Julianna Costa 4 semanas de prazer

Page 1


JULIANNA COSTA

4 Semanas de PRAZER


© 2014 by Universo dos Livros Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros.

1a edição - 2014

Diretor editorial Luis Matos Editora-chefe Marcia Batista Assistentes editoriais Aline Graça Nathália Fernandes Raíça Augusto Rafael Duarte

Preparação Marina Constantino Revisão Carolina Zuppo Abbed Yasmin Albuquerque Âmala Barbosa Arte Francine C. Silva Valdinei Gomes Capa Zuleika Iamashita Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Angélica Ilacqua CRB-8/7057 C87c Chantagem / Julianna Costa. – – São Paulo : Universo dos Livros, 2014. 496 p. ISBN: 978-85-7930-726-3 1. Literatura brasileira 2. Ficção erótica brasileira 3. Sexo I. Título 14-0367 Universo dos Livros Editora Ltda. Rua do Bosque, 1589 – Bloco 2 – Conj. 603/606 CEP 01136-001 – Barra Funda – São Paulo/SP Telefone/Fax: (11) 3392-3336 www.universodoslivros.com.br e-mail: editor@universodoslivros.com.br Siga-nos no Twitter: @univdoslivros

CDD B869.93


Prólogo Eu já me masturbei pensando em Gregory Holt. Acho melhor falar isso de uma vez. Tenho certeza de que é o tipo de coisa que todo mundo imagina e, embora eu negue até o dia do Juízo Final, é verdade. Se alguém pudesse ler meus pensamentos me consideraria o ser mais arrogante do universo. Ah, inferno… As pessoas já acham isso de qualquer modo. Mas eu não sou arrogante. Sou apenas uma mulher segura. Eu sei o que eu quero e nunca, nunca, minto para mim mesma sobre coisas desse tipo. Não importa quão impossível ou absurda seja a ambição: eu sempre admito para mim mesma onde quero chegar e tento chegar lá o mais rápido que conseguir. Muita gente vê isso como arrogância. E o que eu acho? Que o problema é delas. Mas eu estava falando sobre o infame senhor Holt e meus desejos íntimos e não revelados. Permita que eu me explique melhor. Muitas mulheres se masturbam. Não vou dizer todas porque não sei se isso é verdade. Isso varia de uma mulher para outra: depende da ocasião, do tempo ou das ferramentas que ela tenha à sua disposição. Mas, e isso é um fato, para muitas mulheres a masturbação precisa de encenação. O homem pega a revista masculina mais próxima e começa a se tocar de qualquer jeito, enquanto encara fotos de mulheres despidas e baba sobre elas. Pouco tempo depois ele está ejaculando sobre meias, paredes ou algum outro lugar que ele nunca vai limpar do jeito certo. A masturbação feminina é diferente. É delicada, sutil. É quase como uma dança. Você tem que descobrir os passos que funcionam para você, decorá-los e repeti-los como uma coreografia. Geralmente começa com uma imagem. Mulheres não se masturbam diante de revistas ou sites pornográficos. Elas fazem sexo sozinhas dentro do infinito mundo de sua rica imaginação. Penso em um cenário que me seduz: talvez eu deva dinheiro ao entregador de pizza como em um filme pornô, ou o ator mais gostoso do meu seriado favorito me deseje loucamente como em um conto na internet, talvez um homem dominante queira me foder sem nenhuma emoção como em um romance de banca de jornal. Pense em uma possibilidade, ligue seu vibrador, enfie-o entre as pernas e se prepare. É assim com a maioria das mulheres. Nunca foi assim comigo. Eu me lembro da primeira vez que me masturbei de verdade. Nunca tinha visto muita graça nessa coisa toda… Não no sexo! Sexo sempre foi razoável, bom ou muito bom. Nunca sem graça. Mas a masturbação nunca me encantou e, confesso, não era um hábito que eu sentia necessidade de fazer com frequência. Eu era muito jovem, e o meu namorado tinha me traído. Cheguei em casa com muita raiva e me masturbei pensando nele. Foi uma das minhas experiências íntimas mais prazerosas. É contraditório, eu sei. Muitas mulheres iriam gritar aos quatro pontos cardeais que nunca mais pensariam no filho da puta enquanto vivessem – mas o que fariam seria só pensar no filho da puta. Mas eu… Bem, eu já mencionei que não minto para mim mesma, não é? Pensei nele com todas as minhas forças. Eu montava sobre seu corpo suado e fazia ele me desejar


como nunca tinha desejado nada na vida. Fazia ele pedir e implorar. Eu ia rebolar e fazê-lo gritar alto e rouco. E depois o abandonaria. Depois de experimentar a melhor transa de sua vida, ele pediria mais e eu diria “não”. Eu diria “nunca mais”. Só isso já é capaz de me fazer gozar até hoje. Não… Eu não penso em cenários eróticos com uma sensual figura masculina sem rosto enquanto estou me masturbando: o que me faz atingir o clímax é pensar em homens de verdade. Não aquele ator pornô famoso, nem o novo queridinho de Hollywood ou algum personagem de um best-seller: eu penso em homens que eu conheço. Nunca procurei sentido nesse prazer específico. Mas aprendi os passos da minha dança e, sempre que tinha vontade, eu dançava. Até que, um dia, estava lendo algo do Oscar Wilde – ou algo sobre o Oscar Wilde – e, de forma simples, ele conseguiu traduzir meu sentimento perfeitamente: “Tudo no mundo tem a ver com sexo. Menos sexo. Sexo tem a ver com poder.” Era isso que me encantava. Era isso que me seduzia. Sexo era mais uma forma de poder. A mais basal, instintiva e, talvez, a mais absoluta. Era o poder que me deliciava em meus momentos íntimos. Um juiz que deu ganho de causa para a outra parte, um advogado irritante, um cliente boçal, meu chefe em um dia ruim… Qualquer um desses homens poderia cair sob meus encantos quando eu estava sozinha com meu vibrador à noite. A sociedade pode torcer o nariz e dizer que é errado se sentir sexualmente atraída por alguém em um ambiente de trabalho. Mas eu não estava fazendo nada de verdade, estava? Não. Eu estava apenas cedendo aos meus desejos mais íntimos. Aqueles desejos, sabe? Que a maior parte da população prefere mentir e dizer que não sente. E é por isso que eu penso em Gregory Holt. Não, eu não sinto nenhuma paixão adolescente por ele. Não, não é uma relação de amor e ódio. Ele é irritante e muito inteligente. Me desafia de todos os jeitos errados, e é justamente por isso que eu penso nele com frequência, quando minhas mãos encontram algum lugar deliciosamente sensível para acariciar. Se não posso me impor a ele em nenhuma situação real, eu pelo menos extravaso em uma situação imaginária. Não é uma questão de sexo. É uma questão de poder. E, no fim das contas, eu não tenho nenhum poder sobre ele. Nenhum. Mas isso não vai mais ser um problema: ele está indo embora. E tomara que nunca mais volte.


Capítulo 1 “Talvez eu tenha uma fraqueza por causas realmente perdidas.” Rhett – E o vento levou – Um dia vão te achar soterrada sob uma pilha de papéis, Dominique. Levantei os olhos para a porta do meu escritório. Ao meu redor, a típica montanha de processos descansava: um eterno lembrete de que eu sempre tinha trabalho a fazer. Ele estava parado na porta, com alguma coisa escondida atrás do corpo. Seu paletó era bem cortado, delineando seu corpo atlético. Seus cabelos cor de mel eram curtos e arrepiados, de modo que ele sempre tinha que usar uma quantidade exagerada de gel para mantê-los comportados. Ele me encarou com seus olhos verdes e inquisitivos. Tinha ido até ali me provocar uma última vez. Isso era óbvio. – Eu sempre mantenho meus prazos em dia, Gregory. Não sou preguiçosa como você – disse sorrindo, e baixei os olhos de volta para os meus documentos. – Os papéis nunca se acumulariam o suficiente para me soterrar. Percebi que ele tinha dado alguns passos para dentro do escritório e estava prestes a informá-lo de que eu, obviamente, estava ocupada demais para o que quer que fosse e o mandaria dar o fora. – Ouvi que você não vai poder ir hoje à noite. – Para onde? – perguntei, sem levantar os olhos. – Minha despedida. Hoje é o meu último dia, lembra? Eu lembrava. – Aleluia! – murmurei sorrindo. – Não, não me lembrava, Gregory. Sua agenda não é o tipo de coisa que ocupa espaço em minha memória. – Por que não vem, Dominique? Não seria uma despedida apropriada sem você – ele respondeu. – Eu podia sentir o seu sorriso e o seu sarcasmo. – Não acho que consigo ir embora sem ouvir seu último comentário azedo e invejoso sobre como eu não sou uma escolha adequada para o meu novo emprego. – Eles são uns idiotas sem colhões que fingem ter princípios para ganhar dinheiro – disse encarando-o. – Você vai se encaixar perfeitamente bem. Ele riu alto, estourando uma garrafa de champanhe e servindo duas taças. – O que está fazendo? – quis saber. – Você queria um último comentário azedo. Já teve. Sai. – Se você não vem até mim hoje à noite, eu venho até você. Irritante do jeito errado. Ele não ia perder a última oportunidade de regurgitar toda a sua recémencontrada alegria na minha cara antes de ir embora. – Não vou hoje à noite porque tenho trabalho a fazer. A audiência do caso Monroe é amanhã. – Amanhã? Achei que essa audiência só seria daqui a dois meses… Depois que você voltasse de férias.


Engoli a seco. A palavra férias me incomodava de um jeito estranho e inesperado. – E desde quando você sabe o agendamento das audiências do meu cliente? – Um caso de danos morais pela quebra de segredo de justiça é o tipo de coisa de que não se esquece tão facilmente. – É por isso que você perde tantas causas, Gregory. É despreparado. – Perco tantas causas? – disse rindo. – E por que sou despreparado? – Quebra de segredo de justiça é mais comum nessa cidade do que você imagina –– torci o nariz para sua risada. –– Saberia disso se dedicasse mais tempo aos próprios casos em vez de vigiar os dos colegas. – O caso Monroe era meu caso. Antes de você roubá-lo, lembra? – Somos uma equipe, Greg – sorri. – Não há isso de meu cliente ou seu cliente. – Éramos uma equipe, Dom – ele corrigiu. – A partir de amanhã, eu vou embora para bem longe de você e de seu veneno – ele me ofereceu uma taça. – Aqui – anunciei com um falso tom de diplomacia, levantando minha taça. – Um brinde a você. – Não esperava isso de você – sorriu, levantando sua própria taça. – Vai ser clichê como os outros e dizer que não se importa que eu vá para longe desde que seja feliz? – Vou dizer que não me importo se você será feliz desde que vá para longe – confessei e bati meu copo contra o dele. – Isso não está envenenado, está? – brinquei. – Infelizmente, não – ele respondeu, bebendo. – Tem um gosto horrível de champanhe barato – eu disse com uma careta. – Você acha que eu ia gastar dinheiro com você? – riu. – É mais do que você merece – Ele bebeu mais um pouco antes de ficar em um profundo silêncio. – Não quero sair daqui com inimizades, Dom – disse finalmente. – Não acho que você seja tão ruim quanto demonstrou ser… A vida inteira – disse sorrindo. – Os que me conhecem há mais tempo que você dizem que eu sou ainda pior. – Meu avô dizia que as pessoas amargas geralmente têm motivos para serem assim. Então, seja lá qual for o seu motivo… – Qual o seu problema? – interrompi. – Só quero dizer que, no que depender de mim, não há mais qualquer clima ruim entre nós. Está desculpada. – Por que eu tenho motivos para ter sido amarga, Gregory? A sua incompetência e irritação. Esses eram meus motivos. – Não quis te ofender, Dominique. – Mas ainda assim conseguiu. Meus parabéns. Ou você acha o quê? Que eu fui assediada quando criança ou que tive um casamento que não deu certo e por isso sou desse jeito hoje? Não e não, Holt. Fique avisado. – Não precisa fazer um alarde tão grande. Só vim até aqui fazer as pazes. – Pois vá embora e leve suas pazes com você. Quando um homem é ambicioso, ele é uma grande personalidade que conquistou seus mais majestosos sonhos. Quando uma mulher é ambiciosa, ela deve ser uma vadia amarga que merece ser desculpada pelo seu comportamento? – Não foi isso o que eu disse e você sabe. – Começamos a trabalhar aqui quase ao mesmo tempo, Holt, e qual de nós dois foi mais longe? – Você não está sugerindo que minhas promoções não foram merecidas, está? – Ah, por favor. Eu cubro os seus erros desde o seu primeiro ano aqui. – Isso é absurdo e injusto… Mas pelo menos também consegui seu comentário invejoso.


– Ah, cai morto, Gregory. – Sabe, eu realmente, realmente, pensei que você não era uma pessoa horrível. Mal tive contato com você em meu primeiro ano aqui e todo mundo já falava que você era A megera indomada, se me permite a paráfrase, mas eu nunca acreditei. Não de verdade. Aí você entra na justiça contra mim. – As raízes da sua maldita árvore estavam quebrando o muro da minha propriedade! E eu não sabia que você era o meu vizinho com o cachorro maníaco que parece não conseguir parar de latir. Como eu podia ter adivinhado? – Adivinhado? Sua maluca arrogante e egocêntrica. Qual o problema de levantar os olhos da sua vidinha medíocre para desejar bom dia a um vizinho. Moro naquela vizinhança a menos tempo que você e te garanto que conheço mais pessoas. – Ah, parabéns. O que você quer? Uma estrela dourada? – Você só precisava ter falado comigo e poderíamos ter resolvido toda a situação da árvore sem um juiz. Será que você consegue entender isso, Dominique? Que é possível resolver problemas conversando com as pessoas fora de uma sala de audiência? – E por que eu faria isso se na sala de audiência eu consigo um documento assinado por um juiz dizendo que eu estou certa e que posso chamar a polícia para fazer valer o meu direito? – Você é impossível – ele disse. Eu ia dar mais um gole no champanhe mas Gregory se adiantou e tomou a taça das minhas mãos. – E eu não acredito que cheguei a pensar que poderia sair daqui em bons termos com você. – O que você quer ouvir? Que eu sinto muito? Porque eu não sinto. – Trabalhamos juntos por anos. Você foi uma péssima colega de trabalho. Arrogante e insensível. Sou provavelmente a única pessoa desse escritório inteiro que não te acha um caso perdido. Você poderia ter sido boazinha uma única vez na sua vida – ele se levantou, levando o champanhe barato consigo. – Me processe – disse sorrindo quando ele alcançou a porta. – Vai pro inferno, Dominique.

Saí do banho enrolada em meu robe azul-claro. Meu corpo ainda estava úmido e a seda grudava em minhas curvas de uma forma quase carinhosa. Soltei o coque folgado que prendia meu cabelo e o atei mais uma vez, firmemente. O vento sacudiu algumas árvores do lado de fora e me peguei observando a casa vizinha através da janela do meu quarto. Holt parecia um homem limpo e organizado. Ou, pelo menos, essa era a ideia que eu tinha da sua garagem e do pedaço do seu quintal que eu conseguia ver pela minha janela. Em algumas ocasiões cheguei a vê-lo na cozinha da sua casa, ou no andar de cima, mas não conseguia enxengar quaisquer detalhes de sua vida, não importava o quanto minha curiosidade e minha visão aguçada tentassem. Os fundos do meu quintal davam para a lateral da casa dele. Ainda bem que eu não era usuária assídua da minha piscina, ou teria tido sérios problemas de voyeurismo da parte dele. Meus olhos visualizaram o espaço vazio que antes abrigava a maldita árvore que tinha sido origem de tantos problemas. Um sorriso se grudou ao meu rosto e uma ideia proibida começou a se espalhar em minha mente. Me aproximei do vidro da janela e olhei com cuidado ao redor. Sua casa estava completamente apagada. Ele iria embora no dia seguinte, não era? E a essa hora, ainda devia estar enfiado na festa de


despedida do escritório. Todo mundo amava Gregory Holt. Ele era o garoto maravilha. Gentil e agradável e sensível e nhé, nhé, nhé. Deviam ter feito uma festa memorável. Mordi os lábios e corri para o banheiro. Voltei ao quarto com meu vibrador rosa de 16 cm nas mãos. Sim, eu tenho mais de um vibrador. Desci as escadas ainda decidindo se ia ou não fazer aquilo. Abri as portas de vidro que davam para o pátio de trás e senti a brisa da noite balançar a seda do meu robe. O clima estava fresco e agradável. Olhei ao redor: a casa de Holt estava envolta na mais absoluta escuridão, mas andei até o muro baixo que dividia nossas propriedades e fiquei em silêncio tentando ouvir alguma coisa. Qualquer coisa. Nenhum som. Tudo estava no mais absoluto silêncio. Estiquei o pescoço e observei sua casa mais uma vez. Sua garagem entreaberta estava entupida de caixas. As coisas da mudança, provavelmente. Deviam estar ali para facilitar o trabalho do caminhão que certamente chegaria pela manhã. Parte de mim quis pular o muro e roubar suas coisas. A ideia me divertiu e por um tempo fiquei sorrindo como uma criança contra o muro. Ainda sorrindo, esfreguei minha testa, dei as costas para a casa de Holt e fui para as espreguiçadeiras na borda da minha piscina. Massageei o pescoço e repassei o que eu sabia. A casa está vazia. Está tudo apagado. Nenhum som. Não tem ninguém. Ele está em uma festa. Não tem hora pra voltar. Deve voltar tarde. Eu serei rápida. Enfiei um dedo no nó do robe e desatei o cordão. Eu estava nua por baixo e tinha plena consciência disso. O ar levemente frio fez meus mamilos enrijecerem quase que imediatamente. Ah, merda, Dom… Vamos fazer isso de uma vez. Joguei o robe no chão e senti meus pelos se arrepiarem. Sentei na espreguiçadeira de frente para a casa de Holt. Meu polegar encontrou a base do vibrador e o girou. O zumbido discreto me informou que ele estava devidamente ligado em uma velocidade baixa. Deitei e observei as estrelas. Havia algo embriagante na sensualidade de estar nua do lado de fora. Deixei que minhas coxas se afastassem e enfiei o vibrador entre elas. Fechei os olhos e conseguia vê-lo na minha frente. Ele estava parado na porta do meu escritório. Ele diria que aquele champanhe barato era tudo que eu merecia. Aproximei o vibrador do meu clitóris. Eu o ofenderia até que ele não conseguisse mais suportar, seria incisiva e feroz com as palavras. Consegui ouvir sua voz, apenas um sussurro contra o meu rosto: “Vadia”. Desci o vibrador um pouco mais e ele deslizou gostoso. Eu já estava molhada. Levantaria a mão e daria um tapa em seu rosto que estalaria alto. Aqueles olhos verdes iam me observar com ódio e ele rosnaria que eu não tenho solução, me mandaria pro inferno. Ah… Aumentei a velocidade e encontrei meu ponto favorito, logo acima do clitóris, e segurei o vibrador com força. “Vai pro inferno, Dominique.” Eu colocaria a mão contra a porta e diria que não tinha autorizado ele a sair. Eu o conhecia bem demais: com certeza seu sorriso apareceria com uma pergunta: “Como é que é?” Para cima e para baixo. Só com a ponta do meu aparelho, sentindo as vibrações em poucos lugares de cada vez. Eu tiraria a roupa e ficaria seminua na sua frente. “Você quer uma última chance de fazer as pazes? Pois, então, implore.” Não importa que ele seja gentil, agradável ou sensível. Ele é um homem. E eu veria seu pau endurecer através do paletó bem cortado. Se havia uma mulher no mundo que ele nunca imaginou que veria nua, essa mulher era eu. E lá eu estaria: com uma lingerie rendada, e tudo o que ele precisava fazer era implorar. Aumentei a velocidade na minha massagem íntima, nunca chegando perto de penetrar. Penetração com o vibrador nunca me fazia gozar. A ilusão era minha, e na minha ilusão, Gregory Holt iria fazer exatamente o que eu queria. Ele ia implorar.


Ia me despir e passar as mãos pelo meu corpo nu. Ia me jogar em cima da mesa e me foder com força. Ele ia me chamar de puta, eu tenho certeza. Ia me chamar de vadia arrogante e impossível. E eu ia ouvir sua voz rouca de desejo contra o meu ouvido e ia empurrá-lo antes que ele gozasse. Ia me cobrir e mandar que ele saísse. Ah, eu conseguia ver a incompreensão em seu semblante, e o sorriso voltou ao meu rosto. Apertei o vibrador com força e me ouvi gemer. Eu diria que se ele quisesse gozar dentro de mim teria que se desculpar pela árvore. Pela árvore, pelo cachorro, pelo champanhe barato, pelas ofensas… Se quisesse jorrar seu líquido dentro de mim ia ter que merecer. Ia ter que implorar. E ele imploraria. E eu deixaria que ele me possuísse mais uma vez. Afundei o vibrador com tanta força que teria doído se não estivesse sendo tão gostoso. Gemi alto e acho que disse seu nome. O alívio veio rápido e fez minhas pernas tremerem involuntariamente. Desliguei o vibrador e o soltei em cima da espreguiçadeira. Eu estava encharcada. Abri os olhos, ainda passando a língua pelos lábios, e estiquei a mão para pegar o meu robe. Foi aí que algo me chamou a atenção. Aconteceu tão rápido e ao mesmo tempo tão devagar. Uma minúscula luz vermelha nas sombras, do outro lado do muro. Um sorriso abafado. Um clique baixo da máquina fotográfica de um celular. Eu tinha perdido a noção do tempo. Ele tinha voltado para casa. Vesti o robe novamente e, quando dei por mim, estava correndo como uma leoa para cima de Holt.

– Eu vou te matar, Holt. Entrei na casa dele sem pedir autorização. Ele estava rindo satisfeito. – Me devolve isso agora, seu tarado! – Tarado? Eu? – ele ria como se nunca tivesse passado por uma situação tão engraçada na vida. – Que eu saiba, não era eu quem estava se masturbando em público. – Estava me masturbando no quintal da minha casa e você estava tirando fotos! Pervertido! – Tirando fotos? – ele riu alto. Eu me lancei em sua direção enquanto ele mantinha o celular fora do meu alcance com o braço esticado. – Certo… Calma, calma – disse passando o braço pela minha cintura, me deixando presa contra ele. Holt estava tentando me manter quieta e longe do celular. Eu estava com os mamilos rígidos e a vagina molhada, coberta por uma fina camada de seda, logo depois de ter me masturbado pensando exatamente nele: a coisa toda tinha uma sensação errada e deliciosa, e eu não estava conseguindo me concentrar. O empurrei para longe em uma tentativa de recobrar a plenitude dos sentidos. O ar descia ardendo pelos meus pulmões. – Certo – comecei diplomática. Eu precisava reassumir o controle. – A brincadeira foi engraçada. Dominique estava se masturbando e eu tirei algumas fotos, hilário. Tudo bem, eu sou uma vadia arrogante que merece que você se vingue. Você já me deu um susto horrível. Vingança completa. Agora, me dê isso. – Por-que-diabos-eu-faria-isso? – ele disse sorrindo, ainda segurando o celular nas alturas. – Porque você é uma pessoa decente. – E você é uma pessoa horrível. – Certo, tudo bem. – Não era hora de brigar, era hora de negociar – E o que você pretende fazer


com isso, então? – Eu poderia te ensinar uma lição. Poderia te ensinar a ser mais humilde. – Se você acha que vai conseguir me chantagear, você está louco. – E se você acha que amarrou esse robe direito, é você quem está louca – ele continuou rindo. Olhei para baixo e vi um de meus seios expostos. Ah, merda de situação que fica cada vez pior. Puxei as laterais do robe e amarrei o cordão com tanta força que estava quase prendendo a circulação. Que se dane. Não preciso de pernas. Preciso daquele celular. Ele estava se divertindo absurdamente. Eu também estaria, no lugar dele. Estaria sendo agradável, o contrário da dose concentrada de horror que eu estava experimentando. – Se você fizer algo com essas fotos, vai estar sendo uma pessoa tão horrível quanto eu, Greg. – tentei convencê-lo. – Você fica repetindo a palavra “fotos”… – levei três segundos inteiros para entender. Puta merda. Ele tinha me filmado. – Seu nojento pervertido! Você me filmou? – Dei um murro contra o peito dele e vi, pela primeira vez, seu sorriso sumir. Ele chiou de dor enquanto eu continuava a socá-lo. – Estava filmando minha casa, Dominique! – Greg berrou quando conseguiu me segurar por um pulso – Estava filmando os arredores para ter uma lembrança caso me sentisse nostálgico durante a mudança – ele explicou, e logo tinha meus dois pulsos presos em uma de suas mãos fortes – Não imaginei que você quisesse me dar um suvenir de despedida – brincou. Eu me sacudi até que ele me soltasse. – Mas você podia ter parado de filmar quando… – Ah! Você pararia? – Eu… – Para de me tratar como um monstro. Estava filmando minha casa, ouvi um barulho, girei a câmera, você estava com um vibrador enfiado no meio das pernas, e eu fiquei sem reação – ele explicou. Gelei diante das palavras descontraídas de Gregory – Nada que não seja perfeitamente compreensível – concluiu, me encarando – Agora, a pergunta é: o quanto você merece uma lição? Tudo bem. Ele estava com o poder. Eu precisava acabar com aquela situação. Eu ia me odiar pelo resto da vida, mas era a única saída. – Gregory, por favor. Se você colocar isso na internet, minha vida acabou. Eu perco minha credibilidade, meu emprego… perco tudo. Por favor. Você sabe como o mundo jurídico é conservador. Uma única foto dessas seria suficiente para… – eu já estava implorando, mas por Deus, eu não ia chorar. Respirei fundo. – Tudo pelo que trabalhei a vida inteira. Destruído. Com uma só foto. Imagine um vídeo. Por favor. – Juntei as mãos em súplica. Ele respirou fundo e pareceu considerar. – Não quero mostrar isso para ninguém – ele falou finalmente. Eu suspirei aliviada. – Mas… – Prendi a respiração de novo. – Você merece uma lição. E eu não posso perder essa oportunidade. – Que lição, Holt? – perguntei irritada. – Você faz uma coisa, e apago o vídeo – ele disse sorrindo, como se tivesse amado a própria ideia. – Ou eu te processo, tomo todos os seus bens e coloco você na cadeia! – respondi, cruzando os braços sobre os seios. – Processa? – Ele estava rindo como se tivesse acabado de ouvir a piada mais engraçada do mundo. – Não sei, Dom… mas acho perigoso. Ouvi dizer que quebra de segredo de justiça é muito mais comum nessa cidade do que se imagina.


Ouvi-lo repetir minhas palavras fez com que um arrepio de pavor descesse pela minha espinha. Poderia correr tudo bem. Eu iria deixá-lo pobre e furioso quando tudo acabasse. Mas… e se alguém ficasse sabendo? Um único comentário bastaria para acabar com minha reputação. E seria pelo menos um juiz que eu nunca mais poderia encontrar na vida. Sem contar as fofocas e teorias que, certamente, correriam pelo escritório. Seria um risco, quanto a isso não havia dúvida. A questão que permanecia era: seria um risco que eu estava disposta a correr? – Pode arriscar um processo e acabar perdendo sua preciosa reputação, Thoen – ele avisou como se estivesse lendo minha mente. – Ou pode aceitar um simples acordo e ninguém nunca vai precisar saber disso. Suspirei controlando a raiva. Em todas as situações sexuais que eu já tinha imaginado, nunca era assim. Nunca era ele quem tinha o poder. Inferno. O filho da puta ia querer transar. O lado bom é que transar com ele, para mim, não era uma má ideia. Mas desse jeito… desse jeito não. – Tudo bem, Holt. Você quer me chantagear, então? – decidi enfrentar o menor dos males e, pelo menos, ia poder experimentá-lo uma vez na vida. – Vai ser assim? Tudo bem – disse. Ele poderia me ter, mas eu não ia deixá-lo perceber que estava interessada. Arranquei o robe com fúria, e Holt levantou as mãos em uma assustada rendição. – Pode ter o que você quer, mas saiba que essa decisão vai te assombrar pelo resto da vida – dei dois passos em sua direção e ele deu dois passos para trás. Ele estava rindo, e eu estava vagamente consciente de que ele estava observando de perto o que tinha visto de longe mais cedo. – Toda vez, na sua existência miúda e patética, que você se considerar uma pessoa decente, vai se lembrar do dia de hoje e do monstro que você verdadeiramente é. Ele baixou os braços ao lado do corpo. – Dominique, será que você pode parar de ficar nua? Está ficando difícil de manter a concentração. – Parar de… Mas o que diabos você quer, Holt? – Não quero transar com você em troca da gravação. Garanto – ele explicou pausadamente e, de repente, eu senti uma vergonha impossível de medir. Ele apanhou meu robe e eu me vesti novamente em uma fração de segundo. – O que você quer? – Bem, eu poderia só ficar com esse vídeo pra mim – disse rindo. – É um produto de qualidade – afirmou levantando o polegar, e eu dei um tapa em seu braço com toda a minha força. – Diga de uma vez. – Primeiro – ele reclamou, apontando o indicador para o meu nariz –, pare de me bater. – Diga logo – rosnei. – Eu odeio mudança – deu de ombros. – Sou muito desorganizado. Levo uma eternidade para arrumar tudo. – Não estou acompanhando, Holt. – Você entra de férias amanhã. – E o que tem isso? – Você viaja para me encontrar depois de amanhã e passa suas férias comigo. Arruma minha casa nova. Organiza meus documentos. Desempacota minhas coisas – concluiu com um sorriso nos lábios. – Quando tudo isso estiver feito, apagamos o vídeo. Mordi o lábio com raiva. – Você quer que eu seja sua assistente pessoal de luxo? – Precisamente – afirmou sorrindo, o maldito. – E quer que eu fique as minhas férias inteiras? Arrumo sua casa em uma semana. Não há


necessidade alguma de… – Eu sou bem bagunceiro. – Duas semanas, então – reclamei. – Um mês é muito… – Um mês – ele repetiu. – Não é negociável. – Eu trabalhei duro. Mereço esse descanso! Pedir minhas férias inteiras é crueldade. – Não. Crueldade foi o que você fez com a garota do financeiro, seja lá o que tenha sido. – Ela é uma incompetente que não sabe contar e a culpa é minha? – Ela chorou o dia inteiro! – Se ela é emocionalmente desestabilizada, deveria procurar ajuda profissional. Não entendo por que eu seria responsável por… – Você é um ser humano terrível – ele concluiu com um ar de exaustão. – E, se eu fosse você, aceitaria antes que eu mude de ideia. Ele não ia ceder. Processá-lo seria um risco grande. Talvez grande demais. E ir com ele… Uma pequena parte de mim estava achando interessante a ideia de ter companhia durante as férias. Mas era uma parte ridícula e minúscula que eu preferia não ouvir. A vadia dentro de mim tinha planos mais interessantes. Ele queria me humilhar? Tudo bem… Eu jogo seu jogo, Holt. Vou para sua casa, garanto que ninguém nunca vai ouvir qualquer notícia sobre essa merda de vídeo, mas não se engane, meu bem… A arte da guerra me ensinou a manter meus inimigos por perto. E eu vou me vingar. – Quatro semanas? – Quatro semanas. – E como isso vai me ensinar algum tipo de lição? – Isso te ensina um pouco de humildade, Dominique. Algo que você precisa com urgência. – E quem é você pra me dar alguma lição de vida, Gregory? Meu pai? Minha mãe? Deus? – Melhor! – ele riu. – Eu sou o cara que tem um vídeo de você se masturbando. – Você também é um ser humano horrível, sabia? Uma pessoa baixa. – Vou deixar passar desta vez – brincou. – Nunca fui baixo durante toda a minha vida, acho que se for fraco só dessa vez não vou morrer por isso. – Eu desempacoto algumas coisas, compro uns lençóis novos e pronto? – Você é uma assistente pessoal de luxo, como você bem descreveu. Vai precisar fazer o que eu pedir. Pense nisso como um emprego. Eu sou o patrão – ele apontou para si mesmo com um sorriso irritante no rosto. – Você trabalha pra mim. Se fizer um bom trabalho, recebe um vídeo como pagamento. – E como eu vou saber que você não fez cópias? – Eu tenho uma pasta de compartilhamento integrada no celular. Todas as fotos ou vídeos que eu faço vão direto para essa pasta na internet, que eu posso acessar de qualquer computador. – Ótimo – senti meu sangue subir. – Então a gravação já está na internet? – Não. Está em uma pasta pessoal, com senha, que fica na internet. Mas que ninguém pode acessar. – Só você. – Exatamente. – E de que me serve isso? – reclamei ferozmente. Estava perdendo a paciência, e ele estava se deliciando com isso. – A gente vai até o meu computador agora, e muda a senha da pasta. Eu escrevo a primeira metade e você a segunda. Assim ninguém sabe a senha inteira. Nenhum de nós pode acessar sem o outro. Depois nós acessamos a pasta juntos e apagamos o arquivo.


– E como eu tenho certeza de que é a única cópia? – Dominique. Você acabou de correr atrás de mim como um animal. Eu tive tempo para fazer alguma cópia? – Não que eu tenha visto, mas você é um demônio ardiloso – lembrei. – Então você vai ter que confiar em mim. Não é como se tivesse uma escolha. – Mas, se você não tiver a senha completa, o arquivo vai estar protegido. O que te garante que eu vou fazer o que você quer? Eu posso simplesmente deixar o vídeo lá pelo resto da eternidade. – Pode – ele deu de ombros. – Mas bem guardado não é o mesmo que inexistente. Se você não for comigo, o vídeo vai ficar lá até você morrer ou alguém conseguir acessá-lo. Se você for, ele deixa de existir. Você escolhe – Ele sorriu. Estava odiando que ele estivesse se divertindo tanto as minhas custas. – Negócio fechado? – perguntou esticando a mão para que eu apertasse. – Eu quero o celular. Mesmo indo para a sua pasta, o arquivo também fica gravado no aparelho. – Te dou o celular assim que mudarmos a senha. Ou você poderia acessar a pasta direto pelo telefone e apagar o vídeo. – Fechado – apertei com nojo a mão que ele oferecia. – Você quer ir se trocar? – Não saio de perto de você até a senha dessa pasta ter sido modificada – expliquei. – Como quiser – ele riu. – Viu que é possível resolver as coisas com um diálogo agradável? – Sarcástico. – Pense o que quiser. Eu só estou satisfeita que você não quis sexo. Acho que nunca mais ia me sentir limpa na vida se você me tocasse – reclamei. – Você fala com muito pudor para quem estava completamente nua se masturbando bem embaixo da janela do meu quarto. – Será que podemos mudar de assunto e não falar sobre isso nunca mais? Ele me observou com uma cara de exagerada incompreensão. – Dom, meu bem… Eu nunca vou parar de falar disso com você – disse rindo – E olha, talvez eu ainda mude de ideia e aceite o que você estava oferecendo antes. Então, é melhor manter a mente aberta – ele terminou com uma gargalhada. E eu não entendi se ele estava brincando ou falando sério. Um ponto entre minhas coxas tremeu deliciosamente, e eu desejei que fosse sério.


Capítulo 2 “– Você, senhor, não é nenhum cavalheiro. – E você, senhorita, não é nenhuma dama.” Scarlett e Rhett – E o vento levou Dei o nó na gravata e encarei meu reflexo no espelho. Passei um pouco de gel nos cabelos arrepiados em uma tentativa de mantê-los sob controle. Segunda-feira. Será que ela viria? Era um pensamento delicado e arriscado. Eu estava brincado com fogo. E Dominique era fogo do pior tipo. A mulher merecia uma lição: isso era inquestionável. Ela era uma pessoa horrível na maior parte do tempo. E quando não era horrível, era… Quase sorri sozinho. Se mais alguém teria tido a oportunidade de ver o lado gentil de Thoen era uma dúvida que eu sempre tive. Eu mesmo, nunca o teria visto se não fosse por acidente. Ela parecia ser boa sem querer, e ruim de propósito. De qualquer maneira, boa ou ruim, ela era teimosa e inteligente, meu pequeno plano sem dúvida jogaria toda sua fúria na minha direção. Mas eu precisava tentar. – Se ela vier, vai fazer você se arrepender de sua brincadeira – avisei ao meu reflexo antes de enxugar as mãos e sair do banheiro. Eu não podia pensar muito tempo naquele assunto. Só de lembrar da cena… Aquele corpo escultural despido e contorcido, gemendo… Ai, merda… Eu tinha que ir trabalhar. Ela tirou o robe na minha casa e se ofereceu. Esfreguei as têmporas. E eu tive que me controlar para não puxá-la pela cintura e dizer “Sim, por favor”. Tive que me controlar durante muitos anos. Sempre tive tesão por aquela maldita mulher. Isso era um fato. E parte de mim sempre achou que todas as nossas intermináveis discussões tinham um bocado de tensão sexual sufocada. Mas Dominique brigava e rosnava com qualquer um que se aproximasse e, ao perceber que seu estado constante de birra não era reservado exclusivamente a mim, deixei essa ideia da atração velada de lado. Era mais fácil só odiá-la, falar mal dela pelas costas e reprimir o pensamento de como ela ficava linda sempre que espremia os lábios quando estava me xingando de uma coisa ou outra. Ela não vai vir. Thoen me conhece… Ela sabe que eu não vou colocar o vídeo na internet. Merda… eu não tive nem coragem de assistir àquela porcaria. Passei os dedos pelo meu celular, no bolso. O backup do


vídeo estava em outra pasta. Uma que Thoen sequer imaginava existir. Podia sentar na minha sala de estar e assistir à mulher que mais me torturou na vida enfiar um vibrador no meio das pernas. Senti meu sangue fluindo para o lugar errado e soltei o celular. Não era uma boa ideia pensar em Thoen se masturbando. Mas era impossível não pensar. Parte de mim queria muito que ela viesse. Queria conviver com ela e tentar descobrir por que escondia o seu lado gentil e só mostrava aquela casca, teimosa e revoltante. Talvez eu conseguisse fazê-la mudar. Faria dela minha pequena missão de redenção pelos meus erros do passado. Não importaria quanta merda eu tivesse feito na vida, não é? Quero dizer… Se eu conseguisse fazer o demônio Thoen ser uma pessoa melhor, meu karma teria que se equilibrar mais uma vez. Tranquei a porta de casa e brinquei com a chave em meus dedos. Eu havia dito a Dominique que deixaria a chave embaixo do capacho. Seria divertido se ela viesse. Ela não vem, Greg. Você tem sorte se ela não te processar. Era ruim manter expectativas. Thoen era passado. E, se algum dia eu tive uma chance de me aproximar daquela mulher confusa e misteriosa… A chance estava perdida. Nova vida agora, Greg. Entrei no carro e resolvi deixar o passado para trás. Já ia ser difícil o suficiente não passar o dia fantasiando cenas com meu celular me provocando no bolso. Se eu tivesse expectativas de vê-la quando chegasse em casa à noite, seria bem pior. Girei a chave na ignição e tentei afastar a imagem do corpo nu de Dominique da minha mente, mesmo sabendo que era pouco provável que eu tivesse mais sucesso hoje do que tinha tido nos últimos dias.

Larguei minhas duas malas no chão e levantei o capacho. Antes de viajar, Holt disse que a chave estaria ali embaixo esperando por mim. – Filho da puta – reclamei para o nada. Não havia chave alguma. – Ótimo – ri de raiva. O idiota ia usar cada minúscula oportunidade para me humilhar. Tudo bem. Eu ia aceitar: precisava do vídeo. Mas que ele não se enganasse! Minha vingança viria, e ela seria pior do que as sete pragas do Egito. Meu relógio de pulso me informou que ainda estávamos na metade da manhã. O meu patrão imbecil só chegaria à noite. O que diabos eu ia fazer até lá? “Dominique Thoen não espera por ninguém”, ouvi minha mente resmungar. Apanhei minhas malas e voltei para a cerca de entrada, puxando o celular do bolso. – Bom dia – ouvi de uma voz era estridente e irritante. – Hmm – cumprimentei de volta com um sorriso. Ah, mentira… Não sorri. Nem sequer tentei. Devo ter feito alguma careta genérica enquanto procurava na internet o número de alguma companhia de táxi local. – Você deve ser Dominique. Levantei os olhos. Ela era baixa e rechonchuda, devia ter pouco mais de trinta anos. Os olhos eram de um azul muito forte, e a boca fina parecia uma linha no meio do rosto. – Perdão?


– Dominique Thoen, não é isso? Ah, porcaria – tapou a própria boca com um susto. – Eu devia ter perguntado o seu nome primeiro. Agora, se você não for Dominique, pode dizer que é e me enganar. – Sou Dominique Thoen – respondi, encarando-a. – Posso te mostrar um documento se quiser. Mas quem é você? E, afinal, como sabe quem eu sou? – minha voz sempre ficava firme em situações assim. Sempre que eu precisava de uma resposta, minha voz atingia automaticamente um tom que deixava claro que eu não estava brincando. Era intimidante e, às vezes, grosseiro. Eu adorava. – Sou Shelbi Classen! Sou sua vizinha – ela riu e apontou para alguma casa atrás de onde ela estava. – Você é a amiga do Greg. A que ele não tinha certeza se viria. “Greg?” – Você conhece o Gregory? – Ah! Nós nos conhecemos ontem. Ele é uma pessoa ótima! – ela expirou exageradamente. E eu ainda estava tentando decidir se ela tinha se sentido atraída por ele ou se estava tentando me agradar. – Você não devia achar “ótima” uma pessoa que mal conhece – sorri, tentando parecer desagradável de propósito e voltei os olhos para o celular – Pode ser perigoso. – É verdade – sua voz era de genuína concordância. – Acho que sou um pouco inocente – ela disse rindo. De repente, algo que tinha dito me incomodou. – Ele não tinha certeza de que eu vinha? – Não – ela exibiu um largo sorriso ao ver que a conversa não tinha acabado. – Ele mencionou que não gosta de mudança e que uma amiga dele talvez viesse até aqui para ajudá-lo. E aí eu disse… – riu –, eu disse “Greg” – forçou um tom astuto que ela certamente não conseguiria manter naturalmente – “Se uma garota vem até aqui só para te ajudar a se mudar, ela deve ser uma garota muito especial” – sorriu, espremendo as mãos como se estivesse esperando que eu agradecesse o elogio. É… “especial” ou “sendo chantageada”. Fiquei em silêncio por dois segundos enquanto a observava. Finalmente, decidi que não havia nada ali que valesse a pena observar e liguei para a companhia de táxi. – Você precisa de ajuda com suas malas? Você tem a chave? Ah, como eu queria que ela ficasse quieta. Levantei o indicador com um sorriso pernóstico, indicando que estava no telefone. Ela emitiu um “oh” discreto e se calou. Do outro lado da linha, a atendente me perguntou o que poderia fazer por mim. “Matar um excolega de trabalho” não me pareceu um pedido que ela pudesse atender. – Gostaria de um táxi para… – olhei para Shelbi. O endereço estava em um papel amassado em algum lugar da minha bolsa. Ela sussurrou o nome da rua e o número. Não precisa sussurrar, Shelbi. Não é a senha do seu cartão de crédito. Eu repeti o endereço para a atendente, e ela disse que o táxi chegaria em até vinte minutos. Eu tive vontade de reclamar, mas, em vez disso, respirei fundo e desliguei. – Você já vai sair? – Não que seja da sua conta, querida – respondi com o tom mais educado que eu consegui simular. – Mas Gregory se esqueceu de deixar a chave. Ele faz besteiras como essa com frequência. Agora, preciso ir até o trabalhinho dele pegar a chave. – Ah! Eu posso te levar. Não estou fazendo nada. – ela respondeu. Olhei para ela. Não parecia o tipo de ser humano que eu queria ver no comando de um veículo em que eu estivesse. Mas se ela me levasse, eu não precisaria esperar vinte minutos. – Eu sei onde é o escritório! Estávamos


conversando ontem e ele explicou que… – Shelbi, Shelbi – falei apressadamente, interrompendo-a. – Tem certeza de que pode me levar? – Claro! – ela respondeu, satisfeita demais. – Será uma aventura de garotas! – riu e eu tive vontade de esfaqueá-la. – Ótimo – sorri ridiculamente. – Podemos ir agora, então? – Hmm! Por aqui! – ela balançou de um lado para o outro como se fosse um mordomo me mostrando o caminho, e eu soube naquele segundo que ia odiá-la.

Perguntei na recepção pelo senhor Gregory Holt. Uma secretária com um vestido preto, uma cara rosada e com cheiro de hortelã me levou até uma pequena sala de espera redonda. Algumas poltronas beges e pretas estavam espalhadas de forma simétrica ao redor de pequenas mesinhas de mogno. Dois rapazes e uma garota já estavam lá, sentados com alguns papéis espalhados nos colos, mesa e tapete. Sentei a alguma distância, de frente para o grupo. Eles pareciam perdidos, e eu ia passar o meu tempo de espera os observando. – Não adianta… A gente tinha que pedir a citação de qualquer jeito – começou um dos rapazes. Ele tinha um porte mais robusto e uma barba mal feita que lhe dava uma aparência pouco asseada. – Vocês estão olhando isso do jeito errado! A juíza já pediu para solicitarmos as informações do cliente na companhia elétrica, não pediu? Então, a gente passa o pedido para eles e depois disso não é mais problema nosso. A garota que disse isso vestia um conjunto de saia e paletó cinza com uma camisa de seda branca. Eu conseguia sentir o cheiro de estagiário a dois metros de distância. Sorri e peguei um jornal de uma das mesinhas à minha frente. – Juízes não pedem, Soraia, eles mandam – completou o terceiro jovem. Ele tinha o cabelo cortado bem curto e usava uma gravata com um nó estranho. Não consegui deixar de imaginar que aquela poderia ser a primeira gravata que ele tinha usado na vida. – Que seja, Edgar! Ela mandou que a gente solicitasse os dados do cliente. A gente faz o que ela mandou. – Mas e a urgência do… – Eu sei, eu sei! Mas quais opções nós temos? – Como funciona isso? – perguntou o robusto com a barba mal feita – Alguém sabe como é feita essa solicitação? – Acho que a gente pode ligar para a companhia elétrica e pedir… – Edgar coçou a cabeça e eu ri discretamente da sua inexperiência. – Não deve ser assim tão simples – Soraia torceu o nariz. – Deve ter algum tipo de protocolo. – É isso que eu estou falando – explicou Edgar. – Se isso demorar pode ficar mal para a gente. Acho que devíamos falar com um dos advogados responsáveis. – Se corrermos para falar com advogados toda vez que tivermos um problema, perdemos a credibilidade – lembrou a moça. – E eu não sei vocês, mas eu quero garantir um lugar aqui depois que me formar. Respirei fundo. Ah… não custava nada. – Peçam para a juíza realizar a citação por edital – falei. Três pares de olhos se viraram para mim como se não tivessem certeza de que eu estava falando com eles. – A companhia elétrica não vai


divulgar os dados de um cliente. Eles nunca fazem isso – continuei, observando-os. Eles continuaram me encarando sem saber se diziam algo ou se me esperavam terminar. – Vocês vão fazer a solicitação para a companhia, vão esperar dois meses para receber uma resposta e ela vai ser “Devido ao sigilo contratual, não podemos liberar dados dos clientes sem mandado judicial”. – Então a gente tem que pedir um mandado? – arriscou Edgar, e eu consegui perceber em sua voz que ele imaginava que aquilo deveria ser muito difícil. Eu sorri. Não conseguia me lembrar de uma época em que eu achava aquilo difícil. – Não. Você explica para a juíza que é isso que vai acontecer e pede para que ela autorize a citação por edital. – A gente liga pra ela ou… Eu ri. – Claro que não, imbecil! – Soraia respondeu por mim. – Faça uma petição para juntar aos autos – expliquei. – Pesquise nos regulamentos internos de companhias elétricas, telefônicas e do que mais você conseguir achar… Copie todas as menções feitas ao sigilo. Explique como o procedimento funciona e como é pouco eficiente. Alegue celeridade processual. Juízes adoram ser céleres – brinquei, voltando para o meu jornal. – Quem é você? – Soraia quis saber. Foi um pouco menos educada do que deveria ter sido e eu vi algo de mim naquela garota. – Alguém que sabe mais do que vocês – respondi descansadamente. – Dominique? Virei o rosto e vi Holt me esperando na porta. – Gregory – levantei. – Você se esqueceu de deixar a chave. – Não imaginei que você viria – ele respondeu. Tinha uma agradável expressão de surpresa em seu rosto. – Não imaginou que… Você esqueceu por que estou aqui? – Não. Mas imaginei que você fosse pagar o meu blefe. – Quer dizer que você estava blefando? – Agora que está aqui, acho que não vai descobrir – sorriu. – Conheci sua vizinha. – Qual delas? – Por Deus, homem… Você se mudou há menos de 48 horas e já conhece mais de uma vizinha? – Não há nada de errado em desejar bom dia para os vizinhos, Dominique. Acho que essa vai ser uma boa maneira de começar a semana, por sinal. – Vai fazer uma festa de inauguração da sua casa, é? – provoquei. – É uma boa ideia. Mas não era a isso que eu estava me referindo. Continuei fitando-o nos olhos e pude ver que ele estava elaborando algum tipo de tortura para me submeter. – Vamos, Holt. Diga de uma vez. – Seu primeiro trabalho: recebi algumas cestas e cartões de boas-vindas de alguns vizinhos. Por que você não compra algo legal para agradecê-los? Vá até a casa deles, converse um pouco. Vai te fazer bem. – Certo. Seu cartão de crédito e sua senha? Ou você vai querer que eu compre presentinhos para a sua vizinhança inteira com o meu dinheiro? – Não acho que você vá à falência por isso. Eu te pago de volta hoje à noite. – Posso precisar comprar alguma coisa para sua casa também…


– Não vou te dar meu cartão nem minha senha, Dominique. De jeito nenhum! – ele disse rindo. – Tudo bem – sorri, fingindo rendição. Ia ter que arranjar outro jeito de me vingar. Tudo bem. Oportunidades iriam aparecer. – Você precisa de um táxi? Estiquei o pescoço tentando olhar por cima de seu ombro. – O seu chefe está aí? – Por quê? Quer deixar seu currículo? – Nunca! – ri. – Mas imaginei que ele gostaria de ouvir que o novo empregado dele está chantageando uma donzela indefesa. – Donzela indefesa? Você é muitas coisas, Dominique, mas… – Ou talvez sobre o tipo de vídeos caseiros que você gosta de fazer. Será que ele gostaria de ouvir uma história sobre isso? – ameacei. Estava só provocando, obviamente. Aquilo nunca daria certo, até porque… – Acho que ele vai gostar sim – ele sussurrou. – Mas acho que ele vai gostar mais ainda de ver o vídeo. Você vai precisar provar suas alegações, não vai? Exatamente por isso nunca daria certo. Abanei a mão de qualquer jeito na direção dele. – Você precisa de um táxi? – ele repetiu. – Não. Shelbi está me esperando lá em baixo. Ele arregalou os olhos para mim. – Thoen, me diga que você não está explorando os meus vizinhos. – Não, Holt, só estou fazendo amizades – repliquei sonsamente. – Achei que esse era o objetivo. Peguei a chave em suas mãos e dei um “adeus” brincalhão para os estagiários que, agora, pareciam bem mais organizados. De nada.

– Você disse que não estava ocupada! – Ah, não se preocupe, querida! Não foi incômodo algum. Eu deixo você em casa e vou terminar de resolver umas coisas que preciso fazer hoje. Vai dar tempo! Suspirei. Não estava preocupada em incomodar. Nem um pouco. Mas iria usá-la mais um pouco de motorista assim que descobrisse quantos presentinhos eu ia ter que comprar para os vizinhos. Não importava mais: tinha perdido minha carona. Girei a chave e empurrei minhas malas para dentro. O lugar estava uma zona. Ninguém, ninguém, deixa as coisas assim tão largadas quando está de mudança. Gregory tinha dito que achava que eu não viria, mas, observando sua sala, era difícil de acreditar. Parecia que ele tinha deixado as coisas propositalmente da maneira mais caótica possível só para me irritar. Qual é o problema em deixar caixas empilhadas? Mas não, Gregory Holt! Ele deixou suas caixas espalhadas formando um verdadeiro labirinto que impedia um deslocamento em linha reta do ponto A ao ponto B sem ser necessário escalar alguma coisa. O pior eram as descrições das caixas… “Livros”, “Cozinha” e “Quarto” são marcações aceitáveis. ““Presentes de Natal”, “Coisas para olhar e jogar fora” e “Lembranças A.H.” não são.


Eu estava enganada: ia levar uma eternidade para conseguir arrumar aquilo tudo. Seja lá qual fosse a vingança que eu ia planejar para Gregory, ela ia ter que ser umas oito vezes pior. Respirei fundo com as mãos na cintura, visualizando o inferno que me aguardava. Por quê? Por quê? Por que eu fui me masturbar no quintal? Esfreguei a testa e afastei o pensamento da minha cabeça. Eu não tinha o hábito de me arrepender e não ia começar agora. Fiz o que eu queria fazer e ia arcar com as consequências. Escolhi um dos quartos no andar de cima que não parecia ser o que Gregory tinha se acomodado e dispus minhas coisas o mais ordenadamente possível. O Caos Holt poderia reinar do lado de fora, mas se eu ia morar ali pelas próximas semanas, aquele lugar ia ser um santuário perfeito e intocável. Coloquei uma roupa confortável, amarrei meu cabelo para tirá-lo do caminho e deixei meus sapatos em um canto. Nem chinelos… Ia ficar descalça mesmo. Usaria apenas o indispensável naquela batalha, qualquer item sobressalente só iria me atrasar. E, olhando pelo lado bom, se eu cortasse meus pés em algum lugar daquela casa, processaria Holt por cada centavo que ele possuía. Demorei uma boa meia hora para encontrar os produtos de limpeza, tanto que estava começando a achar que ia ter que sair para comprá-los. Só um homem para guardar produtos de limpeza dentro do quarto… Nunca vou entender. Sério. Nunca. Primeiro, limpei e arrumei o meu quarto e o banheiro. Obviamente. A tarde já estava bem avançada quando fiquei satisfeita com a higiene da minha morada temporária e segui para outra parte da casa. Resolvi começar pela sala. Era o lugar que mais me incomodava. A porta de entrada dava para um pequeno hall que se abria em uma antessala redonda onde ficava a escada para o primeiro andar. À esquerda ficava a sala de jantar, um espaço retangular e estreito já ocupado por uma mesa com seis cadeiras; no fundo, uma porta vaivém levava para a cozinha. À direita do hall de entrada ficava a sala de estar, onde já estavam dispostos alguns sofás, uma mesa de centro, uma televisão e um videogame. A televisão e o videogame eram as únicas coisas da casa que estavam perfeitamente asseadas e em pleno funcionamento. Não precisa nem explicar, não é? Encontrei um som com entrada para iPod e resolvi trabalhar ouvindo Art Blakey, nunca me sentia sozinha com um bom jazz. A bateria delicada e constante de Blakey se fez ouvir pelos alto-falantes, e eu esfreguei as mãos tentando me estimular a continuar. “Vamos lá, Dom. Vamos acabar com isso.” Separei as caixas insanas de Holt em três grupos: no hall, as que tinham marcações compreensíveis e que eu começaria a abrir imediatamente. Na sala de estar, empilhadas próximas ao sofá, as com marcações semicompreensíveis, aquelas que eu imaginava que compreenderia assim que as abrisse e observasse seu conteúdo. Na sala de jantar, as com marcações ininteligíveis e que Holt precisaria traduzir quando chegasse. Algumas das caixas estavam identificadas como “Ferramentas” ou “Coisas de jardim”, e eu achei melhor levá-las para a garagem e me livrar de parte do volume de uma vez. Estava voltando para pegar mais um lote de caixas quando ouvi uma voz masculina perto demais. – Boa tarde, vizinha. Virei e dei de cara com um homem asseado e elegante. Cabelo escuro bem curto, barba bem feita, olhos amendoados e nariz longo. Ele tinha um sorriso de vendedor e eu imaginei que ele fosse exatamente isso. – Boa tarde – respondi, discretamente passando as mãos ao redor do corpo. Estava vagamente consciente do meu short muito curto e da minha blusa longa, folgada e levemente transparente. Roupa vagabunda para fazer faxina. Não para conversar com desconhecidos. Mas se era aquilo que eu estava vestindo, era aquilo que ia ter que servir. – Você deve ser a senhora Holt – ele esticou a mão para que eu apertasse.


Pensei em corrigi-lo. Mas o mal-entendido gerava tantas possibilidades agradáveis de vingança: talvez Gregory fosse um marido abusivo e violento e dali a um mês eu o abandonasse para voltar para a casa dos meus pais. Eu iria rir daquilo por anos. Apertei a mão que ele me oferecia e resolvi não negar nem confirmar. – Dominique, por favor. – Dominique, é um prazer. Sou Eric, seu vizinho, e é uma honra tê-la na vizinhança. Hmm… “Uma honra”. Ele estava fazendo uma reverência boba e cortês. Só existem dois motivos para um homem fazer isso. Ou ele está querendo te agradar ou te seduzir. Algo no jeito que ele olhava para minha boca e para a minha bunda me fez imaginar que fosse a segunda opção. Certo… Eu posso usar isso também. Ele não era feio. Mas também não era um deus grego. Nem perto disso. Até Holt era mais atraente do que ele. Certo, tudo bem, Holt é bastante atraente, na verdade. O tipo que deve fazer as mulheres na academia se derreterem em sorrisos imbecis ao vê-lo com uma regata colada. A imagem surgiu em minha mente por um segundo e ficou ali, dançando diante de mim, até eu sacudi-la para longe. Não faça isso, Dominique! – É uma honra estar aqui – respondi, exalando uma simpatia que eu guardava para momentos em que estivesse excitada e precisando extravasar. E se Holt fosse transformado em corno? E se sua doce e dedicada esposa Dominique o traísse com frequência e empolgação? Isso seria divertido também, não seria? – Precisa de ajuda? Sempre há caixas pesadas para um homem carregar – falou, inflando o peito. Eu ri, apesar de não ter achado graça nenhuma. – Na verdade, há algumas. Se não se incomodar… – Claro que não! Mostre o caminho – pediu. Eu obedeci com ares de gratidão. Ele andava na minha frente falando sobre trivialidades, eu respondia qualquer coisa e ria em intervalos esporádicos. Um pensamento firme em minha mente: ele não liga que eu seja casada. Olha para minha bunda e para meus seios quando acha que eu não vou notar e eu, propositalmente, crio variadas situações para que ele observe meu corpo sem preocupações. Esse é o tipo de coisa que meus conhecidos consideram arrogância. Claro… Até parece que mulher nenhuma faz isso: valorizar partes do corpo quando acha que um homem que lhe interessa está observando. A grande maioria das mulheres faz isso, mas não fala sobre isso. Eu? Eu gosto de sexo, sabe? Não gosto de relacionamentos. É muito complicado, exige muito tempo. Mas sexo não. Sexo é rápido e maravilhosamente delicioso. É relaxante e serve para me distrair quando estou muito tensa com alguma situação do trabalho. Manipular homens para levá-los para cama é algo em que eu tenho, digamos, alguma experiência. Isso é outra coisa que as pessoas consideram arrogância. Certo, mas o que eu posso fazer se realmente tenho experiência nisso? Fingir que não tenho porque é mais delicado? Ah, danem-se todos. Quando um homem tem tesão e vai atrás de uma mulher ele é um garanhão, um espécime exemplar do gênero masculino. Quando a mulher faz a mesma coisa é uma vadia arrogante. Sabe o que eu odeio? Odeio ser chamada de vadia arrogante por admitir fazer coisas que todo mundo faz sem admitir. Eric estava me observando. Acabaram as caixas que deveriam ficar na garagem e ele estava esperando que eu o convidasse para entrar. – Não fiz compras ainda – confessei. – Não sei o que posso te oferecer, mas acho que pelo menos um copo d’água – sorri.


– Água está ótimo, e tenho certeza de que podemos ser criativos com o que encontrarmos. As pessoas dizem que cenas de filmes pornôs são ridículas. Mas a vida real é igualzinha. A mesma coisa. As mesmas situações, os mesmos diálogos, as mesmas intenções. A única diferença é a sutileza. O vendedor de pizza diria que eu tenho uma bunda linda e que a aceitaria como pagamento pelos seus serviços. O cavalheiro do meu vizinho encara meu corpo inteiro e diz que podemos ser “criativos”. Falta só a trilha sonora ruim e voilà, pornô instantâneo. Sugeri que ele se sentasse enquanto eu ia buscar a água. Voltei e ele estava sentado exatamente onde o deixei. Olhei para o sofá… Parecia novo. Parecia que Holt tinha comprado o sofá para a casa nova. Sorri. Poderiam acabar descobrindo que eu não era mulher dele, e que ele não era um homem traído. Mas ter transado com um de seus vizinhos no seu sofá novo era algo que Holt nunca poderia tirar de mim. Pelas próximas semanas, sempre que ele sentasse ali para comer, jogar videogame, ver tevê… Eu pensaria nisso. Pensaria que estive suada com um desconhecido naquele sofá, naquele pequeno e confortável refúgio do inocente Greg. Uma boa vingança. Excelente. Toquei no joelho de Eric quando lhe passei o copo d’água. Ele olhou para mim e eu o encarei por um tempo mais longo do que seria adequado. Ele estava sorrindo e eu também. Ríamos sem palavras. Eric derrubou um pouco de água, meio por acidente, meio de propósito. E aí estávamos, rindo e tentando secar a água de sua roupa, alisando tecidos e pele, olhares e sorrisos. Toques simples se tornaram toques perigosos e então inapropriados. Eu chamo de “hora do tapa”. É aquele momento em que o homem já está te tocando de um jeito que, ou você o beija, ou lhe dá um tapa. Eu o beijei. Ele sorriu para mim. – Você é das minhas, Dominique. Estive esperando por uma vizinha como você há muito tempo. – Eu estou aqui e você vai ficar falando? Ele me beijou e passou as mãos por toda a extensão do meu corpo. Puxou minha camiseta para longe, pela minha cabeça, e de repente eu estava só de sutiã no sofá de Greg. Senti sua boca em meu pescoço e em meus seios. Desabotoei sua camisa e sua calça. Passei as pontas dos dedos sobre seu peito nu, descendo até sua virilha. Ele estava duro, mas o material não era muito grande. Fazer o quê… Eric tirou meu short e minha calcinha antes de começar a me provocar com dois dedos. Seu toque era leve e desajeitado, enquanto procurava minha boca com voracidade. Puxei sua cueca para baixo e apoiei um joelho em cada lado do seu quadril. Quando o pênis é pequeno demais para causar impacto, o truque é se concentrar na fricção. – Camisinha? Ele empurrou o quadril para cima, me levantando enquanto buscava algo no bolso traseiro. Da sua carteira ele tirou dois pacotes. Abri um e desenrolei o preservativo cuidadosamente pelo seu membro ereto. Ele gemeu com o carinho e eu tapei sua boca com a minha. Um movimento rápido e eu estava montada nele. Senti suas mãos em meus seios, puxando o bojo do meu sutiã para baixo para conseguir morder meus mamilos. Odeio quando o homem faz isso. Não morder meus mamilos, isso eu até gosto. Mas puxar para baixo… Ou você tira o sutiã ou acaricia por cima, meu amigo. Essa porcaria normalmente custa três dígitos, aí vem qualquer um e estraga o suporte. Valeu… Mas o bojo estava embolando de qualquer jeito e meu peito estava na sua boca. Resolvi focar nisso e me inclinei mais para baixo. Eu rebolava, fazendo com que o ritmo da penetração fosse gostoso para ele, mas


sempre fazendo o possível e o impossível para roçar meu clitóris contra sua virilha. Esfregava cada vez mais forte e mais rápido até que parei completamente de ligar para a penetração e passei a me concentrar só na deliciosa fricção entre nossas partes íntimas. – Ai, delícia… Isso… Linda, vai. Ele parecia indeciso se colocava as mãos nos meus quadris e me observava rebolar ou se abraçava minha cintura e enfiava meus peitos na boca. Decidi por ele e segurei um de seus pulsos contra minha coxa e coloquei o antebraço em seu peito, mantendo-o afastado. Eric tinha os olhos semicerrados e emitia um gemido baixo e contínuo. Seu quadril se elevava em batidas leves, tentando acompanhar o meu ritmo. Eu preferia que ele parasse e me deixasse fazer aquilo sozinha. Mas ele continuou e eu acabei me adequando. Um incômodo delicioso perto do umbigo deixou claro que eu estava bem perto. Pelos gemidos de Eric, imaginei que ele estivesse mais perto ainda e resolvi acelerar. Abandonei sua mão e peito e acariciei meus seios, apertando meus mamilos do jeito que eu gosto. Apliquei mais força no meu movimento e senti meu corpo explodir, começando pelo meu clitóris. Ele gozou poucos segundos antes de mim. Senti seus braços ao redor da minha cintura tentando me puxar para perto, mas me desvencilhei a tempo e logo estava completamente vestida e me livrando dele. Tranquei a porta atrás de mim e fui me livrar da camisinha usada. A dúvida sobre contar ou não contar a Holt que tinha transado no sofá novo dele estava me consumindo e me fazendo sorrir como uma babaca. Nunca mais ia conseguir olhar para aquele sofá sem dar risada. Principalmente depois que visse Gregory sentado nele.


Capítulo 3 “Você é como o ladrão que não se sente nem um pouco mal por ter roubado, mas se sente horrivelmente mal por estar sendo preso.” Rhett – E o vento levou – Como foi o seu dia, querida? Ele tinha um sorriso impossível, estampado no meio do resto. Olhei pra ele sem emoção, deixando claro que não tinha achado graça nenhuma na brincadeira estúpida. – Qual o seu problema? – Problema? Nenhum. Tenho um emprego maravilhoso, ganho muito bem, tenho bons amigos e uma secretária pessoal espetacular. Ele se aproximou e me deu um beijo estalado na bochecha. Eu virei com a mão aberta para lhe dar um tapa com toda a minha força, mas ele já estava preparado para essa possibilidade e se afastou ainda mais rápido. O hall estava quase sem caixas. As com rótulos compreensíveis já tinham sido desempacotadas e seus objetos tinham ido para seus devidos lugares. A sala de estar e de jantar ainda estavam abarrotadas. – Sabe, Dom – ele começou, jogando três pastas de processo no meu sofá. – Para quem disse que só precisava de uma semana para arrumar tudo, você parece bem atrasada. – Tive que desinfetar e esterilizar o lugar onde eu vou dormir. Gastei a maior parte do tempo com isso, não que seja da sua conta. – “Não que seja da minha conta?” – ele se sentou no sofá e se serviu de um pedaço da pizza que eu tinha pedido quando a fome foi maior que meu desejo de acabar tudo o mais rápido possível. – Pelo que eu me lembro dos termos do nosso acordo, tudo que você faz é da minha conta – ele riu, mordendo uma fatia fria. – O acordo é: eu arrumo sua casa e você me deixa em paz – lembrei, tirando a fatia da boca dele. – E isso – disse apontando para a pizza – é meu. – joguei a fatia de volta na caixa. – Ah… Vai ser assim, é? Então, já que a casa é minha, eu posso simplesmente entrar no banheiro quando você estiver tomando banho, não é? A porta é minha, quero dizer. Eu posso abri-la quando quiser. – É esse o tipo de argumento que você usa no tribunal? É por isso que sua taxa de ganhos de causas é tão baixo. – Minha porcentagem é 93%! – ele respondeu, rindo. Ok. Era uma porcentagem impressionante. A minha era um pouco melhor, obviamente. Mas muito pouco. – E não sei por que você se incomodaria – continuou, soltando o nó da gravata e pegando a fatia de volta. – Não é como se eu nunca a tivesse visto nua.


Sabe quando você está quase no seu limite? Sabe aquele momento em que o copo está quase cheio e só uma gota pode destruir tudo? O momento em que você quase não aguenta mais, mas por pouco ainda se segura? Esse meu momento quase foi há várias caixas atrás. E, de repente, com aquelas poucas palavras, Gregory Holt fez meu resignado copo d’água transbordar. Fechei meus punhos e me joguei contra ele com força. Ele tinha um vídeo perigoso, poder sobre meu futuro e sobre minha reputação e uma taxa de sucesso invejável, mas, por Deus, ele não teria a minha pizza. – Isso é meu! Puxei Holt pela gravata frouxa e ele me segurou pelo braço com a mão livre. Ele era claramente mais forte do que eu, e conseguiria me afastar com facilidade. Sem pensar, montei em cima dele, mantendo-o preso no sofá. – Devolva minha pizza – ordenei. – Você não vai mais comer isso. Deixa de ser egoísta. Tentei alcançar a mão que mantinha a pizza longe de mim, mas ora ele segurava um de meus braços, ora o outro, e sempre conseguia me impedir de atingir meu objetivo. Eu queria esmurrá-lo e mordê-lo. Mesmo com toda minha raiva, a proximidade com Holt era sedutora, quase proibida. Se ele ficasse excitado eu iria apontar e rir. Seria uma vitória extra. Eu estava de joelhos quando consegui segurar com as duas mãos o braço em que ele segurava a pizza, e senti seu outro braço me envolvendo, tentando fazer com que eu me abaixasse. Tinha plena consciência de que meus seios estavam na altura do seu rosto, mas não abandonei minha presa e esperei que toda a situação seio/rosto fosse distraí-lo por tempo suficiente. Mas ele me soltou, passou a fatia de uma mão para a outra e a enfiou inteira na boca. – Eu vou te matar – sussurrei. Coloquei minhas mãos no rosto dele e comecei a abrir sua boca. Gregory segurou minhas mãos e mastigou vorazmente. Bati as mãos espalmadas contra seu peito e me levantei em fúria. Minha fúria pode parecer ridícula diante desse episódio irrelevante, mas eu estava entrando em desespero. Nunca, nunca, nunca tinha estado tanto sob o jugo de alguém como nessa situação. Se apenas eu tivesse conseguido aquela estúpida fatia de volta… Não era a pizza, ou o valor, ou o que quer que fosse… Era uma questão de orgulho, e o meu estava irreparavelmente ferido. Andei em direção à porta da sala com o rosto entre as mãos e senti que ia chorar. Conte até dez, Dom. Calma. Respira. Ele se moveu desconfortavelmente no sofá, sem levantar. Algo na minha expressão corporal deve ter denunciado que eu não estava apenas brincando inocentemente. Um. Dois. Três. – Dom, desculpa. Não sabia que você e a pizza tinham ficado tão íntimas, assim, tão rápido – ele tentou brincar. Eu o olhei e deixei que o rancor tomasse conta do meu semblante. Quatro. Cinco. – Brincadeira. Desculpa – ele repetiu. – Não sabia que significava tanto para você que eu não comesse sua pizza. Sinto muito, mesmo. Não como mais suas coisas. Continuei olhando para ele sem dizer uma palavra. Temi que, caso abrisse a boca, começasse a chorar. Odeio chorar. E na frente dos outros, então… Na frente de Holt! Nunca iria me perdoar. Seis. Sete. – Achei que estávamos só brincando. Não achei que fosse sério – ele apontou para a pizza descontraidamente. – Sabe como é, não? – sorriu, um pouco mais relaxado. – Eu te chantageio, você


cede, a gente faz um acordo bobo, você passa algumas semanas comigo e, algumas brincadeiras e conversas íntimas depois, você se apaixona loucamente pela minha personalidade irresistível – ele abriu um sorriso largo, tentando fazer com que eu sorrisse. Teria sorrido se não estivesse tão magoada. Mantive minha expressão irascível. Oito. – Certo. Muito cedo para brincar. Olha, desculpa. Eu devolveria a pizza, se pudesse. Eu… Te levo pra jantar, amanhã. O que acha? Por minha conta? Por favor. Coloquei a mão na nuca e massageei meu pescoço. Respirei fundo. Nove. – Vem, senta aqui – ele se moveu no sofá para me dar mais espaço e bateu a mão na almofada ao seu lado como um convite. Eu ia dar um passo a frente quando notei seu olhar fixo em um ponto do sofá. Ele tinha uma expressão curiosa nos olhos quando puxou um pequeno pedaço de plástico escuro no espaço entre duas almofadas do assento. – Mas que diabos é isso? – ele analisou a tira cuidadosamente e eu prendi a respiração. A tira de cima do pacote do preservativo. Eu tinha jogado todo o resto fora cuidadosamente, mas aquele pequeno pedaço, com a logomarca perfeitamente legível, me escapou completamente. – Isso é o que eu acho que é? – seu olhar ficou frio e seco. Merda. Eu podia tentar mentir. Ou podia dizer a verdade e ele que se foda. Mas havia algo de dor em seus olhos verdes, e eu não consegui me forçar faz dizer nem mais uma palavra. – Não acredito nisso, Dominique! – ele se levantou. – Você está aqui a UM MALDITO DIA e fez o quê? Trouxe um estranho para dentro da minha casa e transou com ele? Onde? Na minha cama? – O que eu faço não é da sua conta e… – Cala a boca – ele falou encarando o chão, com um asco em sua voz que fez com que eu me sentisse imunda. Por que aquilo estava me incomodando tanto? – Você é a pessoa mais egocêntrica que eu já conheci – suspirou. – E pervertida, diga-se de passagem. Meu peito inflou. Ah, isso não… – Sou pervertida porque gosto de sexo? – Você parece nem se lembrar do que te colocou nessa situação em primeiro lugar… – Estava na minha casa… – Embaixo da minha janela! – ele berrou. Ah, então íamos começar a gritar? Tudo bem. Eu sabia gritar também. – Vivo minha vida do jeito que eu quiser e não lhe devo satisfações, Gregory! – Na minha casa você deve! Não acabei de comprar móveis novos para você batizá-los com o pau de algum amiguinho seu. – Me respeite! – Como? Se nem você se respeita? – Seu ridículo hipócrita! Você não transa, então? – Não na casa dos outros – rosnou. – Não é hipocrisia, sua vadia maluca. É educação. – Típico! Uma mulher atende aos próprios desejos sexuais e é… – Cala. Essa. Boca. – sibilou. – Para de advogar! Para! Para de fingir que isso tem algo a ver com preconceito de gênero. Se um homem tivesse vindo como convidado para minha casa e tivesse feito o que você fez… – Você gritaria com ele?


– Daria um murro na cara dele. Como isso funciona na sua cartilha de igualdade entre os sexos? Dou um murro em você também? Abri a boca para continuar a falar, mas ele pegou a caixa de pizza e virou as costas. Ouvi a porta do seu quarto se fechar e senti meu coração batendo na garganta.

A vagabunda tinha transado com um cara na minha casa. Joguei a caixa de pizza em cima da cama e comecei a tirar a roupa. Mal-educada, arrogante, impossível! Queria descer as escadas e continuar a brigar com ela. Queria gritar e xingá-la e… Arrancar suas roupas naquele sofá. Qual era o meu problema? Eu estava enfurecido, mas não parecia ser por ela ter transado com um cara na minha casa. Mas apenas pelo fato de ela ter transado com um cara. Tinha um nó na minha garganta e algo pesado incomodando minha respiração. Estava atraído por Thoen, mas não mandava nela. O que ela fez foi uma grosseria sem tamanho, e era esse o argumento que eu tinha que repetir. Se desviasse desse caminho e deixasse que ela percebesse que tinha outra nota nessa melodia, uma nota de ciúmes, ela iria me engolir e eu perderia a razão. Liguei o chuveiro e me joguei embaixo do jato de água quente. Podia mandar ela embora e acabar com esse problema de uma vez. Mas eu não queria. Não queria nem um pouco. Eu devo ser mesmo um masoquista imbecil para querê-la por perto. E agora, mais do que tudo, eu queria devolver a gentileza. Uma parte insana, perversa e irracional de mim queria fazer Dominique ficar com ciúmes. Idiota… Não se pode ter ciúmes do que não se gosta. Fechei os olhos e minha memória começou a me oferecer um festival de imagens intrusas. Eu conseguia me lembrar do dia em que conheci Dominique como se isso tivesse acontecido há poucos segundos atrás. Lembrava de estar sentado no meu carro, na garagem da casa do meu antigo chefe, Hyde. Assim como agora, tinha acabado de me mudar para uma cidade nova. Naquela noite de Natal, meu ânimo estava pesado. Estava sempre pesado, era um ardor difícil de afastar… Comi algumas fatias frias com muito orgulho. Era a pizza que ela não queria que eu comesse. Escovei os dentes e deitei. Minha mente sonolenta oscilava entre Dominique montada em cima de mim tentando roubar a fatia de volta e aquela noite de Natal em que nos conhecemos. Eu estava dentro do carro… Puxei o cobertor e fechei os olhos. Dentro do carro… Conseguia me lembrar de cada detalhe como se estivesse acontecendo naquele exato momento. Não sei dizer em que ponto dormi e as lembranças viraram sonhos, mas eu estava lá. Estava dentro do meu carro, naquela garagem, mais uma vez. Passei as mãos pelas mangas do paletó e ajustei a gravata borboleta. Queria causar uma boa impressão. Aquele seria meu novo lar e eu esperava que fosse por muito tempo. Queria me distanciar o máximo possível da minha vida anterior, e talvez uma posição em um grande escritório de advocacia não fosse o extremo oposto do meu ponto de partida, mas era de longe o suficiente. Ou, pelo menos, teria que ser.


Fora aquilo, não havia muitas coisas que eu sabia fazer. E havia ainda menos coisas que eu queria realmente fazer. Respirei fundo e desci do carro. As únicas coisas que eu tinha trazido comigo da minha antiga vida eram minhas roupas, algumas coisas da Amanda e meu Porsche Boxster. Apertei o botão do alarme. Aquele carro tinha sido a primeira coisa que eu tinha comprado com o meu dinheiro. Dinheiro do meu trabalho. Nada de dinheiro da família, fundos de investimento ou poupança. Eu tinha trabalhado por cada centavo. Por um lado, aquilo era ridículo. Afinal, o único motivo pelo qual eu tinha conseguido economizar dinheiro para comprar o bendito carro era a existência do dinheiro da família, dos fundos de investimentos e das minhas poupanças, que arcavam com todos os custos da minha vida superficial, insignificante e luxuosa. Era verdade. Mas juntar dinheiro e comprar aquele carro tinha sido um divisor de águas. Tinha sido a prova de que eu podia. Eu podia fazer o que quisesse. E o que eu queria depois do acidente era me mudar para bem longe. Demorei tempo demais para tomar coragem, mas naquele momento… Ali estava eu. Com meu Boxster, meu dinheiro e minha vida. Não devia satisfações a ninguém. Exceto aos meus novos chefes. A música de Natal tocava alta e alegre e fui recebido com sorrisos, cumprimentos e uma taça de champanhe assim que entrei na gigantesca mansão de Anthony Hyde. Ele era um dos sócios majoritários do escritório e, todos os anos, dava uma inesquecível festa de Natal para família, amigos e colegas. Ou pelo menos era isso que eu tinha ouvido falar. Havia comida suficiente para alimentar uma pequena cidade, e eu me servi de um pouco de tudo, mais porque não sabia o que fazer do que por fome. Olhei ao redor enquanto mordia um pedaço de torrada com caviar. Senti as bolinhas do caviar contra minha língua e me odiei por saber identificar a marca. Estava considerando me aproximar de um dos poucos grupos de pessoas que eu já tinha conhecido em minha primeira semana de trabalho, mas não sabia o que dizer e preferi ficar ali, em pé ao lado da mesa por mais alguns minutos até me familiarizar melhor com o ambiente. Foi aí que eu a vi. Estava do outro lado do salão. Segurava em sua mão de unhas bem feitas uma taça de champanhe com morangos e, pelo jeito como falava e sorria, se tornou claro porque era o centro das atenções do pequeno grupo em que se encontrava. Seu vestido amarelo tomara que caia sustentava seus seios em um decote espetacular. Um pequeno detalhe ornamentado com brilhantes começava bem abaixo dos seus seios e seguia pelas laterais do corpo, delineando sua cintura como um delicado cinto justo. A partir daí a saia do vestido caia longa e suave, em um tecido pesado o suficiente para se agarrar a cada uma de suas curvas. E, por Deus, que curvas! Seu cabelo escuro caía em cachos largos e imponentes quase até sua cintura. Ela usava poucas joias e uma maquiagem discreta. Era tão linda que qualquer acessório seria um exagero e uma distração. Eu a media dos pés à cabeça, e tive certeza de que se ela tivesse aparecido para a festa vestida com um saco de batatas ainda seria a convidada mais bonita do sr. Hyde. Era o seu porte: a maneira como andava, falava ou gesticulava. Tinha algo nobre em seus trejeitos. Algo que parecia natural e ao mesmo tempo cuidadosamente aprendido. Analisei o grupo de seis homens ao seu redor. Um deles, com certeza, o marido rico. Uma mulher como aquelas não fica solteira por muito tempo. Não com aqueles olhos, com aquela postura, com aquelas curvas. Não em uma sala como aquela. Algum babaca hediondamente rico já deveria ter se aproximado e colocado um diamante de vinte quilates em seu dedo. Isso depois de ter concorrido


arduamente com outros babacas um pouco menos hediondamente ricos. Alguns colegas acenaram e eu me aproximei sorrindo e desejando feliz Natal. Os votos de felicitações foram devolvidos para todos os lados e a conversa seguiu para trabalho, investimentos e possíveis locais para passar boas férias. Eu sorria, concordava, acrescentava comentários que eu acreditava serem pertinentes, sempre tomando cuidado para não soar prepotente ou boçal: todos os lugares que meus colegas desejavam conhecer, eu já tinha visitado. Mais de uma vez. Logo não estávamos mais falando de férias e sim de esportes. Mas não importava o quanto o assunto variasse, de um jeito ou de outro, eu sempre me pegava observando a mulher de amarelo. Parecia uma hipnose ou magia negra. Tinha algo naquela mulher que estava me enfeitiçando. Algumas colegas foram ao banheiro, outros se afastaram para pegar mais uma bebida e eu pedi licença sob a desculpa de repetir o caviar, ou alguma outra bobagem, na mesa de frios. Ela estava lá. Colocava poucas porções em um prato enquanto tentava equilibrar a taça. – Aqui, por favor – eu me adiantei. – Posso ajudar? – levantei a mão para pegar sua taça. – Ah, obrigada. Mas estou bem. Parecendo um pouco atrapalhada, ofereci meu sorriso mais simpático: – Imaginei que pudesse precisar de ajuda. – Atrapalhada? – seu sorriso se transformou em algo diferente. Ela colocou a taça em um espaço livre sobre a mesa e fez um gesto de modelo apresentando uma nova motocicleta antes de voltar a se servir. – Tudo certo. Acho que consigo me virar sozinha. – É. Parece que sim. Perdoe-me – levantei as mãos, rendido, e continuei a sorrir. Vamos lá, Greg, pergunte seu nome. – Gregory Holt. – Prazer, sr. Holt. – ela pescou um morango na sua taça de champanhe e o colocou na boca. Seu polegar encostou demoradamente em seu lábio inferior enquanto ela mordia um pedaço da fruta sem nunca tirar os olhos dos meus. É horrível como nós, homens, parecemos nascer com um gene que nos impede de ver uma mulher colocando algo na boca assim, desse jeito vagaroso, sem imaginar como seria a sensação de ter nossa ereção ali, naquele mesmo lugar, servindo de aperitivo para aquela mesma boca. Ela mastigou como se estivesse brincando com o morango. Ou, mais provavelmente, brincando comigo. Tive que me forçar a parar de observar sua boca e, quando encarei seus olhos novamente, vi a diversão estampada em seu rosto. Então, ela era uma dessas mulheres. Dessas que sabem exatamente o efeito que causam nos homens e que não se envergonham de fazer isso. Definitivamente, a esposa troféu de algum ricaço. Definitivamente. Eu tive pena do coitado imediatamente. Com certeza, devia estar preso em seus encantos e não importava o quanto ele achasse que era ou tentasse ser o chefe do lar: quem mandava era ela. Sem dúvidas. – Trabalho para Hyde – coloquei a mão no peito me apresentando. – Quem é seu marido? Talvez eu já o conheça. – Meu marido? – ela riu. Seria possível que eu estivesse enganado? Se ela fosse solteira, aquela seria a melhor noite da minha vida. Não que eu imaginasse que ela iria para a cama comigo no mesmo dia em que nos conhecemos ou algo assim. Mas era interessante brincar com a ideia. E se ela fosse, de fato, solteira, eu simplesmente precisava conhecê-la melhor. – Sim – eu queria perguntar, mas não sabia como. Precisava ter certeza. Ela inclinou a cabeça próxima ao ombro e sorriu. Estava me medindo da cabeça aos pés, como se


estivesse tentando decidir o que fazer comigo. Se ela resolvesse me levar para sua cama, acho que eu não sairia de lá nunca mais. Vamos, Greg… Pergunte. Seja educado. Elogie. Use um tom de brincadeira. É. É isso. – Quero dizer, uma mulher linda como você não pode estar solteira. – É mesmo? – ela sorriu. – E com todos esses homens ricos ao redor te cobiçando, seria difícil para uma mulher como você recusar. – Uma mulher como eu? – sua postura mudou e eu notei que estava indo pelo caminho errado. – Não quis ofendê-la. Só quis dizer que… uma mulher tão linda, em uma festa como essa… – … deve estar acompanhando o marido? – ela arregalou os olhos para mim e eu senti que tinha cometido algum erro irreparável. Repassei minhas palavras para entender exatamente qual tinha sido a besteira que eu, certamente, falara – Por que uma mulher não pode ter sido convidada para uma festa de homens importantes porque ela é importante? Ah. Então, foi essa a besteira. – Olhe. Sinto muito. Acho que comecei do jeito errado. – Eu tinha um sorriso que gostava de usar em situações como essa. É o sorriso lindo e fofo que diz “me desculpe se eu fiz besteira, mas eu juro que sou gostoso e que posso te recompensar” – Vamos começar de novo. Sou Gregory Holt. Trabalho para Anthony Hyde. Comecei essa semana. E você é… – A mulher que está indo embora – ela virou o pouco que sobrava de seu champanhe e largou a taça em minhas mãos antes de se virar e partir. Passei as próximas horas da festa decidindo se ia falar com ela de novo ou não. Conversei com várias outras pessoas, comi, bebi, ouvi música natalina… Mas sempre que ela entrava no meu campo de visão eu repassava o diálogo inteiro que havíamos tido em minha mente, me arrependia profundamente e tentava decidir se ia atrás dela ou não. Ela sempre se afastava ou começava a conversar com alguém antes que eu pudesse me decidir. Olhando em retrospecto, talvez tivesse sido melhor simplesmente ter deixado para lá e esquecer que essa mulher existia. Mas ela podia ser uma colega de trabalho. E entre não querer começar um trabalho novo já com uma inimizade e meu pênis que não parava de implorar por uma segunda chance, acabei decidindo me aproximar mais uma vez. Ela estava encostada na lateral de um dos grandes portais de madeira escura que levavam de um ambiente ao outro. Tinha a mão na nuca e massageava o pescoço como se estivesse exausta. Eu me aproximei por trás e já estava quase invadindo seu espaço pessoal quando percebi que não sabia o que dizer. Rápido, Greg. Pense em alguma coisa ou vire as costas e vá embora. Ela se virou, senti seus olhos nos meus e o tempo para pensar em algo interessante para dizer tinha acabado. – Quer ajuda com a massagem? – apontei para o seu pescoço. Que droga foi essa, Greg? “Quer ajuda com a massagem?” De todas, todas, as coisas que você poderia ter dito… Ela me olhou com fúria e eu achei que não tinha salvação para algo tão inapropriado a não ser tentar levar na brincadeira. Sorri, tentando deixar minhas intenções óbvias. – Espero que você não seja o novo porta-voz do escritório – ela disse, simplesmente. – Porque


você parece odiar as palavras, sr. Holt, e é recíproco. – Foi só uma brincadeira. Me perdoe, foi inapropriado. – Eu conheço o senhor há pouquíssimas horas e já teve que se desculpar duas vezes. Acho que isso diz algo sobre seu comportamento. – Com certeza, é só que… – depois de duas mancadas seguidas, julguei que era melhor simplesmente ser sincero. Ela parecia uma mulher inteligente, com certeza não se ofenderia com sinceridade – Você é espetacularmente linda e eu fiquei um pouco confuso. Peço desculpas – coloquei a mão sobre o peito. – Realmente, não vai acontecer de novo. Alguns segundos de um silêncio constrangedor se seguiram. De minha parte, pelo menos. – Tudo bem? – perguntei, e ela me observou como se não entendesse o que eu ainda estava fazendo ali. Sorri e olhei ao redor. Algo chamou a minha atenção. Bem em cima do portal onde estávamos, alguém tinha colocado um visgo. Uma pequena plantinha verde, enrolada em um laço vermelho e natalino. Eu conhecia a tradição: ela dizia que quando duas pessoas se encontravam ali embaixo, deviam se beijar. Eu não consegui não dar risada. De todas as pessoas que eu poderia encontrar embaixo de um visgo, a mulher do vestido amarelo era a pior opção. Pelo menos, no momento. – Posso perguntar qual é a graça? – O destino – respondi irritado, apontando para cima. Ela deve ter entendido minha brincadeira como mais um comentário inapropriado e, sinceramente, quem poderia condená-la? Escutei o estalo do tapa assim que sua mão encontrou minha bochecha. Quando finalmente entendi o que tinha acontecido ela já tinha ido embora e eu estava esfregando meu rosto ardente. Minha mente passeou entre memórias e sonhos loucos e agitadores antes de me levar de volta para aquela noite. Para minha cama. Sozinho, na noite de Natal… Debaixo dos cobertores, como naquele momento. Com raiva de Dominique, como agora. Queria tirar a maldita mulher de amarelo da cabeça e dormir. Mas, assim como naquele momento, ela era a única coisa em que eu conseguia pensar. Eu ficava revivendo o tapa, os comentários esnobes e irritados, as curvas e o decote. Mas acima de tudo, eu ficava revivendo o morango. Aquela boca molhada mordendo o morando. Mastigando com uma calma infinita. Me encarando como se dissesse que sabia exatamente em que eu estava pensando. Mantive os olhos fechados e me cocei em um lugar gostoso. Logo, o coçar se transformou em um carinho e o carinho em um toque ainda mais urgente. Meu pau estava duro e eu passei a mão fechada em toda a sua extensão. Da base até a ponta. Aquela boca naquele morango. Aquela boca no meu pau. E de volta, da ponta até a base. Aquelas curvas naquele vestido. Aquelas curvas nas minhas mãos. Subi mais uma vez. Aqueles olhos safados. Aquela atitude de mulher que sabe o que faz. Desci mais uma vez. Aquele decote exposto. A minha boca enfiada naquele decote. Aumentei a velocidade. Aumentei a pressão. O vestido amarelo no chão do meu quarto. A morena deliciosa nua na minha cama. Minhas entranhas estavam gemendo junto comigo.


Um tapa na minha cara. Meu pau fodendo ela com força. Um gemido longo. Um grito rouco. Meu corpo inteiro tremia e suava. Um beijo naquele pescoço lindo. Um puxão naqueles cabelos imensos. Senti o recuo na minha virilha e eu sabia que estava bem perto. Lembrei do morango. A boca. A língua no lábio. Aquela boca gritando e mordendo os dedos para parar de gritar meu nome. Enfiando meu pau nela. Mais rápido. Mais fundo. Coloquei a mão sobre minha ereção satisfeita para evitar que a ejaculação sujasse tudo. Acordei com o alívio percorrendo o meu corpo como eletricidade. O resquício da minha ereção molhado de esperma. Levantei da cama e fui me lavar. Tinha que trocar os lençóis e lavar o lugar que eu tinha sujado. Não ia deixar aquilo para Thoen… Mesmo que ela merecesse uma vingança… Tirei o pijama com aquela noite de Natal de tantos anos atrás ainda girando em minha mente. Aquela noite, sozinho em casa, na minha cama. Pensando nela enquanto eu me acariciava. Aquela tinha sido a primeira vez em que me masturbei pensando em Dominique. Mas não foi, nem de perto, a última.

Passei boa parte da noite acordada. Se Gregory achava que eu ia me esconder como uma criança pequena, ele não me conhecia bem o suficiente. Fiquei na sala lendo os processos que ele deixou no sofá. O novo escritório de Holt era quase o oposto do seu antigo emprego. Lá, trabalhamos com empresas grandes, corporações monstruosas, tubarões-baleia em um oceano imenso. Agora Holt trabalhava com pessoas. Os ofendidos pelas grandes empresas e corporações monstruosas. Era a outra face da moeda, e eu entendi perfeitamente bem por que uma pessoa com uma índole gentil e fraca como a dele iria preferir o novo emprego ao anterior. Aquelas causas eram ridículas, eu devo dizer. Ganharia qualquer uma delas sem mais que duas horas de trabalho em cada. Trabalho bom, fácil e bem pago. Era óbvio o motivo pelo qual ele tinha ficado tão satisfeito com a mudança. Meu pai dizia que trabalho bom é trabalho duro. Sempre concordei com ele: ganhar dinheiro por um trabalho bobo que mal merecia ser pago nunca me satisfez. Eu gostava do difícil. Dos problemas de que a maioria das pessoas fugia, correndo para longe. Já tinha passado da meia-noite quando subi para o quarto, Gregory não tinha aparecido. Que seja. Se era para um de nós dois se esconder, melhor que fosse ele. Deitei a cabeça no travesseiro e comecei a ser consumida por uma irritante sequência de pensamentos. O que eu fiz foi errado? Foi rude e mal-educado? Vamos lá, Dom, não minta. Foi? Sim, foi. Mas foi de propósito. Ele me filmou enquanto eu me masturbava e está usando isso para me humilhar. Queria me vingar e me vinguei. Pronto. Certo, não vamos mais pensar nisso. Virei de lado e observei a luz da lua entrando delicadamente pela janela. Mas eu não precisava ter feito aquilo. Foi excessivo. Quero dizer… Até agora, ele não me humilhou de verdade, não é? Ah, inferno. Levantei a cabeça, sacudi os cabelos e deitei novamente. Por que eu ligava? Por que


tinha começado a ligar? Eu não estava desenvolvendo uma consciência, estava? Isso que eu estava sentindo… Seria remorso? Expirei longamente deitada no escuro. Considerei as minhas possibilidades por alguns minutos: estava argumentando contra mim mesma e esperando para ver o resultado. Aparentemente, eu estava me sentindo mal pela minha conduta. Aparentemente, eu continuaria me sentindo mal até fazer algo para recompensá-lo. Droga.

Meu relógio biológico me acordou cedo demais, e resolvi descobrir o que eu podia fazer para o café com o pouco que Holt tinha em sua cozinha. Eu não sabia como essa coisa de se redimir funcionava, mas imaginei que um café da manhã bem preparado fosse um bom começo. Ele desceu uns vinte minutos depois. Eu tinha feito ovos e sanduíches de queijo e posto a mesa na sala de jantar. – Fiz comida demais – avisei. – Pode comer, se quiser. – Não, obrigado. Pego alguma coisa no caminho – ele respondeu, indo direto para os seus processos no sofá. – Ahmm… Tudo bem. Mas já está pronto e vai pro lixo, se você não quiser. – Você fez café da manhã para me pedir desculpas? – ele me observou subitamente. Seus olhos traziam alguma emoção indecifrável. – Claro que não – menti. – Fiz comida demais. Só isso. – Se você quiser que eu te desculpe, Dominique, vai ter que dizer as palavras. – Ele tinha os processos na mão e já estava na porta. – Vai ter que dizer “me desculpe”. – Ele saiu sem se despedir e eu tive vontade de jogar uma xícara no lugar onde a cabeça dele havia estado segundos atrás. Ia ter que pedir desculpas? É… Aquilo não ia acontecer. Não sei se minha boca sequer conseguia dizer a palavra “desculpe”. Nunca tinha experimentado antes. Terminei meu café, lavei a louça e fui tirar o lixo. Joguei tudo em uma lata apropriada na lateral da casa. – Você não recicla? Ah, meu deus… Chega de vizinhos, por favor. É por isso que eu não desejo “bom dia” aos meus. Você os cumprimenta uma única vez e pronto: tem que fingir simpatia pelo resto da eternidade. – Não, não reciclo – respondi. Curta e grossa. Não estava no clima para fazer amizades. – Não demora muito e é uma grande contribuição para o planeta. Sabe? Aquela coisa imensa, redonda e azul graças à qual a vida pode existir. Virei pronta para soltar fumaça. Ela era alta e magra. Seus cabelos longos tinham as pontas tingidas de azul e rosa. Seus olhos eram escuros, sua pele pálida, e ela usava roupas demais para um clima quente de verão. – Há alguma lei nesta cidade em que é obrigatório reciclar? – perguntei seca. – É uma questão de princípio, não uma… – Há uma lei? – repeti e meu tom firme surgiu imediatamente. – Não – seus lábios se moveram em uma careta e eu tive certeza de que havia ganhado uma inimiga. – Mas quando nós todos morrermos soterrados pelo lixo, quero ver como você vai se sentir. – Você está assistindo muito Wall-E, querida – respondi, dando as costas e voltando para a casa.


– Vadia… – ela não tentou falar baixo e eu a admirei muito por isso. Duas coisas precisavam ser feitas urgentemente: uma feira e uma limpeza no sofá de Holt. Não queria que ele usasse isso contra mim, nunca mais. Encontrei uma lavanderia e marquei para que eles buscassem o sofá durante a tarde. A feira ia ser um pouco mais difícil. Eu estava sem carro e algo me dizia que Holt não estaria disposto a me emprestar o dele em um futuro próximo. Olhei o mapa no celular e xinguei aquele maldito bairro periférico por não ter nenhum supermercado próximo. Já estava sentindo saudades da minha metrópole com toda a poluição e engarrafamento. Talvez a vizinha de ontem pudesse me ajudar. Se eu apenas me lembrasse do nome dela. O mapa digital me informou que havia uma pequena mercearia a uma distância próxima o suficiente para ser feita a pé. Certo, novo plano: comprar suprimentos básicos, limpar o máximo da zona Holtiana e tentar convencê-lo a me emprestar o carro no dia seguinte. Ou descobrir o nome da vizinha simpática que não se incomoda em dar carona para estranhos. Olhei pela janela da sala e vi a garota alta e esquisita me olhando do seu jardim. Ela morava exatamente na casa ao lado da de Holt. Ótimo. Arranjei uma vigia. Senti vontade de ter alguma camiseta que dissesse “derretam as calotas polares” ou algo igualmente ultrajante, só para irritá-la. Mas, infelizmente, esse não era o tipo de peça que encontraria no meu guarda roupa. Irritá-la ia exigir um pouco mais de criatividade. Amarrei um lenço em meu cabelo para manter os fios longe dos olhos e comecei a enfrentar as caixas semicompreensíveis. Já era quase meio-dia quando consegui organizar uma quantidade suficiente delas de modo satisfatório. Quem coloca CDs em uma caixa classificada como “Coisas que estavam na estante de baixo”? Ou melhor… Quem ainda tem CDs? Seja como for, só precisei abrir três para perceber que estavam todos nas caixinhas erradas. Organizar aquilo ia levar um tempo infernal. Talvez fosse hora de parar e fazer uma visita à mercearia. Alguém bateu na minha porta. Ou melhor, na porta de Holt. Ela devia ter pouco mais de cinquenta anos. Seu cabelo era tingido de preto tão uniformemente que parecia uma peruca. Seu rosto esticado gritava “botox” e seus lábios tinham sido exageradamente pintados com um batom vermelho. – Boa tarde, queridinha – pronto, eu já a odiava. – Posso ajudar? – Vim até aqui ver se o belo Gregory apreciou meus bolinhos. Ela alternava entre palavras audíveis e sussurros, e balançava o corpo como se tentasse valorizar as curvas que não tinha. – Não sei dizer. Mas posso perguntar e te digo depois – sorri falsamente, pronta para fechar a porta na cara dela. – Você é a esposa? – ela segurou a porta com o indicador. Meu bem, isso não vai me impedir de fechar a porta. Quebrar seu dedinho de unha postiça vai ser um bônus. – Não achei que ele fosse casado – A vadia estava torcendo o nariz para mim? – Sou uma amiga. Gregory não fica com mulheres acima dos 22 – sorri maliciosamente. – Ele gosta de garotinhas que mal saíram da puberdade – chiei. Merda… eu deveria parar de inventar essas histórias sobre ele para os vizinhos. A última vez que fiz isso não deu certo, não foi? – Ah – achei que ela ia avançar suas garras artificias na minha garganta. Mas, em vez disso, ela engoliu a seco e se afastou. – Volto depois para falar diretamente com ele, então. Você vai embora


logo, eu suponho? – sua voz estava cheia de uma mal disfarçada esperança, e eu sorri. – Não, não. Acabei de chegar. Fechei a porta, rindo. Eu sei que eu não me dou bem com muitas pessoas. Mas, tenho que confessar, odiar algumas pessoas é bem agradável.

Eu estava arrumando as cuecas do Holt. A porcaria das cuecas dele. Quando eu poderia ter imaginado isso? Limpar o quarto dele se tornou uma necessidade naquele dia. Queria agradá-lo de algum jeito para ver se conseguia superar nosso pequeno desentendimento sem ter que, efetivamente, pedir desculpas. Poucas horas de trabalho e o lugar estava limpo. Mas a maior parte das coisas dele ainda estava dentro de malas ou jogadas de qualquer jeito no armário. O engraçado é que tinha uma tábua de passar roupa no quarto dele. A cada noite, o meu desorganizado ex-colega de trabalho deveria estar passando as roupas que iria usar no dia seguinte. Era cômico, e parte de mim teve vontade de deixálo continuar seu labor noturno. Mas a outra parte suspirou e admitiu que eu estava tentando me redimir. Foram mais algumas horas entre tirar as coisas do armário, separar o que devia estar sujo, o que devia estar limpo e o que parecia suspeito e seria lavado na dúvida. Estava descendo com as roupas sujas para colocar na máquina de lavar quando ouvi as vozes exaltadas do lado de fora. Não estavam na minha porta. Não estavam nem no meu quintal. Deviam estar a algumas casas mais adiante, mas ainda assim eu conseguia ouvi-las claramente. Abri a porta abraçada a um punhado de roupas masculinas e coloquei a cabeça para fora. Havia uma pequena concentração de vizinhos no meio da rua. Eles estavam gritando uns com os outros. Merda de vida suburbana. Era só o que me faltava: barraco no meio da rua. Parabéns pela casa nova, hein, Holt? – Sua bruxa preconceituosa! – ouvi a voz masculina que gritava. Levantei os olhos e vi um homem tentando segurar outro, que avançava para cima de uma senhora. Ela usava uma saia comprida, um coque apertado e tinha a mão sobre o peito como se estivesse completamente ofendida com o que estava ouvindo. – Isso não é de Deus! – ela gritou. – E eu não vou ver criança alguma sendo criada nesse tipo de ambiente. Dois mais dois: casal gay, vizinha preconceituosa. Entendi tudo e voltei aos meus afazeres. Os gritos continuaram. Claro. A vizinhança preferia ver a confusão do que tentar apartar. Eu, particularmente, nunca me encontrei em nenhum dos dois grupos: nem dos que assistem à briga, nem dos que tentam apartá-la. Sempre me localizei muito confortavelmente em um terceiro grupo: o das pessoas que não podiam se importar menos com a vida alheia. A mulher acha que um casal gay não é de Deus e que é pecado e crime. Ótimo, problema dela. O casal gay está incomodado em ter que conviver com uma conservadora retrógrada. Ótimo, problema deles. Se não estão satisfeitos que se mudem, chamem a polícia, processem uns aos outros, se explodam, mas, por favor, parem de gritar. Estão incomodando a vizinhança inteira. Foi só meia hora depois, enquanto enfiava mais uma remessa de roupas na máquina, quando ouvi a


voz de Holt do lado de fora, que parei o que fazia e fui realmente observar a discussão. O meu gentil captor tinha chegado de um cansativo dia de trabalho para uma discussão pública da vizinhança e tinha resolvido, pasmem, se meter. Tive vontade de enfiar a cabeça nas mãos. Homem imbecil. E lá estava ele. Argumentando contra uma senhora que ameaçava chamar a polícia ou, pior, a congregação. Guiados por Holt, três ou quatro outros observadores começaram a interferir e em alguns minutos a coisa toda tinha terminado. Fiquei lá de braços cruzados no jardim esperando que ele chegasse. Ele caminhou vagarosamente até o carro para pegar o resto de seus pertences. – Você não consegue mesmo deixar que as pessoas resolvam os próprios problemas, não é? – E você não consegue mesmo sair do seu caminho para interagir com a vizinhança, não é? A não ser – virou-se, já na porta – quando é para transar com alguém. Maravilha. Ele não tinha deixado pra lá. – Rá, rá, rá – ri com falsidade. – Não tenho o costume de me meter nos problemas dos outros a não ser que me paguem por isso. E que me paguem bem. Ele subiu as escadas, dois degraus de cada vez. Parecia querer se afastar de mim o mais rápido possível. Parte de mim ressentiu a atitude. Fui até a cozinha e coloquei em cima da mesa o que eu encontrei que ainda fosse comestível. Precisava fazer feira urgentemente. Eu não aguentaria nem mais um dia daquele cardápio chez Holt. – Dominique, que diabos é aquilo? Ele estava na porta da cozinha e eu me virei sobressaltada. Juro que dessa vez eu não fiz nada. – O quê? – Você ficou entediada durante o dia e resolveu jogar todas as minhas roupas para cima? Você ficou louca? – Ei! Calma! Estava arrumando seu guarda-roupa. – Como? Sorteando qual roupa ficaria em qual lugar? – Mesmo que tivesse sido assim, seria uma técnica melhor do que a sua que é… – coloquei o indicador no queixo fingindo pensar. – Aliás… Qual é mesmo sua técnica de organização? – Você vai arrumar aquilo. – Me trate com respeito. Você não manda em mim. – Vamos ter essa conversa de novo? – Quer botar a porcaria do vídeo na internet? Pois coloque, Holt! Aliás, você não pode porque não tem a senha. Então pare de me ameaçar a cada quatro segundos. Está perdendo o charme. – Vamos, Dom – ele sorriu de um jeito que me preocupou. – Você é advogada. Sabe como é importante ter um plano b, ter uma segurança, ter provas, ter… um backup. Seus olhos verdes olhavam firmes na minha direção, e eu os senti queimando. – Você está querendo sugerir que tem uma cópia do vídeo em outro lugar? – É importante estar sempre preparado. – Você não fez nenhuma cópia. Não deu tempo. – Eu não precisei fazer nenhuma cópia – ele riu. – Eu menti. Ou melhor… quase. Ele estava voltando para o andar de cima e eu o puxei pela camisa. – Termine a frase, Gregory. – Meu celular não manda minhas fotos, vídeos e arquivos para uma pasta compartilhada –


explicou, levantando o indicador. – Ele manda para duas pastas – completou, levantando mais um dedo. – É mentira. Ele puxou o celular do bolso e eu senti minhas entranhas tremendo. Vi seu dedão apertando um botão e ouvi um barulho de uma gravação feita por um microfone ruim. O som de vento e gemidos era claro. Holt olhou para o visor e sorriu. – Pode ser qualquer outra gravação. Você está blefando e… – ele virou o celular na minha direção e eu vi o vibrador massageando minha vagina. – Me dê isso – eu não ia conseguir ter aquela discussão de novo. Ele guardou o celular no bolso e eu vi algo nos seus olhos. Não era mais o Holt bobo e gentil. Era o Holt que estava puto por eu ter transado com um vizinho no seu sofá. – Arrume meu quarto – ele sibilou. – Compre um vinho de agradecimento para cada um dos meus vizinhos, em retribuição aos presentes de boas-vindas que recebi. Use seu dinheiro. Trate as pessoas com educação. Lave seja lá qual for o lugar da minha casa em que você tiver se esfregado nua com um desconhecido e nunca, nunca mais faça isso de novo. O gosto de bile fez minha garganta arder e eu senti vontade de vomitar. Ele estava indo embora. Não podia deixar aquilo terminar assim. Não podia deixá-lo ter a última palavra. – Você não manda em mim, Holt – foi a única coisa que consegui pensar. – Não se engane, Dominique. Você é mais inteligente do que isso.


Capítulo 4 “Por pior que seja a noite, amanhã é outro dia.” Scarlett – E o vento levou – Você não está entendendo – expliquei de maneira firme, me servindo de mais uma xícara de café. – Você vai vir até aqui buscar esse sofá hoje. Agora pela manhã. Na verdade – continuei –, se eu fosse você, estaria vindo agora. Holt desceu apertando a gravata ao redor do pescoço e sentou à mesa na minha frente. – Eu já percebi que você não me entendeu. Então, eu vou ser mais clara: você não pode pedir um depósito de cartão de crédito por um serviço que ainda não prestou, se comprometer a prestá-lo em um determinado momento e atrasar o procedimento. O homem da lavanderia estava tentando argumentar do outro lado da linha. Em vão, obviamente. Ia ser do meu jeito. Ele só estava demorando para entender isso. – Querido, querido! – repeti para que ele se calasse. – Não me importa. Eu já fiz um depósito inicial para uma lavagem que deveria ter sido feita ontem. Se o serviço que eu solicitei não incluía vocês virem buscar meu sofá e depois devolvê-lo, vocês deveriam ter me avisado ontem, quando eu fiz a solicitação, o agendamento e o pagamento. E agora você quer que eu agende de novo e pague para que vocês venham buscar? Ele estava dizendo que o agendamento era para ontem e que eu não levei o sofá então ele tinha suposto que… – Você supôs que eu ia te dar meu dinheiro para lavar meu sofá e depois ia desistir de lavar meu sofá e te deixar com o dinheiro que eu paguei para que você lavasse meu sofá? O senhor acha que eu sou idiota? – Ele estava tentando falar. – Então, não me trate como se eu fosse idiota. Meu bem, você vai vir buscar esse sofá agora. Vai lavar esse sofá hoje. Vai me devolver esse sofá hoje. Ou eu vou querer meu dinheiro de volta. Ele estava dizendo que não tinha como fazer isso hoje de jeito nenhum. – Querido, ou você me vê hoje pela manhã quando vier buscar meu sofá, ou me vê daqui algumas semanas em uma sala de audiência depois que eu te processar por propaganda enganosa. Que propaganda? A que diz no seu site que vocês pegam o material e devolvem em casa. Ele explicou que seria por um custo adicional. Holt deu uma mordida na torrada e me observou com admiração. – Então, você deveria dizer isso na propaganda. “Não deveria”? – Vamos ver o que um juiz vai dizer. E alguns jornalistas locais que eu conheço. Eles adoram esse tipo de discussão judicial, envolvendo empresas locais e direitos do consumidor. Conheço pelo menos uns dois que escreveriam um gordo artigo a respeito.


Ele ainda queria argumentar. Ele tinha colhões, isso era verdade. – Querido, estarei te esperando em, no máximo, duas horas. Se você chegar depois disso, não vai me encontrar em casa. Eu vou ter saído para visitar a redação de um jornal local e um fórum. Desliguei. – O tubarão Dominique – Gregory resmungou, servindo-se de café. – Se ele soubesse com quem está lidando já estaria aqui. – Por que você está me elogiando? – Não foi um elogio. É uma constatação. Você não é horrível em tudo – ele explicou. – Ah, obrigada – reclamei. – Como eu disse: não foi um elogio. Quer dizer que foi no meu sofá que você deixou um estranho te comer? – Por que você precisa falar desse jeito? – Foi isso que aconteceu, não foi? – Eu fiz amor com o cara, não precisa ser grosseiro quando descreve. – Fez amor? – ele riu. – Não se faz amor com um desconhecido na casa dos outros, Dominique. Na verdade, acho que você seria incapaz de fazer amor em qualquer situação que fosse – acrescentou, e algo dentro de mim doeu. – Você não precisa ser grosseiro. – Não, não preciso. Mas você merece. – O sofá será devidamente lavado e esterilizado, está bem? – perguntei abrindo os braços, irritada. – Então, por que você não cala a boca? – Você é impossível. – Você fala como se fosse novidade. – Eu preciso ir – ele se levantou. – Não posso ficar aqui perdendo tempo com você, não enquanto tem uma mulher que pode não receber uma indenização depois de ter sofrido um acidente de trabalho que a fez perder os movimentos da cintura para baixo. – Ah, deixe de drama. Você fala como se houvesse alguma chance de ela realmente não receber a indenização. – Obrigado por acreditar nas minhas habilidades como advogado, Dominique. Mas o caso é sério. – Não acredito nas suas habilidades como advogado. Eu li o processo, antes de ontem. Um adolescente sob efeito de entorpecentes seria capaz de resolver aquilo. – E você acha que não merece a minha grosseria. É fácil falar quando não está encarregada do caso. Eu sorri. – Você não viu. Ele se deteve na porta. – Não vi o quê? Meu sorriso se alargou. – Você não viu – repeti batendo palmas. – Eu sabia que você era devagar, Holt. Mas é tão óbvio. – O que é óbvio? Ah, amado poder. Senti tanto a sua falta. – A testemunha-chave estava mentindo. – O técnico? O Harris? Balancei a cabeça afirmativamente. Eu estava mordendo o lábio de empolgação. Estava com saudades daquela sensação: ter o completo controle da situação.


– Sabemos que ele está mentindo. Mas não temos como provar. O que foi que você viu? Ele deu dois passos na minha direção e eu tive vontade de fechar os olhos e me deliciar com o momento. – Troco o vídeo pela resposta – expliquei. Ele estreitou os olhos e pareceu considerar. – Vamos lá, Holt. Um mísero vídeo e você ganha sua primeira causa no trabalho novo. E eu nem preciso levar o crédito – provoquei. Ele sorriu e balançou o indicador negativamente em minha direção. – Se você conseguiu descobrir algo ali, eu também consigo.

As roupas de Holt estavam limpas, passadas, dobradas e guardadas. Os CDs estavam dentro das caixinhas certas e eu tinha passado um pano úmido em cada uma delas antes de colocá-las em algumas gavetas na sala. Minha meta do dia era desaparecer com todas as caixas. De hoje não passava: tudo seria aberto e colocado no seu devido lugar. A única coisa que me atrasava, fora as designações incompreensíveis, era o fato de que eu fazia questão de limpar um local antes de começar a preenchê-lo. Cada gaveta, cada prateleira. Tudo deveria estar devidamente limpo antes de ser ocupado com os itens do morador. Os produtos de limpeza estavam acabando e logo eu não conseguiria fazer coisa alguma sem, antes, ir fazer compras. Abri uma caixa e me deparei com zilhares de fotos. Álbuns misturados com fotos soltas e envelopes repletos de fotos. Seria mais fácil digitalizar aquilo tudo, ou seriam memórias perdidas. Tudo bem… Eu ainda tinha um mês. Poderia perder um dia digitalizando fotos de Holt. O escritório ficava no primeiro andar e era um dos poucos cômodos que Gregory tinha organizado antes da minha chegada. Workaholic. Ali estava algo com o que eu conseguia me identificar. Seus papéis, documentos e cópias de processos ainda estavam desarrumados. Mas, pelo menos, as caixas estavam todas ali, o lugar estava limpo e o computador, instalado. Foi uma manhã interessante. Era estranho ver a vida de Holt. Eu não tive uma vida fácil, mas nunca me lamentei por isso. Achava que “vida fácil” era coisa de romance de banca de jornal e de propaganda de margarina. Não achava que era uma coisa que as pessoas realmente tinham. Os problemas eram diferentes. O jeito como as pessoas lidavam com seus problemas era diferente. Mas cada um sentia o peso da própria existência, e ninguém tinha uma vida fácil. Mas as fotos da infância de Gregory Holt estavam colocando minha convicção à prova. Seus pais estavam sempre abraçados, sorrindo e se beijando. Eles pareciam realmente se curtir, se… amar até. Os lugares que ele tinha visitado eram espetaculares. Ele não devia ter mais que seis anos quando foi à França pela primeira vez. Digo primeira, porque havia outras fotos ali que indicavam pelo menos outras duas viagens a Paris enquanto ele ainda era criança. O pequeno Gregory Holt em cima de um cavalo caro com uma bela paisagem de fundo. O pequeno Gregory Holt brincando em uma cama inflável em uma longa piscina em um dia de verão. O pequeno Gregory Holt assando marshmallows em uma fogueira ao lado do seu pai em frente a mais luxuosa casa de verão que eu já tinha visto. O filho da puta tinha tido uma vida fácil. Se aquele mito existia, o pequeno Gregory Holt certamente o tinha experimentado.


Foi difícil não ressenti-lo. Não… difícil não. Foi impossível. Não conseguia parar de pensar na minha própria vida. Em todas as dificuldades que eu tive que superar para chegar aonde tinha chegado enquanto ele tinha tudo às suas mãos. E agora, o miserável ainda tinha a mim. No seu bolso. Na palma da sua mão. Para fazer comigo o que quisesse. As fotos foram passando e eu vi Greg Holt crescer diante dos meus olhos. O garoto mirrado e sorridente se transformou em um adolescente altivo e então em um homem elegante. Algumas fotos mais recentes mostravam Greg tal qual eu o conhecia, na mesma luxuosa casa de verão. Em duas delas, ele estava sem camisa, e as fotos tiverem que ser observadas com mais cuidado. Tudo bem. Ele é gostoso. Eu já imaginava. Há alguns caras que você consegue notar que eles têm um corpo de babar mesmo observando eles vestidos. É o jeito como o tecido prende em determinadas linhas de músculo quando ele se move. E o modo como uma camisa, mesmo do tamanho adequado, consegue se agarrar a algumas curvaturas do braço. E daí você se pega fantasiando como o cara deve ser por baixo daquilo. Sim, mulheres também fazem isso. Eu não sou homem, então não sei exatamente como acontece com eles. Imagino que eles pensem em peitos, vagina e bunda. Devem imaginar se a gente é depilada ou não e mais todo o tipo de absurdo. Para mulheres, ou pelo menos para mim, essa parte da imaginação tem mais a ver com dedução. É observar essas dobras da camisa, o volume alto na virilha e… deduzir. Mas estou divagando: as fotos de Holt deixavam pouco para a imaginação. Dava para estudar anatomia nas linhas dos músculos dos seus braços. Ele tinha o peitoral levemente elevado, a barriga severamente dividida em seis blocos e um caminho da felicidade que terminava provocante em um short abaixo da linha da cintura. Ele tinha um caminho de pelos claros que descia abaixo do umbigo, além de um considerável volume em seu short de banho; e eu me peguei deduzindo. A campainha tocou e eu tive que acordar do exercício para sair da casa e observar três homens carregarem o sofá para um caminhão. Eu estava com tesão. Merda. Por que diabos eu fui olhar aquelas fotos?

Dizer que eu passei o dia inteiro no limite não faria jus à delicadeza da minha situação. Acontece com mulheres com uma frequência maior do que elas gostariam de admitir: o tesão é tanto que você se pega procurando motivos para esfregar uma perna na outra só para sentir o contato com aquela ínfima região deliciosa. De repente, tudo que eu conseguia pensar era que eu não tinha trazido meu vibrador. Nenhum deles. Foi uma decisão consciente e proposital. Foi um vibrador que me meteu em toda essa confusão para começo de conversa, preferi não trazer nenhum comigo. Agora, só me restava o arrependimento. Já passava um pouco do meio-dia e eu estava sentindo minhas entranhas ardendo de desejo. Eu precisava de alguns minutos para mim. Descarregar a energia. Foi só depois que enfiei um sapato na máquina de lavar e esqueci uma tesoura dentro da geladeira que percebi que era melhor eu me masturbar logo e retomar a concentração.


Subi até o quarto e encostei a porta. Algo dentro de mim, mais ou menos na região da virilha, queria que eu fizesse isso na cama de Holt. Mas meu cérebro ganhou a discussão e chegamos todos – eu, cérebro e virilha – à conclusão de que o risco não valeria a pena. Fechei as cortinas do quarto e me despi. Deitei na minha cama apenas de lingerie e escorreguei os dedos para dentro da minha calcinha. Encontrei minha umidez e massageei com gosto. Em poucos segundos eu estava arfando e mal notei que uma das alças do meu sutiã tinha caído pelo ombro. Estimulei meu clitóris e os lábios. Apertei meus seios com força e senti a sensação gostosa crescer e crescer. Minhas pernas pareciam ter criado vida própria e estavam se esfregando uma contra a outra, involuntariamente. Continuei a me acariciar. O tesão era tanto que eu poderia explodir. Precisava gozar. Todo aquele estresse, humilhação e tensão dos últimos dias. Até minha última transa tinha sido mais para ferir Holt do que para me agradar… Mas naquele momento, eu precisava. Não era para mais ninguém. Era para mim. Holt abriu a porta do meu quarto e eu demorei quase cinco segundos para perceber e parar o que eu estava fazendo. – Puta merda, Dominique. Me cobri, constrangida. – Você não sabe bater? – Sei, mas como eu podia imaginar que você ia… – ele não tirava os olhos de mim. Era desejo que eu estava vendo nos olhos dele? – Se você for ficar fazendo isso o tempo inteiro, eu… – ele usava a mesma camisa de mangas compridas com que tinha saído de manhã. Estava sem a gravata, e os primeiros dois botões estavam desabotoados. – Eu sou homem… Sabe? Não dá pra… – ele estava se aproximando. Baixei os olhos e vi o inconfundível volume em suas calças. – Te deixei excitado, foi? – ri enquanto me levantava da cama para pegar minhas roupas. Então senti um puxão e suas mãos na minha bunda. – Foi – ele respondeu, e eu senti seu hálito em meu pescoço. – Era isso que você queria? Me deixar excitado? Me convencer a te devolver o vídeo se você me deixasse te comer? – Você está sendo grosseiro de novo, Holt. Me solte – reclamei. Mas seu abraço ainda era apertado e suas mãos agora estavam enfiadas entre as minhas pernas. Eu estava molhada e ele estava sentindo. – É assim que a chantagem funciona, não é? – Eu sabia que, no fundo, você era uma pessoa horrível. Ele enfiou um dedo em mim e eu senti meu coração chegar até a Lua. – Eu posso estar enganado – sussurrou –, mas acho que você está com mais tesão do que eu – enfiou mais um dedo e eu não consegui disfarçar um gemido. – Então, acho que não vou te foder agora, Dominique. Porque, agora, você quer. – Seus dedos estavam entrando e saindo e eu quis fechar os olhos e me entregar. – E eu me recuso a fazer algo que você queira. Ele puxou a mão e eu o segurei pela camisa. – Gregory… por favor… – Ah droga. Droga, droga, droga. – Me desculpe. – Eu estava tão excitada que minha cabeça não parava de girar. Eu me arrependeria daquilo amanhã. Me arrependeria daquilo pelo resto da vida. Mas ali, com minha vagina ardendo com um tesão incontrolável, eu senti que podia estourar. – Me desculpe pelo sofá e pelo vizinho. Me desculpe por tudo. Holt colocou a boca contra minha e me envolveu em um abraço espremendo meus seios seminus


contra seu peitoral. Ah, como eu queria arrancar aquela camisa. Ele segurou meu maxilar com força. – Implore – ordenou. – Por favor. – Por favor o quê? – Por favor me come. Ele me jogou na cama e tirou minha calcinha e meu sutiã. – Me diga que você é uma vadia. Peça desculpas e implore para eu te chupar. Eu queria que ele metesse o pau em mim. Queria muito. – Pede, Dominique. – Eu sou uma vadia – ele me olhava como se eu fosse um objeto. Como se eu fosse um objeto dele. – Desculpe. – Ele espremeu meus seios e brincou com meus mamilos. Eu não conseguia parar de esfregar uma coxa na outra. – Me chupa. Ele se abaixou e eu vi seu rosto entre minhas pernas. Ele ia fazer isso? De verdade? Não ia me foder? Ia realmente me chupar? – Peça de novo – senti seu hálito contra meu clitóris e tive certeza de que assim que ele colocasse a língua em mim eu iria gozar. – Vai, Greg, por favor! Vai. Senti seu beijo molhado contra minha vagina. Senti sua língua me lambendo. Senti sua respiração contra minha pele. Senti seus dentes em meu clitóris. Mais rápido. Mais gostoso. Sempre em um lugar diferente. O alívio chegou arrebatador e eu gritei. Abri os olhos para o quarto vazio. Eu tinha três dedos enfiados em mim e tinha certeza de que tinha encharcado o lençol. Respirei rapidamente, recuperando o fôlego. Isso era novidade: nunca tinha conseguido gozar me masturbando imaginando uma situação de submissão. Era sempre o poder que me deliciava. Ou pelo menos era assim que sempre tinha sido. O infernal Gregory Holt estava mexendo comigo de um jeito cada vez mais perigoso. E eu não tinha certeza se estava achando ruim.

A ideia de que eu poderia estar com um verdadeiro tesão por Holt estava começando a me assustar. Sim, eu já tinha me masturbado pensando nele outras vezes. Mas sempre em cenários completamente irreais. Era só um hobby, uma distração. Mas ter ficado encantada com seu corpo escultural e ter me masturbado pensando nele em uma situação perfeitamente possível era perigoso. Era desagradável que o fato de ele me ter sob seu controle estivesse me excitando. Respirei fundo. Não vamos nos descontrolar, Dom. Foi só uma vez, e eu estou sob um estresse bem grande. Precisei extravasar e extravasei. Pronto. Passei o resto da tarde organizando as fotos. Deu um trabalho absurdo, mas consegui passar todas para o computador e distribuí-las em pastas de acordo com a idade aproximada ou evento. Depois coloquei todas, em ordem similar à das pastas no computador, em álbuns. Os álbuns foram para uma gaveta apropriada e eu segui para a próxima missão. Já que estava no escritório, resolvi continuar por lá e organizar os processos de Holt. Como ele nunca perdeu nada importante, nunca vou saber. Sabia que ele tinha acabado de se mudar


e, como sabia que eu teria que ajudá-lo, fez muito pouco para facilitar meu trabalho. Mas a falta de ordem em suas coisas era desesperadora. Tinha avançado muito pouco quando ouvi o barulho de carro do lado de fora e imaginei que ele tivesse chegado. O dia tinha sido tão longo que eu não conseguia me lembrar se ainda devia estar com raiva dele ou ele de mim. Levei o tempo em que descia as escadas para lembrar que estava com raiva dele por ele ter mentido sobre a existência de uma cópia do vídeo, e que ele estava com raiva de mim pela minha incapacidade de pedir desculpas. Um latido me arrancou dos meus pensamentos. Holt abriu a porta e um labrador imenso passou por ela junto com ele. Eu estava aos pés da escada quando aquela coisa monstruosa avançou para cima de mim. As pessoas gostam de dividir o mundo entre pessoas que gostam de gatos e pessoas que gostam de cachorros. Eu não gosto de nenhum dos dois. – O que é isso? – Dominique, Max. Max, Dominique. Cuidado com ela, Max. Ela morde – ele riu. – O que é isso? – repeti. – Meu cachorro, Dominique. Não se lembra? O que você acionou na justiça por latir demais. – Eu não acionei o cachorro. Acionei você. É diferente. E quanto tempo ele vai ficar aqui? – Quanto tempo? É o meu cachorro, Dominique. Ele vai ficar aqui para sempre. – Onde ele estava esse tempo todo? Por que não estava aqui? – Eu mal tenho tempo de ficar em casa e o lugar ainda estava uma zona. Deixei ele em um hotel de animais por um tempo. A ideia era pegá-lo algumas noites e aos fins de semana até eu conseguir me organizar. Mas já que você está aqui, tenho certeza de que ele vai ficar mais confortável em casa. – Mais confortável? Não, não, ele não vai. Holt, eu não me dou bem com animais. – Eu já tinha notado isso em sua relação com outros Homo sapiens. Mas quer dizer que você não se dá bem com criatura viva nenhuma? – Gosto de plantas. Por que você não cria uma planta? – Eu crio um labrador. E Dominique… – ele se virou com seriedade. – Sem gracinhas com o meu cachorro. Eu estou falando sério. Eu amo o Max. Muito. Se você machucar meu cachorro ou fizer uma maldade de qualquer tipo com ele, eu publico aquele vídeo na internet e mando o link para todas as pessoas que você conhece, me ouviu? Engoli a seco. – Estou falando muito, muito sério. Não mexa com o meu cachorro. Perfeito. Um cachorro foi adicionado à equação. Era só isso que me faltava.

Holt desceu ainda enxugando os cabelos molhados com a toalha. A comida chinesa tinha chegado e eu estava colocando a mesa. Coloquei só o meu jogo de prato e talher, de propósito. Se ele quisesse comer, que pegasse suas coisas. Estava usando uma camisa branca justa. Era quase como se ele tivesse conseguido ler minha mente e soubesse o que eu tinha feito durante a tarde. Seu corpo ainda estava úmido e a maldita da camisa grudava em todos os lugares certos. Eu devo ter hesitado por alguns segundos enquanto o observava


porque, quando dei por mim, ele já estava sentado na mesa. No lugar que eu tinha arrumado para mim. – Você não vai comer? – perguntou, olhando ao redor e, certamente, notando a ausência de outro prato. – Vou. E você está sentado no meu lugar. – expliquei, tentando controlar o tom de fúria em minha voz. – Ah – ele disse, começando a se servir. – É melhor você colocar mais um lugar, então. Porque eu não vou sair daqui. Não o espanque. Não o espanque. Não o espanque. Fui até a cozinha e peguei tudo o que precisava, mais uma vez. – Max dorme do lado de fora. Já dei comida para ele, mas amanhã você vai precisar fazer isso. Eu ia mandar que ele parasse de me tratar como se estivesse me pagando pelo trabalho. Mas eu sabia onde essa conversa ia dar e achei melhor, pelo menos dessa vez, ficar quieta. – E o que ele come? – Ração. Tem um medidor dentro do saco, na despensa. – Vou precisar do seu carro amanhã – falei antes de começar a comer. – Ah, é? – ele riu, enfiando mais uma porção de frango xadrez na boca. – Preciso comprar algumas coisas para sua casa. Comida, produtos de limpeza… Você já pelo menos ouviu falar dessas coisas? Preciso do seu carro pra fazer isso. – Se vire – acrescentou, fazendo uma careta divertida enquanto tentava falar sem mostrar a comida semimastigada em sua boca. De repente, eu conseguia entender perfeitamente o que levava uma pessoa a cometer um homicídio. – Por favor – rosnei, com os dentes travados. – Faço um acordo com você – continuou, depois de engolir a comida. – Não, obrigada. Estou cheia dos seus acordos. – Você me diz o que viu no processo e eu te empresto o carro amanhã. Estreitei os olhos, satisfeita. Ele não conseguiu encontrar nada. Aquele ínfimo detalhe era tão óbvio para mim e, ainda assim, o iludia completamente. – O seu processo vale bem mais do que isso. – Mas é só uma questão de tempo até eu ver o que você viu. E aí sua vantagem deixa de existir. Não vou trocar a resposta pelo vídeo, Dom. Isso é um fato. Então, é melhor você aproveitar sua vantagem enquanto ela ainda existe. – Diz pra mim… Você chegou ao escritório hoje e disse para a equipe que tinha algo no processo que provava que a testemunha estava mentindo. E aí todos eles começaram a ler e reler tudo. Me conta, Greg. Quantas pessoas? Quantas pessoas passaram o dia lendo o processo inteiro e ainda assim não conseguiram achar a coisa mais óbvia do mundo? Ele estava mordendo o lábio descontraidamente enquanto pensava se ia ou não massagear o meu ego. – Oito. – Oito? – ri. Ah, que delícia. – Mas não foi o dia todo – ele acrescentou, se servindo de mais arroz. – Hmm – gemi, fingindo acreditar, enquanto bebia mais um gole de refrigerante. – Você é inteligente, Dominique. E é espetacularmente boa no que faz, nunca neguei isso. – Não vou te contar o que é. – Mas também é uma megera louca que ninguém suporta.


– Obrigada – sorri. – Mas eu te prometo uma coisa – ele levantou o indicador e se aproximou de mim. – Eu vou descobrir o que é. Fitei seus olhos mantendo uma divertida expressão de incredulidade. – Boa sorte. – Sabe o que diverte o meu dia? – Não. O quê? – Pensar em você. Eu quase engasguei com a comida. Tinha certeza de que tinha entendido errado. – A poderosa Dominique Thoen. O Terror das Cortes, aqui… lavando o meu banheiro. É, eu tinha entendido errado. Mas algo que ele falou me irritou além de suas intenções. – O que tem de errado com lavar banheiros? – Nada, mas sabe… é você. Lavando banheiros. – O que tem de errado com lavar banheiros? – minha voz ficou mais forte e intensa. É claro que o pequeno Gregory Holt, crescido no luxo e na fartura, não sabia o valor de um trabalho bem feito. – Ah, vamos… Você quer me dizer que é louvável lavar… – Meu pai era zelador do fórum, Gregory. Ele lavou banheiros a vida inteira para sustentar a casa. E foi lavando banheiros que ele me deu uma infância digna e oportunidades para um futuro promissor. Então, me diga, seu prepotente imbecil, o que tem de errado com lavar banheiros? Seu rosto assumiu uma tonalidade azulada e eu fiquei muito satisfeita. Isso mesmo, Greg, fique sem graça. – Desculpe, não foi minha intenção ofender seu pai. – É, sei… – resmunguei. – De verdade, não foi. Peço desculpas. Olhei atravessado para ele. Sabia que tinha sido sem querer, mas não mudava nem um pouco a raiva que eu sentia da sua vida de privilégios e alienação. E pensar que há pouco tempo atrás eu não acreditava que “vida fácil” era uma coisa que podia existir. Terminamos de comer e ele se levantou para começar a tirar a louça. Foi um gesto educado e involuntário. Mas parou subitamente, como se tivesse se lembrado de que deveria estar me torturando. Largou tudo na mesa e virou as costas. – Onde está meu sofá? – perguntou quando chegou na sala. Eu o ouvi ligando a tevê. – Lavando – gritei da cozinha. – Achei que você tinha jurado consumir a alma do funcionário se ele não devolvesse hoje. – Você disse que eu tinha que tratar as pessoas com educação. Resolvi dar uma chance ao incompetente. Andei até a sala e vi o sofá menor atravessado. Ele o tinha arrastado para substituir o outro, que ficava de frente para a televisão. Sentei ao seu lado. O engraçado é que eu sempre preferi ficar sozinha em casa. Mas depois da solidão dos últimos dias de caixas e organização, eu estava com saudade de um pouco de calor humano. – Alguma chance de você me deixar escolher o canal? – perguntei. Ele olhou para mim e sorriu. – Porque você foi gentil com o funcionário – ele disse, me entregando o controle, e eu me senti uma cobaia em um laboratório. Sabe? Aquelas de experimentos comportamentais? Em que se dá um choque quando a cobaia faz algo errado e se dá um agrado quando faz algo certo? Peguei o controle e me senti mais rabugenta do que tinha estado cinco minutos atrás.


Estava mudando de canal e em um deles vi a Enterprise cruzando o espaço. Senti minha espinha gelar. Eu queria assistir, mas não queria ouvir as piadinhas de Holt e mudei de canal. – Você pode assistir ao capitão Kirk, se quiser. Olhei para ele confusa. – Você tem uma miniatura da nave no seu escritório – ele explicou. – Imaginei que você fosse fã. – Era do meu pai – expliquei. – Ele parece ser um cara legal. – Ah, por favor, Holt. Pare com o falso moralismo. Era legal só porque era um zelador? Pessoas pobres não podem ser ruins? – Quis dizer que ele parece ser um cara legal porque conseguiu conviver com você a vida inteira sem nunca te largar em um lixão ou te vender – ele devolveu. – Foi muito decente da parte dele te tolerar. – Rá, rá. – Ele mora perto de você? – Ele morreu. Eu podia sentir a respiração de Holt hesitando do outro lado do sofá. – Perdão, eu… – Ah, deixe de ser uma menininha, Holt. As pessoas morrem, a vida é assim. Faz muito tempo, de qualquer jeito. Já superei. – E ele gosta… gostava do capitão Kirk? – Aquilo era a Nova Geração. Não é Kirk na Nova Geração, é Picard. Ele ficou muito quieto e, quando olhei na sua direção, ele estava segurando uma gargalhada quase impossível de conter. – Você sabe os nomes! – É claro que eu sei os nomes. Meu pai assistia a isso! – Você sabe qual capitão é de qual temporada! – Cala a boca – revirei os olhos. – Você é viciada em Jornada nas Estrelas! – O nome é Trekker – brinquei, e ele não conseguia parar de rir. Sucesso. Ele tinha esquecido toda a situação do sexo com o vizinho no sofá. E eu nem tinha precisado pedir desculpas. Sinceramente, Holt… Não sei como você sobrevive com toda sua gentileza no mundo de gente grande. – Pare de rir! – cutuquei ele com o controle – Vai. Me conta como anda seu emprego novo. Gregory me observou com olhos arregalados. – Você está efetivamente interessada na vida de outro ser humano? – ele tentou colocar a mão sobre minha testa para ver se eu estava com febre, mas eu o empurrei para longe. – Acho que se passar mais um dia sem ler um despacho ou qualquer outra decisão judicial eu vou ter um derrame – sorri e ele me acompanhou. – Pois é. Achei estranho quando você resolveu tirar férias. – Não resolvi. Resolveram por mim. Eu tinha muito tempo acumulado e os chefes resolveram que isso poderia ser um problema em uma eventual causa trabalhista. – E quem é louco de querer ir contra você em um processo? – completou com uma breve reverência na minha direção. – E você? Salvando uma pessoa indefesa de cada vez?


– É agradável. E é interessante conhecer pessoas com uma personalidade mais parecida com a minha. Já fiz várias boas amizades. – Eu não duvido! Você é a pessoa mais simpática que eu conheço. – Obrigado, Dom – ele soou sincero. Eu estava confusa. – Não foi um elogio – expliquei, incrédula. Ele riu. – Conheci uma garota legal. – Garota legal? Quem diz “garota legal”? – Perdão – abanou as mãos em rendição. – Conheci uma mulher interessante. Melhorou? Não. Na verdade, não tinha melhorado. Nem um pouco. – Se eu tomar coragem, vou chamá-la para sair amanhã. – Se tomar coragem? Mas você é uma criança, mesmo… – reclamei. – Agradeço o incentivo. Mas é delicado. Ela é uma colega de trabalho. – Não é contra a política da empresa? – Na verdade, não. Merda. – Você acabou de chegar, talvez fosse melhor… – Mas eu não devia estar conversando sobre isso com você – disse rindo. – Se há uma pessoa nesse mundo que deseja que coisas ruins aconteçam comigo essa pessoa é você – completou. Sua voz tinha um tom de brincadeira misturado com um tom de verdade. – Acho melhor pedir conselho para o Max. Eu tinha parado de trocar de canal e nós ficamos ali, sentados em pontas opostas do sofá menor assistindo a um jornal qualquer. Eu tinha algo embrulhado no estômago. Ele estava interessado em uma mulher e eu não estava gostando disso. Essa parte tinha ficado bem clara para mim. Mas por quê?


Capítulo 5 “Não me incomode mais. E não me chame de docinho.” Scarlett – E o vento levou Eu estava lutando arduamente contra a possibilidade de estar atraída por Gregory Holt. Ele era a concentração de tudo que me irritava e, para piorar, estava me chantageando com algo particularmente constrangedor. Eu achava que as mulheres deveriam se apaixonar pelo cara que senta em uma mesa próxima a ela todos os dias na mesma cafeteria, ou pelo cara que a salva de morrer atropelada, ou… sei lá. Qualquer coisa que não envolva uma gravação de sexo caseiro. Mas eu estava me desesperando rápido demais: eu não estava apaixonada por Holt. “Paixão” é uma palavra muito forte. Atraída, talvez. Mas isso era tudo. Acho que poucas vezes na minha vida tinha trabalhado com tanto empenho. Quando Greg saiu de manhã, eu já estava acordada e ativa há duas horas inteiras. Ele fez alguma piada sobre eu estar desesperada para acabar com aquilo e ir logo embora. E eu estava tentando tirar a imagem dele nu da minha cabeça. Aquilo não era paixão, nem atração. Era obsessão. É isso: eu já me masturbei pensando nele em um cenário irreal, a proximidade dos últimos dias foi sedutora e minha vagina começou a pensar que aquilo poderia acontecer de verdade. Minha vagina merecia uma surra para deixar de ter ideias ridículas. O cachorro ficava me encarando o tempo todo. Eu já te dei comida, não dei? O que mais você quer? Nunca tive animais de estimação, então não conhecia muito bem seu comportamento. Será que era isso que os animais faziam? Te encaravam? Talvez ele quisesse atenção. Carinho ou brincar… É, sinto muito, meu bem, mas isso não vai acontecer. Não é que eu tenha medo de cachorros. Eu não tenho medo de quase nada nessa vida. Mas a ideia de abraçar uma coisa que baba e solta pelos me parece pouquíssimo higiênica. Mantive uma distância saudável e o ignorei enquanto seguia trabalhando. Resolvi ficar trancada no escritório de Holt organizando seus processos. Aquilo era o tipo de coisa que ia manter minha mente focada. Li algumas petições que levavam a elegante assinatura de Gregory procurando erros de qualquer tipo: jurídicos, de ortografia, de bom senso. Mas, por mais que aquilo me irritasse, ele era um bom profissional. Tinha trabalhado em uma série de processos sigilosos e eu me diverti com a ideia semiproibida de observá-los. Além do mais, a atividade permitia que eu me distraísse com meu passatempo preferido. Inventei essa brincadeira na época em que estagiava. Ficava horas a mais que os outros, todos os dias. Trabalhava como uma escrava, mas era o que eu queria: aprender tudo que eu pudesse e provar que eu conseguia. Assim que me formei, os advogados encarregados me disseram que, se eu quisesse, teriam uma vaga para mim no escritório. Eu recusei educadamente: àquela altura, já tinha recebido umas três propostas


infinitamente melhores. Mas o fato é que eu passava muito tempo trancada. Minha vida se resumia àquelas folhas de papel. Pedidos e decisões. Um dia, eu simplesmente comecei a pensar nas pessoas por trás dos nomes estampados na minha frente: qual era sua história de vida, que tipo de roupas elas vestiam, quais eram suas comidas favoritas, onde elas moravam, quais eram seus sonhos… Eu me divertia por horas com aquilo. Transformei cada autor e cada réu em meus amigos íntimos nos meus longos dias fechada em uma sala sem janelas. E agora, eu podia repetir a brincadeira. Talvez aquele Richard da petição de guarda fosse um espião que queria manter seus filhos a todo custo, talvez Amiant tivesse matado um de seus filhos, naquela ação penal, e forjado o suicídio, talvez Crispadin estivesse casada com três homens ao mesmo tempo e por isso não tinha explicação para a quantidade de imóveis que possuía. O toque do telefone chamou a minha atenção. Quem poderia estar ligando? Holt estava no trabalho e deveria ter dado o número do seu celular para quem quer que fosse e eu… quem iria ligar para mim? Tirei o telefone do gancho. – Dom? – Holt? – Olha, eu sei que você não daria a mínima se eu morresse ou algo assim. Mas eu vou chegar bem tarde hoje, e não quero que você se preocupe. – Você tem razão. Eu não iria me preocupar – respondi secamente. – Ótimo – riu. – Vou sair com uma colega essa noite. Vamos beber alguma coisa e pode ser que eu… -– Eu não perguntei, Holt. – Certo. Até mais então. Desliguei sem me despedir. Ele ia sair com a piranha. Aquilo que eu estava sentindo… era ciúme?

Se alguém perguntasse, eu poderia dizer que não saí procurando por sexo casual depois daquela ligação de Holt, mas seria mentira. Eu queria foder pesado. De preferência com o vizinho que tinha irritado tanto o Holt. Ah, que se dane. Que se dane essa coisa de remorso. De ser educada com os outros. De cuidar de cachorro e de organizar essa vidinha suburbana. Eu sou uma vadia infernal de primeira categoria. Era assim que eu sempre tinha vivido e é assim o único modo que eu sei viver. Eu trabalho o dia inteiro, todos os dias. Sou espetacularmente sensacional no que eu faço. Quando volto para casa, gosto de ficar sozinha. E quando estou me sentindo solitária, eu saio com um vestido colado e com um decote generoso e alivio minha solidão no corpo de um estranho. Se Holt ia transar hoje, eu também ia. De jeito nenhum eu ia recebê-lo vestida em roupas vagabundas, limpando sua bagunça, quando ele chegasse à noite com um sorriso satisfeito de orelha a orelha. Transar na casa dele era falta de educação. Certo. Essa parte eu entendi. Mas fora da casa dele eu era dona do meu corpo e ele que se fodesse.


Andei até a porta da casa que Eric tinha indicado como sendo a dele. Não parei para refletir, respirar ou considerar minhas opções. Eu só queria ficar suada com alguém e parar de pensar. Parar de pensar em Holt suado com uma mulher. Ah. Inferno. Eu estava mesmo atraída por ele, não estava? Acho que bati umas cinco vezes na porta. – Dominique? Ele estava com uma cara assustada. Saiu de casa e fechou a porta atrás de si. – Cheguei em um mau momento? – Não exatamente. Posso ajudá-la? – Na verdade, parte de mim até achou que você não estaria em casa. – Trabalho com ações. Faço boa parte do trabalho em casa mas, no momento, estou de saída. Ele seguiu andando em direção ao carro e indicou com a mão que eu o acompanhasse. A garagem dele estava fechada e ele abriu uma pequena porta na lateral que dava acesso ao interior. Assim que ele fechou a porta e eu vi que estávamos sozinhos na garagem… – Você tem alguns minutos antes do trabalho? Ele olhou de um lado para o outro com um sorriso no rosto. Tinha entendido o que eu tinha dito, mas estava decidindo se acreditava ou não. – Você está sugerindo… – Uma rapidinha antes de você ir trabalhar. Exatamente, Eric – respondi. Eu não tinha tempo, ou melhor, não tinha vontade de dar espaço para sutilezas. Queria transar e, de preferência, que fosse rápido. Ele andou na minha direção de um jeito que deveria ter sido sedutor, mas não foi. – Mas você é mesmo uma dama perigosa. Colocou as mãos na minha cintura. Levantei meus braços até seus ombros. – Ah, meu bem. Você não faz a menor ideia. Ele enfiou a mão na minha bunda e empurrou meu short de lycra para baixo junto com a calcinha. Estava desatando o próprio cinto quando eu tive uma ideia e segurei suas mãos. – Calma – pedi rapidamente. – Achei que estávamos com pressa. – E estamos, mas… Você gosta de brincar? Ele sorriu confuso. – Brincar? – É – expliquei com a língua nos lábios. – Interpretar papéis… – Ahmm – ele riu gostoso. – E o que eu devo ser hoje? – Seu vizinho está com raiva de mim – brinquei com sua gravata. – E eu acho isso… – balancei a cabeça procurando a palavra certa – sedutor. – Seu marido não te come quando está com raiva, hein? – ele me abraçou mais forte pela minha cintura e me prendeu contra a lateral do carro. – Você se incomoda? – perguntei, mas pelo seu olhar tinha certeza de que ele não se incomodava. – O que foi que você fez? – Ele estava sorrindo e tinha a boca contra a minha. Passeava meus dedos pelo seu corpo e notei algo que não tinha percebido quando tínhamos transado antes: ele tinha um corpo gostoso. Era firme e rígido. Não era charmoso nem tinha traços especialmente maravilhosos, mas por baixo daquela roupa comportada seu corpo deveria ser de babar. Como o de Holt. Merda, não conseguia parar de pensar naquele homem… – Acho que tenho sido uma garota muito má – eu disse, mas não de um jeito provocante. Pelo


menos não intencionalmente. Mas as palavras saíram safadas. Acho que “Tenho sido uma garota má” é o tipo de frase que não se pode dizer com naturalidade. Eric me beijou e eu senti o gosto de hortelã e antisséptico na sua boca. Pensei em qual seria o gosto de Holt. – Eu minto – sussurrei, e ele me beijou de novo. – Não o ajudo com seu trabalho, mesmo quando posso. – Outro beijo – E eu odeio aquele cachorro. – Ele riu contra a minha boca e me virou de costas para ele. – Eu odeio chegar em casa para uma mulher que não cuida de mim, sabia, vagabunda? – ele cantava as palavras no meu ouvido, mas Greg não me chamaria de vagabunda. – Vadia – ri. – Ele não me chama de vagabunda. Seus dedos desceram entre minhas pernas ainda fechadas e eu as abri, obediente. – Isso – murmurou beliscando meu clitóris. – Abre essa porra dessas pernas. Se você não serve para mais nada, pelo menos para isso vai servir. Ele me puxou para o capô do carro, enquanto abria o pacote de camisinha, e me forçou a ficar quase de quatro, com os cotovelos apoiados contra a mercedes vermelha. Fechei os olhos e imaginei que fosse Holt. Era ele com sua camisa branca colada em todos os lugares certos. Ele ia enfiar a mão na calça de moletom escura e abaixar a parte da frente. Ia colocar seu pau duro para fora e ia dar um passo pra trás. Tinha certeza de que ele ia encarar minha bunda com gosto antes de meter alguma coisa em mim. Ia me olhar daquele jeito, pensando na “poderosa Dominique Thoen completamente indefesa”. Mantive os olhos fechados, conseguia sentir seu toque me estimulando, me deixando cada vez mais molhada, suas mãos nos meus seios, sua boca no meu ouvido. – Vou te dar uma lição para você aprender quem é que manda. O impacto empurrou meu corpo todo contra o carro e eu fiquei com as mãos espalmadas procurando apoio, mantendo a testa contra o metal frio e sentindo meus seios espremidos contra o capô. Ele meteu sem piedade. A cada nova estocada meu corpo inteiro esfregava contra o metal. A sensação era deliciosa. – Me diga quem é que manda, vadia. Diz pra mim – ele disse, me segurando pela bunda. Se me desse um tapinha, tinha certeza de que o espancaria. Não gosto disso. – Eu – sorri. – Quem manda sou eu. – Ah, é? Vamos ver se é. – Ele meteu com ainda mais força e ainda mais rápido. Puxei uma de suas mãos da minha bunda para o meu ventre e ele entendeu o que eu queria. Seu pau entrava cada vez mais voraz e ele puxava meu clitóris com força. Gozei com minha respiração embaçando o metal vermelho.

– Senta! Senta! Senta! – Porcaria de cachorro. Eu estava tentando recolocar os móveis no lugar depois que o sofá chegou da lavanderia. Mas com o cachorro enviado por satanás pulando para todos os lados e tentando me lamber a cada três segundos, andar pela sala estava ficando impossível. – Você tem sorte de seu dono ter aquele vídeo, ou já tinha feito churrasquinho de você. Ele finalmente se sentou e me encarou com aqueles imensos olhos castanhos. – Acha que eu não faria, é? Pois eles fazem isso o tempo todo na China. Não duvide, Cérbero. Eu estava com fome, mas não aguentava mais ficar naquela casa. Precisava sair dali. Tomar um ar.


Respirar fundo. O mapa no meu celular dizia que havia uma lanchonete não muito longe dali. Seria um sanduíche de almoço, mas pelo menos não seria na sala de estar de Holt. Coloquei um punhado de ração para a besta demoníaca antes de sair. A vizinhança era… Estranhamente agradável: gramados verdes e bem cuidados, pessoas se cumprimentando, um casal correndo com roupas de ginástica. Coloquei a mão na testa. Estou começando a achar essa vida agradável… Preciso sair daqui, e logo. O casal passou por mim e eu pensei em que tipo de espírito deveria possuir uma pessoa para sair para correr em pleno meio-dia. Acho que inteligência não era um ponto forte naquele bairro. – Dominique! – disse uma voz irritante, e eu me lembrei dela imediatamente. – Tudo bem? – Era a vizinha do outro dia. A da carona. Continuava sem lembrar o nome dela. – Como está a mudança? Horrível. Infernal. Amaldiçoada. Saída de um pesadelo de Lovecraft. “Seja educada com os vizinhos.” – Bem, obrigada. – Estou indo ao supermercado, hoje à tarde. Se você ainda estiver sem carro e quiser… – Ah, seria ótimo! Ela sorriu como se tivéssemos acabado de virar melhores amigas. – Saio daqui a uma hora. – Estou indo almoçar, agora. Pode ser que eu me atrase um pouco. – Sem problemas! – respondeu esganiçada e solícita. – Nós esperamos. – Nós? – Um ou outro vizinho sempre vem comigo – sorriu. – Somos uma comunidade bem unida – completou, balançou para os lados, e ensaiou um murro brincalhão contra o meu braço. Eu geralmente emano uma áurea que diz “Não me toque”, e que é intransponível para a maior parte das pessoas com algum nível de bom senso. Aquela vizinha, no entanto, parecia não temer a morte. Ousadia ou estupidez, eu não soube definir. Mentira. Soube sim: estupidez. Definitivamente, estupidez.

A vizinha estava com o carro estacionado em frente à minha porta quando voltei do almoço. Havia gente demais dentro do carro. – Olá – cumprimentei. – Shelbi – Esse é o nome dela. Não podia mais esquecer. –, você não devia se misturar com esse tipo de gente – ouvi uma voz falar em alto e bom tom. Era a garota-propaganda do Greenpeace. Ótimo. Abri a porta do carro e lá estava ela: sentada no banco do passageiro com uma camisa do System of a Down. Adorei a camisa, detestei a menina. – Crianças da sua idade não podem andar no banco da frente – cuspi as palavras em tom de brincadeira. – Se você acha que eu vou passar para trás para você ir na frente, ficou louca. – Andy! – pediu Shelbi. – Dominique é nova na vizinhança, por favor, vá atrás com o Rick. Ela saiu do carro soltando fumaça e foi para o banco de trás. – Dominique, este é Rick.


Um braço fino surgiu entre os bancos e eu apertei sua mão. Ele era muito branco e tinha cabelos muito escuros. Tinha um sorriso gentil e olhos claros que ficavam por trás de óculos de lentes grossas. – Prazer – falou de qualquer jeito. – O prazer é meu – apertei a mão que ele oferecia. – Próxima parada: supermercado! – anunciou Shelbi com alegria antes de fazer um barulho ridículo do que deveria ser de um trem. – Shelbi, você precisa parar de fazer isso – constatou a garota irritante. – É ridículo. Nossa… concordamos em uma coisa. – Não ligue pra ela, Shelbi. Poucas pessoas apreciam uma brincadeira. – É, eu odiava a onomatopeia e a atitude excessivamente otimista da motorista. Mas odiava a menina-reciclagem ainda mais. – Eu pedi sua opinião? – Andy! Não precisa ser grossa – Shelbi continuou. – Você precisa desculpar a Andy, Dominique. Ela não tem modos! – exclamou olhando pelo retrovisor. – Ah, eu estou acostumada. E pode me chamar de Dom. Ela olhou para mim e sorriu. – Não a chame de Dom, Shelbi! – Ah, garota, cala a boca. – Vocês não são amigas. – Com licença? – perguntei. – Qual o seu problema? – Não suporto gente que… não recicla. Ah, morre, perua. A viagem seguiu com a voz irritante de Andy proferindo ofensas veladas contra mim e com o circo de onomatopeias de Shelbi que eu, infelizmente, tinha começado a defender. Rick se manteve em silêncio e, apesar das incontáveis tentativas de Andy de trazê-lo para o seu lado da discussão e colocá-lo contra mim, se absteve de qualquer comentário para qualquer um dos lados. Considerando todos os elementos, até agora ele era a pessoa do carro de quem eu mais gostava. Finalmente chegamos ao supermercado e eu já estava pronta para me jogar pela janela. Qualquer coisa que me afastasse daquela gente. – Vê se faz as compras rápido – reclamou a Miss Puberdade. – Já tivemos que esperar você por mais de uma hora para vir para cá. – Eu avisei a Shelbi que iria me atrasar, não foi, querida? – Foi sim, Andy. – Querida? – Andy disse, mais uma vez entre os bancos da frente, com o indicador ossudo invadindo meu espaço pessoal. – Não a chame de “querida”. Ai, como eu queria mandar ela pro inferno. Se não matar e esquartejar o funcionário da lavanderia tinha me rendido o direito de escolher o canal na noite passada, eu tinha certeza de que não esbofetear a magricela ia me render múltiplos benefícios. Um deles deveria ser sexo oral. Mas acho que Holt não ia concordar, mesmo se eu pedisse. E, é claro, eu não faria isso.

A verdade é que a casa de Holt precisava de tudo. Eu ia gastar uma fortuna…


Mas eu precisava fazer aquilo. Rick estava um pouco atrapalhado com suas compras e, como ele era o único ser humano decente da vizinhança, resolvi ajudá-lo. Ele não parava de agradecer e aquilo começou a me incomodar. Calma, Dom, o moleque só está tentando ser educado. Paramos no corredor de produtos higiênicos. Duas garotas passaram por Rick e ele derrubou metade dos oito sabonetes que tentava equilibrar. Virgem. Coitado. Abaixei para ajudá-lo a apanhar suas coisas e notei que ele estava estrategicamente parado na frente das fraldas geriátricas. – Sabe? Se você quiser ir puxar conversa com uma delas, é melhor escolher outro lugar para estacionar seu carrinho – brinquei, indicando as fraldas. Ele sorriu constrangido, ajeitou os óculos no rosto e começou a analisar as fraldas. Não entendi o que ele estava fazendo, mas poucos segundos depois ele pareceu se decidir por uma marca e colocou dois pacotes no carrinho. Hmm… – Você sofre de incontinência? – perguntei, séria. – Não. Estou fazendo compras para um amigo também – ele explicou, antes de voltar a empurrar seu carrinho. Um amigo… sei… Achei melhor não perguntar mais nada. Não o conhecia bem o suficiente, era um assunto delicado e, por fim, eu simplesmente não me importava. Se eu fosse ele, daria em cima das meninas no supermercado e compraria minhas fraldas pela internet. Mas cada um é cada um. Alguns enlatados depois, chegamos a um corredor com artigos de papelaria e algumas araras com roupas genéricas. O encarregado da organização daquele supermercado deveria ser demitido. Andy estava escolhendo alguns sutiãs de péssima qualidade. – Você compra sua roupa íntima em supermercados? – não resisti e perguntei. – Onde eu compro minha roupa íntima é da minha conta. Não se meta. – Você é um amor, sabia? – Pelo menos eu sou decente e não poluo o planeta. – Ah! Eu tenho certeza de que as fábricas de Taiwan que produziram esse material de qualidade que você está comprando para tapar os seus minúsculos seios compartilham da sua consciência social. – Vai pro inferno. Puta merda. Ela tinha me mandado ir pro inferno? E eu estava me policiando esse tempo todo… Devia ter mandado ela ir pro inferno primeiro. Respirei fundo e empurrei meu carrinho para o corredor de bebidas alcoólicas. De todos os itens que eu tinha ido comprar, as bebidas eram o que eu mais estava precisando ultimamente. – Que coincidência, parece que a vizinhança inteira está aqui – ouvi uma voz masculina dizer em algum lugar atrás de mim. Virei-me para um jovem alto e forte. Ele tinha os cabelos castanhos arrepiados, um par de olhos azuis bem escuros e um sorriso que dizia “Eu sou gostoso”. – Você é a vizinha nova, não é? Que se mudou essa semana? – Dominique Thoen – ofereci a mão para que ele apertasse. Não me lembrava dele.


– Calvin Harris – ele disse. Apertou minha mão e não soltou. – Moro há umas três casas da sua. Já te vi arrumando as coisas quando passo na frente da sua casa. É que eu corro todos os dias – falou as últimas palavras com um ar de arrogância que eu conhecia muito bem. – Estou arrumando as coisas dentro de casa, sr. Harris. Como pode ter me visto? – sorri. – Você tem uma janela bem grande na sala. E já te vi do lado de fora algumas vezes – explicou atrapalhado e soltou minha mão subitamente. Hm… sei… – Não sou tarado, nem nada assim – completou. – Prometo – acrescentou, e o sorriso sedutor voltou ao seu rosto. – Não pensei que fosse. – Você tem uma camisa do Scorpions. Você estava usando ela outro dia, com um shortinho preto. Eu vi quando passei correndo – ele estava ficando um pouco vermelho e eu me deliciei com sua vergonha. – Você gosta de rock? Quando um homem elogia suas roupas, ele geralmente está elogiando suas curvas. Não é sempre, mas é quase. – Bastante. – Seu marido é um cara de sorte. Uma mulher bonita que gosta de rock. – Não é meu marido. É a casa de um amigo. Estou passando uns dias. – Ah – seu sorriso se alargou. – Então talvez eu passe lá um dia. A gente escuta umas músicas, toma esse vinho… – brincou, apontando para a garrafa que eu tinha nas mãos. – Você tem idade suficiente para beber? – perguntei. – Tenho. Claro – ele respondeu, e algo no seu tom de voz me afirmou que, com certeza, ele não tinha. – Acho que vou precisar ver um documento antes de abrir um vinho com você, Calvin – ele riu. Nunca, nunca, nunca aconteceria. Ele era, definitivamente, novo demais. Mas toda mulher gosta de ver um cara interessado nela, e eu não sou exceção. – Obrigada pelo elogio, Calvin, mas não, obrigada. – Bem, eu tenho que ir agora. Continuar as compras – indiquei o carrinho com a mão. Ele se afastou, saindo do meu caminho e levantando a mão mais uma vez. Eu a apertei, mas ele a puxou até os lábios e beijou meus dedos. Eu sorri e me afastei. É claro que dei de cara com Andy. E é claro que ela estava me encarando como se eu fosse o anticristo. Peguei mais duas garrafas. Voltei e peguei uma terceira. Só por segurança.

Andy estava com uma cesta aguardando na fila do caixa comum. – Por que você não vai para o caixa rápido? Tem menos de trinta itens na sua cesta, com certeza – disse, observando o conteúdo da cesta que ela segurava na frente do corpo e tapava como se sua vida dependesse disso. – Estou bem aqui. Obrigada. O seu tom de voz e o jeito como tentava evitar que alguém olhasse para o que ela ia comprar fez que eu tivesse certeza de que tinha comprado a lingerie colorida que estava olhando mais cedo.


– Pode passar na minha frente – ofereceu Calvin, que era o último da fila, logo atrás de Andy. – Tem certeza? Você também tem pouquíssimos itens aí. E eu… – indiquei a imensa quantidade de coisas no carrinho com o queixo. – Sem problemas – sorriu. Eu passei na frente com um “obrigada” discreto e, para compensar, fiquei inclinada sobre o carrinho, empinando a bunda na sua direção. Não era como se eu estivesse de minissaia ou algo assim, mas tinha plena consciência de que meu short era curto o suficiente. Não, eu não sou vadia só por empinar a bunda para um cara. Olhar não tira pedaço. Muitas mulheres fazem isso. Muitas mulheres se empinam, poucas admitem. – Sério. Você já ouviu falar em lojas de lingerie, certo? – provoquei. – Cala a boca – sussurrou. – Tem lugares especializados em roupas íntimas de qualidade. Você não precisa comprar essa coisa estranha só pela facilidade. Ela ficou muito quieta, respirando fundo. Vamos lá, magricela. Devolva com uma resposta sagaz. É melhor se defender, porque eu descobri um ponto fraco e estou só aquecendo. – E não é nem questão de preço. Tem lugares bem baratos. Posso te levar em um lugar um dia, a gente compra umas calcinhas decentes pra você. Calvin, a essa altura, já tinha entendido a brincadeira e estava rindo atrás de mim. – Estou bem, obrigada. Por que ela estava tão calma? – Deixa eu dar uma olhada nisso – puxei um dos sutiãs que ela tentava esconder na cesta. – Devolve isso – ela disse. Seu rosto estava vermelho. Mas não era raiva, era vergonha. – Awn! Tem arco-íris! – sacudi o item no ar, observando os múltiplos e minúsculos arco-íris desenhados por todo o pano. Ela soltou a cesta no chão perto do caixa e foi embora em silêncio. Estranho. Por que ela não… Então, eu entendi. Calvin morava na vizinhança. Ele era um rapaz jovem, da sua faixa etária, bonito e charmoso. Ela estava atraída por ele. Talvez o sutiã fosse algo que ela quisesse mostrar para ele no seu próprio corpo. E não sacudido na fila de um supermercado por uma estranha. Bem feito. Não se brinca com Dominique Thoen. Não se manda Dominique Thoen para o inferno. Peguei as coisas da sua cesta e paguei junto com as minhas. Entregaria para ela quando chegasse em casa. Não porque me importava. Sinceramente? Por mim ela morria virgem vestida com sua roupa íntima barata. Mas se não fosse gentil com ela, e Holt descobrisse, eu podia estar em apuros e… Um das coisas nas compras de Andy chamou a minha atenção. Era uma revista em quadrinhos vagabunda que, adivinhei pela capa, deveria mostrar um grupo de aventureiros espaciais. Senti um nó em algum lugar da minha garganta. “Você é melhor do que ela, Dommie. É melhor do que ela porque não precisa de nada disso.” Eu podia ouvir a voz do meu pai. Conseguia sentir sua mão segurando a minha quando andávamos pela loja de departamentos e observávamos todas as coisas que minha mãe queria e não podia ter. Todas as coisas pelas quais ela tinha nos abandonado.


Em algum momento da minha vida, eu fui como Andy. Uma garota que não sabia o que queria. Ou melhor, que sabia o que queria, mas que não sabia do que precisava para conseguir o que queria. Respirei fundo, paguei minhas compras, me despedi de Calvin e fui encontrar o resto do grupo. Andy estava encostada no carro enquanto Rick e Shelbi colocavam suas compras no porta-malas. De repente, me ocorreu que a boa vontade de Shelbi não ia ser capaz de contrariar as leis da física e que, todas as nossas coisas juntas, não caberiam lá. – Paguei suas coisas – disse para Andy, de qualquer jeito. Não quis que ela notasse que eu me importava porque eu não queria me importar. Era um caminho sem volta. – Vagabunda. – Andy! – Shelbi reclamou. – É isso que ela é. Vagabunda. – Olha, eu não sabia do seu namoradinho. Da próxima vez, me avise. – Que namoradinho? – Shelbi quis saber. – O garoto do… – Não é meu namoradinho. Você é uma vagabunda porque é uma vagabunda. Pare de falar sobre a minha vida! Pare agora! – Certo. Parei. – respondi, irritada. Toda a compaixão que eu tinha sentido ao ver a revista tinha acabado de desaparecer. – Shelbi, acho que nossas coisas não vão caber todas aí. – Por que você não volta andando, então? – Andrea, chega! – dessa vez foi Rick quem se irritou. – Pare de ser mal-educada. – Tudo bem, Dom. Eu vou colocar essas coisas aqui na frente. Ela tirou um engradado bem grande de cervejas e várias embalagens de coisas para se comer enquanto se bebe cerveja. – Festa? – perguntei, sorrindo. – Han? Ah! – olhou para as embalagens e compreendeu – Uns amigos do Eric vem esse fim de semana para assistir ao jogo. Se eu não tenho nada para servir ele fica irritado – ela começou a sorrir de um jeito estranho. Mas algo me incomodou um pouco mais. – Eric? – É – sorriu. – O meu marido. Você não o conhece ainda, ele… Ela estava falando. Estava dizendo palavras e provavelmente frases inteiras. Mas eu não estava ouvindo. Minha capacidade de compreensão parou na palavra “marido” e meus ouvidos desaprenderam a ouvir. Quais as chances de ter mais de um Eric na vizinhança? – O que… Com o que ele trabalha? – perguntei. Minha garganta estava completamente seca. – Ah. Com ações – sorriu. – Ele é daqueles homens superinteligentes que trabalham com oscilações de mercado e… Eu queria que meu coração parasse de bater. Qualquer coisa para parar de ouvir aquelas batidas altas dentro do meu corpo. Eu sou uma vadia infernal que não liga para os outros. Passo por cima do que for preciso para ganhar uma causa. Não tenho educação ou tato para falar com os outros. Tenho uma coleção de defeitos horríveis e indesculpáveis. Mas nunca na minha vida… Nunca… Tinha ficado com um homem casado. Sequer tinha ficado com um homem comprometido. Minha respiração estava curta e ofegante. Passei a mão pelos cabelos, vagamente consciente de que Andy me observava com olhos de falcão.


Puta merda. Casado. Eu estava tão preocupada com Holt. Em agredir Holt. Em me vingar de Holt. Em magoar Holt. Em causar ciúmes em Holt. Em não ficar para trás com Holt. Tão preocupada que sequer parei para pensar. “Você é uma das minhas, Dominique.” Ele tinha dito isso quando nos conhecemos. Quando estávamos nos agarrando no sofá. Ele acha que eu sou casada. “Você é uma das minhas, Dominique.” Ele achou que eu era casada, assim como ele. “Você é uma das minhas, Dominique.” Ele achou que eu traía meu cônjuge assim como ele fazia. Minha cabeça estava girando e eu achei que ia vomitar. – Dom, você não vai colocar suas coisas no carro? – Não, eu… Puta merda. Casado. CASADO. Eu tinha transado com um homem casado. Duas vezes. Tinha transado com um homem casado na sala da casa de seu novo vizinho. Tinha transado com ele na garagem da sua própria casa. – Não precisa… Eu… Lembrei do seu jeito assustado. De como fechou a porta naquela manhã. Shelbi estava em casa? Ele transou com a vizinha na sua garagem com a mulher em casa? Eu estava tão focada em fingir que estava com Holt. Será que ele estava usando aliança? Ele devia estar usando aliança. Eu não vi. Eu ia passar mal. – Acho melhor pegar um táxi. Shelbi, obrigada pela carona. Mas acho que tem coisas demais e… Meu olhar encontrou o carro. Não tinha notado antes. Senti meus olhos querendo lacrimejar. A mercedes vermelha. Eu ia chorar. Passar mal. Desmaiar. E depois repetir tudo de novo. Eu tinha transado com um homem casado em cima do carro da sua esposa.


Capítulo 6 “– Você nunca pensou em casar só por diversão? – Casamento, diversão? Diversão para os homens, você quer dizer.” Rhett e Scarlett – E o vento levou Fiz a viagem de táxi para casa no piloto automático. Casado… Acho que dei uma gorjeta exagerada ao taxista. Espero ter guardado todas as coisas frias na geladeira ou, no dia seguinte, metade das compras estaria estragada. O resto ficou no chão da cozinha nas sacolas. Casado… Abri a porta do quintal e joguei comida para o cachorro sem me incomodar com o medidor. Devo ter esquecido de fechar a porta, porque ele me seguiu para dentro da sala. O filho da puta é casado… Respirei fundo. Pensei em começar a guardar o resto das compras nos armários. Limpar mais alguma coisa antes de Holt chegar. Enfiei a mão em uma das sacolas e tirei o sutiã vagabundo de Andy. Holt ia chegar tarde, ele tinha me avisado que tinha um encontro hoje. Um encontro com uma mulher interessante. Uma que devia tratar as pessoas com educação e que não devia transar com homens casados. Olhei para o sutiã de arco-íris e me senti imunda. Andy era uma garota boba e jovem que se preocupava com reciclagem e que estava atraída pelo vizinho. Rick era um jovem que tinha incontinência e tentava esconder isso. Ele tinha seus próprios problemas, mas ainda me defendeu quando Andy foi agressiva demais. E Shelbi… Shelbi era um poço infinito de simpatia e altruísmo e eu tinha… E eu… Eu tinha… Na minha memória, eu conseguia ouvir a voz grave e tranquila do meu pai, fazendo o impossível para esconder a dor que sentia. “Vamos ser só você e eu agora, Dommie.” Eu tinha virado a vagabunda da minha mãe. A mulher que traía e destruía famílias. A mulher que não se importava com o compromisso de fidelidade firmado entre duas pessoas, e que se metia entre elas para sua própria conveniência. Levou outro homem para a cama do meu pai.


Levou um homem casado para a cama do meu pai. Seduziu. Conquistou. Destruiu. E depois juntou os cacos, pegou o que lhe agradava e jogou o resto fora. Fez o homem rico se divorciar da mulher e abandonar os filhos pequenos para se casar com ela. Deixou eu e meu pai para trás como se não fôssemos mais do que um incômodo constante em sua vida. Larguei o sutiã no chão e subi para o banheiro. Comecei a tirar as roupas no meio do corredor e deixei tudo caído perto da cama antes de me jogar debaixo do chuveiro. “Casamento são só umas palavras e umas alianças, Dominique”, ela tinha torcido o nariz para mim. “Fiquei com um homem que eu quis quando não queria mais seu pai. Só isso.” Tive vontade de espancá-la. Cortar sua cabeça fora e assistir o sangue peçonhento escorrer de suas veias podres. Ela era a pessoa mais horrível que eu já tive o desprazer de conhecer. E eu tinha me transformado nela. Exagerei no sabonete líquido e passei os próximos vinte minutos a esfregar metodicamente cada centímetro do meu corpo. Lembrava dos meus seios espremidos contra o capô do carro. Eu tinha pensado em Holt e tinha adorado. Esfreguei a esponja contra os meus peitos com tanta força que doeu, mas eu não me incomodei. Continuei a exorcizar minha pele com tanto empenho que tive certeza de ter esfolado meu corpo em pelo menos dois lugares. Não estava adiantando. Eu não estava me sentindo nem um pouco mais limpa. Podia escutar a risada maldita de satisfação que minha mãe daria se algum dia escutasse essa história. E não conseguia parar de pensar em Eric. Eric em baixo de mim. Eric por trás de mim. Seu hálito no meu pescoço. Na minha boca. Um homem casado. No sofá de Holt. No carro de Shelbi. Um homem casado. Meu nariz começou a entupir e, mesmo debaixo do forte jato de água quente, eu conseguia sentir as lágrimas salgadas descendo pelas minhas bochechas. Aquilo não ia adiantar. Desliguei o jato. Escutei um latido baixo e notei que tinha deixado as portas todas abertas. Abri a porta do box, me enrolei na toalha e andei até o quarto para procurar roupas limpas. E de repente, eu tinha usado todas as forças que me restavam. Apoiei a mão contra a quina da cama e deixei meu corpo escorregar para o chão. As lágrimas desistiram da discrição e começaram a cair torrencialmente. Meu corpo estava fraco, minha cabeça latejava e eu não conseguia parar de fungar. Tapei o rosto com as mãos e chorei. Eu odiava chorar, fazia minha cabeça doer e meu raciocínio falhar. Mas ali, molhada e precariamente enrolada com uma tolha no chão da casa de um cara que estava me chantageando, depois de ter feito uma das piores descobertas da minha vida, eu cedi e me permiti chorar.


Não tinha ninguém ali para me ver. Ninguém para me ouvir. Ninguém para me consolar. Nunca tive ninguém para me consolar. A poderosa Dominique Thoen que nunca precisou de ninguém. É fácil aprender a não precisar de ninguém quando você nunca teve alguém. Eu estava abraçada aos meus joelhos, soluçando contra minhas mãos. No que foi que eu me tornei? A ideia do que meu pai diria se me visse naquela situação, se visse o que eu tinha feito, no que eu tinha me tornado… Só a mera ideia fez com que eu chorasse duas vezes mais intensamente. Por quê? Por que eu precisei transar com aquele cara? Por que sentia essa necessidade de me vingar? De estar sempre certa, sempre por cima, sempre no controle? Do que tinha me servido? Uma vida inteira não me importando e… Parabéns, Dom: ninguém se importa com você também. E enquanto Holt faz amizades e Shelbi tem o apoio da vizinhança inteira, você fica chorando sozinha no banheiro porque o único cara que te quer é o safado casado, que só quer te comer e voltar para a mulher. Senti um sopro quente contra o meu rosto e levantei assustada. Por um milésimo de segundo achei que fosse Holt. Mas não era. Era o cachorro. Ele estava me encarando com aqueles imensos olhos castanhos e fez um gemido estranho como se estivesse com pena de mim Eu o empurrei com o braço. Não preciso de sua pena, criatura demoníaca. Preciso da sua distância. Ele pareceu não se importar com meu empurrão e logo estava de volta ao meu lado, coisa irritante. – Sai – reclamei. Mas ele se aproximou ainda mais, com o seu gemido sofrido, e passou a língua babona pelo meu rosto inteiro. – Ai! Que nojo! Sua coisa maldita… Ele me lambeu de novo e latiu. – Sai – reclamei, mas senti minha voz sair mais leve. Max começou a pular ao meu redor. Ele latia, tentava pular em cima de mim e continuava a me lamber sempre que tinha uma chance. Eu finalmente desisti de tentar afastá-lo e percebi que estava sorrindo. Ele ia e vinha tentando puxar minha toalha com os dentes em uma atitude brincalhona. – Para, seu tarado! – brinquei, sacudindo suas orelhas e ele se deitou ao meu lado, estirado de barriga para cima como se quisesse carinho. – Aprendeu com o seu dono, foi? – ele rosnou alegremente enquanto eu lhe fazia cócegas. – Minha vida é uma merda, Max – confessei. Ele se virou de volta e veio apoiar a cabeça no meu joelho. – Eu não queria ser uma pessoa ruim. Nunca foi minha intenção. Mas acho que… Acho que aconteceu, sabe? O par de olhos castanhos se levantou na minha direção como se ele realmente compreendesse. Ele era um animal irracional, era óbvio que não compreendia. Mas falar em voz alta estava ajudando. – Eu fiquei tão preocupada em criar uma casca que fosse grossa o suficiente para me proteger da parte ruim do mundo que acabei me distanciando da parte boa também. – As lágrimas tinham começado a secar salgadas no meu rosto, e eu quase conseguia respirar pelo nariz de novo. – E agora… Eu consigo me defender muito, muito bem. Mas precisei desenvolver uma boa dose de agressividade para aprender a fazer isso e, quando não há nada me ameaçando, eu uso essa agressividade acumulada contra pessoas que não tem nada a ver. Não sei como controlar. – Dei dois tapinhas no seu pelo macio. – Tenho medo de ser mais gentil e acabar desaprendendo a me defender.


E aí, o que acontece? Eu sou gentil com todo mundo, todo mundo para de me detestar. Mas eu ainda vou estar sozinha. O que acontece quando eu precisar? Quem vai me defender, a não ser eu mesma? Ele latiu e eu senti que era quase como se ele quisesse falar. – Eu queria ser uma pessoa boa, mas tenho medo do que possa acontecer – respirei fundo. – Mas não conte para o seu dono! – ralhei, olhando feio para ele. A campainha tocou e eu puxei a toalha para mais perto de mim. O olho mágico mostrou que era Andy. Merda. Tomara que eu não esteja com os olhos vermelhos. Abri uma faixa bem estreita da porta. – Ainda não terminei de arrumar tudo. Levo suas coisas para você quando acabar – cuspi, malhumorada. – Não, não vim por causa disso. – O que você quer? – Posso entrar? – ela olhou ao redor. – Não, não pode. Estou ocupada. O que você quer? – Max estava latindo e tentando me empurrar para ver quem estava na porta. Ou talvez ele estivesse me empurrando para Andy, em uma tentativa de me forçar a ser mais sociável. Calma, rapaz. Mesmo que eu estivesse disposta a tentar fazer isso, nunca seria assim tão rápido. – Tudo bem – ela expirou insatisfeita, dando mais uma rápida olhada ao redor – Vim te pedir desculpas. – falou de uma vez, como se tivesse medo de demorar e se arrepender. Ela queria entrar para pedir desculpas de uma forma mais privada? Pois que pedisse em público. – E por qual ofensa específica você está se desculpando? – provoquei. – Você não sabia. – Tinha algo no seu olhar que gelou meu coração. – Como é? – minha voz não tinha qualquer resquício de convicção. – Você não sabia que ele era casado. Eu queria dizer mais alguma coisa, mas só consegui engolir a seco e esperar. – Sua janela é bem grande – disse, levantando o indicador para a janela grande na lateral da sala. A janela que dava em parte para a rua e em parte para a casa dela. – Eu vi quando você e Eric… – ela arregalou olhos de um modo sugestivo e deixou que seu tom terminasse a frase por ela. – Mas você não sabia. Achei que sabia. Desculpe. Respirei fundo. Reassuma o controle, Dom. – Tudo bem. Está desculpada – dei um passo para trás e fechei a porta, mas sua mão impediu que ela se fechasse. – Qual é o seu problema? – Meu problema? – É! – reclamou. – Eu vim até aqui pedir desculpas e você age como se eu viesse te devolver dinheiro que te devia. – Ah, garota! O que é que você quer? – Quero que você pareça pelo menos incomodada de ter transado com um homem casado no sofá do seu marido – ela explicou com um misto de exaltação e sussurro. – Vagabunda! – acrescentou, ríspida. – Pare de me chamar assim – respondi, levantando o indicador, ameaçadora, em direção ao rosto dela. – E Holt não é meu marido. É só um… amigo. Vim ajudá-lo com a mudança. Ela parou por dois segundos, como se estivesse considerando as informações que tinha acabado de receber.


– Não sei se transar com um estranho no sofá do seu amigo é muito melhor. – Ah, que inferno! É o ano internacional de explicar para Dominique de quantos modos diferentes ela pode ser mal-educada? Olha garota, eu transei com o cara, certo? Eu não sabia que ele era casado. ACREDITE: não vai acontecer de novo. Você veio se desculpar, desculpas aceitas. O que mais você quer? – Você vai falar com a Shelbi? – Claro que não! Você perdeu o juízo? – O cara não presta! Ela merece saber. Algo em seu tom me deixou intrigada. – Ele já fez isso outras vezes? Trair a Shelbi? Ela não precisou responder. – Então, por que você já não foi falar com ela antes? – Porque eu nunca soube o que dizer! E o cara realmente não presta. Quero dizer, ele já deu até em cima de mim. E eu não sou exatamente… Bem… – ela me indicou com a mão. Ela queria dizer que não era bonita, mas não estava achando as palavras. – Eu não sou bem o tipo de mulher que os caras dão em cima – resolveu. – E se você nunca contou para ela, por que diabos acha que eu vou contar? – Achei que podíamos contar juntas. – Ah, ótima ideia! – bati palmas, irônica. – E depois vamos fazer uma festa do pijama na sua casa, assistir Grease e fazer nossas unhas. – Grease? – Foco, garota! Eu não vou falar nada e nem você. – Você pode não falar se quiser, mas não pode me impedir. Alguém começou a gritar no meio da rua e eu me lembrei que odiava aquele lugar. Holt ia descobrir e eu ia ter que esbofetear a garota moralista. – Se você falar, eu nego. E aí? – Ela vai acreditar em mim! – Então, por que você já não foi até lá? Os gritos aumentaram e eu quis cometer um homicídio. Max ficava latindo atrás de mim e eu não entendia o que os infernais vizinhos poderiam estar discutindo a três casas de distância. Quero dizer: eu estava discutindo traições e confissões com minha arqui-inimiga e nós estávamos conseguindo manter nossas vozes baixas. Educação, por favor, vizinhos. Resolvam seus problemas em voz baixa. – Tá, tá. – ela balançou as mãos. – Eu não vou até lá. Não tenho coragem. Mas você é toda segura, imaginei que você poderia… Entre Max latindo e os vizinhos gritando, eu não conseguia ouvir o que Andy estava dizendo. Merda, eu não conseguia ouvir os meus pensamentos. Uma voz feminina berrava que estaria morta antes de ver uma criança ser criada por um casal de pecadores bem na sua frente. – Toda segura? Garota, eu te garanto que tenho milhares de problemas para resolver. Problemas meus, que não envolvem vizinhos e seus problemas conjugais. As vozes continuavam a chegar altas e claras: um homem a chamava de hipócrita preconceituosa e a mulher estava clamando por uma intervenção de Deus. – Mas você pode ajudar… – Eu ia era trazer problemas para mim. Nunca faria isso conscientemente… – Então, você precisa parar de pensar e simplesmente tentar ajudá-la. – Você é muito nova para entender, mas adultos não se metem em problemas de outros adultos sem


serem convidados. – Eu sou adulta, obrigada. – Você é uma pirralha inconsequente… – Não sou! – E eu tenho um sutiã de arco-íris para provar. – Você é a pior pessoa que eu conheço. A mulher, a distância, estava usando toda variante vulgar da palavra “homossexual” para descrever o casal de vizinhos, e a raiva que estava subindo pelo meu corpo pelas últimas duas horas simplesmente explodiu. – Pior pessoa que você conhece? Pois o mundo ainda vai te assustar um bocado – afirmei, passando por ela com raiva e me dirigindo até o centro da discussão a algumas casas de distância. – Ei! – gritei, batendo palmas. – Seja lá qual for o problema aqui, será que dá para vocês resolverem como seres humanos civilizados? Estão incomodando a vizinhança inteira com o seu barulho. De um lado, um homem alto, com o cabelo bem penteado com gel e que usava um paletó cinza sobre uma camisa de linho, segurava um homem vestido com roupas esportivas confortáveis. Provavelmente para evitar que ele avançasse para cima da mulher de calça comprida e terninho comportado, com um precioso colar de pérolas, do outro lado da rua. – Se a palavra de Deus te incomoda, você deve ficar bem com esses daí – disse a mulher, indicando o casal gay. – As palavras que estavam me incomodando eram os gritos da senhora – expliquei rude. – Essa vizinhança fica cada vez pior – exclamou ofendida, com as mãos na cintura. – Como se esses daí querendo ensinar sodomia para uma criança inocente já não fossem ruins o suficiente, agora temos uma prostituta também. Eu fiquei na dúvida se a prostituta seria eu. Mas, pelo bem da integridade física da velha das pérolas, achei melhor nem perguntar. – Vagabunda! – o grito me pegou de surpresa e, considerando as últimas horas, achei que o xingamento estava sendo dirigido a mim. Mas, olhando ao redor, vi o homem de roupas esportivas cuspindo a palavra na direção da velha. Aleluia! Mais alguém além de mim está sendo chamada de vagabunda. Ela fez o sinal da cruz e, entre o “vagabunda” e o “prostituta”, percebi que o clima era de gritaria e falta de respeito. Se era assim, era melhor eu entrar na onda. – Minha senhora, eu não te conheço, está bem? E garanto que a senhora também não me conhece. Então… – Ah, eu conheço o seu tipo, muito bem. É o tipo que está infestando essa vizinhança. Infestando? Agora, eu sou uma doença. Oito anos em salas de audiência defendendo causas milionárias, e eu nunca tinha recebido metade das ofensas que tinha ouvido nos últimos dias na casa de Holt. Isso é o que ele chama de “lugar tranquilo para morar”? – Se nós queremos adotar uma criança, é problema nosso, sua bruxa! – gritou o homem. – É! Sua bruxa! – repeti. Eu queria começar a ofendê-la, e logo. Mas não sabia quais ofensas eram apropriadas, então resolvi seguir a liderança de alguém. Pela expressão corporal agressiva do cara de roupas esportivas, imaginei que, dos presentes, ele era quem tinha o perfil mais similar ao meu. – É da minha conta o que eu tenho que tolerar na minha vizinhança. Ouvi um latido familiar e notei que Max estava ao meu lado. Puta merda, eu precisava começar a fechar as portas.


Baixei a mão para a coleira e o mantive próximo. A última coisa que eu precisava era que o cachorro de Holt fugisse ou fosse atropelado. – Se está incomodada que se mude! – exclamei. – Eu cheguei aqui primeiro! – Na Terra? Pela sua idade, minha senhora, nenhum de nós está discutindo isso. O casal gay foi o primeiro a rir e alguns espectadores próximos o acompanharam. Alguns moleques que estavam jogando bola na rua pararam e começaram a prestar atenção na discussão. – Eu não perguntei sua opinião, sua vadiazinha. – Mas eu vim aqui dar ela mesmo assim. Estava conseguindo ouvir a sua lá da minha casa. Então, imaginei que fosse justo vir aqui gritar com a senhora também. – Não fui eu quem começou a gritar – indicou o casal com um dedo. – A hora deles vai chegar, também – afirmei. – Ou vocês se calam todos ou eu chamo a polícia. – Pois chame! Ela pareceu animada demais e o casal, animado de menos. Droga, uma ligação para a polícia ia direto para o relatório de adoção da assistente-social e eles nunca conseguiriam uma criança. – Por que a senhora quer tanto prejudicá-los? – perguntei indignada. – Eu não estou vendo casal em lugar nenhum. – Ignorem. Por favor, ignorem ela – o homem de paletó disse, querendo que aquilo acabasse. Eu conseguia ver o nervosismo em seus olhos. Ele não estava acostumado a comprar uma briga. Felizmente, eu estava. – E eu não preciso ver esse tipo de coisa – a mulher acrescentou. – E quem foi que disse que a senhora precisa ver? Eles estão dando a bunda no sofá da sua casa? O clima foi de comoção, risadas ou ultraje. Eu não soube dizer e, sinceramente, não liguei. Estava no meu limite e se alguém não gostasse do que eu tinha dito que me processasse. Sem problema algum. Ela colocou a mão no peito e fez o sinal da cruz. – É por isso que o Inferno existe. Para gente como você. – Minha senhora, se o Paraíso é para pessoas como você, eu prefiro o Inferno pela companhia. Obrigada. – Você precisa voltar para o puteiro de onde saiu! – E a senhora precisa voltar para o século XIV. Sabe? Quando a senhora seria queimada na fogueira por usar essas calças? Ela se virou com fogo nos olhos, puxando pelo braço um jovem que chamou minha atenção enquanto voltava para dentro de casa. Era Calvin. Ele tinha um sorriso brincalhão no rosto, e me ofereceu um adeus rápido quando sua mãe não estava olhando. – Olha, obrigado. Você não precisava… Eu levantei a mão para que ele se calasse. – Não estou te defendendo! – deixei claro. – Só quero que o barulho pare – levantei o indicador. Ele sorriu e concordou com um gesto. Puxei Max pela coleira para trazê-lo de volta para casa. Andy estava me olhando com as mãos na cintura e um sorriso nos lábios. Acho que ela estava satisfeita por eu ter tomado as dores de alguém. Pobre Andy: eu não estava tomando as dores de ninguém. Só queria que a gritaria parasse. Mas os pensamentos sobre Andy rapidamente fugiram de minha mente.


Poucos metros atrás dela, Gregory estava parado no meio da rua. Ainda segurando sua pasta de processos. Ele tinha a boca aberta e o olhar fixo em mim. Sua expressão era um misto de impressionado e admirado que fez com que eu tivesse muito orgulho de mim mesma. Andei até a frente da casa e anunciei alto o suficiente para que Andy ouvisse também. – Não estou defendendo ninguém! – exclamei. – Só não aguento mais essa gente mal-educada reclamando. – Caramba… Acho que no fundo você é uma boa pessoa, Dom – Andy afirmou antes de sair. Ela pareceu quase chateada, como se quisesse que eu fosse, na verdade, realmente uma pessoa ruim que ela pudesse odiar. Holt tinha um sorriso no rosto que ia de uma orelha a outra. – O encontro foi bom? – perguntei, diante do seu olhar de satisfação. – Não – ele pareceu ter sido arrancado da sua linha de pensamento. – Desmarquei. Podemos entrar? – Desmarcou? – perguntei, segurando a coleira de Max firme. Ele se aproximou de mim, abaixouse para alisar o cachorro e quando se levantou de volta estava tão próximo que eu conseguia sentir seu perfume. – Não achei legal te deixar aqui sozinha. Vamos? – indicou a porta de casa. – Eu não ligo. Pode sair com quem você quiser. – Dentro de mim, meu estômago estava fazendo uma espécie de dancinha da vitória. Cara… eu realmente estava atraída por Holt. Merda. – Eu me mantenho ocupada. – Percebi – riu. – Vamos continuar a conversar lá dentro e… – Senhora Holt? – um dos moleques que estava jogando bola se aproximou. Greg deu um passo protetor na minha direção e segurou minha cintura. Não entendi. – É senhorita Thoen, moleque. Não sou casada com esse daqui – expliquei. – Senhorita Thoen – ele estava sorrindo –, a nossa bola caiu no telhado da sua casa, podemos… – … ficar sem jogar bola até amanhã para aprender a ter cuidado perto da casa dos outros? – rosnei. – Pode. Holt ficou em silêncio, o que eu achei bastante peculiar. Não era do feitio dele me deixar ser grossa sem nenhuma intervenção. – Podemos entrar agora? – ele se virou para mim quando o moleque se afastou. – Que fixação é essa com entrar em casa? Você não manda em mim, Holt. Se eu quiser ficar na rua, eu fico na… – Um pensamento me arrebatou da minha argumentação. Merda. Merda, merda, merda. Eu ainda estava de toalha, não estava?

– Ouvi a gritaria e acho que saí sem pensar. Não fique vermelha, Dom. Não fique vermelha. Por favor, não fique vermelha. – É. Parece que você tem feito muitas coisas sem pensar ultimamente – riu, colocando as coisas em cima da mesa. – Isso foi algum tipo de indireta, Holt? – Passei as mãos pelo corpo me certificando de que a toalha ainda estava devidamente presa.


– Não, Dominique. Na verdade foi uma direta em relação ao vídeo que eu tenho graças a sua masturbação ao ar livre. Eu odiava o jeito como ele falava sobre aquilo tão casualmente. Mas, ao mesmo tempo, algo nas minhas entranhas sempre se aquecia quando eu o imaginava me imaginando nua. – Não foi intencional – expliquei comedida. – Eu ter saído de toalha na rua, quero dizer. Não estava tentando te humilhar ou causar nenhum constrangimento com os vizinhos ou… – Eu sei. Tudo bem – ele se aproximou mais uma vez. – Mas sabe? Se você continuar fazendo isso – ele colocou as mãos na minha cintura –, logo, logo mais alguém também vai ter um vídeo seu e aí o meu vai perder o valor. Vamos evitar que isso aconteça, sim? – ele riu e eu não consegui não sorrir. – Você está tentando ser fofo ao me chantagear? – Tentei disfarçar meu sorriso em descrença. – Não estou tentando. Ele ainda estava muito perto. Havia algo em sua voz e em seu olhar que eu não conseguia definir muito bem. Não era como se ele quisesse me seduzir. Na verdade era como se… Bem, se fosse qualquer outro homem, eu leria aquela expressão corporal como se ele não quisesse se afastar. Como se quisesse ficar ali, me observando, com as mãos na minha cintura, pelo máximo de tempo que pudesse até que tudo começasse a ficar estranho. Mas era Holt. E eu nunca consegui ler Holt muito bem. Sacudi as ideias loucas para longe. – E Max ainda está vivo! – ele exclamou me soltando. Acho que o momento começou a ficar estranho – Ponto para você. – Você vai apagar meu vídeo agora? – perguntei, puxando o cachorro demoníaco e coçando suas orelhas. Parte de mim queria voltar a falar de sexo com Holt. Era uma parte bem grande de mim, e ela ganhou sem qualquer contestação. – Ainda não. Mas está fazendo um bom trabalho – ele disse olhando para mim, e seu sorriso se transformou em uma expressão estranha e assustada. Um puxão na minha toalha e eu compreendi. Max estava brincando com as pontas soltas mais uma vez e eu, ainda precariamente embrulhada, tive que começar a brincar de cabo de guerra contra o labrador. Greg correu em minha direção e colocou os braços ao redor da toalha. Eu ainda estava vencendo, o que significava que eu ainda estava vestida. Mas um puxão mais forte da parte de Max e Holt estaria abraçando meu corpo nu. Aparentemente, ter duas pessoas puxando a outra ponta da toalha convenceu Max de que aquela era uma brincadeira muito divertida da qual todos queriam participar. E não importa o quanto Holt o mandasse parar, a besta continuava empenhada em puxar o tecido. Eu segurei a parte da toalha ao meu alcance com todas as minhas forças. E entre isso e sentir Holt ao meu redor, minha cabeça não conseguia fazer mais nada. Seus braços e seu peitoral estavam em todos os lugares. – Droga, Max! Pare! Ele estava de frente para mim, com os braços ao redor do meu corpo, puxando a barra da toalha da boca de Max. Seus dedos tocavam minha coxa nua e uma parte de mim queria que Max arrancasse aquela toalha de uma vez para eu descobrir o que aconteceria. Mas essa parte foi bem menor dessa vez, perdendo louvavelmente. Gregory puxou a mandíbula de Max e o forçou a largar a toalha. O cachorro, finalmente, pareceu entender que a brincadeira tinha acabado e foi procurar um lugar para se deitar. Holt ainda tinha os braços ao meu redor. Ele estava olhando para minha boca como se estivesse lutando contra um


pensamento. Aquela era uma emoção com a qual eu conseguia me identificar. Afinal, estava fazendo a mesma coisa. Coloquei minhas mãos contra seus ombros e senti seu abraço ficar mais firme. Ah, por que ele tinha que ter um cheiro tão bom? Senti um inconfundível volume contra o meu quadril. Não tinha por que me ofender. Mas também não podia considerar aquilo nenhum tipo de elogio. Ele estava excitado: óbvio. Abraçado com uma mulher nua e ainda úmida do banho. Se ele não tivesse ficado excitado é que seria estranho. Ele se afastou educadamente, tentando disfarçar. Fingi que não tinha percebido nada. – Acho melhor eu ir tomar um banho – disse. – E você devia… – É. Eu vou…

Quase toda mulher no meu lugar faria o que eu fiz: coloquei o vestido mais sensual que tinha. Nada exageradamente elegante ou vulgar, é claro. Mas daqueles soltos, decotados e curtos que valorizam os seios e mostram a quantidade certa de coxa. Olhei pela janela e vi que os moleques ainda estavam na rua, brincando de alguma outra coisa. Eu podia pegar a bola deles e fazer a última gentileza do dia. Seria algo para conversar com Holt no jantar. Algo para ele me elogiar. Eu estava mesmo me transformando em um rato de laboratório, querendo repetir comportamentos que geravam benefícios. Mas que se dane. – Onde ela está? – perguntei para os meninos na rua. – Chutamos a bola ali – o meninos indicou o ponto aproximado, ainda receoso. Acho que eu o tinha assustado. Bom, eu gostava de assustar as pessoas. – Certo. Vou pegar para vocês. – Apoiei a escada contra a lateral da casa em um ponto onde o telhado era mais baixo. Nada a não ser telhas. – Vocês têm certeza de que foi aqui? – gritei para a rua. – Temos. Foi um chute forte, talvez… Mas eu a encontrei. Estava só um pouco mais adiante, na curva onde o telhado de Holt se dobrava sobre si mesmo. Andei entre as telhas com uma cuidadosa destreza e lancei a bola de volta para a rua. Acenei para os gritos de obrigado e estava me preparando para fazer o caminho de volta quando um movimento em uma das janelas do primeiro andar chamou a minha atenção. O banheiro de Holt tinha uma janela comprida seguindo a linha do teto, e eu conseguia vê-lo lá dentro. Ele estava de pé contra a parede do banheiro de frente para mim. Tinha o rosto no teto e os olhos fechados. Com uma das mãos ele estava se apoiando no mármore da pia e com a outra… Mesmo a distância e através do vidro da janela, ainda dava para ver aquele corpo delicioso. Minha nossa. Cada músculo do seu braço era perfeito. Seu tórax e seu abdômen eram ainda mais definidos que os da foto que eu tinha visto. Eu senti uma vontade louca de lamber cada centímetro dele. Sentir o gosto de sua boca, de sua pele. Ele estava inclinado sobre o próprio corpo de um jeito típico, e o movimento rítmico da sua mão direita e do seu quadril deixou bem claro o que ele estava fazendo. Em qualquer outro dia, eu simplesmente assistiria àquele homem maravilhoso massageando o


próprio pau e me deliciaria com a visão e com a ideia proibida de observá-lo. Mas hoje, depois do nosso pequeno encontro cabo de guerra com a toalha, eu não tive como não imaginar que era em mim que ele estava pensando. Talvez fosse completa ilusão e loucura. Talvez ele estivesse pensando em seja lá qual fosse a piranha que ele ia se encontrar hoje. Podia ser. Mas podia não ser. Podia ser em mim que ele estava pensando. Não podia? Me abaixei contra o telhado e me aproximei da beirada, exatamente onde a casa fazia a curva, para melhorar o meu ângulo de visão. Ele tinha o lábio inferior entre os dentes, e eu podia imaginar o gemido excitante de prazer que ele deveria estar emitindo naquele exato segundo. Ah, como eu queria que aquele gemido estivesse sendo contra o meu ouvido. Eu não me incomodaria de passar os dedos por cada linha de músculo naquela barriga perfeita e estimular sua ereção por ele. Não conseguia ver a linha abaixo da sua cintura muito bem, mas, pelo pouco que eu via e pelo movimento longo do seu braço, eu conseguia deduzir o tamanho. Por Deus, Holt. Será que você podia, por favor, ter algum defeito? Seu braço se movia cada vez mais rápido e uma dor me avisou que eu estava mordendo meu lábio com força demais. Seu estômago estava contraído e eu conseguia ver os primeiros indícios de recuo no seu corpo. Queria vê-lo gozar. Me aproximei um pouco mais da borda. Eu queria ouvi-lo gozar. Mas aquilo era pedir demais. Ia ter que me contentar só com a vista. Ele seguiu com seu movimento maravilhoso. No que você está pensando, Greg? Está pensando nas suas mãos no meu corpo? Na toalha quase caindo? No abraço apertado? Nas mãos na cintura? Na toalha caindo? Em você ao meu redor? O mesmo corpo nu que você viu a distância, agora de perto? Um toque ínfimo e proibido? Um desejo latente e incontrolável? Um único beijo e tudo acabaria. Você tentaria me levar pra cama, mas eu já estaria nua e iria te despir antes de chegarmos às escadas. É nisso em que você está pensando? Em meter esse pau em mim nas escadas? Com as cortinas abertas e que, se os vizinhos assistirem, o problema é deles? Você ia gemer no meu ouvido e ia gozar dentro de mim e eu te acompanharia. É nisso que você está pensando? Tomara que seja. Ah, por favor, que seja. Ele parou, estava recuperando o fôlego. Concentrada em pensamentos eu tinha perdido o momento do ápice, mas ainda assim tinha sido uma experiência maravilhosa. Greg abriu os olhos e esticou um braço para pegar uma toalha. Seu olhar seguiu através da janela e se cruzou com o meu. Ah, não! De novo, não. Chega de me pegar em situações constrangedoras, Holt. Nossos olhares se cruzaram durante um segundo inteiro, e acho que o vi sorrir quando me virei para descer a escada. Ótimo. Perfeito. Excelente.


Como eu consigo me meter nessas situações de merda? Virei de costas e comecei a descer os degraus. Pela janela da sala, vi Holt descendo, os olhos ávidos me procurando do lado de fora. Ele estava usando apenas calças de moletom. O abdômen exposto exibindo aquele lindo caminho da felicidade. Meu coração latejou no fundo do peito e meu pé encontrou apenas o vazio onde deveria haver um degrau. Acho que ouvi Holt gritando meu nome enquanto eu caía.


Capítulo 7 “Se eu dissesse que estou loucamente apaixonada por você, você saberia que eu estou mentindo.” Scarlett – E o vento levou Não cheguei a bater a cabeça. Mas meu tornozelo não tinha ficado a salvo; o braço sobre qual eu tinha caído também já tinha visto dias melhores. Holt demorou menos de dois minutos para chegar até o quintal dos fundos. Com calças de moletom cinza e o peito nu eu o vi pular os degraus que separavam o pórtico do gramado. Max chegou primeiro e, por incrível que pareça, não pulou em cima de mim, nem tentou me lamber. Era estranho, mas ele parecia saber que eu estava machucada e que não seria apropriado se jogar em cima de mim. Valeu, Max. – Dom! Dominique! Ai, meu Deus. Você está bem? Ele estava ofegante quando se ajoelhou ao meu lado e me tocou com cuidado, indeciso se deveria ou não tentar me levantar. – Você machucou a cabeça? Ou o pescoço? Mas eu estava bem. A queda tinha sido alta, mas não tão alta. – Estou bem – tentei me levantar, mas Greg queria que eu ficasse quieta. – Acho que você não devia se mover. – Ele tinha a mão sobre o meu estômago, me mantendo deitada. Meu vestido tinha subido um bocado e eu tinha certeza de que minha calcinha devia estar quase à mostra. Mas Holt já tinha me visto nua me masturbando, quase perdendo a toalha para um cachorro e em cima de um telhado assistindo ele se acariciar. Olhando em retrospectiva, deixar minha calcinha a mostra para Gregory era quase irrelevante. – Estou bem, é sério. Tirei sua mão da minha barriga e me levantei. Eu ia dizer que tinha uma resistência bem alta para dor e que só precisava de um analgésico, mas levantar exigiu mais forças do que eu tinha imaginado que ia precisar e, de repente, meu tornozelo e meu pulso estavam latejando horrendamente com uma dor insuportável e eu gemi involuntariamente. – Você não está bem. Precisa ir pro hospital. O fato de eu ter conseguido me sentar convenceu Holt de que minha cabeça, pescoço e coluna vertebral estavam bem, e ele enfiou os braços por baixo das minhas costas e coxas e me levantou no ar. – Eu acho que consigo andar – reclamei chorosa. – Não gosto que me carreguem. Coloque-me no chão. – Cala a boca, Dom. Ele tinha um tom evidente de preocupação em sua voz, e meu corpo foi preenchido por uma sensação quente e agradável. Havia alguém cuidando de mim para variar. Era interessante. Ele me colocou no banco da frente do carro e correu de volta para dentro de casa para buscar um


casaco e prender o cachorro. Só então percebi que poderia ter aproveitado para espalhar meus dedos pelos seus músculos, sentir o calor da sua pele e experimentar mais toda a arte de toques proibidos que a situação permitia. Mas eu estava com muita dor e meu cérebro priorizou as coisas erradas. Ele acelerou pela rua e os moleques abriram passagem para o carro antes de voltar a jogar bola. Segurei meu pulso e percebi que a possibilidade de ele estar quebrado era considerável. – O que está sentindo? – Gregory repetia a cada quatro segundos. – Pode ser que eu tenha quebrado o braço. Mas estou bem, é sério. Já quebrei o braço antes. Não é nada demais. – Tem certeza? Eu não sei bem como funciona essa coisa de se machucar e ter alguém para cuidar de você, mas estava começando a parecer que dava mais trabalho do que se machucar sozinha. Eu tinha que respirar fundo, controlando a dor e ao mesmo tempo dar um discurso de incentivo atrás do outro para um Gregory que parecia mais assustado do que eu. Se eu estivesse sozinha ia poder gritar de raiva até chegar ao hospital. – Tenho. Tenho certeza. – Estamos quase chegando. – Calma! Não precisa nos matar em um acidente de trânsito só porque eu me machuquei. – Só porque você se machucou. Você está falando como se tivesse se espetado com uma agulha. Dominique, você caiu de uma escada. – Estou perfeitamente ciente disso, Holt. Mas estou bem. – Você tem certeza? A dor era grande, mas eu comecei a rir. – Tenho. Pela centésima vez. – Está rindo? – Ele pareceu chocado. – Você não está sentindo dor? Está rindo do quê? – Estou rindo de você. – Desculpe se estou preocupado com você – disse. Seu tom era sarcástico e parecia ofendido, mas um pouco mais tranquilo. – Está desculpado – ri de novo, e dessa vez ele me acompanhou. – Não sei por que me preocupo. Você é o indivíduo mais duro na queda que eu conheço. – Obrigada, querido. Ele se acalmou, e eu tive tempo para me concentrar na minha dor, o que acabou sendo uma coisa ruim. Eu devo ter gemido, porque Holt voltou a me perguntar se eu estava bem. Dizer que ele “estacionou o carro” seria gentileza. Ele largou seu Porsche Boxster em uma vaga de qualquer jeito e pulou para fora do carro. Abriu minha porta e já ia enfiar os braços por baixo do meu corpo para me levantar mais uma vez quando eu o impedi com meu braço bom. – Eu vou andando. – Você machucou o pé. – Pela última vez, Gregory, eu estou bem. Foi só uma queda sem jeito. – Coloquei as pernas para fora do carro e me pus de pé. A dor foi tão grande que meu mundo inteiro girou. Ainda bem que meu orgulho é irascível, ou eu teria desmaiado ali mesmo. – Você é teimosa ao cubo, mulher. Deixe pelo menos eu trazer uma cadeira de rodas. – Bobagem – sussurrei para que ele não ouvisse a dor em minha voz. – Estou perfeitamente bem. Coloquei um pé atrás do outro como se fosse um bebê que acabou de aprender a andar e ainda não está completamente seguro de que sabe fazer aquilo sem cair.


– Dominique, pare de ser tão teimosa, por favor – Holt resmungou atrás de mim enquanto eu continuava com meus passos tímidos e audaciosos em direção à porta de entrada do hospital. – Você vai acabar prejudicando seu pé ainda mais. Resistir à dor exigia toda a minha força, e os discursos irritantes de Holt começaram a pinicar minha alma. Eu queria que ele calasse a boca. Passamos pelo gramado e chegamos ao asfalto da entrada de ambulâncias. Ele tentava me apoiar pelo braço e me ajudar a caminhar, mas agora que eu já tinha me comprometido a agir como se estivesse bem, iria até o fim. Recusei sua ajuda e o senti suspirar atrás de mim. – Pare de agir como uma criança! Deixe, pelo menos, que eu peça ajuda para você. – Ah, cale-se, Holt! – minha voz saiu mais doída que indignada, e eu me odiei por isso. – Já estou quase lá. Já teria chegado se você não ficasse me interrompendo o tempo inteiro pra dizer que eu preciso… Senti seu braço nas minhas pernas e ele me levantou contra minha vontade. Acho que deve ter, finalmente, percebido que é mais fácil simplesmente fazer algo do que tentar argumentar contra mim. Não há vitória em uma discussão comigo. Cruzei a porta de entrada do hospital gritando e mandando que ele me largasse. Acho que o escândalo pode ter sido um pouco desnecessário, porque dois policiais se aproximaram imediatamente. Eu ainda estava me debatendo contra Holt quando me colocaram em uma cadeira de rodas. – O que houve aqui? – Nada. Ela se machucou – Greg explicou, segurando a cadeira de rodas para me empurrar. – O senhor poderia, por favor, se afastar da senhorita? – Com licença? – Holt soou indignado. – Poderia, por favor, se afastar? – o policial respondeu. Seu parceiro se aproximou de mim. – A senhorita está bem? O que houve? – Eu caí – expliquei. Entre o susto de ser carregada contra a minha vontade, o orgulho ferido e a aproximação súbita dos policiais, minha convicção falhou momentaneamente e o policial Danver – era isso que dizia sua placa de identificação – deve ter ouvido isso no meu tom. – Esse senhor machucou a senhorita ou tocou em você contra sua vontade? Bem… aquela era uma pergunta sem uma resposta satisfatória. – Dominique… – Holt parecia ofendido, surpreso e incrédulo. – Não – afirmei categoricamente. Minha convicção começando a retornar. – Você está louco? Uma enfermeira se aproximou e começou a me perguntar o que tinha acontecido. – Eu caí – expliquei mais uma vez. – Acho que machuquei meu pulso e meu tornozelo. Ela queria as informações do meu plano de saúde, disse que o médico já iria me atender e olhou ao redor perguntando por acompanhantes. – Estou com ela – Holt disse. Mas o policial ainda não estava deixando que ele se aproximasse de mim. Ele olhou para o homem fardado com fúria nos olhos. Eu queria avisá-lo de que era melhor ele deixar Holt passar de uma vez. Não é saudável irritar um advogado desse jeito, colega. Confie em mim. Principalmente um que tenha uma taxa de vitórias de 93%. – Ele está comigo. – A enfermeira desviou o olhar de mim para Holt. – O senhor é da família? Ele manteve a boca aberta por uma fração de segundo enquanto pensava no que responder. – Não – disse finalmente. – Sou um colega de trabalho. Estava só trazendo ela até aqui – virou-se


para o policial. – Então, não pode entrar, ainda. – Ela me rolou para longe de Holt e eu fiquei sem ação. – Preferia que ele pudesse me acompanhar. – Olhei para ela. – Ele achou que meu pé estava pior do que de fato está, me carregou de surpresa e eu me assustei. Por isso estava gritando. – Vamos deixar que os policiais resolvam isso, sim? Agora, temos que cuidar de você. Tentei me esticar para ver Holt atrás dela, mas já estávamos longe e eu não conseguia mais ver o hall de entrada. Eu não devia me preocupar com ele. Gregory é um rapaz bem crescido, ele consegue se virar sozinho. E como ele, obviamente, não tinha me machucado, a única pessoa digna de pena era o policial e seu parceiro, caso resolvessem insistir naquilo. Holt os arrastaria em uma ação de danos morais e arrancaria até seus órgãos como pagamento. Mas ainda assim… Eu estava preocupada. Não me agradava ter causado um inconveniente daqueles para ele. Principalmente quando Greg só estava tentando me ajudar. Ótimo. Eu não estava só atraída por ele. Estava começando a me importar também. Maravilha.

A enfermeira estava me tirando da sala de raio X e me explicando que os policiais iam querer falar comigo assim que o dr. Henris acabasse de me examinar. Eu disse que tudo bem e percebei que estava mais ansiosa para resolver o problema de Holt do que o meu. Isso era, no mínimo, estranho. O corredor era limpo, branco e elegante, com grandes vasos ornamentais a cada esquina. Viramos à direita e meu olhar seguiu para além de uma das portas de vidro. – Ah, só um momento! – pedi para a enfermeira. O cômodo era longo e bem iluminado. Tinha bonitos quadros nas paredes e vasos de flores aqui e ali. Duas longas mesas de madeira no centro do ambiente serviam de apoio para revistas, livros e copos. Ao redor das mesas havia diversas poltronas cinza de aparência confortável. Rick estava sentado em uma cadeira simples de frente para um senhor de idade bem avançada. O senhor estava sentado em uma das poltronas, seu braço estirado tinha tubos entrando e saindo. Olhei para o adesivo fosco na porta de vidro, que dizia “Unidade de Quimioterapia”. – Poderia só falar com um amigo? – pedi educadamente. Ela me olhou como se eu tivesse pedido para grudar um chiclete no seu cabelo. Olhou para o relógio como quem diz “Minha senhora, você está, provavelmente, com dois membros quebrados. Não é hora de falar com amigos”. – Vai ser só um segundo. – Dessa vez meu tom foi mais rígido. Foi o tom Thoen que diz “Meu bem, não estou pedindo. Estou só avisando”. – Rick? – chamei. – Tudo bem? – Olá, Dominique – ele acenou sem se levantar, e a preocupação ficou evidente em seus olhos. – Você está bem? – Estou – sorri, abanando a mão boa. – Só levei uma queda e acho que torci o tornozelo. – Ah. – Ele não fez mais nenhuma pergunta e eu tive certeza de que ele era o tipo de pessoa de que eu gostava. O tipo que não se mete a não ser quando é convidado. Entre descobrir que Eric era casado, a discussão moral com Andy, tentar resolver o problema da vizinhança e ver Holt se masturbando, eu sentia como se semanas tivessem se passado. Ou pelo


menos alguns dias em vez das poucas horas entre termos ido todos juntos fazer compras e aquele momento. – Dominique, este é o sr. Thierry. Thierry, Dominique é nova na vizinhança. Acabou de se mudar para a antiga casa dos Parker. – Ah, olá. Como vai? Ele levantou uma mão tímida e trêmula na minha direção. Sua pele era enrugada e envelhecida. Seus olhos eram escuros e opacos, a não ser por um único ponto que tremeluzia como se alguém tivesse molhado aquele ponto: cirurgia de catarata, certamente. Ele não tinha um único fio de cabelo na cabeça, e eu imaginei que ele já devia estar lutando contra o câncer há um bom tempo. Eu apenas sorri como resposta. Não queria ter que perguntar “E o senhor?”. Ele estava fazendo um tratamento de quimioterapia, era óbvio que não estava bem. – O senhor também mora na vizinhança? – perguntei, e a enfermeira chamou minha atenção. – Sim, sim. – Tinha algo no seu jeito que eu achava familiar. Talvez fosse o jeito de se sentar ou o modo como apertou minha mão. Não soube confirmar. – Vocês são… – Parentes? – Rick sorriu. – Não. Muita gente pergunta isso. Acho que nos parecemos, Thierry – brincou, apertando os joelhos do velho. Thierry olhou para mim com uma certeza nos olhos. Ele não era o tipo de homem que se engana com facilidade. Sabia exatamente por que as pessoas achavam que eles eram parentes: não é qualquer pessoa que acompanha um desconhecido para um tratamento como esse. – Acho que é o cabelo – brinquei. A enfermeira prendeu a respiração atrás de mim, mas, ao contrário dela, tanto Rick quanto Thierry tinham senso de humor. O velho riu tanto que começou a tossir. Era agradável ver uma pessoa tão debilitada rindo com gosto. – Gostei de você, jovem – disse quando recuperou o ar. – As pessoas geralmente me tratam como se eu fosse quebrar. – Odeio quando fazem isso comigo – respondi, mas, na verdade, não conseguia me lembrar da última vez que alguém tinha me tratado com tanto zelo. Fora Holt, depois da minha queda, obviamente. – Senhorita Thoen, precisamos… – Está bem, está bem. Acho que preciso ir. Nos vemos depois, então. – Sim! Venha comer uns biscoitos um dia. Rick lhe mostra onde moro? – completou olhando para o rapaz. – Claro. Os biscoitos dele são muito bons – sorriu para mim. A enfermeira me levou embora e eu me peguei lembrando das fraldas geriátricas. Ele não tinha mentido. Eram para um amigo. Existiam pessoas boas no mundo. Pessoas que simplesmente faziam algo por outras. Esse era um conceito que eu ainda tinha dificuldade de compreender.

O dr. Henris tinha um porte imponente, um cabelo loiro muito liso e um par de olhos castanhos extremamente penetrantes.


Eu tinha recebido um bom analgésico e, mais uma vez na plenitude de minhas capacidades cognitivas, estava conseguindo admirar toda a beleza do meu modesto médico. – Foram apenas torções, tanto no tornozelo quanto no pulso – explicou. – Vamos imobilizar por uns dias por segurança. Alguns analgésicos e anti-inflamatórios e você está liberada – sorriu, observando meu raio X. – Ótimo – sorri de volta. – Disse para meu amigo que me trouxe até aqui que estava tudo bem, mas ele não acreditava em mim. – Mas você precisa de repouso, ouviu? Nada de ficar de pé ou fazendo trabalhos manuais. Tente se comportar por uns dias. – Por uns dias? Quantos dias? – eu precisava terminar de arrumar a casa de Holt ou ficaria presa ali para sempre. – Uma semana, no máximo. Ele puxou a cortina para sair. – Belo vestido – elogiou antes de se retirar. Não lembrava mais que roupa estava usando e baixei os olhos diretamente para o meu decote. Quando um homem elogia suas roupas… O policial Danver entrou assim que o médico saiu e eu me percebi, subitamente sem nenhuma paciência. – Senhorita Thoen? – Ah, por favor! – resmunguei. – Gregory Holt é um colega de trabalho e um amigo. Ele acabou de se mudar para cá eu estou ficando na casa dele para ajudá-lo por uns dias. Uns moleques da rua chutaram a bola para cima do telhado. Eu subi no telhado para pegar, tropecei na escada e caí. Holt me trouxe até aqui. Eu disse a ele que conseguia andar do carro até a porta do hospital. Ele não acreditou e me carregou. Eu me assustei e gritei. Agora, se você não tiver mais nenhuma pergunta, eu aconselho que vá ocupar seu tempo com algo mais importante, pare com todo esse drama de agente secreto e deixe-o entrar. – A senhora caiu do telhado e teve apenas algumas torções? E, mais importante… Subiu no telhado de vestido? – Não foi do telhado, foi da escada. E se comentários sobre a minha sorte ou às minhas escolhas de vestuário são as únicas dúvidas que o senhor tem, oficial Danver, eu recomendo que pare de insinuar que meu amigo me machucou. Isso é o tipo de coisa que pode gerar um problema bem longo. – Quando um homem machuca uma mulher é uma coisa séria. O problema deve ser longo mesmo! – Ah, o senhor me entendeu errado: o problema bem longo vai ser para você. Não tenho qualquer dúvida de que um homem machucar uma mulher é uma coisa séria. Já mandei alguns desses para a cadeia. Mas Holt não me machucou e se você continuar insinuando que ele fez isso, como sua advogada, vou aconselhá-lo a processar o senhor, seu parceiro, toda a sua unidade e este hospital. Estamos entendidos? – Ele não machucou a senhora, então? – De modo algum. – Tudo bem. Tenha uma boa noite. – O senhor também. Holt chegou alguns segundos depois. – O que foi que você disse? – Como assim? – Em um minuto estão me tratando como um criminoso. Aí falam com você e começam a me pedir


desculpas e me tratar como se eu fosse o embaixador de algum sultão árabe. – É sério, Holt, você precisa aprender a argumentar. Não sei como você consegue ganhar alguma causa desse jeito. Ele riu e me ajudou a sentar de volta na cadeira de rodas. – Então, quer dizer que você é minha advogada? – brincou, enquanto empurrava a cadeira pelos corredores de volta para o hall principal. – Então quer dizer que você sabe o que eu disse? – devolvi. – Eles só mencionaram que eu explicasse para minha advogada lá dentro que tinha sido apenas um mal-entendido. Eu demorei para entender o que eles queriam dizer. – Demorou foi? Raciocínio lento o seu, hein? Holt continuou a rir. – Espera aqui? Vou buscar o carro. Fiz que sim com a cabeça e baixei os olhos para minhas mãos enquanto esperava. Eric era casado. No meio de toda essa confusão, tinha esquecido do meu maior problema. E se Andy sabia, mais alguém da vizinhança logo saberia também. Era só uma questão de tempo até Holt descobrir. Ele não se surpreenderia. É claro que aquele era o tipo de coisa que uma bruxa como Dominique Thoen era completamente capaz de fazer. Ele me chamaria de vadia e eu me sentiria imunda. Era uma injustiça tão grande… eu me sentia como em O estrangeiro, de Camus. Eu não era culpada. Não por aquilo. Não daquela vez. Mas mesmo assim ia ser condenada. Condenada por causa de uma vida inteira de uma personalidade horrível e ultrajante. Paciência. – Já está indo? Era o doutor Henris. – Já. Liberada – sorri. Ele trocou o peso de pé como se estivesse considerando se ia embora ou se ficava. Finalmente, resolveu ficar e se abaixou ao lado da minha cadeira. – Ahn… Eu não costumo fazer isso, mas… – ele tirou um cartão do jaleco. – Se precisar de alguma coisa. Ataduras novas, algum remédio ou companhia para o jantar. – Levantou o cartão no ar e esperou que eu o pegasse. – Fique à vontade para me ligar. – Obrigada – peguei o cartão e sorri discretamente. Olhei cuidadosamente para sua mão esquerda antes de aceitar. Não era o tipo de coisa que eu pretendia fazer em um futuro próximo. Mas, se eu ainda estivesse na cidade quando Holt descobrisse sobre Eric, eu poderia precisar de uma distração.

– Tudo bem. – Holt estava dirigindo bem mais calmamente agora. – Você já foi devidamente medicada, não está mais sentindo dor ou correndo o risco de perder um braço. Então, me diga, Dominique, o que diabos você estava fazendo no telhado? Prendi a respiração e me odiei por não ter me preparado para aquele momento. Eu tinha assistido a ele se masturbar: é claro que aquela pergunta seria feita. Mas eu estava tão ocupada com outros pensamentos que ignorei completamente esse fato e agora estava terrivelmente despreparada para o inevitável rumo que essa conversa tomaria.


– Uns meninos da rua chutaram a bola para o telhado. – E você disse que eles só poderiam pegá-la no dia seguinte. Eu estava do seu lado na hora. – É, mas eu mudei de ideia. Pensei que podia ser educada com os vizinhos, como você mesmo sugeriu – me defendi rapidamente. – Certo, mas por que não pediu que eu fizesse isso? Olhei para ele com uma expressão incrédula. Ele esperava mesmo que eu pedisse ajuda a alguém para fazer algo que eu era totalmente capaz de fazer sozinha? Greg parece ter lido a explicação nos meus olhos. – Tudo bem. Não é do seu feitio. Mas… Aí você pegou a bola e devolveu para os meninos? – Não, eu roubei a bola! – disse, sarcástica. – É claro que eu devolvi, Holt. Que tipo de monstro sem coração você acha que eu sou? Ele me olhou com um sorriso nos olhos e eu mostrei a língua pra ele. – Certo. Mas e aí? – E aí o quê? – Você subiu para pegar a bola. Pegou a bola e devolveu a bola. Por que não desceu do telhado? Ai, merda. Ele ia até o fim. – Eu ia… – Mas aí preferiu me ver nu. Ele tinha um sorriso delicioso nos lábios que deixava claro que ele não se envergonhava nem um pouco do próprio corpo nem da própria sexualidade. A questão é que eu também não me envergonhava nem do meu corpo nem da minha sexualidade. Então, como ele conseguia fazer isso? Como ele conseguia me deixar com vergonha o tempo todo? – Você já me viu em uma situação parecida, Holt. Então, nem tente me constranger. Não vai conseguir. – Ah, quem eu estava enganando? Ele já estava conseguindo. – É, mas eu não escalei um telhado para te ver nua. Quero dizer, não me leve a mal: não é que você não mereça – ele riu. – Acredite, merece – acrescentou baixinho, mais para si mesmo do que para mim. – Mas eu não fui pervertido a esse ponto. – Não escalei o telhado para ver você nu – chiei com os dentes cerrados. – Subi com uma escada – expliquei para diminuir o tamanho do esforço. Pode parecer besteira, mas soou importante na hora – Para pegar a bola das crianças. Se você estava se masturbando de frente para a janela, não sou eu quem tem que ficar constrangida. – Ah, então você me viu enquanto eu me masturbava? Só então me ocorreu que ele não sabia quanto tempo eu tinha ficado em cima do telhado. Até onde Holt sabia, tinha sido apenas um momento fugaz em que nossos olhares se cruzaram. Mas agora, eu tinha deixado claro que não havia sido só isso. Parabéns, Dominique. Show. – Vamos! Conte a história toda. Não adianta ficar com vergonha agora – Holt estava se divertindo. – Não estou com vergonha. – Eu estava com vergonha. Estava morrendo de vergonha. Mas por quê? – Você subiu no telhado, me viu enquanto eu me masturbava e… – E parei para olhar! – reclamei dentro do carro. Gregory começou a rir. – Não é como se você nunca tivesse feito o mesmo. Parei e olhei. E pronto. Ele não ia parar de rir tão cedo. – Certo, Holt. Chega desse assunto. Eu podia ter te filmado, sabia? – lembrei de repente. E parte de mim odiou não ter tido essa ideia antes.


– E fazer o quê? Colocar uma filmagem de mim me masturbando que você conseguiu graças a sua perícia em escalada? – riu. – Ia ser mais prejudicial para você do que para mim, Dom. É. Ele estava certo. Maldita sociedade machista. – Certo. Podemos parar de falar sobre isso? – Acho que a gente devia transar de uma vez. Meu coração parou de bater. Meu pulmão interrompeu as trocas gasosas. Minha boca ressecou. Minhas unhas se enfiaram na carne. Minha vagina gritou “Sim, por favor”. – Quero dizer, a gente não para de passar por situações constrangedoras – riu, e dessa vez seu tom deixou claro que ele estava brincando. – É como se o universo estivesse mandando um sinal – brincou. É claro que ele estava brincando. Ou você achou o que, Dom? Que ele estava falando sério? Ele estacionou dentro da garagem. Virou-se para mim e colocou o indicador quase no meu nariz. – Eu vou te carregar e você não vai gritar – ordenou. – Já vimos que os vizinhos são do tipo que fazem escândalo e chamam a polícia. Então, nada de gritos, Thoen. Me ouviu? Concordei em silêncio e deixei que ele me carregasse para o andar de cima. Ele ainda usava o casaco mole e fino por cima do peitoral nu, mas mesmo assim eu aproveitei o máximo que pude da experiência. Abracei seu pescoço e deixei que a ponta dos meus dedos se enfiasse em seus cabelos arrepiados. Mantive meu rosto desnecessariamente próximo ao dele e respirei fundo aquele perfume cítrico delicioso. Aqui e ali, fingia me desequilibrar, e usava isso como desculpa para mudar minhas mãos de lugar e tocar seus ombros largos e seu tórax nos mais variados pontos. Eu queria esfregar minha mão em toda a extensão do seu corpo, mas precisava ser discreta. Só toquei onde fazia o mínimo de sentido. Não estava satisfeita, mas pelo menos não tinha sido pega. Holt, por sua vez, também parecia estar curtindo a proximidade. Apoiava minhas costas com seu braço, mas sua mão sempre dava um jeito de descer até a minha cintura ou subir até quase o meu seio. A mão que segurava minha coxa era ainda mais indiscreta, e Holt apertava minha carne com gosto. Em mais de uma ocasião, acho que o senti acariciando a parte interna da minha perna com o polegar. Podia ser que só estivesse recolocando a mão. Ou podia ser que ele, assim como eu, estivesse usando a situação como desculpa para me tocar em lugares que não seriam facilmente atingidos em outra situação. Eu não sabia qual dos dois toques preferia: sua mão em minha cintura e seio ou o toque forte em minha coxa. Acho que se tivesse que escolher só um, escolheria a coxa. Meu vestido caía, e onde seus dedos passavam em minha pele nua eu sentia uma rajada de fogo. Queria que ele me acariciasse mais um pouco. Que passasse seu polegar pela parte interna das minhas coxas e me fizesse tremer por baixo da calcinha. Mas chegamos rápido demais ao primeiro andar. Ele fez uma curva errada e eu não entendi. – Holt? Está me levando para o seu quarto? – Não tem televisão no seu quarto – explicou. – E você vai ter que passar um bocado de tempo deitada. É melhor ficar no meu. – Eu não ligo. Não preciso de tevê. – Dominique, por favor. Não vamos mais discutir, está bem? Só faça como estou te pedindo. Ele tinha um tom tão doce em sua voz que eu não consegui recusar. Greg me colocou sobre sua cama, e eu senti como se estivesse profanando um lugar sagrado. – Vou dar comida ao Max e pedir algo para a gente jantar.


– Tem comida aí, eu fiz compras. – Tem algo que fique pronto só com o micro-ondas? – Hmm… não sei. – Então é melhor a gente pedir. Eu não sei cozinhar nada. – Mas não precisa nem cozinhar, é só… – Nada! – Ele arregalou os olhos em um claro sinal de pânico e eu ri. – Tudo bem. – Uma pizza? Ainda estou te devendo – brincou.

– Você pode ficar com o último pedaço. – É claro que posso – fingi um tom rabugento. – Você comeu minha última pizza. – Você não sabe só agradecer, não é? – ele riu. Estávamos estirados em cima da sua cama assistindo a Jornada nas Estrelas. Acho que estava sendo uma das melhores noites da minha vida. Me senti uma solitária patética por causa disso. – E por que eu faria isso? – Para ser agradável, educada… – ele me provocou. – Não… Não sei o que são essas coisas – brinquei, cerrando os olhos, fingindo pensar. Holt riu alto. O episódio acabou e eu não consegui terminar a fatia inteira. Holt roubou o que tinha sobrado e enfiou na boca rapidamente. – Você podia fazer especialização nisso: ladrão de pizza. – Você acha que paga bem? – A gente dá um jeito. Ele se moveu na cama para se deitar perto de mim e Max, deitado aos nossos pés, levantou a cabeça para observar a movimentação. Os créditos terminaram, e a tevê voltou para a tela inicial do Netflix. Peguei o controle da tevê e passei pra ele. – Você escolhe agora. – Não. Você escolhe. – A gente já assistiu a dois episódios de Jornada, Greg. Acho que está na sua vez. – Você quase morreu. Você escolhe. – Quase morri? Exagerado! – Thoen! Você caiu do telhado! Do telhado do primeiro andar! É uma queda de cinco metros de altura e você só teve duas torções. Mesmo que as partes mais baixas do telhado tenham ajudado a aparar sua queda… O pessoal do escritório já achava que você tinha vendido a alma pro diabo. Depois disso eles vão ter certeza. – Não caí do telhado! Já disse! Caí da escada quando estava descendo. Foi uma queda baixa – mostrei a língua pra ele. – Mas olha isso – levantei o braço que tinha ficado embaixo do corpo quando caí para que ele observasse. A pele já estava roxa e inchada. E era só o começo. Muito em breve ia piorar. – Acho que alguns torções e uns hematomas não são tão ruins assim, considerando… – Uns hematomas? Você fala como se não fosse nada. – Tem gente que morre em quedas assim, Dom! E você teve o quê? Um braço roxo?


– Um braço… – levantei a barra do vestido do lado que eu tinha caído e mostrei minha perna roxa – Metade do meu corpo vai ficar assim, Holt. Já está doendo! Ele levou a mão até minha coxa e tocou o hematoma com a ponta dos dedos. Se ele estava desenhando as bordas do machucado ou se estava simplesmente acariciando minha coxa, eu não saberia dizer. Sinceramente? Não fazia diferença. Ele me tocou suavemente e eu senti eletricidade correndo pelo corpo. – Sinto muito – murmurou. – Pelo quê? – Você não teria caído do telhado se eu não tivesse te obrigado a vir até aqui. – Sua voz, seu toque… Era tudo tão gentil que eu me senti constrangida. Rápido, Dom! Diga algo cruel. – Também não teria caído se meus pais tivessem usado camisinha na noite em que fui concebida. Vai culpar meu pai morto e enterrado, também? – Dominique, você não precisa ser horrível – apesar das palavras rudes, seu tom era delicado. Sua mão ainda estava na minha perna e ele tinha se girado de lado, estando de frente para mim. Perto demais. – Não estou sendo horrível. Estou só dizendo que não é culpa sua. – Tudo bem. Mas me desculpe, mesmo assim. – Certo, está desculpado – falei rapidamente. A proximidade com Holt estava dificultando minha respiração. Era como se ele estivesse sugando todo o oxigênio do cômodo. – Mas não devia se desculpar por qualquer coisa. Principalmente por coisas que não são culpa sua. – Posso me desculpar por ter te olhado de volta. Você só caiu porque se assustou. Isso foi culpa minha, não foi? – Seu toque na minha perna tinha ficado mais intenso. Desistiu de me tocar apenas com as pontas dos dedos e agora tinha a mão espalmada na minha perna. – Eu subi no telhado, Greg. Eu assisti a você se masturbar. Eu me assustei. Eu caí. Que parte disso é culpa sua? – Você sabe não argumentar? Sabe? – ele estava rindo. Descobri que adorava o som da sua risada. – Simplesmente ouvir algo sem transformar isso em uma discussão? – Acho que não – segurei o sorriso, mas ele levantou meu queixo para me observar melhor e eu ri. Teve que tirar a mão da minha coxa para isso. Uma pena. – O que vamos ver agora? – ele passou o braço pelas minhas costas e agora estávamos quase abraçados. – Já disse, pode escolher. – Tá – ele pegou o controle. – Quero ver mais um episódio de Jornada nas Estrelas. Qual você prefere? A nova geração ou a série clássica? Eu mal me mexia e quase não respirava. Tinha medo que se me movesse muito subitamente ele fosse imaginar que estava me machucando e retirasse o braço. Queria ficar ali. Protegida. Recebendo carinho e atenção. Inferno… Eu parecia um filhotinho desesperado por carinho. Acho que minha individualidade e independência sempre conseguiram disfarçar minha solidão muito bem. Mas ali, machucada tanto física quando emocionalmente, eu estava precisando de um abraço. – Tanto faz – minha voz saiu doída. Ele ia descobrir que eu fiquei com um homem casado. Ele ia achar que eu sou o tipo de mulher que faz isso com frequência. – Está tudo bem? – a dor na minha voz deve ter sido identificada. Ele me soltou por um segundo e eu me arrependi de ter deixado minhas emoções tomarem o controle. – Está – tentei sorrir. – É só… Sei lá… Então, Holt fez algo que eu não esperava: colocou o braço ao meu redor mais uma vez e me


abraçou com ainda mais força. Me puxou para ele e me manteve ali, contra o seu peito, envolvida pelos seus braços. – Quer analgésicos mais fortes? A gente pode dirigir por um bairro perigoso e tentar achar um traficante… – brincou, enfiando a mão nos meus cabelos e eu comecei a rir contra a sua camisa. – Não. Acho que preciso de um banho. – Hmm… – Ele tirou os dedos dos meus cabelos e continuou o carinho pela minha coluna – Vai querer ajuda? Não é como se eu nunca tivesse te visto nua. O descarado estava rindo e eu dei um tapa em seu braço. Normalmente, eu o afastaria para longe. Mas hoje não. – Voyager – mudei de assunto. – Essa é a minha saga favorita de Jornada nas Estrelas. – Nunca ouvi falar nessa. É Kirk ou Picard? – Nenhum dos dois. Voyager é a única saga de Jornada em que a nave é comandada por uma mulher. – Uma capitã? – ele pareceu impressionado. – Capitã Janeway. – Legal. Acho que essa vai ser a minha favorita também. – ele retomou o cafuné e eu queria que ele não parasse nunca mais. – Você é a pessoa mais influenciável do mundo? Você nunca nem viu o seriado. – Estava brincando. Além do mais, por que você gosta mais desse? Só porque a capitã é mulher? – Não é só por causa disso. Mas isso é uma grande parte. – Posso te perguntar uma coisa? – Ih… – Apoiei o queixo contra o seu tórax para observá-lo. – Lá vem… O que foi? – Por que você é tão… defensiva quanto ao seu gênero? – A palavra é feminista, Holt. – Não, não é. Você é excessivamente defensiva sempre que há algo que envolve gênero. Eu me levantei e o empurrei discretamente. Aquilo era o meu calcanhar de Aquiles. – Eu sou defensiva em relação a tudo que eu sou. Defendo mulheres, advogadas, morenas… Desde muito cedo precisei me defender sozinha. Aprendi a ser boa nisso e aprendi bem rápido. – Justo. Acho que explica muita coisa. – Você não vai dizer de novo que eu sou agressiva porque sou amarga, vai? – Não – ele riu e tentou me puxar para perto dele de novo, mas dessa vez eu resisti – Mas todo mundo tem um motivo para ser como é, Thoen, e você não é exceção. – É? E você? Quais são seus motivos? – Venho de uma família… afortunada. – Rica. Essa parte eu entendi arrumando suas fotos. – Minha avó é uma pessoa complicada. É a matriarca de uma família importante e acha que os tempos medievais ainda estão em vigor. Minha mãe, a filha dela, se casou com um homem que minha avó não aprovava. – O seu pai? – É. Foi complicado. – Mas eles pareciam felizes. Pelas fotos – acrescentei. – Eles eram. – Eles faleceram? – Meu pai, sim. Minha mãe… bem, minha mãe ainda está viva. Ou quase. Eu queria perguntar mais, mas achei que, talvez, naquele momento, fosse indelicado.


– De qualquer modo – ele continuou –, quando as pessoas têm dinheiro acham que isso basta. Meu pai me ensinou que a gente tem que tratar as pessoas com decência. Por isso, desde que eu… Abandonei essa vida, tento ser gentil com as pessoas. Greg tinha algo triste em seus olhos e eu senti uma dor no coração que eclipsou qualquer machucado de uma queda de cinco metros. Eu estava muito atraída por esse homem. Senti uma vontade louca de abraçá-lo e dizer que ia ficar tudo bem. Tive que lutar enlouquecidamente contra esse instinto. Precisava tentar mudar de assunto. – Minha mãe se envolveu com um cara rico e casado. Ele largou a família para ficar com ela. E ela nos largou, eu e meu pai, para ficar com ele. A vagabunda queria vida fácil. – Riqueza não traz vida fácil, acredite. – Eu acredito – dessa vez fui eu quem me aproximei dele. Estava começando a ceder à vontade louca de abraçá-lo. – Ele a largou alguns anos depois por uma mulher mais nova. Deu em cima de mim, algumas vezes, o nojento. – E ela levou metade de tudo que ele tinha? – riu. – Não. Ela não levou quase nada, na verdade. – Foi uma das suas primeiras causas? – ele parecia confuso. – Eu não representei ela. Nunca! – Ah, está explicado! – É, Holt – cutuquei, tentando amenizar o clima. – Está me confundindo com outra pessoa? Se eu a tivesse representado… – Ela teria levado até as cuecas dele. – Por aí – ri. – Você vai me contar o que viu no meu processo? – Não sei. Se você se comportar – provoquei. – Me comportar? Eu salvei sua vida, deixei você escolher o que a gente ia assistir, te dei a última fatia de pizza… Por Deus, mulher! – brincou, exageradamente. – O que mais você quer? Seu corpo nu. Ri sozinha. – Quero que você apague meu vídeo. – Jamais! – ele riu e me espremeu em um abraço forte demais. Deixei minhas mãos repousarem em seus ombros e enfiei meu nariz em seu pescoço. Holt alisava minha coluna com gentileza e eu sentia sua respiração contra meus cabelos. Era uma brincadeira de tocar. Eu queria tocá-lo. Ele queria me tocar. Mas nenhum dos dois tinha coragem de fazer isso explicitamente. Ficávamos fingindo um movimento ou outro para ficar cada vez mais próximos, toques cada vez mais íntimos. Eu já tinha dançado aquela dança centenas de vezes. Mas ela nunca tinha sido tão delicada como aquela. Ou tão gostosa. Eu estava envergonhada e não sabia muito bem como lidar com isso. Era a primeira vez que eu tinha vergonha de tocar um homem. Já levei foras antes: acontece. Mas lidei com isso do mesmo jeito com que lido com tudo na minha vida. Uma boa dose de “dane-se” e partia para outra. Mas Holt… Se ele me recusasse, as consequências seriam completamente desconhecidas. E o desconhecido me trazia uma boa dose de pavor. Eu ainda estava presa entre seus braços e suas mãos estavam em quase todos os lugares. Puxei minha perna contra ele e, com meu joelho, encostado em sua virilha, já podia sentir o princípio de uma ereção. Ele empurrou o corpo um pouco para trás, tentando evitar que eu percebesse. Tarde demais.


Escorreguei minha mão por seu peito rígido e o arranhei de leve por cima da camisa. Sua mão estava de volta à minha coxa e dessa vez ela estava subindo e subindo. Cada um se movia a uma velocidade glacial para ficar mais de frente um para o outro. Se fosse qualquer outro homem eu já teria enfiado os dedos em seus cabelos e minha boca na dele. Teria envolvido seu quadril com minhas pernas e dito algo safado. Mas havia algo em Gregory Holt que me deixava congelada. Congelada pelo fogo, se é que isso faz algum sentido: eu o queria tanto que não conseguia fazer nada. Era tortura do pior tipo. Eu queria falar de sexo. Queria que ele pensasse em sexo e que fizesse o primeiro movimento já que eu, claramente, não iria conseguir fazer. – Quero esse vídeo, Holt. – E vai ter. E nem vai precisar trabalhar tanto por isso – Ele puxou a mão das minhas costas e agora era o meu rosto que ele acariciava com uma gentileza infinita. – O que quer dizer? – Vai passar boa parte do seu tempo restante aqui nessa cama. Eu queria que ele completasse com um “porque eu não vou sair de cima de você”. Mas eu sabia que ele estava se referindo ao fato de eu estar machucada. – Faço questão de acabar o que comecei – falei. Ele estava passando o polegar sobre o meu lábio e parecia vagamente consciente do que eu estava falando. Estava tão perto que o único cheiro que eu conseguia sentir era o dele. – Não vou embora enquanto não acabar. Questão de honra. As palavras saíam da minha boca mas eu dava pouca importância a cada uma delas. Eu só conseguia pensar em abrir a boca e chupar aquele polegar. Chupar com vontade, depois lambê-lo e dizer que era isso que eu queria fazer com seu pau. Mas era Holt. Maldito Holt. E eu não conseguiria fazer nada disso. – Vai ser difícil me separar desse vídeo – havia um toque de brincadeira no que dizia, mas sua voz não passou de um sussurro delicioso. – Está levando meu vídeo para o banheiro com você, é? – me forcei a dizer. – Ainda não – susurrou contra os meus lábios e eu me peguei lutando contra a vontade de fechar os olhos. – Mas é uma boa ideia. – Está querendo me deixar com vergonha, Holt? – Vergonha de que, Thoen? Você tem um corpo perfeito – ele piscou e manteve os olhos fechados por uma fração de segundo a mais do que deveria e eu não pude deixar de pensar que ele estava imaginando. Imaginando aquela noite. Me imaginando nua. Seu toque na minha coxa ficou mais urgente, seus olhos verdes estavam cravados nos meus e algo dentro de mim começou a tremer incontrolavelmente. – Você não tem nada de que se envergonhar. Vai, Dom! Diz “Você também não”. Segure ele pela virilha e diga “Você também não”. Mas nada. Eu ainda estava congelada. O polegar de Holt já tinha explorado cada centímetro dos meus lábios antes de sua mão descer para o meu queixo. Manteve meu rosto preso em sua mão. Seu olhar não hesitava. Holt se sentou e se inclinou por cima de mim. Senti seu rosto se aproximar. Sua boca. Sua boca. Sua boca. Era só nisso que eu conseguia pensar. Era só isso que eu conseguia ver. Estava acostumada a seduzir. Mas eu estava sendo seduzida. Senti o calor dos seus lábios contra os meus e tive certeza de que meu sangue tinha descido da cabeça e que minha boca estava gelada. Holt largou meu queixo e me segurou pelos cabelos. Ele me


queria e me queria agora. Entreabri os lábios e senti sua língua entrando na minha boca. Calma e delicada primeiro. Paciente. Massageando minha língua, me explorando com cuidado. Senti força na mão que ele mantinha contra minha nuca até me colocar sentada. Seus dois braços me envolveram com força e eu me senti sua. Eu não tinha nenhum poder ali, nenhum controle. Estava completamente entregue. Sua boca se abriu forçando a minha. Enfiei minha língua em sua boca e o senti sugando. Segurei seu rosto entre minhas mãos e me deliciei em seu gosto. Uma mordida no lábio, um chupão na língua, suas mãos em locais cada vez mais proibidos. Eu queria descer minhas mãos, queria explorar seu corpo também. Mas era como se minha mente só conseguisse fazer uma coisa de cada vez. E, no momento, eu só conseguia me concentrar no beijo ou iria explodir. Ele me beijou e me beijou. Eu estava perdendo o ar, mas não me importei e ele também não. Ele ofegava contra minha pele sem nunca largar o beijo. Eu queria mais. Queria sugar sua saliva inteira. Queria secá-lo em minha boca. Holt tinha as mãos no meu pescoço, no meu cabelo, nas minhas coxas, na minha cintura. Seus dedos subiam pela minha cintura e estavam quase em meus seios. Era só isso que eu precisava. Precisava que ele ultrapassasse a barreira, deixando claro que era isso que ele queria. E aí algo horrível aconteceu: eu comecei a pensar. Comecei a pensar em tudo. Em Eric e Shelbi. Nos vizinhos. No meu pai. Na minha mãe. Na família dele. Mas principalmente em Eric. Greg estava me dando o que provavelmente era o melhor beijo da minha vida e tudo que eu queria era me entregar ao momento. Mas a imagem do seu rosto ficava voltando a minha mente. Sua expressão de nojo quando descobriu que eu tinha transado com um desconhecido no seu sofá. O que ele diria quando descobrisse que era com um homem casado? Ele acreditaria em mim quando eu dissesse que não sabia? Ou diria que eu era uma vadia incorrigível? Que ele deveria ter imaginado? Me olharia com asco e mandaria eu pegar minhas coisas e dar o fora da sua casa e da sua vida? Eu estava passando mal. Não era um mal estar físico, mas completamente emocional, e era horrível. Empurrei seu tórax com o braço. – Holt, não. Não quero fazer isso. Ele passou a língua nos lábios e vi seu rosto ficar vermelho de vergonha. – Ah, tudo bem… Thoen, me desculpe. Eu não… – ele se levantou rapidamente e eu quis dizer alguma coisa. Quis dizer que não estava dizendo nunca, mas que… Eu precisava resolver outras coisas antes. Lembrava de todos os filmes de romance que eu já tinha assistido. Era sempre assim: uma das partes tinha um segredo bobo e simples que poderia ser explicado e compreendido sem maiores problemas. Mas eles sempre esperavam e esperavam até que o segredo era revelado do pior jeito possível. Era isso que estava acontecendo. Talvez se eu simplesmente abrisse a porcaria da minha boca e explicasse, Holt entenderia e eu poderia parar de me preocupar. Ou, na pior das hipóteses, ele não entenderia. Mas pelo menos… Era melhor ouvir de mim do que de outra pessoa, não? Mas ele estava na porta, tirando Max do quarto, pedindo desculpas e dizendo que dormiria no meu quarto. Ele parecia desconcertado e eu quis corrigir meu erro desesperadamente. Mas não havia palavras. Eu não conseguia pensar em nenhuma. Eu queria que ele se sentasse, queria colocar mais um episódio e brincar sobre pizzas e vídeos. Mas Holt tinha me desejado boa noite e tinha ido


embora. E eu fiquei ali. Sozinha em sua cama. Pensando em por que diabos eu tinha feito aquilo.


Capítulo 8 “Não se superestime, Scarlett.” Rhett — E o vento levou Girei a maçaneta bem devagar e coloquei metade do corpo para dentro do quarto. Dominique ainda estava dormindo na minha cama. Ela estava deitada de lado, com as costas viradas para a porta. A camiseta justa do seu pijama estava enrolada em baixo da sua cintura e boa parte de sua barriga estava a mostra. De onde eu observava, as curvas do seu corpo poderiam se alinhar perfeitamente com a linha de um violão. Dominique e suas malditas curvas latinas que fazem o pênis criar vida própria e querer sair para um passeio. Ela estava descoberta com as pernas entrelaçadas no edredom. Eu conseguia ver o desenho de sua calcinha por baixo do pano do short curto e fino. Pare, Gregory. Isso não vai acabar bem. Dei um passo para trás e saí do quarto. Só queria ver se ela estava acordada. Não queria que ela precisasse levantar, ia acabar piorando o tornozelo, que, apesar de sua teimosia, com certeza não devia estar muito bem. Precisava me ocupar aquela manhã. Ou melhor, precisaria me ocupar o dia inteiro. O fim de semana inteiro. O mês inteiro. Até ela ir embora. Aquilo tinha sido uma ideia sensacional e ao mesmo tempo ridícula. A oportunidade de provocar um pouco de humildade em Thoen foi irresistível, mas pensar que eu poderia domá-la? Não, isso nunca. No máximo seria agradável vê-la ser gentil e humana por alguns dias. Mas ia acabar. Mesmo que ela ainda passasse alguns meses com a intenção de ser um indivíduo melhor, as pessoas não mudam. Isso eu já tinha aprendido muito bem. O problema agora ia ser resistir à vontade de me envolver com ela. Desci as escadas sem pressa. Era incrível como ela conseguia ser uma mulher que gerava opiniões unânimes. No escritório onde trabalhávamos, quando o assunto era Dominique Thoen, todo mundo concordava: Ela era uma megera insuportável. Ela era a melhor e mais temível advogada do escritório. E ela era gostosa. Por Deus, como era gostosa. Claro que homens e mulheres se dividiam nessa última opinião. Homens não negavam. Nós todos tínhamos plena consciência de que ela era o tipo de mulher que qualquer um de nós adoraria espremer contra a parede. Mas as mulheres usavam outros tipos de elogios. Uns que facilmente são confundidos com ofensas. Bastava Dominique se aproximar e começava a interminável sequência de “Vadia”, “Como ela tem coragem de usar um vestido tão colado em uma audiência”, “Ela engordou” ou “Ela emagreceu demais”. Não, senhoritas, sinto muito.


Ela não está acima ou abaixo do peso. A roupa é sensual e não vulgar. E quanto ao “Vadia”… Bem… Isso era verdade. Mas o fato inegável é que todas as suas colegas de trabalho apenas a ofendiam porque a admiravam. É o jeito feminino de elogiar através de camadas e camadas de inveja. E Dominique dava muitos motivos para ser invejada. Abri a porta e deixei Max entrar enquanto colocava sua ração. Conseguia me lembrar de quando a vi pela primeira vez. Tinha acabado de entrar para o escritório, era a festa de Natal na casa de um dos sócios majoritários. Estávamos no salão principal e eu a vi. Ela usava um vestido amarelo que… Minha nossa… Era a mulher mais bonita do salão. Talvez fosse até a mulher mais linda que eu já tinha visto na vida. Boa parte das mulheres tenta ser exagerada para chamar atenção. Um vestido muito chamativo, uma maquiagem muito trabalhada, fala mais alto ou mais sugestivamente… Todas essas são ferramentas à sua disposição. Mas Dom era diferente. Ela era sensual de um jeito quieto. E quando me olhou, seu olhar foi tão penetrante que eu me senti derretendo. À primeira vista, pensei que ela fosse até a esposa troféu de algum ricaço da festa. Foi com essa atitude que me aproximei dela. E foi provavelmente por causa dessa atitude que ela passou a me odiar com todas as suas forças. E quando Dominique odeia alguém, ela realmente odeia. Acho que é isso que a faz ser tão boa advogada: ela é intensa com tudo. Fiquei deslumbrado como uma criança diante de uma loja de brinquedos na primeira vez que a vi em uma audiência. Ela dominava o ambiente com tanta segurança que até o juiz parecia precisar pedir licença para interrompê-la. Era tão inteligente, culta e sagaz que eu… Fiquei curioso. E foi aí que comecei a conhecê-la melhor. No escritório, não faltavam apelidos para a poderosa Thoen. E nenhum deles era carinhoso. Ela tratava todo e qualquer colega com desprezo e superioridade. Acionava na justiça qualquer um com quem tivesse o mínimo problema. Eu, inclusive. Em mais de uma ocasião. Era rude e mal-educada. Ambiciosa do pior jeito. Era fácil odiá-la. Fácil até demais. Era quase como se ela quisesse que todos fizessem isso. Logo toda sua beleza, sagacidade e competência perderam o brilho perante meus olhos. E eu passei a trocar ofensas veladas quando estava na sua frente e xingá-la dos mais baixos nomes assim que se virava de costas. Havia algo escuro e podre em sua alma. E eu não queria nada daquilo perto de mim. Já tinha experimentado podridão suficiente em minha vida. E então aquele dia no fórum aconteceu… E eu… Eu fiquei curioso de novo. Comi algo que podia ser preparado rapidamente e olhei para Max. Passei os dedos em seu pelo. – Um banho, amigão? Ele me encarou com seus olhos castanhos e tristes. Ele não gostava de banho. Mas que cachorro gosta? Peguei os produtos dele de um armário na garagem. Dominique realmente estava levando a missão mudança a sério. A casa estava ficando impecável. Sem querer, me peguei levantando a cabeça para observar a janela do meu quarto. Tinha ido longe demais. Droga. Eu a beijei quando ela não queria ser beijada. Sacudi os cabelos com força. Tinha entendido tudo errado. Os toques, os olhares, os sussurros. Achei que ela queria também. Achei que era ciúmes o que eu tinha percebido quando liguei para dizer que tinha um encontro. Achei que ela queria me ver nu do telhado por desejo. Belo dom de interpretação o meu.


Entendi tudo errado. Ou talvez tenha entendido exatamente o que ela queria que eu entendesse. Não seria tão estranho assim se ela estivesse só brincando comigo, seria? Quero dizer, seria uma vingança bem típica dela, na verdade. Eu podia ter imaginado isso antes. Mas ver aquele corpo escultural rebolando de um lado para o outro naquelas roupas curtas e leves estava prejudicando meu raciocínio. E quando ela montou em mim para tirar aquele pedaço de pizza da minha boca eu pensei que fosse ter um orgasmo. Droga… Eu sou um homem decente. Mas sou só um homem ainda assim, não sou? E mesmo antes do dia do fórum, mesmo quando eu sentia nada além de ódio por Dominique, mesmo assim, aquele desejo latente sempre esteve ali. Várias vezes eu menti para mim mesmo. Eu ignorei e disfarcei. Mas se em qualquer um desses dias ela tivesse tirado minha roupa e dito “agora”, eu teria ido. Era além da razão: eu queria experimentála. Deve ser assim que uma atração física absurda funciona. Nesse ponto eu já estava sorrindo sozinho, me lembrando de quando ela ficou nua na minha sala. Ela achou que eu queria transar com ela em troca de não espalhar o vídeo. Se eu tivesse um pouco menos de moral, só um pouco menos, teria caído de boca naqueles seios perfeitos. Teria puxado aquela cintura linda para mim e a teria possuído vorazmente. Experimentado sua umidez, seu calor, sua saliva. Meus olhos estavam fechando e eu senti meus dedos tocando minha boca. Arranhei meu rosto afastando o pensamento e liguei a torneira. Ia jogar o jato de água da mangueira em cima de mim quando lembrei do celular no meu bolso. Tirei a camisa e a enrolei no celular em um canto do jardim. Nem pensar em deixá-lo na mesa da cozinha. Dominique acordaria e iria direto destruir o aparelho inteiro. Segurei o celular sentindo a indecisão. Eu ainda não conseguia acreditar que a tinha visto se masturbando. Era tão completamente surreal. Chegar em casa e dar de cara com essa mulher maravilhosa, nua e molhada, gemendo de prazer. Se eu não fosse atraído por ela antes, essa cena, definitivamente, mudaria tudo. Queria tanto ter coragem para ver o vídeo. Queria muito. Mas a verdade é que eu tinha ficado mais envergonhado de vê-la se masturbar do que do fato de ela ter me visto na mesma situação. Joguei água gelada no meu corpo e esperei a ereção, que começava a surgir timidamente, desaparecer por completo. Eu só queria me deitar em algum lugar, fechar os olhos e relembrar aquele beijo. Aquela boca macia, a pele suave e o calor… Um fogo que só ela podia apagar e que agora estava desconfortavelmente preso nas minhas entranhas. Eu a queria mais naquele momento do que antes do beijo. Isso não era bom. Precisava me concentrar. Precisava me distrair. Precisava aceitar que tinha entendido errado e que não era isso que ela queria. Eu sempre podia devolver o vídeo de uma vez e mandá-la embora. Pelo menos eu não teria que ver aquela bunda e aquelas coxas naquele short minúsculo por nem mais um insuportável dia. Mas ela não me quer. Eu teria que apagar o fogo de outro jeito.


Fui dormir me sentindo uma adolescente de dezesseis anos, insegura e excitada, e acordei me sentindo uma menina de doze, sem a menor ideia do que deveria fazer a seguir. Era sábado, o que significava que era melhor resolver logo o que iria fazer porque seria um dia inteiro de Holt. Max estava latindo do lado de fora. Levantei com dificuldade e fui trocar de roupas, escovar os dentes, pentear os cabelos… Meu tornozelo parecia um pouco melhor. Era meu braço que ainda me preocupava. Com os latidos de Max como trilha sonora, eu fui até a janela e puxei a cortina. Ele estava no quintal de trás, com o pelo coberto de espuma. Gregory o segurava, tentando mantêlo quieto. Sua bermuda estava encharcada e ele estava sem camisa. Exatamente o que eu precisava… – Quieto, Max. Comporte-se – puxou a mangueira para enxaguá-lo, mas a cria de Belzebu, como sempre, estava se recusando a cooperar e logo Holt tinha mais água sobre si mesmo do que sobre o cachorro. Soltei a cortina e dei um passo para trás. Se a história me ensinava alguma coisa era que se eu continuasse a observar seu peito nu e molhado, Greg, inevitavelmente, me pegaria no ato e aí se seguiria um sequência interminável de aleatoriedades incompreensíveis: ou eu me jogaria para trás, com vergonha e quebraria a outra metade do meu corpo, ou abriria a janela para tentar explicar o que estava fazendo e iria fazer algum comentário completamente inapropriado ou simplesmente ia sorrir e ir embora e passar o resto do dia com Holt rindo da minha tara semidisfarçada e odiando a mim mesma por ter lidado tão mal com a situação. Não, obrigada. Hoje, eu poderia passar sem nenhum incidente. Depois que coloquei tudo de que precisava em cima do balcão da cozinha, pude preparar o café devidamente sentada em um banquinho alto. Pelo prato sujo de bolacha e a xícara de café, pude perceber que Holt não tinha se alimentado tão bem assim. Vamos lá, Dom. Vamos mimá-lo um pouco e ver se há como voltar atrás. Derreti algumas fatias grossas de queijo e fiz ovos mexidos. Até enfeitei os pratos com frutas. Minha nossa… Eu devia estar realmente gostando daquele homem. Empurrei a porta que dava para o quintal traseiro: – O café está pronto. – Ele levantou o rosto surpreso, o que fez com que fosse pego desprevenido por um Max molhado e brincalhão. – Bom dia – acrescentei. Ele segurou o cachorro, que pulava, pelas patas da frente e o colocou de volta no chão. – Você não devia ter levantado! – Desligou a mangueira e jogou uma toalha em cima de Max, depois que o cão tinha se sacudido espalhando mais água. – Eu ia levar para você. Só não sabia se estava acordada. – Estou bem – sorri. – Venha de uma vez – ordenei com um gesto. – Nossa! – exclamou assim que entrou. – Para agradecer por ter salvado minha vida – brinquei. – Mas é melhor você se secar. E vestir uma camisa. E nem pense em colocar esse cachorro para dentro. Eu mandei ele vestir uma camisa? Por que diabos eu tinha feito isso? Perdi o juízo? Ele disse um “Sim, senhora” e saiu do meu campo de visão por alguns segundos. Voltou se secando com uma toalha e com uma camisa nas mãos.


– Acho que quero salvar sua vida mais vezes – comentou, servindo-se de um pouco de tudo. – Você não quer subir no telhado de novo? – Depende. Você vai se masturbar no banheiro? Dominique! Não. Isso não foi legal. Ele estava tossindo, engasgado com o suco de laranja, e eu devia estar ficando vermelha. Certo. Vamos respirar fundo e reassumir o controle. Primeiro, você não fez nenhum comentário safado que nunca tenha feito antes. Foi só uma piada sobre a sexualidade dele e a sua. Por que está com vergonha disso? E segundo, não era esse o plano? Deixar claro que você ainda está a fim dele? – Você não devia começar a me provocar tão cedo – riu. – É maldade. Ele levou na brincadeira. Ótimo. Aliás… será? – Não posso evitar, Holt. Você me dá muitas oportunidades – disse. Minhas palavras saíam casuais e descontraídas, mas por dentro eu era um poço de lava venenosa e explosiva girando em um turbulento redemoinho. O que Gregory Holt estava fazendo com minha autoconfiança? – O que vai fazer hoje? – perguntei, e talvez minhas segundas intenções tenham ficado estupidamente claras. – Não sei. Acho que preciso adiantar um pouco do trabalho. Ou talvez não. – Quer ajuda? Holt arregalou os olhos para mim. – Com certeza! – exclamou impressionado. – Mas… Você não vai me cobrar ou algo assim, vai? – Não em dinheiro, Holt. Mas você vai ter que pagar pelos meus serviços. – E não é sempre assim com você? Havia algo estranho no seu tom de voz e eu não consegui definir exatamente o que seria. Ele estava dizendo que, de um jeito ou de outro, as pessoas sempre têm que me pagar. Se estivéssemos no escritório eu diria que ele estava me ofendendo indiretamente, como era o padrão da nossa relação. Mas ele tinha acabado de me beijar na noite anterior. E foi um beijo de verdade. Ele não podia simplesmente desligar um botão e voltar a simplesmente acreditar que eu sou uma vadia egocêntrica, podia? Bebi um gole do meu suco e notei que ele me observava por cima. Desviou o olhar assim que o encarei de volta. Na verdade, ele podia sim. Eu sempre fui uma vadia egocêntrica e se ele tinha encontrado o botão para desativar o carinho que sentia por mim – ou pelo menos, que eu achava que ele sentia –, a atitude mais racional seria, de fato, desativá-lo. Terminamos o café em silêncio. Certo, então nós não íamos conversar sobre o beijo. Acho que, às vezes, ignorar é uma atitude adulta também. Foi um longo caminho do champanhe barato na minha sala antes de sua mudança até o beijo da noite anterior. Mas hoje ele parecia diferente. Como se eu já não o afetasse mais. Comecei a me perguntar se algum dia eu o teria afetado. Talvez ele só estivesse com tesão. Eu podia ter imaginado o carinho. Só o que havia era tesão. É, Dom. Ele queria te comer. Viu que não podia e desistiu. É só mais um homem. – Vou trocar de roupa. Obrigado pelo café. Deixe tudo aí que eu limpo, sim? Eu devo ter balbuciado um “tudo bem”. Holt era só mais um homem. Uma criatura com um cromossomo Y e um pênis que definia 70% das suas ações. Nunca me incomodei com a ideia de que um homem quisesse me comer. E a palavra é essa mesmo: “comer”. Fazer amor, sexo e até transar é o que você faz com o seu namorado, noivo, marido. Quem


te come é aquele desconhecido na balada, é aquele cara que tem uma ereção só de pensar em você e que não quer mais nada a não ser que ele meta com força e depois te deixe suada, exausta e muito, muito, satisfeita. De um modo geral, as mulheres consideram isso um elogio. Um que elas sempre recebem de um jeito esnobe e que, muito frequentemente, acabam recusando. Eu não ligo pra essas pequenas hipocrisias do cotidiano. Se um cara quer me comer é porque ele me acha gostosa e isso é um elogio. Se eu achar ele gostoso, quero comer ele também e tudo dá certo. Mas por algum motivo, a ideia de que Holt só quisesse me comer estava me incomodando. Eu queria que ele voltasse a me tratar com carinho. Queria que ele sentisse vontade de me beijar só por me beijar. Mesmo que aquilo não levasse a mais nada. O que, obviamente, não era o que estava acontecendo, dada a sua óbvia desistência.

– Ahmm… Dom? – Chamou? Voltei para a cozinha e quase esbarrei de frente com Greg. Ele me segurou pelos braços e me apoiou para que eu pudesse liberar o peso do meu pé. Segurei seus braços sem nenhuma intenção de largá-lo. Ele tinha terminado de lavar a louça e a cozinha estava um brilho. O que lhe faltava de habilidades culinárias lhe sobrava de habilidades com limpeza. E eu me peguei me perguntando como sua casa tinha conseguido ficar tão infernalmente bagunçada. Talvez a sujeira tivesse sido, de fato, especialmente para me irritar. – Será que você podia me explicar uma coisa – ele tinha “diversão” estampada no sorriso, e eu soube imediatamente que havia algo errado. – O que foi? – Não sei. É só que… Não me parece seu estilo. Ele levantou o conjunto de roupa íntima de arco-íris e eu revirei os olhos para ele. – É da vizinha – tomei o conjunto das suas mãos. – Ahmm… – seu queixo caiu e ele ficou assim por uma fração de segundo – Por que temos roupa íntima da vizinha em casa? A pessoa… Que você ficou no sofá… Foi… Não consegui não rir. – Não, Holt. Foi com um homem que eu fiquei naquele dia. Não que seja da sua conta, mas já fiquei com mulheres, se você precisa saber. Em mais de uma ocasião. Seu queixo continuou caído. Ele estava imaginando. Isso mesmo, meu bem. Me imagine nua com uma mulher. – Fui fazer compras com o pessoal da vizinhança. A sua vizinha aí do lado comprou isso e veio junto com as minhas coisas. – Achei melhor resumir a história. Ele não precisava saber que eu tinha humilhado a menina na frente do seu namoradinho. – Tudo bem. Você já ficou com mulheres – ele tinha esquecido completamente do sutiã da vizinha – Será que eu posso conseguir um vídeo disso, também? – Rá-rá – mostrei a língua pra ele. – Você faz isso um bocado – apontou. – Mostrar a língua pros outros. – Não é pros outros – reclamei. – É só pra você. Acho que eu o ouvi murmurar um “Ah, bom” antes de sair. O trabalho que Holt precisava fazer exigia quase nenhuma ajuda. Ele conseguiria terminar tudo


sozinho e bem rápido. Parte de mim achou que ele tinha usado o trabalho como uma desculpa para não ter que me encarar durante o fim de semana e, depois de quase uma hora trancada no escritório com ele, percebi que estar tão perto dele e, ao mesmo tempo, tão longe, não estava fazendo bem para minha saúde. Andei até o quintal da frente e cruzei os braços. As latas de lixo estavam vazias. Tanto a comuns quanto as de reciclagem. Meu olhar seguiu sozinho para a casa de Andy. Eu posso fazer isso – disse Andy. Voltei para casa e comecei a separar o lixo: metal, papel, vidro e plástico. Proteção ao planeta à parte, era até uma tarefa divertida. E mantinha a mente ocupada. – Criou uma consciência foi? – Porra! Você precisa parar de fazer isso. – Fazer o quê? – Se aproximar dos outros de fininho e gritar algo em seus ouvidos. – Não me aproximei de fininho e não… – Sua lingerie ainda está comigo – mudei de assunto. Acho que Andy poderia se considerar a primeira pessoa do universo com a qual eu odiava discutir. – Na verdade, todas as suas compras do outro dia. Quando eu terminar isso aqui, vou pegar para você. – Não tem pressa. – Tinha algo de envergonhado em sua voz. – Olha, se você achou aquela porcaria de sutiã bonito não tem porque se envergonhar. – Será que você pode parar de ser grossa? – Não estou sendo grossa, garota. Estou sendo objetiva. É diferente. – É grosseria para mim – reclamou. – Porque você é virgem. Eu entendo, mas olhe… Ela emitiu um rosnado incompreensível e foi embora. E eu era a grossa? Andy entrou batendo a porta e eu fiquei parada encarando sua casa. Se a teoria de Holt fosse verdade, ela também teria um motivo para ser tão impossível daquele jeito. Talvez fosse um motivo parecido com o meu. Odiava isso, mas desde a revista em quadrinho, eu não conseguia mais olhar para aquela garota sem pensar em mim mesma. Eu podia tentar fazer algo por ela. Teria que sair da minha zona de conforto, mas poderia ajudá-la. A pergunta era: será que valia a pena insistir? Mesmo que à primeira vista ela fosse insuportável? Respirei fundo e voltei para dentro de casa. Aquilo não ia acabar com Holt me amando ou com Andy virando minha melhor amiga. Estava ali só para arrumar a bagunça de Holt e ir embora. Voltar para a minha vida. Já tinha me metido em confusões demais. Era melhor eu me lembrar dos meus objetivos e voltar a me concentrar neles. Ou então ia só gastar energia.

O trabalho era pouco mas eu não estava conseguindo me concentrar em nada. Não conseguia decidir se Dominique estava interessada ou se estava apenas brincando comigo. Aquele beijo ficava girando na minha cabeça e eu não conseguia adiar nem mais um segundo. Ela disse que ia se deitar, mas não estava no quarto. Ao invés disso, a encontrei sentada no sofá da sala de estar, lendo. – Você sumiu.


– Estava separando o lixo para reciclagem e parei para conversar com Andy. – Reciclagem e contato social com uma vizinha… Você é um extraterrestre que substituiu Dominique, não é? – Você está pedindo para eu te mostrar minha língua mais uma vez. – Uma única menção à sua língua e eu tremi. Eu queria aquela língua de novo. Muito. Ela estava estirada no sofá com o pé machucado esticado nas almofadas. Me sentei ao seu lado, empurrando-a gentilmente para que ela apoiasse as costas nos meus braços. Tomei cuidado para não abraçá-la do jeito que eu queria, mas, naquela posição, estava sendo um verdadeiro desafio. – Como está o pé? – A mesma coisa. O braço está doendo mais. Toquei seu braço com cuidado. Os hematomas ainda estavam lá. – Precisa de alguma coisa? Mais analgésicos? Se quiser, posso te levar ao hospital de novo. Ela baixou o livro e se virou para me observar. Agora ela estava praticamente no meu colo, e eu passei um dos braços ao seu redor. – Estou bem. É sério. – O que está lendo? – Eu sabia que ela estava lendo e que eu estava sendo irritante. Mas precisava puxar assunto. Precisava conversar. Precisava… saber. – Um livro – riu. Puxei o livro de suas mãos. – Hey! – “Um homem acusado injustamente de estupro passa a viver à margem da sociedade e a perder progressivamente sua humanidade, acabando por se tornar um serial killer”. Então… Nada de revista de moda pra você, hein? – Sou eclética – ela chiou, pegando o livro de volta. – É tipo Dexter? – O seriado? – É. – Dexter é bonzinho, um anti-herói. Ballard é um necrófilo, sociopata, doente. – Nossa. Literatura leve, hein? – Como disse, sou eclética – ela disse virando-se de volta para o livro e me empurrando de leve com o cotovelo. Eu estava ficando louco por aquele jeito dela. Louco. – Está bom? – Até a metade estava achando um dos piores livros que já li. Considerei desistir, mas… – Mas? – Ficou estupidamente bom de repente. Talvez um dos melhores livros que eu já tenha lido. – Encarei aquele comentário como uma oportunidade. – Hmm… Acho que vale a pena a gente insistir em certas coisas, então, não é? A gente pode se enganar de primeira. Ela estava virando uma página e eu deixei que meu tom sugerisse que eu queria dizer mais do que minhas simples palavras significam. – Talvez – ela se moveu contra meu tórax procurando uma posição mais confortável e pelo jeito como se aninhou contra mim, imagino que tenha encontrado. – Mas, às vezes, algumas coisas simplesmente não têm solução e é melhor a gente continuar do jeito que está. – Mas, se você tentar, pode se surpreender, não? Pode descobrir que a segunda metade da história fez tudo valer a pena.


– Mas também pode acabar gastando todas as suas energias com uma coisa sem solução. Gastar tempo que seria melhor empregado em seus verdadeiros objetivos do que com uma coisa que… Só vai te tirar da sua zona de conforto e… Para quê? – Porque o risco pode valer a pena. Pode ter algo incrível te esperando no final. – Ela não tirava os olhos do livro e eu aproveitava a oportunidade para observar seu rosto. Cada linha. Ela era uma mulher linda. Uma mulher linda que não me queria. – Eu acho que se você está bem como está, tentar inovar é perda de tempo. Senti alguma coisa dentro de mim murchar. Precisava ter certeza. Puxei Dominique para mim. Meu nariz estava quase tocando no dela. – É isso que você acha? Eu a encarei e vi seus olhos escuros se arregalarem. – Holt… Eu… – Você também me beijou, Dom. – Holt… – Você me beijou e foi só… Perda de tempo para você? – Não foi isso que eu quis dizer. Eu estava pensando em… – De repente, eu percebi que o problema estava resolvido. Minha dúvida estava esclarecida e eu não queria ouvir nem mais uma palavra. Aquele era o tipo de discussão que só ia insuflar ainda mais o seu monstruoso ego. Sim, eu estou louco por você. Quero te abraçar, te beijar e fazer amor com você. E você… Você não dá a mínima. – Me desculpe por ter me esquecido – disse levantando, e deixei que ela voltasse ao seu livro. – Você só está aqui por causa do vídeo. É tudo com o que você é capaz de se importar: você mesma. Assim que cheguei às escadas já estava sentindo um gosto amargo de arrependimento na boca. Fui cruel. Eu a tinha chantageado para que viesse até aqui, não foi? E agora estava exigindo que ela sentisse por mim o mesmo que eu sentia? Era injusto. Mas eu já tinha massageado o seu ego o suficiente por uma noite sem ter que voltar para assumir que estava arrependido. Hoje, eu ia ser infantil. Precisava extravasar. Tinha Dominique atravessada na minha garganta. E aquele maldito fogo que ardia por dentro, consumindo tudo que eu tinha para dar. Estava morrendo de raiva. Sabia que era irracional, mas não se discute com raiva. Só se age. E eu tinha um fogo que precisava ser apagado. Se não por Dominique, por outra pessoa. Do jeito que eu estava, qualquer mulher teria que servir.


Capítulo 9 “Eu nunca vou querer ser nada além de completamente feliz.” Ashley – E o vento levou O que é que eu faço agora? Toda essa conversa sobre insistir em algo e sobre segundas chances de Holt só me fez pensar em Andy. Não pensei que ele estivesse falando sobre… Ah, merda. E agora? Eu não conseguia mais olhar para ele. A única coisa que me restava era correr atrás de Gregory, dizer para ele como eu me sentia e esperar que ele sentisse o mesmo. Ele podia ter acabado de insinuar que queria algo mais comigo ou podia simplesmente estar preparando o terreno para sexo. Homens fazem isso, não fazem? Como eu queria estar prestando atenção quando ele começou a usar o livro como analogia para a nossa situação. Mas eu estava pensando em Ballard e McCarthy e Andy. Não estava pensando nele. E agora, não importava o quanto eu me esforçasse, simplesmente não conseguia lembrar quais foram suas palavras exatas. Subi as escadas e encontrei a porta do seu quarto fechada. Levantei a mão em punho para bater na porta. Chega disso. Diga que ficou com um homem casado. Diga que não sabia. Diga que está com tesão por ele. Aceite o que ele disser de volta e pronto. Respirei fundo e ia bater na porta. Mas lembrei de algo que fez meu coração se fechar em sua conhecida e confortável casca impenetrável. E daí? E daí que eu fiquei com um homem casado? E daí se eu sabia ou não? E daí se Holt fosse ficar enojado? Aquela semana inteira trancada naquele lugar infernal me fez baixar a guarda. Fez com que eu me importasse com um bocado de coisa e um bocado de gente. Mas uma verdade era inquestionável: quando o mês acabasse eu voltaria para a minha casa, para o meu trabalho, para a minha vida. Bem longe de Holt e Eric e Andy e toda a sorte de loucuras que aquela vizinhança escondia. De que adiantaria aquele trabalho todo? Só pra transar com Holt? Eu ainda ficaria ali por mais algum tempo. Se a oportunidade se apresentasse eu transaria com ele. Se não se apresentasse, meus vibradores ficariam bem ocupados quando eu voltasse para casa. E pronto. Já basta de congelar, de ficar sem saber o que dizer, ficar envergonhada e constrangida diante dele. Joguei a mão com força em três batidas seguras contra sua porta. – O que você quer?


– Sou uma convidada na sua casa e você está sendo grosso. – Eu não sei o que fazer com você, Thoen. – E nem precisa. Eu sei o que fazer comigo mesma bem o suficiente. Obrigada. – Queria que você falasse comigo. Mas não desse jeito – disse, apontando para mim. – Queria que falasse como um ser humano. – Não te devo satisfações, Holt. – Não fui grosseira, apenas objetiva – Você me beijou. Eu te beijei de volta. Não estava no clima para transar e te interrompi. Não quis ofender seus sentimentos. – Ele olhava para mim com um sorriso ultrajado e descrente nos lábios. – Não me entenda mal. Você é muito bonito e sedutor. Mas eu não estava com vontade. Ele mordeu o lábio com raiva enquanto balançava a cabeça afirmativamente. – Mais alguma coisa? – Vou até a casa da vizinha devolver as coisas dela. – Se demorar, pode ser que quando voltar eu tenha saído. Não me espere para jantar. – Eu não ia mesmo. Ele fechou a porta contra o meu rosto. Respirei aliviada. A vadia que não se importava com ninguém estava de volta e eu tinha sentido muito a falta dela. Ele disse que ia sair e que não tinha hora para voltar… Provavelmente ia atrás da piranha do outro dia. Mas… Holt que se dane. Eu não ligo mais.

– Suas coisas. – Eu disse que não tinha pressa. – Andy pegou os pacotes das minhas mãos e os colocou no chão ao lado da porta. – E você… Você pode ficar andando por aí? Seu pé não parece legal. Nem seu braço… O seu amigo te espancou foi? – Não – estreitei os olhos para ela. – Ah… Porque eu super entenderia se ele tivesse feito isso. – Obrigada – resmunguei, virando de costas. – Por que você faz questão de ser tão desagradável? – Porque as pessoas me julgaram inferior a minha vida inteira por ser filha de um zelador. Porque minha mãe riu quando eu disse que ia entrar no curso de direito e disse que com a minha bunda eu tinha melhores chances na vida conseguindo um marido rico. Porque meus colegas de faculdade eram elitistas filhinhos de papai que não suportavam o fato de que minhas notas eram melhores do que as deles. Porque eu sempre tive que, na minha vida inteira, trabalhar quatro vezes mais pesado do que qualquer outra pessoa para atingir metade do sucesso. Porque todas as vezes que eu me importei com outras pessoas elas me abandonaram, me traíram, me usaram ou me decepcionaram. Porque eu estou muito bem sozinha e, quando eu sou gentil, as pessoas acham que podem se aproximar. E quando elas se aproximam quem se fode sou eu. Então, não, eu não faço nenhuma questão de ser agradável e de ficar cercada de pessoas que só vão me trazer problemas. Eu estava naquela situação mais uma vez: última gota d’água. Não aguentava mais todos me questionando por que eu era como eu era. – Calma. Foi só uma pergunta.


– Não, não foi só uma pergunta, Greenpeace. Foi uma tentativa de me ofender. De novo. Parabéns, dessa vez você conseguiu. – É muito ceticismo da sua parte. Nem todo mundo vai te magoar. – Mas o risco é bem grande. E eu optei por não me arriscar mais. A decisão é minha, será que dá pra todo mundo começar a respeitar isso? – Você parece ter se aproximado do seu amigo. O Holt. – É. E que bem isso me fez? Fiquei encarando a menina com fúria nos olhos. – Parece que você está descarregando seus problemas em mim. Nunca te abandonei, nem te traí, nem nada do tipo. Então, por favor, pare de me olhar como se eu fosse o resumo de todos os problemas da sua vida. – Ela não soava exatamente constrangida. Era mais… indignação. – Só vim entregar suas coisas – concluí, tentando recuperar o fôlego e a calma. Entre perder minha autoconfiança na frente de Holt e o meu autocontrole na frente de Andy, aquele lugar estava me transformando em outra pessoa. – Se ficar aqui é tão ruim, por que você não vai embora? – ela exclamou quando eu já estava a alguns passos de distância. – Porque Holt está me chantageando com uma gravação de sexo! Foda-se. Foda-se tudo nessa merda. Cansei. – É o quê? – seu queixo caiu descomunalmente, e ela olhou chocada na direção da casa do vizinho. Eu ia virar de costas e deixar que ela pensasse o que quisesse, mas Andy correu atrás de mim e me segurou pelo braço. – Você precisa denunciá-lo para a polícia! Suspirei, pedindo encarecidamente ao meu autocontrole que voltasse logo. – Não é o que você está pensando. Ele é um cara decente e eu sou uma pessoa horrível. – repeti roboticamente, acenando como quem conduz uma sinfonia – Foi uma brincadeira. As palavras saíram doces da minha boca. Holt nunca colocaria aquele vídeo na internet. Ele simplesmente não faria isso. Independente de eu cumprir o acordo ou não. Mas eu já estava ali e podia ter perdido minha confiança e meu controle, mas, por Deus, eu não perderia o meu orgulho. Ia até o fim com essa história toda. – Ele está querendo te dar uma lição, é? – ela riu, e eu percebi que ela tinha mudado de lado. – Pode fingir que não está achando tão bom? – É difícil – riu. – Você é muito chata. Observando de fora pode parecer louco. Mas, de repente, eu não conseguia parar de achar graça na situação e fiquei rindo com uma maluca no seu gramado. – Olha… – ela começou. – Você parece meio mal e eu… eu não estou fazendo nada. Você quer… – ela indicou a porta da própria casa. Eu não morria de amores pela garota, mas me esconder de Holt pareceu uma boa ideia.

– Não acredito que você se masturbou do lado de fora! – Ah, pare de ser tão virgem, Andy. Ela abriu a boca com indignação.


– Ah, você pode me chamar de chata, insuportável e vadia, mas eu não posso te chamar de virgem? – Não sou virgem – afirmou, encarando os próprios pés. Mentira. Olhei para ela com ares de quem reconhece uma mentira. – Tá, talvez eu seja um pouquinho – confessou. – Como alguém pode ser um pouquinho virgem? – bati as mãos nos joelhos e senti meu pulso doer. – Eu já transei com um cara. Uma vez. Só foi… estranho. – Pare. Pare – balancei as mãos para ela. – Está me dando pena – ri, e ela me acompanhou. – Não sou uma mulher bonita – deu de ombros. – Tive poucos pretendentes. E quando finalmente aconteceu, acho que ele não era o cara certo. E aí foi… ruim. – O “cara certo” é uma ilusão da sua virgindade – disse, fazendo as aspas com os dedos. – Você tem que ficar repetindo a palavra com “v”? – Virgem, virgem, virgem. Cresça, Andy. – Ah, claro. Você fica repetindo como uma criança e a infantil sou eu? Virgindade é uma coisa importante na vida de uma mulher. – Concordo. Não foi isso que eu disse? – Não. Você disse que o “cara certo” era uma ilusão – ela disse, exagerando nas aspas com os dedos, me imitando. – Eu não disse isso. Disse que era uma ilusão da sua virgindade. – E o que diabos isso quer dizer? – Quer dizer que essa coisa de cara certo só existe enquanto você é virgem. Aí você perde o hímen e vira sexo. Vira orgasmo. De preferência gostoso e com frequência. Ela riu com o rosto enfiado nas mãos. Pelo seu jeito eu tinha certeza de que ela não tinha ninguém com quem conversar sobre aqueles assuntos. – Com quem você perdeu a sua… sabe? – Virgindade? Ah, com um cara. – Um cara? – É. Um cara. A gente namorou por um tempo, mas acabou. – Você se arrepende? – Nem um pouquinho – sorri. – Mas acho que varia de mulher para mulher. Me conta, você queria experimentar o Calvin, é isso? Não fica vermelha! Responde! – Eu acho ele bonito. Mas, sei lá… Acho que não sou o tipo dele. – Toda mulher é o tipo de qualquer homem. Basta você saber se vender. – Não vou me prostituir! Você ficou louca? – Ah, garota! Me acompanha! É só uma expressão. Eu sou advogada, você acha que eu ia sugerir a alguém que fizesse algo ilegal? – Não sei. Tem advogado de todo o tipo. – Não sou desse tipo. – Você ficou com um homem casado… – E o que isso tem a ver? Você quer ajuda com o Calvin ou não? – Quero. Desculpe. – A primeira coisa que você precisa fazer é perder a vergonha. – Dominique, a não ser que tenha algum remédio que resolva, não me vejo perdendo a vergonha assim tão fácil.


– É porque você é inexperiente! Fica mais fácil com a prática. Mais… natural. – Então eu perco a vergonha e pratico com ele? – A gente pode fazer isso também. Mas não acho que é uma boa ideia. – Por quê? – Porque você está nervosa, envergonhada e a fim dele. Já teve uma experiência ruim com sexo e a combinação desses elementos não vai te ajudar. Além disso, ele tem cara de homem que não presta, fique avisada! – apontei um dedo pra ela. – Do tipo que usa e vai embora. Se acontecer, vai estar pronta pra isso? – Ou ele pode se apaixonar por mim. – É. Em um filme da Disney. – Não vou fazer sexo com qualquer um. – Você tem alguma inclinação religiosa? – Não. – Quer transar de novo só depois do casamento? – Não. – Esses são dois motivos válidos e bem grandes para esperar. Fora isso, é só se sentir pronta. Diz pra mim: você está com vontade de experimentar de novo? – Ela me observou, hesitante. – Fala garota! Para de ficar com vergonha! – Não sei! É fácil pra você! Eu não tenho experiência, está bem? Foi ruim e… E se for ruim de novo? E se for ruim sempre? Revirei os olhos para ela. – Não vai ser ruim sempre, Andy! Acredite. É complicado quando você está nervosa. Para gozar tem que relaxar! – disse, e ela riu. – Estou falando sério! É por isso que ir direto ao Calvin é uma má ideia. – murmurei mais para mim do que para ela. – Você precisa aprender a relaxar. E não tem jeito de fazer isso a não ser praticando, entendeu? – perguntei. Ela fez que sim. – Você é uma mulher feita. Paga suas contas. Vive sua vida. Não é? – Mais uma concordância. – Sexo é natural, Andy. É como comer ou ir ao banheiro. É algo do corpo. O único mistério que o sexo tem é o mistério que você dá a ele. Está na sua cabeça. Se você não estivesse pronta, eu te diria para esperar que o cara certo aparecesse na sua frente com um alto-falante e um show de pirotecnia. Mas garota, se você está pronta pra transar, vai lá e transa. Não deixe uma única experiência ruim te enganar. Sexo é muito bom. Ela sorriu envergonhada. – Só tome cuidado para não engravidar ou pegar alguma doença. Conheça o cara minimamente para não correr o risco de ser alguém que vai te forçar a fazer algo que você não quer. E evite lugares públicos onde você possa ser pega. Pelo menos nas primeiras vezes – pisquei para ela. – Você acha que é mesmo assim tão simples? – Para mim, pelo menos, sempre foi. A impressão que eu tenho é que as mulheres tendem a esperar pelo cara certo porque transam sem estarem prontas. Então, elas usam a desculpa “mas foi com o cara que eu conhecia desde a infância e com quem eu namorava há três anos”. Tem tanta magia envolvendo a perda da virgindade feminina que nós todas, enquanto gênero, achamos que temos que ter uma boa história sobre a primeira vez para contar ou será arrependimento eterno. É bobagem. Não é que transar com o amigo de infância com quem você namora não seja o ideal. Provavelmente seja. Mas não vale a pena permanecer virgem quando você está louca por sexo só porque nenhum amigo de infância se apaixonou por você, sabe? Quando você está pronta e se sente pronta, pode ser com qualquer cara. Porque o que importa não é ele, entende? É você. O sexo não é pra ele. É pra


você. – Dominique, você me ouviu dizer que não sou mais virgem, não é? Mordi o lábio e sorri. Acho que parte de mim estava achando difícil acreditar. – Foi só uma tangente do assunto principal – lembrei. – Estou só dando minha opinião. – Acho que eu concordo com você – balançou a cabeça, educadamente. – Concorda comigo? – arregalei os olhos, descrente, e puxei as cortinas olhando para o céu – Vai chover canivete. – Pare – ela riu. – Mas e o Holt? – O que tem o Holt? – Ah merda. Queria me distrair e não falar dele. – Ele é o cara certo pra você? – Menina, você precisa parar com essa obsessão com o “cara certo”. – Sei lá, é só que… Ele te conhece e ainda assim te quer por perto – riu. – O que há de errado com ele? Aquela era uma boa pergunta. – Vai ter que perguntar a ele. – Você já transou com ele? – Não. E isso não é uma pergunta muito apropriada. – Você acabou de sugerir que eu transasse com qualquer um. Acho que já ultrapassamos a barreira do “apropriado” há umas oito menções de virgindade. – Verdade. Não, não transei com Holt. – Mas queria? – Que diabos de pergunta é essa? – Você engole a seco toda vez que menciona o nome dele. É estranho. – Você não me conhece. Eu posso engolir a seco um bocado. – Achei que você era tipo Deusa de todos os homens. – Por que acharia isso? – Por que você é bonita e…Tem um corpo bonito. E é segura e confiante. Não sei – deu de ombros. – É. Mas essas coisas todas somem quando fico perto de Holt. Ele tem uma espécie de aspirador que suga toda essa segurança e confiança – resmunguei. – Então você gosta dele? – Gosta dele? Você tem doze anos? Eu estou atraída por ele, sim. Queria transar com ele, sim. Mas não acho que isso vai acontecer. – Por que não? – Ótimo. Arranjei um guru do sexo. – Responde, Dominique! – Um guru do sexo virgem. Ela me encarou com uma careta e ia dizer, mais uma vez, que não era mais virgem. Mas eu continuei: – Ele é muito… decente. E eu transei com um homem casado. Não sei como falar sobre isso com ele. – Você sabe como me dizer que eu sou uma imbecil por não ter muita experiência na cama, mesmo eu sendo uma completa desconhecida, mas não consegue explicar um erro honesto para um cara que você conhece há anos? – Pois é. Vai entender. Tenho travado perto dele por algum motivo. – O nome desse motivo é “amor”.


Expirei fundo resgatando minha paciência. – Não seja tão apocalíptica, virgem. Às vezes, tesão tem os mesmos sintomas. – Mas pode ser que… – Não quero falar sobre Holt. – Mas… – Não quero, Andy! Ele saiu hoje. Tem um encontro. Eu e ele… Não é uma coisa que pode dar certo. Deixe pra lá. – Mas ainda estamos no meio da tarde – olhou para o relógio. – Então, talvez ele não tenha saído ainda – disse e me estiquei para olhar pela janela. Podia ver o caminho da entrada até a garagem, mas não podia ver a garagem em si. Não havia como saber se seu carro ainda estava lá. – Além do mais, não vou me preocupar com isso. Hoje nós vamos sair, eu e você. Vamos arranjar um homem que te interesse. Ela começou a rir. – Desde que seja depois dos biscoitos, eu deixo você bancar a cafetina. – Vou ignorar o comentário da cafetina. E o que você quer dizer com “biscoitos”. – Quero dizer aquelas massas doces de comer. Olhei feio para ela. – É um senhor que mora aqui perto. Ele tem câncer. Eu e Rick… – O Thierry? Ela piscou. – Como você o conhece? – No hospital, ontem. Depois que eu caí. Cruzei com o Rick. – Ah! Ele é um doce. Cuida do Thierry como se fosse seu pai. – Notei. – Mas, de qualquer modo, aos fins de semana nós sempre passamos por lá para ficar um pouco com ele. Conversar… Ele gosta de jogar baralho. Pobre Thierry. É tão sozinho. – Ele me convidou para ir até lá um dia. Eu vou com você, então. E, depois dos biscoitos, você não escapa.

Passava das sete horas da noite quando saí do cinema. Em sua mensagem, Dominique dizia que ia passar a noite fora. Aparentemente, nós dois estávamos competindo para ver quem conseguia ser mais imaturo. E eu estava cansado de perder. Lynn já estava no bar quando eu cheguei. – Greg! Foi um prazer receber sua ligação. Seus cabelos loiros eram curtos e lisos. O corpo esbelto estava coberto por um vestido preto de uma sensualidade discreta. – Sinto muito ter desmarcado nossos planos ontem, Lynn. E também por ter ligado hoje tão em cima da hora. – Ah, não é problema – ela disse, tocando meu braço assim que me sentei ao seu lado. – Ia passar o fim de semana trabalhando. Esse caso Merkin está me dando dores de cabeça. Precisava mesmo de uma bebida. – Vamos dar um jeito – sorri. – Tenho certeza de que vamos dar um jeito de provar que o Harris


está mentindo. – Você parece bem confiante disso, Greg. Queria ter metade do seu otimismo. – Sei que tem algo ali que não estamos vendo. – Se Dominique tinha encontrado, eu iria encontrar também. A não ser que aquela criatura demoníaca no corpo de uma deusa estivesse mentindo só para me irritar. O que, considerando seu histórico, era bem possível. – Pois então vamos nos dedicar para encontrar – ela completou e levantou sua taça de vinho em um brinde assim que minha dose de uísque chegou. Brindamos e eu virei metade da dose. Olhei fundo nos seus olhos. Azuis. A cor errada. – Diga-me, Greg. Por que eu estou aqui? – Lynn tinha uma voz suave e derretida quando se dirigiu a mim. – Eu não sei. Eu… – Passei os dedos nos cabelos. Eu não queria aquela mulher. Era Thoen quem eu queria nua na minha cama. – Teve uma semana longa? – perguntou, apertando meu ombro. – Mais ou menos. – “Longa” nem começava a descrever minha semana. Ela se virou no banco alto na beira do balcão e ficou de frente para mim. Senti uma de suas mãos na minha coxa, quase na minha virilha. – Greg, você quer sair daqui? Lembrei da sua silhueta enrolada no edredom. O gosto delicioso da sua boca. O toque de sua pele quente. Se eu fechasse os olhos bem apertados poderia fingir que Lynn era ela. – Quero.

Os biscoitos de Thierry eram realmente bons. Não eram nada de espetacular. Mas eram gostosos. – E agora? Rick estava mostrando algo em um tablet para o debilitado homem sentado no sofá. – Agora nós vamos nos arrumar para sair. Você já me enrolou a tarde inteira, Andy. Biscoitos, baralho, conversas. Já é quase oito horas e nós vamos sair! – Tudo bem, tudo bem! – levantou as mãos, rendida. – Vou trocar de roupa e te encontro na sua casa daqui a uma hora, está bem? – Dominique, não tenho certeza se… – Ela olhou ao redor. – Tá. Está bem. Vamos. – Thierry, obrigada por tudo! – Rick fechou a porta e eu já tinha cruzado a rua quando vi o Porsche Boxster estacionado na garagem. – Uma hora? – Andy perguntou já do seu lado da cerca. Eu confirmei e entrei em casa. Holt já tinha voltado e uma série de pensamentos inundou minha cabeça. Eu podia parar de ser uma megera e ir conversar com ele. Conversar como um ser humano, como ele tinha pedido. Se eu fizesse isso, ao invés de sair com Andy, minha noite poderia terminar de um jeito bem diferente. Estava sentindo falta de alguém. Onde estava Max? Holt não entraria em casa e deixaria seu babão favorito ainda preso no quintal. Abri a porta dos fundos e o cachorro quase me derrubou. – Você está aqui fora sozinho há um tempão, não é, rapaz? – alisei seu pelo. Estava macio e cheiroso depois do banho. Quase dava vontade de abraçá-lo. – Vem, menino. Vem pra dentro. Ouvi um barulho no andar de cima e Max me seguiu quando subi as escadas. Meu coração estava batendo desconfortavelmente. Algo estava errado.


O barulho estava vindo do quarto dele. Eu queria chamar seu nome e perguntar se estava tudo bem, mas algo em minha mente estava gritando para que eu ficasse quieta e, mesmo sem saber por que, obedeci. Virei o corredor e o barulho ficou mais alto. Minha garganta secou e ardeu. Eu reconhecia aqueles sons bem demais. Era como se um piloto automático tivesse assumido minhas funções e ele estava mandando meu corpo colocar um pé atrás do outro e continuar em frente. A porta do seu quarto estava aberta e a luz do criado mudo estava acesa. Holt estava só de cueca com seus braços envolvendo e apertando uma piranha loira e esquálida. Algo dentro de mim rachou e doeu como nada nunca tinha doído na vida. Meus pulmões congelaram e eu não conseguia respirar. Um ardor insuportável subiu pelo meu nariz até chegar aos meus olhos e o mundo ficou embaçado. Eu tentei engolir, mas não havia uma gota de saliva na minha boca. Tente respirar, Dom. Você precisa sair daqui. Eu estava parada como uma estátua no meio do corredor, bem em frente à porta. Uma virada de cabeça e Gregory veria minha figura patética hipnotizada por um sofrimento difícil de descrever. Ele gemeu e a beijou e eu quis morrer. Dei um passo para trás e desejei sumir dali sem deixar rastros. Mas Max tinha outros planos. Ele latiu e pulou para frente. Sua coleira tinha escapado por milímetros da minha mão frouxa e frágil. Em dois segundos, o labrador estava em cima da cama. Greg se virou para tentar segurá-lo, mas ele já tinha as patas nos travesseiros e o focinho no cabelo loiro de uma mulher histérica. Se ele queria lambê-la ou mordê-la, eu não soube dizer. Mas estava esperando que fosse a segunda opção. Morde ela, Max. Morde ela. Holt puxou seu cachorro pela coleira e se virou para colocá-lo no chão. Sua expressão era um misto de pânico, confusão e incômodo. Levantou o rosto e nós nos encaramos. Na cama, a loira estava se tapando com o lençol. – Não sabia que você tinha voltado. – Meu orgulho era tudo que me mantinha em pé, e eu queria agradecê-lo por ter forçado minha boca a usar palavras compreensíveis em vez de deixar meus pés ganharem a briga e saírem correndo. – Vou levar Max lá para baixo. – Dom… Não sei de onde tirei forças para andar até o meio do quarto e pegar o cachorro pela coleira. Ele resmungou com um latido baixo, mas me seguiu obediente. Ainda consegui cumprimentar a vagabunda com um rápido olhar e um gesto com a cabeça. Finja indiferença, Dom. A palavra de ordem é indiferença. Assim que puxei Max, Holt tentou colocar a mão na minha cintura. – Dominique. Desviei do seu toque e assim que fiz a curva no corredor e estava certa de que eles não podiam mais me ver, corri pelas escadas abaixo. Meu pé doeu como se alguém estivesse enfiando navalhas em chama ao longo das minhas articulações, mas eu mandei tudo ir se foder e continuei a correr. Fechei a porta de casa atrás de mim para que Max não me seguisse. Atravessei o gramado da casa de Andy, sentindo minha respiração curta e ofegante. Eu tinha lágrimas amargas, azedas e mais de toda a sorte de gostos horríveis descendo pelas minhas bochechas. Esmurrei a porta de Andy com força e ouvi Holt chamando meu nome. Ele deve ter demorado a


colocar algumas roupas antes de me seguir. Ou talvez estivesse explicando para a vagabunda aonde estava indo… A porta se abriu. – Dominique? Mas ainda não… Eu me enfiei dentro de sua sala e me abaixei no sofá. Tinha plena convicção de que, assim que ele colocasse o pé do lado de fora, me veria pelas janelas de Andy. Ela ainda estava com a porta aberta, me encarando em uma tentativa desesperada de encontrar um sentido naquela cena absurda. Meu coração batia na minha garganta, e eu sentia as lágrimas caindo ininterruptas de meus olhos inundados. Escutei Holt chamando meu nome, dessa vez mais alto e mais perto. Andy olhou pela janela e eu soube que ele já estava fora de casa. – Por favor, me esconde. O que era aquilo? O que era aquela dor? Aquela falta de controle? A falta de discernimento? Fazia anos que eu não chorava daquele jeito. Anos que eu não sentia vontade de derrubar uma lágrima sequer. E agora… Eu não conseguiria olhar para ele. Não sem perder dois terços da minha dignidade. – Por favor, Andy – juntei as mãos e implorei. Ela ainda mantinha a porta aberta, confusa. Se Holt começasse a andar pela rua me procurando, iria me encontrar encolhida e encharcada de lágrimas na casa de uma desconhecida. Aquilo ia ser muito mais do que eu podia suportar. – Me esconde, por favor. Ela fechou a porta com cuidado e apagou a luz da sala, antes de se ajoelhar ao meu lado. Eu enfiei minha mão boa na boca e mordi. Tinha um choro incontrolável chegando e eu não sabia o que poderia fazer quando ele chegasse. Abracei meus joelhos e senti Andy esfregando minhas costas. Apoiei a testa nas mãos e chorei em silêncio. Era hora de admitir. Eu estava irreparavelmente apaixonada por Holt.


Capítulo 10 “Sonhos, sonhos. Sempre sonhos com você. Nunca senso comum.” Scarlett – E o vento levou – Você quer me contar o que aconteceu? Eu tinha secado minhas lágrimas, mas o gosto salgado ainda estava grudado na minha pele. – Dom, por favor, me diga que ele não te bateu. Ela tinha os olhos semicerrados e preocupados cravados em mim. E eu comecei a rir. Era um riso louco. – Eu caí do telhado. Fui buscar a bola que os moleques chutaram lá e me distraí. – Se distraiu? – Vendo Holt se masturbar. – Ela abriu a boca e manteve a boca aberta. Sem querer, aquela garota esquisita tinha se tornado minha confidente. Não sabia como tinha acontecido ou se aquele era o jeito certo. Nunca tive uma confidente antes. – Mas não, Andy, ele não me bateu. – Tudo bem. Mas o que houve? Apoiei minha cabeça contra a parede e fechei os olhos. Vamos, Dom. Diga as palavras em voz alta. – Estou apaixonada por ele. – E isso é ruim porque… – Porque ele estava na cama com outra mulher. – Agora? Cachorro traidor! – Não exatamente. Nós não estamos juntos, então… – dei de ombros. – Ah. – Ela olhou ao redor, confusa. – Mas ele correu atrás de você. Ele largou a outra na cama? Era verdade. Ele podia simplesmente ter fechado a porta e voltado a montar na lambisgoia. Mas não. Ele tinha largado tudo e corrido atrás de mim. Mordi o lábio. Não queria depender de suposições. Tudo que eu sabia era que ele tinha desistido de mim e tinha saído com outra mulher. Isso era o que eu sabia com certeza. Algumas batidas incisivas na porta e eu me sobressaltei. Andy passou o polegar nas minhas bochechas, limpando minhas lágrimas, e depois colocou o indicador sobre a própria boca indicando que eu ficasse em silêncio. Ela girou a maçaneta e eu me encolhi no escuro. – Olá, sou Gregory Holt. Seu vizinho. – Eu conseguia ouvir sua voz. Ela entrava em mim atravessando pele e carne. É, eu estava apaixonada por ele, mesmo. Certeza. – Você conhece minha amiga, Dominique Thoen? – Sim. Estávamos juntas hoje à tarde. Ótima pessoa. É linda, não é? Enfiei a cara nas mãos. Não, Andy, fique quieta.


– Ah, sim. Você a viu? Agora há pouco? – Não. Acabamos de nos despedir. Ela foi para casa. O que houve? – É que… Tivemos um problema e… Ela está machucada. Estou preocupado. Se a vir, por favor, diga a ela que ligue para mim ou que volte pra casa. – Ah, sim. Com certeza. Mas ela está bem? – Espero que sim. Ela não devia estar andando por aí, está com o pé machucado. – Se a vir, passarei o recado. – Obrigado. Andy fechou a porta e voltou para o meu canto no escuro. – Você ouviu? Ele está preocupado. Não era melhor… – Voltar para dizer que entrei em desespero ao vê-lo com uma mulher? Não. Má ideia. – Olha, eu não entendendo desses jogos de sedução ou seja lá o que for que você esteja fazendo, mas ele pareceu honestamente preocupado. – Não é “jogo de sedução”, Andy. É jogo de orgulho. E se Holt me vir assim, eu perco para sempre. – E seria tão ruim assim? Perder? Alguém estava batendo na porta mais uma vez. Andy gesticulou para que eu fizesse silêncio mais uma vez. – Você está bem? Era Rick. A anfitriã botou a cara para fora da porta e hesitou enquanto pensava no que fazer. Logo depois, puxou Rick pela gola e o colocou dentro de casa. – O que está acontecendo? Estava saindo da casa do Thierry e vi a Dominique correndo para cá. E depois o Gregory a seguiu e… – Shhh! – ordenou Andy. – A gente está escondendo Dominique. – Andy! – reclamei. – Escondendo? Ele… – Rick tinha os olhos cravados em mim – Ele te machucou? Ai meu deus… Isso de novo. – Não seja ridículo, Rick. – Andy interveio como se ela mesma nunca tivesse pensado algo parecido – Ela está apaixonada por ele. Mas ele estava na cama com outra mulher. – Nossa! Essa vizinhança atrai traidores? – Ele não é meu marido – eu disse enquanto me apoiei no sofá e comecei a me levantar. Os dois se aproximaram para me ajudar – E não estamos juntos. – Ah, então você só está se escondendo de vergonha? – Não estou com vergonha – chiei. – Mas também não quero falar com ele agora. É um direito meu, tudo bem? – É, ela só quer ficar aqui por um tempo para deixá-lo preocupado. Rick, sinceramente, você é homem e não entende nada de jogo de sedução. – De orgulho – eu corrigi. – De orgulho – ela repetiu. – Certo – ele se rendeu. – Só fiquei preocupado com vocês duas. Mas se vocês estão bem, o resto, definitivamente, não é da minha conta. Ele se despediu e saiu. Andy manteve a porta entreaberta e sussurrou para fora: – Não diga a ele que ela está aqui. Puta merda, Andy. Cala essa boca. Se Holt estiver a menos de um quilômetro ele vai te ouvir, sua maluca.


Ela voltou para onde eu estava, sentada no sofá, levantando os polegares. Estava animada com a conspiração. Apoiei a testa contra a mão. – Rick não vai falar nada. Encarei ela com descrença no olhar. Meu problema não era Rick, ele era o ser humano mais discreto das redondezas. Tinha certeza de que ele não ia falar nada. Meu problema era ela. – O que a gente faz agora? Seu pé está bem? Holt disse que você estava mal. Tem que tomar algum remédio? Posso ligar para a farmácia. – Não. Vou ficar bem. Mais batidas na porta. Que inferno. Estava começando a me sentir em um programa de tevê no qual não parava de aparecer convidados. Andy fez uma careta para mim e eu me recostei contra o sofá. Estava exausta. Se fosse Holt, que me visse ali de uma vez e pronto. Ela entreabriu a porta e eu ouvi sua voz irritada. – O que você quer? – Vi Dominique vindo até aqui. Ela parece ter brigado com o marido. Se ela precisar de um lugar para ficar…. Eric. Eric, Eric, Eric. Maldito Eric. Levantei do sofá com uma força de vontade sobrenatural. Não liguei para o meu pé, para minha mão ou para o fato de que Holt poderia me ver. Puxei o resto da porta e encarei seus olhos maliciosos. – Dom! Vim até aqui ver se… – Não me chame de Dom – disse levantando o indicador. – Dom – ele sorriu, como se estivesse levando na brincadeira. – Não me ouviu? Eu disse para não me chamar de Dom. – Mas… – Mas nada. Não me chame de Dom. Você não me conhece. Não é meu amigo. – Tudo bem – ele deu um passo para trás e sorriu. – Posso falar com você em particular? – Olhou para Andy quando pronunciou as últimas palavras. Ela cruzou os braços e ficou firme ao meu lado, como quem diz “Me faça sair daqui, imbecil”. – O que você tiver que dizer para mim, pode dizer na frente dela. Eu sempre quis dizer isso. Mas nunca tive ninguém em que eu confiasse o suficiente. Não que eu confiasse na maluca do sutiã de arco-íris. O objetivo era só irritá-lo. E estava tendo sucesso. – Seu marido está chateado porque… – Meu marido não está chateado com nada. – Mas porque… – Não é da sua conta. – Certo. Você quer vir ficar comigo e com a Shelbi esta noite? – Não.


– Ela não se incomoda. Acho que ela adora você – ele tinha um sorriso descarado. Senti a dor dentro de mim aumentar. – Não quero mais nada com você, Eric. Ia fechar a porta na cara dele, mas ele colocou o antebraço no meio do caminho e me impediu. – Por quê? Pronto! Agora eu precisava de motivo para não querer mais um homem! Eu podia ter dito que ele tinha entendido errado: que eu não era casada e não sabia que ele era. Mas o que ia conseguir com isso? – Por quê? – perguntei de volta. – É. Por quê? – ele repetiu. – Porque você tem um pau minúsculo e eu sou uma mulher que exige potência. Enfiei o punho com força contra o seu ombro e ele foi empurrado para trás. Fechei a porta na cara dele e girei a chave. Pela expressão no rosto de Andy eu imaginei que ela bateria palmas para mim assim que saísse de seu estado de torpor. Fazia tempo que eu não sentia tanto orgulho de algo que eu tinha feito.

Andy nem cogitou me levar para o quarto de hóspedes. Aparentemente, a preocupação de Holt a comoveu e, agora, ela tinha tomado para si a missão de ser minha guardiã. Eu estava debilitada demais, triste demais, cansada demais… Simplesmente deixei que ela me guiasse. Tomei banho com dificuldade e vesti umas roupas emprestadas antes de me deitar na cama de Andy. – Vou ficar aqui com você. Não quero que você passe mal e morra de madrugada. – Não vou passar mal e morrer. – Não vai mesmo, porque eu vou estar aqui. Sorri. Tive pouquíssimos amigos na minha vida, mas Andy conseguia ser a mais inesperada. Ela me odiava, ou pelo menos tinha me odiado. E foi bastante recíproco. Mas agora, estava usando sua casa como refúgio e estava sendo bem-vinda. Mesmo depois de ter sido horrível com ela. Coloquei a cabeça contra o travesseiro enquanto ela colocava uma almofada embaixo do meu tornozelo machucado. A palavra estava vindo à minha boca. Tinha um gosto estranho. Um gosto que eu nunca tinha experimentado antes. – Desculpe. Ela me observou intrigada. Para ela era só uma palavra. Para mim era uma barreira que eu nunca havia rompido. Sempre assumi as consequências de todas as minhas ações de queixo levantado e nunca me desculpei por nada. Mesmo quando era pequena e o meu pai me obrigava a aceitar que tinha cometido um erro, ainda era difícil me convencer a cuspir aquela palavra. Mesmo que a contragosto. – Não devia ter te provocado na fila do supermercado ou ter sido grossa com você – expliquei. – Desculpe. Ela abanou a mão para mim.


– Eu não sou exatamente inocente. Também fui bem perversa com você. Eu abri um sorriso inexpressivo e fechei os olhos. – Boa noite, Andy. – Boa noite, Dom.

Fiquei parado no meio da rua. Ainda não tinha conseguido processar completamente os eventos dos últimos minutos. Parte de mim sabia que Dominique podia me pegar na cama com uma mulher. E parte de mim queria isso com vontade. Deixá-la ultrajada e enciumada. Mas… Mas ela saiu correndo. O que diabos tinha acontecido? Nunca vi Thoen fugir de lugar nenhum e, em todos os cenários criados pela minha imaginação, aquela cena nunca acabava desse jeito. Pelo que eu conhecia dela, até se convidar para se juntar a nós seria uma reação mais esperada do que aquela fuga. Ela está machucada. Ai, que merda! Ela estava machucada e correndo por aí. Para onde ela tinha ido? Imaginei que pudesse ter ido para a casa da vizinha, mas para Dominique pedir ajuda a um vizinho… Não, ela não estava escondida em algum lugar. Talvez um táxi tenha passado… Olhei ao redor para a rua deserta. Quais eram as chances? Droga, Dom, aonde você foi? Ela não podia ter ido muito longe. Não com aquele pé machucado. Correu para algum lugar. Vai se acalmar e logo estará de volta. Passei a mão pelos cabelos e desejei que não demorasse muito. Queria conversar com ela. Queria explicar e ter certeza de que ela estava bem. Por que diabos se importar, Greg? A mulher é horrível! Não… Esfreguei a testa com violência. Não, ela não é. Ela só precisa de um pouco de tempo. Voltei para casa e a voz feminina no topo da escada chamou minha atenção. Meus olhos ávidos se levantaram procurando Dom. – Greg? O que houve? – Ah, Lynn. – Não consegui esconder a decepção em minha voz. Como eu tinha conseguido esquecer tão rapidamente da mulher que tinha acabado de estar comigo na cama? Não é você que eu quero. Meu coração estava comprimido dentro do peito, batendo acelerado e triste. Eu quero ela. – Visita inesperada? – Lynn brincou. – Não exatamente – disse, coçando a testa. – E eu? – sorriu, um pouco sem jeito. – Fico ou vou? Hesitei durante alguns segundos enquanto decidia o jeito certo de mandá-la embora, apenas para descobrir que não havia jeito certo. – Sinto muito – foi tudo que consegui dizer. – Tudo bem. – Ela desceu as escadas e me deu um beijo na bochecha. – Nos falamos depois. Vai ficar me devendo, Holt.


Sorri sem achar nenhuma graça e a acompanhei até seu carro. Me despedi, desculpei e agradeci várias vezes. Mas, no final, tinha sido melhor assim. Eu ia fingir que estava com Dom o tempo inteiro e acabar magoando os sentimentos da pobre mulher em minha jornada egoísta. Sentei no sofá e ter magoado Lynn sumiu completamente da minha lista de prioridades. Respirei fundo, tentando me acalmar, mas sabia que seria impossível. Seria impossível fazer qualquer coisa que não fosse me preocupar com Dominique.

Acordei cedo demais. Como sempre. A primeira coisa que pensei assim que abri os olhos foi em Holt. Será que ele ainda estava preocupado ou já tinha me mandando para o inferno? E a piranha? Será que ela tinha dormido lá com ele? Ainda deviam ser as primeiras horas da manhã. Andy estava roncando ao meu lado. Cocei os olhos. Era melhor eu voltar para a casa de Holt. Na verdade, não era melhor. Mas era o que eu queria. Precisava saber se ela estava lá, se ela tinha dormido lá. Levantei vagarosamente e coloquei minhas roupas de volta. Lavei o rosto e joguei um antisséptico na boca, antes de deixar um bilhete para Andy. Era impressionante como você podia escrever bilhetes curtos quando aprendia a usar todas as palavras. Escrevi “Obrigada” e “Desculpe” antes de assinar e deixei o papel do pequeno bloco de notas em cima do travesseiro que eu tinha usado. Pousei as roupas emprestadas dobradas em cima de uma das cadeiras no canto e desci as escadas segurando no corrimão. Atravessei os gramados devagar, destranquei a porta de Holt tentando fazer o mínimo de barulho possível. Eu podia ouvir a tevê ligada na sala. Tentei pisar na ponta dos pés, mas aquilo doeu mais que a morte e eu logo desisti. Greg estava deitado no sofá ainda com as roupas da noite anterior. Tinha dormido quase sentado e a tevê ainda estava ligada em um canal qualquer. Ia deixá-lo ali e subir para me deitar. Fingir que nada tinha acontecido seria interessante. Iria dizer que passei a noite fora, como já tinha dito a ele que pretendia fazer, e que ele estava dormindo no sofá quando eu cheguei. Já tinha colocado o pé no primeiro degrau da escada quando escutei sua voz em minha mente. “Ela está machucada. Estou preocupado.” Ele tinha ido até a casa da vizinha e exposto sua privacidade porque estava preocupado comigo. Ele provavelmente tinha passado a noite em claro esperando que eu voltasse. Não podia simplesmente deixá-lo ali, deitado de qualquer jeito, para acordar cansado e com uma dor horrível na coluna. Me aproximei e me dobrei sobre ele. Toquei seu ombro com cuidado. – Greg? – chamei baixinho – Greg, você dormiu no sofá. Ele abriu os olhos e se levantou assustado. – Dominique! Droga! – Ele esfregou os olhos com os dedos – Onde você se enfiou? – Eu saí – as palavras saíram secas. Eu não conseguia mentir para ele. Eu não queria mentir para ele. Talvez se a piranha ainda estivesse ali, eu dissesse que tinha passado a noite com um homem entre minhas pernas. Mas se ele estivesse sozinho, se tivesse passado a noite me esperando… Eu não poderia mentir.


– Saiu para onde? Droga! – ele repetiu e se levantou. – Você está bem? – começou a me tocar nos braços e pernas inspecionando meus machucados – Você perdeu o juízo? – Sou uma mulher adulta. – Você! – gritou apontando o indicador contra o meu nariz. – É uma criança! – Eu conseguia sentir a ira em sua voz. Ele estava com muita, muita raiva. E isso não é fácil de conseguir assim que se acorda. Quando ele finalmente decidiu que eu não estava machucada, virou de costas e foi ao banheiro. Eu estava colocando ração para Max quando ele voltou. – Será que você pode, por favor, se sentar ou se deitar antes que perca o pé? – Eu estou bem. – Pois então perca o pé. Não me importo mais com você. Que se dane. Ele se virou e foi embora mais uma vez. Eu fiquei congelada no meio da cozinha segurando o medidor de ração. Parecia que ele tinha passado a noite inteira cozinhando um ódio absoluto contra mim e agora ele estava simplesmente incontrolável. Comecei a colocar água para o cachorro quando ele voltou. – Não vai perder o pé – ele gritou. Por que ele estava gritando? – Não na minha casa. Porque aí você vai me processar e a gente já sabe como isso termina. Com você ganhando e eu sendo deixado para trás para ferver em fúria eterna – ele jogou os braços do lado do corpo em um claro sinal de exaustão. – Você está falando como uma pessoa louca. – Sabe quem faz isso comigo? VOCÊ! Para onde DIABOS você foi? Você está com o pé machucado. E o braço. E metade do corpo! E saiu correndo como uma criança pequena pela rua no meio da noite. Nem uma ligação, nem uma mensagem. E se você tivesse caído em algum lugar? E se estivesse ferida? E se precisasse de ajuda? – Eu estava bem. – Minha respiração estava começando a falhar. Estava embriagada pela ideia de que ele se importava tanto. – Mas eu não sabia disso, sabia? E você não se importou, não é? Ah, não! Ele não ia se fazer de vítima! De jeito nenhum! – Não imaginei que você fosse se preocupar! Por que iria? Você parecia bem distraído se divertindo em cima da sua amiga. – Era uma mulher que eu conheço e que trouxe para dentro da minha casa para transar comigo na minha cama. Você tem algum problema com isso? – Você podia, pelo menos, ter fechado a porta. – Não achei que você estivesse em casa. – Pois eu estava. E fui obrigada a ver aquela cena pífia. – Pífia? – É, Holt. – Ah, cala a boca, Dominique. – Cale a boca, você, Gregory. Estava bastante ávido para me julgar quando era eu quem estava transando com alguém e quando eu faço o mesmo você age como se eu estivesse em uma discussão sem propósito. – É a minha casa! E eu não sabia que você estava aqui! Será que você não vê a diferença? – E o que foi que eu fiz? Eu te xinguei ou te humilhei? Eu gritei com a sua amiga? – Não. Você soltou um cachorro em cima da gente. – Isso foi tudo o Max. Não pode me responsabilizar pelo seu cachorro.


Ele tinha as duas mãos enfiadas no cabelo como se não soubesse mais o que dizer. – Vai embora. – Como é? – Vou colocar você no próximo avião de volta pra casa. – Não vou embora até… – Você pode levar a merda do vídeo com você. Aqui. – Ele jogou o celular na minha direção. – Leve tudo. Eu não ligo. Você… Eu não aguento mais. Senti o ardor subir pelos meus olhos mais uma vez. Mas dessa vez a raiva era maior que a dor e eu tive certeza de que não ia chorar. – E você não entende por que eu me fecho para as pessoas. É exatamente por causa disso, Gregory! Por causa de escrotos egocêntricos como você – disse enfiando meu indicador no seu peito com força e ele hesitou. – Que me usam do jeito que lhes convém e depois me descartam como se eu não fosse nada. – E desde quando você liga para como as pessoas te tratam? – Vai se foder. – Vai você. – O moralista supremo. Passou dias querendo me convencer de que eu era uma pessoa ruim e que deveria ser mais como você. E o que é que você faz, seu cretino? Você usou um vídeo contra mim e quando desistiu da brincadeira me joga fora? – Te jogo fora? EU TE BEIJEI! Eu queria continuar te beijando e o que você fez? Você… – Eu me apaixonei por você! E não sabia como lidar com isso. Aí você traz uma vagabunda e coloca ela nua na sua cama e quer que eu faça o quê? Fique assistindo como se eu fosse oca por dentro? É, eu fui embora, Holt. Dormi na casa de uma amiga e se você se preocupa tanto com o meu bem-estar como gosta de demonstrar talvez devesse ter pensado antes de trazer uma mulher aqui. – Você me mandou embora. – Quando? Quando eu te mandei embora? – Você disse que não queria. E disse que era perda de tempo – Ele apontava o dedo para mim como se estivesse se agarrando em suas memórias para não afundar. – Você está tirando tudo que eu disse de contexto. – Dominique! – Ele bateu a mão contra a mesa – Pare de advogar! – Eu fiz uma merda, Holt. Bem grande e… As palavras grudaram na minha garganta e ficaram ali. – O quê? O que foi que você fez? Tudo bem. Acho que vai ser agora, então. – O cara que eu fiquei. No primeiro dia quando cheguei aqui. Travei o queixo e respirei fundo. Aconteça o que acontecer, eu não vou chorar. – O que tem ele? – Eu estava com raiva de você. Queria te magoar e fiquei com ele por vingança. – Me diz algo que eu ainda não sei. – Eu não sabia nada sobre ele. E, antes de ontem, eu descobri algo e… Eu tive certeza de que você ia me odiar. – Você não me conhece tão bem assim, Thoen. Por que não experimenta me contar? Olhei para ele em silêncio. Eu queria que ele não me odiasse. Queria que ele me beijasse e me abraçasse. Mas aquilo não ia acontecer. Ele tinha me mandado embora e depois que eu falasse sobre Eric… O que ele poderia


fazer? – O que tem ele, Dominique? – ele perguntou olhando para mim – É algum pedófilo? Um extorturador nazista? – Eu passei os dedos pelos cabelos – Testemunha de Jeová? – Eu sorri – Casado? Levantei meu rosto em sua direção inconscientemente. – Casado – ele repetiu se apoiando contra o balcão da cozinha. – Era isso que você estava pensando enquanto me beijava? Que tinha transado com um homem casado no meu sofá? – Não faz isso ser pior do que já é, Holt. Por favor. – Acho que era de se esperar. Quero dizer, você deve ter uma cartela de bingo em algum lugar, não é? Com coisas horríveis que tem que fazer para vencer na vida. Essa é uma delas? – Para. – Se você queria arranjar problemas para mim na minha vizinhança nova, Dom. Parabéns. Conseguiu um bem grande. – Cala a boca. – Dessa vez fui eu quem bati a mão contra a mesa. A mão machucada. A dor destruiu meu orgulho, minha teimosia e minha força de vontade. As lágrimas vieram inundando tudo. – Nunca na minha vida. NUNCA! – eu cuspia as palavras com fúria – Eu nunca nem fiquei com um homem comprometido. E eu não vou ficar aqui ouvindo você me julgar e me condenar sem nem me conhecer. Eu não sabia que ele era casado. – As palavras estavam jorrando pela minha boca como se estivessem esperando em fila para serem ditas – Ele deu em cima de mim e eu queria te magoar e fiquei com ele. E aí você começou… Você começou a ser maravilhoso e eu comecei a sentir algo por você. Não sabia o que você ia pensar. Imaginava que seria algo assim. – Apontei para ele com nojo, indicando a situação – Por isso não quis deixar você me comer, Holt. Já que era só isso que você queria. Porque estava sentindo algo por você e não queria que você se arrependesse de ter ficado comigo sem saber o que aconteceu. Não queria que isso aparecesse para você como uma surpresa. Então, me desculpe se eu fui imbecil o suficiente para me preocupar com o que você ia pensar. Eu estava chorando. Mas não era um choro descompensado de dor. Era um choro contido de ódio. Ele abaixou os olhos para o balcão. – Me desculpe. Eu não devia… – Devia. Eu sou a megera insuportável, não é? Eu posso ser ambiciosa e lutar com afinco pelo que eu quero, Gregory. Mas eu nunca roubei, matei ou traí ninguém. Não conscientemente. – Eu estava com raiva, porque você foi embora sem falar nada e… – Eu não sabia – sussurrei. Ele se aproximou e pegou a mão machucada que eu abraçava contra o corpo. – Aqui. Deixa eu ver. – Você não é médico. – Ainda assim, deixa eu ver. Segurou meu pulso com cuidado enquanto o verificava. – Está doendo? – Muito pouco. Ele se virou para os frascos de remédios em um pote em cima do balcão. – Aqui – disse, me entregando uma pílula. – Não precisa, eu… – Dominique, por favor… – Sua voz estava tão cansada que eu aceitei sem nenhuma reclamação adicional. – Vai melhorar – ele acrescentou. Greg continuou a segurar minha mão machucada e com a outra mão envolveu minha cintura tentando aliviar o peso do meu pé. Não estava adiantando muito, mas era bom ser abraçada ainda


assim. – Você disse que estava apaixonada por mim – ele estava sério. – Acho que disse – resmunguei. Ele sorriu encarando o chão. Foi um gesto simples, mas tão recheado de dor e ressentimento que apertou meu coração. – Eu não sabia, Holt. Se você quiser nunca mais na sua vida acreditar em nada que eu digo, faça isso. Mas acredite só dessa vez. – Eu precisava daquilo. Mesmo que ele não me quisesse. Precisava que ele soubesse e que realmente acreditasse que eu era inocente. Pelo menos dessa vez. – Eu juro que não sabia. Por favor, acredite. – Tinha uma vaga noção de que minha voz firme estava se tornando um choramingo sussurrado cada vez mais cheio de dor – Se não acreditar em mais nada, acredite nisso. – Ele levantou os olhos para mim – Por favor, acredite. Pode acreditar em mim? Ele sorriu e segurou meu queixo entre o indicador e o polegar. Um leve toque pra alinhar meu rosto ao seu. E ele me beijou. Como eu podia sentir tanta saudade de uma coisa que só tinha experimentado uma única vez? Segurei seu rosto antes que ele pensasse em desistir. Mas desistir não tinha passado pela sua cabeça. Ele manteve seus lábios nos meus, sua língua na minha e por um bom tempo sua boca era a única coisa em que eu conseguia pensar. Depois de vários segundos ele me soltou do beijo, mas me manteve envolta no abraço. – Você pode se deitar, por favor? – ele acariciava seu nariz contra o meu e eu percebi que não seria capaz de lhe recusar nada. – Ou se sentar… qualquer coisa assim. – Posso. Greg segurou meu rosto entre suas mãos e enfiou os dedos em meus cabelos. Vi um princípio de um sorriso se formando e meu coração se iluminou. – O que foi? – Eu estou morrendo de sono – ele confessou e apoiou a testa contra a minha. Eu ri com ele. – Vem, Holt. Vamos te botar na cama.


Capítulo 11 “– Diga-me, Scarlett. Você nunca se cansa de casar com homens que não ama? – Ah, como foi que você saiu da cadeia? Por que não te enforcaram?” Rhett e Scarlett – E o vento levou – Aqui – ele me deu o controle da tevê assim que decidiu que eu estava deitada e confortável o suficiente. – Acho que prefiro ler. – Aquela coisa horrível com estupradores e assassinos? Não. – Eu sei que eu devia ter defendido a minha vontade, mas ele estava tirando a roupa e eu hesitei. – O que… O que você está… – Não vou dormir de calça jeans. – Eu pude vê-lo usando nada a não ser sua cueca boxer preta por uma fração de segundo antes de ele se enfiar debaixo do edredom ao meu lado. – E não faça essa cara. Nós já vimos um ao outro em situações bem piores. – Ele me apertou em um abraço rápido enquanto me beijava na bochecha e depois em um breve selinho. Eu ri. Era verdade… – Você tem certeza de que não quer que eu fique em outro quarto? Se você passou a noite em claro, devia dormir, e eu não quero incomodar. – Por nada no mundo eu iria querer sair dali e, sinceramente, não fazia a menor ideia de onde estava vindo tanta educação da minha parte. Mas Holt tinha colocado o seu travesseiro no meu colo e se deitou de bruços com os braços ao redor do meu quadril e eu percebi que ele também não queria que eu saísse. – Quando a gente te deixa sem supervisão você sai correndo por aí com esse pé machucado. Acho que vou ficar aqui para ter certeza de que você vai ficar quieta. Coloquei as mãos em seus cabelos e comecei a fazer um cafuné lento e carinhoso. Ele gemeu baixinho. Em poucos minutos senti sua respiração ficar mais pesada e tive certeza de que ele tinha dormido. Agora eu podia admirar cada linha, cada músculo torneado, cada centímetro de pele e cada fio de cabelo pelo tempo que eu quisesse e sem qualquer constrangimento. Ficava indo e vindo no cafuné, alternando com carinhos em seus braços e suas costas. Vez ou outra eu sentia seu abraço no meu quadril apertar involuntariamente e fiquei encantada por alguns minutos, vendo ele dormir e me aproveitando da liberdade absoluta para tocá-lo. Nunca me considerei uma pessoa muito romântica e, apesar de nos últimos dias ter começado a perceber que poderia conseguir ser romântica, ainda assim eu precisava confessar: ver uma pessoa dormir é chato. Não tem nada de muito maravilhoso ou encantador. Eu preferia Holt acordado e me beijando enlouquecidamente. E depois que eu já tinha apertado cada pedacinho de músculo que tive vontade, comecei a ficar entediada e acabei ligando a televisão. Apertei o botão do mudo e escolhi um documentário legendado sobre o vale do Loire. Mantive


minhas mãos em Holt em uma mistura incessante de cafunés e carinhos enquanto alternava minha atenção da região francesa de castelos para sua respiração densa. Max apareceu na porta do quarto e ficou lá parado por alguns segundos enquanto me observava. Imaginei que se ele falasse diria “Vocês já se entenderam ou vão continuar gritando? Porque se forem gritar eu vou dormir lá embaixo”. Dei alguns tapinhas na cama e ele abanou o rabo e aceitou o convite. Mas assim que ele colocou as duas patas dianteiras na lateral da cama eu me arrependi, empurrei suas patas com cuidado e indiquei que ele ficasse no chão. Ele não era treinado o suficiente para entender de primeira. Mas entendeu ainda assim. Recostei nos travesseiros e voltei a me concentrar no documentário. A legenda falava sobre arquitetura, arte e fatos históricos enquanto as imagens mostravam castelos, florestas, tapeçarias e pinturas. Em algum lugar entre Chambord e Chenonceau, acho que adormeci.

Era um pouco depois de meio-dia quando acordei. A impressão que tinha era que tinha caído contra o colo de Dominique e apagado em poucos segundos. A tevê estava ligada no mudo e Dom estava quieta embaixo de mim. Virei o rosto apoiando o queixo contra o seu estômago e vi seus olhos fechados e os braços caídos relaxadamente. Ela deve ter pegado no sono logo depois de mim. Voltei a enfiar a cabeça no travesseiro e puxei minhas mãos contra seu quadril. Estava resistindo ao impulso de movimentar meus dedos com leveza ao longo do seu corpo e senti-la todinha. Falhei grosseiramente e logo estava buscando sua cintura ou o alto de suas coxas. Notei um movimento no chão e vi Max se sentar ao nosso lado. Ele estava me olhando de um jeito estranho, como se quisesse chamar minha atenção e, de repente, eu tive certeza de que ele ia latir. Estiquei o braço e o segurei pelo focinho bem a tempo. Seus grandes olhos castanhos estavam firmes em mim. Comecei a me levantar com cuidado e senti Dominique se mexendo. Congelei em uma posição pouco confortável ainda em cima da cama, tentando evitar que ela acordasse. Peguei algumas roupas antes de entrar no banheiro e fechar a porta atrás de mim. Meus cabelos estavam espalhados para todos os lados. Passei a mão por eles com força, tentando deixá-los de um jeito arrepiado mais natural e comportado. Eles ficaram ainda mais bagunçados e eu desisti. Comecei a me vestir… Quando tirei a roupa para dormir há algumas horas atrás, parte de mim esperava que a ousada Dominique me seguisse. Esperava que ela dissesse que também estava pouco confortável com aquela roupa e que preferia dormir nua. Queria que ela me pedisse ajuda para fazer isso. Mas acho que no fim foi melhor que ela não tenha feito isso ou eu, definitivamente, não teria conseguido dormir. Atravessei o quarto na ponta dos pés e desci até a cozinha. Dei comida a Max antes que ele começasse a latir desesperadamente e estressasse Thoen. Porque isso era de uma probabilidade monstruosa. Apoiei meus punhos fechados contra a cintura e olhei ao redor. Eu podia fazer algo como um café da manhã para ela, não podia? Expirei cansadamente. Não, eu não podia. Ia ficar horrível. Mas eu podia tentar. Apertei um botão e o tablet pediu a minha senha. Entrei no navegador e comecei a buscar o passo a passo de coisas que algumas pessoas parecem nascer sabendo, como fritar ovos, fazer panquecas


ou um café que não seja venenoso. Meia hora e uma cozinha descomunalmente suja depois, consegui fazer algo razoável. Olhei pela porta da cozinha e vi algumas flores crescendo no jardim de trás. Escolhi uma pequena e delicada. Não queria nada óbvio demais ou Dominique iria rir e me chamar de menininha. Estava começando a ficar sem opções do que fazer para agradar uma mulher que não tinha um osso de romantismo no corpo. Entrei no quarto e encontrei a cama vazia. – O que é isso? – ela estava mancando atrás de mim. Devia ter acordado já fazia algum tempo, porque estava com os cabelos molhados saídos do banho. – Vou trazer a coleira do Max para prender você. Parece incapaz de repousar. – Só levantei para tomar banho. Segurei seus braços para lhe dar apoio e a ajudei a deitar-se mais uma vez. – Trouxe comida. – Estou vendo – ela riu. – E estou impressionada. É comestível? – Ela tinha um sorriso safado e aquele lábio delicioso preso entre os dentes. Eu me aproximei do seu rosto e a beijei passando a língua no lábio que ela mordia e depois o suguei. Nossa… Era bom demais poder beijá-la quando me dava vontade. – É – respondi, com os olhos ainda fechados. – Vamos experimentar, então. A comida estava horrível. Bem, talvez não horrível. Mas não estava deliciosa. Seria bom viver em um mundo em que eu poderia dizer que Dominique comeu sem reclamar. Mas nesse universo em que vivemos, isso não seria verdade: ela criticou a cada mordida. O interessante é que aquilo não me irritou. Pelo contrário, eu ria como um imbecil a cada novo comentário, novo sorriso, novo toque. Só ouvir sua voz me aquecia. – E então? O que vamos fazer hoje? – ela quis saber. Tinha uma sobrancelha levantada para mim e eu imaginei que tinha um duplo sentido em suas palavras. Mas preferi ter cuidado. Eu poderia ter apenas imaginado o duplo sentido. – Tentar dominar o mundo? – brinquei, e ela me empurrou. – Não sei. Mas tem que ser alguma coisa que não envolva levantar dessa cama – acrescentei, tentando dar obviedade ao meu duplo sentindo. – Acho que consigo pensar em uma coisa ou duas – ela sorriu e, dessa vez, eu tive certeza de que vi safadeza em seu sorriso.

– Não acredito que você fez isso! – eu não conseguia parar de rir. – O que você queria que eu fizesse? Eles prepararam o bolo com tanto cuidado. – Você é a pessoa mais gentil do universo! Como alguém come algo de que tem alergia e corre o risco de ter um choque anafilático e morrer, só para não deixar alguém triste? – É, eu sei. Pensando bem, eu acho que foi imbecil da minha parte fazer isso. – Só um pouquinho – provoquei. – E você? Qual foi a coisa mais estúpida que já fez? – Fora me masturbar do lado de fora e subir no telhado para pegar uma bola, você quer dizer? – Obviamente – riu.


– Não sei. – Eu queria pensar em algo interessante. – Quando era menor eu aprontava algumas brincadeiras bobas com a minha mãe. Eram bobagens de criança, mas eu sempre me sentia melhor. Era como se eu estivesse me vingando dela aos pouquinhos pelo o que ela tinha feito comigo e com o meu pai. – Isso não é estúpido. É brincadeira de criança. – Uma vez eu coloquei pimenta na pasta de dentes dela. Enfiei um canudo dentro do tubo e sai jogando molho de pimenta e misturando com a pasta. Ela me pegou no ato e eu fingi que era outra coisa. Ela então pediu que eu escovasse os dentes com aquela pasta. – Aí você teve que admitir? – Admitir? Holt… Parece que não me conhece. Eu passei o mês inteiro usando a pasta. Agora era ele quem ria compulsivamente. – Certo. Isso foi bem estúpido também. E isso tudo só para não admitir que estava fazendo coisa errada. – Admitir jamais! Ele riu. – O que houve com sua mãe? Quero dizer, onde ela está? – Não sei. Ela se mudou depois que se divorciou do seu segundo marido. Soube que ela tinha encontrado outro homem rico que a queria. Deve ter se casado de novo. – Vocês não têm nenhum contato? – Eu ainda tentei acreditar que poderíamos superar o que ela fez. Mas depois que seu segundo marido deu em cima de mim pela terceira vez e, pela terceira vez, ela não acreditou em mim, eu resolvi que já bastava. – Ele chegou a te… sabe? – A se aproveitar de mim? Não. Eram só palavras e insinuações. Uma vez ele chegou bem perto de me tocar. Só uma vez. – E o que houve? – Eu dei uma joelhada na virilha dele com tanta força que tivemos que chamar uma ambulância. Nunca mais ele se meteu comigo. Ele riu colocando a mão sobre a parte interna das coxas. – Eu sabia que você era perigosa, mas não tanto. – E olha que eu nem fazia muay thai na época. Imagina se tivesse sido agora. – Calma. Calma. Calma. Você faz muay thai? – ele parecia impressionado. – Gosto de poder me defender sozinha. Ele mordeu os lábios em admiração. – E você? – perguntei – Algum esporte? – Comecei a fazer kickboxing faz um tempo. Mas cresci fazendo esgrima e equitação. – Minha nossa… Você é tão… rico – dei risada. – Hey! Eu não tinha escolha naquela época. Vai! Você embaralha. – Jogou as cartas na minha direção. – Mas mesmo que tivesse, acho que ainda faria equitação. Adoro cavalos. Comecei a dar as cartas. – E a sua mãe? Onde ela está? Vocês ainda tem contato? – Não muito. Ela está em uma instituição. Ficava muito longe de onde eu morava, não tinha condições de ir até lá com frequência. – Que instituição? – É um lugar onde pessoas ricas colocam os parentes com os quais não querem lidar. Minha avó


enfiou ela lá depois… Depois de uns problemas. – Hmm. Entendo. E onde fica? – Fica… Fica aqui perto, na verdade. A uma hora, uma hora e meia de distância. – E por que você não vai visitá-la? – Talvez eu faça isso – ele sorriu, pegando as cartas que eu lhe entreguei e soube que ele estava mentindo. – Hey! E o meu vídeo! Você me disse mais cedo que eu poderia pegá-lo. Eu quero. – Isso foi mais cedo, Dom. Você é advogada, sabe como funciona: se você não aceita a proposta de conciliação na hora, não vale de nada depois. – Piscou um olho para mim. – E, além disso, isso foi antes de você dizer que estava apaixonada por mim. Isso muda tudo. – Por quê? – Porque agora eu vou, finalmente, poder ver aquele vídeo sem me sentir um tarado pervertido. – Quem disse? – O senso comum – brincou. – Mas você é um frouxo mesmo – ri. Ele se virou para mim, incomodado. – Posso saber por quê? – Porque você pode ter ao vivo e fica pensando em um vídeo. Ele hesitou por três segundos antes de tomar as cartas da minha mão e se aproximar. – Não me provoque, Thoen. Eu venci a distância que faltava entre nós e deixei minha boca a alguns centímetros da dele. Eu ainda não estava completamente excitada: estava só brincando de provocar. Inspirei profundamente e vi seu olhar acompanhar minha boca. – Frouxo – sussurrei. – Você está brincando com fogo. – Frouxo – repeti. – Frouxo? Você sabe a quantidade de coragem que um homem tem que ter pra resistir a essa tua bunda linda? – Linda? Mas você ainda nem viu nada! E sabe por quê? – Por quê? – ele tinha um sorriso sacana estampado no meio da cara. – Porque você é frouxo. Ele enfiou uma das mãos no meio das minhas pernas, tão alto na minha coxa que as pontas de seus dedos estavam quase tocando minha calcinha. Eu queria que ele subisse a mão. Nem que fosse só mais um pouquinho. – O que é que eu tenho que fazer pra você calar a boca? – ele estava sussurrando contra a minha pele. – Acho que vai ter que me foder. – Você diz que está apaixonada por mim e poucas horas depois já está falando em foder. É impressionante como você é romântica. – Melhor ser pouco romântica do que ser frouxo. Sua mão avançou violenta e arrancou minha calcinha. Senti seus dedos roçarem meu clitóris e a umidez tomou conta de minhas partes íntimas. Ele enfiou minha boca na sua e a sugou com força. – Cala a boca – ele disse quando finalmente me soltou do beijo. Seus dedos estavam ali, timidamente me bolinando. – Diz pra mim, Holt, quantas vezes ainda vou ter que te chamar de frouxo antes de…


Ele levantou meu vestido. Minha calcinha, que já estava nos meus joelhos, sumiu de vez. Puxei sua camisa e espalhei minhas mãos no seu tórax. Agora sim. Holt arrancou toda minha roupa pela cabeça antes de colocar seus dedos no meu clitóris mais uma vez. Fechei os olhos e meu corpo arqueou ao seu toque. Senti seu hálito quente contra o meu ouvido. – A única coisa que eu quero ouvir saindo dessa tua boca é aquele gemido delicioso. Não foi intencional. Não foi para provocá-lo ou excitá-lo. Mas foi só ouvir esse sussurro quente e delicioso e eu já estava gemendo. Seus braços me envolveram e ele começou a abrir meu sutiã. Se eu não estivesse tão colossalmente excitada, teria pensando em agradecer por ele não estar destruindo o bojo da minha lingerie cara. Mas eu estava encharcada e insanamente desabotoando suas calças. Seu pau latejava de desejo contra o tecido. Mas eu não queria ele ali, queria ele nas minhas mãos. Ele estava com uma boxer cinza agora. A cintura estava baixa e eu podia passar meus dedos por aquele caminho da felicidade enlouquecedor. Ele me beijava com paixão e luxúria e eu devolvia na mesma intensidade. Senti suas mãos em meus joelhos forçando minhas pernas a se abrirem. Um de meus pés bateu contra a ponta da cama. Greg hesitou e só voltou depois que viu que o pé que tinha batido não era o machucado. Enfiei as mãos por dentro de sua cueca e apertei sua bunda com gosto. Depois me ocupei em tirar do caminho o resto de tecido que ainda o cobria e segurei sua ereção com força, massageando da base até a ponta e de volta. Ele fechou os olhos e agora era ele quem gemia. – Acho que eu quero você na minha boca – confessei. – Depois – ele disse, e havia urgência na sua voz. – Eu não aguento mais esperar por esse teu corpo. Você queria que eu te fodesse, não era? Acho que é isso que eu vou fazer. Seus lábios estavam no meu queixo e no meu pescoço. As mãos de Holt me apertavam com força e desespero. Era como se ele não aguentasse esperar mais nem um segundo, como se precisasse do meu corpo inteiro de uma só vez. Seu pau estava na entrada da minha vagina, me acariciando de leve, raspando no meu clitóris, me deixando louca de desejo. – Para, Holt. Enfia esse pau em mim de uma vez. – Agora era eu quem não estava aguentando. Ele ainda estava me beijando no rosto e no pescoço enquanto eu rebolava, tentando forçar seu pênis contra minha vagina. Mas Holt estava no controle e ia ser quando ele quisesse, na velocidade em que ele quisesse. – Ah, você não faz a menor ideia de há quanto tempo eu estou cheio de tesão por essa tua bocetinha. Vou comer ela bem devagarzinho. Eu estava pronta para gozar ali mesmo. Sem penetração nem nada. Só com aquele roçado delicioso e aquela voz contra o meu pescoço. Minhas mãos se perderam em seu cabelo e ele fazendo uma trilha de beijos até meus seios. Eu continuava rebolando, e ele desceu uma das mãos até o próprio pau e o segurou a uma distância segura de mim, raspando o membro contra meus pelos ralos e experimentando minha umidez, um pouquinho de cada vez. Eu gemi alto enquanto Holt segurava um dos meus peitos com a boca. Beijava, lambia e mordia um mamilo. E depois o outro. Eu tentava me empurrar para baixo e me contorcia sob o seu corpo apenas para encontrar seu pau ainda longe demais. – Quero ver se você vai ter coragem de continuar usando aqueles shortinhos minúsculos agora. –


Ele voltou para a minha boca. – Depois de experimentar isso aqui eu não quero mais saber. Rebola essa tua bunda na minha frente de novo e eu como ela todinha. – Quem sabe? Talvez se você se comportar eu deixe você meter onde você quiser. Parece que aquela última frase foi demais pra Holt e eu senti seu pau me rasgar. Ele tinha dito que ia me comer devagar, mas acho que aquilo ia exigir um autocontrole que ele não tinha mais. Socava com força e eu queria que fosse mais rápido, mais forte. Queria ele em mim até o talo. Queria que socasse até doer. Acho que Holt estava perto de gozar, porque ele parou ofegante e espremeu os lábios contra os meus. – Fica de quatro? Lambi sua boca e o beijei antes de ele sair de dentro de mim para que eu me virasse. Suas mãos seguraram minha bunda, me mantendo firme, e ele meteu na minha boceta mais uma vez. Seu toque ia do meu quadril para minha cintura e de volta para a minha bunda. Me empinei para que ele pudesse ver meu corpo do jeito que eu sabia que ele queria. Comer Dominique Thoen de quatro. É, aquele soava como um desejo que ele poderia ter. E eu ia realizar cada centímetro dele. Rebolei e o senti se dobrar contra mim com suas mãos em meus seios. O suor grudava meus cabelos nas minhas bochechas e no meu pescoço. Holt estocava rápido e com força. Senti uma de suas mãos esfregando minha coluna, enquanto a outra passeou pelo meu estômago e atingiu meu clitóris. Ele ainda estava socando quando seus dedos beliscaram meu clitóris e o seguraram em um aperto indescritivelmente delicioso. Eu comecei a gozar e ele meteu ainda mais forte e ainda mais rápido. Acho que passei uns quinze segundos gozando.


Capítulo 12 “Abra os olhos e olhe pra mim. Não, eu não vou te beijar. Apesar de que você precisa ser beijada. Muito.” Rhett – E o vento levou Gregory se mexeu rápido demais e eu acordei. – Porcaria. – Ele levantou da cama em um pulo, e eu tive uma visão privilegiada daquela bunda gostosa enquanto ele corria para o banheiro. – São nove horas! Virei de lado na cama e vi Max levantar a cabeça apenas para deitá-la de novo no chão, ignorando o desespero do seu dono. – Achei que você era super responsável, Holt – provoquei. – Não sabe usar um despertador? Ele entreabriu a porta do banheiro e eu o vi enfiando suas calças sociais. A braguilha ainda aberta exibia a cintura da sua cueca e aquela torneirinha abençoada. Tirou a escova de dentes da boca: – Não faz isso, Dom. – Ele tinha nervosismo nos olhos, e eu achei que era melhor colaborar. – Relaxe! Ninguém vai nem notar. – Fora o juiz – disse, cuspindo a pasta. – Você tem uma audiência? – arregalei os olhos para ele e me senti subitamente desperta. Holt estava fazendo que sim com a cabeça e terminando de abotoar a camisa. Sacudi o edredom para longe e fui abrir a gaveta das gravatas. Escolhi uma verde sóbria e me aproximei. Greg ainda estava vencendo os botões da camisa e seu nervosismo se transformou em um sorriso sapeca assim que coloquei meus braços ao seu redor para dar o nó na sua gravata. – Acho que você ficar nua assim tão perto de mim não vai ser bom para a minha pontualidade. Puxei o nó com força e ele engasgou. – Concentre-se – aconselhei enquanto ele ajustava o nó e acariciava o próprio pescoço fazendo uma careta para mim. Deixei-o calçando as meias e virei para o guarda-roupa, plenamente consciente de que seus olhos estavam cravados na minha bunda. Abri uma das portas e me abaixei para pegar um par de sapatos. Seria mentira se eu dissesse que não me empinei exageradamente só pra ele. Seria mentira também se eu dissesse que não tinha achado os sapatos imediatamente e fingi que ainda estava procurando alguma coisa só para lhe dar mais tempo de me observar. Uma mão escorregou pela minha bunda e se enfiou entre as minhas coxas. Ia me levantar quando senti a força de uma de suas mãos contra minhas costas e a outra procurando meu clitóris. Dois toques rápidos e eu estava úmida. Não muito. Mas mesmo assim, úmida. Ele meteu dois dedos em mim e eu levantei. Dessa vez ele tinha deixado. Empurrei seu braço rindo e Holt me prendeu entre o guarda-roupa e seu corpo. Moveu os dedos dentro da minha vagina e eu suspirei. Sua mão estava na minha cintura, subindo para o meu seio. Seu desejo estava no meu corpo,


mas seus olhos estavam nos meus. Seu olhar calmo e profundo me consumia e congelava quando tirou os dedos de mim e os levou vagarosamente até a própria boca. Fechou os olhos e chupou como se tivesse chocolate derretido nas mãos. Gemeu, passou a língua nos lábios e me observou por segundos inteiros antes que eu finalmente o lembrasse: – O juiz está esperando. – Merda! – Levantou as mãos para a cabeça e me largou. Me apoiei nos joelhos rindo de seu jeito moleque desesperado. Holt correu pelo quarto pegando paletó, carteira e chaves, e eu ia buscar minhas roupas quando ele voltou completamente vestido e segurou minha cintura nua mais uma vez. Me beijou longamente. Me soltou, beijou a base do meu seio, então o mamilo. Eu ri e ele beijou minha boca mais uma vez. – Tente não correr uma maratona hoje, por favor. Levantei a mão em juramento. Ele me beijou mais uma vez e saiu.

Eu não ia passar o dia inteiro na cama. De jeito nenhum. Os hematomas no meu corpo já começavam a mudar de cor e o meu reduzido conhecimento em medicina me dizia que isso era um bom sinal. Meu braço e meu pé estavam consideravelmente melhores e, de um modo geral, eu me sentia muito bem. Mas talvez isso fosse só a dose concentrada de endorfinas da noite anterior ainda gritando pelo meu corpo. Meu trabalho árduo durante a semana garantiu que eu não tivesse muito o que arrumar na casa de Holt nessa segunda-feira. Eu escolhi algumas caixas incompreensíveis e comecei a organizá-las. A caixa classificada como “Presentes de Natal” era composta pela mais variada coleção de tralhas que Gregory deveria ter ganhado de presente de natal ao longo dos anos. Boa parte delas de colegas de trabalho, eu supus. Reconheci uma caneca aqui e uma caneta ali que eu também tinha ganhado em determinado momento, e que pareciam ter sido compradas no mesmo lugar. Pontos para os nossos colegas de trabalho pela praticidade… Eu, particularmente, nunca me preocupei em dar presentes de fim de ano para ninguém. Nem para mim mesma. Eu geralmente passava a véspera de Natal na festa que um dos sócios majoritários organizava todos os anos, e o dia de Natal na Sopa da Lauren. De noite, eu ouvia Art Blakey e comia panetone. Era a isso que se resumia minhas comemorações natalinas. Uma corrente de ar frio passou me arrepiando e eu coloquei os braços ao meu redor para me aquecer. Os moleques da rua estavam andando de skate e acenaram para mim quando eu fui fechar a janela. Acenei de volta antes de voltar aos meus afazeres. Misturei a caixa de presentes de Natal com a das coisas que Holt queria olhar e jogar fora. Achei que as duas combinavam. Agora, só me restava tirá-las do meio do caminho. Na garagem elas ficariam bem até Holt decidir verificá-las, provavelmente no dia de São Nunca. A ideia foi boa e simples. A execução estava se mostrando um pouco mais complicada. As caixas eram pesadas demais para o meu braço e pé. Precisei de alguns minutos e de uns goles de suco para ter uma ideia. – Hey! – chamei. – Vocês querem ganhar uns trocados?


Os moleques pararam e se aproximaram. – Com o quê? – Preciso levar umas caixas para a garagem, mas estou com o braço machucado. E… – lembrei de mais uma coisa. – A grama precisa ser cortada. O que acham? Eu estava marchando meus pequenos duendes de casa para a garagem e de volta para a casa, quando Andy apareceu. – Você sumiu. – ela tinha um ar crítico. Como sempre. – Mas como não ouvi notícias suas pelo resto do dia, achei que era uma coisa boa – riu. – Você e Holt…? – Andy! Crianças! – reclamei. – O que é isso, por sinal? Está explorando trabalho infantil, agora? – Elas estão sendo pagas pelos seus serviços. – É assim que trabalho infantil funciona, Dom – torceu o nariz. Nosso breve momento de amizade e confissões estava ficando cada vez mais distante na minha memória e eu voltava a achá-la insuportável com uma velocidade impressionante. – Se quiser ajuda, pode me chamar – disse. – Eu e Rick carregaríamos essas coisas para você, se você ainda está doente. – Não estou doente. Só machucada. E consigo me virar muito bem, obrigada. E… – percebi algo que não tinha notado antes. – Vocês não tem o que fazer, não? – Como assim? – Ela quis saber enquanto eu abria a carteira para pagar os meninos. – Precisamos de um cortador de grama, sra. Holt. – Eu já disse que não sou casada com ele, não disse? – reclamei. – Esqueci o outro nome – admitiu, e parecia ter medo de mim. – É Thoen. Senhorita Thoen. – Certo. Precisamos de um cortador de grama, senhorita Thoen. Eu estava me lembrando de todos os meus dias de arrumação na casa de Holt… – Não tenho um cortador de grama. – Ahmm… – os três garotos se entreolharam – Podemos pegar um lá em casa. Mas vai custar mais caro. Eu estreitei os olhos para ele. – Pois vá buscar, seu pequeno capitalista – eles correram rindo. – Mas eu quero essa grama perfeita, ouviram? – acrescentei alto. – Você não trabalha? – perguntei a Andy, explicando minha pergunta anterior. – Ah. Trabalho. – Mas está de férias? – Não. – Então o que diabos você faz em casa o dia todo? E o Rick? E a Shelbi? – de repente, notei que ninguém naquele lugar parecia trabalhar. – Eu trabalho com tradução. – Tradução? – É. De livros, sabe? E de documentos. Faço a maior parte do trabalho em casa. – E isso paga bem? Quero dizer, deve pagar, já que você tem uma casa aqui. – Isso não é pergunta que se faça, Dominique – rosnou. – Ah, sim! E perguntar se eu transei com Holt é – devolvi. – E transou? – Ahh… – Joguei a cabeça para trás e esfreguei as têmporas – Vem. Entra. Não vou falar sobre


isso do lado de fora.

– Não acredito que você fala russo. Ela respondeu com algum barulho incompreensível. – E o que isso significa? – Significa “Eu falo russo”, em russo. – Ah. Se algum dia eu precisar de uma tradutora… – É só me chamar – sorriu. – E paga melhor do que você imagina. Mas eu venho de uma família com algumas condições. Não somos ricos, nem nada assim. Eu queria ser artista, logo quando saí de casa, aí recebi um bom dinheiro para começar a vida e o apliquei bem. – Interessante. – Eu estava impressionada. Havia mais na Capitã Planeta do que eu tinha imaginado originalmente – Que tipo de arte você faz? – Escultura, principalmente. Nada muito grandioso. Eu arrisco pintar, de vez em quando. Você gosta de arte? – Gosto daquelas que são exibidas em algum museu na França – brinquei. – Mas feitas pelas minhas mãos? Não. Nunca. Não tenho esse dom. Andy estava me observando de um jeito curioso. Como se eu fosse parte de algum experimento que está dando resultados quase satisfatórios. – O que foi? – Você está agradável. – Não, não estou. Você é que aprendeu como eu sou e parou de me chamar de vagabunda a cada três segundos e meio. Ela riu e engasgou com um gole de água. – Calma. – Dei dois tapinhas em suas costas. – Adorei o jeito como você falou com o Eric. – É. Mas acho que o filho da puta ainda merece um pouco mais de estrago, sabe? – Eu estava gesticulando em uma tentativa de dar forma a minha angústia – Foi bom dizer que ele tem um pinto pequeno, mas eu queria… Eu queria… Colocá-lo nu! – decidi – E apontar. E rir. Ela estava rindo compulsivamente. – E ele tem? O… – … pinto pequeno? Sinceramente, Andy, você precisa começar a conseguir dizer as palavras. Conversar assim é difícil. – É. Pinto pequeno – ela riu. – Tem? – Tem. – afirmei categoricamente – É do tipo que se você não se esfregar, você não goza. Nós começamos a rir e minha mente foi para Shelbi. Acho que a de Andy também, porque ela voltou ao seu copo de água e a brincadeira simplesmente perdeu a graça. – A gente precisa contar para Shelbi. Eu respirei fundo. – Tudo bem. Ela arregalou os olhos para mim. – Você está falando sério? Agora que Holt já sabia, eu podia contar até para o papa. – Estou. Mas por que você ficou tão nervosa?


– Porque… Porque… Eu achava que você ia dizer que não. Achava que você ia me convencer a ficar quieta. Eu abri a boca completamente estupefata. – Se você não quer contar para ela, por que sugeriu? – Porque achei que seria o certo a fazer? – Então, por que queria que eu te convencesse a não fazer? – Porque… sei lá. É o casamento dela. E se a gente estragar tudo? E se eles se divorciarem e for horrível? E se ela sofrer? E se ela… se matar? – Você acha que ela faria isso? Andy levantou os ombros. – Shelbi é uma pessoa muito doce. Não sei o que algo assim faria com ela. Eric é… Ele é sua vida inteira, sabe? Ela não trabalha, quase não tem amigos. Ela vive para ele. Não sei o que acontece quando você tira a razão de uma pessoa assim. – Aí você vem e joga essa bomba em cima de mim? – Eu só queria saber sua opinião! – Você é que é amiga dela! – Nós duas estávamos muito perto de começar a gritar. – Como eu vou saber o que fazer? – Você é mais velha. Tem mais experiência! – Mais velha? Quantos anos você acha que eu tenho? – Não sei… uns vinte e seis? – Vinte e sete! – exclamei. – E você tem… o quê? Vinte e quatro? Vinte e cinco? – Quase vinte e quatro – murmurou. – E você acha que três anos de diferença me dão mais experiência do que você no quesito a vizinha vai se matar de que maneira, exatamente? – Eu não sei o que fazer! – Nem eu! – Diz o que você acha! – Eu não acho nada! Essa coisa toda de tentar fazer o que é certo é novidade para mim! Volte a falar comigo quando tiver um plano. E um bom plano. – Certo. Tudo bem. – Andy gesticulava e eu não sabia se ela estava tentando se acalmar ou me acalmar. – Vamos deixar o assunto de Shelbi de molho por um tempo. Tudo que Andy fez foi dizer as palavras “por um tempo”. Para ela era só um comentário. Para mim tinha uma dimensão muito maior. Meu tempo ali era limitado. Engoli a seco. Logo, logo eu teria que voltar para casa e deixar tudo aquilo para trás. Eu tinha um emprego, uma casa e uma vida. Não podia abandonar tudo. Lembrei de Holt. Lembrei do seu beijo corrido de manhã. Na minha boca. No meu seio. Eu nunca quis aquilo: ter um homem na minha vida. Sempre me pareceu muito mais trabalhoso do que benéfico. E todas as poucas vezes em que decidi experimentar, percebi que eu estava certa. Mas com Holt… Com Holt era diferente. Ou, pelo menos, eu queria que fosse diferente. Tinha algo me incomodando. Algo bem fundo em mim, e eu não sabia expressar em palavras o que era. – O que foi?


Meu silêncio repentino deve ter entregado minhas emoções para Andy. – Eu estou apaixonada pelo Holt. – Ahmm… Já conversamos sobre isso. – Eu contei para ele. – Sério? – Ela deu um pulo. Mas não foi um pulo daqueles que amigas frescas dão quando querem te parabenizar por algo. Não que eu tenha tido muitas amigas frescas. Não que eu tenha tido muitas amigas. Mas o pulo de Andy foi humano e genuíno. Ela estava animada e queria saber o resto da história. – Eu estava certa, não estava? Vocês transaram. – Ela sussurrou a última palavra e eu ri da sua contínua inocência. – Foi, Andy… Se você precisa saber. – E? Foi… romântico? – Rá! – Ela podia ser impossível, mas eu me divertia com ela como jamais tinha me divertido com alguém. – Foi gostoso. – Fechei os olhos. – Muito gostoso. – E qual o problema? – O problema é que eu tenho que ir embora. – O quê? Mas você mora aqui. – Não, não moro. – Olhei pra ela, descrente – Só vim ajudar Holt com a mudança. Eu moro do outro lado do país. Tenho minha vida inteira lá. Estou de férias, e quando elas acabarem, vou ter que voltar. – Não. – Ela se sentou. – Não faz isso. Seu tom me envolveu como um delicado veludo. Acho que iria sentir minha falta. – Não tenho opção – disse levantando um ombro. – Tem sim. A gente te arranja um emprego aqui. – Ela levantou e estava andando pela cozinha como se o movimento pudesse gerar mais ideias. – Eu… Eu te ensino russo! – apontou a mão para mim como se todos os problemas estivessem resolvidos e eu ri. – Não é assim que funciona, Andy. E você sabe. O problema é exatamente esse. Acho que eu gostaria de ficar. Mas não posso. E tenho medo de… de querer mais do que eu já quero. – Não! – Ela me segurou pelos ombros – Não faz isso! – Fazer o quê? Me solta, sua perturbada! – Você vai fazer isso, de novo. – Apontou o indicador para o meio do meu rosto e eu segurei sua mão. – Vai ficar com medo porque vai doer muito na hora de ir embora e aí vai se esconder e não vai viver o que pode viver por medo de uma dor futura. – Certo, obrigada pela dica, Oprah. Vou escutar a garota semivirgem com nenhuma experiência de vida falar sobre os meus assuntos afetivos. – Eu tenho o Rick! E o Thierry, e até a Shelbi. Tenho uns amigos da escola de arte. Tenho um monte de gente legal na minha vida, Dom. E você… – Eu não tenho ninguém – completei as palavras que ela teve a delicadeza de não dizer. – E não é porque você é uma pessoa ruim. Quer dizer – sorriu –, você é bem ruim. – mordeu os lábios como se fosse uma criança que acabou de aprontar. – Mas é esse seu medo horrível de se machucar. Você finalmente admitiu que está apaixonada pelo cara. Transou com ele e tudo. Disse que foi ótimo. Aí se lembra de que vai acabar e desiste de tudo. Se você tem só mais uma semana, vive essa uma semana, ou esse um mês, ou seja lá quanto tempo você ainda tem. E quando doer… quando doer, doeu. – Tenho que admitir que seu discurso faz algum sentido. – Ainda bem. – Ela se jogou sentada na cadeira e abriu um pacote de biscoitos. – Porque se você


voltasse para aquela ladainha de “Não estou nem aí pra ele” quando, claramente, está, eu não ia aguentar. – Você fala como se tivesse passado anos me ouvindo falar sobre Holt – disse, e mostrei a língua pra ela. – Ah, mas quando você começa a falar – Moveu a mão como se tivesse controlando um fantoche –, parece que anos se passaram. Dei uma tapa na sua mão e roubei seu biscoito. Eu não diria que não estava nem aí. Eu não diria isso sobre Holt nunca mais. Seria mentira. Seria uma mentira bem grande. Eu realmente achei que não estava apaixonada por ele. Realmente… Ou será que não? Será que eu estava só me enganando? Não seria minha primeira regra quebrada por causa do Holt, e eu tentei não me deter muito nisso. Não era importante. Não agora. – E o que ele disse? Quero saber todos os detalhes! – Seu sorriso parecia o de uma menininha falando sobre garotos pela primeira vez. – Os detalhes românticos, não os pervertidos – acrescentou com um gesto de desprezo e eu roubei outro biscoito. – E pare de fazer isso, por favor – riu. – Como assim, o que ele disse? – separei as camadas e comi o recheio de chocolate primeiro. Andy fez uma careta impaciente, mas eu realmente não tinha entendido. – Quando você disse que estava apaixonada. O que ele disse? Simples assim, eu tinha colocado nome e sobrenome no meu incômodo. – Ele… Ele não disse nada. – Nada? – tapou a boca, mastigando. – Não, quero dizer… Ele disse muitas coisas, mas… Mas ele não tinha dito como se sentia por mim. Não tinha dito nada. Tinha me chamado de linda, gostosa e impossível. Ele se preocupava, essa parte estava bem clara, mas… Tinha mais alguma coisa? Respirei fundo e encarei Andy. Quando doer, doeu. Talvez aquela dor fosse chegar antes do que eu imaginava.

Algumas batidas na porta do meu escritório chamaram a minha atenção. – Lynn! Entre. Eu sabia que ia me encontrar com ela mais cedo ou mais tarde. Mas depois de todo o episódio no sábado à noite, esperava que fosse mais tarde. – Você está me devendo um jantar. – Com certeza, te devo um pedido de desculpas. Ela fechou a porta atrás de si e se sentou em uma das cadeiras. Sentei na mesa, de frente pra ela. – Espero que tudo tenha se resolvido. – Ela deu um leve aperto no meu joelho e logo me soltou. – Sim, tudo resolvido. – Eu estava irremediavelmente constrangido. Eu a tinha colocado em uma situação de extrema intimidade e agora precisava me desfazer dela e, de preferência, sem muitas perguntas. Lynn ficou sentada de pernas cruzadas me observando como se esperasse que eu dissesse alguma coisa.


Eu enchi o pulmão e fiquei ali, resolvendo se abria ou não a boca. Droga. Eu não fazia a menor ideia do que dizer. – Sua amiga – ela começou. – A do cachorro – sorriu. – Tem uma história ali, não tem? – Uma bem longa – expirei. Eu conseguia sentia a tensão no ar e ela estava impedindo que eu respirasse do jeito que precisava. – Escute, Lynn, eu… Não foi minha intenção te enganar ou algo do gênero. Quando te chamei para sair foi verdadeiro, foi… espontâneo, mas… – Mas tem uma longa história com a moça do cachorro. – Uma bem longa – repeti. – É como assistir a Senhor dos Anéis – murmurou, me oferecendo uma piscadela. – Perdão? – É um filme bem longo. – Verdade… – Eu não estava entendendo. – Chega um ponto em que… Não importa se você está gostando da história ou não. Você simplesmente precisa saber como ela termina. Quero dizer… Você já veio até aqui, não é? Não pode ser trabalho desperdiçado. – Ah – suspirei compreendendo. – Então, termine seu filme, Gregory. – Ela se levantou e apertou meu ombro – E, se ele acabar sendo tão horrível quanto O Senhor dos Anéis – sorriu sugestivamente – Talvez tenha um filme melhor te esperando depois. Ela saiu pensando que tinha deixado um clima de mistério no ar. E só o que eu conseguia pensar era que tinha adorado O Senhor dos Anéis. Os livros e os filmes. Tinha conseguido me concentrar no trabalho perfeitamente bem até agora. Bastou ter conversado com Lynn e eu estava pensando em Dominique mais uma vez. E, por mais incrível que possa parecer diante da situação, não era em seu corpo que eu estava pensando. Aquele corpo que me encheu de desejo e fome por tanto tempo. Mas não… Eu estava pensando em seus olhos. Em sua voz. No jeito como ela tinha amarrado minha gravata. “Eu estou apaixonada por você.” Ela deve ter ido ao inferno, lutado muay thai contra o demônio e voltado antes de ter tomado coragem para se abrir desse jeito. Era impressionante que ela tivesse se permitido chegar a tal nível de vulnerabilidade. Acho que era exatamente por isso que eu não acreditava em uma palavra. Ela não estava apaixonada por mim. Era tesão. E, no momento, ela me quis e fez o que precisava para me ter. Assim como ela fazia em todos os outros aspectos de sua vida. Eu não queria ser só um peão no seu tabuleiro. Não podia me permitir baixar a guarda agora. Eu tinha arrancado uma página do Manual Dominique Thoen de Sobrevivência e o estava seguindo à risca. Ironia do destino, eu acho. Mas agora era eu quem precisava tomar cuidado. Não podia me abrir e correr o risco de ser alguma brincadeira sádica do seu repertório. Se fosse verdade, o tempo diria. Mas se não fosse e eu admitisse como me sentia… Eu não aguentava aquele sorriso. Meu toque nos seus cabelos macios. Ainda me lembrava de sentir seu coração batendo contra minha pele quando ela se deitou sobre mim. Nua. A sensação de acariciar sua espinha e poder beijá-la quando eu quisesse. Cocei os cabelos gastando energia. Nunca tinha me sentido assim na vida.


O jeito como eu me sentia próximo a ela não podia ser explicado em palavras, era… Magnético. Superava qualquer razão e qualquer sentido. Acho que tanto tempo de ódio tinha se transformado em algo absolutamente poderoso e que estava pronto para me consumir. Se eu dissesse as palavras e me permitisse sentir algo por ela, eu sabia que não teria mais volta. Eu não queria dizer as palavras em voz alta. Eu não iria dizer as palavras em voz alta. Mas lá no fundo, em algum lugar dentro de mim, meu coração parecia saber que ela, com todas as suas loucuras e imperfeições, era a mulher da minha vida.

– Dom? – Na cozinha, alimentando o seu cachorro infernal – ela gritou. – Max! Quieto! – ela misturava gritos com risos e eu imaginei que ela e Max estavam começando a se entender. Enfiei a cabeça pela porta. – Tudo certo com vocês dois? – Não exatamente. – Max tinha colocado as patas da frente no balcão e estava disputando uma tigela de cereais que, eu imaginei, Dominique tivesse colocado para ela. – Isso aí se recusa a comer o que a gente serve. Ela estava coçando suas orelhas e empurrando sua tigela para longe. Dominique estava com uma regata que marcava seus seios fartos, a alça escura do sutiã caindo pelo braço. Tinha uma colher enfiada na boca e um sorriso no rosto enquanto brincava e reclamava com meu cachorro. Fiquei parado na porta sorrindo. Eu poderia voltar para casa todos os dias para aquela cena e seria feliz. Ou melhor: Dominique poderia voltar comigo. Ela acabaria de ter destruído alguém em uma audiência com toda a sua inteligência e sagacidade. Eu assistiria fazendo nada além de sussurrar as informações que ela solicitasse, para que a outra parte não fosse ouvida. Voltaríamos para casa, transaríamos no chuveiro e depois ela ia colocar aquela regata. Faria uma tigela de cereal e brincaria com Max enquanto a alça do seu sutiã cairia pelo seu ombro. E eu ficaria sentado em um canto sendo feliz só por fazer parte daquilo. A felicidade pode ser tão simples. – Preciso tomar um banho – falei. Precisava sair dali antes que a pedisse em casamento ou algo igualmente absurdo. – Desço em quinze minutos. – Tá. – Talvez ela fosse dizer mais alguma, mas Max estava pulando mais uma vez. – Para! Cachorro enviado por Satanás! Chega! – Ela levantou com a sua tigela e estava tentando sair do alcance das patas do labrador. Subi as escadas ainda rindo. Coloquei a roupa suja no cesto e liguei a ducha. A água quente lavou meu corpo e eu inspirei o vapor. De um modo geral, estava muito satisfeito com a minha vida. Nunca tive problemas em manter relacionamentos sérios. Mas nunca estive particularmente apaixonado por nenhuma de minhas namoradas também. E essa experiência de viver com uma mulher era interessante. Apesar de que, se eu me casasse com Dominique, nunca iria querer ela em casa o dia inteiro. Ela ia enlouquecer, ia me enlouquecer e


nunca daria certo. E, além do mais, nunca seria uma situação aceitável para ela. Esfreguei o xampu no cabelo com força para trazer minha mente de volta à realidade. Casar com Dominique. Gregory… Escute o que você está falando. Tudo bem que eu já estava batendo na porta dos trinta e que a vontade de me acomodar começava a crescer dentro do peito sem ser convidada. Mas a gente tinha transado uma vez e eu estava pensando em casamento. Gregory Holt, você virou uma mulher do século passado. Com todo o respeito às mulheres e ao século passado. Deixei o rosto contra a água. Um toque delicado no meu quadril me assustou e eu respirei fundo dentro do jato de água. Virei tossindo. Dominique estava nua. Nua e molhada. Nua e molhada, junto comigo, nu e molhado. Isso não ajudou a minha tosse. Nem um pouco. – Calma – ela riu, colocando a mão no meu peito. Meu pênis ainda estava flácido, mas não ia ficar assim por muito tempo. – Vai me matar afogado? Eu sabia que você devia ter um plano – sorri, puxando-a para um abraço. – Droga. Fui desmascarada. – Ela deu um murro leve no meu braço. – Mas o plano era te afogar só depois. – Depois? – Depois – repetiu, sugestiva. – Ah… Então acho que eu vou morrer feliz. Beijei sua boca e desci a mão pela sua bunda. Minha nossa… aquela bunda. A apertei com gosto, forçando-a a mover a pélvis na minha direção. Dom ia reclamar de alguma coisa, mas eu mordi sua boca e não deixei ela se soltar do beijo. Suas mãos estavam no meu pescoço e eu a tinha molhada em meus braços. Espremi seu corpo contra o meu e senti meu pau latejando contra seu quadril. Dom dobrou os braços e empurrou meu tórax para longe. Eu não sabia o que ela estava fazendo, mas eu sabia que ela era uma mulher que não aceita ser contrariada quando decide algo. Apertei meus lábios de desejo e a observei. Gotas de água se acumulavam e escorriam em cada nuance do seu corpo e eu desejei segurá-la e mantê-la parada por alguns minutos para que eu pudesse só memorizar cada detalhe. Ela segurou minhas mãos ao lado do meu corpo para que eu não a tocasse e me beijou. Primeiro na boca, depois no pescoço. Dom me soltou e sorriu pra mim de um jeito tão safado que eu tive vontade de jogá-la contra a parede e fodê-la até ela gritar “Chega”. Mas ela se ajoelhou no box e eu achei que estivesse sonhando. E quando ela passou a língua pela cabeça do meu pau, tive certeza. – Eu disse que queria você na minha boca, não disse? sussurrou contra minha ereção e enfiou minhas bolas na boca. Aninhei meus dedos em seus cabelos e segurei sua cabeça contra mim enquanto aquela boquinha de veludo me lambia e me chupava. Dominique puxou o ar, prendeu a respiração, e eu a assisti enfiar meu pau inteiro na boca. Uma vez e outra. E mais uma. Eu estava gemendo sem controle. Sentia sua boca ao meu redor, seus lábios protegendo os dentes, meu pau chegando na sua garganta. Fez um movimento involuntário para frente, e percebi que devia estar quase gozando. Tentei diminuir a velocidade, mas ela não parou. Não estava mais enfiando meu pau até sua garganta, mas estava deixando que eu fodesse sua boquinha, o que era praticamente tão paradisíaco quanto. Alisei seus cabelos e mantive meus olhos em sua boca, assistindo ao movimento de sua bochecha no ritmo das minhas estocadas. Ela se empinou e arranhou meus testículos com suavidade.


Eu não ia aguentar. Nem mais um segundo. A empurrei para longe um pouco bruscamente demais e ela olhou pra mim confusa. – Vem – chamei. Ela ia falar alguma coisa. Claro que ia. Dominique Thoen sempre precisava questionar uma ordem. Mas meu pau estava furiosamente duro, eu estava pronto para ejacular para todos os lados e não queria que ela não gozasse. A segurei com força e a joguei contra a parede. Pensei em pedir desculpas pela violência, mas ela estava rindo excitada, então simplesmente continuei. Levantei uma de suas pernas pelo joelho e meti com força sem diminuir a brutalidade. Ela começou a gemer meu nome e eu queria que ela parasse, ou eu ia gozar imediatamente. Afastei meu tórax do seu e diminuí a velocidade em uma tentativa de reassumir o controle. Mas aquilo foi pior ainda. Ela rebolava devagar e enfiava os dedos na boca, para depois levá-los aos mamilos em uma dança erótica que fazia minhas entranhas ferverem. Aqueles seios perfeitos se movimentando no nosso ritmo, o quadril grudado no meu… Puta merda. Por que ela tinha que ser tão gostosa? – Dom, eu não aguento mais. – Aguenta sim. – Ela arranhou meu peito. – Não goza ainda, Holt. Me fode mais um pouquinho. Eu a beijei e fiz exatamente o que ela mandou. Estava ficando quase impossível me conter, mas eu me segurei. Mais e mais. Não sei de onde eu estava tirando forças para resistir ao gozo com meu pau enfiado até o talo naquela morena perfeita. E quando ela começou a gemer mais alto, eu aumentei a velocidade. Quanto mais alto ela gemia, mais fundo eu enfiava e com mais força. Até ela gritar. E ela gritou. Gritou meu nome. Bem alto. E ouvir seu grito rouco e louco de desejo chamando meu nome foi mais excitante do que todo o resto. Eu gozei dentro dela com a boca contra o seu pescoço.


Capítulo 13 “Não entenda isso como uma ofensa. Damas nunca me encantaram.” Rhett — E o vento levou Desenhei sua boca com meu indicador e ela me mordeu. – Ai. – Foi só uma mordida de leve. – Doeu. – Frouxo. – Ela tinha uma risadinha safada e sedutora. – A gente vai começar isso de novo? – Se você quiser. – Ela estava passando os dedos pelos músculos no meu estômago e eu quis querer. Mas eu estava fraco, cansado e sonolento. Dom beijou meu queixo e meu pescoço. Eu a abracei com força e a espremi contra os travesseiros. Você quer ser um homem forte, resistente e potente. Mas tem hora que a natureza diz não, agora não dá. E aí você faz o quê? – E então? O que você aprontou, hoje? – Eu precisava mudar de assunto. Fazê-la pensar em algo que não fosse sexo e dar ao soldado pelo menos alguns minutos para se recuperar e ver se ele conseguiria enfrentar mais uma batalha. – Arrumei mais da sua zona. Estou bem perto de acabar, ouviu? Vou querer meu vídeo. Já tinha notado que ela fazia isso. Falava do vídeo quando queria falar de sexo. Isso ia ser difícil. – Vai ter. A casa está incrível, Dom. Eu juro que tenho aquelas fotografias emolduradas da França há anos e nunca as tinha pendurado. – Você não sabe usar um martelo? – ela riu. – Eu acho que nem tenho um martelo. – E não tem mesmo. Tive que pegar um emprestado com o Rick. Que tipo de homem não tem ferramentas? – Ah! E quem está proferindo preconceitos de gênero, agora? – belisquei seu nariz e ela se contorceu entre meu braço e os travesseiros tentando fugir de mim. Ela era linda daquele jeito. Sem qualquer maquiagem. O cabelo despenteado. Vestindo uma de minhas camisas. Obviamente, ela também era linda quando se produzia. Mas era gostoso vê-la assim: sem escudo ou armadura. Vulnerável. – E parece que você fez amizade com os vizinhos. – É. Mas ainda não comprei os presentes de agradecimento que você pediu. – Já tinha me esquecido disso. – Dominique revirou os olhos para mim. – E se eu fizesse uma festa? Uma pequena reunião com os vizinhos, sabe? O que acha?


– Sei lá – deu de ombros. – A casa é sua. – É, mas é você quem já conheceu a comunidade inteira. – Apertei meus dedos em sua cintura e a reação foi um pouco mais exagerada do que eu antecipei – Você sente cosquinhas! – Ah, eu estava maravilhado com a ideia de torturá-la. – Não, não sinto. – Ela estava com a mandíbula travada e segurava minhas mãos com uma força animalesca, mas eu mexi os dedos de novo e ela deu um pulo. – Para, Holt! Para! – ela reclamava e tentava se mexer enquanto eu a mantinha esmagada embaixo de mim, – Peça penico! – expliquei – Peça e eu paro. – Nunca! Pare ou eu jogo o cachorro em cima de você! Parei, rindo. – É, você já mostrou que é profissional em fazer isso. – Rá-rá-rá. – seu sorriso com a língua estirada me fez rir mais ainda. – Acho que vou convidar os vizinhos, então. – Eu posso fazer isso. À medida que sua zona vai ficando sob controle, eu tenho cada vez menos pra fazer. – Tudo bem. Obrigado. Sexta-feira, pode ser? – Não. Pode ser no sábado. Eu ri e beijei sua bochecha. Ela não conseguia parar de ser mandona. – Tem planos para sexta? – Na verdade, tenho. Toda a brincadeira se diluiu e eu me peguei engolindo a seco. Era o que eu imaginava desde o começo: ela estava só brincando comigo? – Tem um encontro, é? – Tentei dar um tom jocoso a minhas palavras, mas senti o incômodo impresso em cada sílaba. Ela me beijou devagar, provocando com sua língua, e eu me acalmei. – Vou ajudar Andy com uma coisa. – Sexta à noite? – É. – Ah. Tudo bem. – O que foi? – Nada, é só que… Acho que seria interessante te levar para um encontro decente algum dia, sabe? – Ajeitei seus cabelos atrás da orelha. – A gente dá um jeito. – É – Beijei sua boca mais uma vez e desejei boa noite antes de apagar a luz. – Greg? – ela me chamou, no escuro, depois de alguns segundos de silêncio. – Sim? – Posso te perguntar uma coisa? É… sobre um assunto delicado. – Pode. Claro. Ela acendeu a luz e eu fiquei preocupado. Dom se sentou na cama e eu me apoiei sobre um cotovelo. Ela tinha a testa nas mãos e parecia seriamente perturbada. – Ei! O que foi? – Acariciei seu braço e me levantei para abraçá-la, mas ela me manteve a uma certa distância. – Eu não sou uma pessoa decente. E você é. – Dom, está tarde para discussões filosóficas – sorri, tentando incentivá-la.


– É que eu não sei o que fazer com uma coisa e… E pensei que talvez você pudesse me dar uma sugestão. – Tudo bem. O que é? – É sobre o cara com quem eu fiquei. – Ela falou rápido, como quem arranca um curativo, e depois ficou em silêncio esperando minha reação. Engoli a seco. Não era um assunto que me agradava, mas ela parecia realmente precisar falar sobre aquilo. – O que tem ele? – O que eu faço? Digo alguma coisa para a mulher dele ou fico quieta e não me meto no que não é da minha conta? – Eu não sei, Dom. Eu não conheço… Não sabia o que dizer. Odiava o homem. Muito. E não era só porque ele era um crápula casado que traía a mulher. Mas porque ele tinha ficado com Dominique. Com a minha Dominique. Tinha colocado suas mãos nojentas nela e beijado sua boca e… E mesmo que ele fosse o solteiro mais solteiro da história do Universo eu ainda o odiaria. Ele ser casado só facilitava a questão. – Acho que isso foi uma má ideia, não é? – Ela se esticou para apagar a luz e eu segurei sua mão. Um relacionamento com Dominique era como uma pescaria: você não pode afastar o peixe. Ela estava se abrindo para mim. Estava pedindo meu conselho e minha ajuda. Se eu a afastasse agora, ela podia nunca mais voltar. – Você é uma pessoa decente. Mesmo que duvide disso às vezes. E é a pessoa mais inteligente que eu conheço. – Está tentando me seduzir com elogios, Holt? – É verdade. Seja lá o que for melhor, eu tenho certeza de que você vai descobrir. E vai fazer a coisa certa. – Você tem confiança demais em uma pessoa que passou a vida inteira fazendo a coisa errada. – Você não fazia coisas erradas, Dom. Você fazia o certo para o que você queria. Você sempre quis se proteger e sempre conseguiu. Se quiser proteger outra pessoa, vai descobrir a coisa certa também. Ela segurou meu rosto entre as mãos e pôs seus lábios nos meus de um jeito tão espontâneo e gentil que eu senti meu corpo inteiro se arrepiar. Talvez aquilo fosse realmente possível. Talvez ela estivesse realmente apaixonada por mim.

Sequei o cabelo, enrolei uma toalha no corpo e abri a porta do box. Gregory estava nu, escovando os dentes. – Você precisa ficar nessa indecência? Ele mordeu a escova, andou na minha direção e arrancou minha toalha. – Ei! – reclamei, me tapando, enquanto ele enrolava minha toalha ao redor do próprio quadril. – Que foi? – Sua dicção estava estranha por causa da pasta na boca – Você não disse que eu devia vestir algo?


– Sim. Mas não o meu algo. – Tentei puxar a toalha de volta e ele lutou por alguns segundos antes de ceder. Estava claramente só tentando me provocar. Se realmente quisesse a toalha, era três vezes mais forte do que eu e teria ficado com ela. Por alguns segundos, é claro: até eu enfiar o pé contra sua virilha e pegar de volta o que me pertencia. – Quando é a audiência da ação de danos morais? – A que você descobriu algo que não quer me dizer? – ele estava vestindo as calças por cima da cueca. – É – sorri satisfeita. – Quero saber quanto tempo você ainda vai fingir que não precisa implorar. – Depois de amanhã. E eu não vou implorar porque eu descobri o que é. Me aproximei dele e fechei um pouco os olhos, analisando a veracidade de suas palavras. Tenho certeza de que vi um sorriso em seus lábios. – Não, você não descobriu – decidi. – Ainda não – completou, vestindo a camisa. – Mas vou descobrir. – Não vai, não – cantei. Eu ia sair do quarto para buscar minhas roupas quando Holt puxou minha toalha mais uma vez. Ia me virar para gritar e lhe dar um tapa, mas, quando dei por mim, ele tinha as mãos na minha cintura e estava me jogando na cama. Vi quando ele abriu a braguilha e colocou a ereção para fora. Mordi minha língua. – Você vai se atrasar. Arreganhou minhas pernas com as mãos fortes e cuspiu na minha vagina para lubrificá-la. – Não vou, não. Eu ainda estava seca quando ele me rasgou e ardeu como o inferno. Mas a sensação da sua camisa de cetim por cima do seu tórax perfeito contra os meus seios logo estava me estimulando loucamente. Foi rápido e gostoso tê-lo me fodendo duro e com força. Ele gozou primeiro, mas não parou de estimular meu clitóris com os dedos até que eu o acompanhasse. Depois se limpou na minha toalha e fechou a braguilha. – Tchau, querida. Já estava na porta quando deu a volta. – Esqueci de perguntar! – disse tocando a testa. – Vamos ter uma pequena comemoração no escritório. Vai ser amanhã à noite. Vem comigo? Mordi o lábio e fiz que sim. Ele sorriu, piscou para mim e se foi.

– Tá. Então a gente fala com a Shelbi. – Você parece mais confiante hoje. O que aconteceu, Greenpeace? A pergunta foi boba e retórica, mas o jeito como ela prendeu a respiração me assustou. – O que foi? – Nada… Não foi nada. – Andy! O que foi? – É que eu conversei com os meninos. Eles também acham que é melhor falar com ela. Meu coração foi até a garganta e disse “Dom, eu acho que vou ficar aqui, hoje”. Respirei fundo e deixei meu mais temível sorriso de fúria transparecer. – Quem são os meninos? O que você disse? E o que eles disseram? – Calma. Não é o que você está pensando – ela disse, levantando as mãos.


– Você não sabe no que eu estou pensando. – Meu corpo inteiro estava rígido e travado. E quando eu falei, meus dentes se recusavam a se separar mais do que poucos milímetros – Responda às perguntas. – Foi só com o Rick e o Thierry. Acabei de passar por lá. E não falei nada sobre você. É só que… Nós todos sabemos que ele faz isso e aí… Achei que era uma bom ideia perguntar o que eles achavam. – Andy, se você contou que… – Não contei nada. Palavra. Não que eu me incomodasse se eles soubessem. Não devia nada a nenhum dos dois. Mas agora que eu tinha que fazer aquilo do jeito certo para Shelbi, todas as decisões ficavam em um território completamente novo e inexplorado para mim. Eu não sabia o que fazer e não queria que nada desse errado. – Tudo bem. Então, nós vamos até lá falar com ela. – É, os meninos acham que ela devia ouvir isso de mulheres. – Pare de chamá-los de meninos, Andy. São dois homens adultos. Ela deu de ombros e sorriu. Eu abri a última caixa que faltava e era a mais incompreensível de todas. A marcação dizia “Lembranças de A.H”. Só faltava aquela. Só aquela e eu poderia dizer a Holt que tudo tinha acabado, apagar o vídeo e ir embora. Senti um aperto no coração, mas sacudi ele para longe e abri a caixa. – O que é isso? – Andy enfiou as mãos no conteúdo da caixa e começo a puxar itens aleatórios. – Estamos arrumando e não bagunçando ainda mais. Se não se incomoda. – Puxei a caixa de música e um pequeno porta-retrato de suas mãos e a vi movendo os lábios rapidamente em uma clara ridicularização do que eu tinha dito. Ia começar a tentar desvendar onde colocar cada coisa quando uma foto chamou a minha atenção. Holt estava sem camisa em uma praia. A data na foto dizia que tinha sido tirada há alguns anos. Antes de nos conhecermos. Havia uma mulher nos seus braços, na foto. Tinha os longos cabelos dourados e os olhos azuis. Sorria como se não tivesse nenhuma preocupação na vida, enquanto Holt lhe fazia cosquinhas. Meu estômago se apertou e se comprimiu. – Quem é? – Andy quis saber por cima do meu ombro. – Não sei – respondi baixinho. – Tem alguma coisa aqui dentro. – Ela estava sacudindo a caixa de música. – Cuidado com isso! – A tomei de suas mãos desajeitadas e abri o fecho com um cuidado exagerado. Tinha uma pequena caixa de veludo lá dentro, e uma embalagem de anel sem nenhuma marcação. Andy arregalou um par de olhos curiosos para mim, mas ela não sabia que eu não precisava de qualquer incentivo: ia abrir aquilo de um jeito ou de outro. O anel que estava lá dentro era deslumbrante. Repleto de diamantes que formavam algo entre uma espiral e uma elaborada rosa sobre o aro de ouro. – Olha! Tem uma inscrição aí. Girei o anel contra a luz e vi a inscrição, em uma caligrafia elegante, que dizia “A. Holt”. Ele não falava sobre sua família. Eu sabia que algo horrível tinha acontecido, ou, pelo menos, algo bem ruim. Mas não sabia exatamente o quê. Agora o passado de Holt começava a tomar forma. Será que ele tinha sido casado?


– Não adianta se preocupar com isso agora. – Andy me arrastava pelo meio da rua até a casa de Shelbi. Eu não estava exatamente preocupada. Eu sabia que ele não era mais casado. Sabia que não era casado há anos. Mas ele não tinha me dado nenhum sinal verbal sobre seus sentimentos e sempre que conversávamos sobre seu passado ele se fechava. Não podia culpá-lo, afinal, eu não era exatamente um livro aberto. “E, além do mais”, minha mente recitou, “daqui a alguns dias você vai embora e nunca mais vai vê-lo de novo”. – Vamos terminar logo com isso. – Qual é o plano? – Plano? – É. A gente não pode simplesmente entrar lá e ir falando. Tem que ter um plano. – Não tem plano, menina. Isso aqui não é um episódio de Scooby Doo. A gente vai entrar lá e vai conversar com ela. Só isso. – Será que vocês podem sair do meu gramado? Virei para observar. Era a coroa estranha do outro dia. A dos bolinhos. Eu tinha perguntado o nome dela? – Vai cuidar da sua vida, Madeleine! – Ótimo. Andy também não gostava dela. – Mas você é grossa, hein, Andrea? – Só com quem merece! – Pois então você devia manter sua boca suja longe de mim. – Qual o seu problema? – perguntei. – Você fica o dia todo na varanda esperando alguma oportunidade para gritar com as pessoas? – Só quero que saiam do meu gramado. – Ela nos enxotou com um gesto. – Se for me tratar como um bicho eu vou acabar te mordendo – ameacei. – Mas olha para isso. Você achou uma amiga tão grossa quanto você, Andrea. Já dizia o ditado que cobras só andam em par. – Como é? – Eu dei alguns passos ameaçadores em sua direção e notei que Andy, ao invés de me impedir, estava me acompanhando. Se continuasse assim a bruxa ia apanhar… – Só quero que vocês saiam da minha propriedade. – Ela estava dando alguns passos para trás e eu não parei de avançar. – Já teríamos saído se a senhora não tivesse nos chamado. – Exagerei na entonação do “senhora” para que ela se sentisse umas oitenta vezes mais velha. Depois de tantos dias de meiguice, a Dominique Vadia estava voltando com força. Era bom saber que ela não tinha me abandonado. – Se continuarem aqui eu chamo a polícia. Andy hesitou ao meu lado e eu senti que ela me observava. – Por que não faz isso? Eu aproveito e presto queixa de calúnia contra a senhora. – Calúnia? Mas que diabos você está fazendo? – Está me acusando de invadir propriedade privada quando só viemos até aqui porque a senhora nos chamou. Isso é calúnia, querida. – Vocês estavam aí antes… – Ela tentava ser firme. Mas não há firmeza diante da minha fúria. – Não me lembro dos fatos assim. E você Andy? – Ah, por favor, garota, colabora!


– Eu me lembro das coisas do jeito que Dominique falou. – Apontou para mim. Isso! Essa é a minha menina! – A casa de vocês duas é pro outro lado. O que estão fazendo aqui? – Estamos indo visitar a Shelbi, não que seja da sua conta. – Ela tinha as mãos na cintura. – Vão tricotar com a esquisita, é? – É o quê? – Andy voltou a avançar e dessa vez fui eu quem a acompanhei. – Não me teste, velha. Ela colocou a mão contra o peito, chocada. – Saiam da minha propriedade! – gritou antes de se enfiar na casa e bater a porta. – Mas será possível que ninguém nessa vizinhança tem um emprego? E qual é a da maluca? – perguntei, apontando o polegar para a casa atrás de nós enquanto continuávamos pela rua. – Sei lá. Ela já foi casada com um cara rico. Ou oito. E agora está acabada, mal amada e… – Mal comida. – completei. Andy riu contra as mãos. Respirei fundo e coloquei os ombros para trás. – Pronta? – Já estava com a mão na campainha. – Pronta.

– Tem certeza de que não querem mais alguma coisa? Shelbi não parava de nos oferecer comida, bebida e sabe-se Deus mais o quê. Andy sorria enquanto eu encarava minhas unhas. Nós queríamos começar a conversar sobre algo que envolvesse nosso objetivo, mas nenhuma de nós duas tinha coragem de quebrar o gelo. A boa e velha Dominique Vadia contaria tudo antes de dar dois passos dentro da casa. Ou teria mandado uma mensagem de texto dizendo “Seu marido escroto deu em cima de mim e eu transei com ele sem saber que ele era casado. Descobri agora e estou te contando. Boa sorte”. Mas dar a notícia de um modo que não magoasse Shelbi além do necessário ou que a fizesse ter vontade de se matar exigia um tato que eu não tinha. Fiquei ali analisando minhas francesinhas e pensando em por que diabos eu tinha decidido que aquilo era uma boa ideia. Não havia nenhum cenário em que aquela coisa toda fosse acabar bem. Nenhum. – Muitas coisas para fazer hoje? – Andy tinha as mãos no joelho e eu me perguntei se ela estava se preparando para levantar e correr. – Só o de sempre – sorriu, servindo-se de algo da bandeja. – E vocês duas? – Ah, só… – nos entreolhamos –, o de sempre também. – Andy repetiu constrangida. – E o Eric? Onde está? – No escritório. Teve que encontrar uns clientes. – Ela tinha um sorriso orgulhoso na boca. Parecia que ter se casado era a maior conquista da sua vida. Senti uma pena imensurável. Mas não era hora de me doer com os pormenores. Eu estava ali para fazer uma coisa e, pelo amor que eu sentia pelo meu pai, eu iria fazê-la! – Ele é um cara legal, não é? O Eric? Andy… Que merda é essa, menina? Você não começa a contar sobre a traição de um cara dizendo que ele é legal. – Ah! Ele é ótimo! Vocês precisam ver o que ele me deu de Natal no ano passado. – Ela levantou correndo do seu jeito urgente e eu enfiei minhas unhas no joelho de Andy.


– “Ele é um cara legal?” Você perdeu o juízo? – sussurrei. – Não! Mas você não estava dizendo nada. – Ela gesticulava enfurecida. – Melhor do que elogiar o cara! Você esqueceu o que a gente veio fazer aqui? – Dominique, a gente precisa puxar o assunto de algum jeito! – E dizer “Poxa! Seu marido é bem legal” – fingi uma voz sonsa – “Sim! E, por sinal… Ele está te traindo” é uma boa ideia? Esse é o seu plano? – Eu não tenho um plano! – rosnou – Porque isso não é “um episódio de Scooby Doo”, lembra? – Tá, tá, tá. Shelbi estava voltando, mas Andy não tinha calado a boca. – Eu queria ter um plano! Mas você tem que fingir que sabe de tudo. Mesmo quando não sabe – chiou. – Psss! – abanei a mão para que ela se calasse e ela encarou Shelbi, que retornava afobada, com um sorriso vazio. – Olhem que coisa linda! Ela abriu uma caixa preta da Cartier e, descansando sobre a almofada de veludo, estava a bijuteria de vidro mais falsa que eu já tinha visto na minha vida. – Não é perfeito? E é Cartier – ela sussurrou a palavra arregalando os olhos com ares de mistério e sacudiu os ombros empolgadamente. Eu tentei dissimular o desconforto e abrir um sorriso de falsa admiração. Uma coisa que quem me conhece percebe com facilidade é que eu tenho vários sorrisos: O sedutor, o eu quero alguma coisa, o saia do meu caminho e até mesmo o que demonstra uma gratidão que eu não sinto. Todos esses eu sempre fui capaz de simular com uma atuação digna de um Oscar. Já o meu sorriso de falsa admiração ou o de falsa alegria pela felicidade alheia… Bem… Nunca tive muita prática com nenhum dos dois. Shelbi estava contando como não sabia onde usar uma peça tão cara, Andy estava impressionada que o crápula do marido traidor fosse capaz de tamanha gentileza e eu tinha enfiado minha testa na mão e estava encarando o chão pela simples falta de saber o que fazer comigo mesma. O cara tinha comprado uma coisa de vidro colorido para enrolar no pescoço em alguma zona de livre importação, vulgo, mercadinho chinês da esquina. Tinha colocado em uma caixa usada para relógios e eu estava ali tendo que engolir a vontade de gritar que aquilo era mais falso que o meu sorriso. Andy olhou para mim e abriu a boca em admiração como quem diz “Não é que ele não é de todo mal?”, e eu revirei os olhos diante de sua inocência. – Vocês terminaram? Eu vou tirar logo a bandeja do caminho e deixar tudo limpinho. Eric fica nervoso quando chega cansado e a casa está suja. Eu olhei para a sala que brilhava impecável. Eu posso ter milhões de defeitos. Bilhões até. Mas eu sempre fui limpinha. Quase ao ponto de ser fresca. E a sala de estar de Shelbi era deslumbrante até para os meus padrões. Onde estava a sujeira? Ela tirou a bandeja e eu perguntei se ela precisava de ajuda. – Não querida, eu resolvo. Sente aí – gesticulou, e eu parei o movimento a meio caminho de me levantar. Andy me deu quatro tapas na coxa. Com força. – Ai! – Ela estava me batendo? Ela ficou louca? – Você viu o tamanho daqueles diamantes?


Ai, meu deus… – Dominique! – continuou –, talvez a gente esteja vendo isso do jeito errado. E se eles se amam, mas… Sei lá… Ele pula a cerca de vez em quando e ela não liga. Por que a gente vai se meter? – Garota! Presta atenção! – Tive vontade de estalar os dedos no meio da cara dela para ver se a trazia de volta a realidade – Aquela porcaria é falsa. – Você tem certeza? – Tinha mais do que dúvida em seu rosto. Tinha descrença. Ela não acreditava em mim. – Eu posso não ter berço nobre, mas se tem uma coisa de qualidade que eu aprendi a reconhecer nessa vida é um diamante. E, meu bem, naquela caixa não tinha nenhum. – Mas como você sabe que… – Nenhum! – repeti para que ela se calasse. Shelbi estava de volta com um pano nas mãos e Andy se sentou contra o encosto do sofá encarando a mesinha de centro e desejando que eu estivesse errada. – O que está fazendo? – A anfitriã estava limpando o lugar onde a bandeja havia estado há alguns segundos. – Limpando – sorriu. – Só para o ambiente ficar fresquinho e agradável para as visitas! Hi-hi! – Seu risinho era quase tão ridículo quanto toda aquela situação, e eu tentei não perder a paciência. – É por causa do Eric, Shelbi? É por causa dele que você é tão preocupada com limpeza? – Também. – Seu sorriso ficou mais discreto, e ela levantou um ombro quase como se estivesse se desculpando – Ele é tão bom para mim que eu tento fazer o que posso por ele. Para lembrá-lo por que ele se casou comigo. – Seu riso agora ficou estridente e eu me senti profundamente triste por ela. – Juro por Deus que não mereço aquele homem. Basta. Olhei pra Andy e senti que já bastava para ela também. – Querida, senta aqui. – Percebi que, talvez pela primeira vez em minha vida, a palavra “querida” tinha sido dita com carinho. Não havia sarcasmo ou insulto. Eu só queria que ela ficasse bem. Ela se sentou em uma cadeira na minha frente e eu tomei sua mão nas minhas. Não sabia por que estava fazendo aquilo. Mas é assim que as pessoas fazem nos filmes, não é? Quando tem algo ruim para contar? Elas te abraçam e seguram sua mão como se o simples toque humano fosse capaz de atenuar qualquer dor. – Eu e Andy viemos até aqui porque precisamos te contar uma coisa. Ela me observou com olhos curiosos e com seu eterno sorriso no rosto. Parecia que sua expressão facial não conhecia dia ruim. Eu, por outro lado, me sentia como uma cirurgiã que tinha acabado de sair da sala de operações, sendo que seu parente mais próximo tinha morrido nas minhas mãos. E agora, eu precisava dizer isso para ela. Vamos lá, Dom, comece dizendo que o sangramento foi muito grave e que você fez o que pôde. – Eu não te conheço muito bem, Shelbi. Nem você, nem o Eric. Mas sei que você é uma pessoa boa e, se a vida fosse justa, só coisas boas aconteceriam a pessoas boas. Mas a vida é uma vadia miserável e ela não liga para ninguém. E coisas ruins acontecem com pessoas boas. – Vocês estão me assustando! – ela riu, como se fosse uma brincadeira e apontou o indicador para mim e para Andy como se estivesse esperando que, a qualquer momento, eu anunciasse que era uma pegadinha. – A gente só quer que você saiba que a gente está aqui. – Andy se aproximou e estava alisando o braço de Shelbi. Ótimo. Então, eu tinha acertado na coisa do contato humano. – Você não está sozinha.


– Eu sei. Vocês são ótimas! Mas qual o problema? – Ela estava estranhamente descontraída e eu percebi que ela era como eu. Ela era exatamente como eu. Como Andy. Como qualquer mulher do mundo. Ela não era imbecil. Não era alguma ridícula superficial que adorava onomatopeias. Ela só tinha uma história de vida, uma que eu desconhecia, que a tinha trazido até ali. E, assim como qualquer uma de nós, Shelbi tinha escolhido a maneira como ia lidar com sua vida. E ela tinha escolhido ser desatenta. Era tola por opção. Prestar atenção poderia doer. Então, do mesmo jeito que eu não me aproximava de ninguém para evitar me machucar, Shelbi não queria prestar atenção aos arredores. – Querida, nós achamos que Eric não é um homem bom. – Pff… Bobagem! – Ela soltou nossas mãos e agora eu começava a ver sua expressão mudando. – É verdade, Shelbi. – Você acabou de se mudar para cá, como pode querer julgar meu marido? – Ela estava olhando para mim e seu eterno sorriso tinha sumido. – Mas e eu? – Andy quis saber. – Eu moro aqui há bem mais tempo e concordo com ela. – Achei que vocês duas se detestavam. E aí vêm aqui com essa conversa… Olha, se é algum tipo de brincadeira, eu não estou achando graça. – Eu sei que isso é horrível de ouvir, Shelbi. – Toda sua postura corporal indicava que ela queria se proteger. – Mas Eric não é o bom marido que você pensa. – Eu conseguia parar uma sala de audiência inteira para indicar novas provas, eu conseguia chocar e interessar um júri, eu conseguia dizer para o meu chefe que ele tinha que aumentar meus honorários, em determinada situação eu tinha até mandado um procurador federal calar a boca. Mas eu estava ali, sem saber o que dizer. Respirei fundo. Diga de uma vez. – Ele te trai, Shelbi. – Vocês são ridículas! Isso é absurdo – disse se levantando. – É verdade, Shelbi. Ele já deu até em cima de mim. – Andy estava tentando fazê-la acreditar. – De você? – Havia algo depreciativo no jeito como ela se referiu a Andy. Sua expressão se aproximava de algo que eu acho que era o mais perto que Shelbi já tinha ido da fúria. – Você acha que eu vou acreditar que o MEU Eric ia precisar sair de casa para buscar uma que nem você? Andy mordeu o lábio e estava tentando superar a ofensa. – Shelbi. Nós só achamos que você merecia saber. Não mate as mensageiras. – Ele deu em cima de Dominique, também! Ele dá em cima de todo mundo! – Andy devolveu e eu respirei fundo. Aparentemente, sua tentativa de superar a ofensa falhou grotescamente. Por favor, menina, não piore tudo. – Sabe qual é o problema de vocês? Falta de amor e carinho na vida. – Shelbi estava começando a flutuar entre um grito e um choro, e eu me lembrei de como detesto gente descompensada. – Já cruzei com muitas mulheres como vocês na vida! Mulheres que acham que, para valorizar o que tem, precisam desvalorizar o que a outra tem. – Tudo bem, Shelbi. – Estava tentando não odiá-la. Lembrava de quando vi Holt na cama com outra mulher. Eu também tinha me descompensado, não tinha? Dor faz isso com a gente. E Shelbi estava machucada. – Você está magoada, mas nós estamos aqui para te ajudar. – Era estranho como eu realmente queria ajudar. Eu queria que ela soubesse que eu entendia o que ela estava fazendo. Eu entendi o escudo, a armadura. Eu entendia o conceito de “se proteger acima de todas as outras coisas”. Mas eu também entendia como ser forte, algo que ela desconhecia. Só queria lhe emprestar minha força. Queria lhe emprestar um pouco do meu foda-se, para que ela pudesse aceitar a situação e lutar de volta. – Não quero ajuda. Não quero nada. Não quero ouvir nem mais uma palavra.


O problema de mentir para si mesmo é que você fica além da razão: não ia adiantar continuar a conversa. Não agora. – Certo, então. Nós só viemos te dizer isso. E foi dito: agora você já sabe. Lide com isso como quiser. – Vou lidar com isso como quiser, sim! Fora da minha casa! As duas! Andy estava cravada no sofá com uma atitude de mulher ofendida que queria continuar a briga. Eu me levantei e forcei seu braço para que ela me acompanhasse. – Certo, Shelbi. Estamos indo. – Não acredito que fui tão simpática com vocês! – Ela estava emitindo sons estranhos e eu achei melhor sair dali de uma vez. A porta estourou audivelmente atrás de nós e eu puxei Andy para a calçada. – É. – suspirei – Isso definitivamente não saiu como a gente esperava. – Estão arruinando a vida de mais alguém? – A voz irritante da coroa saiu da janela da sua casa e eu vi seu rosto excessivamente maquiado rindo para nós com desprezo. – Ah, cala a boca! – exclamei e ouvi Andy fazendo eco a minhas palavras.


Capítulo 14 “Francamente, minha querida, eu não dou a mínima.” Rhett – E o vento levou Por que nós fomos parar na casa de Thierry é uma pergunta que eu nunca vou saber responder. – Ela não acreditou. – Você acha que ajuda se a gente também for falar com ela? – Rick quis saber. – Não. – respondi junto com Thierry. – Ela precisa de tempo. – Deixei que ele continuasse – Vocês são muito novos para entender o peso que um casamento tem na vida de uma pessoa. Ela não vai simplesmente desistir assim. – Mas ele não vale de nada! – Andy reclamou. – Para você. E para nós, Andrea. Mas ele ainda é o marido dela. E se ela acredita mais em um vizinho que no próprio marido… – Bem, agora que vocês já foram até lá falar, a gente precisa fazer mais alguma coisa. Não podemos simplesmente abandoná-la. Mais cedo ou mais tarde ela vai perceber que vocês falaram a verdade e vai precisar de alguém. – E se a gente a fizesse perceber? Eric é a fim da Dominique! A gente monta uma cena e a Shelbi pega os dois nus! – É o quê, garota? – Agora era eu quem estava ultrajada – Nunca no universo. Pode arranjar outro plano aí, Pink, porque esse não vai rolar. – Por que eu sou o Pink? – A gente precisa esperar a Shelbi perceber. Ela vai levar o tempo dela. E o tempo é só dela – gesticulei, tentando evitar pegar mais um biscoito, mas aquela porcaria era uma delícia mesmo. – Ninguém tem que se meter. – Mas e se ela nunca admitir? – Era incrível como Rick sempre conseguia soar verdadeiramente preocupado com os problemas alheios. Era como na noite em que ele veio ver se eu e Andy estávamos bem. – Se o que vocês tentaram fazer com que ela se distanciasse dos amigos, tudo que ela vai ter é o marido horrível dela. – Ô vagabunda, por que eu sou o Pink? – Fedelha! Pare de me chamar de vagabunda! – Ei! Ei! – Rick estava batendo palmas. – Será que vocês duas podem se concentrar? O que a gente faz agora? – A gente não faz nada! – decidi. – Entendo sua preocupação, Rick, de verdade. Mas já fizemos o que podia ser feito. Cabe a ela decidir o que vai fazer da vida agora. Não podemos pegá-la pela mão e cuidar para que ela nunca se machuque com nenhum problema da vida. E essa coisa de inventar planos é muito infantil. Temos que pensar e agir como adultos e, como adultos, se nenhum de nós


pretende colocar Shelbi em uma instituição para que alguém fique de olho nela vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana, vamos ter que confiar na capacidade dela de tomar suas próprias decisões. Inclusive sobre continuar a amizade conosco ou não, e se vai continuar casada ou não. Ninguém se mete, ouviu Clube dos Biscoitos? Eles riram e repetiram o nome como se tivessem achado o máximo. Eu revirei os olhos, peguei mais um biscoito e fui embora.

– Vai fazer o que, agora? Eu preferia Max. Se era para ter um bichinho de estimação, ele exigia consideravelmente menos atenção do que Andy. – Vou cuidar da minha vida – expliquei com ar de obviedade. – Vai voltar a arrumar as caixas da ex-mulher do seu namorado? Ah, garota impossível! – Primeiro, ele não é meu namorado. Segundo, não sabemos se ela é a ex-mulher dele. – Tinha um anel de noivado com… – E terceiro! – a interrompi. – Acho que vou deixar a caixa do jeito que está para ele escolher onde vai colocar aquelas coisas. Vou me concentrar nos outros detalhes que faltam para acabar com isso de uma vez e… Ir embora. Respirei fundo. Duas vezes. Três. Conte até dez, Dom. – Você devia perguntar para ele quem ela é. Eu concordei de qualquer jeito, mas, no fundo do meu coração, discordava completamente. Sabia que parecia bobagem, mas ele não disse nada. Ele não disse que estava apaixonado por mim, não disse que me amava, não disse que gostava de mim… Ele não disse nada. Como eu podia mostrar um porta-retrato e perguntar “E essa, quem é?” sem soar possessiva? E, mais importante: e se fosse uma ex-mulher? Ou uma ex-namorada? E se fosse a mulher da sua vida de quem ele se arrependia de ter se separado? Como eu ia ouvir isso? E do que iria me servir? Se Holt me achava gostosa e queria me comer, o sentimento ia ter que ser recíproco: eu ia ter que achá-lo gostoso e comê-lo de volta até meu tempo ali acabar. Não adiantava eu abrir espaço para essa paixão e depois ter que expurgá-lo como a um demônio. – Eu posso perguntar para ele se você quiser. – Ah, ia ser lindo. Uma vizinha que ele nem conhece fazendo perguntas íntimas. Ele nem ia suspeitar que fui eu quem te pediu pra perguntar – disse, sarcástica. – Esse é o problema? Você não quer perguntar? A gente pode tentar descobrir de outro jeito. – “A gente” não vai fazer nada. Eu vou cuidar da minha vida e você vai voltar para o hospício de onde você saiu. Eu ia dar um passo e me afastar dela quando uma palavra que eu havia dito grudou na minha cabeça e me deu uma ideia pouco convencional. – Justo quando eu começava a te achar legal. Eu queria dizer um “Ah, vai trabalhar, garota!”, mas, em vez disso disso, traduzi meu pensamento em voz alta. – Você sabe onde tem uma instituição aqui perto? Para pessoas com problemas? Tipo um asilo ou hospício… Não sei…


– Tá, já entendi a piada. Você quer me levar para lá porque acha que eu sou doida. Rá-rá. Muito engraçado. Eu a segurei pelos ombros. – Estou falando sério. Andy me observou como se estivesse decidindo se eu estava brincando ou não. – A mãe de Holt – expliquei – Ela está internada em uma instituição perto daqui. Uma para pessoas ricas, aparentemente. – A Casa Morghan? – O que é isso? – Fica a pouco mais de uma hora daqui. É um asilo para pessoas que não podem se cuidar. É bem chique e bem caro. – É esse. – Apontei o indicador para ela. – Diz pra mim, desocupada, você tem carro?

Andy é daquelas pessoas que cantam mais alto do que a música do rádio. Se eu não estivesse aprendendo a gostar dela, teria sentido uma vontade louca de esfaqueá-la. – Isso não é invasão de privacidade? Você fazer uma viagem dessas só para perguntar para a mãe do seu namorado se ele já foi casado? – Diminuiu o volume do som quando começaram os comerciais. Havia tantas coisas erradas com aquela frase que eu não soube nem por onde começar. – Quero dizer, não seria mais simples engolir sua vergonha e perguntar para ele? – Não estou com vergonha. E não estava mesmo. O problema não era ter coragem para fazer a pergunta. O problema era ter coragem para engolir o orgulho diante dele. Havia tanta coisa sobre Holt que eu queria saber, e não apenas sobre seu passado: queria saber se ele sentia alguma coisa mais forte por mim ou se já tinha sentido algo parecido por alguma mulher antes de mim. Inclinei minha cabeça pela janela e deixei o vento sacudir meus cabelos. Eu tinha passado da inércia completa para a velocidade máxima quando o assunto era Gregory Holt. Fui de uma época em que não ligava para nada nem para ninguém para um momento em que não conseguia me concentrar nem em um copo d’água sem pensar nele pelo menos três vezes. Tinha uma angústia dentro de mim, e eu precisava arrancá-la de lá. – É infantil, eu sei. Não precisa ficar me lembrando disso a cada três minutos, Andy. – Você é engraçada. – Obrigada – rosnei. – Sério. Você é toda segura e confiante, mas quando o assunto é esse cara, você não se controla, não é? – Mais ou menos – confessei. E ela tinha definido exatamente como eu me sentia. – O que você vai perguntar para ela quando chegar? Olhei para Andy. Ela dirigia com calma e fazia cada pergunta com um genuíno interesse. Quando você não se preocupa com ninguém, ninguém se preocupa com você. Ninguém se preocupava comigo. Ninguém se preocupou comigo por um tempo bem longo. Desde que o meu pai tinha morrido.


Aprendi a não mentir para mim mesma porque eu era minha única amiga e minha única confidente. Não havia mais ninguém. E agora, ali estava ela: com seus cabelos meio pintados de azul, as roupas folgadas, a expressão curiosa. Ela realmente queria saber. E eu realmente queria contar. – Eu não o conheço muito bem. Quer dizer… Até conheço. Acho que essa é a palavra errada – parei por um breve intervalo enquanto esperava a palavra certa surgir. – Compreender! Acho que é isso, eu não o compreendo muito bem. – Ela estava ouvindo. – Eu sei quem ele é, o que ele faz. Sei como bebe o café, como prepara uma defesa… Conheço pessoalmente quase cada um de seus clientes. Já o vi trabalhar e se divertir. Já o vi ser gentil e idiota. Sei como ele beija e como briga. Mas eu não sei por que… Por que ele abandonou a família? Por que ele é gentil com o mundo inteiro, mas não separa um tempo para visitar a própria mãe? Por que ele é lindo, talentoso e simpático e ainda está solteiro? Por que ele acha que eu posso ser uma pessoa boa mesmo depois de ter sido horrível com ele tantas vezes? – Não é isso que você quer – suspirou. – Agora você acha que me entende melhor do que eu mesma? – Não é isso. É só… As coisas que você diz. Você não quer a compreensão do passado. Você quer uma previsão para o futuro. Você não se importa se ele já foi casado ou se ele foi capaz de te enxergar como uma pessoa além de uma megera maldita. Você quer saber o que o levou a sentir carinho por você para prever se ele vai ser capaz de continuar sentindo esse carinho. Se ele é um cara que já foi casado e que já transou com milhões de mulheres, ou se você só acha que ele te deu uma oportunidade, mas na verdade a intenção dele era só te levar para cama, então você vai saber que não há futuro para vocês. Mas se ele nunca amou ninguém, se ele realmente viu algo em você que ninguém mais viu, se ele realmente estiver se esforçando por você… Aí é diferente, não é? – Continuei a observá-la com o canto do olho. Não queria admitir para ela que seu raciocínio fazia sentido. – Mas é claro que você nunca vai admitir isso. Porque para admitir, você precisaria primeiro aceitar que quer algo mais sério e duradouro com Holt. E nós duas sabemos que você não vai fazer isso. Mordi o lábio. Querer algo mais sério e duradouro com Holt implicava tomar tantas decisões diferentes que eu senti minha cabeça começar a latejar. – Chegamos! Andy indicou o rebuscado portão duplo de ferro e reduziu a velocidade. Seja lá qual fosse o passado de Holt, e seja lá quais fossem as previsões para o futuro, eu ia conseguir descobrir. Tudo estava além daqueles portões.

A recepção era maior e mais bonita que a minha casa. O balcão era longo e arredondado e, atrás dele, dois homens e uma mulher aguardavam sentados com uniformes da instituição. A mulher conversava com um dos homens alegremente enquanto o outro falava ao telefone com um tom bastante formal. – Boa tarde. – Boa tarde. Posso ajudar? – A moça olhou para mim e sorriu, simpática. Tentei devolver um sorriso com a mesma intensidade. Não sabia se não familiares podiam visitar pessoas internadas, e


era possível que eu tivesse que pedir aos recepcionistas que ignorassem algumas regras da instituição para permitir o encontro. Então, era melhor ser agradável desde já. – Espero que sim. Vim visitar uma pessoa. – Claro. Levo as senhoritas até lá. Quem é a pessoa? Ótimo, então qualquer um poderia visitar quem quer que fosse. Mas eu ainda tinha um problema… – A sra. Holt. Disse o nome com o máximo de casualidade que consegui, como se aquele sobrenome bastasse. Não sabia o primeiro nome dela e não tinha qualquer meio de descobrir. – A sra. Holt? – Ela me observou intrigada. – Ah, ela vai ficar muito feliz. Quase não recebe visitas. E quem eu devo anunciar? – Dominique Thoen. Sou… amiga do filho dela. Gregory. – Ah, certo! – Ela pegou um telefone e começou a falar com alguém. Atrás dela, notei o homem que não estava ao telefone me observando de um jeito esquisito. Andy estava ao meu lado, distraidamente olhando os panfletos de divulgação do asilo. – Pronto, srta. Thoen. Se puder subir por aquela escada. – Ela indicou uma bela escada de mármore em uma das extremidades do hall. – Um funcionário está esperando pela senhorita no primeiro andar e vai levá-la até a sra. Holt. Só preciso de um documento com foto e da sua assinatura bem… aqui. – Ela indicou um livro de registro que eu assinei prontamente, logo depois que ela verificou meu documento. – A sua amiga também. Andy explicou que ia esperar no hall e a funcionária indicou um lugar confortável, bem iluminado, com uma tevê e muitas revistas, onde ela poderia esperar. Subi os degraus considerando se aquilo era realmente uma boa ideia e acabei decidindo não me preocupar mais com aquilo naquele momento, que já estava ali. – Srta. Thoen? – O funcionário estava fardado, assim como os da recepção, e me recebeu com um sorriso alegre e com uma mão estendida. – Sou eu. – Apertei a mão que ele oferecia. – A sra. Holt está no jardim leste. Por aqui, por favor. Ele me guiou por alguns corredores esnobemente luxuosos e, por fim, a uma varanda larga de pedra branca com uma escada simples que descia até o belo gramado de um rebuscado e colorido jardim. – Ela está bem ali.

Ela estava sentada em uma cadeira de rodas e usava roupas leves e monocromáticas. Haviam colocado um cobertor sobre suas pernas, como fazem com pessoas muito idosas e muito doentes. O estranho é que ela não parecia ser muito idosa ou estar muito doente. Tinha a pele muito branca e enrugada, seu cabelo longo e escuro estava recheado de fios brancos e fortemente preso em um rabo de cavalo. Era magra e possuía algo incrivelmente familiar em seus olhos verdes. Tinha um bordado nas mãos e, assim que me aproximei, percebi que sua habilidade manual era horrível. – Audrey! – O funcionário chamou – Temos uma visita para você. Ela se virou confusa. Olhou do funcionário para mim e de volta para ele, claramente sem compreender. – Sra Holt?


– Eu não falo com repórteres! – exclamou, arrumando o cobertor verde que tinha nas pernas – Já disse isso! – Ela não é… – O funcionário queria ajudar, mas eu não gosto que falem por mim, e levantei a mão pedindo licença. – Não sou jornalista, sra. Holt. Meu nome é Dominique Thoen, não nos conhecemos. Sou amiga do seu filho, Gregory. Sua boca se entreabriu como se ela buscasse oxigênio e, embora seu rosto não demonstrasse qualquer expressão que não fosse surpresa, tenho certeza de que vi uma sombra de alegria em seus olhos. – Ora, sente-se, então! – pediu, indicando um banco de pedra branca ao seu lado. – Sente-se! Sente-se! O funcionário ao meu lado sorriu antes de nos deixar e algo me fez sentir como se aquele fosse o máximo de empolgação dela que ele já tinha presenciado. – Dominique, você disse, não é isso? – Exatamente. Dominique, sra. Holt. – Ah, por favor, pode me chamar de Audrey. Sorri e me sentei ao seu lado. – A que devo o prazer dessa visita? – Agora ela estava sorrindo. Eu já estava me arrependendo de não ter ouvido Andy. Acho que seria inteligente começar a planejar antes de me enfiar de cabeça nessas situações. Passei as últimas horas inteiras pensando em todas as perguntas que eu queria fazer e como aquilo poderia mudar meu jeito de ver Holt e o nosso relacionamento. Se é que teríamos um. Mas eu não tinha pensado nessa parte. Não podia simplesmente aparecer fazendo perguntas. Tinha que lhe dar algum motivo para que ela me respondesse. – Ainda não estou vendo um anel, então, imagino que ainda não tenham noivado? – Perdão? – Ah! – Ela tapou a boca com as mãos. – Eu estou me adiantando. Desculpe! Não recebo muitas visitas, acho que fiquei nervosa. – Não, não tem problema – sorri. Precisava mantê-la falando. – É que eu deduzi que você é a namorada do meu Greg. Quer dizer… Não do meu Greg – ela se corrigiu como se temesse me ofender. – Afinal, por que outro motivo uma amiga de Greg me visitaria? Apertei sua mão com carinho. – Não sou namorada dele, sra. Holt. Não exatamente. – Não precisa medir as palavras para mim, jovem. – Ela segurou minha mão nas suas e por algum motivo eu comecei imediatamente a gostar dela. – Eu sei que os relacionamentos no mundo de hoje são diferentes! – brincou, piscando um olho para mim. – Vocês não gostam de rótulos, eu sei. Eu assisto a novelas aqui dentro, sabia? – riu, e eu a acompanhei. – Para todos os efeitos, sou amiga dele. – Enfatizei na palavra “amiga” sorrindo e ela fez uma careta de quem fingia que acreditava. – E… – Vamos Dom, diga o que veio dizer. – Me preocupo com ele. Greg não fala muito sobre seu passado e… – Ela tinha aqueles olhos verdes firmes em mim. Cheios de carinho, curiosidade e interesse. Cada menção ao nome do filho parecia fazer seu coração bater mais rápido, e eu imaginei que ela não tivesse notícias dele há muito tempo. Eu estava ali para lhe fazer um punhado de perguntas e dar o fora. Mas para ela, eu talvez fosse o primeiro contato com o mundo em sabe-se lá quanto tempo. – A senhora… tem notícias dele?


Ele me ofereceu um sorriso constrangido e começou a encarar as próprias mãos e o horroroso bordado. – Ele é um bom menino – começou. – Eu sei que ele é muito ocupado e não me incomodo. – Levantou os olhos para mim e apertou minha mão – Não me incomodo, de verdade! Acho que eu até prefiro – riu e eu percebi a mentira em suas palavras. – Bem, então eu vim aqui para lhe dar notícias – sorri. Eu, definitivamente, não tinha ido até lá para isso, mas, de repente, responder as suas perguntas me pareceu infinitamente mais importante do que fazer as minhas. – O que quer saber? – levantei um ombro, tímida. Não tinha costume algum de sentir timidez. Na verdade, acho que a última vez em que senti algum resquício de timidez foi quando fiquei menstruada pela primeira vez e, sem uma mãe presente, não soube muito bem o que dizer e nem a quem. Ali, na frente dela, eu senti como se estivesse entrando na puberdade mais uma vez. Não queria ser agressiva, não queria ser confiante. Não queria ser nada que ela não fosse. – Ele trabalha com advocacia ainda, não é? Ainda está morando naquela cidade horrível do outro lado do país? – Sim, ele é advogado. E acabou de se mudar para bem mais perto daqui. Acho que vai poder vir visitá-la com mais frequência. Sua primeira reação foi sorrir. Mas o sorriso sumiu com uma timidez delicada. – Não, ele não precisa. Não quero incomodá-lo. – Eu ouvia a emoção em suas palavras. Ela queria incomodá-lo, sim. Ela queria ligar para ele e dizer que se sentia sozinha e que queria que ele viesse sempre. Ou que a tirasse daquele lugar e a levasse para casa. Mas havia algo nela que me dava a certeza de que ela pensava não merecer a atenção e o cuidado. – Vocês estão pensando em se casar? Eu queria netos – riu, tapando a boca como se fosse uma menina de onze anos que tivesse acabado de confessar por qual garoto era apaixonada. – Não, não vamos nos casar. – Dei-lhe um tapa bem leve e brincalhão na perna. – Estamos juntos há pouco tempo. Se é que se pode dizer que estamos juntos. – Greg pode ser uma pessoa difícil, mas ele é um garoto bom. É um garoto muito bom. Ela parecia temer que eu o abandonasse. Ou pior, que eu o abandonasse e dissesse que foi por causa de alguma coisa que ela tivesse tido. – Eu sei. – Ele está feliz? Essa era uma pergunta que eu não sabia responder. – Acho que sim. Quero dizer, ele parece feliz. – E tem alguém na vida dele que o incomoda? – Achei a pergunta estranha e tive que pensar por alguns segundos. – Agora que a senhora perguntou, eu sei que tem uma loira horrível no lugar onde ele trabalha. Detesto ela. – exagerei na careta e ela riu com gosto. – Ah, então eu detesto ela também. Seu desespero por ser agradável e querida era tangível. Senti uma mistura enorme de pena e carinho. – Sra. Holt… -– Audrey! – pediu – Audrey – aceitei. – Eu vim até aqui por um motivo. – Eu ainda precisava das minhas respostas. Mas não tinha qualquer intenção de mentir para aquela mulher. – E se a senhora achar errado e preferir não responder às minhas perguntas, quero que saiba que vou entender. Mas eu tinha que vir até aqui lhe perguntar.


Ela ficou em silêncio e eu continuei. – Gregory consegue ser um livro fechado, lacrado e inviolável sobre alguns assuntos e, embora eu saiba que deveria estar tendo essa conversa com ele, tem… Tem algumas coisas sobre ele que eu preciso entender. Antes de sequer imaginar que alguma coisa pode acontecer entre nós. Ela segurou minha mão. – Meu Gregory é um homem muito bonito. – Sim, ele é. – Esperei que ela terminasse o raciocínio, porque, no contexto, sua observação não fazia nenhum sentido. – Estou aqui há muitos anos, Dominique. E um homem muito bonito não fica sozinho durante muitos anos. Você é a primeira moça que vem até aqui me ver. Imagino que esteja aqui sem o seu conhecimento e sem sua autorização. – A palavra me incomodou. Eu não precisava da autorização de ninguém. – Não me importo se você é só uma amiga ou algo mais. Você parece se preocupar com o meu menino, então, gosto de você. Faça suas perguntas. Abri meus olhos e meus lábios travaram. Eu não sabia o que perguntar primeiro. – O que aconteceu? – perguntei finalmente. Foi interessante como os olhos dela brilharam, e ela pareceu entender exatamente a que eu me referia. – Você já ouviu falar na família Baxter? – Claro, é uma das oito famílias mais ricas do mundo. Um império composto pelos três jornais de maior circulação nacional, uma rede de dezenas de hospitais e uma das maiores farmacêuticas do continente. – Era o meu sobrenome – ela sorriu, e eu senti um nó na garganta. Eu sabia que ele era de uma família rica, mas imaginei que fosse riqueza na casa das centenas de milhares. Não de centenas de milhões. – E quando você é um Baxter, há coisas que são esperadas de você. – O volume de sua voz diminuiu como se ela estivesse se lembrando de algo muito distante e doloroso. – Mas não vou incomodar você com os detalhes da minha longa e tediosa vida. O que precisa saber é que me apaixonei por um rapaz que minha mãe não aprovava e que casei com ele apesar de todas as suas restrições. – Era um rapaz de origem humilde? – Humilde é relativo – riu. – Os Holt eram uma família de novos ricos. “Novos” quando comparados aos Baxter, que têm uma árvore genealógica que se estende por séculos. O pai de Greg era da terceira geração de uma família que tinha adquirido fortuna com hotéis, clubes, discotecas, restaurantes e jogos de azar. Nada ilegal – levantou a mão. – Jogos de azar em locais onde a atividade é permitida e regulamentada – acrescentou – Mas para uma família nobre como os Baxter… Minha mãe teve muitos problemas com o meu relacionamento com o jovem herdeiro Mathias Holt. – Ela fechou os olhos por alguns segundos, mas continuou narrando a história de sua vida como se estivesse revivendo cada detalhe. – Fomos tão felizes. Apesar de minha mãe e de todo o seu ódio incontrolável. Eu amava meu Mathias e ele me amava. Tivemos nossos filhos, nossa vida… Mas eu sempre fui fraca, ao contrário de minha mãe, e sempre deixei que seus comentários invadissem minha vida. Eram coisas pequenas no começo: o nome de um filho, a escola em que deveria colocá-lo. Mas acho que acabei sendo daquelas pessoas que finge odiar a mãe e tudo o que ela representa quando, na verdade, tudo o que faz é tentar agradá-la. – Entendo. – Um dia foi demais. Foi há alguns anos. Meus filhos estavam se distanciando dos ideais dos Baxter. Muito. Isso preocupou minha mãe, e ela conseguiu passar cada gota do seu desespero para mim. Eu e Mathias começamos a ter muitos problemas e, um dia, resolvi que queria me separar, que


queria trazer meus filhos de volta para a tradição. Como se ela servisse de alguma coisa… Se apenas eu pudesse voltar no tempo. – Ela abaixou os olhos para a mão e eu apertei seu braço em uma tentativa de lhe dar forças para continuar.– Ele estava em uma negociação em uma cidade vizinha. Eu liguei para ele e disse que estava indo embora de casa. Mathias pediu que eu esperasse, que deveríamos conversar, que não podíamos destruir quase trinta anos de casamento assim, pelo telefone. Mas eu tinha minha mãe na cabeça e no coração, e não queria ouvir nem mais uma palavra. Ele saiu de lá desesperado para tentar chegar em casa antes que eu saísse. Seu nervosismo era tamanho que minha filha, que estava na mesma cidade em que ele, resolveu acompanhá-lo na viagem para acalmá-lo. Ela estava hesitando cada vez mais, e eu tive medo que ela começasse a chorar. Eu não ia saber o que fazer. – Audrey, não precisamos mais falar sobre isso. – Eu queria ouvir o resto da história. Mas fazer aquela mulher sofrer era algo que estava além dos meus limites. – Podemos falar de outra coisa. – Não, querida. Eu quero falar. – Seu sorriso foi mais dolorido que qualquer lágrima. – Estava chovendo muito. O carro derrapou. Eles morreram. Os dois. Ela engolia o choro e eu tive vontade de abraçá-la. Eram muitas emoções novas para mim, e eu não sabia quantas mais ia conseguir aguentar. – Gregory não conseguiu me perdoar. – Seus lábios estavam travados. – E quem pode culpá-lo? No dia em que me colocaram de preto, de pé no meio de um cemitério, e enfiaram a minha menina em uma caixa no chão… Eu soube que nunca mais ia ser a mesma pessoa. Não tem volta. A dor que você sente quando perde um filho… A saudade… É a única coisa na vida que é verdadeiramente insuportável. Todo o resto, qualquer problema, qualquer dor, acredite! É bobagem perto disso. Todas as opiniões de minha mãe, toda a tradição da família, todo o orgulho perante a sociedade. Minha menina estava morta, de que me servia toda aquela porcaria? Ver o meu Mathias enfiado em um terno caro com algodão enfiado em sua boca e em seu nariz… Foi uma das piores sensações da minha vida, mas eu ainda conseguia aguentar. Mas minha Amanda… A minha Amanda, não. Ela estava chorando e eu não resisti. Estava abraçada com uma estranha. Aquele estava sendo o mês mais transformador da minha vida. – Um filho é como uma parte do seu corpo. Você sente o mesmo amor, o mesmo cuidado, a mesma sensação de autopreservação. Mas é um pedaço do seu corpo que sai por aí sozinho. E você fica desesperado porque… como pode protegê-lo? Como pode mantê-lo a salvo? Cada festa, cada saída, cada viagem… Você passa a vida inteira se preocupando. E aí te dizem que aquele pedaço do seu corpo acabou e você sente tanta dor. E você quer gritar e negociar para conseguir aquele pedaço de volta. Mas não tem como. Você sente dor no corpo inteiro. Eu acho que estava chorando junto com ela. Não tinha certeza, mas sentia uma dor na garganta, como se o sofrimento quisesse sair por ali. – Gregory abandonou completamente a família depois disso. – Ela começou a limpar as lágrimas e tentou sorrir. Acho que imaginou que eu estivesse constrangida e estava querendo me acalmar. – Foi embora para bem longe, o meu menino. Ele estava certo. Foi viver onde nada dessa podridão pudesse tocá-lo. Mas para mim… Para mim era tarde demais. Perdi minha família inteira naquela estrada, naquela chuva. E me perdi também. Entrei em depressão e nunca mais consegui sair. Tentei me matar algumas vezes. Enlouqueci – deu de ombros – Foi então que me tornei uma verdadeira vergonha para a família. Um membro da família Baxter louco? Suicida? Nunca! Jamais! Me esconderam aqui e dizem para os outros que eu estou meditando em um templo budista, fazendo topless em algum spa ou algo igualmente ridículo e fútil.


– Mas Greg, ele… É uma pessoa tão boa e gentil. Não acredito que ele possa simplesmente tê-la deixado aqui… – Eu sou o motivo pelo qual ele é tão gentil – sorriu. – O que quer dizer? – Eu sou a última crueldade que ele fez na vida. A última que ele se permitiu fazer. Me abandonar aqui e me esquecer. E, para compensar, ele nunca mais foi cruel. Ele sempre foi assim, desde menino. Acha que uma coisa muito boa pode compensar uma muito ruim. Não acho que ele esteja errado. E mesmo que achasse, quem sou eu para julgar? Mas eu não o culpo. Eu cometi meu crime e estou cumprindo minha pena. Sinceramente? Prefiro que ele esteja bem longe daqui. Bem longe disso tudo. – Por quê? – Ele é o último – expirou longamente. – O último Baxter. Minha mãe vai querê-lo de volta. Ele sempre foi o favorito dela, sempre se deram muito bem. Acho que, no fundo, ela acredita que tudo isso, ele ter se mudado, ter se distanciado de tudo… Ela deve achar que tudo isso é só uma fase que ele vai superar e vai voltar. Ela está só esperando. E, não se engane, Dominique, aquela mulher é o demônio. E eu quero ela bem longe do meu filho.

Não consegui contar a história toda para Andy. Passei a maior parte da viagem de volta encarando a paisagem escura e pensando. Não existe vida fácil. Minha verdade continuava firme e forte. Todas aquelas fotos, toda aquela alegria… Não era fácil. A. Holt. Lembrei da inscrição no anel. Amanda… O nome dela era Amanda. Era a isso que Gregory estava se prendendo? A irmã que ele tinha perdido? Ao pai que tinha perdido? A uma vida inteira que ele acreditou ser verdadeira e que foi destruída na sua frente? Lembrei da moça na foto. Os cabelos cor de mel assim como os dele. Os olhos azuis tinham um toque esverdeado, não tinham? Eu precisaria olhar com mais cuidado em vez de com a repulsa ciumenta com que observei da primeira vez. Era a irmã dele. Lembrei das cosquinhas. Não era um amor sensual naquela foto. Era um amor fraterno. Era o irmão mais velho querendo forçar a irmã mais nova a fazer uma careta para a câmera. Eu precisava respirar fundo e colocar toda aquela conversa para trás. Tinha que seguir o último conselho que Audrey tinha me dado: não podia dizer a Holt que tinha ido visitá-la.

– Estava começando a ficar preocupada. Holt estava no seu escritório. Parecia ter chegado já a algum tempo e ter se enfiado direto no trabalho. Tinha dobrado as mangas da camisa social até quase o cotovelo e sua gravata já descansava sobre o encosto da cadeira. – Estava com Andy. – Eu tinha preparado algo mais elaborado, mas seja lá qual fosse a verdade que eu tinha formulado para lhe contar, ela ficou esquecida no fundo da minha mente. Ele estava sentado na poltrona com o laptop, e alguns processos estavam abertos à sua frente. Seu


sorriso era cansado, mas verdadeiro. – Está vendo que não é impossível fazer amizade com os vizinhos? Ele tinha os mesmos olhos verdes da sua mãe. Minha mente viajava até o asilo e de volta para a casa. Todas as coisas sobre ele que eu tinha aprendido hoje fizeram com que o carinho que eu já sentia crescesse de um jeito exponencial, e agora eu precisava usar todas as minhas forças para não correr até aquela poltrona e abraçá-lo, segurá-lo em meus braços e dizer que ia ficar tudo bem. É claro que essa emoção fez com que eu me sentisse ridícula. Ele era um homem adulto, perfeitamente capaz de cuidar de si mesmo, assim como tinha feito todos esses anos. Mas meu coração não ligava mais de ser ridículo e queria confortá-lo mesmo assim. Andei até Greg tentando manter um sorriso descontraído nos lábios. Era eu quem estava deprimida, não ele. Gregory, provavelmente, não tinha sequer pensado em nada disso ao longo do dia. Era eu quem estava com o seu passado na cabeça e não podia misturar as coisas. Curvei o corpo e segurei seu rosto. Ele estava esperando que eu dissesse algo. Mas eu não tinha palavras. Eu só conseguia pensar no jovem e iludido Greg recebendo a notícia de que seu pai e sua irmã estavam mortos. A dura notícia de que a realidade chega para todo mundo. Beijei sua boca. Não foi com desejo ou provocação. Eu só queria beijá-lo. Só queria que aquele gesto gritasse como eu me sentia. Fiz carinho em seu lábio inferior com o polegar e o beijei mais uma vez. – Dom? Está tudo bem? Ele se jogou para trás e as rodinhas da cadeira giraram. Aproveitei o movimento e me sentei em seu colo. – Está. Está tudo bem. Muito trabalho? – Levantei alguns papéis fingindo lê-los, mas não conseguia me concentrar em nada. – Sabe como é… – deu de ombros, colocando a mão em meu quadril. Ele ainda me observava de um jeito cuidadoso. Minha atitude estava deixando Holt preocupado. – Estou um caco – riu. – Está – respondi exageradamente séria e ele continuou sorrindo. – Já comeu alguma coisa? Precisa tomar um banho. – Ah! Eu estava esperando você. – Ele me deu um beliscão bem baixo no quadril. – Vem comigo? Passei os dedos em seu cabelo, sorri e o beijei mais uma vez antes de me levantar de seu colo. Segui até o banheiro puxando-o pela mão, e ele me acompanhou obediente. Desabotoei cada um dos botões de sua camisa com calma enquanto suas mãos se mantinham na minha cintura. Notei que até então sempre tínhamos sido urgentes. Sempre tinha sido duro, forte, intenso e louco. Não que eu achasse ruim, pelo contrário. Eu adorava. Mas algo estranho estava acontecendo comigo naquele momento. Eu não queria que ele me fodesse. Eu queria tirar sua roupa. Queria colocá-lo embaixo da água. Queria acariciar sua pele e sentir seu calor. Perto ou dentro de mim, não me importava. Algo na delicadeza e paciência do meu toque fez com que Holt não avançasse e, em vez disso, ele apenas ficou ali, de pé, esperando. Colocou os braços para trás e eu o ajudei a tirar a camisa. Depois foi o cinto e a calça. Levantei minhas mãos e senti o toque leve de seus dedos enquanto ele tirava minha blusa. Ele me beijou. Devagar. Deixei nossas línguas se tocarem e se conhecerem. Greg tirou o resto de minha roupa com cuidado enquanto me mantinha firme contra o seu corpo nu. Eu o coloquei debaixo do jato de água e coloquei o sabonete líquido na esponja. Joguei água no seu corpo e passei a esponja pelos seus ombros e descendo pelo seu tórax. Gregory me observou com um sorriso de diversão nos lábios, como se não estivesse entendendo


exatamente o que eu estava fazendo. Não entendi sua confusão com algo que para mim era tão óbvio. Eu estava cuidando dele. Do meu jeito. Passei os dedos ensaboados pelo seu pescoço e suas mãos. Ele deu um passo à frente e colocou o nariz contra minha bochecha. Eu estava evitando me mover demais enquanto continuava a ensaboá-lo. Ele seguia o movimento do meu rosto, nunca deixando seu nariz muito distante da minha bochecha, a não ser quando ele me beijava de leve na linha do maxilar ou na base do pescoço. Greg tomou a esponja das minhas mãos. Agora era ele quem me banhava. Depois, me puxou devagar e senti a água e o sabão deixando nossos corpos. Nossas bocas se encontraram, e eu coloquei meus braços ao redor do seu pescoço. Me soltei para observá-lo. Observei seus olhos, sua boca, seu corpo. Não era só luxúria. Não era só paixão. Eu amava a sensação de sua pele contra a minha, amava sua boca e seu sorriso, amava o seu cabelo grudado no rosto pela água, amava a curiosidade em seus olhos verdes. – O que foi que aconteceu? – Nada – sorri. Eu o beijei mais uma vez e ele me abraçou com tanto carinho… Como se quisesse me proteger do que quer que fosse. Caímos na cama ainda molhados e abraçados. Não havia sorrisos brincalhões, gemidos provocantes ou palavras safadas ao pé do ouvido dessa vez. Havia só ele e eu. E eu o amava. O amava muito. Senti o seu corpo sobre o meu e depois dentro de mim. Não queria fechar os olhos. Seu olhar firme deixou claro que ele deveria estar pensando a mesma coisa. O orgasmo foi algo que eu nunca tinha experimentado antes. Nunca tive um homem tão dentro de mim. Tinha seus cabelos nos meus dedos, sua língua na minha boca, seu gemido contra a minha pele. Acho que era essa a diferença. Em minha vida inteira, eu estava acostumada a transar, a foder pesado ou a deixar que um cara me comesse. Acho que aquela foi a primeira vez que eu fiz amor.

Estava deitada sobre seu peito, sentindo as pontas dos seus dedos acariciando meu braço. – Acho que vou ter que arrumar mais coisas para você fazer aqui. Não sei o que vai ser de mim quando você precisar ir embora. Sorri e dei um beijo estalado em seu tórax. Ia deitar o rosto mais uma vez, mas ele me segurou pelo queixo. – Você é muito linda. – Eu sei – mordi sua mão e voltei a me deitar, abraçando-o apertado enquanto ele ria alto. Mas brincadeiras não iam esconder a preocupação em minha mente. – Só falta mais uma caixa – confessei. – E eu acabo de arrumar sua casa. – Então vou precisar esconder essa caixa para você não terminar nunca. – Enfiou a mão nos meus cabelos naquele cafuné delicioso. – Aliás… É a caixa que estava na mesa da cozinha, hoje? A caixa “Lembranças de A.H.” Meu coração queria parar de bater. – Essa mesmo. – Fiquei esperando que minha voz tivesse soado casual o suficiente. Por Deus… Eu não ia conseguir mentir pra ele. – Ah, eu já resolvi aquela. – Levantei o rosto e apoiei o queixo em seu peito. – Coloquei na garagem. Tem umas coisas ali que eu mesmo arrumo depois.


Ele não ia arrumar. Não ia arrumar nunca. Ia deixá-la escondida na garagem em algum lugar onde não precisasse ver ou lembrar. Não faz isso, Holt… – Tem certeza? Eu já tinha até começado. Não é trabalho algum. Não se esconda. Por favor, não faça isso. – Obrigado. Mas pode deixar aquela comigo. – Tem poucas coisas, não vou demorar para arrumar. – Eu sei. Mas é que tem algumas coisas ali que talvez precisem ser jogadas fora. Tenho que olhar com calma. – Mas eu posso já tirar algumas coisas que você vai querer, com certeza. Pelo menos a foto da sua irmã, posso colocar no quarto ou no escritório. Me arrependi no momento que as palavras saíram dos meus lábios e prendi a respiração, esperando o veredicto. Ele não demorou mais do que dois segundos. – Como sabe que é minha irmã? – Sua testa se enrugou em uma dúvida clara e séria. Diga que imaginou por causa da semelhança física, Dom. Diga que pesquisou e descobriu a história da família, diga qualquer coisa menos… – Sua mãe me disse. – Não era que eu não conseguia mentir para ele. Eu conseguia. Mas não queria. Não queria nem um pouco. Era a primeira vez em muito tempo que eu tinha alguém na minha vida em quem eu queria confiar. E queria que fosse recíproco. Se ele não descobrisse por mim, poderia descobrir por outra pessoa, e aí não seria bem pior? – Minha mãe? – ele riu. Achou que eu estava brincado. Fiquei séria. – Como assim “minha mãe te disse”? – Você disse que ela ficava em um asilo perto daqui, e eu achei que seria gentil visitá-la e… Ele se levantou da cama e começou a se vestir. – Você fez O QUÊ? – Greg, não fiz por mal, só… – Só se meteu na minha vida! De um jeito que você… Que você… Dominique, você não tinha o direito de fazer isso! – Achei que seria… – Achou que seria o quê? Um bom jeito de investigar minha vida? – Quando você fala assim parece horrível. – Porque é! Qual é o seu problema? – Não fale assim comigo! – Se ele ia gritar, a Dominique gentil e carinhosa ia ter que dar licença para a vadia passar – Estou falando com educação, Gregory! Retribua a gentileza. – Que gentileza? Dominique, você quer saber alguma coisa sobre a vida de uma pessoa é só perguntar para ela. – Mas você nunca fala… – Porque eu não quero! É um direito meu! Você pergunta algo para uma pessoa, se ela não quer responder, ela não responde e você fica sem saber! É assim que o convívio social funciona e, sinceramente, estou cansado de ser seu professor no assunto. Você já é bem grandinha, está na hora de começar a descobrir como adultos normais se comportam. – Eles deixam a mãe trancada, deprimida e isolada em um lugar sem nunca visitá-la? É isso que os


adultos normais fazem? – Não me julgue sem saber da minha vida. – Talvez eu saiba mais do que você imagina. – O que foi que ela te disse? Aliás! – Levantou a mão. – Não fale. Não quero saber. – Ela não disse nada de mais. – Não fale! – repetiu rudemente. – Não quero saber! Foi por isso que você… – Ele estreitou os olhos para mim. – Esse carinho todo na cama? Foi culpa? – Ele parecia magoado. – Estava me recompensando por ter feito algo pelas minhas costas? – Eu pareço ser o tipo de mulher que faz algo por culpa? – Mas ele não estava ouvindo. Tinha as mãos enfiadas nos cabelos. – Droga! – sussurrou para si mesmo – E eu pensei que isso tudo era porque… Mas eu sou um imbecil mesmo. – Olha, se você vai ficar assim, eu vou dormir no outro quarto. Não preciso desse tipo de… – Não. Fica aí. Eu tenho que trabalhar. Ele vestiu a roupa e saiu. Eu demorei uma eternidade para conseguir dormir e acordei no meio da madrugada em uma cama sem Gregory. Ele tinha ido dormir no quarto de hóspedes.


Capítulo 15 “Por Deus, mulher. Isso é guerra, não uma festa.” Rhett – E o vento levou Eu tinha aprendido a pedir desculpas. Essa parte eu sabia. Mas o problema é que eu não achava que tinha feito nada errado. Ou pelo menos não tão errado para receber toda aquela fúria. Tomei café no balcão da cozinha. Holt comeu praticamente em pé. Ele não disse uma única palavra e, se aquilo era uma competição para ver quem falava por último, eu não queria perder. – A caixa com as coisas da minha irmã está na garagem – ele disse, quando já estava pronto para sair. – Deixe onde está, tudo bem? Acha que consegue não se meter pelo menos nisso? O encarei com raiva e não disse uma palavra. Vi seu pomo de adão se mover para cima e para baixo. É isso mesmo, Holt. Eu estou puta. – Passo para te pegar às oito, está bem? – acrescentou com uma voz um pouco mais suave, mas ainda firme. – E para onde é que eu vou? – perguntei irritada. – A comemoração. Eu te convidei ontem. Você disse que iria. – Eu posso mudar de ideia? Ele abriu um sorriso irritado e exausto. – Você pode fazer o que você quiser. Não é sempre assim? Eu bebi meu café e ignorei sua presença. – Tudo bem – sacudiu a cabeça devagar. – Eu chego às oito. Se você quiser ir comigo, você vai. Se não… Se não você faz o que você quiser. Max colocou as patas dianteiras no balcão e eu cocei suas orelhas enquanto terminava minha xícara. Se Holt esperou minha resposta antes de sair, não me dei ao trabalho de reparar.

Metade de uma manhã sem ter o que fazer e com meu cérebro cozinhando em possibilidades fez com que meu orgulho sumisse. Eu já estava começando a me arrepender do jeito como tinha tratado Gregory. Mas o que me fez decidir parar com a criancice foi a lembrança da loira aguada. Ele disse que tinha conhecido uma mulher no trabalho. Isso significava que ela certamente estaria nessa comemoração. Foi um pensamento que durou apenas uma fração de segundo, mas foi completamente capaz de me


fazer tomar uma decisão: eu iria a essa festa e não havia nada na Terra, acima ou abaixo dela, que me impedisse. Restava apenas o eterno dilema feminino: o que vestir? Algo que eu já tenho ou algo que precisa ser comprado? Eu tinha preparado a mala de uma mulher que iria fazer uma faxina rápida e eficiente e depois iria voltar para casa o mais rápido possível. Esse já não era mais o cenário em que eu me encontrava há algum tempo, vide o fato de a faxina já ter sido concluída e eu não estar exatamente comprando meu bilhete de volta para casa pela internet. Olhei todas as roupas que eu tinha trazido organizadamente dispostas em cima da cama. Eu tinha um único vestido que poderia servir. Poderia. Sentei na cadeira e observei a bagunça que eu tinha feito. Max ficou de pé na minha frente. – O que você quer? – cocei sua orelha e ele se sentou. Eu odiava admitir, mas cachorros eram uma companhia interessante. Estava começando a considerar arranjar um para mim quando voltasse para casa. Principalmente depois do Experimento Holt, ia ser difícil sobreviver na solidão. Enchi os pulmões e tentei me acalmar. Eu não estava só cheia de tesão e loucamente apaixonada pelo homem. Aparentemente, meus sentimentos eram ainda mais fortes. Eu estava fodida. Total e completamente. Que diabos eu ia fazer? Voltar para casa e fingir que nada daquilo tinha acontecido? Ou me mudar para perto de Holt correndo o risco de que ele não sentisse nada por mim e de acabar fazendo o papel de uma mulher louca e perseguidora? Não havia alternativa ideal e eu ia ter que descobrir uma saída menos pior. Eu ia ter que comprar sorvete. Era isso o que as mulheres faziam nos filmes, não era? Quando tinham uma desilusão amorosa? E eu odeio sorvete. “Acho que vou ter que aprender a gostar.” Max inclinou a cabeça e emitiu um latido baixo. Afinal, o clichê da mulher abandonada não está completo sem sorvete. Apoiei meus cotovelos nos joelhos e coloquei o queixo nas mãos. Aquela seria, provavelmente, minha última noite ali. Principalmente se Holt continuasse tão irritado. À noite eu diria que tinha acabado de arrumar sua casa. A mudança estava concluída e ele, oficialmente, morava em outra cidade. Eu ia ligar o computador e ele ia acessar sua pasta on-line. Eu o deixaria digitar sua metade da senha e eu completaria com “imbecil”. Estava olhando para ele naquela fatídica noite em que ele, acidentalmente, me filmou. Olhando para ele e tentando decidir o que colocar na minha metade da senha. Holt me ofereceu um sorriso pernóstico e eu digitei a palavra “imbecil” sem pensar duas vezes. Max estava me observando divagar sobre todas as nuances do meu passado e todas as possibilidades para o meu futuro. – Mas de todos esses cenários, Max, sabe qual é o único que nós não vamos suportar? Deixar seu dono sozinho com a loira esquálida. Isso, de jeito nenhum. Depois que eu fosse embora, quando estivesse longe dali aprendendo a me afogar em sorvete, ele traria ela para casa. Seria ela quem dormiria na sua cama e coçaria as orelhas de Max. Mas enquanto eu estivesse ali, ela não ia encostar nele. Não ia, não ia e não ia de novo. Passei os dedos pelos cabelos. Eu precisava de um vestido novo. Precisava de um vestido que fizesse cada mulher daquela festa me odiar e cada homem querer cair de boca em mim.


Precisava sair dali deixando uma coisa bem clara para aquela lambisgoia. Ele pode até ficar com você, mas preferia estar comigo.

– Eu tenho que trabalhar. – Mentira. – É verdade! – Não acredito. Você é a maior desocupada que eu conheço. – Isso, Dominique. É desse jeito que você vai me convencer a te fazer um favor. – Olha, desculpa, Andy! Mas me escuta! Nós vamos sair na sexta, não vamos? Tenho certeza de que você também aproveitaria um dia de compras. A gente vai até o salão e dá um jeito no seu cabelo. – O que há de errado com o meu cabelo? – Ah, meu bem… O que não há de errado com o seu cabelo? – Você não pode pegar um táxi? – Posso. – Eu não queria pegar um táxi. Ai meu Deus… Eu estava apreciando companhia. O que diabos estava acontecendo comigo? – Mas achei que você poderia querer vir. Ela me observou por alguns segundos mordendo o próprio lábio. Estava considerando. – Você não faz nada com o meu cabelo sem a minha expressa autorização? – Com certeza – prometi resignada. – Mas acho que você devia me ouvir. – Vou pensar no seu caso.

Estava no quintal esperando Andy sair quando vi Shelbi regando as plantas do lado de fora. Ela se moveu, esticando a coluna, e nossos olhares se cruzaram. Levantei a mão em um cumprimento tímido. Não sabia qual a regra de etiqueta para esse tipo de situação, mas não queria que tudo acabasse com a criação de uma inimizade. – Estou pronta. – Andy estacou ao meu lado, e percebi que ela deveria estar olhando para o mesmo lugar que eu. – Você acha que a gente devia chamá-la? – Eu não sou muito boa com essas decisões sociais. – O que a gente faz, então? Coloquei a cabeça para traz e inspirei profundamente. Estava sentindo minha sanidade começando a querer me abandonar. A verdade? Eu estava de saco cheio. Estava de saco cheio dessa coisa de timidez, meiguice e preocupação. Às vezes, ser uma vadia é a melhor coisa que você pode fazer. E essa vizinhança era dócil demais, precisava de uma sacudida. Marchei pela rua e ouvi Andy me questionando às minhas costas. – Shelbi! – gritei, antes que ela pudesse fugir para dentro de casa e fingir que não tinha me ouvido. – O que é que vocês querem? – resmungou baixinho quando nos aproximamos. – Estamos indo fazer compras, passar no salão de beleza, essas coisas… E você vem com a gente.


– Não vou, não. Eu tenho coisas para… – Vem com a gente, sim! E eu não estou pedindo. Andy estava segurando meu braço e parecia ainda mais nervosa que Shelbi. – Dom, o que você está fazendo? – Estou dando um basta nessa frescura. Shelbi, eu e Andy viemos te dizer uma coisa. Você decidiu não acreditar. A escolha é sua. Não vamos mais falar sobre isso nem nos meter na sua vida. Mas você me ajudou no meu primeiro dia aqui e, por algum motivo que eu não compreendo, parece tratar bem todo mundo ao ser redor, inclusive o traste do seu marido. – Ela fez uma careta e ameaçou se virar – E pronto! Esse foi o último comentário que eu fiz a respeito dele. Não falo mais nada! Mas, como eu dizia, você me ajudou, estou em débito com você e eu odeio ficar em débito com quem quer que seja. Você vem com a gente. Vamos comprar um vestido bonito para você, arranjar um corte de cabelo novo para levar o seu marido à loucura, se é que… – engoli a ofensa. – Nada. Não vou dizer mais nada. – Vocês acham mesmo que eu iria com vocês depois de tudo o que disseram sobre o meu Eric? Sua voz estava diferente. Não estava cheia de fúria e indignação como no outro dia. Estava mais sóbria, mais composta. Era um leve tom de mágoa. Mas uma mágoa que ela queria superar. Um pedido de desculpas resolveria tudo para a pobre Shelbi, e ela poderia enfim voltar a ignorar o fato de que seu marido era, de fato, horrível. Mas desculpas eu não ia pedir. – Não vou pedir desculpas, Shelbi. Não acho que tenho nada para me desculpar e não me arrependo de nada que disse. Se você quiser ficar emburrada regando as plantas, o problema é seu. Nós estamos indo. Agora! Você vem? – Mas o que é esse inferno? Ela chegou com seus sapatos de plataforma e com um drinque cheio de gelo na mão. – Será que vocês podem parar de gritar? Estão interrompendo minha meditação. – Você medita com álcool, Madeleine? – Andy torceu o nariz. – Não é da sua conta. – Pois o que estamos dizendo também não é da sua – retrucou. – Não briguem, por favor. Vamos falar mais baixo, Madeleine. – A Shelbi que odiava conflitos estava de volta. – Não estou brigando. Só não aguento mais essas duas baderneiras. – Quem é a baderneira, sua velha gagá? – CALADAS! AS TRÊS! – Minha voz firme foi ouvida acima de todas as outras. – Mas será que ninguém trabalha nessa vizinhança? Andy, vamos para o carro. – Você não manda em mim. – Menina, não me teste! E vocês duas vêm também. – Dominique, eu… – Shelbi! Entra na porcaria do carro e cala a boca. – E eu? – Madeleine perguntou. – Você vem também. – Mas olhem só pra isso… A esquisita é nova na vizinhança e já acha que pode me dar ordens. Andy se aproximou com o carro. Eu olhei para Madeleine com fúria nos olhos. – Entra. No. Carro. Andy começou a dirigir a caminho do shopping e o silêncio não durou mais que poucos segundos. – Vai fazer o quê, agora que nos sequestrou?


– Madeleine, a Dominique foi gentil demais convidando você. Então, cala essa tua boca imensa. – Convidando? Ah, e foi isso que a grossa fez? – Por que vocês são assim? – perguntei. – Assim como? – quis saber. – Por que vocês brigam e xingam e agem como inimigas mortais o tempo inteiro? – Eu não gosto dela – Andy explicou. – É recíproco – Madeleine completou com sua voz rouca no banco de trás. – Eu não tinha qualquer problema com nenhuma de vocês até inventarem coisas sobre o meu Eric. – O que foi que vocês inventaram? – Senti o tom de quem ama um fuxico na voz de Madeleine. – Elas disseram que meu Eric fez coisas que ele não fez. – Tipo agarrar outras mulheres? Porque isso, querida, é verdade. – Pare o carro, Andy! Eu quero descer! – Shelbi gritou. – Ninguém vai parar o carro – decidi, me perguntando que tipo de doença mental tinha me acometido para ter essa ideia genial de trazer o circo inteiro. – Vocês disseram que iam parar com essas loucuras. – Mas a única loucura aqui é você ainda ser casada com aquele traste e se recusar a admitir que estamos certas. – Andy! – reclamei. – Nós prometemos. – Eu não prometi nada. E você não tem autorização para prometer por mim. – Dominique, faça ela parar o carro! Eu quero descer! – Shelbi repetiu. – Não tem nem calçada aqui, Shelbi, se controle. Madeleine continuou a narrar como Eric não prestava. Andy alternava entre mandá-la calar a boca e dizer a Shelbi que parasse de ser idiota. Shelbi pedia para descer e sua voz começou a ficar cada vez mais fina, como se ela fosse chorar a qualquer segundo. Eu estava com uma enxaqueca louca e com um arrependimento eterno. Mas consegui usar algumas palavras mágicas. E eu digo mágicas porque não sei como conseguimos chegar ao shopping sem que acabássemos nos matando.

Andy tinha um sorriso deslumbrado. Quando tinha dito ao cabeleireiro que sumisse com aquelas mechas horrorosas ela teve vontade de me matar, mas assim que seus fios ficaram uniformes mais uma vez, eu disse a ele que fizesse as suas amadas mechas de volta. Mas agora eram dois tons de violeta e um de azul que preenchiam seus cabelos. Algumas mechas tinham sido puxadas desde a raiz, outras do meio dos fios e a grande maioria apenas das pontas. A coloração de antes parecia ter sido feita com água e papel crepom. Agora, uma linda mistura de cores se mesclava em um furta-cor sempre que a luz batia em seus fios. – É assim que se pinta o cabelo – expliquei e ela riu. – Ficou perfeito! – Ela não conseguia tirar os dedos dos cabelos e os olhos do espelho. – Eu sei. E na sexta você usa a roupa nova que a gente comprou. Juro por Deus, Andrea, se você usar uma camiseta de banda na sexta-feira eu mato você e enterro seu corpo no quintal da Madeleine. – Está muito lindo. – Ela não estava me ouvindo. Ficava encarando cada detalhe do próprio cabelo, e eu ri de seu deslumbramento. Shelbi tinha pintado o cabelo com dois tons de loiro e cortado os fios na altura do queixo. Meia hora na cadeira do cabeleireiro e ela tinha rejuvenescido uns oito anos. Brincava com as pontas dos


cabelos de frente para o espelho. Eu entendia exatamente o que aquele sorriso queria dizer: ela ia voltar para casa e fazer um jantar delicioso, ia vestir a roupa nova, se entupir de perfume e de maquiagem e ia mostrar o corte de cabelo novo para Eric. Eu esperava que ele conseguisse ser, pelo menos, delicado. Notasse o corte e o elogiasse. Levasse sua mulher para cama e a fizesse se sentir especial. Ela queria tanto aquilo que, mesmo a alguns metros de distância e em completo silêncio, era possível ouvir seu pensamento com clareza. – E você? Não vai fazer nada com o cabelo? Balancei minha cabeça negativamente para Madeleine. Meu corte era recente e impecável. O estilo franjão estava na medida certa e eu gostava dos meus cabelos bem longos. E algo no jeito como ele os agarrava, indicava que Gregory também gostava deles assim. Eu ainda não tinha fios brancos e adorava ser morena. E não podia reclamar da minha genética nesse quesito. Meu cabelo colaborava muito e quase nunca acordava indomável. – Uma hidratação era tudo que eu precisava – respondi. Convencer Madeleine a fazer luzes no cabelo tinha sido uma verdadeira saga. Ela, ao contrário de Andy e de Shelbi, se recusava a aceitar que eu tinha uma noção de estética melhor do que a dela. Foi quase tão difícil quanto arrancar a blusa com estampa de onça de suas garras na loja de roupas, mas eu consegui convencê-la e, assim como as outras duas, depois de tudo ela parecia bastante satisfeita. A manicure estava tendo trabalho com Andy. Ela não conseguia parar de mexer no cabelo e o esmalte borrou pela terceira vez. Escolhi uma cor escura para minhas unhas. Um preto com um leve toque avermelhado para combinar com o vestido vermelho que tinha comprado. Eu geralmente preferia amarelo para ocasiões assim, a cor contrastava mais com o meu tom de pele, mas o maldito vestido vermelho serviu no meu corpo de um jeito tão sensual que eu simplesmente soube que tinha que ser ele. – E agora? Vamos para onde? – Andy perguntou quando a manicure finalmente a liberou. A pobre funcionária tinha uma expressão exausta. – Depilação. – Eu espero vocês lá fora. Eu a segurei pelo braço. – Não preciso disso, é sério. – Ela vai fazer o quê? – a depiladora me perguntou. Claramente, ela não tinha paciência para Andy. Eu te entendo, colega. – Você tem pelos na coxa também? Ou só nas canelas? – perguntei. – Só nas canelas – ela respondeu assustada. – E bem pouco. Estreitei os olhos e analisei sua expressão. Decidi que ela estava mentindo. – Ela vai fazer perna inteira, sobrancelhas, buço e virilha. – O que ela prefere? A depiladora nem olhava para Andy e isso começou a incomodá-la. – Egípcia nas sobrancelhas e buço. Cera quente nas pernas e virilha. – Tudo bem. E qual o tipo de depilação na virilha? – Eu estou bem aqui – reclamou. – Eu posso decidir por mim, tudo bem? A depiladora levantou uma sobrancelha impaciente para ela, mas esperou que eu falasse. – O que você quer, então? Ela olhou de mim para a depiladora, e então de volta para mim.


– Quais são minhas opções? – Lisa, cavada, asa delta… A gente pode fazer um desenho em você também. Um coração ou um coelhinho da Playboy. O que acha? – ri. – Não! Nada disso! Dominique, é sério! A depiladora não resistiu e também começou a rir. – Acho que a gente pode fazer uma asa delta nela. Pouco cavada. Já que ela não tem costume. – Acho que é a melhor ideia. – O que é isso? – Significa que só vai depilar o excesso. As bordas. Vai deixar os pelos em toda a região triangular do púbis. Eu uso assim. – Tá. Se serve para você, serve para mim também. Você também vai fazer? – Eu me depilo a laser. Estou em dia com os retoques. Apesar de que… Acho que vou dar uma variada. Vou fazer virilha, também – disse para a depiladora. – Lisa. Andy gritou tanto que não havia uma pessoa nas proximidades que não estivesse constrangida. – Você não disse que ela ia… Que ela ia… – Menina, desembucha. – Fazer atrás também. – E você queria que ela deixasse como estava? – Foi horrível. – Ela não estava me ouvindo e parecia estar controlando o choro. – Não faço isso de novo nunca mais. – Faz sim. Deixe de bobagem. A depiladora saiu e me chamou. – O que você faz. – Andy olhou para ela. – Tenho certeza de que há algum artigo na Convenção das Nações Unidas contra Tortura que diz que é ilegal. Certeza. – Obrigada – a moça agradeceu, indicando que eu passasse.

– A sua amiga vem hoje à noite? Eu não sei por que Devon Hill falava comigo como se fôssemos grandes amigos. Ele era um sacana pernóstico e eu o odiava desde que tinha feito uma piada inapropriada sobre minha vida pessoal. Não tinha o costume de odiar pessoas, então respirei fundo e lhe dei uma segunda chance. Chance que ele jogou pela janela. Cruzou conosco no elevador no primeiro dia de Dominique na cidade, quando ela veio até o escritório pegar as chaves de casa. Ela sorriu e piscou seus longos cílios para ele. Tinha sido uma brincadeira boba e tenho certeza de que assim que saiu do elevador, ela nunca mais pensou nele. Ela sequer tinha feito qualquer menção à ocasião: tinha sido sedutora porque sabia que isso ia me irritar. Me irritou e pronto, missão cumprida. Mas desde então, Devon era só perguntas sobre ela e sobre quando poderia conhecê-la. Ela é areia demais para o seu caminhão minúsculo, Hill, e não, você não vai conhecê-la. – Ainda não sei. – Era verdade. Sorri, tentando ser simpático. – E você? Quem vai ser a companhia da noite? – Sua amiga, eu espero. – riu, sentando na cadeira à minha frente – Desculpe a brincadeira, Greg. – passou a mão na gravata. – Mas você disse que era só uma amiga e, minha nossa… Com todo o respeito, é o pedaço de carne mais bonito que eu já vi na vida.


– Sei que você não faz por mal, Devon. Mas a situação mudou. Estamos juntos agora. – Meu tom tinha saído um pouco mais rude e possessivo do que eu tinha planejado. Mas foi bom, recado dado. Fique longe da minha mulher, idiota! – Ah, poxa. Desculpe, cara. – Ele pareceu levemente constrangido. – Mas é só que… Achei que você e a Lynn… – Não. Isso foi antes. E não deu certo. – Entendo. É só que… Quando você falou da sua amiga… Realmente soou como se não houvesse nada. Achei até que tinha sentido um pouco de irritação. Pensei que poderia ser uma ex-namorada inconveniente ou algo assim – sorriu. Suas perguntas eram o motivo da minha irritação, Hill, não Dominique. – Não havia nada quando você perguntou. Mas agora há. – E é sério? Ou é do tipo que dá para compartilhar com os amigos? Ele riu como se fosse uma piada, mas eu sabia que havia um fundo de verdade no comentário e não achei graça nenhuma. – Estamos namorando. – Droga. Não sabia se estávamos de fato. Não fazia a menor ideia de qual era definição do nosso relacionamento. Independentemente de nossa discussão, eu sabia o que eu queria. Mas não sabia o que ela queria. Além do mais, e se ela fosse embora? E agora, se Hill fizesse qualquer menção a esse meu comentário Dominique ia me fritar e comer com geleia. – Ah. Bem, felicidades, então. – Obrigado. – E se não der certo. Por qualquer motivo – brincou gesticulando, e eu sorri, usando até a minha última gota de força de vontade para continuar sendo simpático e educado – vou querer o telefone dela, hein? – ele riu mais uma vez da sua brincadeira estúpida e eu ri de volta. Ele saiu e eu amassei um papel e o joguei contra a porta. Imbecil. “Sua mãe me disse.” Ela tinha ido ver minha mãe. Eu queria gritar, brigar e dizer a ela que não queria que ela fizesse isso nunca mais. Mas não se diz a Dominique o que fazer, e esse era um dos motivos pelos quais eu tinha me encantado por ela. Dominique Thoen era o oposto de tudo que minha mãe era, de tudo o que tinha destruído nossa família. Ninguém puxava ou empurrava Dominique. Ninguém lhe dizia o que fazer ou como fazer. Ela era sua própria mulher, dona da sua vida e do seu destino. Era isso o que eu adorava. E era isso o que me deixava louco. Assim que saí do quarto me arrependi do jeito como tinha falado com ela. Tudo bem, ela não precisava ter ido ver minha mãe pelas minhas costas. Mas eu tinha lhe dado todas as informações que precisava para fazer isso. Tinho contado pequenos pedaços do meu passado, apenas o suficiente para deixá-la curiosa. Será que eu podia mesmo culpá-la? Eu também tinha feito algo parecido, tinha olhado sua lista pro bono, tinha seguido seus passos no dia do fórum. Eu também tinha investigado sua vida quando ela achou que ninguém estava olhando. E nós nem estávamos dormindo juntos naquela época. O que ela diria se descobrisse? Ficaria indignada como eu tinha ficado? Dominique estava virando minha vida de cabeça para baixo de um jeito que ela não fazia a menor ideia. Tinha mudado toda a minha vida para conseguir me afastar da minha família, e mal ela se aproxima e já começa a trazer minha família de volta. Eu não queria aquilo. Odiava brigar com ela. Odiava. Mais que tudo. Acho que nunca odiei tanto uma coisa na minha vida. Nem o Hill, nem a minha mãe, nem a minha avó. Brigar com Dominique me fazia perder meu


norte. Demorei o dobro do tempo na noite anterior para conseguir acabar meu trabalho… Só conseguia pensar em voltar para o quarto e fazer as pazes. Voltar e dizer “Olha, eu te amo, está bem? Chega dessa frescura. Vem aqui fazer amor comigo e amanhã vamos arranjar um emprego nessa cidade para você não precisar ir embora nunca mais”. E aí o quê? Ela ia olhar para mim e rir? Sua vingança estava completa e ela podia voltar para casa. Eu tinha tanto medo. Já tinha perdido alguém que eu amava antes. E aquela perda tinha destruído minha vida inteira, não tinha? Parte de mim queria experimentar a sensação, independentemente do risco. Queria ser vulnerável e me permitir algo maravilhoso. Mas a outra parte era uma covardia condensada, e eu tremia só de pensar em como seria horrível me abrir desse jeito e depois ter uma porta fechada na minha cara. Amar Dominique poderia ser incrível. Mas perdê-la seria insuportável.

– Dominique? – bati na porta entreaberta do quarto de hóspedes e enfiei o rosto no cômodo. Mantive os olhos no chão, pois não sabia se ela estava trocando de roupa e não queria ser grosseiro. Principalmente com Dominique. E principalmente depois de uma discussão. – Estou quase pronta. – Você vai, então? – Você me convidou, não foi? Já mudou de ideia? – Ela estava sendo grossa. Isso era bom. Ela ser grossa significava que estava bem. – Claro que não. Mas você disse hoje de manhã que não tinha certeza. – Eu sei o que eu disse e… Por que você está olhando para o chão? Não tem nada aqui que você já não tenha visto. Levantei os olhos. Ela estava usando uma lingerie de renda vermelha. Salto alto daqueles bem finos. E mais nada. Vermelha. De todas as cores que ele poderia estar usando… Logo vermelha… Puta merda. Eu sabia que não estava respirando. Eu estava encarando aquela porra daquele corpo escultural enfiado naquela porcaria vermelha e minúscula. Ela tinha celulite. Tinha estria. Tinha marcas no corpo como qualquer mulher. E isso não diminuía em nada aquela delícia de bunda. Não era um corpo perfeito e imaculado. Mas aquelas imperfeições eram a parte mais sedutora. Deixavam claro que ela não era parte de alguma fantasia inatingível. Ela era real e estava bem ali, a poucos passos de mim. Tudo o que eu precisava fazer era andar até lá, pedir desculpas pela minha grosseria, beijá-la e jogá-la na cama. Eu afastaria a parte de baixo da calcinha, só um pouquinho, só para me dar passagem, e a comeria sem tirar nada daquela lingerie vermelha. Suas pernas abraçadas na minha cintura, seus saltos contra minhas pernas, seu mamilo na minha boca… Eu devia estar sem dizer nenhuma palavra há alguns segundos.


– Você disse que ia chegar às oito horas. Está atrasado. Mandei meu cérebro fechar minha boca, mesmo sem ter plena certeza de que ela estava realmente aberta. Tinha perdido o controle do meu corpo enquanto meus músculos se contraíam e minha garganta secava de desejo. Vamos lá, Greg. Tenha calma. Diga palavras. Devagar. Uma frase de cada vez. Concentre-se. – Desculpe. – Pausa. – Tive que resolver umas coisas no escritório. – Pausa. – Fico pronto em quinze minutos. Eu estava passando a língua nos lábios e escondendo minha ereção atrás da porta. Ela se virou de frente e eu desejei morrer. Conseguia sentir seu perfume e meu pênis estava gritando para que eu pedisse desculpas de joelhos e acabasse com aquilo de uma vez. Afinal, se aquilo era uma competição de orgulho e teimosia, nós todos sabíamos quem ia ganhar… Mas meu coração me lembrou que, se eu cedesse a essas emoções por qualquer coisa, era ele quem podia acabar quebrado e arruinado. Ela levantou os braços como se estivesse esperando que eu terminasse de dizer o que eu tinha ido dizer. Eu não tinha mais nada para falar. Mas não queria fechar a porta. Abri a boca. Não saiu nem uma palavra. Nem uma. Valeu pela ajuda, cérebro. Apontei para o lado de fora indicando que eu ia sair e passei os olhos pelo seu corpo mais uma vez. Puta merda.

– Dom? Já está pronta? – chamei, já descendo as escadas. – Aqui embaixo. Ela estava me esperando na sala. – Uau. – Minha boca se mexeu sozinha. O vestido vermelho tinha alças finas e um bojo rígido que empinava e delineava seus seios. A roupa colava agarrada até sua cintura, e depois se abria em uma saia leve com uma fenda na lateral que deixava uma de suas coxas quase completamente de fora. Estava me lembrando do dia em que a conheci. Não foi o acaso de apenas uma noite. Ela tinha a capacidade de ser estonteante quando queria. Seu perfume parecia uma dose concentrada de afrodisíaco, e era suficiente para deixar qualquer homem com as pernas bambas. – Você está… linda. Como sempre. – Tentei fazer o elogio soar casual e não apaixonadamente deslumbrado. Acho que consegui. – Obrigada. Vamos? Se ela estava tentando fingir descaso, estava atuando milhares de vezes melhor do que eu. Abri a porta de casa e ela foi para o carro sem me dirigir uma única palavra. Lembrei de Hill e seus comentários imbecis. Ele ia estar esperando na festa e se Dominique flertasse com ele para me irritar eu não tinha certeza se ia conseguir me segurar. Ele era um advogado antigo da firma. Não podia dar um murro nele. Queria explicar a situação para ela e pedir que compreendesse e não fosse infantil. Mas, ao mesmo tempo, não queria lhe dar munição.


Liguei o carro e seguimos em silêncio por alguns instantes. – Onde vai ser essa festa? – Em uma galeria no sul da cidade. – É uma comemoração de que, exatamente? – O escritório trabalha com algumas fundações de cunho social. Uma delas acabou de conseguir resgatar uma coleção de arte bem importante. A abertura da exibição vai ser hoje. – No meio da semana? Não era mais inteligente fazer isso no fim de semana? – Amanhã é feriado, Dom. – Ah! As férias deviam ter bagunçado seu calendário. Meus olhos desceram para sua perna exposta pela fenda do vestido. Queria poder tirá-la daquela roupa quando voltássemos para casa. E não precisávamos nem transar. Quer dizer, se não fosse por aquela droga de lingerie vermelha me deixando louco de tesão… Mas o fato é que eu queria o que tivemos ontem. Foi bom de um jeito que eu nunca tinha experimentado antes. Sentir seus dedos ensaboados na minha pele, apenas me alisando. Era contraditório imaginar isso. Estávamos nus, mas tinha sido inocente. Tinha sido um carinho verdadeiro. Droga, será que foi só culpa? Ou será que ela me ama? Ah, por favor, por favor, que ela me ame. Não precisava nem ser amor ainda. Acho que já ficaria feliz o bastante se ela estivesse apaixonada. Apaixonada de verdade e disposta a tentar.

– Dominique Thoen, este é meu chefe, Andrew Conaughy. Andrew, minha amiga Dominique. – Um prazer. – Ele pegou minha mão e a beijou. Sorri de volta. – O prazer é meu. Tinha decidido que ia ser espetacularmente simpática aquela noite. Ia deixar todos os seus colegas de trabalho vastamente impressionados com minha personalidade embriagante. Ou, em outras palavras, tinha deixado a vadia em casa. Logo eu estava sendo apresentada a todos do novo escritório de Holt. – Gregory! – exclamou um dos sócios. – Você tem que nos dizer onde encontrou uma dama tão linda. – Sim! E se tinha mais delas nesse lugar. Todos riram e eu acompanhei. Detestava essas hipocrisias. Eles estavam me achando gostosa, medindo minha bunda e decorando minhas curvas para pensar em mim quando estivessem comendo suas mulheres mais tarde. Mas iam passar a noite me fazendo elogios que eles acreditavam serem sutis. Eu sorri, aceitei, e deixei que a brincadeira continuasse. – Ela era minha colega de trabalho no meu emprego anterior – explicou, virando-se para me observar. Eu não estava exatamente próxima a seus braços, mas também não estava exatamente separada. Holt sempre encontrava um jeito de colocar uma mão na minha cintura, no meu braço, nas minhas costas… Era uma dança, e ele sempre estava me tocando. Um gene de DNA canino e ele estaria urinando ao meu redor. Está bem, Greg, acho que todo mundo já entendeu que eu estou com você. – Hyde, Willows & Benson, hein? Conte para nós, Dominique: com quem você teve que dormir


para conseguir um emprego lá? Todos riram. A mulher que precisa dormir com alguém para conseguir um emprego. Realmente pessoal, hilário… – Na verdade, eu achei um precedente na jurisdição e encontrei uma falha contratual que evitou que um dos sócios majoritários perdesse 60% de seus bens para a ex-mulher, de quem estava se separando depois de ter sido pego na cama com a amante. Ele praticamente deixou que eu escolhesse meu salário depois disso. – Impressionante! – Andrew fez uma breve reverência. – E quanto ela levou no divórcio? – 20%. – É, ele realmente tinha que deixar você escolher quantos zeros ia ter no contracheque! – riu. – E isso foi porque ele preferiu que outro advogado conduzisse a audiência – expliquei. – Ah! Claro! Se fosse você teria conseguido o quê? 15%? – Cinco. – Levantei o copo em um brinde elegante e ele me acompanhou. – Impressionante – murmurou mais para si mesmo do que para os outros – Deveras impressionante. – Espero que não tenham começado a festa sem mim! – Ele tinha o cabelo escuro e um par de olhos castanhos perigosamente sensuais. – Boa noite – acrescentou, dirigindo-se diretamente a mim. Gregory apertou o braço que tinha na minha cintura. Hmm… Ciúmes… Certo, eu posso trabalhar com isso. – Dominique Thoen – disse oferecendo a mão para que ele apertasse. Em vez disso, ele a levou até a própria boca. – Devon Hill. – Prazer, sr. Hill. – Não, não. O prazer é todo meu. Ele estava sorrindo daquele jeito óbvio. Estava dando em cima de mim. Holt estava congelado ao meu lado. Se não tivesse gritado comigo no dia anterior, poderíamos agir de modo mais descontraído, ele iria me beijar e eu não piscaria os olhos para o sr. Hill. Mas ele preferiu gritar comigo e ser intransigente, não foi? Pois agora que aguente. A conversa seguiu entre um tópico e outro. Eu tinha conseguido me livrar do abraço de Holt e sentia Hill se aproximar sorrateiro. Gregory estava virando uma taça de champanhe depois da outra. – Onde Greg estava te escondendo? – Hill quis saber finalmente. – Ninguém me esconde, sr. Hill. Eu vou para onde quero. – Tinha um leve tom provocativo em minhas palavras. Discreto, mas evidente. – Perdoe-me – riu. – E é Devon, por favor. – Devon – completei. Holt estava em silêncio já há alguns minutos. E depois que seu chefe se afastou, ele passou a não participar da conversa nem com interjeições. A mulher loira se aproximou tocando Holt e Devon nos braços. – Boa noite! É realmente uma belíssima exibição, não é? Na última e única vez em que eu já tinha visto a recém-chegada, ela estava de roupa íntima na cama de Holt. Minha garganta deu um nó. Ele ia se vingar agora, não ia? Ia retribuir meu comportamento infantil com Hill sendo infantil com a loira aguada. – Linda! – Hill concordou, sem tirar os olhos de mim. Holt só balançou a cabeça concordando.


Prendi a respiração. Ele ia dar em cima dela e eu ia querer morrer. – Não fomos propriamente apresentadas. – Ela tinha um sorriso idiota estampado na cara e eu quis lhe bater. Apertou o braço de Holt como se estivesse pedindo que ele fizesse as apresentações e eu tive certeza de que eu ia lhe bater. Tira as mãos dele, vagabunda. – Dominique, Lynn. Lynn, Dominique. – Curto e grosso. Por que ele não estava flertando com ela? Ela me ofereceu uma mão. Tinha uma postura altiva e dominante. Em sua minúscula cabecinha, devia se lembrar de que estava nua na cama com o meu homem e que tinha sido eu quem saiu correndo. A vagabunda devia achar que ela era a gostosa e eu a mal-amada. Precisava lhe explicar bem direitinho que eu não estava nem um pouco constrangida com a situação e que, quando eu apareci, foi ela quem acabou sendo chutada para fora da cama. – Quase não te reconheci sem o cachorro – riu, esnobe. Ela queria curtir com a minha cara? – Quase não te reconheci vestida. – Eu também sei brincar, viu, meu bem? Lynn me ofereceu um sorriso amarelo e Hill ficou olhando de uma para a outra tentando compreender as informações recém-adquiridas. – Ainda bem que não tenho vergonha do meu corpo – riu, passando a mão de unhas longas e bem feitas pela gravata de Gregory. – Ou teria sido constrangedor. – Ele tocou sua mão com educação e a guiou para longe. Isso aí. Entendeu, magricela? Ele não quer suas mãos nele. – Ah, mas não deve se envergonhar. – Peguei o morango preso na borda da taça de champanhe de Holt e o coloquei na boca permitindo que meus dedos se demorassem em minha língua. Os dois homens me observavam hipnotizados. – Quero dizer, não com esse seu vestidinho fofo. Ele esconde muito bem todas as imperfeições do seu corpo, não precisa se preocupar. Ela queria me matar. Ótimo. – Imperfeições? – ela sorria como se eu estivesse brincando. Mordi o morango bem devagar. Greg estava me vigiando e eu firmei meus olhos nos deles enquanto mastigava e chupava a fruta na minha boca com uma delicadeza imensa e uma discrição infinita. Era sensual de um jeito que só um homem olhando nos meus olhos poderia ver. Acho que senti seu pau ficando duro contra meu quadril. Só por causa de uma fruta, Greg? Sério? Ele tocou minha cintura e me reposicionou à sua frente. Duro. Definitivamente duro. Eu ia precisar comprar morangos. – É. Mas não se preocupe. – Engoli a fruta e voltei minha atenção para ela – Ouvi dizer que é supercomum uma mulher ter a quantidade de celulites e de gordura localizada que você tem. É um idioma. Um que eu apelidei de vadiês. Não é exatamente o que você fala, mas como você fala. É só colocar uma boa dose de condescendência misturada com ofensas e dizer tudo que você quer com a voz mais sonsa da história do universo e sorrir como se estivesse elogiando a pessoa. Lynn queria dialogar comigo. Ela só não sabia que minha sagacidade não conhecia limites e que, quando o assunto era vadiês, eu era fluente. Podia continuar nessa brincadeira a noite inteira. – Como está se adaptando à nova cidade, Greg? – Virou-se para ele, desistindo de continuar a conversa comigo. Pelo menos ela aprende rápido, isso ninguém podia negar. – Já virou um cidadão local? – Ela não tirava os olhos de sua boca e as patas de seu braço. Queria que ela voltasse a conversar comigo. Preferia ela me ofendendo do que o elogiando. Se ele precisasse lhe dar atenção, eu estaria navegando em águas perigosas.


– Ainda não. Mas está tudo tranquilo, por enquanto. Tentei suprimir a vontade de enrugar a testa. Por que ele estava tão normal? Eu estava ali me derretendo para cima do seu colega de trabalho apenas para lhe causar ciúmes e, aparentemente, não estava causando nada. – Bem, se precisar de qualquer ajuda, por favor… – Ela colocou a mão sobre o peito e fez a expressão de humildade mais risível que eu já vi na vida. – Não hesite em pedir. – Obrigado, Lynn. Será que ele não se importava? Eu podia estar interpretando aquilo tudo errado… Se ele não ligasse, todas as toneladas de flerte que eu despejei sobre Hill tinham sido inúteis. – Preciso… – Ela apontou para algum lugar atrás de nós como se precisasse fazer alguma outra coisa. – Mande lembranças para o cachorro, sim? Eu poderia ter respondido milhares de coisas a essa altura, mas estava preocupada demais decidindo se Holt realmente não se importava nem um pouco que eu estivesse flertando com outro cara. – Dom? – Hill estava indo longe demais. Não tinha lhe dado intimidade para me chamar de Dom… – Você dança? Seu acompanhante parece um pouco baixo-astral hoje – riu e eu olhei para Holt. Ele me observou e travou o braço em minha cintura mais uma vez. Ele estava com ciúmes. Ele não queria que eu fosse com Hill. E ele não tinha nem se incomodado em infantilmente devolver a provocação. De repente, me senti miúda e ridícula. Eu e meus jogos imbecis. Ele só tinha me convidado para uma comemoração e eu tinha transformado o evento em mais um jogo de poder. Sinceramente, como ele conseguia me aguentar? – Não, Hill. Estou bem – respondi, encarando os olhos verdes de Holt. – Ora, vamos! Gregory não se incomoda. – Não é por isso – sorri. – Eu realmente não quero. – Greg – pediu –, você esteve desanimado a noite inteira. Vamos! Deixe a garota se divertir. Holt trocou o apoio do corpo e respirou fundo como se quisesse dizer alguma coisa, mas todas as frases que lhe vinham à mente começavam com um palavrão. – Sr. Hill, o senhor está sendo inapropriado. – Inapropriado? Dominique, somos todos adultos aqui. Podemos deixar de bobagens? Ele estava claramente se referindo ao meu comportamento até então. Eu tinha, de fato, sido um pouco amigável demais. Holt soltou minha cintura, vencido. Eu quis abraçá-lo de volta e sussurrar “Não me solta”. Meu pobre Greg… Ele tinha todas as armas para lutar, mas parecia ter desistido da guerra. E por que deveria persistir se tudo que eu fazia era provocá-lo? Ele estava exausto e o arrependimento começou a explodir por baixo da minha pele. – Deixar de bobagens? Tudo bem, sr. Hill. – Encarei o colega de Holt com minha irritação típica. Não ia deixar meu homem ficar por baixo de ninguém que não fosse eu. – Gosto de causar ciúmes em Greg de vez em quando. O sexo fica mais gostoso quando a gente volta pra casa. – Holt tinha prendido a respiração e estava esperando, sem qualquer reação, enquanto eu terminava de falar. – Ele me chama de safada e me bate de um jeito que eu gosto. Mas só faz isso quando eu o provoco o suficiente. – Se Holt queria rir ou chorar, eu não soube dizer, mas estava respirando de um jeito estranho. – Então, não tenho qualquer intenção de dançar com o senhor. Nem agora, nem nunca – ri como se apenas a ideia fosse motivo de piada. Virei para Holt com o lábio entre os dentes. – Estou com sede, vou pegar algo para beber. – Então enfiei a boca dele na minha. Chupei sua língua com


calma e prazer. Mordi e lambi. Deixei minha língua à sua disposição por longos segundos. Eu podia senti-lo, ávido, buscando meu corpo. Sentia a confusão em seu gosto. Ele não estava entendendo nada. – Você quer alguma coisa? – Passei o polegar pelos seus lábios tentando em vão tirar as marcas do batom vermelho. – Han? – Ele engoliu a seco, recuperando o fôlego. – Não, estou bem. Obrigado. Sorri para um cavalheiro. Depois para o outro, e me retirei.


Capítulo 16 “Aconteça o que acontecer, vou te amar como te amo hoje até o dia que eu morrer.” Melanie – E o vento levou – Admiro mulheres como você. Devon Hill estava de volta e eu já tinha me arrependido de ter flertado com ele. – Obrigada? – perguntei sarcástica. – Sem julgamentos. Quero dizer, eu trabalho com o cara. Ele estava querendo sugerir alguma coisa. Essa parte estava bem clara. Mas o quê? – Perdão? – Eu ganho mais de trezentos mil por ano, sabia? – Ele piscou um olho para mim e beliscou minha cintura. Não enfiei o punho no meio das suas fuças porque imaginei que ele estivesse temporariamente maluco para me tocar com esse nível de liberdade. – Não sei do que o senhor está falando e, Hill… Não me toque sem minha permissão. – Eu não ia falar de novo. Na próxima vez ia receber meu punho nas fuças, e deixei meu tom afirmar isso bem claramente. – É claro que não sabe – riu. – Você, uma advogada ambiciosa que mora do outro lado do país veio até aqui só para ajudar o herdeiro Baxter com sua mudança. É claro. Vocês devem ser muito amigos. – Virou o que sobrava da sua dose de uísque – Ou você está apaixonada. É claro – riu. – Muito conveniente. Senti o gosto da bile na minha garganta e queria que ele dissesse mais alguma coisa inapropriada. Qualquer coisa que justificasse o tapa que eu ia dar em sua cara em um futuro muito próximo. – Você não me conhece, Hill. – Para o inferno com a educação. Eu ia ser grossa e ele ia ouvir. – Não defina uma pessoa que você não conhece por clichês. Pode ser perigoso. – Você é uma mulher muito bonita. E, não me leve a mal, eu entendo a ambição. Aqui. – Ele me deu um cartão e pegou mais um copo de uísque da bandeja de um garçom. – Quando ele te largar, e ele vai te largar, liga pra mim. Podemos compartilhar ambições – sorriu, colocando o copo na boca. – Posso te ajudar com algumas coisas e você, pode… me ajudar com outras. Coloquei o cartão dentro do seu copo e vi o papel se dissolver no líquido. – Não recuse um homem só porque ele não é o homem mais rico do mundo, srta. Thoen. Amanhã, ele pode ser o melhor que a senhorita pode conseguir. – Ele soou irritado. – Se você acha que eu preciso de um homem para o que quer que seja, claramente, não me conhece. Ele me observou como se decidisse se fazia mais algum comentário agressivo ou se me beijava. Para mim não importava, de um jeito ou de outro ele ia levar um murro. Era só uma questão de tempo.


– Não te dói? – perguntou. – Pessoas como ele, que podem ter tudo simplesmente pelo fato de terem nascido? – Você também não conhece Gregory, Hill. Parece que tem o péssimo costume de julgar as pessoas sem qualquer conhecimento. – O quê? Ele teve uma vida difícil? Fala sério, Dominique? O que é o pior que pode lhe ter acontecido? Sua Ferrari nova veio na cor errada? E o que é o pior que já aconteceu na minha vida? Na sua? E na de milhões de pessoas como eu e você? E ele… Ele só precisou nascer. Não digo que odeio o homem, quero dizer, não é culpa dele. Mas é difícil não invejá-lo ou não ressentir a injustiça da vida. – Não existe vida fácil. – Não… Mas existe vida mais difícil. Sabe o quanto eu tive que batalhar pela posição que tenho hoje nesse escritório? Quanto tempo de trabalho escravo, horas e horas de sono e de descanso perdidas. Tanta coisa de que eu tive que abrir mão só para conseguir galgar esse lugar, um milímetro de cada vez. E ele? Ele já tinha o emprego mesmo antes de vir fazer a entrevista. – Então você supõe me conhecer, conhecer Holt e conhecer todos os motivos dos seus chefes por trás da contratação de um dos advogados. Você é bem presunçoso, hein? – Não, imagina. Você tem razão. É super comum todo o conglomerado de empresas Baxter mudar de escritório jurídico do nada. E um mês depois, o único herdeiro da família ser contratado para uma posição que o resto de nós teve que conquistar a ferro e fogo. Mas você deve ter razão… – A ironia despejava torrencialmente de sua boca. – Foi só coincidência. Não foi indicação de ninguém… – Se os fatos aconteceram assim como você está narrando, e eu não estou dizendo que aconteceram, afinal não te conheço, não tenho motivo algum para acreditar que diria a verdade… Mas se aconteceram desse jeito, sua lógica é inegável. Só tem dois elementos que escaparam da sua análise. – Ah, é? Por favor, esclareça-me. – Pessoas competentes e incompetentes nascem em qualquer lugar. Independentemente de classe, condição socioeconômica, clima, vegetação ou alinhamento das constelações. Uma pessoa ser rica não significa que ela obrigatoriamente não mereça ter sucesso e, sinceramente, é estúpido pensar assim. Não conheço você, mas conheço Holt. Conheço seu trabalho, sua evolução, seus métodos, sua inteligência. E posso te garantir, mesmo sem te conhecer, que ele vale dez vezes mais do que você. – Vale mesmo. Ele é um Baxter. Vale umas mil vezes mais. – Não seja engraçadinho, Hill. Não lhe cai bem. Aliás, quase nada lhe cai bem. – Apontei para gravata dourada, que tinha sido uma péssima escolha. – Mas isso é outro assunto. Estou falando de sua integridade como homem e de sua capacidade como advogado. Ele é, pelo menos, dez vezes o homem que você é. – Quem está sendo presunçoso, agora? Você também não me conhece. – Não. Mas eu sei que Holt não flertaria com a sua acompanhante. Sei que ele não busca desculpas para suas conquistas e fracassos na sua origem ou na dos outros. Sei que nesse momento, ele está apreciando a exibição e comemorando em vez de se dedicar a joguetes. Podem ser poucas informações, mas uma olhada no senhor e eu tenho certeza de que, se me desse tempo, descobriria muito mais defeitos do que qualidades. – Ele não precisa de ninguém para enaltecer o ego, Dominique. Garanto que o jovem Baxter já tem um ego bem inflado por si só. – Odeio pessoas com sua definição de vida fácil ou vida difícil, sabia? Gente como você usa isso como desculpa para não trabalhar. “Ah, eu não posso conseguir o que ele tem porque ele nasceu com


tudo, ele teve tudo entregue de bandeja”. Se eu tivesse pensado assim, nem sei onde estaria… Pessoas com esse tipo de pensamento me dão nojo. Então, se me dá licença. Não quero mais desfrutar do desprazer de sua companhia. Passar bem. – Você disse que eram duas coisas. – Sorri. – Você disse que dois elementos tinham escapado da minha análise. Esse foi um. Qual o outro? – O outro é sobre a vida pessoal de Holt e tem a ver com decisões que ele tomou em relação à própria família. Decisões que o senhor desconhece e, portanto, não deveria julgar. – Por favor, continue – sugeriu com um gesto. – Adoraria ser educado nos assuntos da família Baxter. Quais foram essas decisões? – Não é da sua conta – respondi como se a mera pergunta fosse insana. – Esse é o meu ponto, ou será que o senhor não entendeu? – Entendi. Entendi muito bem. É melhor ser a puta de um homem rico do que a companheira de um homem mediano. Fechei o punho e joguei o peso do corpo inteiro contra seu rosto. Seis anos de Muay Thai nas fuças do imbecil. Ele caiu no chão e algumas pessoas se aproximaram entre a curiosidade e a preocupação. Deixei a cena para trás. Não tinha dado três passos quando esbarrei em Holt. Ele me segurou pelos braços. Seus olhos diziam milhares de coisas. Diziam que ele tinha ouvido nossa conversa. Diziam que ele estava preocupado com o envolvimento de sua família em seu novo emprego. Diziam que ele estava grato por eu o ter defendido. E diziam que ele queria me abraçar. – Já podemos ir? – perguntei. – Quando você quiser.

A viagem de volta para casa foi silenciosa. Tenho certeza de que Holt estava considerando zilhares de possibilidades e achei melhor me concentrar na direção e deixá-lo pensar em silêncio. Eu, por outro lado, ainda estava irritada com o seu comportamento da noite anterior. Não suportava quando uma pessoa simplesmente me abandonava e, apesar da minha pequena traição por ter ido ver sua mãe sem comunicá-lo… Ah, por favor… Eu só queria saber um pouco mais sobre ele. Era realmente um crime tão imperdoável? Aquilo só podia terminar de uma ou de outra maneira: ele ia ter que pedir desculpas de um jeito que eu acreditasse, eu ia persistir na teimosia só por mais um pouco e depois iria perdoá-lo, ou eu iria esquecer o que tinha acontecido entre a gente, dizer que tinha acabado de arrumar sua casa, pegaria sua metade da senha e iria embora. Comecei a tirar os brincos já na sala de estar. Estavam pesados e fazendo minhas orelhas doerem. – Obrigado – sussurrou. – Você não precisava ter me defendido. – Só quem pode te chamar de esnobe filhinho de papai sou eu. Ele sorriu discretamente. Eu falei brincando, mas meu tom ainda era sério. – Bem, eu agradeço. – ficou de pé no meio da sala me observando com firmeza. Esperei por alguns segundos. Ele não disse uma palavra. – Boa noite, então – falei antes de virar para subir a escadas. – Desculpe. – Han?


– Por ontem à noite. E por hoje de manhã. Fui grosseiro, desculpe. É só que… Não gosto de contato com a minha família, e você ter ido até lá pelas minhas costas, eu… Perdi o controle. Desculpe. Você só queria algumas respostas. Eu já tinha te dado algumas informações soltas e devia ter lembrado de que você não é o tipo de mulher que fica parada, esperando alguma coisa acontecer. Na verdade, quando paro para pensar, não sei como não imaginei que você acabaria fazendo exatamente isso. Coloquei a mão na testa. – Já fui abandonada muitas vezes na minha vida, Gregory – interrompi. Ele ficou em silêncio, me observando como se esperasse um veredicto. – Não gosto da sensação, mas aprendi a me acostumar. Mas quando eu vim até aqui e tentei mudar algumas coisas na minha vida por você. – Apontei em sua direção irritada – E aí você cansa no primeiro problema, vira as costas e vai embora… Isso me irrita. Profundamente. Não é atitude de um homem. Se você tem um problema, você o resolve. Simples assim. – Eu sei. Me desculpe. Você está completamente certa. Eu… Só fui pego de surpresa e exagerei. – Tudo bem. – Abanei uma mão gentilmente na sua direção e suspirei cansada. Já estava subindo as escadas mais uma vez. – Eu… – Sua voz grave chamou minha atenção. – Que foi? – Posso dormir no quarto? Tive vontade de rir. A casa era dele! Como alguém podia imaginar que o poço de gentileza que era aquele homem poderia algum dia se aproveitar de privilégios familiares para conseguir o que quer que fosse? – É a sua casa, Holt. Você dorme onde quiser. – Quero dormir com você, então. – Sua voz era cuidadosa. Era quase como se ele estivesse com medo de mim. Eu ainda estava irritada e sabia que rir naquele momento destruiria o controle que eu tinha da situação. – Isso não depende só de você – o lembrei – A casa é sua e você escolhe onde quer dormir. Mas eu decido o que faço comigo. E eu vou dormir no quarto de hóspedes hoje.

Fiquei andando de um lado para o outro no meu quarto. Dominique estava com raiva. Essa parte eu tinha entendido. Era engraçado porque eu não conseguia parar de rir. Estava louco por essa mulher. Louco de tesão, de paixão, de amor. Cada dia eu descobria uma loucura nova. Tinha um medo insano do que ia acontecer, um medo inexplicável de perder uma coisa da qual eu mal tinha certeza se tinha. E apesar de ela estar com raiva e de isso ser um problema, eu não conseguia parar de sorrir. Deitei na cama. Ela estava me defendendo. Verdade seja dita, no começo ela estava se defendendo. Hill achou que ela precisava de um homem rico e eu me lembrei da noite em que a conheci. Eu também tinha cometido aquele erro uma vez. Só uma. Dominique não precisa de homem. Ela não precisa de ninguém. Era a mulher mais forte, confiante e autossuficiente que eu já tinha conhecido. E ela estava me defendendo.


Pensar nela era tão embriagante que eu mal consegui me lembrar do fato de que meu emprego poderia ter sido conquistado por causa da minha família. Mas me preocuparia com isso depois. No momento, eu só conseguia pensar em Dominique e no murro que ela tinha dado em Hill. Eu queria muito ceder e acreditar que ela realmente gostava de mim. Só brincar de imaginar já era tão gostoso. Fechar os olhos e pensar que ela estava no quarto do outro lado do corredor pensando em mim. Era possível. Levantei da cama. Certo. Chega.

Ouvi algumas batidas na porta do quarto. Achei que, a essa altura, Gregory já estaria dormindo. Abri a porta e dei de cara com seu tórax nu. Ele podia ter vestido uma camisa. Mas ainda bem que não tinha feito isso. – Desculpe – repetiu. – Já entendi, Holt. E está desculpado. – Não, não estou. Ou você estaria na cama comigo. – Não seja presunçoso, Holt! – Não! Não! Não quis dizer nesse sentido. – Levantou as mãos. – Quis dizer fisicamente, deitada ao meu lado. Dormindo, apenas. Se você quiser. Só isso, prometo! Ele era muito fofo quando ficava constrangido. Merda, Dom. Presta atenção! Ou ele vai te dobrar só com esse jeito irresistível. – Não acho que consigo dormir sem você hoje. Consegue, sim. Claro que consegue. Mas eu entendi o que ele estava dizendo. Ele não queria dormir sem mim. – Holt, olha… Acho que talvez seja melhor… – Minha teimosia tinha encontrado uma voz e estava recusando seu convite sem minha autorização. – Não, não é melhor. Dom, por favor, me desculpa. Não quis ser grosseiro. Eu queria resistir. Queria manter meu orgulho intacto. Queria ter poder sobre a situação. Mas eu queria ele mais. Seus olhos mornos imploravam mais que suas palavras, e cada segundo era uma luta para manter meus braços abaixados e longe do seu pescoço. Queria perdoá-lo, beijar sua boca e lambê-lo inteiro. Meu orgulho estava pequeno e esquecido no fundo da minha mente e percebi o quanto ele era insignificante ali. – Vamos acabar com isso? Não quero brigar. Vem pra cama comigo? Por favor? – Ele estendeu uma mão e eu comecei a travar uma batalha épica comigo mesma. Expirei longamente, desistindo da birra, e ele riu. Coloquei minha mão na sua e deixei ele me guiar.

– Acho que eu devia pedir desculpas também – confessei.


Ele estava deitado com a cabeça na minha barriga, sua testa tocava meus seios e ele tinha a mão nas minhas coxas. – Acha é? – Ele levantou os olhos e esperou que eu, de fato, pedisse desculpas. Hmm… Não. Não ia acontecer. Fiquei em silêncio e ele riu. – Você não tem jeito! Eu tinha os dedos em seus cabelos. Sua respiração era profunda e tranquila, e eu me senti em paz. – O que você quer saber? – sussurrou contra a minha pele. – Como assim? – Você foi até lá fazer perguntas à minha mãe, não foi? Pergunte, Dom. O que você queria saber. – Não acho que precisamos falar sobre isso agora. – Quero te contar. – Sua mãe me disse várias coisas já. É verdade, não precisa. – Ela te disse que só queria o melhor para a família? Quando resolveu se separar do meu pai? – Não. Foi o oposto, na verdade. Ela se sente muito culpada. – Culpada? – Ele se levantou e deitou ao meu lado. Me puxou para um abraço e grudou o nariz no meu. – Acho que o tempo naquele lugar fez bem para ela. – Não fale assim. É estranho te ver ser cruel. – Você não entende… – Então me explica. – Abracei Greg pelos ombros e dei um beijo rápido em seus lábios em súplica. – Me explica. Eu vi o brilho dos seus olhos sumir. Ia doer falar sobre isso, eu sabia. Mas queria que ele conseguisse falar. E queria que fosse comigo. Alisei sua bochecha e ele sorriu como se estivesse se decidindo. – Amanda… Minha irmã era incrível – riu. – Não é só uma daquelas coisas que a gente fala sobre pessoas que já morreram, sabe? – Ele conseguia falar sobre sua morte com uma calma quase resignada. Aceitava sua morte. Era todo o resto que ele parecia não aceitar. – Ela era realmente incrível. Sorri perto de seus lábios e deixei que ele continuasse. – Dizem que irmãos gêmeos têm uma ligação especial. Não sei se é verdade. Eu e Amanda não podíamos ser mais diferentes. – Vocês eram gêmeos? – Éramos. Mas Amanda era livre. Eu sempre fui medroso. Vivia bem perto da família, debaixo das asas da minha avó. Queria fazer tudo certo e do jeito da família. Já Amanda… Ela não estava nem aí. Minha avó dizia que ela teve uma adolescência rebelde, mas quando eu paro para pensar… Foi uma adolescência completamente normal, sabe? Mas minha mãe tratava Mandy como se ela fosse uma viciada em drogas. Quando ela entrou na faculdade de medicina, minha avó quase morreu de alegria. Na sua cabeça, Mandy estava crescendo e se preparando para assumir parte dos negócios da família. Aí ela se formou e entrou para os Médicos sem Fronteiras e a minha avó quase teve um infarto. Ela acabou se conformando e pensou que era só mais uma fase de Mandy. E era bom para a imagem da família ter um membro fazendo trabalhos sociais tão intensos. Ela não pensou se era bom para as crianças famintas e para as vítimas de cólera no interior da África, sabe? Era bom para a família e isso era tudo o que importava. Bastava minha avó se reunir para discutir esses assuntos e eu me sentia em O poderoso chefão. Ri com ele. – E eu era grudado nela. Espero que você nunca a conheça… – murmurou. – Mas, se um dia


acontecer, você vai entender. Ela tem uma personalidade dominante. – Acho que posso me identificar com isso – brinquei. – Não sei, não. Acho que minha avó consegue dominar até você. Levantei uma sobrancelha para Greg e ele me apertou. – Vou voltar para o meu quarto, hein? – ri. – Não! Eu retiro o que disse! – Era bom poder ouvi-lo rir enquanto conversava sobre esses assuntos. Se ele chorasse, como Audrey, eu tinha certeza de que não ia suportar. – Mandy voltou noiva da sua segunda viagem para África. Minha avó não se importava com quem ela casasse. Para mim, ela estava pronta para fazer um baile de pretendentes como em Cinderela. Mas para Mandy… Acho que desde que o rapaz tivesse todos os dentes, minha avó não ia reclamar. – Então foi tudo certo? – Teria sido. Se Amanda não tivesse ficado noiva de uma mulher. Cobri a boca com a mão e comecei a rir. – Desculpa! Mas a história da sua família parece uma novela mexicana. – Nem me fale! Minha avó queria mandar a Amanda para a reabilitação e esquecer que ela existia. Mas Mandy… Ela não era como eu. Ela não dava a mínima para nada da família e só queria ser feliz. Ela só tinha usado o dinheiro dos Baxter para montar uma fundação para crianças carentes. Mas assim que ela se assumiu lésbica, minha avó tirou todos os fundos e fechou as portas. – Não acredito. – Pois acredite. Começou a barganhar. Mas Mandy não barganhava. Ela estava acostumada a se cuidar e foi exatamente isso que fez. Eu lembro que fui até o seu apartamento algumas vezes. Era um lugar minúsculo e sem nenhum luxo, mas era tão… confortável. Era um lar, sabe? Eu lembro que nos dias ruins, quando eu tinha certeza de que eu não era nada a não ser uma engrenagem na máquina da família, quando eu perdia completamente minha individualidade e não podia fazer o que eu queria… Eu pensava nela. Pensava que se algum dia tudo ficasse ruim demais eu podia ir viver como ela. Se ela conseguia ser tão feliz, eu conseguiria também. Não é drama. Minha irmã era minha heroína. Meu pai tentou lhe dar dinheiro para a Fundação, mas Amanda tinha resolvido que ia fazer aquilo sozinha e, quando ela resolvia uma coisa, ninguém conseguia fazê-la mudar de ideia. O máximo que ela permitiu que meu pai fizesse foi lhe apresentar alguns investidores que poderiam se interessar. Era isso que ela estava fazendo… Eles tinham viajado para uma cidade vizinha. Ele tinha reuniões com alguns investidores em potencial, e Amanda foi com ele para conhecê-los. Eles deveriam dormir lá e voltar no dia seguinte. Mas aí minha mãe… – Ele estava tentando juntar oxigênio suficiente para falar e eu interrompê-lo. – Sua mãe já me contou essa parte. Ele moveu a cabeça, concordando. – E foi isso. Meu pai e minha irmã estavam mortos. Minha mãe dizia que não era culpa dela e minha avó dizia que tinha sido melhor assim. Você acredita? “Foi melhor assim”. Tive vontade de vomitar. Nunca mais olhei na cara dela depois daquilo e… Saí de lá o mais rápido que pude e nunca mais voltei. – Você visitou sua mãe alguma vez? – Algumas. Logo depois que ela tentou se matar. Mas ela parecia alternar entre perder a razão e se recusar a admitir sua parcela de culpa. – Você não pode culpá-la, Holt. Ela também perdeu muita coisa. Também estava sofrendo muito. – Eu posso culpá-la, sim, Dom. E é exatamente isso que eu faço. Não tire isso de mim. Às vezes, a gente precisa de alguém a quem culpar. Independentemente de essa pessoa ter culpa ou


não. – Eu sempre fui horrível e você deu um jeito de me perdoar. Ou, pelo menos, eu acho – sorri com delicadeza – Não pode achar um jeito de fazer o mesmo pela sua mãe? – É diferente. – Por quê? – Porque você é uma pessoa boa que vestiu uma casca bem grossa para evitar que outras pessoas te machuquem. Minha mãe machucou outras para se proteger. – Como você tem tanta certeza de que eu sou uma pessoa boa? Ele sorriu de um jeito suspeito. – Eu já vi sua lista pro bono. – Investigou minha vida, foi? Engraçado, podia jurar que tinha te ouvido dizer que isso era horrível e imperdoável… – Ele enfiou os dedos na minha cintura e estava fazendo cosquinhas – e coisa que adultos não fazem! – gritei, me contorcendo para fugir dos seus dedos. – Justo! – respondeu. – Mas foi porque… – Porque o quê? Ele estava decidindo se me contava ou não. – Eu tinha audiência no Fórum um dia e te vi chegando. Acenei para te cumprimentar, mas você não me viu. Desceu do carro da empresa e estava subindo as escadarias. Aí você parou e… Eu notei que você estava dando algo para um rapaz. Percebi que minha visão seletiva tinha feito com que eu ignorasse os sem-teto que ficavam por ali às vezes. Mas você não só não os tinha ignorado como tinha levado uma refeição para eles. Falou com um deles como se o conhecesse há algum tempo. O cumprimentou sem nenhuma frescura e eu fiquei pensando que você não podia ser uma pessoa horrível. Não de verdade. Pessoas horríveis deixam de apoiar uma fundação em prol de crianças carentes para conseguir o que querem. É isso o que pessoas horríveis fazem. E você… sua lista pro bono era a maior do escritório inteiro. Dom, de todos os advogados de um dos maiores escritórios de advocacia do país, você é a que mais atende pessoas sem condições financeiras voluntariamente… A maior parte do pessoal do escritório fazia aquilo só para cumprir meta. Ignorava completamente os clientes necessitados, fazia só porque tinha que fazer. Quando eu vi sua lista pro bono… Sua taxa de sucesso era igual à dos seus casos normais. Você se empenhava da mesma maneira tanto nos trabalhos pagos como nos voluntários. Fiquei em silêncio. Eu não era do tipo que posta fotos em redes sociais e diz “Estou me sentindo feia” só para receber elogios. Não ligo se as pessoas acham que algo que eu faço é certo ou errado. Tomo minhas decisões e estou sempre satisfeita com elas. Ouvir alguém me elogiar por algo que eu tinha feito sem qualquer intenção de ser descoberta, me deixou embaraçada e sem palavras. – Você é incrível – sussurrou. – Obrigada – agradeci porque não sabia o que mais dizer. – Thoen? – Holt se apoiou nos cotovelos. – Você está com vergonha? – Não! – Está! Você está com vergonha! – Cala a boca, Holt. – Não achei que fosse viver para ver isso acontecer! – Ele tinha os olhos arregalados e um sorriso divertido – Dominique Thoen está com vergonha! Puxei-o para perto de minha boca e o beijei. Ele parou e me apertou com mais força. – Cala a boca – mandei. – Sim, senhora – riu, buscando minha boca mais uma vez.


Colocou o corpo sobre o meu, ainda apoiado em um dos cotovelos, sempre me olhando, seu olhar silencioso e urgente. – Você deu um murro em Hill. – Nossos narizes se encostaram em uma posição que era cada vez mais familiar e confortável. – Ele me chamou de puta. – Rá! Pobre coitado. – Curvou a boca no sorriso mais delicioso que eu já tinha visto – Se ele apenas soubesse… – Ele mereceu. – Sem dúvidas. Mas olha… Acho que ele vai te processar. – o misto de diversão e seriedade em seu rosto não deixou claro se ele estava brincando. – Pois que processe. O último cara que me processou depois de levar um murro acabou tendo que me pagar quinze mil de danos morais. Ele se afastou de mim com a boca exageradamente aberta. – Você não existe! – As pessoas não deviam me processar. Não é bom pra elas. – Fiz beicinho. – Eu bem sei! – Prendeu meu lábio inferior nos dentes e o chupou. Arqueei meu corpo só um pouco, mas foi suficiente para seu pau começar a se manifestar. Olhei para baixo, provocando. – Dom, não quero que você pense que só quero sexo com você. Não é isso. – Mas está com tesão? – ri. – Estou com saudade – Confessou com um olhar brincalhão. – Faz algum sentido? Fazia. Fazia perfeito sentido. Eu também estava com saudade. – É, mas você não está merecendo nada – disse, fazendo birra. – Verdade. Mas você merece. Eu não tive certeza de que tinha entendido o que ele quis dizer até ele descer a mão pelo meu corpo, abrindo minhas coxas. Escorregou para baixo e puxou o curto short do pijama e a calcinha para o lado. – O que é essa novidade? Senti seu polegar esfregando a região do púbis onde antes estavam meus pelos. – Eu gosto de inovar. Acostume-se. – Já me acostumei. – Ele se afastou para observar minha nova nudez. Seu toque passeava por cada centímetro das minhas partes íntimas. Coloquei a cabeça para trás e fechei os olhos. Podia sentir seu olhar, seu desejo, sua carícia proibida e deliciosa. Desceu um dedo para o meu clitóris e mordeu meu mamilo rígido. Minha umidez estava preparando meu corpo para recebê-lo. Seus lábios quentes trilharam vagarosamente um caminho de beijos desde a base do meu seio, passando pelas minhas costelas, por cima da barriga até o umbigo, e continuamente descendo. Gregory me lambeu, bem devagar. Não estava tentando me excitar – embora estivesse conseguindo sem problemas. – Era como se ele quisesse me saborear. Lambeu meu líquido mais algumas vezes antes de começar a chupar. Gemi seu nome e senti ele encaixando a boca inteira na minha vagina. Vai, lindo, me chupa, vai. Tinha minhas coxas apoiadas sobre seus ombros, e ele esfregava os polegares contra a curva da minha bunda sem nunca tirar a boca de mim. Pressionou os lábios gentilmente contra meu púbis recém-depilado. – Dom, eu sei que você sabe que é gostosa. Mas puta merda… – Ele me lambeu de novo – Você é muito gostosa. Usou os dentes para brincar com meu clitóris, e eu ouvi meus gemidos ficando mais intensos.


Abriu espaço para sua língua com os dedos e começou a comer minha boceta e chupar minha umidez como se fosse o único alimento que o satisfazia na Terra. Meu corpo queria alívio, mas o prazer estava só começando e crescia de um jeito arrebatador. Movi o quadril contra sua boca querendo aumentar o estímulo. Coloquei minhas mãos sobre os seios e prendi cada mamilo com um beliscão. Holt soltou a boca de mim e puxou minhas mãos para os lados. – Deixa que eu faço isso. Sua língua voltou para o meio das minhas pernas e suas mãos estavam apertando, espremendo, alisando e beliscando cada nuance dos meus seios. – Holt… – Eu não conseguia parar de gemer. Coloquei minhas mãos sobre as suas enquanto ele continuava a massagear meus seios com um apetite voraz. Gregory enfiou a língua em mim e tirou uma de suas mãos dos meus seios para dar atenção ao meu clitóris. Sentia sua língua fazendo movimentos acrobáticos; era como se ele estivesse procurando alguma coisa… Meu corpo inteiro arqueou e eu percebi que ele tinha encontrado. O famoso ponto G é uma área pequena, delicada e extremamente sensível no osso púbico, na parte superior interna da parede vaginal. É, provavelmente, a zona erógena mais poderosa do corpo feminino. E Holt estava fazendo a festa bem em cima dele. Com a língua. – Caralho, Holt! – Se antes eu estava gemendo o nome dele, agora eu estava gritando. Urrava de desejo e de tesão com as unhas enfiadas no colchão. Um calor tomou conta do meu corpo, começando pela virilha, e eu estava ofegando desesperadamente. O suor escorria pelos meus peitos enquanto Holt estimulava meu clitóris e um de meus mamilos. Sua língua continuava enfiada em mim, e ele não parecia ter qualquer intenção de sair dali tão cedo. Rebolava contra sua boca e deixava ele me foder com a língua. Sentia sua respiração quente contra minha pele sensível e depilada. E o lugar dentro de mim que sua língua atingia e acariciava lançava espasmos de arrepio, fazendo meus músculos do corpo inteiro contraírem. Eu queria gritar obscenidades enquanto meu corpo acumulava mais e mais tensão. Mas a única palavra que ainda parecia existir no meu vocabulário era o nome dele. E, na falta do que gritar, continuei gritando isso. Ele tirou a língua e me chupou uma última vez. Com tanta força que parecia querer me sugar inteira pela boceta. Gritei sem controle enquanto meu corpo inteiro tremia e caía sobre o colchão sem qualquer reação. Holt beijou meu clitóris e voltou pela mesma trilha de beijos pela minha barriga. – Estou perdoado? – Hmm… Eu queria dizer alguma coisa, mas não tinha forças. Meus dedos dos pés e das mãos formigavam, e eu precisei de alguns segundos para recuperar a sensibilidade deles. Holt ficou deitado ao meu lado fazendo carícias no meu corpo nu, exposto e completamente vulnerável. Eu respirava profundamente, cansada, e me concentrava em cada centímetro de pele sob seu toque. Desenhou padrões em meus seios, na linha das minhas costelas e até ao redor do meu umbigo. Acariciou meu queixo e toda a linha da minha mandíbula. Aqui e ali, me dava beijos. Eu podia sentir seu pau latejando contra mim. Notei que tinha recuperado o controle dos meus movimentos e escorreguei uma mão por dentro da sua bermuda. Sua rigidez inteira pulsou na minha mão. Assim que o toquei, ele endureceu ainda mais.


– Minha vez – sorri e desci gulosa para enfiá-lo todinho na minha boca.

O suor tinha grudado nas nossas peles e secado. Eu queria levantar para tomar um banho, mas não tinha forças ou coragem. Gozar era, obviamente, delicioso. Mas gozar na boca de Dominique… Puta que pariu… – Aonde você vai? – perguntei, ainda deitado de bruços, quando ela se levantou. – Banho – explicou – Odeio dormir suada. – Eu queria ter coragem para levantar. – Se você não tomar banho nem pense em tocar em mim com essas mãos suadas quando eu voltar limpa. – Ela deu um tapa estalado na minha bunda e eu me levantei. Não tocar em Dominique não era uma opção. Não mais.

Passei uma toalha nos meus cabelos molhados e vi ela se enfiar em uma de minhas camisas e deitar na cama. – Limpo! – Larguei a toalha em cima de uma cadeira. Essa coisa de tomar banho com Dom estava me deixando mal-acostumado. Acho que não saberia mais me ensaboar direito sem ela. Deitei ao seu lado e a puxei para os meus braços. – Não. Você tem o lado de lá inteiro para você – reclamou. – Você é tão romântica, Dom. – Não cutuque uma mulher cansada, Greg. Eu ri e apaguei as luzes. Podia ouvi-la respirando no escuro. Queria me aproximar o suficiente para sentir seu hálito contra minha pele. Queria passar a noite inteira beijando aquela boca. – Dom? Ainda está acordada? – Estou. O que foi? – Ela se virou de lado. – Acho que estou apaixonado por você. – Acha é? A envolvi com meus braços e ri quando ela reclamou. – Acho que tenho certeza, resmungona. – Ou você acha ou tem certeza, Gregory. Não pode ser os dois. Beijei sua boca bem devagar. Era tão gostoso dizer aquilo. Colocar as palavras para fora e o resto que se dane. – Tenho certeza – sussurrei – Estou bem apaixonado por você, Dom. Vai… diz o que você acha. – Isso pode ser um problema. – Ela estava séria e eu senti meu coração doer. – Eu moro do outro lado do país e só vim até aqui porque você me chantageou. – Ela tinha as mãos no meu peito e espremia suas unhas contra minha pele, como se sentisse o mesmo aperto no coração que eu. Chega disso. – Linda.


– Han? – Ela me olhou sem compreender. – É a minha metade da senha. Linda. Não conseguia pensar em nada, aí olhei para você e digitei a primeira coisa que me veio à cabeça – sorri. Ela mordeu o lábio e colocou a testa contra a minha. – Está me dando a senha para que eu vá embora? – Estou te dando a senha para que você fique porque quer. Não porque precisa. – Enfiei a mão nos seus cabelos e a beijei mais uma vez – Eu nunca ia sair por aí espalhando aquele vídeo, Dom. – Eu sei. Quer dizer… A não ser que eu matasse Max – riu. – É! – Arregalei os olhos – Nesse caso, era Youtube para você. – Você assistiu? – Não – confessei – Mas eu quis. Muito. – Pode ver se quiser. – Ela tinha um sorriso safado e eu quis meter meu pau naquela boca de novo. – Assiste comigo? – Uma única vez e depois a gente apaga. – Combinado. – Beijei sua boca outra vez. Eu não cansava de fazer aquilo. Ela manteve as mãos no meu tórax e ficou encarando as próprias unhas. Ela estava pensando no mesmo que eu. Estava pensando no que fazer depois que o vídeo fosse apagado. Quando ela não tivesse mais motivo para ficar ali. – Não vai embora. – Holt, não é assim que a vida funciona, e você sabe. – Você pode conseguir um emprego aqui se quiser, e você sabe. – Está pedindo a uma mulher com quem você está dormindo há pouco tempo para mudar a vida inteira por você? Isso não se faz, Gregory. – Eu posso voltar. Era verdade. – Não estou te pedindo para fazer isso. – Ela pareceu assustada. – Mas eu voltaria mesmo assim. Dom, se foi por causa da minha avó que eu consegui esse emprego… Eu não quero. Não quero de jeito nenhum. – Você queria tanto trabalhar para esse escritório… – Se foi por causa dela, vou sempre depender da sua vontade. Se eu fizer qualquer coisa que ela não queira, serei demitido. Não quero isso. Não quero isso para minha vida nunca mais. Mas, de qualquer forma, se eu voltasse, Dom, seria por você. – Não posso te pedir para fazer isso. – Ouvia o nervosismo em seu tom. – Você está com medo de se comprometer, de se abrir para alguém e de ficar vulnerável. Eu também estou. Eu sei faz pouco tempo. – Eu sei! – Mas todo relacionamento começa em algum lugar. Não estou te pedindo em casamento. Ainda não – sorri. – Mas eu queria… queria tentar. – Greg… – Diz para mim que você também quer tentar. E a gente tenta. – Não quero que você mude sua vida por mim. E não sei se tenho coragem de mudar minha vida por você, Holt. Não é que eu não goste de você, eu gosto. De verdade! Muito! Mas não sei se tenho coragem. – Eu tenho coragem por nós dois. Mas você só precisa deixar que eu te ajude. Dom, não precisa decidir nada agora. Você ainda tem o resto do mês de férias, não tem? Só o que eu estou te pedindo é para ficar. Não apague o vídeo e vá embora. Fica aqui comigo. Teremos um encontro decente. Jantar,


cinema. – Ela estava rindo – É sério! – Belisquei sua cintura – E aí a gente vê. Hein? O que me diz? Ela estava me olhando e mordendo os lábios. Estava com medo. Ela tinha lutado muito mais do que eu para chegar onde estava. E arriscar mudar de vida por algo que poderia não durar dois meses… Era um risco enorme e eu entendia. Mas eu queria que ela entendesse que eu nunca a abandonaria. Inferno… Se ela se mudasse para cá e não desse certo, se ela não conseguisse um emprego… Eu vendia minha alma de volta para a minha avó e conseguia uma posição espetacular pelo resto de sua vida para ela. Não tinha como ter certeza se aquilo ia durar para sempre. Mas eu queria muito que durasse e estava disposto a fazer de tudo para isso. Se ela apenas estivesse disposta a fazer o mesmo… – Fico até o fim das minhas férias – sussurrou. – E aí gente vê. Ela tinha um sorriso contido que eu achei deslumbrante. Dom também queria tentar. Coloquei minha boca sorridente contra a sua e a beijei. Eu tinha mentido. Não estava apaixonado por ela. Eu a amava. E eu podia estar errado, mas algo me dizia que ela me amava também.


Capítulo 17 “Não sou gentil. Estou só te provocando.” Rhett – E o vento levou Espremi meu nariz contra o dele e desci os nós dos dedos pelo seu pescoço. Sua respiração era quente e tranquila. Eu não conseguia tirar o sorriso do meu rosto, a compreensão do que ele tinha dito na noite anterior estava me atingindo em ondas e, naquele momento, quando eu finalmente tinha entendido e aceitado que aquilo não era um sonho, tinha uma quantidade enorme de felicidade transbordando do meu corpo. Por que eu nunca tinha tentado fazer aquilo antes? Se apaixonar era indescritivelmente bom. Holt abriu os olhos e meu sorriso se alargou contra sua boca, que rapidamente se abriu em um sorriso igualável ao meu, tanto em tamanho quanto em intensidade. – Isso é bom – sussurrou e me apertou. – Acho que não me lembro de ter acordado sorrindo alguma outra vez na vida. Meus lábios se abriram e eu os fechei forçadamente assim que percebi quais eram as palavras que iam escapar. Eu te amo. Era isso o que eu queria dizer. Merda. Acordar com toda aquela alegria, todo aquele carinho… Eu amava a porcaria daquele homem e meus lábios mal-educados iam informá-lo disso sem consultar meu cérebro primeiro. Duas semanas, Dom. Você não pode amar alguém em duas semanas. Verdade. Não podia. Estava loucamente apaixonada e querendo amá-lo desesperadamente. Talvez um dia… Se aquilo desse certo. Mas não vai dar e você sabe. Sabe do que mais? Estava começando a ficar com raiva do meu cérebro. É… Provavelmente nada daquilo daria certo. Mas aquele dia era um feriado. Eu tinha Greg só pra mim. Ele tinha pedido para que eu ficasse. Disse que estava apaixonado e que queria que eu ficasse. Ia ser um dia bom. Joguei o cobertor para longe e tentei levantar para ir ao banheiro apenas para sentir os braços fortes de Greg me jogando na cama de novo. – Você não vai levantar. – E quem disse que você manda em mim? – Mulher! – Ele inflou o peito e fingiu uma voz autoritária. Eu comecei a rir. – Não me faça ter que


repetir. Enfiou a cabeça entre os meus seios, fechou os olhos e me prendeu na cama com seu corpo. – Acho que vou passar a dormir aqui. – Você é muito pesado! – reclamei. – Eu ia acordar toda dolorida. – Você não reclama do meu peso quando eu estou te fodendo. – Sua mão escorregou pelo meu abdômen e começou a brincar com meu clitóris. – Ou de ficar toda dolorida. – Prioridades, meu bem! – Rá! – Seu hálito risonho atingiu meus seios e meus mamilos se endureceram em antecipação ao toque. Sua mão continuou brincando com meu clitóris. Estava ficando molhada enquanto Holt continuava com sua lenta e preguiçosa provocação. Puxei sua mão livre e a coloquei sobre meu seio. – Está com fogo, é? – Não gosto de ficar com os mamilos duros para nada. – Ah, não seja por isso. – Ele se moveu e enfiou um deles na boca – Eu resolvo – sussurrou, entre beijos. – Sabe o que eu adoro? – Continuou provocando meu mamilo com os dentes – Como você fica molhada rápido. – Está me chamando de fácil, Holt? – Fácil? você? – Ele estava sufocando o riso com o meu peito enfiado na boca. – Tá, tá. – Dei um tapa no topo da sua cabeça. – Estou dizendo que você é determinada. Tão determinada que até seu corpo é decidido. – Trouxe o rosto até o meu – Ele decide “quero transar agora” e aí fica molhado de uma vez. Sem perder tempo. – Odeio perder tempo. Ele sorriu e desceu até meus seios mais uma vez. – Levanta! – Empurrei ele para longe. – Ahh… – Ele rolou para o lado, contrariado. – Preciso ir ao banheiro. – Andei apressada e fechei a porta. – Se você for se masturbar aí dentro sem mim, vou ficar chateado. – Sua voz grave ecoou através da porta e um calor se espalhou pelas minhas entranhas. Escovei os dentes com uma velocidade furiosa, louca para voltar para aquela cama. Abri a porta e ele já estava esperando. Deu um tapa na minha bunda quando eu passei e também foi usar o banheiro. Sentei na cama e esperei, penteando meus cabelos. O celular dele estava sobre a cômoda. Olhei com o canto do olho para a porta do banheiro fechada, ouvi o barulho da torneira e espremi os lábios, sapeca. Puxei o celular e estava tentando uma sexta combinação de senha. – 3, 9, 7, 2. Levantei o rosto, sobressaltada. – Minha senha, sua curiosa. – Ah! Sorri, culpada, e ele repetiu, sentando ao meu lado. – A gente vai fazer o que eu acho que a gente vai fazer? Estalei um beijo na sua boca. Greg ficou em silêncio absoluto enquanto eu mexia no celular procurando o vídeo. Acho que ele teve medo que, se dissesse algo errado, eu desistiria e apagaria tudo sem mostrar para ele. Ainda não conseguia acreditar que ele não tinha visto. Mas pelo jeito como suspirou excitado


quando eu encontrei o que procurava, acho que poderia muito bem ser a primeira vez em que ele iria ver a coisa toda do início ao fim. Girei o celular na mão. – Não tenho certeza se vou querer assistir a isso – exclamei no meu tom sonso mais falso. Gregory me puxou para o meio de suas pernas e eu me sentei com as costas apoiadas em seu tórax. – Thoen, de um jeito ou de outro, eu vou te ver nua e se masturbando nos próximos segundos. – Prefere ao vivo ou no vídeo? O silêncio que ele fez, gritou mais alto do que seus pulmões teriam conseguido. Ele preferia ver ao vivo, mas aquele vídeo o estava atormentando há algum tempo. Já devia ser questão de honra. – Alguma chance de eu ter os dois? Coloquei minha mão entre nós e apalpei seu pau. Eu o senti crescendo em minha mão. Deitei a cabeça em meu ombro e Holt aproveitou o caminho livre para beijar meu pescoço. Movi a mão da base do seu pau até a cabecinha e depois o caminho de volta. Bem devagar. Ele gemeu com o nariz enfiado na curva do meu ombro e agarrou meus seios. Eu apertei o play. A imagem tremida mostrava os arredores de sua casa. E não é que ele estava falando a verdade? Realmente, estava só filmando a própria casa. O microfone do celular era um espetáculo, e eu ouvi meu gemido no mesmo momento em que a câmera fez uma curva. Dentes agarraram o lóbulo da minha orelha com força e eu percebi que estava masturbando Holt com muita intensidade. Diminui a velocidade, ou ele gozaria no meio da apresentação. E lá estava eu. As pernas abertas à luz da lua, o corpo arqueado contra a espreguiçadeira, arfando de desejo e movendo o vibrador ao redor do meu clitóris com uma velocidade que aumentava progressivamente. Meus gemidos saíram pelo som do celular, cada vez mais intensos. – Eu adoro essa porra desse teu gemido – Holt sussurrava ao meu ouvido, e eu podia ouvir a luxúria incontrolável em cada sílaba. – Dá vontade de colocar como toque no meu celular. Ou meu despertador. Eu só ia acordar duro. Passei as unhas no seu pau com força e ele reclamou, excitado, antes de enfiar minha orelha na boca de novo. Mantive meus olhos na tela. Havia algo estranhamente gostoso em me assistir naquela situação. Algo novo e inesperadamente sensual. Modéstia à parte, eu estava muito gostosa. E o pau de Holt furando minhas costas com gosto deixava claro que ele concordava. – O que você pensou quando viu isso? – perguntei, fogosa. – Na hora? Que eu queria arrombar sua casa depois que você dormisse para achar esse vibrador molhado e enfiá-lo na boca. – Holt largou meus peitos e desceu com as mãos sincronizadas apertando meu abdômen até chegar a minha vagina. Repousou as duas mãos ali, entre as minhas coxas, e ficou sentindo meu calor e umidez. – Queria lamber aquela porcaria todinha só pra sentir esse teu gostinho doce. Joguei um braço para trás, ao redor do seu pescoço, e enfiei a mão no seu cabelo. – Puta merda – gemeu no meu ouvido – Olha isso. Na tela do celular, eu tinha enfiado o vibrador até o talo e conseguia ouvir o familiar som da sua vibração na intensidade máxima. Tirei o vibrador e o enfiei de novo em uma dança rítmica e contínua. Na imagem, eu tinha os dedos enfiados na boca e não parava de gemer. – Por que você faz isso? Por que enfia esses dedos na boca? – Ele parecia querer chorar – Fica impossível segurar o gozo. Toda vez que você faz essa merda dá vontade de te foder até morrer.


Tirei a mão dos seus cabelos e levei até os seus lábios. Holt entendeu exatamente o que eu queria e começou a enfiar meus dedos na boca. Continuei a masturbá-lo suavemente. O áudio da gravação saiu claro e forte quando o meu eu da filmagem gemeu. – Holt… Vai… Gregory parou o que estava fazendo e se lançou em direção ao celular. Eu tentei tirá-lo do seu alcance, mas não fui rápida o suficiente. Ele pausou o vídeo e me encarou com o queixo no chão e o pau mais duro que aço. – Você… Estava pensando em mim? Não havia como negar. Não quando havia uma gravação de mim com um vibrador enfiado na boceta e gemendo a porra do nome dele. O único jeito de sair por cima era deixar ele ainda mais duro: – E não foi a primeira vez – gemi, plantando mais um beijo em seus lábios entreabertos. – Tenho um vibrador lá em casa que praticamente tem o seu nome escrito. Sua expressão fazia parecer que ele estava lutando para não fechar os olhos e gozar ali mesmo. – Eu preciso ouvir isso de novo. – Sua voz saiu fraca enquanto ele retrocedia o vídeo em alguns segundos. E lá estava eu, gemendo o nome dele. Ele voltou mais uma vez e mordeu o lábio. Toquei seu pau com a mão e ele me segurou. – Agora não, Dom. Não me toca agora, se não eu gozo. Finalmente, Gregory decidiu que já tinha ouvido meu gemido secreto o máximo de vezes que conseguia sem gozar nos lençóis e deixou o vídeo continuar. Eu tinha aumentado a velocidade dos movimentos do meu punho, enfiando o vibrador em mim, esfregando no meu clitóris. Meus gemidos cada vez mais altos e cada vez mais desesperados. – Sua vez de me dizer no que estava pensando. – A voz de Holt no meu ouvido não era um pedido gentil, mas um comando rosnado. – Diz para mim no que você estava pensando enquanto se fodia com aquele vibrador. – Não é óbvio? – Fala! – Estava pensando em você no meio das minhas pernas. – Virei o rosto para sussurrar contra sua boca – Tinha jogado aquele champanhe barato na sua cara e mandado você tirar a roupa. Eu montava em você, selvagem, e te ouvia urrando enquanto me fodia. Um grito alto e notei que meu eu digital tinha gozado. O vídeo acabava quando eu levantava correndo. Holt tinha jogado o celular no chão. – Abre as pernas. Levantei uma sobrancelha pra ele. – Peça com educação. – Puta merda, Dominique. Abre essa porra dessas pernas que eu não aguento mais. – Tinha uma urgência insana na voz quando puxou um dos meus calcanhares e me deixou arreganhada e atravessada na cama. Sua fome me fez ficar umas oito vezes mais molhada. Holt meteu fundo em mim com uma violência deliciosa. Não começou devagar ou gentil. Ele já estava pronto para gozar há um bom tempo e quando me penetrou, foi com um desespero incontrolável. Eu estava excitada, mas daquele jeito eu tinha certeza de que ele ia gozar primeiro. Lambi dois dedos antes de enfiar a mão entre nós e comecei a esfregar meu clitóris. Esse simples gesto fez Holt começar a urrar obscenidades, e só se calou quando enfiou meu peito na boca e o sugou enfurecido.


Minhas pernas estavam tremendo em contrações involuntárias e eu comecei a sentir espasmos se espalhando pelo meu corpo a partir da virilha. Holt soltou meu seio, deu um tapa na minha mão e começou ele mesmo a me estimular. Arqueei o corpo me esfregando nele, joguei a cabeça para trás e senti meu corpo se contorcer como se estivesse convulsionando. O orgasmo começou poderoso, mandando destruidores rastros de eletricidade a partir da minha virilha para o meu umbigo e dali para todo o corpo. Puxei o ar com força tentando recuperar o fôlego e sequer prestei atenção no ápice de Holt. Mas pelo jeito como ele caiu pesado em cima de mim, imagino que também tenha terminado bem satisfeito.

– Acho melhor a gente ver um filme – reclamou. – Frouxo! – ri. – Você podia ser ruim em alguma coisa, sabia? – Vai! Vamos de novo! – Não quero. – Vai! – Não quero e não vou. – Deixa de ser frouxo, Holt. – Chega dessa humilhação. – Vai! Se você ganhar de mim na próxima eu te chupo como você nunca foi chupado na vida – prometi sorridente. Greg estreitou os olhos analisando minha proposta. – Mas e se eu perder? O que provavelmente vai acontecer… – Se você perder… – Estava pensando em algo que fosse realmente horrível. Eu podia pedir pra ele me chupar, mas pelo tesão que eu o sentia exalando de todos os seus poros, ele já ia fazer isso de todo jeito. – Se você perder, você atravessa a rua, bate na porta da terceira casa e quando a dona te receber você diz: “Madeleine, você é a mulher mais linda que eu já vi na vida.” – Estou imaginando que isso seja uma coisa muito ruim para se fazer, por algum motivo. – É uma coisa horrível – ri contra seu ombro. Ele estava sentado no sofá com as pernas abertas e eu tinha me encaixado no espaço entre elas. Para segurar o controle do videogame, seus braços tinham que ficar ao meu redor. Eu podia ficar ali jogando sentada naquele colo quente e macio pelo resto da minha vida. Acho que nem sentiria falta do trabalho. Holt beijou minha bochecha e depois meu queixo. Aproveitei sua distração para roubar seu controle e começar mais uma partida. Eu não tinha muito costume de jogar videogame. Na verdade, não tinha costume nenhum. Mas uma vez que você aprendia qual botão fazia o quê, o resto era só uma questão de bom senso. E para ganhar de Holt, o truque era esfregar minha bunda contra sua virilha sempre que eu precisava que ele se distraísse. Aprendi isso bem rápido e tenho certeza de que ele notou o que eu estava fazendo na mesma velocidade. Mas que homem iria reclamar de uma coisa dessas? Então, ele ficou quieto, eu continuei ganhando, e nós dois ficamos felizes. – Eu estou te deixando ganhar, sabia? – Sabia. – Dei um beijo na mão que segurava o controle. Escolhi Blanka mais uma vez. De todas as lutas até agora, percebi que aquele adorável monstro


verde era a melhor opção para a minha recém-adquirida habilidade de apertar só dois botões bem rapidamente. Minha barra de energia estava quase cheia e a de Holt pela metade quando ele largou uma das mãos do controle e a enfiou por dentro do meu vestido, puxou minha calcinha para o lado e meteu dois dedos dentro de mim. – Ahh… – arfei, surpresa. Ele apertou os botões com muito mais familiaridade do que eu e destruiu meu pobre e indefeso Blanka. – Eu também sei brincar, meu bem. – Ele mordeu a lateral do meu maxilar e depois me jogou deitada no sofá. Levantou meu vestido até a cintura e me beijou por cima da calcinha. Senti o calor do seu corpo entre minhas pernas. Eu já estava molhada de novo. “Um corpo decidido”, como ele tinha dito. Senti seus dedos curiosos na borda da minha calcinha. Dois segundos de hesitação e ele empurrou o tecido para o lado e me lambeu, antes de voltar a se sentar. – Não me canso desse teu gosto. – Ótimo! Então, volte e termine. – Não, não, não. Eu ganhei e você prometeu. – Tudo bem. Você ganhou. Estou te devendo. Ele bateu uma mão na outra e as esfregou, debochando. – Mas e então? Fora me chupar, o que mais quer fazer hoje? – Não sei. Eu me lembro vagamente de uma promessa sobre um filme e um jantar. – Justo! O que você quer assistir? – Não sei. Que tipo de filme você gosta? – Ahm… – coçou a cabeça. – Você pode achar estranho… – Você já se divertiu bastante às minhas custas por eu gostar de Jornada nas Estrelas. Vai, Holt. Desembucha! – Eu gosto de filmes de horror, mas daqueles antigões, sabe? Preto e branco até. Fiquei o encarando e forçando meus olhos a piscarem. – Eu adoro esse tipo de filme também. – recitei, descrente. – Mentira! – Não, não vale! Você tem que me contar alguma coisa bizarra que você goste e eu não. Filme de horror antigo não vale. – Dom, acho que você não me entendeu… – Ele parecia levemente constrangido. – Eu gosto dos antigos mesmo. Dos esquisitos que não fazem sentido nenhum. Eu me divirto, sabe? Acho eles hilários. Mas eu tinha entendido perfeitamente. – Você já assistiu ao filme Veio do inferno? – perguntei, e vi seu queixo cair exageradamente. – Eu nunca conheci, na minha vida toda, alguém que também tivesse visto esse filme! – Ele se virou para o lado para tentar ficar de frente para mim. – Imaginei que tivesse assistido a esse… Quero dizer, nada é mais antigo e sem sentido do que um homem que morre e volta do mundo dos mortos como uma árvore assassina. – Por causa dos espíritos dos povos da tribo! – adicionou, completando o roteiro do filme. – E porque a ilha era radioativa! – lembrei. – E ele veio do inferno! Eu estava rindo animada e ele sorria de volta em uma empolgação única. – E o jeito como ele mata as vítimas! – Holt continuou, rindo – As joga em uma poça de areia


movediça… – E as atuações daquele filme são um circo dos horrores. Quero dizer, a árvore assassina joga as pessoas na borda da poça e, em vez de elas se agarrarem em qualquer coisa para se salvar… – Elas nadam para mais para longe! – ele concluiu minha frase. – É absurdo. Ri aquele filme inteiro. – É um dos melhores. Sem dúvidas. – Certo! – Ele respirou fundo e me observou com cuidado – Do que mais você gosta? – Achei que já tínhamos escolhido a categoria do filme – brinquei. – Eu sei, eu sei… É só que… Queria saber do que mais você gosta. – Virei de lado, ainda sentada no seu colo, e apoiei meu braço em seu ombro. – Vai! Me conta. – Ele sorriu convidativo e eu percebi que, depois que meu pai tinha falecido, não havia qualquer pessoa no mundo que me conhecesse. Alisei seu cabelo e sorri. Eu queria contar tudo. – Gosto de comida italiana. Lírios. Não sou muito fã de chocolate. Detesto sorvete. Sou louca por romances distópicos. Tanto esses juvenis atuais como os clássicos: Ardil 22, 1984, A Revolta de Atlas… Amélie Nothomb é minha autora favorita, mas também gosto muito de Dostoiévski. Sei que soa pseudocult dizer que gosto de literatura russa, mas depois que li O diabo e outras histórias, do Tolstói, alguma coisa mudou dentro de mim e eu nunca mais consegui parar de ler os camaradas. Meu diretor favorito é o Woody Allen, tem algo real nas histórias dele que sempre me toca profundamente. E seu filme Match Point faz referências óbvias a Dostoéivski e tem cenas completamente inspiradas em Crime e castigo, que é o meu livro favorito. Todo mundo diz que o melhor livro dele é Irmãos Karamázov… Eu mostro a língua para essas pessoas. Crime e castigo é sublime. – Filmes favoritos? – ele perguntou com um sorriso imenso no seu rosto. Ele estava se divertindo com a minha disposição. – Gosto de qualquer coisa do Woody Allen. Gosto dos filmes do Jornada nas estrelas. Da trilogia Senhor dos anéis. Tinha um brilho engraçado nos seus olhos. – Mas qual é o favorito? Se só pudesse escolher um? Eu não precisava nem pensar: – E o vento levou. – CLARO! – colocou a testa contra o meu rosto. – Por que “Claro”? – Se você não for fã da Scarlett O’Hara eu engulo minha mão – sorriu. – A mulher é uma batalhadora! – Levantei as mãos e ele começou a rir. – E em uma época em que mulheres eram submissas irrelevantes. Scarlett é um exemplo. Ela é uma pessoa horrível. Mas é um exemplo. – Tem muito dela em você. – É o maior elogio que você poderia me fazer – mostrei a língua pra ele. – “Nunca mais passarei fome” – entoou, recitando a famosa frase do livro e do filme. – As pessoas esquecem do resto da frase. – falei mais para mim mesma do que para ele. – Como assim? – Todo mundo só se lembra do “Nunca mais passarei fome”, mas a cena é muito mais do que isso. – Me conta – ele sussurrou. Era uma conversa boba e cheia de trivialidades, mas estava sendo importante para Greg. E estava sendo importante para mim. Havia tantas coisas que a gente desconhecia sobre o outro. Baguncei seus cabelos.


– Ela chega em casa e sua vida acabou. Ela acabou de passar pelo inferno da guerra civil. Quando ela acha que finalmente chegou em casa, quando ela acha que finalmente está a salvo… o lugar que ela chamou de lar está em completo caos. – Se eu fechasse os olhos, conseguiria ver a tela em tons de preto e vermelho na minha frente, e Vivien Leigh subindo o morro desgastado. Deus, eu amava esse filme. – Ela sobe o morro da horta e cava o chão com as mãos nuas para comer raízes e o que mais ela conseguir encontrar. – E então ela diz: “Nunca mais passarei fome” – Holt concluiu suavemente. – Não. – Beijei sua bochecha. – Ela diz: “Nem que eu tenha que matar, roubar ou mentir… Nunca mais passarei fome”. Ela está disposta a fazer o que precisa ser feito para proteger a si mesma e as pessoas que ama. – Uma mulher determinada. Confiante. Autossuficiente. – Tinha algo diferente no seu sorriso dessa vez. – Um exemplo. – Sem dúvidas. – Ele colocou uma mecha do meu cabelo atrás da orelha. Havia algo nos seus olhos verdes que estava me incomodando. – Já sei o que quero fazer hoje. – Descobri de repente. Gregory olhou para mim e deixou que sua expressão de dúvida fizesse a pergunta por ele. – Acho que a gente devia ir ver a sua mãe. – Dom… – Sua expressão mudou imediatamente. – Não faz isso. A gente está tão bem. – Você precisa superar isso um dia, Greg. – Eu sei. Tudo bem. Mas hoje não. – Então, quando? Ele abriu a boca procurando as palavras e a fechou de novo. Abriu mais uma vez e tornou a fechála. – Não sei se isso entre a gente vai dar certo, Gregory. Mas eu mudei um bocado nessas míseras duas semanas aqui. E acho que mudei para melhor. Descobri coisas sobre mim que eu nem sabia que existiam e isso foi graças a você, sua chantagem e sua persistência. – Dom, essa história com a minha mãe é… – Eu sei. Juro que sei. – Coloquei as mãos em seu rosto e tentei fazer com que o meu toque deixasse claro para ele o quanto eu me importava.– Mas, se as coisas entre nós não derem certo, daqui a duas semanas eu vou embora e você vai se esconder. Você nunca vai olhar a caixa da sua irmã. Vai se esconder da sua mãe e ignorar o passado. Não se vive assim, Greg. – Você odeia a sua mãe! Como pode me dizer para dar mais uma chance para a minha? – Você deu uma segunda chance para sua mãe? – Ele ficou em silêncio. Sabia que a resposta era não. – Eu dei umas doze segundas chances para a minha. E ela me decepcionou em cada uma. Demorei muito tempo para descobrir que tudo que ela fazia era me machucar. – Encostei meu nariz no dele. Eu não queria me afastar. Ou pior, não queria que ele me afastasse. Sabia que seu primeiro instinto seria fugir e queria segurá-lo ali. Fazer o que fosse possível para que ele se sentisse seguro. – Com a sua mãe é diferente. Ela está magoada. – Dom… – Eu posso não saber muitas coisas, Greg, mas eu sou muito boa para julgar caráter. E acredite quando eu digo que sua mãe não é uma pessoa ruim. Ela só é uma pessoa que sofreu um bocado. E que ainda está sofrendo. – Ela merece – respondeu ríspido. – Eu entendo que você ache isso. E até concordo que o que ela fez foi horrível. Mas ela também


perdeu muita coisa, Holt. Você não perdeu sozinho. – Outro dia, está bem? Outro dia nós vamos. – Você não vai. Sabe que não vai. Precisa quebrar a inércia, Greg. – Eu não quero proximidade com a minha família, Dom. Eles são tóxicos. São perigosos e letais – rosnou com os dentes semicerrados. – Se você for até lá e der uma boa olhada na sua mãe, vai ver que está errado em relação a ela. Há no mundo poucas criaturas tão indefesas. Acariciei seu rosto e beijei sua boca. – Deixa eu te ajudar. Você me ajudou e eu sou impossível, eu sei. Se você não tivesse um vídeo meu eu nunca teria deixado você fazer isso. Se eu tivesse um vídeo seu, você seria obrigado a ir. Então, finja que está sendo obrigado. Não precisa ir por ela. Vai por você, Holt. Vai até lá para largar essa dor e esse arrependimento. Vai até lá por mim.

E eu estava dentro de um carro sendo levado até a Casa Morghan. Se ela tivesse dito qualquer outra coisa eu seria capaz de recusar ou enrolar. Mas ela pediu que eu fosse por ela. Merda… Eu faria qualquer coisa por ela. Assinei meu nome em um livro de visitas e fui conduzido por um funcionário por um lance de escadas. – O que está fazendo? – Dominique tinha se separado de mim e ido se sentar em um sofá na recepção. – Vou esperar aqui. Vocês precisam de privacidade. Eu desci os quatro degraus que já tinha subido. Ah, mas de jeito nenhum! – Você vem. – Greg… – Eu não vou falar com ela sozinho! Não sei nem o que diria! Isso foi ideia sua… Ou você vem comigo ou eu não vou. Ela se rendeu e me seguiu. – Senhora Holt! – o funcionário chamou. – Tem alguém aqui para vê-la. Sentada em uma cadeira de rodas de frente para um grande tabuleiro de damas, estava a minha mãe. A senhora sentada do outro lado sorriu, despediu-se e levantou quando viu que a colega tinha visitas. Ela virou o rosto e sorriu primeiro para Dominique. Levou dois segundos para me reconhecer. Suas mãos trêmulas foram para a boca e eu a observei. Ela parecia tão… velha. Não tinha qualquer resquício da mulher intolerante que regurgitava todos os discursos da minha avó. Aquela senhora sentada na cadeira de rodas era alguém que tinha lutado contra a vida e perdido grotescamente. – Greg! – ela falou meu nome com um soluço. – Olá, mãe – falei inexpressivo. Dominique se sentou no sofá ao seu lado e eu me mantive de pé. Estava só esperando um sinal de que ela estava satisfeita para dar o fora daquele lugar. – Oh!! Oh-ohh! – Ela apertou a mão de Dominique como se sentisse gratidão. Obviamente, sabia que, se eu estava ali, não tinha sido por decisão minha. – Por favor, venha até aqui! Deixa eu te ver! Me aproximei e sentei no sofá perto de Dominique. – Como você está? Você está bem? – Ela se aproximou o máximo que pôde sem me tocar. Pelo


movimento de suas mãos, notei que era isso que ela queria. Mas estava se controlando. – Estou. Tudo certo. Não ia perguntar como ela estava. Isso não podia acabar bem. Ela ficou parada me observando, dividida entre um soluço e um sorriso, e eu comecei a ficar constrangido. – Bem, só viemos dar uma olhada na senhora. Estamos um pouco atrasados – disse, levantando. – Ah, tudo bem. – Ela pareceu um pouco decepcionada. Mas logo sorriu de novo. Aquele sorriso louco e desesperado que me incomodava mais do que tudo. – Atrasados para quê? Thoen… Cala a boca. – Thoen. Nós precisamos… – Holt! Sente e converse com a sua mãe – ela rosnou na minha direção de um jeito que me deu medo. Ela conseguia ser extremamente impositiva quando queria. – Eu vou ao banheiro. Se me dão licença. Ela levantou e se foi. Na minha cabeça, comecei a xingá-la. Sabia que a amava e era, sem dúvidas, a mulher mais gostosa que eu já tive na cama, mas, por Deus, ela conseguia me enlouquecer. – Ela é uma boa menina – sorriu tímida e eu tive que rir. Dominique? Uma boa menina? – O que há entre vocês? – Ainda não sei bem. – Ah! – Ela olhava para os lados como se procurasse assunto. Estava mais nervosa do que eu. – Obrigada por ter vindo. Significa muito para mim, filho. Expirei profundamente. Aquilo, definitivamente, não ia dar certo. – Não vim até aqui por sua causa. Vim para que Dominique me deixasse em paz. Por você, eu não viria nunca. Meu pai e minha irmã estão mortos, e a culpa é sua. Você é uma egocêntrica venenosa que só se importa com duas pessoas no mundo: com você e com a sua mãe. Pois se quer a visita de alguém, ligue para ela. – Você está certo. Tudo bem. Eu não estava esperando aquilo. Todas as conversas que já tinha tido com minha mãe sobre esse assunto sempre terminavam em gritos que me levavam à rouquidão. Ela se agarrava com todas as forças ao fato de que não tinha como saber o que iria acontecer e que só queria o melhor para a família e mais toda essa merda que minha avó tinha colocado na cabeça dela. – Estou certo? – Está. Você sempre esteve, na verdade. Acabaram minhas palavras. Merda. Eu estava me sentindo mal. Dali a alguns minutos, quando Dom voltasse, eu iria embora e ia deixá-la sozinha naquele lugar com nada para lhe fazer companhia a não ser as palavras horríveis que eu tinha acabado de dizer. – Desculpe se fui grosseiro. – Não precisa se desculpar. Tive muito tempo aqui, Gregory. Com nada para fazer a não ser me afogar em arrependimentos. Sei que pareço bem mais frágil, mas a verdade é que aqui fiquei mais forte. E agora eu consigo encarar o que eu fiz.


Seus olhos estavam marejados. – Não vou pedir seu perdão porque eu sei que não mereço. Mas o problema é que eu não sei mais o que fazer comigo. Não tenho mais vida, não tenho mais nada. Só restou você. Acho que a esperança de ter notícias suas é a única coisa que ainda faz com eu me mantenha viva – sorriu. – E, mesmo que você não volte para me visitar nunca mais, estou feliz que esteja com essa moça. Ela parece cuidar bem de você. – Não foi minha intenção ser grosseiro – repeti, por falta do que dizer. – Foi sim – ela riu, e finalmente tomou coragem para tocar o meu queixo. Balançou meu rosto do jeito que adultos fazem com crianças muito pequenas e eu senti uma saudade imensa dela. Uma saudade insuportável de uma época em que as coisas eram simples e boas. – Tá – admiti com um meio sorriso – Talvez tenha sido. Seu sorriso aumentou e eu a acompanhei discretamente. – E esse lugar? É bom? Se quiser posso procurar outro lugar para você. – Ah, eu gosto daqui. Os funcionários são muito gentis e o pudim de chocolate das sextas-feiras é divino! – exagerou. – Tudo bem. Tudo bem – ri do seu otimismo. Ela parecia diferente. Talvez Dom estivesse certa. Inferno… Era de Dominique que eu estava falando. Era óbvio que ela estava certa. – Quem é a sua amiga? Que estava aqui antes de a gente chegar? – Paula Trimm! Ela é um doce! Os filhos largaram ela aqui. Mas isso não é novidade – riu. – É difícil achar alguém aqui dentro que não tenha a mesma história. – Mãe, eu não… – Eu sei, garoto. Não se preocupe. Não é culpa sua. Nada disso é. É culpa minha. Eu podia ter feito tanta coisa diferente. – Acho que não adianta mais pensar nisso agora. Todo mundo errou em algum momento. Acho que a gente tem que admitir isso, aceitar e seguir em frente. – E, simples assim, meu ódio tinha ido embora. Era estranho e até ridículo. Tanto tempo de raiva. E depois de algumas poucas frases ditas e ouvidas… Acabou. – É. Acho que você está certo. – Tudo bem com vocês? – Dominique estava de volta. Nós sorrimos e ela se sentou do outro lado do tabuleiro. – Esse banheiro que você foi, era lá em casa? Ela me mostrou a língua. – Uma partida, Audrey? – Ah! Eu não sou muito boa nesse jogo – ela riu, colocando o rosto nas mãos. – Sem problemas, Greg joga com você. – Jogo, é? – Joga! Minha desforra por aquela última partida de Street Fighter.

Estacionei o carro e Dom me olhou sem compreender. – O que estamos fazendo aqui? – Tem uma cantina italiana incrível ali na esquina – expliquei – Te devo um jantar. – Hmm! Verdade! – Bateu com as mãos nos joelhos. Abri a porta e a tomei no meu braço. Ela usava um vestido de verão justo na cintura, com alças


curtas, decote moderado e saia rodada. Não tinha um homem que passasse por nós que não se virasse para observá-la mais uma vez. Dom ignorava completamente todos eles e eu percebi que era bem provável que ela estivesse acostumada a esse tipo de coisa. – Sua vez! – sorriu. – Filmes e livros favoritos! – pediu enquanto o garçom perguntava se queríamos vinho. – Estou dirigindo, mas se você quiser… O restaurante era cheio de pequenas passagens e as mesas eram dispostas de um jeito que quase todos os clientes tinham uma boa dose de privacidade. – Não. Eu não faço questão. Se você quiser beber, eu dirijo. – Você já fez isso por mim na comemoração do escritório. – O garçom se foi para buscar refrigerantes. – Verdade! Você estava bebendo uma taça de champanhe atrás da outra, Holt. – E ia continuar até desmaiar e não ser mais obrigado a ver a senhorita flertando com o idiota do Hill. – Estava tentando te provocar. – Mas é claro… E conseguiu. – Ah, nem reclame! Eu acabei dando um murro nele. – Verdade! Um dos melhores momentos da minha vida. – Fechei os olhos para reviver a lembrança e ouvi sua risada. Eu amava aquele som. Amava seu gemido também, mas acho que amava sua risada ainda mais. Não… Provavelmente amava mais o gemido. Aquilo me deixava doido de tesão. – Obrigado por ter me feito ir hoje. Acabou sendo uma boa ideia. – Todas as minhas ideias são boas – ela riu daquele jeito safado que me dá vontade de foder aquela boquinha linda. Sacudi os cabelos afastando os pensamentos. – Gosto dos filmes do Tarantino – mudei de assunto antes que ficasse duro no meio do restaurante. – Sério? Você não faz o tipo. – Tem um tipo? – ri. – Sei lá, você é calmo. E os filmes de Tarantino me parecem exagerados. – E são. Acho que é exatamente por isso que eu gosto. Ele não liga: simplesmente vai lá e faz. Acho isso libertador. – Tarantino, hein? – ela perguntou, com um sorriso curioso. – Tarantino. – Ouviu falar de um cara que salvou uma lanchonete de um assalto recitando uma passagem de Pulp fiction? – A cena do final ou Ezequiel 25:17? – A cena do final. – Eu comecei a rir. – O que foi? – Você sabe qual é a cena. E entendeu a referência a Ezequiel 25:17. – “Inglês, filho da puta, você fala?” – rosnou baixinho, em uma péssima imitação de Samuel L. Jackson que fez refrigerante sair pelo meu nariz. É sério, Dominique era incrível. Quando eu repassava tudo que eu sabia sobre ela na minha mente, parecia só invenção de um homem apaixonado. Mas se eu fizesse uma lista objetiva ela diria: Gostosa. Inteligente. Sagaz. Competente. Gosta dos mesmos filmes que eu. Gostosa. Entende o que se passa na minha família. Boa de cama. Muito boa de cama. Muito, muito boa de cama.


Determinada, Corajosa. Gostosa. Surpreendentemente carinhosa. Estava aprendendo muitas coisas sobre ela nos últimos dias. Sobre seu jeito, sua personalidade, seus gostos. E não tinha absolutamente nada que não me fizesse ficar ainda mais louco por ela. Quando Dom disse que gostava de Senhor dos anéis, senti vontade de rir. Chegava a ser cômico como ela combinava comigo. Ela encaixava de todos os jeitos certos. Eu não podia deixá-la ir embora de jeito nenhum. Se ela fosse, eu ia com ela. Coloquei as mãos em cima da mesa, como um convite. Ela pegou uma de minhas mãos e a beijou de um jeito suspeito. Toquei sua coxa por baixo da mesa e sua mão segurou meu braço, me guiando mais para cima. Gostei da brincadeira. Subi minha mão por aquela carne gostosa e apertei as pontas dos dedos contra sua pele. Em um movimento suave e discreto. Dom derrubou o guardanapo de pano no chão e se inclinou para buscá-lo. Minha mão escapou de sua pele e a frustração invadiu meu corpo por alguns segundos. Até eu senti-la embaixo da mesa. Aquela mulher infernal enfiou a mão na minha virilha, destravou a fivela do meu cinto e desceu o zíper. Olhei ao redor. A toalha da mesa se arrastava pelo chão, e para o espectador desavisado eu parecia apenas um cavalheiro esperando sua companhia voltar do banheiro. Mas ela estava ali embaixo. Seu toque no meu pau foi breve e eu estava duro como concreto em suas mãos. E aí eu senti aquele calor molhado me envolver. Puta merda. Puta merda. Puta merda. Apoiei os cotovelos e a testa na mesa e escondi meus olhos com a mão. Seja lá o que você fizer, Holt, não deixe escapar nenhum gemido. Poucas coisas na vida eram melhores do que aquela boca no meu pau. Muito poucas. Na verdade, no momento, eu não conseguia pensar em nenhuma. Senti uma camada fina de suor cobrir meu corpo e minha respiração falhou. O garçom se aproximou. Por favor, vá embora. – O senhor precisa de mais alguma coisa? – Não. Estou bem. – Meu sussurro era pouco audível e eu congelei na cadeira. Diga alguma coisa, Holt. – Só esperando os pratos, obrigado. – Tudo bem – ele sorriu educado e se afastou. Acho que Dominique o ouviu se afastar porque sugou meu pau como um aspirador, tirou ele da boca e engoliu meus testículos. Eu não ia conseguir ficar em silêncio. Simplesmente não ia. Puxei seus cabelos, forçando-a a parar. – Garçom! – chamei um pouco alto demais. – Sim, senhor? – Na verdade… Vou precisar dos pratos para viagem.

A masturbei o caminho inteiro. – Já estou arrependido. – De quê?


– De ter apagado o vídeo, de que mais? – Está querendo ouvir meu gemido é? – Sempre e quando eu quiser. – Enfiei mais um dedo nela na hora em que entrei na garagem de casa. – Hooolt! – ela gemeu alto. – Vem aqui que eu quero gemer no teu ouvido. Te fazer gozar só me ouvindo ficar louca por causa desses teus dedos. Me joguei em cima dela, guloso, e a beijei, chupando seus lábios e língua. Nos soltamos com desespero e saímos do carro correndo para a porta. Ela tropeçou no degrau e eu a segurei nos meus braços. A espremi contra a porta e enfiei minha língua na sua boca. – Dom, nossa… Dom… Eu não tinha palavras. Quer dizer, palavras eu tinha. Mas as que não deveriam ser ditas. Suas mãos puxaram meu cabelo. Eu queria dizer “Eu te amo”. Queria dizer “Eu te amo. Faz amor comigo e não vai embora nunca mais. Por favor”. Acho que fechei a porta atrás de nós, espero que sim, porque não aguentei chegar ao quarto e eu e Dominique ficamos nus na escada. Se a porta estivesse aberta, qualquer vizinho na calçada poderia ver suas costas nuas rebolando no meu pau. Segurei sua bunda com força e guiei seu movimento sobre mim. Assisti seus seios seguindo o ritmo das cavalgadas e gozei longamente com espasmos fazendo minhas pernas tremerem. Dom estava suada sobre o meu corpo e eu me estiquei: porta fechada. Ainda bem. Adorava o toque da sua pele suada contra a minha. Dava uma sensação de lar, de estar em casa. Não importava se era aqui ou do outro lado do país. Se ela estava suada sobre mim e sorrindo ao meu ouvido, eu estava em casa. Droga… Eu estava muito apaixonado.

Ela saiu do banho vestindo um de seus pijamas curtos. – Não vai querer uma camisa minha hoje? – Não, estou bem, obrigada. – Prendeu o longo cabelo escuro em um farto rabo de cavalo. Recostei nos travesseiros e esperei ela vir para os meus braços. Preferia quando ela usava uma de minhas camisas para dormir. Era estúpido, mas só vê-la usando algo meu me fazia sentir como se ela fosse minha. Não de um jeito esnobe e possessivo. Mas de um jeito carinhoso e duradouro. Era o tipo de coisa que namoradas faziam. Dom me beijou devagar e se afastou para deitar no seu lado da cama. – Nada de dormir agarradinho para você, hein? – Nós já conversamos sobre você cutucar uma mulher cansada, não foi? Dominique deitou de barriga para baixo e virou a cabeça no travesseiro. Fui para o lado dela da cama e grudei meu nariz em seu ombro passeando as pontas dos dedos pela sua coluna. Suas costas subiam e desciam com sua respiração. Ela entendia os problemas com a minha família. Dom tinha uma gentileza e uma bondade em seu coração que até ela desconhecia. Naquela tarde, eu tinha dado o primeiro passo para me livrar de anos de um ódio inexplicável, e tudo por causa dela. – Dom? Você acredita em alma gêmea?


– Ai meu Deus, Holt, deixe de ser tão mulherzinha. Eu tive que rir. – Quer dizer que se uma pessoa é sensível ela é mulherzinha? Onde está sua defesa pela igualdade de gêneros, Thoen? – Estudos comprovam que mulheres são mais sensíveis que homens! – Ela se virou para mim e agora era eu quem recebia suas desajeitadas cosquinhas – E eu não defendo a igualdade de gêneros. Defendo a equidade de gêneros, senhor Holt. – Advogada Dominique Thoen se apresentando! – debochei. – E equidade significa tratar coisas iguais como iguais e diferentes como diferentes. – Eu também fiz faculdade de Direito, sabia? – Ela estava mais me beliscando do que fazendo cosquinhas. Mas o contato com ela, qualquer contato, era sempre tão bom que eu recebi seus beliscões rindo. – Nossa! Foi só uma pergunta! – Segurei suas mãos e joguei uma perna por cima do seu corpo para dificultar seus movimentos. – Não. – Seus lábios tocaram os meus rapidamente e se foram deixando um sorriso no meu rosto. – Não acredito em alma gêmea ou em amor à primeira vista ou nenhuma dessas bobagens. – Por quê? – Porque eu não acho que existe amor. Acho que é uma coisa que o desejo humano inventou. Quer dizer… Pelo menos era isso que eu achava até você apar… – Ela interrompeu a fala como se as palavras tivessem um gosto ruim. Ela tinha dito que me amava? Tinha, não tinha? Ela tinha dito que me amava. Quis que ela concluísse. Dissesse as palavras de uma vez para que eu pudesse dizer “Eu te amo também” e pronto. Aí eu poderia fodê-la nas escadas e dizer como eu me sentia quando eu quisesse, sem nenhum tipo de freio. Mas ela engoliu as palavras, respirou fundo e concluiu com um pensamento que, definitivamente, não era o mesmo que tinha começado. – Até você aparecer e querer me convencer de que a humanidade é boa. – Foi uma boa saída. Quase fazia sentido – Agora, estou começando a me questionar. – Ela sorriu, mas havia algo trêmulo no canto da sua boca. Ela estava com medo. É claro que estava. Dom tinha o costume de ser só. Se ela achava que me amava, aquilo deveria estar matando ela de medo. Ela deveria estar apavorada. Se eu, que era bem mais aberto a esse tipo de emoção, estava tremendo por dentro, eu apenas podia imaginar o que se passava na sua cabeça. Ela não estava pronta para dizer. Tudo bem. Eu também não estava. Mas isso não significava que eu não estava pronto para escutar, e aquelas palavras espontâneas e inocentes aqueceram meu coração. A puxei para perto de mim e a beijei. Coloquei o máximo de carinho que consegui naquele beijo. Era o meu jeito espontâneo e inocente de dizer “Eu também”. Seus olhos me observaram tranquilos. Dom estava nos meus braços e não importava onde eu estivesse no mundo. Se ela estivesse comigo, eu estaria em casa. Apertei meus braços ao seu redor e a beijei mais uma vez. E de novo e de novo. – Vai dormir agarradinha hoje – decidi. Ela riu tentando me empurrar sem muito empenho, e logo


desistiu. Dormiu em meus braรงos, com a boca grudada na minha.


Capítulo 18 “– Se você acha que vou casar com você só para retribuir o favor, eu não vou. – Não se superestime. Eu não sou o tipo que casa.” Scarlett e Rhett – E o vento levou – Acho que a gente precisa conversar sobre algumas coisas. – Holt encheu meu copo de suco e segurou a gravata mantendo-a no lugar enquanto se sentava. – O que foi? – Coloquei o copo na boca. A brisa fresca da manhã entrava pela janela e depois de um feriado maravilhoso, eu estava bastante disposta. O problema agora seria me manter ocupada, já que a casa estava arrumada e eu não consigo ficar muito tempo sem fazer nada. – Não sei se você notou – seu sorriso era um misto de constrangimento e graça –, mas a gente não tem sido muito cuidadoso. Eu sabia exatamente o que ele queria dizer, mas o fato de ele ter demorado tanto tempo para perceber me fez querer provocá-lo. – Como assim? – Quis dizer… em relação à proteção. – Quer que eu ligue para alguma empresa de segurança colocar um alarme na casa? Esse comentário foi um pouco demais e Holt abriu a boca desconfiado de que eu já tinha entendido a sua intenção. – Dominique. Você sabe do que eu estou falando. – A gente já transou zilhares de vezes e só agora você lembra que não ter usado camisinha pode ter sido um problema? – Eu culpo você – sorriu, safado, se escondendo atrás da xícara de café. – O corpo, os gemidos, a provocação… Eu esqueço de tudo. – Esquece com frequência? – Isso era um pouco preocupante. Greg largou a xícara e aproximou seu rosto do meu. – Nunca transei com ninguém sem camisinha. Nunca. Mas com você, eu só… Me distraí. – Fechou os olhos como se estivesse revivendo uma memória deliciosa, e eu dei um tapa em seu braço. – Vai se atrasar. – E você também esqueceu! Se tivesse dito qualquer coisa, eu teria colocado. – Eu sei. Acho que me distraí também – sussurrei. Holt passou a língua nos lábios como se quisesse desistir da audiência e me foder ali, em cima da mesa. – Mas não se preocupe, eu tomo anticoncepcional. Então, pode ficar tranquilo. Sou eu quem tenho que me preocupar com suas doenças – ri. – Eu sou limpinho. Você que é safada. – Deu um beijo no topo da minha cabeça quando se levantou.


– Isso é meio delicado. Principalmente porque a gente pulou de cabeça nisso, mas é uma coisa séria, Holt. – Mudei o tom – Tem algo com que eu precise me preocupar? – Não. Nenhuma doença. – Piscou um olho pra mim. – Tomo muito cuidado com minha saúde. – Ótimo. Eu também não tenho nada. – falei antes que ele perguntasse. – Tenho um cuidado obsessivo com essas coisas. Faço exames anuais. De tudo. – Tudo bem – ele sorriu, pegando meus braços quando eu levantei com meu prato. – A gente pode continuar, então? Sem camisinha? Sem preocupações? – Acho que é meio tarde para dizer não. – O beijo que eu dei em seus lábios era para ter sido rápido, mas ele me segurou pelos cabelos e não me soltou. – Adoro ter você aqui – confessou com um sussurro quando nossas línguas se soltaram. – Na sua casa? – Nossos narizes se tocavam e a proximidade com Holt estava tirando o oxigênio do ambiente inteiro mais uma vez. Agora era eu quem queria que ele desistisse da audiência e me fodesse em cima daquela mesa. – Não – riu. – Aqui – explicou, sugestivo, apertando os braços ao meu redor. – Bem… Eu não vou a lugar algum. Pelo menos, não pelas próximas semanas. Seu sorriso largo ficou tímido e retraído. – Você disse “Conversar sobre algumas coisas” – lembrei. – Sim! – Bateu a mão na testa. – Como você está? – Muito bem, obrigada. – Não entendi. – Dominique – revirou os olhos –, seu pé e seu braço? Não temos sido exatamente cuidadosos com eles e você foi para a festa de salto… – Não se preocupe – ri. – Eu sou tipo o Wolverine. Preciso de pouco tempo para me recuperar. Ele riu da minha referência e perguntou se eu tinha certeza. Tive que levantar a camisa para mostrar que os hematomas tinham sumido. Ele tocou minha pele, ganancioso, e me beijou mais três vezes antes de sair.

Estava regando as plantas enquanto Max dormia na sombra quando vi Thierry e Rick caminhando pela calçada. – Bom dia, vizinha – Rick cumprimentou. – Oi, Rick. Bom dia, Thierry. – Olá, olá – respondeu sorridente. Andava se apoiando no braço de Rick. – Exercício matinal? – perguntei. – Estou me preparando para uma meia maratona. Uns seis meses disso e eu conseguirei correr. Tive que rir. Seu bom humor diante de sua situação era invejável. Queria saber como sua saúde andava, mas eu me recusava terminantemente a trazer a conversa para assuntos tristes. – Parece que ele está se apoiando em mim. – Rick mostrou o braço. – Mas é o contrário. Eu conseguia ver algo de Holt naquele garoto. Era sua gentileza inesgotável. – Vocês dois não trabalham, não? – Eu estava me repetindo nesse assunto, apenas porque aquilo me incomodava profundamente. Todas as pessoas daquela vizinhança pareciam viver de luz. – Aposentado – Thierry afirmou apontando para si mesmo. – Não sirvo mais para nada a não ser fazer biscoitos. – Mas são biscoitos muito bons – elogiei. – Eu trabalho em casa. – Rick ainda estava rindo do comentário dos biscoitos. – Trabalho com


desenvolvimento de softwares. – Isso parece muito complicado. – Escuto isso com frequência. Mas não é… Sabe aqueles programas que você tem no celular ou no tablet? Jogos e aplicativos? – perguntou. Confirmei com um gesto – Pronto. Eu desenvolvo aquelas coisas e coloco para vender on-line. Tenho uma pequena empresa, mas como tudo é feito pela internet, todo mundo trabalha em casa e a gente se reúne de vez em quando se tiver alguma decisão mais específica que não possa ser tomada por conferência virtual. – Algum aplicativo que eu conheça? – Não sei – riu. – A gente trabalha com alguns aplicativos para profissionais. Temos um compêndio com todas as leis de vários países, talvez esse você conheça. Tem ferramentas de busca, de marcação, permite que você faça anotações. – Eu tenho um desses no meu celular! E foi bem barato. – Olha aí. Talvez seja o meu. – Que incrível, Rick! Nunca conheci alguém que fizesse isso. Achei que esses aplicativos eram feitos por… Duendes escravizados, por meio de magia ou algo assim. Ele riu. – Eu tenho outros mais bobos. Mas esses profissionais são o carro-chefe da empresa. É o que dá dinheiro. Mas faço algumas outras coisas para brincar. – Tipo o quê? – Desliguei a mangueira quando notei que já estava afogando as plantas. – Uns jogos, um sensor de movimento que pode ser vinculado a outros aplicativos e um gravador com comando de voz. São meus atuais projetos à parte da empresa. O gravador é o único que realmente está dando dor de cabeça. – Por quê? – Fazer a gravação ser ativada por um comando de voz é fácil. É só dizer a palavra e ele começa a gravar. O problema é parar. Porque quando você quer fazer gravações longas e com muitas interrupções, como em uma entrevista, por exemplo, a gravação sempre fica cheia de comandos para parar, sabe? Queria conseguir fazer com que ele ignorasse a palavra de comando. Não gravasse a palavra final. Mas se você escolhe uma palavra, ela seria ignorada sempre. Isso seria um problema se ela fosse dita no meio do diálogo. E ainda tem o problema do aprimoramento do reconhecimento de voz… Enfim… Não tinha entendido completamente, mas algo me dizia que quanto mais ele tentasse me explicar, menos eu iria entender. Achei melhor deixar para lá. – Se precisar de alguém para ajudar quando tiver uma versão experimental, é só avisar. – Ah, obrigado. – E você, Dominique? – Thierry quis saber. – Nenhum trabalho hoje? – Não. Estou de férias. Mas estou seriamente considerando voltar ao trabalho mais cedo. Essa coisa de descanso não funciona muito bem comigo. – Seu namorado é advogado também? Não corrigi. Nós estávamos transando. Eu estava apaixonada por ele e tinha dito isso. Ele estava apaixonado por mim e tinha dito isso. Não importava se a palavra ainda me incomodasse: para todos os efeitos, eu e Holt estávamos namorando. – É. – Tem que se controlar para não avançar no trabalho dele, então, hein? – Rick brincou. – Nem me fale. Metade do tempo eu acho que ele não está fazendo as coisas do jeito que… A audiência!


A audiência de hoje era a do caso que a testemunha estava mentindo! Eu sabia que ela estava mentindo e podia provar. Mas será que Holt tinha descoberto o que era? – Dominique? Está tudo bem? – Está. Quer dizer, não! Acabei de lembrar de uma coisa e preciso ir. Dei um tchau apressado para os dois e puxei Max para dentro de casa.

– Sinto muito, senhora. Mas não posso dar esse tipo de informação. Eu queria matar aquela secretária a machadadas. – É um caso de vida ou morte – exclamei para o celular. – Não tenho autorização para isso, senhora – continuou, do outro lado da linha. – Se preferir falar com… – Você pode garantir que não vai me deixar esperando na linha por quinze minutos como da última vez? – Os advogados podem estar ocupados, senhora. Não posso prometer que eles vão atender imediatamente. A não ser que seja urgente. – Mas é urgente, minha filha! Que parte de é urgente você está tendo dificuldades para entender? – Se a senhora não mantiver a educação, eu não sou obrigada a escutar. Malditas secretárias de escritório jurídico que sentem cheiro de processo plausível. Não podia gritar com ela. – Tudo bem. Mas é urgente. – Certo. Se a senhora me disser qual é a urgência eu repasso a informação para… – Devon Hill! Transfira a ligação para Devon Hill, ou para Lynn… – Eu tinha ouvido o sobrenome dela? – Lynn… Lynn Alguma Coisa. – Eles não estão no escritório no momento. Mas a senhora pode deixar um recado, se quiser. Esfreguei os dedos nos olhos. Se Holt perdesse essa causa imperdível por minha culpa, eu nunca iria me perdoar. Quem mais eu conhecia naquele inferno de escritório? – Soraia! – Lembrei com um estalo – Você tem uma estagiária chamada Soraia trabalhando aí, não tem? – Temos… – Pronto! Quero falar com ela. Alguns segundos depois, uma voz feminina e cansada atendeu ao telefone com um alô murcho e irritado. Ela devia estar soterrada por milhões de afazeres, e atender uma ligação devia estar lá embaixo na sua lista de prioridades. – Soraia! Você não se lembra de mim. Meu nome é Dominique Thoen e eu salvei sua vida e a dos outros dois estagiários no assunto da companhia elétrica. Ouvi sua respiração do outro lado da linha. – A amiga do dr. Holt? – Exatamente! Liguei porque preciso que você retribua o favor. Holt esqueceu uma coisa muito importante que pode fazer com que ele perca uma causa. Preciso que você verifique para mim. O cliente se chama Amberg, a audiência é hoje. Preciso que você me diga qual é a vara e qual o horário. E rápido!


Abri a porta de casa e Shelbi quase caiu por cima de mim. – Shelbi! Oi! Olha, eu estou muito atrasada. A empurrei com o corpo e tranquei a porta da frente. Tinha exatamente meia hora para chegar ao centro da cidade. Só o trajeto, sem trânsito, ia levar mais tempo do que isso. – Você estava certa. – Tinha algo na sua voz que me fez virar e observá-la com mais atenção. Seus olhos estavam vermelhos e inchados, algumas lágrimas ainda escapavam pelo canto dos olhos enquanto ela falava. – Shelbi! O que houve? – Eric… Eric, Dominique… Vocês estavam certas. Ai, não. Agora não. – Olha, eu preciso sair agora. Mas eu volto mais tarde e a gente conversa, está bem? – Eu vou jogar as coisas dele fora! – disse chorando. – Vou jogar tudo pela janela e mudar a fechadura! Quero ele longe de mim! – Faltava convicção em sua voz, e eu podia sentir que ela estava louca para perdoá-lo. Mas, se ela tinha vindo até mim para que eu a convencesse a fazer as pazes com ele, tinha escolhido a confidente errada. Mas tinha que ser feito direito. – Não! Você não vai fazer isso agora. – Vou sim! – Ela inflou o peito. Aparentemente, ter alguém para impedi-la lhe deu mais convicção. Achou que poderia xingá-lo até tirar tudo de seu peito magoado e que eu a convenceria a perdoá-lo e a ficar casada. E quando finalmente terminasse de gritar, estaria pronta para morrer ao lado de seu marido traidor. Só que não era isso que eu pretendia dizer. – Vai fazer mesmo. Só não vai fazer agora. Não antes de eu dar uma boa olhada no contrato de casamento de vocês, me ouviu? Seus olhos se arregalaram brilhando. Ela queria jogar as coisas dele pela janela e humilhá-lo. Mas ele pediria desculpas e ela o perdoaria. Seu plano ia até aí. A mera indicação de que um divórcio se seguiria fez suas pernas tremerem perceptivelmente. Ela ia fazer besteira. Se eu a deixasse ali, sozinha, ia fazer alguma besteira enorme e irreparável. – Vem cá. – Puxei-a pelo braço através do gramado de Andy e toquei a campainha compulsivamente. – Dominique! – Ela usava um avental todo sujo de tinta por cima das conhecidas roupas escuras. O cabelo estava amarrado em um cuidadoso nó e eu percebi imediatamente que ela deveria estar dedicando um tratamento de verdade ao cabelo novo. – Preciso que você olhe a Shelbi e preciso pegar seu carro emprestado. – Você precisa de muitas coisas. – reclamou – E eu estou ocupada. – Ah, é? – puxei Shelbi chorosa para o seu campo de visão. – O que foi que houve? – Alguma epifania maluca. Ela quer se livrar do Eric. – Oh, Shelbi! – Andy a abraçou. – Não é hora de abraços. – Eu as separei e depois segurei Andy pelos ombros. – Ela não pode fazer nenhuma besteira antes de eu dar uma olhada no contrato de casamento, você entende? – Entendo. – Precisa ficar de olho nela até eu voltar.


– Tudo bem, sem problemas. – E preciso do seu carro. É urgente. É sobre uma causa de Holt. A audiência é agora e eu preciso chegar lá. – Você é nova na cidade. Vai ser mais rápido se eu te levar. Estava certa. Shelbi estava fungando ao meu lado como se fizesse parte de uma realidade alternativa e eu suspirei. – Posso levá-la para o Clube dos Biscoitos! – Andy sugeriu animada. Ah merda, aquilo tinha virado um nome? – Rick e Thierry ficam de olho nela até eu voltar. Ou você precisa que eu fique te esperando lá? – Não! Eu volto de táxi, de ônibus, de mula, qualquer coisa… Só preciso chegar lá! – Então, vamos!

Desejei bom dia para as pessoas na sala e sentei na cadeira ao lado de Lynn. – Bom dia, Greg. – Bom dia – sorri educado. – Sra. Amberg – cumprimentei. Ela estava sentada em uma cadeira de rodas. Ia ficar ali pelo resto da vida. Seu filho mais velho estava sentado em um banco logo atrás, esperando. A expressão dos dois era de uma derrota ainda não completamente assumida. – Primeiro, o juiz vai ouvir as testemunhas – expliquei ao seu ouvido. – Ele vai fazer algumas perguntas. Depois será a vez dos advogados dele e depois somos nós. – Ele está mentindo, dr. Holt. Não aconteceu daquele jeito. – Vamos tentar deixar isso claro, está bem? Ela concordou com um gesto exausto. Eu devia ter perguntado a Dominique. Mas eu sabia a resposta: ela tinha inventado aquilo para me provocar. Toda aquela história de ter visto algo no processo que provava a mentira de Harris… Não havia nada ali. O processo foi esmiuçado por uma equipe inteira. E depois de novo. Nem eu, nem ninguém mais tinha conseguido encontrar nada ali. A história do homem fazia perfeito sentido e eu não precisava ouvir Dominique dizer que tinha mentido para mim. Não quando estávamos indo tão bem. – Senhores? Vamos começar, então? – O juiz folheou o processo. Sybill Amberg era uma funcionária da construtora Hammil. Seu cargo era secretária. Ela deveria passar o dia em uma pequena sala cuidando de papéis. Mas, por algum motivo, tinha sofrido um acidente em campo, regulando um aparelho sem as instruções necessárias. A construtora alegava que o técnico estava com ela, a defesa, que o técnico estava operando a máquina e que Sybill se machucou por culpa própria. O que Sybill alegava, e nós sabíamos ser verdade, era que, após uma longa onda de demissões, a Hammil estava usando os funcionários de todos os modos errados, e Sybill tinha sido instruída a regular equipamentos, mesmo sem conhecimento, e obedeceu por medo de ser demitida. Foi a imprudência da construtora que fez com que a jovem sra. Amberg se envolvesse no terrível acidente. Ela ficou caída por horas, sozinha, até o técnico finalmente chegar e ouvir seus gritos fracos e roucos. Mas não era isso que a testemunha dizia. – O Sr. estava presente no momento do acidente? – o juiz quis saber.


– Estava. – Mas se ausentou. Por quê? – Precisei ir buscar ajuda. Mas era no meio da semana e não há nada perto da construção a não ser uma livraria. Corri até lá. Precisava de uma toalha ou de um pano para ajudar a estancar o sangramento. E de um telefone. – Estava sem celular? – Não tinha sinal. – Não havia telefone no local da construção? – Não. As obras ainda não começaram. Eram só testes preliminares. Coisa que qualquer pessoa pode fazer. A senhora Amberg me acompanhou para anotar os resultados, ela estava tirando algumas fotos quando se distraiu e andou para o lugar errado. – Mentiroso! – Amberg falou sofrivelmente. – Sra. Amberg, por favor – instruí. – Não vai acontecer de novo, excelência. A nossa argumentação girava em torno da negligência da empresa. Estávamos alegando que eles poderiam tomar medidas de segurança maiores, que deveriam ter mais pessoas presentes no local se os testes tinham algum risco em potencial. Mas a diferença entre a falta de cuidado para proteger a sra. Amberg e eles terem de fato colocado a funcionária sem as qualificações necessárias em um ambiente perigoso era de alguns milhões na indenização. Em vez dos poucos milhares que ela acabaria recebendo. Os advogados da construtora solidificaram ainda mais o fato de que a empresa tinha feito o possível para proteger os funcionários e que a culpa tinha sido exclusiva da vítima. – Vamos passar a palavra agora para os advogados da sra. Amberg – o juiz indicou. Lynn organizou a listagem de perguntas e me passou. – Bom dia, sr. Harris. – Bom dia. – Primeiro, queremos tirar algumas duvidas sobre o padrão de segurança da… A porta se abriu atrás de nós e todos os olhos da sala se levantaram para Dominique. Dominique? Mas o que diabos… – Peço desculpas pelo atraso. Ela usava uma saia cinza justa que ia até os joelhos e uma blusa branca de seda com mangas compridas. Os primeiros três botões estavam abertos e o decote exibia o alto dos seus seios. O cabelo estava preso em um elegante rabo de cavalo. A maquiagem era discreta e usava um delicado par de brilhantes nas orelhas. O conjunto como um todo era o que fazia as mulheres do escritório chamá-la de vadia e se morderem de inveja. Tê-la de short curto na minha casa era espetacular o suficiente. Mas essa imagem da Dominique no auge do poder, a advogada cruel que tinha me irritado todos os dias pelos últimos anos da minha vida, me deu vontade de pedir que ela me esperasse em casa vestida exatamente daquele jeito. Para eu arrancar aquela saia com os dentes. – E quem é você? – o juiz perguntou com pouca severidade na voz. Não pude deixar de imaginar que uma parte dele também estava babando por aquela deliciosa mulher que tinha acabado de entrar. Lynn tinha o queixo no chão e encarava Dominique como se quisesse matá-la com o olhar. – Sou uma das advogadas da Sra. Amberg. Sou a encarregada da sua causa. Pedi para que uns colegas a acompanhassem porque poderia me atrasar. Eu foquei meus olhos nos seus, em desespero. Dom, o que você está fazendo?


Mas havia uma segurança no seu andar que empurrava minhas dúvidas para bem longe. Deixe ela fazer o que sabe, Greg. – Obrigada, meu bem, mas já cheguei. – Ela puxou a cadeira de Lynn e indicou que ela se levantasse. Lynn olhou para mim como se esperasse que eu fizesse alguma coisa. Mas fazer o quê? – Não gosto que as pessoas se atrasem para minhas audiências, doutora… – Thoen. – Ela observou o juiz com um sorriso. – E eu me atrasei porque estava preparando algumas provas que o senhor vai achar muito interessantes. Quando eu terminar de falar, garanto que vai ter valido a pena esperar. – Ainda assim. Vou deixar os outros advogados… – E você não precisa me agradecer agora. – Ela estava mandando o juiz calar a boca? Ai meu deus… Enfiei a testa na mão e rezei para acordar e descobrir que aquilo era algum tipo de pesadelo insano. – Pode me agradecer depois. Acho que ela deu um beliscão no ombro de Lynn, porque minha nova colega se levantou e foi se sentar ao lado do filho de Sybill. Por favor, Dom, me diz que você sabe o que está fazendo. – Sr. Harris. – Ela empurrou os papéis de Lynn para longe – Esse é o seu nome? – Ahmm… Sim, sou. O babaca estava encarando o decote de Dom. Eu fiquei me perguntando se seria uma de suas estratégias para distrair as testemunhas. – Sou Dominique Thoen. A construtora já encerrou suas perguntas? – Já. – O juiz suspirou e jogou as costas contra a larga cadeira. Tinha desistido de discutir com ela. É… Eu conhecia bem aquela sensação. – Ótimo. Tenho algumas perguntas, então, sr. Harris. Se não se incomoda. – Claro – ele sorriu um pouco demais. Calma aí, idiota. – O senhor trabalha para a construtora Hammil como técnico de testes, estou certa? – Sim. – E foi conduzir os testes que levaram ao acidente de Sybill Amberg no dia 25 de maio deste ano? – Fui. – Pessoalmente? – Pessoalmente. – O senhor estava lá, fisicamente presente, no momento em que o teste foi realizado. Viu a senhora Amberg sofrer o acidente no exato segundo em que ele aconteceu e depois saiu para buscar ajuda? – Exatamente. – E demorou algumas horas para voltar? – Já expliquei antes de a senhora chegar – começou, sorrindo. – Explique de novo. – Tinha algo feroz em sua voz que fez a testemunha engolir a seco. Nem mesmo o juiz ousou questioná-la. – O local da construção ainda não estava preparado. A estrutura não estava pronta. O celular não tinha sinal. E a única coisa que havia por perto era uma livraria. Tive que correr pelo estacionamento e procurar um telefone. – E isso levou duas horas? – Tentei procurar um pano ou uma toalha antes. Sei que foi estúpido, mas ela estava sangrando e eu nunca tinha presenciado algo daquele jeito. Não conseguia parar de pensar em estancar o sangramento e não notei o tempo passando. – E por que não pedir ajuda?


– A livraria estava vazia como se fosse o dia depois do apocalipse. Fica longe da cidade e era um dia de semana… Não havia muitos funcionários ou clientes. – E a toalha? O senhor achou? – Não. Liguei para a emergência e voltei. Foi só aí que me ocorreu tirar minha camisa. Como eu disse: estava muito nervoso. Não consegui pensar rápido o suficiente. Dominique estava sorrindo. Algo no seu sorriso me tranquilizou. Era lindo vê-la em ação. Ela dominava o ambiente inteiro como se pudesse prever o futuro e soubesse que era só uma questão de tempo até tudo se concretizar exatamente do jeito que tinha previsto. – A livraria que fica ao lado da construção é uma Hillbrooke, não é? – Sim. – E não é uma Hillbrooke qualquer. É uma das maiores da cidade. Estou certa? – Acho que sim. – Excelência, pela ordem – pediu Marden, o advogado da construtora –, qual a relevância disso? – Vou dizer agora mesmo – Dom respondeu pelo juiz e eu imaginei que, se fosse biologicamente possível, Marden estaria soltando fumaça pelo nariz. – Os eventos se passaram no dia 25 de maio. Ela respondeu com simplicidade e eu vi o seu lindo corpo se recostar elegantemente contra a cadeira como se tudo estivesse resolvido. – Desculpe, mas… – O advogado estava rindo – O que tem isso? – Ah, o senhor não sabe? – Ela passou a língua nos lábios, já estava saboreando uma vitória que só ela sabia ter conquistado. – O dia 25 de maio é o Dia do Orgulho Nerd. Há eventos em vários lugares, principalmente em livrarias, para comemorar o dia do lançamento de um dos filmes de Guerra nas estrelas e para homenagear o escritor Douglas Adams no aniversário da sua morte. A livraria Hillbrooke teve um evento nesse dia. No horário do acidente, do outro lado do estacionamento, havia uma livraria apinhada de gente. Então, o senhor vê, não haveria como não encontrar alguém para ajudar. Minha nossa… – Mas eu demorei para chegar lá. Estava procurando uma toalha… Levantando-se, Dominique passou algumas fotos impressas para o juiz e para a outra parte. – São fotos do evento. Havia pessoas por todo o estacionamento. E vê o que quase todas as pessoas têm nas mãos? – São toalhas? – o juiz perguntou. Dominique estava rindo. – Douglas Adams escreveu uma série de livros chamada O guia do mochileiro das galáxias. É uma comédia com uma suave crítica social. Mas o fato é que ele narra o que uma pessoa precisa para viajar pelas galáxias, e a toalha é o item mais importante. Em uma referência ao livro, algumas pessoas saem de casa com toalhas nesse dia, em homenagem ao escritor. Por isso 25 de Maio, o Dia do Orgulho Nerd, também é conhecido como O Dia da Toalha. Agora, sr. Harris, sei que o senhor já explicou isso antes da minha chegada e mais uma vez logo depois, mas será que o senhor poderia explicar mais uma vez como estava presente no momento do acidente, se ausentou para procurar uma tolha e uma pessoa para ajudar e voltou, algumas horas depois, sem nenhum dos dois, mesmo estando do lado de um evento cheio de pessoas e toalhas? O homem ia precisar ser entubado para voltar a respirar. – Isso é algum tipo de piada? – O juiz se virou para o advogado da construtora com fúria nos olhos – Você acha que meu tribunal é um circo e que você pode trazer macacos treinados para mentir na minha frente?


– Excelência, claramente há alguma engano… Não é uma piada, eu… – Não, não é piada. – A diversão sumiu da voz de Dominique e agora ela estava séria como o diabo. – É perjúrio. E nós vamos passar a acusação pelos meios devidos. A lei não é uma brincadeira que você pode manipular, caro advogado. Deveria ter pensado melhor antes de tentar nos fazer de palhaços. – Essa audiência está encerrada – o juiz decidiu. – Vocês serão todos comunicados da minha sentença. Ele se levantou para sair. – Excelência, por favor… Marden se levantou com ele e eu notei que Harris estava branco como uma folha de papel. – O que isso significa? – Amberg se virou para Dominique. Não para mim ou para Lynn… Para Dominique. – Vamos ter que esperar a sentença, mas acho que vai ser uma vitória de alguns milhões. Sybill a puxou em um abraço estranho e eu a vi sorrir. Aquele sorriso lindo que fazia meu mundo inteiro derreter. – Holt. Acho que podemos renegociar os termos do acordo como vocês sugeriram inicialmente. Exatamente nos termos de vocês e resolvemos isso de uma vez – Marden agora dizia para mim. – Meu bem – Dominique se enfiou entre nós e, com seus saltos altos, ficava maior do que o miúdo Marden –, acho que você não está entendendo a gravidade da situação. – Cruzou os braços na frente do corpo de um jeito que fez seus seios saltarem. – Vamos fazer uma denúncia sobre o seu comportamento para o Conselho da Ordem. Eu vou querer os milhões da sua empresa, cada centavo, conforme o pedido da sra. Amberg e vou querer sua licença profissional. Enquanto eu viver, vai ser minha missão de vida fazer com que um traste mentiroso como você nunca mais exerça advocacia na vida. Não haverá qualquer acordo. Não para esse processo. Se fosse você, começaria a pensar em qual acordo o seu cliente vai querer fazer quando abrirmos mais um processo contra ele. Dessa vez por danos morais. Eu queria jogar ela em cima da mesa da sala de audiência, rasgar a blusa e chupar aqueles peitos perfeitos. Estava sentindo um tesão louco vendo ela ali, a centímetros de distância do meu corpo, sendo a Dominique megera. Era muito delicioso de assistir. Principalmente quando ela estava no meu time e quando eu sabia que podia levantar aquela saia cinza e fodê-la quando chegasse em casa. Marden engoliu a seco e saiu. Lynn estava atrás de nós, escolhendo as próximas palavras com cuidado. Sybill e seu filho se abraçavam em comemoração e tive certeza de que Thoen era a pessoa mais incrível do universo.

Andrew Conaughy ofereceu umas doze propostas de emprego diferentes para Dominique. Ela recusou cada uma com educada discrição, mas sem deixar clara uma certeza absoluta. Isso me fez sorrir como um bobo. Ela não queria fechar aquela porta definitivamente porque estava pensando em se mudar para lá. Tinha que ser. Era o único motivo. Depois que champanhes foram estourados e Sybill abraçou Dominique pela milésima vez, ela me acompanhou até meu escritório e ficamos sozinhos. – Dia do Orgulho Nerd, hein? – provoquei. – Vai se foder, Holt.


– Vou. Mas antes você me conta como sabia disso. – Conhecimentos gerais são importantes, sabia? – Se não soubesse, teria aprendido agora. – Assim que eu vi que o caso ocorreu no dia 25 de maio e que o cara se defendeu dizendo que tinha saído para buscar uma toalha e não a encontrou, soube que tinha alguma coisa estranha. – Você foi espetacular. – Eu geralmente sou – sorriu debochada, e eu quis vê-la de joelhos com a cabeça na minha virilha. – Estava com saudade de te ver assim. – Com saudade, é? – Estava quase esquecendo desse seu jeito autoritário. – Acho que vou ter que te lembrar dele com mais frequência então. – Ela deu dois passos e trancou a porta da minha sala. Precisei apenas ouvir o clique da trava para sentir minha ereção dentro da calça. – O que você está aprontando? – Cala a boca. Eu disse que você podia falar? Ah, sim. Por favor. Faz isso. Meu pau gostou da brincadeira mais do que eu e já estava todo espremido contra o tecido. Sua boca tomou conta da minha em um beijo louco, apenas para me soltar muito rápido. Eu queria mais. Queria aquela saliva deliciosa na minha língua. Dom me puxou pela gravata e me jogou contra a cadeira. Caí sentado e a assisti passar as mãos pelas próprias coxas. Inclinei meu corpo para frente para tocá-la. – Também não disse que podia me tocar. – Ela se afastou e eu me recostei na poltrona, vendo suas mãos passeando delicadas e fogosas pelo meio de suas pernas. Ela encontrou algum ponto sensível e estava se acariciando. Enfiou os dedos lá dentro e eu quis que ela parasse com a brincadeira para poder colocar os meus próprios lá dentro também. Tirou os dois dedos úmidos e os colocou sobre os meus lábios. Abri a boca e suguei sentindo seu gosto. Ela tirou os dedos da minha boca e levou para sua. Lambeu com um cuidado sensual e meu pau latejou como um tambor. Suas mãos abriram os botões e baixaram o zíper da minha calça e minha ereção saiu da cueca gritando por ela. Dom engoliu até o talo e me deixou foder sua boquinha por alguns segundos. Eu ia começar a gemer quando ela se levantou, tirando a calcinha. Era a porra de uma calcinha de renda preta que eu peguei e esfreguei contra o nariz, sentindo seu cheiro. Tudo daquela mulher me excitava. Tudo. Dominique levantou a saia cinza e abriu as pernas em cima de mim. Coloquei uma mão na sua cintura e a outra na base da minha ereção enquanto ela descia seu corpo no meu pênis duro e desesperado. Ela se moveu de maneira devagar e suculenta, mordendo os dedos enfiados na boca para sufocar um gemido. Minha carne dura escorregava dentro dela sentindo sua maciez e seu calor. Apoiou as mãos nos meus ombros e aumentou a velocidade. – Merda, Greg… – ela sussurrava com tesão. – Eu não aguento mais passar um dia sem esse teu pau. O desejo que saía da sua boca conseguia me deixar ainda mais rígido dentro dela. Se é que isso era possível. – E eu não consigo mais olhar para você sem pensar em sexo. – Minhas palavras saíam ofegantes e mornas de desejo. – Na hora em que você entrou naquela sala de audiência eu só pensava em arrancar tua roupa e te comer ali mesmo, na frente do juiz. Ela começou a rebolar e eu fui ao paraíso. Mantive as mãos no seu quadril, sentindo seu


movimento fluído, e joguei a cabeça para trás na poltrona. Meus pés estavam grudados no chão e eu me impulsionava devagar seguindo o ritmo dela, me enfiando mais e mais fundo. – Quase… Quase… – ela começou a ofegar. Seus mamilos endurecidos estavam marcando a camisa de seda e eu notei que ela não estava usando sutiã. Coloquei a boca por cima da sua blusa e mordi o discreto ponto rígido. Seu movimento ficou mais intenso e eu podia ouvir os pés da cadeira se arrastando pelo chão da sala. Um transeunte atento ouviria os barulhos óbvios e eu seria demitido. Mas não importava. Não tinha nada no mundo que me fizesse sair de Dominique naquele instante. Segurei seu pescoço na minha mão e toquei seus cabelos. As mãos espalmadas de Dom estavam contra o meu tórax. – Me morde – ela mandou e eu obedeci. Mordi seu queixo, seu pescoço, sua boca. – Isso… Isso… Gree-eg… Sua blusa de seda começava a sair de dentro da saia e minha mão encontrou um espaço livre para se enfiar lá. Encontrei seu seio nu e o mamilo excitado. Ela continuou com aquele rebolado impossível de resistir ao meu redor e eu não aguentava mais esperar. Precisava dela nua, agora. Arranquei sua blusa e acho que vi alguns botões voando. Passei a mão entre seus seios e joguei meu quadril contra ela com violência. – Não para! Holt! Não para! – Não precisa nem pedir, meu bem, não pretendia parar. Não pretendia parar nunca. O orgasmo iminente fez com que ela mordesse o lábio com tanta força que o fez ficar branco ao redor dos dentes. Só mais um pouco e eu poderia gozar junto com ela. Mas tinha mais uma coisa que eu queria fazer. Dom estava com o corpo todo apoiado sobre meus ombros quando eu a segurei e olhei em seus olhos. – Dom, eu quero foder essa tua bocetinha em cima da minha mesa. – Vai. Faz o que você quiser. Eu sou toda tua. Eu ainda estava dentro dela quando enfiei minhas mãos por baixo dos seus joelhos e a levantei no ar. Três passos e a coloquei em cima da minha mesa por cima dos papéis e do teclado. Nem me incomodei em jogar nada no chão. Apoiei sua bunda na borda e fiquei de pé estocando com vontade. Ela ainda estava mole, se recuperando do orgasmo, mas logo voltou a gemer e a se contorcer. A visão de Dominique arrombada em cima da minha mesa era uma que eu nunca mais ia conseguir esquecer. Droga… Trabalhar ali ia ser difícil. – Eu queria ter te comido todos os dias, assim. Pelos últimos anos. Toda vez que você fizesse um comentário safado. Te jogava na minha mesa e te rasgava com meu pau até você aprender. – Acho que se fizesse isso eu não ia calar a boca nunca – ela respondeu. Meti com mais força. Mais uma vez. Outra. Ouvir que ela me desejava, sobre o tesão que sentia por mim, me deixava ainda mais louco. – Ia te provocar de propósito só para você ter que me dar uma lição. – Seu sorriso era sacana com uma boa dose de deboche. – Cala a boca ou eu enfio meu pau aí para você manter essa boca ocupada. – Achei que quem estava mandando fosse eu – riu. – Achou errado. Metia meu pau com força e violência e, quanto mais ela indicava que estava gostando, mais fundo eu me enfiava. Segurei sua cintura com força e a virei de barriga para baixo na quina da mesa. – Vem cá que eu quero te comer de quatro. – Ela chiou alguma coisa incompreensível, mas eu estoquei de novo e ela calou a boca, a não ser pelos familiares rosnados de tesão. – Dominique, se


você não empinar essa porra dessa bunda, vai apanhar. Vi sua bunda descendo propositalmente e entendi o recado. O tapa estalou alto e ela gemeu gostoso. – Vai, minha linda, levanta essa bunda para mim. Ela se empurrou contra o meu pau com força, mas não se empinou, e eu joguei minha mão aberta contra sua bunda mais uma vez. – Fala comigo, Holt – pediu se esfregando. – Me diga o que você quer. – Quero que você empine essa porra e implore. Dom levantou a bunda e eu a segurei, apertando em êxtase. Seus cotovelos estavam apoiados na ponta da mesa e suas mãos deixavam marcas de suor na madeira escura. Me curvei sobre ela, beijando sua coluna, e me afastei de novo para admirar seu corpo suado, de quatro, empinado só pra mim. Coloquei minha mão sobre sua boca para abafar seu grito quando ela gozou pela segunda vez e mordi seu ombro para que meus gemidos também não fossem tão evidentes.

Greg jogou minha blusa de volta depois de fechar o zíper da calça. Eu abaixei minha saia e resgatei minha calcinha. – Estragou alguns botões… – notei assim que vesti a camisa. – Vou estragar mais alguns quando chegar em casa – ele sussurrou com o nariz enfiado no meu cabelo. Puxei a seda para frente tentando evitar que os buracos causados pela ausência de botões ficassem muito evidentes. – Vou precisar de um táxi. – Não… Eu te deixo em casa. – Tem certeza? – Tenho. Ia sair para almoçar de todo jeito. Quer vir comigo? – Restaurante italiano? – ri. – Com certeza! – ele exclamou exagerado e meu sorriso aumentou. Era tão confortável ficar com Holt. Parecia que estávamos fazendo aquilo há anos e eu me sentia absolutamente à vontade ao seu lado. – Obrigado pela ajuda hoje. – Sua boca tocou a minha com carinho. Gostava de como o toque de seus lábios quentes faziam meu coração derreter dentro do peito. Era… felicidade. – Disponha. – Tenho que confessar, achei que você estava inventando. – Rá! Inventando? Toma vergonha, Holt. Ele me abraçou pela cintura. Nossa… Eu amava quando ele fazia isso. Eu me sentia dele. E era uma sensação indescritivelmente boa: ficar ali, com minhas mãos apoiadas em seus ombros, seu sorriso a centímetros do meu. – Verdade. Não devia ter duvidado. – Não devia. – Dei um peteleco em seu nariz e recebi um beijo na bochecha. – Mas você chegou bem a tempo de me salvar. – Graças ao Rick! – E quem é Rick? – Me espremeu de um jeito ciumento.


– O vizinho. Ele mora na esquina. – O vizinho? – Sua boca tremeu de um jeito peculiar e eu entendi qual era seu problema. – Não, Holt! O Rick não tem nada a ver com… nada. Não foi ele. – Ah – ele sorriu e me apertou ainda mais forte – Então eu gosto do Rick. – Estava regando as plantas quando ele passou caminhando e começou a falar sobre seu trabalho… – sorri, arrumando sua gravata. – Ele desenvolve aplicativos e entende dessas coisas de computador. Aí uma coisa levou a outra e ele começou a me chamar de workaholic e a dizer que eu iria avançar no seu trabalho depois de tanto tempo de férias. Só então que eu me lembrei que você tinha mencionado que a audiência era hoje. – Bem, então devo um “obrigado” ao Rick também. – Vou dizer a ele que você agradeceu. – Dei um selinho nele. Não havia nada no mundo mais gostoso que sua boca.

– Tchau, querido. Respondi com um sorriso e tentei esconder o excesso de alegria que eu sentia. Já estava com um pé fora do Porsche quando ele me puxou pelo braço para mais um beijo. – Juro que não canso disso – murmurou nos meus lábios. – Quero te beijar para sempre. Passei os nós dos dedos pelo seu rosto apreciando o contato de cada centímetro de sua pele. – Não faça promessas que não pode cumprir, Holt – sussurrei de volta, beijei seu rosto e desci. – Ei! – ele baixou o vidro da janela quando passou por mim. – Pretendo cumprir. – Piscou um olho para mim antes de acelerar pela rua de volta ao trabalho. Andei até a casa de Thierry. Queria resolver essa coisa toda com Shelbi de uma vez, voltar para casa, tomar um banho e colocar a lingerie mais sensual que eu tivesse. Voltar para casa. Eu estava realmente ficando cada vez mais à vontade. A sala de Thierry estava cheia: ele, Rick, Andy, Shelbi e Madeleine. Até Madeleine… Toda a vizinhança desocupada reunida. Legal. – A gente foi com ela até lá buscar o contrato de casamento que você disse que queria ver. Ela demorou um bocado para achar – Andy reclamou, cruzando os braços na frente do corpo. – Certo. Deixa eu dar uma olhada. – Cumprimentei o grupo rapidamente e me afastei com Andy. – Você conseguiu conversar com ela e descobrir o que aconteceu? – Ela só chora – deu de ombros. – Só se acalmou agora há pouco. Mas pelo que eu entendi, ela voltou do dia do salão toda pronta para seduzi-lo e ele nem notou a diferença. A Shelbi passou a noite triste e, ontem, no feriado, ele disse que tinha que trabalhar. Ela o seguiu. E aí viu… Bem… Acho que você pode imaginar. Baixei os olhos para o contrato e o li rapidamente. – Ela tirou fotos dele traindo ela? – Até onde eu sei, não. Acho que a gente vai precisar perguntar. – Shelbi? – Me aproximei com cuidado e sentei ao seu lado. Madeleine pulou para a ponta do sofá deixando que eu passasse. – Andy me contou sobre o que você viu ontem. Percebi que todo o Clube dos Biscoitos deveria estar tentando animá-la pelas últimas horas e provavelmente estavam conseguindo, porque quando mencionei o nome dele, seu olhar congelou e lágrimas começaram a se formar. Todos ao meu redor me encararam com ares de reprovação.


– Só preciso saber se você tem alguma prova do que viu. Tirou alguma foto? – Não – comentou chorosa. – Só consegui correr de lá. – A gente vai precisar de provas de que ele te traiu. Assim, quando você se divorciar, ele não terá direito a nada seu. – Dominique… Não sei se é isso que eu quero. E se tiver sido só uma vez? – Não foi, Shelbi! Eu e Dominique já falamos com você sobre isso – Andy respondeu por mim. – Mas o que foi que vocês viram? Ela precisava saber de uma vez. Se fosse me dar um tapa na cara, que desse logo e acabasse com isso. – Eu conheci o Eric sem saber que ele era seu marido, Shelbi. Ele não mencionou nenhuma vez. Eu ainda não estava com o Holt. Eric deu em cima de mim e nós transamos. Ela abriu a boca na minha direção e não foi a única. – Sabia que essa daí não valia nada – Madeleine achou importante mencionar. – Cala a boca, velha chata! – Andy correu a minha defesa, mas eu conseguia me defender sozinha. – Não sabia que ele era casado. Mas ele não presta, Shelbi. É um fato comprovado. Se você quiser gritar comigo ou me dar um tapa… Tudo bem. Mas eu realmente não sabia. – E chamou ele de pau pequeno quando descobriu. Bateu a porta na cara dele e disse para que sumisse. Eu estava lá e vi com meus próprios olhos! – Andy levantou o dedo do meio para uma Madeleine que pareceu ultrajada. Shelbi engoliu a seco e se abraçou. Estava chorando quando disse: – Vocês têm certeza de que era ele? – Shelbi! Pare de se enganar. Por favor – respondi. – Dominique… Não sei se quero me divorciar dele. – Ela não parecia estar com raiva de mim quando disse isso. Só havia uma emoção reconhecível em sua voz. – Sabe, sim. Você só está com medo. – Não precisa ficar com medo, Shel… – Andy segurou seu braço e tentou reconfortá-la. – É, a gente vai te dar todo o apoio. Você não vai ficar sozinha hora nenhuma – Rick acrescentou. – Estamos todos com você, garota. – Thierry deu um beijo gentil em sua testa. – É, todos nós. – Madeleine se aproximou e eu tive que ficar impressionada. – O que me diz, Shelbi? – Eu não saberia nem por onde começar… – Havia um brilho diferente nos seus olhos. Ela devia ter passado o dia ouvindo discursos de incentivo dos vizinhos e agora se sentia protegida o suficiente para tentar fazer aquilo. – Primeiro a gente precisa se certificar de que ele não vai levar nada que seja seu no divórcio. – Como assim não levar nada dela? – Andy quis saber. – Acho que ela quer dizer que a Shelbi deve garantir que, quando o divórcio acabar, vai levar pelo menos metade de tudo que o Eric tem – Madeleine, a especialista em casamentos, acrescentou. – Não, não é isso. O dinheiro da família é todo da Shelbi. Eric usa o seu dinheiro, não é? Todos os olhos da sala se voltaram para ela, impressionados. – Quer dizer que você nem precisa dele para sobreviver? – Andy parecia indignada. – Então, por que diabos se submeteu a ele por tanto tempo? – Andy. Não seja assim – Thierry aconselhou. – Estou só dizendo que… – Não é importante, Andy! – Agora era Rick quem se manifestava. Ele tinha o dom de saber quando um assunto não precisava ser discutido.


– Calem-se todos! – ordenei. – Temos que conseguir provas de que Eric quebrou uma das cláusulas contratuais e traiu Shelbi. – Dei dinheiro para ele começar os investimentos… – Precisava de sua atenção, mas ela estava bem longe, relembrando o começo de sua vida. – Foi por causa dos meus investimentos que ele conseguiu o trabalho que tem hoje… – Safado – resmunguei, e Shelbi me observou com olhos de reprovação. – Diga você também, chame ele de safado! Ela abriu um sorriso discreto. – Crápula arrogante – Madeleine sugeriu. – Descarado desonesto – Thierry e Rick entraram no clima e logo a sala inteira estava proferindo ofensas contra Eric. – Safado – Shelbi conseguiu sussurrar finalmente. – Descarado, traidor, sem vergonha. – A cada palavra ela tomava mais força e era bonito de assistir. Logo ela estava chorando e xingando ele de todos os nomes horríveis que conseguia pensar em alto e bom som. – O que eu faço, Dominique? – Ela se virou para mim, com o coração satisfeito e aliviado. – A gente pega ele te traindo. – Então, você vai ficar com ele de novo? – Andy quis saber. – Garota, desencana dessa ideia. Não vai acontecer. – Mas como a gente vai pegar ele então? – Poderíamos nos revezar – Rick sugeriu. – Cada um segue ele por um tempo. O cara não consegue se controlar, não é? Quando ele fizer de novo… Será flagrado. – Não gosto de depender do acaso. – Toquei minha boca com o indicador e formulei um plano rápido. – Shelbi, você teria algum problema se armássemos para cima dele? – Não. – Senti convicção em sua voz. – Madeleine. Você ficaria com um homem casado com a benção da esposa? – Ela me olhou descrente – Estou falando sério. – Eric não vai dar em cima da velha. – Greenpeace, silêncio. Sou eu quem está dando as ordens. Ficaria, Madeleine? Ela olhou de um lado para o outro e encontrou apenas olhares de apoio e aprovação. – Ficaria, mas como… – Eu me preocupo com essa parte. Eric vai aparecer te procurando em breve. Rick! – Sim? – Vamos precisar preparar a casa de Madeleine. Câmeras por todos os lados. Pode organizar isso? – Com certeza. – Teste tudo pra ter certeza de que vai funcionar e mostre a Madeleine onde precisamos que ela fique. Não precisa ir até o fim com ele, ouviu? Só algumas fotos e vídeos de beijos e ou dele dando em cima de você e pronto. Rick! Outra coisa… – O quê? – Shelbi! – Virei para ela – Acha que consegue pegar o celular dele sem que ele perceba? – Acho… Acho que sim… – Pronto. Faça isso. Rick, você consegue burlar a senha e acessar mensagens de texto, e-mails e tudo o mais? – Sem problemas – sorriu. – Vamos precisar disso tudo.


– E eu? Faço o quê? – Andy perguntou. – Shelbi vai dizer para Eric que vai passar um tempo aqui te ajudando com um projeto de arte. Para que ela não precise voltar para casa se não quiser. Você cuida dela. – Quando a gente começa? – Acho que consigo fazer Eric te procurar esse fim de semana, Madeleine. – O que você vai dizer para ele? – Não se preocupem. Eu sou criativa.

Atravessei a rua de volta para casa me sentindo dez anos mais jovem e doze vezes mais cansada. Era uma exaustão boa: tinha sido um dia feliz e produtivo. Essa coisa de ajudar os outros acabava sendo bem recompensadora. A tarde já estava chegando ao fim, e a luz quebrada do crepúsculo entrava discreta pela janela. Ouvi um barulho na sala e meu coração pulou duas batidas. Não podia ser Holt. Max estava preso no quintal de trás. Tirei meus saltos com cuidado e os soltei no canto do chão sem fazer barulho. Coloquei um pé atrás do outro até cruzar o portal do hall para a sala. Vi a sombra de um homem alto cruzar meu caminho e joguei minhas mãos no seu braço e pescoço. Um toque contra sua jugular e ele perdeu o ar. Usei meu ombro para jogá-lo no chão e acendi a luz. – Ai! Calma! – ele exclamou do chão, com a mão para cima. Tinha uns quarenta anos, era negro, forte e muito alto. Senti a adrenalina latejando em minhas veias. – Quem é você? O que diabos está fazendo aqui? – Já tinha colocado a mão no telefone da sala e meus dedos estavam prontos para ligar para a polícia quando ouvi a voz feminina: – Ele é meu motorista. Virei assustada. Tinha os cabelos grisalhos presos em um coque perfeito. A saia preta escura e a alinhada blusa branca gritavam “Carolina Herrera”. Usava um colar de pérolas que deveria estar na casa das centenas de milhares. Seu perfume era discreto e seu olhar, duro. – Sou Eleanor Baxter. E nós duas precisamos conversar.


Capítulo 19 “Sua pequena hipócrita. Não se incomoda que eu saiba. Só se incomoda que eu fale.” Rhett – E o vento levou Engoli a seco e fiquei congelada no meio da sala com o telefone nas mãos. Diz alguma coisa, Dominique. Ajudei o motorista a se levantar. – Ahm… Peço desculpas, senhora Baxter. E senhor… – Pode me chamar de Boe. – Ele bateu as mãos na calça, arrumando o tecido abarrotado, e moveu o braço que deveria estar dolorido. – Boe, Perdão. Não sabia que a senhora viria hoje. Holt não disse nada. – Gregory não sabe que estou aqui. – Ela pronunciou o nome dele de um jeito estranho. – Não sabe? Mas como a senhora conseguiu a chave? – Eu tenho a chave de todas as casas de Gregory. – Tudo bem. – Tentei não deixar a confusão transparecer no meu semblante. Aquilo era muito estranho. – Eu não sabia disso. – Claramente. Há muitas coisas sobre a nossa dinâmica familiar que a senhorita desconhece. – Tudo que Holt mencionou é que não era muito próximo da senhora. – Eu estava tentando manter minha recém-descoberta educação, mas ela estava começando a me irritar. – Não tinha como imaginar que a senhora teria a chave de sua casa nessas circunstâncias e… – Não vim até aqui falar de mim, senhorita Thoen. Se precisasse falar sobre mim, procuraria um profissional caro e especializado, não a senhorita. Vim até aqui para falarmos sobre você. Eu não ia gostar dessa velha. Não ia mesmo. – Sobre mim? – meu tom autoritário veio ao meu resgate e estava firme como sempre. – Observo com cuidado todas as garotas com quem Gregory se envolve. Na maior parte das vezes não passa de algum relacionamento bobo. Tenho que confessar que nunca precisei intervir antes. Até agora. – Intervir? Odiar… Eu ia odiar a velha. – Não é bom para Gregory ir até aquele lugar horrível e ver Audrey naquela situação. – Ah, então era isso? – Quando a senhorita voltar… – Ela gesticulou com superioridade na minha direção como se estivesse buscando palavras que não fossem muito ofensivas – … de onde quer que tenha saído, sou eu quem vai ter que resolver os problemas de Gregory. Então, peço educadamente que evite criar situações que possam ser constrangedoras no futuro.


Educadamente? – Só achei que ele deveria ver a mãe. – Achou, não foi? Tenho certeza de que tudo é muito simples de onde você vem. – Por que eu sentia tanto nojo na sua voz sempre que ela falava da minha origem? – Mas uma família no padrão da nossa precisa agir de acordo com certos códigos de conduta que são além da sua compreensão. Gostaria que acreditasse na minha palavra quando digo que é ruim para Gregory ter contato com aquela mulher. – Aquela mulher? – Eu estava ficando indignada – Ela é sua filha. – Sei muito bem o que ela é, senhorita Thoen. – Levantou-se do sofá e eu notei que mesmo sendo bons centímetros mais baixa do que eu, ela parecia imensa. Parecia colossal. Era quase como se sua presença ocupasse a sala inteira e não deixasse espaço nem para o ar. – E sei muito bem o que a senhorita é, também. – Sabe o que eu sou? – Não importava quão grande ela fosse, eu estava com raiva. – Não faça análises sobre minha família que são obviamente aquém de seus ínfimos conhecimentos. – Ela estava me ignorando. – A senhora pode, por favor, me dizer o que sabe quem eu sou? Ela estava séria, mas eu sentia a alegria em seus olhos. Greg estava certo: ela era uma vadia oitenta vezes pior do que eu. – Peço desculpas. Não quis ofendê-la. – Havia algo de peçonhento em suas palavras e eu senti que estava pisando em vidro – Começamos do jeito errado. Acabo sendo possessiva quando o assunto é a minha família. Pode me perdoar? – Claro – respondi azeda e sem nenhuma convicção. – Ótimo. Dominique… Posso chamá-la de Dominique? – Ela não me deixou responder – Vamos começar de novo. Por que não me diz o que quer? – Perdão? – O que você quer? Com Gregory? Quais são suas intenções? “Fodê-lo até não conseguir mais” não me pareceu um comentário apropriado e “Estou apaixonada” não me pareceu ser da conta dela. – Isso é bastante pessoal, sra. Baxter. – Querida, quando se é uma das oito famílias mais ricas do mundo, não existe pessoal. Tudo que Gregory faz é, e tem que ser, público. – Acho que ele não vê as coisas assim. – Ele está tendo um período rebelde. E queremos evitar que continue assim, não é? – A senhora vai precisar me desculpar, sra. Baxter, mas não estou entendendo o motivo da sua visita. Veio ver seu neto? – Não. Eu já disse, criança, será que não tem boa memória? Vim falar com você. – Pois então fale – rosnei com os dentes semicerrados. A vadia tinha me chamado de criança? – Vamos ser objetivas? Tudo bem. O que você quer? – COMO ASSIM? – Minha paciência estava indo embora em uma velocidade arrebatadora. – Você está com Gregory. Claramente, quer alguma coisa. Trabalhou com ele por muitos anos e não tiveram qualquer amizade. Assim que ele se muda, você o segue e o seduz… Descobriu recentemente que ele era um Baxter? Foi isso? – O que está querendo sugerir? E eu teria cuidado com as palavras se fosse a senhora. – Eu sempre tenho cuidado com as palavras. Ao contrário de você, não posso me dar ao luxo de ser vista em situações inapropriadas. – Engoli a seco sem saber se haveria um duplo sentido em suas


palavras – Você seguiu Gregory até aqui, quando ele finalmente estava voltando para casa, e se tornou um empecilho no seu desenvolvimento. Prendendo-o ao passado e coisas do gênero. Minha pergunta é: o que você quer com ele? Você é uma mulher ambiciosa e inteligente, Dominique. É claro que quer alguma coisa. Só quero que me diga o que, e eu garanto que será dado. Se aceitar meus termos, é claro. – A senhora está querendo me dar dinheiro para que eu vá embora? É isso? – Se dinheiro for o que você quer. – Enfiei as mãos no cabelo. Aquela mulher era louca e estava me ofendendo com cada suspiro – Mas se for contatos, poder ou alguma posição o que busca, tenha certeza de que isso também pode ser arranjado. – E se eu gostar do seu neto? Já pensou nessa possibilidade? – Não me faça rir – expirou, em tom de ultraje – Uma mulher como você? Encontraria Gregory e se apaixonaria? É essa a história que você quer vender, mocinha? Porque eu aviso desde já que não vou comprar. – Acha que não há nada no seu neto que valha a pena para uma mulher? – Há muitas coisas nele que valem a pena. Mas para a mulher certa. Mulheres erradas sentem o cheiro do dinheiro primeiro. – Mulheres erradas? – ri, irritada. Era na jugular dela que eu devia ter enfiado a mão. – Eu conheço sua história. – Ela se aproximou e eu me odiei por ter dado um passo para trás. Mas havia algo ao seu redor que parecia queimar. – Seu pai era um lavador de chão, sua mãe é uma golpista que casou com quantos conseguiu. Você subiu muito na vida. É uma garota determinada e sem medo de trabalho. Isso eu admiro. Mas só chegou aonde chegou por saber reconhecer uma oportunidade quando a encontrava. E um herdeiro Baxter é uma oportunidade incomparável. Ninguém a condenaria por ter imaginado que talvez sua mãe estivesse certa: um casamento podia levar uma pessoa bem longe. E um casamento com um Baxter! – Arregalou os olhos e bateu uma mão na outra, antes de ficar séria como a morte. – Mas uma coisa eu te prometo, querida: você nunca, nunca, vai entrar para essa família. É uma possibilidade que não existe. Eu lhe dou minha palavra, e eu nunca a quebro. Então, seja lá o que você quer com Gregory, sua única chance de tê-la é sendo honesta comigo, agora. Diga o que você quer e poderemos chegar a um acordo. Você passa mais uns dias aqui. Abre suas pernas para ele, o mantém longe daquele asilo e negócio fechado. – Abri minha boca enojada e quis esbofeteá-la. Era possível que ainda fizesse isso antes de ela ir embora. – Não faça essa cara de sonsa. Ultraje não é uma expressão que combina com seu tipo de mulher. – E que tipo de mulher eu sou? – Do tipo baixa – explicou pausadamente. – Do tipo que usa blusas sem metade dos botões para chamar a atenção dos membros sexuais masculinos. Olhei para baixo sem entender. Merda. Os botões que tinham caído quando Holt arrancara minha blusa. Acho que dizer que ele tinha me fodido no escritório era a última coisa que ela precisava saber naquele segundo. – A senhora não me conhece – decidi falar, usando a última gota de calma que ainda me restava. – Devo entender que prefere não aceitar minha proposta? Eu queria dizer com todas as letras onde ela devia enfiar a proposta. – Pode levar sua proposta com você. Eu estou bem, obrigada. – A decisão é sua – sorriu maliciosa – Mas devo dizer que foi uma péssima decisão, da qual você vai se arrepender bastante. Vou me certificar disso.


Ela foi embora sem dar tchau, adeus, ou até logo.

Me arrumar para sair com Andy estava se tornando uma tarefa impossível. A visita da matriarca Baxter ficava girando em minha mente. Ela achava que eu estava com Holt por causa de dinheiro. O pior é que, quando se analisava a história da minha vida e do meu relacionamento com Greg, sua opinião fazia bastante sentido. Talvez se eu conseguisse convencê-la de que não era esse tipo de gente ela me deixasse em paz. Mas também, ela que se danasse. Não lhe devia nada e era uma mulher adulta, responsável pelas minhas próprias decisões. O problema era que algo na sua promessa tinha feito os pelos do meu corpo inteiro se eriçarem, e eu tinha ficado as horas seguintes inteiras com essa sensação. – Shelbi tem que ir com a gente. Merda. Tinha esquecido dessa parte. – Ela não melhorou? – Um pouco. Mas não é bom deixá-la sozinha… Coloquei minhas mãos na nuca e joguei minha cabeça para trás. Fechei os olhos. A familiar enxaqueca estava surgindo mais uma vez. – A gente pode deixar para ir outro dia. Se metade das ameaças de Eleanor se concretizasse, talvez eu não durasse muito tempo naquela vizinhança, e não queria deixar Andy semivirgem. – Não! A gente vai hoje. E a gente leva a Shelbi. – Mas o que a gente faz com ela? Você fica de olho nela quando eu… Sair? – A gente arruma alguém pra ela. – Como? Ela não está em um clima bom. Cocei a cabeça. Será que eu conhecia alguém naquela cidade que pudesse apresentar para Shelbi? Talvez conseguisse arranjar alguém para ela no bar. Ela não era uma mulher espetacular, mas era bonita. E poderia ficar bem charmosa quando se arrumasse. Só precisava de um pouco de autoconfiança, e reduzir o nível das brincadeiras bobas. – Ela não vai querer sair. – A gente não vai dar opção para ela, Andy. Onde ela está? Ela fez um gesto com a mão me convidando para entrar. Andy estava incrivelmente bonita na roupa nova. Andava nos saltos de um jeito meio desajeitado, mas quando ela sentasse no bar, ninguém ia notar. – Shelbi? – Não me incomodo! – respondeu, nervosa, e eu percebi que ela e Andy já deveriam estar discutindo aquele tema há algum tempo – Vocês podem ir sem mim. Eu fico aqui. Prometo que não faço nenhuma besteira. Não vou ligar para Eric ou falar com ele… Ele não vai saber o que estamos fazendo. Eu juro. – O problema não é esse, Shelbi. Quanto antes você aceitar e continuar com a sua vida, melhor. Você vai sair com a gente para se divertir. Vai tomar uns drinques, vai rir, conversar e se algum gato der em cima de você, vai ficar com ele. – Mas eu não quero. Eu ainda sou casada… – Se não quiser, tudo bem. Mas não por você ser casada. Você está separada, mesmo que seu


marido ainda não saiba. E ele já te traiu centenas de vezes, Shelbi. Trair ele, nem que fosse uma vez só, ia te fazer se sentir melhor. – Mas não vou, está bem? Eu até fico lá sentada com vocês. Mas não quero fazer nada além disso. Tudo bem? – Tudo bem. Você só faz o que quiser. Mas meu amigo vai ficar muito decepcionado. Shelbi olhou para mim com olhos esperançosos. Era horrível para uma mulher como ela não se sentir querida. Ser paquerada era tudo o que ela precisava. – Que amigo? – Andy quis saber. É, Dominique, que amigo? – Um amigo. Vocês vão conhecê-lo quando chegarmos ao bar. Merda. Eu não conhecia ninguém. Só Devon Hill. Mas ele seria a pior ideia possível. Nunca me faria esse favor e, mesmo que fizesse, era o pior homem na Terra para se ficar em débito. Quais outros homens eu conhecia naquela cidade? Só Rick, Thierry, Calvin… O casal gay e os pirralhos da rua não iam servir. Tinha Holt, mas esse de jeito nenhum. Eric não servia, obviamente. Quem mais, Dom? Quem mais você conhece? Era minha primeira vez naquela cidade e fora o pessoal da vizinhança, eu não conhecia ninguém. A não ser o funcionário da lavanderia e o médico. O médico! Puta que pariu! Como não pensei nisso antes? Eu tinha o cartão dele! – Você está sendo muito misteriosa, Dominique. – Eu sei. Mas ele é um bom partido. Vale a pena. Vou voltar em casa e pegar uma roupa emprestada para a Shelbi. Vamos deixá-la sensual. E bote maquiagem nessa cara, garota. Você não vai sair com esse rosto lavado! Andy fez um muxoxo estranho e eu entendi imediatamente. – Você não tem maquiagem suficiente, não é? – Acho que um batom ou… – Eu trago a maquiagem também.

Eu vestia calça jeans e regata preta. Prendi o cabelo em um rabo de cavalo, coloquei um par de sapatos de salto médio, brincos discretos, pouco perfume e quase nenhuma maquiagem. Andy e Shelbi queriam me engolir porque eu não as deixei se vestirem tão casualmente. Eu sabia que era algo horrível de dizer, e por isso não disse, mas se eu me produzisse para valer, era pouco provável que homens se aproximassem querendo falar com elas. O homem loiro acenou para nós assim que entramos no bar. – Dr. Henris – cumprimentei. – Tristan! Por favor, só sou doutor no hospital – brincou com um sorriso sensual. – Essas são minhas amigas, Andy e Shelbi. Elas sorriam um pouco demais, não sabiam onde colocar as mãos, prolongavam todo e qualquer silêncio constrangedor e eu me peguei rindo. Como algo podia ser tão natural para mim e tão assustador para aquelas duas?


– Vão beber alguma coisa? – Eu preciso ir ao banheiro. – Andy se levantou e eu tive certeza de que ela queria ver se a maquiagem tinha borrado. Se tornou uma obsessão desde que eu tinha terminado de passar a máscara para cílios. Ela tinha certeza de que estava com uma mancha negra no rosto e não importava quantas vezes eu a mandasse calar a boca, Andy simplesmente não me obedecia. Shelbi a seguiu com um leve toque de paranoia e eu quase gritei para que ela ficasse e conhecesse o homem a quem eu queria lhe apresentar. Mas elas se foram e eu fiquei sozinha com Tristan. Acompanhei com o olhar minhas duas amigas desajeitadas andarem entre as mesas até o lado oposto de onde o banheiro feminino estava e fazendo o caminho de volta assim que perceberam que estavam erradas. Andy acenou quando passou pela mesa mais uma vez e eu senti o desconforto no seu sorriso. Ai meu deus… Ri e voltei a atenção para o médico. Peguei seus olhos enfiados no meu decote. Ele levantou a cabeça, tentando disfarçar. Pena que eu não sou idiota. – Obrigada por ter feito essa gentileza, Tristan. – Não foi nada. – Ele estava sorrindo daquele jeito sedutor que os homens sorriem quando flertam. Em qualquer outra situação, eu estaria espremendo meus seios com os braços para aprimorar sua vista e arranjando uma desculpa para tocá-lo. Mas naquele dia eu só olhei ao redor e pedi ao garçom que trouxesse um suco de laranja. – Nada de álcool para você hoje? Alguns homens fazem isso… Tentam te embriagar para facilitar o trabalho. Eu nunca fui uma dessas mulheres. Já fingi que estava bêbada em uma situação ou duas para transar com um homem gostoso que eu não tinha nenhuma intenção de ligar no dia seguinte. Mas nunca tinha ido para a cama de ninguém efetivamente bêbada. E, bêbada ou sóbria, nunca tinha levado ninguém para minha cama. Aquele pensamento flutuou no ar. Era verdade: Nenhum homem conhecia minha casa. Talvez Holt pudesse ser o primeiro. Ou talvez sua avó mandasse me matar e me enterrasse no quintal de sua mansão antes que eu pudesse convidá-lo. – Não. Hoje, eu vim de babá. – Deve ser a mais bela babá que eu já vi. – Você é muito gentil. – Meu tom foi quieto e polido. Do tipo que diz “obrigada pelo elogio, mas, por favor, não o repita”. – Como estão os machucados? – Muito bem. – Fiz uma breve reverência – Meu médico é muito competente. – Agora é você quem está sendo gentil. – Aquele diálogo estava se aproximando demais de um flerte e eu não queria lhe dar a ideia errada. – Obrigada por ter aceitado conhecer a Shelbi. – Eu sabia que não era isso que ele tinha aceitado. Ele só tinha dito sim porque queria me fazer um favor e me ver nua até o fim da semana. Talvez eu tenha deixado essa possibilidade no ar quando liguei pra ele, ainda em casa, mas era apenas porque eu realmente precisava que ele viesse. A única coisa que ele ia ganhar de mim era um “muito obrigada”. – Qual é a história, por sinal? – Ela está se divorciando. Já está separada. Aí resolvemos sair para um pouco de diversão. – E por que eu estou aqui? – O garçom chegou com o meu suco e eu coloquei o copo nos lábios – Quero dizer… Por que convidar um garoto para uma noite só de garotas? – Achei que Shelbi precisava conhecer alguém. Ela anda com a autoestima muito baixa. Alguns elogios não vão fazer mal.


– Justo. Bem, estou aqui para servi-las. – Obrigada. – Mas depois você fica me devendo um jantar. – Ah… – engoli a seco. Seus olhos castanhos me perfuraram. – Eu estou aqui só para conhecer a Shelbi, não é? – Espremeu os lábios, resignado. – Sinto muito se te dei outra impressão, Tristan. Eu não… Não estou disponível. – Entendo. – Deu um gole na sua bebida – É claro que não está – riu – Não sei por que diabos imaginei que estivesse. Para você ser solteira, todos os homens do universo teriam que ser imbecis. – Você não me conhece – brinquei. – Talvez eu seja uma pessoa horrível. Ele encheu o peito como se fosse me fazer mais algum elogio, mas nossas acompanhantes chegaram e se sentaram. Tristan desistiu do que quer que fosse falar e realmente se concentrou em Shelbi. Parecia ser um homem bom. Elogiou sua roupa e seus olhos. Ela sorriu envergonhada e coube a mim e a Andy quebrar o gelo repetidas vezes. Mas logo os dois acharam um ponto em comum conversando sobre viagens pela Europa e eu pude me virar para Andy e sussurrar: – Certo, virgem. Sua vez.

– Entre – convidei quando ouvi duas batidas firmes na minha porta. Ainda estava com os olhos no computador quando ouvi uma voz conhecida. Conhecida até demais. – Gregory? Levantei meu olhar em descrença. – Eleanor? O que está fazendo aqui? – Ela ia dizer alguma coisa, mas eu levantei a mão. – Não. Não precisa nem dizer. Acho que já estava esperando que, mais cedo ou mais tarde, você fosse aparecer. – Não seja assim. – Ela tinha uma doçura na sua voz que se misturava com uma quantidade ideal de firmeza. – Você é meu neto. Uma avó não pode sentir saudades do neto? – Pode. Mas você não é assim e nós dois sabemos. – Não ganho nem um abraço? – Ela levantou uma sobrancelha para mim. Inferno… Eu gostava dela. Gostava um bocado. Se alguém nesse universo tinha me mimado era aquela mulher bem ali. Eu tinha ressentimentos acumulados por milhares de coisas que ela tinha feito. Mas ao mesmo tempo, ao longo de toda a minha vida, era com quem eu mais me identificava. Atravessei a sala e lhe dei um abraço educado e sem muitas emoções. – O que quer, Eleanor? – belisquei sua bochecha. – E eu sei que quer alguma coisa, então não minta pra mim. – Estou preocupada. – E não é sempre assim? – Estou falando sério, Gregory. – Não voltei para cá porque quero voltar para a empresa. Voltei por outros motivos e não pode dizer nada para mudar disso. Entende? – Não entendo. Mas aceito. – Pousou uma mão no peito, resignada. – Não vim por isso. Passei na sua casa hoje. Esperava encontrá-lo. Mas em vez disso encontrei uma moça bastante desbocada. – Ela pareceu ofendida e eu tive que segurar o riso de desespero. Então, ela tinha conhecido Dominique? Fantástico. Estava aí um encontro fadado ao desastre. – Não seja cruel, Eleanor. Eu gosto da moça.


– Ah, Gregory! Não diga isso! Você não sabe o que é gostar. – Agora era ela quem beliscava minha bochecha. – Escute… – Eu vi as curvas que a moça tem. – Seu tom era sugestivo o suficiente, mas ela acrescentou uma expressão de obviedade que não deixava dúvida sobre suas intenções – E você é um homem. E mais que um homem: um Baxter. Baxters são perigosos! – riu. – Têm as mulheres que querem. E eu entendo: você é jovem e ela é atraente. Mas, por favor, não confunda as coisas. – A senhora não pode tomar esse tipo de decisão por mim. – Eu sei. Mas posso vir aqui e tentar lhe abrir os olhos. Veja a história de vida dessa jovem! Ela parece o tipo que recusaria uma oportunidade de se aproximar de um Baxter? Ela parece o tipo que não faria de tudo para crescer na vida? Dominique era como a Scarlett O’Hara que ela tanto amava. Isso eu sabia além de qualquer dúvida: era inteligente e ambiciosa, fazia o que precisava ser feito para atingir seus objetivos. Sempre foi assim. Mas ela nunca precisou de ninguém para isso. Estava se saindo muito bem sozinha e mantinha todos que conhecia a uma boa distância. Me usar apenas para sexo e dinheiro nunca me pareceu estar em sua lista de afazeres. Para vingança, talvez… Mas por sexo e dinheiro, não. – Eu posso ter poucas certezas na vida, Eleanor, mas uma certeza que eu tenho é de que Dominique não precisa de homens para o que quer que seja. Seja qual for seu sobrenome. E… – uma ideia tomou conta da minha mente e eu estava lívido. – Você não sugeriu isso pra ela, sugeriu? Que ela estava comigo por dinheiro? – Queria ter certeza de que ela sabia que tem alguém olhando por você. Com um olhar objetivo! Ótimo. Maravilhoso. Tinha um animal feroz me esperando em casa então. – Não gosto que se meta na minha vida, Eleanor! Quantas vezes vou precisar lhe dizer isso? – Pelo menos mais uma. Como sempre. E você fala como se eu mantivesse você na coleira, Gregory! Faz alguns anos que não tenho uma notícia sua. Uma notícia de verdade. Meu olhar ordenou que ela dissesse a verdade. – Não tenho! – repetiu. – Quer mesmo que eu acredite que não tinha ninguém me observando para você? Já trabalhei na Baxter, Eleanor. Sei muito bem como as coisas funcionam. – Tudo bem. Tudo bem. – Ela levantou as mãos como uma oferta de paz. – Você é meu neto, Gregory. E o último Baxter! – Você fala isso como se eu fosse uma espécie em extinção. – E não é? – Não seja ridícula. – Essa moça não é coisa boa. Não precisa acreditar em mim agora. Só preciso que fique atento. Ah, Gregory! Prometa que vai ficar atento! – Vou ficar atento, está bem? Ela respirou como se estivesse profundamente aliviada. – Fico mais tranquila assim. – Você não conhece a Dom. Ela não é nada como você imagina. – Espero que você esteja certo. – Estou. Vou dar uma festa na minha casa amanhã. Só alguns vizinhos e amigos. Por que a senhora


não vem? Assim a conhece melhor. – Não, não, não, Greg. Péssima ideia. Droga… – Posso levar alguém? – sorriu. Ah, porcaria. Mas agora era tarde demais, não era? – Pode. Mas tem que prometer que vai se comportar. – Qualquer coisa por você, querido.

– Tem camisinha na bolsa? – Dominique! Eu não vou fazer isso… Não posso. Mudei de ideia. – Andy! Não pode ficar mudando de ideia a cada três segundos. Ou você está pronta para fazer isso de novo ou não está. – Não estou! – resmungou. – Não estar pronta e estar com medo são duas coisas diferentes. – Eu estou com medo de não estar pronta. – Ah, garota! Você já não perdeu a virgindade? Ainda tem tesão? Se masturba? Pensa em um cara enquanto faz isso? – Sim… – respondeu tímida. – É a mesma coisa. Só que com uma pessoa viva. Não precisa ter medo. Se está pronta, vai lá e faz! Não vou falar mais nada, me ouviu? Você não pode fazer isso forçada e eu não vou te forçar. A decisão é sua. A ideia de que ninguém mais iria pressioná-la a fazer aquilo, parecia ter dado uma dose intravenosa de coragem a Andy. Parte dela parecia estar esperando que eu a empurrasse em cima de um homem. Mas quando eu disse que não ia fazer aquilo, ela percebeu que a vontade ainda estava lá. E, agora, só dependia dela. – Aquele cara ali é lindo. – Aquele cara ali é areia demais para você. – Você é muito grossa. – Eu sou muito realista. Agora, cala a boca e presta atenção. Aquele outro cara ali, no bar, está te encarando há algum tempo. – Está? – Não se vira assim, sua retardada! – Tá. O que eu faço? – Você vai até lá e deseja boa noite. – E depois? É… E depois? Eu não sabia. Ou melhor, não sabia como ensinar. É tão simples e natural. Ele vai sorrir e desejar boa noite ou vai cumprimentá-la de um jeito apático. Dá para sentir no sorriso. E aí ou você pergunta se pode se sentar ou só finge que queria algo no bar e vai embora. Mas como dar anos de experiência para Andy? – Você gosta de arte. Escultura, essas coisas… não é? – O que isso tem a ver? – Responde, menina! Me obedece! Já não notou que eu sei mais dessas coisas do que você? – Tá. É! Gosto! – Você já fez alguma aula de teatro na vida?


– Já! Algumas em um lugar chamado Empório 3! Se você quiser, eu posso… – Andrea. Cala a boca. Presta atenção. – Olha, dá pra você ser menos grossa? – Não, não dá. Foco, fedelha! Presta atenção. Você sou eu. – Hein? – Você sou eu. Esse é o seu papel. Vai até lá e finge ser eu. Aja como eu agiria. Pense como eu pensaria. Quer dizer… Não exatamente, obviamente. Mas tente entrar no papel de uma mulher segura, gostosa e poderosa. – Você é bem humilde, hein? – Estou tentando te ajudar, mas você não está facilitando. – Não sei se consigo. – Não precisa conseguir. Se fizer merda, é só virar as costas e a gente vai para outro bar. Nunca mais precisa olhar para esse cara na vida. Seus olhos brilharam e a ideia de que errar era aceitável deu uma nova rodada de confiança para o meu pequeno experimento científico. – É só chegar lá e desejar boa noite? – Sorria, pergunte se pode sentar na cadeira perto dele. E tente não ficar desesperada! Preste atenção no que ele vai dizer e no que vai fazer. Se ele disser que você pode sentar de qualquer jeito pode ser que não esteja interessado, então não force. Mas se ele ficar te observando, se for convidativo, aí é porque ele está a fim e você vai com força. – Vou com força de quê? Para onde? – Ela estava triplamente nervosa. – Vai para um motel. Não vai para a casa dele. Você não o conhece. E não vai para a sua casa porque você não quer que um desconhecido saiba onde você mora. E quando estiver no carro dele ou no táxi, mande uma mensagem de texto para mim dizendo onde você está. – Por quê? – Porque se ele te matar eu tenho alguma pista para dar pra polícia. – Ah! Dominique! – Ela ia chorar. – Eu estou brincando! Quer dizer, mais ou menos, manda a mensagem de texto. Agora, repete para mim. – Desejar boa noite, pedir pra sentar, prestar atenção, ir com força para um motel e mandar uma mensagem para você. – Tem camisinha? – Tenho. – Toma mais umas. – Abri minha bolsa e tirei mais três pacotes de dentro. – Quantas vezes eu vou transar com ele? – Ela me olhou assustada dada a quantidade infinita de preservativos que eu a estava fazendo levar. – Provavelmente só uma. Mas você vai rasgar umas oito camisinhas antes de conseguir colocar uma direito. – Eu vou ter que colocar? – Ela parecia em choque. – Da última vez o cara fez isso. – Da última vez? – Levantei uma sobrancelha para ela – Você quer dizer da única vez. – Ela me ofereceu uma careta como resposta – Pode ser que ele faça. Pode ser que ele te peça. Nesse caso, você coloca. – Ai! Eu devia ter prestado atenção na banana. – Ela colocou a mão na testa e falou mais para si mesma do que pra mim. – Que banana? Ô garota, você não tá alucinando, tá?


– A banana! Na aula! Uma enfermeira foi na escola mostrar e eu achei ridículo e não prestei atenção. – Você não sabe como colocar uma camisinha? É isso? – Mais ou menos. – Não tem mistério. Coloca na ponta do pênis dele, espreme a pontinha com seu polegar e o indicador assim – gesticulei –, e vai desenrolando o resto pra baixo. – Por que tem que espremer a ponta? – Porque se não pode juntar ar, aí quando ele goza a borracha estoura e não adianta nada. – Mas pode entrar um pouquinho de ar? Ou não pode entrar nenhum? – Ela estava tão tensa que eu podia cortar seu nervosismo no ar com uma faca. – Não pode entrar nenhum ar. É por isso que as camisinhas são vendidas com aquele aparelho de sucção a vácuo para você acoplar na borracha. – Que aparelho? Da última vez não vi isso! Ai meu deus, eu não comprei isso! Revirei os olhos: – Quando eu fui na farmácia não tinha isso! O que eu faço? – Garota, você está merecendo um tapa. Foi uma piada, imbecil! É claro que pode entrar um pouco de ar. Você espreme a ponta só pra evitar que entre muito. – E eu fico por cima ou por baixo? – Fica por baixo. Você não ia saber o que fazer em cima. – E as preliminares? O que eu faço? – Você o beija, em vários lugares diferentes. Passa a língua no peito dele. Esfrega as unhas no pênis e passa a mão nos testículos. E deixa ele pegar em você onde ele quiser. – Certo. E se ele fizer algo que eu não quero? – Você diz que não quer. Se ele não parar, você finge que está gostando, desce a mão até o saco dele e aperta como se estivesse espremendo o suco da laranja. Isso vai te dar uns dez minutos de vantagem para pegar o dinheiro que ele tiver na carteira, suas roupas e correr. – O dinheiro dele? Sério? – O filho da puta tentou te estuprar? Seríssimo. – Tudo bem. – Ela encarou o vazio e eu soube que ela estava tentando processar a infinita quantidade de informações. – Você vai ficar bem. – Coloquei minha mão em seu ombro, tentando acalmá-la. – E se mudar de ideia, espreme o saco dele e liga para mim que eu vou te buscar. – É bom mesmo. Você está com o meu carro – sorriu. – Tudo bem. Vai lá e arrasa.

– Boa noite – sorri constrangida. Não acredito que Dominique tinha me convencido a fazer isso. Olhei para trás. Ela estava me olhando com um fogo nos olhos e senti que, se voltasse para lá sem ao menos tentar, ela ia me bater. – Boa noite. – Ele tinha um sorriso lindo. E estava sorrindo para mim. Achei que fosse derreter. Minhas pernas iam parar de funcionar, minha boca ia parar de mexer. Aquilo tinha sido uma péssima ideia! Eu não ia conseguir! Segue o plano, Andy… Só segue o plano. – Posso me sentar aqui?


– Claro. – Ele puxou a cadeira para mim. Mas eu não prestei atenção. Quer dizer, não sabia se tinha atenção. Ele tinha sido convidativo? Ou só estava sendo educado? Puxou a cadeira para ser romântico ou achou que eu tinha alguma deficiência? Olhei para Dominique mais uma vez e ela levantou um indicador raivoso para mim, mandando que eu parasse de olhar para trás e prestasse atenção no homem na minha frente. Eu queria fazer aquilo. Queria muito. Mas nunca soube como. E mesmo com todo o mapa que Dominique tinha desenhado, ainda era difícil. Eu estava anos atrasadas em uma área de conhecimento que todo o resto da população na minha faixa etária parecia ter nascido sabendo. Como Dominique… Ela simplesmente entendia e fazia funcionar. Claro, era fácil para ela, com aquele rosto e aquele corpo. A maldita tinha vindo com calça jeans e uma camiseta vagabunda e quando ela levantou da mesa para ir ao banheiro, tenho certeza de que dois terços da população masculina do lugar tinha se virado para ver sua bunda passeando. Enquanto eu… Eu tinha que pintar o cabelo de azul para conseguir chamar alguma atenção. Percebi bem cedo que as pessoas não me notavam. Nenhuma delas. Eu era a garota que todo mundo conhecia e esquecia dois segundos depois de eu ter ido embora. Depois da tintura, eu era, pelo menos, “aquela menina do cabelo azul”. Isso era melhor do que ser imediatamente esquecida. – Sou Leo. – Ele me ofereceu uma mão. Eu a apertei devagar e depois comecei a arrumar meu cabelo atrás da orelha. Pisquei o olho algumas vezes e senti algo escorrendo no meu rosto. Ah, droga! Se a maquiagem estivesse escorrendo eu ia ficar ridícula e nojenta em segundos. Dominique já tinha me garantido repetidas vezes que era só a minha imaginação. Mas sempre que eu sentia aquela coisa estranha no meu rosto a dúvida voltava e, com ela, o desespero. Eu queria ser segura como Dominique. Respirei fundo e tentei pensar no que ela pensaria. Tentei pensar no que ela diria. – Tudo bem com você? – ele quis saber. Pelo seu sorriso, tive certeza de que ele estava achando minha timidez engraçada. Balancei a cabeça afirmativamente, incapaz de colocar ordem nas palavras. Pensar no que Dominique faria era impossível. Ela só olharia para ele e diria “estou com tesão. Vem comigo”. E ele obedeceria sem questionar. Eu não podia fazer a mesma coisa. – Qual é o seu nome? Vai, Andy. Diz alguma coisa. – Dominique – respondi, antes que pudesse me controlar. – Dominique Thoen. – Prazer. – Não. O prazer é meu. AAhhhhh!! Aquilo era ótimo. Eu podia ser a Dominique, não podia? Podia dizer o que eu quisesse e o mundo que se fodesse. Eu era a mulher mais gostosa do bar e ele tinha sorte por estar falando comigo. É, ia ser assim. – O que te traz aqui essa noite? – Você – respondi e mordi o lábio. Doeu e eu imaginei que tivesse mordido forte demais. O jeito sensual não era assim, era? Eu estava fazendo do jeito errado. – Que bom. Porque acho que eu vim por sua causa também. Comecei a sorrir e toquei seu braço. Certo. Eu consigo fazer isso.


Com Shelbi e Andy encaminhadas, eu terminei de beber meu terceiro copo de suco de laranja no canto do balcão. – O que há de errado com você? – Como é? – Só não virei pronta para mordê-lo porque ouvi o tom de paquera em sua voz. Era alguma cantada pronta que eu ainda não tinha ouvido. – Não quis ofendê-la. Mas uma mulher linda como você, sentada aqui, sozinha, no canto do bar… Não me parece certo. A não ser, é claro, que haja algo muito errado com você. – Trabalho com microbiologia. Tivemos um acidente no laboratório com uma lâmina contaminada e eu não me sinto muito bem em ficar tão perto de outras pessoas. Eu posso ser contagiosa. Eu conseguia notar que ele estava na dúvida se ria ou se me levava a sério, então resolvi acabar com sua dor. – Só vim acompanhando umas amigas. – Ah. Não está interessada em conhecer ninguém hoje? – Não, obrigada. – Pode acabar se surpreendendo. – Querido – bebi o último gole de suco e me levantei do banco –, quando o assunto é meu relacionamento com homens, geralmente são eles quem se surpreendem. O deixei para trás com o queixo caído e peguei o carro de Andy para voltar para casa. A mensagem de texto de Holt dizia que ele tinha tido um problema e que ia voltar muito tarde do trabalho. Devia ser só coincidência: eu não conseguia contar quantas vezes tinha ficado no escritório até de madrugada. E, tenho certeza, com ele não devia ser diferente. Mas esse atraso logo depois da aparição inesperada de sua avó fez com que minha cabeça começasse a divagar entre vários cenários. Um pior do que o outro. Abri a porta e coloquei mais água para Max. – E aí, garoto? Acho que somos só eu e você hoje. Ainda não passava das onze, o que significava que eu não tinha ficado nem duas horas no bar. Preparei um jantar rápido e coloquei ração e uns biscoitos para o labrador. – Seu dono vai chegar atrasado. – O cachorro levantou a cabeça do pote vazio e me observou. – E nem me olhe com essa cara, você já comeu tudo. – Sua língua saiu rápida e lambeu o focinho. – Você vai ficar imenso de gordo se continuar comendo desse jeito. Coloquei os pratos sujos na pia e Max me seguiu. Enfiei os dedos atrás das suas orelhas e baixei a boca para lhe dar um beijo em cima da cabeça. Ele latiu, satisfeito, e eu cheirei minhas mãos. – Você está fedendo. Holt precisa te dar um banho de novo! Era engraçado o jeito que ele me olhava. Parecia que queria falar. Se aquilo com Holt não desse certo – e considerando a adição da avó materna à equação, provavelmente não daria – eu ia ter que arranjar um cachorro. Com certeza. Era uma ótima companhia. Ele tentou me lamber e eu o empurrei. – Tá. Não tão ótima assim – ri, falando em voz alta, como se ele tivesse conseguido ler meus pensamentos. Eu podia dar um banho nele. Ia ser bom por vários motivos diferentes: ele ia ficar limpinho, Holt não ia ter que se preocupar em fazer isso antes da festa do dia seguinte e eu podia me manter ocupada por mais algum tempo.


Não sabia se devia esperar Holt chegar ou não. Não estava com tanto tesão. Depois dos últimos dias, seria bem difícil… Mas ainda assim queria vê-lo esta noite. Dormir sem falar com ele significaria esperar até o dia seguinte para olhar em seu rosto e ver se algo tinha mudado. E eu precisava saber. Coloquei um short curto e uma camiseta branca ainda mais vagabunda do que a que eu já vestia. Os produtos de higiene animal estavam todos em um armário na garagem e eu os encontrei sem maiores problemas. Ligar a mangueira e manter Max debaixo da água e longe dos canteiros de flores foi a parte difícil. Puxei sua coleira pela décima vez. Ele tinha espuma espalhada por quase todo o pelo e ficava se virando, tentando abocanhá-la. Segurava sua mandíbula com a minha vida. Eu não fazia a menor ideia se aquela porcaria era tóxica ou se era comestível. Mas depois da oitava vez em que ele mordeu a espuma, decidi que, se fosse para ele morrer por causa daquilo, já teria morrido, e segui com o banho impossível. Ele tinha tanto sabão quanto terra pelo corpo, e eu percebi que aquilo não ia adiantar de absolutamente nada. Holt fazia parecer fácil. – Max! Por favor! Estou te implorando! Fica quieto! Ele latiu e correu soltando espuma pelo quintal. Eu corri atrás dele com a mangueira ao redor da piscina. A criatura infernal tinha transformado o banho em uma brincadeira de molhar. – Vem aqui! Você quer que eu implore de joelhos? É isso? Por favor! Fica parado, só um instante! Segurei sua coleira mais uma vez e joguei água no pelo. A água começou a cair com bem menos intensidade e eu vi o cachorro contorcido mordendo outra parte da mangueira. – Eu vou chorar! Para, por favor. Eu já tinha me arrependido daquela ideia. E me arrependido de novo. – Acho que nunca te vi implorar antes! A risada de Holt me pegou desprevenida, e eu me virei com a mangueira em riste. Em dois segundos, ele estava encharcado. – Ai meu Deus, Holt! Você me assustou! Ele começou a tirar o paletó e a gravata: – E precisa me dar um banho por causa disso? – Agora que ele já estava molhado, pareceu não se importar e me puxou para os seus braços. Ah… A gente estava bem. Nunca pensei que algo pudesse acalmar tanto meu coração e minha ansiedade como um simples abraço. – Você não ia chegar tarde? – Ia. Mas resolvi trazer o trabalho pra casa. – Me deu um beijo. – Qual é o botão que faz esse cachorro ficar parado? – Tem que segurar ele com força – riu – Quer ajuda? – Por favor! – Max! Vem aqui, garoto. – Mal ouviu a voz do dono e o cachorro pulou em cima dele. A camisa social de Greg ficou cheia de água, terra e sabão. Holt segurou Max pela coleira e o manteve parado enquanto eu molhava o pelo e o ensaboava mais uma vez para livrá-lo da sujeira recém-adquirida. Estava passando as mãos pela coluna do labrador e só notei que minha camisa estava estupidamente encharcada quando senti a mão grossa de Holt apertando meu peito e beliscando meu mamilo por cima da camisa. Olhei pra baixo e vi a camisa branca vagabunda quase completamente transparente. E eu sequer


tinha colocado um sutiã. – Você faz isso para me provocar, não é? – Nem tudo é sobre você, Holt – ri, esfregando a toalha em um Max que insistia em se sacudir. – Ah, mas isso é. Eu venho dirigindo do trabalho para cá pensando que talvez eu finalmente consiga sentar e ter uma refeição com você sem pensar em sexo. A gente tem transado tanto que eu vim pensando que talvez o tesão incontrolável tivesse ido embora. – E? – puxei Max para o alcance do secador e liguei o ar quente contra seu pelo. Ele latiu, mas Greg o manteve seguro. – E eu chego em casa e você está me esperando com um short que deixa metade da sua bunda do lado de fora e com uma camisa branca transparente. E molhada, para completar. – Ah, você não fez ideia de quão molhada eu estou. – Me aproximei do seu rosto. – Não me provoque. – Ele me envolveu com um abraço, mas sua mão foi direto para a minha bunda. – Vai! Me solta. Deixa eu acabar de secar o Max – ri. – O cachorro está limpo, Dominique. – Sua boca estava no meu pescoço e eu parei de me importar com a limpeza do animal. – E você está imundo. – Sua roupa estava toda manchada. – É. Acho que essa daqui não tem mais solução. – Ele estava todo sujo de terra, sabão e baba. – Vem me dar um banho? – Eu não! Você está podre. Tome um banho sozinho e me procure quando estiver limpo. – Você fala como se estivesse em uma situação melhor do que a minha. Com esse short enrolado e essa camisa suja de terra. – Seus olhos estavam no meu corpo, e eu percebi a fome que continham. – Não está gostando da minha camisa, é? – Estou adorando sua camisa. Principalmente o jeito como ela está molhada e me mostrando esses teus peitinhos perfeitos. – Segurou um deles na palma da mão e me deu um beijo por cima da camisa. – Peitinhos? – reclamei, rindo. – Ah, perdoe-me. – Lambeu os lábios de forma sacana – O diminutivo realmente não se adequa à situação. A genética foi muito boazinha com você. – Como você sabe que eu não tenho silicone? Ele me olhou com um sorriso de obviedade. – Acho que já conheço os seus peitos muito bem, Dom. Sorri e virei para abrir a porta e deixar Max entrar em casa. Mal ele tinha passado, Holt me puxou pela cintura. – Mas vamos verificar, só por segurança. – Me segurou pela cintura e arrancou a blusa pela minha cabeça. Fiquei nua da cintura pra cima e o ar frio da noite enrijeceu a ponta dos meus seios. Ele se afastou, com minha camisa nas mãos e o lábio inferior entre os dentes, e me observou por alguns segundos. Não me tapei, nem me escondi. Pelo contrário. Cruzei os braços logo abaixo dos seios e eles se levantaram. – Você é muito linda. – Vai descobrir se eu tenho ou não silicone só olhando, é? – De jeito nenhum. – Ele cobriu cada seio com uma mão e os apalpou enquanto passeava com o nariz pela base do meu pescoço até um de meus mamilos. – Tudo natural – sussurrou, e eu me arrepiei onde seu hálito tocava minha pele. – Sabe do que eu gosto?


– Do quê? – Gosto quando você suga meus seios. Quando você mama com violência e os deixa doídos e sensíveis. Me excita. Muito. – Ah, a gente pode trabalhar nisso. – É? – Dei dois passos para trás e ele começou a me seguir. – Vem cá e mostra para mim como é que se faz. Porque mesmo adorando essa tua boca, eu ainda acho que consigo sugar melhor do que você. Deixei a palavra sugar dançar na minha língua. A ereção de Holt estava facilmente identificável. – É difícil competir com você. – Ele colocou o polegar na minha boca – Essa boquinha é uma coisa de louco. – Eu sei. – Dei mais um passo para trás, em direção à piscina. – Você está fugindo para onde? – Estou fugindo de você. Está imundo. – Mais um passo. E mais outro. Ele estava me seguindo. Isso, meu bem, vem. – Você não vai escapar. Vou meter meu pau sujo em você. Gozar nesses teus peitinhos – riu. Tirei uma de minhas sandálias e joguei nele. Ele a pegou no ar e eu joguei a outra. Holt se desviou e avançou para me segurar. – Você só me fode depois que tomar um banho. – Estávamos na borda da piscina. Eu dei um passo para o lado e o empurrei. O problema é que ele segurou meus braços com força e me puxou junto. A água morna nos envolveu. Achei o chão com os pés e comecei a caminhar para o raso. – Se isso foi uma tentativa de diminuir minha ereção, não funcionou. – Reclamou, tirando os sapatos e as meias e os colocando na borda da piscina. Estava tudo encharcado. – Vou aí te pegar e te foder do mesmo jeito. – Pelo menos agora você está limpo – ri e me abaixei na água. Tirei o short e, quando submergi, estava completamente nua. Joguei as roupas na borda junto com os sapatos de Holt e depois me aproximei e passei a língua nos seus lábios. – Nunca – sussurrou –, nunca vou parar de sentir um tesão incontrolável por você. Ele me beijou, enfiando as mãos nos meus cabelos molhados, e eu senti sua roupa molhada grudando no meu corpo. – Eu ia te levar para a cama, Dom. Mas não posso desperdiçar você nua aqui. – Não, não pode. – Holt agarrou minha bunda e eu o envolvi com minhas pernas. Ele deu alguns passos para o lado e nos levou para o fundo até minhas costas baterem na lateral na piscina. Ele me beijava com um incrível nível de intimidade: ele conhecia minha boca. E mais do que isso, ele gostava da minha boca. Sabia exatamente o que fazer com ela. Eu estava entregue ao seu toque, ao seu carinho, à sua língua. Sexo animal e voraz é excelente. Mas tinha algo novo no sexo com Holt. Era ternura. Transar com alguém que você gosta. Não passava minhas mãos no seu corpo para excitá-lo ou para me excitar, as carícias eram feitas porque eu gostava dele. Gostava do seu corpo. Queria o seu calor perto de mim. Me aquecendo até que eu derretesse. Fechei os olhos e, a cada novo beijo, eu sentia um arrepio delicioso descendo pela minha espinha. Os braços fortes e musculosos me mantinham bem presa a ele de modo que não houvesse qualquer distância entre nossos corpos. Esfreguei minha vagina contra sua camisa e passei alguns segundos ali, só curtindo a fricção. – Vai, linda. Se esfrega aqui. Deixa eu te sentir. – Ele chupou um dos dedos e o desceu entre minhas coxas. Enfiou fundo em mim e eu gritei. Não de prazer. De dor. – O que foi? – Greg parou,


assustado e me segurou pelos braços. – Ai! – choraminguei. – A porcaria da água da piscina… Não consigo ficar molhada. Holt me observou. Ele era lindo! Tinha uma expressão extremamente preocupada por eu ter me machucado. Era uma gentileza que não conhecia limites, e era dedicada só a mim. Era indescritível como eu estava amando ter alguém que se preocupava comigo daquele jeito. Com cada toque, com cada palavra. Ele não me machucaria nunca. – Você não está molhada? Dentro da água? Como isso é possível? Eu ri. – A água está me lavando. Aí eu fico seca por dentro. Doeu. – Fiz um beicinho e ele expirou aliviado por ter compreendido e beijou meus lábios. – Oh, meu amor… Vem, vamos te tirar da piscina. – Mas eu queria ficar aqui. – Fazer aquele dengo era tão gostoso. Aquela atenção que ele me dedicava era embriagante. – Nunca transei em uma piscina antes. – Não vou te machucar, Dom. De jeito nenhum. Vem… A gente faz amor na beira da piscina. – Beijou minha boca – Você deixa os pés dentro da água se quiser – disse com um carinho envolvente. Holt me pegou no colo dentro da água e me carregou com facilidade. – Estou me sentindo muito forte hoje – brincou, inflando o peito, e eu comecei a rir das suas bobagens. Já estávamos na escada quando eu me virei e comecei a despi-lo. Ele ficou parado me observando. Tocava minhas mãos enquanto eu me dedicava aos botões de sua camisa, acariciava meu rosto com os nós dos dedos quando eu me aproximava. Nunca tirava os olhos da minha boca, me beijou mais algumas vezes e me ajudou a sair da água. Assim que eu estava do lado de fora da piscina, Holt me carregou nos braços mais uma vez. – Viu? – riu. – Forte! Eu estava rindo sem qualquer vontade de parar. Até ele se ajoelhar e me deitar na grama. Colocou meus cabelos atrás da orelha e apoiou minha cabeça com a mão para que ela não ficasse contra o chão. Nossos narizes se tocavam e sua boca estava tão próxima que eu sentia o seu hálito fresco. – Eu sou louco por você, sabia? – E eu sou louca por você. – Passei o dedo por sua orelha. Tentei respirar fundo, mas meus pulmões pareciam estar trabalhando com metade da capacidade. Ele tocou meus joelhos e abriu minhas pernas. Escorregou pelo meu corpo e beijou a parte interna das minhas coxas, do meu joelho, até lá. Os beijos e lambidas foram só para umedecer minha entrada. – Se você ainda estiver seca, promete que me diz? Não quero te machucar, Dom. – Holt estava beijando meu pescoço, mas só aquela simples frase conseguiu me deixar molhada. Não era sacanagem, nem safadeza de nenhum tipo. Era só doçura. E a doçura dele me excitou mais do que eu imaginava ser capaz. – Digo – respondi, envergonhada. Era incrível como eu não tinha vergonha de nada. Nem do meu corpo, nem da minha sexualidade… Mas bastava ele me tratar daquele jeito gentil e cada centímetro do meu corpo se derretia. Ele manteve a mão na minha nuca, protegendo minha cabeça do chão. Não que precisasse… a grama era fofa e agradável o suficiente, mas, independentemente disso, ele deixou a mão ali. Holt baixou os olhos e segurou a base de sua ereção antes de me penetrar. Eu o senti mexendo ali dentro. Devagar e gostoso. Um gemido longo de satisfação escapou da sua boca. Envolvi seu quadril com as pernas e apoiei meus calcanhares em sua bunda. Ele entrava e saía de mim como uma onda.


Uma fluída, constante e deliciosa onda. Eu tinha um desejo por ele que não se traduzia em palavras. Um desejo pelo seu corpo, pela sua alma, pelo seu coração. – Holt? – perguntei, e me surpreendi como minha voz soou tímida e vulnerável. – Amor? – Ele se apoiou nos cotovelos e manteve os olhos nos meus, sem nunca parar de se mexer. Não queria que ele acelerasse. Não queria que fosse bruto ou violento. Não naquele momento. Eu só queria carinho. – Faz amor comigo? – sussurrei. – Todos os dias – murmurou contra os meus lábios. Gregory me tomou como sua, e não apenas o meu corpo. Cada milésimo da minha alma era dele. Continuou devagar até a fricção entre nossos corpos virar eletricidade e fogo. Então ele ficou mais e mais rápido, sempre com os olhos cravados nos meus, os nós dos dedos acariciando meu rosto, um beijo delicado nos lábios. Joguei a cabeça contra a grama e gozei olhando para as estrelas.

– Tem certeza de que não quer que eu leve ele lá pra baixo? – Tenho. Assim que saímos do banho, Dom se enfiou em uma das minhas camisas e deitou na cama, puxando Max com ela. Sentei ao seu lado e beijei sua testa. – Vou terminar o trabalho Ela já tinha fechado os olhos e deu um suspiro pesado. Dormiu agarrada ao Max antes que eu chegasse à porta. – Eu te amo – sussurrei muito, muito baixo. Não queria que ela ouvisse. Mas queria dizer. Saí do quarto e desci as escadas para apagar as luzes antes de ir para o escritório. Tinha uma longa noite de trabalho pela frente, mas não me importava. Desde que aquela morena linda estivesse me esperando na cama, eu não ligava para muitas outras coisas. Ela não tinha mencionado minha avó. Mas isso poderia ficar para o dia seguinte. Era por isso que eu não tinha conseguido esperar no escritório. Precisava voltar para casa porque não sabia o que tinha acontecido, e parte de mim temia não encontrar Dominique me esperando quando eu chegasse. Temia que seja lá o que minha avó tivesse dito tivesse assustado Dom. Mas eu voltei e ela estava lá. Estava dando banho no meu cachorro. E eu nem precisei chantageá-la. Passei pelo portal que separava o hall de entrada da sala e sorri pensando em quanto eu e Dom tínhamos mudado. Foi aí que algo perto do telefone chamou a minha atenção. Era um cartão. Um cartão de visitas. Apanhei de qualquer jeito e li o nome. Dr. Tristan Henris. Era o médico que tinha atendido Dominique quando ela tinha machucado o pé. O médico que estava dando em cima dela quando eu voltei do estacionamento. O que diabos esse cartão estava fazendo ali? Ela não tinha saído com Andy esta noite? O pensamento me ocorreu quando voltei os olhos para o telefone. Ah, não… Não, Dom. Por favor, não.


Não faz isso comigo. Apertei o botão para rediscar o último número e encarei o visor digital. Era o mesmo do cartão. Dominique tinha ligado para o médico no mesmo dia em que tinha ido a um bar com a amiga. Será que ela tinha realmente saído com a vizinha? Ou tinha saído com ele?


Capítulo 20 “Não posso pensar nisso agora. Se pensar, eu enlouqueço. Amanhã eu me preocupo.” Scarlett – E o vento levou – Que bicho te mordeu? – Quê? Nada. Ele estava estranho. Tirei os ovos da geladeira e os coloquei sobre o balcão. – A gente precisa ir ao supermercado comprar algumas coisas para hoje à noite. Já falei com o pessoal da vizinhança. E você precisa contar quantas pessoas do escritório vêm. – Acho que umas quatro ou cinco. Fora a minha avó. Eu nunca tinha imaginado como seria a sensação de uma estaca de madeira atravessando meu pescoço. Mas o que senti naquele momento deve ter sido muito próximo disso. – Sua avó vem? – Vem. E vai trazer alguém com ela. Pode somar mais duas pessoas. – Sua voz era fria e distante e eu me peguei repassando os acontecimentos da noite anterior. O que é que eu tinha feito para merecer essa mudança de comportamento? – Achei que você não se dava bem com ela. – Também não entendi. Mas ela apareceu no escritório ontem à tarde e eu acabei convidando-a sem querer. – Se você não quer que ela venha, então desconvide. – Só porque você não gosta de uma pessoa, não significa que pode desconvidá-la para uma festa na minha casa, Dominique. – Não estou desconvidando ninguém, e sei muito bem que a casa é sua! Holt, o que diabos você tem? E por que está dizendo que eu não gosto da sua avó? – Você não ia me contar que ela esteve aqui ontem? – Ia. Em algum momento. Mas se você já sabe, por que a charada? – Talvez ela tenha te dito algumas verdades que você não tenha gostado de ouvir, e aí resolveu não me dizer que ela esteve aqui – chiou para si mesmo e a minha visão ficou vermelha de raiva. – É O QUÊ? – Levantei a faca para ele. – Ei, ei! Calma! – Calma é o caramba! A mulher veio até aqui e me acusou de me aproximar de você por dinheiro e você está dizendo que foram verdades? Quer dizer que você diz que não quer me machucar, que vai fazer amor comigo todos os dias e depois resolve que mudou de ideia e que pode me tratar como lixo? – O que o cartão do médico estava fazendo em cima da mesa?


– Que cartão? Que médico? – O Henris. Ou seja lá qual for o nome dele. Puta que pariu. Esse drama todo era por isso? – Eu estou com você, Holt. – Baixei a faca e me surpreendi com o meu tom estava calmo. Mais que calmo… Estava sentido. – Eu disse que estava apaixonada por você e que queria ver onde isso ia dar. – Eu estava ressentida. – Aí você escuta umas três palavras azedas da sua avó, vê um cartão em cima da mesa e resolve que eu sou uma vadia que não merece consideração de novo. É isso? – Eu sei que você ligou para ele ontem. Quando você disse para mim que estaria com a Andy. Por que você não me explica, Dom? – Ele parecia irritado. – Eu quero entender. – Ele não tinha o direito de ficar irritado. – Você quer entender, imbecil? Pois então vem escutar de outra pessoa, já que a minha palavra não vale nada para você. Puxei ele pelo pulso com violência e marchei através da sala e do jardim. Meti a mão na porta de Andy como se o modesto pedaço de madeira fosse o responsável por todos os meus problemas. – Dom? – Agora ela tinha o rosto todo borrado de maquiagem. Tinha um sorriso feliz no rosto, mas eu não tinha tempo para isso. – Andy, será que você pode explicar para esse animal o que nós fizemos, ontem? – A gente foi para um bar. – Ela desviou o olhar de mim para Holt, sem compreender, e parecia querer se esconder atrás da porta. – Pode dar mais detalhes para ele não achar que você está mentindo? Porque, aparentemente, está na moda achar que as pessoas estão mentindo e nem lhes dar a chance de se defender. – Ahmm… Você me maquiou. E maquiou a Shelbi! Emprestou roupas para ela. Por sinal, ela… Ahmm… Não dormiu em casa. – sibilou para mim com uma cara impressionada. – Foi embora com o médico. Acho que te devolve as roupas depois. – Ah! Tinha um médico na história? – exagerei, parecendo sonsa. – Por favor, Andy, será que você podia explicar para o Gregory o que o médico estava fazendo lá? – Ele trocou o pé de apoio do corpo, estava cada vez mais constrangido. Ótimo. – E use palavras fáceis. Porque ele é um imbecil! – rosnei na cara dele. – Não precisa, Andy. Está tudo bem. Dom, por favor… – Não! Você vai ouvir. Vai ouvir umas verdades. Diz para ele! Andy me encarou assustada. – Dom, eu não quero me meter… – Greenpeace! Abre essa boca e conta a história. Agora! – Shelbi está se separando do marido. Está ficando aqui em casa por uns dias. Ela não queria ir para o bar com a gente, aí Dom ligou para o amigo médico e apresentou os dois. Foi um trabalho de cupido – sorriu, levantando os polegares. – Vide o fato de que ela ainda está com ele. Olhei para Gregory em silêncio. – Dom, me desculpe. Eu não pensei direito. – É, não pensou. – concluí, autoritária. – Eu vou ficar aqui com a Andy e vou descobrir como foi a noite dela depois que eu saí do bar e voltei para casa para dar banho no seu cachorro. Quando eu voltar para a sua casa é bom ter um café da manhã delicioso me esperando ou eu pego aquele seu amado videogame e jogo ele na sua cabeça. Ele deu um sorriso torto e levantou as mãos em sinal de paz. Hesitou, esperando autorização para se aproximar. Eu não me movi, então Holt colocou as mãos na minha cintura com cuidado, sussurrou um “me desculpe” e beijou minha bochecha antes de se afastar.


– O que foi que houve? – Crise de ciúmes sem propósito. Não é importante. Mas me conta: como foi a noite? – Ah! Dom! – Ela se derreteu na porta. – Tão boa assim, hein? – ri. – Eu realmente não sabia o que estava perdendo! Como eu pude esperar tanto tempo para tentar de novo? Quero fazer isso todo dia! – Oh, oh, oh! Calma aí. Também não é para sair desesperada. – Calvin vai estar na festa de vocês hoje à noite? – Ele foi convidado. – Logo, logo eu ia ter que me apoiar nos joelhos ou a gargalhada ia me derrubar no chão. A animação de Andy era o máximo. – Posso dar em cima dele? – Deve! Agora é melhor eu voltar para casa. Se Holt fica muito tempo sozinho em uma cozinha, coisas explodem. Quando Shelbi chegar, você me avisa? – Também quer ouvir a história, hein? – sorriu. – Com certeza!

– Desculpa. Ele vinha empurrando o carrinho de compras atrás de mim e repetia isso a cada noventa segundos. Alternava os pedidos com uns beijos no meu pescoço, e eu estava achando difícil resistir. – Tá. Da próxima vez, tenta me perguntar antes de deduzir o pior. – Eu sei. Mas é porque… – Porque o quê? – Virei para ele e parei o carrinho quase cheio. – É difícil acreditar que é verdade. – Não é difícil só para você, Gregory. Mas você prometeu que ia ser forte por nós dois. Essa de coisa de relacionamento? É horrível para mim! Eu não tenho nenhuma experiência! Fico perdida sem saber o que fazer. E só aceitei tentar porque você disse que ia ser forte por nós dois. Aí, no primeiro sinal de problema, você abre as pernas e joga a toalha. – Nossa, você está com muita raiva. – Muitos Baxters questionando minha ética nos últimos dias. – Não me chame assim, Dom. Por favor. – Você me chamou de piranha aproveitadora! Eu chamo você do que eu quiser. Ele começou a rir. Por algum motivo, Holt estava achando minha fúria hilária. – Você fica muito linda com raiva. – Fico perigosa também. Cuidado. Eu mordo. – Não te chamei de piranha aproveitadora. Só fiquei com ciúmes e parei de ver com clareza. – Me puxou em um daqueles abraços maravilhosos e eu tive que virar o rosto para longe dele ou desistiria da minha teimosia. – Me desculpa, por favor? – Ele moveu o rosto, tentando alinhar sua boca com a minha e eu me distanciei em uma provocação infantil. – Hum? – pediu mais uma vez, com o sorriso a milímetros do meu. – Vou pensar no seu caso. Ele me beijou e eu o perdoei. Porcaria… – Agora… Posso te perguntar o que são algumas dessas coisas que você colocou no carrinho?


– Tipo o quê? – Não entendo como vamos servir esses morangos, o chantilly ou os iogurtes de chocolate para os vizinhos. – Pelo sorriso sacana na sua cara, ele tinha certeza do que eu estava planejando. – Tem um experimento que eu quero fazer e não é porque você foi um imbecil que eu vou desistir. – Hmmm… E me envolve? Seu experimento? – Eu adorava aquele sorriso safado. Queria aquela boca me chupando todinha e depois dizendo que era louco por mim. – Se você se comportar, talvez. – Eu juro que me comporto! – Levantou uma mão, em uma promessa exagerada e eu ri.

A casa estava começando a ficar cheia. Andy chegou primeiro e disse que Shelbi tinha ido trocar de roupa em sua própria casa. Aparentemente, a aventura da noite anterior tinha deixado, minha adorável vizinha, convencida de que a recém-separada tinha bebido uma boa dose de autoconfiança e não ia fazer nenhuma besteira. Eu confiei nela mais porque não havia o que fazer do que por qualquer outro motivo. Algumas pessoas do escritório de Holt tinham vindo, inclusive Lynn. Se a avó dele queria achar uma golpista de olho no baú do tesouro, só precisava olhar para a doce loira aguada. Quero dizer, se você continua insistindo depois que o homem te larga sozinha na cama para ir atrás de outra mulher ou você não tem uma gota de respeito por si mesma ou está se esforçando para um prêmio maior. No sofá, Rick estava dando uma surra em Hill no videogame. Isso! Meu garoto! – Deixa eu tentar – pedi. Hill me passou o controle a contragosto e eu vi meu Blanka ser humilhado mais uma vez. – Será que eu posso te processar por isso? – Acho que não – Rick riu. – Mas pode tentar abrir um precedente – Hill acrescentou, arrogante. Deixei os dois para trás assim que vi Shelbi cruzar a porta. Me aproximei e ela correu para os meus braços. – Dom! Foi incrível! Tristan é um homem excelente e nós temos tanto em comum! – E ele é bom de cama? – Andy quis saber. – Olha só pra isso! – ri. – A menina perdeu a virgindade a menos de doze horas e agora só pensa nisso. – Foi uma pergunta honesta – deu de ombros. – Ah, mas eu não fiquei com ele. Não assim. Eu e Andy nos entreolhamos. – E vocês foram para onde? – Começamos a conversar e como nós dois gostamos de música country, ele me levou para um lugar… Foi muito bom. – Mas onde você dormiu? – Eu não queria ter que acordar a Andy tão tarde. Fiquei na casa dele, mas não fizemos nada! – acrescentou rapidamente. – Ele foi um cavalheiro. – Ela estava suspirando. Eu tenho medo de quando mulheres começam a suspirar por causa de homens. Tinha experimentado um pouco disso nos últimos dias: a razão nos abandona. Não é muito aconselhável. – Tristan é o homem mais incrível do mundo! – Ela tecia elogio após elogio e não viu Holt se aproximar. Olhei fundo nos seus olhos e notei que ele estava ouvindo. Estava ouvindo a mulher elogiar o homem que ele tinha me acusado de ter seduzido. Ou seja lá o que for que ele tenha me acusado…


– Bebidas, moças? – ofereceu. Shelbi se calou, assustada. Ela sabia que esse assunto ainda não podia chegar em Eric. Elas começaram a escolher o que iam aceitar e Greg passou um braço em minhas costas. – Desculpa – disse no meu ouvido antes de dar um beijo na minha testa. Não era um tom alegre ou brincalhão. Era um tom bem sério dessa vez. Eu assenti e ele baixou o rosto para me dar um selinho. Uma movimentação na porta chamou a nossa atenção. Ela usava o mesmo coque grisalho no topo da cabeça. A blusa preta de manga comprida tinha a gola alta, a saia vinho ia até os pés. Seu pescoço ostentava um discreto colar de diamantes, que era quase tão frio e elegante quanto seu olhar. Só havia uma diferença: ela estava sorrindo. Se não tivesse sido tão verbalmente agredida por ela no dia anterior, quase acreditaria na sua simpatia. Ela estava de braços dados com outra pessoa. Uma mulher. Alta, com cabelos loiros cuidadosamente penteados para trás e presos com uma fita. Usava uma roupa que… Na falta de descrição melhor, poderia se dizer simplesmente que ela estava fantasiada de rica. Cada peça que ela usava era algo que só alguém exorbitantemente podre de rico teria no guarda-roupa. Eu conhecia tudo porque gostava de observar objetos incompráveis quando me permitia sonhar acordada com alguns supérfluos femininos: Dos scarpins pretos de Christian Louboutin à echarpe de seda Hermès. – Gregory! – Eleanor. Merryl? – acrescentou, surpreso. – Olá, Greggy! Greggy? Ai… Não… – Nossa! Há quanto tempo! – Eles se abraçaram um pouco amigavelmente demais e eu quis roubar seus scarpins, atravessar o salto na sua garganta e depois limpar o sangue, colocar aqueles sapatos no meu guarda-roupa e amá-los pelo resto da vida. – Faz alguns anos, não é? Você sumiu! – Eles soltaram o abraço e ela deu um soco gentil no seu braço. – É verdade. Tive que fugir por um tempo. Essa é Dominique. Dom, acho que já conheceu minha avó. – Boa noite – cumprimentei de forma seca e ela apenas sorriu inexpressivamente de volta. É, a gente se odiava. Estava decidido. – E esta é Merryl. É uma amiga da família. – Olá. – Eu estava apertando sua mão quando sua avó se intrometeu. – Ora, Gregory, não seja tão formal. – Ela pegou a loira rica pelo braço mais uma vez – Merryl é mais que uma amiga, é quase parte da família. E teria feito parte de verdade da família se o pequeno Baxter não fosse um tonto. – Ela sorria do neto para a convidada e eu estava pronta para enfiar um anzol na minha garganta e pescar meu coração. Qualquer coisa para ele parar de bater tão desesperadamente dentro do meu peito. Esculpi um sorriso na cara e deixei ele congelado ali. Sabia que se abrisse a boca para falar qualquer coisa ia acabar me arrependendo. – Não me chame de Baxter, eu não gosto – sorriu educado. – E às vezes as coisas não dão certo, Eleanor. – Ele manteve sua mão firme na minha cintura e eu o amei por isso. Mas mesmo com o apoio do seu braço e do seu corpo junto ao meu, mesmo me mantendo firme e segura em seu ombro, o sorriso azedo e odioso de sua avó ainda me machucava e eu não conseguia entender exatamente por quê. – É verdade! Dominique, nós mal conversamos no outro dia. – Ela estava sendo simpática demais, e eu suspeitei de suas intenções imediatamente – Por que não passamos alguns minutos juntas, hein?


Gostaria de ouvir um pouco mais sobre você. Gregory fala maravilhas a seu respeito. Ah, então ela era desse tipo. Ia me elogiar e ser simpática na frente dele e deixar para mim a missão de falar mal dela. Isso ia fazer com que Gregory a venerasse e começasse a ficar irritado comigo. Não, eu não ia jogar esse jogo. Os problemas que ele tinha com a família eram dele. Eu não ia me meter. – Claro. Será um prazer – respondi, devolvendo toda a hipocrisia. – Me mostre a casa, sim? – Ela me pegou pelo braço e me puxou. Vagabunda filha de uma puta. Ela estava me afastando de Greg e deixando ele sozinho com Merryl. Eu tinha que confessar que tinha sido uma boa jogada. – Você não quer um tour da casa, quer? Não de verdade… – Não – sorriu. – Você é mais esperta do que parece. – Você realmente acha que seu neto é estúpido o suficiente para não perceber o que você está fazendo? – Ah, ele sempre percebe. É um garoto inteligente. Mas sempre acaba fazendo o que eu quero mesmo assim. – Você o subestima. – E você o superestima. Ele é só um homem. Um homem que foi criado no luxo e na opulência. Aquela moça? Ela é uma Waelde. Eles dividem conosco a lista das famílias mais ricas. Olhe para os dois. – Senti vontade de vomitar – Gregory e Merryl cresceram juntos. Nós planejávamos sua união antes de eles aprenderem a andar. E eles ficaram juntos por algum tempo. Até toda aquela coisa com o pai dele acontecer. – Morrer. Até o pai dele morrer. Ela se virou de frente para mim e começou a ajeitar o cinto fino que delineava minha cintura por cima do vestido. – Olhe só pra você, achando que é moralmente superior a mim porque consegue ter compaixão pelos sentimentos de Gregory. Querida, você não é superior a mim em nada. Nem se compara. Nem a mim, nem ao meu neto. – Ele sabe que você só está vendendo ele como carne. – Ah, pobrezinha. Você acha que tem alguma chance? Aqueles dois nasceram um para o outro. Foram criados e adestrados um para o outro. Não existe parceria mais ideal do que essa. Eles só se separaram por um acaso do destino. E eu? Eu não preciso fazer nada. É só colocar os dois no mesmo ambiente por tempo suficiente. É inevitável. Eu engoli a seco. Do outro lado da sala, Greg e Merryl sorriam um para o outro como velhos amigos. Amigos de infância. Se ela tivesse sido seu primeiro amor, seu primeiro beijo, sua primeira vez… Como eu poderia competir? Além do mais, ela tinha todo o apoio do furacão Eleanor Baxter enquanto eu, a poderosa Dominique Thoen, começava a me sentir cada vez mais minúscula.

– Não acredito que você ainda não contou para ninguém. – Ainda não posso, Greggy. Não estou preparada, por favor, não me julgue. – Não! Nunca. Não foi essa minha intenção e você sabe – sorri para ela. De todas as pessoas que eu tinha deixado para trás, Merryl era de quem eu mais sentia falta. Por muitos anos, ela tinha sido minha melhor amiga.


– Eu sei! Você não é o tipo. Mas você sabe como é… – Sei. Acredite! – Arregalei os olhos exagerando e ela riu. – Mas estou feliz em te ver. Você parece bem. – É muito bom te ver também! E, obrigado. Acho que estou bem. Agora, pelo menos… – Já foi visitar os túmulos? – Não, e não fale isso muito alto. – Olhei ao redor preocupado – Se Dominique escuta isso, ela me arrasta até lá. – A preocupação era genuína – Ela me fez ir até o asilo. – Ver a Audrey? – ela sussurrou, impressionada – Não acredito! – seu queixo caiu – E você foi? – Confie em mim: não é seguro dizer “não” para a Dominique. – Está explicado por que a Eleanor a odeia. Você sabia que ninguém sabe onde sua mãe está? Eu só sei porque você me contou. Sua avó nunca disse nada para ninguém. Há rumores, óbvio. Mas nenhuma certeza. – Imagino que se eu for visto entrando e saindo daquele lugar não vai ser bom para os negócios da família, não é? – Que se danem os negócios da família. – Seu sorriso amigável me aqueceu por dentro. Tinha sentindo falta da minha amiga. – E eu não acredito que ela te convenceu a ir. – Ela estava tapando a risada com as mãos em concha. – Não estimule esse tipo de comportamento, Merryl – ri e apertei seu braço. – Você gosta dela? – Nossa… – suspirei. – Isso tudo, hein? – Mais – confessei. – É estranho porque… de todas as pessoas do mundo… – Eu não tinha palavras para explicar. – Você sabe que Eleanor vai fazer da vida dela um inferno, não sabe? – E ela começou te trazendo aqui. – É, eu sei, não foi um plano muito bom. – Ela se apoiou no meu ombro rindo e eu a acompanhei. – Mas ela não sabe de tudo. Foi até a minha casa querendo me arrastar até aqui, mas é claro que não precisou pedir duas vezes. – Obrigado por ter vindo. É bom te ver. – Digo o mesmo, Greggy. Mas se você gosta da garota tome cuidado, tá? Quando Eleanor começa com essas coisas, quem sabe quando ela vai parar? – Ela não é tão ruim assim. É só um cachorro que late muito, mas a mordida é fraca. – Você quem sabe – deu de ombros. – E ela? Gosta de você? – Eu acho que sim. – Acha? – Com Dominique é difícil. Às vezes eu tenho quase certeza. Ou até certeza absoluta. Mas aí acontece alguma coisa e eu acho… – … que é bom demais para ser verdade. Sei como é. Mas não afaste a menina por medo de acreditar, Greggy. – Tá, tá. Eu sei – sorri. – E você? Alguém especial? – Estão me fazendo sair com um Allender. – Uuhh! – provoquei. – Mais um top 8 – ela riu. – Não tira onda, Baxter-Holt! Nem todos podem viver uma vida livre. – Pode sim, se quiser. – Não tenho coragem, Greg. Ainda não. Te admiro muito por isso, você sabe. Mas assim é mais


fácil. Não sou forte como a Amanda. – É sim. Só está com medo que seja bom demais para ser verdade. Agora, fala a verdade. Alguém especial? Ela sorriu. – Ela se chama Laurie. É da minha turma de literatura espanhola. – Hmm… E o que ela acha da situação da família? – De ter que sair escondida, você quer dizer? Ela detesta. Se assumiu há pouco tempo e acha que está dando um passo para trás comigo – deu de ombros. – Mas eu não posso… Não agora. – Sabe… – sussurrei. – Quando Amanda me contou que você era lésbica, a primeira coisa que eu pensei foi “e ninguém mais notou ainda?” – É! Acho que eu sempre preferi brincar com você e seus carrinhos – riu. – Não que isso seja indicativo… Amanda adorava barbies. – Ela foi o meu primeiro beijo, sabia? Mentira! – Não acredito! – É sério! – Olha para isso! Quase que um Baxter e um Waelde se unem em um relacionamento de verdade! – Rá! Só não ia ser o que nenhuma das duas famílias queria, não é? – riu. – Mas eu achei que Mandy só tinha percebido que era gay depois que voltou da África. – Não. Ela já sabia há muito tempo. Quando ela sugeriu que a gente namorasse para disfarçar, estava tentando me ajudar porque entendia. – Ela respirou fundo – Sua irmã era uma pessoa incrível. – Ah, nem me fale. – Meu coração estava doendo. – E sabe do que mais? Acho que ela ia gostar de Dominique. Ia brigar com Eleanor para que te deixasse viver sua vida. – “Deixe a menina em paz, sua velha birrenta” – rosnei, imitando minha irmã e Merryl começou a rir. – Mais ou menos isso. – Se algum dia precisar de alguma coisa, sabe que pode contar comigo, não sabe? – Sei, moleque! Talvez, quando eu finalmente contar que sou gay e meus pais me colocarem para fora de casa, eu tenha que vir atrás de você procurando um lugar para ficar. – Minha porta está sempre aberta. – Os olhos de Merryl andaram por cima do meu ombro. – Ela é muito bonita. Dominique estava nos braços da minha avó, do outro lado da sala. Usava um vestido leve que caía até os pés delineando cada uma de suas curvas. O cinto fino acentuava a cintura e quando ela se virava de perfil eu podia ver cada nuance daquele corpo que eu estava rapidamente aprendendo a amar. – É. Eu sei – sorri, em paz. – Acho melhor eu ir lá resgatá-la. E se eu conheço aquela mulher, ela deve estar morrendo de ciúmes. – De mim? – ela riu. – E de quem mais? – a ironia era infinita. – E o pior é que ela não vai assumir. Vai ser grossa e irritante até eu dizer chega. – Nós, mulheres, somos complicadas. Holt, posso te pedir um favor? – Dois até. – Não conta para ela, por favor? Eu tenho certeza de que ela é confiável, mas… – É uma coisa sua e é um assunto sensível, Merryl. Não é meu segredo para contar. Fique


tranquila.

Eu não dei nem dois passos e Dominique já tinha conseguido se livrar da minha avó sem a minha ajuda. Objetivamente falando, quando é que Dominique precisava de ajuda para o que quer que fosse? A sala de jantar estava vazia quando cruzei apressado atrás dela e empurrei a porta da cozinha alguns segundos depois. O tempo tinha sido suficiente para que ela arranjasse uma faca e começasse a dar uma de açougueira em um pedaço de queijo. – Minha nossa… – brinquei, passando as mãos pela sua cintura – O que é que o queijo te fez? – Estou armada, Holt. Não me perturbe. Ela estava com ciúmes. Ela era linda. – Nunca. Principalmente depois de ter testemunhado o assassinato do queijo. – Estou dividindo ele em pedaços pequenos para colocar na bandeja dos salgados. Algo que, por sinal, você deveria estar fazendo, já que a casa é sua. Ela não ia parar com as indiretas. Tudo bem, eu merecia. A casa era mesmo minha, mas eu tinha falado aquilo para ofender. Estava magoado porque, algumas horas antes, tinha realmente acreditado que ela tinha saído com o médico. – Não fica com raiva. Eu já pedi desculpas. – Tentei fazer cosquinhas na sua cintura, mas ela me empurrou. – Me solta ou eu castro você com essa faca. – Estamos violentos, hoje, hein? – Por que você não vai ficar com sua amiga, Merryl? Tenho certeza de que ela é mais pacífica do que eu. – Ela estava morrendo de ciúmes e eu tive que sorrir – Mais educada, também. Refinada… Não é? – voltou a enfiar a faca no queijo. – Dom, o queijo está morto, acho que você já pode parar. – Ela o esfaqueou mais algumas vezes e eu puxei sua cintura – Está com ciúmes, é? – sussurrei no seu ouvido. – De você? Rá! Não me faça rir. – Dessa vez ela aceitou o abraço e ficou quieta recebendo os beijos leves que eu dava no seu rosto e no seu pescoço. – Está soando como uma namorada ciumenta. – E se for? – Me observou com seus olhos escuros. – Nesse caso, eu vou ter que dizer que é extremamente desnecessário já que, depois de ter experimentado esse teu corpo, eu não consigo sentir atração por mais ninguém. – Ah é? – Você me debilitou para a vida inteira, Thoen. Não pode ir embora nunca mais agora. Passei meu polegar pelos seus lábios. Ela se virou para continuar a organizar as bandejas e esfregou a bunda na minha virilha. Joguei a cabeça para trás. Porra de mulher maravilhosa. – Você está brincando com fogo – baixei o rosto e falei contra seus cabelos. – Posso te provocar à vontade, Holt. – Ela estava rindo com gosto – Você vai fazer o quê? – Te jogar contra pia e comer essa tua bunda, por exemplo? – Com a sua avó na sala ao lado? – riu. – Até parece.


– Só não faço porque não sei se você gosta dessas coisas. – Meu pênis estava ficando duro com aquela conversa, e eu achei melhor me afastar daquela tentação antes que a situação chegasse longe demais para voltar. – Ah, querido. Se você tivesse coragem para me comer agora, eu deixava você enfiar onde você quisesse. Ela estava me provocando. Não estava? Me afastei alguns passos em direção à porta mas não consegui tirar os olhos da sua bunda. O sorriso no seu rosto era deslumbrante. Eu mataria e morreria por aquele sorriso. E por aquela bunda também, obviamente. Estava com a mão na porta quando a ouvi rindo: – Frouxo. Eu olhei pra baixo e vi meu pau explodindo ereto nas minhas calças. Sair da cozinha não era mais uma opção. – Olha o que você fez. – Eu me virei e ela passou a língua nos lábios. – Isso mesmo, pode se lamber, deixa essa boquinha bem molhada para me receber. Agora que você começou, vai ter que terminar. – Vai querer minha boca, é? Mesmo depois que eu disse que podia enfiar onde quisesse? – Ela moveu os lábios sem emitir nenhum som e eu li a palavra “frouxo” se formar na sua boca. Puxei ela para o canto da cozinha de forma tão rápida que tenho certeza de que a assustei. Apoiei sua bunda na mesa que ficava na curva da parede. Naquele lugar, se alguém entrasse na cozinha, teríamos exatos três segundos antes de sermos pegos. – Você me provocou porque quis. – Comecei a puxar a alça do seu vestido com a boca, enquanto enfiava minha mão por baixo da saia e subia o tecido até o seu quadril. – E agora eu percebi que ainda não experimentei você nessa cozinha. – Tem certeza de que quer tentar? – Sua respiração começava a ficar rasa. Meus dedos alcançaram sua calcinha. – Nós dois sabemos que você não é muito bom na cozinha. Eu tive que rir. – Então você manda. Me diz o que fazer. – Puxei sua calcinha para fora e passei os dedos pela sua pele lisa. Meu pau latejou com violência. Eu não ligava para pelos, mas sentir Dominique lisinha daquele jeito fazia meu sangue evaporar. – Me conta como você se masturba. – Ela tinha a boca tão perto da minha que nossos lábios se raspavam sempre que ela falava. – Quando você se toca… – Segurou minha mão e a guiou para dentro da minha cueca. – Naquela vez do banheiro… Que eu te vi… Tremendo de desejo, estimulando esse pau enorme. Diz pra mim… – Me beijou. Dom estava me masturbando junto comigo. Eu ainda podia sentir sua boca depois que fechei os olhos. Puta merda, ela era muito sensual. – Eu estava pensando naquela porra daquela toalha. Em como eu queria que ela caísse para eu poder te ver toda nua. Inteira, como veio ao mundo. Na minha frente. – O meu abdômen estremeceu. – O que é que você ia fazer, Greg? Se a toalha caísse no chão. – Sua voz era um sussurro contra a minha língua, e acho que meu pau nunca esteve tão duro na vida. Sentia a tensão das veias rasgando minha pele. – Nossa… Eu queria te lamber. – Mantive os olhos fechados. Minha mão subia e descia no meu pau e a dela ainda estava lá comigo. Sentindo meu movimento. Arranhando aqui, provocando meus testículos ali. – Quando eu cheguei do trabalho e te vi de toalha no meio da rua… Nunca fiquei duro


tão rápido. – Minha virilha estava recuando sozinha e eu me deliciei. – Tive que esperar uns três minutos pra me recuperar e não sair armado pela vizinhança. – Sabia que eu fiquei muito molhada? – A voz dela provocava cada centímetro do meu corpo. – Com suas mãos me envolvendo. O cachorro puxando a toalha. – A cada frase que ela dizia, sua mão se movia pela minha ereção. – Queria que aquela merda caísse para a sua boca ficar bem em cima do meu seio nu. Para eu te mandar abrir a boca e me chupar. Coloquei a língua no lábio inferior e a deixei lá. Não tinha forças para mais nada. Só para ouvir a voz de Dominique e foder sua mão. Seus lábios quentes e molhados fugiram brevemente para o meu pescoço, mas logo ela estava de volta, murmurando suas incitações no meu ouvido. – Foi tão gostoso. Ficar nua no meio da sua sala. Só aquele pedacinho de toalha me separando das tuas mãos. E nem pense que eu não vi seu pau acordando quietinho. – Quietinho? Ele estava desesperado para te ver pelada. – É? E eu estava tão molhada que fiquei com medo que escorresse no chão. Sua mão segurando a toalha tocou na minha coxa e eu queria que você subisse só mais um pouquinho para eu me esfregar nela e deixar você me foder com os dedos. Ela passou as pernas pelo meu quadril e rebolou. Puta merda. Eu ia gozar nas calças. – Nunca tive que segurar tanto o gozo como nas vezes em que transo com você, sabia? – E eu estou começando a ficar com inveja. – Ela enfiou três dedos na própria boca e depois na minha. Lambi cada um chupando sua saliva. Eu sabia o que ela ia fazer. Tanto que me afastei um pouco para apreciar a vista quando ela escorregou a mão entre as coxas e começou a se masturbar. – Eu disse que você podia ter ao vivo, não disse? Soltei meu pau e levantei a saia do vestido. Ver sua mão estimulando seu clitóris e os dedos entrando e saindo era hipnótico. Meu quadril estava se movendo sozinho em uma atração magnética. Cada célula do meu corpo queria penetrar aquela mulher. – Acho que vou te filmar de novo. – Hmmm… – ela gemeu e eu calei a boca. Ai, aquele gemido… Eu não ia conseguir resistir por muito tempo. Se ia fazer aquilo, tinha que ser logo. – Eu ainda posso meter onde eu quiser? Dom sorriu e levantou. Deu uma volta sensual bem devagar até ficar de costas para mim. Eu empurrei sua coluna com uma mão, enquanto subia o vestido com a outra. – Ai, minha nossa… Vai, linda. Empina essa bunda para mim. Enfiei a mão entre suas pernas e trouxe sua umidez para trás. Eu amava quando ela ficava encharcada daquele jeito. Aquele grito de desejo que aquela coisinha linda manifestava. Cuspi na sua entrada uma vez, devagar e passei o polegar lentamente. Ao redor e depois dentro. Ela colocou uma mão entre as pernas e continuou a se masturbar. Meu pau estava gritando que se eu não comesse aquele cuzinho lindo logo, ele ia assumir o controle por mim. Forcei um pouco e ela resistiu. Investi com um pouco mais de força e logo estava abrindo caminho por aquela entrada apertada e deliciosa. Me curvei sobre seu corpo e beijei suas costas por cima do vestido. – Dói? Quer que eu pare? – Nem pense nisso! Aquela voz carregada de tesão era tudo de que eu precisava. Logo eu tinha alcançado um ritmo perfeito e quando eu parava para prestar atenção no que estava acontecendo, não conseguia acreditar.


– Gostosa… – sussurrei mais pra mim do que para ela. Segurei sua cintura e ela rebolou. – Muito gostosa… Seus gemidos se alternavam com gritinhos curtos e abafados, e a ideia surreal de comer Dominique Thoen por trás e ouvi-la gemer e gritar de prazer enquanto rebolava no meu pau começou a ser demais para mim. – Dom, eu vou gozar. Não aguento mais. – Ahhnn… Eu tô quase, Holt. Só mais um pouquinho. Por favor! Coloquei a mão entre suas pernas e os dedos em seu clitóris. Ficamos os dois beliscando aquela região, bolinando e masturbando o que nossos dedos alcançassem. Ela rebolou mais rápido e eu ouvi a porta da cozinha se abrir. Se a pessoa, seja lá quem fosse, desse dois passos, ia nos ver ali. Mordi seu ombro e coloquei minha mão sobre sua boca. Parei de estocar, mas ela continuou com aquele rebolado impossível. Puxei seu clitóris com força e ela mordeu minha mão. Não grita, Dom. Apertei sua bunda e ela se empinou ainda mais. Que se foda. Podia ser quem fosse… Estoquei uma última vez e senti o mundo girando ao meu redor. O recuo maravilhoso mandou vibrações por cada músculo do meu corpo e eu fiquei dobrado sobre ela, masturbando-a enquanto seus dentes prendiam minha mão com cada vez mais força, até que ela lacrimejou como louca e eu tive certeza de que tinha gozado também.

– Alguém viu a gente? – Acho que não. – Holt não parecia muito seguro. Olhando pelo lado bom, na pior das hipóteses tinha sido a avó dele, e ela já me odiava mesmo… – Você vai voltar a ficar lá flertando com sua ex? – chiei. – Se for, eu só quero ser avisada antes. – Não – sorriu e me beijou. – Enquanto você me quiser, eu não quero nada com mais ninguém. Pode acreditar nisso? Estreitei os olhos, analisando seu discurso. – Posso tentar – provoquei. – Mas fique avisado que eu vou flertar com alguém. – Posso saber com quem? – riu. Achou que eu estava brincado. Mas eu não estava. – Com o Eric. – O marido da Shelbi? – seu sorriso diminuiu. – Ele mesmo. Holt ficou sério, abrindo e fechando a boca como um peixe enquanto escolhia as palavras. – E você pode, ou confiar em mim, ou achar que eu sou uma vagabunda. Seja como for, tem que decidir agora. Ele respirou fundo. – Tenho certeza de que você tem um bom motivo. Mas eu poderia saber qual é? – A gente precisa tirar fotos dele traindo a Shelbi para que o divórcio dela saia tranquilamente. – Não, Dominique. Não. Eu entendo que você quer ajudar, mas… – Você não tinha decidido que podia confiar em mim? – Olha, pode me chamar de ciumento controlador, mas eu não quero minha namorada se agarrando com um cara por aí. – Deixei o sorriso tomar conta do meu rosto e ele balançou a cabeça, brincalhão.


– É isso mesmo. Te chamei de “minha namorada”. – Não vou me agarrar com ninguém. Confiar em mim significa confiar no meu bom senso também. – Certo. Então, por favor, me explique como você dar em cima de um homem casado ajuda a Shelbi… – Sua boca continuou aberta quando ele concluiu o raciocínio e eu soube que ele tinha somado dois mais dois. – Esse Eric… Foi ele? – As palavras saíram ríspidas. – Foi – respondi simplesmente. – Mas eu não sabia que ele era casado. Só queria te irritar. Eu já dei um fora nele e a Shelbi já sabe de tudo. – Achei que era importante repassar todas as etapas. Holt sorriu para mim e eu notei que manter a calma estava exigindo cada gota de paciência que ele tinha. – E ele está aqui, hoje? – Acho que o vi chegando antes de a gente entrar na cozinha. – O filho da puta trai a mulher na minha casa e ainda tem a cara de pau de aparecer depois? – Hmm! – Quase me esqueci de um detalhe importante – E tem mais uma coisa: ele acha que nós somos casados. – COMO É? – Ele ficou com essa impressão e, no primeiro momento, eu não neguei. – Olha, eu não vou nem me irritar com isso. – Abanou as mãos, desistindo – Só me diz como esse teu plano termina, por favor. – Bem, ele começa com você fingindo que somos casados. Não precisa nem fazer nada se não quiser. Só não desminta. – Tudo bem. O que mais? Eu respirei fundo e comecei a explicar para Holt o que eu tinha planejado.

Filho da puta. Filho da puta. Eu não conseguia parar de encará-lo. Ele tinha ficado com Dominique. Com a minha Dominique. Eu queria engoli-lo. Queria jogar uma lata de cerveja na sua cabeça, qualquer coisa… Imbecil, idiota, sacana, traidor, cachorro, filho da puta, cara de pau, descarado, sem noção, nojento, verme, podre, canalha, bunda mole. Ele se aproximou. Acho que eu estava o encarando demais. – É uma bela casa. – Obrigado – respondi seco. – Você devia vir nos visitar um dia. Você e sua esposa. – É? – Mordi a língua. – Com certeza. Eu e a Shelbi íamos adorar recebê-los. – Talvez daqui a alguns dias. Tenho que dar um trato na Dominique antes. – Um trato? – É. A Shelbi não mencionou? Dom é ninfomaníaca. Tem dias que ela fica com tanto tesão que eu mal posso sair de casa. É de um jeito que eu mal considero traição quando ela fica com outros homens. – Ele estava tentando não sorrir e não deixar o queixo cair. Estava falhando grotescamente em ambos os quesitos. – Então, tenho que dar um trato nela antes. Para não passar vergonha na sua casa. – Ah, sem problemas. Eu e a Shelbi somos… Muito compreensíveis. – É, mas a Dominique ultrapassa os limites às vezes. – Suspirei e fingi estar muito preocupado. –


Você parece uma pessoa discreta, será que eu poderia… – Fingi hesitar – Não. Acabamos de nos conhecer. – Comecei a me afastar – Seria bem inapropriado. – Não, por favor, fique à vontade. Também sou homem – riu. – Sei como podem ser os problemas conjugais. Encarei meu inimigo mortal por alguns segundos enquanto interpretava um homem que cogita compartilhar ou não um segredo. – Dominique está com uma coisa pela vizinha. Essa tal de… Mad… alguma coisa. – Madeleine? – Essa! – sorri. – Deu que quer um ménage com a mulher. Ninguém tira essa ideia da cabeça dela. Estou começando a ficar constrangido. Mas enfim… Já disse a ela que não tem condição. – Hmm… Entendo. É… fazer o quê? Dom, você me deve uma. Uma bem grande.

– Calvin! Que bom que você veio. – Comecei imediatamente a olhar ao redor procurando por Andy. – Claro, Dominique. Não podia perder. – E a sua mãe? Ela vem? – Não… – riu. – Minha mãe não gosta de festas. Quer dizer… pelo menos não das que ela não organiza. – Havia algo sugestivo no seu tom. – Festas da igreja? – Festas com igreja. – Hmm… – ri. – Você conhece o pessoal? – Encontrei Andy e a chamei com a mão. Ela caminhou até nós um pouco insegura. Acho que falar sobre sexo na minha frente era fácil. Queria ver agora com o Calvin. – Ah, acho que sim. Quase todo mundo. – Bem, fique à vontade. Tenho que resolver umas coisas. Anfitriã, sabe como é… – sorri. – Mas Andy está me ajudando com umas coisas aqui e ela cuida de você. Não é, Andy? Fala alguma coisa, menina… Revirei os olhos e a deixei decidindo o que ia dizer. Holt tinha se despedido de sua avó e de Merryl. Já vão tarde… Merryl ainda tinha dado um adeus educado na minha direção. Eleanor só se virou como se eu não existisse. – Vem cá. – Greg passou o braço nos meus ombros. – Queria pedir sua opinião profissional. – O que foi? – Adam, Liam! Essa é a Dominique. Dominique, esses são Adam e Liam. Eu os conhecia. Eram o casal gay das zilhares de discussões barulhentas. – Olá! E obrigado pelo outro dia. – Não estava defendendo… – Só queria que o barulho parasse, eu sei – sorriu. – Mas obrigada ainda assim. – Adam e Liam estão no meio de um processo de adoção. Eu me ofereci para dar uma olhada na documentação e ver se eu poderia ajudar de alguma forma. Queria saber se você pode dar uma olhada também. Você é um pouco mais perceptiva do que eu.


– Só um pouco? – brinquei, empurrando ele com o ombro. – Eu olho sim, com certeza. Eles me agradeceram e eu desviei o olhar para observar Eric no canto da sala. Ele estava me seguindo com olhos de gavião. Holt fez um gesto quase imperceptível e eu percebi que ele já tinha conversado com nossa vítima. Sorri e meu namorado, notando que outro homem estava de olho no que era dele, apertou minha bunda sem qualquer constrangimento. A única pessoa, fora nós dois, que viu foi a única pessoa que estava olhando para minha bunda. E depois de receber a carícia de Holt, segui direto para ele. – Acho que eu te devo um pedido de desculpas – comecei. – Acho que deve. – Ele se aproximou e tentou sussurrar sedutor. Mas depois de conhecer o sussurro sedutor de Holt, o dele era só um grasnido ridículo. – Você foi um pouco rude demais da última vez em que nos encontramos. – TPM. – disse seca. – Fico subindo pelas paredes de fúria. Aí ela passa e eu continuo subindo pelas paredes. Só que de tesão. – Eric deu mais um passo na minha direção. – Você gostou da brincadeira da última vez. Será que topava mais uma? – Pode ser que sim. Pode ser que não. – E se eu te prometer que vai ser bem gostoso – sussurrei, ensinando para ele como é que se faz. – Nesse caso, você tem minha atenção. Ótimo.


Capítulo 21 “Oh Rhett, me escute, eu devo ter te amado por anos, mas fui uma tola estúpida e não percebi.” Scarlett – E o vento levou Considerando tudo que poderia dar errado, a festa da noite anterior tinha acabado sendo bem interessante. Minha avó não demorou mais que uma hora e, aparentemente, não enfureceu Dominique além do necessário. Ainda me segurou na porta, antes de ir, para dar mais um de seus discursos sobre os cuidados. Ela estava terminantemente convencida que Dominique estava se aproveitando de mim. – Preste atenção na história de vida dessa moça, Gregory! Ela parece o tipo que se apaixona? Tinha alguma verdade em suas palavras e, se não fosse Merryl, revirando os olhos ao seu lado, eu realmente teria deixado as palavras me atingirem. E fora a situação com Eric, tudo mais tinha corrido na mais perfeita tranquilidade. Lynn tinha sido inconveniente em um momento ou dois, mas acho que ela finalmente estava começando a desenvolver uma saudável dose de medo de Dominique, o que estava facilitando as coisas consideravelmente. Hill apareceu, mesmo depois do murro… O que me surpreendeu. Quer dizer, teria surpreendido se eu não o tivesse visto conversando com minha avó. O sacana era um belo alpinista social e não ia dispensar uma festa na minha casa de jeito nenhum. Que tenha feito bom proveito, pois nunca mais seria convidado de novo. Dom ainda estava dormindo, parcialmente coberta, com uma das coxas para fora do edredom. Saí do banheiro secando o cabelo e a ouvi gemer baixinho quando beijei sua coxa antes de sair do quarto. Já tinha, seguramente, passado das três horas da manhã quando fomos dormir. A festa com a vizinhança acabou pouco depois da meia-noite. Alguns vizinhos tinham ficado para ajudar na limpeza, o que eu achei muito gentil. Não sei se Dominique compartilhava meu sentimento, já que passou uma boa meia hora gritando ordens para cada um deles. O curioso é que eles sorriam e obedeciam. Faziam caretas quando ela não estava olhando, mas é claro que Dom sempre percebia. Ela mostrava a língua para eles e continuava como se nada tivesse acontecido. Eles pareciam gostar dela. De um jeito bem peculiar, pareciam ter notado o que eu notei: que debaixo da rígida casca grossa, se escondia uma mulher incrível. Era quase impossível de acreditar. Bom demais para ser verdade… Eu tinha um sorriso no rosto e um calor no coração que não ia embora. Algo em mim sempre soube que ela era uma pessoa boa. Passou boa parte da noite conversando com um senhor de aparência debilitada. Ele não ficou por muito tempo, mas ela fez questão de ir buscá-lo em casa e depois deixá-lo de volta. Fiquei sabendo depois que ele tinha um câncer bem sério. Não teria percebido sozinho que era algo grave: embora ele tivesse uma aparência frágil,


estava sempre sorrindo e pareceu se divertir. Desci as escadas passando a mão nos meus cabelos molhados. Depois que os vizinhos foram embora, eu e Dom começamos a nossa festa privada. Ela não tinha trazido os morangos e outros itens da sua experiência. Mas eu estava tão envolvido de desejo pelo seu corpo que só notei isso quando já estávamos deitados para dormir. Mas tínhamos o domingo todo pela frente e eu não ia estragar aquelas compras especiais. De jeito nenhum. – Vem, garoto! Estava levando Max para o quintal da frente assim que terminei de tomar café quando vi Dom descendo as escadas. – Não me acordou? – Não. – Fiquei um degrau abaixo dela e nossas bocas ficaram na mesma altura. Ela segurou meu rosto com as mãos e eu a beijei. – Estava tão linda dormindo. – Revirou os olhos para mim. – Tão pacífica e pouco agressiva – brinquei. – Mas agora eu acordei e a paz acabou – decidiu. – Para onde meus meninos estão indo? – alisou Max com carinho. – Ia lá fora brincar um pouco com ele. Mas se você quiser companhia para o café, eu espero. – Não. Vai! Me deixa em paz – riu, dando um tapa na minha bunda. Eu estava feliz. Nossa, eu estava muito feliz. Alguns anos atrás eu tinha fugido daquela cidade tentando deixar tanta coisa ruim para trás, apenas para descobrir que elas tinham viajado junto comigo. Não conseguia largar o ressentimento, o ódio, o rancor… Como a cura era impossível, eu simplesmente olhei pra frente e tentei ignorar o passado. Tinha um novo emprego, uma nova casa, novos amigos. Comprei um cachorro e vesti a máscara do “está tudo certo”. Mas no fundo, meu coração machucado continuava a sangrar. Era possível que eu estivesse vendo as coisas de um jeito deturpado já que eu estava insanamente apaixonado por ela agora. Mas olhando para trás, acho que Dominique foi a única pessoa que realmente tinha me ajudado a esquecer. Tudo ao meu redor eram novas tentativas para resolver problemas do passado. Menos ela. Ela era um problema novo. Um que não tinha nada a ver com Baxters, Holts, asilos, declarações de homossexualidade, divórcios ou acidentes. Ela me irritava tanto que, sem querer, era a única coisa que realmente me distraía de todo o resto. Era a vadia insuportável da minha nova vida. E uma vida não é completa sem alguns problemas. Joguei a bola para Max pela terceira vez e ele afundou pelo gramado para recuperá-la. – Com licença? – Virei o rosto sobre o ombro procurando a origem da voz. Era um garoto do outro lado da cerca baixa da minha casa. Um jovem adulto, na verdade. Devia ter acabado de passar dos vinte. Tinha os cabelos escuros e os olhos claros. Estava arrumado e perfumado demais para um domingo de manhã. – Sim. Posso ajudar? – Eu estou procurando uma pessoa. – Ele coçou a nuca constrangido. – Tudo bem – sorri indicando que ele continuasse. – Nossa, cara. Desculpa. Isso vai parecer coisa de gente doida, mas eu juro que não sou um perseguidor nem nada assim. – Não achei que fosse.


– Meu nome é Leo. – Ele ofereceu uma mão e eu a apertei – É que eu conheci essa menina e… Nossa… Não consigo parar de pensar nela. – É? – Eu comecei a rir – Conheço a sensação. – Fiquei com ela e… Nossa… – Ele estava sem graça. – Ela me disse que morava nessa rua, mas não disse a casa. E eu não… Não peguei seu telefone. É meio absurdo eu ter vindo até aqui, eu sei, mas… – Cara… Eu não julgo. Quem é a moça? Pode ser que eu conheça. – O nome dela é Dominique. Dominique Thoen. Meu estômago inteiro se contraiu e eu senti que ia vomitar. Calma, Greg, vocês acabaram de conversar sobre isso: vamos confiar em Dominique. Provavelmente você entendeu errado. Engoli a seco. Não estava gostando do rumo dessa conversa. – Dominique Thoen? – Meu tom tinha ficado consideravelmente menos simpático. Será que era algum maluco que tinha conversado com Dominique no bar? Ele tinha feito o quê? Procurado ela pela internet? Mas como teria achado minha casa? – Tem certeza? – Tenho. Nome diferente, não é? – E vocês ficaram juntos? – Eu precisa ter certeza de que não tinha entendido essa parte errado. – Foi. Nessa última sexta. Deve ter sido uma das melhores noites da minha vida, se é que me entende. – Você não devia ficar falando assim de mulheres, rapaz. Não é educado. – Ah, claro. Eu sei. É só que… Bem, você a conhece? Sabe se ela mora por aqui? Quer dizer… Ela não mora exatamente por aqui. Mora do outro lado do país. Está ficando na casa de um amigo que acabou de se mudar. Sei que ele é advogado, como ela, mas não consigo me lembrar do nome dele. – Gregory Holt? – Minha garganta estava seca. Tinha alguma coisa errada, tinha que ter. – Isso! Você o conhece? Prometa que vai ficar atento. Minha avó só tinha me feito um único pedido. Só um. Eu queria confiar em Dominique mais do que qualquer coisa na vida. Mas e se ela estivesse me enganando? Eu estava apaixonado… Será que eu seria capaz de notar? – Sou eu. Por que não vem comigo? Dominique está tomando café. – Abri a porta e ele pareceu envergonhado. Minha boca estava rígida. Na frente dele, ela não ia ter como mentir. E eu precisava saber a verdade. Não era desconfiança… Eu só estava atento. Ele parou assim que cruzou a porta e eu fui até à cozinha. – Será que você podia vir até aqui um instante? – Claro. O que foi? – Ela me observou, nervosa. Era o meu tom de voz. Tinha certeza de que não estava sendo nem um pouco amigável. E não queria ser: se aquilo fosse só um engano eu pediria desculpas. Mas tinha um homem na minha sala dizendo que tinha ficado com ela há duas noites e que tinha sido a melhor noite da vida dele. Eu merecia uma explicação, não merecia? – Tem um rapaz aqui dizendo que ficou com você há dois dias. – Ah, Holt… – Ela jogou a torrada no prato – Isso de novo? – É sério, Dominique. Tem um cara aqui na minha sala dizendo que ficou com uma advogada chamada Dominique Thoen na última sexta. Disse que foi a melhor noite da vida dele. – o ciúme subia ácido pela minha garganta. Se ela estivesse me enganando… Botava ela para fora da minha casa agora mesmo, e ia tentar juntar os pedaços do meu coração. – Disse que ela mencionou o nome


da rua, mas não o endereço completo. E que não deixou o telefone. Ele parece um bom rapaz… – Minha raiva estava começando a ficar perceptível – Por que uma mulher ficaria com ele e não deixaria o telefone? A não ser que estivesse se escondendo, é claro. Ela me olhou de um jeito magoado e eu precisei me manter firme. Firme e atento. Se ela estivesse me enganando ia fazer o show inteiro. Ia se fazer de ofendida e fingir que nunca tinha visto o cara antes na vida. Precisava colocar os dois na sala juntos para ter certeza. – Tome muito cuidado com suas próximas palavras, Gregory. – Ela se levantou – Não vou te perdoar pela mesma ofensa duas vezes. – Só venha resolver isso, está bem? – gesticulei na direção da sala. – Resolver o quê? – RESOLVER O HOMEM QUE ESTÁ NA MINHA CASA DIZENDO QUE FICOU COM VOCÊ! – Não grite comigo – ela sussurrou e eu fiquei arrepiado. A mulher conseguia me assustar. – Eu não fiquei com ninguém desde que ficamos juntos, está me ouvindo? Ninguém! Quantas vezes eu vou ter que dizer isso antes de você escutar? – Está sendo difícil, Dominique. – Acreditar em mim? Por quê? – Porque… Olha para a sua história! – Ela engoliu a seco e deu um passo para trás – Você sempre foi cruel e impiedosa. Sempre. Me torturar e me enganar por vingança parece bem plausível com as suas atitudes. – Eu sentia uma queimação horrível no coração. Eu tinha me permitido amá-la. Se ela só estivesse me enganando ia doer como nada nunca tinha doído na vida. – Aí você liga para um médico que viu uma vez e o convida para sair com vocês! – Você já sabe o que aconteceu naquele dia! – E se você tiver a vizinha como desculpa? E tem toda essa história de dar em cima do Eric que… – Holt! Não ouse usar isso contra mim! – E agora esse cara! – Apontei o polegar na direção da sala. – São muitas coincidências, Dominique. Muitas. – Eu não fiquei com ninguém, Holt. – Tinha um toque de nojo na sua voz. Como se a mera acusação a enojasse, e eu me senti horrível. Mas precisava me proteger. Meu coração estava nas mãos dela. Precisava ter o mínimo de cuidado. – Tudo bem. Então, vem até aqui e diz isso pra ele. Ela passou a língua no lábio em fúria e suspirou. – Tudo bem. Passou por mim me empurrando com o ombro e cruzou a sala. – Bom dia. – Arregalou os olhos para Leo. – Bom dia… – Ele olhava dela para mim e de volta, como se esperasse que um de nós dois explicasse bem pausadamente o que estava acontecendo. Ele nunca a tinha visto na vida. Eu não sabia se ficava aliviado ou em pânico. Meu coração estava dando piruetas e gritando que sabia que ela me amava, mas meu cérebro estava me mantendo plenamente ciente da mulher furiosa ao meu lado. – Você disse que me conhece? – Ahh… – Ele abriu a boca e a manteve assim, sem saber quais palavras usar. – FALA, criança! – rosnou. – Você disse que me conhece? – Não. Eu não disse. Olha… Deve ter sido algum engano. Eu preciso achar a Dom e… – Precisa achar quem?


– Eu só vim até aqui procurando Dominique Thoen. Você a conhece? Olha, eu não quero causar problemas. Ela deu dois passos em sua direção e ele se encolheu com um óbvio medo de apanhar. Era um medo compreensível dada a real probabilidade de ele, de fato, apanhar. – Parece o tipo de homem que eu levaria para cama? – Ela apontou para a figura miúda e encolhida. É… Era um bom ponto. – Espere aqui. – Ela sussurrou e eu o vi congelar onde estava. Ele não se moveria nem se uma chuva de meteoros atingisse a casa. – Dom… – Chamei, tímido. – VOCÊ FICA AQUI TAMBÉM! Não me mexi. O que eu estava fazendo? Era possível que só uma porcaria de frase da minha avó me fizesse questionar tudo. Eu sabia como me sentia por Dom e era um risco, claro… É sempre um risco. Mas Eleanor tinha colocado uma dúvida na minha cabeça e, se juntasse isso ao medo louco que tinha de perder aquela mulher incrível que eu tinha acabado de descobrir… Acho que qualquer coisa bastava para disparar uma incontrolável crise de ciúmes. Ela ia gritar um bocado comigo. E tinha o direito. Mas, poxa… O que eu podia fazer? O cara apareceu dizendo aquilo, não foi? Eu queria, pelo menos, uma explicação. Dominique voltou trazendo Andy arrastada pelo braço mais uma vez. – Dominique! – Leo respirou aliviado. – Leo! – ela sorriu. – O que… Ahm… O que está fazendo aqui? – Ele está procurando Dominique Thoen. – Dominique estava soltando rosnados para todos os lados e Andy virou-se para ela com uma boca aberta de desculpas. – A mulher com quem ele ficou na sexta. Andy olhou para mim, nervosa. – Ai meu deus… – sussurrou. – Você não devia ter vindo – falou para ele. – Andrea! Você deu meu nome para esse rapaz? – Ela estava de volta em uma sala de audiência, inquirindo uma testemunha. Se Andy queria elaborar alguma verdade para contar na frente do namorado, era bom ela pensar rápido. Dom não ia lhe dar muito tempo. – DEU? – Dei. Leo… A gente precisa conversar. Eu acho que te disse umas coisas que… – Andrea? – Ele olhou ao redor repetindo o nome que Dominique tinha dito. – Você me deu uma nome falso? – Sua boca se contorceu em uma careta irritada. – Foi ideia dela! – apontou para Dom. – Foi o quê, menina? – Foi! Você disse que eu devia fingir ser você! – Disse que você devia pensar no que eu faria ou no que eu diria para ficar mais à vontade com o cara! Não pra dar meu CPF! Ficou louca? – Eu sinto muito, Leo. Sr. Holt. – Ela se virou para mim, seus olhos tinham um misto de pânico e educação. – Sinto muito, eu só… Eu era praticamente virgem… Não tinha quase nenhuma experiência e… – murmurou de um jeito quase inaudível – A Dominique é minha amiga e ela é sempre tão segura que eu… – Olha, chega, está bem? Você! – Dominique apontou para Leo. – Vai com ela ouvir toda a sua


explicação. Ela é uma boa menina e isso tudo foi um mal-entendido. Leo estava olhando ao redor assustado. Achei que deveria ajudar Andy também, afinal, eu também tinha minha parcela de culpa. – Pelo que você falou sobre a noite que passaram juntos, acho que ela merece pelo menos alguns minutos do seu tempo. Ele sorriu constrangido e pediu desculpas antes de sair. – Dom… – Andei até ela e tentei puxá-la pelo braço. – Não me toque. Ela marchou de volta para a cozinha e começou a jogar a louça suja na pia de qualquer jeito. – Dom, o que você queria que eu fizesse? O cara sabia seu nome e sobrenome. Sabia sua profissão e que você estava ficando com um amigo. Ele sabia informações demais… O que você queria que eu pensasse? – Queria que pensasse no que eu te disse, Holt! Que pensasse em como eu me sinto, no que sinto por você. Que pensasse que eu tenho meus motivos para ser ambiciosa, mas que isso não faz de mim uma vagabunda inescrupulosa. – Não achei isso. – Não? Não achou? E por que mais acharia que eu seria capaz de te trair com aquele moleque? – Ela apoiou os braços na pia e me ignorou com o olhar. – Você está certa – gesticulei. – É so que… Eu fico com medo de descobrir que isso entre a gente não é verdade. É quase bom demais, sabe? – eu sorri sem querer, me aproximei e coloquei os braços pela sua cintura daquele jeito que eu já tinha notado que ela gostava. Mas dessa vez algo diferente aconteceu. Tinha uma sensação estranha no ar, e eu não estava conseguindo determinar o que era exatamente. Ela se desvencilhou do meu abraço de um jeito tímido que não combinava com ela. Seus olhos estavam no chão e ela evitava me encarar a qualquer custo. O que estava acontecendo? – Me solta, por favor. – Ela ainda tinha os olhos no chão. – Dom? – Minha voz mal saiu. Puxei ela para mim e segurei seu rosto nas mãos. – Você está chorando? – Não. Eu não choro. – Ela estava se contorcendo. – Vem aqui. – Segurei seu corpo com força em um abraço apertado e a forcei a olhar para mim. Ela levantou o rosto com sua típica irritação. Seus olhos eram fortes e decididos. Mesmo através das lágrimas que se acumulavam na pálpebra inferior antes de cair rolando pela face. – Estava lacrimejando. Mas já parei. Acabou? Pode me soltar? – Ela estava se mexendo de novo. Meu corpo inteiro doeu. Ver aquelas lágrimas era como se alguém estivesse enfiando espinhos nos meus olhos. Meu peito inteiro se espremeu e tudo o que eu queria era limpar seus olhos e seu rosto e abraçá-la até espantar seja lá o que fosse que a estava deixando triste. Mas ela não parou de me empurrar e eu a deixei livre. – O que foi que houve? – Nada. Não houve nada. Olha, dá pra você ir esperar lá fora? Vou arrumar a cozinha e aqui dentro você só vai me atrapalhar. – Ela começou a andar de um lado para o outro fingindo estar muito mais ocupada do que realmente estava. – Dom… Essa coisa com o moleque… Eu não queria… – É. Eu sei. Está perdoado. – Não havia muita firmeza em suas palavras – Então me diz o que houve. Por que está chorando?


– Você está surdo? – rosnou. – Disse que não foi nada. Sai daqui. Por favor. Tinha algo estranho na sua voz. Algo choroso, magoado… – Por favor, me diz o que houve. – O tom baixo e desesperado de súplica escapou dos meus lábios. – Nada… – Tinha bem menos convicção dessa vez. – Dom, por favor. – Eu me aproximei mais uma vez e tirei o prato que ela mantinha nas mãos como desculpa para não prestar atenção em mim. – Fala comigo. – Ah, que inferno. – Colocou a mão contra a testa e parecia mais cansada do que irritada. – Fala, Dom – sussurrei. – Nada. – O que foi? Dom? – Ah, merda! Entre você não acreditar no que eu digo e achar que eu sou algum tipo de puta promíscua e a sua avó vir me dizer com todas as palavras que eu sou uma oportunista antiética porque meu pai era um zelador e minha mãe uma vagabunda, eu estou tendo um fim de semana bem ruim. E você! Você! – Ela me deu um tapa no tórax e eu senti que ela estava magoada. Não era raiva, sedução ou provocação. Ela estava realmente triste. – Você tinha que ficar lá rindo e se derretendo para a sua ex. Sabe o que mais, Baxter? – Respirei fundo. – Se eu quisesse ter ficado com aquele médico, tinha ficado com aquele médico. – Ela estava respirando de um jeito estranho e eu imaginei que a qualquer momento ela pudesse voltar a chorar. – Tinha ficado com metade dos homens daquele bar. E se eu quisesse, ao mesmo tempo! Mas, ao contrário do que você, sua família e todo mundo do escritório pensa, eu sou uma pessoa decente. Eu cuido de mim em primeiro lugar? Sim, claro. Olhe ao meu redor, Holt! Quem é que vai cuidar de mim se eu não fizer isso? Mas transar com um homem casado ou ficar com você por dinheiro, eu… Ela estava mordendo os lábios e as lágrimas começaram a cair. Ela nem se preocupou em escondê-las. – Eu lutei a minha vida INTEIRA. Por tudo. Absolutamente tudo. Cada centavo que eu tenho, cada fio de roupa, cada grama de conhecimento, cada linha em cada processo. Tudo. Eu conquistei tudo o que eu tenho sozinha. – Eu não sabia se devia me aproximar ou não. Ela não estava mais chorando de tristeza. Estava chorando de fúria. Mas lágrimas eram lágrimas, e eu nunca tive estômago para ver uma mulher chorar. E quando a mulher que chorava era Dominique, eu estava descobrindo bem rápido que preferia morrer a vê-la sofrer por mais um segundo. – Mas as pessoas não se importam com isso. Elas só querem saber se você é simpática, se as convida para sua casa. E aí elas gostam de você e acham que você é o máximo. Eu não tinha uma casa para convidar meus amigos. Aliás! Fiz isso uma única vez. Passei um tempo sem dormir direito na semana da véspera da prova para a bolsa. Passei em primeiro lugar e entrei para aquela escola maldita como bolsista. Eu era inocente e achava que só aquilo bastava: que se eu mostrasse que era boa o suficiente as pessoas iam gostar de mim e me aceitar. Mas como eu estava enganada! As três amigas que eu convidei para conhecer a minha casa em um fim de semana passaram o resto da eternidade explicando em ricos detalhes como tinham pegado micose na minha casa imunda da filha de lavador de banheiros. Sabe o que eu fiz? Mandei todas elas se foderem. Me formei naquela merda em primeiro lugar. Todas as melhores notas. Eu conquistava o que eu queria e não precisava do aval de ninguém. Nunca. E eu posso nunca ter sido admirada na minha vida por mais nada, mas isso era uma coisa que as pessoas sabiam que eu era: uma mulher que consegue se virar sozinha. Não tem nada a ver com ética. Ou com moral. Eu fui ambiciosa a minha vida inteira porque eu não conhecia mais nada. Minha ambição era tudo que eu tinha. Mas aí, de repente, eu vi isso se transformar em uma coisa ruim. Dominique, a vadia megera


que só pensa em si mesma. E aí sabe o que eu fiz? Mandei todo mundo se foder de novo. Fiquei incrivelmente boa nisso. – Dom… Eu não estou dizendo que você é assim. Me enganei sobre você por muito tempo. Mas também, no fundo, sempre soube que você era uma pessoa boa ou não estaríamos aqui. – Não, Holt. O que você acha é que eu sou uma mulher que diria que gosta de você e sairia na sexta-feira para transar com outro cara. É isso que você acha. – Dom, não faz isso. Não foi assim. – Então, me diz como foi? E sua avó! – Ela espremeu a mão contra a testa. – Ah! Aquele mulher me enlouquece. Ela age como se tudo que eu conquistei na minha vida não valesse nada. E por quê? Porque eu tive que lutar. Porque não recebi tudo de graça no dia em que eu nasci. É sério isso? Se eu tivesse nascido com tudo e não tivesse que ter me esforçado eu valeria mais do que eu valho? – Eu não estou dizendo isso. – Não disse que estava. É o que ela diz. Que eu sou errada pra você porque meus pais não tinham o que os seus tinham. O que isso tem a ver? – Não tem nada a ver. – Não tem nada a ver! – repetiu. -– Eu não aguento isso. Essa… essa provação. A única pessoa para quem eu preciso provar alguma coisa é para mim mesma! E aí vem você e a sua avó maldita e agem como se eu precisasse provar minha índole a cada minuto. Se era isso que você queria que eu fizesse quando sugeriu que a gente tentasse, acho que é um contrato que eu não quero assinar. – Dom, eu sinto muito por hoje. Não foi minha intenção. Mas você tem que entender as circunstâncias. Não pode analisar tudo fora de contexto. – Fora de contexto? Ah, vai se foder você também, Holt. – Fora de contexto! – repeti. – Não é simples, Dominique! A gente se conhece há muito tempo, mas somos novos nisso. – Indiquei nós dois. – Você não pode analisar cada atitude minha como mais uma ação isolada de desconfiança. Isso tudo é novidade para nós dois. Não pode esperar que eu não cometa nenhum erro. Se formos ficar juntos, eu ainda vou cometer vários. E você também vai. É assim que a gente vai se conhecer e criar confiança. Erros podem fortalecer o relacionamento, se a gente lidar com eles do jeito certo. – É fácil falar quando não é você quem está sendo copiosamente julgado. – Quem é que está te julgando? Eu só quis que você esclarecesse o mal-entendido! Só isso. Fiquei preocupado e com ciúmes? Óbvio! Se a situação tivesse sido ao contrário você teria arrancado minha espinha. Ela puxou o ar em antecipação ao monólogo monstruoso que se seguiria, mas engasgou com as palavras. Soltou os braços cruzados na frente do corpo e colocou uma das mãos na testa, escondendo os próprios olhos. O modo como seu peito soluçou serviu como uma clara indicação do que estava acontecendo. Ah, droga… Eu não ia conseguir vê-la chorar e continuar argumentando. Venci a distância que nos separava e a coloquei nos meus braços. Dom estava chorando escondida atrás da própria mão e fazia o impossível para chorar em silêncio. – Amor, por favor, não chora. Desculpa! É sério: por favor, me desculpa. Eu só estava roxo de ciúmes e fui um imbecil! – Seu corpo se movia seguindo os soluços silenciosos e eu conseguia sentir sua dor furando minha carne. Eu daria um braço para que ela parasse. Arrancaria ele fora no mesmo instante se isso parasse sua dor. – Sei que não é justificativa, mas foi isso o que aconteceu. Me perdoa. Suas fungadas ficaram irregulares quando ela respirou fundo.


– Eu achei que era ela. – As palavras saíram soluçadas e quase incompreensíveis. – O quê? – Achei que era ela – repetiu, tentando acalmar o choro. – Linda, você não está fazendo sentido. – Passei meu polegar na maçã do seu rosto limpando as lágrimas. Não resisti e lhe dei um beijo suave na bochecha. Ela tinha passado uma vida inteira sozinha e tinha se acostumado a isso. E agora estava começando a se acostumar a não ficar sozinha, apenas para que eu ficasse brincando com seu coração desse jeito. Estava me sentindo um traste inútil. – Você disse que tinha um homem aí dizendo que tinha ficado comigo. Eu sabia que isso era impossível. Então eu pensei que tivesse sido ela. Pensei que tivesse sido sua avó. – Falar estava acalmando seu choro, mas eu ainda conseguia senti-la transbordando de nervosismo nos meus braços. – Pensei que ela tivesse contratado um ator ou… Sei lá… – Ela apoiou a testa no meu ombro, mas ainda estava se abraçando de um jeito que não permitia que eu a confortasse completamente. – Ele ia saber tudo a meu respeito e ia dizer que tinha ficado comigo. – Dom, mas não foi… – Eu tive que sorrir. – Foi só um mal-entendido. – Ainda bem… – choramingou. Havia uma dor imensurável na sua voz que fez meu coração implodir. – Porque se fosse isso… Se tivesse sido um plano da sua avó e não um mal-entendido com Andy… Você teria acreditado. Sua tristeza me atingiu como um arpão e eu ouvi verdade nas suas palavras. Ela estava certa: nosso relacionamento ainda era incrivelmente jovem e eu ainda não tinha aprendido a confiar nela. Uma pequena provação dessas teria destruído tudo. – A gente só precisa de tempo, Dom. Um tempo para aprender a confiar um no outro. – Não consigo, Holt. – Ela tinha parado de chorar, mas ainda trazia um sentimento horrível em cada respiração. – Você não entende… Eu fico bem sozinha. Aí você aparece e me entope de gentileza e eu penso “Poxa… E se for possível?”, e depois você mesmo vem e destrói tudo. Não suporto essa sensação de não saber. Foi tão ruim… – Ela levantou o rosto e eu vi seus olhos magoados e exaustos. Vê-la com aquela expressão de derrota consumiu minha alma, e eu quis me espancar pelo que eu estava fazendo com ela. – Quando eu percebi que não ia ter amigos, quando minha mãe foi embora, quando meu pai morreu… Sempre que eu me abria um pouco, eu acabava sozinha e doía tanto – disse a última palavra com uma intensidade imensa. – E com você… Eu não sei se consigo aguentar. Não sei se quero. Não quero mais. Não quero. Não aguento mais. Segurei seu rosto em minhas mãos e beijei sua boca. Senti o gosto salgado das lágrimas nos seus lábios. Ela puxou o queixo me interrompendo cedo demais, mas eu mantive minha testa colada na sua. – Eu te amo – sussurrei. – Pare, Holt. – Ela estava me empurrando. – Eu te amo – repeti mais alto, tentando mantê-la nos meus braços. – Como? Você ficou louco? Estamos juntos nesse experimento insano há poucos dias. Você sequer confia em mim e está dizendo que me ama? Ou perdeu o juízo ou acha que eu sou idiota. – Não estou dizendo que sempre te amei. Nem estou dizendo que vou te amar para sempre. Disse que te amo agora. – Ela respirou fundo e me observou. Seus olhos começavam a brilhar com vida mais uma vez, e eu senti um alívio se espalhando pelo meu peito. – Não me entenda mal: eu quero te amar para sempre. Mas o que eu quero dizer é que agora, nesse exato segundo, eu sinto por você algo forte que eu nunca senti na minha vida. Por nada, nem por ninguém. Não é mais só paixão e eu tenho certeza.


– Você não pode… – Será que você pode calar a boca? – Ela estava se contorcendo para escapar do meu abraço e foi minha vez de interrompê-la. – Já te ouvi um bocado. É minha vez de falar. – Ouvi sua expiração resignada. – Eu te amo – repeti e ela levantou os olhos para os meus. – Ou, pelo menos, eu acredito com algum nível de certeza de que é amor. – Umedeci os lábios procurando as palavras certas. As palavras que fizessem ela entender e acreditar. – É uma coisa que cresce. A cada dia eu descubro algo novo sobre você e eu sempre adoro cada nova descoberta. Eu te amo mais agora do que há alguns dias quando percebi que isso era mais forte que uma paixão simples e boba. Se isso – disse apontando com o indicador para o meu peito, para o meu coração –, se isso continuar crescendo desse jeito… Acredite: daqui a pouco tempo vou te amar de um jeito inquestionável. Eu sei que faz pouco tempo! Eu sei. Mas tem que ser diferente, não é? Quero dizer, algumas pessoas podem levar anos para perceber, outras meses. – E outras dias? – Uma pessoa que ama a outra há anos teve que começar em algum lugar, não foi? Em algum momento a amou só há alguns dias. – Não é isso que eu estou dizendo. – Mas é isso que eu estou dizendo. Daqui a muitos e muitos anos, eu e você vamos estar casados, com filho e netos. Teremos envelhecido juntos e estaremos morando em um asilo. Vamos ter tido uma vida inteira de provações, brigas, mal-entendidos e raivas. Mas também de companheirismo, amizade, confiança e respeito. E eu vou olhar para trás, para o meu eu jovem de hoje e vou pensar “Ah, aquele moleque estúpido não fazia a menor ideia do que era amor. Não fazia a menor ideia do quanto ele ainda ia amar aquela mulher”. Você pode achar que é loucura. Pode achar impossível e ridículo. Pode questionar se quiser. Mas essa é minha realidade, hoje. Eu te amo. E pronto. Meus dedos estavam entrelaçados em suas costas quando ela apoiou as mãos no meu peito. Encarou as próprias unhas durante uma fração de segundo. Aquela timidez curiosa tinha voltado e, mesmo que não fosse um comportamento típico de Dom, ela ficava linda com aquele jeito discreto. Mas quando é que ela não ficava linda? – Por que a gente vai estar morando em um asilo? – perguntou finalmente, com o princípio de um sorriso no rosto. – Porque nossos filhos não vão te suportar, não é óbvio? – belisquei sua cintura e ela riu. – Vão te despachar para lá assim que puderem. E eu vou te seguir porque não consigo viver sem você.

Subi as escadas com os meus dedos presos nos de Holt. Ele me guiou do seu jeito carinhoso e tranquilo. Ele me amava? Então não era absurdo e desesperado eu amá-lo de volta? “Se a situação tivesse sido ao contrário você teria arrancado minha espinha.” Ele estava certo. Só de vê-lo falando com a ex eu já estava na iminência de um frenesi furioso. Se uma mulher tivesse aparecido dizendo que tinha passado a noite com ele… No mínimo, eu ia querer uma explicação. No mínimo. O meu verdadeiro problema tinha nome e sobrenome: Eleanor Baxter. Desde que ela tinha aparecido eu estava insegura. E insegurança era uma coisa incompatível com cada fibra do meu ser. Meu corpo estava recusando esse sentimento como se fosse um corpo estranho e inimigo no meu


coração, e o resultado tinha sido uma quebra na minha confiança e muitas lágrimas. Aquela mulher desalmada mexia comigo. Todos que eu conhecia podiam me achar uma antipática nojenta, mas ninguém questionava o meu valor. Há muitos e muitos anos eu não ouvia qualquer questionamento a respeito das minhas capacidades. Eu odiava a ideia de que ela podia fazer Greg duvidar de mim. Mas não podia odiá-lo por ceder quando até eu estava começando a duvidar de mim mesma. A velha tinha uma lábia digna do diabo. Eu só precisava separar as coisas e deixá-la no seu lugar: bem longe do meu relacionamento. Foi só um engano. Andy ficou com medo e fingiu que era eu. Era até fofo quando eu parava para pensar. Fofo de um jeito bem estranho, é claro. Mas na sua busca por confiança, ela tinha encontrado a minha imagem. De certo modo, eu me sentia honrada. Holt estava me guiando para o quarto. Eu entendia o que ele queria porque era o mesmo que eu precisava. A situação inteira transpirava uma necessidade infinita de nos enfiarmos no corpo um do outro e ficarmos lá até a mágoa sumir. E ela sumiria, com certeza. Estanquei quando faltavam apenas dois degraus. – O que foi? – Greg me observou nervoso. Acho que ele estava com medo que eu voltasse a chorar ou dissesse que não queria mais aquilo e fosse embora. Mordi a ponta do meu polegar e lhe ofereci um sorriso safado que imediatamente o tranquilizou. – O que foi? – repetiu, com um tom muito mais descarado. – Esqueci minhas compras lá embaixo. Me espera no quarto enquanto eu vou buscar? Seu sorriso aumentou e eu podia contar seus dentes brancos e perfeitos. – Sem dúvida.

Melei a mão no iogurte e desenhei ondas de chocolate pelo seu peito. Seus olhos mal permaneciam abertos enquanto longos e suaves suspiros de desejos escapavam pelos seus lábios. Greg enfiou as mãos nos meus cabelos e eu desci a língua até seus mamilos. Usei os dentes para provocá-lo antes de levar a língua até o doce sobre sua pele e limpá-lo com lambidas curtas e demoradas. O gosto do chocolate provado direto do seu corpo despertou o meu paladar enquanto eu descia as mãos pelo seu quadril enfiando meus dedos no topo da sua cueca para empurrá-la para fora do caminho. Era a primeira vez em que ele ficava completamente nu enquanto eu ainda estava completamente vestida. Ele movia os dedos no meu cabelo em padrões circulares, fazendo um cafuné calmo. – É melhor tirar a roupa ou vai sujá-la. – Já, já. – Derrubei mais iogurte sobre seu peito, dessa vez direto do pote, e vi seus músculos se contraírem de frio. A camada grossa se espalhava devagar pelo seu tórax. Então me estiquei para a bandeja de morangos na cabeceira. Umedeci os lábios antes de morder só a pontinha da fruta. Deixei que ele apreciasse a vagareza do movimento e senti uma típica rigidez contra minha perna. – Vira aqui pra mim – pediu, baixinho. – Morde esse morango de novo para eu ver. Eu sorri com tesão nos olhos e repeti a mordida, ainda mais provocante. Ele se inclinou para sentar e o iogurte escorreu, mas ele não pareceu se importar. Me beijou por cima do morango que eu tinha delicadamente colocado na sua boca, antes de morder um pedaço direto dos seus lábios. Ele fechou os olhos e gemeu, mastigando.


Peguei mais um morango e o lambuzei no chocolate do seu corpo. Greg se deitou mais uma vez colocando as mãos entrelaçadas atrás da cabeça, e eu pude ver aqueles músculos deliciosos dos seus braços se desenharem ao alcance das minhas mãos… Ao alcance da minha língua… Eu queria morder aqueles bíceps. E foi exatamente isso que fiz. Não precisei de chocolate ou morango, ele era delicioso assim também: puro. Só Greg. Coloquei um pedaço do bíceps rígido entre os meus dentes e apertei sensualmente. Desci a língua pela extensão do seu músculo e o beijei e lambi. – Não vai querer chocolate? – riu. – E precisa? – Passei mais um morango na sua barriga e limpei um pedaço do iogurte revelando o tanquinho que me esperava logo abaixo. – Você é gostoso de todo jeito. – Mesmo assim, sem nada? – brincou. – Especialmente sem nada. – Passei chocolate nos meus lábios e o trouxe em minha direção. Ele chupou minha boca com fome. – Quero mais morango – pediu. Peguei na bandeja e coloquei ao alcance da sua mordida, mas ele se virou. – Não quero na minha boca. Quero na sua. – Coloquei a fruta presa entre os meus dentes e me inclinei. Sua mão forte me segurou pela nuca enquanto ele mordia a fruta e o meu lábio indistintamente. Terminei de lamber o chocolate do seu corpo. Limpando cada gominho do seu tanquinho com uma lambida orgásmica. O limpei com saliva dos mamilos até o umbigo, e Greg se contorcia de prazer sob minha língua enquanto gemia elogios. – Ai… Linda… Tirei os últimos resquícios de chocolate do seu tórax com meus dedos e os lambi. Seus olhos brilharam e eu toquei seu pau apenas para senti-lo latejar com aquele desespero maravilhoso. Ele realmente amava quando eu enfiava os dedos na boca. Antes era sem querer… Agora, eu fazia isso sempre, e de propósito. – Essa tua barriguinha é gostosa demais. Só percebi agora como comida fora dela não tem gosto. – Fiz um beicinho e ele levantou da cama com voracidade. – Estou com fome – sussurrou contra minha boca. Eu achei que ele ia me beijar. – Minha vez – decidiu, e eu o senti se afastar, rápido demais, antes de me segurar pela coxa e me jogar deitada na cama. Tirou minha roupa sem cerimônia e me deixou nua. – Assim… – sorriu. – Do jeito que eu gosto. Nua, na minha cama e… – ofegou enquanto descia a mão entre as minhas coxas – … molhada. – Vai me comer, agora? – perguntei sonsamente. – Ah, querida… Você não faz nem ideia. O toque frio do iogurte fez com que eu me arrepiasse. Esfreguei uma coxa na outra, tentando causar fricção no meu clitóris, mas Holt segurou um dos meus joelhos e abriu minhas pernas. – A minha putinha tá com tesão, é? – Morrendo – choraminguei. – Pois vai continuar morrendo. Nada de desperdiçar essa vontade toda só esfregando as pernas. Você vai esfregar essa bocetinha, já, já. – Desceu a boca para o meu corpo melado. – Mas vai ser em outra coisa. Holt tomou meus seios e eu coloquei uma mão de cada lado da cabeça empurrando o colchão e jogando meu corpo contra ele. O desejo que eu sentia por aquele homem era uma coisa incontrolável. – Não faz assim! Tá me deixando louca aqui. – Tentei puxar minhas coxas para voltar a espremêlas uma contra a outra, mas ele ainda mantinha meu joelho firme em sua mão. – Me come, vai… Greg lambeu longamente o chocolate em um dos meus seios e depois no outro.


– Estou comendo – riu. – Holt! – Eu não sabia se estava falando ou gemendo o nome dele. – É sério! – Minha voz saía encharcada de luxúria – Ou mete agora ou, quando você quiser enfiar, eu não vou deixar! – Não vai, é? Soltou meu joelho e se enfiou entre as minhas pernas. Raspou a ponta da sua ereção na entrada da minha boceta e ficou subindo e descendo até o meu clitóris em uma provocação insuportável. Eu gritei com força. Puta que pariu! Eu queria mais. Queria aquele pau em mim, duro e feroz. Mas ver o nível enlouquecedor do meu tesão estava apenas divertindo um Holt, que ainda tinha fôlego para mais algumas horas de preliminares. Movi meu quadril em sua direção e ele escapou. – Não quero – rosnou autoritário. – Não quero te foder agora. Quero só isso aqui. – Chupou mais um pouco de chocolate antes de se inclinar e segurar o pau pela base. Aproximou a ponta de mim mais uma vez e se pôs a acariciar meu clitóris com sua rigidez. Primeiro, eram só cosquinhas deliciosas, mas a intensidade foi aumentando e logo ele estava se esfregando contra minha virilha e eu estava gemendo como uma vadia no cio. – Ai… Dom… Se continuar gemendo assim vou gozar na tua barriga. – Greg! – gemi. – Não para. Vai, lindo. Por favor. Come tua putinha, come. Me come agora. – Apertei minhas coxas ao seu redor, tentando trazê-lo para mim. Mas ele ainda não ia fazer aquilo. – Pede mais um pouquinho, Dom, implora pra mim. Me diz se esse iogurte matou a sua fome. Eu estava gritando que não e ele colocou um morango na minha boca apenas para tirá-lo da minha língua com a sua. Seu pau continuava escapando sem nunca parar de estimular meu clitóris. – Sabe o que eu queria? Um pouco do seu líquido para lavar a refeição. – Aaahh… – Eu não conseguia parar de gemer e de me contorcer. – Puta que pariu, Greg! Me fode. – Se eu te botar na boca você jura que não goza? Porque eu quero te ouvir gozar no meu ouvido e com o meu pau dentro de você. Não gozar se ele me chupasse? Eu não sei como ainda não tinha gozado só com a surra que a ponta do seu pau estava dando no meu clitóris. Eu queria dizer que jurava só pra ele me chupar e eu gozar de uma vez. Mas eu não estava conseguindo mentir e do jeito que meu corpo gritava desesperado buscando o alívio, eu tive certeza de que ele não acreditaria mesmo se eu mentisse. – Acho que não, não é? – ele sorriu e me beijou. Seu corpo estava sobre o meu, nós dois melecados de doce e suados de desejo. Sua boca tinha um gosto melhor do que qualquer coisa e eu vi o suor escorrendo pelo seu corpo. Aquela delícia de peitoral perfeito… Era um suor que pedia língua e eu o mordi e lambi. Suas mãos empurraram minhas coxas com força e eu as abri. Vi o morango na mão que Holt desceu para a minha virilha antes que ele o esfregasse em mim, molhada. Depois o trouxe para a própria boca e o comeu. Movi meu quadril em desespero. Eu precisava de um orgasmo naquele exato momento, ou ia começar a convulsionar. Greg enfiou o nariz na curva do meu pescoço e me lambeu do ombro até a orelha. – Esse teu suor de tesão é mais gostoso do que chocolate. Ele colocou força suficiente no quadril para me rasgar com a ereção, mas eu estava tão fodasticamente molhada que o pau duro escorregou até quase a parede do meu útero. Ou pelo menos, era essa a sensação.


Enfiei minhas unhas na carne das suas costas e tive certeza de que, quando o sexo acabasse, aquilo ia doer como o inferno. Mas ele nem sequer hesitou e continuou a me foder. Minha boca se abria sozinha e eu sentia o orgasmo se formando entre minha virilha e meu umbigo. Poderia ter ficado com vergonha dos meus urros animalescos se eles não se comparassem aos de Holt em número e intensidade. Ele me fodia forte e gostoso, e mesmo estando seguramente dentro de casa, vi estrelas. Gozei e gozei e gozei e gozei antes de ouvi-lo gritar meu nome e com uma última rasgada derramar seu líquido quente dentro de mim.

Eu estava em uma missão de beijar cada centímetro do seu corpo. Ela ficou deitada, sorrindo com o polegar entre os dentes. – Te amo – disse depois de um dos meus zilhões de beijos. – Te amo. – Mais um beijo – Te amo. – Eu adorava repetir aquilo. Era gostoso como ficava formigando na minha boca, anestesiava qualquer dor, qualquer preocupação. Dom puxou o cabelo molhado para o lado e eu beijei sua boca. – Acabou? – sorriu. – De te beijar todinha? Acabei. Mas acho que vou começar de novo. – Puxei sua mão e comecei a beijar cada um seus dedos enquanto ela ria e me empurrava. Abracei seu corpo ainda úmido do banho, apoiei minha testa na dela e fechei os olhos. Senti seu toque delicado nos meus lábios e beijei seu dedo sem abrir os olhos. – Eu tenho que sair – sussurrou. – Não – decidi. – É sério. Tenho que ver se está tudo certo para hoje à noite. – O problema da Shelbi? – Abri os olhos e ela me beijou. – Isso. – Ela precisa de mais alguma coisa? Fora essas fotos dele com a Madeleine? – Não. Só bons advogados – sorriu. – Isso a gente providencia. – Apertei o abraço – Precisa ir agora? Dom alisou meu ombro e me observou como se estivesse travando uma épica batalha interna. – Não. Na verdade, acho que posso ligar e pedir para Andy resolver e passar o dia aqui na cama com você. – Aquele sorriso tímido deslumbrante tinha voltado. – ADOREI esse plano. – Ela riu alto. – Vamos fazer isso. – Será que a gente consegue adestrar o Max para ele fazer o almoço? – Acho que sim – respondi resoluto só para continuar ouvindo aquele riso que fazia qualquer estresse valer a pena. Qualquer problema, qualquer irritação… Era só ouvir aquela risada e eu estava bem. Eu amava Dominique e tinha cada vez mais certeza disso. – Você ficou bem íntima da vizinhança, não foi? – Culpa sua. – Eu comecei a rir – Agora, tenho que me preocupar com todo mundo. – Foi legal o modo como você ajudou a Andrea. – É… E vê como ela me retribui – sorriu. – Mas acabou dando tudo certo. – Beijei a ponta do seu nariz. – E ela parece ter se dado bem com o filho da outra vizinha.


– O Calvin? – É. Notei que eles passaram a noite toda juntos. – Ela tem uma queda por ele. Mas não vai dar certo. – Ele tem cara de ser descarado. – Pois é. E Andy vai acabar casando com Rick – sorriu. – Nenhum dos dois faz a menor ideia ainda. Mas eles combinam demais. Se completam, sabe? O que ela tem de nervosa, estressada e briguenta ele tem de calmo e racional. Daria certo. – Tipo a gente? – brinquei. Ela ficou estranhamente silenciosa por alguns segundos antes de dizer: – Greg? – Hmm? – Eu sei que eu não disse… nada. Eu sabia o que ela queria dizer. Queria dizer que não tinha dito que me amava também. – Não é que eu não sinta – continuou –, mas é só… Acho que não estou pronta, sabe? Para dizer. – Tudo bem. – Apertei seu sorriso no meu em um beijo gostoso – Não precisa dizer nada. Eu só disse o que eu queria dizer. – Eu só não quero que você pense que… – Não estou pensando em nada. Prometo. Para ela era vulnerabilidade demais em apenas uma semana, e eu entendia. Preferia que ela dissesse quando estivesse pronta. Que fosse natural e espontâneo. E não forçado porque ela achava que me devia algo. – Tudo bem. Desde que você entenda que eu… Eu também me sinto… assim. Mas acho que ainda é cedo. – Eu entendo. – Esfreguei minha testa na sua em um movimento brincalhão – Juro que entendo. – Só preciso de um tempo. – E você tem todo o tempo que quiser – dei de ombros com ela nos meus braços. – Eu não vou a lugar algum. O meu celular tocou estridente em cima do criado-mudo arrancando nós dois de nosso paraíso particular. – Holt. – Atendi. – Gregory? É Devon. Olha, tivemos um problema no caso da Borgouis. O prazo é amanhã, Andrew está chamando todo mundo de volta para o escritório. Precisamos fazer um milagre. – Ahmm… certo. Tudo bem. Estou chegando. Desliguei o telefone e olhei para Dom. Ela me observava com um sorriso curioso nos olhos. – Não vai a lugar algum, hein? – brincou. – Culpado. Problema com um dos clientes – expliquei. – O prazo é amanhã. – Tá. Vai lá salvar o mundo. – Volto o mais rápido que for humanamente possível. – É bom mesmo. Porque eu vou até a casa do Rick ver se ele preparou as câmeras para Madeleine e depois vou voltar para essa cama, tirar a roupa e ficar te esperando. Eu estava muito feliz. A vida estava me tratando cada vez melhor. – Não me deixe esperando muito tempo, ouviu, Holt? – Sim, senhora.


Eu tinha acabado de me vestir e de descer as escadas quando ouvi batidas na porta. Não podia ser Holt. Mesmo que tivesse esquecido alguma coisa, ele tinha as chaves. Max chegou na porta antes de mim. Puxei sua coleira, afastando-o da entrada antes de girar a maçaneta. – Eleanor – cumprimentei, sem qualquer indício de ânimo na voz. Tinha decidido que não ia nem me dar ao trabalho de fingir simpatia. – Dominique. Posso entrar? – Achei que você tinha a chave. – Eu tenho. Mas preferi tocar a campainha e evitar que você agredisse meu motorista. – Olá, Boe. – Acenei para o homem alto que tinha ficado na calçada, perto do Rolls-Royce estacionado. – Srta. Thoen. – gesticulou uma reverência com a cabeça e Eleanor olhou para trás com uma expressão ácida. Boe ajeitou a postura e voltou a me ignorar. – Podemos conversar lá dentro? Ou as pessoas têm o hábito de conversar na porta no lugar de onde você veio? – De onde eu venho as pessoas têm o hábito de serem minimamente educadas com quem elas mal conhecem. Mas acho que isso é demais para a senhora. – Ora, ora… Olhe quem não está mais com medo. – Está insinuando que em algum momento tive medo da senhora? – Não estou insinuando, querida. – Ela me empurrou com o braço e entrou na casa. – Pode entrar – Completei sarcástica, quando ela já estava a meio caminho do sofá. – Não preciso de convite para entrar na casa do meu neto. Sente-se. – A senhora quer beber alguma coisa? – Abri um sorriso propositalmente falso. – Arsênico? Cianeto? – Se isso foi uma ameaça, vai receber uma ligação dos meus advogados. Eu tive que rir. – Não se ameaça um rottweiler com poodles, sra. Baxter. – Levantei uma sobrancelha. – Mas foi apenas uma piada. Diga-me: qual foi a ofensa que a senhora veio me fazer dessa vez? – Nenhuma ofensa. Só um pedido educado: vá embora. Hoje. – Não, obrigada – sorri. – Era só isso? – Indiquei o caminho da porta com um gesto. – Vou ter que lembrá-la de que fui educada primeiro. – Educada? “Vá embora. Hoje.” Isso é educação de onde você vem? Acho que prefiro a minha etiqueta de filha de lavador de chão – rosnei. – Ah, estou farta do som da sua voz. Talvez isso aqui cale a sua boca. Ela levantou a tela de um tablet para mim. Estava no mudo, mas a imagem foi mais do que suficiente para fazer meu coração parar de bater. Era o quintal da minha casa. Meu corpo nu se contorcia sobre a espreguiçadeira na borda da piscina enquanto um vibrador entrava e saía da minha vagina. Me senti fraca e trêmula. Minhas pernas começaram a se curvar sem minha autorização e quando dei por mim, estava sentada no sofá. – Eu mantenho Gregory sob constante observação. E, em um mundo digital, isso significa ter não apenas o acesso irrestrito à sua casa, mas também acesso irrestrito a determinados aparelhos. Agora!


– Ela desligou a imagem e deitou o tablet no próprio colo. – Vou repetir: vá embora. Será que está me ouvindo dessa vez? Ou vai ter mais algum comentariozinho sarcástico para acrescentar à conversa? Eu tentei engolir a seco, mas não havia qualquer saliva na minha boca. Minha garganta estava ardida e ressecada. Puta que pariu. Puta. Que. Pariu. – Ah, nenhum comentário? Bem, já que a senhorita está prestando atenção, vou aproveitar para explicar o que vai acontecer. Não sei que tipo de mel você passou nessa falha funda que tem no meio das pernas, mas meu Gregory parece estar hipnotizado. O jeito como ela falava “meu Gregory” era duro e possessivo. Nada como o jeito gentil, delicado e tímido como Audrey tinha chamado logo antes de se desculpar por fazê-lo. “E não se engane, Dominique, aquela mulher é o demônio.” As palavras da mulher frágil e abandonada inundaram minha mente. Ela estava certa. Muito certa. – Tanto que nem mesmo Merryl foi capaz de persuadi-lo. Enfim… Se não posso fazer do jeito suave e natural, vou fazer do jeito Baxter. Eu te fiz uma promessa, Dominique, e eu pretendo cumprila. Eu estava tentando respirar. Meu corpo inteiro tremia. Minha vida estava ali naquele tablet. Meu futuro inteiro, nas mãos dela. E diferentemente de Holt, ela não tinha qualquer motivo para se conter. Diferentemente de Holt, ela não queria só brincar e me dar uma lição. Ela queria me destruir. E tinha munição suficiente para fazer isso quantas vezes quisesse. – Você tem vinte e quatro horas. Ouviu, criança? A esta hora, amanhã, ou você vai estar em um avião voltando para qualquer que seja o buraco que chama de lar ou esse vídeo vai estar na internet. E no e-mail de cada um dos seus empregadores e potenciais empregadores. Uma vez por mês, pelo resto da eternidade, para ter certeza de que eles não vão esquecer a vagabunda promíscua que você é. Ela se levantou e eu fiquei muda, encarando o espaço vazio no sofá que ela tinha ocupado há poucos segundos. Eu precisava dizer alguma coisa. – Eu disse que você deveria ter aceitado minha proposta. Poderia estar saindo daqui com dinheiro, contatos e infinitas oportunidades. O que está acontecendo agora com você é culpa exclusivamente sua. Defenda-se, Dom. Reaja! – Foi seu neto quem fez essa gravação. Se você colocar isso na internet, não se preocupa em prejudicá-lo? – É um dano que eu posso contornar – sorriu. Maldita. Eu não ia aguentar ser chantageada mais uma vez. Aquela merda daquele vídeo já tinha causado o máximo de problemas na minha vida que iria causar. – Você está errada – mordi o lábio. – Eu amo o seu neto. – Ama, é? – Amo – respondi ríspida, e me odiei por ter me permitido confessar isso para ela antes de conseguir dizer para Greg. Aquele vídeo não ia me incomodar mais. E nem aquela velha. Os dois tinham me escravizado o suficiente para uma vida inteira, e eu não ia mais aceitar. – Quer espalhar


esse vídeo? Pois espalhe. Eu não ligo mais. Não cometi nenhum crime. Não há vergonha nenhuma em ser uma mulher e exercer sua sexualidade. – Acho que o mundo jurídico não vai concordar com você. – Vou sofrer preconceito e ser hostilizada – dei de ombros com um breve sorriso de desespero. – Já sofri preconceito e fui hostilizada antes. Eu sobrevivo. – Se o ama é mais um motivo para ir embora. – Eu odiava aquele sorriso impiedoso. Queria avançar com uma faca na cara dela e arrancar aquele sorriso fora. – Você acha que pode conquistar grandes coisas com ele. Que adorável! Mas ele já nasceu sendo vinte vezes superior a você. Imagine tudo que ele pode ser? Ele pode ser um Baxter. – Ela estava gesticulando pela sala como se estivesse proferindo um discurso presidencial. – Pode ser o guia de um império internacional. Mas se ficar com você, se optar por essa… Por essa… – olhou ao redor com nojo –, essa vidinha, ele nunca vai ser mais do que um mero advogado subalterno. Se você o ama, por que não deixá-lo atingir seu potencial? Você pode discordar de mim quanto ao valor de um berço de ouro, mas não pode negar que dinheiro e poder trazem privilégios. Privilégios que o homem que você diz amar nunca vai poder ter se ficar com você. É isso que quer para ele? Mediocridade? Eleanor baixou os braços e respirou fundo analisando qual o efeito que seu discurso tinha causado. Detesto admitir que a simples ideia de prejudicar Gregory me doía mais do que um vídeo íntimo meu na internet. – Você fica aqui como uma demonstração do seu amor. Eu coloco seu vídeo na internet. – cuspiu. – E aí o quê? Vocês se casam e vivem uma linda história de amor. Sobrevivem o preconceito que você sofreu, juntos. Sim, essa é uma possibilidade em um milhão. Mas e se o que acontecer for o mais comum? Você não vai conseguir outro emprego. Gregory vai te sustentar com o salário de advogado medíocre dele. Ele nasceu em um luxo extremo e já caiu bastante. Sustentando dois com o salário de um… Ele vai cair mais ainda. Acha que ele não vai olhar para trás? Não vai pensar em como poderia ter sido sua vida se não tivesse que arrastar você como peso morto? Vai ficar estigmatizado como o homem decente namorando a vagabunda que apareceu nua e se masturbando na internet. Isso vai acompanhá-lo pelo resto da vida. Talvez você leve a credibilidade dele junto com a sua. Talvez ele perca o emprego. Eu prometo que irei congelar todos os fundos dele. Vocês vão estar desempregados, sem dinheiro ou perspectivas, passando necessidades… E então? Vocês ainda vão continuar juntos? Um exemplo de superação do amor? – Ela ridicularizava cada palavra dita – Ou será que a vida vai desgastar esse sentimento bobo que vocês, jovens estúpidos, chamam de amor? Eu tenho mais experiência de vida que você, Dominique, então permita-me prever o que vai acontecer: vocês vão ressentir um ao outro. Você por ter perdido o emprego e a vida por um vídeo que ele fez e que caiu nas mãos da avó dele. E ele por ter se tornado um homem miúdo quando, sem você, poderia ter sido gigantesco. Vocês vão virar as costas um para o outro e seguir seus próprios caminhos, sozinhos. E você vai olhar para trás, para o dia de hoje, e vai pensar: se apenas eu tivesse tomado uma decisão diferente. Eu sentia mais raiva do que tristeza. – O que você está fazendo é uma crueldade desumana e desnecessária. – Sabe o que é desnecessário? – Ela aproximou o rosto do meu ameaçadoramente. – Se masturbar em público.


Capítulo 22 “– Eu só sei que eu te amo. – É uma pena.” Scarlett e Rhett – E o vento levou – Dom, você tem certeza de que está bem? – Tenho. Já era muito tarde e ele tinha uma expressão exausta. Expressão exausta de advogado medíocre subalterno. Meu coração estava apertado. A profissão que eu tinha era o ápice do que eu jamais tinha almejado alcançar. Talvez não o ápice absoluto… Mas bem perto. Mas para Greg… Para ele, aquilo era tão menor do que o que ele podia ser. Se fosse presidente da Baxter não estaria trabalhando até tarde em um domingo para acordar cedo na segunda e ganhar dez vezes menos que seus chefes por trabalhar três vezes mais. Ele teria uma vida mais tranquila, mais luxuosa, sem dúvidas… Talvez mais feliz. Pelo que tinha me contado, sempre se deu bem com sua avó. E se aquele fosse apenas um período de rebeldia? – Ainda não usamos o chantilly – sorriu no meu ouvido. – Agora não, Holt. Estou cansada. Ele hesitou, decidindo se eu estaria realmente cansada ou se havia algo errado. Virei no travesseiro para impedi-lo de continuar me encarando até perceber que a minha falta de desejo tinha uma explicação desagradável. Faça uma lista, Dom. Prós e contras. Se eu fosse embora teria meu emprego seguro. Meu futuro. Tudo pelo que tinha trabalhado a vida inteira. Greg, aos poucos, voltaria para a sua vida de antes. Ele se dava bem com a avó, ia encontrar um meio-termo para viver assim de novo. Moraria naquela cidade, perto da mãe, e teria a chance de decidir se queria se aproximar dela ou não. Ia ser um homem de sucesso, nunca ia precisar de nada. O contra é que eu teria que viver sem Greg. Espremi o rosto contra o travesseiro. Se alguém me dissesse há duas semanas que “viver sem Greg” seria o maior problema e a maior dor da minha vida, eu gargalharia até passar mal. Acho que, às vezes, quando você ama, você tem que deixar a pessoa livre. É o último nível de altruísmo… E eu nunca fui muito altruísta. O que Scarlett faria? Scarlett seria capaz de ver o que era melhor para ela e para o homem que ela amava. Scarlett seria capaz de deixá-lo ir. Talvez eu tivesse que fazer a mesma coisa. Talvez eu só tivesse que respirar fundo e deixar Holt ir.


Se ele levasse uma vida medíocre por minha culpa, eu… não… eu não podia. Deixar Holt bem tinha que ser o Plano A. Eu teria que me conformar em ser o Plano B.

– Dom? O que aconteceu? Você está estranha desde ontem à noite. Eu não podia deixá-lo decidir. Simplesmente não podia. Era gentil demais. Ia dizer que estava apaixonado e ia me pedir para ficar. E, se ele pedisse, eu não ia conseguir dizer não. A decisão ia ter que ser minha, e eu tinha resolvido priorizar o Plano A. – Saudades do trabalho – menti. – A gente vai ter que conversar sobre isso – sorriu e apertou minha bochecha. – Sobre para onde a gente vai. Se você preferir ficar, temos que conseguir um emprego para você. Isso se você não quiser trabalhar para Andrew. Ele já deixou claro que, se você quiser, tem uma vaga lá. Sorri, mas sabia que não tinha nenhuma emoção na minha expressão. – Mas se você preferir voltar, sem problemas, também. Eu falo com Hyde. Quando fui embora ele disse que sempre teria espaço para mim, caso eu mudasse de ideia. Vamos ver se ele estava falando sério – sorriu, mas assim que seu olhar alcançou o meu, sua expressão mudou. – Dom? O que você tem? – Não sei – suspirei com dificuldade. Ia precisar dizer mais alguma coisa para convencê-lo. – Não estou me sentindo muito bem. Pode ser uma gripe… Greg levantou e colocou as costas da mão na minha testa. – Se você não estiver se sentindo bem, posso ligar para o escritório e dizer que não vou. Fico aqui e cuido de você. – Não seja ridículo. Eu consigo me virar. – Estava cortando sua gentileza com severidade. Se ia ter que fazer aquilo, melhor que começasse a me acostumar de uma vez: eu estava sozinha de novo. – Tudo bem – disse baixinho. Tirou a mão da minha testa e eu tive certeza de que ele sabia que algo não estava certo. Fosse por cansaço dos meus problemas, porque estava atrasado ou por qualquer outro motivo que fosse, ele não insistiu na pergunta. Segui seus passos até a porta, Greg tocou minha cintura e aproximou a boca da minha. Não sei o que me possuiu, mas virei meu rosto no último segundo e ele acabou beijando minha bochecha. – Chego mais cedo, hoje – suspirou. – Para ficarmos juntos, tá? – Tinha medo em seus olhos. Uma dúvida imensa. – Tá. – Pode dar uma olhada nos arquivos de Adam e Liam? – Claro. Ele me beijou no rosto mais uma vez. Intencionalmente na bochecha. Assim que vi seu carro se afastando na rua, subi as escadas e comecei a arrumar minhas malas. Acabou a brincadeira. Era hora de voltar para casa e encarar a vida real.

Mal abri a porta, Andy, Shelbi e Madeleine já estavam enfiadas na sala.


– Deu tudo certo! Exatamente, EXATAMENTE como você disse – Andy anunciou. – O que preciso fazer agora, Dom? – Precisa achar um bom advogado e levar tudo para ele. Já pode colocar Eric para fora de casa. Pode jogar as roupas dele pela janela e tocar fogo, se quiser. – Precisa achar um advogado? – Andy repetiu. – Por que você não a representa? Ia ser lindo! – Entrelaçou os dedos, animada. – Não posso. Mas aqui. – Encontrei o número do escritório de Holt e anotei em um pedaço de papel. – Esse é o escritório de Gregory. É um escritório excelente. Eles vão te ajudar com o que precisar. – Muito obrigada, Dom. De verdade! – De nada, querida. E você, Cabelo Azul? Greg notou que você e Calvin ficaram bem íntimos na festa de sábado. – É, acho que a gente se deu bem. – Ela tinha um sorriso empolgado. – Eu ia vir te contar, mas imaginei que você e Gregory estavam se resolvendo depois do problema com Leo. – E você me deve um pedido de desculpas. – Não, não devo. Por minha causa vocês dois tiveram um sexo de reconciliação muito bom. – Madeleine e Shelbi estavam rindo. – Menina, me respeite! – Dava para ouvir os gritos e gemidos de vocês da minha cozinha! – Arregalou os olhos para mim. – Sou eu quem devia pedir respeito. – Cruzou os braços e eu fiz uma careta para ela. – Ah… Vai ficar com o Calvin, vai. – brinquei. Andy conseguia me distrair dos meus problemas. – Ele saiu com uns amigos. Ele disse que vai fazer isso toda segunda e quarta de manhã enquanto estiver de férias aqui. – Por quê? – Madeleine quis saber. – Porque a mãe dele tem um grupo de estudo de Bíblia que aparentemente sempre acaba com ela e um congregado na cama. Algo dentro de mim acordou. Era a parte de mim que desejava controle e que estava total e completamente esquecida, principalmente nos últimos dias. – Ela vai se encontrar com ele hoje? – Vai. Ih… O que é esse olhar? – Que horas? – Acho que… – Ela olhou para o relógio – Daqui a uma meia hora? – Dominique, o que foi? – Madeleine estava interessada em todo e qualquer tipo de plano depois do sucesso da empreitada da noite anterior. – Vocês conhecem Adam e Liam? – Ah, eles são uns amores! – Madeleine se derreteu. – São pessoas ótimas, realmente. Uma pena que Violeta tenha resolvido persegui-los daquele jeito. – Shelbi parecia realmente incomodada. – É por causa dela que o processo de adoção não anda mais rápido. – Bruxa. – Andy acrescentou. – Pois é… Acho que a gente podia dar uma lição nela e, de quebra, garantir que ela não incomode mais o casal. O que vocês acham? – Convoco o Clube dos Biscoitos? – Andy sorriu, esfregando uma mão na outra. Eu sorri e disse que sim, logo depois de mandá-la parar de chamar todo mundo por aquele nome


ridículo. O Clube dos Biscoitos… É, vamos lá… Uma última reunião.

– Só preciso colocar um celular lá dentro, Rick. Com uma câmera, para filmar os dois no ato. Ele coçou a cabeça. – Certo. Mas como vamos levar o celular lá pra dentro? – Deixa que eu me preocupo com isso. – É, Dominique é criativa. – Andy piscou o olho pra mim. Thierry estava sentado e sorrindo em um canto da sala. Acho que ele estava se divertindo com toda a animação dos últimos dias. Rick tentava explicar o que a gente precisava fazer, mas Andy o interrompia a cada dois segundos. Shelbi parecia mais nervosa do que animada e Madeleine mais animada do que nervosa. – Tudo bem, a gente só tem que se preocupar com duas coisas então: a memória disponível e a bateria. – Como assim? – Deixa que ele explica, Greenpeace. – Tá, tá. – Se a gente deixar a câmera lá gravando, pode ser que a memória lote antes de você conseguir o que quer. E se você não souber quanto tempo uma coisa vai levar para acontecer, a bateria pode acabar. – E como a gente resolve isso? – É bem simples, na verdade. Eu vou precisar preparar o telefone pra transmitir o feed ao vivo. Aí a gente não precisa se preocupar com a memória. E quanto à bateria… Essa parte é complicada… – Mas a gente sabe que vai acontecer agora. A bateria não é problema – Andy respondeu. – E se você estiver errada? – lembrei. – A gente precisa colocar a câmera lá, mas se ela não se encontrar com o cara hoje a gente perde a chance. – Havia algo que Rick tinha dito que estava me incomodando e, como um clarão, a ideia invadiu minha mente. – O sensor! Rick, você não disse que estava desenvolvendo um sensor para vincular a outros aplicativos? – Isso! – Bateu palmas. – A gente vincula a câmera do feed ao sensor. Assim que tiver movimento no quarto, ela liga sozinha. Assim a gente economiza bateria. – Perfeito! Em quanto tempo você consegue preparar tudo? – Qual celular a gente vai usar? Todos na sala se entreolharam. – Meu plano envolve deixar o celular lá dentro – confessei. – Mas não envolve resgatá-lo. Quem ceder o aparelho pode dar adeus a ele. – Usa o do Eric – Shelbi decidiu, e eu ouvi o rancor vingativo na sua voz. – Rick ainda está com ele. – Boa ideia, Shelbi! – Eu estava impressionada. – Já tirou o que precisava do telefone? Mensagens de texto, e-mail… – Já. Tinha um bocado de coisa… – admitiu, constrangido. – Isso é bom! – incentivei. – Então, vamos lá. Prepara o telefone do Eric e vamos resolver isso.


Fui para o lado de fora com o celular na mão. As férias escolares garantiam uma rua com crianças andando de bicicleta para todos os lados. – Ei! Moleque! – gritei assim que identifiquei o grupo de pirralhos que tinha cortado minha grama no outro dia. Quer dizer, minha não. De Holt. Não pense nisso agora, Dom. Um problema de cada vez. – Você quer ganhar mais algum dinheiro? – Quer que eu corte sua grama de novo, srta. Thoen? – Não. – Porque se for, vamos cobrar o dobro. – Extorsão é crime, sabia? Ele riu, ganancioso. Mais alguns moleques se aproximaram. – A gente vai aprontar uma pegadinha com a vizinha. E eu só preciso que você entre na casa dela e coloque esse celular aqui no quarto dela. Coloque escondido em algum lugar, com a câmera virada para a cama. Pode fazer isso? Shelbi se remexeu do meu lado como se estivesse detestando a ideia. É, envolver crianças era horrível. Mas ele era dez vezes mais ágil e mais rápido do que qualquer um de nós. – Que pegadinha é essa? – Quando ela estiver dormindo de noite, o celular vai começar a fazer barulhos bem altos e o flash da câmera vai acender. Ela vai levar um susto horrível. Mas para isso você precisa colocar o aparelho escondido e com o lado da câmera e do flash virado pra ela. Entendeu? – Ah! Que massa! Como vocês conseguiram fazer isso? Alguns dos seus coleguinhas ao redor começaram a planejar aprontar a mesma coisa com alguém chamado Brian. – Foi o Rick ali – apontei. – Ele desenvolveu um aplicativo. Rick olhou para mim com a boca aberta e os olhos arregalados como quem diz “obrigado pelo trabalho extra”. Devolvi um sorriso de desculpas e levantei os polegares. – Passem lá em casa depois e eu preparo um no celular de vocês. – Massa! – Eles comemoraram entre si. – Ótimo, então não vai ter pagamento. – Como é? – reclamou. – O pagamento vai ser o aplicativo. Tem que escolher, moleque. Ou o dinheiro ou o aplicativo. Eles se entreolharam considerando as possibilidades. – Ah, não precisa! – Shelbi desistiu – Aqui. Eu pago e o Rick dá o aplicativo. Só resolvam isso de uma vez. Expirei irritada e dei o celular para o menino. – Agora eu vou criar uma distração para tirar ela de casa. Aí, quando ela sair, você vai lá correndo. Entendeu? – Entendi. Eles correram animados com a brincadeira e ficaram na lateral da casa que eu indiquei. – Dominique, como você vai tirar ela de casa?


– Ah, eu tenho um plano e vocês vão me ajudar. – Como? Andei até a calçada do lado oposto da casa da mulher e gritei a plenos pulmões. – Adoração a Satanás. Adorem Satanás. Andy começou a rir. Madeleine fez o sinal da cruz e deu dois passos para trás. Mas no fim, todos entenderam o que eu estava fazendo e acompanharam. Em menos de um minuto. Violeta tinha saído de casa e estava na calçada gritando com a gente. O bom de lidar com criaturas de hábitos é que sempre é fácil manipulá-las.

Uma hora depois, bati na porta da casa de Violeta com metade do Clube dos Biscoitos atrás de mim. Era minha vez de chantagear outra pessoa, e eu ia aproveitar cada segundo. – O que vocês estão fazendo aqui? Eu vou chamar a polícia. Levantei a tela do celular sem dizer uma palavra. Ela abriu a boca exageradamente, mas não emitiu qualquer som. – Você vai parar de incomodar Adam e Liam. O casal homossexual que mora aí na frente – adicionei, caso ela fosse do tipo que grita com as pessoas sem sequer saber seus nomes. – E você vai escrever uma carta de recomendação para adicionar ao processo de adoção deles na vara da família. Andy vai passar aqui para pegar amanhã. E é bom que seja uma carta espetacular.

Entrei de volta na casa de Thierry com Andy nos meus calcanhares. – Foi ótimo! – gritou para Rick e jogou os braços no seu pescoço. – Acho que dessa vez ela vai parar. – Tomara. – ele riu, ficando muito vermelho, muito rapidamente. Todos se sentaram na sala e Thierry perguntou quem queria biscoitos. Todo mundo queria, mas ninguém queria ajudar a fazer. Eu me levantei devagar. – Pessoal, eu preciso ir. – Não vai ficar para os biscoitos? – Não. Obrigada. Tenho que terminar de arrumar as malas. – Arrumar as malas? – Andy parou de rir e me observou sem compreender. – Eu estou indo embora. – Embora? Para onde? – Eu não vim para ficar, Andy. Moro do outro lado do país. Tenho minha vida, meu emprego. Minhas férias acabaram, tenho que voltar pra casa. – Mas sua casa é aqui! – Ela não estava sendo doce. Estava sendo agressiva e eu quis gritar que ou ela calava a boca ou me tratava com respeito. Merda. Eu ia sentir falta dela. – Você e Holt não estão juntos? – Ficamos juntos por um tempo. Mas agora eu tenho que ir. – Não! Você não vai.


– Andy… – Shelbi pediu. – A vida não é simples. Todos vamos sentir falta de Dominique, mas se ela precisa ir… – Ela não precisa fazer nada. Ela está é fugindo e se escondendo. Qual é o seu problema? – Qual é o meu problema? Qual é o seu problema! – Você paga de pavão para todo lado. Diz que é a mulher segura e confiante. Mas sempre, SEMPRE que o assunto é esse cara você parece uma adolescente. Se você gosta dele, por que não fica? – Não devo explicações da minha vida para você. – Ah, então é assim? Você se mete na vida de todo mundo, mas assim que alguém quer te dizer o que fazer você diz que não deve explicações? – É – rosnei. – É exatamente isso. – Tudo bem, então. Faça uma boa viagem. – Ela virou as costas e foi embora. Escutamos o barulho alto da porta que ela fez questão de bater atrás de si. – Isso tudo é porque ela vai sentir sua falta. – Shelbi passou a mão no meu braço. – Acho que vou sentir falta dela também. Mas preciso ir. – Claro. Vai ficar silencioso aqui sem você. – Shelbi abriu os braços com um cuidado estranho, e eu a abracei antes que ela fizesse alguma onomatopeia irritante. – Não deixe ele te enganar, me ouviu? Ele não presta e você tem que largá-lo imediatamente – eu a alertei. – Vou fazer isso! Não se preocupe. – A gente não vai deixar ela sozinha – Madeleine prometeu quando trocamos um abraço desajeitado. Depois foi a vez de Rick. Eu o espremi em meus braços e dei um beijo estalado em cada uma de suas bochechas. – Cuide de todos, sim? – Pode deixar. E você, se cuida! – Tchau, Thierry – sorri. – Foi um prazer. – O prazer foi meu, querida.

Era estranho, mas eu queria chorar. Sentia um ardor horrível nos meus olhos e não conseguia deixar o ar entrar muito fundo nos meus pulmões. Parecia que eu estava sufocando bem devagar. Eu não preciso de ninguém. Essa experiência com os vizinhos foi legal, mas eu não preciso de ninguém. Eu fico bem sozinha. Eu consigo me virar. Holt vai ficar melhor sem mim. Vai conseguir avançar na vida de um jeito que nunca conseguiria comigo. Se eu ficasse, não seria justo com ele. Tinha que ficar repetindo tudo que eu sabia como um mantra, ou desistiria de tudo. Ou pior: ligaria para Holt e pediria para ele voltar e me convencer a desistir. Minhas malas estavam prontas. A casa de Holt estava arrumada. O vídeo tinha sido apagado… ou quase. Max veio correndo assim que eu cruzei a porta. Deixei que ele pulasse em mim e lambesse meu rosto.


– Acho que vou pegar um labrador quando voltar pra casa – sorri. Eu adorava coçar suas orelhas. Ele ficava bem quieto recebendo o carinho, com um palmo de língua de fora da boca e um par de olhos amigáveis me observando. – Acho que vou chamá-lo de Max também. Você se incomoda? Ele sacudiu a cabeça quase como se estivesse dizendo que não. Mas pode ter sido só impressão minha. Provavelmente foi. Cachorros não falam, Dom. Eu queria gritar para o meu cérebro que esse cachorro falava! Esse cachorro sentia e me entendia e era meu amigo, e eu não queria ir embora. Não queria ficar sozinha. Mas, ah… Inferno… Eu amava Gregory. Amava muito. Amava ele mais que tudo na vida. Amava ele mais do que a mim mesma, aparentemente. E era exatamente esse o problema: podia ser agora, podia ser depois… Mas não ia durar. Fui uma vadia egoísta minha vida inteira e logo, logo estaria de volta às minhas raízes. Ele ia descobrir que não gostava tanto assim de mim… Tinha sido só o calor do momento. E aí? Que diabos eu ia fazer então? Levei anos para montar a armadura intransponível que protegia meus sentimentos de qualquer ameaça externa. Essa situação toda com Holt era um trinco nas minhas defesas. Um que poderia virar um buraco colossal e me deixar destruída. Marilyn Monroe dizia que era melhor abandonar antes de ser abandonada… Ali, na casa de Holt, com as malas feitas e o coração na mão, tenho que confessar que entendia exatamente o que a senhorita Monroe queria dizer. Ficar ali significaria arriscar meu futuro inteiro por um cara que poderia desistir de mim em pouco tempo. Sentei no sofá e respirei fundo. Eu não minto para mim mesma. Não vou começar agora. Minhas malas estavam no chão aos meus pés. O telefone estava logo ali. Já tinha comprado minha passagem pela internet. Tudo que eu precisava fazer era ligar para um táxi ou ligar para Holt. Se eu mal tinha conseguido me despedir da vizinhança, me despedir dele ia ser… insuportável. Eu não podia fazer isso. Não podia olhar pra ele e dizer “Estou indo, até logo. Me liga quando estiver pela cidade”. Não ia acontecer. Eu ia chorar, ele ia me abraçar. Se ele me beijasse, dissesse que me amava e me pedisse para ficar eu não iria embora nunca. Pense, Dom. Pense, de verdade. Fechei os olhos e fingi que o vídeo estava na internet. Eu tinha decidido ficar e a velha maldita tinha espalhado minha intimidade para o mundo inteiro ver. O que aconteceria depois? Como eu me sentiria? Ia ser horrível. Eu ia me sentir um lixo. Ia perder tudo. Ou quase tudo. Mas ia ficar com ele. Valia a pena? Não seja apocalíptica, Dom. Eu não ia perder tudo. Ia pintar o cabelo e arranjar um corte diferente. Podia mudar de nome e conseguir um emprego em outro lugar. Holt poderia se mudar para outra cidade comigo. Ele mesmo já tinha feito essa proposta antes, não tinha? E, se nada mais desse certo, podia abrir um escritório meu. Ia atender os vizinhos e cobrar pouco, mas não ia passar fome. Qualquer trabalho duro é um bom trabalho. Era isso que o meu pai tinha me ensinado. Não ia ser tão ruim.


Mas e para ele? Ele ia ter que ouvir piadas e comentários? Ia ter que ouvir gracinhas de colegas de trabalho como Hill? Qualquer um… Um juiz em uma audiência, uma parte contrária em uma ação, o cara atrás da gente na fila do cinema… Qualquer um poderia ter me visto nua em uma situação da mais extrema intimidade. Como ele iria se sentir? E se essa vontade de Gregory de ser independente fosse só um período de rebeldia como sua avó tinha sugerido? Ele, com sua gentileza infinita, nunca me abandonaria. Não se eu tivesse escolhido ficar com ele em detrimento do meu próprio futuro. Mas não abandonar não significa não se arrepender. E se ele se arrependesse? E se ele olhasse ao redor depois de um bom tempo e percebesse que priorizou a coisa errada? Eu podia conviver com o preconceito e a humilhação. Eu já tinha sido provada nesse quesito. Mas ele não. Eu não podia decidir ficar e impor para ele a desgraça do meu futuro. Era injusto. E se ele estava apaixonado, não veria com clareza. Ele iria querer se sacrificar. Mas depois… o arrependimento… Peguei o telefone. Tomei uma decisão. A única que me restava tomar. Disquei o número. – Dom? – Ouvir sua voz quente fez minha força de vontade falhar. – Dom? Está aí? Fale. – Greg. Eu estive pensando… Estive pensando sobre um bocado de coisas. – Eu imaginei. Era por isso que estava estranha ontem à noite? – Acho que sim. – Eu vou chegar em casa mais cedo, hoje, está bem? A gente conversa quando eu chegar. Você me conta o que houve. – Ele atropelava uma frase com a outra. Era quase como se não quisesse me dar tempo para falar. Quase como se soubesse exatamente o que eu ia dizer e não quisesse ouvir. – Greg, eu preciso ir. – Eu não tinha certeza se ele tinha ouvido. Minha voz saiu tão baixa que eu mesma mal a escutei. – Dom, eu chego mais cedo, hoje, está bem? Por favor, vamos conversar com calma. – Não posso. Greg, confia em mim. Por favor! Não vai dar certo. – Eu confio em você. Se está dizendo isso, tenho certeza de que tem algo te incomodando. Mas eu não mereço pelo menos saber o que é? – É uma coisa minha. Uma coisa que você não ia concordar e ia querer me impedir. E não ia ser justo. Pode confiar em mim? – Dom… – ele sussurrou e eu podia sentir a tristeza na sua voz. Não, Greg, não sofre, por favor. Tudo isso é só para você não sofrer. – Linda, a gente conversa. Com calma. – Não há mais nada para conversar. Eu já sei o que eu preciso fazer. A decisão é minha e eu já tomei. Só estou te avisando que eu já comprei a passagem e já arrumei minhas coisas. O táxi já está chegando. – Dominique, não faz isso. – Tinha uma urgência dolorida em sua voz. – Foi muito bom enquanto durou, Greg. Muito bom mesmo. Mas foi só uma brincadeira. Foi só um sonho que não tinha nenhuma chance na vida real. – Você não sabe disso. Não sabe. Você não quer morar aqui? Tudo bem. Eu já disse que posso voltar com você. Ou a gente tenta um relacionamento a distância. Tem milhões de possibilidades


entre o ficar junto e o não ficar, Dom. Não precisa ser assim. – Precisa. Holt, não dificulta. – Eu estou indo até aí, está bem? Estou indo agora. Só me promete que não vai embora assim. Por favor. Só promete que espera até eu chegar. Algo na sua voz triste me lembrou a sua mãe. Eu liguei para ele e disse que estava indo embora. – Holt, eu preciso ir. E não há nada que você diga que possa mudar isso. Eu podia ver as lágrimas nos olhos de Audrey de novo. Ele pediu que eu esperasse, que deveríamos conversar, não podíamos destruir quase trinta anos de casamento assim, pelo telefone. – Estou com as chaves do carro na mão. Estou indo até aí. Dom, por favor… você sabe. Você sabe… não faz isso. Não vai embora assim. Não se despede de mim pelo telefone. Não me faz passar por isso de novo. Mas eu tinha minha mãe na cabeça e no coração e não queria ouvir nem mais uma palavra. Eu entendia como Audrey se sentia. Eleanor tinha encontrado o ponto mais fraco na minha coluna vertebral e tinha espremido com força. Agora eu era só uma sombra da mulher confiante. Eu era só uma mulher apaixonada, tentando protegê-lo. Se ele viesse correndo e tivesse um acidente… Mas ao mesmo tempo eu não podia vê-lo. Não podia mais fazer isso. – Eu espero – menti. – Mas venha devagar.

Abri a porta do escritório e Eleanor estava parada com a mão em riste, como se estivesse pronta para bater na madeira escura. – Gregory. Aonde vai? – Estou saindo, Eleanor. O que você quer? Ela entrou na minha sala descansadamente e se sentou. – Deixe-a ir. Meu coração subiu até a garganta. – Você é filho do seu pai e eu sabia que ia tentar impedi-la. Mas ela sabe o que é melhor para ela e sabe o que é melhor para você. Por Deus, Gregory, não me faça dizer que aquela moça de pouco pudor tem mais bom senso do que você. – Eleanor, você não pode tomar esse tipo de decisão sobre a minha vida. Não brinque de Deus. – Eu pareço uma mulher que brinca? Estou falando muito sério. Deixe-a ir e vá viver sua vida. Dominique estava me esperando, mas ela não ia esperar por muito tempo. Virei as costas. – Se você quiser ficar aí, fique. Mas eu tenho que ir. – Ela ficou com um homem casado, Gregory! Abra os olhos! Essa mulher não presta. Eu esfreguei minha mão na testa. – Você está falando sobre coisas que não sabe. – Não sei? Não sei que ela propôs um encontro sexual exótico com um homem casado em uma festa na sua casa? Como diabos ela sabia disso? – Você está vendo informações fora do contexto. E… Além do mais, por que eu estou perdendo tempo aqui? Você não gosta dela, eu já entendi.


– E você deveria ter imaginado que ela não é confiável. Dada a situação em que a conheceu. Eu parei e girei nos calcanhares voltando a olhar para ela. – O que você está dizendo? Ela me observou com cuidado. Levantou uma sobrancelha e mordeu o lábio em silêncio por uma fração de segundo. – Diga de uma vez, Eleanor! – Ora, está bem. – Puxou o tablet e iniciou um vídeo. – Isso parece uma moça de respeito, Gregory? E você acha que ela não poderia dar em cima de um homem casado? – Era o vídeo que eu tinha feito de Dominique. – Uma moça que se predispõe a uma coisa dessas é capaz de tudo. – Que se predispõe a quê? A se masturbar? – Avancei vagarosamente na sua direção com dentes semicerrados. – As pessoas fazem isso, Eleanor: elas se masturbam. Agora a verdadeira pergunta é: como você conseguiu isso. – Você mesmo disse. – Piscou os olhos, guardando seu tablet. – Já trabalhou na Baxter e sabe como fazemos as coisas. – Você invadiu meu e-mail? Minhas pastas compartilhadas? E o que mais? Minhas redes sociais? Tem algum acionista de Wall Street fazendo comentários sobre a Bolsa de Valores no meu perfil do Facebook? Para que as pessoas olhem e digam “Oh, como o jovem Baxter é inteligente!” Porque é só com isso que você se importa, não é? As aparências? – Respirei fundo e baguncei meus cabelos. Voltar para essa cidade tinha sido uma péssima ideia. – Você vai parar de investigar minha vida. Ouviu? Vai parar. – Tudo bem. Tudo bem. Estava só tentando te proteger. – Inacreditável. Já estava passando pela porta quando finalmente entendi. Entendi tudo. – Você! Você mostrou isso para Dominique? – Ela travou o lábio com aquele seu jeito arrogante de quem nunca vai admitir que tinha errado, e eu tive certeza do que aconteceu – Você a chantageou, não foi? A mandou ir embora ou você colocaria isso na internet. Foi isso? RESPONDE! – Foi. Claro! Eu tinha que fazer alguma coisa. – Me dá. – O quê? – O tablet. Me dá. Agora. Tomei o tablet das suas mãos com violência e saí. Atrás de mim, ela mencionou que não era a única cópia. Merda, Dom. Por que você não me disse? Mas uma coisa era verdade: Se Eleanor tinha feito cópias – e eu tinha certeza disso –, só esse tablet não convenceria Dominique a ficar. Eu precisava de alguém que entendesse disso melhor do que eu. Mas quem? A resposta me veio alta e clara na voz segura de Dominique. Ela tinha mencionado uma pessoa que poderia resolver meu problema.

Saí da casa de Rick mais de uma hora depois. Só acabamos quando ele me garantiu além de qualquer dúvida que aquele tablet era a fonte original da invasão na minha pasta e que ele tinha certeza de quantas cópias tinham sido feitas, para onde elas tinham ido e de que tinham sido apagadas. O seu medo era que alguma das cópias tivesse sido feita para um disco rígido removível


que não estivesse conectado, porque, nesse caso, ele não poderia fazer nada. Mas ele identificou que apenas três cópias tinham sido feitas e conseguiu achar a apagar cada uma delas. Eu o agradeci pela milésima vez, mas algo em seu sorriso dizia que eu não precisava. Ele tinha se tornado amigo de Dominique, aquela amizade de um jeito estranho, típica de Dominique. Deixei o meu carro estacionado na esquina e corri pela rua até chegar à minha casa. – Onde diabos você estava? Olhei para trás e vi Andrea cruzando meu gramado. – Andrea. Não posso conversar agora. – Ela já foi. Tirei a mão da maçaneta e me virei de volta para ela. – Hein? – Dominique. Ela foi embora.


Capítulo 23 “Eu queria você. Queria desesperadamente. Mas achei que você não me queria.” Scarlett — E o vento levou Minha casa estava vazia. Fria e escura. Parecia uma casca que algum animal tinha abandonado quando ficou grande demais para usá-la e agora era só um resto pequeno demais diante da grandeza do mundo. Me recusei a acreditar em Andy e subi as escadas gritando seu nome. Passei em cada cômodo duas vezes. Mas ela não estava lá. Suas coisas tinham sumido. E a merda é que eu ainda conseguia sentir seu perfume. Aquele cheiro cítrico delicioso que ela deixava para trás quando passava. Estava impregnado em cada ambiente e no meu coração. A vizinha era uma criatura irritante que ficava me seguindo e me mandando fazer alguma coisa. Me ameaçou de formas insanas que eu sequer compreendi e disse em tom de ordem que eu devia ir atrás de Dom. Mas como? Se pelo menos eu soubesse para qual aeroporto ela tinha ido. Ainda tentei ligar meu computador e olhar o histórico de navegação. Mas se Dominique não queria ser encontrada, ela não seria encontrada. O histórico tinha sido apagado. Eu podia atravessar a rua e pedir a Rick que viesse ao meu resgate mais uma vez. Mas a verdade é que, quando ele conseguisse, Dom provavelmente já estaria voando. Puxei o celular e enviei uma mensagem de texto para Dom. Avisei que o vídeo tinha sido completamente destruído. Agora precisava esperar. Esperar ela pousar, ler a mensagem e, tomara, me ligar de volta. Ela não se despediu. Liguei de volta para o escritório. Eu estava planejando voltar para casa mais cedo. Disse à secretária que não voltaria aquela tarde. Disse que estava me sentindo mal. Não era mentira. Sentei no sofá e esperei a tarde virar noite. Fiquei sentado no escuro encarando a televisão desligada. Eu nem a tinha beijado. Não de um jeito decente. Se eu soubesse que aquele até logo de manhã teria sido um adeus, eu… Eu teria tomado sua boca na minha por horas. Teria levado ela para cama uma última vez. Teria feito amor com ela e segurado ela nos meus braços. Vai dormir agarradinha. Max deitou nos meus pés e parecia sentir minha tristeza. – Ela foi embora, parceiro – murmurei. – Ela abandonou a gente.


Eu me sentia uma criança. Estava completamente perdido. Eu tinha decidido o que eu queria: eu queria ela. E aí ela foi e decidiu o oposto e eu fiquei ali sozinho. Sozinho e perdido. As horas se passaram e eu tive certeza de que ela já deveria ter pousado. Matei o tempo acessando as páginas de todas as companhias aéreas e tentando deduzir qual voo ela teria escolhido. Olhava para a tela do meu celular compulsivamente. Vamos, Dom. Me responde. Diz que viu a mensagem. Pede desculpas por ter ido embora sem se despedir. Diz que ficou com medo. Diz que me ama. E pronto. Acabou. Volta para cá. Volta para mim. Levantei e tentei andar pela casa para me distrair. Mas aquilo não ia funcionar. O sofá me lembrava Dom. A cozinha me lembrava Dom. A piscina me lembrava Dom. A escada me lembrava Dom. Não vou nem falar sobre os quartos. Até o maldito telhado me lembrava Dom. Tentei tomar um banho. Mas ficar no chuveiro também não ajudou… Não era impressão. Não era paixão ou tesão. Eu amava aquela mulher. Amava realmente do fundo do meu coração. Tinha acontecido em uma velocidade avassaladora e me pegou desprevenido. Pegou nós dois desprevenidos. Mas eu não queria perdê-la. Queria que ela voltasse. Queria ela ao meu lado, na cama, quando eu acordasse todos os dias. Puta merda… Ela não estaria lá de manhã. Eu não ia conseguir. Não ia conseguir dormir. Não ia conseguir acordar no dia seguinte sem ela. Quer dizer, eu conseguiria. É óbvio. Mas não queria. Não queria nem um pouco.

Na mensagem, Greg dizia que tinha resolvido o problema do vídeo. Ele pedia desculpas pelo comportamento da avó e me pedia para voltar. Terminou com um “beijo e eu te amo” que me fez querer morrer. Mas o vídeo não era o meu único problema. E, de volta em minha casa, depois de algumas horas para digerir o fato de que tudo aquilo tinha sido muito bom, mas que ia ser apenas uma lembrança, eu estava bem. Ou tão bem quanto seria possível ficar naquela situação. Joguei minhas malas no chão da sala. Minha casa parecia vazia e oca. – Melhor se acostumar, Dom – falei para o nada. – É só você, de novo. Tomar banho foi uma provação do inferno. Eu estava começando a esquecer as etapas do meu mantra de por que abandonar Holt era uma boa ideia. Eu precisava de um cachorro. E de sorvete. Tentei dormir, mas ia ser impossível. Completamente impossível. Liguei a tevê da sala e estava passando Jornadas nas estrelas. Voyager. Merda. Nunca mais conseguiria ver meu seriado favorito. Eu sabia do que precisava. Remexi os DVDs no armário e peguei E o vento levou. Era isso de que


eu precisava: uma boa dose de Scarlett e eu estaria pronta para enfrentar o inferno que fosse. Já passava das três horas de filme quando senti que era melhor desligar a televisão, antes das cenas finais. Não ia ser uma boa ideia ver aquela parte. Não do jeito que eu estava.

A claridade incomodou meus olhos e eu demorei alguns segundos para lembrar que tinha dormido no sofá. De novo. Era a terceira noite seguida. Eu queria que aquela porcaria de férias acabasse de uma vez para que eu pudesse voltar ao trabalho e tivesse algo para me distrair. Os últimos dias podiam ser facilmente resumidos em uma lista de ações compulsivamente repetidas. Procurar anúncios virtuais de venda de cachorros e identificar infinitas falhas em cada um dos filhotes, que nunca eram tão perfeitos quanto o meu Max. Digitar o sobrenome Baxter no google e descobrir se Holt já estava noivo de alguma mulher obscenamente rica ou se sua avó tinha morrido em algum acidente trágico e maravilhoso. Assistir a filmes de terror que absolutamente não tivessem qualquer relação com romance. Tentar começar a ler Crítica da razão pura, de Kant, que deveria exigir foco e manter todos os meus problemas bem longe da minha mente. Mas eu tinha que reler a mesma frase oito vezes antes de conseguir considerá-la compreensível e seguir para a próxima. Isso era feito por algumas páginas até meu cérebro traidor fazer espasmos correrem pela minha pele provocados pela lembrança do toque de Holt. Então, tudo que eu precisava era lembrar que aquele livro – ou qualquer outro – seria muito mais interessante se pudesse ser lido enquanto ele estava ao meu redor jogando videogame, e aí minha concentração sumia e a leitura se tornava impossível. Cogitei comprar um videogame em mais de uma ocasião. E, em mais de uma ocasião, desisti. Não conseguia me masturbar e precisava de uma boa dose de filmes antes de finalmente conseguir dormir de cansaço. Tudo me lembrava Gregory e me fazia sofrer. Mas, no fim, eu estava satisfeita com a minha decisão. Pensava nisso para manter sob controle os meus impulsos de ligar para ele ou de responder suas mensagens: se após duas semanas eu já estava sofrendo assim, mal podia imaginar como seria se nosso relacionamento acabasse depois que tivéssemos ficado ainda mais tempo juntos. Tinha sido bem melhor acabar com aquilo de uma vez. Nós não combinávamos. Erámos opostos que não se misturavam e, em pouco tempo, isso ia ficar perfeitamente claro para os dois. E aí ia doer. Ia doer mais do que estava doendo agora. Parece que a velha Baxter tinha acabado me fazendo um favor, na verdade. Nunca confessaria isso na sua frente, é claro. Mas se meu coração já estava pegando fogo agora, ver Holt me abandonar depois que tivesse mudado minha vida inteira por ele, ia ser insuportável. Mas a minha sóbria racionalidade não impedia que eu sentisse sua falta. Sentia falta do seu sorriso lindo, do seu toque gentil, do seu abraço quente, da língua ávida. Às vezes, tinha certeza de que tinha ouvido a sua voz. Corria para a janela e por um momento minúsculo me permitia pensar que ele tinha vindo atrás de mim.


Mas não tinha… Óbvio que não tinha. Eu era só a colega de trabalho com o corpo bonito que ele tinha levado para a cama algumas vezes. Quando reencontrasse o pessoal do escritório ia contar nossa breve história e todos iam rir. As mulheres iam torcer o nariz e se perguntar como ele teve estômago para ficar com a “vadia da Dominique” e os homens iam parabenizá-lo de um modo um pouco exagerado demais pela sua conquista masculina. Eu seria um prêmio, uma lembrança cada vez mais distante e uma história divertida para contar para os amigos. Só isso. Era tudo que eu jamais seria para alguém, não é? Vadias sem coração não têm final feliz. Elas vivem sozinhas e morrem sozinhas depois de uma longa vida amarga. Eu olhava através da janela para o meu quintal vazio. E me odiava por sequer ter imaginado que ele viria. Por imaginar que ele se importaria. Ele tinha dito que me amava. É… Mas eu estava certa desde o começo: era só atração. Uma atração bem forte, sem dúvida, mas nada mais. Já fazia mais de um dia que ele não ligava ou mandava qualquer mensagem. Eu não sabia se o amor que ele dizia sentir tinha se transformado em ódio devido às suas tentativas de contato ignoradas, ou se tinha se transformado em indiferença quando ele percebeu que o que sentia por mim, na verdade, não era tão forte assim. Seja como fosse, sua insistência logo se transformou em silêncio e, por um dia inteiro, uma parte cruel do meu coração alimentou a esperança de que, talvez, ele viesse bater à minha porta. Gritar comigo por eu não ter atendido o telefone e o ter forçado a atravessar o país. Eu faria birra e diria que não queria mais nada com ele, mas tudo que Greg precisaria fazer era dizer mais duas palavras doces e eu estaria convencida. Tinha certeza de que era tudo de que eu precisava. Mas seu silêncio durou dias e dias. E minha campainha não tocou. E a cada vez que eu pensava ouvir sua voz, eu corria para ver meu jardim vazio pela janela.

Ela não tinha voltado ao trabalho. Pensei que fosse mandar as férias para o inferno e voltar à sua vida normal. Teria sido melhor, mesmo que essa notícia significasse que ela não sentia nada por mim. Nem mesmo saudades. Mas a imagem de Dom escondida em algum lugar, sofrendo, estava me corroendo inteiro. Depois de mais de vinte e quatro horas de ligações não atendidas e mensagens não respondidas, eu aceitei que a teimosia de Dominique não ia me deixar vencer. Consegui esperar quase uma manhã inteira antes de ceder à curiosidade desesperadora e ligar para o meu antigo escritório. Me garantiram que ela não tinha voltado. Essa ligação foi razoável e completamente compreensível. As outras doze que eu fiz, no mesmo dia, não foram. Mas eu precisava ter certeza de que ela não tinha obrigado as secretárias a mentirem pra mim. Ou talvez que tivesse entrado escondida na sua sala e ninguém a tivesse visto. Depois de reiteradas garantias de que Dominique Thoen não estava no prédio, eu desisti dessa estratégia de ataque também. Alguns ex-colegas ligaram perguntando o que ela tinha feito… Se teria me processado de novo por alguma coisa absurda e se era por isso que eu precisava falar com ela tão enlouquecidamente.


Eu expliquei sem dar muitas informações diretas. Afinal, o que eu poderia dizer? Chantageei a megera para que viesse cuidar da minha mudança e, acredite se quiser, me apaixonei por ela. Minha avó decidiu que não era uma boa ideia e a chantageou para que fosse embora. Ela deve estar dizendo a si mesma que foi embora para me proteger de ameaças da minha avó, ou para evitar que a chantagem se concretize, mas eu a conheço bem melhor agora. Eu sei que ela fugiu porque está com medo, e que toda essa conversa de chantagem e de me deixar ser o melhor que eu possa ser, é só conversa sem fundamento. Ela está com medo de me amar. Dominique consegue ser a mulher mais medrosa e mais corajosa que eu já conheci. Todas as noites eu chego em casa e não me sinto à vontade. Tem alguma coisa errada com a minha casa. Algo errado com minha cama. Com meu chuveiro. Com minhas refeições. Tudo parece frio, sem gosto e incompleto. Aquela sensação pesada e horrível de que há algo faltando me acompanha o tempo inteiro. O pior é que eu sei exatamente do que estou sentindo falta. Mas como eu faço para o inferno daquela mulher pelo menos me ouvir? Como faço para sacudi-la e obrigá-la a perder o medo? Joguei a cabeça no travesseiro e passei o braço pelo lado vazio da cama. O lado onde ela deveria estar. Reclamando e rosnando. Dizendo que a deixasse em paz, que ela não gosta de dormir abraçada com ninguém e que não é seguro cutucar uma mulher cansada. Ri sozinho no escuro. Como uma pessoa podia sentir tanta saudade de outra depois de um relacionamento tão curto? Não fazia qualquer sentido. Mas lá estava eu, contra toda a lógica, sentindo uma falta insana da minha Dom teimosa e reclamona. Enfiei as mãos nos cabelos. Eu não ia conseguir continuar assim. Aquilo ia me deixar muito machucado. Só tinha uma coisa que eu podia fazer.

A noite de sábado devia estar quase terminando e eu ainda não estava nem perto de conseguir dormir. Agarrada ao travesseiro e ao cobertor que tinham sido transferidos para o sofá da sala. Demorei para entender que não conseguia dormir na cama porque a sensação de estar sozinha me deprimia. Na sala, a tevê ficava ligada e eu podia me distrair com a ilusão de estar acompanhada. A solidão tinha crescido sombriamente ao meu redor nos últimos dias, e a TPM certamente não estava colaborando. Coloquei dois biscoitos na boca de uma vez e mastiguei com preguiça. Tentar achar algum canal que não me lembrasse Gregory era uma missão difícil. Acho que era por isso que eu acabava passando a maior parte do tempo mudando de um canal para o outro, sem parar em uma mesma imagem por mais que alguns poucos segundos. Apertei o botão do controle remoto e a tela exibiu um documentário sobre castelos. Eu achei que ia começar a chorar, mas a campainha tocou me fazendo pular no sofá sobressaltada. Olhei para o relógio no meu pulso. Àquela hora… Quem poderia ser? Eu sabia quem eu queria que fosse. Mesmo sabendo que deveria ouvir Marilyn. Mesmo sabendo que tudo podia dar errado e que eu


acabaria sofrendo muito mais do que tinha sofrido naquela semana. Mesmo sabendo que megeras como eu não deveriam ter um final feliz. Mesmo com tudo isso: eu sabia quem eu queria que fosse. Tinha certeza. Encostei o rosto no olho mágico e sorri. Ia ser horrível ouvir o que ele tinha para dizer e seria impossível me livrar dele se conversássemos cara a cara. Mas minha cama estava mais fria e mais vazia do que eu podia concordar. Meu coração não aguentava mais e meu corpo agiu sem pedir minha autorização. Abri a porta e Max pulou em cima de mim. – Oi, garoto! – cocei suas orelhas. Estava com quase tantas saudades dele do que estava de Holt. Quase. – Você disse que ia esperar. Levantei o rosto. Ele tinha ficado mais bonito? Mais gostoso e irresistível nos últimos dias? Era possível? Dei um passo para o lado para lhe dar passagem e ele entrou na minha sala. – Você me fez ter que atravessar o país inteiro, Dominique. E não vou nem falar sobre como você me ignorou todos esses dias. Nem mesmo uma ligação! – Seus lábios estavam espremidos e irritados. – Eu não ia conseguir me despedir de você – expliquei fechando a porta. Max estava passeando pela minha casa e explorando a mobília desconhecida. – Ia acabar desistindo de ir embora. – E por que isso seria uma coisa ruim? – Porque… Porque é. – Mordi o lábio e tentei controlar minha respiração. – Eu sei o que a minha avó fez. E eu já resolvi. Você recebeu alguma das minhas centenas de mensagens? – Recebi. – Eu liguei. Várias vezes. Por que não me atendeu? – Holt… Não é só o vídeo. Eu disse a ela que podia colocar na internet. Disse a ela que eu não ligava. Seus olhos se abriram exageradamente. – Você disse o quê? – Não aguentava mais essa coisa de chantagem. Ela disse que ia colocar na internet, pois que colocasse. – Então… Então, por que você foi embora? – Eu conseguia ouvir na sua voz que ele sabia a resposta para aquela pergunta. – Porque sem mim você pode ser grande. Eleanor foi bastante clara sobre tudo o que você estaria perdendo se ficasse comigo, e eu não achei justo te fazer escolher isso. – Ah, cala essa boca! – largou os ombros, exausto. – Como é? – Você foi embora porque é uma medrosa! Ficou com medo de se envolver, de se abrir… Medo de se permitir ser vulnerável e sofrer. – E você me culpa? Essa semana foi horrível! – Horrível porque você me ama, sua mulher impossível! – reclamou alto. – E não precisa nem me dizer isso, porque eu sei exatamente o quão horrível ela foi e sabe por quê? Porque eu te amo e por que foi horrível para mim também. Engoli a seco e cruzei os braços. Queria que ele me abraçasse mais do que queria viver. – Eu errei várias vezes nessas últimas semanas. Fui injusto com você em mais de uma ocasião.


Mas, desta vez, você fez besteira, Dom. Não devia ter ido embora. – Eu queria que você tivesse todas as oportunidades que quisesse – repeti. Se eu confirmasse em voz alta… Se dissesse que ele estava certo e que eu estava morrendo de medo ia começar a chorar. – E você mesmo disse que não era como sua irmã. Você disse que gostava da sua família antes. – É. E aí metade da minha família morreu por causa do jeito como minha família conduz os negócios e eu abri os olhos. Você pediu para eu confiar em você, que você não estava me traindo ou só querendo vingança. Eu errei, mas aprendi. Eu confio em você. Estou te pedindo que confie em mim. Não me mudei por rebeldia, Dom. Eu não quero mais aquela vida. Nunca mais. – E vai preferir viver como um advogado subalterno medíocre? – Ouvi as palavras de Eleanor saindo pela minha boca. Meu deus… Aquela mulher tinha algum tipo de magia negra… – Advogado subalterno medíocre? Eleanor fez algum tipo de lavagem cerebral em você? – riu. – Tenho uma posição excelente e ganho muito bem, obrigado. Estou… Aliás… Nós dois estamos muito acima da média da população. Foi isso que ela quis te convencer? Que eu seria infeliz com você porque não seria rico? – Você poderia ser mais, Holt. Bem mais do que já é. – Poderia. Mas para isso eu teria que pagar. E o preço que a minha avó cobra, geralmente, é bem alto. – Ela disse que ia congelar seus fundos. Eu não sei como isso funciona para você. Não sei o quanto depende disso. Eu não podia deixá-la… – Dominique… Eu não sou um Baxter. Eu sou um Holt. Mantive os braços cruzados e os olhos nele. – Se Eleanor congelar meus fundos Baxter, não faz qualquer diferença para mim por dois motivos. Primeiro, eu já não uso aquela porcaria de qualquer modo. Segundo, eu tenho todas as ações e fundos de investimento do meu lado Holt. É uma família bem rica também, sabe? Não uso o dinheiro de nenhum dos dois lados porque gosto de viver com o meu salário. É suficiente para mim e para Max. E creio que seja suficiente pra você também. – Ninguém vai me sustentar, Holt – rosnei. – Eu sei. E é precisamente o que eu estou dizendo – sorriu. – Mas se algum dia eu estivesse passando fome… – exagerou, gesticulando –, eu ainda seria dono de um terço de Las Vegas. Acho que eu ficaria bem. – Eu estou com medo – murmurei. – É verdade, você está certo. – Ele sorriu, discreto e satisfeito, e eu quis parar de falar e beijá-lo. – Mas esse outro problema também é uma realidade! Se você voltar para casa, agora, sem mim, você tem todas as possibilidades do mundo, Greg. Você pode ser o que você quiser e depois pode mudar de ideia e ser outra coisa. Mas se você voltar comigo, um monte dessas oportunidades vai desaparecer. Você acha que não se importa agora, mas pode mudar de ideia. Não quero que se ressinta por isso. E, principalmente, não quero que seja obrigado a fazer algo que não quer por uma decisão tomada por paixão – dei de ombros. – Você tem que entender suas prioridades. Escolher o que você quer fazer com a sua vida, ter as opções de ser o que você quiser… Isso é o Plano a. Eu sou o Plano b, Greg. E você não pode botar o b na frente do a porque não é assim que o alfabeto funciona. – Só tem um problema com a sua lógica. – Ele passou a mão na nuca com aquele sorriso doce e lindo no rosto. – Você não é o Plano b. Nem o Plano a. – Colocou as mãos na minha cintura e me puxou naquele abraço que eu adorava. – Você é pré-requisito, Dom. Sem você não tem plano. Greg passou os nós dos dedos na maçã do meu rosto e me beijou. Eu me entreguei naquele beijo macio e deixei ele me abraçar. Há poucos minutos eu tinha achado que nunca mais ia sentir aquela


boca. Segurei seu rosto entre minhas mãos e o beijei de volta com carinho e saudade. – Comprei duas passagens de volta – ele sussurrou contra os meus lábios. – Você volta comigo. – Eu não tenho voto? – ri. – Não. Porque você foge sem se despedir por motivo nenhum, sem sequer me explicar o que está acontecendo. Esse é o tipo de coisa que gente doida faz – riu. – E gente doida não tem voto. Você volta comigo. Além do mais, a vizinha me ameaçou. – Andy? – Eu tive que rir. – É. – Ele levantou as sobrancelhas, fingindo medo. – Ela consegue ser bem assustadora. – Está sendo uma boa aluna! – Percebi! – beijou meus lábios, que se abriam em um sorriso. – Ela me ameaçou com alguma coisa de biscoitos. Disse que ia mandar os biscoitos atrás de mim se eu não te trouxesse de volta. Não sei o que ela quis dizer, mas soou horrível. Eu não quero biscoitos atrás de mim, Dom. – ele disse, fingindo uma voz assustada. Eu estava rindo como uma criança. – Por favor, você tem que voltar. Coloquei as mãos nos seus ombros. – Nada mudou – continuou. – Você ainda tem mais algum tempo de férias. Vem ficar comigo. A gente para durante a semana e pensa no que vai fazer. A gente decide algo junto. Você não pode decidir sozinha! Não sei de onde tira esses seus planos absurdos… Greg passou o polegar nos meu lábio inferior. Eu fechei os olhos e sorri. – Eu fiquei pensando no que Scarlett faria. – Segurei seu pescoço e o puxei para mais perto. Ele veio, obediente. – Ela deixou o homem que amava ir embora porque era melhor para ele. – Aí você pensou em fazer o mesmo comigo? – Seguir Scarlett nunca falha – decidi, birrenta. – Você tem certeza de que já assistiu a esse filme? – Ele me apertou ainda mais. Até quase doer. Mas eu não me incomodei. Queria que ele me apertasse o mais forte que pudesse e que me mantivesse o mais próximo possível. – Porque eu acho que você confundiu as histórias de amor, Dom. O amor da vida de Scarlett não é o homem que ela deixa ir. É o homem de quem ela não desiste. Ele estava certo. Eu estava sorrindo. – E quando você conhece a determinação de Scarlett, você tem certeza de que ela vai consegui-lo de volta. – Porque ela não desiste. – Mordi o lábio. – Viu? Não sei como você pode ter achado que era uma boa ideia ficar sozinha. Você precisa de mim até para interpretar o seu filme favorito. Dei um tapa no seu braço. – Não se divirta às minhas custas ou eu boto você pra fora. – Não! Não faz isso. Essa vizinhança é meio louca – constatou, brincando com os cordões do meu roupão. – Tinha uma moça se masturbando ali do lado de fora quando eu passei… ai! Espalhei tapas pelo seu corpo, mas os tapas logo viraram carícias e as carícias viraram beijos mais intensos. – Diz pra mim, Thoen. Você está nua debaixo desse roupão? – Talvez – provoquei. – E, por sinal! Você se lembra desse roupão? – Como eu poderia me esquecer? Você estava usando quando achou que eu queria trocar o vídeo por sexo. – Que foi o que você acabou fazendo. – Fiz um beicinho debochado.


– Ei, Max! Vem aqui! Roupão é mais legal de puxar do que toalha! Vem aqui, garoto. Atiçou o cachorro usando os cordões. Max acreditou na brincadeira e puxou um deles. Holt me segurou por um dos braços e me desembrulhou como se eu fosse um presente. Eu estava completamente nua a não ser por uma lingerie vermelha. Ele umedeceu os lábios. – Você já acabou com a bobagem? Ou eu vou ter que continuar o discurso para te convencer sobre como eu me sinto antes de você finalmente aceitar que eu não vou a lugar nenhum sem você? – Eu te amo – suspirei. – É. Eu já sabia. – sorriu e levou mais um tapa no ombro. – E já que estamos aqui… – disse olhando ao redor –, alguma chance de eu ser apresentado àquele vibrador? – Sem dúvidas – sorri, safada. – Eu te mostro como usar. Ele espremeu os lábios em um sorriso discreto. – Eu também te amo. – É. Eu sei – repeti.


Epílogo Dois anos depois Morávamos na mesma cidade. Na mesma rua. Trabalhávamos no mesmo escritório e passávamos a maior parte do tempo juntos, ou na minha casa ou na dela. Mas Dominique não queria morar junto oficialmente. Demorou quase um ano para que eu, finalmente, a convencesse de que estava na hora de evoluir no relacionamento. Vivia levando Max para sua casa e mesmo depois que eu apelei para uma guarda compartilhada, eu via meu cachorro cada vez menos. Dei para Dom um White Highland Terrier de presente de Natal, para ver se ela me devolvia o meu labrador. Mas aí, em vez de morar com um cachorro, ela passou a morar com dois. Eu podia olhar para trás e saber que filmar a minha vizinha gostosa se masturbando tinha sido a melhor decisão da minha vida. A vizinha gostosa tinha se tornado minha melhor amiga, minha companheira inseparável, minha confidente. Tinha se tornado o amor da minha vida. E não haveria outra como ela. Nunca. Fizemos uma lista de prós e contras para decidir em qual cidade íamos morar. Acabamos nos decidindo pela minha cidade de origem. A vizinhança amigável e algo chamado de Clube dos Biscoitos ficou do lado dos prós, bem como a proximidade com a minha mãe, a quem Dom faz questão de visitar a cada quinze dias. No começo ela me forçava a ir junto, mas depois de um tempo passei a ir por livre e espontânea vontade. Trouxemos ela pra casa para passar o natal conosco e ela acabou ficando o mês inteiro. Agora, as pessoas sabem onde ela está e o que aconteceu, e suas velhas amigas a visitam com frequência. No lado dos contras, o único elemento era a proximidade com Eleanor e Dominique decidiu que esse contra valia por três. Eu não discordei. Estamos juntos há dois anos. Dois maravilhosos anos. Enquanto procuro a caixa na garagem, tento me lembrar de como era minha vida antes dela e simplesmente não consigo. Ela tinha se tornado indispensável de um jeito absoluto. Encontrei a caixa marcada como “Lembranças de A.H.” e a abri. Dominique já tinha me obrigado a olhar o que tinha ali algumas vezes. Mas a verdade é que eu ainda não sabia o que fazer com os pertences da minha irmã. Jogar fora me parecia errado, e colocar os objetos pela casa não me parecia certo. Então, a caixa ficou ali. Respeitosamente guardada na garagem. Encontrei a caixa de música embaixo de alguns porta-retratos. De dentro dela, tirei a pequena caixa preta sem marcação. O anel de diamantes da família Holt. Tinha sido da minha bisavó. Quando


meu bisavô Holt fez o seu primeiro milhão, sua esposa perguntou o que ele iria fazer com aquilo. Ele foi até o mais respeitado joalheiro da época e encomendou um anel de noivado de mais de meio milhão. Quando eles se casaram ele era um homem pobre que sequer tinha condições de lhe comprar um anel. Ao ser surpreendida com a joia milionária ela lhe disse: “Nathan, eu não preciso disso e você sabe. Então, por que gastar todo esse dinheiro com um presente para mim?” E ele respondeu: “Eu sempre posso conseguir outros milhões, Ann. Mas só tenho uma de você.” Eleanor achava essa história ridícula. Eu discordava. Ele jogou todo aquele dinheiro fora em uma coisa inútil e simbólica. Foi o jeito dele de dizer “Está vendo todas essas coisas? Elas não valem nada sem você”. Era exatamente assim que eu me sentia por Dominique. Peguei o anel na mão, observei seus belos diamantes e sorri antes de enfiá-lo no bolso.


Agradecimentos Um “obrigada” em primeiro, segundo e terceiro lugar ao meu pai, por sempre ter sido a minha mais firme rocha e o mais animado membro na minha torcida. Para Peu, por ter aguentado toda a minha ansiedade e neurose com uma paciência infinita e um carinho interminável. Para Luis Matos, Marcia Batista, Juliana Teixeira e todo o pessoal da Universo dos Livros por essa oportunidade e pelo excelente trabalho, carinho e dedicação para transformar isso tudo em realidade. Para minha mãe, que está resistindo muito bem ao impulso de mandar me internar desde que eu resolvi que queria escrever. Para os meus amigos que sempre entenderam e apoiaram esse sonho e estiveram presentes em cada evento, encontro, palestra, venda de livros e leitura de prólogos e outros trechos. Vocês são o máximo! Para Belinha, que também acompanhou todos os gritos, risos e choros! Para Dr. Laila, por me ajudar a fazer minha ansiedade malcriada se comportar. Para todas as mulheres malucas e incríveis no “Restritas de Ju”, por terem sido meu maior incentivo ao longo de toda essa jornada. Para o pessoal do Clube do Livro – PE, para Lucien, Serena, Dany Wanessa, Anna Schermak e tantos outros blogueiros dedicados e maravilhosos pelo seu incondicional apoio à literatura nacional. Valeu, pessoal! Vocês todos foram mais do que essenciais.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.