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PODER JUDICIÁRIO 2.ª VARA DO TRIBUNAL DO JÚRI
Processo nº: 0260692-78.2009.8.04.0001 Acusados: Leandro do Nascimento Guerreiro Autora: A Justiça Pública Vítima: Raylen Caldas Gomes Sentença Vistos etc...
O Ministério Público do Estado do Amazonas, por seu Promotor de Justiça, com base no Inquérito Policial, ofereceu Denúncia contra o Réu LEANDRO DO NASCIMENTO GUERREIRO, como incurso nas penas do artigo 121, § 2º, inciso IV (recurso que impossibilitou a defesa do ofendido), do Código Penal Brasileiro, pela prática do fato que a seguir passo a transcrever: " Consta do incluso Inquérito Policial, que a esta serve de denúncia, que por volta das 11:15h, do dia 02 de dezembro de 2009, na Av. Álvaro Botelho Maia, nº 515, bairro Nossa Senhora das Graças, nesta cidade, no interior da loja Word Micro Computadores, o acusado de posse de uma arma de fogo, disparou contra a vítima Raylen Caldas Gomes, produzindo-lhe os ferimentos descritos no Laudo de Exame Necroscópico de fls. 14, ocasionando-lhe a morte. Tudo originou-se de uma discussão entre o segurança daquela loja, Francisco Augusto Vieira Magalhães e o flanelinha Douglas Reis de Souza, devido a vítima ter estacionado seu veículo na rua em frente da loja, ocasião em que o segurança passou a espancar o flanelinha, porque este havia orientado a vítima a deixar naquele local seu carro. Ao perceber que o flanelinha estava apanhando do dito “segurança” a vítima interveio e se identificou como policial civil, dizendo que aquele procedimento não era correto, instante em que o “segurança” também mostrou sua identificação, dizendo-se ser “policial”, instante em que a vítima levou o “segurança” pelo braço até o interior da loja, dizendo-lhe que queria falar com o seu superior.
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Já dentro da loja a vítima tornou a se identificar para a recepcionista Sra. Clícia Monteiro dos Santos, mostrando-lhe sua carteira funcional, dizendo-lhe que queria falar com o superior dela, ocasião em que veio falar com a vítima o gerente Sr. Isaac Ferreira Sarmento, tendo a vítima explicado-lhe o fato, no que o referido gerente disse: “que não era com ele”, tendo a vítima indagado a quem deveria se dirigir, que então o Sr. Isaac, apontou para a sala do proprietário da Loja, Leandro do Nascimento Guerreiro. Segundo após, quando a vítima caminhava pelo corredor, foi surpreendido pelo acusado, que sem dar uma palavra disparou a queima-roupa, sem oferecer qualquer meio de defesa para a vítima escapar com vida, pois o disparo atingiu em cheio a face da mesma, que morreu no próprio local. Em seguida, o acusado de arma em punho, apontou para a esposa da vítima que de joelhos implorava para não ser morta, momento em que o acusado perguntava “quem é tu, quem é tu”, desesperada a mesma pedia ao acusado que não atirasse nela, pois tinha três filhos para criar, e seu marido era policial, que naquele momento já se encontrava estirado ao solo com uma bala na cabeça. A vítima não se encontrava armada, tendo se limitado apenas a mostrar a todos a sua carteira de policial civil, pedindo tão-somente para falar com o superior do gerente Isaac, pois não era correto o segurança Francisco Augusto Vieira Magalhães bater no flanelinha”. A Denúncia, acompanhada do rol das testemunhas e do inquérito policial, foi oferecida em 02/02/2010 e recebida no dia 04/02/2010, quando foi determinada a citação do réu para responder por escrito à acusação (fls. 02/06). Defesa Preliminar às fls.201/202. Foram arroladas sete testemunhas, sendo ouvidas quatro, conforme fls.489/490; 491/492; 500/502 e 521/522. Às fls. 492, consta desistência da oitiva das testemunhas Aguinelo Pereira do Nascimento e José Alberto Carvalho da Silva. Foram ouvidas seis, das oito testemunhas de acusação, conforme fls. 452/454; 455/456; 457/458; 459/460; 525/526; 527/528 e reinquirição de fls. 523/524. Às fls. 461 o representante do Ministério Público desistiu, por ora, das
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testemunhas faltantes, reservando-se para convocá-las em outra fase processual. Memoriais do Ministério Público às fls. 609/636. A acusação argumentou ter sido provada a materialidade do delito, pelo Laudo de Exame Necroscópico de fls. 20, assim como a autoria, induvidosa, até mesmo pela confissão do réu. Verificando o conjunto probatório, constante nos autos, entende o Parquet, que na espécie não pode ser mantida a acusação de homicídio doloso (Art.121, § 2º, inciso IV (recurso que impossibilitou a defesa do ofendido) do CPB), por tratar-se de erro sobre elemento do tipo, ficando caracterizado o crime de homicídio culposo (culpa imprópria na conduta antecedente que resultou dolosamente na morte da vítima), à luz do art. 20,§ 1º, 2ª parte, conjugado com o art. 23, II, ambos do Código Penal Brasileiro, motivo pelo qual requer a ção do fato atribuído ao acusado, de homicídio doloso para homicídio culposo. Por conseguinte, requer ao final o Ministério Público, no caso de desclassificação acatada de homicídio doloso para homicídio culposo, a remessa dos autos a uma das Varas Criminais comuns da Capital, nos termos do art. 419, caput, do Código de Processo Penal, por não ser a competência do Tribunal do Júri, para julgar homicídios culposos sendo somente competente para julgar os crimes dolosos contra a vida, Memoriais da Defesa às fls.646/656, onde pugna pela Absolvição Sumária acusado, nos termos do art. 415, III, do Código de Processo Penal, sob a alegação de caracterização da ocorrência de erro de tipo invencível, visto que o acusado supôs situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima, devendo ser aplicado ao caso, a previsão do artigo 20, § 1º, 1ª parte, c/c 23, II, ambos do Código Penal Brasileiro. É o relatório. Passo a decidir. A materialidade do crime de homicídio, resta comprovada, conforme se verifica pelo Laudo de Exame Necroscópico de fls. 20 e certidão de óbito de fls. 21. O denunciado Leandro do Nascimento Guerreiro, confessou no interrogatório em juízo (fls.529/531), a autoria do homicídio que vitimou Raylen Caldas Gomes, morto por um único tiro de arma de fogo à queima roupa: “(...)Que, é verdadeiro o fato de ter sido o autor do disparo que vitimou Raylen Caldas Gomes. (...) “(...) Que, narra apenas o que viu o que fez, que se encontrava no fundo do estabelecimento comercial, mas precisamente na sua sala de montagem de reparos, montando duas maquinas para um cliente por que após ter sofrido um assalto, dispensou o técnico que fazia tal serviço e ele próprio depoente que fazia
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montagem de reparos de computadores a seus cuidados. Nesse momento deve sua atenção despertada do barulho vindo da parte do corretor de circulação de sua loja, já no interior já destinada aos funcionários, isto é, de acesso restrito apenas aqueles que ali trabalhavam. Que, viu um alteração muito forte e aproximou-se da sala da gerencia e contabilidade onde se encontrava Sr. Isaac e viu um homem muito alto e forte vestindo uma camisa preta e calça jeans, dominando fisicamente o segurança da loja o Sr. Francisco. Que, o tal homem, muito mais forte e mais alto que o segurança o mantinha dominado segurando o colarinho da camisa do Sr. Francisco por trás e imobilizando também por trás, só que o depoente não tinha condições de ver a mão da pessoa e imaginou que o mesmo estivesse armado com revólver, pois estava rendendo o segurança da loja que estava armado. Que, o segurança olhou para o interrogado ao adentrar na sala da gerência como se dissesse, "que nada podia fazer", em razão do domínio sofrido. Que, chegando na porta da sala da contabilidade ouviu as seguintes frases: "chame o Dr. Mario, Chame o Dr. Mário, dizia o Sr. Francisco. Enquanto a pessoa que o dominava falava o seguinte "chama o responsável, senão vai dar merda". Que, o depoente ainda olhou para o Sr. Isaac que já se encontrava fora de sua cadeira e completamente estático, atônito, e espantado, sem qualquer tipo de reação. Que, ao ver aquela cena, voltou a sala de montagem e armou-se de um revolver que tinha, pois tinha plena certeza em razão daquela comoção ora vivida que estava se deparando novamente com um assalto. Que, ainda pensou em fugir, entretanto pensou em seu pai, um homem de 90 anos de idade que se encontrava na sua sala naquele mesmo ambiente e também nas demais pessoas que ali estavam. Momento então que resolver reagir. Que, ao aproximar-se novamente da sala, onde estava ocorrendo aquela cena, notou que a pessoa, sempre mobilizando o segurança e o trazendo como escudo ia saindo da contabilidade se direcionado para parte de trás da loja onde se encontrava o interrogado. Que, ao se deparar com os dois levantou o revólver e rapidamente atirou na cabeça da vítima, pois tinha certeza que ele estaria armado pois estava mobilizando como dito anteriormente, um segurança armado. Que, até o momento do disparo, ninguém,
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nem mesmo a vítima, gritou que era policial ou se identificou como tal. Que, após o disparo observou que havia uma senhora no interior da sala da contabilidade, gritando "é meu marido, é meu marido", que o interrogado, virou para ela ainda com a arma na mão, dirigindo-se a mulher quem era ela e o que queriam, nesse momento o segurança passou a dizer que o interrogado não poderia ter feito aquilo, pois se tratava de um policial e também, se dirigindo para mulher o segurança, ainda em pânico e com a arma na mão, dizia, "como é que vocês fazem isso, pois nós sofremos um assalto não faz nem um mês". DA LEGÍTIMA DEFESA PUTATIVA A defesa apresentou memoriais (fls.646/656), argüindo a caracterização de erro de tipo invencível, com a pretensão da absolvição sumária, embasado nas disposições previstas no art.20, §1º, 1ª parte c/c art. 23, II, ambos do Código Penal Brasileiro. A defesa alega que o denunciado Leandro do Nascimento Guerreiro agiu em legítima defesa putativa, pois pensava que estava sendo vítima de novo assalto. Ocorre que a legítima defesa putativa é a também denominada legítima defesa ficta. A situação de perigo existe tão somente no imaginário daquele que supõe repelir legitimamente um injusto. Constitui descriminante putativa ou seja, o agente "supõe a ocorrência de uma excludente de criminalidade que, se existisse, tornaria sua ação legítima". Por conseguinte, a ação do que se supõe agredido é revestida de antijuridicidade, em divergência daquele que age em legítima defesa real. Afirma Jescheck que "o fato praticado sob a suposição errônea de uma causa de justificação continua, pois, sendo um fato doloso". A culpabilidade é elemento pressuposto da aplicação da pena, não excluindo a antijuridicidade do fato, incidindo apenas sobre o momento no qual o Estado inflige a punição ao agente. A análise da culpabilidade é um juízo de reprovação subjetivo, acerca do autor do fato típico e antijurídico, e sua presença se perfaz quando o autor do fato, podendo agir em conformidade com o Direito, resolve, , agir em desconformidade com o sistema normativo. A análise do instituto da culpa, em tela, é jurídica, não moral ou religiosa. Excluída a culpa, por conseguinte, verifica-se excluída a aplicação da pena, uma vez que esta é proporcional à responsabilidade subjetiva do autor do fato. O erro em que incorre o agente pode ser inevitável (invencível) ou evitável (vencível). Se o agente atuou com erro apesar dos cuidados objetivos, o erro é invencível e exclui o dolo e a culpa. Entretanto, se poderia tê-lo evitado com as cautelas exigíveis nas condições em que se encontrava, ocorrerá o erro culposo. Neste caso, o
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erro elimina a tipicidade dolosa (não queria a realização do tipo), mas, havendo culpa, responderá por crime culposo se a lei prevê este. Há erro de tipo essencial quando o erro do agente recai sobre os dados constitutivos do tipo fundamental, do tipo qualificado ou sobre circunstâncias agravadoras (agravantes e causas de aumento de pena ). Apresenta-se sob duas formas : a) Erro invencível (ou escusável ) b) Erro vencível (ou inescusável) Se tratando de erro invencível (escusável ou inculpável )ocorre quando não pode ser evitado pela normal diligência, ou seja, qualquer pessoa, empregando o cuidado intenso, ordinariamente exigido pelo ordenamento jurídico, nas condições em que se viu o sujeito, incidiria em erro. Há erro vencível (inescusável ou culpável) quando pode ser evitado pela diligência ordinária, resultado de imprudência ou negligência. Qualquer pessoa, empregaria a prudência normal exigida pela ordem jurídica, não cometeria o erro em que incidiu o sujeito. Dispõe o art. 20, caput, que o erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime "permite a punição por crime culposo, se previsto em lei". Assim, aproveitando-se os exemplos citados anteriormente, se o caçador poderia ter evitado de atirar, por saber que outras pessoas estavam na área - o que o obrigava a maiores cautelas -, responderá por homicídio culposo,' o pai, se foi negligente ao examinara pomada, será responsabilizado por lesão corporal culposa. Não responderá a gestante por crime de aborto mesmo que tenha sido descuidada ao ingerir a substância que acreditava ser um calmante, nem por furto o que, por descuido, subtraiu o guarda-chuva alheio, já que a lei não prevê a modalidade culposa nesses dois delitos. De acordo com a doutrina e a jurisprudência mais abalizada, a decretação da absolvição sumária pelo reconhecimento de excludente de ilicitude, na fase de pronúncia, exige a sua presença induvidosa, cristalina no conjunto probatório dos autos, o que, contudo, não ocorre in casu. Em conformidade com as lições de Júlio Fabbrini Mirabete (In Código de Processo Penal interpretado, 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2002, pág. 1123): “A absolvição sumária nos crimes de competência do Júri exige uma prova segura, incontroversa, plena, límpida, cumpridamente demonstrada e escoimada de qualquer dúvida pertinente à justificativa ou dirimente, de tal forma que a formulação de um juízo de admissibilidade da acusação representaria uma manifesta injustiça. (...)” .
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A jurisprudência pátria, é remansosa nesse sentido, conforme se vê dos julgados adiante colacionados: EMENTA: PROCESSUAL PENAL. PRONÚNCIA. TENTATIVA DE HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO POR MOTIVO FÚTIL E MEDIANTE RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DA VÍTIMA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. LEGÍTIMA DEFESA. EXCLUDENTE NÃO COMPROVADA DE PLANO. PEDIDO ALTERNATIVO: EXCLUSÃO DAS QUALIFICADORAS. INCONSISTÊNCIA. CIRCUNSTÂNCIAS NÃO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTES. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO SOCIETATE QUE PREVALECE NESSA FASE PROCESSUAL. ENCAMINHAMENTO DO RECORRENTE A JÚRI POPULAR. RECURSO QUE NÃO MERECE PROVIMENTO. Na fase da pronúncia, em
que prevalece o princípio do in dubio pro societate, a absolvição sumária por legítima defesa pressupõe a presença cristalina, induvidosa da excludente nas provas dos autos. Somente é possível a exclusão de qualificadoras admitidas na pronúncia quando o conjunto probatório demonstra cabalmente a sua não incidência. (TJRN - RSE Nº 2009.009609-1 – Relator: Des. Caio Alencar – Julgado em 13/10/2009). EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO (ART. 121, § 2º, IV, DO CP). SENTENÇA DE PRONÚNCIA. IRRESIGNAÇÃO. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ALEGAÇÃO DE LEGÍTIMA DEFESA PUTATIVA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA. IMPOSSIBILIDADE. INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE DO CRIME. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO SOCIETATE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
I – A sentença de pronúncia é mero juízo de admissibilidade proferido pelo magistrado face à existência de indícios quanto à autoria e à materialidade do fato típico; II – Em tal fase processual vigora o princípio do in dubio pro societate, em que, havendo dúvidas quanto ao agir do recorrente, o tribunal do Júri deve dirimi-las”. (TJRN – RSE nº 2007.008250-8 – Relator: Des. Saraiva Sobrinho – Julgado em 10/06/2008).
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Desse modo, considerando que a Constituição Federal atribuiu ao Júri a competência para julgar crimes dolosos contra a vida, sejam tentados ou consumados, assim como, na fase de pronúncia prevalece o princípio in dubio pro societate, não há como serem acolhidas as pretensões da defesa, em ter decretada a absolvição sumária do acusado Leandro do Nascimento Guerreiro, haja vista não constar dos autos, provas da excludente alegada e da improcedência cabal das circunstâncias mencionadas, pois trata-se de um crime de homicídio, onde é confirmado a materialidade e a autoria, não sendo confirmada a tese defensiva, de erro invencível diante da analise dos fatos, uma vez que, a vitima estava desarmada, havendo muitas dúvidas e contradições nos depoimentos das testemunhas perante a autoridade policial e os depoimentos em juízo acerca dos fatos, que poderiam justificar o erro inevitável do acusado, pois, as declarações das testemunhas e do acusado comprovam estar a vítima acompanhada de funcionários do estabelecimento e de sua esposa ao acesso às instalações restritas à direção da empresa, que se identificou na recepção e ao gerente da loja, que cabia também aos funcionários da empresa caso achassem que tratava-se de assalto, terem chamado a policia, pois, não foi verificado violência e nem ameaças que impedissem por exemplo, da recepcionista, do gerente e de outros funcionários terem feito a chamada telefônica à policia. DO ERRO DE TIPO E DA DESCLASSIFIÇÃO DO CRIME DOLOSO PARA CULPOSO. O Ministério Público, requereu a desclassificação do indiciamento de homicídio doloso escudado no erro de tipo, por ter o acusado disparado um único tiro de arma de fogo contra a vítima Raylen Caldas Gomes. Analisando os fatos, verifico que tal justificativa, não pode prosperar e ser acatada como excludente do dolo, a uma, seria uma justificativa a ser usada nas grandes capitais no Brasil e no mundo, pelo número de assaltos que acontecem diariamente, as pessoas matariam e seriam absolvidas por acharem que estavam ou seriam novamente assaltadas, a duas, por existir a Segurança Pública para defender a população. O erro é uma falsa representação da realidade e a ele se equipara a ignorância, que é o total desconhecimento a respeito dessa realidade. No caso de erro de tipo, desaparece a finalidade típica, ou seja, não há no agente a vontade de realizar o tipo objetivo. Como o dolo é querer a realização do tipo objetivo, quando o agente não sabe que está realizando um tipo objetivo, porque se enganou a respeito de um de seus elementos, não age dolosamente: há erro de tipo. São casos em que há tipicidade objetiva (nos exemplos, os tipos de homicídio, lesão corporal, aborto, furto, corrupção ativa), mas não há tipicidade subjetiva por estar ausente o dolo. O acusado por outro lado informa que meses antes tinha sido assaltado, e por esse motivo pensou que estava sendo assaltado novamente, agindo abruptamente com a presença da vítima e de sua esposa.
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Quanto ao erro de tipo que encontra-se estatuído no art. 20, ", do Código Penal, verifico, que ocorre no caso concreto, quando o indivíduo não tem plena consciência do que está fazendo; imagina estar praticando uma conduta lícita, quando na verdade, está a praticar uma conduta ilícita, mas que por , acredite ser inteiramente lícita.No caso em tela, o acusado perguntou quem seria a vítima e a mesma não estava armada. Quem incide em erro de tipo “não sabe o que faz, porque, em conseqüência de seu erro, não compreende o verdadeiro conteúdo de sentido do acontecimento no espaço jurídico – social; o decisivo é somente que, o que atua em erro de tipo não seja alcançado pela função de apelo e advertência do tipo. No depoimento em juízo, a esposa da vítima, relatou que o acusado apontou a arma para sua cabeça, desistindo de prosseguir na execução, por verificar que a mesma estava desarmada, sendo impossibilitada de defesa, assim como, os depoimentos em juízo e na delegacia de polícia afirmam que a vítima estava desarmada e sem possibilidade de defesa, por ter sido alvejada com um tiro sem ter feito nenhuma ameaça ao acusado, ao seu pai e aos funcionários da empresa. Quanto ao pleito de exclusão das qualificadoras, à vista das provas carreadas ao processo, também não há como afirmar-se que tais circunstâncias afiguram-se manifestamente improcedentes, porque existem dúvidas acerca do crime, havendo prova no sentido de que houve um disparo de arma de fogo que atingiu a vítima, estando a vítima desarmada, acompanhada de sua esposa e do gerente da empresa; também, porque também há discussão a respeito das circunstâncias em que o disparo foi efetuado, se de maneira a impossibilitar ou não a defesa do ofendido. IMPOSSIBILIDADE DE DEFESA DA VÍTIMA TJDF - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO : RSE 19980510022405 DF Dados Gerais Processo: RSE 19980510022405 DF Relator(a):P. A. ROSA DE FARIAS Julgamento:06/02/2003 Órgão Julgador:1ª Turma Criminal Publicação:DJU 30/04/2003 Pág. : 59 Ementa PENAL - PROCESSO PENAL: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - HOMICÍDIO SIMPLES SENTENÇA DE PRONÚNCIA DESCLASSIFICAÇÃO HOMICÍDIO QUALIFICADO INCLUSÃO DE QUALIFICADORA QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DA VÍTIMA - SURPRESA - ATAQUE
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INESPERADO - VÍTIMA QUE NÃO TINHA MOTIVOS PARA TEMER AGRESSÃO QUALIFICADORA CARACTERIZADA EMENDATIO LIBELLI - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. VÊ-SE EXAUSTIVAMENTE COMPROVADA A TESE DE QUE A VÍTIMA NÃO TINHA CONDIÇÕES DE NEM MESMO SUSPEITAR DE EVENTUAL AGRESSÃO POR PARTE DO RÉU, O QUE OCORREU SEM QUE A MESMA PUDESSE ESBOÇAR QUALQUER MEIO DE DEFESA. A INCLUSÃO DA QUALIFICADORA EM COMENTO NÃO CARACTERIZA INFRINGÊNCIA AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO, PORQUANTO É ASSENTE NA JURISPRUDÊNCIA PÁTRIA DE QUE A SENTENÇA ENCONTRA-SE VINCULADA, SIM, AOS FATOS DESCRITOS NA PEÇA ACUSATÓRIA, E NÃO À CAPITULAÇÃO DA CONDUTA QUE LHE FOI DADA. TOTALMENTE PASSÍVEL DE ALTERAÇÃO TAL CAPITULAÇÃO, SEM QUE ISSO DEVA SER CONSIDERADO MUTATIO LIBELLI, E, SIM, MERA EMENDATIO LIBELLI , PREVISTO NO ART. , DO . DEVE O RÉU DEFENDER-SE DOS FATOS ALI CONTIDOS, E NÃO DA TIPIFICAÇÃO. EVENTUALMENTE ADOTADA NA PREFACIAL ACUSATÓRIA. VEJO QUE, CONTRARIAMENTE AO QUE FORA ESPOSADO PELA DEFESA, ESTÁ-SE CONFERINDO VIGÊNCIA PLENA AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO, E NÃO LHE NEGANDO EFICÁCIA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Ressalto que foram analisadas cuidadosamente, as alegações trazidas em memoriais pelo Ministério Público do Estado do Amazonas e pela Defesa, confrontando-as com as provas acostadas aos autos. A decisão de pronúncia é um mero juízo de admissibilidade, de cunho meramente processual, com o fim único de submeter o réu ao julgamento do Tribunal do Júri. Pelas provas apresentadas, verifico que não tem como acatar as pretensões argüidas em memoriais pelo Ministério Público de desclassificação de homicídio doloso para homicídio culposoe nem a tese de absolvição sumária ou de desclassificação de homicídio doloso para culposo, apresentada em memoriais pela defesa, por
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verificar que os depoimentos das testemunhas tanto de acusação quanto de defesa, informam que a vítima Raylen Caldas Gomes estivera na loja “Word Micro Computadores” acompanhado de sua esposa, na data de 02 de dezembro de 2009, identificando-se com sua carteira funcional de policial, primeiramente ao segurança, depois já dentro da loja, à recepcionista, percorrendo juntamente com o gerente imediato Isaac Ferreira Sarmento, os vários ambientes do estabelecimento com o objetivo de falar com os responsáveis pela empresa. Em análise ainda aos autos, foi constatado que não houveram por parte da vítima, agressões verbais e físicas, ameaças aos funcionários e proprietários da empresa, que não houve invasão aos ambientes restritos da empresa, e que a vitima vítima Raylen Caldas Gomes e não apreendeu, nem retirou a arma do segurança e encontrava-se desarmada quando recebeu o tiro. Além disso, a alegação de ausência de animus necandi, dúvida quanto à real intenção do acusado, é questão diretamente ligada ao meritum causae que deve ser dirimida pelo juízo natural e constitucional do Júri, pois quem atira contra outrem assume, no mínimo, risco de tal resultado.
De igual modo, não há como desclassificar o delito pelo qual foi denunciado o acusado para o delito de homicídio culposo, nem como absolvê-lo sumariamente, tal questão não ficou bem esclarecida, pairando dúvidas acerca dos reais objetivos dos mesmos, pois o tiro acertou a vítima desarmada e a queima-roupa, sem agressão, sem ameaça, o que impede de se afastar a intenção homicida. Assim, tendo havido disparo de arma de fogo contra a vitima, o que não é negado pelo acusado, as questões relativas à intenção e à conduta de Leandro do Nascimento Guerreiro deve ser reservada para Tribunal do Júri. Nesse sentido, a orientação Pretoriana dos Tribunais Pátrios e do Excelso STF: "HOMICÍDIO - TENTATIVA - DESCLASSIFICAÇÃO - LESÕES CORPORAIS. Exsurgindo a ambigüidade, impõe-se a submissão do acusado ao juiz natural, que é o tribunal do júri. A este, então, cabe decidir pela existência, ou não, de crime doloso contra a vida." (STF, 2.ª Turma, HC n.° 75433/CE, Rel. Min. Marco Aurélio, v.u., j. 03.02.1998; in DJU de 13.031998, p. 4).
"Recurso em sentido estrito - Pronúncia - Tentativa de homicídio qualificado (art. 121 § 2º, IX e IV c/c art. 14, IX, ambos do CP) - Despronúncia Impossibilidade - Indícios suficientes de autoria, presente a materialidade -Desclassificação para o delito do art. 132 do CP - Não cabimento - "Animus
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necandi" - Dúvida que milita em favor da sociedade ("in dubio pro societate") - Recurso desprovido." (TJMG, 2.ª C.Crim., RSE n.° 1.0702.03.059534-3/001, Rel. Des. Sérgio Resende, v.u., j. 25.03.2004; pub. DOMG de 16.04.2004). "TENTATIVA DE HOMICÍDIO - PROVA EXISTÊNCIA DE DÚVIDA QUANTO À REAL INTENÇÃO DO AGENTE - DESCLASSIFICAÇÃO NA FASE DA PRONÚNCIA - IMPOSSIBILIDADE AFETAÇÃO AO TRIBUNAL DO JÚRI. A competência para julgar os crimes contra a vida é do Tribunal do Júri e, por isso, existente dúvida em relação à intenção homicida do réu, não se lhe pode subtrair o julgamento, em respeito ao princípio ""in dubio pro societate"". Na decisão pronunciatória, só se autoriza a desclassificação do delito se houver prova inconcussa acerca do ""animus necandi"". Na eventualidade de existir qualquer dúvida a respeito, por menor que seja, a palavra final é do Tribunal do Júri, juízo natural e constitucional dos ilícitos contra a vida." (TJMG, 2.ª C.Crim., RSE n.° 1.0194.03.027345-3/001, Rel. Des. Hyparco Immesi, v.u., j. 16.06.2005; pub. DOMG de 02.08.2005). "PROCESSUAL PENAL - PENAL - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - TENTATIVA DE HOMICÍDIO (ART. 121, ""CAPUT"", C/C ART. 14, II, AMBOS DO CPB). PRONÚNCIA - MERO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DA ACUSAÇÃO - REQUISITOS (CPP, ART 408): CONVENCIMENTO ACERCA DA EXISTÊNCIA DO CRIME E INDÍCIOS DE SUA AUTORIA - PRESCINDIBILIDADE DE PROVA CABAL - ""IN DUBIO PRO SOCIETATE"". A teor do disposto no art. 408 do Código de Processo Penal e precedentes jurisprudenciais, para que haja pronúncia, basta que se estabeleça convencimento acerca da existência de crime e indícios de sua autoria. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO INTENÇÃO DO AGENTE: QUESTÃO INTIMAMENTE LIGADA AO ""MERITUM CAUSAE"" - EXAME RESERVADO AO TRIBUNAL DO JÚRI. A aferição acerca da intenção do agente é questão diretamente ligada ao ""meritum causae"", e, sendo assim, o juízo preciso a ser formulado a esse respeito é de inteira competência do Tribunal do Júri. Recurso desprovido." (TJMG, 1.ª C.Crim., RSE n.°
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1.0418.05.978242-9/001, Rel. Des. Sérgio Braga, v.u., j. 22.08.2006; pub. DOMG de 29.08.2006).
Conseqüentemente, na esteira da orientação jurisprudencial citada, deve a pretensão desclassificatória do ilícito de homicídio doloso, incurso nas penas do artigo 121, § 2º, inciso IV (recurso que impossibilitou a defesa do ofendido), do Código Penal Brasileiro para o de homicídio culposo, ou a absolvição, ser submetida ao Tribunal Popular, não cabendo à pronúncia fazê-lo, sob pena de subtrair-se do seu Júri questão sobre a qual cabe-lhe, com exclusividade, deliberar. Ademais, se a pronúncia o fizesse, acabaria por violar sua soberania. Quanto à qualificadora que consta na denúncia, extraindo-se dos autos indícios necessários para o acolhimento da mesma, deve-se reservar exame mais apurado a respeito de sua pertinência ou não, assim como do inteiro teor da denuncia para o Tribunal Popular Soberano, cuja competência lhe é constitucionalmente assegurada (art. 5.° inciso XXXVIII, alínea 'd', da CF/88). Ademais, na conformidade da orientação contida na jurisprudência pátria: "Deve-se deixar ao Tribunal do Júri a inteireza da acusação, razão pela qual não se permite decotar qualificadoras na fase de pronúncia, salvo quando manifestamente improcedentes. (unanimidade)." Nesse sentido, a doutrina de Guilherme de Souza Nucci: "Exclusão de qualificadoras ou causas de aumento de pena: somente em situações excepcionais, segundo doutrina e jurisprudência amplamente majoritária no País, pode o juiz afastar qualificadora ou causa de aumento específica, constante da denúncia. Tratando-se de componente do tipo penal incriminador de delito doloso contra a vida, tem o juiz a possibilidade de analisar a sua existência ou inexistência, ainda que deva fazê-lo com especial cuidado, para não se substituir aos jurados, juízes naturais da causa. Uma qualificadora absurda, não encontrando mínimo respaldo na prova dos autos, merece ser afastada. Entretanto, quando a avaliação da qualificadora for nitidamente controversa, como por exemplo, o caso do ciúme ser ou não motivo fútil, segundo nos parece, deve o juiz remeter o caso à apreciação do Conselho de Sentença, sendo-lhe defeso invadir seara que não lhe pertence.
[...] o juiz, por ocasião da pronúncia, somente pode afastar a qualificadora que, objetivamente, inexista,
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mas não a que, subjetivamente, julgar não existir. A análise objetiva dá-se no plano das provas e não do espírito do julgador. [...] Em conclusão: ao juiz cabe analisar objetivamente, a existência da qualificadora; aos jurados permite-se a análise subjetiva quanto à sua manutenção ou não." (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado, 2.ª ed. rev., atual. e ampl., São Paulo, Editora RT, São Paulo: 2003, p. 604-605). STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp 351597 DF 2001/0114343-0 Resumo: Penal. Processual. Recurso Especial. Pronúncia. Qualificadoras. Exclusão. Impossibilidade. Princípio In Dubio Pro Societatis. Competência do Tribunal do Júri. Recurso Especial Provido. Relator(a): Ministra LAURITA VAZ Julgamento: 16/06/2003 Órgão Julgador: T5 - QUINTA TURMA Publicação: DJ 04.08.2003 p. 356 Ementa PENAL. PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. PRONÚNCIA. QUALIFICADORAS. EXCLUSÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO IN DUBIO PRO SOCIETATIS. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. O Tribunal revisor, salvo em casos excepcionais, não pode afastar as circunstâncias qualificadoras propostas na denúncia e mantidas pela sentença de pronúncia, pois, havendo indícios de sua existência e incerteza sobre as circunstâncias fáticas, deve prevalecer o princípio in dúbio pro societatis. 2. Recurso especial conhecido e provido Não havendo, pois, qualquer dúvida acerca da qualificadora em comento, e se dúvida houvesse, teria de ser levado em conta que na pronúncia, a dúvida reverte-se a favor da sociedade.
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A pronúncia é mero juízo de admissibilidade; certa a existência do crime, toda e qualquer discussão que se distancie dos indícios da autoria, deve ser feita perante o Tribunal do Júri, vigorando, nesta fase, o princípio in dubio pro societate. Desse modo, na conformidade da orientação doutrinária e jurisprudencial, as qualificadoras só podem ser excluídas quando, de forma incontroversa, mostrarem-se totalmente improcedente, sem qualquer apoio nos autos, sob pena de se invadir a soberana competência do Tribunal do Júri. Expõe o art. 413 e parágrafos do CPP: . O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena. Se o crime for afiançável, o juiz arbitrará o valor da fiança para a concessão ou manutenção da liberdade provisória. juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código.”
Para que o réu seja pronunciado é necessário apenas a existência de elementos que comprovem a materialidade do delito e indícios suficientes de autoria quanto ao responsável.[...] Remanescendo incertezas fundadas acerca da conduta do réu deve ser aplicada a máxima do in dubio pro societate (na dúvida, pró sociedade)".Em o Ministério Público às fls. 609/636, afirma ter sido provada a materialidade do delito, pelo Laudo de Exame Necroscópico de fls. 20, assim como a autoria, induvidosa, até mesmo pela confissão do réu. Acrescento que a sentença de pronúncia, segundo a moldura do art. 408, do CPP, apenas se proclama a admissibilidade da acusação, em face da
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prova da existência do crime e de indícios de autoria, sendo vedado realizar forte incursão sobre a pretensão acusatória para não exercer influência no ânimo do Conselho de Jurados, que é o Juízo Natural para o julgamento. Sendo assim, recomenda a prudência que, por ora, deixemos a avaliação do elemento subjetivo da conduta do acusado a critério do Tribunal do Júri que, por força do Texto Constitucional, é o juiz natural dos crimes dolosos contra a vida. No presente caso, faz-se importante a análise na qual vigora o princípio in dubio pro societate . Trata-se de uma decisão, pela qual o magistrado declara a viabilidade da acusação por se convencer da existência do crime e indícios que o réu seja o seu autor. Neste sentido, dispõe o artigo 413: "O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação ". O princípio in dubio pro societate , uma espécie de resposta e contrapeso ao princípio in dubio pro reo , impõe ao juiz um raciocínio de que, mesmo que não haja certeza, mas se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, ele deverá pronunciar o acusado, para que a própria sociedade, representada pelos jurados, decida sobre a condenação ou não do acusado, tudo em conformidade com o disposto no artigo 5º, inciso XXXVIII: é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a plenitude de defesa; o sigilo das votações; a soberania dos veredictos e a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. A este respeito, vale citar entendimento do STJ por ocasião do julgamento do , cujo relator foi o Ministro Felix Fischer, publicado em 23/03/2009: Ementa: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. JÚRI. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRONÚNCIA. PROVAS. PRINCÍPIO IN DUBIO PRO SOCIETATE . CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. I - Em se tratando de crime afeto à competência do Tribunal do Júri, o julgamento pelo Tribunal Popular só pode deixar de ocorrer, provada a materialidade do delito, caso se verifique ser despropositada a acusação, porquanto aqui vigora o princípio in dubio pro societate. Outras jurisprudências pátrias: TJPI - Recurso em Sentido Estrito: RECSENSES
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201000010050781 PI Processual Penal -Recurso em Sentido Estrito -Decisao de Pronúncia -Réu Confesso -Materialidade do Crime -Requisitos Legais Para a Pronúncia Preenchidos -Decisao Irrepreensível -Nulidade do Processo -Adiamento de Aud... Dados Gerais Processo:RECSENSES 201000010050781 PI Relator(a):Des. Raimundo Nonato da Costa Alencar Julgamento:07/12/2010 Órgão Julgador:1a. Câmara Especializada Criminal Ementa PROCESSUAL PENAL -RECURSO EM SENTIDO ESTRITO -DECISAO DE PRONÚNCIA -RÉU CONFESSO -MATERIALIDADE DO CRIME -REQUISITOS LEGAIS PARA A PRONÚNCIA PREENCHIDOS -DECISAO IRREPREENSÍVEL -NULIDADE DO PROCESSO -ADIAMENTO DE AUDIÊNCIA NEGADO -APRECIAÇAO DE PROVA DESNECESSÁRIA -CONVENCIMENTO FUNDAMENTADO DO MAGISTRADO -DOCUMENTAÇAO DESNECESSÁRIA AO EXAME DA LIDE - QUALIFICADORAS DO CRIME DE HOMICÍDIO -APRECIAÇAO DE SUA EXISTÊNCIA OU NAO -COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI -RECURSO CONHECIDO E NAO PROVIDO 1.A decisão recorrida, ao pronunciar o recorrente, ateve-se à demonstração clara dos requisitos do artigo do , quais sejam, a existência de indícios suficientes de autoria, dado que se trata de réu confesso, e da materialidade do crime.2.Convencido o magistrado da existência de tais condições, não lhe resta outra opção a não ser pronunciar o réu, levando-o ao julgamento perante o júri.3.Não se traduz em nulidade a simples negativa de adiamento de audiência para apreciação de nova documentação, dado que cabe ao magistrado, fundamentadamente, decidir se tal ou qual prova se mostra necessária à instrução criminal.4.A qualificadora do crime de
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homicídio somente poderá ser afastada pelo juiz singular quando, de modo manifesto, for improcedente, sob pena de arvorar-se o magistrado na competência constitucionalmente firmada para o júri.5.Recurso em sentido estrito conhecido e não provido.
Acórdão nº 1.0105.01.041303-4/001(1) de TJMG. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, 19 de Dezembro de 2005 PENAL E PROCESSO PENAL - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - DECISÃO DE PRONÚNCIA HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO (ART. 121, §2º, INCISO II, C/C ART. 14, INCISO II, AMBOS DO CP) - INTELIGÊNCIA DO ART. 408 DO CPP CONVENCIMENTO ACERCA DA EXISTÊNCIA DO CRIME E INDÍCIOS DE AUTORIA - RÉU CONFESSO - ARGUMENTAÇÕES INCIDENTES SOBRE DETALHES INCAPAZES DE AFASTAR OS REQUISITOS PARA A PRONÚNCIA - QUESTÕES PERTINENTES AO MÉRITO SÃO DE COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO ""IN DUBIO PRO SOCIETATE"" COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL DO TRIBUNAL DO JÚRI (CF/1988, ART. 5º, XXXVIII) - PRECEDENTES DO STJ. A teor do disposto no art. 408 do Código de Processo Penal e precedentes jurisprudenciais, para que haja pronúncia, basta que se estabeleça convencimento acerca da existência de crime e indícios de sua autoria. Recurso desprovido. No Recurso Especial nº 115.601, do Rio Grande do Sul (96.0076756-4), julgado em 10 de março de 1998, a Sexta Turma, sendo relator min. Anselmo Santiago, ementou: “Recurso Especial. Réu pronunciado por homicídio qualificado. Tribunal local que o despronuncia, baseado na dúvida de que oóbito da vítima teria ou não resultado de um crime. Basta, contudo, mero juízo de probabilidade. Aplicação, nessa fase, do provérbio in dubio pro societate. I– Para a pronúncia, basta o mero juízo de probabilidade de que tenha havido um crime, à vista dos indícios de autoria e
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materialidade. Desnecessária a certeza de sua ocorrência, o que se reserva para a decisão definitiva do Júri. II –Nessa fase, há de se aplicar o provérbio in dubio pro societate e não in dúbio pro reo, para que não se abstraia o acusado de seu juízo natural: o Tribunal Popular. Precedentes do STF e STJ. III – Recurso conhecido, restabelecida a decisão de primeiro grau.” No Recurso Especial nº 115.324, do Paraná (REG 96.0076299-6), julgado em 9 de junho de 1997, a Sexta Turma, relator min. Vicente Leal, exsurgiu a seguinte ementa: “Processual Penal. Pronúncia. Juízo de admissibilidade de acusação: existência material do fato criminoso e indícios de autoria. Inexigência de certeza quanto à autoria. In dubio pro societate. Segundo a moldura legal do art. 408, do Código de Processo Penal, a sentença de pronúncia consubstancia mero juízo de admissibilidade da acusação, em que se exige apenas o convencimento da prova material do crime e da presença de indícios de autoria, sendo descabido que se demonstre, nesse édito judicial, de modo incontroverso, quem seja o autor do delito. Nos crimes dolosos contra a vida, o juízo de certeza sobre a autoria, imprescindível apenas para a condenação, é da competência exclusiva do Tribunal do Júri, seu juízo natural, sendo vedado ao juízo singular,ao proferir a sentença de pronúncia, fazer longas incursões sobre a prova de autoria, susceptíveis de influenciar o corpo de jurados, sendo certo que, nessa fase Revista da Escola Paulista da Magistratura, ano 4, nº 1, p. 9-23, janeiro/junho – 2003. PRONÚNCIA IN DUBIO PRO SOCIETADE do processo, despreza-se a clássica idéia do in dubio pro reo, sobrelevando o princípio do in dubio pro societate. Recurso especial conhecido e provido.” E diz o venerando acórdão: “Ora, em tema de pronúncia, despreza-se a clássica idéia do in dubio pro reo, sobrelevando o princípio do in dubio pro societate.” Nos federativas, conserva-se a mesma orientação:
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“A decisão de pronúncia é de mera admissibilidade do Juízo, em que impera o princípio do in dubio pro societate, ou seja, que, em caso de dúvida, esta deve ser dirimida pelo Conselho de Sentença, juiz natural da causa” (TJSP, Rec., rel. Linneu Carvalho, RT 729/545). “Homicídio. O despacho de pronúncia, sendo meramente declaratório, faz ocorrer inversão da regra procedimental do in dubio pro reo para in dubio pro societate, em razão de que somente diante de prova inequívoca é que deve o réu ser subtraído de seu juiz natural: o Júri” (TJSP, Rec., rel. Reynaldo Alves, RT 619/340). “Na pronúncia, há inversão da regra procedimental in dubio pro reo para a in dubio pro societate, de sorte que somente diante de prova inequívoca pode o réu ser subtraído do julgamento de seu juiz natural, que é o Júri” (TJSP, rel. Nélson Schiavi, RT 605/304). “Não há como sustentar uma impronúncia fundamentada no brocardo in dubio pro reo. É que nessa fase processual há inversão daquela regra procedimental para a do in dubio pro societate em razão de que somente diante de prova inequívoca é que deve o réu ser subtraído ao julgamento pelo Júri, seu juízo natural” (TJSP, Rec., rel. Diwaldo Sampaio, RT 587/296). “A dubiedade de prova não beneficia a réu na fase de pronúncia” (TJRJ, Rec., rel. Décio Itabaiana, RT 583/422). Todos os arestos, em seguida referidos, extraíram-se de FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui (coords.), Código de Processo Penal e sua Interpretação Jurisprudencial, São Paulo: RT, 1999, v.2, p. 2.466. Outros arestos encontram-se colecionados por PEREIRA, José Ruy Borges, Tribunal do Júri: Crimes Dolosos Contra a Vida, São Paulo: Saraiva, 1993, na seqüência ao artigo 408, nºs 050/20, 30, 80, 87, 95, 117, 126 e 052/101, pp. 203-215 e 233. Revista da Escola Paulista da Magistratura, ano 4, nº 1, p. 9-23, janeiro/junho – 2003 -SÉRGIO MARCOS DE MORAES PITOMBO “A sentença de pronúncia, como decisão sobre a admissibilidade da acusação, constitui Juízo fundado de suspeita,, não o juízo de certeza que se exige para a
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condenação. Daí a incompatibilidade do provérbio in dubio pro reo com ela. É a favor da sociedade que nela se resolvem as eventuais incertezas propiciadas pela prova” (TJSP, Rec., rel. Dirceu de Mello, RT 583/352). “O brocardo in dubio pro reo é incompatível com o juízo de pronúncia. Se dúvida existe, cabe a Júri dirimi-la, pois é ele o juízo constitucional dos processos por crimes contra a vida, competindo-lhe reconhecer ou não a culpabilidade do acusado” (TJSP, Rec., rel. Goulart Sobrinho, RT 575/367). “O in dubio pro reo é incompatível com o Juízo de pronúncia. Se dúvida existe, cabe ao Júri dirimi-la. É ele o juízo constitucional dos processos por crimes contra a vida, competindo-lhe reconhecer ou não a culpabilidade do acusado” (TJSP, Rec., rel. Hoeppner Dutra, RT 22/36). “No despacho de pronúncia, sendo meramente declaratório, há inversão da regra procedimental do in dubio pro reo para in dubio pro societate, em razão do que somente diante de prova inequívoca é que deve o réu ser subtraído de seu juiz natural” (TJPR, Rec., rel. Ministro Lemos Filho, RT 465/339). D E C I D O. Preliminarmente, convém acentuar que, não eiva de vício a denúncia do Ministério Público, máxime deixou evidente a descrição da referida qualificadora e a sua ratificação durante a instrução o que remete ao art.121, parágrafo 2o, inciso IV (recurso que impossibilitou a defesa do ofendido), do Código Penal Brasileiro. A autoria e a materialidade do delito sub judice resultaram incontestes e indene de dúvidas, conforme se afere por todo o conjunto probatório, em especial, pela própria confissão do acusado LEANDRO DO NASCIMENTO GUERREIRO que confessou no interrogatório em juízo (fls.529/531) a autoria do homicídio que vitimou Raylen Caldas Gomes e o exame cadavérico da vítima (fls. 35 a 36) e oitiva das testemunhas em Juízodas oito testemunhas de acusação, conforme fls. 452/454; 455/456; 457/458; 459/460; 525/526; 527/528 e reinquirição de fls. 523/524. O delito em liça, conforme já relatado no decorrer da instrução processual, máxime pela forma desproporcional e insignificante dos motivos que o ensejaram.
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A versão do denunciado é muito duvidosa, principalmente se cotejada com os demais elementos de prova carreados para os autos. Se tal ocorreu, o fato da forma que a Defesa alega ou na forma requerida pelo Ministério Público, sua aferição deverá ser apreciado pelo colendo Conselho de Sentença. Com efeito, não vislumbro, a priori, qualquer circunstância extreme de dúvida que exclua a antijuridicidade ou que afaste a imputabilidade do acusado. Ex positis , tendo em vista o que mais dos autos consta e considerando, que o réu é confesso (autoria), que a materialidade está comprovada, em conformidade com o disposto no art. 413 “caput” e parágrafos, do Código de Processo Penal, JULGO PROCEDENTE a denúncia e PRONUNCIO o acusado LEANDRO DO NASCIMENTO GUERREIRO da infração constante da denúncia de Homicídio Doloso (Art.121, § 2º, inciso IV (recurso que impossibilitou a defesa do ofendido) do CPB), sujeitando-o a julgamento pelo 2º Tribunal Popular do Júri desta Comarca de Manaus.
Mantenho a liberdade do acusado, deixando de decretar a prisão preventiva do mesmo, face não permanecerem presentes os requisitos autorizadores da sua custódia cautelar, por não significar iminente perigo para a ordem pública e paz social, por não ter o acusado criado obstáculos na realização da instrução processual, nem ameaçado testemunhas. Fundamenta-se, pois a prisão preventiva nos artigos 311 e 312, do Código de Processo Penal, em garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal e segurança da futura aplicação da Lei Penal. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Manaus, 03 de junho de 2011 ELIEZER FERNANDES JÚNIOR Juiz de Direito (Portaria nº 505/2011)