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Minas Gerais
• Abril de 2016 • brasildefato.com.br • distribuição gratuita
O que está em jogo?
EDITORIAL
O que querem os que defendem o impeachment
Quem assiste televisão, ouve rádio e lê os jornais tem ficado assustado. Com medo até. Parece que o mundo está acabando. E, segundo a mídia, é tudo culpa dos políticos. Não de todos, mas principalmente da presidenta Dilma e de seu partido, o PT. Mas essa não é a verdade. Uma parte das elites, incluindo Aécio Neves e o PSDB, não aceitaram a derrota nas eleições de 2014. Outros segmentos, como os grandes meios de comunicação, a exemplo da Globo, os mais ricos e parte do empresariado, também não. A investigação Lava Jato foi aproveitada como arma e passou a atuar com fins políticos, investigando apenas alguns.
O objetivo deles não é apenas retirar Dilma, ou o PT, do governo. Muito menos acabar com a corrupção. Dilma não está sendo investigada. O que eles querem é a volta da agenda neoliberal, que inclui retirada de direitos, privatizações, menos investimento em saúde e educação, fim da política de cotas, mais terceirização, menos investimento do Estado na vida das pessoas. Nesta edição o Brasil de Fato traz algumas dessas propostas da direita golpista, para que o leitor não tenha medo: nem de desligar a televisão que mente e trama o golpe abertamente, nem medo de ir para a rua, lutar contra o golpe e por mais direitos.
ESPECIAL
Belo Horizonte, abril de 2016
Pré-sal pode ir para empresas estrangeiras Tramita em regime de prioridade na Câmara dos Deputados o projeto de lei (PL 4567/16) que retira a obrigatoriedade da Petrobras de participar da extração do pré-sal. A proposta, de José Serra (PSDB-SP), pretende facilitar que empresas estrangeiras atuem como operadoras do petróleo brasileiro. A legislação atual, aprovada no governo Lula, garante exclusividade da Petrobras na condução e execução de todas as atividades de exploração e produção. Para o diretor do Sindicato dos Petroleiros de Minas Gerais (Sindipetro-MG) Felipe Pinheiro, “um dos motivos porque querem tirar a Dilma, com certeza é a entrega do pré-sal”, alerta.
Agência Petrobras
Partilha X Concessão
Legislação atual garante exclusividade da Petrobras na condução de atividades de exploração e exploração do pré-sal
Em vigor desde 2010, o modelo de partilha adotado para a exploração dos campos do pré-sal determina que a União é única proprietária do petróleo, cabendo à empresa contratada arcar com os custos e riscos da operação em troca de uma parte do produto extraído. No caso da concessão, defendida pelos partidos que querem o impeachment, PMDB e PSDB, a dona do petróleo é a empresa concessionária. As petrolíferas são livres para administrar e comercializar o petróleo, essa medida pode afetar a indústria nacional e comprometer as gerações futuras com uma extração desenfreada.
Menos investimento em saúde e educação Como forma de aumentar o investimento na saúde e educação, o governo federal sancionou duas leis que estão relacionadas à exploração do pré-sal. A Lei dos Royalties, de 2013, determina que 75% dos royalties devem ser para educação e os outros 25% para a saúde. Já o Fundo Social Soberano, garantido pela Lei 12.351/10 – que insti-
75% dos royalties devem ser destinados para o ensino público e 25% para a saúde
Tirar Dilma facilita entrega do pré-sal
Fundo Social Soberano já conta R$ 5,8 bilhões
tuiu o regime de partilha –destina metade dos recursos para educação. Atualmente, o Fundo já conta com R$ 5,8 bilhões. Embora o PL 4567/16 não aponte mudança nessas legislações, a sua aprovação refletiria na diminuição dos investimentos na saúde e educação. “A questão é que o custo de produção da Petrobras é mais baixo devido à tecnologia que só ela tem. Se entrar outra petrolífera, o custo será maior, o que significa menos recursos a ser repassado para o Estado”, explica Felipe.
Em 2014, a previsão era que, somente a exploração do Campo de Libra, renderia R$ 300 bilhões em royalties em 30 anos
Desvalorizar para privatizar Reprodução
O professor de relações internacionais na Universidade Federal do ABC Igor Fuser aponta que faz parte de uma estratégia do capital a campanha de desgaste de empresas públicas, com o objetivo de facilitar a ven-
da. Ele explica que esse mecanismo aconteceu no Brasil, na década de 1990, com a privatização da Vale e outras companhias, por exemplo. “A direita lança seus ataques às estatais, com des-
taque para a Petrobras, a partir da oposição, utilizando os recursos de poder ao seu alcance, a mídia empresarial e o aparato policial e judiciário. Os meios mudaram, mas o objetivo é o mesmo”, explica o professor.
Belo Horizonte, abril de 2016
Plano econômico proposto por PMDB mexe nos direitos trabalhistas
ESPECIAL 9
Mapa da democracia
“PONTE PARA O FUTURO?” Documento propõe que acordos tenham força superior a da legislação Divulgação
Após anunciar a saída do governo, sinalizando o apoio ao processo de impeachment, o PMDB já prepara seu programa de gestão caso a queda de Dilma se consolide. Um dos pontos defendidos é que na área trabalhista, as “convenções coletivas prevaleçam sobre as normas legais”. A ideia foi apresentada em nova versão do documento chamado “Ponte para o Futuro”. Os pontos incluem o corte no subsídio ao setor industrial, fim do uso do FGTS para financiamento do Minha Casa, Minha Vida, a ideia de ampliar a privatização do ensino médio e limitar o número de bolsas do Fies. Direitos trabalhistas Renan Kalil, procurador do
Programa do PMDB propõe privatização do ensino médio e corte de bolsas
Versão atualizada do programa do PMDB propõe cortes sociais
trabalho e mestre em direito, explica que o programa do PMDB do negociado valer sobre o legislado, “é uma proposta para o que for acordado
em negociação coletiva, entre sindicato dos trabalhadores e empresa, ou sindicato patronal, tenha mais força do que disposto em lei”, explica.
Para a juíza Carolina Gralha Beck, o trabalhador é que sai prejudicado diante dessa situação. “É um verdadeiro retrocesso nas relações trabalhistas”, observa. A reportagem entrou em contato com a Fundação Ulysses Guimarães, responsável pela redação e divulgação do “Ponte para o Futuro”, mas não teve retorno até o fechamento desta edição.
Terceirização pode aumentar Reprodução
rios aos interesses dos trabalhadores devem ser votados de forma acelerada. “O entendimento dos empresários é de que em um governo do PMDB/PSDB a terceirização irrestrita será aprovada. Os parlamentares que defendem o golpe no Congresso são os mesmos que defendem, por exemplo, a terceirização irrestrita”, completa.
Sindicalista afirma que projetos que retiram direitos serão votados de forma acelerada
O projeto de lei 30/2015, em discussão no Senado, permite que atividades-fim, ou seja, que fazem parte da principal atividade da empresa também sejam terceirizadas. Hoje, a possibilidade se limita às atividades-meio.
“Há dados que comprovam as péssimas condições de trabalho do terceirizado. Ele tem salários mais baixos, está mais sujeito a acidentes e mortes, mais doenças ocupacionais, menos benefícios, maior índice de rotatividade, maior
jornada de trabalho e maior constatação de trabalho escravo”, critica Graça Costa, secretária nacional de Relações de Trabalho da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Ela afirma que, com o impeachment, projetos contrá-
Quem defende golpe quer também terceirização irrestrita”
No último domingo (27), foi lançada a plataforma digital “Mapa da Democracia: O Brasil contra o Golpe”, desenvolvida pela Frente Brasil Popular. O site tem o objetivo de pressionar os membros do Congresso Nacional na votação do pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff e lista os deputados da Comissão Especial de acordo com o seu posicionamento sobre o assunto. O projeto permite, ainda, o envio de mensagens dos internautas aos parlamentares. Para conhecer, acesse o endereço: www.mapadademocracia. org.br
Atos criticam Globo No mês do aniversário de 51 anos da Rede Globo de Televisão, movimentos sociais organizam protestos contra a emissora em todas as regiões do país. Em Belo Horizonte, um ato acontecerá no dia 9, na sede da Globo, na Avenida Américo Vespúcio, a partir das 17h. Manifestantes irão realizar uma espécie de “cinemão”, que exibirá o documentário “Muito Além do Cidadão Kane”, do diretor Simon Hartog. O filme retrata as relações entre mídia e poder no Brasil, focando em Roberto Marinho. A proposta é que cada pessoa leve um lanche para realização de piquenique.
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ESPECIAL
“Impeachment sem crime é golpe” ENTREVISTA Beatriz Cerqueira, presidenta da CUT Minas, destaca o que os trabalhadores podem perder Lidyane Ponciano
Coordendora geral do Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais e presidenta da CUT Minas, Beatriz Cerqueira também integra a Frente Brasil Popular, que propõe mobilizações de rua como pressão para mudanças na economia e no sistema político. Brasil de Fato - Por que dizem que está em curso um golpe e quem estaria promovendo isso? Beatriz Cerqueira - É um golpe porque não foi cometido nenhum crime pela presidenta da república que justificasse um processo de impeachment. A justificativa no Congresso, as pedaladas fiscais, fo-
“Golpe vai jogar crise nas costas dos trabalhadores”
ram cometidas pelos antecessores da Dilma, tanto o Lula quanto FHC, e por outros 16 governadores. As pedaladas fiscais são mecanismos contá-
beis, não um crime. E elas foram motivadas, no caso do governo Dilma, para a manutenção de políticas sociais. Impeachment sem crime é golpe. O golpe tem sido articulado por quem defende uma agenda neoliberal, conservadora, derrotada nas eleições de 2014. Eles sabem que pelas urnas não ganham. Porque o povo brasileiro não é a favor de privatização e retirada de direitos. Se confirmado o impeach-
ment, quem vai governar o Brasil? Quem perdeu as eleições em 2014 e em 2002. Já exis-
“Poder econômico manda nos parlamentares” te um acordo entre PMDB e PSDB. A agenda é de privati-
zações, da retirada do Estado das políticas públicas, da venda do patrimônio, da ausência de investimentos e da tentativa de proteção do trabalhador no mundo do trabalho. O que significa para os direitos dos trabalhadores? O golpe vai significar a privatização não só da Petrobras, Caixa Econômica, Banco do Brasil, mas da educação básica. A privatização da previdência, que é muito lucrativa no sistema financeiro e a privatização do SUS. É isso que nós vamos perder. E a desregulamentação do mundo do trabalho como nós conhecemos. Existem hoje no Congresso 55 projetos em tramitação que são horríveis para o povo. Esses projetos terão a tramitação e votação aceleradas. Vamos deixar de ter política de salário mínimo. Vamos enfrentar um forte ajuste fiscal nas costas dos servidores públicos. Vamos perder os direitos que conquistamos em relação às domésticas, podemos perder políticas afirmativas como as cotas. Conseguimos ampliar o número de vagas nas instituições de ensino superior e isso não vai continuar. Estamos vivendo uma cri-
“Existem 55 projetos no Congresso horríveis para o povo” se também econômica. Qual a saída que a Frente Brasil Popular aponta? Precisamos de duas coisas. Primeiro, mudança na política econômica. O Estado tem que investir para que voltemos a crescer, tem que proteger o trabalho e o trabalhador para não termos desemprego. Segundo, é importante um outro sistema político. Esse sistema como está faliu. Como um réu da Operação Lava Jato, que já teve a continuidade da investigação aprovada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), pode conduzir o processo de impeachment de uma presidenta? Isso mostra que o poder econômico manda nos parlamentos, tantos nos municipais até o plano federal. Nós precisamos de uma reforma política, por isso a defesa da Constituinte.
Investigados por corrupção podem assumir o governo Se a presidente Dilma não está envolvida em casos de corrup- 1 - Michel Temer (PMDB), vice-presidente ção, o mesmo não acontece com seus possíveis sucessores. Temer é acusado de particiValter Campanato / ABr par do esquema de corrupção na Petrobras. Ele foi citado por delatores da Lava Jato e é acusado de receber dinheiro de propina. 2 - Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara Contra Cunha pesam denúncias de receber dinheiro desviado da Petrobras e man-
ter milhões de dólares em contas secretas na Suíça e em outros paraísos fiscais. Ele é réu no Supremo Tribunal Federal (STF). 3 - Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado Renan também foi citado por delatores, investigados na Lava Jato, acusado de ser beneficiário do esquema de corrupção na Petrobras. Ele é citado em nove inquéritos no STF.
Brasil de Fato MG (31) 33093314 redacaomg@brasildefato.com.br Textos: Joana Tavares, Larissa Costa, Rafael Tatemoto Diagramação: Bruno Dayrell