PDF da edição 35 do BF MG

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E agora, Galo?

Liberdade Tan Tan

Maratonista das ruas

Familiares e portadores de sofrimento mental fazem curso de formação política. Concurso de Samba Enredo para o dia da luta antimanicomial já está aberto

Charles viveu na rua desde os 14 anos, quando foi preso injustamente pela Febem. Isso mudou o destino do futuro campeão

Atlético perde em Medelín e desencadeia onda de problemas, como o baixo desempenho dos craques e a demissão do técnico Autuori

Edição

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Uma visão popular do Brasil e do mundo

Reprodução

Belo Horizonte, de 25 de abril a 01 de maio de 2014| ano 1 | edição 35| distribuição gratuita | www.brasildefato.com.br | facebook.com/brasildefatomg

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Marco Civil mantém liberdade da internet

Edição Especial Agência Senado

Aprovado no Congresso e sancionado pela presidenta, o marco defende a neutralidade e diversidade da rede. “É uma vitória colossal”, avalia o professor e ativista Sérgio Amadeu cidades | pág. 3

Reprodução

Confira no encarte: - População paga lucro de acionistas - Mineiros foram às urnas por conta de luz mais barata - Movimentos querem sacudir a política em 2014

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Mais um festival de boteco

Polícia pode não ser militar

Botecar reúne 55 bares para fortalecer a comida tradicional de Minas e Comida di Buteco faz sua 15ª edição, agora em 16 cidades do país. As duas competições gastronômicas vão até dia 10 de maio, em Belo Horizonte

A Polícia Militar trata a população como inimiga, acreditam jovens e estudiosos. No poder Legislativo, a PEC 51 propõe a desmilitarização, o que significa modificar a capacitação dos oficiais

Mídia Ninja


02 | opinião

Belo Horizonte, de 25 de abril a 01 de maio de 2014

editorial | Minas Gerais

Este jornal é nosso Liberdade de expressão é uma expressão bem comum. É um direito, certo? Mas você já parou pra pensar em quem tem, exatamente, essa liberdade? Você, por exemplo. Você pode expressar suas opiniões para seus amigos, familiares, talvez em sua página no facebook ou blog. É verdade que a internet ampliou a capacidade de mais pessoas serem ouvidas, lidas e vistas. Por isso é uma grande vitória a aprovação do Marco Civil no Senado, como você pode ler na entrevista com Sérgio Amadeu. Mas é suficiente se comunicar com quem já é conhecido? E se você quiser expor as demandas de um grupo que participe para um público maior? Um dos caminhos é procurar a imprensa. Aí a coisa começa a complicar. Em BH, existem seis ou sete grandes jornais diários, um punhado de emissoras (ou retransmissoras) de rádio e TV. Mas isso garante a pluralidade de ideias? É suficiente? Será que esses veículos têm interesses para além de vender jornal? Que interesses são esses? Um exemplo: nossa conta de luz. Os mineiros pagam uma das tarifas mais caras do país, o ICMS mais alto de todos os estados e não têm um serviço de qualidade. A Cemig - uma empresa teoricamente pública, mas controlada

Trazemos nesta edição um encarte especial, sobre o plebiscito pela redução da conta de luz e outra consulta que será feita à população: sobre o sistema político por acionistas - terceiriza a maioria dos trabalhadores da rede elétrica, que são vítimas de acidentes, muitas vezes, fatais. O assunto não é tema frequente nos jornais, TVs e rádios. Aliás, frequente mesmo são os anúncios da companhia, em forma de outdoors, informes de rendimentos e comerciais estrelados por atores globais. Certamente, essa propaganda não é de graça e custa um preço na hora da cobertura dos fatos. No ano passado, dezenas de entidades foram para as ruas consultar a população sobre o preço da luz. Mais de 600 mil pessoas votaram no plebiscito popular que pedia redução dos impostos e da tarifa. Você soube dessa iniciativa pela mídia? Talvez aqui, no Brasil de Fato Minas Gerais. Somos um jornal semanal, novo. A edição mineira começou a circular em agosto de 2013. Mas não temos rabo preso com os donos do poder e assumimos o compromisso de informar sobre a realidade das pessoas trabalhadoras. Como parte desse trabalho de alargar a noção de quem pode se expressar, trazemos nesta edição um encarte especial, sobre o plebiscito pela redução da conta de luz e outra consulta que será feita à população: sobre o sistema político. Não estamos satisfeitos com o atual sistema, que deixa os poderosos mais poderosos e os ricos mais ricos, enquanto nos exclui. E apostamos que você também não.

editorial | Brasil

Ofensiva contra a Petrobras As descobertas de jazidas de petróleo no Brasil e as pesquisas do pré-sal coincidiram com o governo Fernando Henrique Cardoso, que se submetia aos interesses dos grandes capitalistas e empresas transnacionais. FHC promoveu uma verdadeira dilapidação da Petrobras, acabando com o monopólio da exploração do petróleo. Com isso, o petróleo passou a pertencer à empresa que o extrai. Qualquer petroleira pode exportá-lo sem passar por nenhum processo de refino. Basta apenas pagar uma taxa ao Estado. Nesse período, foram vendidas ações da Petrobras na Bolsa de Valores de Nova Iorque. Estima-se que atualmente 40% do capital da empresa é controlado por estrangeiros. O descalabro foi tanto que chegaram a propor a mudança do nome da empresa para Petrobrax. Assim, ajudaria os gringos que não conseguem pronunciar, pasmem, “Petrobras”. Com a reação das ruas, o governo voltou atrás. Com a eleição de Lula, em 2002, houve mudanças significativas na companhia. O governo tentou recuperar o patrimônio da Nação brasileira, ainda que lentamente. Mudou a lei de novo e recuperou a propriedade do petróleo da camada pré-sal para a União.

Empresas estrangeiras estão de olho nas reservas do Pré-sal, que chegam a 70 bilhões de barris de petróleo As reservas do pré-sal chegam a 70 bilhões de barris de petróleo, o que permite uma exploração de 50 anos, no mínimo. Com isso, os capitalistas abriram o olho. Essa exploração pode gerar um lucro extraordinário, que alcançará uma cifra de trilhões. Essa é a disputa feita pelo capital, que acionou seus cães de guarda no Congresso para tentar criar uma CPI. O objetivo é agitar o mercado, fazer as ações da empresa caírem e intensificar uma ofensiva sobre o que sobrou da empresa. Além disso, pretendem enfraquecer a presidenta Dilma. No entanto, isso é apenas a sobremesa, porque o que querem mesmo é o lucro com o petróleo. O candidato à presidência Aécio Neves já mostrou nas entrelinhas que quer privatizar a Petrobras e entregar as reservas do pré-sal ao capital estrangeiro. Os erros existentes nos negócios da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, são apenas manipulações para esconder da sociedade os verdadeiros interesses da oposição. Um exemplo é que, dois anos atrás, o pedido de auditoria desse negócio por representante de associação dos engenheiros não rendeu nada na imprensa. A sociedade deve ficar alerta, em defesa da Petrobras como empresa pública. Só assim será garantida a riqueza do petróleo para atender às necessidades do povo brasileiro.

O jornal Brasil de Fato circula semanalmente em todo o país e agora também com edições regionais, em SP, no Rio e em MG. Queremos contribuir no debate de ideias e na análise dos fatos do ponto de vista da necessidade de mudanças sociais em nosso país e no nosso estado.

contato..................brasildefatomg@brasildefato.com.br para anunciar : publicidademg@brasildefato.com.br / (31) 3309 3304

conselho editorial minas gerais: Adília Sozzi, Adriano Pereira Santos, Beatriz Cerqueira, Bernadete Esperança, Bruno Abreu Gomes, Carlos Dayrel, Cida Falabella, Cristina Bezerra, Durval Ângelo Andrade, Eliane Novato, Ênio Bohnenberger, Frederico Santana Rick, Frei Gilvander, Gilson Reis, Gustavo Bones, Jairo Nogueira Filho, Joana Tavares, João Paulo Cunha, Joceli Andrioli, José Guilherme Castro, Juarez Guimarães, Laísa Silva, Lindolfo Fernandes de Castro, Luís Carlos da Silva, Marcelo Oliveira Almeida, Michelly Montero, Milton Bicalho, Neemias Souza Rodrigues, Nilmário Miranda, Padre Henrique Moura, Padre João, Pereira da Viola, Renan Santos, Rilke Novato Públio, Rogério Correia, Samuel da Silva, Sérgio Miranda (in memoriam), Temístocles Marcelos, Wagner Xavier. Administração: Valdinei Siqueira e Vinicius Moreno. Distribuição: Larissa Costa. Diagramação: Luiz Lagares. Revisão: Luciana Santos Gonçalves Editor-chefe: Nilton Viana (Mtb 28.466). Editora regional: Joana Tavares (Mtb 10140/MG). Repórteres: Maíra Gomes e Rafaella Dotta. Fotógrafa: Ana Beatriz Noronha. Estagiária: Raíssa Lopes. Endereço: Rua da Bahia, 573 – sala 306 – Centro – Belo Horizonte – MG. CEP: 30160-010.


Belo Horizonte, de 25 de abril a 01 de maio de 2014

Festivais animam botecos de BH até maio COMIDA MINEIRA Novo no pedaço, Botecar se especializa em comida de raiz

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Maíra Gomes Entre os meses de abril e maio, a capital mineira está mais agitada do que nunca com a realização de dois festivais de comida de boteco na cidade. Desde o dia 10, 100 bares de Belo Horizonte oferecem pratos exclusivos para serem analisados e votados pelos clientes dos festivais. Com 55 bares participantes, o Botecar apresenta-se como o maior e mais novo festival de botecos de raiz, ao lado do já tradicional Comida di Buteco, que completa este ano a sua 15ª edição, com 45 estabelecimentos inscritos. Do total de participantes do Botecar, 20% estão estreando em um festival. Entre os demais, figuram bares vencedores de outras competições e que encaram a novidade do tiragosto exclusivamente de raiz como um grande desafio para inovar e se destacar para ganhar a disputa. Enquanto o Comida Di Buteco se consolida como competição presente em 16 cidades do Brasil, o Botecar traz a proposta de fortalecer os petiscos mineiros. “Com a apresentação de dois festivais na cidade, mostrou-se a opção em trabalhar com um que tem o perfil mineiro ou com o outro, que é nacional”, explica Marcos Proença da Mata Machado, proprietário do Patorroco, bicampeão do Comida di Buteco que agora está na lista dos bares do Botecar. Antônio Lúcio Martins, organizador do evento, disse que a ideia de criar um festival que tivesse a

O metrô de Belo Horizonte será tema de audiência pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), no próximo dia 28 de abril. A sessão acontecerá na Comissão de Assuntos Municipais, na ALMG, às 14 horas. Metroviários prometem lotar a audiência, lutando contra a estadualização e a privatização do metrô da capital. No dia 19 de março, a categoria paralisou as atividades por 24 horas para protestar contra o projeto de Parceria Público Privada do metrô e para exigir informações sobre

Pergunta da semana Até a próxima quarta-feira (30), os estudantes podem requerer o meio passe estudantil na Prefeitura de Belo Horizonte. Com o benefício, eles podem pagar apenas 50% nas passagens de ônibus. Em Belo Horizonte, a Lei do Meio Passe Estudantil começou a valer em 2011. Mas, ao contrário do que acontece em outras cidades, nem todos os estudantes podem ter o benefício. É feita uma seleção com prioridade para estudantes do ensino médio e com carência econômica comprovada, deixando muitos alunos de fora.

O que você acha do meio passe para estudantes? Botecar reúne 55 bares para apresentar a comida tradicional de Minas Gerais

‘cara’ dos bares de BH surgiu após constatar que muitos estabelecimentos estavam inovando no cardápio, com pratos muito criativos, mas distantes da identidade mineira. “Precisamos resgatar a cultura dos botecos como um grande diferencial competitivo para o nosso turismo. Os visitantes querem saborear a verdadeira culinária mineira e não podemos perder esse foco”, avalia Antônio Lúcio. Mesmo com dois festivais realizados simultaneamente, Marcos acredita que ninguém saiu prejudicado. “Está surpreendente. Alguns achavam que iria esvaziar, mas não é o que está acontecendo. Belo Horizonte é uma cidade grande e tem público para vários eventos”, aponta. Ele conta que houve melhoras no atendimento dos bares, já que não há superlotação ou grandes filas e os clientes podem ser melhor recebidos.

Elisa Fonseca, proprietária do famoso Bar da Lora, no Mercado Municipal, também está no Botecar, após anos no festival anterior. Ela conta que sempre gostou muito do Comida Di Buteco, mas se incomodava com as limitações impostas. “Não podíamos ir em outra emissora que não a Globo, não era permitido participar de outros eventos e coisas do tipo. Tínhamos a obrigação de usar os ingredientes dos patrocinadores. Tudo tinha que pedir bença”, explica. Em reunião com outros bares, o grupo pediu liberação das limitações e outras reivindicações. Como não foi atendido, decidiu sair do festival. “E arrumamos um evento pra gente. O Antônio Lucio se prontificou a organizar e como o Botecar não colocou aqueles limites, resolvemos participar”, diz. Os festivais vão até o dia 10 de maio.

Audiência pública vai debater metrô de BH Rogério Hilário

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o destino de trabalhadores. Eles saíram em passeata em direção à Procuradoria Regional do Trabalho, onde aguardaram o resultado da terceira audiência pública entre os dirigentes do Sindicato dos Empregados em Empresas de Transportes Metroviários e Conexos de Minas Gerais (Sindimetro-MG), representantes da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBUT) e da Metrominas. Representantes da CBTU negaram conhecer iniciativas que visem a privatização do metrô de Belo Horizonte. Depois da audiência, a categoria realizou assembleia em frente à Procuradoria e decidiu re-

Eu nunca tive meio passe porque eu estudava perto de casa. Quando eu comecei na faculdade, eu já trabalhava e fui procurar o meio passe. Eles disseram que eu não podia porque eu já trabalhava e era pra quem só estuda. Magno dos Santos, trabalhador de papelaria e estudante universitário

Midia Ninja

tornar às atividades no dia seguinte. De acordo com a presidente do Sindimetro-MG, Alda Lúcia Fernandes Santos, a CBTU e a Metrominas não deram nenhuma informação nas audiências anteriores, assim como não chamaram o sindicato para participar das negociações a respeito do projeto de PPP.

Eu não tenho meio passe estudantil, pois estudo perto da escola e as pessoas perto de mim também não têm meio passe, mesmo aquelas que precisam. Elas não correram atrás, e pra te falar a verdade nem eu sabia que isso existia. Jéssica Paloma, estudante do ensino médio


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De morador de rua a maratonista, com orgulho SUPERAÇÃO História de abandono não tira esperança e garra de Charles

fatos em foco Ocupações urbanas em protesto

Rosana Zica

Rosana Zica No pódio das maratonas, Charles Marcos Gomes, 41 anos, parece um atleta profissional comum, com seu físico alto e esguio que parece ter sido trabalhado em anos de treino e vida saudável. Só quem conversa com ele descobre sua história dura de abandono, sofrimento e superação. Charles foi criado no bairro Jardim Laguna, em Contagem, mas nunca conheceu o pai. Ficou órfão de mãe aos 9 anos, quando foi morar com tio, militar, e finalmente foi matriculado na escola. Mas, aos 14 anos, um mal entendido mudou seu destino novamente. “Saí de casa para jogar fliperama, quando apareceu o pessoal da Febem e nos levou”, conta. Na antiga Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor (Febem), ele relatou que morava com um tio e uma assistente social o levou para casa. Mas o tio pensou que o garoto estava envolvido com coisa errada e não o aceitou de volta. Liberdade reconquistada Charles tentou várias vezes fugir da Febem, mas sempre era resgatado. Saiu definitivamente da Fundação Dom Bosco aos 21 anos, com pouco estudo, mas com o curso de marcenaria completo e voltou para a casa do tio. “Ele me ajudou muito. Morei lá com ele e passei a vender picolé”, lembra. Mas o tio se aposentou e mudou para o interior e Charles voltou para as esquinas da capital, onde, ao todo, morou 21 anos. Só na rua Itambé, na Floresta, ficou 15 anos, catando material reciclável que vendia para depósitos. Faz apenas sete meses que Charles ganhou um lar. “Meu filho Welington, de 6 anos, veio morar comigo e os motoboys de uma empresa de entrega ficaram com pena de ver uma criança dormindo na rua e conseguiram um quarto barato para eu alugar”, conta. O aluguel, de R$ 380, é pago com o dinheiro da faxina que Charles faz em prédios na região. Atleta de rua, com orgulho No meio de tantas batalhas, Charles conta que começou a correr aos 26 anos, na Lagoa da Pampulha, quando era office boy na Secretaria Municipal de Esportes. Hoje, o que mais gosta é correr. “A cor-

Na quinta-feira (24), os moradores das ocupações Rosa Leão, Esperança, Vitória, William Rosa e Emanuel Guarani Kaiowá fizeram, mais uma vez, manifestação para garantir o cumprimento de seus direitos. Cerca de 12 mil famílias ainda se encontram ameaçadas de despejo, por ordens de reintegração de posse da Justiça de Minas Gerais. Os manifestantes da Região do Isidoro realizaram passeata pela avenida Cristiano Machado e os de Contagem seguiram com os protestos pela Tereza Cristina. Mais tarde, se concentraram na porta da Prefeitura. Na quarta-feira (23), eles já haviam se reunido informalmente com a direção da Ceasa. No encontro, segundo o coordenador da ocupação William Rosa, Lacerda Santos Amorim, os moradores foram convidados a se retirar de forma pacífica, sob a promessa de futuras negociações com o governo estadual e federal de inclusão das famílias no programa “Minha Casa, Minha Vida”.

Tarifa Zero pede que MP suspenda aumento do transporte intermunicipal rida me distrai e não deixou que eu me tornasse uma pessoa revoltada, além de me dar uma saúde de ferro. Fui criado sozinho, mas tenho Deus e encontro na Bíblia e no esporte meu ponto de apoio”, relata. Charles já participou da Maratona de São Paulo, da São Silvestre, e de provas em outras cidades. Hoje, mantém a rotina de treinos, correndo até 200 quilômetros por semana. Neste momento, ele tenta regularizar o cadastro no Bolsa Família do Auxílio Moradia e corre atrás da segunda via da carteira de trabalho, já que o original, que ‘guardava’ num bueiro da Floresta, sumiu. Enquanto os documentos não vêm, Charles e o filho dividem o almoço do Restaurante Popular. “Não gosto de pedir, mas o café com pão ganho dos funcionários de um sindicato e uma senhora do prédio que limpo doa uma cesta básica por mês e assim vamos levando”. Ele diz que o que mais precisa é de ajuda para participar das maratonas. Para o filho, o sonho é uma bicicletinha. Gente boa vivendo nas ruas Charles diz que não tem saudade da vida nas ruas. “Fiquei mui-

tos anos porque não via opção, mas é muito complicado. Lá tem o morador de rua de verdade, que pede e nunca rouba, e o sujeito que chega e se mistura para fazer coisa errada”, distingue. O atleta conta que conviveu com todo tipo de gente, mas nunca bebeu, fumou ou teve passagem pela polícia. “Meu negócio sempre foi esporte”, conta o maratonista. Para Claudenice Rodrigues Lopes, da equipe da Pastoral de Rua da Arquidiocese de Belo Horizonte, a vida de Charles é mais uma prova de que nas ruas também há virtudes e superação. “Ser morador de rua não é sinônimo de usar drogas. A ida para essa situação pode ter variados motivos e só desmistisficando essa visão é que as políticas públicas para essas pessoas deixarão de ser pensadas apenas na perspectiva da segurança e do tratamento de saúde”, destaca. Ela defende políticas intersetoriais para a inclusão das pessoas que vivem nas ruas, que promovam a geração de renda, habitação e saúde de uma forma mais ampla e a educação em um segundo momento.

O Movimento Tarifa Zero protocolou, na quinta-feira (24), documento pedindo a intervenção do Ministério Público para que seja suspenso o aumento das tarifas do transporte intermunicipal, e também entregou relatório final a respeito de auditoria do transporte público realizada pela empresa Ernst & Young. No documento, o movimento conclui que a verificação se baseou em dados que não possuem validade fiscal fornecidos pela BHTrans e pelo Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (Setra BH). Além disso, o relatório demonstra que há custos que não foram explicados pela empresa que realizou a auditoria. Por esse motivo, o Tarifa Zero argumentou que “nenhuma decisão de reajuste tarifário ou alteração do contrato podem ser tomadas, uma vez que as conclusões apresentadas pela EY não se baseiam em dados contábeis reais e passíveis de verificação”. O movimento organiza uma nova manifestação na próxima segunda-feira (28), às 17h, frente ao Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DER).


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Conta de luz e mudança política são temas de Encontro MOVIMENTOS Praça da Assembleia será ocupada por pessoas de todo o estado Rafaella Dotta A partir de 1º de maio, será realizado em Belo Horizonte o 5º Encontro dos Movimentos Sociais de Minas Gerais, na Praça da Assembleia Legislativa. Os organizadores esperam receber 2 mil pessoas, para debater dois plebiscitos populares: o Plebiscito pela Redução da Conta de Luz, realizado em Minas em 2013, e o Plebiscito por uma Constituinte do Sistema Político, que está programado para setembro deste ano, em todo o Brasil. O Encontro dos Movimentos Sociais é organizado por diversos sindicatos, grupos de jovens, pastorais e movimentos populares de Minas Gerais. “O 5º encontro tem por objetivos fortalecer a construção do Projeto Popular em Minas, combater as medidas neoliberais que têm sido implementadas pelos governos do PSDB, de Aécio e Anas-

tasia, e proporcionar maior unidade nas lutas populares. Vamos devolver para a população e para os deputados o resultado do plebiscito da energia e preparar para a discussão da reforma política”, coloca Frederico Santana Rick, da Assembleia Popular. Conta de luz ainda na pauta O primeiro encontro de movimentos sociais mineiros aconteceu em 2006, paralelo ao encontro do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Durante o evento, foi realizado um protesto na sede da Cemig, contra as altas tarifas cobradas. Neste 5º Encontro, o assunto da conta de luz ainda está colocado. “Vamos fazer uma urna enorme, juntando os 600 mil votos do Plebiscito da Energia”, conta Carol Garcia, que foi secretária do plebiscito realizado no ano passado.

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O 5º Encontro dos Movimentos Sociais será realizado de 1 a 3 de maio

As mesas serão compostas por representantes de movimentos nacionais, como João Pedro Stedile, da coordenação do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), e Sônia Mara Maranho, do Movimentos de Atingidos por

Barragens (MAB), e por entidades do estado, como Beatriz Cerqueira, que foi líder da greve de 100 dias dos professores estaduais em 2011, e hoje é presidente estadual da Central Única dos Trabalhadores (CUT).

Acompanhe todos os domingos, de 7 às 7h30, na TV Band, o programa “Outras Palavras”. O objetivo do Sind-UTE/MG é promover, por meio desse canal, uma ampla discussão sobre a educação pública em Minas Gerais, na visão dos educadores.

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Belo Horizonte, de 25 de abril a 01 de maio de 2014

Desmilitarização da PM é questão de segurança pública PEC 51 Especialistas defendem que modelo da PM no Brasil é atrasado e ineficiente Midia Ninja

Maíra Gomes O debate de segurança pública sempre esteve presente na sociedade brasileira. Mas foi após as manifestações de junho de 2013 que o assunto tomou fôlego e ganhou páginas de jornal e propostas no Legislativo. A apresentação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) Nº 51, em setembro do ano passado, parece ampliar o debate, trazendo à tona a polêmica da desmilitarização da Polícia Militar. Atualmente, o modo de funcionamento e organização da PM é igual ao das Forças Armadas, do qual ela é considerada força reserva, conforme artigo 144 da Constituição Federal de 1988. De acordo com o especialista em segurança pública e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) Luiz Eduardo Soares, em entrevista à Fiocruz, o debate passa pelo objetivo de cada uma das corporações. “O melhor formato organizacional é aquele que melhor permite à instituição cumprir suas finalidades. Finalidades diferentes requerem estruturas organizacionais distintas. Portanto, só faria sentido reproduzir na polícia o formato do Exército se as finalidades de ambas as instituições fossem as mesmas”, afirma. O objetivo do Exército é defender o território e a soberania nacionais. O papel da Polícia Militar é garantir os direitos dos cidadãos, prevenindo e reprimindo violações, recorrendo ao uso comedido e proporcional da força. Roberta von Randow, militante do coletivo Morro na Favela é Verbo, explica que quando a PM tem a formação militar, fica sempre em busca de um inimigo, cau-

Grupos denunciam que PM usa violência contra negros e favelados, escolhidos como “inimigos” internos

sando um desvio em sua função original. “O Exército é baseado na ideia de um inimigo externo que invade o território. Quando essa passa a ser a lógica da PM, você traz o inimigo pra dentro do país”, explica. Ela conta que, ao longo da história, a polícia sempre foi usada para controlar revolta, combater negros, estudantes, indígenas, ocupações rurais ou urbanas, todo considerados inimigos dos que detêm o poder. Extermínio de jovens “Os dados de mortes em confrontos policiais são alarmantes há um tempo, mas após as manifestações, quando a violência da polícia se refletiu sobre jo-

vens brancos universitários, houve mais visibilidade do problema”, analisa Filipe Rodrigues, da Coordenação Nacional do Levante Popular da Juventude. Ele frisa que naquele momento os estudantes se tornaram também os inimigos da ordem. Pesquisa realizada pelo Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos (Cebela) revela que o índice de homicídios de jovens no Brasil é altíssimo, com 18.436 jovens assassinados apenas no ano de 2011, o equivalente a oito Chacinas da Candelária por dia. De acordo com Míriam Alves, do grupo Bloco das Pretas, os policiais são formados para classificar as pessoas de acordo com

os estereótipos, criminalizando os jovens negros da periferia. “Quando a polícia entra na favela, já procura o jovem negro. Temos dados que apontam que quanto mais ação policial tem dentro da favela, maior é o número de mortes na localidade”, conta. Míriam aponta que o que chama de ‘ódio ao negro’ é passado aos policiais através da hierarquia da corporação, além da herança histórica da atuação da PM no Brasil, inclusive no tempo da ditadura. “É o principal componente pra termos a polícia agindo de forma truculenta contra as pessoas e não da forma correta, preventiva, de controle do crime”, acredita.

Polícia no Brasil não é de ciclo completo Maíra Gomes da tem muito o que melhorar para que possa servir com efetividaOs militares das Associações de à população. “Eu acredito que de Praças em nível nacional se é possível fazer mais com o mecolocam a favor da desmilitari- nos que temos, mas não nesse zação, mas não no estado de Mi- modelo que engessa as polícias nas Gerais. O militar Heder Mar- como um todo”, destaca. Ele acretins de Oliveira, diretor jurídico dita que a desmilitarização é apeda Associação dos Praças de Mi- nas uma parte da questão. Dentre nas Gerais, aponta que a PM ain- muitos, o ponto considerado pelo

militar como central diz respeito ao ciclo de trabalho das polícias no bojo da segurança. Atualmente, cada setor das policias é responsável por uma etapa do processo. Quando acaba sua atuação, o setor não tem mais acesso ou responsabilidade sobre o caso. “No Uruguai, a polícia é de ciclo completo e em cin-

co dias uma ocorrência está solucionada. Como um país que é o terceiro do mundo em população carcerária pode sofrer problema de impunidade? Não é esse o caso, a questão é que prendemos mal, quem deveria estar solto está preso”, avalia.


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Uma visão popular do Brasil e do mundo

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Belo Horizonte, de 25 de abril a 01 de maio de 2014

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Belo Horizonte, abril e maio| edição especial| distribuição gratuita | www.brasildefato.com.br | facebook.com/brasildefatomg

Plebiscitos mobilizam sociedade Noronha Rosa

Cidadãos mineiros se organizaram para pedir um preço menor para a energia. O plebiscito, que chegou a 600 mil pessoas, será discutido de 1 a 3 de maio, no 5º Encontro dos Movimentos Sociais, em que 2 mil participantes irão preparar também o plebiscito popular nacional por uma Constituinte

Lucro da conta de luz vai para fora Matéria investiga o volume do lucro da Cemig e descobre para onde vai o dinheiro da conta de luz. Em entrevista, auditor fiscal afirma que ela pode ser considerada uma “empresa privada”, pois já não serve à população do estado

Constituinte pode mudar política A semana da Pátria, de 1 a 7 de setembro, será marcada pela vontade de mudar a política brasileira. Todos os cidadãos serão convidados a votar em um Plebiscito feito pela própria população e que começa a ser organizado desde já


Edição Especial

Belo Horizonte, Abril e Maio de 2014

População paga lucro dos acionistas da Cemig CONTA DE LUZ Recordes de repasse aos estrangeiros são garantidos com imposto mais alto do país Se alguém deve concordar com o slogan “A melhor energia do Brasil” são os 121 mil acionistas da Cemig, espalhados em 40 países. O relatório anual de 2012 da Companhia Energética de Minas Gerais mostra que os investidores internacionais possuem 37% de suas ações e os empresários nacionais 24% . Em 2012, por exemplo, a empresa teve o lucro recorde de R$ 4,5 bilhões e repassou R$ 4,7 bilhões aos seus acionistas. Com base nesses dados, o auditor fiscal Lindolfo Fernandes afirma que a Cemig não pode ser considerada uma empresa do Estado, como aparenta. “Um detalhe a se observar é que, apesar de o governo estadual administrar a companhia e ser o acionista majoritário, ele tem apenas 22,27% do patrimônio. Ou seja, a Cemig pode ser considerada uma empresa privada”, afirma. O fiscal se refere às diferentes ações dentro da companhia: as ordinárias e as prioritárias. O governo estadual tem 51% de ações ordinárias, que têm a função de administração, e apenas 22% das prioritárias, aquelas que têm prioridade na divisão do lucro. Resumindo, o governo estadual é quem aparece como gestor, de-

cide sobre os impostos e pode pedir aumentos, mas na hora de receber, o dinheiro vai basicamente para os investidores. Má qualidade dos serviços Apesar dos lucros bilionários da companhia, não há retorno desse recurso à população ou aos trabalhadores da categoria. O Sindicato dos Eletricitários de Minas Gerais denuncia que, desde 1999, a empresa passou a autorizar a terceirização do serviço da rede elétrica, sem o necessário processo de capacitação específica e aparatos de segurança. Trabalhando sob pressão e sob regime de cumprimento de metas, esses mais de 18 mil terceirizados estão sujeitos a compor a estatística de uma morte a cada 45 dias. A população também não se beneficia do aumento dos lucros: nos últimos dez anos, o índice que mede o tempo que os consumidores ficam sem luz, tanto por motivos acidentais como por manutenção da rede - o DEC piorou 14%. “Nós trabalhadores sofremos com a precarização e com os acidentes e a população tem ganhado apenas uma conta alta e a queda no serviço de energia”, critica Jai-

Imposto estadual da conta de luz (ICMS) de Minas Gerais é o mais caro do país.

ro Nogueira Filho, coordenador geral do Sindieletro -MG. “Se a Cemig cumprisse seu dever de empresa pública, deveria abrir concurso para os 18 mil terceirizados, investir na manutenção da rede elétrica do estado e fazer melhorias para a população. Energia é um bem essencial e não pode ser tratada como mercadoria, para gerar lucros para alguns”, continua Jairo.

Na TV: a polêmica da conta de luz Propagandas sobre o aumento na conta de luz viraram debate neste mês. A Cemig divulgou na televisão, rádio e jornais um comercial que dizia “A tarifa da Cemig não é decidida pela Cemig”, mas sim pelo governo federal. Depois de dois dias, foi a vez de o governo federal rebater. Para tirar a dúvida, o

Brasil de Fato MG conversou com Jairo Nogueira Filho, que trabalha na Cemig e é coordenador do Sindicato dos Eletricitários: Quem é responsável pelo aumento da conta de luz? A Cemig mandou documentos para a Agência Nacional de Energia Elétrica, a Aneel, que regula o setor

elétrico, pedindo um reajuste de 30% nas contas de luz dos mineiros. Mas a Aneel aprovou apenas 14%. E esse reajuste não é obrigatório. A Cemig poderia manter o preço antigo da conta de luz. Então, quem determina na realidade é a Cemig, não a Aneel. A Cemig diz que metade

das famílias mineiras tem isenção de ICMS, é verdade? O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) é estadual, ou seja, é decidido pelos governos de cada estado. Em Minas é cobrado um ICMS de 30%. Como ele é cobrado em cima de outros impostos, acaba virando 43% da conta. É o

mais caro do Brasil. A isenção da Cemig é para casas que consomem até 90kw/h, o que é um absurdo, pois o consumo médio da família mineira é de 150kw/h. Ou seja, enquanto os donos de casa de campo ou imóveis vazios não pagam o imposto, a população mais necessitada precisa pagar uma conta de mais R$ 100.

Textos: Rafaella Dotta. Edição: Joana Tavares. Diagramação: Luiz Lagares. Contato: brasildefatomg@brasildefato.com.br


Edição Especial

Belo Horizonte, Abril e Maio de 2014

Mineiros foram às urnas por conta de luz mais barata CONSULTA 600 mil pessoas requisitaram redução do ICMS e do preço da energia de Minas Gerais A população mineira deixou um recado para o governo: quer pagar menos pela conta de luz. Durante todo o ano de 2013, movimentos sociais, sindicatos, pastorais e outras entidades construíram um Plebiscito Popular sobre a tarifa da energia elétrica, que resultou em 603.039 votos, ou seja, 4% do eleitorado do estado. Com as perguntas “Você concorda que o governo de MG deve reduzir o imposto estadual (ICMS), que representa 42% da conta de luz, para 14%?” e “Você concorda que a Cemig deve reduzir em 50% a tarifa de energia para o povo de MG?”, os mineiros puderam dizer o que pensam.

“Foi fundamental este diálogo para que a sociedade tome conhecimento, para que entenda a sua conta de energia”, declara Jair Gomes Pereira Filho, diretor do Sindicato dos Eletricitários, Sindieletro-MG, e um dos organizadores do Plebiscito. As cédulas continham as duas perguntas, e a possibilidade de ‘sim’ e ‘não’ como respostas. Depois de duas semanas de votação de 19 de outubro a 3 de novembro - foram computados 99.3% de ‘sim’ em ambas as respostas. A assistente social Carolina Garcia, que trabalhou na secretaria do plebiscito, entende que o resultado deixa clara a indignação da

população em relação ao preço da energia. “A população quer redução, não concorda com a cobrança da forma como é feita”, avalia. Resultado será entregue ao governo Nos dias 1, 2 e 3 de maio será realizado o 5º Encontro de Movimentos Sociais de Minas Gerais, que pretende discutir os próximos passos do Plebiscito da Energia. Está agendada uma audiência para entregar o resultado à Assembleia Legislativa, mas os organizadores estão incentivando que os comitês municipais, cerca de 300 em todo o estado, requisitem audiências públicas

Plebiscito popular é ferramenta da democracia, explica advogado Um plebiscito é uma espécie de votação em que todas as pessoas podem participar. Pergunta-se sobre um assunto e o votante pode dar a sua opinião. No entanto, há diferentes formas de consultar o povo sobre temas importantes fora das eleições oficiais, como o referendo e os projetos de lei de iniciativa popular. O advogado e dirigente nacional da Consulta Popular Ricardo Gebrim explica que plebiscito é uma ação diferente. No referendo, uma lei já aprovada pelo Congresso Nacional é submetida à votação para saber se a população a apoia. Um exemplo desse tipo de consulta foi sobre o Estatuto do Desarmamento, em 2005, em que a população votou pela manutenção do comércio de armas de fogo. No caso de iniciativa popular, os eleitores apre-

sentam um Projeto de Lei com assinaturas de, pelo menos, 1% do eleitorado. “Apesar de interessante, esse tipo de projeto não tem nenhum tratamento preferencial e pode sofrer alterações propostas por qualquer deputado ou senador”, explica o advogado. Portanto, uma iniciativa popular pode ser completamente modificada, sem o consentimento da população. Plebiscito Um plebiscito oficial, chamado pelo governo, pode ser convocado pelo Congresso Nacional a qualquer momento, como determina o artigo 48 da Constituição Federal. Até hoje, apenas um foi convocado. Em 1993, a população decidiu pelo presidencialismo como forma de governo. Já o Plebiscito Popular é convocado pela pró-

pria população. “Um Plebiscito Popular é organizado por movimentos sociais e todos os cidadãos e cidadãs que quiserem trabalhar para que ele seja realizado podem se somar ao processo”, afirma Gebrim. Ele conta que diversas iniciativas desse tipo já foram realizadas no país. “Em 2002, mais de dez milhões de pessoas votaram contra o projeto da Alca, que era uma proposta de anexação comercial do Brasil aos Estados Unidos. Apesar de não ter valor legal, essa significativa pressão social foi fundamental para a derrota do projeto do FHC”, lembra. De acordo com o advogado, essas experiências fortalecem a democracia no sentido mais radical do termo, ou seja, propiciam que a população se posicione sobre os temas que interferem diretamente em suas vidas.

também em suas cidades. “É importante retornar informações para os participantes e mostrar que a movimentação não terminou. Vamos forçar a discussão em torno da energia”, afirma Neila Batista, assistente social e uma das

organizadoras do Plebiscito. Ela sugere que os comitês requisitem audiências através de vereadores ou comissões da Câmara e que apresentem o resultado do Plebiscito para pedir a redução do ICMS da energia.

Brasil de Fato pergunta: Quase 5 mil pessoas se envolveram com o Plebiscito da Energia e foram responsáveis por fazê-lo chegar até a população em mais de 300 municípios de Minas Gerais. O número de votos não é o único bom resultado, afirmam os organizadores.

Você que ajudou no Plebiscito da Energia, o que achou da experiência?

Foi um momento de ampliar a minha visão, para além dos muros da universidade. Me marcou e me surpreendeu muito a indignação, a revolta do povo e trago isso pro meu dia a dia. A imensa maioria da população se sente prejudicada e quer que a tarifa de luz, e todas as outras, diminuam. André Araújo Carvalho, estudante, mora em Alfenas.

Participar do Plebiscito da Energia foi uma das experiências mais gratificantes que vivi em 2013. Fomos construindo coletivamente, etapa a etapa. Os cursos realizados possibilitaram que nos informássemos e a partir daí ficou fácil coletar os votos. A receptividade da população foi enorme. Outros frutos virão. Feliciana Saldanha, professora, mora em Ipatinga.


Edição Especial

Belo Horizonte, Abril e Maio de 2014

Movimentos querem sacudir política em 2014

Tirando as dúvidas

PROPOSTA Organizações se preparam para alcançar 10 milhões de pessoas e mudar as leis Na semana da Pátria, de 1º a 7 de setembro, em todo o Brasil existirão coletas de vo-

tos para pedir alterações na Constituição Federal. Essa é a aposta de 80 entidades nacionais que estão organizando o Plebiscito da Constituinte, que visa mudar regras da política. Em Minas Gerais, já são 117 organizações, entre sindicatos, movimentos sociais, pastorais sociais, associações de bairro e estudantes. “As manifestações de junho mostraram que a nossa democracia é limitada para o tipo de participação que a população está querendo”, acredita o professor de direito da Universidade Federal de Brasília Gladstone Leonel. Ele defende que a mudança nas leis precisa vir da

mobilização e cita exemplos de países da América Latina que fizeram esse tipo de mudança. “A Bolívia acabou com o analfabetismo e 65% dos jovens estão na universidade depois da reforma da Constituição. Pra gente ter uma ideia, no Brasil, apenas 15% dos jovens são universitários”, explica. Organização Atualmente, 80 entidades nacionais participam da estruturação do plebiscito popular. “Esse número aumenta muito nos estados e cidades. Cresceu tanto que hoje não é possível fazer um levantamento exato”, diz Lucas Pelissario, integrante da secretaria nacional. “O plebiscito não acontece só em setembro. Desde já, os comitês estão fazendo cursos

Reprodução

de formação, materiais e debates para que a população conheça e se envolva com o tema”, explica. A expectativa do Plebiscito da Constituinte é coletar de 10 a 13 milhões de vo-

tos em todo o Brasil. Em Minas Gerais, espera-se que o número de votos supere os 600 mil coletados no Plebiscito da Energia de 19 outubro a 3 de novembro do ano passado.

Mudança na política pode mudar a representatividade das maiorias Se a política brasileira fosse um campeonato de futebol, desde a colonização do país teríamos um único time vencedor: o time dos “homens brancos e ricos”. Quem faz a metáfora é o advogado Ricardo Gebrim, que explica que diversas perversões no atual sistema político brasileiro fazem com que exista um número muito baixo de pobres, mulheres e negros em cargos eletivos. “Teoricamente, qualquer um pode se candidatar, mas nem todos podem se eleger, pois as campanhas são caríssimas e da forma como o sistema é hoje, é o dinheiro que define quem é eleito”, critica. Segundo estudo do Instituto Kellogg feito em 2013, a cada

R$ 1 Investido em um político

a cada R$ 1 investido em um político, a empresa arrecada R$ 8,50 em contratos com o poder público. “A influência do poder econômico nas eleições está associada à corrupção na sociedade brasileira, pois as decisões políticas dos eleitos beneficiam quem os financiou”, afirma Liliam Daniela, socióloga. Sub-representação Apesar de negros e mulheres serem metade da população brasileira, com 49,6% e 50,8% respectivamente, esses números não têm reflexo na política. Em 2011, o Congresso Nacional tinha apenas 7,74% de negros e 9,6% de mulheres em cargos eletivos. Estudiosos têm chama-

do esse fenômeno de “sub -representação”. Liliam aponta que a realização de uma Assembleia Constituinte Soberana e Exclusiva “é o único mecanismo que permitirá mudanças estruturais no sistema político”. Uma das mudanças que poderiam ser decididas é o financiamento público exclusivo de campanhas. “Os partidos recebe-

População brasileira Congresso Nacional 49,6% Negros 50,4% Outros

a empresa arrecada

50,8% Mulheres

R$ 8,50 em contratos com o poder público

riam dinheiro público, repassado pelo Estado, para suas propagandas, o que garantiria equilíbrio nas condições de candidatura”, explica a socióloga. “A proposta de reforma política também prevê cotas de participação para os diversos segmentos nos cargos eletivos, de modo que a sociedade seja efetivamente representada nas esferas de governo”, aponta.

49,2% Homens

7,74% Negros 92,26 Outros

9,6% mulheres em cargos eletivos 90,4% Homens

O que é um plebiscito? É quando a população é chamada a votar em alguma coisa fora do período eleitoral. Lembra do referendo das armas, que aconteceu em 2005? Ele perguntou sobre a lei de desarmamento, que já existia. O plebiscito é parecido, mas pergunta sobre temas que ainda não foram decididos pelo governo, sobre propostas de mudança. Há o plebiscito oficial (o último foi realizado em 1993, em que se decidiu sobre o regime de governo) e o popular, convocado pelo povo. O que essas pessoas estão querendo mudar? Elas querem reformular as “regras do jogo” no Brasil, ou melhor, as regras da política. A proposta é conseguir um número elevado de votos - os organizadores falam em 13 milhões - para que seja eleita uma assembleia constituinte exclusiva, que faria as mudanças na Constituição. O que significa uma Assembleia Constituinte Exclusiva e Soberana? É onde se reunirão os representantes da população, eleitos exclusivamente para essa Assembleia, por isso chama-se Exclusiva. Eles farão novas leis para a nossa Constituição Federal, por isso é chamada de Constituinte. Nenhum outro órgão do Estado (Senado, Câmara dos deputados ou Presidência) poderá mexer nessas novas leis, e por isso é chamada de Soberana. Quando vai ser? A fase de coleta de votos do plebiscito vai acontecer entre 1 e 7 de setembro de 2014, na semana da Pátria, em diversos pontos das cidades brasileiras. Já existem comitês em 300 cidades de Minas Gerais. Todas as pessoas e grupos podem participar, basta concordar com a pergunta: “Você é a favor de uma constituinte exclusiva e soberana sobre o sistema político?”. Para saber mais, entre em contato com a secretaria estadual (31 3238-5000 / plebiscitopopularmg@gmail.com).


Belo Horizonte, de 25 de abril a 01 de maio de 2014

Cidadania em curso SAÚDE Curso de Formação Política discute os temas da luta antimanicomial

fatos em foco Norte de Minas se reúne em BH Lívia Bacelete

Lívia Bacelete Os portadores de sofrimento mental de Belo Horizonte e Região Metropolitana voltaram para a sala de aula. O que para muitos pode parecer uma verdadeira loucura, para outros é uma possibilidade de os usuários da rede saúde mental se apropriarem de conhecimentos. Trata-se da terceira edição do Curso de Formação Política para os Usuários e Familiares de Saúde Mental: Cidadania em Curso, promovido pela Associação dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental de Minas Gerais (Asussam), em parceria com o Fórum Mineiro de Saúde Mental. Realizada em Belo Horizonte, a formação, que teve início no dia 25 de março e será finalizada em 5 de maio, conta com a participação de 50 alunos. D i vidido em duas turmas de 25 pessoas, cada uma das 10 aulas do curso tem duração de 1h30 e trata de diferentes assuntos ligados à luta antimanicomial. Temas como a história da loucura, a trajetória da Reforma Psiquiátrica brasileira, a rede de atenção psicossocial, o Sistema Único de Saúde (SUS), as políticas públicas sobre drogas, a legislação brasileira que se refere ao portador de sofrimento mental e outros serão o fio condutor da formação política. Para Emilha Maria de Oliveira, tesoureira da Asussam e subcoordenadora do Fórum Mineiro de Saúde Mental, o curso vem para contribuir com o processo antimanicomial. “As pessoas ganharão um potencial para pensar e agir em prol desse projeto ousado

minas | 07

Acontece nesse domingo (27), o Encontro do Norte de Minas em BH. O evento trará à capital nove atrações do interior, que valorizam as tradições populares do estado. Haverá apresentação de samba de roda, violas e sanfonas, bandas e exposição de produtos da região. O projeto é uma iniciativa do Movimento Nacional dos Direitos Humanos de Minas Gerais (MNDH), e acontecerá no Mercado das Borboletas (Avenida Olegário Maciel, 742, Centro, III Piso), das 12h às 20h.

Prova da OAB traz denúncia a Cemig

50 pessoas, entre portadores de sofrimento mental e familiares, participam do curso

na loucura”, afirma. Emilha, que é usuária da rede de saúde mental e participa da formação, explica que, para além das expectativas pessoais em aumentar seus conhecimentos, existe uma expectativa coletiva de que mais pessoas levantem a bandeira da Reforma Psiquiátrica. Democratizar o conhecimento A psiquiatra e psicóloga Miriam Abou-yd, do Fórum Mineiro de Saúde Mental, explica que o objetivo da formação é democratizar um saber que, até então, é sustentado e incorporado pelos técnicos da rede. Miriam acredita que, ao se apropriarem desse conhecimento, os usuários e familiares podem atuar como mul-

Samba para a liberdade

Esquentando os tamborins para o Dia Nacional da Luta Antimanicomial – Dezoito de Maio de 2014 - o Fórum Mineiro de Saúde Mental e a Asussam realizam o 10º Concurso do Samba Enredo da escola de samba “Liberdade Ainda que Tan Tan”, no dia 26 de abril, a partir das 9h, no Parque Professor Guilherme Lage, em Belo Horizonte. O concurso faz parte das atividades preparatórias para o Dia Nacional da Luta Antimanicomial na capital mineira. Durante o concurso também serão eleitos o casal de mestre sala e porta bandeira, a rainha, princesa e princeso da bateria. O concurso tem contribuído para o envolvimento dos usuários, familiares e trabalhadores dos serviços substitutivos da rede de saúde mental com as pautas da luta antimanicomial.

tiplicadores, além de participar com mais consistência e autoridade, representando a si mesmos nos espaços de controle social do SUS, como os conselhos de saúde. Realizado através de edital do Ministério da Saúde, o curso conta com a participação de usuários e familiares dos Cersams (Centro de Referência em Saúde Mental), CAPS AD (Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas) e Centros de Convivência de Belo Horizonte, além de participantes da rede de saúde mental de Itaúnas e Betim. A proposta é que nas próximas edições a formação se amplie com a participação de usuários de outras cidades da Região Metropolitana.

Reforma Psiquiátrica no Brasil O processo da Reforma Psiquiátrica é marcado pelo posicionamento dos trabalhadores da saúde mental contra as condições de vida e a forma excludente e desumana de atenção a que estavam submetidos as pessoas portadoras de sofrimento mental. No Brasil, a instituição do SUS (Sistema Único de Saúde) é referência fundamental para a organização da Política de Saúde Mental. Depois da Constituição de 1988, houve avanços na área, com a tentativa de mudar da lógica do modelo assistencial hospitalar, como os hospitais psiquiátricos, para um modelo aberto e comunitário de tratamento.

Realizada em 13 de abril, a prova que licencia advogados a atuarem profissionalmente, o XIII Exame de Ordem da OAB, trouxe uma pergunta sobre a Cemig. A questão afirmava que a empresa foi responsabilizada “pela submissão de 179 trabalhadores a condições análogas às de escravos, em Belo Horizonte” e completava: “Esse fato gravíssimo comprova, na prática, violação de um princípio crucial acerca dos Direitos Humanos.”

Empresas de telefonia recebem reclamações Em comunicado divulgado nos canais de TV de Minas Gerais, o Sindicato das Empresas de Telefonia (SindiTeleBrasil) sugere que os usuários procurem suas operadoras e façam reclamações sobre o serviço. A atitude é parte do acordo das empresas com a Assembleia Legislativa de Minas Gerais, que realizou a CPI da Telefonia e apurou os principais problemas apontados por clientes. No Procon Belo Horizonte, as empresas de telefone lideram a lista de queixas.

Descoberto trabalho escravo na Aglo American Funcionários da empresa Anglo American e terceirizadas foram classificados como vítimas de trabalho análogo à escravidão. Os casos são de diversos empregados que cumpriam até 200 horas extras por mês e um caso em especial, de um homem que trabalhou 88 dias seguidos, sem folga. A empresa foi autuada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, mas afirmou que não concorda com a acusação e irá recorrer.


08 | opinião

Belo Horizonte, de 25 de abril a 01 de maio de 2014

Foto da semana

PARTICIPE Viu alguma coisa legal? Algum absurdo? Quer divulgar? Mande sua foto para redacaomg@brasildefato.com.br.

Arquivo Levante

Acompanhando

Na edição 30... Burocracia contra hip hop ....E agora

Mais de 3 mil jovens de 25 estados estiveram reunidos no II Acampamento Nacional do Levante Popular da Juventude, dos dias 17 a 21 de abril, em São Paulo. Muita animação, ativismo cultural e debates sobre a realidade do país marcaram o encontro. Minas esteve bem representada, com mais de 500 jovens de todas as regiões do estado.

Lúcio Centeno

Silvio Mieli

Para onde vai o Gigante?

Hábitos culturais

Passado quase um ano das manifestações que colocaram milhões de pessoas nas ruas por todo Brasil, a pergunta que desde então inquieta a todos é: qual será o destino do maior fenômeno de massas das últimas décadas? “O gigante acordou”, o grito que ecoou de um extremo a outro do país, revela a entrada em cena de uma nova geração na arena da política. A juventude que nos anos 90 e 2000 era caracterizada pela apatia política se colocou como protagonista na disputa dos rumos do país. A força desse movimento é inquestionável, agiu como um gigante, bateu em todas as instituições de poder, esmagou todos os que se colocavam contrários a ele. A grande mídia, em especial a Globo, ao constatar a impossibilidade de atacar, resolveu tentar domesticá-lo. De lá pra cá, muita coisa aconteceu. A morte de um jovem na periferia, ofensas racistas no futebol, reajustes salariais pífios, o abuso policial em uma universidade. Tudo que era cotidiano, e de alguma forma tratado com certa naturalidade, neste período inaugurado em Junho, tornou-se uma causa de luta. Para que essa geração traduza as suas insatisfações em força política para alterar o jogo do poder, é preciso superar dois desafios principais. O primeiro deles é o desafio organizativo. Superar ao mesmo tempo as velhas formas de organização contaminadas pelo pragmatismo eleitoral e a tentativa de desconstrução de qualquer forma coletiva de organização. O segundo desafio é o político. Para dar consequência ao conjunto de reivindicações que emergiram, precisamos de uma bandeira que atinja o coração do sistema. Ou seja, é preciso mudar as regras do jogo. Por isso, a importância da luta pela Constituinte. Sem a superação desses desafios, não importa a força do gigante, ele poderá ficar sem rumo.

Enquanto se discutia se o professor de Brasília fez bem ou mal em incluir a letra de um funk na prova de filosofia, uma pesquisa raríssima envolvendo hábitos culturais do brasileiro era lançada. Entre os 2.400 entrevistados de 25 estados, mais da metade (51%) não pratica atividade cultural alguma (nos dias úteis a proporção chega a 85%). Entre os entrevistados, 89% nunca foram a um concerto de ópera ou música clássica em sala de espetáculo; 75% nunca assistiram a espetáculos de dança ou balé no teatro; 71% nunca estiveram em exposições de pintura, escultura e outras artes em museus ou outros locais; 70% nunca foram a uma exposição de fotografia; 61% nunca presenciaram uma peça de teatro. A maior parte das pessoas (58%) não leu nenhum livro nos últimos seis meses. Cerca de 39% preferem filmes de aventura ou ação, 38% gostam mais de comédias. Temática social e musical são os menos vistos (2%). Quanto ao teatro, 33% dos entrevistados preferem comédia. As exposições são atividades pouco procuradas: 14% frequentam exposições de artes. Os gêneros musicais prediletos foram o sertanejo, MPB, Forró, Gospel e Pagode; e as principais danças reportadas foram o Forró, a Dança de salão, Samba e Street Dance/Rap. A TV aberta é o principal meio de adquirir informação (para 62%), e as novelas são a opção preferida de entretenimento nessa mídia. A internet foi citada por um terço dos entrevistados (superando a TV aberta e se destacando como principal meio apenas entre os estratos de renda acima de cinco salários mínimos). Apesar das limitações de toda pesquisa, esse mergulho estatístico ajuda a entender o porquê, no Brasil de hoje, como diz a funkeira Valesca Popozuda, se bater de frente “é só tiro, porrada e bomba”.

Lúcio Centeno é militante do Levante Popular da Juventude no Rio Grande do Sul

Silvio Mieli é jornalista e professor da Faculdade de Comunicação da PUC SP

A partir dos protestos pela volta do Duelo de MC’s às ruas de BH, o Coletivo Família de Rua recebeu parecer favorável à isenção das taxas de alvará que seriam cobradas pela Prefeitura. Isso quer dizer que a Procuradoria Geral do Município não irá mais cobrar para que os encontros de rap sejam realizados, nem para execução do Game of Skate. Mesmo com a vitória, os eventos ainda não possuem local definido para as apresentações. O lugar escolhido pelos representantes do coletivo havia sido a Praça João Pessoa, no Bairro Santa Efigênia, mas a PBH alegou que ela “não oferece as condições necessárias para sediar os shows”. A Família de Rua ainda não teve acesso ao laudo da Secretaria de Meio Ambiente que explica o motivo da inviabilidade da Praça e pretende transferir o Game of Skate para a Praça Sete Na edição 16.... Farinhaços e CPI para não terminar em pizza ... E agora Alvimar Perrela, ex-presidente do Cruzeiro e irmão do senador Zezé Perrela foi acusado de formação de cartel, improbidade administrativa e lavagem de dinheiro em licitações entre os anos de 2009 e 2012, segundo denúncia do Ministério Público. Alvimar é um dos sócios da empresa Stillus Alimentação, principal fornecedora de alimentos para presos do Estado. Conforme informações do MP, os réus obtinham a colaboração de outras empresas para suprimir a possibilidade de competição em licitações. Por meio do esquema, eles teriam vencido 32 processos licitatórios, com preço estimado em R$ 80.977.622,15. Os bens dos acusados foram bloqueados pela Justiça.


Belo Horizonte, de 25 de abril a 01 de maio de 2014

entrevista | 13

“Marco Civil garante internet livre, aberta e diversificada” VITÓRIA Professor e ativista explica o que estava em jogo na lei que regulamenta a rede IHU Online O texto do Marco Civil da Internet foi aprovado no Congresso Nacional e sancionado pela presidenta Dilma Rousseff. Assim, ficou garantida uma versão mais alinhada à proposta construída pela sociedade civil sobre o tema. “O texto do Marco Civil da Internet defende claramente a neutralidade da rede e ele é o texto que assegura que a internet continue livre, aberta e diversificada. Nós conseguimos impedir os ataques mais fortes das operadoras”, explica Sérgio Amadeu, ativista e professor da Universidade Federal do ABC, em São Paulo. Entretanto, ele explica que há tensionamentos no texto. “Sem dúvida alguma, as companhias de telefonia, junto com um grupo de deputados conservadores, inseriram no Marco Civil alguns dispositivos que são ruins, mas que não prejudicam a essência do projeto, nem destroem a neutralidade na rede”, considera. Amadeu é doutor em Ciência Política pela USP e autor de diversos livros, como “Software Livre: a luta pela liberdade do conhecimento” e “Comunicação Digital e a Construção dos Commons”. Ele também participou da implementação dos Telecentros na América Latina e da criação do Comitê de Implementação de Software Livre. Brasil de Fato - Depois de todas as quedas de braço entre as empresas de telecomunicação e ativistas, de que maneira ficou o texto do Marco Civil da Internet? Sérgio Amadeu - O texto do Marco Civil da Internet defende claramente a neutralidade da rede. Ele

“Estamos tendo uma vitória colossal no mundo. Queria deixar isso claro. Em todo o planeta, nós estamos vivenciando leis para criminalizar, bloquear e controlar a Internet” é o texto que assegura que a internet continue livre, aberta e diversificada. Nós conseguimos impedir os ataques mais fortes das operadoras. Porém, sem dúvida

Fora do Eixo

alguma, as companhias de telefonia, junto com um grupo de deputados conservadores, inseriram no Marco Civil alguns dispositivos que são ruins. O texto aprovado na Lei está mais próximo da proposta construída coletivamente desde 2009, por meio das audiências públicas, ou mais próximo aos interesses corporativos? Ele ficou mais próximo da proposta da sociedade civil, apesar de ter tido várias idas e vindas. Há alguns problemas que advêm do fato de o relator ter incorporado alguns textos vindos de bancadas conservadoras, que do contrário não votariam no projeto. Então, o projeto da sociedade civil era bem mais avançado, mas eu considero uma vitória descomunal o fato de o projeto ter passado por um Congresso Nacional tão conservador como o nosso. Nós estamos tendo uma vitória colossal no mundo. Queria deixar isso claro. Em todo o planeta, nós estamos vivenciando leis para criminalizar, bloquear e controlar a Internet. Como fica a questão da liberdade de expressão? No Brasil, o Marco Civil vem para fazer com que a Internet continue livre e aberta. Vários jornalistas me perguntavam: “Mas o que muda na vida do cidadão com a aprovação do Marco Civil?” Eu falava: “Olha, não muda nada! A Internet continuará livre, coisa que não ia acontecer se a gente não aprovasse rapidamente o Marco Civil”. Por quê? Porque as operadoras de telefonia já articulam uma série de ações para gradativamente ir transformando a internet em uma grande rede de TV a cabo. É possível apontar alguma brecha na legislação que permita interpretações que impactem a neutralidade da rede? Sim, existe. Por exemplo, as operadoras de telefonia fizeram um ‘cavalo de batalha’ e conseguiram incluir no artigo 3º um princípio – o da liberdade de modelo de negócios, desde que respeitando os demais princípios da lei –, e ele nos dará neutralidade. Mas por que eles fizeram questão de colocar essa redação? Exatamente para poder brigar depois no Judiciá-

O professor Sérgio Amadeu

“A Internet continuará livre, coisa que não ia acontecer se a gente não aprovasse rapidamente o Marco Civil” rio. Eles querem continuar a disputa, continuar a guerra, e a guerra vai virar jurídica, com a interpretação do Marco Civil. E sobre a privacidade? As operadoras de telefonia se aliaram aos setores conservadores e conseguiram iniciar a guarda de lobby [dados] por aplicação. Isso significa que todas as empresas de comerciais que têm apli-

cações na web vão ter que guardar lobby por um período de tempo obrigatório. Isso permite o manejo de dados e o uso como várias empresas fazem. Esses grupos de conservadores estão fazendo de tudo para quebrar a nossa privacidade. Eles dizem que fazem isso em defesa da nossa segurança. E eu digo que, quando se abre mão da privacidade, da intimidade, em troca da segurança, na verdade se está construindo um cenário totalitário, autoritário. Mas nós vamos efetivamente travar uma batalha em defesa da privacidade. Então, já alerto a todos que a guerra mal começou.


10 | brasil

Belo Horizonte, de 25 de abril a 01 de maio de 2014

Deputados retiram ‘promoção da igualdade’ em Plano de Educação LEI Proposta deve ter votação concluída em maio e definirá metas do país para 2020 Pedro Rafael Vilela, de Brasília (DF)* O projeto de lei (PL 8035/10) que define as metas para a educação brasileira até 2020 deve ser aprovado em maio. Nesta semana, duas reuniões tumultuadas na Câmara dos Deputados discutiram os pontos polêmicos do Plano Nacional de Educação (PNE). Um deles se refere à “superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da igualdade racial, regional, de gênero e de orientação sexual”. Esse trecho foi excluído da versão do projeto após pressão da bancada parlamentar religiosa na Comissão Especial que analisa o assunto. Para a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), o resultado geral foi vitorioso, mas a eliminação do trecho foi um retrocesso. “Em alguns pontos do plano, como esse, não houve o reconhecimento de que existem preconceitos potentes como racismo e homofobia nas escolas”, avalia Bárbara Melo, presidenta da entidade estudantil. Orçamento da educação Outro ponto polêmico foi a destinação dos 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para o orçamento da educação, que consta como meta do Plano. Alguns deputados queriam retirar dessa conta o financiamento de programas como o ProUni, que dá bolsas a estudantes de baixa renda em universidades privadas, e o Fies, que concede empréstimo para custeio de faculdade. No entanto, a Comissão manteve

esses programas na soma de recursos a serem destinados à educação. “O que foi aprovado não chega a 7,5% do PIB para a educação pública, porque uma grande parte é para o setor privado, é transferência de recurso público para o setor privado”, afirmou o deputado Ivan Valente (PSOL-SP). Já o deputado Alex Canziani (PTB-PR) defendeu o outro lado. “Quando falamos em educação, a gente não precisa dizer se é pública ou privada, é educação. Por isso que nós concluímos que os 10% para a educação pública também podem ser utilizados para programas importantes como Fies, o Pronatec e o ProUni”, argumentou. Fim do analfabetismo A erradicação do analfabetismo é uma das principais metas incluídas no PNE. O Brasil possui 13 milhões de pessoas com mais de 15 anos que não sabem ler e escrever, algo em torno de 8,7% do total da população acima dessa faixa etária. Por causa disso, o país ocupa a 8ª pior posição entre 150 nações de todo o mundo, segundo a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Outra meta fundamental do projeto prevê a universalização da educação infantil (crianças de 4 e 5 anos), ensino fundamental (6 a 14 anos) e médio (15 a 17 anos). Todas a metas devem ser alcançadas até 2020. Para ser aprovado, o PNE ainda passará por mais uma audiência da Comissão Especial no próximo dia 6 de maio. Em seguida, poderá ir a plenário e, sendo aprovado, seguirá para a sanção presidencial. (Com informações da Agência Câmara).

Supremo manda instalar CPI “só” da Petrobras A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu na noite de quarta-feira (23) uma decisão provisória (liminar) para que o Senado Federal possa instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar exclusivamente a Petrobras. A medida atende ao pedido feito por senadores de oposição há duas semanas, que não querem uma CPI para investigar outros temas. “Se a oposição pensa que vamos deixar de lado a investigação sobre

o metrô de São Paulo e outras suspeitas que pairam de má aplicação de recursos públicos federais, está enganada”, afirmou o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PT -PE). A decisão do STF é provisória e cabe recurso. Ainda nesta quintafeira (24), o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), avisou por meio de nota que vai recorrer da liminar, que deverá ser analisada pelos demais ministros do Supremo.

Estudantes protestam contra retrocessos do plano


Belo Horizonte, de 25 de abril a 01 de maio de 2014

AGENDA DO FIM DE SEMANA MÚSICA

Show com a banda Pau Brasil, que comemora 30 anos de carreira. Sexta (25), às 20h, na Praça Floriano Peixoto (Santa Efigênia). DEBATE

CINEMA

Roda de conversa com habitantes da tribo Pataxó de Carmésia, que apresentarão aos visitantes seus costumes como pintura corporal e danças tradicionais. Sábado (26), de 9h às 17h, no Centro Cultural Lagoa do Nado (Rua Ministro Hermenegildo de Barros, 904, Itapoã).

5ª edição do “Juventude oKupa a Cidade: fazendo política além dos limites” discute diferentes formas de ocupação do espaço urbano como modos legítimos de participação social. O evento trará, ainda, apresentação de grupos artísticos formados por jovens de Belo Horizonte e Região Metropolitana. Sexta (25), às 18h, no Espaço CentoeQuatro (Praça Rui Barbosa, 104, Centro).

é tudo de graça! CINEMA

Exibição do filme “A Hora da Estrela”, baseado no romance de Clarice Lispector. Sexta (25), às 15h, no Centro Cultural Jardim Guanabara (Rua João Álvares Cabral, 277, Jardim Guanabara). MARACATU

cultura | 11

Segunda a quinta-feira LITERATURA

Projeto “Sempre Um Papo” recebe a escritora Lya Luft, que dividirá o palco com Vicente de Britto Pereira para falar sobre suas obras. Segunda (28), às 19h30, no Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1537, Centro).

FUTEBOL

Exposição “Brasil - Um País, um Mundo” exibe objetos da história do futebol, como camisas usadas por jogadores da seleção, troféus, bolas e chuteiras. Até 11/05, de segunda a sábado, das 10h às 22h, e domingos, de 12h às 20h, no Shopping Del Rei.

ARTE DIGITAL

Segunda edição do “ Festival de Linguagem Eletrônica”, com instalações que criam relações entre sons e animações. De 28/04 a 01/06, às terças, quartas, quintas, sextas e sábados, das 11h às 21h, e domingos das 11h às 19h, no Teatro Oi Futuro (Afonso Pena, 4001).

Ibirité recebe mostra de fimes sobre a ditadura Apresentação da banda Trovão das Minas. Domingo (26), às 11h, na Área do Vertedouro da Barragem Santa Lúcia (Rua Engenheiro Zoroastro Torres, s/nº, Santo Antônio).

O Sind-UTE Ibirité realiza, até o dia 30 de abril, a Mostra de Cinema “Ditadura Nunca Mais - Memória, Verdade e Justiça”. Serão apresentados ao público sete documentários brasileiros: quatro longas e três curtas metragens que permeiam o universo do golpe de 64. Nas datas de exibição, também serão realizados debates com a presença de combatentes que vivenciaram o período, historiadores, ativistas dos direitos humanos e militantes de diversos movimentos sociais. Os filmes serão exibidos às 19h, no Sind-UTE Ibirité (Rua João Carvalho Drumond 145, Centro, Ibirité). Para conferir a programação completa acesse: www. sinduteibirite.wordpress.com.


16 | esporte

Belo Horizonte, de 25 de abril a 01 de maio de 2014

OPINIÃO América

Imagem de arquivo

Encarando os grandes Bráulio Siffert O empate com o Vasco fora de casa na estreia da Série B demonstra que o América já começou repetindo o que vem fazendo nos últimos campeonatos brasileiros: encarando de igual para igual os times grandes. Na Série B do ano passado, por exemplo, só o América e a Chapecoense não perderam para o Palmeiras e só o América ganhou na casa palmeirense. Na Série A de 2011, apesar de ter sido rebaixado, o América ganhou do Corinthians, do Botafogo, duas vezes do Fluminense, goleou o Vasco e não perdeu para o Cruzeiro. Em sua melhor participação na Série A, em 1973 (quinto lugar na primeira fase), o América acabou à frente de times como Flamengo,

Fluminense, Atlético-MG e Corinthians. Mas, convenhamos, na Série B de 2014 tudo isso pouco importa: só o Vasco está entre os quinze primeiros do ranking da CBF. Ou seja, o América tem que se impor é diante dos médios e pequenos.

OPINIÃO Atlético

E agora?

Reinaldo Marques de Assis Tempo ruim na cidade do Galo. Se a perda do campeonato mineiro cobriu o céu com nuvens, a derrota para o Atlético Nacional (COL) precipitou a queda de Paulo Autuori. Antes mesmo que o time retornasse de Medelín, o presidente Alexandre Kalil ordenou a demissão do treinador por telefone. Essa medida já era clamada por muitos torcedores. Grande era a insatisfação com o desempenho do Atlético na temporada, muito inferior ao futebol envolvente que rendeu o inédito título continental. Na quinta-feira (24), a sede do clube, no bairro de Lourdes, amanheceu pichada com a frase “Fora Autuori e R10!” Verdade seja dita: Autuori melhorou o setor defensivo atleticano, mas o fez sacrificando as qualidades ofensivas da equipe. Se o time sofreu poucos gols, foi porque,

OPINIÃO Cruzeiro

No olho do ciclone Gualter Naves/Site oficial do Cruzeiro.

Bruno Cantini

além dos bons zagueiros, passou a jogar com volantes e laterais plantados na defesa, perdendo a ligação com o ataque. Para piorar a situação, Ronaldinho, Tardelli e Jô andam irreconhecíveis. Ainda assim, trocar o comando durante as oitavas de final, com o peso de ter que vencer o segundo jogo, torna as coisas muito difíceis. No Horto, o Galo tem chances de reverter a desvantagem do primeiro jogo, mas precisa de tranquilidade e uma boa preparação para esse desafio. Quem conduzirá esse momento? A mudança não veio em boa hora. Agora, cabe à massa provar seu amor pelo Atlético, apoiando e comparecendo em peso ao Independência. Para os que acreditam no espírito alvinegro, as dificuldades do presente são mais uma oportunidade para dizermos ao mundo que, para ser Galo, tem que ter sofrimento e superação.

Wallace Oliveira Na próxima quarta-feira (30), o Cruzeiro vai a Asunción defender a sobrevivência na Libertadores. Ao que tudo indica, este será o desafio mais difícil da equipe de Marcelo Oliveira, desde sua formação. Se à Raposa só interessa jogar para vencer, o Cerro Porteño entra à vontade para mais uma vez mostrar suas qualidades defensivas e tentar liquidar a disputa nos contra-ataques. O Ciclón (em português, “ciclone”), como é conhecido o time do técnico Francisco Arce, defende com duas linhas de quatro marcadores muito bem postados. Quando ataca, tem nos meias Matias Corujo e Oscar Romero boas opções de ligação com o ataque, composto por Ángel Romero, irmão gêmeo de Oscar, e Dani Güiza, campeão da Eu-

rocopa 2008 pela seleção espanhola. O Cruzeiro, por sua vez, tem condições de mostrar no Paraguai um desempenho bem melhor do que apresentou no Mineirão. Primeiro, porque ganha mais de uma semana para descansar da maratona de jogos difíceis disputados nos meses de março e abril. Segundo, porque contará com o retorno de Ricardo Goulart, figura central do meio campo. É imprescindível não tomar gols, mas ainda mais importante é melhorar as finalizações. No jogo de ida das oitavas de final, o Cruzeiro finalizou 31 bolas, 14 na direção do gol. Apenas a última tentativa balançou as redes. A bola parada, sobretudo pelo alto, será um recurso importante. E vamos buscar a classificação no olho do ciclone. Dá-lhe Cruzeiro!


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