia
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p r o p a g a n d a p o l í ti c a
75
No final do comício da Habitação, Mario Covas caminha satisfeito entre populares e candidatos do PSDB a deputado federal e estadual, como Walter Feldman, Ricardo Tripoli, Alberto Goldman, Juscelino Cardoso e Arnaldo Madeira
de Alta Velocidade para acesso à internet
Ambiental
e
Reflorestamento
das
nas escolas estaduais.
Marginais dos rios Pinheiros e Tietê – Projeto São Paulo Pomar Pinheiros -
Na área do Emprego e Relações de
Tietê: Mais Verde, Mais Vida.
Trabalho, assinou-se a lei que cria o Programa Emergencial de Auxílio
Em
Desemprego
o
e Obras, promoveu-se a assinatura
regulamenta. Em Energia, foi inaugurada
dos contratos de financiamento do
a Eclusa e Usina Hidrelétrica Engenheiro
Banco
Sérgio
e
Banco Internacional de Reconstrução e
assinado o termo de compromisso para
Desenvolvimento (BIRD), para o Programa
a implantação de Centrais Termelétricas
Estadual de Microbacias Hidrográficas –
do bagaço de cana-de-açúcar. No Meio
Uso e Manejo do Solo, e para o Programa
Ambiente, foi lançado o “Selo Verde”,
Integrado – PITU, Ligação Barra Funda.
e
Motta
do
decreto
(Porto
que
Primavera)
Recursos
Mundial,
Hídricos,
por
Saneamento
intermédio
do
para a identificação das empresas que
76
respeitam o meio-ambiente e realizou-
Nos Transportes, o governo Mario Covas
se o lançamento do Projeto Recuperação
promoveu a transferência gratuita entre
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p r o p a g a n d a p o l í ti c a
De frente para câmera de televisão, Covas defende seus pontos de vista no debate realizado entre candidatos ao governo paulista na Rede Bandeirantes
o Metrô e a CPTM nas estações Barra
começou a funcionar a Bolsa Eletrônica
Funda e Brás. Em Habitação, oficializou-
de Compras – Projeto Governo Eletrônico
se o convênio entre a Secretaria de
da Secretaria da Fazenda. Na Gestão
Desenvolvimento
Caixa
Estratégica, foi assinada a lei que dispôs
Econômica Federal, a Secretaria de
sobre a proteção e a defesa do Usuário do
Habitação e o CDHU, que firmou medidas
Serviço Público do Estado de São Paulo.
Urbano,
a
para a contratação e comercialização mais
rápida
de
empreendimentos
Na área da Saúde, o segundo mandato de
habitacionais por meio do Programa
Mario Covas promoveu a re-inauguração
Carta de Crédito e do Programa de
do Centro Cirúrgico Ambulatorial do
Arrendamento Residencial (PAR).
Hospital das Clínicas de São Paulo, a inauguração do Ambulatório de Saúde
Na área da Justiça e Defesa da Cidadania,
da Mulher na zona central de São Paulo,
dois Centros de Detenção Provisória
com capacidade para a realização de
foram entregues à população: o de
2.300 atendimentos por dia, além da
Osasco e o de Campinas. Houve, ainda,
criação do Comitê Estadual do Plano de
o lançamento do Plantão Eletrônico de
Reorganização de Atenção à Hipertensão
Segurança Pública. Na área da Fazenda,
Arterial e ao Diabetes Mellitus.
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O debate da virada com Paulo Maluf, no segundo turno da eleição a governador, realizado pela TV Globo com a mediação do jornalista Carlos Nascimento
Mario Covas discursa em seu comitê de campanha política, depois de confirmada a sua reeleição ao governo do Estado de São Paulo, acompanhado de sua mulher, Lila Covas
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Ricardo Penteado, advogado de Covas
A marca da legalidade O advogado Ricardo Penteado conta como a obediência de Mario Covas às leis mudou para sempre as campanhas eleitorais no país A campanha eleitoral de 1998 foi a primeira em que a legislação eleitoral brasileira permitiu a reeleição. Com muita cautela, Mario Covas candidatou-se ao seu segundo mandato consecutivo no comando do governo do Estado de São Paulo. Antevendo problemas com os adversários, Mario Covas licenciou-se do cargo de governador, não queria ser acusado de usar a máquina administrativa em sua campanha. Também lutou na Justiça Eleitoral para que cada candidato tivesse seu tempo na televisão respeitado. Essas e outras histórias são contadas a seguir por Ricardo Penteado, advogado de Mario Covas na campanha à reeleição.
FMC – Como foi a sua entrada na
o Mario Covas saiu da empresa, voltou
campanha eleitoral do Mario Covas em
para a política, e o Arnaldo Malheiros
1998?
permaneceu lá.
Ricardo Penteado – O Mario Covas não me
FMC – E como o Covas reencontrou o
conhecia pessoalmente. Ele conhecia o
Malheiros?
Arnaldo Malheiros, meu grande professor e mestre no Direito eleitoral, que fora
Ricardo Penteado – O Mario Covas, pela
advogado em todas as eleições anteriores
primeira vez na sua vida, procurou o
àquela. Não era nem do PSDB nem
Arnaldo Malheiros. Queria contratar o
advogado do Mario Covas, embora fossem
grande especialista em Direito eleitoral
grandes amigos, porque os dois foram
porque sabia que a campanha teria muitos
sócios na Ductor, empresa de engenharia,
conflitos para resolver nos tribunais, e
durante o período da cassação. Depois,
teve mesmo. Acontece que, em 1996, o
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Arnaldo Malheiros tinha advogado para o
Ricardo Penteado – As conversas eram
Celso Pitta, candidato à sucessão do Paulo
ótimas. Mais de uma vez ele me falou que
Maluf na prefeitura de São Paulo. Em
sonhava fazer um júri. Talvez não quisesse
1998, o Paulo Maluf voltou a procurar o
ser bacharel em Direito nem advogado,
Arnaldo Malheiros e ele disse: “Não. Agora
mas uma experiência com júri ele queria
quem vai disputar a eleição com você é o
ter. O Mario Covas era um tribuno de mão
Mario Covas, meu amigo, contra quem eu
cheia, uma coisa que a história brasileira
jamais advogaria”. Quando o Mario Covas
está começando a registrar.
procurou o Arnaldo Malheiros, ele se sentiu na obrigação de dizer não também,
Nós temos poucos registros gravados,
para não se indispor com seu ex-cliente,
mas muitos testemunhos de pessoas e
e ficou fora do processo. O Mario Covas,
também aquilo que foi efetivamente
então, pediu pediu indicação de outros
escrito no Congresso Nacional. Mario
nomes. O próprio Arnaldo Malheiros, o
Covas tinha uma compreensão muito boa
Michael Zeitlein e o Zuzinha indicaram o
do sistema jurídico, era um engenheiro,
meu nome. Foi assim que comecei.
mas
com
uma
cultura
nessa
área
impressionante. Evidentemente que o FMC – Como o mario Covas recebeu você
Direito, como não é uma ciência exata,
na equipe?
abre campo para muita discussão, e nós tivemos sim, boas e belas discussões, em
Ricardo Penteado – O Mario Covas pouco
que ele apertava muito a gente.
me conhecia na época. Até senti que, no começo, ele tinha alguma restrição, mas
FMC – Quais eram os motivos das
uma coisa do tipo: “Vamos testar esse
discussões?
moleque”. Ele era muito duro, incisivo, exigente nas perguntas, nas satisfações
Ricardo Penteado – A campanha de
que buscava com os assessores, auxiliares
1998 foi extremamente difícil. Diria que
e prestadores de serviço.
foi uma das mais difíceis das quais eu já participei como advogado, e eu estou
Ao mesmo tempo, era uma pessoa que
trabalhando nisso há vinte anos. Era uma
dava total liberdade para eu fazer o que
campanha que seria marcada por uma
eu tinha de fazer. Por incrível que pareça,
legislação que não foi criada para aquela
eu já ouvi dizer que algumas pessoas o
eleição. Em todas as eleições, desde a
consideravam centralizador. Não acho,
redemocratização
de modo algum. Ele era exigente com
uma legislação especial para cada uma
aqueles que estavam na equipe, mas, no
e era normalmente uma coisa casuística,
momento de a pessoa atuar, ele só queria
arrumada. Essa, de 1998, aconteceu
saber como a coisa ia.
subordinada a uma lei que ia reger
do
país,
tínhamos
todas as eleições. O Mario Covas tinha FMC – O Covas gostava muito da área do
uma preocupação impressionante com
Direito. Como eram as conversas que
a legalidade, uma noção muito clara de
vocês tinham sobre esse assunto?
que a legalidade o favorecia e que era essa a marca que ele queria ter. Acho que
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ele levou isso tanto para a campanha e
Ricardo Penteado – O Covas se licenciou
o público eleitor, quanto às postulações
por um princípio. Quanto aos outros,
que fez nos tribunais.
cada caso é um caso. Eu certamente não conheço todos aqueles que se licenciaram
FMC – A busca da legalidade chegou
no meio da campanha, mas sei que o
ao ponto de ele ter se afastado do
Mario Covas foi o único candidato que se
governo para disputar a eleição.
licenciou do cargo de governo desde o primeiro instante de uma campanha.
Ricardo
Penteado
–
Foi
o
único
candidato desde a reeleição que fez toda
FMC – A reeleição sempre traz
a campanha licenciado. Teve gente que
essa questão do uso da máquina
tentou cassar a candidatura dele, dizendo
administrativa. Foi melhor para
que esse afastamento era ilegal, que ele
o Covas fazer a campanha como
teria abandonado o governo. Na verdade,
governador licenciado?
era uma postura não exigida pela lei que ele se afastasse, mas era possível
Ricardo Penteado – Existe uma tentação
desde que aprovada pela Assembléia.
muito grande para aqueles que estão no
A Assembléia aprovou, e ele fez toda a
governo de resolver a eleição de uma
campanha eleitoral como governador
forma rápida. Muitas vezes é sedutor o
licenciado. Isso implicou uma certa
papel de governador, prefeito, presidente
dose de sacrifício, porque não é fácil
da República. De uma forma ou de outra,
um governador se afastar. Mas ele tinha
a máquina o favorece. Quando você se
um vice preparado para isso. O Geraldo
afasta, de uma certa maneira perde a
Alckmin não pôde se licenciar quando
chance de estar na mídia, por exemplo,
terminou o mandato do Mario Covas,
em inaugurações, em lançamento de
porque ele não tinha um vice.
planos e outras tantas coisas. O Mario Covas, licenciado, não podia nem fazia
FMC – O mario Covas foi mesmo o único
aparições em eventos de governo. Creio
governador desde a reeleição que se
que boa parte do público viu isso como
licenciou até hoje?
uma coisa positiva, mas muita gente menos informada perdeu a referência que
Ricardo Penteado – Com certeza. Teve
tinha na mídia do Mario Covas e passou a
gente que se licenciou em pedaços da
vê-lo só na propaganda eleitoral, em pé
campanha, em momentos em que a
de igualdade com os demais candidatos.
campanha o exigia. Mas ninguém fez como o Covas, que se licenciou de um
FMC – Houve prejuízo para ele?
cargo de governo antes de começar a Ricardo Penteado – A busca pela
campanha eleitoral.
legalidade
muitas
vezes
exigiu
do
FMC – Quem se licenciou em partes da
Mario Covas um certo sacrifício. Ele foi
campanha olhou seu interesse e não a
corajoso ao assumir teses jurídicas que
lisura do processo, é isso?
moralizavam o processo eleitoral e que ainda não tinham emplacado no Judiciário.
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Ele levou aos tribunais e conseguiu,
apenada pela Justiça Eleitoral e tinha um
por exemplo, a divisão do horário da
candidato que não sofria nenhuma pena,
propaganda eleitoral. Atualmente, há um
que era o Mario Covas. Nós achávamos
tempo para deputado, outro tempo para
que íamos brigar muito na propaganda
senador, outro para governador. Antes, o
eleitoral, o que de fato aconteceu, e que
manda-chuva do partido ocupava todos
teríamos muito trabalho na discussão
os tempos. A propaganda do deputado e
sobre o uso da máquina. Mas contra o
a do senador só fazia a propaganda do
Mario Covas não foi promovida uma única
governador. Esse era o comportamento
representação pelo uso da máquina.
de
todos
os FMC – Você tinha
c an dida t o s adversários Mario
do Covas
“Nós achávamos que íamos
em 1998, e ele,
brigar muito na propaganda
quando viu isso na
eleitoral,
lei, advertido pelos
o
que
de
fato
advogados, disse:
aconteceu, e que teríamos muito
“Vamos
trabalho na discussão sobre o
a
obedecer
lei”.
Durante tempo
uso da máquina. Mas contra o
ele discutiu com
Mario Covas não foi promovida
um
bom
outros candidatos que o tempo do
uma única representação pelo
governador
uso da máquina”
era
autonomia para agir ou o Mario Covas queria ser consultado antes?
Ricardo Penteado –
O
candidato
adversário o
Paulo
que
tinha
era Maluf, mais
de um escritório trabalhando pela
muito
menor
sua
do
estava
e uma rede de
que
sendo
usado.
candidatura
informações muito
E
ele, por coerência, só usava o tempo
grande. Nós trabalhávamos com um
que lhe era reservado. Os tempos de
escritório que era muito pequeno, com
deputado, senador, deputado federal,
dois advogados, eu e mais um outro mais
deputado
reservados
jovem, e um estagiário. Nós alugávamos
para esses candidatos e, com isso, ele
o que a gente chamava de mocó, que era
tinha uma coligação ainda pequena. O
um escritório ao lado da Justiça Eleitoral
tempo de televisão no primeiro turno foi
onde muitas vezes passamos a noite. Nós
extremamente sacrificado.
tínhamos que fazer o acompanhamento
estadual
eram
de tudo o que saía na mídia, em rádio,
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Em compensação, a Justiça Eleitoral
TV, jornais etc. Lembro que o Mario Covas
reconheceu, quase no fim do primeiro
teve que tomar decisões muito difíceis.
turno, que o Mario Covas tinha razão, e
Algumas
aplicou algumas penas para os demais
reportávamos a ele, que eram as brigas
candidatos, retirando deles o tempo que
com os demais candidatos, para colocá-
fora utilizado a mais. Acho que o público
los nos eixos. Essas, nós pouco ou nada
percebeu que muita gente estava sendo
tínhamos que consultar, apenas informá-
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nós
tomávamos
e
depois
lo logo em seguida. Com relação ao mau
Ricardo Penteado – Sim, a própria mídia
comportamento da mídia, aí sim nós
se reeducou para esse processo eleitoral.
tínhamos que consultá-lo. Nós tivemos
As emissoras de rádio e televisão se
problemas graves com duas emissoras de
sentiam absolutamente licenciadas para
televisão, por conta do comportamento
fazer propaganda de seus candidatos
de alguns apresentadores de programas
prediletos, mas são concessionárias de
de auditório.
serviços públicos, ainda que possam emitir opiniões editoriais etc. Se um
FMC – Os comunicadores...
programa de auditório de televisão fizer propaganda de um candidato, gerará
Ricardo
Penteado
–
Sim.
Nisso
a
uma desigualdade que a lei não admite.
legislação tem que ser aperfeiçoada, porque
penaliza
completamente
a
FMC – O trabalho como o advogado
emissora e dá pouca responsabilidade
que garante os direitos do cliente
ao comunicador. Devia pesar um pouco
está ligado à comunicação. Como era a
mais para o comunicador. Nós tivemos
relação com a comunicação?
que entrar com medidas sérias, e duas emissoras de televisão foram retiradas
Ricardo Penteado – Muito próxima.
do ar durante 24 horas. Isso nunca tinha
O trabalho jurídico numa campanha
acontecido no Brasil, muito menos com
eleitoral não pode ser de gabinete,
emissoras de televisão de porte.
exclusivamente técnico. É necessário ter uma compreensão da dinâmica eleitoral
FMC – A repercussão disso foi grande?
e, principalmente, da comunicação. Uma coisa fundamental nesse processo é a
Ricardo Penteado – Virou notícia. Para
integração entre o marketing político e o
um candidato, por respeito à liberdade
jurídico. Nós não só éramos obrigados a
de imprensa ou por interesse político,
assistir a todas as propagandas de todos
não interessa calar a boca dos outros.
os candidatos como éramos convidados
Ao contrário, ele quer aparecer e bem.
– e aí havia uma equipe sensacional –
Ao retirar uma emissora do ar, você só
a participar do processo de elaboração
está comprando uma briga muito grande,
da campanha eleitoral. A partir de 1998
porque a emissora pode se irritar com
eu passei a conviver com marqueteiros
você e, sutilmente, começar a boicotar.
juristas, e eles, a conviver com o rábula
Quem ganhou com isso foi o Poder
da propaganda, que sou eu. A partir de
Judiciário Eleitoral, porque foi provocado
então, a discussão respeita os limites
quando tinha de ser provocado e tomou
legais, seja na hora de escrever um texto
providências que jamais tinha tomado até
seja quando o candidato vai falar. É
então para fazer uma eleição legítima,
preciso ter esse cuidado.
como foi essa. FMC – Como era a equipe? FMC – A mídia percebeu que precisava tomar cuidado com o que veiculava?
Ricardo Penteado – Era formidavelmente bem integrada. Nós éramos muito bem
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informados pelos assessores de imprensa
FMC – Você teve alguns embates com
e assessores da propaganda a respeito do
ele. E até onde sabemos, o Mario
que estava acontecendo, do que os outros
Covas gostava de quem fizesse o
candidatos estavam fazendo, do que nós
contraponto. Como era isso?
queríamos fazer. Foi a primeira vez que eu vi acontecer uma integração com tal
Ricardo Penteado – O Mario Covas era
intensidade. A partir de 1998, eu diria
muito sacana. Eu diria que metade da
que as campanhas eleitorais mudaram e
discussão era um exercício para suas
muito no Brasil inteiro.
próprias convicções. A outra metade era um teste das suas convicções na
FMC – Foi possível evoluir e crescer
convicção de seu interlocutor. Ele sabia
com essa experiência?
argumentar. Teve uma noite em que a
As campanhas melhoraram?
gente discutiu muito até a elevar a voz um com o outro. No dia seguinte, eu não
Ricardo Penteado – Melhoraram em
era mais o advogado dele, mas percebia-
partes.
vemos
se que, naquele embate, houve uma
imperfeições até da própria legislação
contraposição de posições que ele queria
eleitoral. Por conta das dificuldades
ver em que resultava.
Em
várias
eleições,
políticas do nosso país, também está sendo um pouco difícil a gente repensar
FMC – A discussão o ajudava a pensar.
essa legislação eleitoral, naquilo que realmente interessa. Hoje em dia as
Ricardo Penteado – Ajudava sim. O
pessoas se concentram muito na discussão
Mario Covas não estava lá só para ganhar
a respeito da propaganda eleitoral, mas
prêmio de bom comportamento, ele
eu acho que o buraco está mais embaixo,
estava lá para agir legalmente e ganhar
é mais do sistema eleitoral em si.
uma eleição. Ele pesava todos os lados das questões, que são muitos, e colocava
Nisso eu sinto muito a falta do Mario Covas,
a gente em xeque. Nós tivemos muitas
porque ele era um grande personagem
discussões bravas, bravas mesmo. Em
político com quem era possível conversar
algumas delas eu cheguei a dizer: “Quem
sobre
Ele
mandou você votar essa Constituição?”
compreendia a coisa com muita rapidez,
Mas no dia seguinte prevalecia alguma
era um dos maiores negociadores que eu
ideia com a qual ou eu ou ele realmente
já vi. Tinha a condição impressionante de
estávamos de acordo.
os
problemas
jurídicos.
alinhavar todos os interesses e conseguir liderar um resultado que fosse positivo.
FMC – Ele gostava de combater o bom
Era um político de avanço. Nunca vi
combate...
alguma coisa na mão do Mario Covas ficar
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parada. Ele sempre avançava, tornava
Ricardo Penteado – Se o Mario Covas
a coisa possível. Hoje nós estamos
tivesse mais tempo e menos coisas
discutindo uma reforma política, e o
importantes a fazer, obras a realizar,
Mario Covas faz falta. Ele congregava as
eu acho que ele passaria o dia inteiro
diversas opiniões.
discutindo com os outros.
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