Procedimento de Inspecção Tributária
2.º Curso de Pós-Graduação em Direito Fiscal
Tema: O Procedimento de Inspecção Tributária
Nome: Maria Otília de Cabral Rodrigues Barbosa Almeida Residência: Romesal Silva Escura 3740-336 Sever do Vouga
Bilhete de Identidade: 9892121 de 14/12/2000
Faculdade de Direito da Universidade do Porto
2
Procedimento de Inspecção Tributária
Índice
I
Introdução
II
O Procedimento de Inspecção tributária
1
2
III
Princípio Legais do procedimento de Inspecção Tributária
4
IV
Classificação do Procedimento de Inspecção Tributária
7
V Competência para a Realização do Acto Inspectivo
10
VI
17
VII
VIII
IX
Actos de Inspecção
Fases do Procedimento de Inspecção
Tipos de Correcções Efectuadas pela Inspecção Tributária
Fundamentação das Correcções Efectuadas pela Inspecção Tributária
X Conclusão
19
26
28
36
3
Procedimento de Inspecção Tributária
I Introdução
Se bem se compreende que o poder de tributar seja um dos elementos constitutivos da capacidade jurídica dos órgãos de soberania, também se reconhece que num Estado de Direito Democrático esse poder não seja ilimitado. A verdade é que uma excessiva limitação dos direitos à propriedade ou ao rendimento do trabalho podem acarretar a morte do contribuinte por falta de meios de subsistência, assim como a cobrança demasiado reduzida de impostos poderá conduzir à insuficiência da matriz existencial do Estado de Direito Democrático que é redistribuição dos rendimentos a favor dos mais desfavorecidos e à ausência de infraestruturas sociais. É precisamente o poder de tributar por parte do Estado e o dever de pagar impostos por parte dos contribuintes, que exigem regras de tributação claras capazes de estabelecer o equilíbrio necessário à justa redistribuição da riqueza e à equitativa tributação dos rendimentos. O Estado, num primeiro momento, aparece-nos como o titular do poder de tributar, criando normas gerais e abstractas. Num segundo momento, aparece-nos como titular de uma relação jurídica tributária em que figura como sujeito activo dessa mesma relação jurídica. Por fim, o Estado aparece ainda como Juiz, ao dirimir os conflitos que surgem entre o sujeito passivo (contribuinte) e o sujeito activo (administração tributária) da relação jurídica tributária. Por tudo isto, têm surgido normas reguladoras da correlação de forças que se estabelece entre o Estado, enquanto detentor do poder de tributar, e o contribuinte, enquanto sujeito passivo da relação tributária, entre as quais há a salientar o Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 413/98, de 31 de Dezembro e a Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98 de 17 de Dezembro. O procedimento de inspecção tributária ganha, hoje, especial relevo na relação jurídico-tributária, que mereceu especial atenção do legislador naquela que é uma preocupação crescente na defesa dos direitos dos contribuintes e das garantias da administração tributária, no âmbito e em cumprimento dos actos de inspecção. A fundamentação dos actos tributários e, em especial das correcções efectuadas pela inspecção tributária, reveste hoje, e cada vez mais, um importante tema de análise e reflexão como forma de melhor garantir o necessário equilíbrio numa relação jurídicotributária moderna e mais justa.
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Procedimento de Inspecção Tributária
II O Procedimento de Inspecção Tributária
O procedimento de inspecção tributária tem consagração legal no Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 413/98, de 31 de Dezembro. O procedimento de inspecção tributária visa a observação das realidades tributárias, a verificação do cumprimento das obrigações tributárias e a prevenção das infracções tributárias1. A observação das realidades tributárias torna-se hoje, e cada vez mais, uma tarefa de crescente complexidade, fruto da evolução das sociedades modernas com tecidos económicos e sociais em constante mutação. O cumprimento das obrigações tributárias obriga a que os serviços da administração tributária se modernizem, quer em organização, quer em planificação das acções inspectivas por forma a estarem em permanente acção e diálogo com os contribuintes. A prevenção das infracções tributárias é de facto a tarefa mais importante da administração tributária por forma a contribuir para evitar a fraude e a evasão fiscal. O procedimento tributário compreende toda a sucessão de actos dirigidos à declaração de direitos tributários2. O procedimento de inspecção tributária comporta todas as diligências necessárias ao apuramento da situação tributária dos contribuintes3 compreendendo a averiguação de factos e das situações tributárias, a investigação do cumprimento dos deveres tributários e a prevenção da violação das normas tributárias4.
1
Artigo 2.º, n.º 1 do RCPIT.
2
Artigo 54.º da LGT e artigo 44.º do Código do Procedimento e do Processo Tributário (CPPT). O procedimento tributário compreende: a) As acções preparatórias ou complementares de informação e fiscalização tributária; b) A liquidação dos tributos quando efectuada pela administração tributária; c) A revisão, oficiosa ou por iniciativa dos interessados, dos actos tributários; d) O reconhecimento ou revogação dos benefícios fiscais; e) A emissão ou revogação de outros actos administrativos em matéria tributária; f) As reclamações e os recursos hierárquicos; g) A avaliação directa ou indirecta dos rendimentos ou valores patrimoniais; h) A cobrança das obrigações tributárias, na parte que não tiver natureza judicial; i) Todos os demais actos dirigidos à declaração dos direitos tributários. 3
Artigo 63.º n.º 1 da LGT.
4
O artigo 2.º, n.º 2 do RCPIT (na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2001, de 30 de Agosto), enuncia uma lista de acções admitidas no procedimento de inspecção tributária a saber: a) Confirmação dos elementos declarados pelo sujeito passivo e demais obrigados tributários; b) Indagação de factos tributários não declarados pelos sujeitos passivos e demais obrigados tributários; c) Inventariação e avaliação de bens, móveis ou imóveis, para fins de controlo do cumprimento das obrigações tributárias;
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Procedimento de Inspecção Tributária A prática de actos de inspecção, no âmbito do procedimento de inspecção tributária, reveste um carácter informal. A prática de actos ao longo do procedimento de inspecção não depende de um ritual processual tipificado como, por exemplo sucede com a prática de actos no processo judicial. Os órgãos de inspecção tributária gozam de uma ampla margem de liberdade na escolha dos actos de inspecção, desde que tal escolha se conforme com a lei.
d) Prestação de informações oficiais, em matéria de facto, nos processos de reclamação e impugnação judicial dos actos tributários ou de recurso contencioso de actos administrativos em questões tributárias; e) Esclarecimento e orientação dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários sobre o cumprimento dos seus deveres perante a administração tributária; f) Realização de estudos individuais, sectoriais ou territoriais sobre o comportamento dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários e a evolução dos sectores económicos em que se insere a sua actividade; g) Realização de perícias ou exames técnicos de qualquer natureza tendo em conta os fins do procedimento de inspecção tributária (observação das realidades tributárias, verificação do cumprimento das obrigações tributárias e prevenção das infracções tributárias); h) Informação sobre os pressupostos de facto dos benefícios fiscais que dependam de concessão ou reconhecimento da administração tributária, ou de direitos que o sujeito passivo, outros obrigados tributários e demais interessados invoquem perante aquela; i) Promoção, nos termos da lei, do sancionamento das infracções tributárias; j) Cooperação nos termos das convenções internacionais ou regulamentos comunitários, no âmbito da prevenção e repressão da evasão e fraude; l) Quaisquer outras acções de averiguação ou investigação de que a administração tributária seja legalmente incumbida.
6
Procedimento de Inspecção Tributária
III Princípios Legais do Procedimento de Inspecção Tributária
O procedimento de inspecção tributária deve obedecer aos princípios da verdade material, da proporcionalidade, do contraditório e da cooperação5. Estes princípios concretizam e desenvolvem os princípios constitucionais orientadores da actividade da administração pública e por consequência da administração tributária6. O procedimento inspectivo visa a descoberta da verdade material. Neste domínio deve a administração tributária adoptar oficiosamente todas as iniciativas julgadas adequadas à descoberta da verdade material7. A administração tributária não se deve refugiar em questões meramente formais, mas sim apurar factos, quer sejam favoráveis ou desfavoráveis ao sujeito passivo ou à própria administração tributária. A administração tributária deve ainda realizar todas as diligências que se mostrem necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material8. Os órgãos de inspecção tributária estão legalmente obrigados a actuar realizando as diligências necessárias à descoberta da verdade material, incluindo as diligências que não tenham sido requeridas pela pessoa ou entidade inspeccionada, mas que se revelem necessárias ao correcto apuramento da situação tributária dos contribuintes inspeccionados. Todavia, e apesar disso, a pessoa ou entidade inspeccionada também se encontra obrigada a cooperar com os órgãos inspectivos na busca da verdade material9. Nos casos em que a administração tributária se recuse a praticar diligências requeridas pela entidade inspeccionada ou se abstenha de praticar diligências que devese realizar e de que resulte a frustração do dever de apuramento da verdade material, ocorrerá um vício de procedimento que poderá determinar a anulação da decisão final. O respeito pelo princípio da proporcionalidade10, no âmbito do procedimento de inspecção tributária, implica para a administração tributária a obrigação de adoptar 5
Artigo 5.º do RCPIT.
6
Designadamente os previstos no artigo 266.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP)
7
Princípio da verdade material consagrado no artigo 6.º do RCPIT.
8
Princípio do inquisitório, previsto no artigo 58.º da Lei Geral Tributária (LGT) e artigo 56.º do Código do Procedimento Administrativo. 9
Cfr. Artigo 59.º, n.º 1 da LGT.
10
. II O princípio constitucional da proporcionalidade impede que os poderes conferidos à Administração Fiscal para suprir deficiências de escrita dos contribuintes de que resultem efeitos negativos para a Fazenda Pública sejam utilizados para permitir a cobrança de impostos em quantidades superiores às que presumivelmente resultariam da aplicação das normas de incidência e determinação da matéria colectável . Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 2ª Secção, de 07-10-1988, recurso n.º 22.801.
7
Procedimento de Inspecção Tributária apenas e só as acções que sejam adequadas e proporcionais aos objectivos de cada uma das inspecções tributárias em curso11. O acolhimento do princípio do contraditório, no âmbito do procedimento de inspecção tributária, implica para a administração tributária, a obrigação de permitir ao sujeito passivo ou obrigado tributário que esteja a ser inspeccionado a possibilidade de se pronunciar livremente e em prazo razoável, sobre os factos que lhe sejam imputados, confirmando-os ou refutando-os12. O princípio do contraditório é assegurado essencialmente pelo direito de audição prévia e pela possibilidade (e em alguns casos, pela obrigação) do sujeito passivo, Técnico Oficial de Contas e/ou Revisor Oficial de Contas estarem presentes ou serem chamados durante o acto de inspecção. Atendendo ao princípio da cooperação13, no decurso do acto inspectivo deverá haver um dever mútuo de cooperação e colaboração entre a inspecção tributária e os sujeitos passivos14. A recusa de colaboração e a oposição à inspecção tributária, quando ilegítimas, fazem incorrer o infractor em responsabilidade disciplinar, quando for caso disso, contra-ordenacional e criminal nos casos previstos na lei. Para o efeito devem os funcionários da inspecção tributária comunicar a recusa ou oposição ao dirigente máximo do serviço ou ao representante do Ministério Público competente15. No plano dos princípios o procedimento de inspecção tributária deve ainda conformar-se com os princípios do procedimento tributário consagrados no artigo 55.º da Lei Geral Tributária16. Os órgãos da administração pública, incluindo todos os órgãos da administração tributária, devem actuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos poderes e dos
11
Artigo 7.º do RCPIT. os funcionários devem agir de modo esclarecido e competente, tendo em vista garantir permanentemente que os direitos e interesses legítimos dos cidadãos são respeitados, que os deveres que lhes são impostos o são em termos justos e em medida adequada e proporcional aos objectivos a alcançar. Resolução do Conselho de Ministros n.º 18/93, de 17 de Março. 12
Artigo 8.º do RCPIT e artigo 8.º do Código do Procedimento Administrativo.
13
A violação pela administração tributária dos deveres procedimentais de colaboração e de actuação segundo as regras da boa fé, pode consistir em vício autónomo de violação de lei Diogo Leite de Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária, Comentada e Anotada, Lisboa, 1998. 14
Artigo 59.º da LGT, artigo 9.º do RCPIT, artigo 48.º do Código do Procedimento e do Processo Tributário, artigo 133.º do Código do IRS, artigo 124.º do Código do IRC, artigo 77.º do Código do IVA, artigo 7.º e 60.º do Código do Procedimento Administrativo. A falta de cooperação, quando ilegítima, pode constituir fundamento para aplicação de métodos indirectos, nos termos dos artigos 87.º e 88.º da LGT (artigo 10.º do RCPIT). 15
Artigo 32.º do RCPIT.
16
A administração tributária exerce as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários.
8
Procedimento de Inspecção Tributária limites que lhes estejam atribuídos e em conformidade com os fins para que esses mesmos poderes lhes foram conferidos17. A administração tributária está obrigada a pronunciar-se sobre todos os assuntos que sejam da sua competência, quando apresentados pelos sujeitos passivos ou por quem tiver interesse legítimo, por meio de reclamações, recursos, representações, exposições, queixas ou quaisquer outros meios admitidos por lei18. A administração tributária está obrigada a tratar de forma idêntica os contribuintes que estejam em situações semelhantes e a tratar de forma diferente os contribuintes que estejam em situações diferentes, naquela que é a expressão máxima do princípio da igualdade alcançando-se assim a proibição da discriminação dos cidadãos. A administração tributária, nas suas relações com os particulares, deve reger-se pelo princípio da igualdade, não podendo privilegiar, beneficiar, prejudicar, privar de qualquer direito ou isentar de qualquer dever nenhum contribuinte em razão de ascendência, raça, sexo, língua, território de origem, religião, convicções políticas, ideologias ou religiosas, situação económica ou condição social19. Outro princípio que deve nortear a actividade da administração tributária é o princípio da imparcialidade. Na averiguação das situações sujeitas a inspecção a administração tributária deve seguir sempre critérios de isenção. A administração tributária deve trazer ao processo todos os factos e provas mesmo que se mostrem adequados a demonstrar a falta de razão da administração tributária ou que venham a determinar vantagem para o particular20. O princípio da imparcialidade determina ainda que todas as actuações da administração tributária, no âmbito do procedimento inspectivo, tenham que decorrer de boa fé21. Outro princípio que deve nortear o procedimento inspectivo é o princípio da celeridade no âmbito do qual deve a administração tributária abster-se de praticar actos inúteis para o procedimento ou que o retardem desnecessariamente. O princípio da celeridade impede a administração tributária de praticar actos de inspecção que não tenham qualquer utilidade para o procedimento ou que o retardem desnecessariamente.
17
Artigo 3.º do Código do Procedimento Administrativo.
18
Princípio da decisão, previsto no artigo 56.º da LGT. Não existe o dever de decisão quando a administração tributária se tiver pronunciado há menos de dois anos sobre pedido do mesmo autor com idênticos objecto e fundamentos; ou tiver sido ultrapassado o prazo legal de revisão do acto tributário. 19
Artigo 5.º do Código do Procedimento Administrativo.
20
Do princípio da imparcialidade resulta que as relações entre a administração tributária e os contribuintes decorram em obediência a uma actuação recíproca de boa-fé. Artigo 59.º n.º 2 e 75.º n.º 1 da LGT. 21
Cfr. artigos 59.º n.º 2 e 75.º n.º 1 da LGT.
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Procedimento de Inspecção Tributária
IV Classificação do Procedimento de Inspecção Tributária
1. Classificação do procedimento de inspecção tributária quanto aos fins
O procedimento de inspecção tributária classifica-se, quanto aos fins, em22: Procedimento de comprovação e verificação; Procedimento de informação. O procedimento de comprovação e verificação visa a confirmação do cumprimento das obrigações dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários. O procedimento de informação visa o cumprimento dos deveres legais de informação ou de parecer dos quais a inspecção tributária seja legalmente incumbida. Sempre que os fins de prevenção tributária ou a assistência no cumprimento das obrigações acessórias ou de pagamento dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários o justifiquem, deve ser assegurado o seu acompanhamento permanente com vista a seguir de perto a situação tributária do contribuinte sempre tendo em conta os critérios gerais definidos pela inspecção tributária23. O acompanhamento permanente deverá ter uma componente essencialmente pedagógica por parte da inspecção tributária.
2. Classificação do procedimento de inspecção tributária quanto ao lugar da realização
Quanto ao lugar da realização, o procedimento de inspecção pode classificar-se em24: Procedimento Interno; Procedimento Externo.
22
Artigo 12.º do RCPIT.
23
Artigo 12.º, n.º 2 do RCPIT.
24
Artigo 13.º do RCPIT.
10
Procedimento de Inspecção Tributária O procedimento será interno quando os actos de inspecção se efectuem exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise da forma e da coerência dos documentos. O procedimento será externo quando os actos de inspecção se efectuem, total ou parcialmente, nas instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso. O procedimento só será interno desde que os actos de inspecção sejam todos eles praticados exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise formal e de coerência dos documentos. Caso contrário, será caracterizado como procedimento externo. Sempre que o procedimento de inspecção vise a análise ou verificação da contabilidade, dos livros de escrituração ou outros documentos relacionados com a actividade da entidade inspeccionada, o procedimento de inspecção é externo e realizase, em regra, nas instalações ou dependências onde aqueles elementos estejam ou devam estar localizados. Note-se que, no caso de procedimento de inspecção externo, este poderá realizarse ainda nas instalações do Técnico Oficial de Contas responsável pela contabilidade, quando os livros de escrita ou demais documentos de suporte dos registos contabilísticos da entidade inspeccionada se encontrarem aí centralizados.
3. Classificação do procedimento de inspecção tributária quanto ao âmbito e extensão
Quanto ao âmbito e extensão, o procedimento de inspecção pode ser25: Procedimento Geral ou polivalente; Procedimento Parcial ou univalente. O procedimento de inspecção será geral ou polivalente quando a inspecção tiver por objecto a situação tributária global ou o conjunto dos deveres tributários dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários. O procedimento de inspecção será parcial ou univalente quando a inspecção abranja apenas algum ou alguns tributos, algum ou alguns, deveres dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários.
25
Artigo 14.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto.
11
Procedimento de Inspecção Tributária O procedimento de inspecção será ainda parcial quando se limite à consulta e recolha de documentos ou elementos, à verificação de sistemas informáticos dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários e ao controlo de bens em circulação. A definição do âmbito e extensão do procedimento inspectivo constituem limites à prática dos actos inspectivos, delimitando o objecto do procedimento e balizando os poderes inspectivos dos respectivos funcionários encarregues de cada inspecção em concreto. A extensão reporta-se ao período ou períodos de tributação inspeccionados de acordo com o âmbito definido para a inspecção. No decurso da acção inspectiva os fins e a extensão do procedimento de inspecção podem ser alterados mediante despacho fundamentado da entidade que tiver ordenado o acto inspectivo26. A lei permite que os fins da inspecção27 e a extensão do procedimento de inspecção possam ser alterados após o início da acção inspectiva por iniciativa da administração tributária ou a solicitação do próprio sujeito passivo ou demais obrigados tributários, caso invoquem motivos atendíveis. Toda e qualquer modificação da extensão do procedimento deverá obedecer aos seguintes requisitos28: Ser precedida de um despacho fundamentado, de direito e de facto, contendo quais as razões que justificam a alteração; Deverá ser autorizada pelo mesmo órgão administrativo que ordenou o procedimento que é objecto de modificação; Deverá conter, em termos gerais, todas as menções exigíveis para os actos administrativos, já que não se trata de um mero despacho interno; Deverá ser notificada ao contribuinte inspeccionado.
A notificação do despacho que ordenou a alteração da extensão do procedimento inspectivo torna-se de particular importância, pois que a partir desse momento o contribuinte deixa de poder opor-se à realização dos respectivos actos inspectivos.
26
Artigo 15.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto.
27
Procedimento de comprovação e verificação e o procedimento de informação.
28
Aliás à semelhança do que está previsto no artigo 123.º do Código do Procedimento Administrativo.
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Procedimento de Inspecção Tributária
V Competência para a Realização do Acto Inspectivo
Em matéria de competência para a realização de actos de inspecção importa, numa primeira fase, definir quais os serviços competentes para a prática de actos de inspecção tributária e, numa segunda fase, definir o âmbito das garantias da administração no exercício da função inspectiva.
V.1
Competência material e territorial para o exercício da função inspectiva
São competentes para a prática dos actos de inspecção tributária os seguintes serviços da Direcção-Geral dos Impostos29: As Direcções de Serviços de Inspecção Tributária; Os Serviços Periféricos Regionais; Os Serviços Periféricos Locais. As Direcções de Serviços de Inspecção Tributária têm competência relativamente aos sujeitos passivos e demais obrigados tributários que devam ser inspeccionados pelos serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos. Têm competência em todo o território nacional. Os Serviços Periféricos Regionais têm competência relativamente aos sujeitos passivos e demais obrigados tributários com domicílio ou sede fiscal na sua área territorial. Os Serviços Periféricos Locais têm competência relativamente aos sujeitos passivos e demais obrigados tributários com domicílio ou sede fiscal na sua área territorial30. 29
Artigo 16.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto.
30
No caso da administração tributária não dispor de órgãos periféricos locais, serão competentes os órgãos periféricos regionais da administração tributária do domicílio ou sede do contribuinte ou da situação dos bens ou da liquidação. Se a administração tributária não dispuser de órgãos periféricos regionais, as competências atribuídas a esses órgãos serão exercidas pelo dirigente máximo do serviço ou por aquele em quem ele delegar essas competências, artigo 10.º n.º 3 e 4 do CPPT. São competências dos serviços da administração tributária (artigo 10.º, n.º 1 do CPPT): a) Liquidar e cobrar ou colaborar na cobrança dos tributos, nos termos das leis tributárias; b) Proceder à revisão oficiosa dos actos tributários; c) Decidir as petições e reclamações e pronunciar-se sobre os recursos hierárquicos apresentados pelos contribuintes; d) Reconhecer isenções ou outros benefícios fiscais e praticar, nos casos previstos na lei, outros actos administrativos em matéria tributária; e) Receber e enviar ao tribunal tributário competente as petições iniciais nos processos de impugnação judicial que neles sejam entregues e dar cumprimento ao disposto nos artigos 111.º e 112.º do CPPT; f) Instaurar os processos de execução fiscal e realizar os actos a estes respeitantes, salvo os previstos no n.º 1 do artigo 151.º do CPPT;
13
Procedimento de Inspecção Tributária As regras de atribuição de competência territorial da administração tributária não são absolutas já que o artigo 17.º do RCPIT31 estabelece uma extensão dessas competências a áreas territoriais diversas, mediante decisão fundamentada do dirigente do serviço a cargo do procedimento de inspecção. Exercem funções no âmbito do procedimento de inspecção tributária32: O pessoal técnico da área da inspecção tributária; Os funcionários de outras categorias técnicas da Direcção-Geral dos Impostos; Outros funcionários designados pelo director-geral dos impostos para realizarem ou participarem em acções de inspecção tributária. O pessoal técnico da área da inspecção tributária integra, designadamente, os inspectores tributários, os técnicos economistas e juristas e outros funcionários das carreiras do grupo da administração tributária designados pelo dirigente do serviço. Os funcionários de outras categorias técnicas da Direcção-Geral dos Impostos integram, designadamente os especialistas em auditoria informática e engenheiros, quando prestem apoio especializado à actividade de inspecção tributária. Resulta pois, que só podem exercer funções no âmbito do procedimento de inspecção tributária quem for funcionário da Direcção-Geral dos Impostos. Daí que, não obstante o artigo 3.º do RCPIT, permitir a intervenção de entidades privadas para a realização de estudos ou monografias, exames ou perícias de qualquer natureza, estes nunca são susceptíveis de constituir actos de inspecção. Os funcionários da inspecção tributária, além das incompatibilidades de âmbito genérico aplicáveis aos funcionários da Direcção-Geral dos Impostos, estão sujeitos a incompatibilidades específicas a saber33: Realizar ou participar nos procedimentos de inspecção que visem a confirmação ou averiguação da situação tributária do seu cônjuge, parente ou afim em linha recta ou colateral até ao 3.º grau, ou qualquer pessoa com quem vivam ou tenham vivido em economia comum; Realizar ou participar nos procedimentos de inspecção que visem a confirmação ou averiguação da situação tributária de quaisquer entidades em que as pessoas antes mencionadas possuam participação social ou desempenhem funções como técnicos oficiais de contas ou responsáveis
g) h) i) j)
Cobrar as custas dos processos e dar-lhe o destino legal; Efectuar diligências que lhe sejam ordenadas ou solicitadas pelos tribunais tributários; Cumprir deprecadas; Realizar os demais actos que lhes sejam cometidos por lei.
31
Na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto.
32
Artigo 19.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto.
33
Artigo 20.º do RCPIT.
14
Procedimento de Inspecção Tributária pela escrita, revisores oficiais de contas, gerentes, directores ou administradores; Realizar ou participar nos procedimentos de inspecção que visem a confirmação ou averiguação da situação tributária de sociedades em que detenham participação no capital social; Realizar ou participar nos procedimentos de inspecção que visem a confirmação ou averiguação da situação tributária de entidades em que tenham prestado serviços nos cinco anos anteriores ao do início da acção de inspecção; Realizar ou participar nos procedimentos de inspecção que visem a confirmação ou averiguação da situação tributária de entidades que contra si tenham intentado acção judicial antes do início da inspecção; Realizar ou participar em acções de inspecção visando a prestação de informações em matéria de facto em processos de reclamação, impugnação ou recurso de quaisquer actos da administração tributária em que tenham tido intervenção; O funcionário deve comunicar o impedimento ao seu superior hierárquico no prazo de três dias úteis contados após a nomeação para o procedimento de inspecção34. É vedado aos funcionários da Direcção-Geral dos Impostos35: Exercer advocacia ou qualquer espécie de procuradoria, com excepção dos juristas do Centro de Estudos Fiscais e da Consultadoria Jurídica em causas não fiscais; Exercer qualquer ramo de comércio ou indústria, salvo em casos justificados, autorizados pelo Ministério das Finanças e do Plano; Desempenhar, sem autorização do Ministro das Finanças e do Plano, qualquer actividade pública ou privada susceptível de comprometer a isenção exigida no exercício das funções, designadamente quando essas actividades se relacionarem com aquelas, ainda que desempenhas por interposta pessoa. No decurso do procedimento de inspecção tributária devem os funcionários actuar com especial prudência, cortesia, serenidade e discrição36, a que acresce o dever de 34
Em matéria de incompatibilidades é plenamente aceitável e justificável a aplicação do regime do artigo 48.º do Código do Procedimento Administrativo que estabelece que o titular de um órgão ou agente deve pedir dispensa de intervir no procedimento quando ocorra circunstância pela qual possa razoavelmente suspeitar-se da sua isenção ou da rectidão da sua conduta. Também não poderemos perder de vista os casos de impedimento previstos no artigo 44.º do Código do Procedimento Administrativo, aplicáveis aos funcionários da administração pública em geral. 35
Artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 363/78, de 28 de Novembro.
36
Os funcionários devem usar da maior cortesia no seu relacionamento com os cidadãos e estabelecer com eles uma relação que, presumindo-se de boa fé, contribua para garantir com correcção e serenidade o exercício dos seus direitos e o cumprimento dos seus deveres. Ao mesmo tempo, os funcionários devem
15
Procedimento de Inspecção Tributária guardar rigoroso sigilo sobre os factos relativos à situação tributária do sujeito passivo ou de quaisquer entidades e outros elementos de natureza pessoal ou confidencial de que tenham conhecimento no exercício ou por causa das suas funções37. É legítima a oposição do contribuinte à acção de inspecção efectuada por órgão ou por órgãos material ou territorialmente incompetentes da administração tributária 38.
V.2 Garantias da administração no exercício da função inspectiva Para o exercício da função inspectiva no âmbito do procedimento de inspecção, a administração tributária faz uso de determinados direitos e prerrogativas, sem prejuízo do respeito pelo dever de sigilo e pelos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados39. Entre os direitos e prerrogativas de que a administração pode fazer uso destacamse: a) Acesso às instalações ou locais onde possam existir elementos relacionados com a actividade do sujeito passivo; b) Examinar e visar os livros de escrita e os registos de contabilidade, bem como quaisquer outros elementos relacionados com a actividade do sujeito passivo; c) Aceder, consultar e testar o sistema informático dos sujeitos passivos; d) Solicitar a colaboração de quaisquer entidades públicas; e) Solicitar a colaboração de terceiros com quem o sujeito passivo mantenha relações económicas; f) Requisitar documentos de notários, conservadores ou outras entidades oficiais; g) Utilizar as instalações do sujeito passivo quando necessárias; h) Apreender ou fotocopiar elementos de escrita ou outros, sempre que necessário; i) Proceder à selagem das instalações, quando necessário;
assegurar aos cidadãos o apoio, a informação ou o esclarecimento que lhes seja solicitado sobre qualquer assunto. Resolução do Conselho de Ministros n.º 18/93, de 17 de Março. 37
Artigo 21.º e 22.º do RCPIT.
38
António Lima Guerreiro, Lei Geral Tributária, Lisboa 2000.
39
Artigo 28.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto. Esses direitos e prerrogativas estão previstos no artigo 63.º da Lei Geral Tributária, nos artigos 33.º e 34.º do Decreto-Lei n.º 363/78, de 28 de Novembro e no artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 249/98 de 11 de Agosto.
16
Procedimento de Inspecção Tributária j) Proceder ao arrombamento de dependências, cofres ou móveis que contenham documentos necessários à realização da inspecção; k) Promover a punição, como crime de desobediência, da recusa de colaboração do sujeito passivo; l) Usar arma de defesa, estando dispensado de licença de uso e porte de arma; m) Prender em flagrante delito os indivíduos que os ofendam no exercício das suas funções, bem como os que tenham praticado crimes fiscais; n) Requisitar às autoridades policiais e administrativas a colaboração necessária; o) Ingressar ou transitar em quaisquer recintos públicos, ainda que a admissão esteja sujeita ao pagamento de entrada. Durante a realização de uma inspecção tributária, o funcionário que para ela tiver sido designado tem competência para proceder ao levantamento de autos de notícia sempre que verifique directa e pessoalmente a existência de factos constitutivos da prática de contra-ordenações tributárias. No procedimento de inspecção tributária é admitida a prática de actos materiais de recolha de prova expressamente previstos nos códigos e leis tributárias, tendo sempre por limite a necessidade e a adequação ao procedimento de inspecção no âmbito do qual ocorrem40. Os funcionários da inspecção tributária que sejam arguidos em processo judicial por actos cometidos ou ocorridos no exercício ou por causa das suas funções têm direito a ser assistidos por advogado, indicado pelo dirigente máximo do serviço, ouvido o interessado, retribuído a expensas do Estado. No caso de condenação judicial do funcionário este deve reembolsar o Estado das importâncias eventualmente dispendidas41. Estas garantias não são garantias pessoais mas sim garantias que a lei entende como necessárias ao desempenho da função inspectiva. O funcionário só estará protegido por estas garantias no âmbito e em cumprimento das suas funções inspectivas e nunca fora delas.
40
Artigo 29.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto. Os actos materiais de recolha da prova são nomeadamente os previstos no artigo 63.º da LGT, nos artigos 124.º, 125.º e 126.º do Código do IRS, no artigo 108.º do Código do IRC, nos artigos 77.º, 78.º e 79.º do Código do IVA, no Decreto-Lei n.º 45/89, de 11 de Fevereiro, e no Decreto-Lei n.º 363/78, de 28 de Novembro. 41
Artigo 33.º do RCPIT.
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Procedimento de Inspecção Tributária
V.3
Medidas cautelares tomadas no âmbito do procedimento de inspecção
Ao longo do procedimento de inspecção tributária podem ser adoptadas medidas cautelares com vista à obtenção e conservação da prova de factos ou valores com relevância tributária42. As medidas cautelares43 podem consistir: Na apreensão dos elementos de escrituração ou quaisquer outros elementos, incluindo os suportes informáticos, comprovativos da situação tributária do sujeito passivo ou de terceiro44; Na selagem de quaisquer instalações, sempre que se mostre necessário à plena eficácia da acção inspectiva e ao combate da fraude fiscal45; Visar, sempre que conveniente, os livros e demais documentos. A par das medidas cautelares de natureza administrativa, são admitidas ainda no decurso do procedimento de inspecção tributária providências cautelares de natureza judicial, como sejam o arrolamento e o arresto46. O arresto47 e o arrolamento48 são admissíveis sempre que haja justo receio de frustração dos créditos fiscais, de extravio ou deterioração de documentos conexos com o cumprimento de obrigações tributárias. Para efeitos da propositura das providências cautelares de arresto e arrolamento a administração tributária deverá: Elaborar informação contendo a descrição dos factos demonstrativos do tributo e da sua provável existência;
42
Artigo 30.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto.
43
As medidas cautelares adoptadas pela administração tributária podem ser objecto de impugnação nos termos dos artigos 143.º e 144.º do Código de Procedimento e do Processo Tributário. 44
Caso em que deverão ser devidamente fundamentadas com a justificação da sua adequação ao fim a que se destinam e deverá ser lavrado o respectivo termo, sendo autenticadas as fotocópias ou duplicados dos elementos apreendidos. 45 Caso em que deverão ser devidamente fundamentadas com a justificação da sua adequação ao fim a que se destinam. As instalações seladas não deverão conter bens, documentos ou registos indispensáveis ao normal exercício da actividade da empresa, nomeadamente bens comercializáveis perecíveis no período em que presumivelmente a selagem se mantiver. Se possível os elementos a selar deverão ser reunidos em local que não perturbe a actividade empresarial ou profissional, em divisão fixa ou contentor e fechadas com dispositivo inviolável, designadamente através de fio ou fita envolvente lacrada nas extremidades com o selo do serviço responsável pela inspecção. 46
Artigo 31.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto.
47
O arresto encontra-se regulado nos artigos 136.º e seguintes do Código de Procedimento e do Processo Tributário e nos artigos 406.º a 411.º do Código do Processo Civil. 48
O arrolamento encontra-se regulado nos artigos 140.º e 142.º do Código de Procedimento e do Processo Tributário e nos artigos 421.º a 424.º do Código do Processo Civil.
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Procedimento de Inspecção Tributária Fundamentar do fundado receio de diminuição das garantias de cobrança do tributo; Elaborar uma relação de bens suficientes para garantir a cobrança da dívida e acrescido, com a indicação do valor, localização e identificação de registo predial ou outras menções que permitam concretizar a descrição. No caso de arrolamento de bens ou documentos a informação deve conter: A prova sumária do direito relativo aos bens ou documentos que se pretendem arrolar; e Os factos que fundamentam o receio de extravio ou destruição.
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Procedimento de Inspecção Tributária
VI Actos de Inspecção
VI.1 Local dos actos de inspecção Sempre que o procedimento de inspecção tenha por objectivo a verificação da contabilidade, dos livros de escrituração ou outros documentos relacionados com a actividade da entidade inspeccionada, devem os actos de inspecção ser realizados nas instalações ou dependências onde esses elementos estejam ou devam estar localizados49. Os actos de inspecção podem, no entanto, ser realizados noutro local, quando tal for solicitado pelo sujeito passivo ou demais obrigados tributários, desde que não haja prejuízo para o procedimento de inspecção. Os actos de inspecção podem, ainda, ser realizados nos serviços da administração tributária da área do domicílio ou sede fiscal da entidade inspeccionada, sempre que esta não disponha de instalações ou dependências para o exercício da sua actividade e não indique outro local para a realização do procedimento de inspecção. Resulta pois que o procedimento de inspecção externo deve ser realizado, em regra, nas instalações ou dependências da entidade inspeccionada, só sendo possível realizar actos de inspecção em local diferente, se houver acordo entre a entidade inspeccionada e a inspecção tributária. Na prática tem sucedido, em alguns casos, que no procedimento inspectivo ocorrem actuações dilatórias por parte dos obrigados fiscais bem como procedimentos menos correctos e até, por vezes, abusivos por parte dos serviços fiscais. É o caso de alguns contribuintes que usam de expedientes especificamente dirigidos a atrasar o procedimento inspectivo e a evitar que os inspectores tenham acesso aos elementos de escrita e às instalações onde exercem a sua actividade, bem como aquelas situações em que a inspecção usa o mecanismo das notificações para fazerem os contribuintes comparecer nos serviços de inspecção quando, em boa verdade, deveriam ser os inspectores a deslocar-se às instalações ou dependências dos contribuintes onde estes exercem a sua actividade. Independentemente dos pedidos aos contribuintes de informações ou de elementos que possam ser satisfeitos pelo seu envio aos serviços sem a necessidade de contacto pessoal, as inspecções externas a empresas ou trabalhadores independentes que disponham de instalações para o exercício da sua actividade, devem ser realizadas neste local, pelo que o inspector ou a equipa de inspecção devem aí comparecer50. O conceito de instalação ou dependências para o exercício da actividade terá que ser entendido num sentido mais substancial. É o que se passa com aqueles contribuintes que sendo pessoas singulares usam parte do seu domicílio fiscal (residência) para aí exercerem a sua actividade. 49
Artigo 34.º do RCPIT.
50
Conforme resulta, aliás, do Relatório da Comissão para o Desenvolvimento da Reforma Fiscal, de 30 de Abril de 1996, capítulo 4.
20
Procedimento de Inspecção Tributária Nestes casos surge a problemática de saber determinar com exactidão os limites que separam a reserva da vida privada do contribuinte, consubstanciada no espaço íntimo da sua residência e a parte dessa mesma residência que estando afecta ao exercício de uma actividade comercial, industrial, agrícola ou profissional passam a integrar um espaço de acesso à inspecção tributária no âmbito das garantias da administração tributária. Nesta matéria deverá ser afastodo o regime previsto no n.º 4 do artigo 34.º do RCPIT, segundo o qual os actos de inspecção podem realizar-se no serviço da administração tributária da área do domicílio fiscal do contribuinte, para se aplicar o regime regra previsto no n.º 1 do mesmo artigo, ou seja, a inspecção deverá decorrer nas instalações do sujeito passivo. Por fim saliente-se que a liberdade de circulação e de acesso dos funcionários da inspecção tributária está limitada aos locais onde se encontrem ou possam encontrar elementos relacionados com a contabilidade e com o exercício da actividade do contribuinte.
VI.2 Horário dos actos de inspecção
Os actos de inspecção deverão ser realizados dentro do horário normal de funcionamento da actividade empresarial ou profissional51. Os actos de inspecção só poderão ser praticados em horário diferente mediante acordo entre a entidade inspeccionada e a inspecção tributária. Na falta de acordo, a inspecção só poderá praticar actos de inspecção tributária fora do horário normal de funcionamento da actividade empresarial ou profissional se para tal estiver munida de autorização do tribunal da comarca competente. Quando os actos de inspecção visem o controlo de bens em circulação, estes podem ser realizados sem qualquer observância de horário. A entidade inspeccionada não poderá limitar ou restringir o horário de permanência nas instalações dos funcionários da inspecção tributária, sempre que esta ocorra no horário normal de funcionamento da sua actividade.
51
Artigo 35.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto. De acordo com o Relatório da Comissão para o Desenvolvimento da reforma Fiscal, de 30 de Abril de 1996, capítulo 4, a inspecção será realizada dentro do horário normal de funcionamento da actividade empresarial ou profissional, entendendo-se como tal o normalmente praticado no sector de actividade em que o sujeito passivo se insere. A realização da inspecção fora desse horário, a não ser que haja acordo prévio do contribuinte, deverá depender de despacho nesse sentido, de funcionário com determinada posição mínima na hierarquia da Administração Fiscal, que será notificado ao interessado.
21
Procedimento de Inspecção Tributária
VII Fases do Procedimento de Inspecção
O procedimento de inspecção integra várias fases até à feitura do relatório final de inspecção, o qual terá que ser comunicado ao contribuinte inspeccionado52.
VII.1
Início do procedimento de inspecção
O procedimento inspectivo poderá ser iniciado até ao termo do prazo de caducidade do direito à liquidação dos tributos53. O início do procedimento externo de inspecção deve ser notificado ao sujeito passivo com uma antecedência mínima de cinco dias54. A notificação para início do procedimento faz-se por carta-aviso, a qual deverá conter os seguintes elementos: Identificação do sujeito passivo ou obrigado tributário que vai ser inspeccionado; e O âmbito e extensão da inspecção a realizar.
52
Artigos 36.ºa 63.º do RCPIT e artigo 57.º e 69.º da LGT.
53
Artigo 36.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto. O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de 4 anos. Será de 3 anos no caso de erro evidenciado na declaração do sujeito passivo ou de utilização de métodos indirectos por motivo da aplicação à situação tributária do sujeito passivo dos indicadores objectivos previstos na Lei Geral Tributária. No caso de reporte de prejuízos ou de qualquer outra dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o exercício em que foi exercido esse direito. Artigo 45.º da LGT. 54
Artigo 49.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto e artigo 69.º da LGT. O âmbito e extensão do acto inspectivo encontram-se regulados nos artigos 14.º e 15.º do RCPIT. Poderá não haver lugar à notificação do início do procedimento de inspecção quando: a) O procedimento vise apenas a consulta, recolha ou cruzamento de documentos destinados à confirmação da situação tributária do sujeito passivo ou obrigado tributário; b) O fundamento do procedimento for a participação ou denúncia com indícios de fraude fiscal; c) O objecto do procedimento seja a inventariação de bens ou valores em caixa, testes de amostragem ou quaisquer actos necessários e urgentes para aquisição e conservação da prova; d) O procedimento consistir no controlo de bens em circulação e da posse dos respectivos documentos de transporte; e) O procedimento se destine a averiguar o exercício de actividade por sujeitos passivos não registados; f) A notificação antecipada do procedimento de inspecção possa ser, por qualquer motivo devidamente fundamentado, susceptível de comprometer o seu êxito. Nestes casos a carta aviso e o respectivo anexo serão entregues no momento da prática dos actos de inspecção.
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Procedimento de Inspecção Tributária A carta-aviso deverá fazer-se acompanhar de um anexo contendo os direitos, deveres e garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários no procedimento de inspecção. O procedimento externo de inspecção depende da credenciação dos funcionários que, para o efeito, deverão estar munidos de ordem de serviço ou de um despacho do superior hierárquico que determinou a realização do acto inspectivo55.
A ordem de serviço deverá conter os seguintes elementos: O número de ordem e data de emissão; Identificação do serviço responsável pelo procedimento de inspecção; A identificação do funcionário ou funcionários incumbidos da prática dos actos de inspecção; A identificação do chefe de equipa; A identificação da entidade a inspeccionar; O âmbito e extensão da acção de inspecção.
Não há lugar à emissão de ordem de serviço quando as acções de inspecção visem: A consulta, recolha e cruzamento de elementos; O controlo de bens em circulação; O controlo de sujeitos passivos não registados.
Nestes casos será emitido um despacho que deverá conter os seguintes elementos; O número de ordem e data de emissão; Identificação do serviço responsável pelo procedimento de inspecção; A identificação do funcionário ou funcionários incumbidos da prática dos actos de inspecção; A identificação do chefe de equipa; A identificação da entidade a inspeccionar; e
55
Artigo 46.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto.
23
Procedimento de Inspecção Tributária Os objectivos do procedimento.
O procedimento inspectivo externo inicia-se com a assinatura, pelo sujeito passivo ou obrigado tributário, da ordem de serviço ou do despacho que o determinou, devendolhe ser entregue uma cópia56. A ordem de serviço ou o despacho poderão ser assinados pelo técnico oficial de contas ou qualquer empregado ou colaborador presente, no caso do sujeito passivo ou obrigado tributário ou seu representante, não se encontrarem no local. A notificação do início do procedimento de inspecção efectiva-se assim com a assinatura da ordem de serviço ou do despacho que determinou o procedimento57. A recusa da assinatura da ordem de serviço ou do despacho não obsta ao início do procedimento de inspecção. No início do procedimento inspectivo o sujeito passivo ou o obrigado tributário devem designar a pessoa que ficará encarregue de assegurar e coordenar os seus contactos com a administração tributária58.
VII.2
Prazo do procedimento de inspecção
O procedimento de inspecção é contínuo e deve ser concluído no prazo de seis meses contados da data de assinatura da ordem de serviço pelo sujeito passivo ou obrigado tributário59. Este prazo, no caso de procedimento de inspecção geral ou polivalente, poderá ser ampliado por mais dois períodos de três meses60 nos seguintes casos: Sempre que estejamos perante situações tributárias de especial complexidade; 56
Artigo 51.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto.
57
No procedimento externo de inspecção as notificações devem ser pessoais, artigo 38.º do RCPIT.
58
Artigo 52.º do RCPIT.
59
Artigo 36.º n.º 2 do RCPIT. Os prazos procedimentais contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil (artigo 57.º n.º 3 da LGT e artigo 20.º n.º 1 do CPPT). O prazo começa a contar-se no dia seguinte ao da ocorrência do evento, ainda que recaia num sábado, domingo ou feriado. Este prazo conta-se continuadamente e não se suspende aos sábados, domingos e feriados, nem nas férias judiciais. Se o termo do prazo ocorrer a um sábado, domingo, feriado ou num dia em que os serviços estiverem encerrados, o último dia do prazo passa para o primeiro dia útil seguinte. 60
Artigo 36.º n.º 3 do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto.
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Procedimento de Inspecção Tributária Quando, na acção de inspecção, se apure a ocultação dolosa de factos ou rendimentos; Nos casos em que a administração tributária tenha a necessidade de recorrer a instrumentos de assistência mútua e cooperação administrativa internacional; Em resultado de outros motivos de natureza excepcional, mediante autorização fundamentada do director-geral dos impostos. Esta prorrogação da acção inspectiva terá que ser notificada à entidade inspeccionada com a indicação da data previsível do termo do procedimento61. O prazo do procedimento inspectivo pode ainda ser objecto de suspensão, no caso de prioridades excepcionais e inadiáveis da administração tributária reconhecidas em despacho fundamentado do dirigente do serviço62. Esta suspensão não prejudica os prazos legais de conclusão do procedimento, ou seja, o prazo de seis meses prorrogável por dois períodos de três meses. No caso de suspensão, o reinício do procedimento inspectivo deverá ser notificado ao sujeito passivo ou obrigado tributário. O prazo para conclusão do procedimento de inspecção suspende-se, ainda, quando haja lugar a processo especial de derrogação do segredo bancário em que o contribuinte interponha recurso com efeito suspensivo da decisão da administração tributária que determine o acesso à informação bancária, ou a administração tributária solicite judicialmente acesso a essa informação, mantendo-se a suspensão até ao trânsito em julgado da decisão em tribunal63.
61
Artigo 36.º, n.º 4 do RCPIT.
62
Artigo 53.º do RCPIT.
63
Artigo 36.º, n.º 5 do RCPIT, aditado pelo n.º 1 do artigo 44.º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, OE para 2003. Nos termos do artigo 63.º-B da LGT, a administração tributária tem o poder de aceder directamente aos documentos bancários sempre que se verifique a recusa da sua exibição ou de autorização para consulta: a) Quando se tratem de documentos de suporte de registos contabilísticos de sujeitos passivos que se encontrem sujeitos a contabilidade organizada; b) Quando o contribuinte usufrua de benefícios fiscais ou regimes fiscais privilegiados, havendo necessidade de controlar os respectivos pressupostos e apenas para esse efeito. A administração tributária tem também o poder de aceder a todos os documentos bancários, exceptuando-se as informações para justificar o recurso ao crédito, nas situações de recusa de exibição daqueles documentos: a) Quando se verificar a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, nos termos do artigo 88.º da LGT, bem como quando estejam verificados os pressupostos para o recurso à avaliação indirecta; b) Quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastem significativamente, para menos, sem razão justificada dos padrões de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestações de riqueza evidenciadas pelo sujeito passivo, nos termos do artigo 89.º-A da LGT; c) Quando existam indícios da prática de crime doloso em matéria tributária; d) Quando seja necessário, para fins fiscais, comprovar a aplicação de subsídios públicos de qualquer natureza. Nestes casos as decisões da administração tributária são passíveis de recurso judicial com efeito suspensivo.
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Procedimento de Inspecção Tributária
VII.3
Conclusão do procedimento de inspecção
No decurso do procedimento externo de inspecção o(s) técnico(s) devidamente credenciado(s) encarregue(s) de executar o acto inspectivo vai(ão) recolhendo elementos e analisando os factos relacionados com a situação tributária do contribuinte que depois vão reflectir-se no relatório final e fundamentarão as correcções eventualmente propostas64. Recolhidos os elementos referidos será notificado ao contribuinte a conclusão da acção inspectiva externa, mediante uma nota de diligência que será assinada pelo sujeito passivo ou obrigado tributário65. Após a assinatura da nota de diligência e no caso do acto inspectivo ter dado origem a actos tributários ou em matéria tributável desfavoráveis à entidade inspeccionada66, os serviços de inspecção terão 10 dias, após a assinatura da nota de diligência, para notificar o contribuinte do projecto de conclusões do relatório com a indicação desses actos e respectiva fundamentação67. A notificação deverá fixar um prazo entre 10 e 15 dias para que a entidade inspeccionada se pronuncie sobre o referido projecto de conclusões68. A notificação para exercício do direito de audição prévia deverá fazer-se por carta regista69.
Há lugar a audição prévia dos contribuintes70: As decisões da administração tributária que autorizem aceder a documentos bancários sujeitos a sigilo compete ao director-geral dos Impostos ou ao director-geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo ou seus substitutos legais, sem possibilidade de delegação. Também aqui e dada a importância de que reveste o acesso a dados que integram matérias sujeitas a segredo bancário se exige a correspondente fundamentação com a expressa menção dos motivos concretos que justificam a decisão da administração tributária. 64
Artigos 55.º a 59.º do RCPIT e 63.º da LGT.
65
Artigo 61.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto. Os actos de inspecção consideram-se concluídos com a assinatura da nota de diligência. A nota de diligência tem por objectivo a definição da data de conclusão dos actos de inspecção. No caso de despacho com vista à consulta, recolha e cruzamento de elementos; ao controlo de bens em circulação; e controlo de sujeitos passivos não registados, a nota de diligência terá que, obrigatoriamente, indicar as tarefas realizadas. 66
Poder-se-á entender por actos desfavoráveis à entidade inspeccionada, todos os actos que possam ser susceptíveis de, imediata ou mediatamente, modificar a sua situação tributária, quer alterando os seus direitos tributários, quer os seus deveres tributários. 67
Direito de audição prévia. Artigo 60.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto e artigo 60.º da LGT. 68
Artigo 60.º n.º 2 do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto.
69
Artigo 38.º, n.º 3 do Código de Procedimento e do Processo Tributário, na redacção dada pelo n.º 1 do artigo 41.º da Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro, que aprovou o Orçamento de Estado para 2005, e artigo 60.º, n.º4 da LGT.
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Procedimento de Inspecção Tributária Nas decisões que se fundamentem em factos não relevados nos pedidos, petições, reclamações ou recursos hierárquicos, apresentados pelos contribuintes; Nas decisões que se fundamentem em elementos que já deveriam ter sido submetidos a audiência prévia, mas em que esta formalidade não foi cumprida; Nas decisões em que o órgão com competência para decidir altera o sentido do projecto de decisão e respectiva fundamentação, anteriormente submetida a audiência prévia; Nas decisões em que o órgão com competência para decidir altera o projecto de decisão favorável ao contribuinte.
Não há lugar a audição prévia dos contribuintes quando71: A liquidação do imposto se efectuar com base na declaração do contribuinte; A decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição for totalmente favorável ao contribuinte; A administração tributária se tenha pronunciado há menos de dois anos sobre o pedido do mesmo autor com idênticos objectivos e fundamentos; Tiver sido ultrapassado o prazo legal de revisão do acto tributário; Se verifiquem as situações previstas no n.º 1 do artigo 103.º do CPA72.
Há dispensa de audição prévia quando73: A administração tributária, apenas, aprecie factos que lhe foram dados pelo contribuinte, limitando-se na sua decisão a fazer a interpretação das normas legais aplicáveis ao caso;
70 71 72
Artigo 60.º n.º 1 da LGT e Circular 13, de 08-07-1999, da Direcção de Serviços de Justiça Tributária. Artigo 60.º n.º 2 da LGT e Circular 13, de 08-07-1999, da Direcção de Serviços de Justiça Tributária. Ou seja: a) Quando a decisão seja urgente; b) Quando seja razoável de prever que a diligência possa comprometer a execução ou utilidade da decisão; c) Quando o número de interessados a ouvir seja de tal forma elevado que a audiência se torne impraticável, devendo nesse caso proceder-se a consulta pública, quando possível, pela forma mais adequada.
73
Artigo 60.º n.ºs 2 e 3 da LGT; artigo 103.º, n.º 2 do CPA e Circular 13, de 08-07-1999, da Direcção de Serviços de Justiça Tributária.
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Procedimento de Inspecção Tributária A administração tributária actue, exclusivamente, no âmbito de poderes vinculados; A administração tributária pratique um acto com base em factos já submetidos, noutra fase do procedimento, a audiência dos contribuintes. Importa ainda deixar claro que em matéria contra-ordenacional resultante da punição de infracções tributárias não há necessidade de audição prévia uma vez que esta matéria se encontra regulada pelo Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei 15/2001, de 5 de Junho. A verdade é que a audição do sujeito passivo nesta matéria faz-se no âmbito do processo contra-ordenacional, pelo que não parece haver vantagem significativa em exercer o direito de audição nos termos do artigo 60.º do RCPIT. Os serviços de inspecção têm 10 dias contados a partir do exercício do direito de audição ou do termo do prazo fixado para que a entidade inspeccionada o exercesse para elaborar o relatório definitivo74. Para a conclusão do procedimento de inspecção é elaborado um relatório final com a identificação e sistematização dos factos detectados e a sua qualificação jurídicotributária75.
74 75
Artigo 60.º, n.º 4 do RCPIT. Artigo 62.º n.º 1 do RCPIT.
28
Procedimento de Inspecção Tributária
VIII Tipos de correcções efectuadas pela Inspecção Tributária
São de dois tipos as correcções fiscais propostas pela inspecção tributária: correcções técnicas e correcções não técnicas. As correcções técnicas são ditadas pela necessidade de dar cumprimento às leis fiscais, mais propriamente decorrentes de erros aritméticos e resultantes da não aplicação ou errada aplicação de normas jurídicas fiscais. As correcções não técnicas são decorrentes da aplicação de métodos indirectos76, de poderes discricionários previstos na lei77 e da aplicação de normas anti-abuso78. As correcções técnicas são relativamente fáceis de fundamentar já que resultam a aplicação normativa da lei fiscal pois têm sempre por base uma referência legal, isto é, uma norma que impõe uma determinada conduta. As correcções não técnicas, por sua vez, revelam sempre uma maior ou menor margem de subjectividade por parte de quem as efectua, não obstante termos vindo a assistir, por parte do legislador, a uma preocupação crescente no sentido de introduzir factores de objectividade nalguns métodos de tributação indirecta79. É pois em sede de correcções não técnicas que a necessidade de fundamentação ganha particular importância porquanto toda a correcção proposta por via da avaliação 76
A avaliação indirecta é subsidiária da avaliação directa (artigo 85.º da LGT) e só pode efectuar-se nos casos dos artigos 87.º e 88.º da LGT. 77
Não obstante o OE para 2003, ter alterado o n.º 14 do artigo 91.º da LGT, com vista a não fazer referência às correcções sujeitas a recurso hierárquico suspensivo, ao mesmo tempo de que alterou o artigo 54.º do CPPT no mesmo sentido e procedeu à revogação dos normativos que contemplavam esse meio de defesa específico nos artigos 141.º do Código do IRS e 129.º do Código do IRC, o que levou a que as correcções decorrentes de poderes discricionários em sede de IRS e IRC deixassem de ter associado um meio de defesa próprio, não significa que em sede de IRC não subsistam ainda normas que fazem apelo a esse tipo de critérios (por exemplo o artigo 28.º) e que não se possam contestar tais correcções. O recurso hierárquico com eficácia suspensiva não desapareceu do ordenamento jurídico fiscal, conforme se pode ver no artigo 75.º n.º 2 do Código do IVA, a respeito das decisões proferidas ao abrigo dos artigos 56.º e 58.º, n.º 4 do mesmo diploma legal 78
Consideram-se disposições anti-abuso quaisquer normas legais que consagrem a ineficácia perante a administração tributária de negócios ou actos jurídicos celebrados ou praticados com manifesto abuso das formas jurídicas de que resulte a eliminação ou redução dos tributos que de outro modo seriam devidos. Artigo 63.º n.º 2 do CPPT. 79
Como é o caso do regime simplificado de tributação em sede de IRS e IRC, previsto no artigo 31.º do Código do IRS e 53.º do Código do IRC, respectivamente. Regime que assenta dentro dos pressupostos da sua aplicação na consideração de indicadores de base técnico-científica para os diversos sectores de actividade. Não obstante a lei prever a aplicação destes indicadores, a verdade é que até hoje os mesmos ainda não foram aprovados, pelo que o regime simplificado de tributação vigora presentemente com base na aplicação de um coeficiente genérico para todos os contribuintes abrangidos por este regime de tributação. Em sede de IRS, o lucro tributável determina-se pela aplicação do coeficiente 0,20 ao valor das vendas de mercadorias e de produtos e do coeficiente 0,65 ao valor dos restantes proveitos; em sede de IRC, o lucro tributável determina-se pela aplicação do coeficiente 0,20 ao valor das vendas de mercadorias e de produtos e do coeficiente 0,45 ao valor dos restantes proveitos.
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Procedimento de Inspecção Tributária indirecta terá forçosamente que comportar todos os elementos objectivos e subjectivos que concorreram para sua qualificação e quantificação. O contribuinte tributado por via indirecta tem o direito de saber as razões de direito e de facto que determinam a correcção efectuada.
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Procedimento de Inspecção Tributária
IX Fundamentação das correcções efectuadas pela Inspecção Tributária
A questão da fundamentação não se coloca apenas ao nível do relatório de inspecção, mas ao nível de todos os actos de inspecção, desde a análise da escrita dos contribuintes, passando pela recolha da prova até ao exercício do direito de audição prévia e ao relatório final. A fundamentação começa a ser delineada com a recolha dos meios de prova na fase da análise e verificação da situação tributária do contribuinte e terá que ser acautelada em todas as fases do procedimento inspectivo. O campo de actuação da inspecção tributária é bastante vasto. O procedimento de inspecção abrange:
A confirmação dos elementos declarados pelos contribuintes; A indagação de factos tributários não declarados; A promoção e sancionamento das infracções tributárias; A Prestação de informações nos processos de impugnação e reclamação; Cooperação nos termos das convenções internacionais ou regulamentos comunitários; A realização de estudos individuais, sectoriais ou territoriais sobre o comportamento dos contribuintes.
O procedimento inspectivo tem assim que dar resposta a um fluxo de solicitações cada vez maior e mais exigente pelo que a fundamentação de todos os actos praticados no procedimento deve obedecer a critérios objectivos que garantam o esclarecimento cabal dos motivos que determinaram a decisão ou acto tributário. A verdade é que uma fundamentação inexistente ou deficiente conduzirá inevitavelmente a um aumento do contencioso entre a Administração e os contribuintes.
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Procedimento de Inspecção Tributária
IV.1 Objectivos da fundamentação
Uma boa fundamentação das correcções não poderá estar dissociada dos direitos dos contribuintes de modo a que sejam acauteladas todos os meios de reacção face às correcções propostas pela inspecção tributária, que terão inevitavelmente influência na esfera jurídico-contributiva dos cidadãos, por forma a que lhe sejam sempre garantida a possibilidade de contestar os fundamentos de direito e de facto que determinam as correcções que lhes são propostas pela administração tributária.
A fundamentação dos actos tributários80 visa alcançar diversos objectivos: Pacificação o acto praticado pela administração, se bem fundamentado de facto e de direito, será mais convincente quanto à sua justeza e o contribuinte aceitá-lo-á com maior facilidade; Auto-controle a obrigação da administração fundamentar o acto praticado obriga-a a uma maior reflexão e ponderação quanto à sua motivação; Defesa do contribuinte a fundamentação obriga a maior controlo da legalidade da decisão administrativa ao mesmo tempo que permite constituir fundamento para poder ser utilizada no procedimento ou processo tributário; Clarificação da prova a fundamentação passa pela enunciação clara e objectiva dos meios de prova recolhidos previamente o que permite uma melhor explicitação da motivação do acto praticado.
Uma boa fundamentação é determinante para garantir o sucesso da receita fiscal e respeito pelos elementares direitos dos contribuintes proporcionando uma tributação mais justa e menos conflituante. O dever de fundamentação justifica-se pela necessidade de assegurar maior ponderação do órgão ao qual compete decidir, no caso à administração tributária. O dever de fundamentação justifica-se ainda pela necessidade de dar a conhecer ao administrado, no caso ao contribuinte, os motivos que conduziram à decisão tomada e não a outra qualquer decisão. Por isso exige-se que a fundamentação contenha todas as razões de facto e de direito que concorreram para a génese da decisão e constituíram a sua motivação e justificação81.
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Enquanto garantia dos contribuintes com consagração máxima no artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa.
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Procedimento de Inspecção Tributária Todas as decisões da administração têm de ser fundamentadas com as razões de facto e de direito que as motivaram82. A fundamentação deve ser expressa, clara, congruente e suficiente83. A fundamentação expressa não é mais que uma exigência legal exigindo-se que seja explícita e contextual, não podendo ser tácita ou implícita84. A fundamentação clara significa que as razões de facto e de direito, ainda que enunciadas sucintamente, não podem ser confusas, ambíguas, obscuras ou dubitativas para que não corram o risco de não darem a conhecer o que determinou o agente a praticar determinado acto. É absolutamente necessário que o destinatário do acto compreenda os motivos de facto e de direito que conduziram à decisão tomada85. A fundamentação congruente significa que o conteúdo do acto tem de ter uma relação lógica com os fundamentos invocados. A fundamentação suficiente deverá fazer-se sempre uma componente qualitativa e não quantitativa, pois o que se impõe é tornar claro quais são os pressupostos de facto e de direito que foram tidos em conta pelo autor do acto.
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V O dever de fundamentação dos actos administrativos, que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos, imposto constitucionalmente (cfr. artigo 268.º n.º3 da CRP) e enunciado no artigo 125.º do CPA, consiste na obrigação por parte da Administração em externar as razões de facto e de direito que estão na base da decisão administrativa de molde a poder reconstituir-se o itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela Administração, dever que se mostra satisfeito se os vários elementos procedimentais para que o acto remete permitirem tal reconstituição. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 1ª Subsecção do Contencioso Administrativo, Recurso n.º 45.249, de 1105-2000. 82
Artigo 77.º da LGT.
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IV Carece de fundamentação o acto desde que, colocado perante ele, o seu destinatário, entendido como destinatário normal, não tenha a possibilidade de conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo de quem decide. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 2ª Secção, recurso n.º 5.523, de 24-10-1990. 84
IV Por força do art. 268, n.º 3 da CRP, a fundamentação dos actos de liquidação tem de ser expressa, no sentido de explícita e contextual, não podendo ser tácita ou implícita Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 2ª Secção, Recurso n.º 24.240, de 019-03-2000. IV Com o dever de fundamentação, a lei visa evitar que a Administração, furtando-se a tal dever, se remeta a juízos meramente conclusivos. Por isso exige que no acto se expressem também os respectivos fundamentos, ainda que de modo sucinto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 2ª Secção do Contencioso Administrativo, Recurso n.º 31.172, de 29-06-1993. III A manifestação de concordância do acto com fundamentação de anterior parecer, informação ou proposta não pode qualificar-se de implícita e resulta das circunstâncias em que o acto é proferido que o seu autor se determinou, ao decidir, por essa fundamentação Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Pleno da Secção do Contencioso Administrativo, Recurso n.º 32.702, de 10-111998. 85
IV A suficiência e clareza da fundamentação são noções relativas que dependem do tipo legal do acto e das circunstâncias do caso concreto, designadamente da situação do interessado, considerado como um destinatário normal, e da sua possibilidade real de compreender os motivos da decisão, em ordem a ficar habilitado a defender conscientemente os seus direitos e interesses legítimos Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Pleno da Secção do Contencioso Administrativo, Recurso n.º 16.276, de 05-04-1990.
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Procedimento de Inspecção Tributária
IV.2 Recolha da prova
A recolha dos elementos de prova ganha especial importância pois vai ocorrendo ao longo dos actos de inspecção que vão sendo realizados no âmbito do procedimento de inspecção até à sua conclusão que culmina no relatório final de inspecção86. A recolha de elementos, no âmbito do procedimento de inspecção tributária, deve obedecer a critérios objectivos87 definidos pela administração tributária, em função das circunstâncias de cada caso em concreto. Dever-se-á entender por critérios objectivos aqueles que não dependam apenas ou primacialmente do sujeito passivo ou obrigado tributário inspeccionado ou da mera opinião do funcionário afecto ao procedimento de inspecção. A exigência legal de que os critérios de recolha de elementos sejam objectivos tem por fim possibilitar a defesa do sujeito passivo ou obrigado tributário inspeccionado contra decisões arbitrárias da administração tributária, assim como, possibilitar à própria administração tributária verificar a conformação legal dos actos de recolha de elementos no âmbito do procedimento de inspecção88. A recolha de elementos no âmbito do procedimento de inspecção tributária deve conter89: A menção e identificação dos documentos e respectivo registo contabilístico, com indicação, quando possível, do número e data do lançamento, classificação contabilística, valor e emitente;
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Que ocorre conforme já ficou referido, no momento da assinatura da nota de diligência.
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Artigo 55.º do RCPIT.
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Os procedimentos respeitantes à recolha de elementos de prova encontram-se previstos nos artigos 55.º a 57.º do RCPIT. São procedimentos de recolha de elementos, designadamente, os seguintes: As fotocópias ou extractos serão efectuadas nas instalações ou dependências onde se encontrarem os livros ou documentos. Em caso de impossibilidade de as cópias ou extractos se efectuarem nos locais referidos no número anterior, os livros ou documentos só podem ser retirados para esse efeito por prazo não superior a setenta e duas horas, devendo ser entregue recibo ao sujeito passivo ou obrigado tributário. Dos inventários e contagens físicas será lavrado o correspondente termo. O termo referido no número anterior será assinado pelo sujeito passivo ou obrigado tributário ou seu representante, que declarará ser ou não o mesmo conforme ao total das existências, e poderá acrescentar as observações que entender convenientes. Quando o sujeito passivo ou obrigado tributário ou seu representante se recusarem a assinar, será o termo assinado por duas testemunhas. Na impossibilidade de os serviços de inspecção tributária colherem assinatura das testemunhas, constará o facto do termo, do qual será entregue uma cópia ao sujeito passivo ou obrigado tributário. Sempre que os testes de amostragem não consistirem no mero confronto de documentos, será igualmente lavrado o respectivo termo, aplicando-se o disposto nos n.ºs 4 a 6 do presente artigo, com as necessárias adaptações. Nos actos de inspecção podem ser utilizadas, quando aplicáveis, técnicas de auditoria contabilística. 89
Artigo 55.º, alíneas a) e b) do RCPIT.
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Procedimento de Inspecção Tributária A integral transcrição das declarações, com identificação das pessoas que as profiram e as respectivas funções, sendo as referidas declarações, quando prestadas oralmente, reduzidas a termo. No decurso da inspecção tributária, os funcionários afectos ao procedimento de inspecção podem inquirir quaisquer trabalhadores da entidade inspeccionada, estejam ou não ligados às áreas financeiras e da contabilidade90, já que as entidades inspeccionadas têm o dever de esclarecer as dúvidas suscitadas no âmbito da inspecção. Em regra a recolha de elementos de prova deve ser efectuada nas instalações ou dependências onde se encontrem os livros ou documentos de suporte dos registos contabilísticos relacionados com o exercício da actividade da entidade inspeccionada. Em caso de impossibilidade, os livros e documentos só podem ser retirados para fotocopiar por prazo não superior a 72 horas. As cópias recolhidas durante o procedimento de inspecção que possam constituir meio de prova devem ser autenticadas pelos inspectores com a data, rubrica e a menção Está conforme o original de onde foi extraído . Noutros casos os inspectores podem ainda e como medida cautelar visar os documentos com a aposição de um visto, de uma data e da assinatura. O contribuinte inspeccionado deve ceder ao funcionário da inspecção tributária um gabinete, uma secretária, uma cadeira ou outros equipamentos adequados à realização da inspecção por forma a que as suas funções sejam exercidas em condições de dignidade e eficácia91.
IV.3 Fundamentação no Direito de Audição
Emitida a nota de diligência segue-se a preparação do projecto de conclusões do relatório no qual há que explicitar qual ou quais as correcções propostas e a respectiva fundamentação. O direito de audição previsto no artigo 60.º da Lei Geral Tributária surgiu na sequência do princípio constitucional da participação dos cidadãos na formação das decisões que lhe dizem respeito92. Apesar do procedimento de inspecção ter um carácter meramente preparatório ou acessório dos actos tributários ou em matéria tributária93, não há dúvida que estes 90
E muito acrescidamente estes, já que dispõem de acesso aos livros, registos da contabilidade e sistemas informáticos. 91 Artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 249/98, de 11 de Agosto. 92
Artigo 267.º n.º 1 da CRP.
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Artigo 11.º do RCPIT.
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Procedimento de Inspecção Tributária podem vir a ser desfavoráveis aos contribuintes inspeccionados. Daí a exigência legal em matéria de direito de audição prevista no artigo 60.º da LGT94. Para efeitos do exercício de audição a entidade inspeccionada deverá ser notificada do texto integral do projecto de conclusões do relatório que conterá a identificação dos actos de inspecção de que possam resultar actos tributários ou em matéria tributária que lhe sejam desfavoráveis e a respectiva fundamentação. A notificação deve fornecer os elementos necessários para que os interessados fiquem a conhecer todos os aspectos relevantes para a decisão, nas matérias de facto e de direito, com a indicação das horas e do local onde o processo poderá ser consultado95. Não basta cumprir a obrigação legal de notificar o contribuinte para exercer o direito de audição prévia nos termos dos artigos 60.º da LGT e do RCPIT, é preciso garantir que os argumentos aduzidos pelo contribuinte no âmbito e em cumprimento desse direito sejam devidamente analisados pelos serviços de inspecção por forma a serem ou não aceites como válidos para a formação da decisão final. Não poderá(ão) o(s) inspector(es) encarregue(s) da feitura do relatório final cingirse a expressões do tipo: apesar de notificado para exercer o seu legítimo direito de audição prévia previsto nos artigos 60.º do RCPIT e da LGT, o sujeito passivo nada trouxe de novo que contradigam os factos constantes do projecto de relatório que lhe foi validamente notificado Ou Tendo o sujeito passivo exercido o direito de audição prévia em ./ ../ ,a verdade é que os argumentos expostos em nada alteram o sentido das conclusões do projecto de relatório . Sempre que assim suceder, em matéria de fundamentação, ocorre uma deficiência grave e notória pois não se consegue vislumbrar os motivos da não aceitação dos argumentos invocados pelo sujeito passivo em reacção aos factos que lhe foram dados a conhecer no projecto de conclusões do relatório e que influem directamente na sua esfera contributiva.
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I Mesmo antes da entrada em vigor da Lei Geral Tributária e por força do disposto no artigo 100.º do Código do Procedimento Administrativo, a lei ordinária dava já a consagração ao princípio constitucional da participação do administrado nas decisões administrativas, impondo/estabelecendo o direito de audiência prévia tanto para o procedimento administrativo comum, como para os procedimentos administrativos especiais. II E o direito de audição antes da liquidação e ou da conclusão do relatório da inspecção tributária, em que se materializa o referido princípio constitucional da participação do administrado, mostra-se agora expressamente previsto e estabelecido pelas als. a) e e) do artigo 60.º da LGT. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 2ª Secção, de 30/10/2002, recurso n.º 780/02. 95
Artigo 101.º n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo.
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Procedimento de Inspecção Tributária IV.4
Fundamentação no Relatório Final
O relatório final de inspecção é a peça fundamental do trabalho da inspecção tributária que tem por função identificar e sistematizar os factos detectados e proceder à sua qualificação jurídico-tributária96. É pois uma peça dirigida não só aos contribuintes inspeccionados, mas também aos responsáveis hierárquicos dos inspectores tributários, bem como a todos aqueles que possam vir a ser chamados a ponderar a pertinência dos factos e da respectiva fundamentação que constam do relatório final97. A fundamentação factual e de direito deve ser adequada ao caso concreto e alicerçar-se em meios de prova suficientemente fortes.
IV.4.1
Fundamentação das correcções técnicas
Nas correcções técnicas a fundamentação de facto e de direito deverá ser adequada à situação em concreto e demonstrativa de que resultou de imperativo legal.
96
Artigo 62.º do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto.
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Do relatório final devem constar os seguintes elementos (artigo 62.º n.º 3 do RCPIT, na redacção dada pelo n.º 2 do artigo 4.º da Lei 50/2005, de 30 de Agosto): Identificação da entidade inspeccionada, designadamente denominação social, número de identificação fiscal, local da sede e serviço local a que pertence; Menção das alterações a efectuar, aos dados constantes dos ficheiros da administração tributária; Data do início e do fim dos actos de inspecção das interrupções ou suspensões verificados; Âmbito e extensão do procedimento; Descrição dos motivos que deram origem ao procedimento, com a indicação do número da ordem de serviço ou do despacho que o motivou; Informações complementares, incluindo os principais devedores dos sujeitos passivos e dos responsáveis solidários ou subsidiários pelos tributos em falta; Descrição dos factos susceptíveis de fundamentar qualquer tipo de responsabilidade solidária ou subsidiária; Acréscimos patrimoniais injustificados ou despesas desproporcionadas efectuadas pelo sujeito passivo ou obrigado tributário no período a que se reporta a inspecção; Descrição dos factos fiscalmente relevantes que alterem os valores declarados ou a declarar sujeitos a tributação, com menção e junção dos meios de prova e fundamentação legal de suporte das correcções efectuadas; Indicação das infracções verificados, dos autos de notícia levantados e dos documentos de correcção emitidos; Descrição sucinta dos resultados dos actos de inspecção e propostas formuladas; Identificação dos funcionários que o subscreveram, com menção do nome, categoria e número profissional; Outros elementos relevantes.
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Procedimento de Inspecção Tributária Em matéria de correcções técnicas existe sempre a obrigação de fundamentar o acto tributário ou em matéria tributária, devendo ser enunciadas as razões porque se corrige e qual o critério que foi usado nessa correcção98.
IV.4.1
Fundamentação das correcções com base em métodos indirectos
A administração tributária tem de começar por fazer a demonstração a fundamentação da existência dos pressupostos que justificam a aplicação dos métodos indirectos. Para tal deverá99: Especificar os motivos que conduzem à impossibilidade de comprovação directa e exacta da matéria tributável; Especificar a descrição do afastamento da matéria tributável do sujeito passivo dos indicadores objectivos da actividade de base técnico-científica e as razões da não aceitação das justificações apresentadas pelo contribuinte, se for o caso disso. Descrever os bens cuja propriedade ou fruição a lei considera manifestações de fortuna relevantes; Indicar os critérios utilizados na avaliação da matéria tributável, ponderar os factores que influenciaram a sua determinação e descrever as operações ou cálculos utilizados nessa mesma determinação. Por norma a determinação do lucro tributável das actividades comerciais, industriais, agrícolas e de serviços, faz-se com base na contabilidade ou nos livros de registo. Só excepcionalmente, e na hipótese de não ser possível a comprovação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação do lucro, se aplicarão os métodos indirectos à determinação do lucro tributável. A contabilidade do sujeito passivo deverá, pois, encontrar-se devidamente organizada de acordo com os sãos princípios da lei comercial e fiscal, respeitando todos os requisitos formais e substanciais para que possa gozar da presunção de veracidade100. 98
A administração tributária, ao introduzir, na sequência de exame à escrita de um contribuinte, correcções técnicas, considerando que metade das quantias inscritas num grupo de recibos como respeitante a ofertas e publicidade , constitui custo de publicidade, e que a outra metade corresponde a donativos, quando o contribuinte declarara como custos de publicidade a totalidade, está obrigada a fundamentar o acto, enunciando as razões porque corrige e o critério usado nessa correcção. Dizendo a administração, apenas, que os recibos, ao referirem-se a ofertas e publicidade, sem discriminação, não justificam o gasto, em publicidade, do montante total neles inscrito, e que considera metade respeitante a publicidade e outra metade a donativos, a fundamentação é insuficiente por, embora dando a conhecer as razões da correcção, não revelar o critério utilizado Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 04-12-2002. 99
Artigo 87.º da LGT. Artigo 75.º da LGT.
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X Conclusão
1. O procedimento de inspecção tributária tem consagração legal no Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 413/98, de 31 de Dezembro, e visa a observação das realidades tributárias, a verificação do cumprimento das obrigações tributárias e a prevenção das infracções tributárias. 2. O procedimento de inspecção tributária deve obedecer aos princípios da verdade material, da proporcionalidade, do contraditório e da cooperação. Estes princípios concretizam e desenvolvem os princípios constitucionais orientadores da actividade da administração pública e por consequência da administração tributária. 3. O procedimento de inspecção tributária classifica-se, quanto aos fins, em procedimento de comprovação e verificação; e procedimento de informação. O primeiro, visa a confirmação do cumprimento das obrigações dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários. O segundo visa o cumprimento dos deveres legais de informação ou de parecer dos quais a inspecção tributária seja legalmente incumbida. 4. Quanto ao lugar da realização, o procedimento de inspecção pode classificar-se em procedimento interno e externo. O procedimento será interno quando os actos de inspecção se efectuem exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise da forma e da coerência dos documentos. Será externo quando os actos de inspecção se efectuem, total ou parcialmente, nas instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso. 5. Quanto ao âmbito e extensão, o procedimento de inspecção pode ser geral ou polivalente e parcial ou univalente. O procedimento de inspecção será geral ou polivalente quando a inspecção tiver por objecto a situação tributária global ou o conjunto dos deveres tributários dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários. Será parcial ou univalente quando a inspecção abranja apenas algum ou alguns tributos, algum ou alguns, deveres dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários. 6. São competentes para a prática dos actos de inspecção tributária os serviços da Direcção-Geral dos Impostos, nomeadamente as Direcções de Serviços de Inspecção Tributária; os Serviços Periféricos Regionais; os Serviços Periféricos Locais. 7. Para o exercício da função inspectiva no âmbito do procedimento de inspecção, a administração tributária faz uso de determinados direitos e prerrogativas, sem prejuízo do respeito pelo dever de sigilo e pelos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados. 8. Ao longo do procedimento de inspecção tributária podem ser adoptadas medidas cautelares com vista à obtenção e conservação da prova de factos ou valores com relevância tributária. 9. O procedimento de inspecção integra várias fases até à feitura do relatório final de inspecção, o qual terá que ser comunicado ao contribuinte inspeccionado.
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Procedimento de Inspecção Tributária 10. São de dois tipos as correcções fiscais propostas pela inspecção tributária: correcções técnicas e correcções não técnicas. 11. As correcções efectuadas pela inspecção tributária terão que ser fundamentadas. A fundamentação das correcções não poderá estar dissociada dos direitos dos contribuintes de modo a que sejam acauteladas todos os meios de reacção face às correcções propostas pela inspecção tributária, que terão inevitavelmente influência na esfera jurídico-contributiva dos cidadãos, por forma a que lhe sejam sempre garantida a possibilidade de contestar os fundamentos de direito e de facto que determinam as correcções que lhes são propostas pela administração tributária.
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