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Spider’s Nemesis Elemental Assassin 0.4 Jennifer Estep


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Esta história se estende por um período de muitos anos, começando antes de Gin nascer e terminando durante os eventos de Tangled Threads (livro 4 da série). A história é narrada do ponto de vista de Mab Monroe e mostra como a Elemental do Fogo cresceu, incluindo seu primeiro encontro com Eira Snow, a mãe de Gin.


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vadia simplesmente não iria morrer.

Não importava o que eu fazia, não importava quão duro eu tinha meus homens procurando por ela, não importava quem eu contratei para matá-la, a assassina conhecida como a Aranha simplesmente não iria morrer. Mais uma vez esta noite, ela escapou da armadilha que eu tinha reservado para ela – e me envergonhou no processo. Eu odiava ser envergonhada. Não era bom para os negócios, ou mais importante, para minha imagem. Eram dois dias antes do Natal e eu estava de pé no antigo pátio de trens de Ashland, minha propriedade – e uma que estava atualmente cheia de cadáveres. Os policiais já estavam aqui, as luzes azuis e vermelhas em cima de seus sedans emitidos pela cidade girando e girando, jogando flashes berrantes de cor em toda parte. As piscinas brilhantes de luz iluminavam os vários vagões que estavam no pátio e faziam os trilhos de metal enferrujado no caminho brilhar como fitas de seda. Os policiais já haviam colocado a fita amarela da cena do crime, amarrando-a de um vagão para o outro. Eu sempre me perguntei por que eles se incomodavam com tais coisas após o fato. Meus homens estavam mortos. Isolar a área não ia fazer nenhum maldito bem aos gigantes mortos e, não era como se fosse haver qualquer evidência real para coletar. A Aranha nunca deixava nada de importante para trás de suas matanças. Só essa maldita runa.Hoje à noite, ela tinha desenhado no cascalho do pátio de trens, como uma galinha arranhando no chão, um pequeno círculo rodeado por oito raios finos. Uma runa de aranha. O símbolo para a paciência. Fiquei olhando para a marca em meus pés, minhas mãos curvando em punhos e um pouco de vapor subindo fora de meus dedos cerrados. Eu teria gostado de nada mais do que alcançar a minha magia de Elemental do Fogo e desencadear onda após onda quente, pulsando até o chão estar carbonizado, até as cinzas e essa maldita runa junto com ele. Mas eu não podia fazer isso – não enquanto a imprensa estava observando. Repórteres de vários jornais, TV e estações de rádio da cidade se agrupavam em grupos apertados por trás da fita da cena do crime, seus microfones e câmeras todos apontados nessa direção, filmando os


4 policiais conforme eles carregavam os diversos corpos em macas para deslizar nas vans do legista que tinham sido enviadas a cena. E as pessoas pensaram que eu era má. Pelo menos eu não era um fodido abutre de mídia. Claro, eu matei pessoas por dinheiro, capricho, prazer, ou simplesmente para fazer um ponto, mas eu não filmava o processo – ou o resultado. Alguns dos repórteres me notaram olhando em sua direção e tomaram isso como um convite para começar a gritar para mim. — Srta. Monroe! Mab! Você pode nos dar uma declaração sobre o que aconteceu? É verdade que a Aranha matou vários membros de sua equipe de segurança? As perguntas dos repórteres todas correram juntas, como um enxame de abelhas zumbindo no fundo. Eu dei a eles um olhar desdenhoso e voltei a olhar para a runa no chão na minha frente. Eu me perguntei a mesma coisa que eu sempre perguntava quando eu via o símbolo esses dias: por que uma runa de aranha? De todas as runas lá fora, por que ela tinha escolhido uma tão simples para deixar para trás como sua marca? A runa me importunava, como uma agulha picando a minha pele. Eu sabia que eu tinha visto isso antes, mas eu não conseguia localizar onde ou a quem pode ter pertencido. Alguém que eu matara mais provavelmente, já que a Aranha sempre cantava alegremente sobre reembolso durante as breves conversas de telefone que eu tinha com ela. Mas quem poderia ser? Eu há muito tempo tinha perdido a conta de todos os tolos que eu tinha assassinado ao longo dos anos. Você não conseguia ser o chefe do submundo de Ashland por ser um tipo tímida, reservada e eu tinha subido na hierarquia mais rapidamente do que a maioria, graças à minha determinação implacável – e minha magia de Fogo. Mesmo agora, eu podia sentir o poder queimando dentro de mim, como se minhas veias estivessem cheias de lava, em vez de sangue. Oh, havia outros elementais lá fora, aqueles com magia de Gelo, Ar, e Pedra, ou desdobramentos lamentáveis dessas áreas como metal ou água, mas nada poderia se comparar a sensação de minha magia de Fogo, a esse calor derretido que sempre esteve lá, à espreita logo abaixo da superfície da minha pele pálida, pronto para ser usado nas mais cruéis, dolorosas e criativas formas possíveis. Os flocos de neve girando no ar frio de Dezembro sibilaram e viraram vapor quando entraram em contato com o meu cabelo cor de cobre. Tinham-me dito que eu era um desses elementais que constantemente emitiam ondas de energia, mesmo quando eu não estava usando minha magia de Fogo para deixar alguém justamente tão infeliz como eu estava com ele. Agora, eu teria amado nada mais do que mostrar a Aranha quão descontente eu estava com ela – e que você fodeu com Mab Monroe por seu próprio risco.


5 Mais uma vez, meus olhos traçaram a runa aos meus pés. Obviamente, a runa da aranha era seu nome de assassina, mas eu senti que havia mais para o símbolo do que apenas isso. Tinha que ter algum significado pessoal para ela e se eu pudesse descobrir qual era esse significado, então eu saberia exatamente quem eu estava enfrentando – e a melhor forma de encontrar e matar a vadia. Uma tarefa que tinha se transformado de um passatempo divertido para uma necessidade crescente. Passos trituraram o cascalho atrás de mim, mas eu não me virei. Eu sabia quem era. Ele era o único corajoso – ou tolo o suficiente – para se aproximar de mim depois de uma derrota tão embaraçosa. Qualquer derrota, na verdade. Um momento depois, Jonah McAllister pisou ao meu lado. McAllister usava um terno liso preto, coberto com um sobretudo longo e pesado tão condizente com seu status como meu advogado. As luzes dos carros da polícia faziam seu elegante penteado de cabelo prateado assumir um tom azul frio e, então, sangrento avermelhado. Seu cabelo estava em desacordo com o rosto sem idade. A pele lá era tão suave e firme que você poderia ter jogado moedas em suas maçãs do rosto1. — A contagem oficial é de quatro gigantes mortos e, claro, LaFleur — disse Jonah, uma nota de pesar rastejando em sua voz, já que ele estava fodendo com ela enquanto ela estava em Ashland. — LaFleur — eu murmurei em desgosto. — Eu nunca deveria ter contratado ela. A única coisa em que se destacou, era em falar besteiras. Que desperdício de dinheiro — meu olhar cortou da runa de aranha para a mulher morta no chão ao lado dela. Ela tinha uma vez sido bastante impressionante, com seu curto cabelo preto brilhante. Agora, sua pele de porcelana tinha assumido uma qualidade de cera e seus olhos verdes estavam abertos com choque, dor e apenas um toque de medo. Elektra LaFleur. Supostamente, a melhor assassina que o dinheiro podia comprar com a magia Elemental elétrica poderosa que ela usava para fritar suas vítimas como uma batata frita queimada. Eu tinha contratado LaFleur para vir a Ashland, rastrear e matar a Aranha – só que ela não tinha estado completamente à altura da tarefa, como evidenciado pela ferida de faca ainda sangrando no seu coração e o sangue que tinha se agrupado debaixo de seu corpo frio. — Bem, pelo menos a Aranha não incendiou qualquer outra coisa, enquanto ela estava aqui — disse Jonah.

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Diz a lenda que os novos recrutas no exército dos EUA tinham que fazer suas camas de tal forma que o sargento inspecionando poderia deixar cair uma moeda sobre o cobertor e ela iria saltar. Em outras palavras, muito liso.


6 — Não, Jonah — eu rebati. — Ela cuidou disso a última vez que ela esteve aqui, ou já se esqueceu do que ela fez ao depósito de trem? — eu golpeei meu dedo para as ruínas ainda fumegantes do depósito. Há poucos dias, a Aranha tinha se esgueirado para o pátio de trens para resgatar uma garota que eu tinha sequestrado e estava segurando como motivação para seu pai. A Aranha tinha começado um incêndio no depósito como uma distração e, toda a estrutura tinha queimado até o chão como resultado. O advogado engoliu em seco e deu um passo para trás. Apesar do fato de que meus olhos eram negros como seu terno, Jonah ainda podia ver o Fogo Elemental piscando em meu olhar aquecido. Eu virei para longe de Jonah, me abaixei e peguei outra coisa que a Aranha tinha deixado para trás esta noite – uma orquídea branca. As pétalas pareciam frias na minha mão, como delicadas lascas de gelo. A orquídea era a assinatura de LaFleur, algo que ela usava para decorar os corpos de todas as suas vítimas, assim como o Aranha fazia com seu símbolo pequeno, símbolo excêntrico. Assassinos e suas fodidas runas. Eu nunca entendi por que algumas pessoas sentiam a necessidade de marcar suas mortes. Saber que seu inimigo estava morto deveria ser satisfação suficiente. Sempre foi para mim. — E o que você quer fazer sobre Bria Coolidge? — Jonah finalmente perguntou. — Isso depende. O que ela está dizendo aos policiais e a imprensa? Ele deu de ombros. — Que LaFleur a sequestrou, a colocou em um vagão ferroviário e ameaçou torturá-la. Que ela ouviu uma luta e que ela não viu uma maldita coisa até que alguém abriu o vagão ferroviário. Coolidge alega que no momento em que ela reuniu coragem o suficiente para sair, LaFleur e os gigantes estavam mortos e a Aranha tinha ido embora. — Você acredita nela? Jonah deu de ombros novamente. — Isso se encaixa com alguns dos outros relatos de testemunhas oculares sobre a Aranha, mas eu acho que há mais na história de Coolidge do que ela diz. Ela sabe que você a quer morta, Mab, e que você enviou LaFleur para fazer o trabalho. Desta vez, eu dei de ombros.


7 — Eu não me importo com o que ela sabe ou que ela diz. Coolidge não pode me tocar. Ninguém pode. Eu mando nessa cidade — eu olhei através do pátio de trens. A detetive Bria Coolidge estava sentada na traseira de uma ambulância que tinhas as portas abertas e deixou um paramédico tomar sua a pressão arterial, enquanto outro limpava os arranhões superficiais no seu rosto. Xavier, um gigante e seu parceiro na força, ficou por perto, mantendo um olho em Coolidge e conversando com um de seus oficiais superiores. Xavier era um dos poucos homens no Departamento de Polícia de Ashland que não estava em minha folha de pagamento. Uma vergonha. Ele parecia mais resistente e muito mais competente do que os que reportavam para mim. Coolidge era bonita o suficiente, com o cabelo desgrenhado loiro e olhos azuis, mas era o colar que ela usava que sempre chamava minha atenção. Um pequeno pingente de silverstone em forma de uma delicada prímula. Eu tinha visto Coolidge usando o colar antes, quando nossos caminhos se cruzaram pela cidade – na verdade, eu nunca a tinha visto sem ele. Mas por alguma razão, eu não conseguia parar de olhar para esta runa hoje à noite. Uma prímula. O símbolo de beleza. Comecei a pensar sobre símbolos então – todos os outros símbolos que eu vi esta noite. A orquídea de LaFleur. A runa da Aranha. E agora, Coolidge e sua prímula. Demorou alguns segundos, mas as lembranças borbulharam na superfície da minha mente, como um vulcão em erupção. E, de repente, lembrei-me de outra menina – e outro colar... — Por que você está usando um floco de neve como um colar? — eu perguntei. A garota olhou para mim, com seus grandes olhos azuis. — Porque é a minha runa. Um floco de neve para a calma gelada. O símbolo da família Snow. O nome da garota era Eira Snow e estávamos sentadas à mesa que tinha sido colocada na minha sala de jogos enorme. Limonada, cookies, cupcakes e mais cobria a mesa de madeira branca, juntamente com um conjunto de porcelana fina de minha mãe e pilhas de guardanapos de linho branco. Bichos de pelúcia, blocos e outros brinquedos se amontoavam no chão, enquanto livros brilhantes estavam enfiados nas prateleiras que cobriam uma das paredes. Nós deveríamos estar brincando juntas, mas eu não tinha qualquer interesse no alimento, ou brinquedos. Eu já tinha usado minha magia de Fogo para derreter três xícaras de porcelana e chamuscar a maior parte


8 do pelo fora dos bichos de pelúcia, deixando apenas seus olhos de vidro inteiros e intactos. Eu até mesmo usei meu dedo como uma tocha e chamusquei meu nome em letra cursiva no topo da mesa de madeira. Eira tinha me olhado com os olhos arregalados quando eu havia feito isso e ela brincava nervosamente com a ponta de uma de suas tranças douradas, como se ela quisesse me dizer para parar – mas ela não tinha coragem. E ela não iria se soubesse o que era bom para ela. Eu tinha apenas sete anos, mas eu já tinha descoberto que era muito mais divertido usar minha magia Elemental nas pessoas do que em meus bichos de pelúcia. Eu sabia mais do que todos pensavam que eu sabia – especialmente sobre o que minha família realmente fazia e de onde o nosso dinheiro vinha. Meu pai, Marcus, era um chefe da máfia, assim como em todos os filmes antigos que eu via na TV. Eu não sabia exatamente o que isso significava, além de que as pessoas faziam o que meu pai dizia que quando ele dizia. E, se não, então ele usava sua magia de Fogo neles até que chorassem e implorassem a ele para parar. Ele tinha me deixado assistir a última vez que ele usou seu poder sobre alguém, dizendo-me que já era hora de aprender exatamente para quê minha magia de Fogo era boa. Isso tinha sido... Excitante. — Onde você acha que minha mãe está? — Eira perguntou com uma voz pequena, preocupada. Dei de ombros. — Provavelmente ainda está conversando com meu pai. A outra garota não disse nada, mas ela começou a mastigar as unhas. Eira e sua mãe haviam chegado a nosso estado esta manhã, juntamente com vários guarda-costas gigantes. Meu pai tinha os recebido e eu o ouvi dizer algo sobre uma disputa familiar e, finalmente, fazer a paz antes de Eira e eu sermos trazidas aqui para a minha sala de jogos, enquanto os adultos conversavam. Isso havia sido há horas. Eu não entendia o que estava demorando tanto e por que meu pai só não contava a mãe de Eira o que ele queria que ela fizesse. Isso seria o fim das coisas, tanto quanto eu estava preocupada. Eira moveu-se em sua cadeira e tomou um pequeno gole do seu copo de limonada. O movimento fez o colar de silverstone em torno de sua garganta brilhar. Tinha a forma de um pequeno floco de neve, delicado e bonito, com seis pontas pequenas. Eu amava silverstone porque eu sentia como se o metal mágico tivesse o mesmo tipo de fome que eu tinha: o desejo quente, a necessidade dolorosa que eu tinha de ter tudo que eu quisesse, tão logo eu quisesse.


9 Eira colocou seu copo para baixo e seu colar brilhou novamente, ainda mais brilhante do que antes. Eu estava com ciúmes. Apesar de todos os meus brinquedos, eu não tinha um colar como esse – e eu queria um. Eu queria o dela. Agora. Eu fiquei de pé, andei ao redor da mesa e estendi a minha mão. — Dê o seu colar para mim. Eu quero dar uma olhada. Claro, eu não tinha intenção de dar de volta para ela alguma vez, mas eu não disse isso a Eira. Ela só iria chorar grandes e gordas lágrimas. Eira balançou a cabeça e envolveu sua mão ao redor da runa de floco de neve, como se isso fosse protegê-la de mim. — Não, esse é meu colar. Minha mãe me deu. Consiga o seu próprio. Meus olhos se estreitaram e raiva explodiu em meu coração. — Não, eu quero o seu. Dê para mim. Agora. Ou eu vou dizer ao meu pai que você não deu. Seu rosto empalideceu um pouco a minha ameaça, mas ela endireitou-se na cadeira. — E eu vou dizer à minha mãe que você tentou tomá-lo de mim. Por um momento, eu não sabia o que fazer. Ninguém nunca disse não para mim. Nem meu pai, nem nossos servos, nem mesmo os guarda-costas gigantes que iam por toda parte com a gente. Normalmente, todos eles corriam para me dar tudo o que eu queria, principalmente agora que meu pai tinha me dito que eu poderia usar minha magia de Fogo neles exatamente como ele usava – para ferir e queimar pessoas como ele. Eira continuou me encarando, seus olhos azuis escuros e cautelosos agora. Bem, se ela não iria dar para mim, então eu só iria tomá-lo dela, do jeito que eu tomava tudo o que eu queria. Estendi a mão e agarrei o colar, mas Eira bateu minha mão para longe. Eu avancei pelo colar novamente, mas ela ficou de pé e recuou, de modo que ela estava de pé do outro lado da mesa. — Dê-me seu colar — eu ordenei. — Ou eu vou tomá-lo de você e eu vou fazer isso doer. Eu alcancei minha magia de Fogo. Faíscas vermelhas encheram o ar e chamas começaram a crepitar e queimar nas pontas dos meus dedos. Eu estendi as chamas para ela e sorri, deixando-a imaginar exatamente o que eu faria a ela com isso. Em vez de sentir medo de mim, Eira estendeu a própria mão. Um fraco brilho azul tremulou em sua palma, antes de se transformar em uma bola sólida de Gelo Elemental. Percebi que ela tinha magia também – a magia de Gelo. Eu podia sentir seu poder, seu gélido e glacial poder que não


10 parecia em nada com o calor derretido correndo pelas minhas veias. Estremeci com a sensação horrível, fria e alcancei mais da minha magia. Eu não sei por que, mas eu queria queimar a outra garota com o meu Fogo agora mais do que nunca. Ficamos ali na sala de jogos, nos enfrentando sobre a mesa. — Me deixe em paz — Eira disse, finalmente. — E eu vou te deixar em paz. — Não antes de você me dar o seu colar — eu rebati. — Dê para mim agora. Ela balançou a cabeça, me dizendo que não novamente. Ninguém me dizia não, especialmente esta garota. Minha raiva queimou um pouco mais brilhante, explodindo em completo ódio. Eu recuei minha mão, alcancei por mais do meu poder e joguei minha magia de Fogo nela. Os olhos de Eira se arregalaram, e ela mergulhou para fora do caminho. A bola de Fogo que eu tinha criado voou pela sala e se chocou contra a parede atrás dela. Um alarme começou a tocar – o mesmo alarme que soava sempre que eu usava tanto da minha magia na casa. Eira olhou por cima do ombro para mim, depois se virou e correu para a porta fechada na extremidade distante do quarto. — Oh, não, você não vai! — eu assobiei e corri atrás dela. Eu agarrei a parte de trás do seu vestido branco pouco antes de ela chegar à porta. Eira se virou e bateu minhas mãos para longe. Eu dei um chute nela e nós duas caímos no chão, rolando e rolando, ambas gritando. Eira, me dizendo para parar e eu dizendo-lhe para me dar seu colar ou então... Passos pesados soaram e eu estava vagamente consciente da porta batendo aberta e acertando a parede. Alguns segundos depois, mãos me arrancaram da outra garota. Eu chutei e ataquei, mas as mãos prenderam meus braços nos meus lados. Eu olhei para meu pai, que me segurava firme contra suas pernas. — Basta, Mab! — meu pai disse em uma voz baixa e feia. — Já basta. Eu não tinha medo de muita coisa, mas eu sabia melhor do desobedecer meu pai. Depois de um momento, eu assenti com a cabeça.

que

— Eira, querida, você está bem? — uma voz suave e feminina chamou. Uma mulher entrou correndo na sala e caiu de joelhos, ajudando Eira a ficar de pé. Ela se parecia com Eira, toda cabelos dourados e olhos grandes – olhos que tinham um fraco brilho azul sobre eles. Uma Elemental de Gelo, eu percebi. Ela era uma Elemental de Gelo, assim como Eira.


11 Naquele momento, eu odiei a mãe tanto quanto a filha. Eu me movi em meus pés, mas meu pai manteve as mãos em mim, me segurando ainda assim, quase como se ele soubesse o que eu queria fazer – como eu queria atacar com a minha magia de Fogo e queimar as outras duas elementais até cinzas. A mãe da Eira segurou a mão de sua filha e se virou para mim e meu pai. — Acho que devemos ir agora — disse a mãe. — Obrigada por sua... Hospitalidade, Marcus. Depois de um momento, meu pai acenou com a cabeça para ela. — E obrigado por se encontrar comigo, Elizabeth. A Elemental de Gelo acenou de volta para ele, então olhou para mim. Seus olhos se estreitaram em pensamento por um momento, antes dela se virar e levar Eira para fora da sala. A outra garota olhou por cima do ombro para mim e eu peguei um vislumbre final do seu colar de floco de neve antes dela entrar no corredor e desaparecer de vista. Essa foi a primeira vez que lutei com Eira Snow – mas não seria a última. Três dias depois, meu pai me deu meu próprio colar. Eu desembrulhei a caixa, tirei apressadamente o topo e olhei para o que estava aninhado dentro do papel de seda branco: uma dúzia de raios dourados, ondulados e amarrados juntos em torno de um grande rubi. — É uma runa de explosão do sol. O símbolo para o fogo — meu pai disse em uma voz orgulhosa. — Feito especialmente só por você. Agora, não é muito melhor do que aquele floco de neve bobo que você queria? — Sim — eu sussurrei, alisando o ouro brilhante com meus dedos. — É muito mais bonito do que o colar dela — meu pai acenou com a cabeça, satisfeito com minha resposta. Ele me ajudou a colocar o colar, em seguida, recuou para que eu pudesse me olhar no espelho sobre a minha penteadeira. Cabelo vermelho, olhos negros e, agora, um colar em volta do meu pescoço. A luz entrando pela janela atingiu os raios dourados, fazendo parecer como se estivessem realmente piscando, como se eu estivesse realmente usando um anel de fogo ao redor do meu pescoço. — Eu amo isso — eu disse, me virando e sorrindo para o meu pai. Ele sorriu de volta para mim, piscando em seus próprios olhos negros.

um

pouco de

Fogo Elemental

— Bom. Ele me deixou no meu quarto e eu sentei lá na frente do espelho e estudei o meu colar de todos os ângulos. Meu pai estava certo. A explosão do sol era muito mais bonita do que o floco de neve estúpido. Muito mais feroz, muito


12 mais forte. Assim como minha magia Fogo era melhor do que qualquer poder Elemental de Gelo. Ainda assim, eu não ia esquecer o que tinha acontecido com a outra garota. Como ela tinha me dito não. Como ela tinha me humilhado na frente de meu pai. Algum dia, eu jurei, eu iria ter o colar de runa de Eira, ou derretêlo direto em sua garganta bonita.

*** — Ela vai te matar — uma voz velha, ligeiramente ofegante disse. — Sério? — eu murmurei, tentando encontrar um lugar para sentar sem sujar o meu terninho preto. — Bem, eu desejo-lhe sorte na tentativa — eu finalmente empurrei uma pilha de revistas de jardinagem de vinte anos atrás para fora do sofá irregular de veludo preto no canto e me sentei ali, me empoleirando na beirada da almofada bolorenta. Poeira levantou-se quando as revistas bateram no chão, as partículas brilhando na luz do sol entrando pela janela. Eu reprimi um espirro e tentei não imaginar quanto tempo tinha sido desde que o ar fresco havia circulado pela sala. Dez anos, talvez vinte – talvez até mais do que isso. Sentei-me no que era possivelmente a casa mais suja em Ashland. Móveis estofados que estavam 50 anos desatualizados lotavam a pequena e quadrada sala de estar, juntamente com roupas que eram ainda mais antigas e eram tão gastas que eram pouco mais do que pilhas de fios amarrados juntos. Gelatina suja e rachada e frascos Mason seguravam uma variedade de botões, alfinetes de segurança e folhas de chá secas, entre outras coisas. Avistei mais do que alguns ossos retorcidos aninhados sobre tampos de mesa, ao lado de estatuetas de vidro dos animais que tinham vindo. Livros, revistas e jornais estavam também espalhados pela área, muitos deles salpicados de características manchas marrons de sangue seco. Pequenos caminhos cortavam através de toda a bagunça, parecendo com pequenos e apertados túneis em um labirinto de coelho – ou um ninho de ratos. Eu nunca poderia decidir qual era a descrição mais apropriada. Um chiqueiro teria sido mais limpo do que esta sala e o resto da casa era igualmente ruim. Do banheiro, para a cozinha e para o quarto, pilhas de pratos sujos, comida mofada, recibos antigos e outros detritos se espalhavam em toda


13 a superfície dos balcões e das mesas para o chão. Algumas das pilhas se erguiam cinco ou até seis pés no ar. Repugnante. Absolutamente repugnante. Mas não havia nada que eu pudesse fazer para corrigir isso – exceto queimar a casa toda até o chão. Uma opção que eu tinha pensado mais de uma vez, mas eu não iria dar esse passo ainda. Eu ainda precisava de Magda e suas visões – no momento, de qualquer maneira. Uma vez que minha posição no submundo de Ashland estivesse finalmente completa, bem, então eu iria rever a questão – e queria tia Magda junto com ela. — Ela vai te matar — repetiu minha tia. Virei o meu olhar longe da sujeira e foquei na tia do meu pai, minha tiaavó. Magda Monroe era uma mulher pequena, apenas um pouco mais alta que um anão e era tão fina e encurvada como uma folha de grama curvada por um pesado orvalho da manhã. Seu cabelo era sal-e-pimenta preso em mechas difusas em torno da cabeça e sua pele era marrom, cheia de linhas e manchada com a idade. Seus olhos ainda estavam afiados, tão afiados, duros e negros como os meus eram. Magda podia ter mais de oitenta, mas não havia nada de errado com sua mente – ou sua magia de Elemental do Ar. Ela se agachou sobre o cadáver de um frango morto recentemente no canto de trás, que era a única parte relativamente clara do quarto. Magda já havia cortado o frango e estava cutucando e perscrutando suas entranhas sangrentas, olhando para algo que só ela podia ver ou mesmo entender. Seus olhos negros brilhavam, ardendo como brasas no seu rosto enrugado e eu podia sentir sua magia de Ar fluindo ao seu redor. O poder roçou minha pele como uma brisa quente e úmida, mas a sensação não me incomodava. Ar e Fogo eram duas potências que complementavam uma a outra. Era magia de Gelo e Pedra que eu não poderia suportar e as frias, duras ondas de energia que vinham junto com elas. — Ela vai te matar — disse Magda, pela terceira vez. Uma aranha rastejou para fora da pilha de revistas que eu tinha jogado no chão e disparou através da tábua deformada na minha frente. Eu usei a ponta do meu estilete para moê-la no chão, aproveitando a pequena trituração que isso fez, antes de cruzar essa perna em cima da minha outra. Eu suspirei. — E quem essa pessoa misteriosa poderia ser? Eu tinha feito a viagem até esta gritadora desamparada no alto das montanhas sobre Ashland, porque Magda havia ligado e insistido que eu viesse – que ela tinha visto alguma visão com a sua magia que simplesmente não iria esperar. Usar magia de Ar para ver o futuro não era uma ciência


14 exata e Magda se envolvia em outras coisas também, como o sangue da galinha morta no chão. Mas minha tia tendia a estar certa mais frequentemente do que não, então eu cedia a seus pedidos – e me certificava de que ela tivesse um suprimento constante de aves domésticas. Ouvir as visões e conselhos de Magda tinham me permitido expandir os interesses de negócios de meu pai cinco anos atrás, quando eu assumi meu lugar de direito como o chefe do império que ele tinha começado. Meu pai não queria se afastar, é claro, mas ele não tinha muita escolha. Oh, ele colocou uma boa luta, até mesmo me desafiando para um duelo elementar, mas ele percebeu que seus dias estavam contados. Ele sabia nessa altura que a minha magia era mais forte do que a sua – mais forte do que de a de qualquer um –, mas ele ainda me desafiou. Eu quase lamentei transformá-lo em cinzas em seu próprio escritório. No mínimo, eu deveria ter feito isso do lado de fora, onde o que restou dele teria apenas desintegrado limpamente, em vez de polvilhar a mobília. — Snow — Magda sussurrou, interrompendo meus pensamentos. Ela passou os dedos através do sangue da galinha e depois usou a bagunça pegajosa para desenhar no chão. — Morte por Snow. Meu corpo todo ficou tenso e eu me inclinei para frente, de repente, ansiosa para saber que coisa nebulosa ela tinha visto na bagunça de sangue, ossos e pele no chão. — Snow? — eu perguntei, num tom afiado. — Você quer dizer Eira Snow? A vadia Elemental de Gelo ainda estava viva – e ainda causando problemas para mim todos esses anos mais tarde. Eira e eu tínhamos sido inimigas desde o primeiro dia que nos conhecemos na minha sala de jogos e nossa briga só tinha crescido ao longo dos anos. A frágil trégua que nossos pais tinham negociado entre nossas famílias havia desaparecido há muito tempo. Em sua maior parte, a gente se afastou uma da outra como crianças e adolescentes, em seguida, embora eu quase matasse Eira quando ela se casou com um homem que eu queria – Tristan, um Elemental de Pedra. Eu não tinha nenhum sentimento real por Tristan, mas ele era bonito e rico e, o mais importante, eu pensava que sua magia seria interessante para passar para minha filha um dia. Eu o persegui, mas ele realmente amava Eira e havia casado com ela em vez de mim. Apenas outra maneira em que ela tinha me envergonhado, sem sequer tentar. Amor. Uma emoção tão tola. Ainda assim, tinha sido essa emoção e a tristeza que se seguiu que mantiveram Eira longe de me incomodar pelos últimos vários anos, depois de seu amado Tristan ter sido morto em um acidente de carro. Bem, isso, e as três pirralhas que ela


15 estava ocupada criando. Todas garotas e todas Elementais de Gelo, assim como sua mãe. Mas Eira mais uma vez se tornou uma pedra no meu sapato. Aparentemente, eu tinha matado um de seus amigos e a família da mulher sobre uma dívida de jogo que o marido não poderia pagar. Eu não tinha nenhuma malícia verdadeira para os Graysons, mas eu estava finalmente garantindo o meu domínio sobre as últimas das operações de jogos de azar na cidade e eu precisava de um exemplo do que acontecia quando você não pagava Mab Monroe e seus diversos agentes de apostas. Queimar a casa dos Graysons com eles trancados dentro parecia como a maneira mais fácil de fazer o meu ponto. Além disso, tinha acabado por ser divertido. Eu não tinha tido qualquer problema com pagamentos atrasados desde então. Mas Eira tinha levado para o lado pessoal, do jeito que ela levava tudo. Eu tinha ouvido rumores nas últimas semanas que ela estava pressionando os funcionários da cidade para olhar nos meus vários negócios, mesmo que ela tivesse que saber que eu tinha a maioria dos policiais, juízes e promotores no meu bolso. Ainda assim, Eira persistiu com seu absurdo, ao ponto que estava começando a me irritar. E as pessoas sempre me irritavam apenas uma vez. Percebi que Magda estava pergunta para ela.

me

encarando,

então

eu repeti

minha

— Você acha que Eira Snow vai me matar? — deixei escapar uma risada dura, amarga. — Isso é um absurdo. Sua magia não é tão forte quanto a minha e nós duas sabemos disso. Essa é a razão de ela não ter me desafiado para um duelo Elemental por matar esse amigo dela. A magia de ninguém é tão forte quanto a minha. Você mesma me disse isso, muitas, muitas vezes. Magda sorriu, mostrando-me um bocado de dentes manchados, amarelos. — E isso era verdade, até que Eira teve uma garota com magia tanto de Gelo e de Pedra. Seu poder está crescendo, mesmo enquanto falamos. Essa garota, essa é a Snow que eu quero dizer. Ela vai ser igual a você algum dia, Mab. E depois ainda mais forte. E ela vai te matar, assim como você matou tantos outros elementais. Meus olhos se estreitaram. — E como você sabe disso? Magda apontou para o chão. — Porque todos os sinais mostraram isso para mim.


16 Eu fiquei de pé, andei e olhei sobre seu ombro. Magda tinha usado o sangue da galinha para desenhar uma série de runas no chão – flocos de neve. Pequenos círculos redondos com raios finos irradiando deles. Um após o outro, ela tinha desenhado no chão, fazendo um anel deles ao redor do corpo da galinha e dela próprio. Eu franzi as sobrancelhas, me inclinei e olhei para as marcas um pouco mais atentamente. Não, não flocos de neve. Não exatamente. Flocos de neve não tinham oito pontas sobre eles. Então, novamente, as mãos de Magda não eram tão firmes quanto costumavam ser. Ela provavelmente colocou as marcas extras lá por engano. Eu não deveria ter prestado muita atenção para a profecia de Magda. Afinal, ela estava ocasionalmente errada. Além disso, eu sabia que poderia matar Eira, que eu poderia fritá-la como uma batata frita a qualquer hora que eu quisesse com a minha magia de Fogo. Nós chegamos às vias de fato mais de uma vez ao longo dos anos e, cada vez, eu sabia que meu poder era maior do que a dela, podia sentir isso profundamente na boca do meu estômago, sabia disso com uma certeza que os fortes sempre sabiam. Mas uma garota com magia de Gelo e de Pedra, isso poderia ser problemático. Era um dom raro, ser capaz de tocar em duas áreas elementais. Era algo que eu queria dar a minha própria filha, usando Tristan e sua magia de Pedra. Mas Eira e sua filha tinham conseguido esse poder ao invés. Mais uma vez, Eira tinha algo que eu queria, algo que ela tinha conseguido sem sequer tentar. Vadia. O antigo e familiar ódio explodiu em meu coração, queimando para longe todo o resto. — Qual? — eu perguntei em uma voz áspera. — Qual das pirralhas de Eira tem poderes duplos? Magda mergulhou seus dedos em sangue da galinha de novo. Mais uma vez, a sua magia de Ar soprou pela sala imunda, como uma brisa quente girando contra o meu rosto. Após alguns segundos, a sensação desapareceu e Magda começou a balançar para frente e para trás em seus calcanhares, fazendo seus joelhos dobrarem e estalarem. Ela começou a murmurar alguma coisa que eu não podia entender, algo sobre aranhas e teias, aranhas e teias e ela continuou mergulhando os dedos em sangue de galinha e usando para desenhar esse floco de neve distorcido no chão. Às vezes, Magda ficava assim, presa em quaisquer visões torcidas que sua magia de Ar a mostrava ou a merda louca que a sua própria mente distorcida criava. Eu suspirei e alcancei o meu poder de Fogo, até que quentes e famintas chamas dançavam nos meus dedos, ansiosas para saltar de minha mão e consumir cada coisa que elas podiam. Eu curvei minha mão em um punho. Então, eu me abaixei e o esmaguei e as chamas no rosto de Magda tão duro quanto eu podia.


17 Magda guinchou de dor e caiu sobre seu lado. Sua cabeça estalou contra o chão e o movimento acentuado, doloroso foi suficiente para tirá-la do transe em que ela estava à deriva. Eu fiquei ali e assisti-a sacudir e se contorcer no chão, enquanto ela superava as ondas de dor se agitando através de seu corpo. Não era a primeira vez que eu batia ou queimava ela – e não seria a última. — Então o que eu tenho que fazer para parar essa sua profecia? — eu perguntei, quando ela finalmente se acalmou o suficiente para conversar racionalmente de novo. — A ideia ridícula que esta pirralha Snow vai me matar um dia? Magda espiou acima para mim, uma queimadura do tamanho de um punho em sua bochecha direita. A pele coriácea já tinha empolado e inchado. Ela balançou a cabeça. — Não há nada que você possa fazer para impedir isso — ela respondeu asperamente. — Não desta vez. Não esta. Não esta garota. Ela vai ser a sua morte, Mab. Marque minhas palavras. Ela vai ser mais forte do que você, ela vai ser mais forte do que qualquer um por um longo, longo tempo por vir. Mesmo que fosse quente e abafado no interior da sala, um arrepio ainda desceu pela minha espinha. Eu não tinha magia do Ar como Magda, então eu não tinha qualquer tipo de premonição ou visão do futuro, mas eu senti como se alguém tivesse acabado de andar sobre o meu túmulo ainda assim – tudo por causa da Eira Snow e as três fodidas pirralhas que ela tinha feito. Raiva e desgosto me encheram mais uma vez. Eu marchei de um lado pro outro, me movendo tão rapidamente como eu poderia através dos caminhos estreitos e sinuosos que conduziram através do lixo podre que enchia a casa a ponto de transbordar. Pensando. Finalmente, parei e olhei para Magda, mais uma vez. — Sua visão não lhe disse qual das filhas de Eira é? — perguntei. — Que pequena pirralha tem magia tanto de Gelo como Pedra? Magda balançou a cabeça. — Eu não vi isso com certeza, mas é provavelmente a mais jovem. É como essas coisas funcionam normalmente. Eu não sabia se a profecia de Magda aconteceria ou não, mas havia algo na voz dela, alguma coisa no jeito que ela olhou para mim, que me inquietava. Como se ela já tivesse visto a minha morte e estivesse marcando o tempo até acontecer. Eu não tinha matado meu pai e passado os últimos cinco anos agarrando meu caminho para o topo do submundo de Ashland para deixar alguém me ameaçar agora, para deixar alguém destruir tudo o que eu tinha trabalhado tão duro para conseguir, em primeiro lugar – mesmo se


18 ela era apenas uma garota. Crianças eram ferramentas, coisas que poderiam ser usadas para motivar outras pessoas. Eu não sentia mais por elas do que por qualquer outra pessoa – em outras palavras, absolutamente nada. — Bem, então — eu disse com uma voz fria —, se você não sabe exatamente qual é garota, então eu tenho que matar todas elas e sua mãe, apenas para uma boa medida. Magda cacarejou sua aprovação e desenhou uma última runa distorcida de floco de neve no chão.

*** — O que você quer dizer com o assassino disse que nenhuma criança? — eu lati para Elliot Slater. O gigante encolheu os ombros enormes. — Quero dizer que ele disse que faria a mãe sem problema, mas ele recusou quando eu disse que você queria as três crianças mortas também. Eu até ofereci triplicar sua taxa assim como você me disse, mas ele não quis ouvir. Aparentemente, ele tem uma coisa sobre não matar crianças. Você pode acreditar nisso? Sentamos em meu escritório, bebendo uísque e discutindo a melhor forma de organizar o assassinato de Eira e suas três filhas. Elliot descansava na cadeira de couro vermelho na minha frente, agitando o líquido âmbar em torno de seu copo de cristal. Ele era alto e poderoso, mesmo para um gigante, embora sua pele esbranquiçada, cabelos loiros e finos e olhos cor de avelã e lhe darem uma aparência desbotada, quase albina. Elliot vinha trabalhando para mim por um bom tempo agora, constantemente subindo através das fileiras até agora, ele era o chefe dos guarda-costas gigantes que eu empregava. Ele provou ser leal, confiável e tão cruel como eu era em sua própria maneira. Elliot apreciava perseguir, estuprar e assassinar mulheres bonitas e eu me certificava que ele tivesse um suprimento constante delas, assim como eu fazia com Magda e suas galinhas. Até agora, nós dois estávamos satisfeitos com o arranjo. Elliot sabia que se ele falhasse em continuar me agradando, ele seria morto como seus antecessores foram. — E qual era o nome desse assassino de novo? — eu perguntei.


19 — O Homem de Lata — respondeu Elliot. — Não se sabe muito sobre ele, mas ele deveria ser o melhor no negócio. Creditado com um monte de mortes ao longo dos anos, embora ele seja esperto sobre não ter nada para rastrear de volta até ele. Eu tive que passar por três recortes apenas para fazer contato e eu ainda não tenho a menor pista de quem ele realmente é, ou se ele está com base aqui em Ashland ou em outro lugar. Eu me recostei na minha cadeira, tomei um gole de uísque, e apreciei a queimadura doce, lenta do licor em minha boca e garganta. Nem de perto tão inebriante como usar o meu poder de Fogo, mas o uísque tinha seu próprio tipo de magia. — E que tal outras opções? Outros assassinos? Slater deu de ombros novamente. — Todos com quem conversei disseram este Homem de Lata é o melhor. Se ele não vai fazê-lo, ele não vai fazê-lo. Eu digo a você que me deixe e aos meus garotos irmos para a casa desta Elemental e cuidarmos do negócio nós mesmos. Eu balancei minha cabeça. — Eira iria transformar seus homens em cubos de Gelo. Ela não é tão forte quanto eu, mas ela não é moleza em sua magia. Além disso, ela ainda tem amigos e influência em Ashland. Se um ataque de seus homens vier a falhar, todos saberiam que eu estava atrás dele. E se Eira sobrevivesse, ela poderia causar ainda mais problemas para mim. É por isso que eu queria isso feito por um assassino, assim não haveria nenhum traço de volta para mim. Slater se inclinou para frente e me olhou com seus olhos claros. — Então talvez você deva lidar com isso você mesma e discretamente deixar todo mundo saber o quão forte você é, exatamente o quão intocável. Eu arqueei uma sobrancelha. — E o que isso me daria exatamente? Slater se recostou na cadeira. — O respeito dos poucos teimosos restantes que tenho tido problemas. Gente como Porter Kincaid. E se não o seu respeito, então algo ainda melhor, o seu medo. Eu tomei outro gole de uísque e considerei a ideia de Slater. Eu estive quietamente acumulando poder há anos, desde a morte de meu pai. Um pedaço aqui, um pedaço lá, até eu quase tive todo o bolo. Para muitas pessoas


20 em Ashland, eu era uma empresária rica e benevolente que dava milhões de dólares para várias instituições de caridade a cada ano. Eles não percebiam que essas instituições de caridade eram fachadas para a minha organização – e que eu tinha as minhas mãos em todos os negócios ilegais na cidade e arredores. Meu pai tinha sido um príncipe do submundo enquanto ele esteve vivo, partilhando o poder com outros. Mas eu, eu ia ser rainha e responder a ninguém. Quanto mais eu pensava sobre a ideia do gigante, mais eu gostava. Eira era uma Elemental poderosa, rica e influente. Sua morte enviaria ondas de choque através de Ashland e todos iriam se perguntar se podiam ser os próximos se irritassem a pessoa errada – eu. Ainda assim, eu não ia ser descarada demais sobre as coisas. Era uma coisa ter as pessoas suspeitando que você assassinou, outra eles saberem que você fez isso. Na maioria das vezes, a suspeita era tudo o que você precisava – especialmente tendo em conta o quão dolorosa eu planejava fazer as mortes de Eira e suas filhas. — Tudo bem — eu disse. — Vou eu mesma fazer isso. Vai ser mais divertido de qualquer maneira. Sempre é. Slater acenou sua aprovação. — E o que você quer que eu faça sobre o assassino? Ele devolveu a taxa que ele pediu. — Como se isso bastaria para salvá-lo por dizer não para mim — eu zombei. — Descubra quem este misterioso Homem de Lata realmente é e mate o filho da puta. — Vou colocar Douglas nisso — disse Elliot. Eu assenti. Douglas era um dos homens mais capazes de Elliot. Ele ia rastrear o assassino e cuidar desse misterioso Homem de Lata. E se Douglas não fizesse, então eu continuaria enviando homens até que um deles conseguisse. Gigantes eram descartáveis dessa maneira. Todos que trabalharam para mim eram descartáveis dessa maneira, até Elliot, mesmo se ele não percebeu isso. Eu me recostei na minha cadeira e bebi um pouco mais do meu uísque. Um sorriso curvou meus lábios enquanto eu começava a pensar em qual seria a maneira mais dolorosa, prazerosa para matar Eira Snow.


21

*** Matar Eira foi mais fácil do que eu pensava que seria. Quebrar sua filha foi mais difícil. Tinha sido bastante fácil para Elliot e seus homens superar os guarda-costas que Eira havia contratado para proteger sua mansão e suas filhas. A maioria dos homens mal teve tempo de gritar antes de Elliot esmagar suas cabeças com os punhos enormes. Ele fez o mesmo com alguns dos criados também antes de alguém soar o alarme e os outros fugirem para a floresta que cercava a casa. Então, Eira tinha saltado para a mistura, usando sua magia de gelo para cobrir a fuga dos criados e matar tantos gigantes como podia. Eu me arrastei atrás de Elliot e os homens que ele tinha trazido com ele, mais do que contente de deixá-los lidar com o ataque frontal. Deixe Eira dissipar sua magia, tentando salvar os criados que tinham abandonado. Quanto mais ela usasse agora, menos ela teria mais tarde, quando eu finalmente a matasse. Levou meia hora antes de Elliot e seus homens terem finalmente conduzido Eira para um corredor na parte embaixo da casa e ela decidiu fazer a sua posição final. Foi quando os gigantes haviam retrocedido e eu finalmente dei um passo à frente para encará-la – minha mais antiga inimiga. Os olhos de Eira se estreitaram, seu olhar azul frio e gelado com o brilho de sua magia de Elemental de Gelo. — Eu deveria ter sabido que era você — Eira disse com uma voz dura, rastejando de volta para a sala de estar que estava por trás dela. Sorri para ela, combinando seu lento recuo passo por o passo. — Sim, você devia ter. Meu único arrependimento é que eu não fiz isso há muito tempo. O primeiro dia que nos conhecemos, na verdade. Sua boca apertou em uma linha fina. — Você tentou, lembra? — Bem, esta noite, eu finalmente estou indo para o sucesso. Olhe para você, você está uma bagunça suada, assustada. Porque eu imagino que você tenha usado a maior parte de sua magia de Gelo, tentando ajudar as pessoas que correram ao primeiro sinal de problemas. Você não vai durar um minuto contra o meu Fogo, Eira. Dúvida cintilou em seus olhos, mas ela endireitou os ombros em desafio.


22 — Veremos. E então nós duelamos. Tinha tomado um pouco mais do que eu pensei que iria, mas o meu plano tinha funcionado. Eira tinha usado tanto de sua magia de Gelo tentando levar os outros para a segurança, que ela mal tinha qualquer sobrando para arremessar em mim. Eu poderia tê-la matado imediatamente, mas era muito mais satisfatório deixar meu Fogo rastejar cada vez mais perto dela, cortando todo o Gelo lamentável que ela conseguia criar. Eira sabia que ela estava morta, assim como eu sabia. No final, ela nem sequer olhou para mim. Em vez disso, ela virou a cabeça para o lado, olhou para cima e disse alguma coisa – eu não tinha certeza do que. Eu nunca descobri porque meu Fogo tomou conta dela um segundo depois. Um momento, Eira estava lutando comigo. O próximo, os amassados e cinzentos restos de seu corpo desceram para o chão. A visão me fez sorrir como nada mais jamais fez. Nem a morte de meu pai, nem os outros senhores do submundo que eu tinha despachado, nem todos os outros inimigos que eu tinha eliminado ao longo dos anos. E então meu prazer dobrou. Um segundo depois, a filha mais velha da Eira havia descido as escadas e agachado ao lado de sua mãe. Ela não era tão forte em sua magia como Eira tinha sido e levou apenas uma bola de Fogo para transformá-la em uma pilha de cinzas soltando fumaça. Duas para baixo, duas para ir. Mas as outras duas pirralhas acabaram sendo um pouco mais sortudas ou talvez um pouco mais espertas do que eu esperava. Demorou a Elliot vinte minutos de procura, antes de ele pegar a pirralha do meio se esgueirando pela casa. Ele jogou seu corpo inconsciente aos meus pés. — Pensei que você mesma iria querer fazer isso — disse ele. Eu assenti. — E a filha mais nova? Aquela com magia tanto de Gelo como Pedra? O gigante balançou a cabeça. — Não a achei ainda. Esta levou meus homens em uma perseguição alegre pela casa, no entanto. Eu acho que ela poderia ter escondido sua irmã em algum lugar. Isso, ou a pirralha percebeu o que está acontecendo e se escondeu em algum lugar ela mesma. Baixei o olhar para a garota à minha frente. Ela era jovem, talvez doze ou treze, com um emaranhado selvagem de cabelos castanhos, lisos, em vez dos cabelos dourados de Eira. Ela parecia uma boneca quebrada espalhada aos meus pés, como um dos meus brinquedos que eu tinha há muito tempo


23 rasgado em pedaços. A única coisa a fazer era queimá-la viva, assim como eu já tinha sua mãe e irmã mais velha. Eu levantei minha mão e comecei a fazer exatamente isso, quando notei algo brilhando em volta de seu pescoço. Curiosa, inclinei-me e afastei o cabelo dela para o lado. A garota usava um pingente de silverstone, assim como Eira tinha quando ela era uma garota. Assim como a Elemental de Gelo tinha até que eu a tinha matado menos de uma hora atrás. Uma estranha espécie de fúria encheu-me então. Eu arranquei o colar em torno da garganta da garota e fechei os dedos sobre ele, nem mesmo me importando de ver exatamente o que o símbolo era. O silverstone estava frio e liso e eu senti a forma redonda dele cavar minha mão, juntamente com vários raios irradiando para fora do centro. Outro maldito floco de neve, o mais provável, assim como aquele que Eira tinha usado. Meus dedos apertaram e eu estava apenas alcançando a minha magia de Fogo para derreter o metal para sempre, quando Elliot limpou a garganta. — Mab? — Elliot perguntou. — O que você quer fazer agora? A voz do gigante penetrou minha raiva esquisita e eu olhei para a garota aos meus pés considerando. — Diga a seus homens para continuar procurando a filha mais nova — eu disse finalmente. — Você vai ficar aqui e me ajudar com esta. — Por quê? — O gigante perguntou. — Mate-a e acabe logo com isso. — Não — eu disse, sorrindo, meus dedos apertando muito mais em torno do pingente de silverstone na minha mão. — Isso seria fácil demais, como matar Eira foi fácil demais. A vadia pode estar morta, mas ainda posso fazer as suas filhas sofrerem, começando com esta. A garota sacudiu acordada com um susto. Eu sentei a beira do sofá branco e a observei, desfrutando de sua confusão, então seu medo, então seu terror, conforme ela percebia que estava amarrada a uma cadeira – e que eu tinha feito Elliot prender com fita-adesiva sua preciosa runa de silverstone entre suas mãos. Ainda mais delicioso era o fato de que a garota não podia ver uma maldita coisa que estava acontecendo, desde que eu tinha feito o gigante vendá-la também. Era um truque que eu aprendi com meu pai. As pessoas eram muito mais facilmente assustadas quando não podiam ver que coisa horrível estava prestes a acontecer com elas. Apenas a antecipação sozinha era suficiente para quebrar a maioria das pessoas. Ainda assim, depois de um momento, a garota empurrou de lado seu medo o suficiente para começar a lutar, tentando se livrar das cordas pesadas


24 que Elliot tinha amarrado em torno de seu corpo. Eu fiquei de pé e me inclinei, de modo que minha boca estava perto de seu ouvido. — Não adianta lutar — disse. — Eu me certifiquei que essas cordas são bastante seguras. Trocamos mais algumas palavras sem sentido, então eu comecei a tratar com a garota, perguntando a ela onde sua irmã estava. Mas a vadiazinha se recusou a falar, mesmo quando eu a ameacei com a minha magia de Fogo. Ela ainda teve a audácia de me dizer para ir para o inferno. Olhei para ela um momento, para o conjunto teimoso do seu queixo e a dureza de sua boca. Esta era filha de sua mãe, afinal de contas, determinada a ser um espinho no meu lado até o fim. — Tão corajosa, tão jovem, tão estúpida. Faça como quiser, então — eu disse. Eu recuei e alcancei minha magia de Fogo, concentrando meu poder no silverstone preso entre as mãos da garota. Foi fácil direcionar minha magia para o metal, focar meu Fogo nessa única área, e lentamente, agonizantemente aquecer e derreter o silverstone até que o metal mágico se cauterizou na carne delicada de suas mãos. A garota gritou e chorou e se debateu contra as cordas que a prendiam, mas surpreendentemente ela ainda não me disse o que eu queria saber – nem mesmo quando eu sabia que ela podia sentir o cheiro de sua própria pele queimando. O cheiro dela enchia a sala, misturando-se com o de Eira e da outra garota. Finalmente, eu cansei de torturar a garota e a deixei sozinha, ainda chorando e lamentando. Ela não ia a lugar nenhum. Ela não era a que eu queria morta de qualquer maneira, sua irmã mais nova era – aquela que Magda acreditava ter magia tanto de Gelo como Pedra. Bria era o nome dela. O que a fazia a pirralha do meio, a que eu tinha acabado de torturar, Genevieve, de acordo com a informação que Elliot tinha recolhido para mim. Eu encontrei o gigante na cozinha, abrindo as portas do armário e espiando os potes e panelas, como se Bria pudesse estar escondida no interior. — Você ainda não a encontrou? — eu perguntei em voz afiada. Elliot olhou por cima do ombro para mim. — Estamos fazendo o melhor que podemos. É uma casa grande e ela é uma pirralha pequena. Há um monte de lugares que ela poderia estar se escondendo, se ela já não foi para a floresta. Não se preocupe. Nós vamos encontrá-la mais cedo ou mais tarde...


25 Um grito interrompeu as palavras do gigante – um afiado e estridente lamento que se propagava com terror. Mais alguns poucos gritos seguiram esse primeiro. Elliot sorriu e se levantou. — Vê? Eu te disse que eles iam achá-la mais cedo ou mais tarde. Agora, tudo o que temos que fazer é ir buscá-la... E foi aí que outro grito soou. Este estava cheia de dor e medo também, mas havia algo mais no som, algo que fez até mesmo eu prestar atenção... Fúria. Fúria pura, bruta e Elemental. Senti sua magia rasgar a casa do jeito que a minha tinha se lançado em Eira mais cedo esta noite – bruta, dura e imparável. A explosão fria de seu poder golpeou por toda a casa, parecendo ganhar força a cada segundo, até que eu podia sentir a sua magia cortando em minha pele como um chicote gelado, um que tinha um núcleo de granito. E eu senti algo que eu não tinha em um tempo muito longo: medo. — Magda estava certa — eu sussurrei. — Ela é forte. O grito desvaneceu e, por um momento, houve silêncio. Então, uma a uma, as pedras sob os nossos pés começaram a fragmentar. Não, não fragmentar. Isso era muito lento. A pedra simplesmente quebrou e eu sabia que era por causa de seu grito, por causa de seu poder Elemental. Não meu. Toda a casa começou a sacudir e erguer e eu cambaleei para trás, segurando um balcão por apoio. Fendas irregulares apareceram no teto acima de nossas cabeças e blocos de gesso começaram a cair como gotas de chuva. — Vamos destruição.

sair daqui!

— Elliot gritou acima

do rugido crescente

de

Eu já estava me movendo em direção à porta, jogando-a aberta e tropeçando para fora. Elliot estava bem atrás de mim. Nós cambaleamos até a borda da floresta, então viramos e olhamos de volta para a casa. Era como algo saído de um filme de catástrofe. Pedaço por pedaço, sala por sala, andar por andar, a casa simplesmente entrou em colapso. Poeira e fumaça e outros resíduos encheram o ar. Vidro quebrou, madeira gemeu, e os incêndios floresceram como orquídeas alaranjadas na bagunça. O que outrora fora uma mansão imaculada tinha sido reduzida a escombros por uma garota - uma garota que ainda não tinha entrado em seu pleno poder como uma Elemental ainda. Um arrepio ondulou acima pela minha espinha e, mais uma vez, eu senti como se alguém tivesse acabado de andar sobre um túmulo – o meu. — Bem — disse Elliot quando o ruído e a poeira finalmente se acalmaram. — Eu acho que você não precisa se preocupar em encontrar a outra pirralha agora. Ninguém poderia ter sobrevivido a isso. Nem mesmo a


26 Elemental que causou. Quem estava nessa casa agora está morto, morto e enterrado. Eu sabia que o gigante estava certo. A pirralho do meio, o que eu tinha deixado na sala de estar, estava certamente morta, morta pela magia de sua própria irmã. Mesmo eu não poderia ter sobrevivido a algo assim, tal destruição enorme e súbita. — Vamos lá — disse Elliot. — Vamos ver se algum dos meus homens conseguiu sair da casa do outro lado. Eu sei como você odeia desperdiçar recursos. O gigante começou a contornar em torno da borda da casa em ruínas, gritando por seus homens. Eu inspirei e o segui. Ainda assim, pouco antes de virar uma esquina e colocar a parte de trás da mansão fora de vista, eu arrisquei mais um olhar sobre meu ombro. Os incêndios foram se espalhando, consumindo toda a madeira, vidro e gesso que poderiam atingir e saltando de um monte de entulho para o outro. As chamas iriam devorar o que quer que não tinha sido destruído pela casa entrando em colapso sobre si mesma. Elliot estava certo. Eira e suas filhas foram enterradas, para sempre. Então, por que eu não podia me livrar dessa sensação persistente de temor?

*** Uma vez que a notícia das mortes de Eira Snow e suas filhas virou notícia, as coisas ficaram muito mais fáceis para mim. Ninguém poderia apontar um dedo de volta a mim e dizer que eu tinha desabado a própria casa de Eira sobre ela, mas a maioria das pessoas imaginou que eu tinha algo a ver com sua morte. De qualquer forma, isso funcionou bem para mim. Os poucos focos de resistência restantes no submundo derreteram e tomei o controle da cidade do jeito que eu sempre planejei, do jeito que eu sempre sonhei. Oh, eu ainda tinha problemas aqui e ali. Uma Elemental do Ar chamada Alexis James pensou que poderia defraudar da empresa de seu pai depois que eu a assumi e um assassino conseguiu matar Tobias Dawson, alguém que achava que ele era um parceiro de negócios meu. Essa mesma assassina também teve a audácia de assassinar Jake McAllister, filho de Jonah, durante uma festa na minha casa. Ainda assim, tudo estava sob controle – até o dia em que a detetive Bria Coolidge veio a Ashland.


27 Elliot foi quem divulgou a notícia para mim e nós discutimos isso uma noite, durante jantar em Underwood's, junto com Jonah. Realmente, não havia nada a discutir. De alguma forma, de alguma maneira, Bria Snow tinha sobrevivido à destruição de sua mansão e agora ela estava de volta em Ashland. A profecia de Magda, aquela que eu tinha praticamente esquecido ao longo dos anos, veio correndo de volta para mim e eu senti esse mesmo toque de medo que eu tinha todos esses anos atrás, quando eu ouvi pela primeira vez o grito Elemental de Coolidge de raiva, dor e fúria. — Mate a vadia — eu ordenei. — Essa noite. Mas Elliot não estava muito preparado para a tarefa. Ele voltou para a minha mansão, dizendo algum conto ridículo sobre uma mulher mascarada – uma assassina – que tinha matado seus homens e salvo Coolidge. Normalmente, eu teria queimado sua pele de seus ossos por lançar uma história tão ridícula. Só sua história não era tão ridícula quanto inicialmente parecia ser. Alexis James. Tobias Dawson. Jake McAllister. Este era um retrocesso enorme e eu comecei a imaginar se havia mais para as mortes de Alexis e Tobias do que eu pensava inicialmente. Então veio a noite em que Elliot foi morto e eu recebi um telefonema de uma mulher que eu tinha encontrado uma vez antes – no meu próprio banheiro, logo após ela ter matado Jake e despejado seu corpo na minha banheira. Ela se vangloriou para mim um pouco antes ir ao que interessa. — Você está acabada nesta cidade, Mab. Você e todos os seus comparsas e asseclas. Eu estou colocando você em aviso prévio. Eu vou derrubar a sua organização uma peça, um jogador de cada vez, até que você seja a única sobrando. E então, eu vou por você. Eu tinha combatido suas ameaças com algumas das minhas próprias e ela tinha lançado de volta algum absurdo sobre deixar seu cartão de visitas ao lado da mansão na montanha de Elliot. — Essa fodida runa de aranha? — eu perguntei, olhando para o símbolo queimando na pedra. — Por que uma runa de aranha? É tão simples, tão fraca. Ela hesitou alguns instantes. — Por que uma runa de aranha? Porque é o símbolo de paciência. E eu posso esperar não importa quanto tempo eu tiver, até te alcançar. Então olhe para a runa, Mab, memorize-a e lembre bem dela. Porque você vai ser vêla novamente em breve, doce. Incluindo o segundo antes de você morrer — em seguida, a vadia tinha desligado na minha cara.


28 Meus olhos sacudiram sobre Bria Coolidge, imaginando se ela poderia ser com quem eu estava falando, mas a detetive estava olhando para a runa ardente como todo mundo estava. Ela não estava sequer segurando seu celular. Ela não era quem tinha matado Elliot e o resto dos meus homens. Pela primeira vez em um tempo muito longo, eu tinha uma inimiga – alguém que parecia ser tão viciosa e mortal como eu era.

*** — Mab? — Jonah perguntou com uma voz suave, invadindo meus pensamentos desordenados e me puxando de volta para o aqui e agora. Pisquei e a última de minhas memórias desapareceu, como a neve derretendo no meu cabelo. Sim, eu tinha uma inimiga e agora ela tinha matado a assassina que eu havia contratado para cuidar dela. Baixei o olhar para LaFleur, os meus olhos mais uma vez indo para essa maldita runa de aranha que tinha sido riscada no cascalho ao lado dela. A neve tinha ganhado força enquanto eu estava perdida nas minhas lembranças, cada floco, individual lentamente preenchendo a runa de aranha. Eu me lembrei, então. O colar do floco de neve de Eira piscando ao redor de sua garganta quando éramos crianças. Os flocos de neve estranhos que Magda tinha desenhado quando ela me contou sobre a sua visão, que uma garota com magia tanto de Gelo como Pedra me mataria. Os estranhos e distorcidos flocos de neve que tinham oito pontas em vez de seis. A sensação da runa de silverstone da pirralha do meio na minha mão e todos os raios irradiando para fora desse círculo fino. — Não são flocos de neve — eu sussurrei. — Não são flocos de neve afinal. Aranhas e teias, ao invés. — Mab? — Jonah perguntou novamente. — Do que você está falando? Claro, eles são flocos de neve. Eles estão todos ao nosso redor. Eu o ignorei, minha mente correndo uma dúzia de direções diferentes ao mesmo tempo, colocando todas as peças do quebra-cabeça juntas, uma por uma. Não demorou muito. Agora que eu finalmente lembrei o que eu precisava, eu sabia exatamente o que eu tinha que fazer. Olhei para a orquídea branca que eu ainda segurava na minha mão. Meu punho explodiu com Fogo Elemental e a bela flor se desintegrou em um instante. Eu abri meus dedos e deixei as cinzas flutuarem para longe na brisa fria de inverno. Como LaFleur, a orquídea não tinha mais utilidade para mim Jonah deu um passo para o lado.


29 Sempre o deixava nervoso toda vez que tão casualmente eu desencadeava o meu poder de Fogo. Ele tinha me visto matar muitas pessoas com ele ao longo dos anos para ser nada além de cauteloso ao meu redor. Era a única qualidade que eu admirava nele. — Eu sei quem a vadia é — eu disse com uma voz satisfeita. — Eu deveria ter percebido isso imediatamente, mas foi há tanto tempo atrás e eu matei tanta gente desde então. Mas eu sei exatamente quem ela é agora. Mais importante, eu sei como posso encontrá-la e feri-la, feri-la como ela não foi ferida em um longo, longo tempo, desde a última vez que nos encontramos, aliás. Ele piscou. — Você sabe quem é a Aranha? Eu assenti. — Quem, quem é? — Ninguém importante — eu respondi. — Apenas uma garotinha que eu deveria ter matado há muito tempo, junto com sua irmã. Mas vou corrigir essa situação muito, muito em breve. As sobrancelhas prateadas de Jonah se juntaram, embora o resto do seu rosto não se moveu junto com elas. — E como exatamente você vai fazer isso? Eu lhe disse meu plano. Ele me ouviu atentamente, suas feições perfeitamente lisas não traindo nada do que ele realmente estava pensando. Às vezes, eu pensava que essa era a razão para Jonah ter todos esses tratamentos faciais de Elemental do Ar – para que ele pudesse esconder melhor seus verdadeiros sentimentos de mim. — Vai levar algumas semanas para organizar tudo — Jonah finalmente disse quando eu terminei. — Especialmente se você quiser atrair talentos de qualidade para Ashland e lançar uma rede por toda a cidade. — Leve quanto tempo você precisar — eu disse. — E gaste tanto dinheiro quanto você precisar. Apenas certifique-se que o trabalho seja feito corretamente desta vez. Por que Jonah? — Sim? Eu o deixei ver o fogo negro queimando em meus olhos. — Esta é sua última chance.


30 O advogado apertou os lábios e engoliu. Eu me virei, espreitei através do pátio de trens e fui em direção a minha limusine à espera. O motorista me viu chegando e correu para abrir a porta traseira para mim. Antes de deslizar dentro do carro, eu parei e olhei por cima do meu ombro. Bria Coolidge estava olhando para mim, junto com seu parceiro, Xavier. Ambos tinham os olhos estreitos e olhares calculistas em seus rostos e eu sabia que eles estavam se perguntando o que eu estava preparando, onde estava indo e o que eu poderia estar tramando contra eles e seu misterioso amigo. Dei-lhes um olhar de desprezo e deslizei na parte de trás da limusine. O motorista fechou a porta e correu para frente. Cheguei para frente, abri o bar na parte de trás e me servi um grande copo de uísque. Lá fora, Coolidge e Xavier continuaram encarando meu carro. Mesmo que não pudessem me ver através dos vidros escurecidos, eu levantei a meu copo para eles, então drenei todo o uísque. Deixe-os pensar. Deixe-os se preocupar com o que eu estava preparando. Eles descobririam em breve. Porque não demoraria muito até que Bria Coolidge estivesse morta – e a Aranha junto com ela.

FIM


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