Braga

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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAZONAS

Autos de Representação Penal Pública mediante representação Registro nº 001.08.233147-3 Representante: Carlos Eduardo de Souza Braga Representados:Cassiano Cirilo Anunciação, Francisco Cirilo Anunciação Neto e Cyro Batará Anunciação

Vistos em Representação criminal oferecida por Carlos Eduardo de Souza Braga, então Governador do Estado do Amazonas, perante o Procurador-Geral de Justiça, em face de Cyro Batará Anunciação, Francisco Cirilo Anunciação Neto e Cyro Batará Anunciação, respectivamente, Presidente e Vice-Presidentes do jornal Diário do Amazonas (fls. 02/08). A inicial aponta a prática do delito de calúnia cometido pelos três representados, inserta na matéria jornalística que ganhou a seguinte manchete: “Reeleição de “Belão” blinda Braga de investigação na ALE”, edição do dia 10 de julho de 2008. Despacho da Promotora de Justiça Sara Pirangy de Souza ordenando a distribuição dos autos para uma das Promotorias Criminais (09) Distribuído perante esta 8ª Vara, determinei a abertura de “vista” ao Promotor atuante (11). Promoção do MP com pedido de juntada aos autos de certidões de antecedentes criminais em nome dos representados, “posto que a totalidade das figuras típicas descritas no capítulo reservado aos delitos contra honra torna obrigatória, se preenchidos os requisitos de lei, a formulação de proposta de suspensão condicional do processo” (fls. 12). Juntada das certidões com nova “vista” ao MP (13) Manifestação do Ministério Público pelo recebimento da queixa-crime e posterior prosseguimento do feito (fls. 20). Decisão recebendo a Queixa-Crime e determinando a citação dos réus para respondê-la (22) Resposta dos três réus às fls. 29/46. Breve relatório. Passo a decidir.


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Por primeiro, deixo consignado que o rito a ser observado será o previsto no Código de Processo Penal (art. 394 e seguintes). A capitulação seguirá o Código Penal, no seu artigo 138 c/c o art. 141, II, haja vista a revogação da Lei de Imprensa pela mais alta Corte do País. A matéria jornalística, objeto da presente ação penal, diz respeito à eleição do Deputado Belarmino Lins (Belão) para o terceiro mandato de presidente da Assembléia Legislativa do Estado do Amazonas e suas repercussões perante o Executivo. O autor entende que o texto lhe calunia. No bojo da Queixa-Crime, destacou: “O governador Eduardo Braga foi o responsável pela eleição, ontem, do deputado Belarmino Lins (PMDB), o “Belão para um terceiro mandato de presidente da Assembléia Legislativa do Estado e pela aprovação da emenda constitucional que dá aos deputados estaduais o poder de eleger o governador e o vice-governador do Amazonas no caso de vacância dos dois cargos. Com a recondução de “Belão”, Braga tenta garantir que as informações de corrupção no governo não serão investigadas no Parlamento pelo menos até 2010. Com a aprovação da emenda, pretende utilizar a sua hoje maioria governista na ALE para eleger o seu sucessor num mandato “tampão”, no caso de se desincompatibilizar do cargo para concorrer a uma vaga de parlamentar, também em 2010.” Noutra passagem destacada pelo Autor, lê-se: “A prova de que foi Braga o responsável pela reeleição de “Belão” está numa cópia de e-mail ao qual o Diário teve acesso, em que o governador e o secretário de Estado do Governo, José Melo, trocam informações sobre vários assuntos, entre eles, a aprovação da emenda constitucional para a eleição dos mandados “tampões” de governador e vice-governador. No e-mail, Melo diz a Braga: “Conversei com o “Belão” sobre o mandato tampão. Ele disse que seguirá sua orientação e que, se for o caso, poderá aprovar a EC antes do recesso parlamentar. Braga responde: “tudo certo sobre o mandato tampão, Quero apenas garantias


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que será assim”. Os e-mails foram trocados entre os dias 24 e 25 de junho”. Deduz o hoje Senador Eduardo Braga que a matéria é especulativa e as conjecturas nela lançadas passam a constituir crimes, na medida em que se afirma que o referido e-mail, trocado com o Secretário de Estado seria a prova que está em busca de satisfazer interesses particulares, entre os quais o de não ser investigado e, por conseguinte, permanecer impune. Argumenta, ainda que o texto alude a crimes em tese, como “prevaricação”, “advocacia administrativa” e “corrupção passiva”, todos previstos na parte especial do Código Penal Brasileiro. Na resposta de fls. 29/44, os acusados refutam a prática do crime de calúnia. Salientam que a reportagem baseou-se em informações e e-mails obtidos por meio de fonte jornalística, “nas quais se revela a conversa que o secretário e o governador tiveram sobre a possibilidade de eleição de um governante para o exercício de um chamado “mandato tampão””. Adiantam que o jornal limitou-se a narrar os fatos, em homenagem ao direito-dever de informar os leitores sobre assuntos de interesse público. Justifica a especulação do texto aduzindo que é público e notória a existência de aliança política entre o governador e o presidente da ALE, ambos pertencentes ao mesmo partido político, PMDB na época do fato. Delimitada a controvérsia, passo decidir. Por primeiro, devo ressaltar que o argumento da matéria jornalística ter-se baseado em “e-mail apócrifo” (terceiro parágrafo de fls. 05) não procede. Não existe prova ou provas nos autos que conduzam o Juízo a tê-los como falsos. Por conseguinte, não restando provada a falsidade dos emails utilizados na notícia, a especulação que a eleição do Deputado B. Lins ajudaria na governabilidade do Estado é de toda razoável. Tanto no Senado quanto na Câmara, constitui fato público e notório a intervenção do Governo Federal na escolha dos presidentes de ambas as Casas Legislativas


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Por que a interferência? Porque o Governo sabe que poderá contar com a “complacência” dessas autoridades em determinados temas que possam desgastá-lo. Vamos a um exemplo concreto e atual: o caso da CPI sobre as irregularidades na área do Ministério dos Transportes. A Presidente da República "defenestrou" o ministro e uma penca de funcionários supostamente envolvidos em fraudes. Na hora em que a oposição reivindicou a abertura de uma CPI investigatória sobre o tema, o Presidente do Senado, José Sarney impediu sua abertura. Lá como cá, tudo igual. Não se está afirmar que, com tal medida, o Senador J. Sarney tenha interesse em encobrir supostos crimes cometidos pela turma do MT. Muito pelo contrário. Enquanto não julgado e condenado por qualquer crime que seus acusadores o apontam como autor, temos que tê-lo como cidadão impoluto. È mais sensato raciocinar que o litúrgico presidente do Senado Federal impediu a criação de uma CPI porque, se instalada e com liberdade para investigar, desgastaria ainda mais um Governo que se mostra tão desorientado quanto cachorro caído do caminhão de mudança. O texto do jornal Diário do Amazonas teoriza que a recondução de “Belão” garantiria que “informações de corrupção no governo não seriam investigadas”. Nota-se que a matéria faz referência à possíveis corrupções no governo E. Braga. Não há menção explicita a “corrupção ou corrupções do governador E. Braga”. A corrupção no governo Eduardo Braga pode ser entendida como aquela praticada por um secretário de estado, um gestor do dinheiro público, por um funcionário público etc. E informações sobre prática de possíveis atos de corrupção no governo Eduardo Braga foram noticiadas com freqüência durante sua gestão. Lembremos da rumorosa Operação desencadeada pela Polícia Federal nos idos de 2004.

Albatroz,


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A época, o então governador Eduardo Braga teve que desmentir a acusação de promessas de realização de obras públicas ao deputado Antônio Cordeiro, suposto chefe de um grupo acusado de desviar R$ 500 milhões nos últimos dez anos dos cofres do estado. O governador também defendeu os quatro secretários e ex-secretários estaduais suspeitos de envolvimento com a organização de Cordeiro. Nessa operação, a Polícia Federal do Amazonas apontou Roberto Lisboa Pimenta, diretor do Departamento de Gestão Financeira da Susam (Secretaria de Estado da Saúde), como autor dos crimes de formação de quadrilha, fraudes em licitações e advocacia administrativa, quando da realização da Operação Albatroz. Também a população amazonense tomou conhecimentos de outras situações semelhantes, como o “caso Renata”, “Emparsanco”, “Pampulha” e por aí vai. Embora dispensável a ressalva, ratifico que não se está a afirmar que o autor da ação é o responsável ou partícipe nas irregularidades citadas. Basta lembrar que prevalece em nosso ordenamento jurídico o princípio constitucional da inocência até que uma sentença penal adquira o contorno de definitiva O alongamento em mais exemplos soa irracional, razão pela qual deixo consignado que não restou caracterizado o crime de calúnia quando o jornal Diário do Amazonas “especulou” que a eleição de B. Lins garantiria “que as informações de corrupção no governo não seriam investigadas.” Bem de ver, especulação por especulação, a parte com mais legitimidade para reclamar da notícia seria o parlamentar que por pouco não usucapiu a cadeira de presidente da Assembléia Estadual. Diante desse quadro, observada a redação do art. 397, III, do Código de Processo Penal, absolvo sumariamente os réus Cassiano Cirilo Anunciação, Francisco Cirilo Anunciação Neto e Cyro Batará Anunciação da prática do suposto crime de calúnia cometido contra o então governador do Estado Carlos Eduardo de Souza Braga. P. R. e Intimem-se as partes e advogados via Diário Eletrônico. Não interposto qualquer recurso, arquivem-se os autos e dê-se baixa na distribuição.


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Manaus, 29 de agosto de 2011. Juiz Carlos Zamith de Oliveira Junior 8ª Vara Criminal


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