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Escola Secundária de Albufeira Português
O verdadeiro significado das coisas é encontrado ao se dizer as mesmas coisas com outras palavras.
Prof.ª Maria de Jesus Pinto
Marisa Azinheiro Ano Lectivo 2011/2012 3
Índice
Introdução…………………………………………………….5 Variação linguística…………………………………………6 Pequenos Tesouros………………………………………….8 Crónica do falar lisboetês………………………………..10 Conclusão……………………………………………………12 Bibliografia…………………………………………………..13 Anexos………………………………………………………..14
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Introdução
O tema escolhido para este Dossiê Temático surgiu no seguimento de uma troca de impressões durante a aula, relativa às diferentes pronúncias existentes em Portugal. A partir daí, escolhi o tópico da cultura portuguesa por que ansiava pesquisar: os regionalismos, isto é, as variações linguísticas ao longo do território português. Comecei por organizar os tópicos a averiguar, as reflexões a escrever e que anexos colocar, para, por fim, publicar o meu trabalho online, em jeito de revista. Desta vez, a escolha para o título deste Dossiê Temático tornou-se muito complicada, em comparação com os anteriores. Necessitava de algo que ilustrasse a diversidade cultural presente em todo o território nacional… Acabou por surgir Viajando pelas
Palavras, acompanhada por um típico transporte de Lisboa: o eléctrico! É este meio que nos oferece não só paisagens de cortar a respiração, como também nos permite contactar com um leque variadíssimo de pessoas no seu interior, sendo este o motivo para o ter incluído nesta capa. O tipo de letra utilizado (que remete um pouco para o antigo, para o velho) está intimamente relacionado com o eléctrico, pois é um meio de transporte utilizado há anos pelos lisboetas. O objectivo deste pequeno Dossiê Temático será dar a conhecer um pouco do que o nosso país tem de mais curioso, assim como refletir sobre a aceitação das diferenças linguísticas, que marcam o nosso país. Ao longo desta viagem virtual, serei feliz, como sempre! 5
Variação linguística
representa a diversidade de
realizações de uma língua. Quando é pronunciada, esta pode ser influenciada por inúmeros factores, entre os quais a região, o contexto ou o grupo social. Estas variações podem ocorrer a nível fonético, morfológico, sintáctico ou semântico. Não há dúvidas de que Portugal é um país extremamente enriquecido, em termos de variações linguísticas: nas zonas do norte, é frequente trocar os “vês” pelos “bês”; nas expressões algarvias, é usal o uso do gerúndio nos verbos. À medida que vamos subindo no território português, deixamos de estar “marafados” e passamos a estar “zangados”. Já não é “meio dia e meia”, mas sim “meia hora”. Quando pedimos uma bica, estamos a falar de um cimbalino. De seguida, irei apresentar algumas expressões e vocábulos que melhor ilustram a quantidade de regionalismos espalhados pelo país. SUL/CENTRO
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Afia Pastel de bacalhau Bica Entalado Trilhado Amarrotado Imperial Nêspera Meio dia e meia Um quarto para o meio dia
NORTE Aguça Bolinho de bacalhau Cimbalino Engasgado Entalado Encorrilhado Fino Magnório Meia hora Meio dia menos um quarto
SUL/CENTRO Perto de mim Cabide Casa de banho Chapéu de chuva Merenda Pisar Queda Ténis Frigideira Guarda-fatos
NORTE À minha beira Cruzeta Quarto de banho Guarda-chuva/Chuço Lanche Calcar Tombo Sapatilha Sertã Guarda-vestidos
SUL/CENTRO Carcaça Tonto Ter água na boca Tolo Prato Bitoque Bandeja Feijão-verde Granizo
CONTINENTE Camisola de lã Emaranhado Alguidar Molas da roupa Fato de macaco
NORTE Molete Ourado Ougado Pascácio Pires Prego no prato Tabuleiro Vagem Saraiva
AÇORES Blusão Enriçado Bacia Pinhos Alvarozes
SUL/CENTRO Cadeado Pão de leite Refogado Sarjeta Testo Desfeito Mal vestido Tigela Cãimbra Pôr/Deitar Assadeira
CONTINENTE Alcunha Apressado Conversa Perseguir Vergonha Volante (de carro) Cérebro Papagaio de papel Conversador, fofoqueiro
NORTE Aloquete Bico de pato Estrugido Boeiro Tampa (de panela) Escangalhado Fraldisqueiro Malga Breca Botar Pingadeira
MADEIRA Apelido Embalado Paleio Atazanar Vexame Guiador Cachimónia Joeira Bilhardeiro
Expressões linguísticas do Porto: Deu-lhe a filoxera = Desmaiou. Dar corda aos vitorinos = Andar rápido, fugir de. Dói-me o garfeiro = Doem-me os dentes. Estar com os vitorinos encharcados = Estar bêbado. Estar de beiços = Estar amuado. Secou-se-lhe o céu da boca = Morreu. “Apesar de virmos de diferentes países e falarmos línguas diferentes, os nossos corações batem como um só.” Dumbledore (personagem da saga de filmes Harry Potter) Não podia deixar de colocar neste Dossiê Temático esta frase do filme Harry Potter e o Cálice de Fogo e de fazer uma pequena analogia com as variações linguísticas. Neste filme, o regresso do vilão, Voldemort, provoca a morte de um colega muito querido por todos, tornando-se impossível, para os restantes alunos, oriundos de outros países, ficarem indiferentes à perda de um amigo tão próximo. Este filme constitui uma prova de que, em tempos difíceis, a união faz a força. É disso mesmo que Portugal necessita. De algo que nos faça ser melhores e que crie o desejo de querer viver num território agradável para todos. Apesar de vivermos num lugar onde a diversidade de pronúncias é tão grande, os nossos corações não deixam de bombear sangue português. Por isso, não nos devemos render a preconceitos, impeditivos da progressão natural do país. É indiferente falarmos minhoto, lisboeta, coimbrão ou algarvio. Somos um só e essa é a chave do sucesso.
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Tal como em qualquer outro país, as variações linguísticas são intrínsecas à cultura portuguesa. A quem já não aconteceu estar na praia, no Algarve, em pleno Verão, e, de repente, ouvir uma voz com uma pronúncia completamente diferente da que está habituado? No entanto, é como Fernando Pessoa uma vez disse: “Primeiro estranha-se, depois entranha-se”! É usual as pessoas atribuírem níveis sociais, quando conhecem outras que fogem ao “normal”. Hoje em dia, ao se avaliar alguém, não se limitam apenas ao seu aspecto. Atingiram o patamar de considerar também a sua pronúncia. São meros esterótipos. Atribuímos certas características a desconhecidos, simplesmente pelo facto de se vestirem e falarem de maneira diferente. Ao dizerem palavras que nos são totalmente estranhas, consideramo-las ridículas, quando a única coisa ridícula são as mentes retrógadas que negam a riqueza cultural do seu país. De facto, há palavras no Norte que só quem lá vive conhece, pois só nesta região é que são necessárias. Atente-se na produção de vinho, à qual estão associados um sem número de vocábulos. A maioria dos habitantes algarvios permanecem alheios a tais palavras, pois a cultura do vinho não está implantada nessa região, logo não necessitam de palavras a ela associadas para o seu quotidiano, permanecendo na ignorância. É bastante comum julgarem as pessoas do Norte, tomaremnas por menos inteligentes, limitadas ou mal educadas. A pronúncia do norte não é bruta. Resulta apenas das vogais serem mais abertas e os ditongos mais alongados e rasgados. Dizem, até, que são os nortenhos que falam melhor o português… E têm uma certa razão. Afinal, onde começou o nosso país, há milhares 8
de anos? Os povos do sul é que sofreram influências dos árabes que por aqui andaram durante muito tempo, até serem finalmente expulsos. Ora, são os regionalismos que, por vezes, tornam o meu dia-a-dia mais interessante! Aumentam o meu grau de curiosidade exponencialmente. Divirto-me a descobrir que uns chamam buffet e outros chamam bar, ao lugar onde tomam o pequeno-almoço ou o lanche, na escola. Ainda mais quando uns perguntam se alguém quer um cabide para pendurar o casaco, enquanto que outros perguntam se quer uma cruzeta. São estes pequenos pormenores que fazem a diferença e que enriquecem o nosso país culturalmente. A verdade é que a maneira de falar em Coimbra, no Porto, em Bragança ou em Lisboa é tão correcta como a falada em Beja, Faro ou Aveiro. São apenas maneiras diferentes de realizarmos a mesma língua. É extremamente tacanho ridicularizar pessoas deste ou daquele lugar simplesmente pela forma como falam. É assim que tencionam fazer progredir o nosso país? Há que despertar consciências, fazê-las ganhar um espírito activo e incutir-lhes o empenho em mudar certos estereótipos, os quais apenas levam Portugal para o fundo do poço. A acção tem de partir de cada um de nós. Se mudarmos a consciência dos que nos rodeiam, quiçá um dia mudaremos a do mundo também… Não podemos ter um país que negue as suas raízes. Isso seria impedi-lo de chegar ao melhor que ele pode ser. Marisa Azinheiro
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Crónica do falar lisboetês De súbito, o homem do quiosque de Lisboa a quem eu pedira os meus jornais habituais interpelou-me: - O senho é do Norte, não é? Respondi-lhe que não, que nasci na Bairrada e resido há quase 40 anos em Coimbra. Fitou-me, perplexo. Logo compreendi que do ponto de vista de Lisboa, tudo o que fique para cima de Caneças pertence ao Norte, uma vaga região que desce da Galiza até às portas da capital. Foi a minha vez de indagar porque me considerava oriundo do Norte. Respondeu de pronto que era pela forma como eu falava, querendo com isso significar, obviamente, que eu não falava a língua tal como se fala na capital, que para ele, presumivelmente, não poderia deixar de ser a forma autorizada de falar português. Foi a primeira vez que tal me aconteceu. Julgava eu que falava um português padrão, normalmente identificado com a forma como se fala «grosso modo» entre Coimbra e Lisboa e cuja versão erudita foi sendo irradiada desde o século XVI pela Universidade de Coimbra, durante muitos séculos a única universidade portuguesa. Afinal, via-me agora reduzido à patológica condição de falante de um dialecto do Norte, um desvio algo assim como a fala madeirense ou a açoriana. Na verdade – logo me recordei -, não é preciso ser especialista para verificar as evidentes particularidades do falar alfacinha dominante. Por exemplo, «piscina» diz-se «pichina», «disciplina» diz-se «dichiplina». E a mesma anomalia de pronúncia se verifica geralmente em todos os grupos «sce» ou «sci»: «crecher» em vez de «crescer», «seichentos» em vez de «seiscentos», e assim por diante… O mesmo sucede quando uma palavra terminada em «s» é seguida de outra começada por «si» ou «se». Por exemplo, da expressão «os sintomas» sai algo parecido com «uchintomas», «dois sistemas» como «doichistemas». Ainda na mesma linha, a própria pronúncia «de Lisboa» soa tipicamente a «L’jboa». Outra divergência notória tem a ver com a pronúncia dos conjuntos «-elho» ou «-enho», que soam cada vez mais como «-ânho» ou «-âlho», como ocorre, por exemplo, em «coelho, «joelho», «velho», frequentemente ditos como «coalho», «joâlho» e «valho». Uma outra tendência cada vez mais vulgar é a de comer os sons, sobretudo a sílaba final, que fica reduzida a uma consoante aspirada. Por exemplo: «pov» ou «continent», em vez de «povo» e «continente». Mas essa fonofagia não se limita às sílabas finais. Se se atentar na pronúncia da palavra «Portugal», ela soa muitas vezes como algo parecido com «P’rt’gâl».
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O que é mais grave é que esta forma de falar lisboeta não se limita às classes populares, antes é compartilhada crescentemente por gente letrada e pela generalidade do mundo da comunicação audiovisual, estando por isso a expandirse, sob a poderosa influência da rádio e da televisão. Penso que não se trata de um desenvolvimento linguístico digno de aplauso. Este falar português, cada vez mais cheio de «chês» e de «jês», é francamente desagradável ao ouvido, afasta cada vez mais a pronúncia em relação à grafia das palavras e torna o português europeu uma língua de noridade exótica, cada vez mais incompreensível já não somente para os espanhóis (apesar da facilidade com que nós os entendemos), mas inclusive para os brasileiros, cujo português mantém a pronúncia bem aberta das vogais e uma rigorosa separação de todas as sílabas das palavras. A propósito do português do Brasil, vou contar uma pequena história que se passou comigo. Na minha primeira visita a esse país, fui uma vez convidado para um programa de televisão em Florianópolis (Santa Catarina). Logo me avisaram de que precisava de falar devagar e tentar não comer os sons, sob pena de não ser compreendido pelo público brasileiro, que tem enormes dificuldades em compreender a língua comum, tal como falada correntemente em Portugal. Devo ter-me saído airosamente do desafio, porque, no final, já em off, o entrevistador comentou: «O senhor fala muito bem português.» (queria ele dizer que eu tinha falado um português inteligível para o ouvido brasileiro). Não me ocorreu melhor e retorqui: - Sabe, fomos nós que o inventámos… Por vezes conto esta história aos meus alunos de mestrado brasileiros, quando se me queixam de que nos primeiros tempos da sua estada em Portugal têm grandes dificuldades em perceber os portugueses, justamente pelo modo como o português é falado entre nós, especialmente no «dialecto» lisboetês corrente nas estações de televisão. Quando deixei o meu solícito dono do quiosque lisboeta do início desta crónica, pensei dizer-lhe em jeito de despedida, parafraseando aquele episódio brasileiro: - Sabe, a língua portuguesa caminhou de norte para sul… Logo desisti, porém. Achei que ele tomaria a observação como uma piada de mau gosto. Mas confesso que não me agrada a ideia de que, por força da força homogeneizadora da televisão, cada vez mais portugueses sejam «colonizados» pela maneira de falar lisboeta. E mais preocupado ainda fico quando penso que nessa altura provavelmente teremos de falar em inglês para nos entendermos com os espanhóis e – ai de nós! – talvez com os próprios brasileiros… Vital Moreira (in Público, de 4 de Janeiro de 2000)
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Conclusão Como para o próximo ano lectivo irei estar em Lisboa ou no Porto, a realização deste Dossiê Temático foi bastante produtiva, permitindo-me descobrir algumas palavras que nunca imaginaria que fossem ditas daquela forma e que possuíssem certo significado. Não restam dúvidas de que, quando for para lá viver, o choque não irá ser tão brusco: já não me sinto tão desamparada como há umas semanas atrás. Recorri, inclusivé, a amigos do Porto e dos Açores, de modo a me ajudarem na recolha de alguns vocábulos que me poderiam ser mais úteis no futuro. Foi um trabalho enriquecedor, que me permitiu crescer, mais uma vez. Ao pesquisar por frases, provérbios, vocábulos ou
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crónicas que falassem sobre esta diferença de pronúncias entre as regiões, apercebi-me de que o nosso país é uma verdadeira mina de surpresas, um tesouro. E, por isso, devemos estimá-lo, tratá-lo com o respeito que ele merece. Este Dossiê Temático teve de ser, necessariamente, mais pequeno que os anteriores, por possuir um limite de quinze páginas. No entanto, poderia estender-me por muitas mais, pois o material relativo a este assunto parecia não ter fim. É sempre um prazer saber mais. Sinto-me melhor, mais satisfeita comigo mesma. Agora, resta-me usar toda a informação apreendida e (porque não?) mudar o Mundo!
Bibliografia
http://alfclul.clul.ul.pt/clulsite/DRA/resources/DRA.pdf http://pt.wikipedia.org/wiki/Regionalismo#Em_Portugal http://clc-rvcc.blogspot.pt/2008/10/ng6-dr2-ruralidadee-urbanidade.html http://www.dicio.com.br/regionalismo/ http://meloes-melodia.blogspot.pt/2009/05/pronunciado-norte.html http://www.xn--portugusq1a.tv/articles/120154/Dialectos-de-Portugal http://www.xn--portugusq1a.tv/articles/120153/Dialectos-da-l%C3%ADnguaportuguesa http://pt.wikipedia.org/wiki/Regionalismos_de_Portugal http://amorizade.weblog.com.pt/arquivo/2005/08/diciona rio_port.html
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ANEXOS
Publicidade da SAGRES, Encontra-te Aqui http://www.youtube.com/watch?v=V0qGkH1JIYs&feature=player_emb edded Vídeo da SIC, Viagem pela Língua Portuguesa, 30/09/2007 http://videos.sapo.pt/tOYSiaduoybCb2elImnI Vídeo da SIC, Frases que fizeram a História, 25/11/2007 http://videos.sapo.pt/hzcnHj0AWzFfL93KbRP2 Música do grupo GNR, A Minha Cidade http://www.youtube.com/watch?v=teKOeDNLoUY Regionalismos de Braga https://sites.google.com/site/falarbragues/voc%C3%A1bulos Regionalismos da Madeira http://www.buzico.net/regionalismos.htm Regionalismos Guarda-Viseu/ Lisboa http://www.scribd.com/doc/26696867/Expressoes-e-Vocabulos Documento relativo à língua do Alto Minho http://www.victordomingos.com/resources/livros/arcosonline/a-nossalingua.pdf Música Champanhe, de Rui Veloso http://letras.terra.com.br/rui-veloso/1583903/
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Podemos ter muitas palavras para dizer uma coisa que aparentemente . é a mesma, mas a verdade é que cada um a diz de uma forma diferente. É por isso que as possibilidades de reprodução do mundo pelas palavras são tantas.
José Luís Peixoto
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