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1.2 - Pedagogia do Teatro: diálogos da cidade na cena
from Carloman Weliton Soares Bonfim - O ESPETÁCULO ARENA DE TOLOS COMO PRÁTICA PEDAGÓGICA DE INSERÇÃO...
by Biblio Belas
UFMG), Aderval Costa Filho (FAFICH-UFMG), Élcio Ribeiro (Centro Cultural São Geraldo – PBH), Renegado (Grupo Cultural NUC) entre outros. Também fez parte das atividades a oficina Teatro do Oprimido ministrada por Nuno Arcanjo. No início de outubro o núcleo de investigação e experimentação da CIA ACÔMICA, apresentou o exercício cênico resultante de suas vivências em praças, parques e instituições de Contagem, Betim e Belo Horizonte, inclusive na praça do bairro São Geraldo. Dando sequência às Tarde Teatrais, a Cia Circunstância apresentou o espetáculo Palhaços à Vista, na rua em frente à sede e ministrou a oficina circense Malabarearte, oferecida para a comunidade do bairro São Geraldo e interessados em geral. Este grupo foi convidado para substituir o Grupo Trama impossibilitado de participar dessa agenda. A CIA ACÔMICA pretende dar sequência em suas atividades, oferecendo atividades artísticas formadoras e apreciativas que aproximem cada vez mais a comunidade do bairro São Geraldo do teatro.
1.2 – Pedagogia do Teatro: diálogos da cidade na cena
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A partir desta pesquisa pude observar que muitos grupos de teatro de Belo Horizonte têm como prática teatral na cidade a realização de atividades formadoras, como exemplo, a CIA ACÔMICA que atua em sua sede no bairro São Geraldo. As ações teatrais, tanto no interior quanto na rua à frente da sede, como também na praça do bairro, modificam o cotidiano da comunidade, propiciando a leitura de novas imagens desse cotidiano aos que experienciam o evento teatral. Desse conjunto de atividades o espetáculo Arena de Tolos é modelar. A prática improvisacional, a inserção do dia-a-dia do bairro no texto cênico, atrelada a linguagem cômica torna-se um facilitador de vínculo com o entorno, bem como uma alternativa de diversão para os moradores do bairro São Geraldo. Ao oferecer a possibilidade do público participar - expondo suas questões relativas ao político/social - se estabelece uma comunicação direta entre palco e platéia, companhia e comunidade, teatro e cidade.
O espectador é retirado de seu lugar comum, espectador passivo, e deslocado para a posição de espectador atuante. Ao proporcionar a socialização de questões (problemas) provenientes da comunidade, ao facilitar o encontro dos moradores para a fruição espetacular, a sede da companhia torna-se, mais uma vez, em lugar de possibilidades, lugar teatral.
Os desajustes emanados no cotidiano do bairro são expostos, transferidos do particular para o público, ganham visibilidade. Um morador que, durante o recurso denúncia do espetáculo, reclama do vizinho que desperdiça água ao lavar a calçada usando mangueira, está potencialmente imaginando colaborar com a cidadania, proporcionando uma reflexão a cerca do problema da falta de água potável na cidade (e quem sabe no mundo dada a presença maciça do tema na TV e mídias eletrônicas). Nesse momento a cidade é levada para dentro do teatro. Os problemas do bairro passam a ser motes teatrais e tornam-se visíveis, protagonista do fazer teatral. Concretiza-se, pois, o diálogo entre arte e vida. Se a estrutura do Teatro do Oprimido pode ser percebida no Arena de Tolos ao mesmo tempo é possível verificarmos que ela não se encontra na sua totalidade. O Arena de Tolos não é uma prática do Teatro do Oprimido, mas outras estratégias se fazem visíveis, dentre elas a da improvisação teatral e a participação efetiva do público. Arena de Tolos dialoga pedagogicamente com o espectador no embate da cena, quando este é convidado a somar-se aos atores, dramaturgo e diretor, dividindo a criação do espetáculo que se constrói a partir de fatos reais, que são evocados pelos espectadores. Assim, o próprio jogar e improvisar são por si pedagógicos, tanto que é parte essencial de diversas metodologias do ensino de teatro. Do mesmo modo o cômico não esvazia a reflexão dos temas, apenas suaviza o peso do fato real. Abre-se, pois, o espaço para o indivíduo expor suas questões, e estas são partilhadas em conjunto, ganham visibilidade e passam a ser sentidas no coletivo. Lida no campo da sensibilidade.
[...] a relação do espectador com a obra não é somente a de alguém que está lá para entender algo que o artista tem para dizer. [...] a participação do espectador é a de alguém que está lá para elaborar uma interpretação da obra de arte, para uma atuação que solicita sua participação criativa. Ou seja,
compreende-se que os significados de uma obra não estão cravados nela como algo inalterável [...] (DESGRANGES, 2006, p. 37)
Neste sentido, podemos perceber que a importância dada ao espectador para o evento teatral também se encontra na construção dos significados proporcionados pelo diálogo deste com a obra. Cada espectador organiza as informações que lhe são dadas, constrói suas próprias imagens. Acompanhar o desenrolar dos fatos é fonte de prazer, o que efetiva o fato artístico, dando ao espectador a tarefa que lhe cabe, a de co-autor. Ao reelaborar os códigos apresentados e lançar, a partir daí, “um novo olhar interpretativo para a vida”, (ibidem, p. 23), de forma reflexiva e crítica, o espectador ganha mais autonomia em seu caminho. Assim, o último campo de atuação de uma obra teatral está no espectador. Dessa forma podemos conceber o teatro não só a partir do fazer, mas também da possibilidade de pensá-lo. Mais uma vez constata-se o valor pedagógico que o espetáculo Arena de Tolos proporciona. Entretanto vale enfatizar, mais uma vez, que este processo pedagógico de formação de públicos em micro espaços, como o lugar teatral, é pouco investigado. Optamos por relatar a atividade de inserção da companhia na cidade e seus desdobramentos. Muitas questões ficaram em aberto e outras ainda não estão claras para mim. Ao sair do campo da escolarização e da formação de alunos, mas sim, compreendendo o projeto artístico de uma companhia de teatro como prática pedagógica, na sua relação com a cidade, entramos num campo com muitas possibilidades de análise e reflexão. Parte do público presente nas apresentações do espetáculo (aproximadamente 60 pessoas por sessão) foi composta por moradores do entorno, a outra parte de alunos das oficinas oferecidas pela CIA ACÔMICA em 2009 e 2010, ou seja, esse segundo grupo de moradores do São Geraldo já estava familiarizado com a linguagem teatral, o que contribui com a percepção e participação destes com a obra em questão e o próprio fazer teatral.
Durante as apresentações de Arena de Tolos também se pode constatar: Algumas pessoas retornam para verificar se o espetáculo é realmente improvisado e se a história será outra.
Ao retornar a possibilidade de um mesmo espectador realizar nova denúncia é concreta.
O espectador ao retornar está sempre acompanhado de um amigo ou parente que não participara até então do evento teatral. A concordância de parte da plateia com o denunciante no instante da denuncia é visível.
O retorno do público sobre a repercussão quanto a uma e/ou outra denúncia realizada no dia anterior na comunidade ainda é pequeno. A presença de crianças é freqüente, muitas acompanhadas pelos pais, ou seja, as famílias comparecem. A presença de espectadores pertencentes a outros bairros, distantes da região leste.
Entretanto, no momento não é possível detectar se as ações da CIA ACÔMICA são suficientes ou não, se correspondem aos anseios daquela comunidade ou não, somente uma longevidade do projeto, com abrangência maior, de uma companhia que ali se instala poderá responder a esta questão. Mas, como descentralizador da atividade teatral, como espaço de reflexão sobre teatro, como propositor de atividades no âmbito da pedagogia teatral e no diálogo que faculta entre companhia e comunidade, os projetos da CIA ACÔMICA vêm alcançando seus objetivos, contribuindo com a inserção e a visibilidade do teatro na cidade. Assim, o projeto Cia Acômica de Portas Abertas para a Comunidade é constituído por um conjunto de procedimentos, revelando inúmeros meandros no objetivo de fazer parte da comunidade, de compreender o pertencimento e estabelecer pontes identitárias com o entorno. Certamente, não será somente o Arena de Tolos capaz dessa mobilização pedagógica. Trata-se de uma estratégia compreendida aqui como modelar. Na qual se pode observar a riqueza de detalhes que envolvem estar presente e se inserir na cidade.