Edição 46 do Brasil de Fato MG

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3 CIDADES

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Marina Lana/AgEficaz

Política junto com diversão Na segunda (7), pessoas se reuniram na Praça Sete para brincar e discutir política. Quadrilha junina propôs Plebiscito da Constituinte por Reforma Política no Brasil

Minas Gerais

ESPORTES

Nem tudo é 7x1 (Também teve jogador vampiro). Nossa equipe fez uma retrospectiva dos fatos mais marcantes e engraçados da Copa no Brasil

11 a 17 de julho de 2014 • edição 46 • brasildefato.com.br/mg • distribuição gratuita

4 CIDADES

Suspeitas rondam a queda do viaduto Marcello Casal Jr Agência Brasil

ESPECIAL Entenda a proposta de deputados mineiros para mudar a Constituição do Estado e abrir caminho para privatização de empresas públicas. Querem começar com a Gasmig, subsidiária da Cemig, que pretendem passar para o controle de uma empresa de gás espanhola

5 MINAS

Divulgação/ Bloco das pretas

Conjunto de obras do BRT é alvo de investigação pelo Ministério Público e Polícia Civil. Dentre elas, a possível ilegalidade de contrato de Consórcio com Prefeitura de BH

7 BRASIL

6 MINAS

Transnacionais levam nosso dinheiro

Guerra na Síria trouxe jovens a BH

Com crise na Europa e EUA, aumenta o envio dos lucros de empresas estrangeiras que atuam no Brasil. Falta de taxação da remessa de dólares torna país mais dependente

150 mil pessoas já morreram na Síria. Fugindo do conflito, 22 jovens encontraram em Belo Horizonte acolhida através de paróquia dirigida por padre sírio há 11 anos no Brasil

Racismo assombra Minas Gerais “Maior parte da população é negra, mas estado ainda vive como no período escravista”, aponta Ângela Gomes, doutora pela UFMG


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OPINIÃO

Belo Horizonte, de 11 a 17 de julho de 2014

editorial | Brasil

editorial | Minas Gerais

Mais médicos aumentou consultas Os inimigos do povo e reduziu internações O programa Mais Médicos completa um ano e foram apresentados os seus impactos em Minas Gerais. É a hora de o povo mineiro também fazer seus balanços. Com o Mais Médicos, houve um crescimento de 21,6% no total de consultas nos postos de saúde nas cidades mineiras, 100% da demanda por médicos dos municípios foi atendida, alcançando 4,2 milhões de mineiros. No total, 1235 médicos trabalham no estado, em 463 municípios e um distrito sanitário indígena. Portanto, o Mais Médicos aumentou o acesso à assistência médica no SUS em Minas Gerais. Houve também redução de 21% no número de encaminhamentos a hospitais feitos por postos de saúde onde há profissionais do Mais Médicos, diminuiu a superlotação de UPAs e hospitais. Além disso, a proposta é formar mais médicos no Brasil, com mais 11,5 mil vagas em cursos de medicina até 2017. Porém, não podemos formar nos-

Houve um crescimento de 21,6% no total de consultas nos postos de saúde e redução de 21% no número de encaminhamentos a hospitais

suas equipes de saúde da família, como ocorre em quase todo o Brasil, mas no máximo 1,5 mil pessoas. E o financiamento da saúde, mesmo com alguns avanços recentes, é ainda insuficiente, já que apenas cerca de 4% do PIB é investido em saúde pública, ao contrário do que acontece em Cuba com 11% do PIB, Alemanha com 8,9% e Argentina com 6,3%. Por fim, o povo mineiro não precisa apenas de mais médicos. O acesso à terra, por exemplo, assim como à educação, moradia digna, salários adequados às necessidades do trabalhador e transporte público eficiente têm impactos diretos sobre a percepção de saúde de um indivíduo. A saúde depende de reformas estruturais para a garantia dos nossos direitos fundamentais. Essas transformações só serão possíveis com a mudança do atual sistema político. E nesse momento, a esperança é o plebiscito popular para convocarmos a Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político.

Os ataques do articulista da Revista Veja, Rodrigo Constantino, detonando o Plebiscito Popular sobre uma Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político mostram o pavor que a direita tem desta proposta. Quando a Presidenta Dilma lançou a proposta de um Plebiscito legal que decidisse a convocação de uma constituinte, o pensamento reacionário cerrou fileiras. O Ministro do STF Gilmar Mendes, porta-voz do pensamento de direita afirmou: “fui dormir na Espanha e acordei na Venezuela”. Discursos irados acusaram o Plebiscito de “golpe”. Os mesmos ataques ocorrem agora diante do Decreto Federal que cria a Política de Participação Social. A iniciativa que estabelece limitados mecanismos para acompanhar a formulação, a execução, o monitoramento e a avaliação de programas de políticas públicas, também foi chamado de “golpe bolivariano”. Qualquer iniciativa para ampliar a democracia desperta um

sos médicos sem esquecer das lições cubanas para a saúde do povo brasileiro. Lição de que o médico pode ser camponês, negro, mulher, filho de uma trabalhadora doméstica. E lição de que a medicina pode ser feita com qualidade técnica na comunidade, com humildade e humanidade, voltada para a pessoa e não para a doença. Bons médicos não fazem saúde sozinhos. Profissionais como os agentes comunitários de saúde, enfermeiros, assistentes sociais, entre outros, garantem mais qualidade no cuidado em saúde. O próximo passo é a luta por melhores condições de trabalho e pelo financiamento do SUS. Os cubanos, por exemplo, não atendem em Cuba 5 mil ou até 20 mil pessoas em

O jornal Brasil de Fato circula semanalmente em todo o país e agora também com edições regionais, em SP, no Rio e em MG. Queremos contribuir no debate de ideias e na análise dos fatos do ponto de vista da necessidade de mudanças sociais em nosso país e no nosso estado.

verdadeiro pânico no pensamento de direita. Tocar no sistema político é o mais grave dos pecados. A direita sabe que o descontentamento com a falência do atual sistema político esteve presente nos milhares de pequenos cartazes, palavras de ordem e pichações das ma-

Querem impedir que a juventude disposta a lutar se aproprie de uma bandeira política nifestações de junho de 2013. Sabe que uma palavra de ordem como a Constituinte Soberana do Sistema Político pode ganhar força e tornarse uma ameaça real ao seu poder. Para tanto, utiliza a tese de que a bandeira da Constituinte é para “servir ao projeto do PT”. Ignoram, propositalmente, que a campanha é muito mais ampla e que congrega a maior parte das forças de esquerda. Ignoram o apoio da candidata à Presidência do PSOL, Luciana Genro, da Deputada Luiza Erundina do PSB, de inúmeros artistas e intelectuais. Jamais mencionam que a campanha já envolve as principais organizações sociais brasileiras, reunindo mais de 240 movimentos sociais. Querem impedir que a juventude disposta se aproprie de uma bandeira política. Sem enfrentar um sistema político em que os grandes grupos econômicos ampliam suas bancadas a cada eleição, na qual a mais tímida das iniciativas políticas é soterrada e a alegação da correlação de forças desfavorável trava qualquer intento popular, estaremos condenados a um cenário em que mesmo quando conquistamos vitórias eleitorais somos empurrados para a lógica do recuo. Diferente de outras campanhas decisivas como a luta contra a ALCA, desta vez estamos discutindo diretamente o poder. E a história nos mostra que nesse ponto a classe dominante não vacila.

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conselho editorial minas gerais: Adília Sozzi, Adriano Pereira Santos, Beatriz Cerqueira, Bernadete Esperança, Bruno Abreu Gomes, Carlos Dayrel, Cida Falabella, Cristina Bezerra, Deliane Lemos de Oliveira, Durval Ângelo Andrade, Eliane Novato, Ênio Bohnenberger, Frederico Santana Rick, Frei Gilvander, Gilson Reis, Gustavo Bones, Jairo Nogueira Filho, Joana Tavares, João Paulo Cunha, Joceli Andrioli, José Guilherme Castro, Juarez Guimarães, Laísa Silva, Luís Carlos da Silva, Marcelo Oliveira Almeida, Michelly Montero, Milton Bicalho, Neemias Souza Rodrigues, Nilmário Miranda, Padre Henrique Moura, Padre João, Pereira da Viola, Renan Santos, Rilke Novato Públio, Rogério Correia, Samuel da Silva, Sérgio Miranda (in memoriam), Temístocles Marcelos, Wagner Xavier. Administração: Vinicius Moreno. Distribuição: Larissa Costa. Diagramação: Luiz Lagares. Revisão: Luciana Santos Gonçalves Editora regional: Joana Tavares (Mtb 10140/ MG). Repórteres: Maíra Gomes e Rafaella Dotta. Fotógrafia: Agência Eficaz. Estagiária: Raíssa Lopes. Endereço: Rua da Bahia, 573 – sala 306 – Centro – Belo Horizonte – MG. CEP: 30160-010.


Belo Horizonte, de 11 a 17 de julho de 2014

CIDADES

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Política criativa na Praça Sete REFORMA POLÍTICA Plebiscito que pede novas leis para a política faz protestos com uma nova cara e ganha apoio da população Marina Lana/AgEficaz

Rafaella Dotta A segunda-feira (7) foi inundada por brincadeiras, danças e cartazes. Organizadores do Plebiscito pela mudança do sistema político fez uma ação um tanto diferente na Praça Sete, em Belo Horizonte. As manifestações aconteceram também em 14 estados do país e teve o objetivo de divulgar o Plebiscito. “Ah, ah, ah... Mudar o Congresso” cantavam e dançavam os jovens, em uma paródia de “Lepo Lepo”. A intenção é tornar a mobilização política mais interessante, diz Filipe Rodrigues, um dos organiza-

dores. Ele afirma que os problemas já fazem parte do dia a dia do brasileiro, “o que precisamos mostrar é alegria e soluções, e não ficar remoendo denúncias”, disse. O ato, inusitado para a política, conquistou a atenção de muitas pessoas. “É interessante porque é leve e divertido. Se as manifestações sempre forem assim, é mais fácil participar”, afirmou Juliane Reis. O dia terminou com uma quadrilha junina, em que foi encenado um casamento entre o “povo” e o “poder”. A brincadeira remete ao problema de que, hoje, somente políticos financiados por gran-

Ato inusitado conquistou a atenção de muitas pessoas

des empresas conseguem se eleger. Enquanto isso, os mais pobres e as mulheres, por exemplo, continuam a não ser representados, afirma Cazu Shikasho, membro do Comitê Metro-

Feira de economia solidária movimenta Savassi COLETIVO 30 barracas expõem trabalho de produtores autônomos Joana Tavares O movimento da Copa do Mundo não se restringe aos campos de futebol. A economia das cidades que recebem o evento também se altera, com o incremento dos gastos dos turistas. Em BH, além do comércio formal, uma feira de economia solidária é alternativa para o consumo diferenciado. São 30 barracas, armadas no bairro que mais recebe estrangeiros, a Savassi, na região Sul. Participam pessoas de todo o estado, que produzem artesanalmente e de forma coletiva, priorizando valores como a saúde, o respeito ao meio ambiente e a solidariedade. “Existem muitos artesãos, muitas famílias que produzem e nós agrupamos essas pessoas dentro do projeto da economia solidária. Com isso, queremos, em uma segunda oportunidade, propiciar a forma-

lização desses trabalhadores”, explica Eduardo Bernis, Secretário de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social. A feira começou no dia 11 de junho e vai até o final da Copa, no dia 13 de julho. Organizada em parceria entre os governos federal, estadual e municipal, faz parte da agenda de trabalho decente, da Organização Internacional do Trabalho. Segundo Hélio Rabelo, presidente do Conselho Es-

Feirantes esperam continuar após Copa tadual de Economia Solidária, a feira é uma oportunidade para expor uma forma de trabalho fora da agenda capitalista. “São empreendimentos sobretudo de mulheres, coletivos, solidários, que cuidam do meio ambiente e não praticam trabalho escravo ou infantil”, afirma.

Mudança de vida Neuza Maria Ferreira não gostava do seu trabalho, que tomava quase todo seu tempo. Depois que começou a produzir bolsas de material reciclado com outras seis mulheres de seu bairro, o Coração Eucarístico, ela conta que sua vida mudou. Passou a ter mais tempo para ficar com seu filho, para ler e ter ideias para seu artesanato. Ela entrou em contato com as discussões da Economia Popular Solidária e diz que sua percepção sobre o mundo também mudou. “Eu não entendia o que era solidariedade. É ver tudo com outro olhar. Não é ter dó, é compartilhar, dividir mesmo com outro. É um modo de viver, de construir um mundo melhor”, diz. Neuza e os demais feirantes esperam que a feira se torne permanente na Savassi, mesmo depois da Copa do Mundo.

politano do Plebiscito. Cazu acredita que ações como essa podem dar estímulo à realização do Plebiscito, que terá sua coleta de votos entre 1º e 7 de setembro em todo o país.

Pessoas interessadas em mais informações ou organizar comitês podem entrar em contato pelo e-mail plebiscitopopularmg@ gmail.com.

PERGUNTA DA SEMANA No dia 3 de junho, parte do Viaduto Guararapes, na Avenida Pedro I, desabou sobre quatro veículos, por volta das 15h. A tragédia deixou dois mortos e 26 feridos. Em entrevista à imprensa no mesmo dia, o prefeito Marcio Lacerda afirmou que fiscais da prefeitura acompanhavam a obra e que “acidentes como esse infelizmente acontecem”.

E você, acha que acidentes como esse realmente “acontecem”?

O que aconteceu não pode ser visto com naturalidade. Foi uma obra feita pela administração pública, que tem fiscalização, recursos técnicos e de engenharia. Despende-se muito dinheiro público. Então, dizer que acidentes acontecem não é resposta. Luís Carlos dos Santos, 44 anos, funcionário público municipal

Achei absurdo o que o Márcio Lacerda falou. Ele disse como se o que aconteceu não tivesse culpados. Porque se aquela queda aconteceu, foi porque era uma obra mal feita. Não houve fiscalização, acompanhamento, e isso com certeza levou a essa tragédia. Regina Célia de Oliveira Barbosa, 53 anos, consultora de vendas


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CIDADES

Belo Horizonte, de 11 a 17 de julho de 2014

Contratação ilegal, ligações entre políticos e empresas

FATOS EM FOCO Professores brasileiros trabalham mais que a média mundial

DESABAMENTO Descaso da PBH e Cowan geram perigo à população Maíra Gomes Uma semana após a queda do viaduto na Avenida Pedro I, irregularidades sobre a obra não param de aparecer. O elevado Batalha dos Guararapes, parte das obras do BRT Antônio Carlos/Pedro I, começou a ser construído há um ano, quando estava sob responsabilidade do Consórcio Integração, composto pelas empresas Cowan e Delta. A última saiu do consórcio no início das obras. O viaduto estava em fase final de acabamento, quando desabou na quinta (3), deixando duas mortes e 23 feridos. O conjunto de obras de todo o Sistema BRT já era alvo de investigação no Ministério Público de Minas Gerias (MPMG) desde 2012. Dentre outras suspeitas, o contrato com a Prefei-

tura é questionado por ter sido assinado antes mesmo de o Consórcio Integração existir. Somente três meses depois de o negócio ser fechado pelo prefeito Marcio Lacerda, no valor de R$170 milhões, é que o Consórcio veio a apresentar um CNPJ. Também na lista de investigação do MPMG está o sobrepreço de materiais, alguns declarados até 350% acima do valor comum de mercado. Segundo relatório do Tribunal de Contas de Minas Gerais (TCE -MG), o superfaturamento no projeto pode alcançar os R$ 6 milhões. Falhas estruturais no conjunto das obras reforçam a necessidade de investigação. A pedido do MP, Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (CREA-MG) já realizava perícia nas obras do BRT. Cinco meses atrás, outro

Reprodução

Lacerda assinou contrato antes mesmo de o Consórcio Integração existir

viaduto das obras na Pedro I cedeu 30 centímetros, interditando a via por três dias. Também no sistema BRT, um laudo técnico apresentado no fim de junho indicava “falhas es-

truturais graves” na estação BRT São Gabriel. O documento alerta para o risco de ruptura e queda de peças metálicas da cobertura da estação, por onde passam 80 mil pessoas por dia.

E daqui para frente? O secretário de Obras da Prefeitura de Belo Horizonte (PMBH) e presidente da Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), Lauro Nogueira, reconheceu que houve descaso na fiscalização da obra do viaduto, e disse que a prefeitura é corresponsável pela queda de uma das alças do elevado. “A prefeitura tem responsabilidade, assim como a construtora e os técnicos contratados para a fiscalização”, afirmou. Após 30 dias, será publicada a causa da queda. O Instituto Brasileiro de Avaliação e Perícias de Enge-

“A prefeitura tem responsabilidade, assim como a construtora ” nharia (Ibape), o Conselho Regional de Engenharia (CREA), e peritos contratados pela Cowan, produzirão laudos que devem chegar a um resultado final. As primeiras análises sinalizam que um afundamento de seis metros do pilar principal, após a retirada das escoras, pode ter causado o desabamento. A Polícia Civil do Estado de Minas Gerais informou Reprodução

que o inquérito policial destinado a apurar as circunstâncias que envolveram a queda do viaduto já está em andamento na 3ª Delegacia Regional de Venda Nova, onde mais de 20 pessoas já foram entrevistadas. CPI do BRT Vereadores da oposição em BH querem criar uma Comissão Parlamentar de

Inquérito (CPI) que investigue queda do viaduto e outras obras do BRT. Na segunda (7), os vereadores Adriano Ventura (PT), Arnaldo Godoy (PT), Gilson Reis (PCdoB), Iran Barbosa (PMDB), Juninho Paim (PT) e Pedro Patrus (PT) se reuniram para pensar a proposta. Deputados estaduais também estudam possibilidade.

Doações em campanha A construtora Cowan doou 2,8 milhões para campanhas eleitorais em 2012, segundo levantamento da ONG Contas Abertas. Os recursos foram repassados para apenas três partidos, com R$ 1,8 milhões para o PMDB; R$ 500 mil para o PCdoB e R$ 500 mil para o PSDB. Apesar de não ser ilegal, o cientista político Frederico Rick aponta ligação entre essas doações e a corrupção no país. “Empresas não doam, fazem investimentos e esperam retorno. Este vem na forma de contratos com o poder público, que estão na origem da corrupção”, diz. Assim, Frederico reforça a urgência do debate da Reforma Política no Brasil, que pode mudar as formas de financiamento de campanha.

Enquanto professores de todo o mundo trabalham em média 19 horas por semana, brasileiros fazem 25 horas. A informação é resultado da Pesquisa Internacional sobre Pesquisa e Aprendizado (Talis) feita pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que ouviu 100 mil professores e diretores de 34 países. De acordo com o estudo, somente 12,6% dos professores acham que são valorizados e 87% se sentem realizados no emprego. Na média mundial, 30,9% responderam afirmativamente à valorização e 91% no quesito realização profissional. As informações integrarão o Censo Escolar, para análises mais precisas sobre a educação brasileira.

“Cadê o Mateus?” Protesto lembra desaparecimento de jovem Na terça-feira (8), moradores da Pedreira Prado Lopes (PPL) e apoiadores realizaram um ato para dar visibilidade ao desaparecimento de Mateus Souza Lopes. O adolescente, de 15 anos, desapareceu há quase dois anos, depois de ser abordado pela Polícia Militar no próprio bairro. Um inquérito foi aberto pela Corregedoria da PM logo após o desaparecimento, mas foi arquivado sob a justificativa de falta de evidências. O ato foi organizado pela Rede de Enfrentamento à Violência Estatal e marchou do bairro São Cristóvão à Rua Popular, na PPL, onde o jovem foi visto pela última vez.


MINAS

Belo Horizonte, de 11 a 17 de julho de 2014

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O desafio de ser negro em Minas ELEIÇÕES Seguindo a série do Brasil de Fato MG, movimento negro expõe suas demandas e reivindicações para candidatos ao governo do estado Maíra Gomes A população negra predomina no estado de Minas. De acordo com o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 53,5% dos mineiros se declararam pretos ou pardos. Já no século XVIII, o estado de Minas tinha a maior população negra do Brasil, escravizada para a lida com a extração de ouro e pedras preciosas. A doutora em Geografia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Ângela Gomes lembra que o Brasil foi o maior receptor de escravos do mundo, mas os brasileiros ainda tratam os negros como se fossem exceção. “Após a abolição, os negros não foram indenizados nem com terra nem foram reparados pelos 300 anos que trabalharam de graça. Pelo contrário, o que houve foi uma acentuação do racismo e da violência”, aponta. Um dos estados mais racistas, Minas não tem ao menos um deputado estadual negro, e diversos espaços no estado funcionam praticamente como o apartheid, segregando negros. “Em cada pedaço de Minas o racismo se manifesta. No território, no trabalho e até no genocídio da juventude”, reforça a professora, que declara que as mulheres

negras ganham 40% do que ganham as mulheres brancas e os homens negros, sobretudo no meio rural, chegam a ganhar 70% a menos que os brancos. Cultura negra: identidade e preconceito A cultura quilombola é considerada patrimônio cultural e é protegida pela Constituição, no art. 68. No entanto, desde a criação em 1988, até hoje o governo fez muito pouco. Os quilombos são espaços importantes para a livre manifestação da cultura e modo de vida do povo negro. Em Minas, são quase 500 comunidades quilombolas, e apenas uma tem a titulação da terra. Manifestações da cultura negra no Brasil contribuíram muito para criar a identidade brasileira, mas são desvalorizadas pela sociedade. Modalidades musicais de raiz negra, como o rap, ainda enfrentam preconceito. “Sempre vai haver um momento na história que a cultura negra vai ser discriminada. Antes era o samba e hoje é o funk, que é a manifestação que predomina nas periferias, que é feita pela juventude preta, pobre e favelada”, explica Bruno Vieira, integrante do Fórum das Juventudes da Grande BH.

Genocídio da juventude negra

As religiões de matriz negra também são alvo de preconceito sofrido pela umbanda e pelo candomblé, há quatro séculos. Tatetu Arabomi, de BH, diz que a sua religião foi “satanizada” por muito tempo. “Até o início dos anos 80, tinha que ter licença nas delegacias para poder funcionar, e até as delegacias que permitiam prostíbulos não permitiam terreiros”, conta. Apedrejamentos de casas destas religiões são frequentes. Uma forma de mudar este cenário de racismo é através da educação, que deve demonstrar de fato o

“Sempre há na história discriminação a cultura negra. Antes era o samba e hoje é o funk” que representa o povo negro na construção do brasileiro. “É muito importante que todos percebam que quando os europeus chegaram à África, não existiam ali um bando de selvagens, e sim reis e rainhas, em um processo até mais avançado que a Europa”, declara Bruno. Para tal, foi criada a Lei 10.639, de janeiro de 2003, que inclui no currícu-

lo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro -Brasileira”. No entanto, movimentos denunciam que a lei ainda não foi totalmente implementada. “Tem política pública e recurso federal, mas falta vontade da Secretaria de Educação de Minas para a aplicação da Lei”, aponta Markim Cardoso, membro da Coordenação Nacional de Entidades Negras (CONEN). Para ele, a solução passa pela formação de professores e criação de materiais didáticos adequados. Miriam Alves, do Coletivo de Estudantes Negros (CEN) da UFMG, reforça ainda a importância do in-

vestimento na educação como um todo para o empoderamento da população negra. “A educação pública está completamente precarizada em Minas, isso elimina a possibilidade de o negro ter atenção, já que a maioria dos pobres são negros”, diz. O combate a este preconceito deveria estar sendo feito principalmente pelo Estado, mas entidades denunciam que o racismo institucional é o maior inimigo. “Falta estrutura administrativa, recursos orçamentários e vontade política do governo do estado. . Nestes 12 anos o governo de Minas não fez nada”, aponta Markim.

Principais demandas em Minas Gerais • Transformar a atual Coordenadoria Estadual em Secretaria de Estado de Promoção da Igualdade Racial;

A cada três assassinatos cometidos no Brasil, dois são de jovens negros de 15 a 24 anos de idade, revela o Mapa da Violência 2013, elaborado pelo Centro Brasileiro de Estudos Latino -Americanos (Cebela). Em Minas, de 2001 a 2011, o número de homicídios subiu 80%, caracterizando o maior crescimento da região sudeste, enquanto Rio de Janeiro e São Paulo tiveram quedas nos índices.

De acordo com Míriam, os policiais são formados para classificar as pessoas de acordo com os estereótipos, criminalizando os jovens negros da periferia. “Quando a polícia entra na favela, já procura o jovem negro. Temos dados que apontam que quanto mais ação policial tem dentro da favela, maior é o número de mortes na localidade”, conta.

• Demarcação e Titulação dos Territórios Quilombolas; • Aprovação e imediata aplicação do Plano Estadual de Políticas Promoção da Igualdade Racial para o Estado de Minas Gerais; • Criação do Comitê Técnico Estadual de Saúde Integral da População Negra no SUS; • Implementar o Plano Nacional de Enfrentamento à Mortalidade da Juventude Negra, “O Plano Juventude Viva” como prioridade da gestão; • Implementar a Lei 10.639/11.645, que trata da inserção da História e Cultura Afro nas escolas; • Criação de um Grupo de Trabalho para a promoção da liberdade, valorização e respeito às religiões de Matriz Africana; • Criação do Centro de Informação e Referência da Cultura Negra de Minas Gerais; • Criação de ouvidorias dentro das escolas para crimes de racismo; • Garantir o direto das populações tradicionais de usarem a fitoterapia.


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MINAS

Belo Horizonte, de 11 a 17 de julho de 2014

Belo Horizonte recebe refugiados da Síria SOLIDARIEDADE Com situação de guerra no país, sírios ganham ajuda de brasileiros Rafaella Dotta

Marina Lana / Ag Eficaz

O Padre Jorge Rateb Massis veio da Síria há 11 anos e, desde então, celebra missas na Paróquia Sagrado Coração de Jesus, em Belo Horizonte. Nesse mesmo lugar, decidiu abrigar jovens que fogem da atual guerra civil síria, que já matou milhares de pessoas. Para continuar esse trabalho, o Padre diz que as ajudas são muito necessárias. De acordo com a ONG Observatório Sírio dos Direitos Humanos, até abril deste ano haviam morrido 150 mil pessoas na guerra civil do país. O conflito começou em 2011, quando manifestações pediram o fim do regime de Bashar Al Assad. Desde então teve início uma guerra civil na Síria.

“Os Estados Unidos estão estimulando a guerra com o mesmo objetivo que a fizeram no Iraque: tomar conta do petróleo”

O padre, que esteve pessoalmente na Síria no ano passado, diz que o atual conflito é fruto de intervenções externas. “A Síria era um país de paz. A guerra que está acontecendo lá está sendo feita por pessoas de fora, que não são sírios”, diz. Ele afirma que alguns países, como Estados Unidos, estão estimulando a guerra com o mesmo objetivo que a fizeram no Iraque: tomar conta do petróleo. Uma casa Para tentar uma nova vida, 22 rapazes sírios, de 18 a 25 anos, decidiram deixar suas famílias e pedir asilo ao Brasil, o único país que manteve a embaixada aberta a refugiados. Ilian Sucar fugiu do que chama de situação “muito difícil” na Sí-

ria, em que convivia com bombas e terror cotidianamente. Depois de cinco meses no Brasil e com novo emprego, o jovem começa a se restabelecer e aprender o nosso idioma. A Campanha Juntos pela Síria (conta corrente abaixo) é uma forma de ajudar os refugiados e pessoas que permanecem no país que, segundo o padre, estão sem alimentos e remédios. “Essa ajuda é muito necessária, e é com o apoio de pessoas maravilhosas, que são os brasileiros, que temos conseguido fazer esse trabalho de apoio”, declarou.

Campanha Juntos pela Síria Banco do Brasil Conta Corrente: 30.351-8 Agência 3494-0

Veja no Programa Outras Palavras deste domingo (13/07) A trajetória de lutas do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais, que comemora 35 anos de existência, numa conversa com a primeira mulher a presidir a União dos Trabalhadores em Educação (UTE) e o Sind-UTE/MG, Rosaura de Magalhães Pereira. Acompanhe ainda uma discussão com o coordenador-geral do Sindieletro-MG, Jairo Nogueira Filho, sobre os impactos da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 68), em tramitação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, que propõe privatizar a Cemig e a Gasmig. A terceirização volta a ser o tema do Momento CUT Minas, na visão do procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho em Minas, Hélder Santos Amorim.

Outras s a r v a l a P

Todos os domingos, na TV Band, de 7h as 7h:30.

www.sindutemg.org.br

Fique Ligado! Filiado à

Julho/2014

O programa Outras Palavras é uma produção do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE/MG).


Benedito Maia

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MINAS

Belo Horizonte, de 11 a 17 de julho de 2014

Sindicalistas pedem arquivamento da PEC 68

AgEficaz

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Trabalhadores afirmam que não são contra gasoduto, mas criticam mudança na legislação que permite privatização das subsidiárias de estatais. Nova audiência pública será convocada, desta vez com representantes da Petrobras e do BNDES

Minas Gerais

Julho de 2014 • especial • brasildefato.com.br/mg • distribuição gratuita • brasildefatomg@brasildefato.com.br

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Governo mineiro quer mudar a Constituição para privatizar Reprodução

Reprodução

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Gasoduto cinco Quem propõe Mudança é a PEC inconstitucional vezes mais caro Apresentada pelo deputado do PPS Sebastião Costa (esq.), o texto já tem assinatura de 33 deputados, de um total de 77

Especialista em Direito Administrativo, Isabella Monteiro Gomes, explica como a medida fere a Constituição Federal e a Estadual

Devido à briga entre o PSDB de Minas e o de São Paulo, projeto vai custar cerca de R$ 2, 4 bilhões, quando poderia sair por R$ 473 milhões


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ESPECIAL

Belo Horizonte, Julho de 2014

Gasmig na mira da privataria tucana PEC 68 Mudança seria para viabilizar venda da companhia de gás para empresa espanhola PEC 50 x PEC 68

Da redação Em plena Copa do Mundo e a três meses da eleição para governador, chegou à Assembleia Legislativa de Minas uma Proposta de Emenda Constitucional, a PEC 68, que pode resultar na privatização das empresas estatais mineiras. Assinada por 33 parlamentares, a proposta de mudança do artigo 14 da Constituição do Estado retira da população o direito de decidir sobre o futuro do patrimônio público. Em 2001, no governo Itamar Franco, foi introduzida uma mudança na Constituição que estabeleceu novas exigências para a desestatização, a PEC 50. Desde então, qualquer proposta de venda de estatais mineiras precisa ser aprovada por três quintos dos deputados e passar por referendo popular. “O que o governo tucano quer agora é retirar essa exigên-

Gás não chegará em Uberlândia Essencial para viabilizar a fábrica de amônia em Uberaba, a construção do gasoduto está levantando falsas expectativas em relação ao trecho em que vai passar e até onde chegará. Na lógica privada, a exploração do segmento residencial depende do número de consumidores. Tanto que, em Belo Horizonte, o gás só chegou aos bairros nobres. Não há planejamento, nem de longo prazo, para a construção de ramais para as cidades no percurso do gasoduto, nem sua extensão até Uberlândia, como está sendo espalhado no Triângulo Mineiro

cia para todas as empresas que não são controladas diretamente pelo Estado, como é o caso da Gas-

mig, da Cemig Distribuição, da Cemig Geração e Transmissão. As subsidiárias da Copasa também

A PEC 50, aprovada no governo Itamar Franco, em 2001, determina que a privatização de uma empresa pública ou de economia mista - incluindo suas subsidiárias - só é possível com a criação de uma lei complementar, que precisa ser aprovada por três quintos dos deputados e por referendo popular.

A PEC 68, proposta pelo deputado Sebastião Costa (PPS), retira essa obrigatoriedade para as subsidiárias. Caso seja aprovada, mais de cem empresas que não são controladas diretamente pelo governo podem ser privatizadas, como a Cemig Distribuição e Cemig Geração/Transmissão.

estão sob risco”, denuncia Jairo Nogueira Filho, coordenador-geral do sindicato dos eletricitários (Sindieletro/MG).

nia. Atualmente, a Cemig detém 59,6% da Gasmig, o município de Belo Horizonte 0,4% e a Petrobras os outros 40%. Estimado em R$ 2 bilhões, o projeto do gasoduto está caro demais para a Petrobras, que pretende sair do negócio. Assim, a Cemig compraria a sua parte e depois revenderia 68% para a GNF. “Dessa forma, a distribuição do gás canalizado, que é uma concessão do Estado, sairia da estatal Gasmig para a iniciativa privada. E sem licitação pública”, reforça Jairo.

Gasmig é a bola da vez A PEC 68 vem ao auxílio da venda de ações da Companhia de Gás de Minas (Gasmig) para a espanhola Gás Natural Fenosa (GNF), com o objetivo de se criar uma nova empresa para garantir a construção de um gasoduto que ligue Queluzito a Uberaba, onde será implantada uma fábrica de amô-

Briga de tucanos pode custar R$ 2 bi a Minas Reprodução

Aloísio Lopes O projeto do gasoduto elaborado pela Cemig e pela empresa espanhola Fenosa tem um valor estimado de R$ 2,4 bi. Com uma extensão de 530 quilômetros, terá capacidade para conduzir 3 milhões de metros cúbicos de gás, da cidade de Queluzito, na região das Vertentes, passando pelo centro-oeste mineiro, até chegar a Uberaba, no Triângulo, onde vai atender uma unidade de fertilizantes fosfatados, conhecida como fábrica de amônia da Petrobras. O diâmetro do gasoduto, de 24 polegadas, estaria superdimensionado, segundo informações que a reportagem do Brasil de Fato MG apurou junto a técnicos do setor. Para que o gás chegue na pressão desejada bastariam 14 polegadas. Poderia ser construída uma estação de compressão no meio do caminho, por R$ 50 mi-

lhões, para eventual queda na pressão. A diferença de diâmetro aumenta o valor em R$ 1 bilhão. “Por que gastar mais sem necessidade técnica?”, pergunta Jairo Nogueira, coordenador-geral do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Energética de Minas Gerais. Ele defende transparência na elaboração e aprovação do projeto para evitar prejuízos futuros aos consumidores. Uma outra opção, ainda mais barata, está temporariamente parada devido a disputas políticas entre o governo de Minas e o de São Paulo. O gasoduto que traz o gás da Bolívia passa pelo interior de São Paulo, o que tornaria viável construir um ramal de Ribeirão Preto a Uberaba, cuja distância é de apenas 180 km. Mas o governo de São Paulo, comandado por Geraldo Alckmin (PSDB), não concordou em conceder a distri-

Empresas do Estado poderão ser vendidas à iniciativa privada buição do gás na região para transporte até Minas Gerais, em retaliação à disputa política com o governador Anastasia e o senador Aécio Neves (ambos também do PSDB) pela instalação da fábri-

ca de amônia. Neste caso, a Gasmig iria se associar à distribuidora Gás Brasiliano para viabilizar a obra, que teria um custo aproximado de R$ 473 milhões, equivalente a 20% do custo estimado do projeto que está sendo elaborado pela Cemig com os espanhóis. A Agência Nacional do Petróleo (ANP) e a Advoca-

cia Geral da União (AGU) também dificultaram a negociação, sob a alegação de que a nova Lei do Gás não prevê gasodutos interestaduais. Interessante é que ninguém teve a ideia de mudar a lei. Em vez disso, preferem mudar a Constituição. Se o interesse público prevalecesse, os nós político e jurídico poderiam ser facilmente desatados em benefício dos cofres públicos e da população. O ramal de Ribeirão Preto a Uberaba seria parte de um projeto da Transportadora de Gás Brasil Central (TGBC), que obteve licenciamento ambiental e de instalação do gasoduto de São Carlos até Brasília, numa extensão de 905 km. Apesar de maior no tamanho e na capacidade, seu custo estimado é de R$ 2,2 bi, menor que o custo do gasoduto que pretendem construir em Minas.


Belo Horizonte, Julho de 2014

ESPECIAL

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PEC 68 é inconstitucional DIREITO Advogada explica que mudança na lei retira palavra final da população mineira sobre patrimônio público Reprodução

Thaís Mota Segundo análise jurídica elaborada por especialistas em Direito Administrativo, as mudanças previstas na PEC 68 aparentemente ampliam os requisitos necessários para a privatização de uma estatal. No entanto, a alteração flexibiliza essa manobra em situações específicas. “A legislação atual exige a realização de referendo quando houver discussão sobre a desestatização de uma empresa prestadora de serviço público pertencente ao Estado, independente da forma de administração. Já a PEC 68 propõe a realização de votação popular apenas em casos de desestatização de empresas prestadoras de serviço público e controladas diretamente pelo Estado”, explica a advogada Isabella Monteiro Gomes.

A medida atende diretamente ao governo de Minas, que negocia a venda da Companhia de Gás de Minas Gerais (Gasmig) para a empresa espanhola Gás Natural Fenosa e que, com a aprovação da PEC 68, não precisaria da aprovação popular, uma vez que a Gasmig é uma subsidiária da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) e é controlada indiretamente pelo Estado. Além desta mudança, a PEC 68 propõe alterações que permitem a mudança do controle acionário das subsidiárias do Governo de Minas sem participação do Legislativo. “Com esta lei, novas sociedades com capital minoritário poderão ser criadas sem aprovação do Legislativo e pessoas que fazem parte dessas sociedades poderão participar diretamente do corpo decisório das empresas

estatais e se envolver com a prestação do serviço público”, pontua Isabella . Atualmente, a transferência de ações depende de lei específica aprovada pela ALMG. População de fora “A aprovação da PEC 68 representa uma grande perda de patrimônio público, de controle sobre serviços públicos essenciais e a transmissão de um patrimônio público a particulares”, conclui Isabella. Além de retirar a palavra final da população mineira, a PEC 68 também fere a Constituição Federal. Segundo análise da advogada, alterações no artigo 14 da Constituição Estadual tornam o projeto inconstitucional. Na proposta, os parlamentares da base governista querem aprovar a retirada de lei específica em caso de cisão de sociedades de economia mista, como é

“A aprovação da PEC 68 representa uma grande perda de patrimônio público”, diz advogada

o caso da Gasmig. No entanto, o artigo 229 da Constituição Federal vincula a criação de autarquias e autorização para a instituição de empresas públicas, sociedades de eco-

nomia mista e fundações à aprovação de lei específica. Neste caso, o princípio da simetria garante que também é necessário o cumprimento desta exigência em caso de extinção ou cisão.

Por onde poderia passar o gasoduto O projeto de gasoduto em discussão na Assembleia Legislativa prevê uma tubulação de 24 polegadas (3). Estudos técnicos apontam que a tubulação poderia ser de 14 polega-

das, o que reduzia o custo em R$ 1 bilhão (2). Caso o gasoduto viesse de São Paulo, o trecho se reduziria para 180 km e poderia custar R$ 143 milhões (1).

Ribeirão Preto Gasoduto Queluzito Gasoduto Queluzito 1Gasoduto 2 3 a Uberaba – bitola 14’ – – Uberaba – bitola 14’ – Uberaba – bitola 24’ Extensão 180 km – Custo R$ 473 mi

– Extensão 530 km – Custo R$ 1,420 bi

– Extensão 530 km – Custo R$ 2,43 bi

Arte Luiz Lagares

Minas Gerais 2

Uberaba

1

3 Queluzito

São Paulo

Ribeirão Preto


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ESPECIAL

Belo Horizonte, Julho de 2014

Sindicatos propõem arquivamento da PEC 68 em audiência pública DEBATE Nova audiência deve ser convocada por comissão da Assembleia Benedito Maia/Sindieletromg

Mariângela Lana

Em audiência pública realizada na Assembleia Legislativa na quarta-feira (09) para debater o gasoduto, representantes do sindicato dos eletricitários, da Federação Nacional dos Urbanitários e da CUT Minas denunciaram que o governo está se aproveitando do novo negócio para privatizar as empresas públicas mineiras. Os sindicalistas ressaltaram que não são contra a construção do gasoduto, pelo contrário, defendem o investimento para o desenvolvimento de Minas e a criação de novos empre-

gos. Porém, cobraram que o governo considere outras alternativas, sem privatizar, sem prejudicar a população e os trabalhadores. Alternativas

Deputados da oposição e sindicalistas apresentaram ao governo três alternativas para investir na construção do gasoduto: buscar financiamento junto ao BNDES ou determinar que a própria Cemig, com o seu lucro de bilhões de reais, financie a nova empresa. A terceira opção seria usar recursos da Codemig (Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais) para o ga-

soduto. Na audiência, a Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização decidiu que o debate sobre o gasoduto e a PEC 68 deve ser ampliado. Dessa forma, foi aprovado requerimento para que a Assembleia Legislativa convoque uma nova audiência para discutir o assunto também com representantes da Petrobras e do BNDES. Nos bastidores, porém, as notícias são de que o governo quer aprovar a PEC o mais rápido possível, mesmo que tenha que pagar por reuniões extraordinárias durante o recesso parlamentar, que começa no dia 18 de julho.

Em audiência, sindicalistas reforçaram que são a favor do gasoduto, mas discordam da privatização

Deputados que propõem a PEC da privatização em Minas: Sebastião Costa (PPS)

Agostinho Patrus ( PV)

Antônio Carlos Arantes (PSDB)

Antonio Lerin (PSB)

Arlen Santiago (PTB)

Bonifácio Mourão (PSDB)

Bosco (PTdoB)

Bráulio Braz (PTB)

Carlos Mosconi (PSDB)

Carlos Pimenta (PDT)

Cássio Soares (PSD)

Célio Moreira (PSDB)

Dalmo Ribeiro Silva (PSDB)

Dilzon Melo (PTB)

Duarte Bechir (PSD)

Duílio de Castro (PMN)

Fabiano Tolentino (PPS)

Gil Pereira (PP)

Gustavo Corrêa (DEM)

Gustavo Valadares (PSDB)

Hélio Gomes (PSD)

Inácio Franco (PV)

Ivair Nogueira (PMDB)

Jayro Lessa (DEM)

João Leite (PSDB)

Lafayete de Andrada (PSDB)

Leonardo Moreira (PSDB)

Luiz Henrique (PSDB)

Luiz Humberto Carneiro (PSDB)

Marques Abreu (PTB)

Rômulo Veneroso (PV)

Tiago Ulisses (PV)

Tony Carlos (PMDB)


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BRASIL

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Empresas instaladas no Brasil enviam 171 bilhões de dólares para o exterior SANGRIA Remessa de lucros bateu recorde nos últimos oito anos, informa Dieese. Situação provoca déficit das contas e torna economia nacional mais dependente MST

Pedro Rafael Vilela, de Brasília (DF)

Empresas estrangeiras instaladas no Brasil enviaram um total de 171,3 bilhões de dólares em lucros e dividendos para o exterior, ao longo dos últimos oito anos. Entre 2006 e 2013, segundo dados apurados pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estudos e Estatísticas), os recursos transferidos para outros países aumentaram 107%, um valor recorde para o período. Os principais fatores que explicam esse crescimento são a crise econômica dos países mais ricos – que fez com que as empresas estrangeiras remetessem lucros para as suas matrizes, a

valorização cambial da moeda brasileira, além do fortalecimento da economia nacional, por meio do aumento do PIB (Produto Interno Bruto), que também gerou aumento de investimentos estrangeiros aqui. Essa situação, porém, tem feito o Brasil colecionar déficit na balança de pagamentos, deixando a economia mais de-

“Se a gente tributa tanto o trabalho, por que não tributar o capital?” pendente dos capitais externos. “Um dos problemas de ter balança deficitária é a necessidade de estimular a

Morre o político Plínio de Arruda Reprodução

Militante de diversas causas sociais desde a juventude, Plínio de Arruda Sampaio faleceu na terçafeira (8), aos 83 anos. Ele estava se tratando de um câncer ósseo há um mês, no Hopital Sírio Libanês, em São Paulo, mas não resistiu. A perda foi lamentada por movimentos, intelectuais e políticos, que o classificaram como “gran-

de lutador social”. Na década de 60, Plínio foi relator do projeto de reforma agrária de João Goulart. Foi deputado três vezes, sendo uma delas durante a reforma da Constituição Federal em 1988. Em 2010, concorreu à Presidência da República pelo PSOL e ficou em quarto lugar, com 886 mil votos.

vinda de capitais de diversas maneiras, e uma das medidas é aumentar os juros, para remunerar o capital especulativo”, avalia o economista Ricardo de Melo Tamashiro, do Dieese. O setor que mais contribuiu com o envio de lucros para o exterior é o industrial. Em 2013, o segmento remeteu cerca de 13,4 bilhões. Entre as principais indústrias que mandaram dinheiro para suas matrizes estão a de veículos, bebidas, produtos químicos e metalurgia. Em seguida, aparece o setor de serviços, que no ano passado enviou para o exterior mais de 9,7 bilhões de dólares ou 40,8% do total enviado. Lideram a remessa de lucros os serviços financei-

ros, comércio (exceto veículos), eletricidade e gás e telecomunicações. Por fim, o setor de agropecuária contribuiu com 2,8% do envio de lucros para fora, um volume de 4,6 bilhões de dólares, com destaque para a extração de minérios metálicos, seguida de petróleo e gás. Para Ricado Tamashiro, poderia haver algum tipo de tributação sobre o ca-

pital, para evitar que as empresas se aproveitassem do bom momento da economia brasileira vivido nos últimos anos para gerar lucros e remeter o montante para fora. “É claro que se o país decide abrir sua economia, pode-se criar um mal-estar em [tarifar], mas se a gente tributa tanto o trabalho, por que não tributar o capital?”, questiona.


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VARIEDADES

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Oi, Amiga da Saúde, sou fumante e descobri que estou grávida. Está todo mundo pegando no meu pé, mas não estou conseguindo ficar sem o cigarro. Faz muito mal mesmo pro bebê?

Ultimamente tenho tido muitas dores de coluna. Trabalho como programadora, fico muitas horas sentada, mas costumo fazer pausas e alongamentos. O que pode estar acontecendo?

Angelina Silva, 19 anos, vendedora

Débora Magalhães, 34 anos Reprodução

Faz muito mal sim, Angelina. É como se o bebê estivesse fumando junto com você, pois recebe substâncias tóxicas do cigarro o tempo todo. A nicotina causa um estreitamento dos vasos sanguíneos, que pode fazer com que o feto receba poucos nutrientes , causando baixo desenvolvimento e baixo peso fetal. Para a mãe, aumenta o risco de trombose, embolia pulmonar, derrame, câncer, entre tantos outros males. Procure fazer alguma coisa saudável (como tomar água), quando vier aquela vontade louca de fumar: esse é um ótimo começo. Atividade física também pode te ajudar muito. Busque orientações sobre isso no pré-natal.

Cara Débora, como você passa muitas horas sentada, deve verificar como está a adequação ergonômica do conjunto cadeira-computador. O ideal é que a cadeira tenha descanso para costas e braços, que o teclado fique baixo. de modo que você possa manter os ombros relaxados, os cotovelos descansados próximos ao corpo e os punhos apoiados. Os pés devem ficar apoiados para reduzir a pressão sobre a coluna. O monitor do computador deve ficar alinhado com sua cabeça. Essas são apenas algumas dicas. Procure uma consul-

Reprodução

ta médica para avaliar se existe algum outro problema. Caso a empresa não forneça equipamentos adequados, denuncie ao seu sindicato e peça providências.

Mande sua dúvida: amigadasaude@brasildefato.com.br Aqui você pode perguntar o que quiser para a nossa Amiga da Saúde

‘‘ Uma novela chamada Copa do Mundo

Reprodução

Licença. É o que peço ao leitor desta coluna para falar de uma novela que também está na telinha, há um mês, mas que, diferente das outras, conta uma história real. A novela “Copa das Copas”. Ora, mas isso não é novela, você pode estar pensando. E eu te respondo com a definição do dicionário: “conto; pequeno romance; narração de aventuras”. Não seria a copa um pouco disso? Sim, teve copa. E ela foi uma aventura. Como nas novelas da ficção, o telespectador não sabe muito o destino do enredo. A aventura foi narrada com resultados improváveis, equipes surpreendentes, emoções à flor da pele, dentro e fora de campo. Teve romance, pela seleção brasileira. Um romance que me pegou subitamente. Acho que quando estamos torcendo, cantando o hino, nos sentimos integrados, mesmo reconhecendo as diferenças e desigualdades que nos marcam enquanto povo. Nossa, que romance intenso! E quantos outros contos não compuseram a “Copa das Copas”! Vou contar um deles, intitulado “BH: a zica” .

Depois do sufoco do jogo contra o Chile, do absurdo do viaduto que caiu, dos quebras paus na Savassi, a zica já era grande demais para que o final feliz do núcleo ‘Seleção Brasileira’ fosse escrito. As novelas não têm final feliz para todos, não é mesmo? E isso nunca invalida suas histórias na trama. Por isso, parabéns ao Brasil por jogar sete partidas, por levantar a torcida, por fazer esses últimos dias mais leves e festivos. E bola pra frente, que a gente sabe cair e levantar! Outras aventuras, romances e contos compuseram a novela “Copa das Copas”, cujo desfecho só saberemos no domingo. Já nos dias depois da semifinal, quando levantei, me dei conta que o fim dessa novela marca a volta para a vida cotidiana, dura, mas que é a vida que a gente tem. De volta à realidade... Até uma próxima vez! Joaquim Vela


CULTURA

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À sombra da Gameleira ROMANCE Livro percorre os labirintos da ditadura cujos personagens compartilham frações de suas vidas Vera Lima Livro do jornalista Roberto Amaral, lançado recentemente em Belo Horizonte, pela Editora D’Plácido, intitulado À sombra da Gameleira, resgata uma das mais comoventes histórias dos tempos de chumbo da ditadura militar. O autor narra nesse romance cenas de uma tragédia ocorrida nos idos de 1971, na capital mineira. Relata os sonhos, os amores, as dores e as angústias de um jovem que perde o pai no desabamento do Parque de Exposições da Gameleira e que causou a morte de dezenas de operários. Dados não oficiais revelam que mais de 60 trabalhadores morreram à época. O livro expõe fragmentos da negligência, da desumanidade durante a construção de um dos mais im-

portantes monumentos do “milagre econômico brasileiro”, que produziu obras faraônicas por todo o país, cujo presidente de olhos azuis - Emílio Garrastazu Médici - era o mais temido general da América Latina. A historiadora Lilian Machado Leão colaborou na parte de pesquisa e a escritora e ilustradora Helena Terra foi a responsável pela capa. Nas mais de 300 páginas, o jornalista disseca a trajetória de Betto, que enfrenta as vicissitudes da vida, como a solidão, o tédio, a misteriosa doença da mãe, o amor platônico e o seu incomensurável medo do “Vôo do Pássaro”. Percorre os labirintos da ditadura, cujos personagens compartilham frações de suas vidas polissêmicas revelando fraquezas e contradições inerentes à condição humana. Na dedicatória, uma homenagem a Zuleika Angel

AGENDA DO FIM DE SEMANA MÚSICA

Show com a banda paulista Fil and The Guitar Gun, pelo Festival Conexão. O grupo tem influência de trilhas sonoras dos antigos filmes de faroeste. Sexta (11), às 20h, na Casa dos Jornalistas (Avenida Álvares Cabral, 400). FUTEBOL DE RUA

CINEMA

Exibição do documentário “Pipiripau – O Mundo de Raimundo”, do cineasta Aluízio Salles Jr. Sexta (11), às 16h, no Memorial Minas (Praça da Liberdade).

Reprodução

Jones (Zuzu Angel), - mãe do militante político Stuart Angel Jones - uma das mais expressivas personagens do Brasil da época da ditadura militar. Zuzu é estilista de moda, de Curvelo/ MG, e se tornou conhecida no Brasil e no exterior pela procura de seu filho - mi-

Sonhos, amores, dores e angústias de um jovem que perde o pai no desabamento do Parque de Exposições da Gameleira em 1971 litante de organizações extremistas - assassinado pelo governo e transformado em desaparecido político. Cuba, Barcelona, Santiago do Chile, Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte com-

é tudo de graça! MÚSICA

Show da cantora Anelis Assumpção, filha do também cantor e compositor Itamar Assumpção. Sexta (11), às 21h, no Teatro Oi Futuro Klauss Vianna (Av. Afonso Pena, 4001, Mangabeiras).

põem o cenário de uma história repleta de desafios e emoções. “Foram três anos de buscas, pesquisas e concentração nesse trabalho”, afirma o escritor,

que revela ter pensado em produzir o livro/roteiro de uma obra que pretende ver um dia adaptado para o cinema.

Segunda a quinta-feira EXPOSIÇÃO

Mostra “Dalí - A Divina Comédia” apresenta cem ilustrações do mestre do surrealismo Salvador Dalí, para uma das principais obras da literatura universal, “A Divina Comédia”, de Dante Alighieri. Até 17/08, quartas a domingos, das 9h às 19h, na Academia Mineira de Letras (Rua da Bahia, 1466, Centro).

CINEMA

Mostra exibe clássicos do diretor Vincente Minneli. Programação também conta com palestra de Heitor Capuzzo sobre carreira do cineasta. De 11 a 17/07 no Cine Humberto Mauro (Avenida Afonso Pena, 1537, Centro).

Exposição “Favela Internacional Futebol Artístico”, do artista francês Rodolphe Huguet, retratou a realidade de jovens de várias comunidades mineiras. O artista organizou um minitorneio de futebol com adolescentes carentes e todas as etapas foram registradas em vídeo e fotografia. De 17 a 28/07, todas as segundas, terças, quartas e quintas das 8h às 21h, e sextas e sábados das 8h às 16h30, na Aliança Francesa de Belo Horizonte (Rua Tomé de Souza, 1418, Savassi).

TEATRO POPULAR

“Festival de Teatro Popular Permanente Ronaldo Boschi”, do Centro de Pesquisas Teatrais (CPT), conta com a apresentação das peças “Ascensão e Queda da Família Mineira”, “Troféu Abacaxi” e “Beijo na Boca”. O elenco das montagens é composto por alunos dos cursos de teatro do CPT e Sesiminas. De 11 a 26/07, às 19h, no Teatro Sesiminas (Padre Marinho, 60, Santa Efigênia).


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ESPORTES

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Coisas para lembrar desta Copa CAMPEONATO Seleção dos melhores - e mais engraçados - momentos do Mundial Felipe Canova, Miguel Stedile e Wallace Oliveira Fogo amigo e japonês amigo: o primeiro gol da Copa não foi nem de Neymar nem de Hulk, mas de Marcelo, contra. O Brasil penou para vencer a Croácia, mas contou com a ajudinha do árbitro japonês.

O fim do tic-tac: o sistema de jogo com máxima possessão de bola do Barcelona já havia feito água nos campeonatos europeus e desandou de vez na Copa, quando a atual campeã Espanha levou uma surra dos holandeses e foi para casa mais cedo. Predomínio sul-americano: fora o Equador, todas as seleções sul-americanas passaram às oitavas. Enquanto isso, alguns gigantes europeus ficaram para trás comendo poeira. Marea latina: chilenos, colombianos, uruguaios e argentinos se sentiram em casa. Cantaram seus hinos de forma ensurdecedora nos estádios, tomaram conta das ruas e arquibancadas. Os mexicanos deitaram e rolaram no Castelão contra o Brasil, cantando mais alto que a nossa torcida. Mas australianos, alemães e holandeses também fizeram a festa e conquistaram a simpatia dos brasileiros.

Chora, Ronaldo! Na final da Copa de 2002, o atacante brasileiro marcou dois gols sobre a Alemanha. Quatro anos mais tarde, tornou-se o maior goleador das copas em território alemão. Agora, a Alemanha dá o troco: Klose deixou Ronaldo na saudade, justo no Brasil, justo contra o Brasil.

Fuleco: além da pior música das Copas, o Brasil também será lembrado pelo estranho mascote, que não pegou. Nos últimos dias, era possível comprar bonequinhos do tatu em promoção de pague 2 e leve 3.

O tecnogol: chip na bola e dezenas de câmeras mais potentes que o olho humano tiraram a dúvida se foi ou não gol. França e Honduras foi a primeira partida em que o tecnogol foi necessário para garantir o segundo gol francês. A espuma na marcação da barreira, já consagrada no Brasileirão, também foi adotada. Los Ticos: a sensação Costa Rica ferrou o bolão de muita gente, ao passar em primeira no grupo da morte. Foi embora invicta e como melhor defesa da Copa, só caindo nos pênaltis, para a Holanda. Kingkongs da mídia: eles apostavam num caos total, mas rapidinho aderiram à #copadascopas. Sumiram as matérias sobre aeroportos e o insuportável bordão “imagina na Copa”. Para completar, a mídia tradicional pagou micos bizarros, como publicar uma entrevista com sósia do Felipão achando que era o legítimo, e achar propaganda subliminar do PT na logomarca da Copa, entre outras derrapadas.

Rolo compressor: a poderosa equipe de Joachim Löw esmagou o time de amigos do Neymar. A goleada por 7 a 1 não foi apenas o placar mais elástico de uma derrota da centenária seleção brasileira. É o símbolo de um futebol – o brasileiro – que precisa nascer de novo para fazer jus a seu passado.

Suarez, de herói a fiasco: o jogador uruguaio, que um mês antes da Copa andava de cadeira de rodas, saiu do banco de reservas para conduzir o Uruguai à oitavas de final em duas partidas decisivas. Mas, contra a Itália, ele mordeu outro jogador no campeonato com grande número de câmeras de TV filmando tudo o tempo todo. Já era... Quatro meses e nove partidas de gancho para aquele que poderia ter sido o nome do mundial.

Mick Jagger brasileiro: Ronaldo, o “fofômeno”, disse antes do evento que a Copa seria uma vergonha para o país e que a Espanha era favorita a faturar a taça. Comentarista da Rede Globo, o ex-jogador viu sua emissora perder um terço da audiência. Tomara que ele dê a mesma sorte a seu amigo Aécio nas próximas eleições.

Decime qué se siente: aos trancos e barrancos, eles chegaram. Nenhum deles teve um desempenho espetacular. Definitivamente, não são eles os favoritos a vencer a final. Isto, todavia, é a Argentina, que avança desacreditada, como em 78 e 86, que quer vingar 1990, contra a Alemanha, que vai a todas as partes com seus fanáticos incomparáveis, desde sempre. E se Messi volta a jogar como Messi? Maradona pode estar prestes a perder o trono alviceleste.


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ESPORTE

O corpo das mulheres na Copa dos homens EXPLORAÇÃO SEXUAL Mundial de futebol expõe a necessidade de combater o mercado da prostituição Larissa Costa e Liliam Daniela Não é novidade que a Copa do Mundo da FIFA está relacionada ao aumento do turismo sexual e ao crescimento da prostituição nos países por onde passa. Em 2006, a regulamentação da prostituição na Alemanha evitou maiores problemas aos donos da indústria do sexo, que traficaram mais de 40 mil mulheres para atender à “demanda” esperada do evento. Na África do Sul, em 2010, sabe-se que o número de prostitutas passou de 100 para 140 mil no período de realização dos jogos. A posição central desse país na rota do tráfico de pessoas foi um dos fatores decisivos para esse crescimento. Dados apontam que meninas chegaram a ser vendidas a 670 dólares no perío-

do que antecedeu o evento. No Brasil, a situação se repete. Nas cidades sedes dos jogos, foi construída uma rede organizada de prostituição para receber os “gringos” que por ali passariam. A exploração sexual de crianças e adolescentes também é uma constante. Ainda antes da copa, a inauguração do Castelão em Fortaleza (CE) foi marcada pelas denúncias da exploração sexual de menores, com relatos de que meninas trocavam programas por drogas e comida ou, quando muito, chegavam a receber R$10 pelos serviços sexuais. Também cabe destacar as propagandas e comerciais veiculados pelas empresas patrocinadoras da Copa. A Adidas, uma das principais marcas de material esportivo, divulgou dois modelos de camisetas que soaram

como uma violência às mulheres brasileiras. A mensagem estampada no desenho foi nítida: “gringos, os corpos das mulheres brasileiras estão disponíveis”. As casas de prostituição, mesmo sendo proibidas pela legislação brasileira, também não perderam tempo. Logo anunciaram seus serviços em outdoors em Fortaleza e em São Paulo, nos jornais em Florianópolis, Foz do Iguaçu e em toda a inter-

net. O assunto, embora presente antes, durante e depois da Copa, ainda é pouco discutido e enfrentado. A mídia empresarial nada fala. Pelo contrário, muitas vezes incentiva. Há poucas semanas, o apresentador Luciano Huck usou seu perfil em uma rede social para “ajudar” mulheres brasileiras a “encontrar um príncipe encantado” entre os gringos que estão no Brasil du-

na geral Vingança da FIFA contra Maradona

Recentemente, Maradona criticou a FIFA no programa de TV que ele apresenta na Telesur, o “De Zurda”. O ex-jogador disse que a entidade tem vários casos de corrupção, questionou a idade avançada de seus dirigentes e reclamou de eles “nunca terem chutado uma bola”. Como retaliação, o presidente da entidade, Joseph Blatter, apoiado pelo presidente da Associação Argentina de Futebol, resolveu suspender a credencial de Maradona para a Copa.

Máfia do ingresso Mais uma vez, o racismo Respeito acima de tudo desmascarada no Brasil Ray Whelan, dirigente da Match, empresa que detém exclusividade na venda de ingressos da FIFA, foi preso no hotel Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, na segunda-feira (7). Ele é acusado de facilitar a distribuição das entradas para uma quadrilha internacional de cambistas, que revenderiam os ingressos da Copa por preços superiores aos estampados nos bilhetes. A Polícia Civil do Rio de Janeiro, por meio da Operação Jules Rimet, interceptou mais de 900 telefonemas que revelariam o crime. Whelan foi solto na madrugada de terça (8), após conseguir um habeas corpus e pagar R$ 5.000 em fiança. Parte das ações da Match pertence a uma empresa de Philippe Blatter, sobrinho do presidente da FIFA, Joseph Blatter

No jogo entre Brasil e Colômbia, o lateral colombiano Camilo Zuñiga fez uma falta dura em Neymar, que teve a coluna fraturada no lance e, por essa razão, abandonou a Copa nas quartas-de-final. Vários torcedores brasileiros reagiram ao fato com estupidez e violência verbal. Nas redes sociais, foram publicadas centenas de ataques racistas a Zuñiga. Um torcedor postou em seu Twitter: “Depois, chama uns nego de macaco e é preso por racismo, mas esse Zuñiga ta merecendo”. No Instagram do jogador, a foto de sua filha, que tem apenas quatro anos de idade, também foi alvo de muitos comentários desrespeitosos e até ameaças de estupro. O caso é mais uma prova de que o racismo no Brasil ainda não foi superado.

Após a incrível goleada sobre o Brasil, os alemães manifestaram sua solidariedade e respeito aos brasileiros. A página oficial da seleção alemã publicou o seguinte comentário: “Desde 2006, sabemos como é doloroso perder uma semifinal no próprio país. Desejamos o melhor futuro para vocês”. O atacante Lukas Podolski declarou: “O mundo do futebol deve muito ao futebol brasileiro, que é e sempre será o país do futebol (...). Quando a Copa acabar e nós formos embora, tudo voltará ao normal. Então, paz e amor a esse povo maravilhoso, um povo batalhador e honesto, um país que eu aprendi a amar”. O armador Özil escreveu: “Vocês têm um país maravilhoso, um povo fantástico e jogadores incríveis. Essa partida não pode destruir seu orgulho!”.

Agência EFE

rante a copa. A conquista do hexa ficará para 2018, mas a guerra contra a exploração sexual não pode esperar. Deve ser enfrentada com a seriedade que o tema merece, exigindo do poder público investimento em políticas que confiram autonomia para todas as mulheres. Esperamos que, nesse jogo, o Brasil vença de goleada.

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Você Sabia

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A derrota da Seleção Brasileira para a Alemanha interrompeu uma série de 39 anos sem perder jogos oficiais dentro de casa. O último revés do Brasil em seu próprio território aconteceu no Mineirão, contra o Peru. Valendo pela semifinal da Copa América de 1975, o confronto terminou em 3 a 1 para os visitantes. Jogando amistosos, a última derrota brasileira dentro de casa foi em 2002, contra o Paraguai.


12 ESPORTES

Belo Horizonte, de 11 a 17 de julho de 2014

Desfile de craques nos gramados brasileiros Reprodução

Marcelo Pereira Sim, leitor, eu estou com a mesma ressaca moral, após perder a dignidade junto com a Seleção no Mineirão. Mas pense um pouco: esta Copa continua sendo memorável, em vários sentidos. Na maioria deles, as lembranças são boas. Há décadas, quando o êxodo de grandes jogadores tem tirado do Campeonato Brasileiro os nossos melhores nomes, não víamos tantas estrelas brilharem intensamente em nossos estádios. Não só com os pés se produziram heróis. A Copa revelou ao mundo arqueiros

miraculosos, como Keylor Navas, que levou a Costa Rica às quartas de final, e o veterano Tim Howard, dos Estados Unidos, que parou nada menos que os ataques belga e alemão. Ainda na defesa e apesar do massacre de terçafeira (8), o destaque foi David Luís, com sua cabeleira, garra, disciplina, colocação e antecipação. Formou com Thiago Silva uma das maiores duplas de zaga da história da Seleção. O monstruoso Toni Kroos, com apenas 24 anos, é o maestro da Alemanha. Até a semifinal, não havia marcado gols, mas foi responsável

pela postura tática perfeita do escrete germânico. Ele é o jogador que, quando em campo, potencializa a qualidade de seus companheiros. Na frente, dois craques se destacaram. O colombiano James Rodríguez, com seis tentos, mostrou enorme talento, incrível finalização e muita paixão para defender as cores de seu país. O outro é o holandês Robben. Sua explosão física e velocidade fazem com que os contra -ataques da seleção laranja aterrorizem as defesas adversárias. É quase impossível parar o fiel escudeiro de Batman em direção ao gol com a bola dominada.

A final das finais Reprodução

A derrocada do futebol brasileiro Reprodução

Leonardo Calixto A estupenda seleção alemã deu um chocolate no time brasileiro. Apesar do costume de elegermos bodes expiatórios, precisamos ter em mente que o pior momento da Seleção Brasileira não aconteceu por culpa de apenas uma pessoa ou dos jogadores que lá estavam. A derrota mostrou como está ultrapassado o nosso futebol. Em entrevista ao programa Roda Viva, o jornalista Juca Kfouri disse que o maior legado da Copa da Alemanha, em 2006, foi a revolução feita na estrutura do futebol alemão. Ironicamente, os alemães nos mostraram a necessidade de fazer o mesmo aqui. Chegou a hora de criar um futebol diferente: com

Diego Silveira

a presença do povo nos estádios, contrapondo ao modelo de elitização em curso; em que clubes não queiram tirar vantagem sobre outros clubes; um futebol em que o jogador não fique à mercê de empresários; que não seja refém de uma entidade ultrapassada, como a CBF; futebol que democratize suas instâncias, começando pelas mídias, que têm aumentado a desigualdade no

esporte, mediante a compra dos direitos de transmissão e das concessões. A Copa das Copas teve como principal vítima seu anfitrião, maior vencedor da história. Além da vontade de ver a final, que será um grande jogo, fica a esperança de uma reestruturação, que seja impulsionada pelo povo, para que possamos voltar aos dias de glória.

Alemanha e Argentina farão pela terceira vez a final de uma Copa, o que torna este confronto aquele que mais vezes se repetiu em decisões do torneio. Na Copa das Copas, a final põe frente a frente o melhor time da competição e o melhor jogador de futebol dos tempos recentes. A seleção alemã passou por um processo de renovação desde que perdeu a Copa de 2002 para o Brasil. Seu futebol, antes pautado na força e aplicação tática, deu lugar a um estilo leve, de toque de bola e jogadores habilidosos, sem abrir mão da disciplina em campo. Nos mundiais de 2006 e 2010, caíram nas semifinais. Em 2014, com mais ex-

periência e o refinamento do estilo de jogo, jogarão a final do Maracanã como favoritos. A Argentina deste ano não agrada aos olhos. Enquanto time, seu maior trunfo foi a evolução do sistema defensivo, invicto nos jogos do mata-mata. Na primeira fase, as atuações foscas do genial Lionel Messi foram compensadas pelos lances decisivos do próprio craque do Barcelona. A combinação entre o talento de Messi e a postura compacta na retaguarda pode dar o título aos hermanos. Será justo se o tetracampeonato da Alemanha vier. Também será justo ver Messi tricampeão com sua Argentina. Injusto é saber que uma dessas duas coisas não vai acontecer.


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